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COMPETÊNCIAS MATEMÁTICAS DE ALUNOS DE PRIMEIRO E SEGUNDO CICLOS EM SITUAÇÕES ADITIVAS E MULTIPLICATIVAS. José Aires Castro Filho - Universidade Federal do Ceará - [email protected] Marcília Chagas Barreto – Universidade Estadual do Ceará - [email protected] Alex Sandro Gomes – Universidade Federal de Pernambuco - [email protected] Introdução: Competências Matemáticas A aprendizagem de conceitos matemáticos exige que os alunos tenham experiências em muitas situações diferentes. Na vida cotidiana, eles aprendem uma forma de conhecimento matemático mediado por práticas e materiais culturais definidos historicamente. Por exemplo, vendedores ambulantes e profissionais que realizam cálculos mentais quando lidam com dinheiro. Na escola, ensinam-se conteúdos formalizados, para os quais é necessário apropriar-se de símbolos e materiais muitas vezes estranhos no cotidiano dos alunos. De um ponto de vista construtivista, dizemos que aprender um conceito matemático significa desenvolver uma série de competências (Vergnaud, 1997): 1) representar corretamente as relações entre quantidades envolvidas numa situação-problema. Cotidianamente, fazemos isso para muitos conceitos, como número, frações, proporção etc, 2) dominar as propriedades dos conceitos matemáticos, ou seja, saber aplicar determinadas regras de forma invariante e 3) identificar e processar situações matemáticas de forma precisa, isto é saber somar, subtrair, multiplicar quando for necessário agir (Vergnaud, 1997, Nunes & Bryant, 1997). Vergnaud (op. Cit.) define um conceito como uma tríade de conjuntos: (a) de invariantes, (b) de sistemas de representações, (c) de situações. Os invariantes são os aspectos lógicos inerentes a um conceito ou os esquemas de ação desenvolvidos pelos sujeitos para lidar com situações diversas. As representações são formas convencionais de expressar quantidades (número, grandezas como massa, peso, velocidade, preço etc) ou relações entre quantidades (operações aritméticas, comparações, razão etc). As

COMPETÊNCIAS MATEMÁTICAS DE ALUNOS DE PRIMEIRO … · de expressar quantidades ... mesmo conjunto de problemas (tabela 1). Os alunos do Primeiro Ciclo acertaram 4 ... análise de

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COMPETÊNCIAS MATEMÁTICAS DE ALUNOS DE PRIMEIRO E SEGUNDO CICLOS EM SITUAÇÕES ADITIVAS E MULTIPLICATIVAS.

José Aires Castro Filho - Universidade Federal do Ceará - [email protected]

Marcília Chagas Barreto – Universidade Estadual do Ceará - [email protected]

Alex Sandro Gomes – Universidade Federal de Pernambuco - [email protected]

Introdução: Competências Matemáticas

A aprendizagem de conceitos matemáticos exige que os alunos tenham experiências em

muitas situações diferentes. Na vida cotidiana, eles aprendem uma forma de

conhecimento matemático mediado por práticas e materiais culturais definidos

historicamente. Por exemplo, vendedores ambulantes e profissionais que realizam

cálculos mentais quando lidam com dinheiro. Na escola, ensinam-se conteúdos

formalizados, para os quais é necessário apropriar-se de símbolos e materiais muitas

vezes estranhos no cotidiano dos alunos.

De um ponto de vista construtivista, dizemos que aprender um conceito matemático

significa desenvolver uma série de competências (Vergnaud, 1997): 1) representar

corretamente as relações entre quantidades envolvidas numa situação-problema.

Cotidianamente, fazemos isso para muitos conceitos, como número, frações, proporção

etc, 2) dominar as propriedades dos conceitos matemáticos, ou seja, saber aplicar

determinadas regras de forma invariante e 3) identificar e processar situações

matemáticas de forma precisa, isto é saber somar, subtrair, multiplicar quando for

necessário agir (Vergnaud, 1997, Nunes & Bryant, 1997).

Vergnaud (op. Cit.) define um conceito como uma tríade de conjuntos: (a) de

invariantes, (b) de sistemas de representações, (c) de situações. Os invariantes são os

aspectos lógicos inerentes a um conceito ou os esquemas de ação desenvolvidos pelos

sujeitos para lidar com situações diversas. As representações são formas convencionais

de expressar quantidades (número, grandezas como massa, peso, velocidade, preço etc)

ou relações entre quantidades (operações aritméticas, comparações, razão etc). As

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situações englobam uma classe de problemas a serem dominadas pelos sujeitos a partir

de suas experiências de resolução de problemas.

A aprendizagem de um conceito emerge gradativamente, à medida que os indivíduos

agem em situações diferentes, mediados por sistemas de representações diversos. O

entendimento de conceitos exige que os alunos reconheçam as diferentes situações, no

momento da resolução dos problemas. Tudo ocorre num emaranhado de relações,

chamadas por Vergnaud de campos conceituais, as quais progressivamente dão sentido

aos conceitos. Neste estudo, analisamos os conhecimentos dos alunos sobre dois

campos conceituais, as estruturas aditivas e multiplicativas, cujos aspectos são

fundamentais para a compreensão de outros conceitos matemáticos mais avançados. Na

próxima seção encontram-se detalhados os principais conceitos presentes em tais

estruturas.

Es t ru turas Adi t ivas e Mul t ip l ica t ivas

A aprendizagem dos conceitos presentes nas estruturas aditivas ocorre de forma mais

eficaz, segundo Vergnaud (1997), quando as operações de soma e subtração são

apresentadas concomitantemente, como sendo opostas. Vergnaud (1982, 1986), propôs

a existência de 06 (seis) classes fundamentais de problemas, as quais ele denomina de

“relações aditivas de base” (Vergnaud, 1986 p. 13). Essas situações são: composição de

medidas, transformação de medidas, relação de medidas, composição de transformação,

composição de relação e transformação de relação.

Os conceitos encontrados nas estruturas multiplicativas possuem peculiaridades que não

nos permitem reduzi-las às aditivas, como as relações proporcionais (Nunes & Bryant,

1997). Os conteúdos desse campo conceitual abarcam o programa de vários anos de

escolaridade em matemática que vão desde a segunda série do Primeiro Ciclo até o

Ensino Médio. As situações multiplicativas são classificadas por Vergnaud (1997) em:

multiplicação, divisão por partes, divisão por cotas e quarta proporcional. Também

podemos as situações que envolvem operações com números decimais e frações como

parte das estruturas multiplicativas.

O presente trabalho apresenta os resultados de um estudo quantitativo e qualitativo

acerca dos conhecimentos matemáticos relativos aos campos conceituais das estruturas

aditivas e multiplicativas, apresentados por alunos de Primeiro e Segundo Ciclo do

estado do Ceará. A metodologia utilizada está descrita a seguir.

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Metodologia

Obje t ivo Gera l :

• Analisar as principais competências de que são portadores alunos do

Primeiro e Segundo Ciclos do Ensino Fundamental, no que concerne às

estruturas aditivas e multiplicativas.

Obje t ivos Espec í f icos :

• Verificar o desempenho dos alunos em testes relativos às estruturas aditivas

e multiplicativas.

• Avaliar o domínio conceitual dos alunos nas referidas estruturas.

• Captar as estratégias e representações utilizadas pelos alunos para resolver

os problemas matemáticos.

A consecução destes objetivos exigiu a elaboração de análises quantitativa qualitativa.

Os aspectos metodológicos estão explicitados a seguir.

Del imi tação de ambientes e su je i tos inves t igados

Para a análise quantitativa foram aplicados testes1 em alunos de escolas cearenses

distribuídas da seguinte forma: trinta escolas na capital, abrangendo os dois Ciclos e, no

interior, trinta e três escolas para o Primeiro Ciclo e quarenta e uma para o Segundo

Ciclo.

Em cada Ciclo analisado, aplicaram-se os testes em turmas de conclusão, visando

avaliar a aprendizagem que os alunos demonstravam no fechamento de cada um deles.

Para a fase qualitativa da pesquisa, foram realizadas entrevistas clínicas2 com doze (12)

alunos da capital e oito (08) alunos do interior, sendo metade de cada Ciclo avaliado.

Mater ia l

Os testes continham problemas relativos às seguintes situações: composição de

medidas, transformação de medidas, relação de medidas, composição de transformações

(estruturas aditivas), multiplicação, divisão por cota, divisão por partes, quarta

proporcional e fração (estruturas multiplicativas). Essas situações correspondem ao

conteúdo proposto pela escola nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

O teste do Primeiro Ciclo compôs-se de dezoito (18) questões. Para o teste do Segundo

Ciclo, repetiram-se todas as questões do teste do Primeiro Ciclo, acrescentando-se mais 1 Os testes utilizados serão detalhados mais à frente.

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seis (06) questões que contemplavam situações de maior grau de complexidade,

totalizando vinte e quatro (24) questões.

Para a elaboração do instrumento utilizado nas entrevistas clínicas, foram selecionados

problemas constantes nos testes da análise quantitativa, sendo cinco (05) para o

Primeiro Ciclo e oito (08) para o Segundo Ciclo.

As entrevistas seguiram os preceitos do método clínico, segundo o qual a criança deve

ser deixada livre, durante um período determinado de tempo, de modo que possa

resolver o problema proposto (Carraher, 1989). Após esse período, o entrevistador faz

questões à criança, no sentido de explicitar as estratégias específicas utilizadas por ela

quando da resolução do problema, bem como se certificar de que a resposta concedida

foi efetivamente aquela de nível ótimo a que a criança poderia chegar.

Resultados

Anál i se Quant i ta t iva

A primeira análise feita considerou todas as questões do teste do Primeiro Ciclo e

apenas as 18 primeiras questões para o caso do teste do Segundo Ciclo. Isso permitiu

uma comparação dos dois grupos de alunos usando como parâmetro a performance num

mesmo conjunto de problemas (tabela 1). Os alunos do Primeiro Ciclo acertaram 4

questões em média (22,2%), sendo que nenhum deles acertou todas as questões do teste.

Já com os alunos do Segundo Ciclo, essa média de acertos subiu para 7,1 (39,4%). Os

dados foram analisados usando uma análise de variância (ANOVA). A diferença entre

as médias é significativa a 0,001.

Tabela 1 - Média de acerto das 18 questões p/ alunos do Primeiro e Segundo

Ciclos.

Ciclo/série Número de sujeitos Média Desvio Padrão Mínimo Máximo

Primeiro Ciclo/2a série 1645 4.0 3.0 0 17

Segundo Ciclo/4a série 1661 7.1 3.3 0 18

Total 3306 5.6 3.5 0 18

Pode-se afirmar que os alunos do Segundo Ciclo tiveram desempenho melhor que os do

Primeiro Ciclo nas 18 questões usadas para a comparação. Entretanto, esse desempenho

ainda é muito baixo, pois, em média, aqueles alunos não acertaram nem a metade do 2 Essas entrevistas estão explicadas mais à frente.

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teste. Se considerarmos que esse conteúdo já deveria ter sido apreendido, na sua

maioria, no Primeiro Ciclo, esperar-se-ia que estes sujeitos acertassem a quase

totalidade das questões.

Calculou-se ainda a média de acertos considerando todas as 24 questões do teste dos

alunos do Segundo Ciclo (ver tabela 2). Nesse caso, a quantidade média de questões

acertadas elevou-se para 8,8 (36,7%). No entanto, apesar do escore maior, a

percentagem de acerto médio é menor do que quando se consideram apenas as 18

questões, que foi de 39,4%. Portanto, observa-se que não houve alteração significativa

no desempenho dos alunos quando se consideram as seis questões adicionais.

Tabela 2 - Média de acerto das 24 questões para os alunos do Segundo Ciclo.

Número de sujeitos Média Desvio Padrão Mínimo Máximo

1661 8.8 4 0 23

Foi realizada ainda uma comparação da média de acertos entre os alunos da capital e do

interior. Com relação ao Primeiro Ciclo, observou-se que na capital, o número médio de

acertos foi de 4,2 questões (23,3%) enquanto no interior esse número foi 3,9 (21,7%). A

análise de variância mostra que essa diferença é significativa a 0,05. Resultado

semelhante foi encontrado no Segundo Ciclo. Observou-se que a média de acertos nos

testes aplicados na capital foi de 9,2 em 24 questões (38,3%) enquanto no interior foi de

8,5 (35,4%). A análise de variância revela uma diferença significativa a 0,001. Embora

nos dois ciclos, os resultados apontem que os alunos da capital têm um desempenho

ligeiramente superior aos do interior, tal resultado pode ser explicado muito mais em

função do tamanho da amostra do que de desempenho específico à região.

Até o momento, discutimos os resultados quantitativos da performance dos alunos. Uma

análise qualitativa mais sistemática acerca das competências dos alunos na resolução de

problemas matemáticos encontra-se a seguir.

Anál i se Qual i ta t iva

A análise qualitativa foi utilizada no sentido de evidenciar habilidades matemáticas dos

alunos que não puderam ser captadas durante a realização da análise quantitativa. Dados

quantitativos apresentam apenas produtos e não descrevem o processo de resolução.

Para tentar compreender as competências dos alunos, é necessário analisar a forma de

resolução dos problemas por parte dos mesmos.

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Dividimos os dados em duas seções. Na primeira, descrevemos os tipos de

representação usados pelos alunos. Na seção seguinte, listamos as estratégias de

resolução de problemas.

TIPOS DE REPRESENTAÇÃO UTILIZADOS

Nesta seção, descrevemos as competências dos alunos em representar quantidades e

relações que foram apresentadas nos problemas. Existem diversas formas de

representação de um conceito matemático: os desenhos, os símbolos matemáticos etc.

Foram identificados quatro (04) tipos básicos de representação utilizados pelos alunos:

simbólica, gráfica, mental e concreta.

Representação Simbólica

A categoria de representação simbólica engloba as oportunidades em que o aluno fez

uso de símbolos matemáticos para representar quantidades ou relações entre

quantidades envolvidas nos problemas. Essa representação é chamada de matemática

escrita por Carraher, Carraher e Schliemann (1988). Segue abaixo um exemplo.

Figura 1 – Representação simbólica

A representação simbólica é composta por “...um conjunto de convenções que foram

projetadas pelos nossos ancestrais e transmitidas de geração a geração na cultura em que

a criança por acaso está inserida” (Nunes e Bryant, 1997, pág 25). O sistema de

representação simbólica não pode ser inventado pela criança, mas deve ser apreendido

gradualmente. É a forma privilegiada pela escola para a representação de problemas

matemáticos e pode ser considerado como uma “...ferramenta de pensamento, um meio

para resolver problemas...” (idem, pág 29). Essa forma de representação implica no uso

de símbolos convencionais e na aplicação de regras gerais de modo seqüencial e

hierárquico, chamadas de algoritmos (Carraher, Carraher & Schliemann, 1988). De

modo contrário, as demais formas de representação, que discutiremos a seguir, são

aplicadas em contextos bastante específicos, ligadas a procedimentos informais,

chamadas de heurísticas.

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Representação Gráfica

Alguns alunos utilizaram desenhos de objetos para representar quantidades ou relações

entre quantidades envolvidas nos problemas. Esse sistema de representação e suas

regras podem ser criados pelos alunos. Foram encontradas duas sub-categorias deste

tipo de representação: pictográfica e ideográfica3. Na representação pictográfica, o

aluno desenha o próprio objeto, ou uma figura aproximada do objeto. Um exemplo

deste tipo de representação encontra-se na figura 2.

Figura 2 – Representação pictográfica.

Esta representação é justificada pela aluna da forma como se encontra no protocolo a

seguir:

Maria deu três vestidos de boneca para cada uma de suas amigas.

Sabendo que ela distribuiu 42 vestidos, quantas amigas ela tem?

1. E: ...E como é que a gente vai saber o tanto de

amigas?

1.2.A: Então tem que fazer as bonequinhas pra gente

fazer.

Para resolver o problema, a criança desenha os quarenta e dois (42) vestidos,

agrupando-os em quatorze (14) grupos de três (03) vestidos.

Na representação ideográfica, o aluno desenha uma figura arbitrária para representar o

objeto. Os tipos de figuras encontradas foram círculos (chamados pelos alunos de

bolinhas) e traços. As figuras 3 e 4, seguidas de seus protocolos, apresentam,

respectivamente, exemplos destas representações ideográficas. Em ambos os casos, o

problema era o seguinte: A professora tem 60 bombons para dividir com uma turma de

15 alunos e quer que cada aluno receba a mesma quantidade de bombons. Quantos

bombons ela deve dar a cada aluno?

3 O uso dessas categorias está baseado nas diferentes formas de escrita utilizadas por Rego (1986).

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Figura 3 – Representação ideográfica - uso de bolinhas.

1. E: Você desenhou nessa mesa o que?

2. A: Sessenta bombons.

Figura 4 – Representação ideográfica - uso de tracinhos.

1. …

2. A: A professora tem 60 bombons, aí ela dividiu para

cada 1, tinha 15, aí eu fiz 15 bichinho, aí deu 4 pra

cada aluno.

As estratégias usando desenhos são bastante comuns. Essa é uma tentativa de observar

as relações de forma visual concreta. Segundo Meira (1998), o desenho integra a

atividade cognitiva dos alunos. Quando o desenho é bem utilizado pode servir de

suporte em momentos de ruptura do raciocínio, ou seja, quando há dificuldade no uso de

processos formais de resolução. Johannot (1947) afirma que o desenho é uma primeira e

fundamental forma de abstração que deve ser incentivada na escola.

A operação mental requerida no uso de desenhos ou traços é mais simples que no uso de

símbolos. No primeiro caso, trata-se apenas de criar conjuntos e contar a quantidade de

conjuntos, enquanto no segundo são necessários conhecimentos sobre as regras de

manipulação dos símbolos, que são muitas e arbitrárias.

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Representação Mental

Nesse caso, o aluno representa as quantidades ou relações entre quantidades apenas

mentalmente, não fazendo nenhum registro gráfico ou simbólico e sequer uso de

qualquer material. A utilização dessa representação pode ser percebida no protocolo

abaixo.

Cláudia gastou 8 reais e ficou com 13, quantos reais ela tinha?

1. E: ...Como foi que você resolveu?

2. A: ... Essa aqui eu fiz, só que não botei a resposta não.

2.3.E: E deu quanto?

2.4.A: 21.

2.5.E: E 21 é o que? Esse 21?

2.6.…

2.7.A: 21 reais que ela tinha.

2.8.E: E essa questão é de que para ti?

2.9.A: É de mais.

Observe-se que o aluno afirma que resolveu, mas não colocou a resposta, indicando que

não usou nenhuma forma de representação, a não ser a mental. Acrescente-se que o

aluno interpreta e resolve a situação corretamente, utilizando-se de uma expressão

comumente usada pelos alunos para indicar uma operação de soma: “é de mais”.

A representação mental implica no uso intrínseco de fatos numéricos conhecidos e de

propriedades do sistema numérico decimal e da operação envolvida. Ela pode também

surgir sob a forma de cálculo oral, quando o aluno, à medida em que vai resolvendo o

problema, vai se apoiando na própria linguagem. Essa forma de representação surge

com maior freqüência quando as quantidades envolvidas são pequenas, podendo ser

facilmente operadas mentalmente.

Representação Concreta

A representação concreta significa o uso de objetos físicos para representar quantidades

ou relações entre quantidades. O único exemplo desta representação encontrado foi a

contagem nos dedos. Deve-se isso ao fato de que não se utilizou, durante a entrevista,

nenhum material auxiliar, como palitinhos, tampinhas, material dourado etc, materiais

estes comumente utilizados em sala de aula. Abaixo um exemplo desse tipo de

representação.

Cláudia gastou 8 reais e ficou com 13, quantos reais ela tinha?

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1. …

2. A: Vinte e um.

2.3.E: Como foi que você fez?

2.4.A: Eu, eu contei um, dois, três, aí quando chegou em

oito eu contei de novo até treze.

2.5.E: Muito bem, você contou nos dedinhos, não foi?

Você contou oito que ela tinha gasto e depois contou

os treze que ela ainda tinha, né?

A Criança chegou à resposta correta contando nos dedos. Esta forma de representação é

motivo de polêmica junto aos professores do Ensino Fundamental, sendo defendida por

alguns como um instrumento válido, enquanto para outros é obstáculo para a

generalização de conceitos matemáticos. Faltam estudos sistemáticos sobre a posição

dos professores a esse respeito.

A contagem nos dedos é uma forma natural de expressão do pensamento matemático,

tendo sido uma das primeiras formas de contagem conhecidas na humanidade. Ela pode

ser uma ponte para a compreensão das formas convencionais mais adotadas.

Uso de Variadas Representações.

Em diversas ocasiões, o aluno utilizou mais de um tipo de representação. Em alguns

casos, elas foram usadas em paralelo, como no exemplo abaixo.

Figura 5 – Representação simbólica e gráfica usada em paralelo.

O uso de diferentes representações pode significar uma riqueza de pensamento.

Entretanto, surgiram situações em que cada representação usada gerou uma resposta

diferente. Um exemplo deste caso está apresentado abaixo.

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Figura 6 – Representação em paralelo levando a respostas diferentes.

Maria deu 3 vestidos de boneca para cada uma de suas amigas. Sabendo

que ela distribuiu 42 vestidos, quantas amigas ela tem?

1. E: Quanto você acha que deu?

1.2.A: Maria deu 42 vestidos... É de vezes ou de dividir?

1.3.[O aluno inicialmente multiplicou 42 por 3,

encontrando 126]

1.4.E: O que você fez?

1.5.A: Peraí. 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15,

16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30,

31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41 e 42.

1.6.[Conta e desenha pauzinhos]

1.7.E: O que você fez?

1.8.A: Eu usei os pauzinhos.

1.9.E: ...Por que 42 pauzinhos?

1.10. A: É quantos vestidos ela deu.

1.11. ...

1.12. E: E o que você está fazendo agora?

1.13. A: Agora, eu vou botar três em três para saber

quantas pessoas...14 amigas.

1.14. E: E essa conta que você fez aqui? [referindo-se à

conta de multiplicação]

1.15. A: Ela tá errada.

1.16. E: Tá errada? O que você tinha feito?

1.17. A: Eu botei 42x3.

1.18. E: Aí, deu 126? Você acha que essa tá errada?

Você acha que a dos pauzinhos é que tá certa?

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1.19. A: Sim.

Observou-se que a criança, inicialmente, resolve o problema por uma multiplicação,

usando uma representação simbólica. No entanto, não se sente satisfeita com a resposta

e resolve o problema usando a representação gráfica (pauzinhos) o que leva a uma

resposta diferente. Embora na segunda tentativa, a criança obtenha êxito, isso não a

conduz a uma re-elaboração da representação simbólica. A criança não consegue

estabelecer uma relação entre a representação simbólica e a representação gráfica, como

se essas diferentes formas não tivessem que levar à mesma resposta.

Foi possível detectar também a utilização mista de representações. Denominou-se

representação mista, o uso de dois tipos de representações num único processo de

resolução, como se pode ver a partir da figura e protocolo abaixo:

Figura 7 – representação mista

Maria deu 3 vestidos de boneca para cada uma de suas amigas. Sabendo

que ela distribuiu 42 vestidos, quantas amigas ela tem?

1. …

2. E: Que são esses números 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10,

11, 12, 13, 14?

2.3.A: Ela tinha 14 amigas era?

2.4.(...)

2.5.E: Você falou 14 por que?

2.6.A: Porque são 14.

2.7.E: E esse 14 é o que?

2.8.A: Esse 14 é o número.

2.9.E: Número de que?

2.10. A: De pessoas, das pessoas.

2.11. E: Que pessoas, as amigas?

2.12. A: A-hã.

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Após desenhar cada conjunto de 3 itens, a criança intercala um numeral, assim fazendo

até o numeral 14. A função dos numerais é distinta da dos desenhos. Enquanto estes

representam a quantidade de objetos, os numerais representam a quantidade de grupos.

Observamos então que existem variadas formas de representações, as quais são parte

integrante da atividade de resolução de problemas envolvendo conceitos das estruturas

aditivas e multiplicativas. De uma forma geral, o professor de matemática do ensino

fundamental deve estar consciente da importância que tais representações têm no

contexto do ensino e da aprendizagem de matemática. Os alunos detêm uma grande

variedade de habilidades acerca da criação e uso de representações de quantidade e

relações entre quantidades. Muitos tipos de representações são originais e criadas pelos

alunos. Isso significa que eles possuem versões aproximadas dos conhecimentos que os

professores querem ensinar. O professor pode utilizar as criações dos alunos como

contexto para, através de um processo contínuo de negociações de significado, construir

com o aluno um entendimento de formas de representações convencionais dos conceitos

matemáticos.

Além dessas diversas formas de representação, encontramos ainda diferentes estratégias

de resolução de problemas adotadas pelos alunos, as quais estão descritas na próxima

seção.

ESTRATÉGIAS DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS

Nessa seção, estão descritas as estratégias utilizadas pelos alunos para a resolução dos

problemas propostos. Foram encontradas as seguintes categorias de estratégias:

heurísticas e algoritmos, as quais estão descritas abaixo.

Heurísticas

Chamamos de heurística os processos de resolução informais como os documentados

por Carraher, Carraher e Schliemann (1988). Esses autores afirmam que nas heurísticas

há uma maior flexibilidade de cálculo, no entanto, são limitadas a pequenas quantidades

ou quantidades conhecidas e não são generalizáveis. As heurísticas aqui identificadas

foram classificadas em duas sub-categorias: os agrupamentos e as contagens.

Agrupamentos

Chamamos de agrupamentos a formação de grupos de elementos com quantidades

iguais, como se pode observar na figura e protocolo a seguir. Este tipo de estratégia, em

geral, está identificado com problemas de estruturas multiplicativas.

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Figura 8 – Heurística de agrupamento.

Maria deu 3 vestidos de boneca para cada uma de suas amigas. Sabendo

que ela distribuiu 42 vestidos, quantas amigas ela tem?

1. E: … Certo? Então, quantas amiguinhas ela tem?

2. A: Tô contando de 3 em 3.

2.3.E: Você tá contando de 3 em 3?…Quanto é a

resposta?

2.4.A: Quatorze.

2.5.E: Quatorze? Como foi que você encontrou essa

resposta?

2.6.…

2.7.A: Botando bolinha e separando.

2.8.E: Você botou bolinha e separou?! Então como? O

que é que ele tá perguntando? ... Quantas amigas ela

tem?

2.9.A: Quatorze.

2.10. E: Quantos vestidos ela distribuiu? Você sabe me

dizer quantos vestidos ela distribuiu?

2.11. A: Três.

2.12. E: Três vestidos? Ela só deu três vestidos?

2.13. A: Pra cada uma!

2.14. E: Ah! Deu três vestidos pra cada uma né?

2.15. A: Um-hum! [Confirma].

2.16. E: Então quantas amigas ela tem mesmo?

2.17. A: Quatorze.

Um outro tipo de agrupamento é a soma repetida. É comum observar a resolução de

uma multiplicação como sendo uma soma de parcelas iguais. A criança faz uma soma

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seqüenciada de todas as parcelas da multiplicação. Essa estratégia é correta e pode ser

aplicada com sucesso em muitas situações. Abaixo temos um exemplo:

Figura 9 – Heurística de agrupamento com soma repetida.

Um bezerro engorda 25 gramas por dia. Quanto ele vai engordar em 5

dias?

1. E: E quanto é o resultado?

2. A: 125.

2.3.E: Por que?

2.4.A: 5 dias. Aí, 25 mais 25 dá 50, 25 mais 25 dá 50, 50

mais 50 dá 100, mais 25: 125.

Observe-se também que a estratégia de agrupamento pode vir associada a diferentes

tipos de representação. Enquanto na figura 8, o agrupamento estava representado

graficamente através de desenhos, na figura 9, o aluno utilizou o agrupamento repetido

associado à representação simbólica (repetição de parcelas representadas por numerais).

Ao usar o agrupamento, o aluno está resolvendo situações multiplicativas corretamente,

mas usa um raciocínio aditivo. No entanto, conforme Nunes e Bryant (1997), é

necessário que haja uma diferenciação entre o pensamento aditivo e multiplicativo, pois

haverá situações que o raciocínio aditivo não resolverá, como a multiplicação de

números decimais.

Contagens

As contagens significam que o aluno utilizou de enumeração de elementos sequenciados

para chegar à resposta. Foram identificados dois tipos de contagem: “contagem parte-

todo” e “contagem a partir de”.

No primeiro caso, trata-se das estratégias em que o aluno chega à resposta contando as

partes e a quantidade total do problema. Veja-se a figura e o protocolo a seguir.

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Figura 10 – Estratégia de “contagem parte-todo”.

Paulo tem 17 bolas azuis e vermelhas. Se ele tem 11 bolas azuis, quantas

bolas vermelhas ele tem?

1. [O aluno armou a conta e operou da seguinte forma:

11-17 = 06]

2. E: Então, é seis, né? A resposta é seis?

2.3.A: É.

2.4.E: Você tem certeza?

2.5.A: Sim.

2.6.E: Você sabe fazer de outro jeito essa questão? …

Quer desenhar ou fazer de outro jeito?

2.7.A: outro jeito…?

2.8.[O aluno, nesse momento, começou a fazer bolinhas.

Ele desenhou 17 bolas e pintou 11, deixando seis sem

serem pintadas, representando a subtração que ele fez

anteriormente].

Observe-se no protocolo e figura acima que o aluno inicialmente arma a conta de forma

errada, mas chega à resposta correta. Quando solicitado a resolver de outra forma, o

aluno utiliza-se da estratégia de contagem. Ele desenha as dezessete (17) bolinhas e

pinta onze (11) referentes às bolas azuis. Nesse momento, o que ele fez foi contar o todo

(17) e uma das partes (11). A quantidade remanescente é também contada e constitui a

resposta do problema.

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Na estratégia “contagem a partir de”, o aluno conta a partir de uma determinada

quantidade até chegar à quantidade total. Veja-se o exemplo abaixo.

Paulo tem 17 bolas azuis e vermelhas. Se ele tem 11 bolas azuis, quantas

bolas vermelhas ele tem?

1. …

2. A: Seis.

2.3.E: Seis? …Você sabe explicar pra mim com foi que

você pensou?

2.4.…

2.5.A: Ele tem 17 bolas.

2.6.E: 17 bolas.

2.7.A: Azuis e vermelhas.

2.8.E : Certo.

2.9.A: Aí se ele tem, tem 11 bolas azuis, ele tem o resto,

vermelho é 6.

2.10. E: Certo. Então coloque aí a resposta seis. Seis né?

Mas você sabe fazer a continha? Você fez como?

Você somou, você diminuiu, como foi que você fez?

2.11. A: Eu só fiz contar de onze (11) até dezessete (17).

Como se pode ver, o aluno não contou a primeira quantidade (onze), mas partiu dela

para verificar quantos elementos faltavam para chegar à quantidade total. A resposta é o

número de elementos contados na segunda etapa.

Resolver operações contando objetos é uma das primeiras estratégias desenvolvidas

pelos alunos. Trata-se de um esquema mental baseado na noção de seriação e

ordenação. A criança aprende desde cedo a atribuir aos conjuntos um valor de

cardinalidade correspondente à ordem do último elemento contado. Na busca da

construção do pensamento abstrato, as estratégias de contagem são apresentadas por

Carpenter et all (1999) como um estágio mais avançado que aquele em que o aluno se

utiliza diretamente dos objetos físicos, uma estratégia chamada pelos autores de

modelagem direta. Na ultima estratégia, a criança precisa construir fisicamente todos as

parcelas da operação, antes de resolvê-la. Já no caso da contagem, a criança muitas

vezes parte de uma determinada parcela e representa na contagem somente a quantidade

faltante.

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Algoritmos

A segunda categoria de estratégia é o uso de algoritmos. Chamamos de algoritmo as

estratégias de manipulação de símbolos nas quais um conjunto de regras é aplicado de

forma seqüencial “...para obtenção de um determinado resultado a partir de dados

específicos e através de passos descritos com tal precisão que poderiam ser executados

por máquinas” (Knuth, apud Carraher, Carraher & Schliemann, 1988, p. 57). A figura

11 mostra o uso de um algoritmo da soma.

Figura 11 – algoritmo da soma.

Cláudia gastou R$ 8,00 e ficou com R$ 13,00. Quantos reais ela tinha?

1. E: Você quer calcular no papel?

2. A: Calcular? Tá... [Começa a calcular 13 + 8]

2.3.E: Que cálculo foi esse que você fez?

2.4.A: Treze mais oito.

2.5.E: Então ela tinha quantos reais?

2.6.A: Tinha treze.

2.7.E: Ela tinha quantos reais antes de fazer a compra?

2.8.A: Vinte e um reais.

2.9.E: Por que ela gastou quanto?

2.10. A: Oito reais.

2.11. E: E ficou com quanto?

2.12. A: Treze reais.

Ressaltamos que esta estratégia foi mais comumente encontrada associada com a

representação simbólica. No entanto, em alguns casos encontramos o uso de algoritmos

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associados à representação mental. O protocolo abaixo ilustra a aplicação do algoritmo

da divisão, utilizando-se de cálculo mental

Maria deu 3 vestidos de boneca para cada uma de suas amigas. Sabendo

que ela distribuiu 42 vestidos, quantas amigas ela tem?

1. E: Como foi que você fez?

2. Ela tem 14, porque 42 dividido por 3 é 14. 3 vezes 1,

3, menos 4, 1. Abaixa o 2. 12 dá 4. 3 vezes 4, 12, que

dá 0.

É importante que fique claro que as diferentes estratégias encontradas podem ser fontes

alternativas de atividades ou pontos comuns à negociação do significado de novos

conhecimentos matemáticos. A escola não deve fazer uma separação entre processos de

raciocínio formais e informais. Todos esses recursos são formas de expressão do

pensamento matemático e devem ser igualmente valorizadas na sua construção

(Carraher, Carraher & Schliemann, 1988). D’Ambrósio(1996, 1999) defende que a

matemática formal é apenas uma das formas de expressão do conhecimento matemático,

que historicamente tornou-se dominante.

Conclusão

Observamos no início deste trabalho que um dos indícios da aprendizagem de conceitos

matemáticos é representado pelo domínio que os sujeitos demonstram de propriedades

variadas dos mesmos e pelo fato de que esse domínio ocorre a partir de um leque

significativo de situações. Os resultados da análise quantitativa apontam que o

desempenho de alunos do Primeiro e Segundo Ciclos do Ensino Fundamental, acerca

dos campos conceituais das estruturas aditivas e multiplicativas, é muito aquém do

desejado.

No entanto, a análise qualitativa mostra que os alunos dispõem de um repertório

diversificado de formas de representação dos conceitos matemáticos: simbólica, gráfica,

mental e concreta. Esse conjunto, se conhecido e identificado pelo professor, pode

definir o potencial de desenvolvimento dos alunos para aprendizagem da Matemática.

Na maioria das atividades escolares, a emissão de uma resposta é suficiente para muitos

professores considerarem o raciocínio como correto ou errado. Essa atitude tem

repercussões nos alunos e nos professores. Por parte dos alunos, furta-os da

possibilidade de desenvolver formas originais de raciocínio que estão na base do

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entendimento de conceitos matemáticos. Do lado dos professores, impede que eles

percebam os avanços dos alunos, representados por fragmentos de conhecimento

matemático. Portanto, é como se o professor estivesse sempre iniciando seu trabalho do

nada, ao invés de partir de níveis onde os alunos já se encontram.

A análise qualitativa realizada chama a atenção para um aspecto freqüentemente

desprezado nos processos de ensino-aprendizagem e nos processos avaliativos.

Conforme vimos, em muitos casos, mesmo quando a resposta do aluno não é dada de

forma convencional, seu raciocínio apresenta uma riqueza na compreensão de situações.

Isso demonstra que os alunos contam com habilidades cognitivas que não os

caracterizam como inaptos à aprendizagem da Matemática. O que pode estar ocorrendo

é uma inadequação da escola enquanto mediadora da construção do conhecimento

matemático dos alunos.

Acreditamos que o elenco de descrições apresentado na análise qualitativa, seja de

maior utilidade para os profissionais de educação, do que apenas resultados globais de

índices de acerto.

Palavras Chaves

Resolução de Problemas, Estruturas aditivas e Multiplicativas, Avaliação do

conhecimento Matemático.

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