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Universidade Aberta do BrasilUniversidade Federal do Espírito Santo
Culturas e História dos
Povos Indígenas
Especialização
Adriana V. G. HartuwigArlete M. P. Schubert
Kalna Mareto Teao
Klítia Loureiro
Maria das Graças Cota
Marluce L. S. Lopes
Culturas e história dospovos indígenas
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Vó2011
UniVersidade Federal do espírito santonúc eucçã ab dâc
Culturas e história dos
povos indígenas
a V. G. Huwga M. p. schub
K M tK lu
M Gç CMuc l. s. l
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Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)
(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)
Copyright © 2011. Todos os direitos desta edição estão reservados ao ne@ad. Nenhuma parte deste material
poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem
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Psicanálise, na modalidade a distância.
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limites do direito de autor no art. 46 da Lei no. 9610/1998, entre elas as previstas no inciso III (a citação em
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o nome do autor e a origem da obra), sendo toda reprodução realizada com amparo legal do regime geral de
direito de autor no Brasil
Presidente da República
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Ministro da Educação
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Universidade Aberta do Brasil
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Universidade Federal do Espírito Santo
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Pro. Reinaldo Centoducatte
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e Coordenadora UAB
Maria José Campos Rodrigues
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Robson Loureiro
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Revisão de Linguagem
Andrea Antolini Grijó
Design Gráfco
LDI - Laboratório de Design Instrucional
Ne@ad
Av. Fernando Ferrari, n. 514CEP 29075-910, Goiabeiras Vitória - ES(27) 4009 2208
LDI Coordenação
Heliana PachecoJosé Otavio Lobo NameRicardo Esteves
Gerência
Susllem Meneguzzi Tonani
EditoraçãoMariana Melim
Capa
Leonardo Amaral
Ilustração
Leonardo Amaral
Ricardo Capucho
ImpressãoDossi
Laboratório de Design Intrucional
Culturas e história dos povos indígenas / Adriana V. G. Hartuwig... [et al.].- Vitória . - Vitória, ES : Universidade Federal do Espírito Santo, Núcleode Educação Aberta e a Distância, 2011.
203 p. : il. ; 23 cm Inclui bibliografa.ISBN:
1. Nativos. 2. Índios. I. Hartuwig, Adriana V. G.
CDU: 397
C968
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Esse ascículo insere-se nas atividades acadêmicas e
de extensão de um projeto que emerge no bojo do
Programa da Rede de Educação para a Diversidade daSecretaria de Educação Continuada, Alabetização,
Diversidade e Inclusão (SECADI/MEC/UAB) que pro-
põe a ormação de educadores, gestores educacionais
e prossionais da educação nas áreas da culturas e
histórias dos povos indígenas. Isso acontece por meio
da promoção do curso de extensão (nível de apeei-
çoamento) Formação de Proessores na temática
culturas e histórias dos povos indígenas, na mo-
dalidade a distância, com carga horária de 240 horas.
O curso visa contribuir para a ormação continuada
de proessores da educação básica da rede pública de
ensino do Estado do Espírito Santo. Uma das metas
é acender nos proessores a agulha do desejo pelo
dabate à essa signicativa temática, tornando-os ca-
pazes de compreender os temas da diversidade, das
culturas e histórias dos povos indígenas e dessa orma
contribuir com uma possível transormação da prática
pedagógica, na tentativa de enrentar e diluir os pre-
conceitos arraigados no cotidiano escolar.
Ainda que neste início de século XXI, e durante
todo o século XX, as lutas contra discriminação étnica,
e pelo respeito à diversidade tenham sido incessan-
tes e constantes, verica-se, em todas as sociedades,
Apresentação
gestos, convenções e práticas sociais discriminatórias.
O Brasil tem conquistado importantes resultados na
ampliação do acesso e no exercício dos direitos, porparte de seus cidadãos. Mesmo assim, sob vários as-
pectos, temos muitos desaos a superar e avanços a
conquistar no que tange ao respeito e valorização da
diversidade que undamenta a dignidade da pessoa
humana, a vida, a integridade e o apreço pelas or-
mas de maniestação e expressão da cultura em suas
mais variadas modalidades. Enrentar toda a sorte
de preconceito, discriminação e violência é um des-
ses desaos que inegavelmente deve perpassar toda
a educação. As discriminações e violências étnicas
são produções e reproduções históricas que ocorrem
em todos os espaços sociais, e a escola não ca de
ora. Esse ascículo tem como objetivo ser uma me-
diação entre a produção acadêmica e os promotores
da educação básica, no sistema público de ensino e,
dessa orma, contribuir para o desvelamento do véu
de maia que cobre a capacidade de refexão e crítica
em relação a todo e quaisquer tipo de maniestações,
práticas e comportamentos preconceituosos e discri-
minatórios que ainda insistem em orientar a existên-
cia de milhares de pessoas na sociedade brasileira.
Robson Loureiro
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Sumário
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161
177
97 5
39 3
133 7
21 2
113 6
77 4
8
9
Índios, povos indígenas e termos correlatos
História dos povos indígenas do Brasil
Poder e desigualdade:
assimetria nas relações interétnicas
Cultura(s) e interculturalidade: conceitos e
perspectivas de construção de saberes
Classifcação dos povos indígenas pela
diversidade linguística: troncos e amílias linguísticas
Os direitos dos povos indígenas no Brasil
Sociodiversidade indígena no Brasil:
onde estão e quais são os povos indígenas
Territorialidade e povos indígenas:
dados gerais sobre a demografa indígena
O movimento indigenista e o movimento indígena no BRASIL:
o caso Tupinikim e Guarani no Espírito Santo
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Objetivos
Apropriar-se da terminologia utilizada para conhecer os povos indígenas; identi-
car as implicações políticas do uso dos conceitos índios, povos indígenas, nações
indígenas, tribo, grupo indígena, sociedade indígenas etc; compreender o contexto
sócio-histórico e político, no Brasil e no mundo, do uso desses conceitos; relacionar
o uso desses dierentes termos às lutas das organizações indígenas e indigenistas
pela garantia dos direitos indígenas, no Brasil e no mundo.
Uma aproximação inicial
Durante o processo de aprendizagem da linguagem, nós humanos nos apropriamos de
conceitos que passamos a utilizar para nomear e denir tudo a nossa volta: objetos,
sentimentos, pessoas, plantas, animais etc. O processo de escolarização nos permite
dar um salto qualitativo no emprego desses conceitos, uma vez que passamos não
somente a usá-los, mas também a deni-los. O processo de escolarização contribui
também para que possamos nos apropriar de muitos outros conceitos e também com-
preender as implicações histórico-sociais do emprego um ou outro conceito.
Nesse sentido, é possível armar que a alabetização, que acontece em língua
portuguesa, possibilita a apreensão de diversos conhecimentos acessíveis nesse idio-
Maria das Graças Cota2
Índios, povos indígenas e
termos correlatos1
1Texto ormulado a partir do
capítulo IV da tese de doutorado:
COTA, M.G. O Processo de Escolari-
zação dos Guarani do Espírito San-
to. UFES/PPGE, 2008. Orientadora Regina Helena Silva Simões.
2 Doutora em Educação/Ues.
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ma. São saberes escolarizados, tais como as artes, a matemática, as ciências etc.
Por isso, por meio do processo de escolarização é possível criar as condições de
possibilidade para que, no espaço e tempo da escola, aconteça o aproundamento
de conceitos que, anteriormente, a pessoa já possui e, também, para a apropriaçãode outros, que estão relacionados às diversas áreas do conhecimento. Em outras
palavras, a escola é o lócus privilegiado para ampliar o repertório cultural dos alunos.
Assim sendo, propomos a você um exercício de aproundamento teórico acerca
de alguns conceitos: índio, povo indígena, entre outros. Para isso, antes de ler o
texto a seguir, registre por escrito como você dene índio, ou seja, ao conhecer uma
pessoa como você aria para chegar à conclusão se ela é ou não indígena?
Faça esta mesma indagação para três pessoas do seu convívio (alunos, amiliares,amigos) e registre as respostas por escrito.
Em seguida, leia o texto proposto e compare as representações que você registrou
acerca da denição de índio com as denições apresentadas pelo texto.
Resumo
Este texto objetiva analisar a terminologia utilizada para denir índios, povos indíge-
nas e outros termos correlatos tais como: silvícolas, tribos, grupos indígenas, nações
indígenas, sociedades indígenas etc. Para tal exercício, optou-se por uma análise políti-
co-histórica dessa terminologia, identicando o contexto sócio-histórico e político do
da constituição desses conceitos, assim como as implicações dos seus usos e desusos.
Introdução
Uma das preocupações metodológicas que se tem no campo das Ciências Sociais é a
denição dos conceitos com os quais se está trabalhando, uma vez que, a maior parte
desses conceitos é polissêmica, ou seja, tem mais de um sentido. Na armação “isto é
programa de índio”, a palavra índio tem uma conotação dierente daquela encontrada
na armação “A FUNAI conrmou a identidade étnica dos índios Tupinikim.”
Além disso, uma mesma situação pode ser denida de dierentes maneiras, de-
pendendo do contexto histórico-político em que se realiza. Os índios brasileiros se
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autodenem como “povos”, ou seja, povo Tupinikim, povo Guarani. Já o Estado, os
dene como tribos, grupos indígenas, ou sociedades indígenas.
Levando em consideração essas situações, é que propomos analisar de um pon-
to de vista histórico-político os conceitos de índio, de povo indígena, de naçãoindígena e também de termos correlatos como: silvícolas, tribos, grupos indígenas,
sociedades indígenas etc.
Os usos e desusos que são eitos desses termos estão diretamente relacionados às
concepções que se tem de cultura, Estado, Nação, soberania nacional e dos direitos dos
povos indígenas. A categoria índio é um termo genérico, que oi criado pelos europeus,
para designar os dierentes povos que viviam na América, uma vez que Cristóvão Co-
lombo e outros exploradores pensavam que haviam chegado à Índia. Por sua vez, caberessaltar que esses povos não se autodenominavam índios, mas sim Tupinikim, Guarani,
Pataxó, Mapuche, Maia etc. Séculos mais tarde, esses povos acabaram incorporando esse
termo para demarcar a dierença entre eles próprios e o restante da sociedade.
De acordo com Silva (1999), o termo índio passou a ter um signicado
relacionado à descoberta das semelhanças que unem os diversos grupos indígenas e
à distância que os separa das sociedades nacionais. O mesmo ponto de vista é com-
partilhado por Durham (1983), para quem, na medida em que os povos indígenas seapropriam da categoria índio, estão no caminho de construir uma nova identidade
coletiva e constituírem-se eetivamente como minoria étnica, emergindo assim como
atores políticos coletivos (DURHAM, 1983, pág. 135).
Darcy Ribeiro (1997) util iza o conceito de índio baseado no critério da autoi-
denticação étnica:
[...] indígena é aquela parcela da população que apresenta problemas de inadaptação
à sociedade brasileira, motivados pela conservação de costumes, hábitos ou meras leal-
dades que a vinculam a uma tradição pré-colonial. Ou ainda mais amplamente: índio é
todo individua reconhecido como membro por uma comunidade pré-colombiana que se
identica como etnicamente diversa da colonial e é considerada indígena pela popula-
ção brasileira com que está em contato (RIBEIRO 1987, p. 26).
No Brasil, a Lei n° 6001 de 19 de dezembro de 1983, que se encontra ainda
em vigor e que dispõe sobre o Estatuto do Índio, dene em seu artigo 3° índio ou
silvícola como: “[...] todo indivíduo de origem e ascendência precolombiana que se
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identica e é identicado como pertencente a um grupo étnico cujas características
culturais o distinguem da sociedade nacional”.
Ainda segundo esse documento, quanto ao grau de integração à sociedade na-
cional, os índios são divididos em três categorias: isolados, em vias de integração eintegrados. Assim sendo, qualquer índio que já se encontra totalmente integrado à
“sociedade nacional”, mas que conserve usos, costumes e tradições características da
sua cultura, continua sendo considerado índio.
De acordo com Oliveira (1993), essas denições de índio retratam o estereótipo
de índio cristalizado em nossa sociedade.
Há um uso muito diuso e generalizado do termo índio, materializado nas denições de
dicionário, expresso na ala cotidiana, no imaginário popular, na literatura e nas alas
eruditas, enraizando-se inclusive no pensamento cientíco [...] Os elementos xos que
compõem tal representação propiciam tanto a articulação de um discurso romântico,
onde a natureza humana afora com mais propriedade no homem primitivo, quanto na
visão do selvagem cruel e repulsivo [...] Melhor seria pensá-los como povos indígenas,
como objetos de direito e como sujeitos políticos coletivos, distanciando-se do mito
da primitividade e das improcedentes cobranças que o senso comum instiga a cada
momento (OLIVEIRA, 1993, p. 5).
A partir da segunda metade do século XX, os povos indígenas passaram a lutar
para ter suas culturas reconhecidas não como estágios ineriores da “cultura oci-
dental”, como pregavam os positivistas, mas sim, como culturas dierentes. Além do
reconhecimento ao direito à diversidade cultural, os indígenas lutam também pelo
direito à terra que tradicionalmente ocupam, por sistemas de saúde e de educação
escolar que respeitem seus conhecimentos, línguas e ormas de aprendizagem.
Essa mudança trouxe implicações na orma de relacionamento do Estado com
essas sociedades e para o processo de institucionalização de políticas públicas
que garantam os direitos dos povos indígenas. Os direitos dos povos indígenas
encontram-se atualmente incluídos como parte dos direitos sociais na Constitui-
ção de diversos países, além de estarem presentes como tema nas declarações e
convênios internacionais e incorporados às metas de políticas públicas em muitos
países da América Latina.
A institucionalização dos direitos indígenas é produto de infuências de vá-
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rios níveis, desde as locais, ligadas aos movimentos ambientais e sociais, até as
internacionais. Uma das principais características da luta dos povos indígenas em
todo o mundo é o clamor por direito em diversos aspectos: educação especíca e
dierenciada, reconhecimento da diversidade étnica, propriedade coletiva da terrae assistência médica. Em outras palavras, a luta dos povos indígenas se realiza pelo
reconhecimento da diversidade e também pelo combate às desigualdades sociais,
que por séculos têm submetido os índios e outros segmentos da sociedade à situ-
ações de pobreza e de violência.
Os povos indígenas, vítimas das discriminações sociais e culturais vêm, cada vez
mais, se organizando para lutar contra a ideologia que os declara ausentes e contra
as práticas que os oprimem, que os consideram presenças desvalorizadas, provocan-do assim a crise nal das democracias de baixa intensidade.
Os agentes dessas lutas distinguem-se dos seus antecessores por duas razões. Em pri-
meiro lugar, empenham-se na luta simultânea pela igualdade e pelo reconhecimento da
dierença. Reivindicam o direito de ser iguais quando a dierença os inerioriza e o direi-
to de ser dierentes quando a igualdade os descaracteriza. Em segundo lugar, apostam
em soluções institucionais dentro e ora do Estado para que o reconhecimento dos dois
princípios seja eetivo (SANTOS, 2006, p. 1).
No pleito pelos seus direitos, os povos indígenas da América Latina têm rea-
lizado encontros para discutir seus problemas, ampliar as suas alianças e traçar
novas estratégias de luta, ortalecendo as redes de comunicação e solidariedade.
Durante esses encontros são reivindicados direitos à educação como marco da
diversidade e da cidadania.
A IV Assembleia Geral do Conselho Mundial dos Povos Indígenas, ocorrida no
Panamá, em 1986, adotou a Declaração de Princípios, segundo a qual os povos
indígenas têm o direito de receber educação escolar em sua própria língua ou de
estabelecer suas próprias instituições educacionais. O Encontro sobre o Direito Com-
parativo Indígena na América, realizado em Quito, em 1990, teve como uma de suas
reivindicações o estabelecimento de Programas de Educação Bilíngue e Intercultural
também para as populações não indígenas (MONTE, 2001, p. 49).
Em 2004, aconteceu em Quito, Equador, o II Encontro Continental dos Povos
Indígenas das Américas, no qual estiveram presentes 600 lideranças representativas
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de povos indígenas. Nesse encontro, oram abordados os seguintes temas: terras,
territórios e recursos naturais; autonomia e livre autodeterminação; diversidade e
pluralidade; conhecimentos indígenas e propriedade intelectual; direitos indígenas
e organismos multilaterais; nacionalidades e povos indígenas; movimentos sociais e Fórum Social Mundial; mulheres indígenas; educação escolar; participação política e
governos alternativos e militarização (BITTENCOURT; DANTAS, 2004, p.1).
Em outubro de 2006, aconteceu, em La Paz, Bolívia, o Encontro Continental de
Povos e Nacionalidades Indígenas de Abya Yala (América Latina), cujo tema oi “Da
resistência ao poder”. Milhares de indígenas de países como Colômbia, Argentina,
Equador, Canadá, Venezuela, Panamá, Nicarágua, México, Guatemala e Chile discu-
tiram diversos temas, como: soberania e governo; análise dos direitos internacionaisindígenas; identidade e convivência; culturas, educação e línguas; organização e
perspectivas econômicas; dívidas históricas, sociais e ecológicas; juventude e com-
plementação homem-mulher no processo de mudança; alianças estratégicas e co-
municação indígena (DA RESISTÊNCIA, Acesso em 11 de outubro, 2006).
Outro encontro de representantes de povos indígenas, realizado em 2006, acon-
teceu na cidade de Buenos Aires na Argentina, quando se reuniram representantes
do Chile, da Bolívia, do Brasil, do Peru, da Colômbia, do Panamá e do México, como objetivo de compartilhar experiências e analisar o contexto da comunicação entre
os diversos povos indígenas do continente americano.
Os direitos indígenas instituídos não oram ainda materializados por meio das
práticas governamentais, porém não restam dúvidas de que os povos indígenas al-
cançaram um novo patamar, em suas relações entre si e com o Estado. Outro aspecto
interessante da luta dos povos indígenas é que, apesar de todas as diculdades e da
exclusão, os líderes indígenas da América Latina têm-se apropriado de novos espaços
políticos, pondo m a governos e infuenciando nas eseras de poder local e parlamen-
tar. Os movimentos indígenas da América Latina derrubaram os presidentes da Bolívia
e do Peru, desenvolveram novos caminhos nos processos políticos e ocuparam diversos
cargos em parlamentos, ministérios e preeituras (CEVALLOS, 2004, p. 4).
Os resultados da última eleição presidencial da Bolívia, realizada em dezembro de 2005,
surpreenderam o mundo inteiro com a eleição do líder indígena Evo Morales e intelectual
Álvaro Garcia, obtiveram 1,535 milhões de votos, o que correspondeu a 53,7% dos votos
válidos, vencendo o candidato da oposição, Jorge Quiroga, que obteve 819 mil votos.
No México, em que há dez milhões de indígenas, o Exército Zapatista de Liber-
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tação Nacional, integrado em sua maioria por nativos, pegou em armas no início de
1994 para reclamar democracia, política eleitoral e justiça para os povos originários.
Graças a esse e outros atores que aetaram o sistema político dominado, desde
1929, pelo Partido Revolucionário Institucional, o governo do México iniciou em2000 a construção de um sistema eleitoral mais transparente. Graças à luta dos
zapatistas, o sistema político do México passou por uma ampla reorma em 2001,
assegurando assim vários direitos aos povos indígenas daquele país.
Na Guatemala, durante os anos 70 e 80 do século XX, os indígenas soreram uma
dura repressão política, o que custou centenas de milhares de vidas. Porém, com o
passar dos anos, os povos indígenas conseguiram representatividade no governo:17
dos 113 deputados que atuavam em 2006, nesse país, eram indígenas; uma nativaera ministra de Estado e outros cinco eram vice-ministros. Além disso, 106 dos 331
municípios eram dirigidos por indígenas. Essas conquistas seriam impensáveis menos
de uma década atrás nesse país centro-americano.
Além das redes locais e internacionais relacionadas aos movimentos indígenas,
outros tipos de redes estão sendo organizados em escala global. Segundo Monte
(2001, p. 50), isso acontece mais precisamente no âmbito das organizações que lu-
tam pelo respeito aos direitos humanos. Uma das primeiras organizações que, desde a sua undação em 1919, tem contri-
buído para garantir os direitos dos povos indígenas e, consequentemente, participa-
do dessa rede é a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Essa organização tem
como objetivo melhorar as condições de trabalho, assegurar a liberdade de expressão
e de associação e combater a pobreza no mundo. A OIT, em 2006, oi a primeira
agência especializada a integrar o Sistema das Nações Unidas.
Na Convenção n° 107, sobre as populações indígenas e tribais, aprovada em
Genebra, em 26 de junho de 1957, durante a Conerência Geral da Organização In-
ternacional do Trabalho, convocada pelo Conselho de Administração da Repartição
Internacional do Trabalho, deniu-se a categoria índio como:
Membros das populações tribais ou semi-tribais de países independentes (de todos os
continentes) pelo ato de descenderem das populações que habitavam o país, na época
da conquista ou da colonização e que, qualquer que seja seu estatuto jurídico, levem
uma vida mais conorme às instituições sociais econômica e culturais daquela época
do que as instituições peculiares à nação a que pertencem. (GUIMARÃES, 1989, p. 23).
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Em muitos aspectos, a Convenção n.º 107 oi bastante avançada para a sua
época, pois assegurava aos povos indígenas o direito a uma propriedade coletiva
ou individual sobre as terras tradicionalmente ocupadas e a uma educação escolar
na língua materna. No entanto, adotou ainda uma perspectiva evolucionista e inte-gracionista, uma vez que considerava os índios ou populações tribais ou semitribais
como sendo aqueles cujas condições sociais e econômicas correspondiam a um “[...]
estágio menos adiantado que o atingido pelos outros setores da comunidade nacio-
nal e que sejam regidos, total ou parcialmente, por costumes e tradições que lhes
sejam peculiares” (Convenção nº. 107, art. 1º).
A Convenção 107 da OIT oi promulgada, no Brasil em 18 de julho de 1965, pelo
Decreto Legislativo n.º 20, de 30 de abril de 1965, e pelo Decreto Presidencial n.º58.824, de 14 de julho de 1966, quando estavam no poder os militares.
Devido às transormações de paradigmas no âmbito das Ciências Sociais, prin-
cipalmente no Direito Internacional, e à mobilização das organizações indígenas e
indigenistas3, ez-se necessário realizar uma reormulação da Convenção nº. 107,
principalmente daqueles pontos que não eram aceitos pelos indígenas. Assim sendo,
a Conerência Geral da OIT aprovou, em 1989, a Convenção n.º 169, que trata da
questão dos povos indígenas e tribais em países independentes. De acordo com essa convenção, a consciência da sua identidade indígena ou
tribal deverá ser considerada como critério undamental para determinar os grupos
interessados. Portanto, nenhum Estado pode negar a identidade de um povo indíge-
na que se reconheça como tal.
A Convenção utiliza o termo “povos indígenas”, em substituição a “populações”
da Convenção n.º 107. O uso do termo “povos” tem a ressalva de que esse “[...] não
deverá ser interpretado no sentido de ter implicação alguma no que se reere aosdireitos que possam ser coneridos a esse termo no direito internacional”. Com isso,
elimina-se qualquer possibilidade de essa Convenção ser utilizada para dar legitimi-
dade a movimentos separatistas dos povos indígenas, seja na reivindicação de sua
soberania sobre seus territórios, seja na armação de sua autodeterminação.
Os grupos indígenas brasileiros se autodenominam povos indígenas. Povo no sen-
tido de um grupo de indivíduos que ala a mesma língua, tem costumes e hábitos co-
muns, anidades de interesses, uma história e tradições comuns. Na legislação brasilei-
ra as denominações mais utilizadas são: comunidade indígena, grupo tribal, população
etc. O Estatuto do Índio apresenta em seu artigo 3° o seguinte conceito: “Comunidade
3Organizações Indígenas são
aquelas organizadas e administra-
das pelos próprios indígenas como
é o caso da Associação Indígena
Tupinikim e Guarani (AITG), de
Aracruz,ES. As associações indige-
nistas são organizadas pelos não
indígenas para o apoio a causaindígena, exemplo: Conselho
Indigenista Missionário (CIMI),
ligado à CNBB.
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indígena ou grupo tribal – é um conjunto de amílias ou comunidades índias, quer vi-
vendo em estado de isolamento em relação aos outros setores da comunhão nacional,
quer em contatos intermitentes, sem, contudo estarem neles integrados”.
A Constituição Federal Brasileira de 1988, em seu artigo 231 utiliza as categoriasgrupos indígenas e população.
É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, reerendum do Congres-
so Nacional, em caso de catástroe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou
no interesse da soberania do país, após deliberação do Congresso Nacional, garantindo
em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.
Em toda a legislação brasileira que trata da questão indígena, comumente uti-
lizam-se os termos grupos ou sociedades e nunca povo ou nação. O termo “nações
indígenas” para se reerir aos dierentes povos indígenas, mesmo com todas as limi-
tações ao uso do termo expressas na própria Convenção, não agradou aos represen-
tantes do Governo Brasileiro, por isso o Brasil se absteve de votar.
O Estado brasileiro, representado por alguns de seus segmentos burocráticos mais
tradicionais, oerecia assim indicação de que não estava de acordo com essa propos-ta, ou seja, estava se recusando a ser caracterizado como pluriétnico e multissocie-
tário, negando assim que conviviam em seu território dierentes etnias e sociedades
(SANTOS, 2004). Essa posição conservadora do Estado brasileiro refetiu posterior-
mente no processo de aprovação dessa Convenção pelo Congresso Nacional, como
veremos mais à rente em texto que trata da questão.
Do ponto de vista dos setores mais tradicionais da sociedade brasileira, o Es-
tado Nacional é ormado por uma única nação: a brasileira. Assim sendo, o re-conhecimento da existência de dierentes nações indígenas no interior do Estado
brasileiro poderia colocar em risco a integridade de nossa soberania e território,
uma vez que abriria precedentes para a separação dessas nações, com seus respec-
tivos territórios, do restante do País.
Essas conjecturas que povoam os discursos e a imaginação, principalmente das
Forças Armadas, não parecem razoáveis, se levarmos em consideração o tamanho das
populações de cada um dos grupos indígenas existentes. Na realidade, o que susten-
ta esses discursos são interesses econômicos das mineradoras, azendeiros e outros.
Segundo a Convenção n.º 169, os Estados deverão reconhecer os direitos de
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propriedade e posse dos povos em questão sobre as terras que tradicionalmente
ocupam, assim como os direitos sobre os recursos naturais existentes em suas terras.
Os povos indígenas não deverão ser removidos das terras ou territórios que ocupam.
A Convenção n.º 169 assegura a participação dos povos indígenas na elaboraçãodos programas educacionais que respondam às suas necessidades particulares. Os
currículos deverão incorporar suas histórias, seus conhecimentos e técnicas, seus
sistemas de valores e suas aspirações sociais, econômicas e culturais adicionais. As-
segura também a ormação de membros desses povos para que eles mesmos possam
responder pelos serviços educacionais.
As crianças deverão aprender a ler e a escrever sua própria língua garantindo-se também
que elas tenham a oportunidade de dominar a(s) língua(s) ocial (is) do país onde vivem.O âmbito de luta pelos direitos dos povos indígenas oi ampliado com a criação
da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1948, e de outras organizações que
se encontram vinculadas a essa, como a Organização para a Alimentação e a Agri-
cultura (FAO, 1945), a Organização das Nações Unidas para a Educação e Ciência
(UNESCO, 1945) e a Organização Mundial da Saúde (OMS, 1948).
Os Estados membros dessas organizações são responsáveis pela elaboração, ne-
gociação e scalização do cumprimento dos instrumentos juridicamente vinculató-rios (tratados, pactos, convenções, acordos e outros). As organizações não gover-
namentais desempenham um importante papel de pressão sobre os Estados e as
instituições internacionais tanto na elaboração, quanto na aprovação e cumprimento
do que esses documentos estipulam.
Na ONU, a questão indígena passou a ser aproundada a partir dos anos 70 do
século XX, quando o seu Conselho Econômico e Social autorizou o estudo sobre as
condições de vida das populações indígenas, trabalho realizado pelo embaixador Martinez Cobo. Por sua recomendação , deu-se início a uma crescente inclusão do
tema indígena na pauta de debates e conerências internacionais, sobretudo graças
aos anos de lóbi por parte dos próprios índios, que zeram com que em 1982, a
ONU criasse o “Grupo de Trabalho sobre Populações Indígenas”.
Em 1985, a Subcomissão de Prevenção de Discriminação e Proteção de Minorias,
que deriva da Comissão de Direitos Humanos e do Conselho Econômico e Social,
conorme a estrutura interna da ONU, optou pela criação de uma declaração sobre
os direitos dos povos indígenas para utura consideração pela Assembleia Geral da
ONU. A primeira minuta do documento oi redigida por Erica-Irene Daes e, depois
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de pronta, passou a ser discutida e comentada por representantes governamentais,
povos indígenas, ONGs e demais presentes às sessões anuais do Órgão4.
Em 2006, os representantes do governo de Botswana, com o apoio de outros
países da Árica, dos Estados Unidos, do Canadá, da Austrália e da Nova Zelândia,apresentaram uma moção ao Terceiro Comitê da Assembleia Geral da ONU, tentando
retardar a aprovação dessa tão esperada Declaração.
Tudo indicava que a aprovação da Declaração sobre os Direitos dos Povos Indí-
genas, depois de tramitar na ONU por 22 anos, seria novamente postergada, mas,
graças às pressões dos povos indígenas e de várias organizações, a Declaração oi
aprovada em 13 de setembro de 2007, com 143 votos a avor, 4 contrários (Canadá,
Estados Unidos, Nova Zelândia e Austrália) e 11 abstenções. A Declaração reconhe-ce o autogoverno e a livre determinação dos povos e recomenda que as nações do
mundo respeitem as ormas políticas, sociais e jurídicas de cada povo.
Atividades
Caro aluno, após a leitura do texto, responda às questões abaixo:
1- Em qual contexto histórico surgiu o termo índio? Qual a dierença ente os usos
que a sociedade em geral az deste termo daquele adotado pelos povos originários
(Tupinikim, Pataxó, Guarani entre outros)?
2- Por que os Estados nacionais, e mais especicamente o Brasil, apresentam resis-
tências quanto ao uso dos termos nações e povos quando se trata de indígenas?
3- Qual a importância, para a luta dos povos indígenas brasileiros, do reconheci-
mento de seus direitos por diversos organismos internacionais (ONU, OIT e outros)?
Avaliação
Pesquise em livros, em sítios da internet e em arquivos de jornais e revistas, materiais
acerca das lutas dos povos Tupinikim e Guarani do Espírito Santo. Produza um texto,
4 Em 1999, a ONU instituiu o
“Fundo Voluntário para Popula-
ções Indígenas”, com o objetivo
de auxiliar representantes indíge-
nas em suas despesas de viagem eestadia, acilitando a participação
de muitos povos e comunidades
nesse processo.
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para ser usado com seus alunos, apresentando a relação entre o assunto tratado no
texto “Índios, povos indígenas e termos correlatos” e os argumentos da Empresa
Aracruz Celulose para não devolver as terras tupinikim ocupadas indevidamente, na
década de 60 do século XX.
Sugestão de leituras
COTA, Maria das Graças. Os Tupinikim e a questão da luta pela terra. Dimensões
- Revista de História da UFES. Dossiê. Identidades Negras e indígenas. Nº 21,
2008. p. 83 a 100.
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tória: Editora do Autor, 2009.
Reerências
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de out. de 2006.
DENÚNICA na OEA. Disponível em: <http://www.cejis.org>, acesso em: 10 de
dez. de 2006.
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Nossas terras são invadidas, nossas terras são
tomadas, os nossos territórios são invadidos...
Dizem que o Brasil oi descoberto. O Brasil não
oi descoberto não, o Brasil oi invadido e to-
mado dos indígenas do Brasil. (Marçal Tupã’i)
Este texto tem como objetivo suscitar algumas discussões sobre as relações entre
os dierentes grupos étnicos, tendo em vista a lógica racial dominante na história
da humanidade, que instituiu a ideia da hierarquização dos conhecimentos e das
culturas. No Brasil, isso ocorreu durante o longo do processo de colonização ex-
ploratória e se perpetuou na sociedade brasileira. As terríveis consequências desse
ato para as etnias concebidas como ineriores oram se expandindo no decorrer dostempos - proundas desigualdades geradas na ormação de uma sociedade que se
desejava civilizada2.
Frente à complexidade das contradições sociais advindas desse cenário institu-
íram-se critérios de desenvolvimento de sociedade com tipicação e classicação
étnica. No contexto político colonial, por exemplo, os indígenas eram retratados
de orma estereotipada. Essas representações se solidicaram em toda a sociedade
e principalmente em instituições como a escola. (APPLE, 1995), espaço importantepara a reprodução de concepções eurocêntricas.
Por meio de sua estrutura curricular, a instituição escolar compõe esta con-
Marluce Leila Simões Lopes1
Poder e desigualdade:
assimetria nasrelações interétnicas
1 Doutoranda em Educação/Ues.
2Civilidade neste contexto está
relacionada ao progresso econô-
mico capitalista, evidenciado por
promessas de universalização dos
direitos. (TELLES, 2006). Tese
que signicava a promessa de
construção de uma sociedade em
que todos tivessem seus direitos
garantidos e este ideal não se con-cretizou. Além desta contradição,
desconsideram-se as especicidades
dos dierentes grupos humanos.
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juntura histórico-política, quando se permite legitimar conteúdos e práticas pe-
dagógicas eurocêntricas. Proposta essa, que reproduz a invisibilidade ou a in-
eriorização de conhecimentos e modos de vida não brancos que compõem as
sociedades, principalmente a brasileira. Neste texto, pretende-se analisar as impli-cações dessas representações na política educacional da instituição escolar, pois
entendemos que a perspectiva de uma educação para a diversidade coloca em
“cheque” argumentos undamentados no imaginário racial construído no Brasil
sobre algumas etnias e suas culturas.
Para a discussão proposta buscamos alguns apontamentos teóricos sobre o poder
simbólico (BOURDIEU, 2007), sob o ponto de vista das relações interétnicas. Neste
sentido, esse autor arma:
O poder sobre o grupo que se trata de trazer à existência enquanto grupo é, a um tem-
po, um poder de azer o grupo impondo-lhe princípios de visão e de divisão comuns,
portanto, uma visão única de sua identidade, e uma visão idêntica da sua unidade
(BOURDIEU, 2007, p.117).
Destituídas de reconhecimento, negros, indígenas, ciganos e outros grupos lutamhá séculos contra a desumanidade a que oram e ainda são submetidos. Isso porque na
lógica racista, esses sujeitos não são percebidos enquanto humanos em suas diversida-
des, entretanto, são classicados por seus modos de ser e por suas práticas culturais.
Neste texto, a análise da naturalização das desigualdades demarca a condição
dos povos indígenas do Brasil. Populações essas, que convivem com a invisibilidade
de suas produções cientícas e de suas culturas, além de serem representadas nos
discursos instituídos como seres exóticos, selvagens e primitivos. Isso nos leva a in-dagar os atores que atravessam a gênese desta problemática: as relações de poder
entre as dierentes etnias.
A suposta harmonia entre os dierentes grupos étnicos que compõem a sociedade
brasileira se contrapõe à realidade sociorracial de um país que se instituiu enquanto
nação, sob uma cena construída ideologicamente como uma estratégia de manu-
tenção e ampliação de poder das classes burguesas (CHAUÍ, 2006). Isso porque as
tensões entre povos e etnias impulsionadas por interesses de dominação, provoca-ram grandes e proundas marcas em dierentes sociedades justicadas por: limpeza
étnica, exploração econômica, destituição cultural e/ou religiosa, segregação, enm,
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3Signica a desqualicação do
outro como sujeito de direitos. Ooutro como “coisa”, justicaria a
expropriação de sua humanidade.
(ARENDT, 2001).
racismo sob diversas ormas. E assim, as dierenças ísicas e/ou culturais tornaram-se
critérios de dominação, quase sempre com objetivos econômicos. Ações essas pau-
tadas na crença na superioridade de grupos humanos sobre outros ou de um grupo
humano sobre os demais. Esse etnocentrismo se reproduz na medida em que tais crenças ganham legitimi-
dade nos discursos instituídos. Nessa perspectiva, coisicar3 o outro pode tornar-se
instrumento para a dinâmica da dominação e, consequentemente, da desigualdade.
Indicadores econômicos e sociais demonstram esta realidade - a situação em que
vivem indígenas em dierentes regiões do Brasil, por exemplo, representa as contra-
dições de um país visto como um país de todos, porém, onde os direitos dos povos
indígenas, por exemplo, ainda não estão garantidos. Obviamente, a expropriação dediversas ormas soridas por estes sujeitos, ao longo dos tempos, determinaria tal sina.
O processo colonialista exploratório avançou sobre as populações indígenas e
desavoreceu, sobretudo, os valores simbólicos de suas culturas, consideradas ine-
riores. A trajetória social desses sujeitos ao longo dos últimos séculos oi marcada
pela produção de imagens estereotipadas, assim como pela subjugação em relação
ao grupo étnico dominante (branco). Não estamos desconsiderando as resistências
desses sujeitos, porém, ressaltamos as proundas marcas provocadas pelo longo e violento massacre a que oram submetidos. Além do genocídio, soreram também
pela imposição de modelos culturais europeus, por serem classicados sob critério
cultural, em uma lógica hierárquica. (BOSI, 1992). A linguagem dos dierentes po-
vos indígenas, o acúmulo de saberes e experiências e a religião tornaram-se alvo de
destruição, pois, desqualicar os conhecimentos produzidos pelos indígenas é parte
deste plano de dominação.
Nessa lógica, as ormas de construção e organização dos conhecimentos dos po- vos indígenas são consideradas ilegítimas, já que os saberes produzidos pelos povos
indígenas são organizados a partir da cosmologia indígena. Essa especicidade é
desqualicada pela visão ocidental, que imprime valor negativo às ormas de produ-
ção de saber destes grupos.
Deste modo, os conhecimentos produzidos e transmitidos recebem esta unção social e se
constituem em um pilar do poder político, portanto, objeto de disputa e manipulação de
grupos e indivíduos, o que acaba criando status de poder dierenciado e uma escala de va-
lores subjetivos. Os conhecimentos indígenas são essencialmente subjetivos e empíricos, por
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isso mesmo livres de métodos e dogmas echados e absolutos, e se garantem na eetividade
prática e nos resultados concretos que acontecem no seu cotidiano. (LUCIANO, 2006, p. 171).
O poder exercido pelos europeus no processo de colonização atrelado às re-presentações e discursos que apregoavam a desqualicação de etnias, provocou o
empobrecimento das diversas populações indígenas que sobreviveram ao genocídio
provocado pelos colonizadores. Prova desse extermínio são os dados demográcos
que identicam aproximadamente 5 milhões de índios no Brasil no ano de 1500 e
hoje apontam aproximadamente 700.000 índios em todo o país, divididos em diver-
sas etnias e grupos linguísticos, sendo que 49% se concentram na região Norte e 2%
na região Sudeste (LUCIANO, 2006).Além deste cenário de violência, no início do século XX, teorias naturalistas como
a eugenia e o darwinismo reorçaram a representação sobre a inerioridade racial dos
indígenas. Em conjunto com o Estado, intelectuais da época diundiram a tese de
uma suposta verdade sobre a inerioridade de algumas raças e a superioridade da
raça branca (SCHWARCZ, 2007). A mestiçagem e a teoria do embranquecimento se-
riam a alternativa de depuração das raças já que uma sociedade constituída de etnias
não brancas estaria relegada ao atraso. Como exemplo, no trabalho antropológico de Lacerda os índios Botocudos eram descritos como de cérebro atrasado e incapazes
de serem civilizados.
Ainda no século XX, a teoria do embranquecimento protagonizou a institucio-
nalização de um ethos branco na constituição de uma nação que seria ordeira e
próspera. Essa arsa alavancou deensores nas mais diversas áreas – política, intelec-
tual, artística. Embranquecer signicaria reduzir o índice de nascimento de negros
e índios. Nessa concepção racista, a miscigenação entre brancos e negros e/ou oextermínio de indígenas mudaria o cenário racial do país. Nessa perspectiva, um país
de negros e indígenas representaria a degeneração de uma sociedade que se dese-
jaria “civilizada”, pois, o brasileiro é uma sub-raça mestiça, por descender do índio
e do negro. Seria preciso um projeto de embranquecimento da população por meio
da imigração europeia. Esses eram os ideais deendidos por pensadores da sociedade
da época (CHAUÍ, 2006).
O Estado autoritário institui este projeto de sociedade em parceria com a elitebrasileira, pois, o interesse dos grupos dominantes era voltado para a modernização
de um país que mergulhava na implementação de sua industrialização e para isso,
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teria que manter privilégios e proteger interesses capitalistas que agora se ampliavam.
Isso signicou a prolieração de atos racistas que determinaram práticas de segre-
gação, exclusão e violências contra a dignidade humana de negros e indígenas. O ra-
cismo representa a negação da alteridade com base na ideologia racial. Signica negara subjetividade do outro – anti-sujeito4, na medida em que este outro é invisibilizado
como sujeito. O anti-sujeito desqualica aquilo/aquele que lhe é estranho. O desco-
nhecido ou não aceito é reduzido, silenciado ou invisibilizado. (WIEVIORKA, 2006).
Isso nos leva a refetir sobre a cidadania dos povos indígenas. A Declaração Uni-
versal dos Direitos do Homem, a Conerência de Durban (2001), assim como a Cons-
tituição Brasileira declaram: “Há que se buscar, sim, cumprir a legislação nacional e
aplicá-la aos povos indígenas, visando à sua proteção, resguardados os seus direitosespeciais para que se garantam a eles os seus usos, costumes, crenças e tradições”.
(GUARANY, 2006, p. 161)
Perceber-se superior como humano pode levar pessoas, grupos étnicos, culturas
e religiões à maniestações de ódio e exploração. Essas práticas, se estruturadas em
espaços privados ou coletivos, ameaçam a integridade dos grupos mais ragilizados
socialmente. Canais de divulgação dessa ideia soreram transormações na história,
porém a intenção sempre se manteve – desqualicar para dominar e explorar. Atual-mente, a mídia representa um importante instrumento de legitimação ideológica de
relações de poder assimétricas entre grupos étnicos.
[...] a classe burguesa aspira a universalizar sua ideologia”. Dessa orma, é pertinente
armar que, a dierença utilizada como juízo de valor, baseia-se na projeção de um
ideário personicado nos modos de ser, que reduz o pertencimento cultural dos sujeitos
a uma crença em uma cultura tida como única e aceita pela sociedade em geral. Essa
ideologia impõe a neutralização das contradições históricas de povos, etnias e grupos
humanos sob a reerência de uma cultura dominante. (HELLER, 1992, p. 54).
No contexto das violências raciais podemos destacar duas estratégias de legiti-
mação de relações de poder direcionadas a etnias ineriorizadas no Brasil, neste caso,
o poder exercido pelo Estado, por meio de dierentes instituições que permitem a
manutenção de serviços públicos precários, dissociados da especicidade das die-rentes etnias indígenas existentes no Brasil. A desqualicação do indígena que se
reproduziu ideologicamente na sociedade em geral, legitimou a ocupação de espa-
4O antissujeito ou não sujeito des-
titui o outro de sua humanidadena medida em que há a negação
da subjetividade deste outro sujei-
to. (WIEVIORKA, 2006).
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ços por não índios, vistos como incapazes de participarem igualmente da construção
do país. Desse modo, construiu-se a tese do índio incapaz e tutelado por meio de
instrumentos jurídicos. Essa relação de poder e obediência rearma a hierarquia que
se estruturou desde a colonização, situação que ainda não se alterou.A relação hierárquica entre sujeitos e instituições é uma dos vetores do poder
simbólico, caracterizado por promover a perpetuação da dominação de um grupo
sobre outro, nas instituições e nas relações estabelecidas entre os dierentes (BOUR-
DIEU, 2007). A dimensão política do poder mantém o monopólio cultural e o poder
das instituições econômicas que assolam as comunidades indígenas com ns de
ampliação de suas atividades exploratórias.
Empresas implantadas em áreas indígenas ou em suas proximidades utilizamde estratégias diversas pelas quais vão se adentrando em territórios indígenas e ao
mesmo tempo, tendenciam políticas de enrentamento com os indígenas na busca
de lucro. Os aparelhos midiáticos integram essa rede de proteção do capital em de-
trimento das comunidades tradicionais como indígenas e quilombolas. O objetivo é
invisibilizar esses grupos visando a garantia da invasão territorial. Para isso, o argu-
mento da não existência dessas etnias é utilizado nos discursos dos que detêm o po-
der da mídia e contam também, com o poder do Estado, por meio da orça policial. Essa análise nos remete ao norte do estado do Espírito Santo. No município de
Aracruz, as aldeias indígenas Tupinikim e Guarani sobrevivem em meio à expan-
são da empresa Fibria, antiga Aracruz Celulose. Confitos entre os indígenas e tal
empresa prolongam processos judiciais por meio dos quais esses sujeitos exigem a
ampliação de território ocupado pela empresa, além de denúncias em relação à dis-
criminação racial na postura da empresa diante da luta dos indígenas.
A não existência dos povos indígenas continua sendo produzida nos dias atuais. No ano
de 2006, a empresa Aracruz Celulose, lançou no Espírito Santo, uma ampla campanha,
pelos diversos meios de comunicação, tentando provar que no Estado não existiam mais
índios, argumento para tentar justicar seu domínio da área reivindicada pelos Tupini-
quim e Guarani. (COTA, 2008, p. 62).
A tese da não existência Tupinikim se reproduz em toda a sociedade local eganha apoio de empresas da região. Nas rases (em cartazes, outdoors) espalhadas
pelo município é possível identicar uma das estratégias de proteção dos interesses
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de grupos econômicos na medida em que, dissimulam uma suposta “violência” por
parte dos indígenas e certa “ragilidade” das empresas, ou seja, há uma intenção
de manipular as inormações com o objetivo de manter o poder sobre: a terra, os
recursos naturais, o lucro e a opinião pública.
A FUNAI deende os índios, quem deende nossos empregados?” “A Aracruz trouxe
o progresso, a FUNAI, os índios” “Basta de índio ameaçando os trabalhadores”; “Essa
agressão a Aracruz Celulose atinge nossas empresas também!”
As ideias revisionistas e negacionistas propõem a revisão ou negação da história
de racismo contra etnias. Podemos perceber essa concepção em relação à situação vivida pelos índios Tupiniquim e Guarani no município capixaba de Aracruz: “Faz
alguns anos o nítido propósito desses outdoors é ortalecer e reproduzir um ideário
de discriminação e preconceito em relação aos índios” (LOUREIRO, 2006 p.05).
A negação da história do outro é uma prática de poder, portanto, armar a não
existência daqueles que sempre estiveram aqui é uma estratégia de dominação5.
Podemos compreender então, que o negacionismo objetiva a invenção de uma rea-
lidade a avor de uma lógica econômica instituída. As consequências dessa posturapolítico-ideológica alavancam proundas marcas sociais que assolam as comunida-
des indígenas em todo o país, o que não é dierente em Aracruz. Essa questão nos
remete à seguinte tese: “Quem inaugura a negação dos homens não são os que
tiveram a sua humanidade negada, mas os que a negaram, negando também a sua”.
Estas considerações situam a opressão do racismo como uma das artimanhas da
dominação. (FREIRE, 1988, p. 43).
A situação social das comunidades indígenas locais pode ser percebida pela precarie-dade dos serviços públicos, pelo nível de escolaridade, pela realidade dos trabalhadores,
enm, pela extrema desigualdade social em que vivem. Além disso, a ideologia sobre ser
índio é de inerioridade em relação a essa etnia. Vistos como seres exóticos, os indígenas
são lembrados em data especíca (19 de abril) e retratados com estranhamento:
Desde a primeira invasão de Cristóvão Colombo ao continente americano, há mais de
500 anos, a denominação de índios dada aos habitantes nativos dessas terras continua
até os dias de hoje. Para muitos brasileiros brancos, a denominação tem um sentido
pejorativo, resultado de todo o processo histórico de discriminação e preconceito contra
5A constatação da existência
de indígenas no Espírito Santo
anterior à colonização está regis-
trada em documentos históricos
e antropológicos. “Estima-se aundação de dez aldeamentos no
Espírito Santo, sendo que dois se
destacaram predominantemente,
que são o de Reritiba,e em seguida
Benavente e hoje denominado
Anchieta e Aldeia Nova, depois
chamada Reis Magos e atualmente
Nova Almeida [...] É importante
lembrar, porém, que o primeiroaldeamento do Espírito Santo oi
undado em Santa Cruz no ano
de 1556.” (ALMEIDA, 2007, p. 45).
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os povos nativos da região. Para eles, o índio representa um ser sem civilização, sem
cultura, incapaz, selvagem, preguiçoso, traiçoeiro etc. (LUCIANO, 2006, p.30)
A histórica exploração e depreciação a que sempre oram submetidos torna-seum detalhe no discurso da sociedade que ainda acredita na “primitividade” e alie-
nação dos povos indígenas do Brasil. A história contada diz respeito a um cenário
imaginado e xado no imaginário racial instituído. As conquistas alcançadas vieram
por meio de movimentos de luta dos indígenas e de outros movimentos sociais.
Os indígenas continuam na luta por território, por suas culturas e tradições. Exi-
gem políticas públicas que considerem suas especicidades. Embora haja avanços no
que tange a educação escolar indígena, por exemplo, ainda há demanda de políticasque venham consolidar direitos há tempo a esses negados. O combate à pobreza e às
doenças, e ao analabetismo, por exemplo, exigem um reconhecimento desses povos
e investimentos nos vários campos de atendimento a suas necessidades.
O currículo escolar como instrumento de diálogo interétnico
Assim, quer gostemos ou não, um poder die-
rencial intromete-se no âmago das questões de
currículo e de ensino. (APPLE)
Por meio do currículo escolar tem-se negado conhecimentos sobre a realidade histó-
rica e cultural dessas etnias. A prioridade dada pela escola aos conhecimentos dos grupos
humanos ocidentais é um dos aspectos reorçadores dos argumentos preconceituososem relação às dierentes culturas. O continente que avoreceu e incrementou a domina-
ção de etnias ao longo da história – a Europa – é destaque no currículo escolar.
A Lei 11.645 de 10 de março de 2008 inclui no currículo escolar de todas as
instituições educacionais, a História e Cultura dos povos indígenas. Essa conquista
se deve aos movimentos de resistência rente aos valores eurocêntricos e universa-
lizantes dominantes no currículo escolar das escolas brasileiras. O objetivo é de de-
mocratizar a cultura, ao introduzir dierentes perspectivas étnicas e seus valores, nocurrículo escolar sem que haja uma supervalorização de umas sobre outras. Acredita-
se que, deste modo, abrir-se-á a possibilidade de encontros interculturais.
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Exigir a visibilidade de sua história e sua cultura no currículo escolar é uma estra-
tégia de resistência rente aos estigmas soridos pelas populações indígenas. Para Ian-
ni (2004), o estigmatizado, “o estranho” produz outros movimentos, de consciência
para si, na contramão da história. Esses grupos impõem politicamente a eetivaçãodos seus direitos rente às concepções estruturadas na sociedade. Lideranças indíge-
nas juntamente com outros movimentos sociais buscam conquistar espaços nas mais
diversas áreas. Na educação, insistem na construção de uma educação dierenciada e
na valorização de suas culturas nas escolas indígenas e não indígenas, ou seja, avan-
çar no reconhecimento das especicidades dos diversos povos indígenas do Brasil.
No entanto, a visão do indígena nas propostas curriculares das escolas brasileiras é
preconceituosa, pois universaliza as dierentes culturas e etnias e concebe esses sujeitos en-quanto passivos, incapazes, primitivos, selvagens e exóticos. Além disso, há uma negação e,
consequentemente, uma invisibilidade dos valores desses grupos, nos conteúdos escolares.
A associação entre ideologia e currículo, nos leva a problematizar a educação im-
plicada pela representação dos povos indígenas pela visão etnocêntrica. Nessa proposi-
ção, os conteúdos curriculares são homogeneizantes, enaltecem personagens e heróis
brancos, valorizam a cultura, a religiosidade e a história do branco. (APPLE, 1995).
Diante deste impasse, a Lei 11.645/08 provoca o debate sobre a abordagem dosconhecimentos da história e cultura indígenas no currículo escolar. Democratizar o
currículo signica garantir o conhecimento da contribuição dos dierentes povos
para o patrimônio da humanidade. Isso nos leva a pensar sobre a necessidade e a ur-
gência da promoção de espaços públicos nos quais a interlocução entre os confitos
emergentes, a justiça e os direitos sociais construam outros modos de interlocução
entre as culturas estabelecendo assim, novas sociabilidades (TELLES, 1999).
Na medida em que o currículo escolar e a prática pedagógica estão desvinculadasdas contradições humanas, assim como dos confitos inerentes às relações de poder
e de dominação, a visão da naturalização das relações de poder se perpetua. Desse
modo, ignorar a opressão que as comunidades indígenas vivenciam há séculos e as
demandas oriundas deste processo, acaba por contribuir para a exclusão desses gru-
pos. Nega-se a resistência histórica como instrumento de emancipação.
É através do confito que os excluídos, os, impõem seu reconhecimento como indivíduos
e interlocutores legítimos, dissolvendo as hierarquias nas quais estavam subsumidos em
uma dierença sem equivalência possível (TELLES, 2006, p.101).
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Seria possível dissolver hierarquias étnicas por meio de um currículo interétnico?
Como a escola poderá desenvolver uma proposta de ensino intercultural? Faz-se neces-
sário reormular a organização curricular tendo em vista as dierentes visões de mundo
e incorporar de orma equânime, os valores dos diversos grupos étnicos no currículoescolar. Aparentemente algo simples, mas que exigirá uma transormação em toda a ló-
gica dos tempos e espaços escolares, assim como, a criação de proposta de ormação de
proessores que preencha a lacuna histórica demandada por conhecimentos sobre os di-
erentes povos e culturas indígenas que a escola sempre negou aos que por ela passaram.
Outro aspecto que merece atenção deriva da perspectiva do universalismo o qual
generaliza direitos em detrimento das dierenças entre os grupos humanos. Dierenças
que se traduzem em demandas de políticas especícas. Essa abstrata nudez 6
, (AREN- DT, 2001), signica conceber o sujeito enquanto natureza humana, o humano despido
de suas dierenciações. Entendemos, porém, que a armação da igualdade entre os
homens requer considerar a diversidade e reconhecer as necessidades e os interesses
dessa diversidade. Essa problemática da universalização permeia o currículo escolar, as
práticas educativas e o olhar sobre o ser índio. Armações preconceituosas e atributos
depreciativos (GOFFMAN, 1963) acentuam a discriminação aos povos indígenas.
A aposta em uma educação que tenha como proposição levar os estudantes a co-nhecer a história e cultura dos povos indígenas pode signicar uma possibilidade de
reconhecimento da humanidade desses, ou seja, reconhecer no sentido de ver no outro
um alter , um sujeito de direitos, (ALVES, 2009), pararaseando Maturana, “reconhecer os
outros como legítimo outro”. Dessa orma, aquele outro, antes concebido como inerior,
passa a gozar do direito de ser percebido na sua especicidade, em uma perspectiva de
igualdade – igualdade na dierença. Nesse caminho, a interculturalidade pode possibilitar
a transormação de relações de poder e hierarquia em indicativos de relações orientadaspor princípios humanitários, de diálogos e de respeito entre os dierentes.
A discriminação racial está imbricada nas ormas encontradas pelo ser huma-
no de impor sentidos e realidades a seu avor (BOURDIEU, 2007), reiterada pelos
discursos assumidos pela instituição escolar. Armações preconceituosas sobre os
considerados dierentes estão carregadas de signicados – justicados e naturaliza-
dos pela ideia de que uns nascem com características enotípicas que desencadeiam
naturalmente uma posição na escala social. Lógica racial que se reproduz na medidaem que as representações sobre as etnias estão atreladas à valorização ou desquali-
cação. Vale lembrar os horrores do nazismo e da escravização de povos indígenas e
6
Crítica à naturalização dosujeito, do ser humano abstrato,
despojado de sua especicidade.
(ARENDT, 2001).
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aricanos, justicados biologicamente, até mesmo pela Igreja. O olhar da sociedade
sobre os povos indígenas nestes últimos tempos maniesta, ainda, a rejeição a seus
modos de produção de conhecimento e cultura.
A expectativa de desconstrução desse imaginário no espaço da escola é um ca-
minho que precisa ser trilhado por aqueles que acreditam no diálogo entre as etnias,
como contraponto à naturalização das relações de poder balizadoras das desigual-
dades. Enm, possibilitar aos estudantes a apropriação de saberes diversos que vão
de encontro ao currículo hegemônico. Instigar a refexão e exercitar o debate desco-
lonizador da visão de saberes legitimados acende a chama da inquietação sobre as
relações de poder e as desigualdades entre os humanos.
Transormar a escola em um lugar de todos pressupõe articular políticas sociais,culturais e educacionais voltadas para a consolidação de uma sociedade que se pre-
tende democrática. Nesse projeto, a instituição escolar pode contribuir para romper
com posturas e práticas racistas em relação aos povos indígenas, ao dar visibilidade
aos conhecimentos produzidos por esses e que estão no cotidiano, mas não são
reconhecidos enquanto patrimônio construído por esses sujeitos – a linguagem, os
arteatos culturais, a ciência, a relação com a natureza, a religiosidade.
A implementação dessas políticas será transormadora se expressar as expectati- vas das comunidades indígenas e estabelecer um diálogo com outras coletividades.
Essa interculturalidade abarca o encontro não hierárquico entre as dierentes cultu-
ras e etnias. Nesse sentido, a relação entre as etnias seguirá outro curso, por ações
empreendidas no processo de reconhecimento e partilha das experiências com outros
sujeitos. Experiências pautadas na concepção de interação humana sob o ponto de
vista dos direitos humanos, da igualdade, da justiça e do direito à dierença.
Cuiamá
(José Elias/Flávio Vezzoni)
A meia-lua no céu avermelhou.
Ergueu a lua, um canto ecoou.
A liberdade no couro do “tambô”.
A lua, girassol, a roda girou.
Floreia pomba, for do sol,que cuiamá, no vento, vai dançar
sob o manto da cor da lua.
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Os desaios colocados à sociedade brasileira em relação aos povos indígenas
atualmente são diversos – a territorialidade, a educação escolar indígena, a lin-
guagem, a saúde, a manutenção de suas tradições. No entanto, toda essa rede
de políticas especíicas demanda o cumprimento do aparato legal em relação
aos povos indígenas, uma vez que o campo jurídico caminha a passos lentos
nesta direção, qual seja, a de garantir os direitos das diversas etnias indíge-
nas do Brasil. Não altam exemplos de expropriação dos direitos dos povos
indígenas nas notícias de violências por parte de madeireiros e posseiros em
dierentes regiões do país. Constata-se que o poder político das elites brasileiras
persiste por meio de mecanismos repressivos ao avanço das reivindicações dos
movimentos de resistência dos povos indígenas e de outros movimentos sociaise religiosos, como a Pastoral Indigenista. A liberdade virá no toque do tambor,
metaoricamente, no grito de repúdio das populações indígenas rente à invisi-
bilidade da legitimidade de suas lutas.
Avaliação da leitura
Com base no texto e nas reerências sugeridas, responda as questões abaixo:
1) Para o colonizador europeu os indígenas eram considerados “animais selvagens”
ou seres incivilizados. Explique o que signica “civilizar” os indígenas na concepção
dos dominadores?
2) Identique no texto argumentos etnocêntricos utilizados pelos grupos dominan-tes que tentam justicar o discurso da naturalização das desigualdades em relação
aos povos indígenas.
3) Com o objetivo de obter mais lucro, empresa instalada em área próxima a al-
deias indígenas tenta invisibilizar a presença destes grupos, a exemplo do ocorrido
no município de Aracruz no estado do Espírito Santo. Discuta com seu grupo de
trabalho e descrevam algumas das estratégias utilizadas por esta empresa para amanutenção do poder econômico, assim como, provocar a desqualicação de gru-
pos indígenas que lutam por territórios por esta ocupados.
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4) De que orma o currículo escolar reproduz a ideologia etnicorracial preconcei-
tuosa contra os povos indígenas e apresente sugestões que visem democratizar
o currículo de sua escola.
Exercícios
1) Pesquise os seguintes conceitos: eurocentrismo, interculturalidade e genocídio.
2) Identique e aça uma análise de imagens e discursos no livro didático que apre-
sentem os povos indígenas. Observe se estas representações são estereotipadas edescreva sua compreensão sobre as mesmas.
3) Pesquise sobre as teorias naturalistas: eugenia e darwinismo no contexto da cons-
trução da sociedade que visava a dominação da raça branca.
4) Cite um exemplo que apresente a desigualdade entre brancos e índios na socieda-
de brasileira atual. Justique o exemplo apontado.
Sugestão de livros
ALMEIDA, Cristina. A Consciência argumentativa entre as educadoras Tupinikim
de Aracruz - ES que atuam nas primeiras séries do Ensino Fundamental de esco-
las indígenas. São Paulo: PUC, Dissertação de mestrado, 2007.
APPLE, Michael. Repensando a ideologia e o currículo. In: MOREIRA, Antônio F. e
SILVA, Tomaz T. (Orgs.) São Paulo: Cortez, 1995.
BRASIL, MEC. O Índio Brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas
no Brasil de hoje Coleção Educação para Todos vol. 12, 2004.
BRASIL, MEC/UNESCO. A Presença Indígena na Formação do Brasil. Coleção Edu-
cação para Todos vol. 13, 2004.
/ í
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BRASIL, MEC/UNESCO. Povos Indígenas a Lei dos “Brancos”: o direito à dierença
CHAUI, M. Mito undador e sociedade autoritária. São Paulo: Fundação Perseu
Abramo, 2000.
COTA, M.G. Educação escolar indígena: a construção de uma educação dierenciada
e especíca, intercultural e bilíngüe entre os Tupinikim do Espírito Santo. Disserta-
ção Mestrado em Educação – Programa de Pós-Graduação em Educação. Universi-
dade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2000.
Sugestão de sites
www.socioambiental.org
www.museudoindio.org.br
www.cimi.org.br
portal.mec.gov.br
www.unai.gov.brpaje-lmes.blogspot.com
Sugestão de vídeos, documentários e lmes
“1492: A conquista do paraíso”
“A Missão”“Casca do Chão”, de Glaysson e Jaciara Caxixó, e “Yiax Kaax”, de Isael Maxakali
“Yiax Kaax”, lme de Isael Maxakali,
Reerências
ALMEIDA, Cristina. A Consciência argumentativa entre as educadoras Tupinikimde Aracruz - ES que atuam nas primeiras séries do Ensino Fundamental de esco-
las indígenas. São Paulo: PUC, Dissertação de mestrado, 2007.
ALVES Nild V S i á i I t i l A R d d C h i t T l
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ALVES, Nilda. V Seminário Internacional As Redes de Conhecimentos e as Tecnolo-
gias. Apresentação, 2009.
APPLE, Michael. Repensando a ideologia e o currículo. In: MOREIRA, Antônio F. e
SILVA, Tomaz T. (Orgs.) São Paulo: Cortez, 1995. Não altou o título do livro?
ARENDT, Hanna. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.
BOSI, Alredo. Dialética da Colonização. São Paulo: Companhia das Letras,1992.
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007.
CHAUÍ, Marilena. Cultura e democracia. São Paulo: Cortez, 2006.
COTA, Graça. O processo de escolarização dos Guarani no Espírito Santo. UFES:
Centro de Educação, 2008. (Tese de Doutorado).
COUTINHO, José M. Uma história do povo de Aracruz. Vol. I: Das origens pré-históricas à conquista do poder político pelos ítalo-brasileiros, Aracruz, ES, 2006.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.
GOFFMAN, Erving. Estigma: notas sobre a manipulação deteriorada. RJ, ZAHAR, 1988.
GUARANY, Vilmar M. M. Desaos e perspectivas para a construção e o exercício dacidadania indígena. In: Povos indígenas e a lei dos “Brancos”: o direito à dieren-
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HELLER, Agnes. Cotidiano e História. São Paulo: Paz e Terra, 1992.
IANNI, Octávio. Dialética das relações sociais. In: I congresso luso-aro- brasilei-
ro de ciências sociais, Portugal: Disponível: http://www.scielo.br/pd/ea v18n50/a03v1850.pd. São Paulo, 2004. Acessado em: 28/05/2007.
LOUREIRO Robson; DELLA FONTE Sandra S Revisionismo histórico e a agenda
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LOUREIRO, Robson; DELLA FONTE, Sandra S. Revisionismo histórico e a agenda
pós-moderna: refexões a partir da Teoria Crítica. Disponível em: http://w3.usm.
br/senae/trabalhos/eixo5/eixo5_robsonloureiro.pd. Acessado em: 30/06/2010.
LUCIANO, Gersem dos S. O índio brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos
indígenas no Brasil de hoje. Brasília: MEC, Coleção Educação para Todos. 2006.
SCHWARSZ, Lilia M. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial
no Brasil - 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
TELLES, Vera da S. Direitos Sociais: anal do que se trata? Belo Horizonte: Ed UFMG, 2006.
WIEVIORKA, Michel. Em que mundo viveremos? São Paulo: Perspectiva, 2006.
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Hi tó i d
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Introdução
E dali avistamos homens que andavam pela praia, uns sete ou oito, segundo disse-
ram os navios pequenos que chegaram primeiro [....]. [...] E o Capitão-mor mandou
em terra no batel a Nicolau Coelho para ver aquele rio.[...] acudiram pela praia ho-mens, quando aos dois, quando aos três, de maneira que, ao chegar o batel à boca
do rio, já ali havia dezoito ou vinte homens.
Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas.
Nas mãos traziam arcos com suas setas. Vinham todos rijos sobre o batel; e Nicolau
Coelho lhes ez sinal que pousassem os arcos. E eles os pousaram.
Ali não pôde deles haver ala, nem entendimento de proveito, por o mar quebrar
na costa. Somente deu-lhes um barrete vermelho e uma carapuça de linho que le- vava na cabeça e um sombreiro preto. Um deles deu-lhe um sombreiro de penas de
ave, compridas, com uma copazinha de penas vermelhas e pardas como de papagaio;
e outro deu-lhe um ramal grande de continhas brancas, miúdas, que querem parecer
de aljaveira, as quais peças creio que o Capitão manda a Vossa Alteza, [...].
Foram-se lá todos, e andaram entre eles. E, segundo eles diziam, oram bem uma
légua e meia a uma povoação, em que haveria nove ou dez casas, as quais eram tão
compridas, cada uma, como esta nau capitânia. Eram de madeira, e das ilhargas detábuas, e cobertas de palha, de razoada altura; todas duma só peça, sem nenhum
repartimento, tinham dentro muitos esteios; e, de esteio a esteio, uma rede atada
Kalna Mareto Teao1
Klítia Loureiro2
História dos
povos indígenas do Brasil
1 Doutoranda em História pela UFF
(Universidade Federal Fluminense).
2 Mestre em História pela UFES (Uni-
versidade Federal do Espírito Santo).
pelos cabos, alta, em que dormiam. Debaixo, para se aquentarem, aziam seus ogos.
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E tinha cada casa duas portas pequenas, uma num cabo, e outra no outro.
Diziam que em cada casa se recolhiam trinta ou quarenta pessoas, e que assim
os achavam; e que lhes davam de comer daquela vianda, que eles tinham, a saber,
muito inhame e outras sementes, que na terra há e eles comem.
Parece-me gente de tal inocência que, se nós entendêssemos a sua ala e eles a
nossa, seriam logo cristãos, visto que não têm nem entendem crença alguma, segun-
do as aparências. E portanto, se os degredados, que aqui hão de car aprenderem
bem a sua ala e os entenderem, não duvido que eles, segundo a santa intenção
de Vossa Alteza, se hão de azer cristãos e crer em nossa santa é, à qual praza a
Nosso Senhor que os traga, porque, certo, esta gente é boa e de boa simplicidade.
E imprimir-se-á ligeiramente neles qualquer cunho, que lhes quiserem dar. E pois
Nosso Senhor, que lhes deu bons corpos e bons rostos, como a bons homens, por
aqui nos trouxe, creio que não oi sem causa.
Eles não lavram, nem criam. Não há aqui boi, nem vaca, nem cabra, nem ovelha,
nem galinha, nem qualquer outra alimária, que costumada seja ao viver dos homens.
Nem comem senão desse inhame, que aqui há muito, e dessa semente e rutos, que a
terra e as árvores de si lançam. E com isto andam tais e tão rijos e tão nédios, que onão somos nós tanto, com quanto trigo e legumes comemos. (Pero Vaz de Caminha.
Carta do achamento do Brasil)3
É comum ouvirmos alar que a história do Brasil começa ocialmente em 22
de abril de 1500, quando a esquadra de Pedro Álvares Cabral ancorou na baía de
Santa Cruz de Cabrália tomando posse destas terras em nome da Coroa Portuguesa4.
Como a história depende de documentos escritos, é também em 1500 que começa
ocialmente a história dos índios que aqui viviam. História esta que já começa sendoescrita pelos invasores, pelos portugueses.
Ao chegarem ao Brasil, os portugueses encontraram um território povoado. Seus
habitantes, porém, desconheciam a escrita e não deixaram documentos sobre o pró-
prio passado. O conhecimento que temos sobre os índios brasileiros do século XVI
undamenta-se principalmente em relatos e descrições dos viajantes europeus que
aqui estiveram na época.
A carta de Pero Vaz de Caminha ornece uma dimensão de como a narrativa sobrea história dos povos indígenas e a história do Brasil oi sendo construída ao longo
dos séculos. Variados são os relatos5, dierentes são as perspectivas. Mas, uma coisa é
3A Carta de Pero Vaz Caminha a El
Rey D. Manuel é o primeiro docu-
mento escrito que relata o contato
entre índios e portugueses.
4 Vale ressaltar que o primeiro a
descobrir o Brasil oi o navegador
espanhol Vicente Yanes Pizon no
ano de 1499.
5Cardim, Fernão (1625); Gandavo,
Pero de Magalhães (1576); Lery,
Jean (1578); Staden, Hans (1557),
Thevet, André (1556) entre outros.
certa: a história dos povos indígenas tem sido sempre descrita a partir da coloniza-
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ção, do encontro entre dois mundos, como a narrativa da transerência de pessoas,
instituições e conhecimentos para um novo mundo, não-europeu.
Nesses relatos as sociedades indígenas são apresentadas marcadamente pelo bár-
baro, pelo exótico e pelo eêmero, como se a existência desses povos osse algo
ortuito, um obstáculo que logo seria superado e, que com o passar do tempo quase
oi totalmente esquecido.
A “descoberta” é apresentada como um mero acaso, um eliz e casual acidente
de percurso. O primeiro contato entre índios e portugueses narrado com surpresa e
estupor. Um contato amistoso como é possível ler nos trechos da carta de Pero Vaz
de Caminha (1500).
Todavia, um olhar mais atento sobre essas crônicas nos permite perceber uma
exacerbação da dierença na experiência humana no qual o abismo existente entre
usos e costumes é ressaltado de orma unilateral.
Por sua vez, alar sobre a história dos índios no Brasil é uma tarea árdua visto
que se az necessário romper paradigmas, propor novos olhares, desconstruir os este-
reótipos, a visão romântica e congelada que a sociedade brasileira tem desses povos.
Nesse sentido, nosso objetivo, não é esgotar o debate sobre qualquer eventoou período histórico, ao contrário, nossa intenção é azer pensar, suscitar debates,
estimular a revisão das narrativas sobre os povos indígenas e a história do Brasil que
está equivocadamente descrita ou deormada por visões preconceituosas.
O choque dos mundos
Pindorama Palavra Cantada
(Terra à vista!)
Pindorama, Pindorama
É o Brasil antes de Cabral
Pindorama, Pindorama É tão longe de Portugal
Fica além, muito além
Do encontro do mar com o céu
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Fica além, muito além
Dos domínios de Dom Manuel
Vera Cruz, Vera Cruz
Quem achou oi Portugal
Vera Cruz, Vera Cruz
Atrás do Monte Pascoal
Bem ali Cabral viu
Dia 22 de abril
Não só viu, descobriu
Toda a terra do Brasil
Pindorama, Pindorama
Mas os índios já estavam aqui
Pindorama, Pindorama
Já alavam tupi-tupi
Só depois, vêm vocês
Que alavam tupi-português
Só depois com vocês
Nossa vida mudou de uma vez
Pero Vaz, Pero Vaz
Disse em uma carta ao rei
Que num altar, sob a cruz
Rezou missa o nosso rei
Mas depois seu Cabral
Foi saindo devagar Do país tropical
Para as Índias encontrar
Para as índias, para as índias
Mas as índias já estavam aqui
Avisamos: “olha as índias!”
Mas Cabral não entende tupi
Se mudou para o mar Ver as índias em outro lugar
Deu chabu, deu azar
Muitas naus não puderam voltar
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Mas, enm, descono
Não oi nada ocasional
Que Cabral, num desvio
Viu a terra e disse: “Uau!”
Não oi nau, oi navio
Foi um plano imperial
Pra aportar seu navio
Num país monumental
Ao Álvares Cabral
Ao El Rei Dom Manuel
Ao índio do Brasil
E ainda quem me ouviu
Vou dizer, descobri
O Brasil tá inteirinho na voz
Quem quiser vai ouvir
Pindorama tá dentro de nós
Ao Álvares Cabral
Ao El Rei Dom Manuel
Ao índio do Brasil
E ainda quem me ouviu
Vou dizer, vem ouvir
É um país muito sutil
Quem quiser descobrir
Só depois do ano 2000(Sandra Perez e Luiz Tatit)
O objetivo neste tópico é responder às seguintes questões: o que permeou
o imaginário de índios e brancos ao se entreolharem pela primeira vez? O que
sentiram? Quem era essa gente que acabara de chegar? O que buscavam? Seriam
deuses aqueles seres saídos do mar? E aos olhos dos recém-chegados? Seria o
paraíso terrestre?O antropólogo Darcy Ribeiro (1995) ao descrever o que teria sido a percepção de
índios e brancos ao se “encontrarem” pela primeira vez nos revela:
Ao longo das praias brasileiras de 1500, se derontaram, pasmos de se verem uns aos outros
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tal qual eram, a selvageria e a civilização. Suas concepções, não só dierentes, mas opostas,
do mundo, da vida, da morte, do amor, se chocaram cruamente. Os navegantes, barbudos,
hirsutos, edentos de meses de navegação oceânica, escalavrados de eridas do escorbuto,
olhavam, em espanto, o que parecia ser a inocência e a beleza encarnadas. Os índios, ves-
tidos da nudez emplumada, esplendidos de vigor e de beleza, tapando as ventas contra a
pestilência, viam, ainda mais pasmos aqueles seres que saiam do mar (RIBEIRO, 1995, p. 44).
De qualquer orma, o contato pacíco e a visão idílica que a priori se estabeleceu
rapidamente se dissipa e reverte-se no seu contrário: se em princípio, os índios eram
vistos como a boa gente bela, que recebeu dadivosa aos recém-chegados, passaram
logo a ser vistos como canibais, comedores de carne humana, totalmente detestáveis.
Povos sem Lei, sem Rei e sem Fé!
Como ressalta Ribeiro (1995), com a convivência tanto os índios passaram a
precisar dierenças culturais entre os europeus como estes começaram a distingui-
los em grupos de aliados e inimigos, alando línguas dierentes e tendo hábitos e
costumes discrepantes.
Assim, oi surgindo uma etnologia recíproca, por meio do qual uns iam gurando o
outro. Na Europa, as cartas dos navegantes, as crônicas e os testemunhos provocaram
uma gama de interpretações das novidades bizarras que chegavam do Novo Mundo.
No plano religioso, as notícias motivaram o projeto jesuítico de colonização,
uma teologia com a missão salvacionista, que cumpria à cristandade exercer, a erro
e ogo, se preciso, para incorporar as novas gentes ao rebanho do rei e da igreja.
Cabe lembrar que coube aos missionários religiosos, viajantes e nobres portugue-
ses, ranceses e holandeses, que viajaram pelo Brasil ou aqui se instalaram, atuaremcomo cronistas do Novo Mundo.
Ora assumindo a posição dos recém-chegados ora assumindo a visão dos índios
da terra, Ribeiro (1995, p. 45-6) relata o seguinte:
Aos olhos dos recém-chegados, aquela indiada louçã, de encher os olhos só pelo prazer
de vê-los, aos homens e as mulheres, com seus corpos em for, tinha um deeito capital:
eram vadios, vivendo uma vida inútil e sem prestança. Que é que produziam? Nada. Viviam suas úteis vidas artas, como se nesse mundo só lhes coubesse viver.
Aos olhos dos índios, os oriundos do mar oceano pareciam afitos demais. Por que se
aanavam tanto em seus azimentos? Por que acumulavam tudo, gostando mais de to-
t d d i t bi ? S idã i i í il ã tã
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mar e reter do que dar, intercambiar? Sua soreguidão seria inverossímil se não osse tão
visível no empenho de juntar toras de pau vermelho, como se estivessem condenados,
para sobreviver, a alcançá-las e embarcá-las incansavelmente? Temeriam eles, acaso,
que as forestas ossem acabar e, com elas, as aves e as caças? Que os rios e o mar os-
sem secar, matando os peixes todos?
Se para os índios, a vida era uma tranqüila ruição da existência num mundo dadivoso
e numa sociedade solidária. Para os brancos, a vida representava uma tarea árdua, uma
sorida obrigação, que a todos condenava ao trabalho e tudo subordinava ao lucro.
De acordo com Ribeiro (1995) o desencontro que aqui se deu de gente índia
que enchia as praias, pasmas de ver as velas enunadas, e que era vista com ascínio
pelos recém-chegados de além-mar, representava também, o choque biótico mortal
da higidez e da morbidade.
Se por um lado os índios não conheciam doenças, por outro os brancos traziam
da cárie dental à bexiga, à coqueluche e o sarampo. Um exemplo do poder desar-
ticulador das doenças oi a primeira epidemia de varíola que atingiu a Bahia entre
1562-1565 deixando cerca de 30.000 índios mortos. É assim que aqui desde o pri-
meiro contato desencadeou-se uma guerra biológica.
Ou seja, em um primeiro momento a civilização se impôs como uma epidemia
de enermidades que os índios desconheciam e que eram atais. Já em um segundo
momento por meio de guerras de extermínio e da escravização.
É nesse ambiente de epidemias, guerras sangrentas de extermínio e escravização
que em poucas décadas desapareceram as povoações indígenas que as caravelas do
descobrimento encontraram por toda a costa brasileira e os primeiros cronistas con-templaram maravilhados.
Não obstante, a superioridade cristã diante dos nativos “degenerados” justicava
a conquista: para mudar costumes e valores era necessário integrar os nativos ao
trabalho colonial. No Brasil, os dierentes tipos de trabalho compulsório dos índios
junto aos aldeamentos expressavam os confitos entre os projetos coloniais dos mis-
sionários e os dos colonos, pois envolviam tanto dierentes visões sobre os índios,
quanto à disputa sobre a posse do trabalho indígena, com a consequente consolida-ção desses respectivos projetos (OLIVEIRA; FREIRE, 2006, p. 30).
As “guerras justas” para aprisionamento dos índios hostis tinham sua legislação
baseada num imaginário diuso sobre práticas indígenas “bárbaras” – canibalismo,
poligamia etc Tal imaginário era sempre acionado em deesa dos interesses econô
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poligamia etc. Tal imaginário era sempre acionado em deesa dos interesses econô-
micos dos colonos. O embate dos missionários com pajés supostamente demoníacos
tinha raízes no imaginário medieval da luta cristã contra eiticeiros, bruxas. Por isso
encontramos uma iconograa recorrente nos textos dos cronistas muito distante
da realidade. Foi embasado nessas representações, associadas a argumentações de
distintas ordens, que se orjou a crença do caráter lantrópico e humanitário da
intervenção colonizadora (OLIVEIRA; FREIRE, 2006, p. 30).
Os índios na Colônia
No período colonial, os índios
eram divididos em livres ou al-
deados e tapuias ou inimigos da
Coroa portuguesa. Tal classica-
ção envolvia relações complexas
entre os povos indígenas e os
europeus. Cabe ressaltar que os
índios estabeleciam relações de
aliança ou de confitos conorme
seus interesses e de acordo com o contexto regional e temporal do Brasil. Os índios livres
eram considerados aliados dos portugueses e a eles era garantida a liberdade durante
toda colonização. São considerados donos de suas terras, passíveis de serem recrutados
para trabalhos dos moradores, devendo receber salários e serem bem tratados.O índio servia como importante deensor das ronteiras coloniais, além de con-
tribuir para a produção de alimentos e promover o povoamento nos aldeamentos.
Trabalhavam na agricultura, na construção de casas, igrejas, aldeias, serviços domés-
ticos, obras públicas e nas tropas coloniais.
No aldeamento, os chees indígenas tinham papel importante, pois ainda desem-
penhavam a unção de liderança mesmo com a ação missionária dos jesuítas. Muitos
povos preeriam viver nas aldeias como orma de evitar a dizimação de seus grupos,bem como garantir a posse da terra e ao se aliarem com os portugueses estabeleciam
domínio de áreas antes disputadas com outros povos rivais.
Rugendas. Aldeia de tapuias.
Os portugueses incentivavam as disputas interétnicas dos grupos indígenas,
assim como os índios buscavam alianças com outros povos europeus quando o
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assim como os índios buscavam alianças com outros povos europeus quando o
enrentamento com os portugueses se azia por meio de guerras e dizimação.
Nesse contexto, podemos citar o caso dos Tupinikim que no início da colonização
preeriram aliar-se aos ranceses. No Rio de Janeiro, temos os Tamoios que se
aliaram aos ranceses enquanto os Temiminós aos portugueses. E os Tamoios e os
Temiminós eram povos inimigos.
Nesse período, muito se discutiu sobre a ação de dizimação dos portugueses por
meio das guerras, das doenças e dos trabalhos orçados. Nos aldeamentos, os povos
eram obrigados a seguir costumes e novos hábitos distintos do seu universo cultural.
Eram proibidos de alar seu idioma nativo, não podiam praticar sua antiga religião e
destituídos de seus costumes e tradições.
A política do aldeamento teve sua condução pelos jesuítas. Dentre suas estraté-
gias de colonização e doutrinação ao cristianismo, destacam-se o aprendizado do
Tupi, o ensino de músicas, de cantos, de rezas, de teatro, das estas e das procissões.
Os línguas eram os intérpretes indígenas. Os jesuítas ensinavam a leitura e a escrita
do evangelho. Nos colégios de meninos, as crianças eram educadas através de músi-
ca sacra, liturgias, catecismos, gramáticas e vocabulários com o auxilio de intérpretes.
Segundo Almeida (2010, p.91), o Tupi ou língua geral, poderia ser utilizado como
uma língua de homogeneização pelos europeus. No entanto, atuou como ator de
coesão identitária dos diversos povos indígenas. Ao aprender a ler e escrever, algumas
cheas indígenas reivindicavam seus interesses diretamente à Coroa portuguesa.
Os jesuítas eram responsáveis pela catequese e também pela organização e pela re-
partição dos trabalhadores indígenas para a aldeia e para a Coroa. Quanto à produção
a repartição correspondia ao regime da “terça parte”, sendo um terço reservado para aaldeia, outro terço para a Coroa e o restante repartido para os moradores. Períodos de
trabalho eram divididos em seis meses por ano, em períodos alternados de dois meses.
Além da ação jesuítica, oi uma constante da política colonial promover os des-
cimentos. Os descimentos eram deslocamentos de às vezes centenas de índios de
seu local de origem para pontos distantes visando promover o aldeamento. Essas
expedições saíam do interior para o litoral, com o objetivo de deslocar índios de suas
aldeias de origem para os núcleos portugueses. Era comum, nesses descimentos, queos colonos oertassem presentes aos chees indígenas como orma de convencimen-
to para o empreendimento colonial. Resultavam de deslocamentos de povos inteiros
e partem da persuasão das tropas lideradas ou acompanhadas por um missionário.
Para Almeida, 2010, p.76, os descimentos eram atividades importantes e essenciais
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, , p , p
para originar as aldeias e manter os níveis populacionais diante de um cotidiano de
ugas, mortes, guerras, maus tratos e epidemias.
A guerra justa
era aplicável a todo
índio que se recu-
sava a receber a é
cristã e não aceitasse
a política colonial.
Suas principais cau-
sas eram a recusa à
conversão, impedi-
mento de propagação da é, prática de hostilidades contra vassalos e aliados dos portu-
gueses e quebra de pactos celebrados. Os Botocudos destacaram-se como povo hostil à
Coroa portuguesa sendo requentemente passíveis de guerras e políticas de extermínio.
O resgate no aprisionamento dos índios. Os índios de corda deveriam ser con-
vertidos e civilizados. Quando o cativo pagasse com seu trabalho o preço do resgate,
poderia ser liberto. A Coroa permitia que os índios também possuíssem resgatados,
que geralmente eram povos inimigos.
Os índios possuíam ormas de resistência à política de dominação colonial como
as ugas dos aldeamentos, o batismo invertido, o não cumprimento dos trabalhos,
dentre outros. Ao aceitar o aldeamento, os índios consideravam-se súditos e vassalos
da Coroa, portanto, possuidores dos mesmos direitos que homens livres que servem
ao rei. Nos documentos coloniais, existem casos de chees indígenas que reivindicam
seus interesses utilizando-se dessa condição de considerarem-se súditos da Coroa.
Embora existissem leis avoráveis aos índios no período colonial, elas não se
eetivavam na prática. Algumas leis estabeleciam a proibição de misturar etnias. No
entanto, os aldeamentos possuíam índios de diversos povos, brancos e negros. Fazia
parte da política colonial promover casamentos interétnicos.
A lei de 1 de abril de 1680 estabelecia a proibição de cativeiro indígena. No en-tanto, sua promulgação promoveu revoltas dos colonos. Nos grandes aldeamentos,
os índios haviam garantido o direito às terras para sua sobrevivência e para o cultivo.
Dança tapuia. Albert Eckout.
A guerra dos bárbaros
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Durante o século XVII, no semi-árido nordestino entre a Bahia e o Ceará, ocorreram
confitos pela posse da terra entre colonos e índios das etnias: Tarairiú, Ariú, Janduí,
Payayá, Icó, Paiacu, considerados como tapuios ou hostis.
Na Bahia, confitos envolvendo povos Tupinambá, nas chamadas guerras do re-
côncavo, datam de 1555, com a construção de Salvador e só terminaram com as
expedições punitivas de Mem de Sá.
Os combates contra os Tapuios ocorreram com o apoio de índios aldeados.
Esses combates oram marcados por deslocamentos, mobilidades e unicações
de grupos estimuladas pelos jesuítas. Entre 1651 e 1656, os Tapuios atacaram a
região do Recôncavo baiano em atos chamados de Guerra de Orobó, Guerra do
Aporá e Guerras no São Francisco.
Na Guerra de Orobó, os índios Payayá oram recrutados pelos portugueses para
lutarem contra os Tapuios. Alguns Payayá se revoltaram contra os portugueses e
oram deslocados pra o litoral. A Guerra de Aporá consistiu em uma guerra justa
contra os Topin e outros povos. Novamente, os índios Payayá oram contatados para
lutar contra os Tapuios.
Nas guerras do rio São Francisco, sete aldeias dos Anaio se revoltaram contra os
criadores de gado. Dessa vez, os portugueses convocaram os Kariri e promoveram o
apresamento de centenas de índios.
Oliveira; Freire (2006, p.55), armam que a guerra dos bárbaros mostrou que os
povos indígenas possuíam reações diversas diante da colonização. A complexidade
das relações envolveu articulações de dierentes ormas entre os povos e reelabo-
rações socioculturais. Também houve um processo de territorizalização, a partir do
tratado de paz e seu não cumprimento pelos colonizadores.
A Revolta de Ajuricaba
No Vale do Rio Negro, na Amazônia, a população indígena, no século XVII, explorava
as drogas do sertão como mão de obra para os portugueses interessados em expandiras ronteiras coloniais e comercializar escravos indígenas. Em 1649, com a constru-
ção da Fortaleza de São José da Barra, o jesuíta Antonio Vieira armou que mais de
dois milhões de índios haviam sido mortos durante a colonização do Maranhão e
Grão-Pará (PREZIA; HOONAERT, citado por OLIVEIRA; FREIRE, 2006, p.58).
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Os índios Manao dessa região, de língua aruak, dominavam outros povos da
bacia do Rio Negro. Os portugueses trocavam cativos por armas, utensílios e er-
ramentas. Huiubene, tuxaua manao oi morto pelos portugueses por desenten-
dimentos comerciais. Em 1723, o lho de Huiubene, Ajuricaba aastou os povos
indígenas das aldeias portuguesas e preparou emboscada contra eles. Os índios ob-
tiveram armas com os holandeses da Guiana. Por meio da lei de 28/04/1688 sobre
a guerra justa, oram realizados dois Regimentos de Tropa de Guerra e Resgates no
Rio Negro. Dessa orma, os índios Manao e o líder Ajuricaba oram considerados
inimigos dos portugueses.
Estima-se que mais de 40 mil índios oram mortos nas lutas contra os portugue-
ses. Ajuricaba rebelou-se, no caminho da prisão para Belém, e morreu aogado no
rio Negro em sua tentativa de uga. Ele se tornou mito na Amazônia.
As missões jesuíticas
As missões, ou reduções jesuíticas, se estabeleceram na bacia platina em 1588. Os je-
suítas espanhóis zeram um acordo com a Coroa espanhola para se aastarem dos nú-
cleos coloniais e estabeleceram missões na região do Guairá. (Decreto de 11/10/1611).
Na região do Guairá, atual estado do Paraná, as missões garantiam a navegação
e o comércio pela Bacia do Prata e aldeavam índios hostis à colonização e impe-
diam as bandeiras paulistas.
Nas missões, houve muitos confitos entre índios e jesuítas em unção da diver-
gência entre as autoridades dos xamãs e dos padres.
A Coroa espanhola tornou-se omissa quanto aos desentendimentos entre colo-
nos e jesuítas sobre a utilização da mão de obra indígena. As missões tornaram-se
suscetíveis aos ataques dos bandeirantes paulistas. Segundo Monteiro( 1994), ban-
deirantes como Manuel Preto preavam mais de dois mil índios Tupi de São Paulo e
milhares de índios Guarani aldeados das missões. Em apenas quatro anos, os ataques
dos bandeirantes levaram ao m do Guairá.Os bandeirantes, aliados pelos índios Tupi, chegaram até o oeste do Mato Grosso
e atacavam as missões do Tape, região correspondente ao estado do Rio Grande do
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Sul. As bandeiras paulistas oram derrotadas pelos Guarani nas batalhas de Casapa-
guaçu e na batalha de Mbororé (1638 e 1641, respectivamente).
As guerras guaraníticas oram confitos violentos entre os Guarani e os coloniza-
dores portugueses e espanhóis. O Tratado de Madri, assinado por Portugal e Espanha
em 1750, permutou os territórios espanhóis dos Sete Povos das Missões (São Borja,
São Nicolau, São Miguel, São Luiz Gonzaga, São Lourenço, São João e Santo Ângelo)
com o território português da colônia do Sacramento. Esse tratado garantiu os limites
de território das colônias dos dois países, mas os índios da região sul do Brasil não
aceitaram ser transeridos para o outro lado do rio Uruguai, originando o confito.
Em 1753, os índios começaram a resistir às tentativas de demarcação de rontei-
ra. Em resposta à resistência indígena, os governos espanhol e português enviaram
tropas de Buenos Aires e Rio de Janeiro para combater os índios. O capitão SepéTiaraju oi um dos principais líderes da guerra. Em 1756, os índios guarani se ren-
deram, pondo m ao confito.
Adaptado de: http://caehistoria.
ning.com/photo/mapa-historico-brasil-povos?context=popular
O Diretório dos índios
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Em 1755, oi decretada a Lei de
Liberdade que proibia denitiva-
mente a escravização dos índios. No século XVIII, em relação aos
povos indígenas, oi estabelecida a
política do Diretório dos índios. O
Diretório, implantado em 1757 no
Pará e no Maranhão, se estendeu como política colonial para o Brasil em 1758 e
tratava da liberdade e da administração dos povos indígenas. Suas unções eram:
a expansão da é cristã e do Evangelho, a civilização dos índios, o aumento da
agricultura, a introdução do comércio e o bem comum dos vassalos.
Inicialmente, os índios seriam os administradores dos Diretórios. Porém, o go-
verno avaliou que eles não eram capazes de governar, devido à ignorância e alta de
aptidão. Então, nos Diretórios apregoou-se a necessidade de um diretor nas povoa-
ções que dominasse a língua indígena.
As aldeias oram transormadas em vilas. Os índios passaram a ser governados por
juízes e vereadores. A Diocese cou responsável pela cristianização dos índios e todo
o ensino e a comunicação deveriam ser eetuados somente em língua portuguesa.
As escolas atuavam como espaço de civilização dos índios, que aprenderiam
oícios domésticos e de subsistência. As amílias indígenas passaram a viverem sepa-
radas, em casas próprias. Os índios oram obrigados a se vestirem.
Quanto à distribuição de terras, os índios não deviam ser prejudicados, avorecendo o
comércio e a agricultura. Permitia-se o emprego da orça de trabalho indígena para particu-
lares e a produção de gêneros alimentícios e o cultivo de algodão para produção de tecidos.
O Diretório determinava o pagamento de dízimos sobre a produção dos índios.
Os diretores eram responsáveis pela contabilidade e pelo controle dos dízimos e do
comércio com os índios. As Câmaras das povoações eram responsáveis pela extração
de drogas do sertão, descontavam os dízimos, os custos da expedição e dos diretores
das povoações. O restante cava com os índios.
Em 1798, após o m do Diretório, os juízes de órãos passaram a cuidar doscontratos de trabalhos dos índios civilizados. Os juízes e o Estado brasileiro conside-
ravam os índios incapazes de assegurar seus direitos.
Botocudos. Maximilien de
Wied-Newied
Os índios e o Império
C l i d T i d E d b il i b l
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Com a lei de Terras, em 1850, o interesse do Estado brasileiro atuava em estabele-
cer uma política pública de controle das terras devolutas. No início do século XIX,
As cartas régias (13.05; 28.04; 05.11 e 02.12 de 1808) estabeleciam que as terrasconquistadas por meio de guerras justas seriam consideradas devolutas. (OLIVEI-
RA; FREIRE, 2006, p.74)
O Regulamento das Missões (1845)
permitiu a reunião e remoção de aldeias,
o arrendamento e o aoramento das terras.
Permitia-se aos índios, de bom comporta-
mento, receberem, depois de 12 anos de
cultivo, as terras separadas da aldeia por
meio de Carta de Sesmaria. (OLIVEIRA;
FREIRE, 2006, p.74)
Em 1850, uma decisão do Império man-
dou incorporar às terras da União às ter-
ras indígenas não aldeados. A Lei 3.348 de
20/10/1887 passou as terras de aldeias extintas para os municípios. As terras, das
aldeias extintas e também as devolutas das províncias, passaram ao poder dos esta-
dos durante a Constituição de 1891.
No império, os índios soreram grandes perdas territoriais. Os direitos indígenas
dependiam dos dirigentes públicos. Os aldeamentos e as sesmarias oram reavalia-
dos. As terras do litoral, muitas vezes oram identicadas como devolutas e passavam
ao domínio privado. Muitos índios oram expulsos de suas terras nesse período.
As terras demarcadas aos índios remanescentes ampliaram a desestrutu-
ração interna, alteraram sua orma de trabalho tradicional e os subjugou ao
mercado regional. Os índios viviam como trabalhadores sem terra e eram con-
siderados caboclos.
Nesse período, os índios eram recrutados pela Marinha e pelo Exército em
lutas contra quilombolas, confitos interétnicos e na Guerra do Paraguai. Após a
Guerra do Paraguai, o governo imperial adotou medidas para deender e ocupara região amazônica e criou postos militares, vilas e povoados, além de incentivar
atividades econômicas locais.
Puris. Rugendas
A Cabanada
A C b d d t 1833 1834 N iã N d t Al P b
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A Cabanada durou entre 1833-1834. Na região Nordeste, em Alagoas e Pernambu-
co, a política imperial visava avorecer as elites da burguesia comercial portuguesa,
aos senhores de engenho, ao clero e aos pequenos e médios proprietários de terra.A política liberal estimulava a apropriação undiária que acarretou em revoltas de
moradores, lavradores e índios que deendiam suas terras. Em 1831, ocorreu uma
revolta no Ceará seguida por Pernambuco e Recie.
As terras dos índios oram obtidas por meio de doações dos portugueses em
unção do combate contra os holandeses e negros quilombolas. No entanto, as
terras indígenas soriam pressões dos senhores de engenhos. Escravos ugidos,
índios e mestiços, os cabanos, se insurgiram contra a apropriação de suas ter-
ras pelos senhores de engenho. A população se aliava a setores conservadores
da burguesia lusitana e do Clero para trazer de volta D. Pedro, símbolo das leis
absolutistas e coloniais.
Os cabanos reuniram-se na região de Panelas do Miranda, no interior de Alagoas,
liderado pelo lavrador Antonio Timóteo de Andrade. Nesse contexto, os índios de
Jacuípe oram recrutados à orça pelos latiundiários e políticos para comporem suas
terras. Um cacique oi assassinado e os índios se uniram aos rebeldes de Panela do
Miranda. Os cabanos oram atacados por índios Tupi, arregimentados pelo presiden-
te da Província do Pernambuco.
No confito, índios tapuios, como de Atalaia, Palmeira dos Índios, Jacuípe e Pa-
nelas do Miranda enrentaram os índios legalistas. Os Xucuru combateram ao lado
dos Cabanos. O bispo de Pernambuco propôs a rendição e a anistia dos índios.
A Cabanagem
Ocorreu no Pará e no Amazonas. Os cabanos eram os Tapuias, isto é, índios cristiani-
zados e considerados pacícos, mas também ormados por negros escravizados e di-
versos grupos indígenas e ribeirinhos. Esse grupo se aliou a pequenos proprietários e
outros trabalhadores explorados pelos intermediários contra interesses políticos con-
servadores. A população ribeirinha era denominada de Tapuios, maioria na revolta.
Dentre as causas do movimento, destacam-se a escravidão, a negação da cidadania
aos tapuios, a morte de mais de 200 paraenses e um navio prisão, a impunidade dos as-
sassinos dos cabanos, os golpes políticos regionais e do Partido Caramuru (restaurador).
A Cabanagem deendia ideais republicanos e a autonomia do Estado brasileiro
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A Cabanagem deendia ideais republicanos e a autonomia do Estado brasileiro.
Depois centralizou-se na deesa da liberdade dos escravos e da cidadania dos cabanos.
A rebelião envolveu diversos combates contra as tropas imperiais. Como resultado, omovimento teve um massacre de comunidades indígenas em torno de 30 mil cabanos.
Os índios e a República
O Marechal Cândido Rondon oi
nomeado para trabalhar na chea
da Comissão Construtora de Li-
nhas Telegrácas de Mato Grosso,
com o objetivo de expandir as li-
nhas pela ronteira do Mato Gros-
so e ao mesmo tempo promover
a colonização e o desenvolvimen-
to agrícola e pecuário da região.
Rondon acreditava que os índios podiam se tornar mão de obra na deesa das
ronteiras e no desenvolvimento econômico.
Os trabalhos adotados no Mato Grosso se expandiram, em 1907, para a região
Amazônica e o Acre. Rondon oi então convidado pelo presidente Aonso Pena
para chear a nova Comissão de Linhas Telegrácas e Estratégicas de Mato Gros-
so ao Amazonas. Assim, impulsionados por ideias positivistas, a missão Rondon
procurou civilizar e integrar os índios à nação e ao mundo do trabalho. Rondon
contou com a participação de naturalistas que coletavam arteatos indígenas,
plantas, animais e minerais.
Os índios Paresi e Cabixi participaram da construção do telégrao. Instalaram
2.268 km de linhas telegrácas, estradas de rodagem, além de cartograar rios e
uma imensa região.
O Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais (SPIL-
TN) ou SPI oi criado em 1910, a partir das redes sociais do Ministério da Agricultura
e Comércio (MAIC), do Apostolado Positivista e do Museu Nacional.
O Marechal Rondon diante de
três Tiriyó.
Fonte: acervo Comissão
Rondon, 1928.
Desde 1906, o MAIC previa a civilização e a catequese dos índios. Os positi-
vistas da Comissão Rondon participaram das discussões sobre a capacidade e a
evolução dos povos indígenas do Brasil Rondon propôs a criação de uma agência
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evolução dos povos indígenas do Brasil. Rondon propôs a criação de uma agência
indigenista do governo com agentes delegados regionais. Os objetivos dessa agên-
cia eram: promover a convivência pacíca com os índios, garantir a sobrevivênciaísica dos povos, promover a civilização dos índios, infuir sobre a vida indígena,
xar o índio à terra, promover o povoamento no interior do país, utilizar o índio
como mão de obra agrícola, integrar o índio como cidadão nacional. (SOUZA
LIMA, citado por ROCHA; FREIRE, 2006, p. 113).
O SPI procura aastar as igrejas e a catequese indígena do trabalho com os ín-
dios obedecendo ao princípio laico republicano. Os índios aprendiam nas escolas
agrícolas oícios, como marceneiros, pedreiros, agricultores, etc. O objetivo do SPI
era transormar o índio em trabalhador nacional e integrá-lo à nação. O SPI atuava
em estratégias em ases de atração, pacicação, civilização e regularização da pos-
se. Existiam também os postos indígenas, as povoações e os centros agrícolas. Os
quadros do SPI não eram qualicados para se relacionar com os índios. Havia desde
militares positivistas a trabalhadores rurais sem ormação.
Durante o contato do SPI com os índios oram registradas epidemias de varí-
ola, gripe, tuberculose, coqueluche, pneumonia, sarampo e outras que levaram a
dizimação dos povos.
O Código Civil de 1916 e o Decreto n. 5.484 de 1928 estabeleciam que os índios
eram tutelados pelo Estado. As terras indígenas, seu modo de vida, suas sociabilida-
des e suas relações com não índios passaram a ser gerenciadas pelo governo.
A Funai
Durante meados dos anos 1960, o SPI soreu acusações de genocídio contra índios,
corrupção dos uncionários e inecácia administrativa do órgão. Diante disso, oi
instaurada uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Dessa investigação resultou em
demissão e suspensão de diversos servidores. Em 1967, o SPI oi extinto. Em 5 de
dezembro de 1967 oi criada, pela Lei 5.371, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI).
Em 19 de dezembro de 1973 oi sancionada a Lei n. 6001, o Estatuto do Índio
que regulava sobre a situação jurídica dos índios e das comunidades. O estatuto é
ormado sobre os direitos civis e políticos, terras, bens, rendas, educação, saúde,
cultura e penalidades. A ideologia que marca o estatuto é a civilizatória e integracio-
nista. A Funai também era organizada por meio de postos indígenas e de inspetorias
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nista. A Funai também era organizada por meio de postos indígenas e de inspetorias
depois transormadas em delegacias regionais.
O Parque Nacional do Xingu
Em 1961, no governo do Presidente
Jânio Quadros, oi criado o Parque
Nacional do Xingu, resultado de uma
luta dos irmãos Villas-Boas e o antro-pólogo e educador Darcy Ribeiro, cujo
intuito era preservar não apenas as
condições de sobrevivência dos povos,
mas também o patrimônio natural dessa região.
A criação do Parque teve como inspiração o modelo estadunidense de preser-
vação da natureza. A concepção de proteção aos índios azia-se necessária dian-
te do medo de extermínio desses povos e sua consequente evolução e assimila-
ção pela sociedade não-índia. Entre a proposta original e o decreto do parque
houve perda de mais da metade da área inicialmente prevista, sendo excluídas
as nascentes dos rios.
Atualmente, em sua porção sul, o Parque do Xingu engloba a área cultural co-
nhecida como Alto Xingu, da qual azem parte os povos Aweti, Kalapalo, Kamaiurá,
Kuikuro, Matipu, Mehinako, Nahukuá, Wauja e Yawalapiti.
O massacre do Paralelo 11
Entre 1950 e 1960, no estado do Mato Grosso, grupos de azendeiros, ma-
deireiros e colonos lançavam alimentos contaminados com arsênico, roupas
e brinquedos com vírus da gripe, sarampo e varíola sobre os povos indígenas
Índios Kayapó no Encontro Xingu
Vivo para Sempre.
Foto: Raul Telles do Valle/ISA, 2008
Fonte: http://g1.globo.com/platb/
natureza-isa/2010/04/
da região, pois se tratava de uma área de ronteira agrícola. O assassinato
em massa de índios cinta-largas teve participação de uncionários do SPI,
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g p p ç
como o diretor, o Major da Aeronáutica Luiz Vinhas Neves, em meados dos
anos 1960. Após a investigação baseada em um relatório ocial de 5.115páginas distribuído ao longo de 21 volumes, o Major Neves oi demitido.
O relatório, produzido por uma comissão instalada para estudar o caso,
aastou 200 uncionários do SPI, indiciou 134, incluindo dois ex-ministros,
dois generais, um tenente-coronel e dois majores. Dos acusados, 38 oram
demitidos a bem do serviço público e 17 presos, entre eles Vinhas Neves. O
Massacre do Paralelo 11 incluiu do roubo ao estupro, passando por grila-
gem, assassinato, suborno, tortura.
Fonte: http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2004/05/280435.shtml
Espírito Santo:especifcidades locais
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Objetivo Apresentar estudos arqueológicos que indicam a presença de povos indígenas no territó-
rio do atual Estado do Espírito Santo desde a pré-história até primórdios da colonização.
Os índios no Espírito Santo: um resgate arqueológico
No Espírito Santo, de um modo especíco notícias sobre a presença de povos indí-
genas remontam à pré-história. Estudos arqueológicos concluem que a ocupação
do território do atual Estado do Espírito Santo começou durante a pré-história
brasileira, 3.200 a.C. (antes de Cristo), ou 5.200 a.P. (antes do Presente), cujos
vestígios são os sambaquis6.
A partir do ano 500 d.C, enquanto o Império Romano era destruído pelos “bárba-
ros”, em 475 d.C., conviviam em períodos próximos no território capixaba, possivel-
mente três tradições culturais indígenas, nomeadas pelos especialistas (arqueólogos,
antropólogos e historiadores) como:
1) 500 – 1.500 – Tradição Tupi ou Tupi-Guarani – representada pelos Tupinam-
bá, Tupinikim, Guarani;
2) 800 – 1800 – Tradição Aratu;
3) 1.000 –1.600 – Tradição Una, principal reerência os Puri e os Coroado.
6Sambaquis: amontoados de
conchas de ostras e outros maris-cos, encontrados principalmente
ao longo dos rios Piraquê-açú,
Riacho e Comboios, depositado
pelos povos caçadores, pescadores
ou coletores de alimentos na na-
tureza, que costumavam escavar e
azer moradias.
7 PEROTA, Celso. Os índios em Ara-cruz. Vitória, 1996. Texto produzido
para A empresa Aracruz celulose.
especifcidades locais Kalna Mareto Teao
Klítia Loureiro
8A nação brasileira quando Cabral
aqui chegou conorme Capistrano
de Abreu era ormada por setenta
e seis tribos, divididas em cinco
A tradição tupi-guarani no Espírito Santo
Tupi-Guarani é uma denominação criada pelos arqueólogos que identica a pro-
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grupos distintos. 1) Os Tupis ou
Tupi-guarani, considerados oprincipal povo indígena e o mais
numeroso, habitava o litoral do Rio
Grande do Norte ao Rio Grande
do Sul. Também encontrados no
médio Uruguai, no Paraguai e,
pela costa, quase até os Andes; no
baixo e no médio São Francisco
e também na margem meridional
do Amazonas. Entre o Rio Grandedo Norte e o Rio Grande do
Sul, subdividiam-se em: Carijós,
Tupiniquims e Tupinambás; 2) Os
Kiriris ou Cariris (tristonhos em
língua tupi), viviam no interior,
desde os rios Paraguaçu e São
Francisco ao Parnaíba. Esse grupo
só entrou em contato com os in-
vasores no século XVII; 3) O grupo Jê, também conhecido pelo nome
de Aimorés, na Bahia, Botocudos,
no Espírito Santo e Minas Gerais;
Apinagés, no Maranhão, e Bugres
ou Sinklão, em Santa Catarina;
4) Composto pelos Caraíbas ou Ca-
ribes; 5) Faziam parte os Maipures,
de Gilli; Nuaruaquis, de Steine,
Aruães e Nheegaibas (os que alammal a língua), da oz do rio Ama-
zonas; Wapichanas e Manaus, do
Amazonas e da Guiana; Paramaris,
do Purus; Castenaus, do Xingu,
e Guanás, do Paraguai. Além
desses cinco grupos, Capistrano
aponta para a existência de outros
menores, como Goitacases, em
Campos/RJ; Guaicurus, Charruase Minuanos, no rio da Prata, além
dos Panos, no Amazonas.
dução cerâmica associada aos grupos humanos de origem Proto-Tupi ou Proto-
Guarani7. A palavra Tupi-Guarani reere-se à amília linguística que reúne umconjunto pluriétnico, composto pelos Tupinambás, Tupiniquin e Guarani. Os gru-
pos com esta produção cerâmica correspondem àqueles que estabeleceram os pri-
meiros contatos com os europeus.
A tradição Tupi-Guarani8 é encontrada em todos os estados brasileiros e apresen-
ta uma innidade de particularidades. No Espírito Santo costuma ser identicada em
três ases: a Cricaré, a Tucum e a Itabapoana.
Evidências arqueológicas indicam que o povoamento tupi-guarani era constitu-ído de um grupo de casas comunais, cada uma abrigando um número de amílias
aparentadas. A agricultura era praticada em larga escala, com o plantio de mandioca
e o milho, no nal do período. A presença do milho é devidamente comprovada
pela decoração plástica da cerâmica denominada escovado que é o resultado da
impressão dos sulcos do sabugo de milho na pasta da cerâmica (PEROTA, 1996). É
encontrada no Vale do Rio Doce e em seus afuentes, também no Vale do Rio Cricaré
ou Rio São Mateus e em toda a aixa litorânea do Estado.
O grupo linguístico tupi-guarani é representado pelos povos indígenas Tupinam-
bá, Tupinikim e Temiminó que habitaram ou habitam, como no caso dos Tupinikim
e dos Guarani Mbya, predominantemente o litoral, parte dos Vales dos rios Cricaré,
Itapemirim e Itabapoana.
A tradição Aratu
Os povos denominados Aratu9 são conhecidos apenas arqueologicamente, uma vez
que não tiveram contato com os europeus que aqui chegaram, no início do século XVI.
Os grupos Aratu estão relacionados ao tronco linguístico Macro-Jê. Há registros
desta tradição cultural desde Mato Grosso, passando por Minas Gerais, interior de
São Paulo, Goiás, litoral do Espírito Santo, todas as regiões do Estado da Bahia, Ser-
gipe, Piauí e outros Estados do Nordeste.
Na costa brasileira, são poucos os sítios Aratu bem preservados e até agora iden-
ticados. De acordo com os resultados de datações, os Aratu habitaram esta região
entre os séculos X e XIV. No Espírito Santo encontra-se representada por quatro
ases: Jacaraípe, Itaúnas, Guarabu e Camburi. Sobre essas duas últimas ases não
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existem estudos detalhados devido a pouca quantidade de sítios encontrados.
Os dados etnográcos e etnológicos indicam que a liação dessa tradição é comos índios classicados na amília lingüística Malali, Maxacali e Pataxó.
A tradição Una
A amília Puri-coroado, cuja representação no Estado do Espírito oi mais signicativa
é a de Puri e esteve presente no Sul do Estado, principalmente no vale do Rio Itapemi-rim e na região montanhosa dos municípios de Castelo, Conceição do Castelo, Muniz
Freire, Iúna, Alegre, Guaçui e em toda a Serra do Caparaó. (PEROTA, 1996, p. 11).
Pequenos grupos dessa amília xaram-se no litoral sul até o século XIX e outros
oram aldeados na região serrana, nas cabeceiras dos ormadores do Rio Itapemirim.
Os índios do Espírito Santo e a colonização
A costa atlântica, ao longo de milênios oi percorrida e ocupada por inúmeros povos
indígenas que disputavam os melhores nichos ecológicos, se alojando e desalojando e
realojando, incessantemente. Nos últimos séculos, porém, índios de ala tupi, bons guer-
reiros, se instalaram dominadores, na imensidade da área, tanto à beira-mar, ao longo de
toda a costa atlântica e pelo Amazonas acima, como subindo pelos rios principais, como
o Paraguai, o Guaporé, o Tapajós, até suas nascentes.
Conguraram, desse modo, a ilha Brasil, de que alava o velho Jaime Cortesão (1958),
pergurando, no chão da América do Sul, o que viria a ser nosso país. Não era obvia-
mente, uma nação, porque eles não se sabiam tantos nem tão dominadores. Eram tão só,
uma miríade de povos tribais, alando línguas do mesmo tronco, dialetos de uma mesma
língua, cada um dos quais, ao crescer, se bipartia, azendo dois grupos que começavam a
se dierenciar e logo se desconheciam e se hostilizavam (RIBEIRO, 1995, p. 29).
Antes de apresentarmos a situação atual dos povos indígenas Tupinikim e Gua-
9O termo Aratu oi empregado pela
primeira vez como identicador dos
vestígios arqueológicos encontrados
nas escavações no Centro Industrialde Aratu, região metropolitana de
Salvador – Bahia.
rani Mbya que habitam o litoral norte do estado do Espírito Santo, mais precisa-
mente o município de Aracruz, cabe tecer algumas considerações sobre o passado
histórico desses povos e os confitos estabelecidos com as rentes de expansão da
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sociedade luso-brasileira. Cabe ainda vericar até que ponto esses povos, em con-
tato direto com a “civilização”, desde o período colonial, conseguiram resistir àsmais variadas ormas de opressão exercidas por componentes diversos advindos de
um modelo cultural ocidental-cristão.
Quando Pedro Álvares Cabral10 aqui desembarcou, habitavam nestas terras
aproximadamente 5 milhões de índios que se estendiam por mais de 8 milhões
de km2. É ato que dois universos culturais totalmente distintos se derontaram
e se derontam. De um lado, o universo indígena que representa o desconhecido,
as ormas de pensar e agir não condizentes com a doutrina da Igreja e do Esta-do à época da Revolução Comercial, do individualismo econômico e da Contra-
Reorma, sem alar do Absolutismo em processo de consolidação. Do outro lado, o
mundo europeu dominado por uma ideologia maniqueísta, dualista e eurocêntrica.
O objetivo era, tão somente, submeter esses povos a ormas alienígenas de traba-
lho, de organização social e política, de credos religiosos com o aval do Estado e
da Igreja (MARCATO, 1980a).
Em outras palavras, o desejo maior do colonizador sempre oi converter os povos
indígenas em mão-de-obra dócil, passiva e obediente, para assim auerir lucros de
seu trabalho. O índio litorâneo oi mão-de-obra essencial nos primórdios da coloni-
zação européia, sorendo, portanto, todas as compulsões impostas por um trabalho
escravo de ato ou de direito.
Ao analisar o lugar dos povos na ormação do Brasil contemporâneo Caio Prado
Júnior (1942, p. 79-110) arma que “[...] o índio oi o problema mais complexo que
a colonização teve que enrentar”. Trata-se, de acordo com o autor, de um problema
concreto e agudo: em todas as capitanias, os índios resistiram à incorporação orça-
da pela sociedade colonial. Sem a intervenção agressiva do governo português, que
desorganizou as sociedades indígenas e as diluiu na massa geral da população, era
de se esperar que algumas capitanias jamais zessem parte do País. Devido ao avan-
ço das rentes de expansão econômica por todo o território conquistado, o confito
entre colonos e índios se intensicara.
No Espírito Santo, desde o início da colonização os confitos entre os indígenas e
colonizadores se zeram presentes. A primeira reação aos portugueses oi de hostili-
10Ao contrário do que ensinam
boa parte dos livros didáticos não
oram os cabralinos os primeiros
estrangeiros que aqui aportaram. Historicamente está provado que
no período que vai de junho de
1499 a mio de 1500, estas plagas
oram visitadas por três espanhóis:
Alonso Hojeda, Vicente Yanez
Pinzón e Diego de Lepe, pela
ordem cronológica. Por alta de
perspectivas ou por outro motivo
qualquer, esses aventureiros ibéricosnão se xaram e também não
tiveram i patriotismo de assegurar
ao seu país de origem o domínio e
a glória da descoberta. Olharam a
terra, aspiraram o ar hospitaleiro,
naturalmente zeram algum saque,
e oram embora. Deixaram para os
portugueses a honra da descoberta
(LUNA, Luís. Resistência do índioà dominação do Brasil. Fora do
Texto, Coimbra, 1993, p. 9.
dade. Já em 1535, o donatário Vasco Fernandes Coutinho enrentou os indígenas na
edicação da Vila Velha. Os índios “insubmissos” embrenharam-se na Mata Atlântica
e atacaram os moradores dos núcleos coloniais.
P lh bt j i ã d í di d lit l d E í it S t b
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Para melhor se obter a sujeição dos índios do litoral do Espírito Santo, bem
como aastar a ameaça rancesa e ao mesmo tempo incorporar a capitania ao sis-tema colonial, a partir de meados do século XVI a metrópole passou a incentivar a
política de aldeamentos jesuíticos. Isso porque a resistência indígena tornou inru-
tíero qualquer empreendimento colonizador na capitania (MACATO, 1989, p. 5).
Ao término do século XVI, quatro são os aldeamentos a que temos reerên-
cias: São João, Nossa Senhora da Conceição (atual município da Serra), Nossa
Senhora de Assunção ou Reritiba (Anchieta) e Santo Ignácio dos Reis Magos
((1580) Nova Almeida). Em 1606 é criado o aldeamento de Nossa Senhora deGuarapari (atual Guarapari).
Obrigados a equiparar seu modus vivendi, língua e religião aos do colono, no
início do século XVII, os índios do litoral do Espírito Santo, principalmente os aldea-
dos, destribalizados e alantes da língua geral – nheengatu11, já haviam perdido seus
padrões de cultura.
Foi tão amplo seu grau de descaracterização que muitos deles oram levados para outras
regiões a m de servirem de modelo de adaptação aos moldes civilizados. São Pedro da
Aldeia, atual Cabo Frio, teve assim seu começo, quando em 1617 para lá oi enviado um
grupo de 500 indígenas originários do Espírito Santo. Rompeu-se, pois, no século XVII,
a resistência desses índios litorâneos à dominação civilizada, ecazmente convertidos e
doutrinados pelos jesuítas (MACATO, 1980b).
Com o passar dos séculos, os índios litorâneos oram cada vez mais misturados
com a população luso-brasileira. Forçados pelas circunstâncias, deixaram de lado
seus costumes especícos, incorporaram a cada dia o substrato cultural do coloni-
zador que se auto–intitulava “civilizado”. Já no século XIX, esses índios tinham pas-
sado por todas as compulsões (catequese, violências ísicas, escravidão, entre outras)
capazes de descaracterizá-los étnica e culturalmente.
Grosso modo, os povos indígenas do litoral passaram, ao longo de séculos, pelas
mais diversas experiências de enrentamento com o universo, a geopolítica não-
índia. Eles oram submetidos às mais variadas ormas de repressão e de colonialismo,
11Trata-se da língua geral, variante
do Tupi que, adotada e modi-
cada pelo colonizador, constituiu
a língua mais alada no Brasil
nos dois primeiros séculos de
colonização. C. RIBEIRO, Darcy.
Os índios e a civilização: a inte-
gração das populações indígenasno Brasil moderno. São Paulo:
Companhia das Letras, 1996.
desde a “civilização” imposta pelos aldeamentos missionários, até a ocialização do
extermínio e da escravidão. Ao ndar o século XVI, e início do XVII, a grande maioria
desses povos litorâneos já havia desaparecido ou se encontrava diluída por meio da
mestiçagem (MARCATO 1980b)
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mestiçagem (MARCATO, 1980b).
Nos dias atuais, dois povos indígenas remanescentes dos Tupi-Guarani habitamo litoral norte do Espírito Santo, mais especicamente o município de Aracruz, são
eles: os Tupinikim e os Guarani Mbya.
Movimentos indígenas
No nal dos anos 1970, durante o regime militar, surgiram, no cenário político na-cional, movimentos indígenas que se multiplicaram em todo o país a partir da crise
do indigenismo ocial da Funai. No início, as maniestações indígenas eram isoladas
e impedidas pelos militares. A proposta do governo, de emancipação dos povos,
envolvia a perda de seus territórios e estimulou o surgimento de novas lideranças
indígenas que se aproximaram dos movimentos da sociedade civil desvinculada dos
interesses dos militares e das elites que apoiavam a Ditadura Militar no Brasil.
Setores progressistas da Igreja Católica, infuenciados pelas reuniões de Medellín(1968) e Puebla (1978), realizaram o 1° e o 2º Encontros Sul-Americanos de Bispos.
Nesses encontros, a Igreja Católica passou a adotar uma linha de atuação voltada
para a deesa dos direitos humanos e das minorias étnicas. Reviu sua posição em
relação aos índios. Em 1969 oi criada a Operação Anchieta (OPAN) e em 1972, o
Conselho Indigenista Missionário (CIMI).
Em 1974 ocorreu, na Missão Anchieta, em Diamantino, Mato Grosso, a primei-
ra Assembleia nacional de líderes indígenas. A partir de então, o CIMI apoiou 16
assembleias de povos indígenas. O CIMI apoiava os líderes dierentes das cheas
tradicionais que estavam voltados para questões com a sociedade nacional e que
conheciam bem o português. As demandas principais eram reerentes aos problemas
enrentados nas aldeias. À medida que os povos participavam de assembleias nacio-
nais, os índios passavam a refetir sobre demandas comuns aos demais povos.
Na década de 1970, inúmeras oram as assembleias que mobilizaram diversas lideranças
indígenas em dierentes regiões do país. Em 1978, destacou-se a XI Assembleia de Chees
Indígenas, em Barra do Garças, Mato Grosso, representando 16 etnias de sete Estados.
Surgiam, no cenário nacional, organizações não governamentais voltadas para
a causa indígena. Dentre elas destacam-se a Comissão Pró-Índio de São Paulo
(CPI/SP), o Centro Ecumênico de Documentação e Inormação (CEDI), a Associa-
ção Nacional de Apoio ao Índio (ANAI) o Centro de Trabalho Indigenista (CTI) o
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ção Nacional de Apoio ao Índio (ANAI), o Centro de Trabalho Indigenista (CTI), o
Instituto Socioambiental (ISA). Em junho de 1980 surgiu, no Mato Grosso do Sul, a ideia da criação da União
das Nações Indígenas (UNI) com o intuito e promover a autonomia cultural, a au-
todeterminação dos povos, a recuperação das terras e o ortalecimento comunitário.
Nessa época, a UNI teve um crescimento acentuado e chegou a se constituir como
entidade de representação nacional. Atualmente restringe-se à atuação regional.
Em junho de 1982 destacou-se o I Encontro Nacional dos Povos Indígenas no
Brasil , realizado em Brasília. Nesse encontro, os líderes deniram questões relativasà sua mobilização e à organização.
O Conselho de Articulação dos Povos e Organizações Indígenas no Brasil (CAPOIB)
oi criado em 1992, em Brasília. O CAPOIB é organizado por uma assembleia geral e
uma coordenação composta por cinco lideranças representativas de cada região do país.
Na região amazônica, destacam-se duas organizações expressivas como a
UNI-Acre e Sul do Amazonas e a Coordenação das Organizações Indígenas da
Bacia Amazônica (COIAB). No Espírito Santo, destacam-se a Associação Indígena Tupinikim de Caieiras
Velhas (AITG) e a de Comboios (AITC). Essas organizações trabalham, principalmente,
com projetos de sustentabilidade ambiental e geração de renda com a prática agrícola.
Constituição de 1988
A Constituição de 1988 estabeleceu
o princípio da diversidade e da al-
teridade dos povos indígenas, a de-
esa de que devem ser respeitados
em suas diversas culturas e que são
cidadãos brasileiros portadores de
direitos civis e políticos.
1 º Encontro dos Povos Indígenas
do Xingu. Na oto, Paulo Paiakan,
Raoni, Marcos Terena, Ailton Krenak,
vários deputados e o cacique Pombo.
Foto: Murilo Santos/ISA, 1989.
Fonte: http://g1.globo.com/platb/
natureza-isa/2010/04/
A elaboração e aprovação da Constituição aconteceram em um contexto de rede-
mocratização do país. As lideranças indígenas pressionaram o Congresso para con-
seguirem ver seus direitos assegurados na nova Constituição. A luta pelo reconheci-
mento dos direitos indígenas passava principalmente pelo reconhecimento das terras
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mento dos direitos indígenas passava principalmente pelo reconhecimento das terras
indígenas. A sociedade civil organizada, junto às organizações não governamentaise associações cienticas, participou ativamente desse processo.
Dentre os direitos reconhecidos aos povos, podemos citar:
◊ Direito à organização social, costumes, línguas, crenças e tradições
◊ Direitos originários sobre à terra
◊ O obrigatoriedade da União em demarcar as terras indígenas
◊ Direito à posse permanente das terras indígenas
◊ Proibição da remoção dos povos de suas terras◊ Uso de língua materna os processos próprios de aprendizagem
◊ Proteção e valorização das maniestações culturais
Os índios na Constituição Federal de 1988
Art. 210. Serão xados conteúdos mínimos para o ensino undamental, de
maneira a assegurar ormação básica comum e respeito aos valores culturais
e artísticos, nacionais e regionais.
§ 2.º O ensino undamental regular será ministrado em língua portuguesa,
assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas
maternas e processos próprios de aprendizagem.
Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e
acesso às ontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a
diusão das maniestações culturais.
§ 1.º O Estado protegerá as maniestações das culturas populares, indígenas e
aro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza
material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores
de reerência à identidade, à ação, à memória dos dierentes grupos orma-
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69
, ç , g p
dores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:I - as ormas de expressão;
II - os modos de criar, azer e viver;
III - as criações cientícas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos, edicações e demais espaços destina-
dos às maniestações artístico-culturais;
V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e cientíco.
§ 1.º O poder público, com a colaboração da comunidade, promoverá e
protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros,
vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras ormas de acautela-
mento e preservação.
§ 2.º Cabem à administração pública, na orma da lei, a gestão da do-cumentação governamental e as providências para ranquear sua consulta
a quantos dela necessitem.
CAPÍTULO VIII
Dos Índios
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes,
línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que
tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e
azer respeitar todos os seus bens.
§ 1.º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em
caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis
à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias
a sua reprodução ísica e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
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§ 2.º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua
posse permanente, cabendo-lhes o usuruto exclusivo das riquezas do solo,
dos rios e dos lagos nelas existentes.
§ 3.º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais ener-
géticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só
podem ser eetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas ascomunidades aetadas, cando-lhes assegurada participação nos resultados
da lavra, na orma da lei.
§ 4.º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os
direitos sobre elas, imprescritíveis.
§ 5.º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo,ad reerendum do Congresso Nacional, em caso de catástroe ou epidemia
que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País,
após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese,
o retorno imediato logo que cesse o risco.
§ 6.º São nulos e extintos, não produzindo eeitos jurídicos, os atos que
tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se reere
este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos
nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o
que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a
indenização ou a ações contra a União, salvo, na orma da lei, quanto às ben-
eitorias derivadas da ocupação de boa-é.
§ 7.º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, §§ 3.º e 4.º.
Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas
para ingressar em juízo em deesa de seus direitos e interesses, intervindo o
Ministério Público em todos os atos do processo. ADCT
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Art. 67. A União concluirá a demarcação das terras indígenas no prazo de
cinco anos a partir da promulgação da Constituição.
Fonte: http://www.unai.gov.br/quem/legislacao/indios_na_constitui.htm
Reerências
ALMEIDA, Maria R. C. de. Os índios na História do Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2010.
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MEC/ SECAD/LACED/Museu Nacional. 2006.
CARDIM, Fernão. Tratado da terra e gente do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1980.
CUNHA, Manuela C. História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
GANDAVO, Pero de Magalhaes. Tratado da terra do Brasil: história da Província de
Santa Cruz. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1980.
LERY, Jean de. Viagem a terra do Brasil. Biblioteca do Exército-Editora, 1961.
MARCATO, Sônia de Almeida. Remanescentes indígenas do leste brasileiro.
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OLIVEIRA, João P. de. FREIRE, Carlos A. da R. A presença indígena na ormação do
Brasil. Brasília: MEC/ SECAD/LACED/Museu Nacional. 2006.
OLIVIERI, Antonio Carlos; VILLA, Marcos Antonio. Carta do achamento do Brasil.
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São Paulo: Callis, 1999.
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a ormação o sentido do Brasil. São Paulo: Com-
panhia das Letras, 1995.
SILVA, Aracy L. GRUPIONI, Luís D. B. (orgs). A temática indígena na escola: novos
subsídios para proessores de 1º e 2º graus. 4. ed. São Paulo: Global, Brasília: MEC/
MARI, UNESCO, 2004.
STADEN, Hans. Duas viagens ao Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1974.
THEVET, Andre. As singularidades da França Antártica. Belo Horizonte: Itatiaia;
São Paulo: Edusp, 1978.
Anexos Para saber mais sobre Raposa Terra do Sol
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A destruição como desorra
Resposta ao arrozeiro que apela para a ‘terra arrasada’ em reserva indígena
dirá se temos, de ato, uma Constituição a nos guiar
O Brasil inteiro acompanhou nos últimos tempos a saga do confito envolvendo
índios e arrozeiros que disputavam a posse da Terra Indígena Raposa Serrado Sol, em
Roraima. A disputa trouxe à tona todos os argumentos contrários ao reconhecimentodos direitos indígenas no País, como por exemplo: há muita terra para pouco índio;
terras indígenas em aixa de ronteira ameaçam a soberania nacional; índios preci-
sam ser integrados à sociedade nacional e suas terras utilizadas em prol do desenvol-
vimento econômico. O epicentro desse debate se deu no Supremo Tribunal Federal
(STF), que analisava pedido do governo de Roraima, dos arrozeiros e de políticos
locais para que a demarcação daquela terra indígena osse anulada. Os autores da
ação argumentavam que os índios, quando muito, teriam direito a car connadosem pequenas ilhas de terras, para que a maior parte da extensão da Terra Indígena
Raposa Serra do Sol osse liberada para a ocupação, legitimando-se assim a posse
daqueles que haviam invadido o território, usurpando direitos indígenas.
Em março deste ano, o STF decidiu em avor dos índios, determinando prazo
para a desocupação da área. A decisão pôs uma pá de cal sobre os argumentos
contrários, reconhecendo que a demarcação de terras indígenas é um imperativo
nacional decorrente da necessidade de o País preencher seus hiatos civilizatórios,celebrando pactos de paz com segmentos sociais que historicamente tiveram seus
direitos negados. O relator do processo, ministro Carlos Ayres Britto, armou em seu
voto que a sociedade, de quem se exige solidariedade e humildade, precisa entender
que seu convívio com os índios é uma estrada de mão dupla, que benecia todos.
Para o ministro, é a humildade que “rereia e dissipa de vez todo ímpeto discrimina-
tório ou preconceituoso contra os indígenas, como se eles não ossem os primeiros
habitantes de uma Terra Brasilis cuja integridade ísica tão bem souberam deender
no curso da nossa história de emancipação política...”.
Quem esperava que a decisão do STF osse o m da disputa, por se tratar da úl-
tima e mais importante instância do Poder Judiciário em nosso país, surpreendeu-se
com os episódios dessa semana, quando o principal líder dos invasores da Raposa
Serrado Sol, o arrozeiro Paulo César Quartiero, não só armou que não vai sair
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do local no prazo determinado, como destruiu sede, galpões, rede de eletricidade,sistema de irrigação e tudo mais que pudesse vir a ser utilizado pelos índios após
sua saída. Além da atitude de conronto com o STF, o ato de destruição tem um
caráter perverso de política de terra arrasada, próprio de quem declara guerra a seus
inimigos e procura inviabilizar sua existência. Era, por exemplo, o que se azia nas
guerras travadas na Antiguidade, onde era costume salgar o solo do inimigo para
que ele não pudesse colher nem mais um ruto daquela terra. Era também esse o
costume colonial, quando se queria punir os inimigos do rei. A coroa portuguesa,quando puniu Tiradentes em 1792, além de esquartejá-lo mandou que arrasassem
sua casa e salgassem o terreno onde ela estava, para que os seus descendentes jamais
pudessem viver ali.
Quartiero destruiu beneitorias que se achavam sob investigação judicial. Tra-
mita na Justiça Federal em Roraima uma ação em que se discute o pagamento das
indenizações eventualmente devidas aos invasores da Raposa Serra do Sol. A Funai
inclusive já havia depositado no processo o valor do pagamento dessas indenizações.Ao azer isso, Quartiero acrescenta mais um item ao rol de sua extensa olha de ante-
cedentes policiais, que inclui crimes ambientais como a poluição de rios e a destrui-
ção de matas nativas na terra indígena, além do envolvimento no episódio de maio
de 2008, quando dez índios oram eridos à bala pelos seus capangas. Conorme
amplamente noticiado pelos jornais à época, Quartiero comandou a desobediência
às tentativas do Executivo e do Judiciário de pacicar o confito dentro da Raposa,
sendo responsável, dentre outras coisas, por impedir o trabalho da Polícia Federalno local, com a destruição de pontes e estradas, além da utilização de bombas e
armamentos pesados.
Neste momento, diante da coleção de atos criminosos de Quartiero, não se
pode deixar de perguntar: qual a resposta que será oerecida pelo Estado? Que ará
o Poder Judiciário? Que atitudes adotará o Poder Executivo? A qualidade da ação
do Estado denirá o espaço de garantia do eetivo exercício da cidadania no Brasil.
O lósoo Frédéric Gros, ao alar sobre os novos tipos de violência no mundo mo-
derno, resgata o conceito de que esses atos são remanescentes de uma barbárie que
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“ressurge da natureza arcaica do homem”, e indaga se se trata mesmo de ações isoladas,
como alguns alegam, ou se essas na verdade integram o repertório das violências que
conguram o drama da sociedade nos dias atuais. A resposta que será dada pelo Estado
brasileiro no caso de Quartiero dirá se a barbárie em nosso país é rechaçada pela socie-
dade ou se subsiste como um traço indelével do caráter nacional. Isso vai dimensionarnossa capacidade de atender ao que está escrito no preâmbulo da Constituição Federal,
que arma que o Brasil é “uma sociedade raterna, pluralista e sem preconceitos”.
Ana Valéria Araújo, advogada, mestre em Direito Internacional pelo Washing-
ton College o Law sócia-undadora do Instituto Socioambiental e coordenadora
executiva do Fundo Brasil de Direitos Humanos
Disponível em: http://www.socioambiental.org/inst/esp/raposa/?q=node/548
UHE Belo Monte: Terras Indíge-
nas e UC’s Federais no entorno
Adaptado de: http://www.socio-
ambiental.org/esp/bm/isa.asp
Para saber mais sobre Belo Monte
Comunidades indígenas
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Além dos Juruna da Terra Indígena Paquiçamba, localizados mais próximos à usina,a área de infuência de Belo Monte, segundo denição da Eletronorte, envolve outros
nove povos indígenas: os Assurini do Xingu, os Araweté, os Parakanã, os Kararaô, os
Xikrin do Bacajá, os Arara, os Xipaia e os Kuruaia. A Coordenação das Organizações
Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) inclui ainda vários povos Kaiapó na região
e mais de 1 mil índios que vivem em Altamira.
“O pessoal de Paquiçamba depende muito do regime de águas de Volta Grande.
A perspectiva de terem de buscar alimento, atravessando canais, mostra que essaaldeia indígena não está sendo considerada de orma adequada. Quando a gente
pensa que são mais de 20 etnias ao longo de toda a bacia, então é uma perspectiva
altamente arriscada do ponto de vista social. Principalmente, se a gente levar em
conta que a aprovação do projeto deveria ser submetida ao Congresso Nacional, já
que ele atinge diretamente uma comunidade indígena, e o Congresso Nacional ain-
da não opinou de orma devida sobre Belo Monte”, explicava, em entrevista ao ISA
em 2002, Célio Bermann, proessor do Programa de Pós-Graduação em Energia da Universidade de São Paulo.
O artigo 231 da Constituição Federal, relacionado aos direitos dos índios, deter-
mina que o aproveitamento de recursos hídricos em Terras Indígenas, aí incluídos
os potenciais energéticos, só pode ser eetivado com a autorização do Congresso
Nacional, ouvidas as comunidades aetadas. Também prevê que são nulos e extintos
todos os atos jurídicos que aetem essa posse, salvo relevante interesse público da
União, e que será necessária uma lei ordinária que xe as condições especícas paraexploração mineral e de recursos hídricos nas Terras Indígenas.
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Cultura(s) e interculturalidade:conceitos e perspectivas de
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Objetivos:
◊ Compreender as dierentes concepções atribuídas ao termo de cultura, em dieren-
tes contextos e tempos históricos;
◊ Perceber que os conhecimentos escolares são construções especícas e próprias
da cultura escolar◊ Compreender a relação entre cultura e educação;
◊ Analisar a importância a prática pedagógica intercultural, no contexto escolar, e as
contribuições de novos saberes que daí se origina;
◊ Refetir criticamente sobre os termos multiculturalismo e interculturalismo.
Uma aproximação inicial...
Este texto está pautado na necessidade de refetir criticamente sobre os dierentes
conceitos atribuídos ao termo cultura, em dierentes contextos e tempos históricos,
elemento importante para a compreensão das concepções que direcionam a esco-
lha de conhecimentos escolares e o desenvolvimento de práticas pedagógicas que
infuenciam diretamente a ormação de identidades. Essa questão “toca no cerne”
da relação entre educação dos povos e coletivos diversos, e o padrão único de ci- vilização. A análise crítica das racionalidades,que intererem em nossa existência
Adriana Vieira Guedes Hartuwig1
construção de saberes
1 Mestranda em Educação - (PPGE/
CE/UFES).
humana, nos move ao aprendizado e à intervenção em processos e mecanismos de
discriminação, exclusão e desigualdade.
Mas, antes de iniciar essa leitura, é primordial que você realize as atividades
id b i
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sugeridas abaixo:
1- Em primeiro lugar, tome como reerência a palavra CULTURA. Escreva cinco palavras
que lhe venham à mente quando você pensa – CULTURA. Peça a outras cinco pesso-
as de seu convívio que açam o mesmo. Depois organize as palavras em categorias,
separando-as de acordo com o critério que você estabeleceu. Quais as palavras que mais
apareceram? Que sentido essas palavras tem para você, em relação à palavra CULTURA?
2- A seguir escreva o nome de três etnias que azem parte da miscigenação do povo
brasileiro e dê cinco características culturais às etnias que você listou. Peça às cinco
pessoas que você selecionou que também açam o mesmo. Separe as características
em categorias, da mesma orma que você ez no exercício anterior.
Após ter eito todas essas tareas, leia o texto com muita atenção e responda às
seguintes questões:
3- Que relações você estabelece entre os grupos de palavras e o texto?
4- As palavras reerentes à CULTURA e às características culturais das etnias que
compõem o povo brasileiro possuem semelhanças com os conceitos de cultura men-
cionados no texto?
5- Cite pelo menos duas conclusões pessoais as quais você chegou após a realização
da atividade e da leitura do texto.
Resumo
O presente texto pauta-se na necessidade de reletir sobre os dierentes con-ceitos atribuídos ao termo cultura, em dierentes contextos e tempos históri-
cos, bem como de analisar a maneira como seu conceito se expandiu gerando
distintas ormas de situá-lo, deini-lo e interpretá-lo. A partir dos estudos da
Antropologia, da Linguística, da Filosoia e da Sociologia, iniciados no século
XX, e recentemente, dos Estudos Cultura is começaram a surgir questionamen-
tos sobre o conceito eurocêntrico de cultura que oi tomado como modelo
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tos sobre o conceito eurocêntrico de cultura, que oi tomado como modelode reerência mundo aora. Esses estudos entendem que é mais adequado
alarmos em culturas no plural em vez de cultura no singular. Apresentam
também, os conceitos que tentam incluir outras narrativas culturais no campo
da educação, como o multiculturalismo e o interculturalismo (interculturalida-
de, intercultural). Considera-se que o interculturalismo supera a proposta do
multiculturalismo já que, apesar do multiculturalismo reconhecer a pluralidade
de culturas, não propõe o diálogo entre as culturas. Por im, são apresentadasalgumas relexões e questões sobre as relações entre educação e cultura(s) de-
monstrando a relevância da perspectiva intercultural na educação, já que, essa
proposta possibilita a crítica da racionalidade moderna e também representa
uma alternativa para analisar e valorizar as dierentes maniestações de cultu-
ras, propondo uma ação dialógica, considerada por Paulo Freire a verdadeira
atribuição da educação.
Palavras-chaves: cultura; identidade; multiculturalismo, interculturalismo; diálogo.
Introdução
A diversidade de culturas é uma das questões de primeira ordem, discutidas no
âmbito da educação, na atualidade. Esse debate tem se intensicado devido aalguns movimentos provocados pelo enômeno da globalização, principalmente,
os intercâmbios culturais que transitam em dierentes espaços, desde o campo da
inormação até as migrações e lutas das minorias, que buscam o reconhecimento
de identidades culturais como estratégia de luta pela inclusão. Alguns estudiosos
e intelectuais da educação argumentam que esse movimento é uma resposta à
ação da modernidade capitalista,que impôs aos dierentes povos um padrão único
e hegemônico de cultura.São justamente esses intercâmbios entre as identidades culturais que provo-
carão uma série de deslocamentos e questionamentos a respeito da nossa identi-
dade e dos conceitos sobre os “outros” e sobre as dierenças. A partir daí, surgem
distintas abordagens culturais no campo das Ciências Humanas e Sociais que
discutem o conceito de identidade, cultura e outros termos derivados como multi,
pluri trans e intercultural
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pluri, trans e intercultural .A crítica que se az, a essas terminologias, reside na dívida se tais conceitos
contribuem para ortalecer a lógica cultural do “capitalismo selvagem”, caracterizado
aqui pela má distribuição dos recursos naturais, culturais e dos bens de consumo; ou
podem oerecer a ertilização teórica e prática de uma nova orma de existência, em
que seja possível uma convivência dialógica entre as culturas.
Nesse sentido, o presente texto pauta-se na necessidade de refetir critica-
mente sobre os dierentes conceitos atribuídos ao termo cultura, em contextose tempos históricos diversos, e os conceitos que tentam incluir outras narrativas
culturais no campo da educação, tais como multiculturalismo e interculturalismo
(interculturalidade, intercultural). Deende, ainda, que o interculturalismo supera
a proposta do multiculturalismo em sua versão liberal e também, porque não
propõe a interlocução entre as culturas.
O estudo das dierentes perspectivas multiculturais, especialmente o das propos-
tas críticas e interculturais são importantes, porque apresenta uma refexão contraum modelo de sociedade hegemônico e excludente. Estabelecer essas dierenciações
é muito importante para compreendermos as concepções que direcionam a esco-
lha de conhecimentos escolares e o desenvolvimento de práticas pedagógicas que
infuenciam diretamente a ormação de identidades, voltando-se a uma questão
chave da relação entre educação dos povos e coletivos diversos e o padrão único de
civilização. A análise crítica das racionalidades, que intererem em nossa existência
humana, nos move ao aprendizado e à intervenção em processos e mecanismos dediscriminação, exclusão e desigualdade social.
Como apreciação nal, refetiremos acerca das relações entre educação e cultura
deendendo a importância da interculturalidade na educação, entendida como uma
proposta dialógica, plural e democrática, já sinalizada por Paulo Freire na década de
1960. Com isso, abre-se espaço para reeducar nossos olhares diante dos coletivos
culturais diversos inseridos na escola e, assim, reconhecer suas histórias na história,
no presente, omentando uma educação a avor da valorização e equilíbrio dos sa-beres, sejam eles do campo, da “aldeia” ou da cidade.
Cultura: dierentes concepções, contextos e tempos históricos
O uturo depende da aculdade que o homem
terá para transcender os limites das culturas
individuais. Edward T. Hall
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individuais. Edward T. Hall
Abordar o termo cultura nos exige a consciência de que estamos a lidar com um
dos conceitos mais amplos e polissêmicos da nossa língua. Há várias maneiras de
situá-lo, deni-lo e interpretá-lo. Além disso, a expressão cultura se congura como
um tema polêmico, pois muitos estudiosos e pesquisadores das Ciências Sociais che-
gam a armar que a busca por sua denição incita mais perguntas do que respostas.
Embora hoje em dia a natureza seja comumente considerada um produto dacultura, o signicado etimológico da palavra “cultura” é derivada do conceito de
natureza. Cultura provém do ato ou maneira de cultivar a terra ou o seu próprio
cultivo, o cultivo do que cresce naturalmente. Porém, a denição deste conceito oi
expandido e adquiriu vários sentidos distintos que refetem dierentes pressupostos
epistemológicos, diversas concepções a respeito da evolução humana e dierentes
campos de interesse, entre estes: a Sociologia, a Antropologia, a Psicologia e a Edu-
cação, principal oco de refexão neste texto.O termo cultura passou a azer parte de nosso vocabulário há dois séculos. Seu
sentido básico vinculava-se à ormação do homem, ou seja, às suas características
humanas, visto que um ser social necessitava ser cultivado para tornar-se culto,
renado, em evidente oposição a um inocente estado original “de natureza”.
Para compreendermos como o sentido de cultura oi expandido, precisamos co-
nhecer as características políticas e econômicas da Europa no século XVIII2.
◊ Características da política no século XVIII:
• permanência do absolutismo — centralização do poder nas mãos do monarca;
• inexistência de prática dos poderes legislativo, executivo e judiciário.
◊ Características da economia no século XVIII:
• desenvolvimento das manuaturas;
• tímido desenvolvimento da mão-de-obra assalariada;• vestígios marcantes do regime de servidão.
2O século XVIII é conhecido como
o “Século das Luzes” ou “Iluminis-
mo”, quando a razão iluminaria o
que a tradição obscurecera.
O mundo estava mudando... assim, esse período oi marcado por grandes realiza-
ções intelectuais, especialmente na França, Inglaterra e Alemanha. Há um signicati-
vo aumento da população e, consequentemente, grande desenvolvimento das cida-
des. Milhares de pessoas saem do campo e vão trabalhar em ateliês de manuatura.
A ideia de um novo mundo construído por obra dos homens oi sendo desenvolvido;d d
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p ;um mundo novo, moderno.
É nesse contexto que o vocábulo “civilização” passou pertencer ao espírito geral
do Iluminismo rancês, do ideal moderno de autodesenvolvimento secular e pro-
gressista. O civilizado opõe-se ao bárbaro, ao primitivo, ao selvagem.
Pesquisas de Williams (citado por SILVA, 2009), dispõem que a tensão entre “cul-
tura” e “civilização” oi um marco nos séculos XVIII e XIX, devido à rivalidade exis-
tente entre ranceses e alemães. O modelo de “civilização era a França, consideradauma nação de civilizados, que tinha como objetivo tanto o processo de renamento
social como o ideal utópico rumo ao progresso.
“Cultura” era uma noção alemã, chamada por alguns intelectuais germânicos de
Kultur , que se reeriam à sua própria contribuição para a humanidade, entre essas,
as maneiras de estar no mundo, de produzir e apreciar obras de arte e literatura,
de pensar e organizar sistemas religiosos e losócos (VEIGA-NETO, 2003). Como
destaca Santos (2003), encontramos aqui a ideia de cultura associada aos conhe-cimentos impostos como universais alicerçados em determinados critérios de valor,
estéticos, morais e cognitivos.
Bauman (2005) explica que o conceito de “Cultura”, baseado na noção republi-
cano-iluminista, originou-se em um “Estado sem nação”, que tentou armar sua
identidade ao tentar impor um pouco de coesão a um conglomerado de etnias, de
dialetos e de “culturas locais” (costumes, crenças, mitologias, calendário). Dessa
orma, entendemos que para garantir a ecácia dessa armação, oram usados todosos conhecimentos considerados superiores e que os dierenciava do resto do mundo.
Com eeito, a cultura é o mecanismo que mais tarde será associado à “hegemonia3”,
moldando os seres humanos aos interesses de novo tipo de sociedade.
Outro sentido de cultura, muito diundido nessa época por teóricos evolucionis-
tas do século XIX, oi transposto da teoria de Charles Darwin sobre a evolução do
homem para o plano social e cultural. Para esses pensadores, a humanidade passaria
por estágios de evolução cultural, de sociedades primitivas até ao modelo civilizado. Essa visão justicava o estabelecimento de uma escala de civilização que colocava
3 Preponderância de uma cidade ou
de um povo sobre outras cidades
ou outros povos. Supremacia,
superioridade. Conceito desenvol-
vido por autores marxistas como
Althusser e Gramsci.
no topo as nações europeias, e abaixo delas, as demais nações cujos povos eram
considerados primitivos e selvagens.
É a partir dessas ideias que surge a dierenciação entre alta cultura e baixa cultu-
ra. A alta cultura passou a uncionar como modelo daquele que é culto, que possui
valores da cultura intelectual e artística, ao contrário da baixa cultura, sinônimodaqueles de cultura inerior popular
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daqueles de cultura inerior, popular.
Isso também explica a marca elitista da concepção de cultura tão presente no
imaginário social, vinculada a cultura culta, ao grau de instrução adquirida por meio
da escolarização, capaz de propiciar o acesso aos bens culturais gerais, às obras
artísticas e a comportamentos sociais renados. Entretanto, essa é uma concepção
equivocada a respeito do que realmente signica o termo “cultura”, pois não se pode
dizer que um índio, um negro, um camponês, dentre outros, não possuem cultura. Logo, “[...] a cultura pode ser entendida como tudo aquilo que é produzido
pelo ser humano” (CANDAU, 2002, p.72). Se é assim, toda pessoa humana é pro-
dutora de cultura independente de classe social a qual pertence ou do acesso à
escolarização ormal.
A cultura é um enômeno plural, multiorme, heterogêneo, dinâmico. Envolve criação e re-
criação, é atividade, ação. É considerada também como um sistema de símbolos que orneceas indicações e contornos de grupos sociais e sociedades especicas (CANDAU, 2002, p. 72).
Aprendemos com Geertz (1989) que, os seres humanos ao transitarem da natu-
reza para o mundo da cultura teceram, eles mesmos, suas teias de signicados. Esse
mesmo autor assume “a cultura como essas teias e a sua análise; portanto, não como
uma ciência experimental em busca de leis, mas como uma ciência interpretativa, à
procura do signicado” (GEERTZ, 1989, p. 4). Um conceito de cultura ainda muito vigente entre nós é de um conjunto de
características imutáveis e acabadas, que permanece xo ao longo dos anos, além
de outros traços como genuidade, pureza, autenticidade. Porém a cultura deve ser
entendida como dinâmica produzida e modicada no tempo histórico, de acordo
com a situação do contexto social vivido.
A cultura é, portanto, um processo contínuo de construção, reinventada, recriada
e transormada a todo momento partir da interação social. Assim, não há como umser humano viver uma vida humana ora do tecido social da cultura. Somos seres
naturais e azemos parte da natureza, mas a cultura é o que nos torna humanos.
Somos seres culturais justamente por causa da nossa capacidade de transormar a
natureza em nós e para nós,criando sentidos, palavras, códigos, símbolos que só
possuem signicados a partir da interação e da reciprocidade que geram nossos sa-
beres e aprendizagens próprios e locais, tão importantes como os universais. Assim,precisamos aprender a pensar “transversalmente” as interações entre os universos de
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precisamos aprender a pensar transversalmente as interações entre os universos de
reerências individuais e sociais.
De cultura para culturas: o multiculturalismo e interculturalidade
Além das contribuições de estudos da Antropologia, da Linguística, da Filosoa eda Sociologia, iniciados no século XX, recentemente, os Estudos Culturais têm sido
ecazes em questionar, ou até mesmo desmoronar a racionalidade moderna sobre o
conceito eurocêntrico de cultura.
Segundo Silva (2009), o campo de teorização e investigação conhecido como
Estudos Culturais surgiu em 1964, no Centro de Estudos Culturais Contemporâneos
da Universidade de Birminghan, na Inglaterra. A incitação inicial surgiu a partir de
inquietações sobre a compreensão de cultura dominante presente na crítica literáriabritânica, que refetia preceitos ligados à cultura das chamadas “grandes obras” da
literatura e das artes em geral, e logicamente, restrita à elite.
Assim, a desconstrução desse termo teve início com a concepção de cultura
construída por Raymond Williams (1958) e Richard Hoggart em Uses o literacy
(1957). Para Williams, a cultura deveria ser entendida como o modo de vida global
de uma sociedade, como experiência vivida por qualquer agrupamento humano.
De acordo com essa concepção, não há graus de superioridade e inerioridadeentre as culturas e suas produções e conhecimentos. Esses estudos entendem que
é mais adequado alarmos em Culturas no plural em vez de cultura no singular e
escrevermos com letra maiúscula.
De acordo com Veiga-Neto (2003), essa virada cultural não signicou somente
uma mudança teórica, intelectual e epistemológica, mas muito mais do que isso, tal
deslocamento é inseparável de uma dimensão política na qual atuam orças podero-
sas em busca da dominação material e simbólica pela imposição de signicados. “Seo monoculturalismo coloca a ênase no Humanismo e, em boa parte, na estética, o
multiculturalismo muda a ênase para a política” (VEIGA-NETO, 2003, p.6).
Os Estudos Culturais interpretam a cultura como um conceito estratégico para
a armação da dierença e um campo de luta política em torno de signicados
sociais, nos quais os dierentes grupos sociais, situados em dierentes posições
de poder, tentam e lutam para impor seus signicados à sociedade em geral paramarcar sua identidade.
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marcar sua identidade.
A cultura é nessa concepção um campo contestado de signicação. O que está central-
mente envolvido nesse jogo é a denição da identidade cultural e social dos dierentes
grupos. A cultura é um campo onde se dene não apenas a orma que o mundo deve
ter, mas também a orma como as pessoas e os grupos devem ser. A cultura é um jogo
de poder (SILVA, 2009, p. 134).
Considerando essa citação, tentarei expor como esse jogo de poder tem se con-
gurado em nossa sociedade, identicando as estratégias de lutas utilizadas por povos
e coletivos cujas culturas oram negadas, inviabilizadas e até mesmo eliminadas.
Sabemos que vivemos um momento atual na história da humanidade quando
novas combinações de espaço-tempo são redimensionadas pela propagação crescen-
te de recursos tecnológicos. Esse processo que envolve uma rede complexa, por meioda qual signicados globais e locais são expressos, tem sido sintetizado sob o termo
“globalização”. Mc Grew, citado por Hall (2006), dene esse termo como:
[...] a globalização se reere àqueles processos, atuantes, numa escala global, que atra-
vessam ronteiras nacionais, integrando e conectando comunidades e organizações em
novas combinações de espaço-tempo, tornando o mundo, em realidade e em experiên-
cia, mais interconectado (Mc GREW, citado por HALL, 2006, p. 67).
Esse enômeno não tem sido processado de orma única, pois a desejável ou te-
mida uniormidade não ocorreu de maneira absoluta. A ideia de que a globalização
seria uma orça capaz de atingir uma totalidade homogênea e uniorme, por meio da
qual indivíduos locais seriam transormados em seres planetários, com linguagens,
culturas e identidades gerais, não está ocorrendo. Assim, observamos uma explosão
de maniestações e expressões de grupos dominados como orma de resistência aosdiscursos hegemônicos.
A compreensão antropológica de que nenhuma cultura pode ser julgada superior
a outra é que impulsiona os chamado multiculturalismo e interculturalismo. Multi-
culturalismo é um termo que se congura como um desao conceitual, pois exis-
tem muitas interpretações sobre seu conceito. Conhecer esses conceitos nos permite
questionar concepções que historicamente zeram parte da produção de desiguais. Peter McLaren (2000)4 classica multiculturalismo em quatro tendências: o mul-
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q
ticulturalismo conservador (baseado no legado colonialista de supremacia branca
que deslegitima dialetos, línguas, saberes e valores de outros grupos étnicos); o
humanista liberal (que em nome de uma humanidade comum deende a igualdade
intelectual entre dierentes etnias e grupos sociais); o liberal de esquerda (que tende
a essencializar as dierenças, não levando em conta que essas são construções histó-
ricas, culturais, atravessadas por relações de poder); e o crítico e de resistência (quequestiona a construção da dierença no contexto de relações culturais e de poder).
Entendendo a cultura como confitiva, McLaren (2000) arma que é preciso estar
atento à questão da dierença. Dierenças são determinadas por processos históri-
cos, pelas mentalidades e ideologias, pelas relações de poder e infuenciam proces-
sos políticos e sociais. “Como educadoras(es) e trabalhadoras(es) culturais, precisa-
mos intervir criticamente naquelas relações de poder que organizam as dierenças”
(McLAREN, 2000, p. 135). Nessa perspectiva, não se trata de mudar a ordem hierárquica de brancos sobre
índios, negros e latinos, mas de transormar o valor da hierarquia, ou seja, recons-
truir os sistemas de dierença existentes que organizam a vida social em padrões de
dominação, subordinação e exploração.
Para Forquin (1993), o termo multiculturalismo possui simultaneamente sen-
tidos descritivo, normativo, ou prescritivo. No sentido descritivo, entende-se o
termo como a situação “objetiva” de cada país, ou seja, um dado da realidade, noqual há grupos de diversas origens étnicas, geográcas, línguas, valores, religiões,
refetindo a realidade multicultural de uma determinada sociedade. Quanto ao
sentido prescritivo, o multiculturalismo assume dierentes contornos, já que se
congura como um horizonte de intervenção que permite maneiras de atuar, de
intervir, de transormar a dinâmica social. As ormas de intervir e atuar dos gru-
pos culturais geram novas racionalidades que vão sendo vividas transormando-se
muitas vezes em demarcadores de políticas públicas. Nesse caso, poderíamos rela-tar as experiências de movimentos sociais que se organizaram e provocaram mu-
4 Reconhecido e polêmico Proessor
de Ciências Sociais da Universida-
de da Caliórnia em Los Angeles
(UCLA). Seus estudos partem de
uma perspectiva transdisciplinar
que aborda quatro áreas pelas
quais cou conhecido internacio-
nalmente: a pedagogia crítica, a
educação multicultural, a etnogra-
a crítica e a teoria crítica.
danças, por exemplo, as reivindicações de dierentes etnias indígenas no Brasil que
oram agregadas a Constituição de 1998 e que desencadearam outras conquistas
no plano institucional.
Existem inúmeras críticas ao multiculturalismo, principalmente em sua versão
liberal. Para alguns estudiosos, o termo multiculturalismo abrange o reconhecimentodas diversas culturas, entretanto não há uma preocupação na questão da interrela-
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ção entre esses grupos socioculturais, no sentido de possibilitar um diálogo entre os
diversos sujeitos nas suas dierenças, para uma troca de saberes. O multiculturalismo
também é acusado de ser uma nova orma de racismo, em que o “outro” dierente
deve ser “tolerado” e “respeitado”, como se existisse uma situação de permissão dada
por aquele pertencente a uma cultura superior. Dessa orma, a proposta intercultural
daria conta de preencher essa lacuna deixada pelo multiculturalismo, pois não acre-dita em uma supercultura capaz de conceder respostas aos problemas universais. A
interculturalidade questiona e investiga quais são esses problemas ditos universais e
se abre para o diálogo na busca solidária da resolução das perguntas.
Candau (2002) sugere o interculturalismo como a possibilidade de promover
a inter-relação entre dierentes grupos socioculturais aetando principalmente
a educação em todas as dimensões, numa dinâmica de crítica e autocrítica, va-
lorizando a interação e a comunicação recíprocas. Essa proposta tem por baseo reconhecimento do direito à dierença e a luta contra as discriminações e
desigualdades sociais, e nesse sentido, tenta promover relações dialógicas entre
aqueles que pertencem a dierentes universos culturais, trabalhando os confitos
presentes nesta realidade.
A educação intercultural consiste num enoque global que deve atingir a cultura
da escola, a cultura escolar5, e todos aqueles que azem parte desse processo, ou
seja, todas as dimensões do sistema de ensino e de todo o universo educacional.Sendo assim, essa proposta contribui para a construção de relações democráticas
que ortaleçam os diversos sujeitos presentes nos diversos contextos interculturais.
Conorme Candau:
A promoção de uma educação intercultural é uma questão bastante complexa, que exi-
ge problematizar dierentes elementos da cultura escolar e da cultura da escola e do sis-
tema de ensino como um todo. Trata-se de uma abordagem educativa que aponta para
questões radicais que têm a ver com as unções da escola hoje (CANDAU 2002, p.100).
5 Para um entendimento do conceito
de cultura da escola e cultura escolar,
ver Jean-Claude Forquin, “Escola e
cultura – as bases sociais e epistemo-
lógicas do conhecimento escolar”.
Segundo Jordán citado por Candau (2002), o multiculturalismo e o intercultura-
lismo são termos que requentemente são usados como sinônimos, mas propõe uma
dierenciação entre esses. O autor se situa numa perspectiva em que sugere como
mais adequado o termo interculturalismo para a abordagem que enatiza em edu-
cação. Deende que a educação intercultural não é: uma educação compensatória,
assimilacionista, nem um simples ideal pedagógico humanista, ou um conjunto de
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atividades pensadas e dirigidas a grupos culturalmente minoritários. “Para Jordán,
ao denirmos o que a educação intercultural não é , se está ao mesmo tempo deli-
neando o que ela é ” (CANDAU, 2005, p.75).
Um dos pontos de sustentação do pensamento de Forquin em relação ao multi-
culturalismo e a educação é que a interculturalidade trabalha a tensão entre o uni-
versal e o particular. Ele ressalta que o respeito pelas culturas não deve se restringiraos conhecimentos de uma cultura, mas sugere um pensamento transcultural6.
Arma também que a interculturalidade demonstra um caráter de relação di-
nâmica em que os processos de hibridização cultural7 são intensos e mobilizam a
construção permanente de identidades, supondo que as culturas não são puras.
Assim considerado, o diálogo intercultural é apontado como uma proposta avo-
rável à busca de alternativas e práticas de convivência entre culturas, principalmente
no campo da educação.
A relação entre educação e cultura(s)
Tomando como reerência a origem do caráter monocultural e dominador do con-
ceito de cultura citado anteriormente, oi dada à educação a tarea de levar os “in-
civilizados” a alcançar as ormas mais elevadas da cultura, por meio da dominação eda negação “do outro”, tido como “estranhos”, “ora do ninho”.
Na situação política e econômica da Alemanha no século XVIII, (um “estado sem
nação”, tentando resistir às imposições do Absolutismo rancês e assistindo à deca-
dência da aristocracia alemã) a educação oi apontada como saída para as gerações
uturas apostando na escolarização, capaz de alcançar o ideal utópico de um novo
mundo. Sendo assim, o paradigma pedagógico moderno oi construído sob três ca-
racterísticas essenciais do conceito de cultura: único, elitista e idealista. Essa concepção de cultura teve ampla repercussão na educação de muitos pa-
6 Processo pelo qual as diversas
culturas trocam entre si elementos
culturais. Um exemplo: os imi-
grantes libaneses que vieram para
o Brasil introduziram na nossa
cultura o hábito de comer quibe,
comida típica de sua cultura.
Em contrapartida, muitos delesaprenderam a apreciar o eijão e o
arroz, pratos da cultura brasileira.
7Termo que abarca distintas mistu-
ras culturais. Veja o livro Culturas
Híbridas (1997), de Garcia Canclini.
Nesse livro, o autor se dedicou a
estudar a questão da identidade
nacional como realidade congura-
dora da América Latina.
íses. No Brasil, até os anos 70, o projeto que norteou a Educação Indígena no
Brasil oi baseado na catequese e na socialização para a assimilação dos índios
na sociedade brasileira. O objetivo era integrar e civilizar o índio, concebido como
um grupo primitivo e inerior, principalmente quando comparados aos modelos da
cultura ocidental cristã.
Em termos gerais, a educação brasileira se congurou como um espaço classi-
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catório, em que os alunos mais “civilizados”, mais “capazes, mais “competentes”
eram bem sucedidos e aprovados, recebiam boas notas e eram bem classicados.
Aqueles que não se adequavam ao modelo idealizado estavam condenados à ex-
clusão e à reprovação.
Existem dierentes ormas de abordar as relações entre educação e cultura(s) no
contexto escolar. A partir dos anos 60, muitos paradigmas oram ormulados porestudiosos que se propunham a explicar o racasso escolar de estudantes oriundos
das chamadas camadas populares ou de determinados grupos étnicos. Banks (citado
por CANDAU, 2002) privilegia em sua análise dois paradigmas: o da privação cultural
e o da dierença cultural. O primeiro deles parte do pressuposto de que o racasso
escolar desses alunos ocorre devido à cultura em que estão inseridos que os impede
de ter acesso aos conhecimentos da “alta cultura” ou conhecimento das Humani-
dades. Os deensores desse paradigma acreditam que o problema está localizado nacultura de origem desses alunos e não na cultura da escola. Sendo assim, propõe que
o que deve ser mudado é a cultura do aluno e não a cultura da escola. Nesse tipo de
paradigma a diversidade cultural é reconhecida, porém na relação entre as culturas,
essas são hierarquizadas e classicadas em graus de superioridade e inerioridade.
O segundo paradigma se baseia na concepção de que dierentes culturas possuem
linguagens, valores, símbolos, e modos de comportamentos dierentes, que precisam
ser compreendidos tal como existem. Seus deensores se opõem ao paradigma daprivação cultural e armam que as relações entre as culturas não podem ser ana-
lisadas numa perspectiva hierarquizante. Sendo assim, também deendem que a
cultura da escola, construída e orientada a partir de um modelo cultural hegemônico
e monocultural, precisa ser modicada.
Como visto, não basta reconhecer a diversidade cultural, é preciso desazer a hierar-
quia entre as dierenças culturais, que as concebe como superiores ou ineriores. Paulo
Freire, por meio de suas experiências educativas a partir dos anos 60, nos recorda quea submissão à opressão leva à internalização da autoimagem de oprimido, de inerior.
Ao expor sua amosa rase: “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mes-
mo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”, Freire (1970) já er-
tilizava a ideia de uma proposta educacional baseada no interculturalismo, quando
em seus textos propunha a verdadeira atribuição da educação: a proposição de uma
ação dialógica. Suas preocupações quanto ao respeito à cultura do aluno, ao diálogo
e à liberdade, oerecem respaldo elementar para a compreensão das relações entre
( )
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educação e cultura(s).
Paulo Freire deendia uma educação que devesse se aastar de ações manipula-
doras e massicadoras e armava que toda educação deve ser um encontro entre
os homens (e mulheres), “que mediatizados pelo mundo, o “pronunciam”, isto é,
o transormam, e, transormando-o, o humanizam para a humanização de todos”
(FREIRE, 1970, p.43). Para que a educação intercultural avance, hoje, precisamos enrentar alguns de-
saos, como o de reconciliar os saberes dos(as) alunos(as) com a cultura escolar e
desconstruir o legado dessa educação que nega a cultura do(a) aluno(a). A potência
da educação – não só no sentido da escolarização, mas no sentido mais amplo -
consiste em dialogar os saberes e azer com que cada um deles encontre o interesse
e a relevância no outro.
Outro desao, que se destaca dentro da perspectiva intercultural, é a superaçãoda polarização entre igualdade e dierença. No âmbito das políticas públicas e das
práticas pedagógicas, o reconhecimento da dierença deve estar articulada com as
questões reerentes à igualdade e ao direito à educação de qualidade para todos.
Na tentativa de articular educação e cultura, os deensores da educação indígena
têm sido os que mais avançaram na busca de articular políticas públicas e propostas
pedagógicas que trabalham e buscam reconhecimento de sua cultura, mesmo diante
de inúmeros confitos e adversidades.Assumindo o olhar de que existem dierentes culturas, nós educadores(as), de-
vemos nos questionar: qual é o nosso olhar diante dos coletivos diversos inseridos
na escola? Como somos ormados e preparados para atuar nesse contexto? Como
podemos superar as visões e representações preconceituosas sobre os dierentes?
Essas questões se colocam como essenciais, pois, se queremos combater os pre-
conceitos e as discriminações, devemos primeiro entender como os valores e as
relações entre as culturas, em nosso sistema, e a própria docência contribuíram, eainda contribuem, na produção das desigualdades e da hierarquização das culturas,
por meio da racionalidade moderna de ciência,progresso, conhecimento, cultura e
civilização, de avaliação e segregação.
Nessa dimensão, a educação intercultural se congura como uma prática que
propicia a democracia valorizando os distintos saberes tornando-se incentivadora
das transormações indispensáveis na geração da justiça social e da melhoria da
qualidade de vida.
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Continuando as atividades
8- Como exemplo de grupos sociais que tiveram êxito na luta pelo direito à die-
rença, citamos as reivindicações de dierentes etnias indígenas no Brasil ,que oramagregadas à Constituição de 1998 e que desencadearam outras conquistas no
plano institucional.
Pesquise e socialize com os colegas, exemplos dessas outras conquistas alcança-
das pelos indígenas no plano institucional.
9- Você sabia?
No Espírito Santo existem experiências de grupos étnicos culturais (pomeranos,quilombolas, indígenas, camponeses...) que buscam uma educação dierenciada e se
contrapõem ao modelo de educação baseado no conceito hegemônico de cultura.
Pesquise sobre a experiência cultural dos indígenas no Espírito Santo e descreva
como eles têm buscado essa educação dierenciada e quais seus objetivos. Depois de
registrar de suas descobertas, compartilhe-as com seus(as) colegas.
Filme
O menino de pijama listrado
Direção: Mark Herman.
EUA. 2008. (93 min.)
Um lme que retrata a história da amizade entre duas crianças — um alemãoe um judeu – durante a Segunda Guerra Mundial. Trata se de um bom lme, pois
ilustra a questão do etnocentrismo e a experiência de
um choque cultural e nos ajuda a refetir sobre as im-
plicações da alta de diálogo intercultural que geram
preconceito e racismo.
O racismo contra os judeus e o holocausto oram
justicados pelo darwinismo tortuoso que considerava
os arianos alemães e outros povos nórdicos as “raças”
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os arianos, alemães e outros povos nórdicos as raças
mais evoluídas e destinava-se a destruir as “raças in-
eriores” - principalmente os judeus, aos quais Hitler
atribuía a maioria dos males da humanidade.
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Classifcação dospovos indígenas pela
diversidade linguística:troncos e amílias linguísticas
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Você sabia que no Brasil...
◊ 11 línguas indígenas são aladas por mais de 5 mil pessoas?
◊ 110 línguas indígenas são aladas por menos de 400 pessoas?
◊ a língua Guarani é alada por uma população de aproximadamente 30 mil pessoas?
Línguas indígenas e diversidade cultural
No período que antecedeu a chegada dos europeus ao Brasil, os povos indígenas
eram aproximadamente da ordem de 4 a 6 milhões de habitantes, alantes de
1.200 idiomas distintos. Atualmente, os índios são cerca de 8000 mil e possuem
180 línguas, em nosso país. Houve uma diminuição das línguas indígenas em quase 85 %. A que isso se
deve? A depopulação ocorrreu devido a muitos atores, como as doenças que di-
zimaram os ameríndios: ebre, varíola, gripe; a imposição dos trabalhos orçados,
as guerras, os deslocamentos e a alteração do modo de ser de cada povo indígena.
Soma-se a isso, a imposição da língua portuguesa aos índios e a proibição de uti-
lizarem seu idioma nativo.
O importante é ressaltar que o Brasil apresenta uma grande diversidade cul-tural de povos indígenas, e, por conseguinte, de idiomas distintos. Não cabe,
Kalna Mareto Teao
g troncos e amílias linguísticas
portanto, armar, genericamente que o índio é um só, porque cada povo indí-
gena possui uma cultura própria e especíca. Essa riqueza nos possibilita pensar
que as línguas podem ser um ator de expressão e conhecimento de uma cultura
e o respeito à essa diversidade possibilitará a constituição de uma política de
tolerância e paz em nosso país.
Em meio a essa diversidade, apenas 11 línguas têm acima de cinco mil alan-
tes: Baniwa, Guajajara, Kaingang, Kayapó, Makuxi, Sateré-Mawé, Terena, Ticuna,
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Xavante, Yanomami e Guarani. Essa última é alada por uma população de apro-
ximadamente 30 mil pessoas. Por outro lado, cerca de 110 línguas contam com
menos de 400 alantes.
Para Franchetto (2001, p.6), cada língua tem suas características gramaticais e
de vocabulário, e cada sociedade, tem suas características culturais próprias, sua
visão de mundo, ou seja, uma maneira especial de ver, por meio do conhecimento,
as coisas do mundo humano e natural. Sendo assim, não existem línguas ricas ou
pobres, nem com pouca ou nenhuma gramática, ou com poucas ou muitas palavras.
Tampouco, não existe uma língua primitiva. Toda língua é completa e rica em si
mesma e serve para os usos aos quais se propõe existir.
As línguas, assim como a cultura, (a língua como o conceito de cultura) não
são estáticas, mudam conorme o tempo e cada uma tem sua história. As línguasincorporam palavras de outras culturas e o seu processo de transormação é lento.
Uma língua pode desaparecer apenas se seus alantes desaparecerem também,
ou devido a acontecimentos como o genocídio, ou culturalmente, por meio da as-
similação pela orça ísica resultante da dominação por outros povos. No caso dos
indígenas brasileiros, devido ao processo colonizador, muitos oram submetidos a
processos de assimilação, proibidos de alar suas línguas nativas nas escolas ou
nas missões. Entretanto, os ameríndios resistiram e continuam a alar seus idiomas. É muito comum ouvirmos que os povos indígenas alam tupi-guarani, tupi ou
dialetos. Por trás dessas armativas, esconde-se o preconceito e o desconhecimen-
to da realidade da diversidade cultural em nosso país, pois os ameríndios possuem
línguas ou idiomas indígenas. Dialetos são variantes locais para um mesmo idioma
e duas pessoas podem alar de orma dierente, mas mesmo assim conseguirem se
entender com acilidade.
A língua é uma estrutura complexa que compreende:◊ um sistema que permite a construção de palavras;
◊ um sistema que organiza os sons;
◊ regras e princípios que permitem construir rases e discursos.
A utilização da língua pode ter diversos ns como: expressar sentimentos, pen-
samentos e emoções, comunicar-se com os outros, construir discursos políticos, criar
narrativas, cantos, rezas, descrições, relatos etc.
As línguas indígenas são agrupadas em amílias que por sua vez se agrupam em
troncos linguísticos. Existem também línguas que não pertencem a nenhuma das
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amílias conhecidas e que são chamadas pelos especialistas de línguas isoladas.
Ao armarmos que as línguas azem parte da mesma amília linguística, isso sig-
nica que essas possuem uma origem comum, ou seja, que a língua mãe pertencia
a uma só etnia.
No entanto, com o passar dos anos, essa língua se dividiu com os povos que
migraram para outras regiões e que, na maior parte dos casos, não mais tinham con-
tato entre si, ou esse contato era ocasional. Os povos indígenas eram migratórios,
deslocavam-se constantemente de territórios, ato que impulsionou a mudança dos
idiomas e possibilitou a sua diversicação.
O tronco tupi é o maior e também o mais conhecido: possui dez amílias e cada
uma delas agrupa várias línguas. No caso do guarani, há dialetos, como o mbya e o
nhandeva, o que não os restringe de se compreenderem entre si.O tronco macro-jê possui nove amílias. Entre essas a língua jê, que conta com
cerca de 25 línguas, aladas no Centro-oeste, no sul (kaingang, xokleng), no Pará e
na Amazônia meridional.
As amílias aruák e karib não constituem troncos linguísticos e a cada uma dessas
pertencem várias línguas. Os alantes das línguas aruák situam-se no norte, noroeste
e sul da Amazônia, em Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul e as línguas karib são
aladas no sul do rio Amazonas, ao longo do rio Xingu e no norte da Amazônia.As línguas da amília txapakúra são aladas na região de ronteira entre Brasil
e Bolívia, enquanto a língua tukano é alada no noroeste da Amazônia. A amília
yanomami tem quatro línguas aladas na área ronteiriça entre Brasil e Venezuela e
a amília guaikuru tem apenas um único representante: o kadiwéu, alado no Mato
Grosso do Sul, e também no Chaco argentino e paraguaio.
Há etnias muito pequenas que sobrevivem dos remanescentes de povos antes
numerosos, como os arikapu e os kwazá em Rondônia, os apiaká em Mato Grosso. Em muitas aldeias, podem existir várias etnias, e por isso, há alantes mais de
Conra as línguas das
amílias dos troncos Tupi,
Macro-Jê e de outras amí-lias no anexo da página 109.
uma língua, sendo, portanto, multilíngues, por exemplo as aldeias waiwai, no Ama-
zonas, onde vivem os xereu, os katuena e os warekena, de língua aruák.
Na região do Xingu, no Mato Grosso, convivem povos de língua aruák (mehi-
naku, waurá, yawalapíti), de língua karib (kuikúro, kalapálo, matipú, nahukwá) e de
língua tupi (kamyurá, awetí) que passaram a conviver de orma pacíca, estabele-
cendo alianças, casamentos, rituais, trocando arteatos. Temos nesse caso o exemplo
de uma região multiétnica, em que az-se presente o multilinguismo.
O d Xi ilh i i ã ili
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Os povos do Xingu compartilham mitos, parentesco, organização amiliar, estas,
crenças, hábitos alimentares, técnicas agrícolas e artesanato, no entanto mantêm
suas identidades próprias, sua língua e seu território.
Os povos indígenas sempre conviveram com situações de multilinguismo, já que
o número de línguas usadas por um indivíduo pode variar bastante. Há casos em
que os indivíduos alam e entendem mais de uma língua ou que entendem muitas
línguas, mas só alam uma ou algumas delas. É possível encontrar, numa mesma
aldeia, indivíduos que só alam a língua indígena, com outros que só alam a língua
portuguesa e outros ainda que são bilíngues ou multilíngues.
Muitas vezes, não há correspondência entre a nomenclatura que usamos em re-
lação aos povos indígenas e sua autodenominação. Trata-se da herança de denomi-
nações atribuídas pelos colonizadores ou por povos não indígenas da mesma região,
construídas muitas vezes a partir de características, como os botocudos, cinta-larga
etc. Um exemplo são os metuktire, conhecidos como txukarramãe.
Línguas da Família Tupi-Guarani (Tronco Tupi)
Palavras Guarani Mbyá Tapirapé Waiampí Língua Geral do Alto Rio Negro
Pedra itá itã takúru itá
Fogo tatá tãtã táta tatá
Jacaré djakaré txãkãré iakáre iakaré
Pássaro gwyrá wyrã wýra wirá
Onça djagwareté txãwãrã iáwa iawareté
Fonte: ISA-Instituto
sócio-ambiental
Línguas da Família Jê (Tronco Macro-Jê)
Palavras Canela Apinayé Kayapó Xavante Xerente Kaingang
Pé par par par paara pra pen
Perna tè tè te te zda a
Olho tò nò nò tò tò kane
Chuva taa na na tã tã ta
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Chuva taa na na tã tã ta
Sol pyt myt myt bââdâ bdâ rã
Cabeça khrã krã krã ‘rã krã kri
Pedra khèn kèn kèèn ‘eene kne pò
Asa, pena haaraa ‘ara ‘ara djèèrè sdarbi er
Semente hyy ‘y ‘y djâ zâ y
Esposa prõ prõ prõ mrõ mrõ prõ
Línguas gerais
No início da colonização portuguesa no Brasil, a língua dos índios Tupinambá (tron-
co Tupi) era alada na região ao longo da costa atlântica e no século XVI, passou
a ser aprendida pelos portugueses. Aos poucos, o uso dessa língua, chamada de
Brasílica, intensicou-se e expandiu-se de tal orma que passou a ser alada pela
maioria da população.
Devido aos casamentos interétnicos entre colonos e índias, a Língua Brasílica se
constituiu como língua materna dos lhos por eles gerados. Além disso, as missões
jesuítas incorporaram essa língua como instrumento de catequização indígena. Joséde Anchieta publicou uma gramática, em 1595, intitulada Arte de Gramática da Lín-
gua mais usada na Costa do Brasil e em 1618, oi publicado o primeiro Catecismo
na Língua Brasílica.
Já na segunda metade do século XVII, essa língua, já bastante modicada pelo
uso corrente de índios aldeados e não índios, passou a ser conhecida pelo nome Lín-
gua Geral. Entretanto, é necessário dierenciar as Línguas Gerais no Brasil Colônia:
a paulista e a amazônica.
Fonte: ISA-Instituto
sócio-ambiental
Língua geral paulista
A Língua Geral paulista teve sua origem na língua dos índios Tupi de São Vicente e
do alto rio Tietê. No século XVII, era alada pelos bandeirantes e por seu intermédio
a Língua Geral paulista penetrou em áreas jamais alcançadas pelos índios tupi-
guarani, infuenciando a linguagem corriqueira de brasileiros.
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Língua geral amazônica
Essa segunda Língua Geral desenvolveu-se inicialmente no Maranhão e no Pará, a par-
tir dos Tupinambá, nos séculos XVII e XVIII. Até o século XIX, oi veículo da catequese
e da ação social e política portuguesa e luso-brasileira. Desde o nal do século XIX,
a Língua Geral amazônica passou a ser conhecida, também, pelo nome Nheengatu.
Mesmo após muitas transormações, o Nheengatu continua sendo alado nos
dias de hoje, especialmente na bacia do rio Negro (rios Uaupés e Içana), e além de
ser a língua materna da população cabocla, mantém o caráter de língua de comuni-
cação entre índios e não índios, ou entre índios alantes de dierentes línguas.
As línguas indígenas na escola
No período de colonização, os povos indígenas eram proibidos de alar o seu idioma
materno nas escolas e soriam inúmeros castigos ísicos por tentarem expressar seu
modo de ser por meio do idioma.
Os Tupinikim alavam o idioma tupi até o século XVII e vários viajantes que vieram ao Espírito Santo registraram suas palavras aladas, inclusive D. Pedro II,
quem em visita à região de Santa Cruz, no século XIX, chegou a registrar algumas
expressões em seu diário como:
Temiminó=neto Tuiúca=lama
Avá=homem Cendê= relâmpago
Íra=mel Berú=mosca
Avatché= milhoAtualmente, os Tupinikim têm como idioma materno o português. Em suas escolas, há
um projeto de resgate e valoriza-
ção do tupi antigo, por isso, des-
de 2004, a língua tupi se tornou
disciplina obrigatória no currículo
das escolas tupinikim. O objetivo
é ensinar, conservar e estimular o
reconhecimento e o respeito ao
Tupi incentivar o exercício da cul-
Escola de Boa Esperança –
Guarani - ES
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Tupi, incentivar o exercício da cul
tura, de sua religiosidade, de seu
modo de vida, de organização política, bem como valorizar a cultura indígena.
Os Guarani ensinam em suas escolas tanto o guarani, como o português, por
isso são, bilíngues. Da Educação Inantil ao quinto ano do Ensino Fundamental, as
crianças aprendem preerencialmente em língua materna. A partir do sexto ano, o
português é ensinado a m de instrumentalizar os índios a dominarem melhor o
idioma para que possam se comunicar, receber turistas, ir ao hospital, comercializar
seu artesanato, ler e compreender os documentos, etc.
O ensino da língua materna tem a participação dos mais velhos, proessores e
lideranças políticas da aldeia, já que por meio desse podem ser materializados co-
nhecimentos relativos aos rituais, à alimentação, às estas, ao modo de vida, à caça,
à religiosidade, ao artesanato, à medicina tradicional, dentre outros e, sobretudo,
pode-se produzir seu próprio conhecimento por meio dos materiais didáticos.
Kyringue a’e mba’e kuaawe
Akwery ma yvy rexaka’a a’e yyn wherá
Akuery nhe’e nhane miru, a’e nhane mbovy
Nhanemboporai nhanembojerojy Nhende rera’a arare.
Criança e ancião,
São a luz da terra e o brilho da água,
O espírito deles é que nos apoia e nos
Impulsiona e nos az cantar e dançar;
Que nos leva ao Universo. Wanderley C. Moreira in: MAINÕ ‘I RAPÉ: O caminho da sabedoria. Rio de Janeiro: IPHAN, CNFPC: UERJ, 2009, p.66.
Foto: Gabriel Lordello
Meu povo era livre
Antigamente, nós, Pataxó, vivíamos exclusivamente da caça, da pesca e de rutas da
foresta. A caçada e a pescaria eram realizadas com suas próprias armas e armadilhas.
O arco, a fecha, a borduna, a lança, o mundéu, o kisô, o ojo e muitas outras que
nosso povo azia.
Nós, Pataxó, não conhecíamos armas dos brancos, como machado, acão, oice,
enxada, aca e armas de ogo.
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, g
Antigamente, tinham muitas arturas, nosso povo não passava ome e nem sede.
Hoje, tem dia que o índio passa muita ome, pois a artura que tinha antigamente,
hoje acabou tudo. Antigamente, meu povo não vestia roupa do branco, tinha sua
própria roupa.
Hoje vestimos as roupas que são abricadas nas ábricas das cidades, usamos
relógios e sapatos. Hoje nós estudamos pra deender os nossos direitos e encarar o
mundo lá ora.
Hoje, nós somos a minoria, mas, antigamente, éramos a maioria e vivíamos e-
lizes nessa terra.
Nós, Pataxó, somos ortes e guerreiros, como as outras nações indígenas que
vivem por aí, em outros estados.
O POVO PATAXÓ e suas histórias. 4. ed. São Paulo: Global, 2000.
Atividades
1. Comente sobre a diversidade cultural linguística dos povos indígenas hoje no Brasil.
2. Cite quais são os troncos linguísticos indígenas do Brasil.
3. Dierencie amílias, línguas, troncos linguísticos.
4. Comente acerca dos casos de bilinguismo e multilinguismo dos povos indígenas
5. Podemos armar que existe uma língua inerior à outra, ou mais complexa queoutra? Por quê?
Vídeos indígenas
Série Salto para o uturo, disponível em www.dominiopublico.gov.br
Ylia e o ogo, disponível em www.socioambiental.org
Pajerama, disponível em www.socioambiental.org
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Aldeias vigilantes, disponível em www.socioambiental.org)
Documentários e vídeos indígenas, disponível em http://www.tvcultura.com.br/auwe
Reerências
FRANCHETTO, Bruna. As línguas indígenas. In: Índios do Brasil 2. Secretaria de
Educação a distância. Secretaria de Educação Fundamental. Reimpressão. Brasília:
MEC/SEED/SEF, 2001.
FREIRE, José R. Bessa. Rio Babel: a história das línguas na Amazônia. Rio de Janei-
ro: Atlântica, 2004.
KITHÃULU, Renê. Irakisu e o menino criador. São Paulo: Peirópolis, 2002.
MAINÕ ‘I RAPÉ: O caminho da sabedoria. Rio de Janeiro: IPHAN, CNFPC: UERJ, 2009.
MONTSERRAT, Ruth M. F. Línguas indígenas no Brasil Contemporâneo. In: GRU-
PIONI, Luís D. Índios no Brasil. 4. ed. São Paulo: Global, 2005. Brasília: MEC, 2000.
MUNDURUKU, Daniel. Coisas de índio. 3. ed. São Paulo: Callis Editora, 2005.
______. As serpentes que roubaram a noite e outros mitos. São Paulo: Peiró-
polis, 2001.
O POVO PATAXÓ e suas histórias. 4. ed. São Paulo: Global, 2000.
REFERENCIAL curricular nacional para as escolas indígenas. Brasília: MEC/SECAD, 2005.
ROCHA, Levy. Viagem de Pedro II ao Espírito Santo. 3. ed. Vitória: APEES/SEDU/
SECULT, 2008.
TEAO, Kalna M. LOUREIRO, Klítia. História dos índios do Espírito Santo. Vitória.
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Editora do Autor, 2009.
TEIXEIRA, Raquel F. A. As línguas indígenas no Brasil In: SILVA, Aracy L. GRUPIONI,
Luís D. B. (orgs). A temática indígena na escola: novos subsídios para proessores
de 1º e 2º graus. 4. ed. São Paulo: Global, Brasília: MEC/MARI, UNESCO, 2004.
Sítio eletrônico: www.socioambiental.org
LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996.
Artigo 32.§ 3º O ensino undamental regular será ministrado em língua portuguesa,
assegurada às comunidades indígenas a utilização de suas línguas maternas e pro-
cessos próprios de aprendizagem.
Anexo
Tronco
FamíliasAkwawa
Amanayé
Karitiána Awetí Juruna(Yuruna),Xipaia
Kuruáya Mundurukú
Káro (Arara)
Tupi-Guarani Arikém Awetí Juruna Puroborá Mundurukú RamaramaMawé TuparíMondé
Tupi
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Línguas
Dialetos
Guarani
Tenetehára
KawahibKokáma
y
Anambé
Apiaká
Araweté
Guajá
Kamayurá
Xetá
Zo’e (Puturú)
Tapirapé
Kayabi
Língua GeralAmazônica
Suruí doTocantins
Wayampi (Waiãpi, Oiampi)
Kaapór(Urutu-Kaapór)
Avá-Canoeiro
Asurini do
Xingu (Asurini doKoatinemo)
Xipaia
Mawé(Sateré-Mawé)
Asurini do Tocantins(Asurini do Trocará) e Parakanã
Parintintin, Diahói, Juma, Karipúna,
Tenharin e Uru-Eu-Wav-Wav
Língua Geral Amazônica (Nheengatú). É Amazônica para distinguir da outra Língua Geral, a Paulista, agora já extinta; Nheengatú é um nome um tanto articial, que lhe deu mo Gen.Couto de Magalhães em seu livro de 1876 - O Selvagem.
Puroborá (é um povo cuja língua há documentos dos anos 20 (Th. Koch. Grünberg) e dosanos 50 (W. Hanke) e de que há ainda alguns remanescentes dispersos de Porto Velho até oGuaporé e o pessoal do Setor Linguístico do Museu Goeldi tem contactado alguns egravado dados linguísticos).
Guajajara e Tembé
Kokáma eOmágua (Kambeba)
Kaiowá eOmágua (Kambeba)
Arují (Mayoró) Makuráp MekémSakirabiárTupariAruá
Cinta-Larga
Gavião (Ikóro) MondéSurui (Paiter)Zoró
Fonte: ISA-Instituto Sócioambiental
Macro-Jê
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Boróro
Akwén
Kaingáng
Kayapó
Suyá
Timbira
Apinayé
Panará
Xokléng
Krenák
Krenák Bororó Umutina
Guató
Guató Ofayé
Jê Ofayé Rikbaktsá
Rikbaktsá
Yatê
Yatê
Karajá
Javaé Karajá
Xambioá
Kaingáng do Paraná, Kaingáng Central, Kaingáng do Sudoeste e
Kaingáng do Sudeste
Gorotíre, Kararaó, Kokraimoro, Kubenkrankegn, Menkrangnoti, Mentuktire(Txukahamãe) e
Xikrin
Canela Apaniekra,
Canela Ramkokamekra,Gavião do Pará (Parkateyé),Gavião do Maranhão (Pukobiyé), Krahó Krenjê (Kren-yé) e Krikati (Krinkati)
Tapayúna
Xakriabá, Xavante e
Xerente
Maxakali
Pataxó e
Pataxó Hã-Hã-Hãe
MaxakaliTronco
Famílias
Línguas
Dialetos
Fonte: ISA-Instituto Sócioambiental
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Maria das Graças Cota
Os direitos dospovos indígenas no Brasil
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Resumo
Este texto anal isa a institucionalização das polít icas públicas indigenistas no
Brasil , em uma perspectiva histórica, a partir da República, objetivando compre-
ender a relação entre os movimentos sociais e o reconhecimento dos direitos dos
povos indígenas.
Objetivos
◊ Analisar o histórico da institucionalização das políticas indigenistas no Brasil, a
partir da República;
◊ compreender a relação entre os movimentos sociais e o reconhecimento dos direi-
tos dos povos indígenas no Brasil.
Introdução
A república brasileira, nascida sob a infuência do Positivismo, não apresentou, nos
primeiros anos de sua existência, preocupação com as questões indígenas, tanto
que os índios não são mencionados na primeira Constituição, promulgada em 1891.
A ausência de marcos regulatórios teve como resultado vários confitos e mas-
sacres de povos indígenas. Um dos mais relevantes aconteceu em São Paulo, entre
os Kaigang, os uncionários das vias érreas e os azendeiros que se dirigiram para
a região. O episódio oi tão marcante que, pela primeira vez, o Brasil oi acusado
publicamente pelo massacre de índios, durante o XVI Congresso dos Americanistas,
ocorrido em Viena – Áustria.Essa denúncia oi um dos atores que aceleraram o processo de criação do Serviço
de Proteção ao Índio e Localização de Trabalhadores Nacionais, já que esse e outros
massacres, ocorridos em outros estados, passaram a ser denunciados pela imprensa,
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p p p
estendendo-se às Assembleias Legislativas estaduais e também ao Congresso Nacional.
A reação por parte dos diversos segmentos da sociedade levou o Governo Federal a
criar, por meio do Decreto n.º 8.072/1910, esse serviço, transormado, em 1918, no SPI.
Nesse processo destaca-se a contribuição da proessora Leolinda Daltroe do Cen-
tro de Ciências, Letras e Artes da UNICAMP , que undou, em 1908, a Associação de
Proteção e Auxílio aos Silvícolas do Brasil.
Os positivistas, e entre esses Rondon, eram deensores do pensamento segundo
o qual as sociedades indígenas estariam vivendo na etapa etichista do estado te-
ológico e que, se lhes ossem ornecidas as condições materiais para a evolução,
poderiam passar diretamente para o estado positivo, desconsiderando assim o es-
tado metaísico. A partir da criação do SPI, o trabalho de catequese realizado pelas
diversas ordens religiosas em todo o território nacional passou a ser scalizado pelos
uncionários desse órgão.
Lima (1995) dene a orma de poder exercida pelo Estado brasileiro, por meio
do SPI como poder tutelar. Segundo esse autor, o poder estatizado, exercido sobre
populações e territórios, buscava assegurar o monopólio dos procedimentos de
denição e controle sobre as populações indígenas. Para tanto, oram meios im-
portantes, e ao mesmo tempo seus produtos, a ormulação de um código jurídico
acerca das populações indígenas e a implantação de uma malha administrativa
instituidora de um governo de índios. O poder tutelar é concebido como uma
orma reelaborada da guerra de conquista. Como modelo analítico, a conquista
é um empreendimento com distintas dimensões: xação dos conquistadores nas
terras conquistadas, redenição das unidades sociais conquistadas, promoção de
ssões e alianças no campo de ação das populações conquistadas, com objetivos
econômicos e empresa cognitiva.
A malha administrativa instituidora do poder tutelar sobre os índios era constitu-
ída no plano nacional, de subdiretorias e seções; no plano regional, de inspetorias; e,
no local, de postos, povoações indígenas, centros agrícolas e delegacias. Fazia parte
do corpus jurídico, que passou a regular a vida dos povos indígenas brasileiros, o
Código Civil, promulgado em 1916, que, em seu artigo 6.º, inciso IV, declarava os
índios como relativamente incapazes para a prática de atos da vida civil.A criação do SPI representou a primeira tentativa de concentração dos serviços
em mãos de aparelhos estatizados do governo nacional, isto é, do uso de dispositivos
administrativos de poder destinados a anular a heterogeneidade histórico-cultural,
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submetendo os povos indígenas a um controle com certo grau de centralização e à
imagem de homogeneidade ornecida pela ideia de nação. O controle estatal exer-
cido sobre os povos indígenas, por meio do SPI, permitiu o domínio intensivo sobre
o espaço e populações dele ocupantes. Além disso, criava novas terras destruindoterritorialidades históricas e culturalmente dierenciadas, dando resultados análogos
aos das errovias, revertendo-as para a mercantilização potencial e exploração inten-
siva pela iniciativa privada (LIMA, 1995).
Além disso, a criação do SPI não contribuiu com a proteção dos povos indígenas.
Entre os anos de 1900 e 1950, oram extintas cem tribos indígenas (DAVIS, 1978),
territórios de centenas de outros oram invadidos e apropriados por grileiros, a-
zendeiros e grupos econômicos. Em 1958, Carlos Araújo Moreira Neto, etnólogo do
Museu Paraense Emílio Goeldi, orneceu dados estarrecedores sobre o extermínio de
grupos indígenas Cayapó, que habitavam o vale do Xingu, e que haviam sido conta-
tados pelo SPI. Em 1963, ocorreu a destruição de toda uma aldeia Cinta Larga, no
Mato Grosso, episódio conhecido como “o massacre do paralelo 11”.
Os constantes racassos do SPI em relação à sua capacidade de proteção aos
povos indígenas eram explicados por seus dirigentes como consequência das verbas
insucientes e irregulares, do exagero burocrático, da alta de auxiliares apropriados,
dentre outros motivos. Outro problema, que passou a ser enrentado por esse órgão,
oram as suspeitas de irregularidades administrativas, como a apropriação indevida
do patrimônio indígena, a devastação de forestas e a venda da produção agrícola
dos índios (GAGLIARDI, 1989).
Ao longo dos anos de sua existência (1910-1967), o SPI obteve resultados espe-
taculares no contato com os grupos indígenas arredios, mas o mesmo não se pode
dizer em relação à proteção desses povos. Com requência, a euoria da pacicação
era sucedida por doenças contagiosas que levavam ao extermínio grande parte do
grupo contatado. Não raro, grupos indígenas eram enxotados de seus territórios
pelas pressões de algum azendeiro, que reclamava seu direito de propriedade (GA-
GLIARDI, 1989), mesmo estando assegurado pelas Constituições de 1934, 1937 e
1946, o direito à posse da terra.
Nos anos 60 do século XX, o SPI encontrava-se em situação bastante precáriae acabou sendo extinto após o golpe de Estado de 1964, quando uma auditoria
realizada nesse Órgão conrmou as suspeitas de irregularidades administrativas. Em
substituição ao SPI, oi criada em 1967, a FUNAI.
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No período da Ditadura Militar (1964-1984), a situação dos povos indíge-
nas piorou ainda mais, devido à aceleração do processo de industrialização e à
expansão das ronteiras agrícolas, que levaram à extinção ou à dispersão vários
grupos indígenas.Os Pankararu, originários de Pernambuco, migraram para a Região Sudeste
devido à construção da hidrelétrica de Itaparica, no Rio São Francisco, à seca,
aos confitos oriundos da luta pela terra e às inúmeras outras agressões. Os
Xacriabá, do norte de Minas Gerais, perderam dois terços do território em decor-
rência do desenvolvimento de projetos agrícolas na região, pela Ruralminas, que
atraíram ortes grupos empresariais e grandes azendeiros das cidades vizinhas.
Os Tupinikim, do Espírito Santo, perderam para a Aracruz Celulose cerca de 30
mil hectares de terras.
A situação não oi dierente na Região Sul do Brasil. Martins (1978) relata os
problemas de extermínio e invasão de terras dos povos indígenas nessa região:
Quando cheguei a este posto, em 1968, havia 48 amílias de intrusos, invasores da
reserva indígena. Habilmente esse número oi reduzido para 29 amílias apenas. Tão
logo encerrou o prazo do arrendamento, em 31 de julho deste ano, imaginei encerrada
a ocupação das terras indígenas. Mas vieram os políticos e insufaram os invasores a
permanecer” (MARTINS, 1978, p. 271).
No Centro-Oeste, os povos indígenas também perderam terras, tanto que as li-
deranças Guarani-kaiowá e Guarani-nhandeva passaram a se articular para a reação
à perda de suas terras, que se vinha intensicando desde a década de 1960, com a
instalação da agricultura extensiva no sul de Mato Grosso do Sul.
A Constituição imposta aos brasileiros, pelos militares durante a Ditadura Militar
(1964-1984), previa em seu artigo 4.º “Incluem entre os bens da União as terras
ocupadas pelos silvícolas”. No entanto, no artigo 186 manteve-se “[...] aos silvícolas
a posse permanente das terras que habitam” reconhecendo seu direito ao usuruto
exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades nelas existentes. Percebe-se
assim, o distanciamento entre essas ideias e aquelas, propostas na Convenção n.º107 da OIT, aprovada no Brasil no ano de 1965, no que diz respeito ao direito de
propriedade coletiva ou individual sobre as terras tradicionalmente ocupadas pelos
membros das populações indígenas.
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Na Emenda Constitucional n.º 1, de 1969, oram mantidas as terras indígenas
incorporadas ao patrimônio da União (artigo 4.º, inciso IV) e a competência do mes-
mo ente público ederal para legislar sobre “[...] nacionalidade, cidadania e natura-
lização; incorporação dos silvícolas à comunidade nacional” (artigo 6º, inciso XVIII,alínea “o”). O artigo 189 da Emenda 1/69 dispunha:
[...]
Art. 189. As terras habitadas pelos silvícolas são inalienáveis nos termos que a lei ederal de-
terminar, a eles cabendo a sua posse permanente e cando reconhecido o seu direito ao usu-
ruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades nelas existentes (BRASIL, 1969).
Mesmo com o direito à posse da terra garantida por todas as Constituições Fe-
derais, a partir de 1934, o que persistiu na história da República Brasileira oi um
constante desrespeito aos direitos dos povos indígenas, que perderam suas terras
devido à expansão das ronteiras econômicas e agrícolas.
Durante a ditadura, oi promulgado o Estatuto do Índio, Lei n.º 6.001, de 19
de dezembro de 1973, que “[...] regula a situação jurídica dos índios ou silvícolas e
das comunidades indígenas com o propósito de preservar a sua cultura e integrá-los
progressivamente e harmoniosamente à comunhão nacional” (artigo 1.º). Esse esta-
tuto, ainda em vigor, por seu caráter integracionista tem levado os povos indígenas
brasileiros a lutar por sua reormulação, junto ao Congresso Nacional, desde 1991,
como veremos mais adiante neste texto.
A Igreja exerceu papel importante junto à FUNAI no desempenho do seu pa-
pel tutelar em relação aos povos indígenas, por isso cresceu o número de missões
católicas entre os indígenas, na primeira metade do século XX. A trajetória dessas
missões da Igreja Católica, até a década 70 do século passado, oi praticamente a
história da missão na Amazônia, uma vez que não existia missão em outra região.
A Igreja da Amazônia continuava tradicional e estrangeira, já que, das trinta e seis
prelazias existentes nesse período, apenas duas possuíam majoritariamente clérigos
brasileiros. As missões não mantinham nenhum contato entre si; cada uma delas era
uma ilha e algumas simplesmente reproduziam as práticas pastorais de sua terra deorigem (PREZIA, 2003).
Mesmo sendo a maior parte das congregações muito tradicionais, já havia, na
década de 1960, algumas que desenvolviam experiências missionárias inovadoras e
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que passaram a realizar encontros nacionais para refetir sobre suas práticas. Foi esse
grupo que tentou trabalhar em parceria com a recém-criada FUNAI.
A Igreja Católica, por meio do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e da Con-
ederação dos Bispos do Brasil (CNBB), acabou tornando-se uma das instituiçõesque mais criticaram e questionaram as políticas públicas colocadas em prática pela
FUNAI nos anos subsequentes. Por diversos motivos, oram constantes os atritos
entre as duas instituições: “A dissolução de uma assembleia de 140 chees indígenas,
organizada pelos padres do CIMI, em Roraima, por decisão da FUNAI, gerou mais um
atrito, e as acusações se zeram mutuamente” (MARTINS, 1978, p. 76). As diver-
gências oram tantas que o Ministro do Interior, Rangel Reis, proibiu o ingresso das
missões religiosas nas reservas indígenas.
Da segunda metade do século XX em diante, a Igreja Católica passou a levar em
consideração os conhecimentos das Ciências Sociais, especialmente da Antropologia,
em suas práticas com os povos indígenas. No meio eclesiástico, passou-se a deen-
der a ideia de que nenhum missionário antropologicamente responsável poderia
balizar sua atuação pastoral exclusivamente num dossiê bíblico-dogmático, e seria
necessário levar em consideração as contribuições do historiador, do etnólogo e do
sociólogo (SUEZ, 1981).
As críticas que a Igreja Católica passou a sorer da sociedade civil, em relação à
catequização para a assimilação dos indígenas à sociedade, oram outro ator que
contribuiu para que essa Instituição começasse a rever suas práticas evangelizado-
ras. Uma das críticas mais signicativas oi eita pelos participantes do Encontro de
Barbados I, organizado, em 1971, pelo Instituto da Universidade de Berna, de Brid-
getown, na Ilha de Barbados, e patrocinado pelo Programa de Combate ao Racismo
do Conselho Mundial das Igrejas. Nesse encontro, houve uma tomada de posição
por parte dos antropólogos, diante dos massacres ísico e cultural contra os povos
indígenas do continente americano.
No documento nal desse encontro, os antropólogos pediam que as missões
saíssem das aldeias indígenas. Do seu ponto de vista, a presença missionária sig-
nicava a imposição de critérios e padrões alheios às sociedades indígenas domi-
nadas, e que sob o manto da é se escondia a exploração econômica e humanadas populações indígenas. Por isso, para as populações indígenas e também para
preservação da integridade moral das próprias igrejas seria melhor acabar com toda
atividade missionária.
D dé d d 1970 di t t t õ t d
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Da década de 1970, em diante, aumentaram as tensões entre os processos de
estatização, postos em prática pelo Estado brasileiro, e os movimentos sociais dos
povos indígenas. Esses passaram a oerecer uma resistência mais organizada em re-
lação às políticas de integração e dominação, congurando assim o que poderíamoschamar de movimentos políticos instituintes dos povos indígenas. A partir dessa
década, surgiram também várias instituições indigenistas não governamentais que
passaram a atuar ao lado dos povos indígenas, e que ganharam visibilidade nos
meios de comunicação. Paulatinamente, o respeito à diversidade cultural passou a
ser deendida por vários setores da sociedade.
A omissão da FUNAI, no cumprimento de seus deveres de demarcação e prote-
ção do patrimônio dos povos indígenas, e o ato de essa instituição governamental
congurar-se como uma agência tributária da “relativa capacidade” do indígena,
expressa no Código Civil e que persistia nas políticas indigenistas de integração ét-
nica, contribuíram também com a reação dessa população e com o surgimento de
entidades e movimentos de deesa e apoio a esses povos.
Na década de 1970, o descrédito dos povos indígenas em relação à FUNAI tor-
nou-se tão grande que uma liderança xavante — Mário Juruna — passou a gravar as
promessas dos uncionários da Instituição e de outros setores do Governo Federal,
para que pudesse posteriormente cobrá-las. O gravador virou o seu “arco e fecha no
mundo das promessas dos civilizados” (MARTINS, 1978).
Juruna – Eu comprei pra isso. Branco az muita promessa. Esquece tudo logo. E índio
não podia provar. Quem vai me proibir assim? Então não ala comigo. Falo, gravo. Todo
branco deveria ter gravadora assim. Mas civilizado é bobo. Tem coisa boa e não usa
(JURUNA, apud MARTINS, 1978, p. 207).
Outro problema enrentado pelos índios na relação com a FUNAI oi a proibição
das assembleias indígenas.
Juruna- Eu não tem sono dormi muito tarde. Tamo começando azer contato com
outras tribo. Pra poder ajudar outro. Fazer orça junto. Vamos reunindo. Eu tinha viage
marcada pra Acre. Conhecer índio de lá. Conversar, mostrar o que acontece entre xa-
vante. Dia 2 de janeiro ia pro Acre. Tava marcado reunião com 102 chee índio. Depois
FUNAI proibiu tudo. FUNAI dispensou (JURUNA apud MARTINS, 1978, p. 206).
A proibição por parte da FUNAI de realização de assembleias indígenas era eita
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A proibição por parte da FUNAI, de realização de assembleias indígenas era eita
com base no princípio da tutela, previsto no Código Civil Brasileiro, porém, essa
Instituição não conseguiu conter o movimento e a organização dos povos indígenas.
De acordo com Terena (2003), a primeira organização indígena, criada pelos própriosindígenas, oi a Organização das Nações Indígenas (UNIND), instituída no início da
década de 1980 por um grupo de índios de vários povos, que se encontravam estu-
dando na Universidade de Brasília.
A criação dessa organização oi uma reação dos estudantes à ordem do General
Golbery do Couto e Silva, que determinou ao presidente da FUNAI, Coronel do Exército
João Carlos Nobre da Veiga, que expulsasse os indígenas da Universidade. Do ponto
de vista desse general, o índio jamais deveria acessar aos antigos 1.º e 2.º graus, hoje
Ensino Fundamental e Médio, muito menos à universidade. Como argumento maior,
Golbery armava considerar Brasília uma cidade “atípica” para a educação indígena.
Em junho de 1980, as principais lideranças indígenas do país, reunidas em as-
sembleia na cidade de Campo Grande (MS), recusaram-se a reconhecer a UNIND
como representante dos povos indígenas, uma vez que, segundo elas, essa organi-
zação não resultou das discussões que vinham ocorrendo nas assembleias indígenas.
Por isso, resolveram criar outra organização, também denominada União das Nações
Indígenas, adotando a sigla UNI.
Ainda em 1980, a UNIND e a UNI oram undidas, criando a primeira organiza-
ção nacional indígena, que se impôs como legítima representante de interesses dos
povos indígenas (NEVES, 2003).
As diversas organizações indigenistas não governamentais instituídas a partir dos
anos 70 do século XX são ormadas por antropólogos, juristas, proessores univer-
sitários, linguistas, indigenistas, missionários e outros prossionais, que apoiam a
causa indígena em seus mais diversos aspectos: organização política, luta pela terra,
registro de idiomas, educação e saúde.
Neste texto, optamos por apresentar dois momentos da luta dos povos indígenas e
do apoio das organizações indigenistas não governamentais pela institucionalização de
políticas públicas que levem em consideração a diversidade cultural e os direitos desses
povos, a saber: a Assembleia Nacional Constituinte e a Raticação da Convenção 169.
A Assembleia Nacional Constituinte
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Jamais se conseguirão mudanças estruturais proundas através de uma constituição. A cons-
tatação vale para qualquer época e lugar, inclusive ao atual momento constituinte brasileiro.
Sempre são os movimentos sociais os que orjam novas condições sociais – às quais, via de
regra, se segue, a edição de um novo ordenamento jurídico que institucionalize, no plano
ormal, o que já está obtido no plano concreto. A constatação, porém, não autoriza que se
despreze o espaço da Assembleia Nacional Constituinte (GAIGER1, 1987, p. 11).
A Assembleia Nacional Constituinte (ANC) retratou o momento de transição po-
lítica pelo qual passou o País e também as relações de orça existentes na sociedade
nacional. Uma característica desse momento político é que as organizações indige-nistas não ormavam um bloco homogêneo quanto ao que deendiam em relação
aos princípios que deveriam nortear as políticas indigenistas.
A ANC2 oi instalada em Brasília no dia 1.º de evereiro de 1987 e esteve
reunida até 5 de outubro de 1988, quando oi promulgada a nova Carta Magna.
Para acompanhar e infuenciar o processo de elaboração da nova Constituição,
as várias organizações indígenas e indigenistas passaram a atuar com os consti-
tuintes no Congresso Nacional em várias rentes, que ora trabalhavam separada-
mente, ora em conjunto.
Os trabalhos das diversas organizações indígenas e indigenistas seguiram dois
eixos principais: 1) assessorar os constituintes na elaboração de propostas e emen-
das constitucionais e participar de debates sobre temas relacionados às questões
indígenas; 2) mobilizar e inormar as lideranças indígenas e a opinião pública sobre
os desdobramentos dos trabalhos no sentido de se manter na nova Constituição os
direitos dos índios, já consagrados em Constituições anteriores (CPI-SP).
1GAIGER, J. Inorme Constituinte.
Brasília: CIMI, 1987/1988
2 Para a realização dos trabalhos na
ANC oram ormadas oito comis-
sões constitucionais temáticas, que,
por sua vez, dividiram-se em 24
subcomissões, além da Comissão de
Sistematização. Cada subcomissão
oi composta por 21 membros
que discutiam temas conexos. A
questão dos direitos indígenas
cou a cargo da Subcomissão dos
Negros, Populações Indígenas,
Decientes e Minorias e oi uma
das três da Comissão da Ordem
Social. Cabe lembrar que questões
como saúde e educação indígenas
oram discutidas e aprovadas por
outras comissões e subcomissõesencarregadas desses assuntos.
As posições políticas deendidas pelas organizações indígenas e indigenistas du-
rante a realização da ANC oram rutos do trabalho prático e da articulação de diver-
sas organizações indigenistas, que já vinham amadurecendo seus posicionamentos
em relação a uma série de questões relativas aos direitos dos índios, como: as da ter-
ra, dos procedimentos nas demarcações; da tutela; da representatividade jurídica e
judicial das comunidades indígenas; da mineração em terras indígenas; da educaçãoe saúde indígenas, entre outras. Assim, quando chegou o momento dessas questões
serem discutidas na Constituinte, já havia propostas muito concretas, acordadas en-
tre as organizações indígenas e as várias entidades de apoio (CPI-SP).
A partir do início dos trabalhos da ANC, lideranças indígenas e indigenistas re-
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A partir do início dos trabalhos da ANC, lideranças indígenas e indigenistas re
alizaram uma série de reuniões com os parlamentares para a melhor denirem os
direitos indígenas relativos à cidadania, à deesa do patrimônio, à terra, ao uso dos
recursos naturais, à assistência à saúde e à educação. Em abril de 1987, cerca de 40 índios, de diversos povos e representantes de
entidades indigenistas, estiveram presentes no Congresso Nacional. No Congresso
Nacional divulgaram e entregaram a proposta unitária, que, no seu processo de
construção, contou com o trabalho de Aílton Krenak, o grande articulador entre os
povos indígenas nesse processo. (GAIGER, 1988).
Em abril de 1987 o antropólogo e deputado José Carlos Sabóia (PMDB-MA) apresentou
à Subcomissão das Populações Indígenas uma proposta de texto com cinco artigos e
uma longa justicativa sobre os direitos indígenas, apoiada por extensa lista de organi-
zações da sociedade civil, encabeçada pela UNI, com quinze organizações de apoio aos
índios, centrais sindicais, associações prossionais e de igrejas. A proposta detalha os
direitos territoriais, veda qualquer exploração de recursos não renováveis por terceiros
e conere aos índios, ao Congresso e ao Ministério Público a aculdade de ingressar em
juízo em deesa dos direitos indígenas (CEDI, 1991, p. 16).
O início dos trabalhos nas comissões contou com audiências públicas, para as
quais vários políticos e acadêmicos oram convidados a expor o tema corresponden-
te a cada uma das subcomissões. No dia 29 de abril de 1987, oi realizada a primeira
audiência pública das entidades pró-índio na Subcomissão dos Negros, Populações
Indígenas, Pessoas Decientes e Minorias do Congresso Nacional, em Brasília, com
a participação e depoimentos de D. Erwin Krautler (CIMI), Carlos Marés (CCPY/CPI-
SP), Wanderlino T. De Carvalho (CONAGE), Manuela C. da Cunha (ABA) e Mercio
Gomes (IPARJ-RJ) (CEDI, 1991).
Foi necessário um grande esorço, por parte das organizações indígenas e indi-
genistas, para conseguir novas articulações políticas, que decidissem avoravelmente
a cada um dos pontos do projeto da Constituição Federal que tivessem implicação
direta com a vida dos povos indígenas: “É que em relação aos direitos indígenas, otexto do centrão “quase” conseguiu piorar o texto do Cabral... Não nos serve nem
este, nem aquele. Precisávamos montar um sistema de emendas e destaques que
opusessem a ambos” (GAIGER, 1988, p.78).
Esse momento político representou um marco decisivo para a nova correlação de or-
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p p p ç
ças na ANC. Trabalharam de maneira conjunta todas as organizações indígenas e indige-
nistas, com o objetivo de redigir e encaminhar as emendas, para que ossem deendidas
no plenário pelos constituintes aliados. O trabalho oi árduo, mas oram asseguradosquase todos os direitos reivindicados pelos povos indígenas, para o que oram necessárias
também concessões por parte das organizações indígenas e indigenistas. Uma delas oi
em relação à estatização da mineração em terras indígenas; insistir nessa tese poderia
colocar em risco a possibilidade de resgatar a redação do capítulo sobre os índios.
Contando com 497 votos avoráveis, 5 votos contrários e 10 abstenções, oi apro-
vado, em 1 de junho, o Capítulo VIII, “Dos Índios”, “Da ordem Social”. Igualmente
importante oi a participação dos indígenas vindos de diversas regiões do País paraacompanhar as votações no Congresso Nacional
No mesmo período inicialmente quase 100, e ao nal mais de 200 representantes indí-
genas de mais de 30 nações percorreram todos os gabinetes de deputados e senadores,
levando textos das demandas que apoiavam para o capítulo sobre os índios (Alce-
nir Guerra, Jarvas Passarinho, Carlos Cardenal, Flávio Feldman e Eraldo Trinidade). Na
última semana antes da votação, os índios zeram “corredor polonês” no acesso ao
plenário, abordando cada constituinte que passava. Todos os índios compenetraram-
se em dominar a proposta em detalhe e em conhecer as propostas contrárias. [...] Os
índios utilizaram a estadia em Brasília, nos dias precedentes ao do acordo, para visitar
personalidades do “mundo branco” em busca de alianças: o Procurador Geral da Repú-
blica, o Presidente do Conselho Federal da OAB, o Reitor da Universidade de Brasília, o
Secretário-Geral do Ministério da Justiça e do Conselho da Deesa dos Direitos Humanos
e o Presidente da Diretoria da CNBB (GAIGER 1988, p. 96).
No mês de julho de 1988, o relator da Constituição, o deputado Bernardo
Cabral, entregou o Projeto de Constituição B, que oi a redação revisada e renu-
merada do que oi aprovado pelo Plenário da ANC. O Projeto de Constituição B
apresentava duas alterações antirregimentais em dois artigos relativos aos povos
indígenas: o que tratava da posse da terra pelos índios e o relativo à demarcação
das terras indígenas. Esse ato exigiu das organizações indígenas e indigenistasuma grande correria à “caça” dos constituintes que pudessem apresentar as emen-
das necessárias para recompor os direitos indígenas.
No mês de agosto de 1988, oram iniciadas as votações das emendas ao Projeto
de Constituição B. Novamente, nesse período, indígenas de todo o País concentra-
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ram-se em Brasília.
Desde a primeira semana do mês, estava em Brasília uma delegação de índios do Nordeste
(nações Kapinawá, Xokó, Karapotó, Xukuru, Xucuru-Kariri, Potiguara, Garimpanko e Fulni-ô) a
quem se somaram delegações Kayapó (inclusive Xikrin) e um Kaiowá. Os índios percorreram os
gabinetes, dançaram nos corredores do Congresso, e desde o dia 17 concentravam-se no audi-
tório da liderança do PMDB na Constituinte, junto à sala de reuniões (GAIGER, 1988, p.102).
A ANC encerrou os seus trabalhos no dia 22 de setembro de 1988. O texto cons-
titucional votado nesse dia obteve 474 votos avoráveis e o capítulo relativo aosdireitos indígenas constitui o Anexo B.
A Constituição de 1988 tornou-se um marco na luta dos povos indígenas, visto
que, pela primeira vez, o Estado brasileiro passou a adotar uma legislação de caráter
não integracionista na sua relação com os povos indígenas. Dierentemente das ou-
tras Constituições que existiram no País, essa reconhece o direito à alteridade cultural
dos povos indígenas. Outras conquistas expressivas oram:
◊ reconheceu-se que os direitos indígenas sobre as terras que ocupam são direi-
tos originários, isto é, anteriores ao próprio Estado;
◊ garantiu-se que os recursos hídricos e a pesquisa e a lavra das riquezas minerais só
podem ser eetivadas com a autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades
aetadas, cando-lhes assegurada a participação nos resultados da lavra, na orma da lei;
◊ condicionou-se a remoção de grupos indígenas à autorização ou reerendo do
Congresso Nacional;
◊ deniu-se com precisão e amplitude o que são terras indígenas;
◊ reiterou-se a nulidade e a extinção dos atos incidentes sobre as terras indígenas;
◊ estabeleceu-se, expressamente, a legitimidade processual dos índios, suas co-
munidades e organizações, descondicionando-as de qualquer assistência;
◊ eliminou-se a distinção entre índios aculturados e não aculturados;
◊ rompeu-se com o monopólio da FUNAI em relação às causas indígenas ao es-
tabelecer expressamente como unção do Ministério Público a deesa dos interessese direitos indígenas e xando-se exclusivamente à Justiça Federal o papel de apreciar
as disputas sobre os direitos indígenas.
Cabe ressaltar, no entanto, a título de comparação, que no Continente Ameri-
cano existem constituições muito mais avançadas em se tratando dos direitos dos
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povos indígenas, como é o caso da Bolívia, da Colômbia, do Equador, da Guatemala,
do México, da Nicarágua, do Paraguai e do Peru, em que há o reconhecimento ex-
plícito da diversidade étnica e cultural dessas sociedades:[...]
Artigo 2º: A Nação (mexicana) tem uma composição pluricultural sustentada originalmen-
te nos seus povos indígenas que são aqueles que descendem de populações que habita-
vam no atual território do país, no início da colonização e que preservam suas próprias
instituições sociais, econômicas, culturais e políticas, ou parte de elas (MÉXICO, 1989).
A promulgação da Constituição Federal de 1988 oi apenas o primeiro passo naluta dos povos indígenas brasileiros, uma vez que continua a batalha contra o Estado
para que se cumpram os direitos estabelecidos pela Carta Magna. É necessário um
acompanhamento constante da atuação do Congresso Nacional para que a Cons-
tituição Federal não venha a sorer reormulações que possam colocar em risco os
direitos conquistados.
A Raticação da convenção n.º 169 pelo Brasil
A aprovação da Convenção n.º 169 da OIT era uma das bandeiras de luta das enti-
dades indígenas e indigenistas brasileiras. O texto da Convenção 169 oi enviado
à Câmara dos Deputados, pelo Presidente da República, Mensagem n.º 367, em
1991, submetido assim à apreciação do Congresso Nacional, em cumprimento ao
artigo 49, inciso I da Constituição Federal Brasileira, e ao artigo 19 da Constituição
da Organização Internacional do Trabalho. Depois de ter sido aprovada no Plená-
rio da Câmara dos Deputados, e também, na Comissão de Deesa do Consumidor,
Meio Ambiente e Minorias e ainda na Comissão de Constituição e Justiça, a matéria
passou a ser objeto de longa e controvertida trajetória no Senado Federal, principal-
mente quanto aos seus artigos 14, 15, 17 e 32.
O artigo 14 da Convenção 169 versa sobre a necessidade de se reconheceremaos povos indígenas os direitos de propriedade e posse sobre as terras que tradicio-
nalmente ocupam. Segundo alguns senadores, esse artigo da Convenção violaria o
inciso XI do artigo 20 da Constituição Federal Brasileira, que declara serem bens da
União as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. Ademais, pelo § 2.º do artigo
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231, as terras indígenas tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se à sua
posse permanente, cabendo-lhes o usuruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios
e dos lagos nelas existentes.Ao deender a raticação da Convenção pelo Senado, o Senador Artur da Távola
armou que o texto do artigo 14 parecia opor-se ao do artigo 20, inciso XI da Cons-
tituição, se lido isoladamente. Contudo, a leitura dos artigos 34 e 35 da Convenção
n.º 169 demonstra a fexibilidade presente nessa:
[...]
Art. 34. A natureza e o alcance das medidas que sejam adotadas para pôr em eeito a
presente Convenção deverão ser determinadas com fexibilidade, levando em conta as
condições próprias de cada país.
Art. 35. A aplicação das disposições da presente Convenção não deverá prejudicar os
direitos e as vantagens garantidas aos povos interessados em virtude de outras conven-
ções e recomendações, instrumentos internacionais, tratados, ou leis, laudos, costumes
ou acordos nacionais (MAGALHÃES, 2002. p.100-101).
O artigo 15 estabelece que os direitos dos povos interessados nos recursos natu-
rais existentes nas próprias terras deverão ser especialmente protegidos e há a possi-
bilidade de esses povos participarem da utilização, administração e conservação dos
recursos mencionados. Em caso de pertencer ao Estado a propriedade dos minérios
ou dos recursos existentes na terra, os governos deverão estabelecer ou manter pro-
cedimentos com vistas a consultar os povos interessados, a m de determinar se os
interesses deles seriam prejudicados, e em que medida, antes de se empreender ou
autorizar qualquer programa de prospecção ou exploração dos recursos existentes no
reerido território. Os povos interessados deverão participar, sempre que or possível,
dos beneícios que essas atividades produzam e receber indenização equitativa por
qualquer dano que possam sorer como resultado dessas atividades.
As consultas e indenizações previstas — para os povos indígenas, em caso deexploração, pelos Estados, de recursos naturais existentes nas terras que ocupam
— pelo artigo 15 da Convenção, não estão entre as enumeradas no §1.º do artigo
20 da Constituição brasileira. Esse último só se reere aos estados, ao Distrito
Federal, aos municípios e aos órgãos da administração direta da União. O § 3.º
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do artigo 231 da Constituição Brasileira é menos amplo ao reerir-se aos índios
nestes termos: “o aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos potenciais ener-
géticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podemser eetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades
aetadas, cando-lhes assegurada a participação nos resultados da lavra, na or-
ma da lei” (BRASIL, 2000).
O artigo 16 prevê a permissão do translado e o reassentamento de povos indíge-
nas, desde que sejam considerados necessários e concedidos livremente e com pleno
conhecimento de causa. Esse artigo oi considerado um retrocesso pelos senadores,
uma vez que, pelo § 5.º do artigo 231 da Constituição Brasileira,
[...] é vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras salvo, ad reerendum do Con-
gresso Nacional, em caso de catástroe ou epidemia que ponha em risco sua população,
ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantindo,
em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco. (BRASIL, 1988, p. 8)
Por meio do artigo 32, os governos são conclamados a adotar medidas apropria-das, inclusive mediante acordos internacionais, para acilitar os contatos e a coope-
ração entre povos indígenas e tribais através das ronteiras, inclusive as atividades
nas áreas econômica, social, cultural, espiritual e ambiental. Da parte de alguns
analistas, houve receio que a possibilidade de acordos intertribais ameaçasse de des-
membramento o território nacional.
A aprovação da Convenção nº. 169, que se deu em 1 de setembro de 1991, pela
Câmara dos Deputados, depois de superadas as controvérsias e esclarecidos os pon-
tos polêmicos levantados pelos senadores em relação aos artigos 14, 15, 17 e 32,
oi nalmente raticada pelo Senado Federal em julho de 2004, ou seja, após treze
anos de espera. A aprovação da Convenção 169 deu-se graças à árdua luta dos po-
vos indígenas, de suas organizações e de todas as entidades que apoiavam as causas
indígenas, que, ano após ano, pressionaram os congressistas.
Atividades
1- Qual a dierença entre organizações indígenas e indigenistas? Procure em sítios da in-
l d i l d d d l i d á d ã
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ternet pelo menos dois exemplos de cada uma delas, assim como de suas áreas de atuação.
2- Qual é o papel desempenhado pelas organizações indígenas e indigenistas na lutapela garantia dos direitos dos povos indígenas brasileiros?
3- Amplie seus conhecimentos: busque em sítios da internet as constituições do Para-
guai e da Argentina e identique os direitos dos povos indígenas que são garantidos
nas cartas magnas desses dois países. Em seguida, produza um texto, para ser utilizado
com seus alunos apresentando as dierenças e semelhanças entre as Constituições do
Brasil, Argentina e Paraguai quanto à garantia dos direitos dos povos indígenas.
Avaliação
Pesquise em livros, em sítios da internet e em arquivos de jornais e revistas, materiais
acerca das lutas dos povos Tupinikim e Guarani do Espírito Santo. Produza um texto,
para ser usado com seus alunos, apresentando a relação entre a luta dos Tupinikime Guarani do Espírito Santo e a luta nacional dos povos indígenas.
Sugestões de leituras
COTA, Maria das Graças. Os Tupinikim e a questão da luta pela terra. Dimensões - Revista
de História da UFES. Dossiê. Identidades Negras e indígenas. Nº 21, 2008. p. 83 a 100.
LOUREIRO, Klítia; TEAO, Kalna Mareto. História dos índios no Espírito Santo. Vi-
tória: Editora do Autor, 2009.
Sugestão de documentários
Índios no Brasil. tvescola.mec.gov.br/index.php?option=com_zoo...
Reerências
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BARROS, M.C. D. M.. A missão Summer Institute o Linguistics e o indigenismo
latino-americano: história de uma aliança (décadas de 1930 a 1970). São Paulo: Revista de Antropologia. vol.47 no.1
BITTENCOURT A. C.; DANTAS, I. Articulação indígena. São Paulo: IBASA. 2004.
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SUEZ P Culturas indígenas e evangelização: pressupostos para uma pastoral inculturada
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Kalna Mareto Teao
Sociodiversidade indígenano Brasil: onde estão e
quais são os povos indígenas
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135
Chegança (Antônio Nóbrega e Wilson Freire)
Sou Pataxó,
sou Xavante e Cariri,
Ianonami, sou Tupi
Guarani, sou Carajá.
Sou Pancararu,Carijó, Tupinajé,
Potiguar, sou Caeté,
Ful-ni-o, Tupinambá.
Depois que os mares dividiram os continentes
quis ver terras dierentes.
Eu pensei: “vou procurarum mundo novo,
lá depois do horizonte,
levo a rede balançante
pra no sol me espreguiçar”.
Eu atraquei
num porto muito seguro,
céu azul, paz e ar puro...
botei as pernas pro ar.
Logo sonhei
que estava no paraíso,
onde nem era preciso
dormir para se sonhar.
Mas de repente
me acordei com a surpresa:
uma esquadra portuguesa
veio na praia atracar.
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De grande- nau,
um branco de barba escura, vestindo uma armadura
me apontou pra me pegar.
E assustado
dei um pulo da rede,
pressenti a ome, a sede,
eu pensei: “vão me acabar”.me levantei de borduna já na mão.
Ai, senti no coração,
o Brasil vai começar.
A população indígena na época do descobrimento
Os indígenas estão presentes no Brasil há mais de 12 mil anos, de acordo com
pesquisas arqueológicas que questionam os dados sobre o povoamento americano,
como a teoria do Estreito de Bering. Pesquisas da arqueóloga norte-americana Ana
Roosevelt (1992) apontam para registros de sociedades complexas na Amazônia,
considerando desenvolvimento da cerâmica e da organização social. Essa desco-
berta aponta para um povoamento anterior àquele indicado pela teoria do Estreito
de Bering na América. Outros estudos questionam as antigas hipóteses de povo-
amento que eram baseadas na existência de
sociedades pequenas e simples, de caçadores
e coletores, caracterizadas pela alta mobilida-
de e pelo uso de cestarias.
Segundo Nimeundaju, existiam cerca de
1.400 povos indígenas no Brasil na épocado descobrimento: tupi-guarani, jê, karib,
aruak, xirianá, tucano, entre outros, com di-
versidade geográca e de organização social.
Os Tupi teriam se deslocado através de rotas
de expansão a partir da região do Madeira e Cerâmica marajoara
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do Amazonas, segundo o arqueólogo Francisco Noell. De acordo com essa teo-
ria, os Tupinambá expandiram-se do Baixo Amazonas ao litoral do Nordeste atéatingirem a região de São Paulo; já os Guarani percorreram em direção ao rio da
Prata. Os Tupi encontravam-se na região da costa e do vale amazônico e os aru-
ák situavam-se próximos aos rios Negro e Madeira, enquanto os Karib estavam
na região das Guianas e no Baixo Amazonas.
Há várias estimativas sobre a população indígena na época do descobrimento:
Steward (1949) estimou 1.500.000 índios, Hemming (1978) 3.600.000 e Denevan
quase 5.000.000 de índios na Amazônia (Bethell, 1998:130-131). A depopulação in-dígena ocorreu devido às guerras de conquista, ao extermínio e à escravização, além
do contágio de doenças como va-
ríola, sarampo e tuberculose.
Para Oliveira e Freire (2006,
p.24), a história demográca não
deve ser compreendida apenas
como uma sucessão de doenças,massacres e violências diversas já
que a dispersão populacional pos-
sibilitou diversas reações dos po-
vos indígenas em relação aos co-
lonizadores, como a promoção de
grandes deslocamentos para esca-
par da escravidão e das doenças. Gravura de Hans Staden
A população indígena atual
Estima-se que quando da chegada dos europeus, os indígenas eram entre 2.000.000
e 4.000.000 de habitantes, com uma diversidade de 1.000 grupos étnicos dierentes.
Hoje, segundo dados do IBGE (2011), a população indígena é estimada em 800.000
habitantes. Para o Instituto Socioambiental (ISA) a população ameríndia é estimadaem 600.000 indivíduos, sendo que 450.000 vivem em terras indígenas e 150.000
estão localizados em áreas urbanas.
A Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e a Fundação Nacional de Saúde (FU-
NASA) consideram uma população de 300.000 índios. A variação populacional de-
corre da utilização de dierentes métodos para a obtenção dos dados. A FUNAI e
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a FUNASA trabalham com as populações reconhecidas e registradas por essas, em
geral, populações aldeadas. Nesses dois órgãos não está contabilizada a populaçãoindígena que reside nas cidades
e em terras indígenas ainda não
demarcadas. O IBGE utilizou
o método de autoidenticação
para chegar aos números des-
critos acima, mas ainda existem
povos indígenas não contabiliza-dos nessas estimativas, como os
índios isolados, os índios urba-
nos e os índios em vias de rearmação étnica.
Segundo dados da FUNASA, existem 374.123 índios distribuídos em 3.225 al-
deias, pertencentes a 291 etnias e alantes de 180 línguas. Dessa população, 192.773
são homens e 181.350 mulheres.
O maior índice de população indígena concentra-se na Região Norte (49%) ena Região Sudeste encontra-se o menor índice (apenas 2%).
O crescimento demográco da população indígena possui média de 4% enquan-
to a média nacional é de 1,6 % da população brasileira. Houve um aumento de
250.000 índios no início da década de 1970 para 700.000 em 2001.
A partir da última década do século passado ocorre no país o enômeno de etnogê-
nese, principalmente nas Regiões Norte e Nordeste, já que devido às pressões políticas,
econômicas e religiosas os índios estão assumindo e recriando suas tradições.
Índio guarani, liderança religiosa
Quem é índio?
O termo índio oi utilizado para designar os povos aqui encontrados pelos europeus
na época em que os portugueses aqui chegaram, pensando estar nas Índias. Atribui-
se o termo indígena aos povos nativos do Brasil e do continente americano, tam-
bém chamados de ameríndios. O termo silvícola oi muito utilizado para denir índiocomo aquele originário da selva,
mas atualmente essa expressão
encontra-se em desuso.
O Estatuto do Índio (Lei
6.001/73) em seu artigo 3º,
i id í di il í
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item I considera índio ou silví-
cola: “todo individuo de origeme ascendência pré-colombiana
que se identica e é identicado
como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da
sociedade nacional”.
No item II, dene-se comunidade indígena ou grupo tribal como um “conjunto
de amílias ou comunidades índias, quer vivendo em estado de completo isolamento
em relação aos setores da comunhão nacional, quer em contatos intermitentes oupermanentes, sem contudo, estarem nele integrados”.
No artigo 4º, são classicados os índios isolados como os que “vivem em grupos
desconhecidos ou de que se possuem vagos conormes através de contatos eventuais
com elementos da comunhão nacional”.
Os índios em vias de integração são considerados aqueles que “quando em con-
tato intermitente ou permanente com grupos estranhos, conservem menor ou maior
parte das condições de sua vida nativa, mas aceitem algumas práticas e modos deexistência comuns aos demais setores da comunhão nacional da qual vão necessi-
tando cada vez mais para o próprio sustento”.
Os índios integrados são denidos como “incorporados à comunhão nacional e
reconhecidos no pleno exercício dos direitos civis, ainda que conservem usos, costu-
mes e tradições característicos da sua cultura.”
Após séculos de exclusão e dizimação dos povos indígenas, devido aos pro-
cessos de colonização, de dominação econômica, religiosa, cultural, dos confitos
Índia tupinikim, preparo de arinha
undiários e de interesses em áreas de mineração, os diversos países e organismos
internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU), a Organização
Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização dos Estados Americanos (OEA)
apresentam critérios bastante distintos para identicar quem é indígena. Muitos
deles baseiam-se em conceitos e noções como: raça, traços culturais ou desen-
volvimento econômico.A Convenção 169 da OIT classica os povos indígenas como descendentes “de
populações que habitavam o país ou região geográca pertencente ao país na época
da conquista ou da colonização ou estabelecimento de ronteiras estatais e que, seja
qual or sua situação jurídica, conservam todas as suas próprias instituições sociais,
econômicas, culturais a políticas, ou parte delas.”
S d d i ã d ONU (1986)
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Segundo denição da ONU (1986):
As comunidades, os povos e as nações indígenas são aquelas que, contando com uma
continuidade histórica das sociedades anteriores à invasão e à colonização que oi de-
senvolvida em seus territórios, consideram a si mesmos distintos de outros setores da
sociedade, e estão decididos a conservar, a desenvolver e a transmitir às gerações uturas
seus territórios ancestrais e sua identidade étnica, como base de sua existência continu-
ada como povos, em conormidade com seus próprios padrões culturais, as instituições
sociais e os sistemas jurídicos.
No Brasil, o critério para se denir indígena baseia-se na autoidenticação étni-
ca, isto é, se dene índio como aquele que se reconhece como dierente da sociedade
nacional, por possuir uma ancestralidade de origem pré-colombiana. Todo indivíduo
que se reconhece como parte de um grupo com essas características e é reconhecido
pelo grupo como tal pode ser considerado índio.
Para Luciano (2006, p.27), entre os povos indígenas existem alguns critérios deautoidenticação como:
◊ continuidade histórica com sociedades pré-coloniais;
◊ estreita vinculação com o território;
◊ sistemas sociais, econômicos e políticos bem denidos;
◊ língua, cultura e crenças denidas;
◊ identicação como dierente da sociedade nacional;
◊ vinculação ou articulação com a rede global dos povos indígenas.
O índio hoje
Diante das mudanças históricas, o índio hoje é visto como um sujeito portador de
direitos. Essa mudança de perspectiva deve-se à orte atuação das organizações e dos
movimentos indígenas no Brasil e na América Latina, a partir da década de 1970. As
lutas dos povos indígenas oram asseguradas em diversas leis, como a Constituiçãode 1988, a Convenção 169 da OIT, a Lei 11.645/08, dentre outras.
Para se compreender a questão indígena é importante percebermos que, de-
vido às grandes transormações históricas, deve-se ter atenção a duas idéias,
descritas a seguir.
A primeira delas é acerca da dinâmica da cultura. Os povos indígenas não pos-
suem uma cultura estática ao contrário estão em constante transormação O índio
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suem uma cultura estática, ao contrário, estão em constante transormação. O índio
de hoje é um cidadão do seu tempo, usa jeans, celular, internet; é proessor, advo-gado, cientista; mora na cidade, na avela, na aldeia, na mata ao mesmo tempo em
que mantém suas tradições e culturas vivas.
Mesmo em contato com a sociedade não índia, os povos indígenas mantêm seus
costumes, suas crenças, suas organizações, suas tradições. Enm mantêm suas iden-
tidades, reconhecendo-se como dierentes da sociedade nacional.
No Brasil hoje, há cerca de 225 povos indígenas alantes de 180 idiomas dis-
tintos, tamanha é a diversidade cultural em nosso país. São povos que representamculturas, conhecimentos, crenças, artes, literaturas de acordo com seus espaços ge-
ográcos, políticos e sociais. O conhecimento da história e da cultura desses povos
possibilita reconhecermos a sua contribuição para a ormação da sociedade nacional.
Índios emergentes
No Brasil e na Bolívia, durante os últimos anos, aumentou a quantidade de povos
que passaram a reivindicar a condição de indígenas. São amílias miscigenadas e es-
poliadas de seus territórios que encontram no presente contexto histórico e político
condições avoráveis para a armação de suas identidades étnicas.
Nas últimas décadas esse enômeno surge com mais requência, devido ao avan-
ço dos estudos das histórias regionais, à ampliação e consolidação dos direitos indí-
genas e à atuação de organizações indígenas.
Etnogênese
Desde os anos de 1970, vêm se multiplicando os enômenos de etnogênese. Há registro
de 50 novos grupos com demandas para serem reconhecidos como indígenas em 15
estados no país, concentrados no Nordeste (vinte e dois no Ceará e cinco em Alagoas)
e no Norte (sete no Pará), dos quais se sabe muito pouco além das próprias demandas.As “emergências”, “ressurgimentos”, ou “viagens da volta” são designações al-
ternativas para etnogênese. Mesmo sendo um termo conceitualmente controvertido,
ainda assim, é usado para descrever a constituição de novos grupos étnicos.
Alguns obstáculos como a tradição legalista e os critérios de denição do que
deve ser um índio (naturalidade e imemorialidade) têm dicultado a implementação
de avanços teóricos e jurídicos no reconhecimento de povos indígenas resistentes
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de avanços teóricos e jurídicos no reconhecimento de povos indígenas resistentes.
Ao alarmos de etnogênese, estamos nos reerindo a um processo social e não aum tipo especíco e dierenciado de grupos indígenas. Depois do reconhecimento
dos grupos indígenas diante do movimento indígena, da sociedade regional e dos
órgãos públicos ociais, esses grupos devem deixar de ser contabilizados nas lista
dos emergentes, justamente por terem percorrido o mais ou menos longo, depen-
dendo de cada situação, processo de etnogênese.
Mas, um dos problemas em classicá-los como “emergentes”, “ressurgentes”,
“ressurgidos”, ou mesmo “remanescentes” consiste em não atentar para a dinâmicada história e da cultura.
Índios isolados
Os índios isolados também são conhecidos como povos em situação de isolamento
voluntário, povos ocultos, povos não contatados, entre outros. São assim chamadosos grupos com os quais a Funai não obteve contato. As inormações sobre eles são
heterogêneas, transmitidas por outros índios ou por regionais, além de indigenistas
e pesquisadores. Segundo Luciano (2006, p.51), são estimados 46 grupos isolados,
mas desses, apenas 12 oram conrmados pela Funai.
Pouco se sabe sobre esses povos: quem são, onde estão, quantos são e a lín-
gua que alam. Algumas poucas inormações reunidas baseiam-se em vestígios ou
depoimentos orais.
Das 46 evidências de grupos isolados, seis estão em terras indígenas próprias, isto
é, reconhecidas e/ou demarcadas para eles, quinze estão localizados em terras reco-
nhecidas para outros grupos e seis estão em terras indígenas não reconhecidas. A
demarcação de terras para esses povos é importante na medida em que se garantem
seus direitos e evitam-se ataques de mineradoras e madeireiras.
Para Luciano (2006, p. 52), os índios isolados em algum momento do passadotiveram contato com os não índios e optaram por reugiar-se em lugares distantes e
inóspitos com intuito de evitarem processos de dizimação de seus povos.
A Funai possui uma unidade para realizar estudos sobre localização e proteção
dos índios isolados chamado Departamento de índios isolados, que atua em rentes
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143
Fonte: Instituto Socioambiental
de expansão etno-ambiental, nas regiões de Cuminapanema (PA), Envira(AC), Rio
Guaporé(RO), Madeirinha (RO/MT), Vale do Javari e Purus(AM).
Os povos isolados abaixo oram contatados e protegidos pela Funai devido aos inúme-
ros problemas advindos da situação de contato, das epidemias e das invasões de suas terras:
◊ os Kanoê: contatados há cinco anos em Rondônia;
◊ os Akuntsu: contatados há cinco anos em Rondônia;◊ os Zoé: contatados desde 1989 pela Funai, no estado do Pará, pertencem ao
grupo tupi-guarani. Suas terras oram delimitadas entre os anos de 1996 e 1998.
◊ os Korubo: um grupo de 17 pessoas que se separaram dos demais e que perma-
necem em constante uga. Foram contatados na região do Vale do Javari, Amazonas
e são conhecidos como “índios caceteiros” por usarem bordunas como instrumento
de deesa e ataque contra os inimigos.
Conra as tabelas dos Índios
Isolados em TIs e o Quadro
Geral dos Povos Indígenas
no anexo da página 147.
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q g
Atividades
1) Desde o período colonial já existia uma grande diversidade de povos indígenas no
Brasil. Comente sobre alguns povos existentes.
2) Existe um consenso sobre as estatísticas dos povos indígenas hoje? A que sedeve essa variação?
3) Como a OIT dene povos indígenas?
4) No Brasil é correto armar que os índios são povos com um enótipo denido?
Como é trabalhado o conceito de povos indígenas em nosso país?
5) Por que os povos indígenas não podem ser compreendidos como povos do
passado e isolados?
6) Comente sobre os processos de etnogênese.
7) Pesquise sobre um povo indígena do seu estado. Relate um pouco de sua história,
seus costumes, sua cultura e seus problemas atuais.
Para saber mais sobre a temática indígena:
Reerências
OLIVEIRA, João P. de. ROCHA FREIRE, Carlos A. A presença indígena na ormação do
Brasil. Brasília: MEC/SECAD/LACED/ Museu nacional, 2006.
LUCIANO, Gersem dos S. O índio brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos
indígenas no Brasil de hoje. Brasília: MEC/SECAD/LACED, Museu Nacional, 2006.
SILVA, Aracy; L. GRUPIONI, Luís D. B. (orgs). A temática indígena na escola: novos subsídios
para proessores de 1º e 2º graus. 4. ed. São Paulo: Global, Brasília: MEC/MARI, UNESCO, 2004.
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145
TEAO, Kalna M.. LOUREIRO, Klítia. História dos índios do Espírito Santo. Vitória. Edi-
tora do Autor, 2009.
Sítios de pesquisa na Internet
http://temaindigena.blogspot.com/
http://www.sitesindigenas.blogspot.com/
CTI ( Centro de Trabalho indigenista): http://www.trabalhoindigenista.org.br/
ISA( Instituto socioambiental): http://www.socioambiental.org.br/
CIMI(Conselho indigenista missionário): http://www.cimi.org.br/
FUNAI(Fundação nacional do índio): http://www.unai.gov.br/
MEC (Ministério da educação): http://www.mec.gov.br/
Museu do Índio: http://www.museudoindio.org.br/
Museu Nacional do Rio de Janeiro: http://www.museunacional.urj.br/
Grupo de história indígena de John Monteiro: www.ich.unicamp.br/ihb
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146
Terras Indígenas Estado Situação Jurídica
Alto Tarauacá Acre Homologada e Registrada
Hi Merimã Amazonas Homologada
Igarapé Taboca do Alto Tarauacá Acre Com restrição de uso
Isolados em TIs reconhecidas para eles
Anexo
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147147
Jacareuba/Katawixi(quase integralmente dentro do Parque Nacio-
nal Mapinguari e com uma pequena parte dentro da Resex Ituxi) Amazonas Com restrição de uso
Kawahiva do Rio Pardo Mato Grosso Com restrição de uso
Massaco Rondônia Homologada e registrada
Piripkura: chamados de Piripicura pelos índios Gavião da TIIgarapé Lourdes. Esses índios se localizam na área entre os rios
Branco e Madeirinha, afuentes do Roosevelt,/MT. Já oram con-tatados dois índios, e parece existir mais um grupo sem contatode cerca 17 pessoas.
Mato Grosso Com restrição de uso
Riozinho do Alto Envira (Xinane) Acre Identicada e aprovada pela Funai
Tanaru Rondônia Com restrição de uso
Fonte: Instituto Socioambiental
TIs demarcadas e/ou homologadas para outros índios, também habitadas por índios isolados
Terras Indígenas Isolados Estado Situação Jurídica
Apiaká e
Em 1984, o antropólogo Eugenio Wenzel,que viveu mais de 15 anos com os índiosApiaká, inormou que havia notíciassobre a existência de um grupo de Apiakáque, depois de viver em contato com asociedade regional e sorer massacres no
MT e AM Em identicação
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14814
p
Apiaká isolados
g
período da borracha, no início do século XX, ugiu, aastando-se das margens dosrios maiores. Localiza-se na região dosrios Ximari e Matrinxã, entre os rios Teles
Pires e Juruena, no município de Apiacás/ MT e Apui/AM
MT e AM Em identicação
Alto Turiaçu, Kaapor e Tembé Isolados Guajá, no igarapé Jararaca MA Homologada e registrada
Arara do Rio Branco MT Homologada e registrada
ArariboiaGuajajara
Isolados Guajá MA Homologada e registrada
AripuanãCinta Larga MT e RO Homologada e registrada
CaruGuajajara
Isolados no Oeste da TI MA Homologada e registrada
Kampa e Isolados do Rio Envira, Ashaninka AC Homologada
Kaxinawá do Rio Humaitá AC Homologada e registrada
Kayapo Isolados Pituiaro, do grupo Kayapó PA Homologada e registrada
Continua
Terras Indígenas Isolados Estado Situação Jurídica
KoatinemoAssurini
Isolados PA Homologada e registrada
MenkragnotiIsolados Mengra Mrari, grupo Kayapó,que se separou dos Gorotire em 1938
PA Homologada e registrada
Isolados Masko no verão circulam entre
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14914
Mamoadate dos Yaminawa e Manchineri
Isolados Masko, no verão circulam entre
os rios Mamoadate e cabeceiras do Rio Purus, chamados de Masho-Piro, no Peru
AC Homologada e registrada
Rio Tea (isolados Maku) AM Homologada e registrada
Trombetas/Mapuera Wai Wai
Karaawyana isolados RO, AM e PA
Declarada
TumucumaqueTiriyó, Katxuyana,
Wayana e Apalai
PA e AP
Uru Eu Wau Wau Há pelo menos dois grupos isolados, anordeste e ao sul da TI
RO Homologada e registrada
Vale do Javari Vários grupos isolados: do Jandiatuba, doAlto Jutaí, do São José, do Quixitos, doItaquaí e Mayá
AM Homologada e registrada
Waimiri Atroari Isolados Piriutiti dentro e ora da TI RO e PA Registrada
Xikrin do Catetedos Xikrin
Segundo a antropóloga Isabelle Giannini,os Xikrin dizem que ao norte da TI, na re-gião do Rio Cinzento, vivem índios iguaisaos que encontraram, em 1987 em suasterras, um grupo de Araweté isolados
PA Homologada e registrada
Fonte: Instituto Socioambiental
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
1 Aikanã
Massaca, Tubarão, Co-
lumbiara, Mundé, Huari,Cassupá, Aikaná Aikaná RO180 (Vasconcelos, 2005)
2 Ajuru Tupari RO 94 (Funasa, 2006)
3 Akuntsu Akunt’su Tupari RO 5 (Funai, 2009)
4 Amanayé Amanaié, Araradeua Tupi-Guarani PA 87 (Correia de Assis, 2002)
5 Amondawa Tupi-Guarani RO 83 (Kanindé, 2003
6 Anacé CE
Quadro Geral dos Povos Indígenas
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15015
7 Anambé Tupi-Guarani PA 182 (2000
8 AparaiApalai, Apalay, Appirois,Aparathy, Apareilles,Aparai
Karib AP, PA 317 (Funasa, 2006)
9 Apiaká Apiacá Tupi-Guarani AM, MT, PA 1.000 (Tempesta, 2009)
10 Apinajé Apinaié, Apinajés, Apinayé Jê TO 1.525 (Funasa, 2006)
11 Apurinã Ipurina, Popukare Aruak-maipure AM, MT, RO 3.256 (Funasa, 2006)
12 Aranã MG 54 (Funasa, 2006)
13 Arapaso Arapasso, Arapaço Tukano AM 569 (Dsei/Foirn, 2005)14 Arapiuns PA
15 Arara Arara do Pará, Ukaragma Karib PA 271 (Funasa, 2006)
16Arara do RioAmônia
Apolima-Arara, AraraApolima
AC 278 (GT Funai, 2003)
17Arara do Rio Branco
Arara do Beiradão, Ararado Aripuanã
MT 209 (Cimi, 2005)
18
Arara
Shawãdawa
Arara do Acre,
Shawanaua Pano AC 332 (CPI/AC, 2004)
19 Araweté Araueté, Bïde Tupi-Guarani PA 339 (Funasa, 2006)
20 Arikapu Jabuti RO 32 (Funasa, 2009)
21 Aruá Mondé RO 92 (Funasa, 2009)
22 Ashaninka Kampa, Ashenika Aruak AC, Peru 869 (CPI/Acre, 2004)
23Asurini doTocantins Akuawa, Asurini Tupi-Guarani PA 384 (Funasa, 2006)
Continua
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
24
Asurini do
Xingu Assurini, Awaete Tupi-Guarani PA 124 (2006)
25 Atikum Aticum BA, PE 5.852 (Funasa, 2006)
26 Avá-CanoeiroCanoeiro, Cara-Preta,Carijó
Tupi-Guarani GO, MG, TO 16 (Funasa, 2006)
27 AwetiAwytyza, Enumaniá,Anumaniá, Auetö
Aweti MT 140 (2006)
28 Bakairi Bacairi, Kurã, Kurâ Karib MT 950 (Taukane, 1999)
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151151
Continua
29 Banawá Arawá AM 101 (Funasa, 2006)
30 Baniwa Baniva, Baniua, Curipa-co, Walimanai
AruakAM, Venezuela,Colômbia
5.811 (Dsei/Foirn, 2005)7.000 (2000)1.192 (1992)
31 Bará Bara tukano, Waípinõ-makã
Tukano AM, Colômbia1 (Dsei/Foirn, 2005)296 (1988)
32 Barasana Panenoá Tukano AM, Colômbia939 (1998)34 (Dsei/Foirn, 2005)
33 Baré Hanera Aruak AM, Venezuela 10.275 (Dsei/Foirn, 2005)2.790 (1998)
34 Borari PA
35 BororoCoxiponé, Araripoconé,Araés, Cuiabá, Coroados,
Porrudos, Boe Bororo MT 1.392 (Funasa, 2006)
36 Canela Ramkokamekrá,Apanyekrá
Jê MA 2.502 (Funasa, 2008)
37 Chamacoco Samuko MS, Paraguai 40 (Grumberg, 1994)1.571 (2002)
38 Charrua RS, Argentina40 (Prêmio Culturas Indíge-nas, 2007)676 (INAI, 2004)
39 Chiquitano Chiquito Chiquito MT, Bolívia737 (Funasa, 2006)55.000 (1995)
40 Cinta larga Matetamãe Mondé MT, RO 1.440 (Funasa, 2006)
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
41 CoripacoCuripaco, Curripaco,
KuripakoAruak AM 1.332 (Dsei/Foirn, 2005)
42 Deni Jamamadi Arawá AM 875 (Funasa, 2006)
43 Desana Desano, Dessano Tukano AM, Colômbia 2.204 (Dsei/Foirn, 2005)2.036 (1998)
44 Djeoromitxí Jaboti Jabuti RO 187 (Funansa, 2009)
45 Enawenê-nawê
Enauenê nauê, Salumã, Enawenê-nawê
Aruak MT 540 (Opan/Funasa, 2009)
46 Fulni-ô Ia-tê PE 3.659 (Funasa, 2006)
47Galibi doOiapoque Galibi, Kalinã Karib
AP, Guiana Francesa
66 (Funasa, 2006)2.000 (1982)
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152152
48 Galibi- Marworno Galibi do Uaçá, Aruá Creoulo AP 2.177 (Funasa, 2006)
49Gavião Parkatêjê
Gavião do Mãe Maria,Gavião Parakatejê, Ga-
vião do Oeste, Parkatejê Jê PA 476 (Funasa, 2006)
50Gavião Pykopjê
Gavião do Maranhão,Gavião Pukobiê, Gaviãodo Leste, Pykopcatejê
Jê MA 494 (Funasa, 2006)
51 Guajá Avá, Awá Tupi-Guarani MA, PA 283 (Funasa, 2005)
52 Guajajara Guajajara, Tenetehara Tupi-Guarani MA 19.471 (Funasa, 2006)
53Guarani Kaiowá
Pai-Tavyterã,Tembekuára
Tupi-Guarani MS, Paraguai31.000 (CTI, 2008)13.000 (CTI, 2008)
54 Guarani Mbya Guarani M’byá Tupi-Guarani
ES, PA, PR, RJ, RS, SC, SP,TO, Paraguai,Argentina
15.000 (CTI, 2008)5.500 (CTI, 2008)7.000 (CTI, 2008)
55Guarani
Ñandeva
Ava-Chiripa, Ava-Guara-
ni, Xiripa, Tupi-GuaraniTupi-Guarani
MS, PR, RS, SC,SP, Paraguai,Argentina
1.000 (CTI, 2008)13.000 (CTI, 2008)13.200 (CTI, 2008)
56 Guató Guató MT, MS (Funasa, 2008)
57 Hixkaryana Hixkariana Karib AM, PA, RR 631 (Funasa, 2006)
58 Ikolen Gavião de Rondônia,Gavião Ikolen, Digut
Mondé RO 523 (Kanindé, 2004)
59 Ikpeng Txicão, Ikpeng Karib MT 342 (Funasa, 2006)
60 Ingarikó Akawaio, Kapon Karib RR, Guiana Equatorial,
Venezuela
1.170 (Coping, 2007)4.000 (1990)
728 (1992)
Continua
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
61 Iranxe Ma-noki
Irantxe, Manoki Iranxe MT 356 (Funasa, 2006)
62 Jamamadi Yamamadi, Kanamanti Arawá AM 884 (Funasa, 2006)
63 Jarawara Jarauara Arawá AM 180 (Funasa, 2006)
64 Javaé Karajá/Javaé,Itya Mahãdu
Karajá GO, TO 1.456 (Funasa, 2009)
65Jenipapo- Kanindé
Payaku CE 272 (Funasa, 2006)
66 Jiahui Jahoi, Diarroi, Djarroi, Parintintin, Diahoi, Diahui, Kagwaniwa
Tupi-Guarani AM 88 (Funasa, 2006)
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67 Jiripancó Jeripancó, Geripancó AL 1.307 (Funasa, 2006)68 Juma Yuma Tupi-Guarani AM 5 (Peggion, 2002)
69 Ka’apor Urubu Kaapor, Kaapor Tupi-Guarani MA, PA 991 (Funasa, 2006)
70 Kadiwéu Kaduveo, Caduveo, Kadivéu, Kadiveo
Guaikuru MS 1.629 (Funasa, 2006)
71 Kaiabi Kayabi, Caiabi, Kaiaby, Kajabi, Cajabi
Tupi-Guarani MT, PA 1.619 (Funasa, 2006)
72 Kaimbé BA 710 (Funasa, 2006
73 Kaingang Guayanás Jê PR, RS, SC, SP 28.000 (Funasa, 2006)
74 Kaixana Caixana AM 505 (Funasa, 2006)
75 Kalabaça
76 Kalankó Cacalancó AL 390 (Funasa, 2009)
77 Kalapalo Karib MT 504 (Funasa, 2006)
78 Kamaiurá Kamayurá Tupi-Guarani MT 492 (Funasa, 2006)
79 Kamba MS
80 Kambeba Cambemba, Omaguá Tupi-Guarani AM 347 (Funasa, 2006)81 Kambiwá Cambiua PE 2.820 (Funasa, 2006)
82 Kanamari Canamari, Tukuna Katukina AM 1.654 (Funasa, 2006)
83 Kanindé
84 KanoêCanoe, Kapixaná,
Kapixanã Kanoe RO 95 (2002)
85 Kantaruré Cantaruré, Pankararu BA 493 (Funasa, 2006)
86 Kapinawa Capinawa PE 3.294 (Funasa, 2006)
87 Karajá Caraiauna, Iny Karajá GO, MT, PA, TO 2.532 (Funasa, 2006)
Continua
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
88 Karajá do Norte
Xambioá, Ixybiowa, Iraru Mahãndu, Karajá do Norte
Karajá TO 269 (Funasa, 2006)
89 Karapanã Muteamasa, Ukopinõpõna Tukano AM, Colômbia 63 (Dsei/Foirn, 2005)412 (1988)
90 Karapotó AL 2.189 (Funasa, 2006)
91 Karipuna de Rondônia
Ahé, Karipuna, Ahé Tupi-Guarani RO 14 (Azanha, 2004)
92 Karipuna doAmapá
Creoulo AP 2.235 (Funasa, 2006)
93 Kariri CE
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154154
94 Kariri-Xokó Cariri-xocó AL 1.763 (2000)
95 Karitiana Caritiana, Yjxa Arikén RO 320 (2005)
96 Karo
Arara de rondônia, ararakaro, arara tupi, ntoga-píd, ramaráma, urukú, eurumí, Il´târap
Ramarama RO 208 (Kanindé, 2006)
97 Karuazu AL 336 (Funasa, 2006)
98 Katuena Waiwai Karib AM, PA, RR 136 (Funasa, 2006)
99 Katukina do Rio Biá
Tukuna Katukina AM 450 (2007)
100 Katukina Pano
Pano AC 585 (Funasa, 2008)
101 Kaxarari Caxarari Pano AM, RO 322 (Funasa, 2009)
102 Kaxinawá Cashinauá, Caxinauá, Huni Kuin, huni kuin
Pano AC 4.500 (CPI/AC, 2004)
103 Kaxixó MG 256 (Funasa, 2006)104 Kaxuyana Caxuiana, Katxuyana Karib AP, AM, PA 230 (Funasa, 2006)
105 Kayapó
Kaiapó, Caiapó, Goro-tire, A’ukre, Kikretum,
Makragnotire, Kuben- Kran-Ken, Kokraimoro, Metuktire, Xikrin, Kararaô, Mebengokre
Jê MT, PA5.923 (Funasa, 2006)
106 Kinikinau Kinikinao, Guaná Aruak MS 250 (2005)
Continua
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
107 Kiriri Kariri BA 1.612 (Funasa, 2006)
108 Kisêdjê Suiá, Kisidjê Jê MT 351 (Funasa, 2006)
109 Koiupanká AL 1.263 (Funasa, 2009)
110 Kokama Cocama, Kocama Tupi-GuaraniAM, Peru,Colômbia
9.000 (CGTT, 2003)10.705 (1993)236 (1988)
111 Korubo Pano AM 26 (FPEVJ, 2007)
112 Kotiria Wanana Tukano AM, Colômbia735 (Dsei/Foirn, 2005)1.113 (1988)
113 Krahô Craô, Kraô, Mehin Jê TO 2.184 (Funasa, 2006)
114 Krahô-Kanela Jê TO 83 (Funasa, 2006)
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115 KrenakCrenaque, Crenac,
Krenac, Botocudos,Aimorés, Krén
Krenák MG, SP 204 (Funasa, 2006)
116 Krikati Kricati, Kricatijê, Põca-têjê, Kricatijê
Jê MA 682 (Funasa, 2005)
117 KubeoCubeo, Cobewa, Ku-béwa, Pamíwa
Tukano AM, Colômbia381 (Dsei/Foirn, 2005)4.238 (1988)
118 Kuikuro Kuikuru Karib MT 509 (Funasa, 2006)v
119 Kujubim Kuyubi Txapacura RO 55 (Funasa, 2006)120 Kulina Culina, Madiha, Madija Arawa AC, AM, Peru
3.500 (Dienst, 2006)450 (1998)
121 Kulina Pano Culina Pano AM 125 (Funasa, 2006)
122 Kuntanawa Kontanawa, Contanawa Pano AC 400 (Pantoja, 2008)
123 Kuruaya Xipáia-Kuruáia, Kuruaia Munduruku PA 129 (Funasa, 2006)
124 Kwazá Coaiá, Koaiá Koazá RO 40 (Van der Voort, 2008)
125 Maku
Macu, Yuhupde, Dow,
Nadob, Hupda. Bara, Kakwa, Kabori, Nukak
Makú AM, Colômbia2.603 (Dsei/Foirn, 2005)678 (1995)
126 Makuna Yeba-masã Tukano AM, Colômbia32 (Dsei/Foirn, 2005)528 (Colômbia, 1988)
127 Makurap Macurap Tupari RO 381 (Funasa, 2006)
128 Makuxi Macuxi, Macushi, Pemon Karib RR, Guiana Equatorial
23.433 (Funasa, 2006)9.500 (Guiana, 2001)
129 Manchineri Machineri Aruak AC 937 (CPI/AC, 2004)130 Marubo Pano AM 1.252 (Funasa, 2006)
Continua
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
131 Matipu Karib MT 103 (Funasa, 2006)
132 Matis Mushabo, Deshan Mikitbo
Pano AM 322 (2008)
133 Matsés Mayoruna Pano AM, Peru 1.592 (Funasa, 2006)1.000 (1988)
134 Maxakali Maxacalis, Monacó, Kumanuxú, Tikmuún, Kumanaxú - tikmu’ún
Maxakali MG 1.271 (Funasa, 2006)
135 Mehinako Meinaco, Meinacu, Meinaku
Aruak MT 227 (Funasa, 2006)
136 Menky Manoki
Munku, Menku, Myky, Manoki
Iranxe MT 356 (Funasa, 2006)
137 Mi l Mi l RO
7/14/2019 completo_Culturas+e+História+dos+Povos+Indígenas
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15615 Continua
137 Migueleno Miqueleno RO
138 Miranha Mirana Bora AM, Colômbia836 (Funasa, 2006)445 (Colômbia, 1988)
139 Mirity-tapuya Buia-tapuya Tukano AM 75 (Dsei/Foirn, 2005)
140 Munduruku Mundurucu Munduruku AM, MT, PA 10.896 (Funasa, 2009)
141 Mura Mura AM 9.299 (2006)
142 Nahukuá Naukwá, Nahkwá, Nauquá, Nahukwá
Karib MT 124 (Funasa, 2006)
143 Nambikwara
Nambiquara, Anunsu, Halotesu, Kithaulu, Wakalitesu, Sawentesu, Negarotê, Mamaindê, Latundê, Sabanê, Man-duka, Tawandê, Hahain-tesu, Alantesu, Waikisu,Alaketesu, Wasusu,Sararé, Waikatesu
Nambikwára MT, RO 1.682 (Renisi, 2008)
144 Naruvôtu Karib MT 78 (2003)145 Nawa Náua AC 423 (Correia, 2005)
146 Nukini Nuquini Pano AC 600 (Correia, 2003)
147 Oaié Oaié-Xavante Oayé MS 61 (Funasa, 2006)
148 Oro Win Txapacura RO 56 (Funasa, 2006)
149 Paiter Suruí Paiter, Paiter Mondé MT, RO 1.007 (Funasa, 2006)
150 Palikur
Paricuria, Paricores, Palincur, Parikurene,
Parinkur-Iéne, Païkwené, Pa’ikwené
AruakAP, Guiana
Francesa
1.293 (Iepé, 2010)
950 (Iepé, 2010)
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
151 Panará Kreen-Akarore, Kre-nhakore, Krenakore,Índios Gigantes
Jê MT, PA 374 (Yakiô, 2008)
152 Pankaiuká PE
153 Pankará PE
154 Pankararé BA 1.562 (Funasa, 2006)
155 Pankararu MG, PE 6.515 (Funasa, 2006)
156 Pankaru Pankararu-Salambaia BA 79 (Funasa, 2006)
157 Parakanã Tupi-Guarani PA 900 (Fausto, 2004)
158 Paresí Pareci, Halíti, Arití Aruak MT2.005 (AER Tangará daSerra, 2008)
159 Parintintin Cabahyba Tupi Guarani AM 284 (Funasa 2006)
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157157
159 Parintintin Cabahyba Tupi-Guarani AM 284 (Funasa, 2006)160 Patamona Ingarikó, Kapon Karib
RR, Guiana Equatorial
87 (Funasa, 2006)5.500 (1990)
161 Pataxó Maxacali BA, MG 10.897 (Funasa, 2006)
162 Pataxó Hã- Hã-Hãe
Maxakali BA 2.219 (Carvalho, 2005)
163 Paumari Pamoari Arawá AM 892 (Funasa, 2006)
164 Pipipã PE 1.640 (Funasa, 2006)
165 Pirahã Mura Pirahã Mura AM 389 (Funasa, 2006)
166 Pira-tapuya Piratapuya, Piratapuyo, Piratuapuia, Pira-Tapuya
Tukano AM, Colômbia1.433 (Dsei/Foirn, 2005)400 (1988)
167 Pitaguary Potiguara, Pitaguari CE 2.351 (Funasa, 2006)
168 Potiguara CE, PB 11.424 (Funasa, 2006)
169 Poyanawa Poianaua Pano AC 403 (CPI/AC, 2004)
170 Puroborá RO 62 (Funasa, 2006)
171 Rikbaktsa
Erigbaktsa, Canoeiros,
Orelhas de Pau, Rikbaktsá
Rikbaktsá MT 1.117 (Funasa, 2006)
172 SakurabiatSakiriabar, Mequéns,Sakurabiat
Tupari RO 84 (Funasa, 2006)
173 Sateré Mawé Sateré-Maué Mawé AM, PA 9.156 (Funasa, 2008)
174 Shanenawa Katukina Shanenawa,Shanenawa
Pano AC 361 (Funasa, 2006)
175 Siriano Tukano AM, Colômbia71 (Dsei/Foirn, 2005)
665 (1988)176 Suruí Aikewara, Sororós, Aikewara Tupi-Guarani PA 264 (Funasa, 2006)
Continua
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
177 Tabajara CE, MA
178 Tapayuna Beiço de pau Jê MT 58 (1995)
179 Tapeba Tapebano, Perna-de-pau CE 5.741 (Funasa, 2006)
180 Tapirapé Tupi-Guarani MT, TO 564 (Projeto Aranowayão,2006)
181 Tapuio Tapuya, Tapuia GO 180 (Funai/GO, 2006)
182 Tariana Aruak AM, Colômbia1.914 (PRN/ISA, 2002)205 (1988)
183 Taurepang Taulipang, Taurepangue,Taulipangue, Pemon
Karib RR, Venezuela582 (Funasa, 2002)20.607 (1992)
184 Tembé Tenetehara Tupi-Guarani MA, PA 1.425 (Funasa, 2006)
185 Tenharim Kagwahiva Tupi Guarani AM 699 (Funasa 2006)
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15815
185 Tenharim Kagwahiva Tupi-Guarani AM 699 (Funasa, 2006)186 Terena Aruak MT, MS, SP 24.776 (Funasa, 2009)
187 Ticuna Tikuna, Tukuna, Maguta TikunaAM, Peru, Co-lômbia
4.535 (1988)4.200 (1988)30.000 (CGTT, 2003)
188 Tingui Botó AL 302 (Funasa, 2006)
189 Tiriyó
Tirió, Trio, Tarona, Yawi, Pianokoto, Piano, Wütarëno, Txukuyana,
Ewarhuyana, Akuriyó
KaribAP, PA, Suri-name
1.156 (Funasa, 2006)1.400 (2001)
190 Torá Txapacura AM 312 (Funasa, 2006)
191 Tremembé CE 2.049 (Funasa, 2006)
192 Truká BA, PE 4.169 (Funasa, 2006)
193 Trumai Trumái MT 147 (Funasa, 2006)
194 Tsohom Djapá Tucano Katukina AM 100 (1985)
195 Tukano Tucano Tukano AM, Colômbia6.241 (Dsei/Foirn, 2005)6.330 (1988)
196 Tumbalalá BA 1.469 (Funasa, 2006)
197 Tupari Tupari RO 433 (Funasa, 2006)
198 Tupinambá Tupinambá de Olivença BA 4.729 (FUNASA, 2009)
199 Tupiniquim ES 1.950 (Funasa, 2006)
200 Turiwara PA 60 (1998)
201 Tuxá AL, BA, PE 3.927 (Funasa, 2006)
Continua
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
202 Tuyuka Tuiuca Tukano AM, Colômbia825 (Dsei/Foirn, 2005)570 (1988)
203 Umutina Barbados, Omotina Bororo MT445 (Associação Indígena
Umutina Otoparé, 2009)
204 Uru-Eu-Wau- Wau
Bocas-negras, Bocas-pretas, Cautários,Sotérios, Cabeça-ver-melha, Urupain, Jupaú,Amondawa, Urupain,
Parakuara, Jurureís
Tupi-Guarani RO 100 (Funasa, 2006)
205 WaimiriAtroari
Kinja, Kiña, Uaimiry,Crichaná
Karib AM, RR 1.120 (PWA, 2005)
206 Waiwai Hixkaryana, Mawayana,Karapayana Katuena Karib AM PA RR 2 914 (Zea 2005)
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206 Waiwai Karapayana, Katuena, Xerew
Karib AM, PA, RR 2.914 (Zea, 2005)
207 Wajãpi Wayapi, Wajapi, Oiampi Tupi-GuaraniAP, PA, Guiana
Francesa412 (1992)905 (Apina/Funai, 2008)
208 Wapixana Aruak RR, Guiana Equatorial
7.000 (Funasa, 2008)6.000 (Forte, 1990)
209 Warekena Werekena Aruak AM, Venezuela806 (Funasa, 2006)491 (1998)
210 Wari’ Uari, Wari, Pakaá Nova Txapacura RO 2.721 (Funasa, 2006)211 Wassu AL 1.560 (Funasa, 2003)
212 Waujá Waurá Aruak MT 410 (Funasa, 2006)
213 Wayana
Upurui, Roucouyen,Orkokoyana, Urucuiana,
Urukuyana, Alucuyana, Wayana
KaribAP, PA, Guiana
Francesa,Suriname
288 (Funasa, 2006)400 (1999)800 (1999)
214 Witoto Uitoto WitotoAM, Peru,
Colômbia
5.939 (1988)42 (Funasa, 2008)2.775 (1988)
215 Xakriabá Jê MG 7.665 (Funasa, 2006)
216 Xavante Akwe, A´uwe Jê MT 13.303 (Funasa, 2007)
217 Xerente Acuen, Akwen, Akwê Jê TO 2.569 (Funasa, 2006)
218 Xetá héta, chetá, setá Tupi-Guarani PR 86 (da Silva, 2006)
219 Xikrin Kayapó Jê PA 1.343 (Funasa, 2006)
Continua
NomesOutros Nomes ouGraas
Família/Língua UF (Brasil) Países Limítroes
PopulaçãoCenso/Estimativa
220 Xipaya Xipáya Juruna PA 595 (Funasa, 2002)
221 Xokleng
bugres, botocudos,Aweikoma, Xokrén,
Kaingang de Santa
Catarina, Aweikoma- Kaingang, Laklanõ
Jê SC 887 (Funasa, 2004)
222 Xokó Chocó, Xocó SE 364 (Funasa, 2006)
223 Xukuru Xucuru PE 10.536 (Funasa, 2007)
224 Xukuru-Kariri Xucuru AL, BA 2.652 (Funasa, 2006)
225 Yaminawá Iaminaua, Jaminawa PanoAC, AM, Peru,
Bolivia
855 (Funasa, 2006)324 (1993)630 (1997)
226 Yanomami Yanoama, Yanomani, Yanomami AM, RR, 15.682 (Funasa, 2006)
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1601
226 Yanomami a oa a, a o a ,Ianomami
Yanomami , , Venezuela
5.68 ( u asa, 006)15.193 (1992)
227 Yawalapiti Aruak MT 222 (Funasa, 2006)
228 Yawanawá Iauanaua PanoAC, Peru,
Bolivia
519 (Funasa, 2006)324 (1993)630 (1993)
229 Ye’kuana Yekuana KaribAM, RR,
Venezuela
430 (Moreira-Lauriola, 2000)4.800 (Rodriguez e Sar-miento, 2000)
230 Yudjá Yuruna, Juruna, Yudjá Juruna MT, PA 362 (Funasa, 2006)
231 Zo’é Poturu Tupi-Guarani PA 177 (2003)
232 Zoró Pangyjej Mondé MT599 (Funai/Ji-Paraná, 2008)
136 (Funai, 2007)
233 Zuruahã Índios do Coxodoá Arawá AM
Fonte: Instituto Socioambiental
8
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162
Klítia Loureiro1
Territorialidade epovos indígenas:
dados gerais sobre ademografa indígena
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163
Introdução
Nas últimas três décadas, boa parte das notícias divulgadas sobre os povos indígenas
oi e continua sendo acerca da questão de terras. Sem dúvida, essa é a maior proble-
mática na relação entre índios e não índios, o que leva algumas pessoas ao absurdo
de armar “que existem terras demais para índios”.
Cabe dizer que as maiores terras indígenas encontram-se na Amazônia, e cor-
rem o risco de, em muito pouco tempo, tornarem-se as únicas reservas forestais
do país. Não obstante, nas áreas mais “colonizadas”, principalmente na região
litorânea, os índios perderam quase tudo e lutam incansavelmente para recon-
quistar pelo menos parte de seus antigos territórios a m de garantir a mínima
sobrevivência de seu povo. Neste artigo apresentamos algumas questões que envolvem o confito entre
índios e não índios no que diz respeito à noção de território: o que vêm a ser
“terras de índio?”; Por que demarcá-las?; Qual o signicado para os povos in-
dígenas de território? Qual a relação dos índios com seus territórios ancestrais?
Como ocorre o direito ao território indígena nos marcos do Estado brasileiro?
Apresentamos também dados sobre a demograa indígena: quantos são os indí-
genas no Brasil do século XXI?
1 Mestre em História Social das
Relações Políticas pela Universida-
de Federal do Espírito Santo. Pes-
quisadora sobre a luta pela terra
indígena no Espírito Santo. Autora
do Livro “História dos índios do
Espírito Santo” (2009).
O que é terra indígena e por que demarcá-las
Objetivos: Refetir sobre o conceito de terra/território indígena a partir de uma visão
holística do ser humano, do mundo...
Realize uma leitura inicial do texto, azendo anotações para elaboração de uma
síntese. Registre suas reexões.
Para os povos indígenas, a terra representa
[...] muito mais do que simples meio de subsistência. Ela [a terra] representa o suporte
da vida social e está diretamente ligada ao sistema de crenças e conhecimento. Não é
apenas um recurso natural – e tão importante quanto este – é um recurso sociocultural.2
Em outras palavras, o território é condição para a vida dos povos indígenas,
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164
não somente no sentido de um bem material ou ator de produção, mas como o
ambiente em que se desenvolvem todas as ormas de vida. Território, portanto, é o
conjunto de seres, espíritos, bens, valores, conhecimentos e tradições que garantem
a possibilidade e o sentido da vida individual e coletiva. Ou ainda, a terra é um ator
undamental de resistência dos povos indígenas. É o tema que unica, articula e
mobiliza todos: as aldeias, os povos e as organizações indígenas, em torno de uma
bandeira de luta comum que é a deesa de seus territórios (LUCIANO, 2006, p. 101).
O território indígena “[...] é sempre a reerência à ancestralidade e a toda a or-
mação cósmica do universo e da humanidade. É nele que se encontram presentes e
atuantes os heróis indígenas, vivos ou mortos” (LUCIANO, 2006, p. 101).
Nesses termos, é possível conceituar terra como o espaço geográco que compõe
o território, em que esse é entendido como um espaço do cosmos, mais abrangente
e completo. Para os povos indígenas o território compreende
[...] a própria natureza dos seres naturais e sobrenaturais, onde o rio não é simplesmente o
rio, mas inclui todos os seres, espíritos e deuses que nele habitam. No território uma mon-
tanha não é somente uma montanha, ela tem signicado e importância cosmológica sa-
grada. Terra e território para os índios não signicam apenas o espaço ísico e geográco,
mas sim toda a simbologia cosmológica que carrega como espaço primordial do mundo
humano e do mundo dos deuses que povoam a natureza (LUCIANO, 2006, p. 1001-02).
2 FUNAI. O que é terra indígena.
Disponível em: <http://www.
unai.gov.br/indios>.
Acesso em: 12 jun. 2005.
Isso signica que os povos indígenas estabelecem uma estreita e prounda rela-
ção com a terra, de modo que a questão inerente a ela não se resolve com o apro-
veitamento do solo agrário, mas também no sentido de territorialidade. Para eles,
o território é o habitat onde viveram e vivem os antepassados e está ligado às suas
maniestações culturais e às tradições, às relações amiliares e sociais.
No entanto, é possível perceber no senso comum e no discurso cotidiano uma vi-
são equivocada sobre as terras indígenas já que essas, por exemplo, são apresentadas
como a antítese do desenvolvimento.
Um outro argumento que ainda hoje é bastante divulgado é que existem terras
“demais destinadas aos índios” no País. Mas, esses críticos se esquecem de que os
índios têm que tirar todo seu sustento da terra.
O antropólogo João Pacheco de Oliveira (1999, p. 162) adverte que é um equívoco
pensar o dilema indígena como se osse somente uma questão undiária capaz “[...]
de ser solucionada por meio de uma comparação implícita com o módulo rural e pelo
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165
controle de uma variável (a relação terra/índio medida em hectares, por exemplo)”.
Para Oliveira (1999) as terras indígenas devem ser pensadas como algo muito
particular em relação a outras guras undiárias, visto que resultam de uma comple-
xa rede entre uma cultura, um dado meio ambiente e uma política governamental.
Desse modo, as conexões entre a política indigenista e a preservação da diversidade
cultural são bastante conhecidas, e azem parte do imaginário político nacional,
arma o autor. Por sua vez, as conexões entre as culturas indígenas e os nichos
ambientais em que se inserem são pouco conhecidas do ponto de vista cientíco, da
mesma orma que são subestimadas do ponto de vista administrativo as interligações
entre política indigenista e ambiental.
Um outro ponto a ser considerado, segundo Oliveira (1999, p. 162) é a represen-
tação caricatural e preconceituosa que se tem das terras indígenas: terras que estão
“subtraídas” ao “desenvolvimento”. Nessa perspectiva, as terras indígenas devem ser
concebidas como bens da União e os recursos ambientais ali existentes como parte
integrante do território nacional. Todavia, por constituírem habitat de índios, essas
terras destinam-se exclusivamente à reprodução sociocultural dessas populações, de-
vendo, portanto, ser adequadas aos seus usos e costumes e covertidas em beneício
para seus habitantes tradicionais.
O ato é que a política indigenista que desde 1967 se encontra a cargo da Funai,
como na Lei n.o 6.001/733
, assim como o próprio interesse dos índios não prescre-
3A promulgação da Lei n.o 6.001,
de 19 de dezembro de 1973,
mais conhecida como Estatuto
do Índio, tinha por nalidade a re-
gularização da situação jurídica do
índio. De acordo com o Estatuto,
o índio é considerado uma pessoa
relativamente incapaz, por isso
deve ser tutelado pelo Estado.
vem que as terras indígenas estejam ora do sistema econômico nacional ou sejam o
seu contrário. O que ocorre é que o Estado, representado pelo órgão indigenista, não
possui conhecimento nem da especicidade das culturas nem da heterogeneidade
do meio ambiente, quanto mais da relação concretamente estabelecida entre esses.
Oliveira (1999, p. 163) ressalta:
Em vez de levantar alternativas novas e explorar as potencialidades deste [contato] –
como os conhecimentos acumulados sobre a natureza e as ormas de manejo utilizadas
pelos índios, articulando-os com ormas de exploração racional dos recursos ambientais
e uso de tecnologias de ponta –, o órgão indigenista, cerceado por sua precariedade
tecnocientíca e pelo anseio de denir normas homogeneizadoras, acaba por cingir-se
à mera presença protetora, em alguns casos agindo repressivamente e, em outros, por
iniciativas clientelísticas e paternalistas (como são os projetos econômicos da Funai4).
A denição de uma terra indígena, ou melhor, o processo político pelo qual o
4A Funai oi criada em 5 de
dezembro de 1967. A década de
1970 coincidiu com a criação
do Plano de Integração Nacional
(PIN) e a consequente implantação
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166
Estado reconhece os direitos de uma sociedade indígena sobre parte do território
nacional não pode ser concebido ou expresso conorme as orientações de um e-
nômeno natural. Longe de serem imutáveis, as áreas indígenas estão em constante
reormulação, com acréscimos, diminuições, junções e separações. Isso, escreve
Oliveira (1998, p. 291),
[...] não é algo circunstancial, que decorra apenas dos desacertos do Estado ou de ini-
ciativas espúrias de interesses contrariados, mas é constitutivo, azendo parte da própria
natureza do processo de territorialização de uma sociedade indígena dentro do marco
institucional estabelecido pelo Estado-Nacional.
Cabe lembrar que conceituar “terras de índio” remete-nos a uma denição ju-
rídica materializada em legislação especíca (Lei n.º 6.001/73, artigos 17 a 38 do
Estatuto do Índio). Trata-se do habitat de grupos que se reconhecem (e são reconhe-
cidos pela sociedade) e que mantêm um vínculo de continuidade com os primitivos
habitantes de nosso País.
Conorme Oliveira (1998), a noção de habitat sugere a necessidade de manu-
tenção de um território, no qual um grupo humano, atuando como sujeito coletivo
e uno, tenha condições de garantir a sua sobrevivência ísico-cultural. Trata-se,
portanto, de toda e qualquer parcela do território brasileiro ocupada e utilizada
(PIN) e a consequente implantação
de grandes projetos na Amazônia:
rodoviários (Transamazônica, Peri-
metral Norte, Cuiabá – Santarém,
Manaus – Boa Vista etc.), de colo-
nização (agrovilas), agrominerais,
agropecuários e industriais, por
grandes empresas nacionais e mul-
tinacionais. A implantação desses
projetos normalmente implicava
a ocupação de terras indígenas,
a matança de índios e de outras
pessoas deensoras da causa indí-
gena (padres, missionários etc.). A
omissão da Funai, no cumprimen-
to de seus deveres, avoreceu as
reações indígenas e o surgimento
de entidades e movimentos de
deesa ou de apoio ao índio, como
o Conselho Indigenista Missionário
(Cimi), em 1972; as Assembleias
de Chees Indígenas, em 1974 e
1975; a Associação Nacional de
Apoio ao Índio (Anai), em 1977,
e a União das Nações Indígenas
(UNI), em 1980.
em caráter permanente por uma sociedade indígena ou por um de seus segmentos
componentes, constituindo-se, desse modo, no habitat tradicional e na garantia de
reprodução socioeconômica desses grupos étnicos.
Para alcançar tal objetivo e no intuito de colocar a sua deesa diretamente no
âmbito de atuação do Estado, considerando-as merecedoras de cuidados especiais,
as terras indígenas são enquadradas como bens sob o domínio da União. Ao Estado
cabe o reconhecimento administrativo das terras indígenas, resguardando aos índios
a posse permanente e o usuruto exclusivo das riquezas ali existentes.
Em outros termos, embora os índios detenham a posse permanente e o “usu-
ruto exclusivo de todas as riquezas” existentes em suas terras, conorme o Pará-
grao único do artigo 22 da Lei no 6.001/73, elas constituem patrimônio da União.
Como bens públicos de uso especial, além de inalienáveis e indisponíveis, as terras
indígenas não podem ser objeto de utilização de qualquer espécie por outros que
não os próprios índios.
d dí é á d d l l
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O direito indígena é originário, pois decorre de sua conexão sociocultural com
povos pré-colombianos que aqui habitavam. Tal direito não procede do reconheci-
mento pelo Estado (nem é anulado pelo não reconhecimento), mas é consequência
do próprio ato da sobrevivência atual dos grupos humanos que se identicam por
tradições ancestrais e que se consideram como etnicamente dierenciados de outros
segmentos da sociedade nacional (OLIVEIRA,1998, p. 45).
Nesses termos, é condição necessária e suciente a existência de uma coletivida-
de que se identica como indígena e cuja reprodução exige uma relação regular com
um conjunto de recursos ambientais ancorados em um dado espaço ísico. É para
tais grupos humanos, ressalta Oliveira (1998, p. 45),
[...] que a lei prescreve direitos undiários especícos, cuja destinação cabe ao Estado
garantir. Promover a demarcação da terra indígena é tarea da União, reconhecendo
administrativamente o habitat de um grupo ou comunidade tribal, viabilizando a con-
tinuidade econômica e sociocultural daquela coletividade.
Ainda que o processo de regularização das terras indígenas seja conhecido como
demarcação, essa é apenas uma das ases administrativas do processo. As ases que
compõem o processo de legalização de terras indígenas são quatro: Identicação e
Delimitação, Demarcação, Homologação e Regularização.
Atividades
Realize as atividades abaixo. O objetivo é o aproundamento da leitura do texto.
Atividade 1
◊ Elabore uma síntese das principais ideias apontadas no texto.
◊ Pesquise sobre as ases que compõem o processo de legalização de terras indíge-
nas. Contextualize o caso do estado do Espírito Santo.
Atividade 2
◊ Que novo olhar podemos lançar sobre a noção de território, a partir da leitura do artigo?
O direito ao território indígena nos marcos do estado brasileiro
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O direito ao território indígena nos marcos do estado brasileiro
Objetivo: Refetir acerca da noção de território indígena nos marcos do Estado brasileiro.
A priori , é preciso compreender que a territorialidade, segundo os povos
indígenas, não deve ser entendida no mesmo sentido com que um Estado so-
berano impera e controla o seu território, já que a eles não interessa a ideia de
Estado próprio. Isto porque trata-se de sociedades sem Estado ou até mesmo
contra o Estado, no sentido de que internamente negam a orma de poder
absoluta e centralizada “nas mãos” de uma estrutura política que não seja a
própria coletividade étnica como um todo, em que ninguém tem procuração
para representá-la. A territorialidade indígena não tem relação com soberania
política, jurídica e militar sobre um espaço territorial, como existe em um Esta-
do soberano. Tem relação com um espaço socionatural necessário para se viver
individual e coletivamente.
O direito ao território nos marcos do Estado brasileiro supõe, portanto, que
os povos indígenas brasileiros demandem “espaço étnico” para seu desenvolvi-
mento como povos, e não somente como cidadãos individualizados. A delimi-
tação territorial supõe ixação de limites para que neles os índios desenvolvam
seus costumes, culturas e seus modos de autogoverno e jurisdição. É isso que
as autoridades não índias não entendem quando repetem constantemente a
ideia equivocada de que no Brasil “há muitas terras para poucos índios”, como
se aos índios tivessem que ser concedidas terra, do mesmo modo que há es-
paços necessários para os que vivem em cidades ou no campo, guiados por
outras ormas de relação com a terra. Os povos indígenas precisam de espaços
suicientes de terras para caçar, pescar e desenvolver suas tradições culturais
e seus rituais sagrados que só podem ser praticados em ambientes adequados– dierente dos não índios ocidentais, que vivem em casas e apartamentos
patrimonialmente individualizados e por meio de empregos, de comércio, de
bancos, de outras atividades que não exigem espaço territorial amplo e coletivo
(LUCIANO, 2006, p. 103-104).
Quantos são os povos indígenas no brasil do século XXI?
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Segundo estimativas, quando Cristóvão Colombo chegou ao continente americano,
em 1492, viviam por aqui pelo menos 250 milhões de pessoas, que oram denomi-
nadas de índios. Relatos de cronistas e historiadores da época calculavam que apenas
na região do atual México habitavam mais de 30 milhões de índios.
Apesar de todo tipo de violência implementada pelos invasores europeus, os
povos indígenas somam atualmente mais de 50 milhões de pessoas espalhadas por
todos os países do continente americano.
Relatório divulgado pelas Nações Unidas5 (2010) indica que nos dias atuais os
povos indígenas constituem uma população de cerca de 370 milhões de pessoas
(em torno de 5% do total mundial) e representem 5.000 culturas distintas. Juntos,
ocupam cerca de 20% do território do planeta, distribuídos por 90 países.
São povos que representam culturas, línguas, conhecimentos e crenças únicas,
e sua contribuição ao patrimônio mundial – na arte, na música, nas tecnologias,
nas medicinas e em outras riquezas culturais – é incalculável. Eles conguram uma
enorme diversidade cultural, uma vez que vivem em espaços geográcos, sociais e
políticos dierenciados. A diversidade, a história de cada povo e o contexto em que
vivem criam diculdades para enquadrá-los em uma denição única. Os próprios
indígenas, em geral, rejeitam as tentativas exteriores de retratá-los e deendem como
princípio undamental o direito à autodenição.
5A primeira publicação da ONU so-
bre a situação dos povos indígenas
do mundo, produzida pelo Secreta-
riado do Fórum Permanente sobre
Questões Indígenas das Nações Uni-
das, oi lançada em 14 de janeiro de
2010 , no Rio de Janeiro e também,
simultaneamente, em Nova York,
Bruxelas, Camberra, Manila, México,
Moscou, Pretória e Bogotá.
O documento destaca que devido a
uma série de atores como o anala-
betismo, o desemprego e a discrimi-
nação “a comunidade indígena está
associada a ser pobre”.
Demograa Indígena no Brasil (1500-2010)
O Brasil [...] desconhece e ignora a imensa sociodiversidade nativa contemporânea dos
povos indígenas. Não se sabe ao certo sequer quantos povos nem quantas línguas nativas
existem. O (re)conhecimento, ainda que parcial dessa diversidade, não ultrapassa os res-
tritos círculos acadêmicos especializados. Hoje, um estudante ou um proessor que quiser
saber algo mais sobre os índios brasileiros contemporâneos, aqueles que sobraram depois
dos tapuias, tupininquins e tupinambás, terá muitas diculdades (RICARDO, 1995, p. 30).
Estimativas indicam que, por volta de 1500, quando Pedro Álvares Cabral apor-
tou em terras brasileiras viviam por aqui pelo menos 5 milhões de índios. Hoje,
segundo dados do Instituto Brasileiro de Geograa e Estatística (IBGE/2000) essa
população está reduzida a aproximadamente de 700.000 índios.
A Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa),
por sua vez trabalham com dados ineriores: pouco mais de 500 000 índios Mas por
6Alguns especialistas criticam
o método adotado pelo IBGE.
Justicam suas críticas armando
que o IBGE chegou ao total de
734.131 indivíduos por meio do
quesito cor de pele, e não por
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por sua vez, trabalham com dados ineriores: pouco mais de 500.000 índios. Mas por
que essa dierença? Na verdade, essa dierença é resultado dos dierentes métodos
utilizados para a obtenção de dados. A Funai e a Funasa, por exemplo, trabalham
apenas com as populações indígenas reconhecidas e registradas por elas, geralmente
as populações habitantes de aldeias localizadas em terras indígenas reconhecidas
ocialmente. Ou seja, o grande número de indígenas que atualmente reside nas ci-
dades ou em terras indígenas ainda não demarcadas ou reconhecidas, mas que nem
por isso deixam de ser índios, estão ora das estatísticas.
O IBGE, por sua vez, utilizou o método de autoidenticação6 para chegar aos seus
números. Além disso, ainda existem povos indígenas brasileiros que estão ora desses
dados, inclusive os do IBGE, e que são denominados “índios isolados7”, ou índios ainda
em vias de rearmação étnica após anos de dominação e repressão cultural.
Estimativas atentam para a existência de cerca de 190 mil índios vivendo ora
das terras indígenas, inclusive em áreas urbanas. Há também 63 reerências de índios
ainda não contatados, além de existirem grupos que estão requerendo o reconheci-
mento de sua condição indígena junto ao órgão ederal indigenista.
Os dados da Funasa (2008) são importantes no que se reerem às inormações
sobre as populações indígenas que vivem nas terras indígenas. Segundo dados do
Sistema de Inormação de Atenção à Saúde Indígena/SIASI/FUNASA, o contingente
populacional habitante das terras indígenas reconhecidas pelo governo brasileiro e
meio da autoidenticação étnica.
7Sabe-se muito pouco sobre os cha-
mados índios isolados - também
conhecidos como povos em situação
de isolamento voluntário, povos
ocultos, povos não contatados,
entre outros. São assim chamados
aqueles grupos com os quais a
Funai não estabeleceu contato.
As inormações sobre eles são
heterogêneas e escassas - trans-
mitidas por outros índios ou por
regionais, além de indigenistas e
pesquisadores. Por vezes, vestígios
como tapiris, fechas e outros
objetos encontrados nas áreas por
onde passaram são otograados.
Os relatos verbais de existência
desses grupos são geralmente
ornecidos por outros índios e
regionais mais próximos, que
narram encontros ortuitos, ou
que simplesmente reproduzem
inormações de terceiros.
cadastrado pelo Sistema é de 538.154 índios, distribuídos em 4.413 aldeias, per-
tencentes a 291 etnias e alantes de mais de 180 línguas divididas por 35 grupos
linguísticos (Funasa. Demograa dos povos indígenas).
A população indígena encontra-se dispersa por todo o território brasileiro,
distribuída em 24 estados, 432 municípios, 336 pólos de base. Na região Nor-
te encontramos o maior contingente populacional indígena, com 44%, e na
região Sudeste está o menor contingente populacional indígena do país, comapenas 2% (FUNASA).
No estado do Amazo-
nas concentra-se a maior
população indígena do
país: são aproximada-
mente 291.817 indivídu-
os, ou seja, 54,2% desta
população. Por outro
Gráco. Distribuição da populaçãoindígena por região no Brasil, 2008.
SUDESTE
2%
NORDESTE
NORTE
44%
SUL
9%
CENTRO-
OESTE
19%
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população. Por outro
lado o estado de Sergipe
apresenta uma população
de apenas 410 índios vivendo em terras indígenas. O estado do Mato Grosso do
Sul se destaca como o segundo maior estado com número de população indígena
com cerca de 70.537 índios (FUNASA).
Atividade
◊ Pesquise na internet o Relatório das Nações Unidas (2010) “sobre os povos indíge-
nas” e aponte as principais questões abordadas no documento.
Localização e extensão das terras indígenas
Objetivo: Identicar a localização e a extensão das terras indígenas no território brasileiro.
O Brasil possui uma extensão territorial de 851.196.500 hectares, o que corres-
ponde a 8.511.965 km2. As terras indígenas (TIs) somam 615 áreas (64,2% regula-
Fonte: Siasi/Funasa26%
rizadas e 18,5% ainda em estudo) ocupando uma extensão total de 107.000.000
de hectares). Em outros termos, 12,6% das terras do País são reservadas aos povos
indígenas (Siasi/Funasa/2008).
A maior parte das TIs concentra-se na Amazônia Legal: são 409 áreas, 108.720.018
hectares, representando 21.67% do território amazônico e 98.61% da extensão de
todas as TIs do País. O restante, 1.39%, espalha-se pelas regiões Nordeste, Sudeste,
Sul e pelo estado do Mato Grosso do Sul. Essa situação de fagrante contraste pode ser explicada pelo ato de a coloni-
zação do Brasil ter sido iniciada pelo litoral, o que levou a embates diretos contra
as populações indígenas que aí viviam, causando enorme depopulação e desocu-
pação das terras, que hoje estão em mãos da propriedade privada. Aos povos in-
dígenas restaram terras diminutas, conquistadas com muita luta. Por exemplo, em
São Paulo, a terra Guarani Aldeia Jaraguá tem apenas dois hectares de extensão, o
que impossibilita que os índios vivam da terra. Em outras palavras, na maioria das
vezes, as TIs têm grandes áreas não agricultáveis, e sorem ou soreram diversos
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172
, g g ,
tipos de impactos.
Atividade 1
◊ Assista ao lme “Avatar” e a partir de suas refexões e das leituras realizadas, elabore um
texto apontando que relação é possível estabelecer entre a “cção” e a realidade dos povos
indígenas nos últimos 500 anos de “colonização”.
Avatar
EUA , 2009 - 162 minutos
Ação / Aventura / Ficção cientíca
Direção e Roteiro: James Cameron
Atividade 2
◊ Leia o texto abaixo com bastante atenção. Após a leitura, é possível armar que a
concepção de mundo, de sociedade, de indivíduo e de educação para índios e não
índios é a mesma? Justique sua resposta.
A milenar arte de educar dos povos indígenasDaniel Munduruku8
Educar é dar sentido. É dar sentido ao nosso estar no mundo. Nossos corpos preci-
sam desse sentido para se realizar plenamente. Mas também nossos corpos são vazios
de imagens e elas precisam azer parte da nossa mente para que possamos dar respostas
ao que se nos apresenta diuturnamente como desaos da existência. É por isso que não
basta dar alimento apenas ao corpo, é preciso também alimentar a alma, o espírito. Sem
comida o corpo enraquece e sem sentido é a alma que se entrega ao vazio da existência.
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A educação tradicional entre os povos indígenas se preocupa com esta tríplice
necessidade: do corpo, da mente e do espírito. É uma preocupação que entende o
corpo como algo prenhe de necessidades para poder se manter vivo.
Esta visão de educação é sustentada pela ideia de que cada ser humano precisa
viver intensamente seu momento. A criança indígena é, então, provocada para ser
radicalmente criança. Não se pergunta nunca a ela o que pretende ser quando crescer.
Ela sabe que nada será se não viver plenamente seu ser inantil. Nada será porque já
é. Não precisará esperar crescer para ser alguém. Para ela é apresentado o desao de
viver plenamente seu ser inantil para que depois, quando estiver vivendo outra ase
da vida, não se sinta vazia de inância. A elas são oerecidas atividades educativas para
que aprenda enquanto brinca e brinque enquanto aprende num processo contínuo
que irá azê-la perceber que tudo az parte de uma grande teia que se une ao innito.
Num mesmo movimento ela vai sendo introduzida no universo espiritual. Em-
balada pelas histórias contadas pelos velhos da aldeia, a criança e o jovem passam a
perceber que em seu corpo moram os sentidos da existência. Este sentido é oerecido
pela memória ancestral concentrada nos velhos contadores de histórias. São eles que
atualizam o passado e o azem se encontrar com o presente mostrando à comunida-
de a presença do saber imemorial capaz de dar sentido ao estar no mundo.
Este processo todo é alimentado por rituais que lembram o passado para signicar
8 Daniel Munduruku é indígena ,
escritor, graduado em Filosoa e
Doutorando em Educação na Uni-
versidade de São Paulo. Diretor-
Presidente do Instituto Indígena
Brasileiro para Propriedade Inte-
lectual - INBRAPI - e Comendador
da Ordem do Mérito Cultural da
Presidência da República.
o presente. São movimentos corpóreos embalados por cantos e danças repetidos mui-
tas vezes com o objetivo de “manter o céu suspenso”. A dança lembra a necessidade
de sermos gratos aos espíritos criadores; contam que precisamos de sentidos para viver
dignamente; ordena a existência. Cada grupo de idade ritualiza a seu modo. Cada um
se sente responsável pelo todo, pela unidade, pela continuidade social.
Educar é, portanto, envolver. É revelar. É signicar. É mostrar os sentidos da
existência. É dar presente. E não acaba quando a pessoa se “orma”. Não existe or-matura. Quem vive o presente está sempre em processo.
É por isso que a criança será sempre criança. Plenamente criança. Essa é a garantia
de que o jovem será jovem no seu momento. O homem adulto viverá sua ase de vida
sem saudades da inância, pois ele a viveu plenamente. O mesmo diga-se dos velhos.
O que cada um traz dentro de si é a alegria e as dores que viveram em cada momento.
Isso não se apaga de dentro deles, mas é o que os mantém ligados ao agora.
Resumo: A educação tradicional indígena tem dado certo. As pessoas se sentem
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completas quando percebem que a completude só é possível num contexto social,
coletivo. Cada ase porque passa um indígena – desde a mais tenra idade – alimenta
um olhar para o todo, pois o conhecimento que aprendem e vivem é um saber ho-
lístico que não se desdobra em mil especialidades, mas compreende o humano como
uma unidade integrada a um Todo maior e Único.
Olhar os povos indígenas brasileiros a partir de uma visão rasa de produção, de
consumo, de riqueza e pobreza é, no mínimo, esvaziar os sentidos que buscam para si.
Pense nisso.
Reerências
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15 de maio de 2009. Disponível em: <http://www.overmundo.com.br/pers/daniel-
munduruku>. Acesso em: jan. 2010.
Filme indicado
“BirdWatchers - a Terra dos Homens Vermelhos”
Título Original: BirdWatchers - La terra degli uomini rossi.
2008. Drama. 104m
Mato Grosso do Sul, Brasil, hoje. Os azendeiros têm
uma vida rica e cheia de diversão. Possuem plantações
transgénicas que se perdem de vista e passam os serões com os turistas vindos para
ver os pássaros - Birdwatchers. Contudo, nos limites das suas propriedades cresce o
descontentamento por parte dos Índios, antigos proprietários legítimos das terras.
O suicídio de mais um jovem da reserva catalisa o confito entre estes dois mundos
opostos. No entanto, reside a “curiosidade do outro”. Uma curiosidade que aproxi-
mará o jovem aprendiz de xamã, Osvaldo, e a lha de um azendeiro.
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Tupi, por excelência, extintos, de preerência!
Pensar criticamente a(s) política(s) indigenista(s) exige considerar os projetos dos
Arlete Maria Pinheiro Schubert1
O movimento indigenista eo movimento indígena noBRASIL: o caso Tupinikim eGuarani no Espírito Santo
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Pensar criticamente a(s) política(s) indigenista(s) exige considerar os projetos dos
segmentos da elite brasileira, que se sentia arontada pela ideia da “mestiçagem”
em debate desde a metade do século XIX. Portanto, aremos algumas digressões ao
discorrer sobre o tema, traçando um breve esboço do debate literário do Romantismo
que tomava para si o tema do indianismo e suas implicações com o que oi consi-
derado problema indígena.
Quanto ao indianismo, entendemos que deve ser considerado porque diz respeito
a nossa pretendida indianidade . O indianismo oi uma expressão do Romantismo,
idealizadora dos índios, eita a partir da literatura e que infuenciou toda uma gera-
ção de escritores brasileiros que descobriu nela (no aã de estabelecer uma literatura
própria), o potencial da cção indianista. Na literatura indianista, o índio é represen-
tado como o mito de undação nacional, de preerência o Tupi. Certamente, trata-
se de um índio idealizado, literalmente pintado nos quadros e romances da época,
portanto, compatível com os valores e padrões de comportamento da civilização eu-
ropeia, estereótipo muito presente ainda hoje no imaginário brasileiro. Interessante
que se observados à luz do processo colonizador, indianismo e indigenismo ganham
conotação de compartilhamento de colonialidade. Nesse sentido, ambos se reerem à
subordinação, hierarquização e/ou subordinação das dierenças e, portanto, negam
a igualdade da diversidade. 1 Mestre em Educação/Ues.
Na perspectiva literária do Romantismo, o indianismo, que assemelhava indígenas
e europeus, rivalizou com as narrativas construídas a partir das perspectivas conside-
radas cientícas (e nem por isso menos “ccionais”), que caram a cargo do Instituto
Histórico e Geográco Brasileiro (IHGB), undado em 1838. Discutia-se o que é ser
“brasileiro”, e as vozes mais potentes eram aquelas que apregoavam um nacionalismo
exclusivamente branco, excluindo índios e negros (entre essas, encontramos a voz orte
de Francisco Adolo Varnhagen, sócio correspondente do IHGB, em 1841).Gonçalves Dias, poeta e romancista brasileiro, também um estudioso da Histó-
ria do Brasil oi nomeado para o IHGB e desde 1846, integrou comissões e expe-
dições de reconhecimento das riquezas e populações do território brasileiro, tendo
sido encarregado de um dos trabalhos etnográcos que tinha como missão estudar
os índios, considerando três quesitos: aspectos ísicos, moral e social; conhecer a
opinião deles sobre os brancos e buscar documentação sobre a história do Brasil
nos cartórios provinciais. Para Carneiro Cunha (2002), o debate que aconteceu a partir do m do século
XVIII até o século XIX, dizia respeito às ações a serem desenvolvidas em relação aos
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XVIII até o século XIX, dizia respeito às ações a serem desenvolvidas em relação aos
índios. No undo se perguntavam, se deviam “exterminar os índios ‘bravos’, ‘desine-
tando’ os sertões – solução em geral propícia aos colonos — ou, se cumpria civilizá-
los e incluí-los na sociedade política – solução em geral propugnada por estadistas
e que supunha a sua possível incorporação como mão-de-obra. Ou seja, em termos
da época, se deveriam usar de brandura ou de violência” (CARNEIRO CUNHA, 2002,p.134). A autora conclui tratando das consequências desse debate, cujas práticas
não deixam dúvidas, “pois tratava mesmo de orma teórica, da humanidade ou ani-
malidade dos índios”, questão já anunciada desde o século XVI.
Dierente do século XVI , em que se havia perguntado se os indivíduos encontra-
dos no novo continente tinham ou não alma (mas não parece ter duvidado de que se
tratavam de homens e mulheres realmente), No século XIX não houve escrúpulos em
se questionar se “eram humanos ou animais” aqueles seres com os quais tratavam.
Foi por meio do cienticismo do século XIX que se ousou demarcar as ronteiras
entre humanos e antropóides. Blumenbach, um dos undadores da antropologia
ísica, analisou o crânio de um Botocudo e o classicou a meio caminho entre o
orangotango e o homem. Presença constante no pensamento brasileiro, essa questão
atravessou a tradição antropológica da segunda metade do século XIX, eivada de
depreciações que se arraigaram proundamente no imaginário nacional.
O Museu Nacional oi outra instituição a partir da qual vários estudos oram es-
timulados. Apresentou pesquisas não somente a respeito dos “primitivos habitantes
do Brasil”, mas da mestiçagem e, enm, do que podíamos antever para o uturo
do povo brasileiro. Nessa época era comum, a partir da recém-criada antropologia
ísica, “inerir atributos intelectuais e morais dos indivíduos a partir dos estudos de
características ísicas” (SANTOS, 2002, p. 114).
Portanto, comparecem vários estudos com a disseminação de abundantesargumentos alimentando “as convicções acerca da desigualdade entre as raças”
(SANTOS, 2002, p.144).
Tais estudos, baseados em detalhes de descrições da morologia e das medições dos
ossos, em seu conjunto, tinham por objetivo, de acordo com um de seus autores, construir
“[...] uma história do homem óssil no Brasil (LACERDA, citado por SANTOS, 2002, p. 116).
Naquele momento, respaldado por várias pesquisas cienticas, ganhava ares de
ciência no imaginário nacional o contraste entre índio histórico, matriz da naciona-lidade - tupi por excelência, extinto de preerência -, e o índio contemporâneo, in-
tegrante das ‘hordas selvagens’ errantes pelos sertões, incultos. A primeira categoria
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g g p , p g
(índios históricos) seria a dos Tupi e Guarani, que guravam na auto imagem que
o Brasil pretendia azer de si, enquanto a segunda (índio contemporâneo) seria os
genericamente denominados Botocudo ou Tapuia, contraponto e inimigos dos Tupi
na história inicial da Colônia.
Varnhagen, em 1867, citado um discurso do senador Dantas de Barros Leite, escreveu:
No Reino animal, há raças perdidas; parece que a raça índia, por um eeito de sua
organização ísica, não podendo progredir no meio da civilização, está condenada a
esse desecho. Há animais que só podem produzir e progredir no maio das trevas; e se
os levam para a presença da luz, ou morrem ou desaparecem. Da mesma sorte entre
as raças humanas, o índio parece ter uma organização incompatível com a civilização
(VARNHAGEN, citado por CARENEIRO da CUNHA, 2002, p. 135).
Parece-nos que esses oram alguns dos suportes “cientícos”, a partir dos quais
oram modeladas e armadas algumas ideias e pré-conceitos que hoje se constituem
como senso comum a respeito dos indígenas na sociedade brasileira, entre esses:
bárbaros, animais, erozes, desprovidos de cultura, preguiçosos, vadios, inaptos,
inantis, degenerados, e outros desqualicativos, nossos velhos conhecidos.
Políticas indigenistas
No Brasil do século XIX, podemos identicar três regimes políticos, embora dois ter-
ços desse século se congurem como Império, esse inicia ainda na Colônia e termina
na República Velha. Inicia-se com pleno tráco negreiro e termina com as grandes
levas de imigrantes livres chegando ao Brasil. É um período de tensões entre oligar-
quias locais e surtos de centralização de poder. No século XIX, a questão indígena adquire outros contornos, e torna-se essen-
cialmente uma questão de terras, passando a ser discutida como política geral a ser
adotada no Brasil, pois o índio era cada vez menos essencial como mão de obra.
Entretanto, ainda persistia a discussão se os índios apresentavam ou não indicio de
apereiçoamento, se deviam ser aniquilados ou integrados à sociedade brasileira etc.
(CARNEIRO DA CUNHA, 2002)
Havia também vozes dissonantes que se opunham à ideia do simples extermíniodos índios. Lembremos dos debates e dos projetos então preparando a Constituição
de 1822, sendo o de José Boniácio o mais célebre, embora hoje se constate que
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não varia a ladainha. As suas considerações sob o título “ Apontamentos para a
civilisação dos índios bravos do Império do Brazil ”, tratando da “sujeição ao jugo
da lei e do trabalho, tratando de aldeamentos”, não oram incorporados ao projeto
constitucional (CARNEIRO DA CUNHA, 2002, p. 138). Outros documentos oram
apresentados dizendo-se reconhecer a premência do tema, mas nunca oram toma-das “medidas mais amplas e permanentes” reerentes à questão, como solicitado. O
Regulamento das Missões, promulgado em 1845, é considerado como o único do-
cumento indigenista geral do Império, mesmo assim, é considerado um documento
mais administrativo que político.
Em 1870, uma experiência de Couto de Magalhães, no vale do rio Araguaia, oi
reconhecida pelo governo, que pretendeu estendê-la a outras localidades. Seguia uma
diretriz que preconizava o abandono da política de concentração e aldeamento dos
índios, e previa a criação de um internato para crianças indígenas, obtidas a troca de
erramentas, e destinadas a serem “intérpretes” linguísticas e culturais e a levarem,
juntamente com os missionários, a civilização aos seus parentes. O governo chegou a
preparar um programa de ensino Nheegantu, mas na última década do Império não se
ouvirá mais alar no assunto. (CARNEIRO DA CUNHA, 2002, p. 140). Nessas tentativas
já se apresenta a concepção integracionista que ocialmente se armará mais tarde.
Os positivistas também sinalizavam com proposta de uma política indigenista
que osse mais respeitosa. Em seu projeto de 1890, a respeito dos índios, propunham
no artigo 1º. Inciso II:
[...] A ederação deles limita-se à manutenção das relações amistosas hoje reconhecidas
como um dever entre nações distintas e simpáticas, por um lado: e, por outro lado,
em garantir-lhe a proteção do governo ederal contra qualquer violência, quer em suas
pessoas, quer em seus territórios. Estes não poderão ser atravessados sem o seu prévio
consentimento pacicamente solicitado e só pacicamente obtido (LEMOS; MENDES
citados por CARNEIRO DA CUNHA, 2002, p. 136).
Nas décadas subsequentes, argumentos prós e contras os índios e “o que se de-
veria azer com eles” continuaram sendo elaborados, inclusive por meio de estudos,
se estendendo a um tema que se lançou no debate internacional, entitulado Notas
de Tipos antropológicos do Brasil - de Roquete-Pinto, 1929. Esse estudo, especi-camente, tomava por base a deesa dos mestiços, que já se constituíam como “tipo
nacional”, e eram vistos com preconceito pelas elites nacionais e internacionais. As
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investigações pretendiam “averiguar a viabilidade biológica e intelectual dos mesti-
ços” (SANTOS, 2002, p.121). O estudo também apresentava posicionamento crítico
à política migratória nacional, estabelecida pelo governo, que estimulava a vinda de
indivíduos brancos para o Brasil, em oposição aos mestiços.
É a partir desse contexto que procuramos localizar uma concepção ocial do queseria a questão indígena no Brasil, a partir de então, considerada por órgão indígena
governamental especíco, o Serviço de Proteção aos índios/SPI. Instituído em 1910,
esse sore infuências diretas das sucessivas ases econômicas nas quais o Brasil é
lançado. Serão consideradas, a seguir, as concepções indigenistas que orientaram as
práticas ociais, para pensar suas transormações à luz dos movimentos indígenas e
dos movimentos indigenistas.
Atrair e pacicar: aos bárbaros, ordem e progresso!
Benedito Prezia (1991; 2004) é um dos autores que avalia o nal do século XIX como
“[...] um cenário de guerra contra os indígenas” na sociedade brasileira, em quase todo
o território, sobretudo pelas novas áreas econômicas, que surgiam. Escreve ele:
[...] aldeias e até povos inteiros oram massacrados, desde os Apuinã, no Acre, Os Muras,
no Amazonas, os Canelas, no Maranhão, os Botocudos, no Leste, e os Oti, totalmente
exterminados no interior de SP. Além disso, eram requentes as escravizações, como
aziam os seringalistas na Amazônia com os Yanomadi, Kulina e Kaxinawa, destruindo
aldeias e roubando mulheres. (PREZIA, 1991, p.144).
Foi sob intensa pressão de intelectuais nacionais e internacionais, que o governocriou o Serviço de Apoio aos índios e de Localização dos Trabalhadores Nacionais,
que esteve ligado ao ministério da Guerra. Somente mais tarde houve o desmembra-
mento, criando-se o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), em 1910.
Nessa conjuntura, a partir da criação do SPI, não podemos alar em indigenismo
sem Rondon (engenheiro-militar) e os positivistas, que propunham outra maneira de
ver os povos indígenas. Rondon e os demais positivistas acreditavam na incorporação
da população indígena à civilização como “proveitosa” para os índios. Argumenta- vam que os índios poderiam conhecer os “progressos da civilização”, se lhes ossem
dados os meios materiais e deendiam que essa ‘incorporação’ tinha que ser espon-
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tânea. Por isso, deendiam métodos pacícos e compreensão para a atitude agressiva
do índio que deende seu território. A partir dessa mesma visão, colocou-se como
uma das metas do SPI “[...] transormar os índios em populações laboriosas e úteis à
comunidade” (PREZIA, 1991, p.145).
Cândido da Silva Rondon criticava as praticas de extermínio, bem como de assi-milação veloz, como as praticadas por algumas missões religiosas, deendendo que
deveria ser respeitada a passagem de algumas gerações para ascenderem ao pen-
samento científco. Deendia que eles poderiam ser os guardiões das ronteiras da
nação, conceituando-os como “os primeiros brasileiros”, lembrando que viviam sob
tutela da nação (OLIVEIRA, 1995, p.65).
Empregando o lema Morrer, se preciso or, matar, nunca, Rondon acreditava
que a pátria possuía um valor absoluto e que era preciso buscar “os interesses gerais
do país”. Por isso, usando o que oram considerados “processos raternais”, trans-
eriu os Pareci de suas terras, para que eles protegessem e conservassem as linhas
telegrácas recém-construídas. Como veremos, pensar a questão indígena sob essas
perspectivas, logo deixou de corresponder à realidade, pois não se tratava mais de
ocupar ou vigiar ronteiras políticas, pois a expansão era, então, da ordem das ron-
teiras econômicas, desde as décadas de 1950 e 1960.
Oliveira (1995) deende que, mesmo tendo como objetivo o “respeito e
a demarcação das terras das populações contatadas”, a política indigenista
daquele período teve consequências muitas vezes desastrosas, pois se tratava
de uma visão integracionista, que misturava os interesses econômicos e os
políticos partidários.
Encontramos registros do próprio SPI que relatam a impossibilidade que encon-
travam em conormar interesses econômicos e culturais tão díspares como os dasculturas indígenas e os da civilização que desenvolvemos. Nos relatos, são encon-
trados alguns resultados unestos dessas ações de atração e pacicação que eram
desenvolvidas junto aos índios.
No relatório do SPI de 1954, encontrado na biblioteca do Museu Emilio Goeldi,
lemos o seguinte registro: “A pacicação de uma tribo tem representado sempre a
perda de seu território de caça e coleta, invadido por extratores de produtos da mata,
criadores, conorme a economia dominante na região. [...]. O relatório continua: “[...]Os Xavantes, pacicados em 1946, estão perdendo suas terras para latiundiários
que nunca as viram, mas especulam sobre sua valorização utura (SPI/1954. Re-
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latório de atividades, f.7, grio meu).
No relatório reclamava-se da conança que o governo local e mesmo as ins-
tituições ederais, inspirava nos usurpadores que, segundo o relato, “zombam
dos protestos do SPI, conados no apoio do governo [...]”(SPI/1954. Relatório
de atividades, f.7). No Espír ito Santo, logo após a criação do SPI a região do norte do estado,
bem como do sul da Bahia oram usadas para criar alguns polos de atuação.
Polos de atração oram criados para a paciicação dos índios Botocudos, com
objetivo de evitar a paralisação da construção das Estradas de Ferro Bahia- Mi-
nas e Vitória-Minas que penetraram no último território dos Botocudos (PA-
RAISO, 2002, p.420).
Segundo conclusão da FUNAI, os poucos autores que escreveram sobre os Tupi-
nikim “assinalam que os anos 1966 e 1967 oram decisivos na alteração do panora-
ma undiário da região”. Guimarães (1982, p. 151), Medeiros (1983) e Martins (1986)
constataram que “[...] esses anos marcaram a entrada da empresa Aracruz Florestal
na região, seguida da progressiva expulsão dos índios” (Relatório FUNAI, fs 066).
Temos, assim, durante a construção de República Brasileira, uma concepção que
considera o índio inerior, incapaz de desenvolvimento se não se tornasse “civiliza-
do”. Como podemos constatar, tratou-se da imposição e do domínio de uma cultura,
de uma religião, de uma economia e seu modo de trabalho.
Algumas análises, como a de Darcy Ribeiro ao ormular os pressupostos da políti-
ca indigenista na década de 1950, acreditavam que o Estado brasileiro seria capaz de
uma “intervenção racional e protetora” em relação aos índios. Para ele, as questões
econômicas e os processos capitalistas, não passariam de “meros resíduos de modos
superados de produção” e não pareciam ter infuência no processo de destruição daspopulações, como vinha ocorrendo. Essas ocorrências eram entendidas por Ribeiro
como “[...] abusos despóticos de interesses locais [...] que não teriam condição de
atuar, uma vez denunciados e postos sob vigilância dos órgãos governamentais e da
opinião pública esclarecida” (RIBEIRO, 1970, p. 196).
Inelizmente, para aspectos centrais do debate, como o econômico, essa ava-
liação se mostrara equivocada, posto que empreendimentos privados, bem como
estatais, contaram com incentivo ou aval do governo ederal, como oi o casodos empreendimentos no Espírito Santo, onde habitavam os Tupinikim e Gua-
rani, na década de 1950/1960. Por outro lado, cada vez que tais abusos e vio-
lê i id i dí ã i dí l
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lência oram cometidos, e que as vozes indígenas e não indígenas se elevaram,
ampliando-se para além da sociedade civil local, alcançando dierentes países,
resultou uma intervenção do Estado para solucionar ou considerar questões es-
pecícas, até então ignoradas.
A partir desses conrontos, os povos indígenas oram aos poucos se tornandouma das vozes mais enáticas na deesa de suas territorialidades, constituindo
um processo próprio, nascido desses embates e aproximações, e que passamos a
denominar movimento indígena. Não raras vezes oram eles que zeram o con-
traponto aos empreendimentos econômicos que identicaram como danosos as
suas territorialidades.
Em 1967, quando a FUNAI substituiu o SPI, assumiu-se a doutrina de proteção
raternal ao índio, sistematizada, divulgada e colocada em prática pelo engenheiro-militar Cândido Rondon, primeiro dirigente do SPI, que armava que os índios de-
viam ser integrados à comunhão nacional . Lembramos que nessa concepção, os
índios eram pensados como os guardiões das ronteiras políticas da nação, e viveriam
sob a tutela direta do Estado. A tese deendida era do breve desaparecimento desses
povos, assim que integrados à “comunhão nacional”, por isso não era considerada e
nem era necessário demarcar terras indígenas.
“Integrados à comunhão nacional” ou: apropriando-se dosmecanismos da sociedade?
A tese de “extinção” deendida por dierentes correntes de pensamentos desde o
século XIX até o século XX e sustentada inicialmente por teorias da Antropologia
e da História, como vimos, se mostrou inapta para a questão, visto que os indí-
genas rexistiram ao embate com a civilização. Há muito que essas teorias oramrevistas, e nesse contexto de revisão vêm ornecendo importantes subsídios para
“desenvolver estratégias políticas para que os próprios indígenas moldem o seu
uturo diante dos desaos e das condições do contato e da dominação” (MON-
TEIRO, 1995, p. 227).
Nas últimas décadas, ocorreram mudanças signicativas nos prognósticos que
apostavam no desaparecimento dos povos indígenas, de orma que há um certo oti-
mismo no uturo desses povos, animando a sociedade brasileira e boa parte da Amé-rica Latina. Nesse contexto, os movimentos indígenas superaram sua invisibilidade, e
se explicitaram à medida que as sociedades não indígenas também ganharam certa
organicidade popular
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organicidade popular.
O movimento indígena e o movimento indigenista desenvolveram processos de
interação que apresentam contornos dierentes dos articulados até então. Não que
não houvesses antes um movimento indígena, mas agora esse se maniestava en-
quanto ator histórico, denindo o seu lugar e com poder de intervir em políticasque antes não suspeitava intervir. Isso se refete por conta de um movimento mais
geral de organização que ocorreu na sociedade civil, e supõe um movimento indíge-
na mais ormalizado nos moldes da nossa sociedade, ocorrendo com mais ênase a
partir de promulgação da Constituição de 1988.
A partir desse momento assistimos ao que Oliveira (2005, p. 7) denominou “e-
nômeno da incorporação de mecanismos de representação política por delegação”,
apropriado por alguns povos para assim lidarem com uma sociedade que lhes impe-dia o acesso a direitos. A partir dessa apropriação, os indígenas estabeleceram canais
de comunicação com nossas sociedades modernas, para tratar de suas demandas
territoriais, assistenciais, educacionais, comerciais, de comunicação, entre outras.
Alguns acreditaram por um bom tempo que um órgão indigenista orte resultaria
em melhoria da situação dos índios. A história mostrou que os próprios órgãos do
governo participavam na intrusão das áreas indígenas, mostrando-se a FUNAI inca-
paz de exercer o seu papel de controle e vigilância dessas áreas. A história recente
mostra também que são as próprias lideranças e organizações indígenas que conse-
guem avançar no cuidado de seus territórios e direitos. A questão da representação
dos interesses indígenas no plano supralocal somente poderia ser compreendida e
avaliada no Brasil se considerada uma “sociologia dos intermediários não indígenas”,
como algo que a constituiu e que a conormou.
Pensamos que atribuir o avanço dos direitos indígenas às mobilizações dospróprios índios, sem desconsiderar o apoio do indigenismo não ofcial credibiliza
e potencializa a solidariedade humana como balizadora de justiça. Essa ar-
mação se torna central nas considerações que aremos neste artigo, ao propor
uma breve exposição dos movimentos indigenistas organizados enquanto tais, e
suas transormações, para em seguida avançar para os movimentos indígenas e
suas organizações, ao longo das últimas décadas, considerando alguns dos seus
desaos e tensões.
O movimento indigenista e o indigenismo-ambiental
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O movimento indigenista e o indigenismo-ambiental
A percepção da sociedade civil organizada de que a sobrevivência dos povos indí-
genas em risco, “dependeria em parte da conscientização da sociedade brasileira”
(PREZIA, 1994, p. 61) oi um dos pilares das primeiras organizações não gover-namentais de apoio a esses povos. O mesmo autor avalia ainda que oi o projeto
governamental de emancipação dos indígenas que causou a polêmica na sociedade,
despertando para um indigenismo mais organizado e ormalizado na sociedade civil.
Considerando alguns dados organizados pelo pesquisador Carlos Alberto Ricardo
(p.50-51), as primeiras organizações indigenistas surgiram no nal da década de
1960. A “Operação Padre Anchieta” — OPAN — no Mato Grosso, Amazonas e Mara-
nhão encontra-se como uma das primeiras com registro em cartório. Logo em segui-da, outras organizações surgem, algumas com perl missionário e outros laicos. Ou
seja, temos as primeiras organizações ormalizadas constituindo-se em um período
de implantação dos grandes projetos econômicos no país.
No entanto, nessas organizações havia o discernimento de que a luta deveria
ser protagonizada pelos próprios indígenas. Incentivam, assim, a organização das
primeiras assembleias de lideranças indígenas que tiveram importância unda-
mental nas organizações indígenas representativas que surgiram e se ormalizaram
no nal da década de 1970.
Em continuidade ao movimento indigenista das décadas de 1960 a 1980, sur-
giu um novo movimento, também de apelo global, que vem sendo chamado de
“ambientalismo-indigenista”. Os deensores “do progresso e do desenvolvimento”
avaliam esse movimento como “uma guerra irregular”.
Para o jornalista Lorenzo Carrasco (2008), o Brasil passou a ocupar uma posiçãoprivilegiada nessa estratégia irregular a partir da década de 1980. Após o assassinato
de Chico Mendes, “[...] cuja transormação em um ato de proporções mundiais, cons-
tituiu uma evidência cabal da intenção de apresentar o País como o ‘vilão ambiental
número um’ do planeta”. Essa armação, proerida no clube da aeronáutica, acrescenta
ainda, que após ortes campanhas internacionais que apresentavam a Amazônia em
iminente perigo de devastação, ortes pressões políticas e diplomáticas oram eitas
para que o País aceitasse os princípios de “soberania restrita” sobre a região.Com versões semelhantes, os críticos do ambientalismo especulam ainda sobre
uma possível “conspiração” dos ambientalista-indigenistas que, junto a inimigos
internacionais em uma
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internacionais, em uma
[...] autêntica orça de ocupação territorial”, intererem diretamente sobre as políticas
governamentais “reerentes à denição de grandes reservas naturais e indígenas e, igual-
mente, promovendo ruidosas campanhas e propaganda contra projetos, de inraestrutu-
ra energética, de energia nuclear, biotecnologia, (...)” (CARRASCO, 2008).
Trago essa abordagem para o texto para armar da dimensão dos conrontos
quando se trata de debater e deender interesses que dizem respeito não somente
aos indígenas, mas a outros modos de ser-produzir que não essa história única que
nos apresentam. Não poucas vezes, os argumentos trazidos pelos deensores dos
interesses econômicos capitalistas contêm apelos nacionalistas aceitos e deendidospor pessoas que não se preocupam em acessar as inormações ou dierentes perspec-
tivas, para considerá-las numa análise séria e contextualizada. Os neocolonizadores
“jogam” com o imaginário e o sentimentalismo, e contam com o desconhecimento
e a desinormação para ormar seus exércitos de deensores de ideias como as ex-
postas, contra a diversidade, as dierenças, e a ecologia, deensores da sociedade
monocultural em todas as suas expressões.
Eles não estão enganados, pois se trata sim de uma estratégia quando pessoas,
grupos, coletividades se organizam e se articulam para deender ou opinar sobre
questões que incidem diretamente sobre suas vidas. Esses sujeitos estão pergun-
tando pelas opções em que uns poucos homens se arrogaram o direito de azer
para construir nosso percurso de humanidade e a quais encruzilhadas nos têm
levado tais opções. Estão apontando para uma crise que determina a revisão dessas
opções, posto que vemos entrar em colapso o projeto de desenvolvimento queparte da humanidade empreende.
Para os críticos do indigenismo, quase sempre avessos aos ambientalistas, atos
de obediência à Constituição Brasileira são considerados “prejuízos” ao País. Esses
mesmos críticos creditam a conta dos ditos prejuízos aos movimentos a que costu-
mam chamar de “aparato ambientalista-indigenista”. Eis uma pequena listagem dos
empreendimentos públicos e privados e ações que se encontram em confito com os
movimentos indígenas e o movimento ambiental-indigenista:◊ Usina hidrelétrica de Belo Monte (ex-Cararaô), no rio Xingu (PA);
◊ Complexo Hidrelétrico-Hidroviário do Rio Madeira;
◊ Hidrovias Araguaia-Tocantins, Tapajós-Teles Pires e Paraguai-Paraná;
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◊ g , p j g ;
◊ Prosseguimento do programa nuclear, em especial a conclusão da usina Angra-3;
◊ Desenvolvimento de organismos geneticamente modicados (transgênicos);
◊ Expansão da indústria agroforestal (monoculturas do agronegócio exportador).
A propósito, deve haver para outros povos e populações uma outra noção doque signica prejuízo, lembramos aqui apenas dois relatos pelos cronistas dos
séculos XVI e XVII que apresentam a existência de milhares de currais nas margens
do rio Amazonas, onde era praticada a semidomesticação das tartarugas fuviais,
alimentadas com mandioca e plantas leguminosas, pelos indígenas. Menos de dois
séculos depois da chegada dos colonizadores, inúmeras espécies desapareceram
devido ao manejo irracional praticado por esses, que entendem a existência da
natureza com o único objetivo de servi-los. Relatam também a respeito dos co-nhecimentos indígenas das plantas da foresta: 1/4 de todas as drogas medicinais
prescritas provem das plantas das forestas e 3/4 destas oram colhidas a partir de
inormações ornecidas pelos povos indígenas. Sabemos que eles não se opõem ao
uso de seus conhecimentos, mas revoltam-se quando sabem que tais inormações
são transormadas em mercadorias, com ns sabidamente lucrativos, e não como
conhecimentos para salvar vidas.
Quando estes e outros dados são tomados em conjunto entendemos porque in-
dígenas e ambientalistas tendem sempre a se opor a empreendimentos gigantescos.
Certamente, trata-se de uma estratégia, e para consolidá-la - entendida por uns
como questionadora do modelo de desenvolvimento predador em curso - diversos
povos indígenas criaram e ormalizaram as organizações indígenas, representativas
de suas reivindicações. A articulação com outros povos e com a sociedade nacional, e
muitas vezes internacional, constituiu o chamado movimento indígena organizado. Por tudo que apresentamos, podemos refetir sobre porque as terras indígenas, o
capital simbólico representado por cerca de 222 povos e 180 línguas, são protago-
nistas de maior importância na luta desses povos.
A concepção ambiental-indigenista que desponta nas décadas de 1980 e 1990,
trouxe uma nova postura, pois contempla questões que tocam em cada um de
nós, indígenas e não indígenas, com dierentes intensidades: mulheres e homens,
crianças, jovens, idosos, doutores, proessores, estudantes, camponeses, operários...Aponta-nos uma oportunidade para refetirmos sobre a economia do acúmulo,
da destruição, e se realmente não há alternativas ao que nos apresentam como
única possibilidade; desaa-nos a sermos realmente inventores de respostas, ser-
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p p
mos capazes de ressignicar respostas credíveis à economia do egoísmo. Trata-se,
nesse caso, de potencializar o presente para que ele não deixe de ser uma onte de
respostas coletivas e criativas.
O movimento indígena organizado e seus desaoso caso Tupinikim e Guarani no ES
Quem se lembra, ainda, dos índios tupiniquins que as crianças brancas conheceram nas
aulas do primário e do ginásio? Porque muito tempo se disse: séculos de contato com
os brancos destruíram os tupiniquins... Eles viviam no litoral. Foram amigos dos portu-
gueses. Lutaram ao lado dos portugueses contra os erozes Tupinambás. Na história da
nossa inância, os tupinambás eram os vilões, aliados dos ranceses. Os tupiniquins eram
os bons índios, os amigos (MEDEIROS, 1983, p.65).
“Atrair e pacicar” sempre implicaram em impor arbitrariamente aos indígenas:
nomes de chees, concentrar população, implantar sistemas de organizações estra-
nhos, explorar recursos naturais de orma predatória, tudo em nome da “integração
à comunhão nacional”: Há pouco tempo uma liderança indígena declarava em uma
mesa de debate de que participamos o seu verdadeiro nome, recusado e alterado no
cartório por se tratar de nome indígena: DE WOLILI, nome de seus avô ou bisavô,
passou a se chamar Lili.
Cansados de serem considerados objetos de observação, os indígenas prota-
gonizaram cenas marcantes na mídia televisa do país e no cenário da políticanacional nas décadas de 1980 e 1990. Passaram de observados a observadores
das reações provocadas na sociedade por suas ações muitas vezes espetaculares.
Conhecedores da nossa sociedade, oereciam “produtos de troca” para a nossa
mídia do espetáculo.
Muitos têm conhecimento do cacique Mario Juruna, com seu gravador, gravando
promessas de políticos em Brasília; do gesto marcante de Ailton Krenak ao pintar o
rosto com jenipapo durante discurso no plenário do Congresso Nacional Constituin-te. Um outro momento desses oi num dos eventos denidores da agenda das lutas
indígenas e indigenistas, na cidade paraense de Altamira, em 1989. Nesse encontro
oi criada a agenda de ações contra os grandes projetos para a Amazônia, quando
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então diretor da Eletronorte oi interpelado por uma mulher Kaiapó – Truíra - que
lhe advertiu, chegando a tocar sua ace com a lâmina de seu terçado.
A Usina de Belo Monte, no rio Xingu, estaria sendo construída naqueles anos,
mas o esorço conjunto das mobilizações indígenas, ambientalistas, indigenistasconseguiu protelar a obra. Em 2009/2010 estamos novamente às voltas com o es-
orço do governo para o prosseguimento dessa obra gigantesca e de tantos outros
empreendimentos de grandes impactos socioculturais e socioambientais.
Para nos darmos conta dos esorços que devem ser conjugados para tentar rear
a depredação socioambiental em curso, lembramos as mobilizações que ocorreram
na realização da Conerência Internacional Rio 92; da criação da Raposa Serra do
Sol, (demarcada e homologada em 2009); da luta dos Tupinikim e dos Guarani , no Espírito Santo, pela regularização de suas terras (demarcada em 2008, com homo-
logação em 09/11/2010, publicada no Diário Ocial da União). Momentos que se
constituíram num desses esorços conjuntos de pressão nacional e internacional para
que o território indígena nalmente osse regularizado.
Algumas organizações indígenas existentes são de caráter étnico e de base
local, a exemplo da AITG – Associação Indígena Tupinikim e Guarani. Outras são
regionais ou nacionais e de caráter interétnico, a exemplo da APOINME, Articu-
lação dos Povos Indígenas Nordeste, Minas e Espírito Santo e o CIR- Conselho
Indígena de Roraima. Muitas surgiram a partir de alguma reivindicação especíca
e nem chegaram a se institucionalizar ormalmente, cumpriram seu papel e de-
sapareceram. Pesquisas apontam que as comunidades indígenas “entendem essas
organizações não tradicionais como canais para tratar e receber recursos externos,
apenas”(RICARDO, 1995, p. 50).Algumas dessas organizações oram deliberadamente criadas com esse m, num
momento crítico do serviço de assistência ocial, ou são organizações de serviço,
não de representação. O mesmo autor questiona se “serviriam aos índios modelos
sempre importados, que não reconhecem a especicidade volátil dessas sociedades
para transormá-la em virtude?” (RICARDO, 1995, p.20).
As primeiras organizações ormalizadas, com registro em cartórios, são localizas
na Região Amazônica, sendo a primeira: Conselho Geral da Tribo Ticuna – CGTT, de1982, seguido da Associação de Mulheres do alto Rio Negro - AMARN, em 1984. A
Associação dos Povos Indígenas de Roraima- APIR e Associação Xavante de Pimen-
tel Barbosa- AXPB são de 1988 e as não amazônicas surgem também no nal da
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década de 80. São ormalizadas aproximadamente oitenta organizações indígenas
em uma década, e muitas surgiram desde então, enquanto outras desapareceram,
nem chegando a serem ormalizadas.
Para algumas lideranças, um dos grandes desaos dessas organizações conti-nua sendo o de não cair na armadilha da representação genérica, exigida e pressio-
nada pelos trâmites da organização da sociedade envolvente. O modelo associativo
geralmente entra em confito com os modos tradicionais de organização social,
política e econômica da comunidade ou do povo indígena e são poucos compreen-
síveis os métodos, os encaminhamentos para as comunidades não indígenas. Isso
tem impedido a apropriação qualicada desses instrumentos, como desejavam os
indígenas e não indígenas.O movimento indígena no Brasil, desde a sua criação / organização, a partir da
década de 1970, vem atuando em busca da garantia, eetivação e deesa dos direitos
indígenas. Segundo algumas de suas lideranças,
[...] tais reivindicações dar-se-ão pela necessidade dos povos indígenas obterem prote-
ção especial, sem erir o princípio da organização social e de autonomia de cada povo,
por considerarmos inúmeros atores que ameaçam a reprodução ísica/ cultural de nos-
sos povos. Assim sendo, o movimento indígena pautou como eixo mobilizador da luta:
“A Terra” (COSTA- Tapeba. Presidente da ACITA).
O antropólogo Marshal Sahlins deende:
Nas duas últimas décadas, vários povos do planeta têm contraposto conscientementesua “cultura” às orças do imperialismo ocidental que os têm afigido há tanto tempo.
A cultura aparece aqui como a antítese de um projeto colonialista de estabilização, uma
vez que os povos a utilizam não apenas para marcar sua identidade, como para retomar
o controle do próprio destino. (SAHLINS. O pessimismo Sentimental)
Assim, os indígenas reconstituem sua história, por meio de dierentes movimen-
tos político-culturais. Querem armar sua existência, e não sinalizar apenas parauma construção cronológica e linear, do tipo: antes e depois. Eles estão armando
tempos e racionalidades que se cruzam e que exigem uma nova leitura da história
aprendida e ensinada até então, pois, como pergunta o jornalista Rogério Medeiros:
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“Quem sabe dos jagunços que avançaram com armas na mão sobre as terras dos
Tupiniquins? Quem sabe das grandes forestas onde os índios caçavam e que estão
sendo derrubadas? Quem sabe da grande caminhada dos guaranis, sempre a pé, em
busca da Terra sem Males?” (MEDEIROS, 1988, p 61).Tupinikim e Guarani, juntos iniciaram o movimento de retomada de suas terras,
na década de 1970, logo em seguida organizaram a instância política mais signica-
tiva das suas articulações: a Comissão de Caciques e Lideranças Tupinikim/Guarani,
criada em 1991. É nessa instância que os debates e encaminhamentos são realizados
e encaminhados às comunidade.
A Comissão estabeleceu como objetivo prioritário a retomada de seu território, e
na medida do possível articulação de questões de interesse coletivo, como a assistên-cia nas áreas de saúde, educação e agricultura, ou seja, tratava-se de uma organiza-
ção cuja nalidade era encaminhar questões que diziam respeito a todas as aldeias.
No entanto, permaneceu como uma instância de debate e encaminhamentos, com
autoridade especialmente em torno da questão da terra, e não oi ormalizada, ou
seja, não chegou a ser registrada em cartório.
Entre os anos de 2003/2004, a Comissão oi recomposta com representantes de
todas as aldeias Tupinikim e Guarani. Segue no quadro abaixo o número de partici-
pantes das reuniões:
Aldeias T/G Cacique e
Vice-Cacique
Lideranças
Comunidades
Associação
Indígena
Grupo
Mulheres
Total
C. Velha 02 05 01 01 09
Pau Brasil 02 03 - 01 06Comboios 02 03 01 - 06
Irajá 02 03 - 01 06
Boa Esperança 01 02 - 01 04
Três Palmeiras 01 02 - 01 04
Piraque-açu 01 02 - 01 04
Percebe-se que havia um grupo expressivo se reunindo, mas com participaçõesirregulares, em que reuniões aconteciam com metade do total das representações.
Entre eles havia o entendimento que os problemas precisavam ser debatidos pelas
lideranças de todas as aldeias, antes de serem tomadas as decisões. Nas reuniões
d d d l d ú ú d l
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quinzenais eram discutidos temas como os divulgados no único número do Boletim
Inormativo da Comissão, impresso em 2006: “Nossa Terra, Nossa Liberdade”. O
objetivo oi relembrar os antecedentes do movimento iniciado em 2005. Em pauta
várias questões: A recuperação dos rio Sahy e Guaxindiba , a estação de tratamentode esgoto (ETE) na aldeia Piraque-Açu,; o canal do Rio Doce poluindo do rio Com-
boios; o modelo de agricultura implementado; legislação Indígena ameaçada pela
bancada parlamentar anti-indigenista, em Brasília; a negociação entre Petrobras e
empresa Aracruz, para a passagem da tubulação do gasoduto Cacimbas-Vitória, den-
tro da área indígena.
Para além desses desaos cava uma grande questão, apontava o Inormativo:
“Haverá retorno das terras [...] para o povo Tupinikim e Guarani? Em que condições?Servirá para os que virão? As tentativas de diálogo com a empresa, os racassos, tudo
apontava para uma única solução: a retomada das terras.
Assim, avaliamos que os movimentos indígenas têm se apresentando como veto-
res para reivindicar outras ormas de vida, de relação com a natureza, outras ormas
de “desenvolvimento e progresso”.
O cacique Tupinikim, em encontro com moradores da Vila do Riacho (2005)
para conversar sobre os danos soridos pela ação da empresa, indagava e refetia
com os moradores da Vila: “[...] Perguntem para os antigos, os mais velhos... Per-
guntem como era antes, perguntem dos estragos eitos por aqui: Perguntem pelo
undamento. Aí então vamos saber o que perdemos e quanto custa o reparo das
perdas pra nós e pra vocês”.
Perguntado pelo direito da empresa, respondeu:
Se a empresa tem direito? ... Se nós damos o direito a ela de scalizar o que sempre
oi nosso...? Se ela tem o direito de dizer o que você pode ou não azer. [...]. Tem que
conhecer o undamento. Como era, como oi e como é agora? [...] Porque, com a gente,
a gente era inexperiente e achava uma maravilha a derrubada [da mata] com aqueles
tratores, correntões ortes;
[...] se não tiver a mata não tem a caça, se não tiver a água não tem o peixe e se não tem isso,
acabou a vida. Nós omos reunindo com os parceiros, ormando as lideranças, e omos con-quistando os nossos direitos [...] (Seu Antonino- ex cacique de PB, 2005. Anotação pessoal).
Em 2005, sob o lema “Nossa Terra, Nossa Liberdade”, a Comissão de Caciques
i bl i d id d i dí i d idid t d
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organizou a assembleia das comunidades indígenas, em que oi decidida a retomada
das terras que permaneceram com a empresa nas duas lutas anteriores. O inorme
divulgado pela Comissão de Caciques, arma: “O Acordo com a Aracruz não conse-
guiu resolver nossos problemas, ao contrário, tem nos causado ainda mais difcul-dades, gerando dependência econômica, divisão entre as aldeias e enraquecendo
nossa cultura. A morte da nossa cultura é a morte simbólica do nosso povo” (Nota
pública das Comunidades Tupinikim e Guarani do ES. 28-02-2005).
Entendemos que algumas questões estão postas pelas comunidades nesse inor-
me, e que elas se constituem grandes desaos a enrentar:
- Como ter autonomia em uma sociedade gerida por um único sistema de mer-
cado que encolhe as iniciativas que não obedecem as suas regras?- Como conseguir garantir a sustentação, produzindo alimentos saudáveis e básicos
à subsistência, sem cair na tentação das oertas que contrariam o equilíbrio ambiental?
Certamente encontramos no interior dessas vozes ortes elementos para um
grande debate e o desao será azer o percurso necessário na sociedade não índia,
abrindo espaços estratégicos para contribuírem para superar deasadas e preconcei-
tuosas concepções acerca de suas organizações tradicionais e de suas lutas.
Reerências
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MARI/UNESCO, 1995.
Orientações para trabalhar o texto
O indigenismo e o movimento indígena no brasil – suas lutas e desaos:
o caso tupinikim e guarani
Proa. Arlete M.Pinheiro Schubert
Objetivos
◊ Reconhecer os conceitos “indianismo” e “indigenismo” considerando suas im-
plicações para a questão indígena;
◊ identicar nas lutas dos movimentos indígenas, indigenistas e ambientais
questões relacionadas à diversidade ambiental e aos modos-de-ser-produzir;
◊ identicar o território como base de solidariedade entre as dierentes culturas
das forestas, na construção dos movimentos indígenas e ambientalistas;
◊ reconhecer algumas aproximações entre esses movimentos e seus desaos.
Resumo
Schubert, A.M.P.
O artigo procura reconstruir uma narrativa das lutas indígenas e indigenistas,
levando em conta quais teriam sido os olhares, os enrentamentos e os paradoxos
do que se convencionou chamar a “questão indígena no Brasil”. Ao propor uma in-
terpretação para a questão, aborda temas que antecederam as políticas indigenistas
ociais e que pautaram a relação dos colonizadores europeus com os povos indíge-nas no processo de “invenção do Brasil” e do “homem brasileiro”.
Busca uma síntese das orientações das políticas indigenistas ociais do Brasil, a
partir de 1910, em articulação com as ases econômicas desenvolvidas no país. Em
seguida, localiza o Espírito Santo nessa política de Estado, relacionando a econo-
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seguida, localiza o Espírito Santo nessa política de Estado, relacionando a econo
mia ao processo de “atração e pacicação” dos índios. A partir de então, o artigo
identica os conrontos indígenas com os grandes empreendimentos econômicos
como um dos principais atores responsáveis pela consolidação do movimento indi-genista e do movimento indígena organizados e articulados mais recentemente com
o movimento socioambiental. O movimento indígena organizado articula-se local e
globalmente como vemos em vários casos – entre esses o caso Tupinikim e Guarani
no ES – questionando seriamente o modelo de desenvolvimento predador em curso
em nossa sociedade. Com isso, esses movimentos atraem para si não somente a
hostilidade dos “três poderes” político, econômico e midiático, mas em decorrência
disso, a hostilidade da sociedade desinormada sobre a questão. Entre tantos desaos urgentes, resta-lhes ainda, o deso de azerem o percurso
necessário na sociedade não índia, abrindo espaços estratégicos para contribuírem
para superar deasadas e preconceituosas concepções acerca de suas organizações
tradicionais e de suas lutas.
Palavras-chave: Movimento indígena, indigenismo políticas indigenistas, Tupinikim e Guarani
Procedimentos
Embora possam parecer “desnecessários”, os exercícios que propomos têm a unção
de estimular a leitura crítica e consciente . Experimente e observe se o estudo será
mais proveitoso ao nal da leitura. Essa prática pode auxiliar na escrita da sua pró-
pria síntese, podendo ainda agregar questionamentos novos enriquecendo o texto
(como respostas ou como perguntas).
1. Leia o texto reconhecendo os subtítulos e anotando-os separadamente. Em
seguida proceda a leitura de cada um deles, sublinhando em cada parágrao o que
considerar importante. Note que esse procedimento auxiliará na síntese e na com-
preensão do tema ao realizar as atividades solicitadas abaixo
2. Para elaboração de sua síntese anote no caderno os ragmentos ou rases gri-adas, antes de ler o subtítulo seguinte. Surgindo dúvidas, questionamentos, seria
muito proveitoso anotar ao lado para respondê-lo após a leitura completa, ou mes-
mo compartilhá-la com seu grupo de estudo e/ou convívio.
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Problematização
Tarea 1. Pensando sobre imagens e concepções
1. Observem as otograas e comentem. A partir das opiniões e impressões apresenta-
das prossiga com a refexão sugerida.
Outdoors da Aracruz e indígenas
cortando eucalipto.
a. Que tipo de impressões ou ideias as imagens podem causar a um observador
externo ao confito? Quais mensagens as imagens comunicam?
b. Qual o papel do conhecimento na compreensão da realidade? Que conheci-
mentos são undamentais na interpretação da realidade?
Para sua refexão individual:
1. Analise quais as concepções presentes acerca dos indígenas, nessas otograas.
2. Caracterize o papel do confito indígena para a sociedade não indígena. Como ele
nos interpela enquanto educadoras/es?
Tarea 2: Entendendo os conceitos e suas relações com a questão indígena
1. Releia o primeiro item do texto e suas anotações e dena os conceitos abordados:
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a. Indianismo;
b. indigenismo.
2. Estabeleça uma possível relação desses conceitos com as ideologias presentes nas
políticas do Estado, apresentadas no item 2 e 3.
3. Produza uma síntese abordando algumas características principais das políticas
indigenistas nos dierentes períodos da história do Brasil.. Busque mudanças e per-
manências entre elas.
4. A partir da leitura dos 4 primeiros itens do texto, especialmente, procure detectar
quais as infuencias que exercem sobre o debate indígena, respectivamente:
a) na economia;
b) na política;
c) na cultura.
Tarea 3: A terra como eixo articulador das lutas
1. Releia os itens 5 e 6 (e suas anotações) e dena “movimento indígena” e “movi-
mento indigenista”. Dê exemplos e analise algumas articulações existente entre ambos.
2. Comente sobre “a terra”, estabelecida como “eixo mobilizador” dos movimentos
indígenas. Por que concordamos que ela se tornou o elo principal entre esses mo- vimentos e o indigenismo-ambiental?
Tarea 4: Avanços e desaos
Ao reelaborar suas culturas e identidades, os indígenas são acusados de serem “alsos
índios”, como de ato ocorreu no Espírito Santo, no caso Tupinikim e Guarani (em 2006).
1. Considerando as inormações obtidas por meio dos dierentes meios de comuni-
cação, considerando as leituras deste curso, quais as ideias que você az da questão
indígena? Escreva alguns apontamentos para serem considerados.
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2. Como você deniria os desaos que cabem hoje aos povos indígenas e não indí-
genas, no sentido de construir juntos sociedades em que caibam dierentes modos
de ser, de produzir e de viver, considerando a sustentabilidade ecológica.
Sugestões de leituras
1. História dos Índios do Espírito Santo. Kalna Maeto Teo e Klítia Loureiro. Vitória,
ES: Editora do Autor, 2009.
2. Esta terra tinha dono. Benedito Prezia; Eduardo Hoornaert. CEHILA POPULAR-
CIMI. FTD. 1994.
3. Indígenas do Leste do Brasil. Destruição e resistência. Benedito Prezia.
(Subsídio didáticos para o Ensino Fundamental e Médio. São Paulo: Paulinas, 2004
4. Os Tupinikim e os Guarani contam. Educadores Tupinikim e Guarani & Edivan-
dra Mugrabi. Vitória: MEC/SEDU, 1999
5. Os Tupinikim e Guarani na Luta pela terra. Educadores Tupinikim e Guarani.
Brasília: MEC/SEF, 2001.
6. Viagem ao Espírito Santo e Rio Doce. Auguste Saint-Hilaire. Belo Horizonte: Ita-tiaia; S.Paulo: Edusp, 1974. (Coleção. Reconquista do Brasil, v.6.) (Para proessores)
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