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COMPLEXO INDUSTRIAL DA SAÚDE: ANÁLISE DA POLÍTICA PÚBLICA DE FOMENTO DA PRODUÇÃO DE PRODUTOS PARA DIAGNÓSTICO IN VITRO. DUARTE, MÔNICA A.F.(1); SILVA, MARIA FÁTIMA S.(2) 1. Universidade de Brasília - UnB. Centro de Estudos Avançados e Multidisciplinares - CEAM Rua 21 sul bloco E apt. 902. Residencial Araucárias. Águas Claras/ DF. CEP 71925-540 [email protected] 2. Universidade de Brasília - UnB. Centro de Estudos Avançados e Multidisciplinares – CEAM ICC Sul, módulo 08, subsolo Campus Universitário Darcy Ribeiro - Universidade de Brasília/UnB – Brasília/ DF. CEP 70910-900 [email protected] RESUMO O propósito deste artigo é analisar, a partir do modelo das características-chaves do Relatório do Banco Mundial de 2006, a Política Pública de Desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial dos Produtos para Diagnóstico de Uso In Vitro (CEIPDIV). As seis características elencadas pelos autores, consideradas variáveis dependentes para o desenvolvimento das políticas públicas são a estabilidade, adaptabilidade, coerência e coordenação, qualidade da implementação e de aplicação efetiva, consideração do interesse público e eficiência. Desta forma, foi realizado um levantamento de informações, visando identificar e avaliar as seis características da política pública do CEIPDIV, principalmente, para os produtos utilizados no diagnóstico de doenças negligenciadas. Quanto aos procedimentos, a pesquisa foi bibliográfica e documental. Com os dados analisados, pode-se verificar que o processo de implementação da política em foco apresenta-se ainda incipiente e pode ser caracterizado como incremental conforme dados relacionados aos resultados alcançados. Contudo, há algumas evidências que indicam que algumas características-chaves foram contempladas satisfatoriamente pelo programa constituinte da política. Os resultados obtidos corroboram para o aprofundamento da pesquisa visando contribuir com dados e informações que possibilitem a formulação de uma política efetiva do CEIPDIV que possa ser traduzida em desenvolvimento econômico-social vinculado ao Sistema Único de Saúde. Palavras-chave: Complexo Econômico-Industrial. Produto Diagnóstico. Banco Mundial. II CONINTER – Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades Belo Horizonte, de 8 a 11 de outubro de 2013

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COMPLEXO INDUSTRIAL DA SAÚDE: ANÁLISE DA POLÍTICA PÚBLICA DE FOMENTO DA PRODUÇÃO DE PRODUTOS PARA

DIAGNÓSTICO IN VITRO.

DUARTE, MÔNICA A.F.(1); SILVA, MARIA FÁTIMA S.(2)

1. Universidade de Brasília - UnB. Centro de Estudos Avançados e Multidisciplinares - CEAMRua 21 sul bloco E apt. 902. Residencial Araucárias. Águas Claras/ DF. CEP 71925-540

[email protected]

2. Universidade de Brasília - UnB. Centro de Estudos Avançados e Multidisciplinares – CEAMICC Sul, módulo 08, subsolo Campus Universitário Darcy Ribeiro - Universidade de Brasília/UnB –

Brasília/ DF. CEP [email protected]

RESUMOO propósito deste artigo é analisar, a partir do modelo das características-chaves do

Relatório do Banco Mundial de 2006, a Política Pública de Desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial dos Produtos para Diagnóstico de Uso In Vitro (CEIPDIV). As seis características elencadas pelos autores, consideradas variáveis dependentes para o desenvolvimento das políticas públicas são a estabilidade, adaptabilidade, coerência e coordenação, qualidade da implementação e de aplicação efetiva, consideração do interesse público e eficiência. Desta forma, foi realizado um levantamento de informações, visando identificar e avaliar as seis características da política pública do CEIPDIV, principalmente, para os produtos utilizados no diagnóstico de doenças negligenciadas. Quanto aos procedimentos, a pesquisa foi bibliográfica e documental. Com os dados analisados, pode-se verificar que o processo de implementação da política em foco apresenta-se ainda incipiente e pode ser caracterizado como incremental conforme dados relacionados aos resultados alcançados. Contudo, há algumas evidências que indicam que algumas características-chaves foram contempladas satisfatoriamente pelo programa constituinte da política. Os resultados obtidos corroboram para o aprofundamento da pesquisa visando contribuir com dados e informações que possibilitem a formulação de uma política efetiva do CEIPDIV que possa ser traduzida em desenvolvimento econômico-social vinculado ao Sistema Único de Saúde.

Palavras-chave: Complexo Econômico-Industrial. Produto Diagnóstico. Banco Mundial.

II CONINTER – Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades Belo Horizonte, de 8 a 11 de outubro de 2013

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INTRODUÇÃO

As Políticas Públicas são tradicionalmente julgadas por seus atributos teóricos

técnicos, sem, contudo, considerar os contextos institucionais, políticos e culturais de sua

implementação. O estudo destes elementos tem se tornado um instrumento valioso na

analise da contribuição destas políticas para o bem-estar das sociedades. Eles buscam

promover uma melhor compreensão das dinâmicas das políticas públicas relacionadas às

suas limitações, seu potencial e as tentativas de reformas dos sistemas políticos que as

contemplam. Assim, os estudos em pauta visam, outrossim, servir de alerta àqueles que

acreditam que as possibilidades de êxito de uma política podem ser julgadas abstratamente,

a partir de seus atributos teóricos ou técnicos, sem levar em consideração o contexto

institucional, político e cultural em que é aplicada (BID, 2006). Identificar o caminho

percorrido por uma política ou programa público possibilita uma melhor percepção da

complexidade nela envolvida, esta constituída por diferentes - mas inseparáveis – aspectos,

que acabam por compor o todo (Morin, 2000).

Diversas são as teorias e modelos utilizados para analisar as dinâmicas das políticas

públicas. O modelo apresentado no Relatório 2006 do Banco Interamericano do

Desenvolvimento (BID), intitulado A Política das Políticas Públicas (BID, 2006) é um

exemplo. Seu foco está voltado para o julgamento das políticas públicas, prioritariamente, no

papel dos atores formais e informais – políticos, profissionais e membros da sociedade – e

suas interações nas arenas da construção e implementação das políticas públicas nos

países da América Latina. De forma sintética, as políticas públicas, nesta abordagem, são

analisadas a partir de seis características-chaves: (1) estabilidade, (2) adaptabilidade, (3)

coerência e coordenação, (4) qualidade da implementação e de aplicação efetiva, (5)

consideração do interesse público e (6) eficiência.

Tomando a referência apontada acima, este artigo visa analisar a Política Pública do

Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS) para produtos diagnósticos de uso in vitro

(PDIV) no contexto do Programa Mais Saúde: direito de todos (PMS). Entretanto, os dados

analisados nesta pesquisa, visam, diretamente, a análise do contexto institucional, e, desta

forma, indiretamente, possibilitam algumas inferências sobre o contexto político e cultural.

O Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS) é definido como uma articulação

que envolve a assistência médica, as redes de formação profissional (escolas e

universidades), a indústria farmacêutica e a indústria produtora de equipamentos médicos e

instrumentos diagnósticos (Cordeiro, 1985). É constituído por um conjunto interligado de

produção de bens e serviços em saúde, um conjunto selecionado de atividades produtivas

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que mantêm relações intersetoriais de compra e venda de bens e serviços e que se move

no contexto da dinâmica capitalista. Este conjunto de atividades pode ser dividido em três

grandes grupos de produtos e tecnologias: (1) indústrias de base química e biotecnológica –

produção de fármacos, medicamentos, vacinas, hemoderivados e reagentes diagnósticos;

(2) indústrias de base mecânica, eletrônica e de materiais – equipamentos médicos e

materiais de consumo e (3) setores prestadores de serviços – hospitais, ambulatórios,

serviços de diagnósticos e terapias (Gadelha, 2003).

Os PDIV, identificado no CEIS, compreende todos os reagentes, padrões,

calibradores, controles, materiais, artigos e instrumentos, que contribuem para realizar uma

determinação qualitativa, quantitativa ou semiquantitativa de uma amostra proveniente do

corpo humano, que não estejam destinados a cumprir alguma função anatômica, física ou

terapêutica, que não sejam ingeridos, injetados ou inoculados em seres humanos e que são

utilizados unicamente para prover informação sobre amostras obtidas do organismo

humano. Destacam-se nesta definição os produtos para autoteste, destinados a utilização

por leigos, profissionais da área da saúde, ou pelo laboratório clínico, permitindo o

acompanhamento das condições de uma doença, detecção de condições específicas, com a

intenção de auxiliar o paciente, mas não suficiente para a conclusão do diagnóstico

(ANVISA, 2012).

Programa Mais Saúde (PMS): direito de todos (2008-2011)

O PMS, lançado em 2007, vigente entre 2008 e 2011, estabelece como premissa a

saúde não restrita a uma política social, mas parte integrante do desenvolvimento

econômico do país. Sua missão de melhoria significativa das condições de saúde e da

qualidade de vida dos brasileiros, propiciando mais acesso às ações e serviços de

qualidade. Numa perspectiva mais abrangente, aprofundar e atualizar os grandes objetivos

da criação do SUS num contexto contemporâneo, agregando novos desafios e dimensões

para que os princípios doutrinários de universalidade, equidade e integralidade possam se

concretizar (Brasil, 2007).

O Programa foi estruturado em diretrizes estratégicas que norteiam os eixos de

intervenção, as medidas adotadas, as metas-síntese e os investimentos previstos,

permitindo articular a dimensão econômica e a social da saúde. Quanto aos eixos de

intervenção visando, simultaneamente, a construção de um sistema de saúde universal e

um padrão de desenvolvimento centrado na qualidade de vida dos cidadãos brasileiros, eles

podem ser identificados ao observar-se a Figura 1.

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O eixo a ser analisado no presente estudo é o de número três, o Complexo

Econômico-Industrial da Saúde, o qual se refere às questões do avanço do complexo

industrial e de inovação em saúde, dotando o país de uma base produtiva e de

conhecimento capaz de garantir uma capacidade de oferta interna que permita o

atendimento integral às necessidades de saúde da população. É neste eixo que se

concentram as ações associadas ao propósito de uma Política Nacional voltada para os

PDIV.

Figura1. Eixos de intervenção para a construção de um sistema de saúde universal e para um padrão de desenvolvimento centrado na qualidade de vida dos cidadãos brasileiros.

Fonte: Programa Mais Saúde: direito de todos (Brasil, 2007)

O Complexo Econômico-Industrial da Saúde: contexto, resultados e características

(2008 a 2011)

A atual estrutura industrial de saúde brasileira é extremamente tímida. A falta de

competitividade em produtos de alto valor agregado, fez com que o mercado nacional se

tornasse dependente das importações, principalmente na categoria dos PDIV. Esta

afirmação é corroborada pela observação do valor do déficit da balança comercial. No final

dos anos 80 houve um aumentou de US$ 700 milhões por ano, para um patamar superior a

US$ 5 bilhões ao ano na atualidade (Brasil, 2007). Estes dados se referem à importação de

todos os produtos envolvidos no CEIS e não são desagregados especificamente para os

PDIV.

Como forma de diminuir a dependência do mercado externo, algumas diretrizes

relacionadas ao CEIS foram estabelecidas no âmbito do Programa Mais Saúde. São elas:

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• Reduzir a vulnerabilidade da política social brasileira mediante o fortalecimento do

Complexo Industrial e de Inovação em Saúde, associando o aprofundamento dos objetivos

do Sistema Único de Saúde com a transformação necessária da estrutura produtiva e de

inovação do País, tornando-a compatível com um novo padrão de consumo em saúde e

com novos padrões tecnológicos;

• Aumentar a competitividade em inovações das empresas e dos produtores públicos

e privados das indústrias da saúde, tornando-os capazes de enfrentar a concorrência global,

promovendo um vigoroso processo de substituição de importações, tanto de produtos

quanto de insumos em saúde – com maior densidade de conhecimento - que atendam às

necessidades domésticas.

A partir das diretrizes acima elencadas, foram estabelecidas 14 medidas e 15 metas,

com recursos financeiros específicos. O valor total do eixo CEIS - contemplando 14 Medidas

e 15 Metas, foi de R$ 2 bilhões para o período de vigência do programa. Contudo, em

relação ao CIPDIV, somente uma medida e uma meta foram estabelecidas:

• Medida - Implementar um Programa Nacional para Produção Estratégica do

Complexo Industrial da Saúde, objetivando as necessidades da saúde, articulando o

fomento à inovação e a política de compras governamentais, mediante parceria com

o MDIC/BNDES, o MCT, unidades da federação e Ministério da Saúde.

• Meta - Reduzir a vulnerabilidade da política de saúde, com o aumento da capacidade

produtiva de produtos essenciais em saúde com alto potencial de inovação,

envolvendo principalmente fármacos e medicamentos, equipamentos e materiais

médicos, vacinas e reagentes para diagnóstico com recursos da ordem de R$ 3,0

bilhões.

• Meta Física - Redução de 20% do déficit comercial de saúde e aumento de 7% ao

ano da produção local

Como resultados, conforme dados extraídos do Relatório de 2011, que avaliou a

execução das metas e medidas do quadriênio 2008 a 2011 apontam um recurso total para o

Eixo complexo Industrial/Produtivo da Saúde de R$ 2,0 bilhões utilizado para 14 metas e 33

ações. Entretanto, do recurso total previsto, apenas 21% foi executado durante o período

analisado. Em termos de metas físicas executadas, este percentual contemplou apenas

52%, das metas. Dos recursos utilizados, 80% foram provenientes do BNDES - Banco

Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Brasil, 2011).

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Grosso modo, os dados apontados acima, podem ser tomados como indicativo de que

os resultados não sinalizam para uma eficiência significativa do programa. Além disto, a falta

de resultados para cada eixo que o compõe, também pode ser tomada como o indicativo do

baixo grau de detalhamento do escopo do programa. De qualquer forma, os resultados

provocam questionamentos que vêm a fortalecer a justificativa da pesquisa em pauta neste

artigo.

O Programa Mais Saúde foi finalizado em 2011, contudo, outros programas lançados

posteriormente, buscam ainda contemplar os seus objetivos. Como exemplo, pode-se citar:

(1) a Lei n°12.349 de 2010, que prevê margem de preferência de até 25% para a compra de

produtores nacionais pelo Sistema Único de Saúde; (2) O Plano Brasil Maior - parcerias

para desenvolvimento produtivo e poder de compra do Estado e (3) a Estratégia Nacional de

Ciência, Tecnologia e Inovação – 2012-2015, prioridade do segmento de fármacos e do

complexo produtivo da saúde como um todo.

Já em relação a importância do tema na agenda governamental, verificou-se que no ano

de 2012, diversos eventos foram realizados entre os representantes dos fabricantes

nacionais e os atores governamentais. Todos foram no sentido de sensibilizar os gestores

políticos quanto a importância do fomento do CEIS dos PDIV para o Sistema Único de

Saúde. Entre os eventos promovidos, pode-se citar o II Workshop Internacional “Testes de

Diagnóstico in Vitro Acessíveis e com Qualidade Assegurada para Programas de Saúde

Pública” (Brasília - 19 e 20 de novembro de 2012); o Encontro Internacional sobre

Diagnósticos in vitro (Brasília - 17 e 18 de abril de 2012) e o Seminário “GLOBAL

DIAGNOSTICS AND PERSONALIZED MEDICINE” (São Paulo - 22 de maio de 2012).

Desta forma, o tema acabou por entrar definitivamente na agenda, culminando com a última

chamada pública MCTI/FINEP e MS/SCTIE/DCIIS 03/2013, cujo foco prioritário é o

desenvolvimento de projetos de produtos diagnósticos de uso in vitro do tipo point of care –

testes rápido (Brasil, 2013).

METODOLOGIA

A metodologia proposta para a análise está baseada nas características-chaves

apresentadas no Relatório do BID. Para tanto, foi realizado um levantamento de

informações contemplando artigos, documentos governamentais e dados que revelem as

estratégias propostas pelo Programa. A análise foi realizada em torno do Programa Mais

Saúde: Direito de todos. As características-chaves, já referidas, foram utilizadas como

critério para a análise. A apreciação aqui realizada é qualitativa, fortalecida por um esforço

de triangulação das fontes de informação utilizadas, relativas ao PMS. O estudo, portanto, é

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qualitativo e possibilitou maior aproximação de dois aspectos fundamentais do programa: a)

os vínculos operacionais envolvidos na formulação e implementação do programa e, b) a

relação de importância do tema na agenda governamental.

Várias foram as fontes de dados utilizadas, entre elas: Agenda Nacional de

Prioridades de Pesquisa em Saúde (Brasil, 2008); (2) Prioridades de Pesquisa em Saúde.

Caderno 2 – Doenças Negligenciadas (Brasil, 2006); sítios eletrônicos da Secretaria de

Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE), Departamento do Complexo Industrial

e Inovação em Saúde, Gerência-Geral de Base Química e Biotecnológica (Ministério da

Saúde, 2013); Relatório de “Resultados e Conquistas 2009” (Brasil, 2009) e outros que

serão discutidos. No Quadro 1 é apresentada a associação entre cada uma das

características analisadas e as respectivas fontes de informação.

Quadro 1: Fonte de dados e informações a serem analisados nas características-chaves

do BID (BID, 2006)

Características-chaves Base de Dados/informações para análise

Estabilidade

Dados do sistema informatizado da Anvisa acerca da origem dos produtos in vitro registrados

Relatório de “Resultados e Conquistas 2009”

Agenda Nacional de Prioridades de Pesquisa em Saúde 2008

Adaptabilidade

Relatório de “Resultados e Conquistas 2009”

Programas de Pesquisa em Saúde

Programa de Doenças Negligenciadas

Coerência e Coordenação

Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior

Programas de Pesquisa em Saúde

Normas de criação, estruturação e competências do Grupo Executivo do Complexo Industrial da Saúde

Dados do sistema informatizado da Anvisa acerca da origem dos produtos in vitro registrados

Qualidade da Implementação e da Aplicação efetiva

Dados do sistema informatizado da Anvisa acerca da origem dos produtos in vitro registrados

Normas do MDIC sobre regras de origem de produtos

Orientações da ANVISA quanto a definição de fabricante de produtos

Consideração do interesse público

Programa Mais Saúde - definição de produtos a serem fomentados

Relatório de “Resultados e Conquistas 2009”

Agenda Nacional de Prioridades de Pesquisa em Saúde 2008 - definição de áreas/produtos a serem pesquisados

Programa de Doenças Negligenciadas - definição de áreas/produtos a serem pesquisados

DATASUS

Eficiência

Relatório de “Resultados e Conquistas 2009”

Dados do sistema informatizado da Anvisa acerca da origem dos produtos in vitro registrados

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Fonte: Elaborado pelos autores.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O levantamento de informações realizado foi direcionado, sempre que possível, para

apreciar as características da política do desenvolvimento do Complexo Econômico-

Industrial da Saúde, conforme metas e medidas do Programa Mais Saúde, especificamente

para os PDIV. Nos parágrafos que se seguem são apresentados os resultados obtidos.

Estabilidade

Conforme indicado no Relatório, a estabilidade de uma política está diretamente

relacionada ao grau com que um Estado mantém os compromissos assumidos, honrando

suas obrigações, bem como mantendo as prioridades nos objetivos que lhe foram

atribuídos.

No Brasil, a política de desenvolvimento de um parque fabril de PDIV, que seja de

concepção exclusivamente nacional, vem sendo discutida há algum tempo. A dependência

superior a 80% do mercado externo - produtos importados – fez com a inserção desta

questão fosse definida como meta no programa avaliado (Duarte, 2010).

Com base na conceituação de estabilidade, o Programa se mostrou estável, pois em

todo o transcorrer do período a meta estabelecida se manteve. Contudo, conforme Relatório

de 2009 e de 2010, como a meta estabelecida não prevê orçamento, não é possível

quantificá-la. (Brasil, 2010).

A criação de uma nova ação, denominada Programa Pesquisa Saúde (Brasil, 2006),

como consta na Agenda Nacional de Prioridades de Pesquisa em Saúde (Brasil,2008), pode

ser tomado como um desdobramento da estabilidade do referido programa. Neste

programa, o Ministério da Saúde estabeleceu linhas de pesquisa para desenvolvimento de

PDIV voltados para o mercado nacional, principalmente para as doenças negligenciadas.

Deve ser ressaltado, que a produção mundial destes produtos não é expressiva em vista do

seu baixo valor de mercado (Duarte, 2010).

Vale ainda destacar o Programa de Doenças Negligenciadas (Prioridades de

Pesquisa em Saúde. Caderno 2 – Doenças Negligenciadas), que tem como objetivo unir

academia – pesquisa, e mercado - comércio, com o desenvolvimento de produtos voltados

para o abastecimento do mercado interno. (Brasil, 2006)

Fundamentalmente, pode-se indicar que, após a finalização do PMS, o Ministério da

Saúde - sensibilizado pela importância do Complexo Industrial da Saúde, criou a Secretaria

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de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE), bem como o Departamento do

Complexo Industrial e Inovação em Saúde. A área voltada ao desenvolvimento de produtos

nacionais de tecnologia para diagnóstico de uso in vitro, é a Gerência-Geral de Base

Química e Biotecnológica. (Brasil, 2009)

As três ações citadas acima podem ser tomadas como indicativas para o

fortalecimento da política de desenvolvimento de um parque fabril de PDIV, utilizando-o

como um indicador positivo, ainda que as ações e metas pactuadas, neste programa e nos

outros subsequentes, não estejam diretamente conectadas ao contexto do CEIS para

produtos diagnósticos.

Adaptabilidade

A questão da adaptabilidade se refere à capacidade de inovação quando políticas

vigentes falham, bem como à habilidade em se assegurar tal inovação. Para o programa em

tela, foi considerado como parâmetro de análise o resultado alcançado com as metas e as

medidas indicadas para desenvolvimento de um mercado nacional de produtos in vitro.

Neste contexto, o esforço de adaptabilidade se dá pelo potencial dos PDIV

propiciarem celeridade no processo de tratamento de doenças e agravos à saúde.

Principalmente no que se refere ás doenças negligenciadas, recorrentes em locais de difícil

acesso e com poucos recursos de equipamentos de alto custo. Nestes contextos, os

produtos diagnósticos se mostram eficazes, sendo essenciais para a diminuição da

morbidade e mortalidade da população afetada. Do ponto de vista de assegurar a inovação,

o fator positivo dos PDIV é que com metodologias mais modernas, como é o caso dos testes

rápidos que diagnosticam doenças em 20 minutos, é possível fabricar um produto barato

(comparativamente aos equipamentos médicos) e que pode ser usado em qualquer

localidade do país.

Em relação à meta estabelecida no programa, pode-se verificar que a avaliação está

restrita à questão orçamentária – planejado e executado. Contudo, uma avaliação mais

detida merece atenção, para que se verifique quais ações foram efetivamente realizadas no

contexto da política de fomento da produção nacional de produtos in vitro.

No Relatório de “Resultados e Conquistas 2009” – o único disponível para consulta –

em relação às ações executadas no Complexo Industrial da Saúde há oito resultados: (1)

Produção da vacina pneumocócica; (2) Produção do Efavirenz; (3) Disponibilização o

Raltegravir; (4) Novas parcerias público-privadas – produção de 24 fármacos; (5) O

Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos; (6) Software Registro Brasileiro

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de Ensaios Clínicos (Rebrac); (7) Implantação da Agenda Regulatória da ANVISA; (8)

Aumento do número de substâncias químicas de referência.

Cumpre salientar que nenhuma destas ações refere ao Complexo Industrial de PDIV.

O CEIS abrange fármacos, medicamentos, materiais para uso em saúde, equipamentos

médicos e produtos diagnósticos (Gadelha, 2003). Desta forma, os resultados alcançados

no relatório se restringem aos medicamentos, fármacos e equipamentos médicos, não

sendo, portanto, relacionados diretamente ao fomento da produção nacional de produtos in

vitro.

Pelo exposto, verifica-se limitação das informações, o que pode ser tomado como

uma indicação da necessidade de proposição de metas mais específicas para o CEIPDIV e

formas de registrá-las, tendo em vista sua contribuição, em termos de adaptabilidade do

programa como um todo, e seu potencial, no que tange à diminuição da demanda e á

exigência de menores custos dos investimentos em inovação.

Ainda, quanto às limitações em se desenvolver um mercado nacional de produtos

para diagnóstico, estas já haviam sido identificadas na Secretaria de Ciência, Tecnologia e

Insumos Estratégicos (SCTIE), quando é feita referência à criação dos Programas de

Pesquisa em Saúde e o Programa de Doenças Negligenciadas (Brasil, 2006). Estas ações

representam uma tentativa de se estabelecer linhas de pesquisa para PDIV nacionais.

Entretanto, deve-se ter em mente que o estabelecimento destas linhas passa pelo

esclarecimento de duas questões críticas, a saber: trazer a pesquisa científica para o

conceito de produção pelo mercado e de que o país precisa ser suficiente nos produtos de

diagnóstico específicos para doenças tipicamente nacionais, tais como: dengue, malária,

chagas e tuberculose (Brasil, 2008).

A apreensão que se faz aqui é que maiores investimentos em produtos in vitro

trariam maior adaptabilidade do Programa como um todo, porém, maior clareza na relação

entre esta parte do programa e seu todo ainda precisa ser discutida. A questão da definição

do que é considerado inovação no CEIS, para os diversos produtos inseridos, deve ser

reavaliado, uma vez que a população usuária do SUS, e por consequência do CEIS, é

extremamente heterogênea com demandas de diagnóstico de verminoses até doenças

imunológicas de difícil diagnóstico e tratamento.

Coerência e coordenação

A coerência e coordenação são tratadas no Relatório de 2009 no contexto da

implementação de novas políticas, em consonância com as políticas vigentes e com a forma

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integrada de atuação dos diferentes atores envolvidos na política e seus programas, bem

como com a forma integrada com que os diferentes atores de uma mesma política agem.

As ações relativas à característica de coerência para o PMS foram facilitadas pelo

fato de ter sido estabelecido um período de alinhamento político entre os setores

governamentais envolvidos, o qual coincidiu com as ações desencadeadas após a

finalização daquele programa. As políticas integradas foram, principalmente, a Política

Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (Brasil, 2003). Pode-se considerar, que houve

neste momento, certa constelação favorável orientada pela mesma égide política.

As novas políticas implementadas através de novos Programas ou até mesmo

através de uma reestruturação do Ministério da Saúde corroboram esta afirmação. Contudo,

a coordenação das ações e políticas, quando relacionadas a mais de um setor

governamental – ou mesmo privado (atores de dentro e fora do governo) – ainda se faz de

forma precária.

O Programa Mais Saúde, possuía na questão do Complexo Econômico-Industrial da

Saúde, uma base intersetorial, com a inserção do Ministério da Saúde, Ministério da Ciência

e Tecnologia, Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comercio Exterior, ABDI, BNDES,

FINEP, ANVISA, HEMOBRAS, Universidades Públicas, SEBRAE e FIOCRUZ. Tal

articulação foi formalizada através da criação do Grupo Executivo do Complexo Industrial da

Saúde (GECIS). O GECIS é um órgão constituído por representantes de governo,

coordenado pelo Ministério da Saúde, que também conta com o Fórum Permanente de

Articulação com a Sociedade Civil. Neste Fórum estão presentes os membros principais de

todas as associações empresariais com foco na saúde, bem como representantes do SUS.

A missão desse grupo é construir pontes que liguem os interesses do SUS, da indústria, dos

consumidores e de profissionais dos setores público e privado.

Contudo, as relações entre estes diversos atores não se consolidaram. Diversas

questões foram tratadas com apenas alguns dos atores, desconsiderando o impacto de tais

políticas no contexto das dinâmicas institucionais. Um exemplo é o Programa de Pesquisa

em Saúde (PPS), onde foram elencados produtos – para doenças específicas – estratégicos

para pesquisa. (Brasil, 2006). Não houve, até este momento, um levantamento do mercado

nacional de PDIV, de forma a verificar a dependência de produtos importados de acordo

com a tecnologia envolvida no produto, ou ainda, em relação ao parâmetro ou doença que

se pretendia diagnosticar. Nesta situação, podem-se destacar as tiras-testes para glicemia,

amplamente usadas por diabéticos, em suas casas, para monitoramento da glicemia e

análise da dose de insulina a ser administrada. De acordo com dados da ANVISA, no Brasil,

todos os produtos diagnósticos para monitorização de glicemia pelo próprio paciente

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(monitores de glicemia vendidos em farmácias) são importados (Japão, EUA, Coréia do Sul,

Reino Unido, China, Suíça, Taiwan e Alemanha são os principais produtores). Assim,

observa-se certo desalinhamento do propósito do programa voltado ao desenvolvimento da

produção nacional como consta nos documentos do Ministério da Saúde, uma vez que na

falta de resultados efetivos, a assistência do governo às pessoas portadoras de diabetes e

pressão alta, que monitoram a glicemia diariamente, ainda não contempla os produtos

estratégicos (Duarte, 2010).

Qualidade da implementação e da aplicação efetiva

O exposto no parágrafo anterior foi tomado também como um indicativo de baixa

efetividade na implementação e aplicação do Programa, no que se refere aos produtos in

vitro. Entretanto, a base regulatória e sua exequibilidade foram outros aspectos foram

analisados para caracterizar a qualidade da implantação e da aplicação efetiva.

Como o PMS foi voltado ao fomento de uma produção nacional autossuficiente em

alguns produtos para diagnóstico, com a interface de conexão com diversos órgãos e bases

legais, sua qualidade na implementação e aplicação efetiva frustrou as expectativas.

Conforme observado ao longo da análise das características-chaves, há falta de

articulação entre os diversos setores de governo conectados ao PMS. Ela propicia a

formação de blocos regulatórios específicos, mas desconectados. Normas que são

contraditórias, bem como, a ausência de normas, que fomentem o desenvolvimento da

finalidade do programa, são recorrentes.

Ressalte-se ainda, a análise do MDIC quanto à identificação da origem do produto,

para o enquadramento tributário diferenciado, inclusive com medidas de incentivo à

produção nacional (Brasil, 2011). De forma totalmente singular, a ANVISA - na questão

referente à análise de processo de registro de um produto para diagnóstico, de concessão

de autorização de funcionamento e de Certificação de Boas Práticas de Fabricação e

Controle não define o que é um fabricante, e não especifica as etapas mínimas que devem

ser cumpridas no processo de produção – acarretando distorção do mercado. (Anvisa,

2009). Produtos identificados no mercado como sendo nacionais são, na verdade, produtos

importados, cabendo à empresa brasileira somente a parte final da produção - de

embalagem e rotulagem - o que não agrega qualquer valor tecnológico ao produto final.

Desta forma, a ANVISA compreende que as etapas de embalagem, rotulagem e distribuição

de produto são de efetiva fabricação, mesmo quando não passíveis de inovações

tecnológicas de grande vulto quanto ao produto – conforme definido na Lei n° 10.973 de

2004, que dispõe sobre os incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no

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ambiente produtivo. A não introdução de novidade nos produtos pode ser um indicativo de

quão longe está a prerrogativa do Programa de propiciar independência do mercado

externo. (BRASIL, 2007) Estas observações também contribuíram para a análise da

consideração do interesse público conforme será exposto no próximo item.

Consideração do interesse público

O interesse público - como norteador das questões relativas às ações do PMS,

possui enorme relevância na tomada de decisões. Entretanto, há de se verificar como foi

aferido este “interesse público”: Quais instrumentos foram utilizados para se chegar à

conclusão de que as ações elencadas no programa representam, efetivamente, uma

demanda de verdadeiro e legítimo interesse público?

Na maioria das ações voltadas ao CEIS, a base de dados que subsidiou a tomada de

decisão não está clara nos projetos e programas, bem como, não há citação de suas fontes.

Uma situação é indicar que as políticas foram estabelecidas em decorrência da análise de

prioridades conforme o interesse público, outra é comprovar e esclarecer como estes

interesses foram manifestados.

O item, portanto, é inconclusivo. Realizar uma pesquisa com usuários do SUS, de

forma a verificar as necessidades emergentes de produtos diagnósticos, ou ainda analisar a

metodologia de produtos de maior necessidade em locais de ausência de hospitais ou de

difícil acesso seriam formas de se introduzir o interesse público nas questões de formulação

das políticas públicas do setor. Ademais, a utilização dos indicadores do SUS disponíveis

para consulta no sistema DATASUS poderia ser uma forma de verificar as necessidades do

sistema, congregando as questões assistenciais com as do CEIS, no sentido de direcionar a

produção nacional (Figura 2). Os indicadores apresentados na Figura 2 apontam a

incidência das doenças e agravos conforme Estado, Capital, Região Administrativa, idade e

gênero. Com estes indicadores, é possível verificar as reais necessidades da população

nacional ou até mesmo de uma localidade específica. Desta forma, a produção nacional

poderia ser direcionada para produtos significativos para o processo de cura e tratamento

destas doenças.

Figura 2: Indicadores DATASUS

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Fonte: Elaboração dos autores a partir do site http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/idb2011/matriz.htm#demog

Eficiência

A eficiência aqui surge como sendo uma característica-chave que, indiretamente, já foi

contemplada nas análises das características-chaves da política de desenvolvimento de um

parque fabril de PDIV até aqui apresentadas. O conceito atribuído pelos autores do relatório

do Banco Mundial de Desenvolvimento ao termo eficiência diz respeito ao grau em que a

composição dos gastos públicos gera desperdícios e em que grau os recursos são

direcionados para as atividades em que são mais efetivos.

A eficiência do Programa Mais Saúde, no CEIPDIV, deve ser questionada. Os dados

indicados nas metas cumpridas do Relatório de 2009 apontam certa eficiência, uma vez que

tal meta se refere à todos os produtos do CEIS (medicamentos, fármacos, equipamentos,

materiais, vacinas e produtos in vitro). Contudo, pode ser verificada no Relatório de

“Resultados e Conquistas 2009” que o grande avanço se restringiu a produção nacional de

medicamentos e fármacos. Não há citação de nenhuma ação desenvolvida especificamente

para os produtos in vitro.

Outra análise que pode ser feita é em relação aos registros de produtos junto à ANVISA

– somente após o registro do produto na agência, sua disponibilização para consumo está

autorizada – de 2008 a 2011. Em 2011, o mercado nacional representava somente 16% do

mercado de produtos diagnósticos (Duarte, 2010). Uma análise temporal – no corte do

programa – deve ser feita de forma a analisar sua eficiência.

Os recursos disponibilizados para o Programa, na área de produtos in vitro, foram

sinalizados como sendo não financeiros (Brasil, 2009). Contudo, houve um gasto financeiro

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indireto através do BNDES com investimento em Pesquisa e Desenvolvimento, recursos

humanos e materiais, que aqui não foram contabilizados nesta categoria.

Os aspectos apontados limitam a avaliação da eficiência do programa por falta de

coerência e disponibilização de dados acerca dos recursos investidos. Desta forma,

relatórios acerca da taxa de crescimento da quantidade de produtos nacionais disponíveis

no mercado e de gastos públicos (recursos financeiros e em pesquisa) poderiam ser

tomados para avaliar a eficiência do programa. Assim, seria possível observar a eficiência

na transposição de um produto resultante de uma pesquisa científica para um produto

inovador – com características de reprodutibilidade e repetitividade na produção em série e,

mitigar os possíveis problemas e atrativos competitivos para concorrência com produtos

importados.

Esta situação, ainda não estando presente no contexto do PMS, sinaliza mais uma

fragilidade no seu contexto institucional pelo menos ao que diz respeito ao braço dos

produtos in vitro.

Através das análises das características-chaves acima, infere-se uma variável primordial

à análise das políticas públicas: a transparência na gestão pública. Ausência da

transparência no processo de tomada de decisão ou de implementação das políticas

públicas facilita a distorção da realidade, distanciando o que é necessário com o que se

planeja e executa na política. Entretanto, a apreciação das características-chaves realizada,

indica que existe ainda um distanciamento entre o grau de transparência possível e o ideal.

O controle social seria uma forma de forçar a transparência, conforme enfatiza Silva (2001,

p.24) “o controle social seria um controle de origem no social, ou melhor, na sociedade. Na

verdade qualquer controle tem origem na sociedade que é a quem se devem reportar todos

os entes que a representam.” Porém, o controle social não é uma prática política-cultural da

sociedade brasileira, e um fator determinante para que venha a ser é o fortalecimento do

contexto institucional das políticas públicas. Neste sentido, a análise realizada contribui para

evidenciar a necessidade de uma pauta mais detalhada do CEIPDIV no contexto das

políticas do Complexo Industrial da Saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste estudo buscou-se uma aproximação do Programa Mais Saúde, no que diz

respeito especificamente aos PDIV, visando caracterizá-lo de acordo com a abordagem

apresentada no Relatório do Banco Mundial, mais especificamente, considerando as

características de: estabilidade, adaptabilidade, coerência e coordenação, qualidade da

implementação e da aplicação efetiva, consideração do interesse público e eficiência. Os

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dados para analisar estas características foram documentos institucionais, os quais

apontaram o quadro do contexto institucional de forma mais direta, mas também

possibilitaram inferências sobre o contexto político e cultural da sua implementação.

Em relação às características discutidas ao longo do texto, observou-se que esforços

institucionais significativos vêm sendo direcionados para o fortalecimento da estabilidade da

Política. Quanto à sua adaptabilidade, as ações visando alcançá-la podem ser ditas como

sendo ainda incrementais ou indiretas, já que as informações não são especificamente

relacionadas à fabricação de PDIV. Maior especificidade nas metas propostas e na forma de

registrá-la seriam medidas necessárias para a caracterização da adaptabilidade da política,

ainda que indícios indiretos possam ser detectados quando da observação dos programas

criados pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE). No que diz

respeito à coerência e coordenação, o alinhamento de políticas de diferentes setores

governamentais relacionadas ao propósito do Programa Mais Saúde contribuem para que

esta seja uma característica fortalecida da Política em pauta.

As três últimas características analisadas, apontam para uma consolidação

incremental do programa, tendo em vista: a fragilidade da articulação entre os setores de

governo; a formação de blocos regulatórios específicos e desconectados; e a contradição

normativa. Dados também apontam a fragilidade do processo de introdução de inovações

tecnológicas relativas aos PDIV. A baixa especificidade de dados que possam aferir o

interesse público e suas modalidades específicas provocou a proposição de algumas

medidas apresentadas no contexto da análise realizada. A ausência de dados agregados,

relativos ao cumprimento de metas do programa, além de impossibilitar a análise da

eficiência do programa no que diz respeito aos PDIV, é por si só, um indicativo de que tal

eficiência é ainda incipiente. Esta afirmação é reforçada quando se observa os dados

utilizados para as outras características.

Pelo exposto, pode-se considerar que a pesquisa possibilitou não só qualificar o

contexto institucional do programa, mas também levantar alguns indícios do contexto

cultural e político em que ele se insere. Tais indícios apontam para as limitações no

desmembramento e alinhamento dos processos técnicos-institucionais da estrutura das

políticas públicas em saúde, no Brasil, principalmente, para o caso dos PDIV. Uma das

razões para isto pode ser o seu menor papel econômico no conjunto do complexo industrial

da saúde.

Para finalizar, observa-se que a Política do Programa Mais Saúde, bem como a criação

da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE), possuem alguns

aspectos de alta relevância, e que nos moldes da análise do Relatório do Banco Mundial

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pode ser considerada uma política de alto impacto e importância. Contudo, uma

característica primordial à qualquer programa ou política pública, que não foi abordada pelo

relatório, mas está implícita durante todo o debate, é a questão da transparência.

Uma Política que não é transparente em sua base estrutural - no levantamento de

dados, na forma de avaliar as prioridades, na distribuição de recursos entre os diversos

atores – inviabiliza sua avaliação, não podendo categorizá-la como eficiente ou adequada.

Uma mudança de paradigma dos gestores de saúde, na base conceitual de como fazer

Política Pública, poderia contribuir para o desenho flexível de políticas no que tange sua

estrutura técnico-institucional.

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