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COMPLIANCE TRABALHISTA @professorfabriciolima @iurippinheiro Fabrício Lima Silva Iuri Pinheiro

Compliance trabalhista - dicastrabalhistas.com.br · O Decreto n. 8.420/15 regulamentou a referida lei, passando dispor sobre os programas de integridade, estabelecendo que: Art

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COMPLIANCE TRABALHISTA

@professorfabriciolima

@iurippinheiro

Fabrício Lima Silva

Iuri Pinheiro

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Sumário Governança corporativa: notas introdutórias ............................................................................... 2

Governança corporativa: princípios fundamentais ....................................................................... 8

Compliance: agir em conformidade com a lei............................................................................... 9

As vantagens de implementação de programas de compliance e a viabilidade de implementação em pequenas e médias empresas ..................................................................... 14

Compliance Trabalhista ............................................................................................................... 15

Compliance com foco no Gerenciamento de Riscos e Controles Internos ................................. 20

Implantação do programa de compliance – treinamentos e responsáveis ................................ 22

Auditoria trabalhista ................................................................................................................... 24

Poder empregatício ..................................................................................................................... 26

Código de Ética e Conduta .......................................................................................................... 27

Canais de Denúncia e Investigação ............................................................................................. 30

Compliance e Prevenção de Litígios Trabalhistas ....................................................................... 32

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Governança corporativa: notas introdutórias

As organizações nacionais e internacionais estão passando por grandes transformações, principalmente, em decorrência do fenômeno da globalização e da volatilidade dos investimentos internacionais, obrigando-as a realizar significativas alterações institucionais, com a readequação das estruturas societárias e adoção de novos modelos de gestão.

Nesse contexto, surge a governança corporativa, que remete à implantação de um modelo de administração, com a finalidade de otimizar o desempenho da empresa e facilitar o acesso ao capital, abrangendo o relacionamento entre sócios, conselho de administração, órgãos públicos de fiscalização, empregados e demais partes interessadas (stakeholders).

A governança corporativa tem como objetivo instituir um modelo de gestão no qual as empresas procuram, voluntariamente, cumprir as regras e tomar decisões no interesse comum de longo prazo da organização, com adoção de medidas de transparência e sustentabilidade financeira, adotando um modelo de autorregulação.

A Comissão de Valores Mobiliários – CVM, em sua cartilha de Recomendações sobre Governança Corporativa, destaca que:

Governança corporativa é o conjunto de práticas que tem por finalidade otimizar o desempenho de uma companhia ao proteger todas as partes interessadas, tais como investidores, empregados e credores, facilitando o acesso ao capital. A análise das práticas de governança corporativa aplicada ao mercado de capitais envolve, principalmente: transparência, equidade de tratamento dos acionistas e prestação de contas1.

O americano Robert Monks, formado em direito pela Universidade de Harvard, ficou conhecido como o “pai da governança”, por ter percebido, a partir da segunda metade da década 80, que havia inúmeras distorções na gestão das companhias, uma vez que que os destinos destas não eram delineados por seus proprietários e acionistas, mas sim pelos seus dirigentes e administradores, ocasionando os denominados conflitos de agência.

Ele criticava a omissão dos acionistas, que apenas se preocupavam com a manutenção de seus privilégios e com o valor das ações, passando a ser o principal defensor da necessidade de uma mudança de tal postura, propugnando que os investidores institucionais de todo o mundo se unissem para tornar as corporações mais responsáveis perante seus acionistas.

Um dos primeiros documentos sobre governança corporativa de que se tem notícias no mundo foi o relatório Cadbury (Cadbury Report), elaborado no Reino Unido em 1992, para definir responsabilidades de conselheiros e executivos, objetivando a prestação responsável de contas e transparência, em atenção aos interesses legítimos dos acionistas. O referido relatório

1 Cf. site da Comissão de Valores Mobiliários - CVM: <www.cvm.org.br>.

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abordou dois valores fundamentais do atual modelo de governança: a prestação de contas responsável (accountabiliy) e a maior transparência (disclosure).

Em 1999, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que constitui foro composto por 35 países dedicado à promoção de padrões convergentes em vários temas, como questões econômicas, financeiras, comerciais, sociais e ambientais, lançou um documento de referência denominado “Princípios de Governança Corporativa” (OECD Principles of Corporate Governance)2.

Em 2004, em razão da importância que o documento assumiu internacionalmente, este foi revisto e ampliado3.

A partir dos princípios da OCDE, a cultura de boas práticas de governança corporativa difundiu-se por vários países, com a implantação de códigos nacionais, não apenas em países desenvolvidos, mas também em países emergentes.

No referido documento, restou consignado que a boa governança corporativa ajuda a construir um ambiente de credibilidade, transparência e responsabilidade necessárias para fomentar o investimento a longo prazo, a estabilidade financeira e a integridade dos negócios, apoiando um crescimento mais sólido e inclusivo.

Entretanto, a adoção de boas práticas de governança não impediu que ocorressem diversas fraudes e escândalos corporativos no início do século XXI, dentre as quais podemos citar as que envolveram grandes empresas norte americanas: World.com, Xerox e Enron.

No Brasil, ocorreram escândalos envolvendo as empresas dos grupos EBX, JBS e da Petrobrás, demonstrando falhas na implementação de políticas de governança corporativa e a necessidade de revisão das práticas de mercado.

Nesse contexto histórico, começaram a surgir legislações nacionais tornando a adoção de práticas de governança obrigatórias, com a previsão de punições aos envolvidos em fraudes, podendo-se citar como exemplo a Lei Sabaney-Osley, aprovada pelo Congresso dos EUA, em julho de 2002.

No Brasil, em 1995, foi fundado o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), responsável pela edição do “Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa”4.

O IBGC assim define a governança corporativa:

Governança corporativa é o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os

2 OECD (1999), OECD Principles of Corporate Governance, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264173705-en. 3 OECD (2004), OECD Principles of Corporate Governance 2004, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264015999-en. 4 http://www.ibgc.org.br/userfiles/files/Publicacoes/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf

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relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas. As boas práticas de governança corporativa convertem princípios básicos em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor econômico de longo prazo da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para a qualidade da gestão da organização, sua longevidade e o bem comum5.

Em 1998, foi a aprovada a Lei de combate aos crimes de lavagem de dinheiro (Lei no 9.613), que criou o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) e foi editada a Resolução n. 2.554 do Banco Central do Brasil (BCB), que passou a disciplinar a criação de estruturas e mecanismos de controles internos de riscos para as instituições financeiras.

Em 2013, foi publicada a Lei n. 12.846, denominada Lei de Combate à Corrupção ou Lei da Empresa Limpa, com a previsão de redução das sanções pecuniárias para empresas que passassem a adotar programas de integridade, in verbis:

Art. 7º Serão levados em consideração na aplicação das sanções:

(...)

VIII - a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica;

O Decreto n. 8.420/15 regulamentou a referida lei, passando dispor sobre os programas de integridade, estabelecendo que:

Art. 41. Para fins do disposto neste Decreto, programa de integridade consiste, no âmbito de uma pessoa jurídica, no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira.

Parágrafo Único. O programa de integridade deve ser estruturado, aplicado e atualizado de acordo com as características e riscos atuais das atividades de cada pessoa jurídica, a qual por sua vez deve garantir o constante aprimoramento e adaptação do referido programa, visando garantir sua efetividade.

Art. 42. Para fins do disposto no § 4o do art. 5o, o programa de integridade será avaliado, quanto a sua existência e aplicação, de acordo com os seguintes parâmetros:

5 Cf. o site http://www.ibgc.org.br.

5

I - comprometimento da alta direção da pessoa jurídica, incluídos os conselhos, evidenciado pelo apoio visível e inequívoco ao programa;

II - padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os empregados e administradores, independentemente de cargo ou função exercidos;

III - padrões de conduta, código de ética e políticas de integridade estendidas, quando necessário, a terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados;

IV - treinamentos periódicos sobre o programa de integridade;

V - análise periódica de riscos para realizar adaptações necessárias ao programa de integridade;

VI - registros contábeis que reflitam de forma completa e precisa as transações da pessoa jurídica;

VII - controles internos que assegurem a pronta elaboração e confiabilidade de relatórios e demonstrações financeiros da pessoa jurídica;

VIII - procedimentos específicos para prevenir fraudes e ilícitos no âmbito de processos licitatórios, na execução de contratos administrativos ou em qualquer interação com o setor público, ainda que intermediada por terceiros, tal como pagamento de tributos, sujeição a fiscalizações, ou obtenção de autorizações, licenças, permissões e certidões;

IX - independência, estrutura e autoridade da instância interna responsável pela aplicação do programa de integridade e fiscalização de seu cumprimento;

X - canais de denúncia de irregularidades, abertos e amplamente divulgados a funcionários e terceiros, e de mecanismos destinados à proteção de denunciantes de boa-fé;

XI - medidas disciplinares em caso de violação do programa de integridade;

XII - procedimentos que assegurem a pronta interrupção de irregularidades ou infrações detectadas e a tempestiva remediação dos danos gerados;

XIII - diligências apropriadas para contratação e, conforme o caso, supervisão, de terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados;

XIV - verificação, durante os processos de fusões, aquisições e reestruturações societárias, do cometimento de irregularidades ou ilícitos ou da existência de vulnerabilidades nas pessoas jurídicas envolvidas;

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XV - monitoramento contínuo do programa de integridade visando seu aperfeiçoamento na prevenção, detecção e combate à ocorrência dos atos lesivos previstos no art. 5o da Lei no 12.846, de 2013; e

XVI - transparência da pessoa jurídica quanto a doações para candidatos e partidos políticos.

§ 1º Na avaliação dos parâmetros de que trata este artigo, serão considerados o porte e especificidades da pessoa jurídica, tais como:

I - a quantidade de funcionários, empregados e colaboradores;

II - a complexidade da hierarquia interna e a quantidade de departamentos, diretorias ou setores;

III - a utilização de agentes intermediários como consultores ou representantes comerciais;

IV - o setor do mercado em que atua;

V - os países em que atua, direta ou indiretamente;

VI - o grau de interação com o setor público e a importância de autorizações, licenças e permissões governamentais em suas operações;

VII - a quantidade e a localização das pessoas jurídicas que integram o grupo econômico; e

VIII - o fato de ser qualificada como microempresa ou empresa de pequeno porte.

§ 2º A efetividade do programa de integridade em relação ao ato lesivo objeto de apuração será considerada para fins da avaliação de que trata o caput.

§ 3º Na avaliação de microempresas e empresas de pequeno porte, serão reduzidas as formalidades dos parâmetros previstos neste artigo, não se exigindo, especificamente, os incisos III, V, IX, X, XIII, XIV e XV do caput.

§ 4o Caberá ao Ministro de Estado Chefe da Controladoria-Geral da União expedir orientações, normas e procedimentos complementares referentes à avaliação do programa de integridade de que trata este Capítulo.

§ 5o A redução dos parâmetros de avaliação para as microempresas e empresas de pequeno porte de que trata o § 3o poderá ser objeto de regulamentação por ato conjunto do Ministro de Estado Chefe da Secretaria da Micro e Pequena Empresa e do Ministro de Estado Chefe da Controladoria-Geral da União.

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Em 2015, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça, que tem como objetivo orientar, fiscalizar, prevenir e apurar abusos do poder econômico, publicou o “Guia de Programas de Compliance”, com orientações sobre estruturação e benefícios da adoção dos programas de compliance concorrencial.

A Lei n. 13.303/16 passou a impor às empresas estatais os deveres de integridade, transparência e controle interno, estabelecendo a obrigatoriedade de adoção de estruturas e práticas de gestão de riscos e controle interno, de elaboração e divulgação de um Código de Conduta e Integridade, com a previsão da existência de canais de denúncias, sanções, proteção contra retaliações, treinamentos periódicos, auditoria e adequação periódica de suas práticas ao Código de Conduta e Integridade e a outras regras de boa prática de governança corporativa.

Recentemente, a Portaria 86/2019 do Ministério da Justiça instituiu o “Sistema de Governança do Ministério da Justiça e Segurança Pública - SG-MJSP”, com o objetivo de organizar o processo decisório quanto à gestão estratégica, gestão de riscos e controles internos, integridade, gestão de políticas públicas, transparência e gestão administrativa.

Por fim, está em trâmite em nosso Congresso Nacional, o Projeto de Lei 7.149/2017, que contém a previsão de que "as pessoas jurídicas que celebrarem contrato com a administração pública deverão desenvolver programas de compliance”.

Após os escândalos contábeis e de corrupção, os mercados, sensíveis aos reflexos das mudanças ocorridas em decorrência da implantação de programas de governança, passaram a adotar ágio por ações de empresas com sistemas mais apurados de governança e deságio nos casos opostos, conforme índices adotados por agências de avaliação.

O que se nota, portanto, é a inegável tendência de que todos os segmentos, sejam públicos ou privados, se preparem para essa nova realidade de agir em conformidade, tanto para cumprir o dever que vêm sendo imposto pelas leis como para evitar litígios, formação de passivo e cuidar adequadamente da imagem e função social da empresa.

Não se pode ignorar que o retorno da filosofia liberal abre espaços públicos para o segmento privado (concessões, privatizações, dentre outras perspectivas), mas com esse alargamento de espaço também surgem mais responsabilidades, afinal, direitos e deveres são faces da mesma moeda.

Importante destacar que a adoção de boas práticas de governança corporativa não se restringe às empresas de capital aberto, com ações negociadas em bolsas de valores, podendo ser implementadas em empresas de pequeno e médio porte, ainda que familiares, sempre com o foco na excelência empresarial, com a diminuição de riscos e obtenção de vantagens concorrenciais.

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Governança corporativa: princípios fundamentais

A governança corporativa possui como princípios fundamentais: i) transparência (disclosure); ii) equidade (fairness); iii) prestação de contas (accountability); e, iv) conformidade (compliance).

A transparência é o requisito de divulgação precisa e oportuna de todas as questões relevantes relacionadas com a corporação, inclusive situação financeira, desempenho, composição societária e governança da empresa, o que pode ser realizado por meio de um balanço social corporativo, transmitindo ao mercado uma imagem de respeitabilidade e confiabilidade.

A questão é tratada no Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC, segundo o qual, tal princípio consiste “no desejo de disponibilizar para as partes interessadas as informações que sejam de seu interesse, e não apenas aquelas impostas por disposições de leis ou regulamentos. Não deve restringir-se ao desempenho econômico-financeiro, contemplando também os demais fatores (inclusive intangíveis) que norteiam a ação gerencial e que conduzem à preservação e à otimização do valor da organização”6.

CHAGAS e OLIVEIRA, ao tratarem de Governança Corporativa e Sustentabilidade, destacam que:

O mercado, tanto no plano nacional quanto internacional, é indutor de mudanças nas organizações. As organizações, para se tornarem mais atrativas a investimentos procuram demonstrar o seu compromisso com a perenidade do negócio.

Com isso, há um aumento na pressão por transparência, não só com relação às regras que regem o relacionamento dos interesses de acionistas controladores, acionistas minoritários e administradores dentro de uma companhia, mas também com relação às atividades que evidenciam a inclusão de aspectos sociais e ambientais nas atividades da empresa e nas interações com stakeholders. O conceito de Friedman de que a única responsabilidade social dos negócios seria puramente econômica, ou seja, que a organização, ao maximizar seus lucros, geraria bem-estar para toda a sociedade, já não encontra mais lugar na sociedade atual.

Os investidores cada vez mais buscam aplicações de seus recursos em negócios que equilibrem estratégias de curto e longo prazo, com componentes de perenidade e sustentabilidade. Dessa forma, privilegiam a alocação de investimento em negócios que sejam socialmente responsáveis, sustentáveis e rentáveis, pois elas gerariam valor para o acionista a longo

6 Cf. o site http://www.ibgc.org.br.

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prazo, uma vez que estariam mais preparadas para enfrentar os desafios futuros7.

Pelo princípio da equidade, o sistema de governança corporativa deve garantir o tratamento justo e isonômico entre todos os sócios e demais partes interessadas, incluindo-se os acionistas minoritários e estrangeiros, levando em consideração seus direitos, deveres, necessidades, interesses e expectativas.

Pela prestação de contas, os gestores devem cumprir a obrigação de prestar contas de seus atos ligados à administração da sociedade, como medida de transparência e de comprometimento com os princípios institucionais a serem perseguidos. Trata-se de uma importante ferramenta de controle e prevenção de desvios de conduta/finalidade.

Segundo o Código das Melhores Práticas do IBGC, os “agentes de governança devem prestar contas de sua atuação de modo claro, conciso, compreensível e tempestivo, assumindo integralmente as consequências de seus atos e omissões e atuando com diligência e responsabilidade no âmbito dos seus papéis”8.

Por fim, temos o princípio da conformidade ou do compliance, sendo este último termo amplamente utilizado em ambientes de negócios em nosso país. O compliance, objeto do presente curso, é apenas uma das facetas da governança corporativa, mas de extrema relevância para prevenção de litígios e criação de oportunidade de expansão negocial.

O termo compliance deriva do verbo inglês: “to comply”, que significa cumprir, realizar ou satisfazer o que foi imposto. E, no âmbito de uma organização, as obrigações a serem observadas são extremamente diversificadas (ambientais, cíveis, empresariais, consumeristas, trabalhistas, dentre outras).

Compliance: agir em conformidade com a lei

O compliance pode ser definido com o princípio de governança corporativa que tem por objetivo promover a cultura organizacional de ética, transparência e eficiência de gestão, para que todas as ações dos integrantes da empresa estejam em conformidade com a legislação, controles internos e externos, valores e princípios, além das demais regulamentações do seu seguimento.

O objetivo é bastante ambicioso, não se restringindo à implantação de mecanismos de compliance, mas também na mudança da cultura corporativa e do clima organizacional.

No Brasil, o termo “compliance” é sinônimo da expressão “programa de integridade”, conforme previsto na Lei n. 12.846/13 e no Decreto n. 8.420/15.

7 CHAGAS, Ana Paula; OLIVEIRA, Luís Gustavo Miranda de. Governança Corporativa e Sustentabilidade: A Importância do Compliance Ambiental. In: OLIVEIRA, Luis Gustavo Miranda de (Org.). Compliance e integridade: aspectos práticos e teóricos. V. 2. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2019, pp. 65/66. 8 Cf. o site http://www.ibgc.org.br.

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Todavia, doutrinariamente, há quem defenda que os termos não são coincidentes, sendo que o compliance abrangeria todos os aspectos legais e de conformidade aplicáveis à atividade empresarial e, por sua vez, o programa de integridade seria restrito ao combate à corrupção.

CARDOSO e MELO asseveram que:

As práticas de conformidade (compliance) são mecanismos utilizados pelas empresas para redução de riscos e adequação de condutas à legislação pertinente à sua atividade. Atualmente, o compliance representa um importante mecanismo de transparência e gestão de companhias, tendo interferência direta no seu relacionamento com os acionistas, clientes, empregados, autoridades governamentais e demais âmbitos da sociedade9.

Igualmente, salientam OLIVEIRA e OLIVEIRA, que um programa de compliance: “consiste em conjunto de medidas a serem adotadas pelas empresas com o objetivo de prevenir, detectar e responder a riscos de integridade”10. Em tal definição, verificamos o tripé de atuação do compliance: prevenir, detectar e remediar.

Importante destacar que os programas de compliance não se restringem ao combate à corrupção. Tais programas, para manterem lógica, consistência e coerência, devem versar sobre todas esferas da empresa, envolvendo questões fiscais, contábeis, trabalhistas, financeiras, ambientais, jurídicas, previdenciárias, éticas, dentre outras. Assim, recomendável a adoção de um programa mais amplo e abrangente de integridade e ética corporativa.

A implantação de programas de compliance está diretamente relacionada à diminuição de riscos, sendo muito importantes as ações de planejamento, execução e monitoramento, com ferramenta de proteção contra desvios de conduta e de preservação/geração de valor econômico.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), no documento intitulado “Compliance à luz da governança corporativa”, destaca que:

Os custos de não conformidade também estão maiores, não só pelos encargos substanciais com eventuais inquéritos e processos administrativos e/ou judiciais, mas também pelos reflexos do envolvimento em escândalos, que expõem a imagem e a reputação das organizações, com impacto no seu valor econômico e gerando perdas para a sociedade em geral11.

Além disso, no mesmo documento, o IBGC salienta a importância da distinção entre “estar em compliance” e “ser compliant”, in verbis:

9 CARDOSO, Alessandro Mendes; MELO, Anthéia Aquino. Compliance tributário e a responsabilização pessoal dos gestores. In: OLIVEIRA, Luis Gustavo Miranda de (Org.). Compliance e integridade: aspectos práticos e teóricos. V. 2. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2019, p. 123. 10 OLIVEIRA, Marcos Vasconcelos Rodrigues de; OLIVEIRA, Luiz Gustavo Miranda de. In: OLIVEIRA, Luis Gustavo Miranda de (Org.). Op. Cit. pp. 111/112. 11 Compliance à luz da governança corporativa / Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. São Paulo, SP9: IBGC, 2017. (Série: IBGC Orienta), p. 9.

11

Há uma grande tendência de caracterizar o compliance como uma atividade operacional (“estar em compliance”) e não estratégica (“ser compliant”), alinhada à identidade organizacional e a comportamentos éticos. Estar em compliance é cumprir a legislação e as políticas internas por mera obrigação ou para reduzir eventuais penalidades, caso a organização sofra uma punição. Ser compliant é o cumprimento consciente e deliberado da legislação e de políticas internas, guiado pelos princípios e valores que compõem a identidade da organização, visando sua longevidade.

Nesse sentido, buscamos ressaltar também como finalidade do sistema de compliance a integridade, não no sentido estrito das medidas voltadas para a prevenção de ilícitos, mas como a coerência entre pensamento, discurso e ação, buscando fortalecer a cultura e a reputação da organização. Aqui, o termo é empregado com a conotação proposta por Erhard e Jensen de “honrar a palavra” – não necessariamente cumpri-la, em virtude dos imprevistos do dia a dia –, reconhecendo-se os interesses das diferentes partes interessadas (stakeholders) da organização para evitar que eles sejam surpreendidos por decisões ou mudanças de planos12.

As políticas de metas e a necessidade de obtenção e lucro a qualquer preço não podem ser utilizadas como argumento para justificar desvios de conduta ética, sendo que as empresas devem considerar, em seus planejamentos estratégicos, a responsabilidade social e ambiental, reduzindo interferências negativas e promovendo os aspectos positivos no mercado em que estão inseridas.

Para implantação dos programas de compliance, algumas medidas podem ser adotadas, dentre as quais citamos:

- Mapeamento/Gestão de riscos;

- Implantação do código de conduta;

- Realização de treinamentos;

- Abertura de canais para apuração de desconformidades;

- Aplicação correta de medidas disciplinares.

- Auditorias;

O programa de compliance deve estar integrado ao sistema de gerenciamento de riscos, com o mapeamento de todas as legislações e regulações às quais a empresa esteja sujeita, contemplando ações de mitigação envolvendo riscos de fraude, corrupção e infração à lei.

Neste aspecto, o IBGC estabelece que: “Entre as categorias de riscos de compliance destacam-se: corrupção e suborno; práticas anticoncorrenciais; assédio (moral, sexual e abuso de

12 Op. Cit., pp. 12/13.

12

autoridade); discriminação; vulnerabilidades cibernéticas; desrespeito a direitos humanos e trabalhistas; conflito de interesses; roubos e desfalques; fraudes contábeis; lavagem de dinheiro; impactos socioambientais; e evasão fiscal e tributária”13.

O CADE, em seu Guia Programas de Compliance, dispõe que: “A adoção de programas de compliance identifica, mitiga e remedia os riscos de violações da lei, logo de suas consequências adversas”14.

O código de conduta, por sua vez, atua na promoção de princípios éticos, refletindo a identidade e a cultura organizacional, propugnando por questões de responsabilidade e de respeito: ambientais e sociais. São comportamentos esperados de sócios, administradores, colaboradores, fornecedores e demais partes interessadas.

Segundo o IBGC, a “criação e o cumprimento de um código de conduta elevam o nível de confiança interno e externo na organização e, como resultado, o valor de dois de seus ativos mais importantes: sua reputação e imagem”15.

A elaboração do código de conduta, para ter maior legitimidade, deve contar com a participação de todos os envolvidos: administradores, colaboradores e demais interessados.

Além disso, para o sucesso da implantação do código, é necessário que exista coerência entre as práticas adotadas pela direção da empresa e as posturas propugnadas no código de ética, sob pena de esvaziamento do seu sentido e perda de eficácia.

Deve existir o envolvimento da alta direção da empresa (tone from the top), com a inserção do programa de integridade como valor fundamental da cultura corporativa, com a inclusão do tema com uma das prioridades estratégicas e com o comprometimento de todos. A alta administração deve, muito além do que elaborar os manuais de boas condutas e regulamentos, segui-los fielmente, estimulando denúncia, aplicando correta e tempestivamente as punições.

Nesse sentido, destaca SNYDER, em seu artigo “Compliance is a Culture, Not Just a Policy”:

Os executivos seniores de uma empresa e o conselho de administração devem apoiar e se envolver totalmente com os esforços de conformidade da empresa. Se a gerência sênior não apoiar ativamente e cultivar uma cultura de conformidade, uma empresa terá um programa de conformidade de papel, mas não efetivo. Os funcionários irão seguir o exemplo de seus chefes. Se os patrões levarem a conformidade a sério, os funcionários são muito mais propensos a levá-la a sério. E se eles não, os funcionários não. Simples assim16.

13 Op. Cit., p. 33. 14 Cf. o site: http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/guias_do_Cade/guia-compliance-versao-oficial.pdf/view 15 IBGC, Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa, 2015, p. 93. 16 SNYDER, Brent. Compliance is a culture, not just a policy. DOJ. 2014. Disponível em: https://www.justice.gov/atr/file/517796/download. Acesso em: 24/03/2019 (Tradução livre).

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Os treinamentos são extremante importantes para implementação e para o bom desempenho dos programas de conformidade, com a divulgação das boas práticas e das ferramentas de compliance. Tais treinamentos devem possuir certa regularidade e envolver todos os setores da empresa (desde a alta administração até os mais baixos cargos), com diferentes enfoques e conteúdos, a depender do setor de atuação.

A importância dos treinamentos também é destacada no Guia Programas de Compliance do CADE:

Os treinamentos oferecidos aos colaboradores são uma forma bastante adequada para se transmitir cada um dos objetivos e regras do programa. É também por meio deles que os colaboradores se sensibilizam e compreendem corretamente a importância do compliance e têm a oportunidade de esclarecer dúvidas específicas sobre os procedimentos, o que geralmente contribui para seu engajamento nas atividades.

O treinamento mais efetivo geralmente adota diferentes enfoques de conteúdo, a depender da posição hierárquica e do nível de exposição a riscos concorrenciais dos colaboradores treinados, e ocorre de forma periódica. Isso ocorre porque, de forma geral, colaboradores que interagem com concorrentes ou alocados nas áreas de vendas e marketing estão mais sujeitos a risco do que aqueles alocados nas demais áreas de uma empresa17.

Outra ferramenta importante para o bom desenvolvimento do compliance é a abertura de canais para o recebimento de reclamações e denúncias (whistleblowing), com a adoção de mecanismos para apuração de eventuais desvios de conduta, garantindo-se o sigilo, o correto encaminhamento das denúncias e a preservação da privacidade dos envolvidos.

Diretamente relacionada à apuração de desconformidades, está a correta aplicação de medidas disciplinares, com a adoção de critérios claros, precisos e suficientes, com o cumprimento da legislação correspondente, evitando-se que haja tratamento discriminatório, falhas de apuração ou desvios de finalidade.

Por fim, especial relevância assumem os mecanismos de auditoria, internas ou externas, uma vez que estes atuam no monitoramento da efetividade e eficiência dos programas de integridade, investigando, certificando, ou apontando inconsistências, proporcionando subsídios para a tomada de decisões estratégicas.

17 Cf. o site: http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/guias_do_Cade/guia-compliance-versao-oficial.pdf/view

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As vantagens de implementação de programas de compliance e a viabilidade de implementação em pequenas e médias empresas

Uma das principais vantagens da implementação de um programa de compliance é a viabilização da existência de mecanismos para a rápida identificação de violações à lei, com a possibilidade de pronta resposta pela organização, evitando-se que condutas lesivas sejam perpetuadas e que os prejuízos assumam proporções maiores.

A conscientização promovida pelos programas de compliance tende a evitar ou a diminuir o risco de que práticas indesejadas venham a ocorrer.

Além disso, a adoção de programas de governança corporativa e compliance tem um grande impacto na valorização da imagem e reputação da empresa, que passa a demonstrar maior credibilidade e segurança, agregando valor ao negócio.

O CADE elenca, em seu Guia Programas de Compliance, quais são os benefícios da implementação do programa de integridade para as organizações:

i) prevenção de riscos: a adoção de programas de compliance identifica, mitiga e remedia os riscos de violações da lei, logo de suas consequências adversas;

ii) identificação antecipada de problemas: a conscientização promovida pelos programas de compliance acerca das condutas indesejadas permite a identificação de violações à lei mais rapidamente, favorecendo pronta resposta pela organização;

iii) reconhecimento de ilicitudes em outras organizações: conscientização promovida pelos programas de compliance permite que os funcionários identifiquem sinais de que outras organizações, como concorrentes, fornecedores, distribuidores ou clientes, possam estar infringindo a lei;

iv) benefício reputacional: ações afirmativas de incentivo à conformidade com a lei são parte essencial de uma cultura de ética nos negócios, que resulta em benefícios para a reputação da organização e sua atratividade para fins promocionais, de recrutamento e de retenção de colaboradores. Essas ações tendem a aumentar a satisfação e o comprometimento no trabalho e o senso de pertencimento e identificação com o grupo. O comprometimento com a observância das leis também inspira confiança em investidores, parceiros comerciais, clientes e consumidores que valorizam organizações que operam de forma ética e que se sentiriam enganados em caso de infração;

v) conscientização dos funcionários: colaboradores cientes das “regras do jogo” estão em melhor posição para fazer negócios sem receio de violar as

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leis, assim como para procurar assistência caso identifiquem possíveis questões sensíveis;

vi) redução de custos e contingências: a adoção de um programa de compliance pode evitar que as empresas incorram em custos e contingências com investigações, multas, publicidade negativa, interrupção das atividades, inexequibilidade dos contratos ou cláusulas ilegais, indenizações, impedimento de acesso a recursos públicos ou de participação em licitações públicas, etc18.

Tais benefícios, embora apresentados sobre o prisma do compliance concorrencial, são plenamente aplicáveis a todos os outros aspectos do compliance, incluindo-se o trabalhista, objeto do presente trabalho.

Importante destacar, conforme já salientado anteriormente quanto aos programas de governança corporativa, não há impedimento para que pequenas e médias empresas, mesmo com orçamentos reduzidos, também implementem programas de compliance.

Na introdução do guia elaborado pela Society of Corporate Compliance and Ethitcs (SCCE), especificamente para programas de compliance com orçamentos reduzidos, está registrado que:

Qualquer pessoa com experiência empresarial e honestidade sabe que qualquer operação comercial pode ser gerenciada de maneira eficiente ou ineficiente. Conformidade não é diferente. Você pode implementar um programa de conformidade eficaz com um pequeno investimento se você souber o que está fazendo19.

Assim, muitas das medidas de prevenção, acompanhamento e execução que serão tratadas na presente obra serão plenamente aplicáveis às empresas com menor porte, desde que realizadas as devidas adaptações às respectivas realidades.

Compliance Trabalhista

A partir do momento em que as empresas tomam consciência de que, além de procurar maximizar os seus resultados, devem observar os limites de integridade, os programas de governança e compliance assumem um papel de extrema importância.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), em seu “Código de Melhores Práticas e Governança Corporativa”, salienta que:

A prática constante da deliberação ética consolida a identidade, a coerência entre o pensar, o falar e o agir e, consequentemente, a reputação da

18 Cf. o site: http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/guias_do_Cade/guia-compliance-versao-oficial.pdf/view 19 SCCE – A Compliance & Ethics Program on a Dollar a Day: How Small Companies Can Have Effective Program (Tradução livre).

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organização, com reflexos sobre a sua cultura. A boa reputação contribui para redução dos custos tanto de transação quanto de capital, favorecendo a preservação e criação de valor econômico pela organização.

A reflexão sobre a identidade da organização é fundamental para se desenhar o sistema de governança da organização, incluindo a elaboração de um código de conduta sobre o qual se desenvolve o sistema de conformidade (compliance)20.

Com a intensificação da globalização, as grandes empresas transnacionais passaram a deslocar sua produção para países com menor custo, com a adoção de aprimoradas e diversificadas cadeias globais de suprimentos. Os países desenvolvidos passaram a internacionalizar as atividades de manufatura, concentrando em seus territórios apenas os trabalhos intelectuais e de inovação, com maior valor agregado.

Tal prática, acabou por provocar a desnacionalização das empresas, com o crescimento dos índices de desemprego nos países desenvolvidos e precarização do trabalho nos países subdesenvolvidos.

Nesse quadro, o combate ao denominado “dumping social” passa a ter grande importância para garantia de isonomia entre os atores internacionais, conforme preconizado pela Organização Mundial do Comércio – OMC, com a previsão de inclusão de cláusulas sociais, com o objetivo de combater condições de trabalho degradantes, com a imposição de restrições comerciais aos países que não observem os padrões mínimos laborais.

Conforme salientando pela Organização Internacional do Trabalho - OIT, no estudo “Workplace Compliance in Global Supply Chains”, os empreendimentos devem competir pela qualidade de seus bens e serviços, e não por sua capacidade de minimizar os custos de mão-de-obra.

Em junho de 2016, a Conferência Internacional do Trabalho da OIT adotou uma resolução relativa ao trabalho decente nas cadeias de fornecimento globais, com o reconhecimento de que as falhas neste setor contribuem para precarização das relações sociais, existindo a necessidade de nivelamento da oferta global de mão-de-obra, com o respeito universal princípios e direitos fundamentais no trabalho previstos na Declaração da OIT de 1998.

Assim ressalta ROJAS, em seu artigo “¿Es posible un cumplimiento normativo laboral ético y responsable?”:

(...) la clave de cualquier programa de compliance laboral residirá en su capacidade de asegurar un óptimo cumplimiento y vigilância por parte de las empresas no sólo de la normativa laboral nacional o comunitaria que sea de aplicación, sino también y especialmente el cumplimiento de las normas y

20 http://www.ibgc.org.br/userfiles/files/Publicacoes/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf

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estándares internacionales existentes en el ámbito laboral y de la protección social de los trabajadores a nível global21.

A postura de tentativa de precarização das relações trabalhistas é totalmente contrária aos princípios de governança corporativa e integridade.

Nesse contexto, surge a demanda pela implantação de abrangentes programas de governança corporativa e compliance, com o objetivo principal de influenciar o desenvolvimento da cultura de conformidade e garantia de condições equitativas de concorrência no mercado global.

Além disso, mesmo em se tratando de empresas que não estão inseridas em mercados globais, é necessária a conscientização de que o capital humano é um importante pilar das organizações e que o descumprimento da legislação trabalhista, além de poder gerar grandes passivos financeiros, pode prejudicar o clima organizacional, com altos índices de absenteísmo, interferindo na produtividade, ocasionando problemas interpessoais e prejuízos para imagem e reputação da empresa.

GIEREMEK, ao tratar especificamente do compliance trabalhista, salienta que:

O cenário empresarial e o ambiente regulatório trabalhista estão cada vez mais complexos, afetando diretamente as relações profissionais. O fato requer atualizações constantes nas políticas internas das empresas.

Aplicado na criação e na manutenção de um código de condutas comportamentais da companhia, o compliance trabalhista entra em cena para imunizar a atmosfera corporativa contra práticas antiéticas e ilegais, atendendo à necessidade das corporações de se manterem pautadas na ética e na legislação vigente.

As ações voltadas à melhoria dos processos de gestão de pessoas são bem-vindas, porque muitos conflitos que causam ações trabalhistas nascem de problemas de relacionamento entre colegas de trabalho, principalmente entre gestores e subordinados22.

Em matéria de compliance, é importante sempre nos lembrar que, conforme já salientado neste trabalho, esta é uma ferramenta de redução e controle de riscos da atividade.

Como bem destacam ANDRADE e FERREIRA, tais riscos vão muito além da esfera patrimonial das ações trabalhistas individuais, in verbis:

Além de ter que indenizar o colaborador pelos direitos descumpridos, no cenário atual, é bem possível que, pelos mesmos fatos, a organização seja ainda multada pela Fiscalização Trabalhista (ou até mesmo interditada) e, finalmente, obrigada pelo Poder Judiciário, provocado por meio de ação coletiva, a passar a cumprir a norma que vem descumprindo. Ou seja, além

21 ROJAS, Raul. http://ecija.com/wp-content/uploads/2017/07/ebook-compliance-laboral.pdf 22 http://compliancebrasil.org/compliance-trabalhista/

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de perder recursos materiais por não cumprir alguma norma pagando indenizações, a empresa, eventualmente, acabará sendo obrigada a cumprir tal norma.

Somem-se a esses elementos já citados, ainda: a responsabilização pessoal e criminal dos gestores e administradores (e até mesmo de empregados); a responsabilidade objetiva da organização por prejuízos causados a terceiros por seus colaboradores; e o fato de que a empresa dificilmente terá como cobrar do empregado o prejuízo amargurado (mesmo que o empregado tenha tido algum tipo de culpa pelo dano da empresa). Todos esses fatores jurídicos apresentados e ainda elementos que extrapolam a esfera jurídica (como a queda na produtividade, o aumento no turnover e a perda de credibilidade perante os consumidores) compreendem, atualmente, a correta noção do que representa o risco trabalhista, ou seja, o risco ao qual a empresa ou organização de qualquer tipo fica exposta quando deixa de cumprir normas trabalhistas (civis ou penais).

Decorre desse contexto a necessidade cada vez mais premente de manuais e de programas de integridade, isso é, de instrumentos e mecanismos que gerem o cumprimento espontâneo e eficiente das normas que as pessoas de uma determinada organização devem seguir.23

ROJAS destaca a importância do compliance laboral:

Así, en el ámbito laboral, el Compliance o Labour Compliance, hace referencia a la función corporativa de prevención y gestión de los riesgos asociados a un eventual incumplimiento normativo laboral en el seno de la organización. El riesgo de cumplimiento (Riesgo de Compliance) en este caso, y dentro del marco descrito por el Comité de Basilea enfocado a la actividad de las entidades financieras pero de perfecta aplicabilidad a cualquier otra área de cumplimiento normativo, se centraría no sólo en los riesgos de sanciones legales o en la eventual nulidad o improcedencia de las decisiones empresariales en el entorno laboral, sino también en las pérdidas económicas y sobre todo la pérdida de reputación que puede sufrir la empresa “como consecuencia de su incapacidad para lograr el cumplimiento de todas las leyes aplicables, las regulaciones, los códigos de conducta y las normas de la buena práctica.”

(...)

Sin duda, en lo que respecta al bloque normativo laboral, se ha producido en los últimos años un notable incremento del riesgo legal debido, entre otros factores, al creciente volumen de producción normativa y a una mayor

23 ANDRADE, Flávio Monteiro de; FERREIRA, Isadora Costa. Compliance trabalhista: Compreendendo a Prevenção de Risco trabalhista por Meio de Programa de Integridade. Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária, nº 331, janeiro, 2017, pp. 81/82.

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complejidad en su interpretación. Es en este contexto de incertidumbre jurídica donde la función del compliance laboral se revela como una herramienta eficaz que, incorporando una serie mecanismos y sistemas de control, tanto internos como externos, tiende a evitar o minimizar los riesgos derivados de un eventual incumplimiento normativo, procurando con ello un apetito de riesgo aceptable para la organización24.

Considerando o caráter privilegiado dos créditos trabalhistas (art. 100 da CF/88), a importância de um compliance nesse segmento se revela como medida racional de uma saudável sobrevivência, além de se configurar conduta essencial para consecução da função social da empresa (art. 170, III, da CF/88).

Relevante atentar também que o cardápio de normas trabalhistas é muito diversificado, perpassando por leis federais, decretos, medidas provisórias, normas coletivas, sentenças normativas e regulamentos empresariais, o que avulta a importância de se criar um programa de conformidade ou integridade até para evitar o descumprimento por desconhecimento, já que as sanções da lei são imperativas.

Ante o retorno das perspectivas liberais com enxugamento da máquina e privatizações, o novo cenário traz maiores responsabilidades porque com o bônus sempre se agrega o ônus. A perspectiva contemporânea passa a ser o setor privado com deveres públicos.

A implantação de programas de compliance na área trabalhista demonstra o reconhecimento da importância que o capital humano possui nas organizações.

É salutar que as empresas tenham consciência de que o descumprimento da legislação trabalhista, além de gerar significativo passivo, pode prejudicar o clima organizacional, com altos índices de absenteísmo e queda de produtividade.

Assim, a implantação de um programa de compliance trabalhista poderá, com a adoção de medidas para detecção, prevenção e correção de erros, combater práticas que possam violar a legislação e elevar índices de satisfação com o clima organizacional da empresa, com reflexos positivos em seus resultados.

Dentre algumas práticas que podem ser adotadas, destacam-se o mapeamento de riscos, implantação do código de conduta, realização de treinamentos, abertura de canais para apuração de desconformidades e aplicação correta de medidas disciplinares.

O programa envolve a elaboração de medidas a serem tomadas no que se refere ao controle interno da organização, bem como relacionadas a mão de obra (empregados, terceirizados e terceiros em geral), devendo prever mecanismos para a padronização e o controle de condutas por parte dos trabalhadores e também do empregador.

Não existe um modelo único de compliance, sendo que cada empresa deve desenvolver abordagens adequadas às peculiaridades do negócio e da empresa, conforme ressalta SNYDER:

24 ROJAS, Raul. http://ecija.com/wp-content/uploads/2017/07/ebook-compliance-laboral.pdf

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Os programas de conformidade devem ser projetados para considerar a natureza dos negócios da empresa e para os mercados em que opera. Uma multinacional fabricante de autopeças com plantas e vendas em todo o mundo provavelmente requer uma abordagem diferente para a conformidade do que um empreiteiro de construção de estradas que opera em um único estado. Ambas as empresas precisam deconformidade efetiva, mas a abordagem necessária pode ser muito diferente25.

Compliance com foco no Gerenciamento de Riscos e Controles Internos

A existência de um adequado gerenciamento de riscos e eficaz sistema de controle interno é essencial para o cumprimento do programa de integridade, em conformidade com os normativos internos, externos e com os objetivos estabelecidos pela alta administração da empresa.

Segundo salienta ASSI:

Antes de se preocupar com a redação e a publicação ou promulgação do código de conduta e das políticas que incorporarão à cultura da empresa, é preciso identificar quais os principais riscos presentes no cotidiano da operação, seja em âmbito interno, seja em âmbito externo – no trato com clientes públicos e privados, fornecedores, parceiros e agentes públicos.

Para elaborar uma matriz que verdadeiramente reflita os riscos da atividade empresarial, viabilizando a identificação da gravidade de cada um e facilitando o posterior desenho dos controles correlatos, é preciso mapear os processos (as rotinas e os procedimentos de cada área), identificando as falhas e quebras de legislação, assim como a frequência em que ocorrem (...)26.

As atividades de controle geralmente abrangem três categorias de riscos: de processo (ou operacionais); de registros; e de conformidade. Os riscos a que a organização se submete devem ser gerenciados para subsidiar a tomada de decisões pelos administradores.

Sob o viés trabalhista, é muito importante que sejam avaliados os processos adotados pelo departamento pessoal, os registros documentais dos contratos de trabalho e a verificação de conformidade com a legislação trabalhista e demais normativos aplicáveis aos contratos de trabalho.

Após o mapeamento dos riscos, ressalta ASSI: “passa-se à fase de desenvolvimento das regras que deverão ser seguidas por todos os membros da corporação como forma de mitigá-los, evitando quebras nos processos e na legislação vigente”27.

25 SNYDER, Brent. Compliance is a culture, not just a policy. DOJ. 2014. Disponível em: https://www.justice.gov/atr/file/517796/download. Acesso em: 24/03/2019. 26 ASSI, Marcos. Compliance: como implementar. São Paulo: Trevisan Editora, 2018. E-book. 27 Op. Cit.

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O sistema de controle interno deve também trabalhar com a antecipação de riscos, com a adoção de medidas preventivas.

Neste aspecto, papel importante assume a auditoria interna, que tem como responsabilidade monitorar, avaliar e realizar recomendações objetivando a melhoria dos sistemas de controles internos e das normas e procedimentos estabelecidos pelos administradores.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), em seu “Código de Melhores Práticas e Governança Corporativa”, também destaca a necessidade de criação de um Comitê de Auditoria Interna em grandes corporações, formado, preferencialmente, por conselheiros independentes e coordenado por um conselheiro independente, que deve dar suporte ao conselho de administração nas seguintes atividades:

i. monitoramento da efetividade e da qualidade dos controles internos da organização;

ii. monitoramento do cumprimento das leis, regulamentos e sistemas de conformidade (compliance) pela organização;

iii. supervisão da estrutura e das atividades de gerenciamento de riscos pela gestão da organização, incluindo os riscos operacionais, financeiros, estratégicos e de imagem, em linha com as diretrizes e políticas estabelecidas pelo conselho de administração;

iv. monitoramento dos aspectos de ética e conduta, incluindo a efetividade do código de conduta e do canal de denúncias (...) (abrangendo o tratamento das denúncias recebidas) e eventual existência de fraude;

v. monitoramento da qualidade do processo contábil e respectivas práticas contábeis selecionadas, da preparação das demonstrações financeiras e outras informações divulgadas a terceiros;

vi. supervisão das atividades da auditoria interna, incluindo a qualidade dos seus trabalhos, estrutura existente, plano de trabalho e resultados dos trabalhos realizados;

vii. suporte ao conselho na contratação ou substituição do auditor independente e supervisão da sua atuação, estrutura, independência perante a organização, qualidade e resultados dos seus trabalhos;

viii. avaliação e monitoramento dos controles existentes para as transações da organização com partes relacionadas, bem como para a sua divulgação28.

Além disso, o Comitê de Auditoria teria função de manter relacionamento com os auditores independentes, com empresas coligadas, controladas e terceiros.

28 http://www.ibgc.org.br/userfiles/files/Publicacoes/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf

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Mais adiante, trataremos das ferramentas e atuação da auditoria e da gestão riscos trabalhistas.

Implantação do programa de compliance – treinamentos e responsáveis

Um programa de compliance bem-sucedido começa com uma base sólida, em que todos os funcionários são treinados para entender completamente o significado de ética e integridade fortes e, em contrapartida, passem a aplicar esses valores em suas atividades.

Para eficiência do programa, é necessário que as empresas identifiquem as áreas de risco, os tipos de produtos e serviços oferecidos, os clientes atendidos, as áreas de atuação, os requisitos legais e regulamentares, os mecanismos de fiscalização, os relatórios, os instrumentos tecnológicos, a elaboração de manuais de treinamento, políticas e procedimentos.

O desenvolvimento de um programa de conformidade requer tempo, recursos e experiência.

As seguintes etapas devem ser observadas para implementação do programa:

a) Identificação de todos os regulamentos e legislações aplicáveis à atividade econômica desenvolvida. Sob o aspecto trabalhista, importante a identificação dos instrumentos coletivos aplicáveis aos contratos de trabalho, as normas de segurança e medicina do trabalho, os dispositivos legais, constitucionais e internacionais, dentre outros.

b) O monitoramento do cumprimento dos regulamentos e obrigações pertinentes ao negócio.

c) Acompanhamento das alterações legislativas e regulamentares, com a avaliação dos requisitos necessários ao fiel cumprimento das obrigações.

d) Identificação das lacunas nos manuais de treinamento, políticas e documentação de procedimentos.

e) Implementação de ferramentas tecnológicas de fluxo de trabalho para riscos, relatórios e desconformidades.

Na seara trabalhista, importante a investigação sobre principais legislações, práticas e rotinas que necessitam de especial atenção, com foco na centralidade dos direitos humanos sociais e na prevenção de litígios.

Para devida implantação de programas de compliance, controle e supervisão do cumprimento normativo pelas empresas, a depender do porte da empresa, pode ser necessária designação de uma pessoa (compliance officer/diretor de compliance) ou a criação de um órgão específico (comitê de compliance), que terá a função de implementar o programa dentro da empresa, elaborando modelos de organização, prevenção e gestão de riscos de conformidade.

Quanto à necessidade de implementação do comitê, o CADE, em seu Guia Programas de Compliance, ressalta que:

No caso de grandes empresas, pode se mostrar prudente dedicar toda uma divisão da companhia ao compliance, montando uma equipe para lidar com o tema. Caso a empresa atue em diversos países ou em diversos setores da economia simultaneamente, pode ainda ser interessante designar

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responsáveis regionais ou setoriais pela observância do programa. Já se a empresa é de pequeno porte, esse tipo de iniciativa costuma fazer menos sentido. Uma vez mais, o essencial é que aquele que coordenará o programa e monitorará sua implementação tenha suficiente independência para que suas decisões atinjam a alta diretoria da companhia e efetivamente sejam levadas em consideração quando da tomada de decisão nos níveis hierárquicos superiores29.

Para que as funções sejam fielmente desempenhadas, com a garantia de eficácia do programa, é indispensável que lhe sejam atribuídos os requisitos de independência e autonomia.

ROJAS30, em seu artigo “Hacia el nuevo Estatuto Laboral del Compliance Officer”, indica algumas condições necessárias para a garantia de tais requistos: i) perfil profissional com conhecimentos jurídicos, conformidade regulatória e gerenciamento de risco corporativo; ii) pacto de remuneração suficiente e de acordo com as responsabilidades assumidas; iii) detalhamento do conteúdo das responsabilidades e funções a serem desenvolvidas, com designação expressa de recursos suficientes e adequados para o desenvolvimento da função de compliance, concedendo os poderes necessários para desempenhar suas funções; iv) posição diferenciada no organograma funcional da organização, reportando-se diretamente ao corpo administrativo da pessoa jurídica, mas ao mesmo tempo garantindo uma separação operacional; v) pacto sobre a cadeia e processo de relato de informações de conformidade; vi) pacto de garantia de indenização e proteção contra possíveis demissões arbitrárias sem justa causa; e, vii) pacto de extinção indenizada do contrato de trabalho em caso de descumprimento da pessoa jurídica das medidas estabelecidas pelo compliance officer em matéria de conformidade regulatória.

Todavia, para a excelência do programa de compliance trabalhista, é extremamente importante que os trabalhadores também participem ativamente do sistema de gerenciamento do programa de conformidade.

Embora o papel assumido pela diretoria e pela alta administração da empresa seja muito importante, seguindo a linha “tone from the top” (o exemplo vem de cima), não podemos desconsiderar a importância de toda a equipe na composição do clima organizacional.

Para que os trabalhadores tenham a consciência de sua importância e se envolvam no processo de mudança de postura corporativa, os treinamentos são essenciais para demonstração dos preceitos de moralidade, ética e valores. É necessário que tenham pleno conhecimento de sua importância na implementação e funcionamento do programa de compliance, devendo ser informados sobre a disponibilização de canais para comunicação de irregularidades, os procedimentos a serem adotados e as consequências esperadas.

Além disso, é extremamente relevante que os componentes da alta administração da empresa também passem por treinamentos constantes e estejam preparados para receber as

29 Cf. o site: http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/guias_do_Cade/guia-compliance-versao-oficial.pdf/view 30 ROJAS, Raul. http://ecija.com/wp-content/uploads/2017/07/ebook-compliance-laboral.pdf

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colaborações dos demais empregados e demonstrem o efetivo compromisso com os valores éticos.

De nada adianta a política do denominado “bluewashing” ou “compliance de fachada”, uma vez que tal prática inviabilizaria a efetividade do programa, por ausência de comprometimento dos envolvidos e falta de legitimação.

Auditoria trabalhista

Auditoria trabalhista é o procedimento de análise de documentos, rotinas, realização de cálculos e conferências, objetivando a conformidade com a legislação vigente e melhoria de processos em uma determinada empresa.

O procedimento de auditoria resulta na publicação de um relatório em que serão apresentadas as não conformidades, as possíveis penalidades e soluções.

BOSCO destaca a importância da auditoria:

Em síntese, e de maneira esquemática, a auditoria trabalhista pode ser conceituada a partir de três ações distintas: (i) identificação dos procedimentos em desacordo com a legislação trabalhista; (ii) proposição de medidas corretivas; (iii) implantação das correções. Se, por um lado, seu escopo liga-se direta e imediatamente a resultados objetivos (evitar/diminuir o risco de autuações e condenações trabalhistas), por outro, de maneira mais ampla e diferida, torna-se grande aliada do empresário na busca de uma administração eficiente e racional, bem como na construção e consolidação de um bom ambiente de trabalho31.

A auditoria pode ser interna, quando realizada por pessoas vinculadas à própria empresa, ou externa, quando realizada por uma empresa de auditoria independente.

A auditoria não se confunde com compliance, conforme salientam LAMBOY, RISEGATO e COIMBRA:

As atividades desenvolvidas pelo compliance e pela auditoria não são coincidentes mas, sim, complementares. A auditoria interna efetua os seus trabalhos de forma aleatória e periódica, por meio de amostragens, a fim de certificar o cumprimento das normas e processos instituídos pela alta administração, bem como a eficiência e eficácia dos controles.

O compliance, por sua vez, executa as suas atividades de forma rotineira e permanente, sendo responsável por monitorar e assegurar que as diversas áreas e unidades da organização estejam em conformidade com a regulação aplicável ao negócio. O compliance dedica, igualmente, grande parte dos seus esforços com

31 BOSCO, Marcelo Tadeu Alves. Auditoria Trabalhista. https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI110151,41046-Auditoria+Trabalhista

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atividades de comunicação e treinamento, com vistas à criação de uma cultura de compliance.

Estas áreas contribuem para identificação de fragilidades nos controles internos e promovem uma cultura de correção dos pontos de não conformidade, por meio de reporte para a alta administração. O compliance engloba o acompanhamento dos pontos falhos identificados pela auditoria até a sua regularização, configurando essa uma das intersecções das duas áreas32.

O planejamento da auditoria pressupõe adequado nível de conhecimento sobre as atividades da empresa, os fatores econômicos, legislação aplicável, as práticas operacionais e o nível geral de competência de sua administração.

A auditoria atua preventivamente, objetivando evitar erros, ineficiências, desvios, fraudes, pagamentos indevidos e outras irregularidades, tais como pagamentos a maior ou menor de salários, tributos, descontos, benefícios, diminuição das reclamatórias trabalhistas e multas.

Antes da implementação de um programa de compliance trabalhista, a auditoria ser uma ferramenta muito útil para identificação dos riscos e desconformidades que deverão ser objeto de especial atenção no programa.

E, ainda, mesmo após a implementação, a auditoria mostra-se extremamente relevante para a avaliação e melhoria da eficácia dos processos de gerenciamento de riscos, de controle, governança corporativa e compliance.

A auditoria trabalhista analisa, dentre outros os seguintes procedimentos:

1) Na área de departamento pessoal: admissão de empregados; cumprimento de convenções, acordos coletivos ou sentenças normativas; controle de jornada e marcação de ponto; folha de pagamento (eventos, rubricas, descontos, pagamentos e incidências); pagamentos; concessão e pagamento de férias; pagamento do 13º salário; recolhimentos tributários e cumprimento das obrigações acessórias; recrutamento e seleção de pessoal;

2) Na área de recursos humanos: recrutamento e seleção; treinamento e desenvolvimento; plano de cargos e salários; regulamento interno e código de conduta; processo de integração; e, planos de benefícios;

3) Na área de segurança e medicina do trabalho: comunicação de acidentes de trabalho; Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT); Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA (NR-4 e NR-5); Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – PPRA (NR-9) e do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional – PCMSO (NR-7); e, demais regulamentos aplicáveis ao negócio, incluindo-se licenças municiais, estaduais e outras aplicáveis ao objeto social desempenhado.

32 Introdução ao Corporate Compliance, Ética e Integridade - Christian K. de Lamboy / Giulia G.A. Pappalardo Risegato / Marcelo de Aguiar Coimbra – p. 31 in Christian Karl de Lamboy Manual de Compliance 1° edição, 2018 – São Paulo: Ed. Ética.

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Dentre os procedimentos citados anteriormente, o auditor deve, exemplificativamente, verificar práticas ou critérios discriminatórios na admissão; proteção de dados dos trabalhadores; condutas antissindicais; falhas nos sistemas de avaliação de desempenho; a regulamentação de participação nos lucros e resultados; pagamentos extrafolha; regularidade dos pagamentos e correto enquadramento jurídico das parcelas; rotatividade de mão-de-obra (turn-over), absenteísmo e gestão documental.

Poder empregatício

O empregado, ao celebrar o contrato individual de trabalho com o empregador, passa a se submeter ao comando e direção deste último, o qual, assumindo os riscos da atividade econômica, passa a dispor do denominado poder empregatício.

O poder empregatício decorre da lei (art. 2º da CLT) e do contrato de trabalho, possuindo diferentes feições: poder diretivo, poder regulamentar, poder fiscalizatório e poder disciplinar.

O poder diretivo ou de organização, conforme destaca DELGADO, “seria um conjunto de prerrogativas tendencialmente concentradas no empregador dirigidas à organização da estrutura e espaço empresariais internos, inclusive o processo de trabalho adotado no estabelecimento e na empresa, com a especificação e orientação cotidianas no que tange à prestação de serviços”33.

O poder regulamentar, por sua vez, seria o conjunto de prerrogativas conferidas ao empregador para o estabelecimento de regras gerais a serem observadas no empreendimento. A legislação pátria não trata especificamente da figura do regulamento de empresa, delimitando o seu alcance e conteúdo, existindo, todavia, jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho sobre a temática.

Diversamente do que ocorre com os instrumentos normativos negociados de trabalho, no regulamento de empresa, as condições mais favoráveis aos empregados nele estabelecidas incorporam-se definitivamente aos contratos de trabalho em vigor, sendo que, posterior alteração, em prejuízo para os empregados, só terá validade em relação aos contratos de trabalho celebrados após o início de sua vigência, nos termos do entendimento da Súmula n. 51, do TST:

SUM-51 NORMA REGULAMENTAR. VANTAGENS E OPÇÃO PELO NOVO REGULAMENTO. ART. 468 DA CLT

I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento.

II - Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro.

Importante destacar que o regulamento de empresa e o código de conduta, tecnicamente, não se confundem, mas ambos decorrem do poder regulamentar do empregador.

O código de conduta, do qual trataremos no próximo tópico, apresenta-se como uma importante ferramenta para programas de compliance, como norteador de comportamentos na empresa,

33 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 8ª ed. São Paulo: LTr, 2009, p. 592.

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representando a formalização das expectativas a respeito do comportamento e da conduta dos sócios, administradores, empregados, fornecedores e demais partes interessadas.

Por sua vez, o poder fiscalizatório confere ao empregador a prerrogativa de controle e fiscalização das atividades de seus empregados.

Por fim, o poder disciplinar assegura ao empregador o direito de impor sanções aos empregados, com o objetivo de garantir o bom funcionamento da organização, coibindo-se desvios de conduta que possam vir a ser praticados pelos empregados.

O exercício dos referidos poderes, desde que observados os limites estabelecidos por nossa legislação, está intrinsicamente ligado ao bom desempenho de programas de compliance ou integridade.

Todavia, importante destacar que os referidos poderes não são ilimitados, encontrando limites internos e externos.

Conforme o disposto no art. 187 do Código Civil, ao tratar da figura do abuso de direito: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

Segundo salienta MARTINS, ao tratar dos limites do poder de direção:

Os limites do poder de direção do empregador são: a Constituição, a lei, a norma coletiva, a boa-fé, o exercício regular de um direito.

O poder de direção não é um direito absoluto. Só por ser um direito, tem limites. Limites externos: Constituição, leis, norma coletiva, contrato. Limites internos: boa-fé objetiva e exercício regular do direito. Se for irregular, o negócio jurídico é ilícito (art. 188, I, do Código Civil).

Portanto, é importante que o empregador compreenda os limites ao desempenho do poder empregatício, conforme as balizas estabelecidas por nossa legislação.

Código de Ética e Conduta

Preliminarmente, importante salientar que há doutrinadores que fazem a distinção entre o código de ética e o código de conduta.

DAINESE, em seu artigo "Códigos de Ética Empresarial e as Relações da Organização com Seus Públicos", salienta a diferença:

A diferença entre ambos parece basear-se na forma como a organização expressa as suas expectativas e compromissos em relação a cada público com quem se relaciona. Um código de ética empresarial seria um reflexo do conjunto de valores centrais da organização, que orienta e dá diretrizes de como os indivíduos "deveriam" agir. Em contraste, um código de conduta empresarial seria uma lista de prescrições, às quais geralmente estão relacionadas penalidades para a violação, que dizem como os indivíduos "devem" agir. É, de certo modo, uma forma de lei. Novamente, ressalta-se

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uma questão fundamental: a ética está diretamente ligada à escolha; sem a liberdade para escolher, não se pode falar em ética, só se pode falar em lei34.

Admitida a distinção, é importante salientar que algumas empresas estabelecem em um mesmo documento questões éticas e de conduta. Além disso, importante destacar que ambos instrumentos elevam o nível de confiança interno e externo na organização, com consequente melhoria da sua reputação e da sua imagem.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), em seu “Compliance à luz Governança Corporativa”, ressalta que:

O código de conduta é a expressão dos princípios éticos e valores da organização, devendo comunicar com clareza diretrizes e orientar a atuação de todos, principalmente em relação a processos críticos de negócios. Representa a formalização das expectativas a respeito do comportamento e da conduta dos sócios, administradores, colaboradores, fornecedores e demais partes interessadas.

Seu conteúdo deve se focar em aspectos essenciais, no sentido de fomentar a transparência, disciplinar as relações internas e externas da organização, administrar conflitos de interesses, proteger o patrimônio físico e intelectual e consolidar as boas práticas de governança corporativa. Não se deve esperar que o código contenha detalhamentos para todas as situações possíveis, que devem estar previstas em políticas específicas. Não se trata de uma “lei” a ser cumprida por dever, mas sim por desejo e efetivo comprometimento.

Para tanto, o código deve ser discutido e elaborado com a participação mais ampla possível de seus administradores, colaboradores e representantes de partes interessadas relevantes. A ampla participação no processo de elaboração do código de conduta pode trazer maior engajamento, prevenindo o descumprimento dos seus preceitos por falta de identificação com o conteúdo ou incompreensão35.

O código de conduta deve ser utilizado para complementar as obrigações legais e regulamentares, considerando-se os objetivos éticos da companhia e as práticas esperadas, de forma clara e direta. A linguagem utilizada deve ser simples, com a apresentação de regras, diretrizes e definições, facilitando a tomada de decisões.

Importante que o código seja elaborado com extrema cautela, uma vez que suas disposições passarão, sob o aspecto trabalhista, integrar os contratos de trabalho e, eventuais alterações

34 DAINEZE, M. A. Códigos de Ética Empresarial e as Relações da Organização com seus Públicos. Universidade de São Paulo. Prêmio Ethos-Valor. Categoria graduação. v. 3. 2003. Disponível em:< http://www.uniethos.org.br>. Acesso em: 30 mar. 2019. 35 https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/23486/Publicacao-IBGCOrienta-ComplianceSobaLuzDaGC-2017.pdf

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futuras, poderão encontrar barreira no princípio da inalterabilidade contratual lesiva, conforme previsão do art. 468, caput, da CLT36.

Além disso, o código deverá ter especial atenção à garantia de tratamento igualitário entre os empregados (isonomia), evitando-se discriminações, garantido a privacidade, a preservação da honra e dos demais atributos constitucionais inerentes à pessoa humana.

Exemplificativamente, poderia constar do código de conduta a vedação do emprego de alcunhas ou apelidos no ambiente de trabalho, limites para utilização do aparelho celular, conteúdo de acesso restrito, informações sigilosas, regras de relacionamento interpessoal, padrão de vestimenta e eventuais penalidades em caso de desobediência.

Embora a CLT trate das faltas que poderiam ensejar a ruptura motivada do contrato de trabalho, esta não é autossuficiente, uma vez que os requisitos para aplicação da penalidade mais grave ao trabalhador não se esgotam em seu texto, dependendo de outros fatores.

Determinadas condutas, embora caracterizem a violação dos deveres contratuais, não são suficientes, por si só, para ensejar a resolução contratual por culpa do empregado, como, por exemplo, o caso de falta injustificada. Somente na hipótese de ocorrência de faltas reiteradas é que seria possível a aplicação da penalidade mais gravosa ao trabalhador, com a configuração de ato de desídia (art. 482, “e”, da CLT).

Nesse contexto, importante a implementação de um código de conduta, com o estabelecimento de direitos e obrigações de todos que com esta se relacionam, incluindo os seus funcionários, com a previsão das mais diversas situações do cotidiano da empresa e de seus negócios, estimulando as boas práticas e coibindo condutas inadequadas, com previsão das consequências nas hipóteses de descumprimento.

Tal ferramenta pode ser extremamente útil para auxiliar no processo decisório, com a garantia de isonomia entre os empregados e como estimulo para a prática de comportamentos éticos na organização, tornando-se claras as responsabilidades de cada indivíduo e consequências em caso de desobediência, cumprindo-se, portanto, os deveres anexos da boa-fé objetiva, principalmente, o de informação.

O código deve levar em consideração a realidade da empresa, estipulando obrigações passíveis de cumprimento, conforme destaca o CADE, em seu Guia Programas de Compliance:

A estratégia de elaboração de qualquer material escrito, seja ele um Código de Conduta, um guia ou ainda orientações voltadas especificamente ao compliance, precisa levar em conta a estrutura da organização a que este material se destina. Cartilhas, códigos, guias e orientações que adotam objetivos irreais, descrevem as situações de forma idealizada ou demasiado distante do que se apresenta no dia-a-dia da entidade costumam não surtir efeitos – ou, em certos casos, até mesmo surtir efeitos negativos, pois os colaboradores passam a questionar a validade de um programa que

36 Art. 468, da CLT: “Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia”.

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ROSCO, em seu artigo “Labour Compliance: Una nueva generación de códigos éticos”, apresenta quais seriam os cuidados ou elementos que devem ser observados para assegurar a força vinculante de um código de conduta e sua validade probatória em eventual processo judicial, in verbis:

a) Claridad y precisión. El código debe contener conductas claras y precisas para que puedan ser aprehendidas y cumplidas por sus destinatarios.

b) Comunicación y publicidad. La empresa deberá comunicar el código a sus destinatarios de forma fehaciente, es decir, con la constancia debida de su recepción mediante la firma del mismo.

c) Contenido limitado por la vulneración de Derechos Fundamentales. El empresario podrá exigir todas aquellas conductas que estime necesarias, en su libre ejercicio de las facultades de dirección que le son conferidas, pero con el límite de la vulneración de derechos fundamentales de los empleados.

d) Intolerancia de las conductas prohibidas por el Código Ético. La tolerancia empresarial de ciertos comportamientos incumplidores del código interno provoca, por la doctrina de los actos propios, una mayor dificultad en sancionar dichas conductas infractoras pero permitidas por la empresa.

e) Régimen disciplinario ante incumplimientos del Código. Finalmente, para dotar de eficacia al sistema normativo auto-impuesto por la empresa será necesario articular un concreto régimen de sanciones en caso de incumplimiento, vinculado tanto por el contemplado en el Estatuto de los Trabajadores como por el convenio colectivo que fuera de aplicación37.

Embora relacionados à legislação espanhola, os referidos elementos são plenamente aplicáveis ao modelo brasileiro, possuindo absoluta compatibilidade.

Canais de Denúncia e Investigação

Uma outra ferramenta de extrema relevância para eficácia dos programas de compliance é a utilização de canais para o recebimento de denúncias de condutas indesejáveis e em desconformidade com os padrões éticos da organização.

O IBGC registra, em seu “Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa”, que:

O canal de denúncias, previsto e regulamentado no código de conduta da organização, é instrumento relevante para acolher opiniões, críticas, reclamações e denúncias, contribuindo para o combate a fraudes e corrupção e para a efetividade e transparência na comunicação e no relacionamento da organização com as partes interessadas38.

37 ROSCO, Raul Rojas. Labour Compliance: Una nueva generación de códigos éticos. https://elderecho.com/labour-compliance-una-nueva-generacion-de-codigos-eticos 38 http://www.ibgc.org.br/userfiles/files/Publicacoes/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf

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Os canais de denúncia devem ser disponibilizados aos funcionários, clientes, fornecedores e terceiros que possuam alguma relação com a empresa. A empresa poderá fazer uso de diferentes canais para o recebimento das denúncias: telefone, email e intranet.

É aconselhável que os trabalhadores envolvidos sejam ouvidos quanto à implementação da ferramenta. Além disso, importante que estes sejam informados e treinados para a correta utilização do canal.

Conforme destaca ASSI:

Sempre que houver a identificação de prática fraudulenta ou lesiva por parte de determinado gestor ou colaborador, um canal de denúncia deve estar à disposição para reporte, investigação e aplicação das sanções devidas.

Além de possibilitar o conhecimento de irregularidades ocorridas na empresa o canal de denúncia também serve para desestimular desvios de conduta, devendo estar acessível tanto aos membros da organização como aos terceiros e partes interessadas no negócio.

Para que cumpra o seu papel, o canal deve ser público e amplamente divulgado, seja na internet e intranet, seja por email, ofícios dedicados ou durante os treinamentos de compliance ministrados39.

Em alguns casos, a depender do porte da empresa, pode ser recomendável a terceirização do serviço para recebimento das denúncias, propiciando maior imparcialidade ao sistema.

Recebida a denúncia, a empresa deverá realizar, de forma tempestiva, a apuração dos fatos, com a devida documentação das investigações para posterior aplicação de medidas disciplinares ou corretivas, se for o caso.

Em matéria trabalhista, exemplificativamente, a utilização do canal de denúncias pode facilitar a apuração e desestimular a ocorrência de práticas discriminatórias e ou de assédio, evitando a perpetuação de condutas agressivas.

É importante que a empresa assegure o anonimato do denunciante e a confidenciabilidade das informações recebidas, mantendo o sigilo e coibindo a possibilidade de ocorrência de retaliações quanto aos denunciantes e eventuais testemunhas.

Além disso, aqueles que comprovadamente descumprirem as regras do código de conduta e demais políticas da organização deverão ser punidos, com a aplicação das sanções previstas nos instrumentos, com a observância de proporcionalidade entre a penalidade aplicada e a falta cometida, podendo variar de advertências verbais até a ruptura motivada do contrato de trabalho, se configurados os demais requisitos legais.

39 Op. Cit.

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Compliance e Prevenção de Litígios Trabalhistas

Embora a redução de litígios não seja o mais importante aspecto dos programas de compliance, não há dúvidas de que a efetiva implementação das ferramentas de conformidade implica em sensível redução de litígios na seara trabalhista das empresas.

Sabemos que, na prática, muitas empresas deixam de cumprir a legislação em nosso país por falta de conhecimento sobre o alcance das previsões legais, má interpretação das obrigações ou falta de orientação preventiva.

Em que pese nossa cultura ainda estar muito voltada para o contencioso judicial, com pouco enfoque e valorização do trabalho preventivo/consultivo, atualmente, existe uma forte tendência de modificação deste cenário, com a incipiente e crescente onda de conformidade empresarial, seja em decorrência das alterações legislativas, seja em decorrência das exigências dos mercados internacionais e de capitais.

Em razão das profundas alterações promovidas pela Lei n. 13.467/2017, que tratou da reforma trabalhista em nosso país, inúmeras dúvidas e controvérsias foram instauradas, aumentado ainda mais da insegurança para tomada de decisões pelos gestores, com grande demanda por opiniões consultivas.

A implantação do E-social já demonstrou a necessidade de as empresas repensarem seus procedimentos internos e a qualidade de suas informações, com a correção de falhas, cumprindo-se o objetivo do programa que é o de propiciar mais transparência e confiabilidade dos dados transmitidos ao Governo Federal.

Neste aspecto, ultrapassadas as questões introdutórias quanto aos programas de compliance, o objetivo da presente obra será o de descrever os principais riscos trabalhistas enfrentados pelas empresas, com a análise de todas as fases, modalidades e intercorrências na contratação de mão-de-obra pelas empresas, com a apresentação dos dispositivos legais e posicionamentos jurisprudenciais sobre as temáticas, fornecendo subsídios para a orientação dos gestores na tomada de decisões quanto ao fiel cumprimento da legislação e da possibilidade de existência de interpretações divergentes.