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Capítulo II COMUNICAÇÃO JURÍDICA ESCRITA E VERBAL 2.1. Considerações preliminares A comunicação processual, no Cível, entre o Juiz e as partes, se opera, via de regra, com a interveniência de advogados, nos termos do Código de Processo Civil. Em poucas situações a lei admite que a parte vá diretamente a Juízo, como sói ocorrer, por exemplo, no Juizado Especial, nas reclamações de valor não superior a 20 salários mínimos. No processo civil o advogado se dirige ao Juiz por meio de petições e este responde por meio de despachos e sentenças. Juiz não é órgão de aconselhamento e nem de manifestação verbal, embora, na prática, muitos advogados busquem, às vezes, segundo as circunstâncias, se orientar com os magistrados. 2.2. Linguagem própria Segundo RUI BARBOSA: “Uma verdade há, que me não assusta, porque é universal e de universal consenso: não há escritor sem erros” (Réplica, p. 49, nº 10, apud RONALDO XAVIER CALDEIRA, Português no Direito, 4ª Ed., Forense, p. 73). O nosso objetivo é, pois, apresentar recomendações úteis; longe de pretender ou buscar a perfeição. A linguagem da comunicação jurídica é própria. Assim, no âmbito extrajudicial, temos por excelência, como atos de comunicação jurídica, os contratos que, se feitos perante tabeliães, assumem a denominação de escrituras públicas. Na esfera judicial, quando alguém quer conversar com o Juiz, por exemplo, para o fim de retirar, de imóvel seu, inquilino que não paga aluguel, de nada adianta procurar o magistrado. Deve dirigir-se a um advogado, que ingressará com uma ação em Juízo e, após a sentença, promover-se-á ao despejo compulsório do locatário. Tudo é documentado em autos de processo. Há em Juízo, como também há nos atos extrajudiciais, toda uma linguagem própria a ser observada. Inúmeros são os dicionários de terminologia jurídica existentes no mercado editorial, muitos deles utilizando expressões latinas de uso correntio nos meios forenses. A comunicação jurídica deve primar pela clareza e objetividade, cada pessoa com seu estilo próprio. A clareza porque a mensagem deve ser compreendida de maneira uniforme por todos que intervêm no processo; a objetividade, porque, nos dias de hoje, embora os atos devam ser fundamentados, não se pode perder tempo com considerações teóricas inúteis. Ao redigir coloque-se no lugar do destinatário. A correção da linguagem não pode ser dispensada nos atos processuais,

COMUNICAÇÃO JURÍDICA ESCRITA E VERBAL 2.1. … · há escritor sem erros” (Réplica, p. 49, nº 10, apud RONALDO XAVIER CALDEIRA, ... Não existem, no direito processual, concessões

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Capítulo II COMUNICAÇÃO JURÍDICA ESCRITA E VERBAL 2.1. Considerações preliminares

A comunicação processual, no Cível, entre o Juiz e as partes, se opera, via de regra, com a interveniência de advogados, nos termos do Código de Processo Civil. Em poucas situações a lei admite que a parte vá

diretamente a Juízo, como sói ocorrer, por exemplo, no Juizado Especial, nas reclamações de valor não superior a 20 salários mínimos. No processo

civil o advogado se dirige ao Juiz por meio de petições e este responde por meio de despachos e sentenças. Juiz não é órgão de aconselhamento e nem de manifestação verbal, embora, na prática, muitos advogados

busquem, às vezes, segundo as circunstâncias, se orientar com os magistrados. 2.2. Linguagem própria

Segundo RUI BARBOSA: “Uma verdade há, que me não assusta, porque é universal e de universal consenso: não há escritor sem erros” (Réplica, p. 49, nº 10, apud RONALDO XAVIER CALDEIRA,

Português no Direito, 4ª Ed., Forense, p. 73).

O nosso objetivo é, pois, apresentar recomendações úteis; longe de pretender ou buscar a perfeição.

A linguagem da comunicação jurídica é própria. Assim, no âmbito extrajudicial, temos por excelência, como atos de comunicação jurídica, os

contratos que, se feitos perante tabeliães, assumem a denominação de escrituras públicas.

Na esfera judicial, quando alguém quer conversar com o Juiz, por

exemplo, para o fim de retirar, de imóvel seu, inquilino que não paga aluguel, de nada adianta procurar o magistrado. Deve dirigir-se a um

advogado, que ingressará com uma ação em Juízo e, após a sentença, promover-se-á ao despejo compulsório do locatário. Tudo é documentado em autos de processo.

Há em Juízo, como também há nos atos extrajudiciais, toda uma linguagem própria a ser observada. Inúmeros são os dicionários de terminologia jurídica existentes no mercado editorial, muitos deles

utilizando expressões latinas de uso correntio nos meios forenses. A comunicação jurídica deve primar pela clareza e objetividade, cada

pessoa com seu estilo próprio. A clareza porque a mensagem deve ser compreendida de maneira uniforme por todos que intervêm no processo; a objetividade, porque, nos dias de

hoje, embora os atos devam ser fundamentados, não se pode perder tempo com considerações teóricas inúteis. Ao redigir coloque-se no lugar do

destinatário. A correção da linguagem não pode ser dispensada nos atos processuais,

embora a lei não preveja diretamente nenhuma sanção específica para o

trabalho mal feito, com o linguajar incorreto. Incorreto ou escorreito, infelizmente, na prática, ambos acabam sendo considerados para os efeitos

legais. Já me deparei, na Magistratura, com trabalhos até sujos e datilografados em máquina de escrever com as letras inteiramente defeituosas. Se legível

o trabalho pouco se pode fazer, de concreto, para coibir o mal feito. Com o advento do computador, felizmente, os trabalhos jurídicos estão primando pela boa aparência.

Existem erros clássicos de linguagem às vezes notados em trabalhos processuais, de que são exemplos insenção, concumbinato e a cônjuge-

mulher. Denomina-se estrangeirismo o uso de palavras de origem estrangeira para as quais o idioma nacional possui similar, como ocorre com show. Palavras

novas (neologismo) podem ser utilizadas com proveito quando não ofereçam dificuldades de compreensão, como ocorre, por exemplo, com o

termo biônico. O uso do latim é correntio nos meios jurídicos, embora o art. 156 do CPC estabeleça que em todos os atos e termos do processo é obrigatório o uso

do vernáculo. Expressões como ultra petita e extra petita dificilmente são substituídas pela fórmula correspondente no português.

A seguir alguns, dentre os muitos, brocardos jurídicos em latim: Audiatur et altera pars: seja ouvida também a outra parte. Accessorium sequitur principale: o acessório acompanha o principal.

Dormientibus non succurrit jus: o direito não socorre a quem dorme. Dura lex, sed lex: a lei é dura, mas é lei.

In dubio, pro reo: em caso de dúvida, a favor do réu. In claris cessat interpretatio: a interpretação cessa diante das coisas claras.

Jus et obligatio sunt correlata: direito e obrigação se equivalem. Locus regit actum: o lugar determina o ato.

Pacta sunt servanda: os pactos são para serem cumpridos. Seguem, também, algumas locuções:

Ab intestato: sem deixar testamento. Ad cautelam: para cautela.

Ad Hoc.: para o ato. Ad judicia: para o juízo, o foro em geral.

Extra-petita: além do pedido. Improbus litagator: litigante desonesto.

Quaestio juris: questão de direito. Não há vedação a que, nos processos, se utilize a forma manuscrita para manifestação. É preciso, no entanto, que esta se limite a pequenos trechos,

sob pena de gerar confusão. Alguns Magistrados e representantes do MP formulam manifestações nos autos com bastante dificuldade de leitura.

Petições manuscritas estão se tornando cada vez mais raras. Cuidado se deve ter com a pontuação. Muitos despachos judiciais são elaborados em forma seqüencial, de modo que, cumprida uma fase, desde

logo se parte para o atendimento ao item seguinte do despacho.

Na língua portuguesa é comum falar-se na importância da vírgula na frase: Matar o rei não é crime. Inserida a vírgula após a palavra não, assim

ficaria: Matar o rei não, é crime. Muda inteiramente o sentido da frase. Recentemente um ponto e vírgula no art. 201, §7º, da Constituição Federal, fruto da Emenda Constitucional da Reforma da Previdência,

provocou grande celeuma na classe jurídica. Muitas palavras têm, na acepção jurídica, um sentido próprio, muitas vezes não coincidente com o comum. Assim, a palavra alimento, no

singular, diz respeito àquilo que nutre e preserva a vida. A palavra, tomada no plural, abrange “as despesas que uma pessoa é por direito obrigada a

fazer com o sustento, habitação, vestuário e mais tratamento de outra pessoa” (CALDAS AULETE, Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa, 3ª Ed., Delta, vol. 1, p. 162, citado em nossa PRÁTICA DAS

AÇÕES DE ALIMENTOS (Forense, 5ª Ed., p. 5). Quando se diz, outrossim e costumeiramente, que um Juiz é

incompetente, não se está a afirmar que o magistrado careça de conhecimentos jurídicos, mas, sim, que não possui competência processual, em razão do território ou da matéria, por exemplo, para conhecer e julgar

determinada causa. A boa convivência social impõe regras de convívio, dentre elas algumas relativas ao tratamento que se deva dispensar a determinadas pessoas.

Assim, altas autoridades, como o Presidente da República, os Governadores de Estado, os Prefeitos, Os Ministros, Oficiais Generais,

membros do Congresso Nacional, os Magistrados, dentre outros, têm o tratamento de excelência. Os reitores de universidades são tratados por Vossa Magnificência. O Papa, por Vossa Santidade. Os reis e imperadores

por Vossa Majestade. Os príncipes, duques e arquiduques por Vossa Alteza. Os sacerdotes por Vossa Reverência e os Bispos e Cardeais por

Vossa Excelência Reverendíssima. Outras pessoas e demais autoridades em geral por Vossa Senhoria. São comuns também o uso de certas abreviaturas. Assim: advogado (adv.);

acadêmico (acad.); bacharel (bel.); Comandante (Com., Comte.); Conselheiro (Cons., Conselh.); Digníssimo (DD.); Doutor (Dr.); Desembargador (Desemb.); Excelentíssimo (Exmo.); Merítissimo (MM.); Procurador (Proc.); Vossa

Excelência (V.Exa.). No meio jurídico são muito empregadas algumas expressões, como Doutor,

Egrégio e Colendo. Vale, pois, conferir o exato significado dessas palavras: “Egrégio: significa nobre, distinto; é tratamento forense destinado aos

tribunais superiores.

Colendo: significa respeitável; é tratamento geralmente aplicado às

Câmaras Legislativas e às Câmaras dos Tribunais.

Dom.: título honorífico destinado a membros da família imperial, aos

monges beneditinos e aos dignitários do clero a partir dos bispos.

Doutor: ‘Recebem-no não só os médicos e os que defenderam tese de

doutoramento, mas, indiscriminadamente, todos os diplomados por escolas

superiores’” (Celso Cunha, Gramática da Língua Portuguesa, p. 294, apud

CORRESPONDÊNCIA – Linguagem & Comunicação, Odacir Beltão e Mariúsa

Beltrão, Atlas, 19ª Edição, p. 76).

A linguagem jurídica é, na maioria dos casos, escrita. Até as alegações

finais em audiência são comumente tomadas por termo nos autos. Há exceções, naturalmente, como a sustentação oral no plenário do Tribunal do Júri que, em regra, não se documenta, senão de forma muito genérica.

Muitas expressões, usuais no colóquio verbal, são inadmissíveis na linguagem escrita. A matéria será, adiante, novamente vista.

Existe grande intercâmbio entre a linguagem técnica do direito e a de outras ciências. Assim, nas questões que envolvem responsabilidade civil do médico, acidentes do trabalho e outras da mesma natureza, o profissional do

direito terá que se afeiçoar à linguagem técnica da medicina, ao mesmo tempo em que os peritos médicos que atuem nessas áreas têm que assimilar a

nomenclatura proces- sual. O mesmo se diz de questões que envolvem engenharia, contabilidade e outras ciências. 2.3. Princípios de forma e ética

Grosso modo diríamos que a comunicação jurídica, a nível de direito material, goza de bastante liberdade de forma.

Ou seja, se forma não for exigida em lei, um ajuste entre duas pessoas

pode nascer da simples manifestação de vontade. Em alguns casos, no entanto, a comunicação jurídica, formalizada em contratos, não pode ser

verbal (fiança, doação de bens móveis que não sejam de pequeno valor, etc.). Noutros, é imprescindível a comunicação por escritura pública (venda de bens imóveis de valor superior à taxa legal; procuração de

analfabeto). Na interpretação dos atos jurídicos se atenderá mais a intenção das partes do que ao sentido literal da linguagem (Código Civil,

art. 85). Assim, a efetiva vontade terá relevância na avaliação dos efeitos do ato jurídico.

O projeto do novo Código Civil, em seu art. 113, prescreve que os

negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. Há casos, no entanto, em que a interpretação será literal, como sói ocorrer, por exemplo, na aplicação do Código

Tributário Nacional, relativamente às normas sobre isenção tributária. Os vícios na manifestação de vontade tornam o ato jurídico anulável,

como sói ocorrer com o erro e o dolo. Os atos processuais (comunicação jurídica processual), no entanto, são

eminentemente formais. Um contrato pode existir sem qualquer

documentação da sua existência, desde que não haja proibição legal. No que concerne aos atos processuais, no entanto, verifica-se exatamente o contrário. É conhecida a afirmativa de que, o que não se acha nos autos, não existe no

mundo. Imagine-se, por exemplo, um despejo por denúncia vazia formulado numa locação por prazo indeterminado, em que o locatário tenha sido

regularmente notificado. A ação foi ajuizada, no entanto, sem a notificação (e sem referência a ela na petição inicial). O Juiz, ao decidir de acordo com o que dos autos consta, irá decretar a carência de ação, por ausência de notificação

premonitória que, no entanto, existiu.

Não existem, no direito processual, concessões verbais de prazo. Por

isso, em processo não se conversa verbalmente. Todas as manifestações devem ser traduzidas para os autos.

Os atos do processo devem ser praticados com tinta escura e indelével (art. 67, CPC).

A comunicação jurídica, especialmente no âmbito do direito

processual, recebe forte influência de fatores éticos. A ética, sabemos, associa-se aos preceitos morais vigentes na

sociedade, destacando-se o bem e o justo. Afirma-se a existência de uma

ética profissional, consubstanciada no conjunto de princípios morais que orientam o exercício de determinada profissão.

O Código de Processo Civil recomenda às partes e procuradores expor os fatos em juízo conforme a verdade e proceder com lealdade e boa-fé (art. 14, I e II) . É defeso às partes e advogados empregar expressões injuriosas,

cabendo ao Juiz, de ofício ou a requerimento do ofendido, mandar riscá-las (art. 15). Quando as expressões injuriosas forem proferidas em defesa oral,

o juiz advertirá o advogado que não as use, sob pena de lhe ser cassada a palavra (parágrafo único do art. 15).

O art. 17, II, do CPC, considera litigante de má-fé aquele que altera a

verdade dos fatos. Da análise de todos esses dispositivos vê-se que a lei impõe um

comportamento de nível elevado nos autos do processo, priorizando valores de alto teor ético, como a verdade, a boa-fé, a lealdade e o respeito.

O advogado, no entanto, não pode ser tolhido na sua liberdade de expressão. Segundo o Estatuto da OAB o advogado é inviolável no exercício

de suas funções (art. 2º, § 3º). O art. 6º, caput, do mesmo Estatuto, estabelece que não há hierarquia e nem subordinação entre advogados,

magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratarem-se com consideração e respeito recíprocos. E o parágrafo único do referido

artigo recomenda que as autoridades e servidores públicos e os serventuários da justiça devem dispensar ao advogado, no exercício de sua

profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas a seu desempenho. O Estatuto, em seu art. 25, cuida

do sigilo profissional e, no art. 31, dispõe sobre a ética. Sob o manto, no entanto, da liberdade de expressão, não podem ser

escondidas as ofensas pessoais, desnecessárias e injustas, produzidas no processo.

2.4. A verdade real e a processual As causas são decididas de acordo com a prova existente nos autos, a

verdade processual. Mesmo que outra seja a verdade real, o Juiz não deve substituir suas impressões pela prova dos autos. Se o Magistrado tem, por exemplo, conhecimento do lugar onde ocorreu certo acidente de trânsito,

que irá julgar, é preferível que, através de uma Inspeção Judicial, vá ao local e lavre um auto de inspeção para, tendo-o nos autos, nele basear-se

para a sua decisão. Como Magistrado não poucas vezes me vali desse valioso expediente. O que não está nos autos não está no mundo, motivo

porque o Juiz deve, sempre, trazer para os autos o que julgue de relevante

para decidir a causa. Muitas vezes o Magistrado toma conhecimento extra-autos de informações que possam ter relevância na decisão da lide; é

temerário, em geral, pesar tais fatos, porque não foram submetidos ao crivo do contraditório. A chamada “petição de pé de ouvido”, assim entendida aquela que o advogado formula verbalmente ao Magistrado,

constitui uma praxe viciosa com sérios inconvenientes e que merece repulsa. Ausente o contraditório, a parte contrária fica sem meios de se defender. Esse expediente, portanto, ainda que ocorrente, deve ser

extirpado de nossos costumes. O Juiz só deve ouvir as partes na audiência , quando se dá a ambas a oportunidade de manifestação.

2.5. Cuidados com o que se escreve A comunicação jurídica no processo é eminentemente formal. Devem os advogados, por isso, ao peticionarem nos autos, primarem pela

clareza de seu pronunciamento. Igual comportamento devem adotar os magistrados nos seus despachos.

Um despacho pouco explícito pode levar dúvida ao Escrivão encarregado do seu cumprimento. Nem sempre aquilo que o magistrado quer dizer está escrito e será entendido como ele pretendeu. Afinal, isso também acontece

com as leis e outras formas de comunicação. A Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1988, que dispõe sobre redação de leis, contém substancial matéria relativa à forma de redação

oficial que, por aplicação subsidiária, pode ser aplicada nos atos processuais.

Merecem transcrição, pois, alguns de seus dispositivos:

“Art. 11. As disposições normativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem

lógica, observadas, para esse propósito, as seguintes normas:

I – para a obtenção de clareza: a) usar as palavras e as expressões em seu sentido comum, salvo quando a norma versar

sobre assunto técnico, hipótese em que se empregará a nomenclatura própria da área em

que se esteja legislando;

b) usar frases curtas e concisas;

c) construir as orações na ordem direta, evitando preciosismo, neologismo e adjetivações dispensáveis;

d) buscar a uniformidade do tempo verbal em todo o texto das normas legais, dando

preferência ao tempo presente ou ao futuro simples do presente;

e) usar os recursos de pontuação de forma judiciosa, evitando os abusos de caráter estilístico;

II – para a obtenção de precisão:

a) articular a linguagem, técnica ou comum, de modo a ensejar perfeita compreensão do objetivo da lei e a permitir que seu texto evidencie com clareza o conteúdo e o alcance que

o legislador pretende dar à norma;

b) expressar a idéia, quando repetida no texto, por meio das mesmas palavras, evitando o

emprego de sinonímia com propósito meramente estilístico;

c) evitar o emprego de expressão ou palavra que confira duplo sentido ao texto; d) escolher termos que tenham o mesmo sentido e significado na maior parte do território

nacional, evitando o uso de expressões locais ou regionais;

e) usar apenas siglas consagradas pelo uso, observado o princípio de que a primeira

referência no texto seja acompanhada de explicitação de seu significado;

f) grafar por extenso quaisquer referências a números e percentuais, exceto data, número

de lei e nos casos em que houver prejuízo para a compreensão do texto (redação da Lei

Complementar nº 107, de 26.04.2001);

g) indicar, expressamente o dispositivo objeto de remissão, em vez de usar as expressões

“anterior”, “seguinte” ou equivalentes (redação da Lei Complementar nº 107, de

26.04.2001); III – para a obtenção de ordem lógica:

a) reunir sob as categorias de agregação – subseção, seção, capítulo, título e livro –

apenas as disposições relacionadas com o objeto da lei;

b) restringir o conteúdo de cada artigo da lei a um único assunto ou princípio; c) expressar por meio dos parágrafos os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida;

d) promover as discriminações e enumerações por meio dos incisos, alíneas e itens.”

2.6. Leitura e pesquisa Uma boa comunicação, não apenas jurídica mas no geral, depende de

conhecimentos. Quem tem conhecimentos, quem se dedica ao hábito da leitura, muito mais condições tem de se comunicar, porque pode discutir os mais variados assuntos com convicção e com firmeza. Além da leitura,

propriamente dita, a pesquisa de temas jurídicos é medida da maior importância para uma boa comunicação, pois são comuns as citações de

pontos de vista doutrinários e jurisprudenciais sobre determinados temas e, para tal fim, a pesquisa detalhada e aprofundada se afigura imprescindível.

Em direito pesam muito, na solução do caso concreto, além dos argumentos, as posições doutrinárias de juristas reconhecidos e as decisões dos Tribunais, especialmente os Superiores.

2.7. Uso da palavra em audiências São as audiências, sem dúvida, as ocasiões em que os advogados se vêem

mais compelidos a utilizar o seu potencial de comunicação. Primeiro, o ingresso na sala de audiências e o cumprimento adequado ao Magistrado, ao colega ex-adverso, ao servidor da Justiça e, sendo o caso, ao

representante do Ministério Público. Depois, durante a audiência, a postura ética adequada. Durante a discussão de acordo, a postura isenta e

voltada à solução da demanda. São comuns as situações em que os advogados se esquecem de que representam as partes e se comportam na causa como se elas fossem.

O advogado, não obstante o fervor com que deva dedicar-se à causa, não pode se deixar levar pelas paixões pessoais, porque ele é o representante da parte e tem o dever de dispensar serenidade à causa que patrocina,

sem prejuízo da sua tenacidade e coragem. O Magistrado deve se postar com tal isenção, sem prejulgamento,

ouvindo as partes e propondo soluções que atendam aos seus interesses e aos ditames da justiça. Se sentir que a solução jurídica não é mais justa, nada impede que busque a justiça, que deve se sobrepor à letra da lei, na

tentativa do acordo. O magistrado sente-se no compromisso ainda maior de buscar o acordo quando percebe que um detalhe processual poderá

impedir, naquele processo, a prestação jurisdicional. Assim, por exemplo, o proprietário tem o direito de buscar a coisa sua que se acha em poder de outrem. Mas o caminho processual tem que ser bem escolhido: pode ser

uma reivindicatória, uma possessória ou uma ação de despejo. Se não o

for, a parte perderá a ação, embora possa ingressar em Juízo com outra, atrasando substancialmente a satisfação do direito lesado.

O Magistrado nunca deve se deixar impressionar por impactos emocionais como também deve respeitar sempre o ponto de vista da parte. Quando

alguém, em audiência, afirma para o Magistrado, por exemplo, que não pretende formular acordo, pode o magistrado ponderar quanto à conveniência daquele, mas nunca exercer sobre a parte juízo de censura.

2.8. Valer-se de um incidente Certa vez, em audiência, quando ainda estudante, assisti um advogado, por

descuido, falar mal de um colega que não participava do ato processual. Aproveitou-se o patrono da parte contrária, naquela oportunidade, para defender efusivamente o colega ausente. Causou tanto constrangimento a

situação que o colega que fizera o comentário acabou por fazer um acordo nos autos para o qual vinha criando resistência. Apelo emocional simples- mente. Caso idêntico também foi causado quando um advogado reteve indevidamente

processo em seu poder e iria acarretar o adiamento da audiência. Acabou sendo levado a transigir. É lógico que ninguém foi obrigado a acordar; mas é

natural que, diante do constrangimento, o advogado se disponha a colaborar na solução da demanda. 2.9. Postura do magistrado no acordo

O primeiro passo é ouvir carinhosamente as partes e advogados. Respeitar o ponto de vista de cada um. Verificar, no semblante das partes, a

disposição delas em buscar uma solução para a demanda. Formular, com firmeza e isenção, a sua proposta conciliatória, apontando, como bom negociador, as vantagens e desvantagens para cada uma. A palavra do

Magistrado desperta, nas partes, grande poder de persuasão, como também ocorre com a palavra do médico junto ao paciente. Além disso, convém demonstrar sempre as vantagens de uma conciliação, mostrando

os inconvenientes de uma prestação jurisdicional demorada. Muitas vezes o Magistrado há que utilizar, no acordo, de técnicas de

persuasão a fim de vencer obstáculos que a parte apresenta. Há, como já dissemos, muitas pessoas que só querem se manifestar. Depois de apresentarem as razões da sua discordância acabam por anuir em

transação. Surgem aí alguns detalhes e curiosidades. Soube eu que, certa vez, havia

num Juízo uma demanda em que se discutia importância menor que dois salários mínimos e um réu residente fora da Comarca. A autora ingressara em Juízo com uma sustação de protesto e o réu a contestara. Não

importava para o réu, ali, quanto estava gastando, pois se achava em jogo o seu brio pessoal. De nada adiantava, pois, em audiência, propor o pagamento, porque o réu queria levar a demanda até o fim. A autora, por

seu turno, também não concordava em pagar nada. Foi proposto, então, que a autora fizesse a doação do valor discutido a uma instituição de

caridade. E a lide terminou. O réu não recebeu, mas a autora pagou; a autora pagou, mas o réu não recebeu. Noutra oportunidade, desse fato

também tive notícia, tratava-se de embargos à execução, em que a diferença

do valor que o devedor concordava em pagar distanciava-se bem daquela que o credor julgava razoável receber. Utilizou-se o Magistrado, então, de

uma técnica. Cada advogado anotou, num pedaço de papel, a sua proposta extrema. O credor, o mínimo que receberia em acordo e o devedor o máximo que concordava pagar. Diante da informação de ambos, o Juiz teve

condições de formular uma proposta intermediária, que acabou por ser aceita. Cada audiência conciliatória deve ser exercitada com todos os esforços no

sentido de acomodar os interesses em conflito. Não basta propor o acordo; é preciso apresentar soluções e mostrar aos litigantes as conveniências e

inconveniências da medida proposta. A sentença raramente poderá dar à lide os contornos que só o acordo pode fazer. 2.10. O juiz e o comprometimento com a palavra

Vimos que os advogados conversam com os magistrados através de petições nos autos. Mas que, muitas vezes, existem contatos verbais, ora

necessários, ora inteiramente dispensáveis, como sói ocorrer nas consultas, a que o magistrado está impedido de responder. A experiência nos demonstrou o grande risco do magistrado comprometer-se com a

palavra verbal. Muitas vezes emite um Juízo, num caso de rotina, de jurisdição voluntária e, depois, se convence de que o pleito não pode ser acolhido. Não convém ao Juiz antecipar sua decisão, por mais simples que

seja a questão a ser submetida à sua apreciação. A matéria tem especial relevância quando se trata de examinar pedido de

liminar. A melhor postura do magistrado é a resposta: prometo examinar. Dispensa-se até a referência “com atenção ou detalhadamente”, porque isso já constitui pressuposto do exame jurisdicional. Mas há situações em

que o advogado terá necessidade de levar fato relevante ao conhecimento do magistrado verbalmente, seja porque a urgência da situação não

permite esperar, seja porque a natureza do assunto, excepcionalmente, requer contato pessoal e privativo. Um conselho que se pode dar, ainda, ao Magistrado iniciante, é de que

avalie, previamente, as conseqüências do ato que se propôs a praticar. Ameaça não fica bem à figura do magistrado e, ainda muito pior, quando ela não se concretiza. Já ouvimos falar de casos de Juízes que expulsaram

advogados de sua sala. E eles não resistiram à ordem. É inevitável o desgaste. Não custa exercitar o autocontrole e pensar um pouco antes de

agir. A cautela, aliás, vale para qualquer profissional que detenha poder em suas mãos. 2.11. A contradita

A contradita ocorre quando o advogado pretende impugnar o depoimento de uma testemunha suspeita. Costumamos dizer que, nesse momento, o advogado não pode ser amável e esperar que a oitiva inicie. Tão logo tome

conhecimento do fato que acarreta a suspeição, especialmente durante ou após a qualificação da testemunha, deve o advogado contraditá-la, sempre

antes do compromisso legal. O parágrafo primeiro do art. 414 do CPC

disciplina a contradita no processo civil, dizendo que “É lícito à parte

contraditar a testemunha, argüindo-lhe a incapacidade, o impedimento ou a suspeição...”

2.12. Despachos de urgência: liminar O fato de o Juiz conversar com o advogado por meio de petições não

afasta o direito do profissional de procurar o magistrado para atendimento

de urgência. São comuns, na vida forense, os pedidos de sustação de protesto cambiário formulados no final da tarde do último dia concedido

ao devedor para pagar. Ou a concessão de uma liberdade provisória ou fiança. Embora não se recomende que os advogados busquem a prestação

jurisdicional às últimas horas, quando possam fazê-lo com alguma antecedência, certo é que o magistrado não pode deixar de atendê-los.

Certamente não se tem como impor sempre ao magistrado um atendimento imediato, mas é de exigir sensibilidade dele para perceber a

urgência de cada caso. Nessas situações o advogado não deve se dirigir ao magistrado dizendo que precisa de uma liminar, ou de uma liberdade

provisória, mas, sim, que depende de um despacho em situação de urgência, objetivando o exame de seu pedido. A concessão ou não da

liminar ou da liberdade provisória é ato privativo do Juiz.

Em casos de urgência o advogado não deve temer incomodar o Magistrado porque mais importante que o valor comodidade é o cumprimento do dever

legal objetivando o provimento rápido da medida que carece de solução. Em matéria de prestação jurisdicional não existem favores, mas cumprimento de dever legal. Em Minas Gerais, a Lei Complementar nº 59, de 18 de

janeiro de 2001, que contém a organização judiciária do Estado de Minas Gerais, impõe, em seu art. 145, IV, aos Magistrados, o dever de tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as

testemunhas, os servidores e auxiliares da justiça e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quando se tratar de providência que

reclame e possibilite solução de urgência.

2.13. O magistrado e a mídia

O Juiz não está impedido de se manifestar. Há muitas situações em que

não só pode, como deve. O Juiz não pode ficar fechado no seu Gabinete enquanto sofre ataques pela mídia ou lhe imputam condutas que não praticou. Não só pode mas, como homem que é, tem o dever de se defender,

zelar pelo seu nome e pela sua honra. Informações truncadas dos meios de comunicação comprometem a imagem do Judiciário e do Magistrado. Mas, para isso, é preciso não ter “telhado de vidro”.

O que se veda ao Magistrado é manifestar-se sobre processo pendente de julgamento, sobre o qual deve manter a mais absoluta isenção e discrição.

Também lhe é vedado proferir juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças dos órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos, obras técnicas ou magistério. A Lei de Organização Judiciária de Minas Gerais

dispõe sobre essa matéria no seu art. 146, VI, em consonância com a Lei

Orgânica da Magistratura.

A prudência lhe recomendará, certamente, o silêncio, nos casos corriqueiros em que o simples tempo se encarregará de solucionar o

impasse e nos quais qualquer reação não se aconselha. 2.14. Comunicação do magistrado pelo exemplo e postura Como vimos, as pessoas não se comunicam apenas através de palavras. O

bebê que nasce reclama dos seus incômodos através do choro, pois não sabe falar. A postura e a conduta são formas de comunicação. O Magistrado se comunica com os advogados e a classe jurídica também

pelo seu exemplo e por sua postura, revelada no cumprimento dos prazos e no respeito às pessoas. A regra também se aplica aos demais integrantes

de carreiras jurídicas, como o advogado e o Promotor de Justiça. O magistrado deve ser corajoso: “Já se disse que da dignidade do Juiz depende a dignidade do direito, e que este valerá o

que valham os Juizes como homens. No dia em que os juízes tiverem medo, nenhum cidadão poderá dormir tranqüilo” (Juiz Ideal, SÁLVIO DE FIGUEI- REDO TEIXEIRA, apud Waldir Vitral, Deontologia do Juiz de Direito, do Promotor de Justiça e do Advogado,

Forense, 1ª Edição, p. 57).

Deve, igualmente, ser sereno:

“O Juiz deve ter a humildade necessária para ouvir com paciência as

queixas, reclamações e réplicas que a parte oponha aos seus despachos e

sentenças. Apontar os erros do julgador, profligar-lhe os deslizes, os abusos, as

injustiças em linguagem veemente – é direito sagrado do pleiteante. O calor da

expressão há de ser proporcional à injustiça, que a parte julga ter sofrido. Nada

mais humano que a revolta do litigante derrotado. Seria uma tirania exigir que o

vencido se referisse com meiguice e doçura ao órgão judiciário e à pessoa do

julgador que lhe desconhecesse o direito. O protesto há de ser por força em

temperatura alta. O juiz é que tem de se vestir da couraça e da segurança

profissional necessária para não perder a calma e não cometer excessos”

(RAFAEL MAGALHÃES, apud Waldir Vitral, ob.cit., p. 210).

Não deve ser arrogante, sofrer daquilo que pejorativamente se denomina de “Juizite”:

“Ah! O Juiz jactancioso e arrogante! Que coisa dolorosa de se ver! Pensa

que é rei, que está acima dos pobres mortais. Sua pessoa é intangível; por isso,

caminho coberto por um pálio e é precedido pelo seu acólito, o Oficial de Justiça

que, ao toque da campainha, abre caminho para a passagem de Sua Excelência,

o Meritíssimo Juiz. Seu silêncio não pode ser perturbado, sequer pelo ruído

normal das ruas. Por isso, manda vedar o trânsito na rua, à porta do Forum.

Sua excelência está parturejando uma sentença. Don’t disturb!” (O JUIZ SUA

CONDUTA NO FORO E NA SOCIEDADE, Juiz FRANCISCO BERNARDO

FILGUEIRA, apud Escola Judicial –TJ/MG – Deontologia Forense, p. 51).

O Juiz deve integrar-se à sociedade em que vive, não esquecendo, no

entanto, que sua postura deve ser exemplar. O Juiz não deve ser melhor do que ninguém, mas nivelado pelos homens de bem de uma sociedade:

“É justo que o Juiz queira participar da sociedade. Ele é humano, a família

não pode isolar-se do meio em que vive. Ninguém o proíbe disso. Mas deve fazê-

lo sem o risco da vulgaridade, sem perda de sua respeitabilidade, sem desgaste

da sua postura elevada e distinta. A sociedade não admite jamais que o Juiz

seja um homem vulgar, sem compostura, sem distinção, relaxado, mal afamado

e de desagradável apresentação” (CONDUTA DO JUIZ, Des. ANTÔNIO PEDRO

BRAGA, ESCOLA JUDICIAL DO TJ/MG- Deontologia Forense cit., p. 68).

São esses alguns conselhos de vividos e experientes homens da magistratura que, dedicando-se com afinco à profissão, fazem ou fizeram de

suas vidas um exemplo de trabalho e de dignidade. 2.15. A mídia: dever de informar e direito de personalidade

O Pacto de São José da Costa Rica, em seu art. 13, I, estabelece: “Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito

compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de toda

natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.”

Durante a vigência da Constituição de 1967, com as alterações procedidas em 1969, houve período em que, por sua excepcionalidade, o direito brasileiro conheceu a censura prévia. O Decreto-lei nº 1.077, de 26 de

janeiro de 1970, disciplinava a matéria e, em seu artigo 3º, estabelecia que, verificada a existência de matéria ofensiva à moral e aos bons costumes, o Ministério da Justiça proibiria a divulgação da publicação

(livros ou periódicos) e determinaria a busca e apreensão de todos os seus exemplares.

Hoje, tal não ocorre, prevalecendo não só a liberdade de imprensa, como a de manifestação de pensamento de qualquer pessoa. O art. 220, da Constituição Federal, em seu caput e §§ 1º e 2º, dispõe:

“A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer

forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de

informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto

no art. 59, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.”

O art. 5º, inciso IX, da mesma Constituição, assegura a toda pessoa a

liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

O risco de responder por danos morais sugere, no entanto, que as próprias empresas jornalísticas, de rádio e televisão exerçam de forma

indireta o controle prévio sobre as matérias que divulgam.

Não obstante a grande admiração que dispensamos ao profissional do

jornalismo e mesmo compreendendo as dificuldades que enfrentam ante a necessidade de produzirem matérias sobre os mais variados setores da atividade humana, é de se reconhecer que os meios de comunicação,

algumas vezes, não dispõem de pessoal preparado adequadamente para transmitir, de modo correto, as questões discutidas em Juízo.

Muitas vezes se fazem imputações de inércia ao Magistrado, por

exemplo, quando se sabe que nenhuma ação civil se inicia sem provocação

da parte e que o magistrado não pode julgar além do pedido. O Juiz não é a favor nem contra uma das partes; cumpre-lhe decidir a lide conforme a

lei e o direito. E, na área criminal, ainda que sem desconhecer que vive numa comunidade, deve ter a postura de isenção e equilíbrio para compatibilizar, através da aplicação da lei, os direitos do acusado e o

interesse social. Não pode o Magistrado criminal se transformar num árduo combatente do crime organizado porque isso prejudicaria a sua atividade jurisdicional.

A pressão da mídia costuma dar repercussão a muitas causas simples,

levando o magistrado, muitas vezes, a proferir decisões precipitadas para não ser taxado de moroso, o que, convenhamos, não convém ao interesse público.

Outrossim, se a lei permite, por exemplo, liberdade provisória em determinada situação, não pode o Juiz negá-la simplesmente pela repercussão que a imprensa deu ao caso. A imprensa costuma condenar sem

contraditório, mas o Magistrado não pode fazê-lo. A linguagem da mídia nem sempre se mostra adequada aos termos

processuais. Ora diz-se que o Juiz dá parecer, quando Juiz não opina, decide. Ora afirma o julgamento da causa em prol de alguém, quando sequer se adentrou no mérito da questão na lide decidida.

Mas não se nega que os meios de comunicação não apenas têm o direito como o dever de informar. Ocorrem os fatos e a imprensa exerce o seu

relevante papel. Tais fatos, no entanto, muitas vezes não foram sequer apurados. Como é comum alguém ser julgado e condenado pelos meios de comunicação, sem direito de defesa e sem quaisquer apurações seguras dos

fatos. Por isso há que se compatibilizar o direito que a imprensa tem de informar com o direito do cidadão de resguardo à sua honra e dignidade. Ao seu nome, imagem e decoro.

A Constituição Federal consagra o direito de todos à honra, nome e imagem e assegura indenização compensatória por danos morais quando tais

valores forem violados (v. art. 5º, incisos V e X). Assim, se alguém é injustamente ofendido através dos meios de

comunicação, pode buscar em tese indenização compensatória por danos

morais, contra o autor do fato ou contra a empresa jornalística que o divulgou. Em cada caso há que se apurar se o órgão de imprensa agiu no

dever de informar e utilizou-se de elementos que lhe foram adequadamente fornecidos ou se, sem uma apuração segura, fez afirmativas caluniosas ou injuriosas à pessoa de alguém. Na segunda hipótese, estará obrigada a

indenizar.

A Lei de Imprensa regula, em parte, a indenização devida pela

empresas jornalísticas e de comunicação quando praticarem calúnia, injúria ou difamação no exercício de suas atividades, regras que devem ser

compatibilizadas com a Constituição Federal de 1988.

Na responsabilização da empresa jornalística por calúnias, injúrias e

difamações cometidas há que se distinguir o exercício do direito do abuso do

direito. A imprensa tem o dever de informar, repetimos, mas também tem o de respeitar as pessoas, seu nome e imagem. Quando se excede no exercício

do direito ingressa-se na seara do abuso de direito e, aí, surge a obrigação legal de indenizar os danos morais sofridos por aqueles atingidos pela matéria veiculada. Já tivemos casos de jornais que noticiaram fatos com

base em ocorrências policiais, nas colunas próprias para matéria policial. As pretensões indenizatórias foram, nesses casos, desacolhidas, porque o jornal não obrara com culpa. Agira, apenas, no exercício regular de um

direito. Mas confundir nomes e imputar a pessoas fatos de que não participaram é imperdoável e deve ser indenizado. Assim também os

ataques pessoais, que fogem às escancaras ao objetivo de informar.

2.16. O magistrado na interdição e no interrogatório

Costumamos dizer que o Magistrado não carece, para o exercício de suas nobres atribuições, apenas de conhecimento jurídico. Deve ter o dom da

boa comunicação, ainda que não tenha o da oratória. Em dois atos processuais, privativos do Magistrado, destaca-se a importância de sua percepção: o interrogatório criminal e o interrogatório

de interditando. No interrogatório criminal o Juiz está diante do autor do crime. Pode ser

que colha, naquele ato, a sua confissão ou pode se ver diante de uma negativa de autoria. Ouvirá, de viva voz, as razões que o réu aduz para a eventual prática do crime. O Magistrado experiente já tem, após o

interrogatório, uma posição provisória sobre a autoria e a sentença que, a final, irá proferir.

Tamanha é a importância do interrogatório que a lei recomenda que o

revel, quando compareça a Juízo, seja interrogado, sendo lícito, ao Magistrado interrogá-lo novamente, o que pode ser feito, inclusive, pelo

Juiz que não presidiu aquele ato. Segundo o disposto no artigo 196 do Código de Processo Penal a todo tempo, o juiz poderá proceder a novo interrogatório. E o artigo 185 do mesmo Código estatui que o acusado, que

for preso, ou comparecer, espontaneamente ou em virtude de intimação, perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será

qualificado e interrogado.

Na interdição igualmente impõe-se ao magistrado sensibilidade e sabedoria.

Sabedoria para aferir, naquele contato, a efetiva incapacidade do requerido, evitando expedientes fraudulentos, embora se saiba que, na espécie, é exigível o exame médico do interditando. Sensibilidade porque se envolve

com pessoas deficientes que merecem tratamento carinhoso. O contato com os interditandos, na grande maioria dos casos, não pode ser feito da mesma

forma fria com que se toma o depoimento de uma testemunha. Tem que ser sensível.

No contato com o interditando, muitas vezes, o magistrado tem

condições de aferir não apenas a sua efetiva incapacidade, como também averiguar aquelas pessoas que podem e merecem ser nomeadas para o

encargo de Curador.

2.17. Inspeção judicial

A inspeção judicial constitui meio idôneo de prova, regularmente previsto no Código de Processo Civil.

Por ela o Juiz inspeciona pessoas e coisas.

É comum nas questões que envolvem divisas, obras em condomínios,

construções e outras da mesma natureza. Com efeito, fechado em seu gabinete, dificilmente o Juiz tem elementos para uma visão segura do que ocorre no mundo real. A inspeção judicial do magistrado, numa ação de

nunciação de obra nova, por exemplo, lhe permite ver com os próprios olhos o que está a ocorrer e, daí, não apenas decidir com mais segurança,

como também propor soluções conciliatórias.

As partes são obrigatoriamente intimadas para a Inspeção e podem

acompanhá-la. O Juiz, nesse ato, deve se limitar a ser descritivo, registrando e constatando fatos, após ouvir as partes, se necessário.

Constitui meio de prova idôneo, mas existe certa restrição à aceitação

de conclusões técnicas que o Magistrado tenha feito, porque isso seria matéria naturalmente entregue à prova pericial.

Certa vez, na magistratura, tive uma ação renovatória de contrato de locação proposta por uma firma comercial. Contestando a ação, o

proprietário pedia a retomada para uso próprio. Só que o mesmo proprietário possuía, desocupada, há pouca distância da loja que

pretendia retomar, outra, de dimensões idênticas. Fiz uma Inspeção Judicial no local e, além de constatar fatos, registrei que a loja desocupada oferecia, para a exploração comercial pretendida na

retomada, as mesmas condições de utilização da que se pretendia retomar. E, aliando essa circunstância a outros elementos dos autos, considerei, na sentença, o pedido de retomada insincero, deferindo a

renovatória. Houve recurso e a matéria provocou muita polêmica no Tribunal de Alçada, num julgamento com votos vencidos, muito bem

fundamentados, onde se questionou até onde o Juiz poderia concluir através da Inspeção que, em princípio, é um ato processual de mera constatação.

2.18. Inquirição de testemunhas

A colheita da prova oral é tarefa que incumbe pessoalmente ao Magistrado e que não deve ser delegada a ninguém. Nem aos advogados, nem ao

Escrivão. Deve o Magistrado reproduzir fielmente o que foi dito pela testemunha, atentando-se, no possível, à sua linguagem. Em conferência proferida sob o tema PODERES E DEVERES DO JUIZ, o

Des. JOSÉ DE ASSIS SANTIAGO ressaltou:

“Outra recomendação que se faz ao Juiz é que ele não deve permitir que advogados

inquiram diretamente testemunhas, fazendo-o ele mesmo e, se indeferir alguma pergunta,

deve mandar consigná-la no termo, com as razões do indeferimento” (ESCOLA JUDICIAL

DO TJ/MG, Deontologia Forense, 1979, p. 39).

A importância do contato físico do Juiz com a prova testemunhal erigiu, no direito processual civil, o princípio da Identidade Física do Juiz com o

processo, constante do art. 132, caput, do CPC, segundo o qual “O Juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver

convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor” o qual, se necessário, conforme autoriza o parágrafo único do citado artigo, poderá

mandar repetir as provas produzidas. O dia-a-dia nos ensina inúmeros cuidados que se deve ter na coleta

da prova testemunhal. Há testemunhas, por exemplo que, por medo, dizem pouco. Lembro-me, certa vez, de estar fazendo uma audiência de divórcio direto e a testemunha, indagada se um dos divorciandos já teria

constituído nova família, ficou receosa de confirmar o fato que, numa separação contenciosa, seria comprometedor, mas que, no divórcio direto,

auxilia bastante, segundo certo ponto de vista, posto que demonstra a impossibilidade de reconstituição da vida conjugal. A verificação, pelo Juiz, da sinceridade do depoimento de uma

testemunha não é simples. O depoimento sincero é espontâneo e se houver necessidade de repetir um mesmo fato a testemunha o fará tantas vezes quanto preciso for da mesma forma.

A questão dos apelidos é também de vital importância na tomada da prova oral pois, muitas vezes, uma testemunha faz alusão a fatos utilizando-se

de apelidos ou alcunhas, motivo porque é importante que tais elementos estejam sempre bem esclarecidos nos autos. Há advogados que arrolam testemunhas como que por obrigação. Têm que

levar alguém para justificar o seu trabalho e esforço perante o cliente. A prova testemunhal no entanto é, sempre, uma questão de risco. Quantas e quantas vezes o autor não prova o fato constitutivo de seu direito e o réu, que não

tinha nenhuma obrigação de fazer contraprova, acaba arrolando testemunhas que só servem para confirmar e respaldar a pretensão do autor.

Deve-se atentar, também, para o sentido das palavras utilizadas para a tomada do depoimento e o registro das respostas. Muitas vezes o Juiz faz uma pergunta mas, por não compreender certas palavras, a testemunha

faz afirmativas contrárias ao que realmente pretendia dizer. Certa vez, numa audiência criminal, indaguei à testemunha se tinha conhecimento

de que a vítima estava grávida e ela afirmou que não. Pouco depois dissera que a vítima estava em estado interessante. Só aí fui compreender que, para a testemunha, estado interessante era o estado de grávida. E assim

também, certa vez, uma testemunha definiu o concubinato de um amigo como “estado de enrolado”. Carta precatória dirigida a juízo itinerante é, para nós, mais que uma

curiosidade, um erro. O juízo deve ser sempre certo; a itinerância é da essência da precatória, de modo que o Juiz que a receba, não tendo

competência para cumpri-la, a encaminha ao Juízo competente. Pode ser

usada para tomada de depoimento de testemunhas que não residem na

Comarca em que tramita a ação. 2.19. A petição inicial e as respostas

Não há peça processual de maior importância do que a petição inicial. Ela traça os confins da pretensão do autor. Um processo pode perdurar, na justiça, durante vários anos e nele serem produzidas inúmeras provas.

Tudo isso vai depender, no entanto, daquilo que foi articulado na inicial. O Código de Processo Civil elenca, em seu art. 282, os requisitos da petição inicial, que devem ser observados, sob pena de indeferimento, de

plano, após concedido à parte oportunidade para emenda ou a qualquer tempo, posteriormente.

Mesmo que o Juiz esteja em condições de proferir o julgamento, se a petição inicial, por exemplo, carecer de pedido, não terá como o magis- trado proceder à prestação jurisdicional. Recomenda o § 3º, do art. 267, do

Código de Processo Civil, que o Juiz conhecerá de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida a sentença de mérito,

da matéria constante dos incisos IV, V e VI do CPC. A petição inicial deve, pois, ser redigida com arte, cuidado e atenção.

Ela é uma peça lógica, onde o autor narra fatos, indica o direito sobre eles aplicáveis e formula o pedido, que resulta da incidência da norma sobre o fato. Somente uma petição inicial adequada permite uma sentença

que lhe corresponda.

Dentre os requisitos da petição inicial se acha a exposição dos fatos e fundamentos jurídicos do pedido (inciso III do art. 282). O fato deve ser exposto com clareza, de modo a ser bem compreendido pela parte

contrária e pelo Magistrado. É sobre ele que vai incidir a prova. Os fundamentos jurídicos consistem nas razões de direito que amparam a pretensão do autor, que podem consistir na indicação do dispositivo legal

ou apenas na referência ao postulado do direito. Assim, alguém propõe uma ação de indenização com fundamento no art. 159 do Código Civil ou

expõe um fato e respalda a respectiva pretensão, por exemplo, na teoria da imprevisão. A falta de indicação da lei na petição inicial, embora, na maioria das vezes, constitua uma imperfeição, não leva ao indeferimento

da inicial.

Outro cuidado que se deve tomar diz respeito ao pedido, que, segundo o

disposto no inciso IV do art. 282 do CPC deve ser especificado. O autor tem que dizer exatamente o provimento que pretende da autoridade judicial. Não

se justificam pedidos como “condenação nas penas previstas em lei”, porque aí não se define o que pretende o autor.

A resposta, por parte do réu, constitui, também, para este, a peça

processual mais importante. Da mesma forma que o autor só pode levar como resultado da prestação jurisdicional aquilo que postulou na inicial, o réu só poderá sustentar no curso do processo aquilo que alegou na

contestação. Há, naturalmente, questões de direito, assim como relativas a condições da ação que podem ser conhecidas de ofício. Fora essas, no

entanto, se o réu não alegou, na contestação, determinada matéria de

defesa, especialmente no campo probatório, a questão não poderá ser discutida nos autos e nem consequentemente objeto de prova, se a lide

versar sobre direito disponível. A contestação segue, também, uma ordem lógica. Segundo preconiza o art. 301 do CPC há questões que o réu deve alegar preliminarmente, antes de adentrar no mérito. No mérito, o réu deve

manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na inicial, presumindo-se verdadeiros aqueles não impugnados (art. 302, caput). Irrecomendável a adoção da fórmula contesta-se por negativa geral, que somente se justifica em prol do advogado dativo, do curador especial e do MP (parágrafo único do art. 302 do CPC). Com efeito, o curador especial

tem dificuldades de, na contestação, manifestar-se precisamente sobre a inicial, porque, não tendo contato físico com o réu (por exemplo, no caso de curadoria ao citado por Edital), não dispõe de elementos para adentrar nos

fatos articulados.

A circunstância de havermos destacado, por sua importância, a petição inicial e a contestação não afasta a importância das demais peças processuais, inclusive os recursos.

Deve o advogado, no uso da palavra, lembrar-se de que ali fala em nome das partes. O advogado não é parte. Pode sentir, mas não pode se envolver emocionalmente com a lide. Quando interpõe um recurso incumbe-lhe

criticar a sentença sob todos os ângulos em que está a merecer reforma. Não justifica, no entanto, que parta para a linha do ataque pessoal,

imputando agressões gratuitas ao Magistrado. O Jornal Gazeta Mercantil de 26.06.2001, divulgou caso ocorrido em determinada Comarca na qual o advogado subscreveu uma petição inicial

de 165 páginas. O Magistrado teria recomendado sua emenda, para reduzi-la de cinco a, no máximo, dez páginas e, ante a omissão do advogado, a inicial foi indeferida. Sem entrar no mérito jurídico da questão, certo é que,

em nossos dias, é de se recomendar que os arrazoados não sejam excessivamente extensos, a fim de permitir que possam ser efetivamente

lidos com proveito.

2.20. A sentença

O Juiz se comunica com os advogados, nos autos, através de despachos

interlocutórios, despachos de mero expediente e sentenças. Sentença, originariamente, é um ato de sentir. Daí a observação de

EDUARDO J. COUTURE: “Essa originariamente é algo que foi sentido e daí seu nome de sentença” (Introdução ao

Estudo do Processo Civil, 3ª Ed., Forense, p. 49).

A sentença deve ser proferida em consonância com a petição inicial e

constitui também um trabalho lógico. O art. 458 do CPC recomenda que a sentença conterá o relatório, a

fundamentação e a parte dispositiva, em que o Juiz resolverá as questões

que as partes lhe submeteram. O relatório pode ser sucinto, mas é indispensável, sob pena de nulidade da

sentença, salvo nos feitos submetidos ao Juizado Especial, onde a lei, de modo expresso, o dispensa (Lei nº 9.099, art. 38). A fundamentação é também imprescindível. O juiz tem que dizer às partes

os motivos que o levaram a acolher ou desacolher a pretensão manifestada em Juízo, ainda de forma sucinta. Todas as questões devem ser examinadas, quer as preliminares, quer as de mérito.

E, finalmente, no dispositivo, o Juiz tem que se manifestar sobre cada pedido formulado de modo expresso, aplicando, ainda, a sucumbência. Se

há lide secundária, como a denunciação à lide, deverá decidir ambas na mesma sentença, procedimento igualmente adotável no caso de feitos conexos.

A sentença, repetimos, constitui também um trabalho lógico, no qual o Juiz examina as alegações do autor, do réu e tira a sua conclusão. Deve ter

uma seqüência no exame dos fatos e das considerações jurídicas. Inúmeras razões podem levar à nulidade da sentença, dentre elas a omissão no exame de ponto discutido nos autos e que o magistrado não apreciou. Nesses

casos, o Tribunal anula a sentença para que outra seja proferida.

2.21. Embargos declaratórios

A experiência vem demonstrando que os embargos declaratórios são, na maioria das vezes, procrastinatórios. Por eles vêm pretendendo os

advogados, quase sempre, a revisão do pronunciamento judicial, o que não se afigura apropriado. Para tal fim existe o recurso. Há casos, no entanto, em que o Magistrado efetivamente se omitiu ou foi

contraditório. Aí os embargos são imprescindíveis e o Juiz deve recebê-los com serenidade, vendo, ali, a oportunidade de complementar o seu trabalho jurisdicional.

É preciso que o Magistrado reconheça que seu trabalho sentencial foi imperfeito e, destarte, foi oportuna a oposição dos embargos a fim de que

possa ser corrigido ou compreendido. 2.22. Monografia jurídica e pareceres Falando de comunicação jurídica não podemos nos esquecer de duas

outras formas importantes pelas quais ela se manifesta: a monografia jurídica, hoje obrigatória para os alunos que se formam em direito

(Portaria nº 1.886, de 30 dezembro de 1994) e os pareceres, subscritos por advogados e que respondem a consultas formuladas por seus clientes. No parecer o subscritor descreve, em geral, a consulta, aponta os

fundamentos de fato e de direito e, a final, opina nesse ou naquele sentido. Deve o profissional ter o cuidado em manter a sua coerência, abstendo-se de fazer pronunciamentos antagônicos sobre o mesmo tema.

O erro crasso no exame de documentação pode levar o profissional a responder civilmente pelos prejuízos causados ao cliente.

Na monografia o autor aprende a técnica de redigir e, como diz LÚCIA CUNHA DE CARVALHO:

“Na monografia de final de curso o aluno demonstrará o pensamento

crítico e a capacidade em comunicar (escrevendo e expondo oralmente)

corretamente suas idéias com concisão, clareza, objetividade e coerência” (Como

Elaborar A Monografia de Final de Curso de Direito, Forense, 1ª Edição, p. 9).

Na redação de monografias há que se atentar para aspectos técnicos

de organização do texto consagrados nos meios editoriais.

Destacam-se, por sua importância, as notas de rodapé, para as quais se recomenda seguir as normas da ABNT-NBR-6023.

São comuns, na redação de textos, expressões latinas como apud (indicada para um texto que foi extraído de obra que não a original),

passim (textos extraídos de lugares diversos de uma obra), op. cit. (obra de onde foi extraído o texto), ipsis literis (exatamente como no original).

Recomenda-se o uso de aspas simples quando o texto já está entre aspas.

A comunicação através da publicação de livros tem disciplina própria, na Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. O art. 7º define o alcance da referida lei ao estabelecer que são obras intelectuais protegidas as criações

do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro. Os incisos

do referido artigo contém exemplificação dos tipos de obras. Um exame mais detalhado da matéria foge, naturalmente, ao âmbito

restrito do presente trabalho.

2.23. Segredo de justiça

O processo civil é, em regra, público, sendo portanto os atos nele praticados acessíveis a qualquer pessoa. O Estatuto da OAB consagra, de modo expresso, o direito do advogado de examinar tais autos e extrair cópia de

peças. No mesmo sentido o CPC (art. 40, I). As audiências são também públicas; qualquer um pode assisti-las, ressalvado, naturalmente, no caso

concreto, o poder de polícia do magistrado. As audiências dos processos referidos no art. 155 do CPC realizam-se com portas fechadas. São casos em que o processo corre em segredo de justiça, isto é, somente têm acesso a ele

as partes e seus procuradores. Via de regra submetem-se ao segredo de justiça as causas de família.

Dispõe o art. 155 do CPC: Os atos processuais são públicos. Correm, todavia, em segredo de justiça os processos em que o exigir o interesse público (inciso I) ou que digam respeito a casamento, filiação, separação

dos cônjuges, conversão desta em divórcio, alimentos e guarda de menores.

2.24. Sigilo profissional

Regra ética imposta aos profissionais das mais variadas especialidades diz respeito à observância do sigilo profissional. Quando alguém procura um

profissional e se abre com ele, confiando na fé de seu grau, não pode ser surpreendido com revelações públicas daquilo que se operou em recinto

exclusivamente privado. O Estatuto da Advocacia e o Código de Ética do

Advogado disciplinam o sigilo profissional.

Dispõe o Código de Ética e Disciplina da OAB, de 1° de março de 1995: “Art. 25. O sigilo profissional é inerente à profissão, impondo-se o seu

respeito, salvo grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o advogado se veja afrontado pelo próprio cliente e, em defesa própria, tenha que revelar segredo, porém sempre restrito ao interesse da causa.

Art. 26. O advogado deve guardar sigilo, mesmo em depoimento judicial, sobre o que saiba em razão de seu ofício, cabendo-lhe recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva

funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou tenha sido advogado, mesmo que autorizado ou solicitado pelo constituinte.

Art. 27. As confidências feitas ao advogado pelo cliente podem ser utilizadas nos limites da necessidade da defesa, desde que autorizado

aquele pelo constituinte.

Parágrafo único. Presumem-se confidenciais as comunicações epistolares

entre advogado e cliente, as quais não podem ser reveladas a terceiros.”

2.25. Sigilo nas comunicações telefônicas, postais e no acesso a informações bancárias e fiscais. Provas havidas por meios ilícitos A Constituição Federal assegura, como direito e garantia do cidadão, o de ter

mantida a sua privacidade nas comunicações telefônicas que, em razão disso, são sigilosas (art. 5º, inciso XII). O conhecido grampeamento, tão comum na prevenção do tráfico de entorpecentes, somente pode ser autorizado por Juiz

Criminal, estando a matéria, hoje, regulamentada pela Lei n° 9.296, de 24 de julho de 1996 que, em seu artigo 1º, caput, dispõe que a interceptação de

comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de

justiça. A comunicação postal também tem seu sigilo protegido por preceito

constitucional. Regulamentando-o o Código Penal, de longa data, instituiu, no seu art. 151, caput, o tipo penal violação de correspondência, que consiste em devassar indevidamente o conteúdo de correspondência

fechada dirigida a outrem. Também tem o cidadão o resguardo do sigilo de sua conta bancária e

de sua situação fiscal. No tocante à primeira, a Lei nº 4.596, de 31 de dezembro de 1964, em seu artigo 38, estabelece a obrigatoriedade do sigilo das operações ativas e passivas pelas instituições financeiras, dispondo

que, nas requisições judiciais, somente as partes poderão ter acesso às informações. Sendo público o processo, a única forma possível de se

respeitar o sigilo bancário é a manutenção da informação nos cofres do Cartório ou em envelope lacrado. Ou, então, o Juiz decretar o processamento sigiloso do processo, o que se afigura inadequado.

Quanto à situação fiscal, o Código Tributário Nacional (Lei n° 5.172, de 25 de outubro de 1966) prescreve em seu art. 198 que, sem prejuízo do disposto

na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública

ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a

situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades. O parágrafo primeiro do

citado artigo abre exceções que são, além das previstas no art. 199, a requisição de autoridade judiciária no interesse da justiça e solicitações de autoridade administrativa no interesse da Administração Pública, desde que

seja comprovada a instauração regular de processo administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração administrativa.

Recentemente, a Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001, dispôs sobre o sigilo das operações das instituições financeiras e o Decreto

nº 3.724, de 10 de janeiro de 2001, regulamentou o art. 6º da referida lei para disciplinar a requisição, acesso e uso, pela Secretaria da Receita Federal, de informações referentes a operações e serviços das instituições

financeiras. As provas obtidas por meios ilícitos, como, por exemplo, a gravação

clandestina, não se prestam, em princípio, para produzirem efeitos em Juízo. 2.26. O advogado e a cobrança de dívidas em face do CDC

Segundo o disposto no art. 42 do Código de Defesa do Consumidor:

“Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a

ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou

ameaça” (caput).

Não constitui ameaça, no entanto, a nosso ver, o exercício regular do

direito de cobrança que o credor tem.

A cobrança feita com manifestos constrangimentos para o devedor

pode levar à incidência da obrigação de reparar danos morais por parte do

credor.

2.27. Compreendendo as decisões antagônicas

O Juiz é livre para proferir decisões segundo o seu convencimento. Em

razão disso, não pode se submeter à camisa de força de um entendimento jurisprudencial. Por isso a luta contrária à súmula vinculante. Daí resultam muitas vezes decisões extremamente antagônicas que levam

o leigo à perplexidade. Muitas vezes, num mesmo Tribunal, em Câmaras ou Turmas

diferentes, uma hipótese de dano moral é considerada para efeito indenizatório; em outra, idêntica, com as mesmas características, a indenização é negada.

A questão da revogação da figura contravencional – dirigir sem habilitação – prevista na Lei de Contravenções Penais, dividiu a opinião dos Juízes e

Tribunais. Até no STJ haviam decisões conflitantes. Uns entendendo haver sido extinta a figura da contravenção penal com o advento do Código de Trânsito Brasileiro; outros, sustentando a sua manutenção no Direito

Brasileiro. Felizmente a questão foi uniformizada pelo Supremo Tribunal

Federal. A possibilidade da prisão do depositário infiel na alienação fiduciária é

outra questão controvertida. O indivíduo adquire um veículo com cláusula de alienação fiduciária. E o vende. Posteriormente, não sendo o veículo encontrado em seu poder, o banco postula a conversão da busca e

apreensão em ação de depósito. Não sendo entregue a coisa há juízes que admitem a prisão do depositário; outros não. Fica difícil para o leigo compreender essa contradição que, no entanto, não existe apenas na

ciência jurídica, mas em todas as ciências sociais, inclusive na área médica. Já afirmara ALBERT EINSTEN que no interior do átomo não existe a

certeza que tantos afirmam. Alguma coisa deve ser feita, no entanto, de concreto, em nome da estabilidade das relações sociais, em prol da efetiva uniformização da

jurisprudência.

2.28. Formalismo jurídico

A comunicação jurídica, embora se lute contra certo ranço e praxes ainda existentes, é eminentemente formal. Afirma-se, costumeiramente, que não está no mundo o que não se encontra nos autos.

Ainda existem requisitos de forma consagrados na legislação e que já não respondem à velocidade do mundo moderno, como a técnica de cerrar e coser o testamento cerrado (v. art. 1.638, inciso XI, do Código Civil),

transformando-se a abertura desse testamento, em verdadeira curiosidade jurídica. O Código Civil, aliás, em matéria de testamentos, é bastante

formalista. O formalismo, de certo modo, constitui fator de segurança jurídica. Nem por isso precisam ser mantidas as fórmulas praxistas de escrituras públicas e

termos processuais, inclusive alvarás e mandados, que podem e devem ser simplificados para, sem prejuízo da clareza e segurança, ajustarem-se

melhor ao linguajar de nossos dias. A forma não pode ser priorizada em detrimento do conteúdo. Não se pode chegar ao extremo – e infelizmente isso costuma acontecer – de um carimbo ou papel timbrado valer mais que

uma assinatura. Mas é imprescindível, especialmente no direito processual, que tudo fique documentado nos autos, mesmo porque outras pessoas que venham a

participar do processo não têm obrigação de tomar conhecimento de fatos que não estão ali registrados.

2.29. Mentalidade jurídica Segundo o disposto no art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil: “Na aplicação da lei, o Juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às

exigências do bem comum”. Cada lei se dirige a um fim: assim a legislação de trânsito visa, dentre

outros objetivos, a educar o motorista e, ao mesmo tempo, puni-lo pelas

infrações cometidas, tendo como diretriz básica a prevenção de acidentes e

a eficácia do trânsito. O motorista que dirige em excesso de velocidade

pode ser multado e perder pontos na sua carteira. Quando o legislador elaborou o Código de Trânsito o fez voltado para o problema do trânsito,

priorizando-o, dentro do contexto social. Da mesma forma ocorreu com outras leis. Quando o legislador elaborou a lei do meio ambiente preocupou-se com o futuro de nossas florestas e com a pureza do próprio

ar que respiramos. Quando editou o Estatuto da Criança e do Adolescente direcionou-se para o grave problema social do menor desassistido. A preocupação excessiva em tutelar determinados setores da vida social leva

a certas contradições. Uma lesão corporal culposa, sem maiores conseqüências, em acidente de trânsito, chega a ser punida com mais

intensidade que a mesma lesão leve, decorrente de comportamento doloso. Cada uma dessas leis, no entanto, deve ser interpretada segundo os princípios que a orientam. É preciso, pois, compreender toda a realidade

que envolve cada setor da vida social. O “furto” de uma criança, com a popular adoção à brasileira, por exemplo, não deve ser visto com o

rigorismo do direito penal ou mesmo da legislação civil, mas à luz dos princípios que informam o menorismo. Uma relação entre um consumidor e um fabricante não pode ser julgada com os princípios individualistas do

Código Civil, mas à luz das normas de interesse público do Código de Defesa do Consumidor. O direito é único e deve ser interligado; cada especialidade, porém, tem seus princípios informativos, muitas vezes

decorrentes de preceitos constitucionais. Todas as vezes que o profissional se afasta do convívio diário com determinada especialidade do direito

perde, involuntariamente, essa mentalidade jurídica, indis- pensável para a atuação em determinada seara. Em conseqüência, uma boa comunicação jurídica pressupõe uma visão geral do direito, de seus princípios maiores e

um comportamento adequado à mentalidade que domina na seara a que o profis- sional se dispõe a se especializar na profissão.

Um bom conhecimento de direito constitucional permite essa visão, porque é a Constituição que traça os confins de toda a atividade legislativa. Nos

grandes princípios constitucionais assenta-se, sem dúvida, a estrutura básica de nosso direito.

2.30. Argumentação jurídica

Ensina JOLIVET:

“O raciocínio, em geral, é a operação pela qual o espírito, de duas ou mais relações conhecidas, conclui uma outra relação que desta decorre logicamente. Como, por outro

lado, as relações são expressas pelos juízos, o raciocínio pode também definir-se como a

operação que consiste em tirar de dois ou mais juízos um outro juízo contido logicamente

nos primeiros. O raciocínio é então uma passagem do conhecido para o desconhecido. O

argumento é a expressão verbal do raciocínio” (Ob. cit., p. 45).

A lógica se utiliza, no raciocínio, de dois métodos: o indutivo e o dedutivo. O primeiro, parte de fatos particulares para o geral e, o segundo, do geral para o individual. O

silogismo é conhecido como a expressão formal do método dedutivo, constituindo-se ele de

duas premissas (uma maior e uma menor) e a conclusão.

No raciocínio, o agente está sujeito a dois tipos de erros, seja porque raciocinou

corretamente com dados falsos, seja porque, não obstante verdadeiros os dados,

raciocinou incorretamente.

Segundo SILVIO DE MACEDO:

“Sendo a lógica jurídica uma lógica de persuasão, encontra assim no argumento sua matéria-prima. Define-se portanto o argumento como o raciocínio que tem por objeto

provar ou refutar uma determinada proposição” (Enciclopédia Saraiva do Direito, vol. 7,

p. 460).

Para HILTON JAPIASSÚ E DANILO MARCONDES:

“Argumentação (lat argumentatio) Modo de apresentar e de dispor os argumentos, vale

dizer, os raciocínios destinados a provar ou a refutar determinada proposição, um ponto de vista ou uma tese qualquer. Seu objetivo é convencer ou persuadir, mostrando que todos os

argumentos utilizados tendem para uma única conclusão” (Dicionário Básico de Filosofia,

Jorge Zahar Editor, p. 16).

Para os profissionais do direito destaca-se a importância da argumentação.

Tudo deve ter um porquê. A petição inicial deve contar os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido, o que pressupõe argumentação. O despejo deve ser concedido ao proprietário locador do imóvel em face à

inadimplência do inquilino porque a lei assegura a sua faculdade de retomar o imóvel nos casos de falta de pagamento do aluguel, o que é natural em nome do seu direito de propriedade. A argumentação tanto se

opera no campo do direito, como no da prova. Quantas vezes o Magistrado utiliza a argumentação para, dos indícios, extrair a presunção.

No campo do direito, no entanto, existem muitas questões em que a letra fria da lei ou as decisões dos Tribunais retiram substancialmente a importância da argumentação. Não obstante todo o brilho de uma

coerência na exposição, a pretensão costuma ser desacolhida sem indagações mais profundas, em nome de um entendimento jurisprudencial remansoso.

Dentre outras argumentações que já recebi destaco a seguinte.

Presidia uma audiência de instrução e julgamento e havia testemunhas a serem ouvidas por precatória, já expedida. Uma das partes trouxe as testemunhas, para a audiência, a fim de serem ouvidas ali. Nada mais

razoável e econômico. O procurador da parte contrária, no entanto, formulou o seguimento argumento: não tinha elementos, naquela ocasião, para apresentar a contradita pois, na certeza de que a testemunha seria

ouvida por precatória, somente naquela ocasião é que iria verificar quem seria a testemunha arrolada para efeito de contraditá-la ou não. Ainda que

se pudesse, na espécie, entender que o depósito do rol, na Secretaria, já tornava público o nome da testemunha, não deixou de ser brilhante a argumentação apresentada.

Para efeito de argumentação jurídica há que se observar a questão do paradigma. No debate em Juízo são relevantes as questões de direito e de

prova. Na discussão administrativa, no entanto, não adianta questionar

aspectos relacionados à legalidade de norma regulamentar, por exemplo,

porque a administração pública, em princípio, cumpre os princípios que erigiu, embora se saiba que, à norma inconstitucional, pode ser negado

cumprimento. A matéria é apresentada aqui, de forma bastante simples e sucinta, posto

que existem, sobre o tema, obras profundas e específicas, no campo da filosofia e da lógica, dentre elas o precioso Tratado da Argumentação, de

Chaïm Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca, Martins Fontes, do qual transcrevemos sua parte conclusiva final:

“Graças à possibilidade de uma argumentação que forneça razões, mas

razões não-coercitivas, é que é possível escapar ao dilema: adesão a uma

verdade objetiva ou universalmente válida, ou recurso à sugestão e à violência

para fazer que se admitam suas opiniões e decisões. O que uma lógica dos

juízos de valor tentou em vão fornecer – a saber, a justificação da possibilidade

de uma comunidade humana no campo da ação, quando essa justificação não

pode ser fundamentada numa realidade ou verdade objetiva –, a teoria da

argumentação contribuirá para elaborar, e isso a partir de uma análise dessas

formas de raciocínio que, embora indispensáveis na prática, foram

menosprezadas, depois de Descartes, pelos lógicos e teóricos do conhecimento”

(p. 581).

2.31. Marketing jurídico

É muito comum que o leigo indague quem seria um bom advogado. Seria o mais brilhante, quem mais se destaca pela sua inteligência? Ou aquele que soluciona o problema? Quem recorre, ou faz acordo.

É comum o advogado vender uma imagem que não tem, prometer sucesso na demanda e, depois, simplesmente atribuir a culpa à Justiça.

O estudo do direito material é importante, como também o são as

regras de processo. Mas a grande maioria das pessoas quer resolver o seu problema, da melhor forma possível. Não está interessada em teses

jurídicas, a não ser na proporção em que contribuam para a solução do caso concreto. O comerciante quer que o advogado discuta a auto-aplicabilidade da regra constante no art. 192, §3º, da Constituição Federal,

porque tem interesse na redução dos juros cobrados pelos bancos. Alguns profissionais, às vezes, discutem questões meramente acadêmicas por

motivos de ordem estritamente pessoal. Outros poucos por convicção.

O marketing jurídico se desenvolve em torno da forma como o profissional

vende os seus serviços.

Na área do direito, inúmeras regras de comportamento ético impedem

uma política de marketing, à semelhança de outros setores, em face às restrições existentes, inclusive através de propagandas. O Código de Ética do Advogado contém inúmeras disposições sobre a propaganda em seus

arts. 5º, 7º e 28 a 34.

O advogado, no entanto, registre-se desde já, não pode nunca assumir

compromisso com o cliente pelo resultado da demanda.

2.32. Comunicação e fraude

Felizmente a fraude processual vem perdendo espaço no mundo atual,

em face ao esforço dos Magistrados em reprimi-la e o trabalho da Ordem

dos Advogados do Brasil no sentido de punir os profissionais que a

praticam.

Mas, infelizmente, ela ainda existe. Caso clássico de fraude é daquele devedor que, estando com inúmeras execuções ajuizadas, foge da citação. Procura, então, um conhecido e

contrai, em prol dele, dívida inexistente. Ato contínuo, o título fraudulento é objeto de execução e o devedor comparece a Juízo, oferece bem à penhora e,

depois, dação em pagamento. Como a primeira penhora assegura prioridade para recebimento do crédito, em princípio, a dação seria válida. Também pode ocorrer que, diante da iminência do praceamento de seus bens,

idêntica dívida seja contraída pelo devedor. Só que o credor, sabendo que não terá a prioridade da penhora, formula pedido de insolvência civil do devedor, o que lhe permitirá não apenas impedir o pagamento do crédito,

mas também a sua habilitação, em igualdade de condições com os verdadeiros credores. São práticas censuráveis que, não obstante devessem

ser extirpadas dos meios jurídicos, infelizmente ainda existem e nem sempre são provadas.

2.33. Comunicação virtual

Um novo meio de comunicação passou a integrar a vida do cotidiano do século atual: A comunicação via Internet. Por ela as pessoas conversam através de e-mail, fazem compras, vendem, tudo dentro de sua própria casa,

abolindo as distâncias no mundo globalizado. O próprio Governo vem introduzindo a possibilidade de utilização da

Internet para inúmeros serviços. Hoje as declarações de imposto de renda podem ser prestadas através de e-mail e, pela mesma via, vários benefícios

previdenciários já podem ser postulados. A assinatura escrita é substituída, nos meios de comunicação virtual por uma confirmação ou assinatura eletrônica. Aliás, nos relacionamentos com os bancos a

utilização do cartão magnético com a senha do cliente já substituiu a tradicional assinatura à caneta. Até que se regulamente, no entanto, a matéria, a comunicação via

Internet ainda não tem plena validade para a formação de contratos, que dependem de assinatura do contraentes, embora seja indiscutível início de

prova. No âmbito do processo civil, a Lei nº 9.800, de 26 de maio de 1999, já autoriza a remessa de petições via e-mail (ou por fax), mas ainda condiciona à apresentação, em Juízo, dos originais escritos.

A comunicação virtual ainda não tem, em nosso direito, a força de prova documental, valendo, em princípio, pela força dos testemunhos que

consubstancia.

Os trabalhos divulgados via Internet, no entanto, gozam de plena proteção

legal. Nesse sentido:

“E realmente, conforme será exposto nesse trabalho, a Internet não é, não foi e nunca

será essa “terra sem lei”, gozando, toda e qualquer criação intelectual de proteção legal,

ensejando a indenização aos seus autores e titulares, seja no campo moral, seja no campo

patrimonial, independentemente do meio que a suporta (eletrônico ou tangível)” (MARCOS GOMES DA SILVA BRUNO, Revista Panorama da Justiça nº 28, p. 14, Editora Escala).

2.34. Comunicação com espíritos

A doutrina espírita, à luz dos ensinamentos de ALLAN KARDEC, sustenta a possibilidade de comunicação do ser encarnado com o mundo invisível

dos desencarnados. Dessa comunicação poderia surgir o questionamento em torno da possibilidade da adoção como meio de prova, quer daquelas mensagens psicografadas, quer daqueles que querem prestar testemunho

do contato que tiveram com os espíritos.

“Sendo admitidas a existência, a sobrevivência e a individualização da alma, o

Espiritismo reduz-se a uma só questão principal: Serão possíveis as comunicações entre

as almas e os viventes? Essa possibilidade foi demonstrada pela experiência, e, uma vez

estabelecido o fato das relações entre os mundos visível e invisível, bem como conhecidos a natureza, o princípio e o modo dessas relações, abriu-se um novo campo à

observação e encontrou-se a chave de grande número de problemas” (ALAN KARDEC, O

que é o espiritismo, Federação Espírita Brasileira, pp. 157/158).

Mas e a possibilidade jurídica do meio de prova? A bibliografia jurídica sobre o tema é rara. Também não se encontra o enfrentamento do tema na jurisprudência.

A matéria teria relevância, ainda, no campo dos direitos autorais, relativamente às obras ditas psicografadas. Sobre essa última questão

anotou CARLOS ALBERTO BITTAR:

“Outra questão particular nessa matéria é a da obra psicografada, que vem, com a

evolução do espiritismo, formando literatura própria e com editoras especializadas. É a

obra realizada por uma pessoa (médium) que recebe de um espírito de luz, normalmente

transformada aquela em veículo material. Mas, como a questão envolve conotações metajurídicas e na comunicação da obra aparece o nome do elaborador material, a este

compete o respectivo exercício, que, aliás, vem sendo efetivado, à generalidade, em prol de

campanhas beneficentes promovidas por entidades espíritas, responsáveis quanto à

publicação” (Curso de Direito Autoral, Forense, 1ª Ed., p. 39).

A Revista Isto É, Especial ao nº 1552, trouxe personalidades religiosas do século, e, ao cuidar da vida de FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER, menciona

que, em 1979, numa cidade do Goiás, uma carta psicografada por ele teria sido aceita para inocentar um acusado.

Reconheça-se, no entanto, a grande dificuldade hoje de se argumentar

em Juízo com o tema, dada a manifesta dificuldade ou impossibilidade de

comprovação dos fatos dessa natureza.

2.35. O cavalheirismo e o traje como forma de comunicação Na vida social o indivíduo cumpre não apenas regras de direito, de moral e

de religião, mas também uma série de comportamentos denominados

normas de etiqueta social.

Segundo o insigne PAULO NADER:

“As regras de trato social são padrões de conduta social elaborados pela sociedade e que,

não resguardando os interesses de segurança do homem, visam a tornar o ambiente social

mais ameno, sob pressão da própria sociedade” (Introdução ao Estudo do Direito, Forense, 5ª Edição, p. 54).

O traje adequado à circunstância, por exemplo, constitui uma regra de

etiqueta social. Assim como é adequado o uso de terno no ambiente forense, trajes de banho são indicados para as cidades de veraneio. Além dos trajes existem regras inúmeras que orientam a boa convivência

social e que fazem comunicação. A postura num jantar de requinte pode comunicar a elegância ou o despreparo.

As regras de cortesia também induzem comunicação. Ceder um lugar no ônibus ao mais velho demonstra cordialidade e respeito.

Nos meios jurídicos a igualdade entre o homem e a mulher se revela com bastante plenitude.

Existem concessões. No júri, por exemplo, se o Promotor admite o aparte, deve também permiti-lo o advogado.

Há advogados que, por cortesia, em nome do bom relacionamento

profissional, anuem ao pedido do colega no adiamento de uma audiência, por motivos de ordem pessoal ou evitam discutir o pagamento de honorários advocatícios.

Relatou-nos certa vez um amigo que costumava ir, de terno, a um dos

caixas do andar térreo de uma agência bancária e, ali, pagar uma determinada conta de serviço público, que era aceita normalmente. De certa feita, fora ele àqueles mesmos caixas, de manga de camisa, efetuar o mesmo

pagamento e recebeu, com surpresa, a informação de que deveria subir uma escada e pagar a conta no andar superior.

Ainda que se trate de um caso episódico, ele bem retrata o tratamento diferenciado que se dá às pessoas adequadamente trajadas. O terno

completo, principalmente no meio jurídico, inspira respeito e confiança, principalmente quando adequadamente combinado com a camisa, gravata e sapato. Para quem o usa com elegância faz bem à sua auto-estima.

Para as partes o traje também influencia na comunicação. Numa ação de alimentos, por exemplo, em que a mulher pretende emprestar a idéia de pobre coitada, uma roupa modesta se impõe. Se o objetivo, no entanto, é

demonstrar bom nível social, a situação se inverte inteiramente e a vestimenta mais adequada é aconselhável. Dúvidas não há de que ninguém deveria valer mais ou menos pelo que

veste; mas não se pode negar a importância, na vida, exercida pela vestimenta.

2.36. O silêncio jurídico O silêncio tem, na comunicação jurídica, aspectos dos mais relevantes. O réu que, citado, se silencia, não contestando a ação, que verse sobre

direito disponível, torna-se revel e, em conseqüência, são verdadeiros os

fatos afirmados pela parte autora. Ou seja, consentiu, calando-se.

Também o silêncio e o transcurso do prazo contra decisões judiciais faz gerar a preclusão.

O réu, no crime, tem o direito de se calar, ao ser ouvido em Juízo, mas o silêncio pode ser interpretado em seu prejuízo, nos termos do que dispõe o art. 186 do Código de Processo Penal.

Mas adverte MITTERMAIER:

“O silêncio obstinado do acusado não pode fazer com que ele se considere o autor de um

crime. No cível, o princípio da desistência pode fazer admitir esse sistema; mas não

sucede assim no crime; por conseqüência, ainda que o Juiz, para vencer a sua

obstinação, lhe marque um prazo para responder, e o ameace de que, se não o fizer, considerará verdadeira a imputação, não há confissão tácita” (Tratado da Prova em

matéria criminal, Eduardo & Henrique Laemmert, ed. de 1874, p. 310).

Em trabalho com o título O dever de calar e o direito de falar ADAUTO

SUANNES anotou: “ Ou seja, nem haveria necessidade de previsão legal, expressa, pois a Ética não admite que alguém testemunhe contra ou a favor de si próprio” (Revista Literária de Direito, nº

40, p. 19).

A prescrição cível deve ser invocada, no processo de conhecimento, como preliminar, na contestação, sob pena de não mais poder ser alegada.

A incompetência relativa do Juízo, também, se não argüida, por exceção, no momento próprio, prorroga-se.

A recusa do réu em submeter-se ao DNA pode implicar a presunção de paternidade, se o contrário não resultar da prova dos autos. Embora não possa ser compelido ao exame, tal fato constitui forte indício de

paternidade. São exemplos da importância de que se reveste o silêncio da parte no

mundo jurídico. 2.37. O processo não é fim, é meio Uma prestação jurisdicional adequada pressupõe o ajuizamento correto de

uma ação. Muitos bons advogados afirmam ser mais fácil contestar uma ação bem ajuizada, do que aquelas confusas e incompreensíveis. Mal propostas, portanto.

Com efeito, o direito processual constitui-se, sem dúvida, no instrumento adequado à satisfação das legítimas pretensões de direito material.

Não se pode, contudo, dar ênfase excessiva à forma, preterindo-se a prestação jurisdicional, que é o fim. Processo é meio.

A estrutura processual brasileira, além de formalista, é bem rigorosa. Quem ajuíza uma ação incompatível com o seu direito material é julgado

carecedor de ação, segundo o ponto de vista de certos processualistas. Assim, quem possui um imóvel locado, não pode postular, em Juízo, uma ação reivindicatória ou uma possessória. Deve pleitear, de modo específico, a ação de despejo.

Uma pessoa que adquire um imóvel em hasta pública e que se acha

ocupado por terceiro tem, muitas vezes, que enfrentar uma verdadeira maratona judicial para retomar a coisa, sem prejuízo do complexo exame que terá de fazer para definir o caminho a percorrer.

Os repertórios jurisprudenciais demonstram que existem mais decisões

de direito processual civil do que de direito civil propriamente dito. Ou seja, perde-se muito tempo discutindo o caminho...

Temos conhecimento de certo autor que ingressou em Juízo postulando uma adjudicação compulsória. Conseguiu, em primeiro grau,

uma outorga de escritura, porque seu compromisso de compra e venda não estava registrado. Em sede de recurso o Tribunal anulou a sentença

porque o Juiz julgara ultra petita. E o autor ficou sem nenhuma das duas soluções jurídicas.

É preciso que se proceda a uma reforma urgente na qual, sem violentar-se um mínimo de segurança e forma, permita-se uma prestação jurisdicional

menos complicada, em que se priorize o efetivo enfrentamento do mérito da questão.

2.38. A importância da filosofia do direito na comunicação

O direito não pode repousar numa fria aplicação da norma jurídica no caso concreto. O Juiz não pode se divorciar do meio, dos princípios, das fontes maiores da sabedoria humana, para interpretar o direito como um objeto

isolado. O direito é instrumento vivo de disciplina da vida das pessoas; da aplicação da norma jurídica pode resultar a paz ou a guerra; a satisfação

ou a frustração; a felicidade ou o fracasso. A aplicação da lei deve se integrar no meio social objetivando a realização

da justiça. Daí a importância do estudo, na comunicação jurídica, dos princípios básicos da filosofia, e por que não do pensamento de grandes filósofos?

Inspirou-me na redação deste capítulo o jovem acadêmico de filosofia Franklin Rossi Felipe, que muitas sugestões forneceu sobre o tema.

O direito merece ser visto sob o prisma da sabedoria universal, dos grandes princípios que regem e regram a vida do homem em sociedade.

Segundo DANILO MARCONDES (Iniciação à História da Filosofia,

Jorge Zahar Editor, 2ª Ed., p. 19), a filosofia, como ciência, teria nascido na Grécia, caracterizada como “uma forma específica de o homem tentar entender o mundo que o cerca, isso não quer dizer que anteriormente não

houvesse também outras formas de se entender essa realidade”. O ponto de partida da filosofia é o rompimento com o pensamento

mítico-religioso, aquele que repousava não numa explicação racional dos fenômenos da vida, senão apoiava-se em mistérios ou fenômenos sobrenaturais. O tempo fez reduzir o âmbito de sua abrangência, hoje

voltada mais para a investigação dos primeiros princípios, dos

fundamentos da ciência e da ação humana.

Segundo boa corrente de estudiosos da história da filosofia o primeiro filósofo teria sido Tales de Mileto. Seguiram-se outros, sendo, no entanto, o

surgimento de Sócrates um marco na história da filosofia. Em 399 a.C. Sócrates é acusado de crimes contra cidadãos atenienses e condenado à morte (beber veneno, cicuta), após longo discurso de defesa, perante um

Júri de 501 cidadãos, no qual recusou declarar-se inocente. Já nessa época se desenvolvia a oratória e a retórica com os sofistas,

que tinha em Sócrates um opositor, embora muitos também o

considerassem um sofista. Outros filósofos sucederam Sócrates, destacando-se Platão e

Aristóteles, o último discípulo do primeiro, mas que rompeu com muitos ensinamentos de seu mestre.

Muitos outros filósofos foram reconhecidos, dentre eles São Tomás de

Aquino (1224-1274). O marco da filosofia moderna viria, segundo Danilo Marcondes (ob.cit., p. 207) com Immanuel Kant (1724-1804), autor da obra

Crítica da Razão pura.

Mais uma vez invocando a lição de Danilo Marcondes (ob. cit., p. 275) tem-

se que “o pensamento contemporâneo resulta de uma tentativa de encontrar respostas à crise do projeto filosófico da modernidade. Suas

principais correntes visam seja atualizar o racionalismo e o fundacionalismo característicos da filosofia moderna, seja romper com esta tradição em direção a novas alternativas a partir da influência de filósofos

como Heidegger e Wittgenstein. Um dos aspectos centrais dessa crise é o questionamento da subjetividade como ponto de partida da tentativa de fundamentação do conhecimento e da ética. A linguagem passa a ser vista,

em diferentes perspectivas, como uma alternativa para a reflexão filosófica”.

A síntese do pensamento desses grandes filósofos e outros foge ao objetivo sucinto da presente obra, mas se apresenta como importante subsídio na comunicação e na própria ciência do direito.

2.39. Interpretação jurídica

Por maior que seja a clareza buscada pelo legislador ao texto legal, sempre existem dúvidas sobre o alcance de determinados dispositivos de lei, a

provocar celeumas na doutrina e polêmica nos Tribunais. Quanta divergência se assenta, por exemplo, na interpretação da expressão cúmplice de cônjuge adúltero, inserida no art. 1.177 do Código

Civil. Para uns é a mulher que vive com o homem casado, ainda que separado de fato de sua mulher; para outros é aquela que vive com homem

que conviva, simultaneamente, com sua esposa. Alguns dispositivos legais consubstanciam regras expressas de interpretação. Assim:

Na aplicação da lei se atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum (Lei de Introdução ao Código Civil, art. 5º).

Interpretam-se literalmente as normas que disponham sobre suspensão, exclusão do crédito tributário e isenção (CTN, art. 111, I e II).

O art. 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente estatui que “Na interpretação desta lei, levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e

coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento”.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 47 recomenda interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor.

A doutrina, com o aval da jurisprudência, traça uma série de normas de interpretação jurídica, que podem ser buscadas em valiosos estudos, dentre

os quais a clássica obra de CARLOS MAXIMILIANO, Hermenêutica e Aplicação do Direito.

No dia-a-dia do magistério universitário tenho refletido com os alunos sobre o grande dilema do aplicador da lei. A lei pode ser justa enquanto

mandamento teórico; mas, algumas vezes, transformar-se num desastre se interpretada literalmente no caso concreto. O grande conflito do aplicador da lei é o seguinte: não pode desrespeitá-la, porque ela constitui um

mínimo ético legal, mas também não pode desconhecer que, se ela se dirige ao homem, não pode ser interpretada contra os mais legítimos interesses humanos.

A situação se agrava com as leis desatualizadas, que ainda vigem, mas não mais respondem ao anseio da sociedade.

Compatibilizar o respeito à lei com a primazia do interesse do homem constitui inegável tarefa do jurista moderno.

É mister outorgar-se ao Magistrado um pouco mais de poder para decidir com eqüidade, objetivando alcançar esse equilíbrio.

Segundo WASHINGTON DE BARROS MON- TEIRO, a eqüidade “Mais sentida do que definida (COGLIOLO) personifica sinteticamente a justiça no caso concreto, a humanidade no direito (BUTERA)” (Curso de Direito Civil,

Saraiva, 6ª Ed., p. 45).

Segundo o disposto no art. 127 do CPC, o Juiz só decidirá por

eqüidade nos casos previstos em lei e a Lei nº 9.099/95, em seu art. 6º, dispõe que o Juiz adotará em cada caso a decisão que reputar mais justa e eqüânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem

comum.

Penso, repito, que ao julgador se deva dar uma flexibilidade maior.

Não se pode chegar ao absurdo de soluções imorais e injustas só porque o legislador assim previu.

Até a vigência da Constituição de 1988 , segundo dominava no entendimento doutrinário e jurisprudencial, o filho adulterino não podia ser reconhecido. Punia-se injustamente quem nenhum ilícito cometeu, em

nome de valores que, já na ocasião, não tinham e nem poderiam ter o peso que a eles se dava.

Por isso costumo dizer que o Jurista tem um compromisso com a lei.

Sim. Mas quanto maior for o interesse social em jogo, maior deverá ser a liberdade do intérprete ou do julgador em fugir ao critério do rigor legal.

Imagine-se, por exemplo, um cientista que descobrisse o remédio para um grande flagelo da humanidade, e que cometesse um crime cuja pena impedisse o prosseguimento do seu trabalho!

SAINT-EXUPÉRY, com sua sensibilidade, narra, em seu precioso O PEQUENO PRÍNCIPE a história de um rato que havia no reino e que seria condenado à morte, mas nunca executado, por ser o único que existia.

Qualquer magistrado dispõe do rol de um sem número de situações em que, pelo respeito à lei, foi obrigado a cometer injustiça.

2.40. Comunicação, conciliação e justiça O atual modelo de prestação jurisdicional efetivamente não satisfaz às exigências da sociedade. Não tem sentido que uma pretensão simples

possa ficar no aguardo de uma solução judicial durante anos e, depois, a parte lesada ainda tenha que fazer uma autêntica peregrinação para obter

a efetiva satisfação do seu direito, através de um processo de execução que não atende às exigências da nossa realidade.

Não há dúvidas de que o modelo atual possa persistir: ações

complexas, provas demoradas, recursos processuais. Mas para grandes

questões, ou, ao menos, aquelas em que os recursos consensuais foram

esgotados.

Na generalidade dos casos, especialmente os mais simples, e nas

situações de urgência, é mister uma solução rápida e menos onerosa para

as partes.

Seria ideal que as partes pudessem procurar diretamente um Juiz que

as ouvisse, de imediato e pudesse dar uma solução a seus problemas. O

Juizado Especial caminha nesse sentido. Já se imaginou um acidente em

que, pouco tempo depois, ali já comparecesse o Judiciário para solucionar o

impasse? Um Judiciário que fosse ágil e, se possível, pudesse se deslocar

até o local do litígio?

As pessoas devem ter a oportunidade da conciliação, de forma rápida,

ampla e satisfatória.

Conciliar efetivamente não é apenas formular proposta de acordo. É

ouvir, conversar, ponderar, aconselhar. E isso, os experientes melhor

fazem do que os mais novatos, que podem, no entanto, muito contribuir

com seu entusiasmo e vontade de vencer. Costumo dizer que é mais difícil

ser um bom conciliador, do que proferir uma sentença tecnicamente

correta.

Se, na conciliação cível, em se tratando de direitos disponíveis, se acha

um dos mais poderosos instrumentos de efetiva realização da Justiça, e se

uma boa comunicação é da maior valia para o êxito do processo

conciliatório, então a comunicação desponta-se como instrumento

imprescindível à melhoria da prestação jurisdicional.

Mas a prestação jurisdicional não se faz apenas com o Juiz. A

mentalidade de conciliar, de solucionar o problema, deve estar presente

em todos os mais que atuam na Justiça, em particular os advogados.

Cada servidor da Justiça deve também integrar-se no projeto.

No dia-a-dia da vida judiciária é comum que os servidores novatos de

uma secretaria sejam colocados no balcão para atendimento às partes e

advogados. Como se essa fosse a tarefa menos importante da serventia.

Ledo engano, penso, porque é, através do contato direto com a parte, que

o servidor da serventia pode levar a paz ou a angústia, o consolo ou a

revolta. Os fatos podem ser recebidos de forma inteiramente diferente

segundo a forma como forem ditos. Numa mesma demanda duas pessoas

podem sair com posturas inteiramente diferentes: uma revoltada, outra

conformada. Não basta, prestar a atividade jurisdicional. É preciso fazê-la

compreendida pelos jurisdicionados.

Sem prejuízo, pois, repito, da sobrevivência do atual sistema, é preciso conversar mais, convencer mais e conciliar mais.

Mas não basta mudar o sistema. É preciso criar também uma nova mentalidade naqueles que atuam na justiça. As pessoas devem estar

voltadas para o ideal de solução de problemas, não de redução de processos. Processo é meio, vida humana é fim. É preciso que o profissional do direito esteja aberto para o novo, para a evolução do

mundo, que já não se coaduna com certos padrões e condutas ainda largamente utilizados.

Fica difícil, contudo, ao Magistrado, promover a efetiva realização da Justiça se o legislador não atualizar as nossas leis. O direito é vida, não é um instrumento teórico de discussão de teses, senão de efetiva realização

da justiça.

Por isso, voltar-se para o mundo atual, encarar a realidade de frente, é

dever do legislador.

Veja-se, por exemplo, o direito de família. Constate-se a realidade do

dia-a-dia. Casais de homossexuais, ascensão do cônjuge-mulher, maior liberdade na vida privada após a separação de fato, filhos havidos de prostitutas. Quantas questões não merecem ser repensadas e vistas à luz

da realidade. Afinal, o direito existe em função do homem. Na mudança dos paradigmas que regram o comportamento social o direito deve se ajustar, assentando-se noutros, que melhor traduzem o comportamento

social, sem postergar a segundo plano princípios morais de longa data conhecidos e aceitos.

2.41. Comunicação por propaganda e anúncios As propagandas e anúncios têm relevância no mundo do direito.

Especialmente no direito do consumidor o legislador dedicou-se ao tema, nos artigos 36 a 38 do Código do Consumidor, além de fazer sobre o

assunto alusões em outros dispositivos.

Preocupa-se o Código Consumeirista em vedar e punir a propaganda

enganosa ou abusiva, evitando, assim, que o consumidor incorra em erro

quanto ao produto que irá ser adquirido, a par de consagrar o mais amplo

direito à informação relativamente ao produto ou serviço e sua utilização.

O art. 30 do mesmo Código é expresso no sentido de que “Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer outra forma ou meio de comunicação com relação a produtos e

serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado”.

São comuns os casos de consumidores que reclamam, nos Juizados Especiais, quanto à oferta de produtos, cujo preço foi divulgado através de

impressos e, a final, não restaram respeitados na transação de compra e venda, objetivando o pagamento efetivo do preço da oferta.

A legislação eleitoral disciplina, ainda, a propaganda eleitoral, por ocasião das eleições, nos aspectos administrativo e penal, estabelecendo as penalidades a que se sujeitam os infratores, tudo objetivando a igualdade

de participação dos candidatos no pleito.

2.42. Redação de contratos

Rapidamente cuidamos da matéria no item 2.3.

Há contratos formulados verbalmente e, pois, se torna difícil a

interpretação da efetiva vontade das partes.

Além disso um pacto verbal impede uma série de cláusulas usuais no

contrato escrito. Assim, um contrato de locação de imóveis para fins

residenciais, por exemplo, formulado verbalmente, tem valor jurídico, mas

apresenta inúmeras conseqüências que fogem, inevitavelmente, ao alcance das

partes. O prazo da locação será indeterminado e o ITPU não poderá ser

transferido ao inquilino.

Aconselha-se, sempre, pois, a formulação do contrato escrito.

A ocupação de um imóvel de longa data, sem documento, tanto pode

ser a de um esbulhador, como pode resultar de um contrato. O ocupante,

nesta última hipótese, tanto pode ser um inquilino, quanto um

comodatário. É de todo conveniente, pois, documentar a situação, o que

previne sérias controvérsias.

Há contratos, como vimos, que podem ser formulados verbalmente,

como a locação.

Outros, no entanto, somente podem consubstanciar-se através da

forma escrita, como sói ocorrer com a fiança e a doação de bens que não

sejam de pequeno valor.

Finalmente, há contratos em que se exige a escritura pública (compra

e venda de bem imóvel de valor superior ao limite legal).

Os contratos escritos, de um modo geral, devem descrever tudo o que

seja lícito às partes disciplinar, com detalhes, clareza e objetividade.

Numa locação, por exemplo, além das cláusulas necessárias,

aconselha-se a descrição (laudo de vistoria) do imóvel no momento do

contrato, a fim de se verificar o seu estado e eventuais danos praticados

pelo inquilino por ocasião da sua entrega. Numa empreitada, deve-se

lançar o cronograma das obras a fim de que se possa acompanhar o

cumprimento do contrato, com todas as especificações de materiais a

serem utilizados.

A lei exige que os contratos escritos tenham duas testemunhas (Código

Civil, art. 135), exigência reafirmada na hipótese de o contrato ser utilizado

como título executivo extrajudicial, por força do que dispõe o art. 585, II,

do CPC.

No mandato não se cogita de testemunhas mas do reconhecimento de

firma do outorgante, para sua validade perante terceiros (Código Civil, art.

1.289, § 3º).

A redação do contrato deve ser clara, em estilo simples, com a

utilização de termos consagrados e usuais, evitando divergências por

ocasião do seu cumprimento. Expressões como correção monetária pelos

índices legais, por exemplo, não são aconselháveis. É mister especificar o

índice a ser utilizado.

Certa vez tivemos uma demanda judicial em que o cerne da questão repousava sobre a expressão obra concluída. Seria aquela fisicamente em condições de habitação ou aquela com habite-se e averbação regular no

Registro de Imóveis? A clareza é sempre proveitosa. A doutrina firma inúmeras regras para interpretação dos contratos, como

se pode encontrar nos tratadistas de direito civil. Segundo ORLANDO GOMES, citando A. von Thur, “Interpretar um contrato é, afinal, esclarecer o sentido dessas declarações e determinar o significado do acordo ou consenso”

(CONTRATOS, Forense, 13ª Ed., p. 198). O princípio fundamental, no entanto, em tema de interpretação de contratos, diz respeito à efetiva busca da intenção das partes, que

prevalece sobre o sentido literal da linguagem e faz nascer a teoria subjetiva.

A nível legislativo o Código Comercial Brasileiro contém regras de interpretação, em seus arts. 130 e 131.

ROBERTO POTHIER formulou quatorze regras de interpretação dos

contratos, que podem ser encontradas na obra (Manual Prático dos Contratos, Forense, 1ª Ed., pp. 96/97), de autoria de Jônatas Milhomens e Geraldo Magela Alves.

2.43. Comunicação na advocacia em causa própria Uma boa comunicação exige imparcialidade e isenção.

Se às vezes já se afigura difícil ao advogado manter isenção na

discussão da causa, quanto mais complicada é a situação daquele que

atua em causa própria.

Embora a pessoa inscrita como advogada na OAB possa atuar em

causa própria (art. 36, caput, CPC), é sempre recomendável que se faça

representar por colega, evitando, assim, os naturais impactos emocionais

decorrentes da discussão da causa.

O Código de Ética e Disciplina da OAB recomenda que, havendo

necessidade de arbitramento e cobrança judicial dos honorários

advocatícios, o advogado renuncie ao patrocínio da causa e se faça

representar por um colega (art. 43).

2.44. Bancos de dados: assentamentos

O art. 43 do Código de Defesa do Consumidor dispõe sobre bancos de

dados e cadastros de consumidores, estatuindo o direito do consumidor de

acesso a eles.

Constitui direito do credor, pois, em tese, lançar o nome do devedor

que não adimpliu com sua obrigação nesses bancos de dados, como,

igualmente, pode o devedor se insurgir contra a inscrição, se tiver motivos

relevantes para tanto, como, por exemplo, no caso de dívida paga.

O Código de Defesa do Consumidor exige que o devedor seja

cientificado do lançamento de seu nome no cadastro (art. 43, § 2º).

Mas toda empresa tem também seu banco privado de dados (que não tem

caráter público). Poderiam esses dados serem fornecidos a terceiros? A matéria não tem normatização legal dotada de clareza suficiente. O Código Penal, em seu art. 153, dispõe ser crime divulgar alguém, sem

justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa

produzir dano a outrem. Por outro turno, o art. 154 considera crime revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão da função, ministério, ofício

ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem.

2.45. Comunicação à distância

A estrutura tradicional de nosso direito negocial repousa, preponderantemente, na idéia de que o contrato se forma no contato físico das partes. É exemplo a escritura de compra e venda de imóvel assinada

no Cartório de Notas. O Código Civil disciplinou parcialmente a relação contratual à distância, inclusive o contrato epistolar, em seus arts. 1.080/1.086, que cuidam da

proposta e sua aceitação. Com efeito, nos contratos à distância, a manifestação de vontades nem

sempre é simultânea e, quando o é, surgem manifestas dificuldades de se comprovar a relação contratual. No mundo globalizado tende ao crescimento, contudo, a relação contratual

à distância, onde as pessoas compram sem ter que sair de dentro de suas casas, através da internet, do telefone ou do fax. Já tivemos casos em Juízo de acordos formulados com empresas de cartões de crédito via

telefônica. Inúmeros são os contratos, especialmente na relação de consumo, formulados por telefone, como a compra e venda.

Urge que a matéria seja regulamentada, a fim de que o direito possa ter o

instrumental necessário para conviver com essa nova realidade do mundo moderno.

Na comunicação virtual, outrossim, é possível conversar, ao mesmo tempo, com pessoas de diferentes países, se todos estiverem on line. O mesmo mecanismo acaba por permitir reuniões e porque não também contratos à

distância.