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Didática do Ensino da Língua: Concepções de Linguagem e Práticas Docente de Leitura e Escrita Didáctica de la Enseñanza de la Lengua: Concepciones de Lenguage y Prácticas de Enseñanza de Lectura y Escritura NOME DO AUTOR¹ RESUMO: Este trabalho tem por objetivo abordar os reflexos das Concepções de Linguagem na Didática do Ensino da Língua, mais especificamente, nas práticas docentes do ensino da leitura e da escrita no Brasil. Decorrente disso, pretende-se traçar, sob a ótica das teorias linguísticas, uma breve retrospectiva do ensino dessas competências linguísticas dos anos 50 até os dias atuais, focalizando os pressupostos teóricos e ideológicos que respaldaram tais práticas. PALAVRAS-CHAVE: Concepções de Linguagem; leitura; escrita. RESUMEN: Este trabajo tiene por objeto abordar los efectos de las concepciones del lenguaje en la enseñanza de la lengua, más específicamente, en las prácticas docentes de la enseñanza de la lectura y escritura en Brasil. Además, se pretende, hacer, basado en las teorías lingüísticas, um breve trayecto de la enseñanza de esas habilidades lingüísticas de los 50 años a el día de hoy, centrándose en los presupuestos teóricos y ideológicos que apoyaron estas prácticas. PALABRAS-CLAVE: Concepciones de lenguage; lectura; escritura. Introdução Consoante Bezerra (2010, p. 39), "tradicionalmente, o ensino de Língua Portuguesa no Brasil se volta para a exploração da Gramática Normativa, em sua perspectiva prescritiva (quando se impõe um conjunto de regras a ser

Concepções de Lingua e Práticas Docentes de Leitura e Escrita

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Didtica do Ensino da Lngua: Concepes de Linguagem e Prticas Docente de Leitura e Escrita

Didctica de la Enseanza de la Lengua: Concepciones de Lenguage y Prcticas de Enseanza de Lectura y Escritura

NOME DO AUTOR

RESUMO: Este trabalho tem por objetivo abordar os reflexos das Concepes de Linguagem na Didtica do Ensino da Lngua, mais especificamente, nas prticas docentes do ensino da leitura e da escrita no Brasil. Decorrente disso, pretende-se traar, sob a tica das teorias lingusticas, uma breve retrospectiva do ensino dessas competncias lingusticas dos anos 50 at os dias atuais, focalizando os pressupostos tericos e ideolgicos que respaldaram tais prticas.PALAVRAS-CHAVE: Concepes de Linguagem; leitura; escrita.

RESUMEN: Este trabajo tiene por objeto abordar los efectos de las concepciones del lenguaje en la enseanza de la lengua, ms especficamente, en las prcticas docentes de la enseanza de la lectura y escritura en Brasil. Adems, se pretende, hacer, basado en las teoras lingsticas, um breve trayecto de la enseanza de esas habilidades lingsticas de los 50 aos a el da de hoy, centrndose en los presupuestos tericos y ideolgicos que apoyaron estas prcticas.PALABRAS-CLAVE: Concepciones de lenguage; lectura; escritura.

Introduo

Consoante Bezerra (2010, p. 39), "tradicionalmente, o ensino de Lngua Portuguesa no Brasil se volta para a explorao da Gramtica Normativa, em sua perspectiva prescritiva (quando se impe um conjunto de regras a ser seguido)". Dentro dessa perspectiva, o ensino de Lngua Portuguesa, no Brasil, concedia primazia aos cnones estabelecidos/ impostos pela Gramtica Normativa, primando pelo padro culto da lngua [modelo homogneo, monoltico e uniforme]. Com isso, a Didtica do Ensino da Lngua Portuguesa focava na abordagem de exerccios de anlise e de classificao das nomenclaturas de uma gramtica sacralizada. Essa posio surge em decorrncia dos paradigmas tradicionais adotados pelo ensino de lngua no Brasil.Durante muito tempo, o modelo educacional adotado pelo processo de escolarizao do Portugus seguiu parmetros norteadores tradicionais. Em face disso, o ensino da leitura e da escrita estava diretamente vinculado s prticas tradicionais de escolarizao. A leitura e a escrita, com base nesse norte, se voltavam para uma perspectiva de codificao/ decodificao. Tais prticas estiveram presentes no mbito educacional durante muito tempo, fazendo com que o ensino dessas competncias lingusticas estivesse diretamente ligado aos compndios cannicos e prescritivos da Gramtica Normativa. Em funo desse contexto educativo e na defesa de um modelo sociointeracionista do ensino, em meados da dcada de 1980, a Didtica do Ensino da Lngua passou por radicais mudanas, vivenciando, assim, um intenso processo de reestruturao em seus parmetros norteadores (CARDOSO, 2003; SUASSUNA, 2009). Eclode grande diversidade de estudos das Cincias da Linguagem [Lingustica, mais especificamente, a Lingustica de Texto, a Anlise do Discurso, a Anlise da Conversao, a Etnolingustica, a Lingustica Cognitiva, a Psicolingustica, a Pragmtica e a Sociolingustica, conforme apontam Albuquerque (2006), Barbosa & Souza (2006), Cereja (2002), Geraldi (1984), Santos et al (2006), Silva et al (2011), Soares (1998) etc.], das Cincias Educativas [Pedagogia], das Cincias Psicolgicas [Psicologia, Psicologia Cognitiva etc.] e de outros campos de estudo [Filosofia e Sociologia], conforme demonstra Albuquerque (2006). Tendo como pano de fundo esse novo contexto paradigmtico, eclodem novos fundamentos lingusticos e tericos, que respaldam novas estratgias de ensino. Cita-se, primeiramente, o fato de surgir uma concepo de lngua enquanto atividade de cunho social, que se volta para uma perspectiva pragmtico-enunciativa. Menciona-se, tambm, o fato de essa nova concepo de lngua enunciativa ocasionar novas funes e papis sociais para os atores sociais que fazem parte da construo social do conhecimento (KOCH & ELIAS, 2006). Surge, assim, uma nova Didtica do Ensino da Lngua Portuguesa, acompanhada de novas prticas docentes de ensino da leitura e da escrita.

Nos ltimos 30 anos, surgiu uma ampla literatura na qual se discutiu o modo como vinha se processando o ensino de lngua materna no Brasil. Havia nestes trabalhos a preocupao de no apenas criticar as prticas de ensino de lngua portuguesa presentes na escola, mas sobretudo apontar questes de nvel conceitual e metodolgico na direo de uma nova forma de se conceber o ensino da leitura e da escrita. J na dcada de 1980 alguns trabalhos das reas da Lingstica e da Psicolingstica passaram a questionar a noo de ensino-aprendizagem de lngua escrita que concebia a lngua apenas como cdigo e, dessa forma, entendia a leitura apenas como decodificao e a escrita somente como produo grafomotriz. A linguagem deixava de ser encarada, pelo menos teoricamente, como mero contedo escolar e passa a ser entendida como processo de interlocuo. Nesta perspectiva, a lngua entendida enquanto produto da atividade constitutiva da linguagem, ou seja, ela se constitui na prpria interao entre os indivduos. Passou-se, assim, a prescrever que a aprendizagem da leitura e da escrita deveria ocorrer em condies concretas de produo textual (SANTOS, 2002, p. 30-31).

Em face da propagao dos ecos desses postulados, o ensino da leitura e da escrita vem passando por uma intensa mudana terica e metodolgica, rompendo com as prticas mecanicistas e tecnicistas (SANTOS, 2002; 2007), o que pe xeque as tendncias paradigmticas que preconizavam prticas tradicionais de escolarizao. Em virtude dos fundamentos lingusticos provenientes desses estudos, a leitura e a escrita passam a ser concebidas em perspectivas Dialgicas e Interativas, conforme evidenciam Koch & Elias (2006; 2009). Contudo, essas diferentes vises no surgem do acaso. Pelo contrrio, elas ocorrem por conta das Concepes de Linguagem que norteiam o ensino. Tomando-se por base os trabalhos de Albuquerque (2006), Barbosa & Souza (2006), Bezerra (2001; 2010), Geraldi (1984), Kleiman (2008; 2009), Koch (2002), Koch & Elias (2006; 2009), Rojo (2004), Santos (2002), Santos et al (2006), Soares (1998), Suassuna (2009), entre outros, este trabalho tem por objetivo abordar os reflexos das Concepes de Linguagem na Didtica do Ensino da Lngua Portuguesa, mais especificamente, nas prticas docentes de ensino da leitura e da escrita no Brasil. Decorrente disso, pretende-se, traar, sob a tica das teorias lingusticas, uma breve retrospectiva do ensino dessas competncias lingusticas dos anos 50 at os dias atuais, focalizando os pressupostos tericos e ideolgicos que respaldaram tais prticas.

A lingustica e o ensino de lngua portuguesa: ecos e reflexos da concepo dialgica da linguagem sobre as prticas de ensino

De acordo com Suassuna et al (2006, p.227), por um longo tempo, o ensino de Portugus centrou-se nas regras gramaticais que normatizam a variedade lingustica padro, apresentadas nas gramticas tradicionais, como modelo do bom uso da lngua. Diante dessa perspectiva, durante dcadas, o ensino de Lngua Portuguesa priorizou o ensino da Gramtica Normativa, focando na estrutura e, conseguintemente, em atividades com um fim em si mesmas. Ao centrar-se, preponderantemente, em exerccios de anlise/ classificao dos termos e das regras sacralizados (as) e impostos (as) pela Gramtica Normativa, deixava-se de lado ou em segunda posio o desenvolvimento de outras competncias lingusticas, como o caso da leitura e da oralidade. Destacava-se, com base nesse norte, a utilizao do texto como suporte didtico, isto , como pretexto para anlise e classificao dos compndios cannicos estabelecidos/ impostos pela gramtica, conforme aponta Kleiman (2008). Na fala de Albuquerque (2006, p. 11), a dcada de 80 assistiu a um amplo desenvolvimento de pesquisas na rea de Lngua Portuguesa. Pesquisadores de diferentes campos Psicologia, Histria, Sociologia, Pedagogia, etc. tomaram como temtica e objeto de estudo a leitura e a escrita buscando redefin las. Dentro desse contexto, o ensino de lngua vem, a partir dos anos de 1980, passando por profundas mudanas. Esse quadro proveniente de uma gama de estudos das Cincias da Linguagem [Lingusitica] e da Educao [Pedagogia]. Em virtude desses estudos e dessas pesquisas, surgem novos fundamentos e saberes especficos rea de Letras, que propiciam esclarecimentos acerca de diversos fenmenos lingusticos (FONSECA & FONSECA, 1977). Essas teorias lingusticas que compartilham de uma perspectiva de lngua pragmtico-enunciativa abalam os parmetros orientadores tradicionais. nesse cenrio que surgem novos paradigmas norteadores, que ocasionam novas prticas pedaggicas para o ensino de Lngua Portuguesa.

So difundidas, no Brasil, teorias construtivistas e sociointeracionistas de ensino/ aprendizagem e, em relao ao ensino da lngua especificamente, novas teorias desenvolvidas em diferentes campos - Lingustica, Sociolingustica, Psicolingustica, Pragmtica, Anlise do Discurso - levam a uma redefinio desse objeto. Sob influncia desses estudos, a lngua passa a ser vista como enunciao, discurso, no apenas como comunicao, incluindo as relaes da lngua com aqueles que a utilizam, com o contexto em que utilizada, com as condies sociais e histricas de sua utilizao. Essa concepo de lngua altera, em sua essncia, o ensino da leitura, agora vista como processo de interao autor/ texto/ leitor, em determinadas circunstncias de enunciao e no quadro das prticas socioculturais contemporneas de uso da escrita. (ALBUQUERQUE, 2006, p. 21)

Nessa conjectura, a partir da dcada de 80, deslocou-se o eixo do ensino voltado para a memorizao de regras e nomenclaturas da gramtica de prestgio (SANTOS, 2002, p. 30). Nesse contexto, deixa-se de lado o ensino reprodutivo, priorizando, assim, o ensino produtivo e, principalmente, interativo. Essa nova perspectiva representa uma quebra paradigmtica com os parmetros norteadores tradicionais, que centram - se, predominantemente, nos aspectos estruturais do ensino de lngua e no padro culto da lngua, o que constitua o dialeto de prestgio social da poca (SOARES, 1998). Em face da propagao desses postulados, surgem novos princpios que ocasionam mudanas significativas nas prticas de ensino. Primeiramente, destaca-se a ecloso das novas competncias lingusticas que devem ser desenvolvidas/ trabalhadas no contexto educacional. Alude-se, nesse ponto, aos Nveis de Ensino de Lngua Portuguesa [ou tambm Unidades Bsicas de Ensino, como denomina Geraldi (1984)], isto , a Leitura, a Produo de Texto, a Oralidade e a Anlise Lingustica. Surgem, agora, novos eixos para o ensino, trazendo tona uma perspectiva de equidade no espao dado ao estudo da lngua. O que est em sintonia com Suassuna (2006, p. 30), que esclarece esses eixos,

LEITURA deve permitir ao aluno construir os caminhos pelos quais ele atribui sentido ao dizer do outro.PRODUO DE TEXTOS ESCRITOS deve levar o aluno a expressar sua viso de mundo.LINGUAGEM ORAL deve dar margem a que o aluno participe, enquanto cidado, do debate social.ANLISE LINGUSTICA deve contribuir para que o aluno, refletindo sobre a lngua, busque e construa explicaes cada vez mais sistemticas e articuladas sobre seu funcionamento.

Todos esses novos paradigmas refletem os efeitos da Concepo Dialgica da Linguagem para o ensino de lngua. Em funo da considervel expanso dos estudos e das pesquisas lingusticas que ocorre anos 80, surge uma Concepo de Linguagem como Recurso de Interao Social. Esta, por sua vez, traa caminhos rumo a um ensino sociointeracionista e inovador, que concebe o educando como sujeito ativo na construo social do conhecimento. O que est em consonncia com Koch (2002) e Koch & Elias (2006) que ressaltam o fato de, em virtude da Concepo Dialgica da Linguagem, o sujeito passa a ser concebido enquanto ator e construtor social, que atribui e elabora sentido, assumindo, assim, uma postura ativa. Tal postura transcende a limitao perspectiva dos padres de reproduo oriunda da Concepo de Linguagem como Expresso do Pensamento e Instrumento de Comunicao (KOCH & ELIAS, 2006). No dizer de Santos (2002, p. 3), a partir de trabalhos no mbito da Lingustica Textual e Anlise do Discurso, os estudiosos da linguagem passaram o ensino de lngua sob novas bases. Percebe-se, assim, que, em face dos postulados das Cincias da Linguagem e, por conseguinte da Concepo Interativa da Linguagem, surgem no s modificaes na Didtica do Ensino da Lngua Portuguesa, mas, sobretudo, novas funes e novos papis sociais para os atores envolvidos nos processos de ensino e de aprendizagem de lngua.

Concepes de linguagem e o ensino da leitura no Brasil: uma breve retrospectiva sob a tica dos postulados das cincias da educao e da linguagem

Consoante Santos (2002, p. 1), "vrios trabalhos, sobretudo a partir de 1980, tm procurado discutir o modo como se vem processando o ensino de lngua escrita no Brasil e apontam para algumas questes de nvel conceitual e metodolgico". Dentro dessa perspectiva, a partir de meados da dcada de 1980, o cenrio educacional tem sido marcado pela proliferao de uma serie de estudos acerca do ensino da leitura e da escrita. Esses postulados produzem novos paradigmas educacionais. Tendo como pano de fundo esse quadro de modificaes nas bases norteadoras do ensino de lngua, eclodem novos pressupostos tericos, que respaldam novas estratgias de ensino.

Inmeras so as teorias que, de formas variadas e em nveis diversificados, influenciam a metodologia de ensino de Lngua Portuguesa. No entanto, nas duas ltimas dcadas do sculo XX e primeiros anos de sculo XXI, algumas tm se destacado: a teoria sociointeracionista vygotskyana de aprendizagem, as de letramento e as de texto/discurso, que possibilitam considerar aspectos cognitivos, sociopolticos, enunciativos e lingusticos envolvidos no processo de ensino/aprendizagem de uma lngua. (BEZERRA, 2010, p. 40)

Com base nesse novo contexto paradigmtico, as bases orientadoras do ensino adotam como objeto uma perspectiva sociointeracionista e dialgica da lngua. E, na defesa desse novo modelo, propaga-se uma intensa produo de autores provenientes de diversos campos de estudo. nesse cenrio que se iniciam as mudanas no ensino de Lngua Portuguesa. Surge, agora, uma nova Didtica do Ensino da Lngua Portuguesa, transcendendo as atividades com um fim em si prprias e, por conseguinte, ocasionando o redimensionamento do ensino da leitura e da escrita. Essas diversificadas prticas pedaggicas surgem em funo das Concepes de Linguagem que norteiam o ensino. Ao fazer um breve percurso histrico das prticas de ensino da leitura e da escrita no Brasil, surgem trs concepes que respaldaram o ensino dessas competncias lingusticas ao longos dos anos. Para Koch (2002) e Koch & Elias (2006), cada uma dessas concepes preconiza um tipo de enfoque/ tratamento dado s habilidades de leitura e escrita e, acima de tudo, um papel atribudo ao leitor/ produtor de texto [conseguintemente, ao discente] (KOCH, 2002; KOCH & ELIAS, 2006).A primeira concepo a de Linguagem como Expresso do Pensamento. Alguns autores, como o caso de Barbosa & Souza (2006), Bezerra (2001; 2010), Santos et al (2006), Silva et al (2011), Soares (1998), entre outros, ressaltam o fato de essa concepo ter norteado o ensino da leitura e da escrita at meados dos anos 50. Ela tem como fundamentao terica a Gramtica Tradicional. Nesse ponto, alude-se aos estudos tradicionais da Gramtica Grega, abrangendo/ englobando, tambm, os postulados latinos, medievais e modernos dessa rea de investigao (CARDOSO, 2003). A linguagem, luz dessa concepo, assume a condio de mecanismo de exteriorizao e materializao do pensamento, o que, por sua vez, articula pensamento e linguagem. O conceito de expressar, exteriorizar e materializar o pensamento estava diretamente atrelado ao ato de lanar mo das normas da Gramtica Normativa, focando, sobretudo, nos aspectos concernentes Morfologia/ Sintaxe. Dito de outra forma, a articulao do pensamento linguagem e, por conseguinte, materializao deste por meio de ideias estava diretamente associada utilizao incondicional das regras de uma gramtica sacralizada pela tradio.

Um dos objetivos dos gramticos, naquela poca, passa a ser, ento, garantir o patrimnio cultural grego atravs do zelo pela cultura e lngua grega consideradas mais puras e elevadas. Cabia, portanto, aos gramticos oferecerem os padres da linguagem presentes nas obras consideradas de excelncia em contraste com a linguagem corrente utilizada pelos brbaros. , portanto, essa concepo de gramtica que permite conhecer o padro a ser seguido no uso da lngua, que a cultura ocidental herdou e seguida pelo currculo tradicional. De acordo com esta forma de compreenso da gramtica e da boa escrita, a aprendizagem da lngua consiste na arte do bem falar e bem escrever, ou seja, usar corretamente a gramtica. (SANTOS et al, 2006, 13) De acordo com Soares (1998, p. 54), a funo do ensino da Lngua Portuguesa era, assim, fundamentalmente, levar ao conhecimento, talvez mesmo apenas ao reconhecimento, das normas e regras de funcionamento do dialeto de prestgio: ensino da gramtica. Nessa perspectiva, o ensino de Lngua Portuguesa adotou como objeto de ensino um modelo prescritivo da lngua (SUASSUNA, 2009), concedendo primazia abordagem das nomenclaturas, ou melhor, dos compndios cannicos ditados/ impostos pela Gramtica Normativa. Nessa conjectura, o modelo era, portanto, o da lngua considerada padro, encontrada nas grandes obras clssicas e descrita nas gramticas (SANTOS et al, 2006, p. 13). Em virtude disso, o ensino da leitura e da escrita nas instituies de ensino brasileiras se voltava aos fatores ligados s colocao, concordncia e regncia verbo-nominal, morfossintaxe, pontuao etc. (KOCH & ELIAS, 2009), priorizando, assim, a norma culta da lngua. O que est em consonncia com Koch & Elias (2009, p. 32-33),

Quanto s regras da gramtica, bem, houve um tempo em que era comum recomendar aos alunos baterias e baterias de exerccios sobre o uso de sinais de pontuao, concordncia, regncia, colocao pronominal, dentre outros tpicos, esperando que o aluno exercitasse em frases as regras gramaticais e depois transferisse esse conhecimento para a leitura e para a produo de texto. Ah! Poderia haver, sim, alguns desvios em relao aos usos das regras, mas isso s era visto com bons olhos apenas em escritas de autores j consagrados. Dito de outro modo, s aqueles que conheciam bem as regras da lngua poderiam alter-las. Aos demais, cabia apenas seguir o que era preconizado nas gramticas, seguir modelos.

Esse modelo terico-metodolgico alava o ensino condio de reproduo e o aluno, por conseguinte, a um papel passivo que se resumia ao ato de reproduzir as escrita desses consagrados/ renomados autores, com o propsito de alcanar esse padro lingustico de intenso prestgio social. Para realizar tal faceta, as prticas pedaggicas presentes no processo de escolarizao brasileiro lanavam mo dos textos literrios [nica variedade textual presente nos bancos escolares, conforme demonstram Barbosa & Souza (2006), Bezerra (2001; 2010), Santos et al (2006) e Soares (1998)], por meio das Antologias, isto , colees de textos literrios com valor semelhante aos livros didticos presentes no contexto educacional atual. E, a partir dos gneros textuais oriundos do campo literrio, ocorria o ensino da leitura e da escrita. Diante desse quando, eclode uma prtica, hoje, conceituada por muitos tericos da Lingustica Aplicada e da Pedagogia como Texto como Pretexto, ou seja, o uso do texto enquanto suporte didtico para a realizao de atividades lingusticas de identificao, localizao, reconhecimento, anlise e classificao de estruturas da Gramtica Normativa. O que est em sintonia com Kleiman (2008, p. 17) que conceitua tal prtica como o Texto como conjunto de elementos gramaticais, por intermdio da qual o professor utiliza o texto para desenvolver uma srie de atividades gramaticais, analisando, para isso, a lngua enquanto conjunto de classes e funes gramaticais, frases e oraes (KLEIMAN, 2008, p. 17). Dentro dessa viso tradicional de ensino, atribudo ao texto o papel de produto lgico do pensamento (representao mental) do autor, nada mais cabendo ao leitor se no captar essa representao mental, juntamente, com as intenes (psicolgicas) do produtor, exercendo, pois, um papel passivo (KOCH & ELIAS, 2006, p. 10). O ensino da leitura assume, nessa perspectiva, uma postura de reproduo das falas e dos dizeres dos autores de renome da poca, destacando-se, em especial, os autores literrios brasileiros e portugueses, conforme evidencia Soares (1998). Tal postura o que Koch & Elias (2006) classificam como Foco no Autor, por meio da qual a leitura alada condio de atividade de captao de idias do autor. O foco da ateno , pois, o autor e suas intenes, e o sentido est centrado no autor, bastando to somente ao leitor captar essas intenes (KOCH & ELIAS, 2006, p. 10). E, diante dessa acepo, o leitor, durante o decorrer do ato da leitura, abdica da elaborao/ produo de sentido, priorizando a reproduo dos discursos dos autores consagrados pela tradio literria. Contudo, essas prticas metodolgicas discutidas at o presente momento no so as nicas que surgem em virtude da Concepo de Linguagem como Representao do Pensamento. Em face dessa concepo, o ensino da leitura, tambm, se voltava para aspectos fontico-fonolgicos. Em outras palavras, uma leitura diretamente ligada oralidade e, por conseguinte, representao grfica e sonora [grafia, padres entoacionais, pontuao e pronncia], conforme ressaltam Kleiman (2008) e Santos (2002). Em vista disso, a prtica docente, no que concerne leitura, concedia primazia aos atos de mensurar as capacidades relativas pontuao, pronncia e aos padres de entoao da voz dos alunos (KLEIMAN, 2008). Esse posicionamento didtico o que Kleiman (2008, p. 21) define como Leitura como Avaliao [ou tambm Leitura em Voz Alta]. A escrita, ainda amparada por essa concepo, tambm foi elencada condio de atividade de cunho de reproduo. Segundo Santos et al (2006, p. 15) o texto visto como um conjunto de unidades lingusticas (palavras, frases, perodos) atravs do qual se pode expressar claramente um pensamento. Dentro desse contexto, a escrita foi norteada por uma concepo puramente normativa, priorizando aspectos gramaticais [ortogrficos, lxicos, morfolgicos, sintticos etc.]. Nesse contexto, percebe-se que, tendo como base de sustentao a Concepo de Linguagem como Expresso do Pensamento, o ensino da lngua e, especificamente, da escrita deve iniciar pela apresentao da gramtica, cujo domnio conduzir produo escrita (SANTOS et al, 2006, 13). Em funo do modelo metodolgico preconizado por essa concepo, o foco do ensino da escrita era as questes ortogrficas, lexicais, morfolgicas e sintticas, elegendo esses aspectos/ fatores enquanto nicos critrios de avaliao, conforme postula Suassuna (2009). Alm disso, essa autora sinaliza o fato de que o ensino dessa competncia lingustica pautava-se em trs etapas: assimilao da nomenclatura gramatical, autocontrole gramatical e caracterizao do certo e do errado (SUASSUNA, 2009, p. 42). Isso , por conseguinte, exclua da metodologia de ensino da escrita, inmeras questes internas do texto, como, a progresso, a referenciao, a amarrao/ articulao entre as frases, a argumentatividade etc. Porm, essa concepo no se limita a fatores puramente lingusticos, mas tambm engloba aspectos poltico-ideolgicos [ou tambm extralingusticos], conforme ressaltam Bezerra (2010) e Soares (1998). Nessa poca, o acesso ao processo de escolarizao se dava por intermdio da classe social. A escola voltava-se, exclusivamente, para as classes mais favorecidas economicamente [camadas abastadas], deixando margem ou de lado a grande maior parte da populao brasileira (BARBOSA & SOUZA, 2006; BEZERRA, 2010; SOARES, 1998). Nessa linha de pensamento, a escola e os processos de ensino e de aprendizagem fornecidos por essa instituio asseguravam a ordem [estrutura social] vigente e, acima de tudo, os privilgios que gozavam alguns segmentos sociais, conforme evidencia Soares (1998).A segunda concepo a de Linguagem como Instrumento de Comunicao. Algumas autoras, tais como: Barbosa & Souza (2006), Bezerra (2001; 2010), Santos et al (2006), Silva et al (2011), Soares (1998), entre outros, sinalizam o fato de tal concepo ter orientado o ensino da leitura e da escrita a partir de meados dos anos 60. Dito de outra maneira, essa concepo surge na dcada de 1960. Todavia, ela se intensifica, difundindo-se e disseminando-se ainda mais na dcada posterior. Ela tem como base de respaldo os estudos da Lingustica Estruturalista e os pressupostos tericos da Teoria da Comunicao [ou Teoria da Informao]. Nesse ponto, remete-se, respectivamente, s teorias elaboradas por Saussure [Estudos Estruturalistas] que concebia a lngua como sistema, focando, sobretudo, na estrutura do sistema lingustico e nas teorias formuladas por Jakobson que concebia a lngua como cdigo, focando, assim, na abordagem dos elementos da comunicao [emissor, receptor, referente, canal, cdigo, mensagem]. Ainda, no que tange s bases norteadoras da Concepo de Linguagem como Instrumento de Comunicao, destacam-se os pressupostos tericos tecnicistas e, por conseguinte, de cunho behaviorista. Alude-se, nesse ponto, ao Behaviorismo, ou seja, teoria dos postulados da Psicologia elaborada por Watson, que se dedica aos estudos que tm como interferir no comportamento humano, amparando-se internalizao de hbitos e prticas]. Apesar de amparar-se em novos princpios tericos de sustentao, essa concepo ainda preconiza um ensino e, conseguintemente, prticas metodolgicas orientadas por uma pedagogia centrada na modalidade lingustica supostamente homognea das gramticas (SUASSUNA, 2009, p. 41). Partindo desse pressuposto, o ensino da leitura e da escrita ainda se voltam para uma perspectiva de cunho normativo, pautando-se na articulao entre unidades menores/ maiores [palavras, frases e perodos] e na trade cannica que predominou o processo de escolarizao brasileiro nessa poca [Descrio, Dissertao e Narrao], conforme sinalizam Bezerra (2001) e Santos et al (2006).

Embora os defensores da nova legislao propagassem a introduo de novos elementos no processo de ensino-aprendizagem da lngua, no se observa um completo rompimento com a viso de lngua e de seu ensino at ento efetuadas pela escola. Para as propostas curriculares elaboradas neste perodo, escrever , antes de tudo, uma questo de conhecimento lingstico com ateno focalizada no vocabulrio e na sintaxe. Alm disso, o desenvolvimento da escrita continua sendo visto como resultado da prtica de imitao de modelos de boa escrita. (SANTOS et al, 2006, 13-14)

luz da Concepo de Linguagem como Instrumento de Comunicao, o ensino de lngua tambm era alado a uma perspectiva de reproduo e ao discente, por conseguinte, era elencado um papel passivo que se resumia ao de reproduzir modelos e padres pr-estabelecidos. Em outras palavras, o ensino de lngua e, conseguintemente, o ensino das competncias lingusticas da leitura e da escrita, diante desse modelo, estavam intimamente ligadas prtica de treino de habilidades de leitura (ALBUQUERQUE, 2006; CARDOSO, 2003). O objetivo dessa prtica pedaggica era levar os discentes a memorizar e, principalmente, a reproduzir incondicionalmente no s as estratgias de codificao/ decodificao como tambm as nomenclaturas sacralizadas pela Gramtica Normativa. Nessa tica, essa concepo preconizava uma perspectiva de transmisso/ identificao de estruturas apresentadas na superfcie do texto. nesse cenrio que surgem atividades didticas, ou melhor, exerccios que preconizavam um modelo a ser seguido incondicionalmente. Aliava-se, com isso, um codificador, um decodificado [ambos exercendo papis especficos] e uma mensagem que deveria ser decodificada, a fim de evidenciar a aprendizagem do aluno. Tudo isso reflete os ecos e os traos dos paradigmas tecnicistas.Ainda, nessa poca, surgem os Livros Didticos de Lngua Portuguesa presentes nos dias atuais (BEZERRA, 2001). Eles ainda no possuam a estruturao atual, isto , eles ainda no tinham a estrutura organizacional e de contedos presentes nos manuais didticos presentes no mbito educacional deste sculo. Contudo, em face dos fundamentos provenientes dessa concepo, em meados da dcada de 1970, a organizao estrutural dos livros didticos comea a passar por inmeras alteraes/ modificaes, no que diz respeito seleo textual (BEZERRA, 2001; 2010). nesse contexto que as prticas pedaggicas presentes no processo de escolarizao brasileiro passam a se utilizar no s dos textos literrios, mas tambm de uma incipiente diversidade/ seleo textual [as Entrevistas, as Histrias em Quadrinhos - HQs, as Notcias, as Propagandas, as Reportagens e as Tirinhas], conforme sinaliza Bezerra (2001; 2010). Embora tenha surgido essa incipiente seleo textual, o enfoque/ tratamento dado a esses gneros ainda no estava voltado para os aspectos lingustico-discursivos e cognitivos. Pelo contrrio, o foco do ensino, diante desse quadro terico-metodolgico, eram as habilidades de leitura [ou melhor, treino de habilidades], que deveriam ser reproduzidas em face de todos os textos visando identificar a mensagem exposta na superfcie do texto ou classificar estruturas.Dentro dessa viso, elencado ao texto o papel de simples produto da codificao de um emissor a ser decodificado pelo leitor/ ouvinte, bastando a este, para tanto, o conhecimento do cdigo lingustico utilizado (KOCH & ELIAS, 2006, p. 10). O ensino da leitura assume, dessa forma, uma postura didtica que primava pela decodificao e pela representao de signos, em detrimento da construo e da elaborao de sentidos a partir do texto. Tendo como base de fundamentao os princpios dessa concepo, o foco do ensino dessa competncia lingustica se volta para a identificao e extrao de mensagens do texto (BARBOSA & SOUZA, 2006; KLEIMAN, 2008), a partir de atividades que solicitavam respostas de localizao [localizadoras], por meio das quais o aluno limitava-se ao ato de localizar pequenos trechos de textos e, sobretudo, reproduzi-los na ntegra. Ou seja, tinha-se uma leitura que estava voltada representao de signos e smbolos apenas (SANTOS, 2002; SANTOS, 2007). Tal posio seria o que Koch & Elias conceituam como Foco no Texto, por meio da qual a leitura alada condio de atividade que exige do leitor o Foco no Texto, em sua linearidade, uma vez que tudo est dito no dito (KOCH & ELIAS, 2006, p. 10). Ou, tambm, o que Kleiman (2008, p. 18) classifica como o Texto como Repositrio de Mensagens e Informaes, atividade por meio da qual atribudo ao texto o papel de depsito de informaes, baseando-se na crena de que o papel do leitor consiste em apenas extrair essas informaes (p. 18). Partindo desse pressuposto, o objeto de ensino da leitura, nas instituies escolares brasileiras, era o ato de identificar informaes e mensagens, bem como as caractersticas estruturais e organizacionais dos gneros textuais presentes nos processos de ensino e de aprendizagem [ainda que incipientes]. Para tanto, as atividades didticas de leitura presentes no processo de escolarizao brasileiro envolviam um locutor, um interlocutor e uma mensagem exposta por intermdio de signos/ smbolos. Tudo isso amparado por uma perspectiva de repetio e reproduo de cunho tecnicista [conseguintemente, dos pressupostos do Behaviorismo].A escrita, tambm, assume, luz dos ecos e traos da Concepo de Linguagem como Instrumento de Comunicao, uma condio de atividade de cunho de reproduo. Primeiro, destaca-se o fato de o ensino dessa competncia lingustica primar por prticas norteadas pelos compndios cannicos estabelecidos pela Gramtica Normativa. Limitando, desse modo, o ato de escrever elaborao de um texto escrito sobre um tema proposto (ou imposto), em que o aluno deveria por em prtica as regras gramaticais aprendidas num momento anterior (SUASSUNA, 2009, p. 4). Segundo, focaliza-se o fato de as prticas pedaggicas do ensino dessa competncia lingustica priorizarem a codificao/ decodificao de signos e smbolos [representao de palavras]. No dizer de Koch & Elias (2009, p. 33), o texto visto como simples produto de uma codificao realizada pelo escritor a ser decodificada pelo leitor, bastando a ambos, para tanto, o conhecimento do cdigo lingustico utilizado. Nessa conjectura, o ensino da escrita, com base nesse contexto paradigmtico, focava nas tcnicas de escrita/ redao e nas caractersticas estruturais dos gneros textuais que deveriam ser reproduzidas durante o ato da escrita, independentemente da temtica e da situao comunicativa. Nesse sentido, a Didtica do Ensino da Lngua Portuguesa era alada condio de atividade de cunho reproduo, a partir de um intenso treinamento de identificao/ repetio de caractersticas e habilidades.Assim como a concepo anterior, esta tambm est diretamente atrelada a fatores polticos e ideolgicos (SOARES, 1998). Nessa poca, a conjuntura poltica brasileira tinha como objetivo desenvolver a industrializao. Contudo, para realizar tal faceta, havia a necessidade de mo de obra qualificada. Mas, como um pas como Brasil iria possuir essa mo de obra qualificada, se o acesso educao ainda centrava-se nas camadas abastadas da sociedade, excluindo, assim, a maior parte da populao do processo de escolarizao? nesse contexto que a escola surge como instituio que ir fornecer a qualificao necessria para as camadas menos favorecidas da sociedade e, consequentemente, prepar-las para o mercado de trabalho. Nessa direo, a escola abre suas portas para os segmentos minoritrios e pobres da populao brasileira. Contudo, o ensino fornecido pelas instituies escolares se volta para perspectivas instrumentais. Em outras palavras, no ocorria um ensino de qualidade, mas um ensino que tinha como pretenso propiciar aos alunos habilidades de leitura e escrita [codificao e decodificao]. O que, por sua vez, articulava o trabalho e o ensino.A terceira concepo a de Linguagem como Recurso de Interao Social [Interativa ou Dialgica (KOCH & ELIAS, 2006)]. Tal concepo surge em meados da dcada de 1980, tendo como base de fundamentao os estudos da Lingustica da Enunciao [Lingustica de Texto, Anlise do Discurso, Anlise da Conversao, Etnolingustica, Lingustica Cognitiva, Psicolingustica, Pragmtica, Sociolingustica etc.]. Aliado a essas subreas dos Estudos das Cincias da Linguagem, ela tambm se fundamenta em estudos e pesquisas das Cincias da Educao [Pedagogia] e das Cincias Psicolgicas [Psicologia e Psicolingustica], como evidencia Albuquerque (2006).

Uma proposta de mudana na forma de compreender a linguagem e seu processo de aprendizagem iniciou-se de fato a partir da dcada de 80 com a iniciativa de pesquisadores de algumas universidades do pas, de educadores e de algumas Secretarias de Educao dos Estados. Pretendia-se superar o impasse desencadeado pela prtica educativa anterior que vinha dominando nossas escolas desde o incio dos anos 70. Um ensino de carter essencialista, conteudista, tecnicista e limitado descontinuidade e fragmentariedade dos livros didticos - resumindo-se a tcnicas de redao, exerccio estruturais, treinamento de habilidades de leitura - dominava no s as escolas como tambm o processo de formao de professores. (CARDOSO, 2003, p. 9)

Em face desses postulados lingusticos, educativos e psicolgicos, ocorre uma quebra paradigmtica da concepo de lngua enquanto estrutura/ sistema, rompendo/ quebrando com uma viso homognea e monoltica. Tendo como pano de fundo esse contexto, eclode uma viso inovadora para o ensino de Lngua Portuguesa. Cita-se, primeiramente, a ecloso de uma nova concepo de lngua pautada em uma perspectiva de heterogeneidade, plasticidade e multiplicidade, voltando-se para uma perspectiva pragmtico-enunciativa que concede primazia interao. nesse contexto que surge uma proposta de reestruturao no ensino/ aprendizagem de Lngua Portuguesa (CARDOSO, 2003, p. 11). Rompe-se, assim, com as prticas tradicionais de escolarizao, que priorizavam a abordagem dos contedos gramaticais por meio de exerccios enfadonhos, distanciados da produo/ leitura de textos (ALBUQUERQUE, 2006, p. 26). No dizer de Santos et al (2006, p. 27), com as discusses sobre o ensino de lngua a partir de meados dos anos 80 do sculo XX, o texto passou a ser objeto de ensino nas salas de aula. luz desses novos paradigmas, o texto alado condio de instrumento, unidade de ensino e sentido (BEZERRA, 2010; CARDOSO, 2003; CEREJA, 2002). nesse cenrio que eclode uma nova viso educacional, novos contedos e novas estratgias de ensino. Esses novos paradigmas tm sido adotados pelos documentos oficiais que norteiam o ensino de lngua no Brasil [PCNs, OCNs etc.] e, por conseguinte, por diversos manuais didticos [Gramticas e Livros Escolares]. Eclode, dessa maneira, a diversidade/ multiplicidade textual presente nos manuais didticos atuais (BEZERRA, 2001; 2010).Os Parmetros Curriculares Nacionais - PCNs, na viso de Cereja (2002), reforam ainda mais a postura de trabalhar os contedos em uma perspectiva contextualizada, elegendo o texto enquanto objeto/ unidade de ensino (BEZERRA, 2010; CARDOSO, 2003; SANTOS, 2007). Tal postura surge em decorrncia dos estudos da Lingustica Enunciativa, que se volta para os aspectos/ fatores lingustico-discursivos da lngua, atentando para os aspectos lingusticos e extralingusticos. Destaca-se, ainda, a perspectiva adotada por Cereja (2002), em que o texto constitui a unidade de sentido. Dito de outra forma, um trabalho que examine que modo a lngua utilizada em todas as suas dimenses (fontica, morfossinttica, semntica, estilstica) para a construo do sentido ou dos sentidos do texto (CEREJA, 2002, p. 156). O que, por sua vez, contribui substancialmente para o redimensionamentos/ reestruturao do ensino de Lngua Portuguesa (CARDOSO, 2003; SUASSUNA, 2009). Esse novo ensino assume, ento, uma perspectiva sociointeracionista e pragmtico-enunciativa, adotando como objeto de ensino os fenmenos lingusticos, interativos, textual-discursivos e cognitivos. O ensino de Lngua Portuguesa se volta, com base nesse norte, para a prtica da anlise lingustica, rompendo, desse modo, com postura didtica que primava pela abordagem de contedos gramaticais com um fim em si mesmos, por meio de exerccio enfadonhos e repetitivos, apartados da produo/ leitura de textos (ALBUQUERQUE, 2006, p. 27).Com base na Concepo Dialgica da Linguagem, eclode uma nova concepo de leitura enquanto processo interativo entre autor e leitor, mediado pelo texto, envolvendo conhecimentos (de mundo, de lngua) por parte do leitor, para que haja compreenso (SANTOS, 2002, p. 3). Diante dessa acepo, a leitura assume, com base nesse modelo terico enunciativo, assume a condio de ato de elaborao/ produo de sentido, pautado em perspectivas lingusticas, cognitivas, dialgicas, interativas e sociais (KOCH, 2002; KOCH & ELIAS, 2006). Dito de outro modo, surge, agora, uma nova concepo de leitura pautada em uma perspectiva enunciativa, sociointeracionista e textual-interativa, elencando a essa competncia lingustica o papel/ funo social de atribuir / elaborar de significados/ significao, a partir do texto. A escrita, nesse novo contexto paradigmtico, tambm assume uma perspectiva Dialgica e Interativa, sendo alada condio de Produo de Texto, conforme ressaltam Koch & Elias (2009). Contudo, a mudana que surge em funo desses novos fundamentos que ambas [leitura e escrita], agora, trabalham articuladas, em uma perspectiva de juno de fatores. Em outras palavras, o produtor do texto [ou enunciador, conforme conceitua Koch (2002)], ao elaborar/ produzir o texto, leva em conta o leitor [ou co-enunciador (KOCH, 2002)], lanando mo de diversas estratgias, marcas e pistas textuais que levam esse co-enunciador a refletir acerca dos recursos lingusticos utilizados durante o decorrer do ato da escrita, construindo/ produzindo efeitos de sentido e, por conseguinte, chegando ao seu propsito comunicativo (LINS & LUNA, 2002). Rompe-se, assim, com a prtica da imitao de modelos de boa escrita (SANTOS et al, 2006, p. 14).Destaca-se, sobretudo, acerca da Concepo de Linguagem como Instrumento de Interao Social, o fato de, a partir dos seus pressupostos tericos, eclodirem novos papis/ funes sociais para os atores que compem os processos de ensino e de aprendizagem. Autor e leitor, dentro dessa viso dialgica, assumem a condio de sujeitos ativos na construo social do conhecimento e, em especial, atores/ construtores sociais, conforme evidenciam Koch (2002) e Koch & Elias (2006). Partindo desse pressuposto, o aluno deixa de ser concebido enquanto um sujeito passivo, que recebe as instrues de um professor que supostamente sabe o contedo a ser ensinado e, como num passe de mgica, transfere-lhe esse saber (XAVIER, 2007, p. 4). Difunde-se, assim, uma nova perspectiva de aprendizagem, que se volta para o desenvolvimento da autonomia do discente.Teceu-se, neste tpico, um texto que lana mo de argumentos que traam, sob o olhar das Cincias da Linguagem e da Educao, um breve resgate histrico da trajetria da Didtica do Ensino da Lngua Portuguesa, em especfico, do ensino da leitura e da escrita. Primou-se, sobretudo, pela abordagem das bases e dos fundamentos norteadores [lingusticos e ideolgicos] que guiaram a conduo dessas prticas. Porm, no se pode deixar de destacar que, ainda que, nas ltimas trs dcadas, o ensino [em uma perspectiva geral] tenha passado por inmeras modificaes de teor terico e, sobretudo, metodolgico, as prticas tradicionais de escolarizao do Portugus ainda se fazem presentes em muitas prticas pedaggicas (ALBUQUERQUE, 2006; SANTOS, 2002).

Consideraes finais

Diante dos estudos realizados, percebeu-se que a Didtica do Ensino da Lngua Portuguesa, mais especificamente, as prticas pedaggicas do ensino da leitura e da escrita, no Brasil, dividem-se em duas posies distintas e opostas (BEZERRA, 2001). Uma, guiada pelas Concepes de Linguagem como Expresso do Pensamento e como Instrumento de Comunicao, pautando-se/ respaldando-se, assim, em modelos tericos tradicionais advindos das abordagens formalistas das lnguas (MARTELOTTA, 2008), o que, por conseguinte, alava o ensino dessas competncias lingusticas uma perspectiva de reproduo, conforme demonstram Koch & Elias (2006; 2009). Outra, norteada pela Concepo Dialgica da Linguagem [Recurso de Interao Social ou Interativa] que se volta para uma perspectiva de lngua enquanto atividade de cunho/ teor social e que concede primazia interlocuo (SANTOS, 2002). Perspectiva esta proveniente dos Estudos da Lingustica da Enunciao [remete-se, nesse ponto, s correntes de estudo da lngua que adotam a concepo de linguagem como processo de interao (CUNHA, 1999, p, 45)]. A leitura e a escrita, com base nessa perspectiva, se voltam para uma perspectiva pragmtico-enunciativa e, sobretudo, textual-interativa que prima pela construo/ elaborao de sentido (KOCH & ELIAS, 2006; 2009). Ou seja, a interao passa a ser o elemento que conduz os processos de ensino e de aprendizagem dessas competncias lingusticas.Todos esses pressupostos tericos apresentados neste texto permitem no s compreender o percurso histrico das prticas pedaggicas do ensino da leitura e da escrita presentes no processo de escolarizao do Portugus. Mas, acima de tudo, eles permitem perceber os fundamentos tericos, lingusticos e ideolgicos que orientaram tais prticas. Nesse sentido, foi possvel perceber no s os ecos e os traos das Concepes de Linguagem na Didtica do Ensino da Lngua Portuguesa [isto , a articulao dessas concepes com a prtica docente do ensino dessas competncias lingusticas no processo de escolarizao brasileiro ao longo dos anos], mas, sobretudo, a relao mtua entre Estudos das Cincias da Linguagem, das Cincias da Educao, das Cincias Psicolgicas e de outros campos de investigao [postulados filosficos e sociolgicos] e as mudanas no ensino de Lngua Portuguesa, o que, por sua vez, ocasionou o redimensionamento/ reestruturao do ensino (CARDOSO, 2003; SUASSUNA, 2009).

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