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Pesquisa FAPESP - Ed. 50
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ENCARTE ESPECIAL: PATENTES
UMA PUBLICA~AO MENIAL DA fUNDA~AO DE AMPARO À PEIQUIIA DO EITADO DE IÃO PAULO
8 FAPESP está implantando mecanismos de patenteamento dos resultados das pesquisas e o licenciamento de tecnologia para empresas. No encarte especial, veja as propostas de especialistas
22 Descobertas a respeito da estrutura do fungo Paracoccidioides brasiliensis acenam com tratamento precoce de uma micose tipicamente tropical
Capa: Hélio de Almeida
16 Pesquisadores de São Paulo concluem
o seqüenciamento do genoma da Xylella fastidiosa, primeiro fitopatógeno seqüenciado em todo o mundo. Isto coloca
o Brasil na liderança científica neste segmento da genômica
EDITORIAL
MEMORIAS
OPINIÃO
28 Estudos comprovam a baixa qÚalidade das águas nas propriedades rurais produtoras de leite
5 6 7
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLOGICA 8 CIÊNCIA 16 TECNOLOGIA 34 HUMANIDADES 41 LIVROS 48 LANÇAMENTOS 49 ARTE FINAL 50
34 A LaserTools, empresa com projeto aprovado no PIPE, amplia o uso industrial do laser e presta serviços de corte, gravação e estampagem metálicas
44 Pesquisadores da FAU/USP fazem amplo estudo do paisagismo brasileiro, pesquisando os projetos de praças, parques e calçadões em 35 cidades do País
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I fEVEREIRO DE 2000 . 3
PESQUISA FAPESP E UMA PUBLICAÇÃO MENSAL
DA FUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO
CONSELHO SUPERIOR PROf DR. CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ
PRESIDENTE
PROF. DR. PAULO EDUARDO DE ABREU MACHADO VICE-PRESIDENTE
PROF. DR.ADILSON AVANSI DE ABREU PROF. DR.ALAIN FLORENT STEMPFER
PROF. DR. ANTÓNIO MANOEL DOS SANTOS SILVA PROF. DR. CELSO DE BARROS GOMES
DR. FERNANDO VASCO LEÇA DO NASCIMENTO PROF. DR. FLÀVIO FAVA DE MORAES
PROF. DR.JOSÉJOBSON DE A ARRUDA PROf DR. MAURÍCIO PRATES DE CAMPOS FILHO
DR. MOHAMED KHEDER ZEYN PROF. DR. RUY LAURENTI
CONSELHO T ÉCNICO-ADMINISTRAT IVO PROF. DR FRANCISCO ROMEU LANDI
DIRETOR PRESIDENTE
PROF. DR. JOAQUIM J. DE C AMARGO ENG LER DIRETOR ADMINISTRATIVO
PROf DR. JOSÉ FERNANDO PEREZ DIRETOR CIENTÍFICO
EQUIPE RESPONSÁVE L
CONSELHO EDITORIAL PROF. DR. FRANCISCO ROMEU LANDI
PROF. DR. JOAQUIM J. DE CAMARGO ENG LER PROF. DR. JOSE FERNANDO PEREZ
EDITORA CHEFE MARILUCE MOURA
EDITORA ADJUNTA MARIA DA GRAÇA MASCARENHAS
EDITOR DE ARTE HÉLIO DE ALMEIDA
EDITORES CARLOS FIORAVANTI (CIÊNCIA) CARLOS HAAG (HUMANIDADES)
MARCOS DE OLIVEIRA (TECNOLOGIA) MÁRIO LEITE FERNANDES (TEXTO)
DIAGRAMAÇÃO E PRODUÇÃO GRÁFICA T ÃNIA MARIA DOS SANTOS
COLABORADORES ADILSON AUGUSTO ANA MARIA FlO RI
ANA W EISS MARIA APARECIDA MEDEIROS LIMA
MÓNICA TEIXEIRA RENATA SARAIVA
ULISSES CAPOZOLI WILSON MARINI
ENCARTE ESPECIAL PATENTES
FOTOLITOS E IMPRESSÃO GRAPHBOX-CARAN
TIRAGEM: 22.000 EXEMPLARES
FAPESP RUA PIO XI, NO. I SOO, CEP OS468-90 I ALTO DA LAPA - SÃO PAULO - SP
TEL (O - li ) 838-4000 - FAX: (O- li ) B38-4117
ESTE INFORMATIVO ESTÁ DISPONÍVEL NA HOME-PAGE DA FAPESP:
http://www.fapesp.br e-mail: [email protected]
SECRETARIA DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO
ECONÔMICO
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
4 • JANEIRO I FEVEREIRO DE 1000 • PESQUISA FAPESP
CARTAS
Dossiê Nordeste
Inicialmente gostaria de dar-lhes os parabéns pela Pesquisa FAPESP, que tem aliado artigos sumamente importantes à qualidade de impressão, divulgando e mostrando a ciência de ponta de nosso Estado e o expressivo trabalho desenvolvido pela entidade, colocando-a como grande impulsionadora da ciência pátria e introduzindo-a mais veementemente no cenário científico mundial. Temos ligações com a instituição há décadas e só podemos agradecer o incentivo constante que temos recebido, através de auxílios nas diferentes modalidades e programas.
Numa das seções da revista de no 47, há divulgação de uma publicação do Instituto de Estudos Avançados da USP, edição 36, vol. 13, de autoria de Aziz Ab'Saber e outros. Como temos feito algumas palestras sobre a transposição do Rio São Francisco, nos envolvemos e nos apaixonamos pelos problemas do Nordeste. Gostaríamos de adquirir um exemplar daquela edição.
A T NIO E VALDO K LA R,
Faculdade de Ciências Agronômicas/Unesp, Botucatu, SP
A edição da Revista de Estudos Avançados- Dossiê Nordeste Seco- pode ser adquirida no próprio Instituto de Estudos Avançados da USP: Av. Prof Luciano Gualberto, Travessa], 374, Cidade Universitária, CEP 05508-900, São Paulo, SP, telefones (O xx 11 ) 818-4442 ou 818-3919. Cantata: Edilma Martins (e-mail: [email protected]) .
Pesquisa FAPESP
Em primeiro lugar, quero transmitir-lhes meus parabéns e minha admiração pela qualidade e alto nível da importante revista Pesquisa FAPESP. Durante minha atuação profissional no Departamento de Geografia- FFLCH da USP, sempre tive o
apoio da FAPESP para a realização e continuidade de minhas pesquisas e das dos mestrandos e doutorandos sob minha orientação. Aposentada como professora titular e tendo continuado a pesquisar em Geomorfologia Costeira na área de Florianópolis, SC, através da Universidade Federal de Santa Catarina, venho agradecer o recebimento em São Paulo dessa notável publicação durante 1999 e afirmar-lhes que gostaria de continuar a recebê-la e poder divulgar seu incalculável papel na formação científica do País.
Ü LGA CRUZ,
São Paulo, SP
Estou recebendo a sua revista. Está magnífica. Gostaria de continuar a recebê-la. Sou professor aposentado da Escola de Comunicações e Artes da USP.
THOMAZ FARKAS,
São Paulo, SP
Venho acompanhando há muito tempo o crescimento da FAPESP como instituição de apoio à pesquisa científica e, como professor e pesquisador, é sempre com muita satisfação que tomo conhecimento e me atualizo quanto às pesquisas em andamento e à produção de colegas da comunidade científica, por meio da Pesquisa FAPESP. Apesar de não trabalhar mais na cidade de São Paulo, gostaria de continuar recebendo a publicação no meu novo endereço, no Rio de Janeiro.
M ARGARET H DA SILVA P ERE IRA
Rio de janeiro, Rj
Li recentemente a revista Pesquisa FAPESP e gostaria de recebê-la. Sou biólogo, formado pela Universidade Federal de Uberlância, e recém-ingressado no curso de mestrado em Genética da USP de Ribeirão Preto.
FRANC IS DE M ORA IS FRANCO N UNES,
Ttuiutaba, M G
EDITORIAL
Um fato científico de peso internacional
A ciência brasileira já pode festejar sua competência em genômica
Amatéria de capa desta edição de Pesquisa FAPESPtrata de um fato científico de im
portância internacional: pesquisadores brasileiros concluíram o seqüenciamento do genoma da bactéria Xylella fastidiosa .
Acrescente-se a essa informação que, além de ser o primeiro genoma de um patógeno vegetal seqüenciado no mundo, este é também o primeiro genoma seqüenciado fora do eixo Estados Unidos-Europa-Japão, realização cujo mérito deve ser creditado à ONSA, um instituto virtual for-mado por uma rede de 35 labora-
do projeto privado norte-americano de seqüenciamento do genoma humano, liderado por Craig Venter- de apresentar, ainda este ano, um esboço da seqüência genética humana.
Outros especialistas em genômica, reunidos em San Diego, Califórnia, em janeiro, no I Encontro de Genomas Microbianos Relevantes para a Agricultura, saudaram com entusiasmo e "uma ponta de inveja" a notícia da iminente conclusão
do seqüenciamento da X. fastidiosa. Explicação de Noel Keen, fitopatologista da Universidade da Califórnia, para tal inveja: "Os pri-
tórios conectados via Internet. Observe-se também que o projeto propiciou um salto da competência científica nacional em Genética Molecular. E relembre-se aqui que a X. fastidiosa é responsável pela praga do amarelinho ou clorose variegada dos citros (CVC), um problema que vem afetando um terço das plantas nos laranjais paulistas, com pesadas conseqüências econômicas para a poderosa citricultu-
"Este é o meiros projetas de seqüenciamento de bactérias fitopatogênicas nos Estados Unidos estão apenas começando': O doutor Peter Johnsan, responsável por um dos maiores programas de financiamento de pesquisa do Departamento de Agricultura dos EUA, preferiu outra abordagem: classificou a determinação do genoma da Xylella como "um marco que merece ser
pnme1ro genoma
concluído
fora do eixo
Estados Unidos
Europa-Japão"
ra do Estado. Por isso, a conclusão do seqüenciamento da bactéria per-mite prever um caminho de con-trole efetivo da praga, através das pesquisas do genoma funcional da X. fastidiosa num prazo de aproximadamente cinco anos.
Esses dados mostram que a conclusão do seqüenciamento da Xylella é um feito significativo o suficiente para que a FAPESP concentre-se agora mais nos substantivos que a informação sobre o projeto exige e deixe a terceiros o espaço para os adjetivos próprios das apreciações, comentários e juízos de valor. De Bob Waterston, por exemplo, a conclusão do seqüenciamento mereceu o curto e incisivo comentário de que "a iniciativa paulista em genômica é espetacular': Waterston dirige na Universidade de Washington, em Saint Louis, Missouri, o quinto maior centro de seqüenciamento genético do mundo. E sobre ele está depositada boa parte da esperança dos Institutos Nacionais de Saúde (NIH) -fustigados pela agilidade
celebrado por toda a agricultura': A partir do anúncio formal da
conclusão do primeiro projeto do Programa Genoma da FAPESP, no
dia 21 de fevereiro- portanto, quase quatro meses antes do prazo originalmente previsto -, outras avaliações sobre seu significado para a ciência brasileira certamente serão feitas. Esta Fundação aguarda-as com a serenidade de quem sabe que induziu um trabalho científico de largo alcance.
Esta edição de Pesquisa FAPESP, contudo, não é monotemática. Assim, chamamos a atenção para um outro tema importante aqui tratado: a questão da propriedade intelectual e das patentes que devem resultar da atividade de pesquisa. Ela é objeto de uma matéria que mostra as atuais preocupações e as propostas desta Fundação numa área vital para o desenvolvimento científico e tecnológico nacional e para o aproveitamento econômico do investimento do País em pesquisa. Patentes é também objeto do encarte especial desta edição, com palestras de especialistas no assunto.
PESQUISA FAPESP • JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • 5
Vital Brazil e as pestes do início do século Em 1899, neste modesto laboratório da foto à direita, o médico Vital Brazil Mineiro de Campanha (1865-1950) fez os primeiros estudos para produzir a vacina contra a febre amarela que tomava conta de São Paulo e do Rio de Janeiro. Mineiro nascido na cidade de Campanha, como seu próprio nome inusitadamente indica, Vital Brazil participou também, nessa mesma época, do combate à epidemia de peste bubônica, que também chegava pelos portos de Santos e do Rio. Foi um pioneiro da medicina experimental no Brasil e criou a base da imunologia no País, ao elaborar soros específicos contra picadas de cobras - a especificidade antigênica, um dos pilares da imunologia moderna. Vital Brazil criou
Poder sob aparência tosca
Não, a arrumação de arames ao lado não é uma escultura moderna nem um tosco artefato de inventor caseiro, mas uma invenção que substituiu as válvulas eletrônicas e permitiu a construção dos computadores, sem os quais não conseguimos mais sobreviver. É o transistor, anunciado em 1948 pelos seus criadores, William Shockley, John Bardeen e Walter H.
6 • JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
o Instituto Butantan, que passou a funcionar neste mesmo ano de 1899 e oficialmente dois anos depois - e logo se tornou uma
Brazil, as primeiras instalações do Instituto Butantan e uma visita de Roosevelt (ao centro}: referência internacional
referência internacional, a ponto de ter sido visitado pelo presidente norte-americano Theodore Roosevelt (1858-1919) em 1915.
Brattain, que trabalhavam para a Bell Telephone. Esse primeiro transistor, do tipo ponto-de-contato, amplifica sinais elétricos pela passagem de um material sólido semicondutor, basicamente a mesma operação realizada pelos modelos de junção, atualmente em uso.
O primeiro transistor: o mesmo princípio de amplificação de sinais elétricos empregado nos modelos atuais
OPINIÃO
HUGO AGUIRRE ARMELIN
Mais uma vez deu FAPESP na cabeça É hora de avaliar o impacto dos megaprojetos nas universidades
Aseqüência completa e anotada do DNA da bactéria Xylella fastidiosa está sendo publicamente anunciada. Missão cumprida pelo
esforço coordenado de 35 laboratórios de pesquisa e cerca de 200 pesquisadores de diversas instituições. É o primeiro patógeno de plantas e o primeiro genoma seqüenciado no hemisfério sul. Trata-se, portanto, de um feito internacional em pesquisa científica que dá credibilidade definitiva ao projeto Genoma da FAPESP.
A divulgação dessa conquista elevará em muito o conceito e a confiança que a coletividade do Estado
1990 e 798 em 1995, respectivamente, por US$ 4,6 milhões e US$ 6 milhões. Mas, entre 1990 e 1995, o investimento da FAPESP saltou de US$ 21 milhões para US$ 136 milhões, propiciando condições para a abertura de programas novos.
A fase 2, com os projetas temáticos, passa a oferecer até quatro anos de financiamento renovável, permitindo orçamentos relativamente avantajados. Foram 191 projetas entre 1991 e 1995 envolvendo
US$ 49,6 milhões. O objetivo era atrair projetas interdisciplinares destinados a resolver problemas relevantes de ciência e tecnologia. Mas
tem na capacidade competitiva de suas instituições de pesquisa. Por outro lado, o sucesso dessa iniciativa deve motivar muita reflexão entre dirigentes universitários e líderes de pesquisa. É oportuno indagar qual o significado e o impacto possível desse acontecimento no sistema de ciência e tecnologia de São Paulo e do Brasil.
" A estrutura as universidades não responderam à altura. O programa recebeu e aprovou propostas de ótima qualidade, mas, em geral, ortodoxamente disciplinares e distantes da complexa interdisciplinaridade exigida para a solução de problemas reais.
que agora dá resultados
começou a ser montada há 30 anos"
Diante disso, a FAPESP disparou a fase 3 em 1997, com o Projeto Genoma, iniciado com a Xylella e ago-
A FAPESP possui uma história rica em iniciativas paradigmáticas que contribuíram para o progresso evolutivo da organização da pes-quisa científica no Estado. Pode-se distinguir três fases nos quase 40 anos de atividades da Fundação, que levaram a mudanças culturais e estruturais nas nossas instituições de pesquisa, principalmente nas universidades.
Na fase 1, entre 1962 e 1990, a FAPESP, por meio de um programa de concessão de auxílios financeiros de um ano a projetas de pesquisa, conseguiu efeitos muito importantes: a) fez nascer a cultura do professor pesquisador empreendedor acadêmico, que criando projetas de pesquisa competitivos obtinha recursos e recrutava estudantes e b) montou progressivamente uma robusta rede de avaliação de projetas científicos e tecnológicos entranhada na comunidade estadual, que alcançou enorme credibilidade. Este programa nunca foi interrompido: 499 projetas foram contratados em
. ra com outros projetas de seqüenciamento: a) Câncer Humano; b) Cana-de-açúcar e c) Xanthomonas citri. Engatilhou, também, projetas de genoma funcional. Esta nova ini-
ciativa procura gerar macroprojetos interdisciplinares para resolver problemas reais do País, consorciando laboratórios de instituições diferentes em esforços coordenados de pesquisa. Dessa forma, a FAPESP desempenha o papel dos centros de ciência e tecnologia das boas universidades de pesquisa.
A conclusão do seqüenciamento da Xylella deu à FAPESP os primeiros resultados importantes da fase 3, que mais uma vez mostra agilidade, inovação e iniciativa para lidar com os grandes desafios. Enquanto isso, nossas universidades de pesquisa continuam não chegando junto.
H uco A GUIRRE ARMELIN, professor de Bioquímica, Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP)
PESQUISA FAPESP • JANEIRO I FEVEREIRO DE 1000 • 7
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
PROPRIEDADE INTELECTUAL
Cuidando bem das próprias idéias FAPESP vai incentivar o patenteamento dos resultados de pesquisas
Omineiro Alberto Santos Dumont, que há cem anos ulti
mava os preparativos para o vôo inaugural do 14-Bis, não patenteou nenhum de seus inventos, entre os quais, ao que consta, se incluía até mesmo o uso do relógio no pulso. Se tivesse tomado esse cuidado, talvez o inventor do avião conseguisse evitar a amargura do final da vida, que o levou ao suicídio, e aquinhoar uma parte dos dividendos da bilionária indústria dos ares. Para mudar esse quadro de quase desdém pelos mecanismos de proteção dos resultados das pesquisas científicas e tecnológicas, a FAPESP decidiu, no final do ano passado, que vai atuar de modo mais efetivo no campo da propriedade intelectual- tema ainda pouco tratado entre os cientistas no Brasil, mas de importância crescente, dado o interesse comercial despertado por descobertas ocorridas em laboratórios de instituições de pesquisa no mundo todo.
Para uma instituição cuja história se construiu sobre o financiamento de projetas de pesquisa em todas as áreas do conhecimento, a definição de formas de proteção legal dos resultados dos trabalhos acadêmicos configura um marco histórico. Neste campo, a FAPESP limitava-se até agora a ações isoladas de apoio a pesquisadores e a uma cláusula nos contratos de financiamento de projetas com empresas, por meio da qual poderia receber 50% dos royalties resultantes da exploração comercial das tecnologias que ajudou a. desenvolver.
8 • JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
Os novos procedimentos formais devem ser definidos ao longo deste semestre, mas já é certo que os pesquisadores ou bolsistas que receberam financiamentos da FAPESP, em qualquer época, podem encaminhar pedidos para análise de patenteamento dos resultados de seus trabalhos. A princípio, segundo Edgar Dutra Zanotto, coordenador adjunto da diretoria científica da FAPESP, o
O sires Silva: o exemplo da Embraer •
próprio corpo de 6 mil assessores da Fundação examinará se o resultado de uma pesquisa é ou não patenteável.
A FAPESP poderá ela própria encaminhar os pedidos avaliados positivamente ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), a entidade do governo federal sediada no Rio de Janeiro que cuida dos registras no Brasil, ou indicar escritórios voltados a áreas específicas. A Fundação propõe-se a cobrir os custos da patente provisória, válida por um ano.
Nesse período, os assessores que tiverem examinado os projetas ou uma comissão especializada em propriedade industrial (a forma final a ser adotada pela FAPESP ainda não está definida) providenciarão relatá-
rios ou protótipos dos inventos com a finalidade de encontrar parceiros que possam pôr a nova tecnologia em fabricação e uso por meio de contratos de licenciamento.
Diretrizes - Fecha-se assim o ciclo que a FAPESP está montando: de um lado, o desenvolvimento já em curso de tecnologias, viabilizado por meio dos auxílios a pesquisas em anda-
Zanotto: do laboratório à produção
menta, dos programas de parcerias para inovação tecnológica (PITE) e o de pequenas empresas (PIPE); de outro, o patenteamento dos resultados de pesquisas, agora incentivado; e, por fim, o licenciamento de tecnologias às empresas, de modo a tornar comerciais as pesquisas, sobretudo as de evidente caráter tecnológico. ''A inovação efetiva só ocorre quando a tecnologia se torna um produto", comenta Zanotto.
Se uma ou mais empresas se interessarem pelo invento, a FAPESP providenciará a patente definitiva, "apenas no Brasil, nos Estados Unidos ou no mundo todo, dependendo do mercado", diz Zanotto. Segundo ele, a Fundação, ao cobrir os custos, reser-
va-se o direito da titularidade - em outras palavras, torna-se a proprietária da patente, conforme o modelo em estudo, embora os lucros resultantes da exploração comercial sejam compartilhados em proporções iguais com o inventor e o empregador (a universidade ou o instituto de pesquisa).
Zanotto alerta para o fato de que a produção científica brasileira tem crescido, encontrando-se no momento próxima a 1 o/o da produção
te no banco de patentes Derwent, um dos maiores do mundo, disponível desde dezembro para pesquisadores e empresários paulistas (ver box na próxima página). "Centenas de projetas de pesquisa poderiam ter sido patenteados, se o caminho fosse menos árduo", diz Zanotto. Sua estimativa é que cheguem de uma a duas centenas de pedidos por ano, à medida que ganhe corpo a nova estrutura de exame de viabilidade de
O workshop sobre patentes: incentivo aos pesquisadores e revisão de procedimentós
mundial, mas o desenvolvimento tecnológico - avaliado pelo número de patentes depositadas nos Estados Unidos, equivalente a 0,05% das patentes concedidas anualmente naquele país - mantém-se estável há mais de dez anos. Os caminhos agora trilhados pela FAPESP, ele ressalta, constituem alternativas aos escritórios de transferência de tecnologia mantidos por universidades e institutos de pesquisa, de modo que o pesquisador possa escolher a forma que julgar mais adequada para cuidar de seu invento.
Sem uma estrutura formal ligada à propriedade intelectual, há apenas 11 patentes com a participação da FAPESP registradas espontaneamen-
patenteamento e de licenciamento de tecnologias na Fundação.
Encontro - A reorientação nessa área resulta de estudos iniciados pela diretoria científica da FAPESP em 1998. Culminou nas apresentações e nos debates realizados durante o workshop Propriedade Intelectual e Patentes, realizado pela FAPESP no dia 15 de dezembro de 1999, com cerca de 200 participantes. "Estamos muito atrasados nessa área no Brasil': observou o diretor científico da FAPESP, José Fernando Perez, na abertura do workshop. Segundo ele, a busca de mecanismos de proteção à propriedade intelectual tornou-se prioritária para a Fundação, em vista
das sucessivas descobertas científicas com potençiais aplicações industriais. "A FAPESP vai atuar de modo mais incisivo e compatível com os programas de indução tecnológica que mantém", reiterou.
Osires Silva, diretor do Departamenta de Tecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e criador da Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer), comentou que propriedade intelectual
é um tema "da maior importância, que envolve interesses e cifras elevadas". Alertou: "Infelizmente, a taxa de desenvolvimento mundial é bastante grande. Estamos perdendo tempo nessa corrida e está aumentando o fosso entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento."
Mas há como reagir. Osires Silva contou que a Embraer negociou US$ 7 bilhões no Salão de Le Bourget, em junho de 1999, em Paris, porque detém a propriedade das marcas e da tecnologia de fabricação dos aviões. "Se fizéssemos licenciamento, como sugeriram, teríamos no máximo o domínio do mercado interno."
Em seguida, o presidente da FAPESP, Carlos Henri-que de Brito Cruz, lembrou
que o Brasil depositou 56 patentes nos EUA em 1996, enquanto a Coréia deposita 1.500. "Como é que a Coréia consegue?", questionou. Não se trata, ele lembrou, de um país tão diferente do Brasil. "Uma instituição que financia pesquisa, em um ambiente acadêmico e industrial, precisa induzir à reflexão", disse.
As apresentações dos especialistas convidados, reproduzidas no encarte especial que acompanha esta edição de Pesquisa FAPESP, incentivaram os pesquisadores a registrar e a negociar tecnologias, ao delimitar os riscos, os custos, os benefícios e as exigências de uma patente. David Allen, assessor da vice-presidência do Escritório de Licenciamento da
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • 9
Universidade Estadual de Ohio, tratou dos conceitos básicos em uma de suas apresentações, pela manhã, e dos mecanismos de licenciamento de tecnologias, à tarde.
De Israel, vieram duas especialistas: Paulina Ben-Ami, vice-presidente de patentes e propriedade intelectual da Yeda, uma empresa que patenteia e licencia os inventos do Instituto Weizmann, e Renée BenIsrael, gerente de propriedade intelectual da Yissum, empresa privada ligada à Universidade Hebraica de Jerusalém.
Situação brasileira - Maria Celeste Emerick, coordenadora de gestão de tecnologia da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro, analisou as diretrizes e os resultados das estratégias de proteção à propriedade industrial da Petrobras, IPT, USP, Unicamp, Embrapa e Fiocruz. "Se não mudarmos, perderemos tudo o que já fizemos", afirmou. No final, Luiz Otávio Beaklini, diretor de
Registro de patentes no Brasil está em alta 18.000 ..,.,..
./ /'
16.000
14.000
..___ ~.-41' 12.000
10.000 ._.....
~ 8.000
6.000 ~
--~ -4.000
+ Total
.À. PCT - ~
2.000 -o 90 91 92 93 94
Fonte: INPI
patentes do INPI, comentou a respeito dos critérios e dificuldades das análises de patentes. Diante de críticas da platéia, tratou também dos mecanismos que o instituto procura implantar para atender com presteza os pedidos que chegam.
O encontro deixou claro uma série de procedimentos imediatamente aplicáveis em relação à propriedade
• Res identes
e Outro s não-residentes 95 96 97
intelectual. Um deles: não publicar nada antes de patentear, sob o risco de perder a patente, pois a maioria dos países exige o ineditismo para conceder o privilégio de exploração de um invento. Outra constatação é que o patenteamento, por si só, não resolve problemas. Cria, sim, mecanismos legais de proteção de uma idéia e caminhos de negociação.
Banco de patentes
Após o acordo, o pesquisador pode agir como consultor da empresa ou como antena das tendências de mercado. A regra é não se acomodar, jamais. Mais: não adianta fazer patente se o inventor ou financiador não está interessado em explorar o mercado atingido pela nova tecnologia. Por fim, uma comprovação espantosa: os acordos de licenciamento com empresas gerados a partir das patentes resultam principalmente de contatos dos próprios pesquisadores.
Em qualquer país, um pedido de patente só é aceito se cumprir três requisitos: a não-obviedade, a originalidade mundial e o potencial comercial do invento. Para saber se o trabalho que se pretende registrar atende a essas exigências prévias, é possível economizar tempo e dinheiro pesquisando em bancos internacionais de patentes.
Um dos maiores bancos de patentes do mundo, o Derwent, um dos maiores do mundo, do Institut for Scientific Information, está disponível desde dezembro para universidades e instituições paulistas de pesquisa que têm acesso ao Web of Science, o banco de artigos científicos apoiado pela FAPESP.
Segundo o diretor científico da FAPESP, José Fernando Perez,
I D • JANEIRO I fEVEREIRO DE 1000 • PESQUI SA FAPESP
o acesso ao Derwent deve se estender em breve às empresas que participam dos programas de . inovação tecnológica mantidos pela FAPESP, o de Inovação Tecnológica em Pequena Empresa (PIPE) e o de Parceria para Inovação Tecnológica (PITE). Por meio de outras instituições, deve se tornar ainda mais amplo o acesso no meio empresarial.
O Derwent ( dii.derwent.com) contém quase 10 milhões de patentes concedidas no mundo desde 1963. A pesquisa pode ser feita a partir do nome do inventor, depositante, ano, país ou por palavra-chave, em três seções distintas, Química, Eletroeletrônica e Engenharia em geral. O Derwent mantém o diálogo com o ISI, por meio do qual permite acesso a artigos e citações.
O próprio Zanotto, o organizador do workshop, conta que reveria suas atitudes. Entre 1995 e 1996, um de seus alunos de doutorado, Oscar Peitl, participou do desenvolvimento de biovidros na Universidade da Fiárida, nos Estados Unidos. O invento hoje é explOrado comercialmente pela US Biomaterial e os royalties cabem inteiramente à Universidade da Flórida, que detém a titularidade. Os pesquisadores nada recebem, embora constem como inventores. "Hoje eu não procederia da mesma forma", reconhece Zanotto. •
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
CENTROS DE EXCELÊNCIA
Escolha na etapa final
Núcleos que vão realizar projetos integrados serão definidos em poucos meses
Caminha para a etapa final o processo de seleção dos Cen
tros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID), o programa lançado pela FAPESP que implanta uma nova modalidade de financiamento, dirigido a instituições interessadas em desenvolver projetas multidisciplinares com efetiva transferência de conhecimento à sociedade. No final de 1998, inscreveram -se 112 instituições. Após a primeira triagem, realizada por 12 especialistas de outros Estados, permaneceram 29, que envi-
aram o plano gerencial e as propostas de trabalho detalhadas. Outra avaliação, desta vez conduzida com o apoio de 120 assessores internacionais, levou à relação de dez centros pré-qualificados anunciados no início de fevereiro (ver tabela).
Semelhante ao Sciences and Tecnology Center, um programa da National Science Foundation (NSF) dos Estados Unidos, atualmente com 35 projetas em andamento, o CEPID incentiva a formação de núcleos de trabalho científico cujo trabalho deve integrar três campos. O primeiro é a execução de um programa multidisciplinar de pesquisa básica ou aplicada. O outro é a realização de projetas de inovação tecnológica, com empresas, ou de políticas públicas, com órgãos públicos ou organizações não-
Os projetos qualificados para a terceira fase
I. Centro de Pesquisa do Câncer Antonio Prudente - Hospital do Câncer
2. Centro de Toxinologia Aplicada- Instituto Butantan
3. Centro de Estudos Metropolitanos - Cebrap
4. Centro de Ciências Ópticas/Centro de Pesquisas Fotônicas' - USP São Carlos/ Unicamp
S. Centros de Pesquisas de Terapias Baseadas em Células - USP Ribeirão Preto
6. Centro de Estudos do Sono- Unifesp
7. Centro de Biotecnologia Estrutural Molecular- USP São Carlos/LNLS
8. Centro de Estudo do Genoma Humano - USP
9. Centro de Estudos da Violência- USP
I O. Centro Multidisciplinar para Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos - UFSCar/Unesp
(*) Qualificação condicionada à apresentação de uma proposta integrada
governamentais. A terceira vertente é a interação com o sistema educacional, por meio de cursos para estudantes e professores do desenvolvimento de técnicas educacionais ou de recursos pedagógicos, como museus de ciência, vídeos e softwares.
Essa forma de. apoio à produção científica, na avaliação de José Fernando Perez, diretor científico da FAPESP, é um desdobramento natural dos programas lançados pela Fundação nos últimos anos, que promovem a aproximação com empresas, orgãos públicos e escolas. "O CEPID é uma forma de consolidar uma visão de co-responsabilidade do sistema de pesquisa nas questões sociais'; diz Perez.
Visitas - Nos próximos meses, uma comissão internacional vai examinar in loco a infra-estrutura, a qualificação dos profissionais e as propostas de trabalho das instituições pré-qualificadas. As visitas vão embasar o julgamento final, a ser anunciado em meados do ano. Devem ser contempladas cerca de cinco instituições, que vão receber por ano de US$ 300 mil a US$ 2 milhões para desenvolver projetas de longa duração, limitados a 11 anos.
Os centros terão autonomia para utilizar os recursos financeiros, mas serão avaliados continuamente. Perez lembra que o acompanhamento por especialistas internacionais -nos moldes do efetivado nos programas Genoma e Biota - "assegura a qualidade dos projetas, de acordo com um padrão internacional, e contribui com uma visibilidade maior da ciência brasileira". •
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO OE 1000 li
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
A Begonia jureiensis, identificada na mata da Juréia, em lguape, é uma das 44 espécies inéditas da flora paulista
Projeto Flora passa por avaliação e anuncia descobertas
Adevastação sistemática que se abateu sobre a vegetação natu
ral do solo paulista desde os tempos do descobrimento não impediu que os botânicos participantes do projeto temático Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo identificassem 44 novas espécies e uma variedade de plantas não descritas pela ciência. Entre elas estão sete da família das acantáceas, a mesma dos camarões-de-jardim, cinco lauráceas, parentes do louro e da canela, duas rubiáceas, a mesma do café, duas bromélias e duas begônias. Além dessa boa notícia, eles coletaram 118 espécies que foram registradas an
do País, mas que ainda não haviam sido encontradas no Estado. Também destaca-se o desaparecimento de dez espécies de orquídeas e uma de bromélia que não são coletadas há mais de 50 anos em São Paulo, por isso consideradas extintas, provavelmente por excesso de extração predatória.
Esses resultados são preliminares e foram apresentados na segunda reunião de avaliação do projeto, realizada no início de fevereiro, na presença dos três assessores internacionais designados pela FAPESP: Paul Berry, diretor do herbário da Universidade de Wisconsin, nos Estados
teriormente em outras regiões Nee, Berry e Stannard: prio ridades e paciência
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Unidos, Brian Stannard, pesquisador da flora da América do Sul do Royal Botanic Gardens, da Grã-Bretanha, e Michael Nee, pesquisador do Jardim Botânico de Nova York, Estados Unidos.
A primeira reunião de avaliação ocorreu em 1995, um ano após o início desse ambicioso projeto que vai catalogar as cerca de 8 mil espécies vegetais com órgãos reprodutores caracterizados por flores, as chamadas plantas fanerogâmicas. Na avaliação deste ano, os três assessores entenderam que o projeto está bem desenvolvido e consideraram
normal o atraso para a entrega final de todos os trabalhos, prevista, inicialmente, para quatro anos. "É complicado desenvolver um trabalho como esse em tão pouco tempo", afirma Berry.
Muito tempo - "Países como Panamá e Guatemala tiveram
suas floras completadas no período de 30 anos." Isso levando-se em conta que esses dois países têm áreas menores, 75 mil e 108 mil km2
, respectivamente, do que o Estado de São Paulo, com 248 mil km2
• Outro dado semelhante vem da realização da flora da Guiana Venezuelana, a região amazônica da Venezuela, com 9.400 espécies, um estudo realizado em, aproximadamente, nove anos. "Por isso, a FAPESP e os próprios pesquisadores precisam ter paciência para chegar ao final do projeto", aconselha Berry.
A coordenadora do Flora Fanerogâmica, a professora Maria das Graças Lapa Wanderley, do Instituto de Botânica, da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, lembra que o prazo para coleta de material na natureza era de dois anos, mas esse período foi esticado até mar
outros Estados e 32 estrangeiros, totalizando 246 botânicos. Até agora, os manuscritos de 72 famílias foram entregues à coordenação e 115 estão em fase de descrição. A família mais populosa, a das orquídeas, que representa cerca de 10% das espécies da flora paulista, está com 80% das espécies concluídas, assim como a segunda, a das poáceas, que reúne as gramas e os capins, com 400 espécies.
coleção. Eles indicaram que o melhor caminho, nesse momento, é estabelecer prioridades. "É preciso concentrar esforços nas famílias menores ou naquelas em que os trabalhos estiverem no fim, para a publicação dos primeiros volumes em relativamente pouco tempo", indica Berry. "Nós já havíamos percebido a necessidade de darmos prioridade a algumas famílias, e eles reforçaram
essa visão", afirma a professora Maria das Graças.
Nidularium amazonicum paulistanum: nova variedade de bromélia ço deste ano porque os pesquisadores precisaram estabelecer uma melhor qualidade nos estudos.
Duas outras ações fazem parte do projeto Flora Fanerogâmica. A primeira, mais recente e indicada pelos assessores, será uma maior integração com o Projeto Biota, que reúne diversas linhas de pesquisa para mapear e analisar a flora, a fauna e os microrganismos do Estado. "Os estudos taxonômicos (identificação) e a descrição de cada espécie vão ser uma fonte de informação muito grande para o Biota", avalia Maria
"Muitas vezes, o pesquisador necessita de mais tempo para fazer novas coletas, além de consultar e tirar dúvidas em vários herbários (local onde fica a coleção de plantas) até obter a confirmação da identificação e da descrição completa de uma espécie", explica Maria das Graças. Estavam previstas 144 expedições, mas certamente esse número vai chegar a 200. O tempo se prolonga, também, porque muitos pesquisadores têm seus trabalhos rotineiros e se ocupam do projeto nos fins de semana.
O projeto tem a colaboração voluntária de um batalhão de especialistas. Em alguns casos, com mais de um pesquisador para cada uma das 187 famílias vegetais existentes no Estado, que correspondem a cerca de 1.500 gêneros. São 135 pesquisadores de 13 instituições de São Paulo dotadas de herbários, 79 de
Novos botânicos - A quantidade de pessoas envolvidas nesse projeto temático impressionou os três assessores. "Percebemos que existe muita disposição por parte dos participantes", analisa Berry. "A participação ·de estudantes e estagiários nas coletas e análise do material é muito importante para o treinamento de novos botânicos", lembra Michael Nee. Para prover o trabalho de campo de todos os pesquisadores, em viagens de coletas, visitas a herbários e diárias, o financiamento da FAPESP é de R$ SOO mil. Esse valor também será utilizado na confecção de ilustrações técnicas das espécies e na futura edição dos 16 volumes que reunirão toda a flora de São Paulo, com ilustrações e descrições de todas as plantas. Um 17° volume será editado com informações sobre a atual situação da vegetação do Estado.
Por orientação dos três assessores, até o final do ano devem estar prontos os dois volumes iniciais da
das Graças. A outra contribuição do projeto será, depois de finalizado, servir como modelo para uma futura Flora Fanerogâmica Brasileira, prevista pela Sociedade de Botânica do Brasil. "Acredito que a identificação de todas as plantas do País, que está começando em São Paulo, é uma decisão estratégica para o Brasil", analisa o professor Berry.
Além do conhecimento da biodiversidade vegetal paulista, a Flora é o ponto inicial para possíveis novos usos econômicos das plantas, na produção de alimentos, de fibras, nas pastagens, na fabricação de medicamentos ou uso ornamental. Para preservar essa riqueza, o projeto vai indicar o estado de conservação das áreas naturais e identificar as espécies mais ameaçadas de extinção, propondo melhores cuidados ambientais nas regiões mais críticas. Ainda mais quando sabemos da existência de mais 45 novas e belas flores espalhadas no que resta da mata paulista. •
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POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
ESTRATÉGIAS
Franceses investenn nnais enn pesquisa
A pesquisa está em alta nas grandes empresas francesas. É o que anuncia o jornal Le Monde, em reportagem assinada por Annie Kahn e feita a partir de uma enquete, realizada pelo próprio jornal, com os 25 principais grupos do país. Em 1998, depois de anos em baixa, os investimentos em pesquisa feitos pelas companhias francesas aumentaram 12,2% sobre 1997, totalizando US$ 15 bilhões.
Isto é resultado, segundo a reportagem, do crescimento econômico, que ressalta
a necessidade de investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), e da globalização. A globalização ocorre, inclusive, nos próprios setores de P&D. Um dos fatos marcantes da evolução das empresas, assinalado pela maioria delas, foi a abertura de laboratórios no exterior, durante os anos de 1997 e 1998. "Essa internacionalização atende a vários objetivos", diz o Le Monde. "Antes de mais nada, visa a aproveitar melhor os talentos
Orçamentos das empresas francesas para a pesquisa e desenvolvimento
Empresa Orçamento 1997 Orçamento 1998 P&Dem Efetivo em milhões em milhões percentagem do em número de dólares de dólares faturamento 98 em P&D
Alcatel 2.579 2.760 13.10 23.500
Renault 1.363 1.582 4,30 11.026
Thomson-CSF 1.176 1.508 24,70 15.000
Rhone-Poulenc 1.282 9,80
PSA 1.146 1.282 3,80 12.000
Aerospatiale 1.644 1.262 15,24 5.102
ELF 951 987 3,10 8.400
France Telecom 754 754 3,10 4.500
Alstom 381 440 3,10 3.6SO
EDF 467 440 1,50 2.6SO
Schneider 377 392 5,20 3.SOO
Valeo 309 374 6,20 3.700
L'Oréal 2SI 283 2,50 2.24S
Saint-Gobain 236 247 1,40 1.900
Buli 224 227 5,90 2.3SO
Total 196 209 0,80 1.840
Suez-Lyonnaise 165 180 0,60 800
Usinor ISO 1,40 I.SOO
Pierre Fabre 129 141 13,90 1.034
Air Liquide 128 131 2,10 soo Framatome 123 117 4,30 1.100
Danone 110 117 0,90 1.2SI
Vivendi 61 101 0,30 6SO
Pechiney 93 90 0,90 840
Gaz de France 70 70 0,70 794
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em qualquer lugar onde estejam, a fim de colocar-se no melhor nível da pesquisa mundial e não mais apenas francesa", para poder enfrentar, em pé de igualdade, os concorrentes mundiais. Alguns exemplos citados na reportagem. A France Télécom abriu um laboratório no Vale do Silício, na Califórnia, formado por uma equipe de 20 pessoas, entre as quais cinco franceses, e hoje participa diretamente das pesquisas do Medialab do Instituto de Tecnologia de Massachusetts. "Já tínhamos muitos contatos com laboratórios americanos. Mas perdíamos tempo estabelecendo relações e nossa visão não era suficientemente precisa", justifica Pascal Viginier, diretor do Centro Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento da France Télécom. Ainda nos Estados Unidos, a L'Oréal montou, em Chicago, um centro de pesquisa de "cabelos étnicos". No Brasil, a Renault também abriu um centro de pesquisa, no Rio de Janeiro. "Queremos trabalhar com pessoas que tenham uma outra cultura e que utilizem métodos diferentes dos nossos", explicou Pierre Beuzit, diretor de pesquisa da empresa. E mais: "Queremos mostrar que a Renault vai ao Brasil não apenas para vender carros, mas também para resolver problemas locais". O grupo Vivendi , por sua vez, abriu um laboratório em Hong Kong. Já a
Suez-Lyonnaise estabeleceu três centrais coordenadoras de seus laboratórios de pesquisa: uma, criada em 1998, sediada em Kuala Lumpur, na Malásia, que agrupa laboratórios na China, nas Filipinas, na Indonésia e na Austrália; outra, criada em 1997, sediada em Newcastle, na Inglaterra; e a terceira, a mais antiga, localizada nos arredores de Paris. ''A pesquisa é o cartão de visita da tecnologia do grupo. É valorizadora no plano comercial", comentou Catherine Moulin, assessora de pesquisa, desenvolvimento e inovação da Vivendi.
Empresas criam o Instituto I mage
Daniel Nahon, conselheiro do ministro francês Claude Allegre, em entrevista concedida à Pesquisa FAPESP e publicada na edição 49, de dezembro passado, havia anunciado a implantação de um centro de genoma em Evry, nos arredores de Paris, resultante da interação entre órgãos de pesquisa, órgãos de desenvolvimento, universidades e indústria privada. Esse centro, informa a Nature de 20 de janeiro último, será o Instituto Image, mantido pelo consórcio público Image (Integrated Molecular Analysis of Genome and their expression) -que já havia sido criado para fornecer ferramentas de pesquisa a pesquisadores da indústria e das universidades -, por agências de pesquisa e Ministério da Educação Nacional, da Pesquisa e da Tecnologia. Segundo a Nature, o consórcio inclui
mais de 30 companhias farmacêuticas, agroquímicas e de biotecnologia, e deve anunciar um grande acordo com importantes empresas de bioinformática que respaldariam a criação do centro de excelência nessa área.
Celera: negócios da China
A Celera, empresa norteamericana criada e presidida por Craig Venter, que vem provocando uma contínua aceleração da corrida pelo seqüenciamento do genoma humano, adquiriu 47,5% da companhia chinesa de biotecnologia Shanghai GeneCore BioTechnologies Ltd. De acordo com uma nota publicada pela Nature de 20 de janeiro último, as ações pertenciam anteriormente à chinesa Axys Pharmaceuticals Inc., empresa da área genômica atuante nos centros industriais e acadêmicos do país. Outra empresa ligada à principal acionista da Celera, a Perkin Elmer Biosystems, já possuía 47,5% da Shanghai GeneCore. Segundo Venter, a aquisição faz parte dos planos de expansão global da Celera e vai proporcionar
Venter: planos de expansão
acesso à diversidade genética vegetal, animal e humana da China, "fundamental para a expansão das informações genômicas da Celera".
Mobilização em Pernambuco
A SBPC e a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente de Pernambuco promoveram no começo de fevereiro uma movimentada reunião com a comunidade científica e tecnológica do Estado. O encontro, no auditório do Instituto Tecnológico de Pernambuco (Itep), foi uma oportunidade para o presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa de Pernambuco (Facepe), José Carlos Cavalcanti, apresentar as metas da Facepe para o período 2000-2002. De acordo com os planos, os clusters tecnológicos existentes no Estado vão se encarregar da difusão das inovações tecnológicas e, ainda este mês, a Fundação deve lançar, via Internet (www.facepe.pe.gov.br ), dois editais para projetos de pesquisas induzidas nas áreas de biotecnologia, energias alternativas, tecnologia ambiental, tecnologia da informação e saúde. Do encaminhamento à avaliação dos projetos, tudo será feito on line.
Plano de Financiamento
Na mesma reunião no Itep, o secretário de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, Cláudio Marinho, expôs o Plano de Financiamento de Pesquisa em Pernambuco, que traz
Cavalcanti: projetas induzidos
a promessa da tão sonhada regularização dos repasses do Tesouro à Facepe, na base de R$ 250 mil mensais, valor de pico dos desembolsos dos últimos quatro anos. O secretário apresentou também a proposta de programatizar o fomento, destinando 70% dos recursos para a indução de áreas estratégicas e 30% para a demanda espontânea. Mas a idéia é que para isso, em paralelo aos investimentos do governo, sejam captados recursos externos, na base de um para dois - para cada R$ 1 do governo, R$ 2 sejam colocados por um parceiro privado. Outra proposta em curso é a Lei do Conhecimento, que vem sendo elaborada com vistas à criação com incentivos fiscais e financeiros para estimular as empresas privadas a investirem em pesquisa e desenvolvimento.
Bolsas e auxílios em andamento
Um flash do início do ano: a FAPESP apóia atualmente 9.000 bolsas e 7.000 auxílios à pesquisa. Por mês, a Fundação destina cerca de R$ 12 milhões a bolsas e de R$ 12 a R$ 18 milhões a auxílios.
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CAPA
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Está concluído o seqüenciamento genético da bactéria Xylella fastidiosa, maior projeto científico já realizado no Brasil, lançado em
14 de outubro de 1997 pela FAPESP, com apoio do Fundo Paulista de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), e investimento de US$15 milhões. No dia 6 de janeiro passado, os pesquisadores da Organização para Seqüenciamento e Análise de Nucleotídeos, ou, em inglês, Organization for Nucleotides Sequencing and Analysis - que resulta na sigla ONSA, de sonoridade propositalmente tão brasileira-, fecharam o genoma do primeiro fitopatógeno já seqüenciado no mundo.
Isso significa que nesse dia estavam determinadas todos os 2,7 milhões de bases do cromossoma da Xylella. Ou, como resume de forma bem simples o doutor Andrew Simpson, coordenador de DNA do projeto, "significa que aí tivemos uma seqüência contínua de tudo", ainda que um trabalho pesado tenha prosseguido, até meados de fevereiro, em pelo menos cinco dos 35laboratórios da rede ONSA envolvidos com a bactéria responsável pela clorose variegada dos citros ( CVC), a praga do amarelinho, que afeta 34% dos pomares de laranja, base da importante citricultura paulista.
A última reunião:
Simpson discute o mapa genético do primeiro fitopatógeno seqüenciado no mundo
,
Nesses laboratórios continuavase a trabalhar incansavelmente na revisão de umas poucas centenas de bases que ainda não estavam exatamente dentro do padrão de qualidade utilizado na ONSA- de menos de um erro por 10 mil nucleotídeos- e na descrição e definição precisas dos genes codificados pelo genoma. E nesses e em outros grupos de pesquisa prosseguia o absorvente esforço para a elaboração do artigo científico - o paper, no jargão dos cientistas -, com o mapa da seqüência da bactéria, incluindo todos os genes nela encontrados, que será submetido para publicação em março. É somente a publicação que vai oficializar para a comunidade científica internacional o feito dos pesquisadores brasileiros na genômica e, só a partir dela, os novos dados científicos da biologia da Xylella fastidiosa podem ser livremente divulgados pela imprensa não especializada. São rituais próprios do universo científico- há que aceitá-los.
Mas muito antes disso, ou seja, no dia 21 de fevereiro, os laboratórios e cerca de 190 cientistas envolvidos no projeto da Xylella terão recebido do Estado de São Paulo o reconhecimento público da relevância de seu trabalho, na forma de troféus, medalhas e diplomas do "Mérito Científico e Tecnológico". Trata-se de um novo prêmio para conquistas significativas na área de C&T em São Paulo, instituído oficialmente pelo governador Mário Covas em 18 de fevereiro, motivado precisamente pelo trabalho dos pesquisadores do genoma da X. fastidiosa.
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MIGUEL BOYAYAN
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"' Encontro para preparação do artigo científico (o paper) com as conclusões do projeto Genoma Xylella
Entre o momento dessa homenagem e o começo efetivo do projeto da Xylella, o tempo decorrido foi muito curto: apenas dois anos. E isso não muda muito ainda que se tome por começo a gênese mesma do projeto, fixada por consenso de seus líderes em primeiro de maio de 1997, dia em que Fernando Reinach, pesquisador do Instituto de Química da Universidade de São Paulo-USP, propôs ao diretor científico da FAPESP, José Fernando Perez, que se fizesse o seqüenciamento completo de um microorgamsmo.
No entanto, em termos científicos, há simbolicamente, para o Brasil, quase a distância de uma era entre esse começo, incluindo os dias de manejo desajeitado e lento das novas máquinas seqüenciadoras, no início de 1998, e o momento em que o read (parte da biblioteca de clones) enviado por Luís Eduardo Aranha Camargo fechou o genoma - ou, melhor ainda, o momento em que Simpson anunciou o fechamento para os cientistas reunidos no I Encontro de Genomas Microbianos Relevantes para a Agricultura, promovido pelo De-
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partamento de Agricultura dos Estados Unidos, em San Diego, Califórnia, nos dias 8 e 9 de janeiro. Tinha-se, antes, um País alheio às conquistas da genômica e, depois, um País que pertence ao seleto clube dos que concluíram o seqüenciamento de um genoma microbiano, expertise até então dominada por apenas 14 outros grupos de pesquisa nos Estados UnidÓs, na Europa e no Japão.
A participação de Simpson no encontro em San Diego, para o qual foi convidado, merece ser registrada. Na abertura do encontro, Peter Johnson, responsável por um dos maiores programas de financiamento de pesquisa do Departamento de Agricultura, anunciou à audiência o fechamento do genoma da Xylella nos seguintes termos: "Tenho uma boa e uma má notícia para contar: a boa, é que foi seqüenciado o genoma do primeiro organismo fitopatógeno; a má, é que não foi feito aqui nos Estados Unidos': A palestra de Simpson, mais tarde, fez um grande sucesso e, no final, ele ressaltou que o melhor do projeto brasileiro foi a revelação de jovens pesquisadores. Como destes estavam
presentes no encontro Luís Eduardo Aranha Camargo, Felipe Rodrigues da Silva, Celso Marinho, Alessandro Paris e André Vettore, Simpson pediu desculpas por embaraçá-los, solicitou que se levantassem e os cinco foram aplaudidos. Depois, Simpson foi cercado e entusiasticamente parabenizado. Vale observar que o fato de os orçamentos para seqüenciamento de genomas importantes para a agricultura, nos Estados Unidos, serem menores que os disponibilizados pela FAPESP só aumentou o calor da acolhida ao seqüenciamento da Xylella.
"Foi só naquele momento em San Diego que eu senti como era saboroso ter um dedinho naquilo que estava provocando tanto impacto, tanto sucesso", diz Camargo. O pesquisador de 35 anos, professor doutor no Departamento de Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz-Esalq/USP, diz que ao saber que um read que enviara ao Centro de Bioinformática fechara o genoma, sentiu só alívio. "Eu estava tão estressado, porque queria ter terminado tudo antes do Ano Novo, e tão an-
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- Meidanis: experiência anterior dos Joões tornou-os a alternativa perfeita à idéia de cooperação em bioinformática
gustiado, porque no meu computador não conseguira fechar, mesmo depois de o João Setúbal me dizer que fechara, que nem senti alegria. Na Califórnia é que veio o rebote': comenta.
Realidade maior que o sonho -A par do importante fato científico stricto sensu, que abre vastas possibilidades e novas indagações para os laboratórios ligados à rede ONSA, o fechamento do genoma da Xylella fastidiosa tem uma infinidade de outros significados. Primeiro, ele atesta que, não só foi cumprido, como ultrapassado em boa medida, o que era pouco mais que um sonho quando a FAPESP lançou solenemente, no auditório da Fundação superlotado por autoridades, empresários e mais de 300 pesquisadores do Estado, o então chamado Projeto Genoma-FAPESP. Ali, anteviam-se e explicitavam-se estas realizações: • Seqüenciar até maio do ano 2000 cerca de 2 milhões de pares de base do DNA da Xylella fastidiosa; • Propiciar um salto de competência em Genética Molecular, com cerca de 30 laboratórios dominando, no ano
Setúbal: competência do Centro de Bioinformática mereceu referência especial do Steering Committee
2000, as técnicas de análise de genoma e todas as tecnologias básicas dessa área; • Dispor de novos dados científicos e idéias, no final do projeto, para tentar resolver o problema da CVC na citricultura paulista; • Consolidar um novo modelo de trabalho cooperativo em pesquisa.
Essas propostas estão documentadas no Notícias FAPESP número 25, de outubro de 1997, na matéria com o título assertivo "Um projeto
para revolucionar a ciência brasileira", apropriado ao clima de entusiasmo que grassava entre os formuladores da proposta de seqüenciamento da Xylella, à frente o professor Perez. E é um exercício interessante comparar o que está dito no então boletim da Fundação com o que de fato ocorreu.
Primeiro, o número de bases da Xylella revelou-se cerca de um terço maior do que indicava a estimativa inicial, o que faz de seu genoma o quinto mais extenso já completamente seqüenciado. E ainda assim, o trabalho foi concluído cerca de quatro meses antes do prazo previsto: em janeiro, e não em maio de 2000.
Em segundo lugar, o salto de competência científica registrado na pesquisa em biologia molecular em São Paulo, em decorrência do projeto da Xylella, foi certamente maior e mais facetado do que ousavam imaginar seus mais visionários formuladores. Em relação a número de laboratórios capacitados, por exemplo, hoje existem, não 30, mas cerca de 60 grupos de pesquisa espalhados pelo estado de São Paulo com conhecimento e domínio das técnicas mais modernas de pesquisa em biologia molecular. Sobre isso, Marco Antonio Zago, professor titular do Departamento de Hematologia e Hemocentro da Medicina da USP de Ribeirão Preto e coordenador de um dos laboratórios de seqüenciamento da Xylella diz que, "além da importância de seu resultado específico, é preciso ressaltar exatamente a mudança drástica, fundamental, operada na pesquisa biológica em São Paulo pelo projeto, na medida em que permitiu a capacitação em termos de infra-estrutura e competência técnica de um número muito grande de laboratórios espalhados pelo estado". Zago não tem dúvida de que esses laboratórios encontram-se num patamar comparável aos dos melhores grupos de pesquisa dos países mais desenvolvidos para responder, como diz Perez, "a um futuro, mais que promissor, exigente':
Em relação à competência científica, a área de bioinformática merece
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uma referência especial. Ela era crucial para se fazer o seqüenciamento, mas, ao mesmo tempo, nova e carente de quadros no País, de tal forma que chegou-se a pensar na alternativa de resolver o problema via cooperação internacional. A idéia foi sugerida por André Goffeau, um dos três integrantes do comitê internacional ( Steering Committee) de assessoramento ao projeto da Xylellaos outros dois são Steve Oliver, da Universidade de Manchester e John Sgouros, do Imperial Cancer Research Fund, em Londres. Goffeau, respeitado pesquisador belga do Instituto Curie, coordenador do seqüenciamento do genoma da levedura, concluído em 1996 por uma rede de cerca de 100 laboratórios europeus, propôs que se contratasse um dos especialistas que haviam trabalhado nesse projeto. A hipótese foi descartada quando o grupo que discutia inicialmente o projeto - Perez, Reinach, Simpson, Paulo Arruda, pesquisador da Universidade Estadual de Campinas-Unicamp, Marcos Machado, do Instituto Agronômico de Campinas, Márcio de Castro, da Esalq, Juliano Aires e Ademerval Garcia, do Fundecitrus, Ricardo Brentani e Joaquim Machado, do Instituto Ludwig de Pesquisas sobre o Câncer e Goffeau, entre outros - soube que dois jovens pesquisadores da Unicamp já vinham trabalhando nessa área. Eram João Meidanis e João Setúbal, logo chamados para se agregar ao grupo e que terminariam ocupando a função-chave de coordenadores de bioinformática do projeto. A solução revelou-se perfeita: no último parecer do Steering Committee sobre o projeto, extremamente positivo, há um destaque para "o excepcionalmente alto nível de competência profissional demonstrado pelos dois coordenadores de bioinformática, combinado com a disposição de ajudar, sempre, a resolver os problemas". Do laboratório dos dois Joões começam a sair novos especialistas em bioinformática, e ali afirmou-se, por coincidência, um ter-
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O projeto ajudou a revelar novos tal entos, co mo João Kitajima, da Bio informática, área científica estratégica no século XXI
midades dos genes, o método ORESTES permite alcançar sua área central, de fundamental importância porque aí se concentra sua região codificadora de proteínas. O método vem sendo usado com grande sucesso no projeto paulista do Genoma Humano do Câncer. Um artigo a seu respeito está prestes a ser publicado numa revista científica internacional e ele é objeto de um pedido de registro de patente depositado no escritório norte-americano pelo Instituto Ludwig, com a concessão de metade dos direitos à FAPESP.
ceiro João, o Kitajima. Isso é de grande importância, porque a essa área que, segundo a própria explicação de Setúbal, viabilizou o trabalho de tratamento e análise de enormes volumes de dados na biologia, conferindo-lhe uma dimensão quantitativa inteiramente nova, parece reservado um lugar muito especial no desenvolvimento científico do século 21.'
Um olhar mais amplo sobre a questão do salto de competência obriga ainda a incluir uma brilhante realização paralela obtida no curso do projeto da Xylella fastidiosa: a nova metodologia de seqüenciamento ORESTES, sigla de Open Reading Frames EST Sequences. Embora não tenha sido utilizada com a bactéria da CVC, foi impulsionado por seu trabalho como coordenador de DNA nesse projeto que Simpson aperfeiçoou, junto com talentosos jovens cientistas de seu laboratório no Instituto Ludwig de Pesquisas sobre o Câncer, o método sobre o qual já vinha trabalhando há alguns anos. Diferentemente das outras metodologias em curso, que propiciam o seqüenciamento das extre-
O vigor conquistado da ONSA - Em relação ao
objetivo do projeto da Xylella de gerar dados e idéias novas para resolver o problema da CVC, o caminho proposto pela FAPESP foi o projeto Genoma Funcional. Lançado em 30 de outubro de 1998, ele desafiava os pesquisadores paulistas especializados em doenças de plantas e áreas afins a trabalhar com novas hipóteses sobre a praga do amarelinho, a partir dos genes da bactéria que vinham sendo biologicamente identificados pelos laboratórios da rede ONSA. Hoje, 21 projetos de pesquisa estão sendo desenvolvidos no âmbito do Genoma Funcional da X. fastidiosa e há uma expectativa de que possam oferecer um caminho efetivo de controle da clorose dentro de alguns anos.
E, para concluir a análise do saldo entre o proposto e o realizado pelo projeto da Xylella, uma questão decisiva para seu êxito: o modelo implantado de trabalho cooperativo em pesquisa. A ONSA revelou-se um modelo que efetivamente conseguiu criar uma nova cultura sobre o modo de fazer pesquisa em São Paulo. Antes de indicar como e por que
ele conseguiu isso, vale lembrar que a ONSA foi a base a partir da qual a FAPESP transformou o Projeto Genoma numa coisa muito maior, o Pro-grama Genoma-FAPESP, constituído no primeiro semestre de 1999, com essa seqüência de lança-mento de projetos: • Genoma Humano do Câncer, em 26 de março, num esquema de parceria entre a FAPESP e o Instituto Ludwig de Pesquisas sobre o Câncer; • Genoma da cana-deaçúcar, em workshop internacional nos dias 12 e 13 de abril, com apoio da Copersucar (Cooperativa dos Produtores Paulistas de Cana -de-Açúcar); • Genoma-Xanthomonas,
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em junho, para seqüenciamento da bactéria Xanthomonas axonopodis pv citri, causadora do cancro cítrico, com apoio do Fundecitrus.
A essa altura, os projetos do programa Genoma da FAPESP representam investimentos globais de aproximadamente US$ 35 milhões, incluindose os aportes de R$ 5 milhões do Ludwig para o Genoma-Câncer, cerca de US$ 1 milhão do Fundecitrus para os dois projetas genoma ligados à citricultura e US$ SOO mil da Copersucar em apoio ao GenomaCana. Chega-se ao custo total com os investimentos no projeto Genoma Funcional da Xylella.
Mas quais as razões do sucesso do modelo de trabalho concretizado pela ONSA? Já em maio de 1998, a renovação que ele estava trazendo ao ambiente da pesquisa paulista era, graças à percepção de Perez e Simpson, assim descrita no Notícias FAPESP 31: "Um fenômeno novo está ocorrendo na organização da pesquisa e na própria produção de ciência no Estado de São Paulo. ( .. . ) ele se manifesta numa cooperação entre pesquisadores em escala ja-
Luiz Eduardo Camargo: de seu laboratório, ele enviou, no dia 5 de janeiro, o read que permitiu fechar o genoma da bactéria
mais vista no País, num ritmo de produção que lembra mais uma linha de montagem industrial do que a investigação científica tradicional, e numa velocidade de obtenção de resultados surpreendente numa atividade que, pelo menos no Brasil, sempre foi vista como descomprometida com a ação do tempo". Explicava-se que o acontecimento novo se revelava na consolidação de uma estrutura de pesquisa leve, flexível e eficiente, um instituto virtual sem paredes, descentralizado e baseado na idéia de rede de laboratórios, tomada de empréstimo a alguns grandes projetas internacionais, à qual, no entanto, a iniciativa paulista agregara "princípios de liderança e hierarquia próprios de um instituto convencional, chegando a uma receita, no mínimo, original".
Uma chave da questão parece estar justamente aí: "Primeiro, o projeto da Xylella funcionou muito bem por causa do estilo de coordenação de Simpson. Ele tem a capacidade de agregar pessoas, entende suas limitações e suas qualidades, cobra sem ferir e sem ser paternalis-
z
~ ta", diz Luiz Eduardo Camargo. Em segundo lugar, ainda de acordo com Camargo, a network da Xylella foi de alta eficiência, até pela sintonia que se conseguiu para a troca de informações, graças ao trabalho do Centro de Bioinformática. "E finalmente, tudo funcionou bem pela sensação de bem estar que prevalecia nas reuniões do grupo".
Mais velho e mais experiente, o professor Zago vai praticamente pela mesma linha na avaliação das razões do sucesso do trabalho na ONSA. "Trabalhar em rede era um enorme desafio, porque não tínhamos a cultura da cooperação", diz. Segundo ele, a personalidade de Simpson, a percepção dos pesquisadores de que acabara a competição entre eles e chegara o momento de se unir para competir com os grupos de fora e resultados rápidos, porque o grupo se unia para resolver os problemas, foram os componentes básicos do excelente funcionamento do projeto. Excelência reconhecida pelo Steering Committee quando disse, em seu parecer de 10 de novembro último, que a rede estava funcionando em São Paulo "ainda melhor do que funcionou na Europa" e recomendou à FAPESP esforçar-se para incorporar tudo que fora listado de positivo no projeto da Xylella aos projetas genoma futuros. Dessa lista constam, entre outras coisas, "o excelente espírito de grupo construído na rede" e "o modo entusiasmado, positivo e acolhedor com que Andrew Simpson exerceu seu papel de coordenador de DNA".
Simpson, por sua vez, afirma que "o segredo do sucesso do projeto foi a dedicação intensa de jovens pesquisadores e o aproveitamento do enorme talento disponível entre o grupo". Segundo ele, "esses talentos precisam ser valorizados e precisam saber que são valorizados".
Tudo deu certo com a Xylella. Agora o futuro, dizem os pesquisadores num coro virtual, está aberto para novos e maiores desafios. •
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO OE 1000 21
CIÊNCIA
IMUNOLOGIA
Uma vitória contra os fungos
Caminhos novos para o tratamento de uma micose tipicamente tropical
Overão, quando o calor e a umidade aumentam, é a épo
ca própria das micoses. Se localizadas nas mãos ou nos pés, podem ser tratadas mais facilmente. Às vezes formam manchas brancas na pele ou até coçam, numa preciosa indicação de sua gravidade. Pior é quando não têm tempo certo para aparecer, espalham-se pelo organismo e permanecem silenciosas durante anos. É o caso de uma micose de nome longo, que num primeiro momento causa certo estranhamento, ainda que tipicamente tropical - a paracoccidioidomicose ou, simplesmente, PCM. Causada pelo fungo Paracoccidioides brasiliensis, é difícil de ser detectada, até se manifestar em colônias que se formam normalmente nos pulmões. A busca por detalhes da origem e do comportamento desse fungo tem frustrado pesquisadores do Brasil, Argentina, Venezuela e Colômbia, os países mais atingidos. Mesmo assim, por meio da biologia molecular, a PCM pode estar sendo derrotada.
Um trabalho realizado na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp, antiga Escola Paulista de Medicina) levou ao isolamento e ao estudo da ação biológica de um componente molecular do fungo e agora abre caminho para a detecção da infecção, antes que ela se manifeste clinicamente, e para uma vacina contra a PCM. É a glicoproteína gp43 (a abreviação gp refere-se à estrutura de uma glicoproteína: além dos aminoácidos formadores da proteína, há uma cadeia de caboidra-
22 • JANEIRO I FEVEREIRO DE lODO • PESQUISA FAPESP
Travassos: o conhecimento da gp43 conduz à imunização experimental contra a PCM
tos). Já se sabe que essa molécula permanece frouxamente ligada à parede que reveste a membrana celular do fungo e é desprendida para o meio externo, mas suas funções, em relação ao próprio fungo, permanecem pouco conhecidas.
"Ao longo da evolução do fungo, a gp43 pode ter sido uma enzima responsável pela degradação de açú-
cares da parede celular, embora atualmente não tenha mais essa função", conta a biomédica Rosana Puccia, uma das pesquisadores que estuda essa molécula desde os anos 80. Como resultado do seu mestrado e doutoramento, concluído em 1990, Rosana identificou a gp43 como uma molécula protéica do P. brasiliensis que inicia as reações imuno-
Efeito do desequilíbrio ambiental O VII Encontro Internacional
sobre Paracoccidioidomicose, realizado em abril de 1999, em Campos de Jordão, mostrou a dimensão atual da PCM, descrita pela primeira vez em 1908 pelo médico carioca Adolfo Lutz (1855-1940). O pesquisador Boda Wanke, do Hospital Evandro Chagas, no Rio de Janeiro, expôs um trabalho demonstrando que o Brasil tem mais de 80% dos registras de PCM na América Latina.
Não há registro de surtos epidêmicos, mas a doença ameaça alas-
trar-se em áreas de ocupação recente, em Rondônia, Tocantins, Pará, Mato Grosso e Acre, onde era desconhecida. Wanke atribui essa expansão ao desequilíbrio ambiental. O desmatamento acelerado e o revolvimento do solo para plantio deixam o fungo em suspensão na atmosfera, facilitando a contaminação humana.
Outro estudo, feito em conjunto por pesquisadores da Unifesp e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro, com base em
lógicas no organismo humano contra a PCM, um marco em sua carreira científica, registrado em I986 com a publicação de artigo na revista Infection and Immunity. No papel de antígeno, como são chamados os elementos estranhos ao corpo, a gp43 aciona a produção de anticorpos, como ela demonstrou.
Rosana não parou. Tornou-se professora da disciplina de Biologia Celular da Unifesp em I993 e uma das pesquisadoras do grupo reunido por Luiz Rodolpho Raja Gabaglia Travassos, seu orientador no mestrado e doutorado. Foi Travassos quem coordenou durante três anos o projeto temático Biologia Molecular e Imunobiologia de Componentes Exocelulares Purificados de Paracoccidioides Brasiliensis - Relação entre Estrutura e Função. O trabalho contou com recursos da FAPESP da ordem de R$ 250 mil, empregados principalmente em equipamentos e reagentes para a purificação e análise de proteínas.
Os epitopos - Nesse estudo, os pesquisadores da equipe de Travassos aprofundaram as descobertas de Rosana. Numa busca mais detalhada, verificaram que o mecanismo básico envolvido na origem e prevenção da PCM envolve um trecho específico da gp43, ou epitopo, contido em uma
3.I8I mortes, entre I980 e I995, aponta a PCM como a oitava causa de mortalidade entre as doenças infecciosas e parasitárias. É comparada às grandes endemias, como a doença de Chagas, tuberculose, malária, esquistossomose, sífilis e hanseníase. Com uma taxa de mortalidade média anual de I,48 por milhão de habitantes, predomina entre a população masculina (84,75% dos casos na faixa entre 30 e 59 anos).
A infecção ocorre pela aspiração de formas arredondadas do P. brasiliensis que penetram nos alvéolos pulmonares. No organismo humano, o fungo se reproduz no
O fungo: em forma de mickey mouse
seqüência de apenas IS aminoácidos. Quase perdido entre os 4I6 aminoácidos da gp43, é esse trecho que será reconhecido pelas células do sangue chamadas linfócitos T, que a partir desse momento vão entrar em ação para proteger o organismo. Há outros epitopos, de tamanhos variados, que acionam a produção de anticorpos ou de outras células de defesa,
pulmão como leveduras capazes de brotamento múltiplo, dando origem a figuras características em roda de leme ou mickey mouse -quando se formam apenas duas gêmulas, semelhantes às orelhas do famoso rato.
Podendo permanecer incubada por 10 a 20 anos, a PCM manifestase na sua forma aguda pela formação de gânglios e intenso comprometimento do sistema linfático regional. Se as células fúngicas não são contidas, podem espalhar-se pelo organismo e afetar o sistema nervoso central, na forma mais grave e rara da PCM.
mas é esse, de IS aminoácidos, o único cuja localização e efeito encontram-se mais conhecidos.
Essa descoberta foi o resultado da tese de doutoramento, concluída no ano passado, de Carlos Pelleschi Taborda, hoje fazendo pós-doutoramento no Albert Einstein Medical School, em Nova York, nos Estados Unidos. Sua rotina, durante meses, consistia em injetar uma solução da gp43 ou de seus fragmentos de peptídios em centenas de camundongos de linhagens especiais, chamados isogênicos. Sintetizados no Departamento de Biofísica da Unifesp, os fragmentos de IS a I8 aminoácidos, PI, P2, P3 . . . , representavam toda a cadeia protéica da gp43. O peptídio que deu mais certo, como se verificaria, foi o PIO, justamente o tal epitopo de IS aminoácidos.
O efeito da molécula inteira e dos fragmentos foi avaliado em células crescidas no laboratório e em camundongos. Os animais imunizados com a gp43 ou com o PIO desenvolveram uma infecção pulmonar cerca de 200 vezes menos intensa que os animais controle não imunizados. Também se verificou que a infecção provocada pelo fungo não chegou a outros órgãos nos animais protegidos. Esse efeito era o resultado do estímulo de uma espécie de linfócitos T, os CD4+ Th-I, que produzem substâncias protetoras chamadas interleucinas. Essas células são responsáveis pelas reações intradérmicas positivas quando se injeta a gp43 ou o PIO na pele de pacientes com PCM ou em animais infectados pelo fungo.
Na etapa das experiências realizadas no laboratório em placas de plástico, ou in vitro, os pesquisadores compararam o comportamento de linfócitos T de dois tipos. Um era proveniente de indivíduos infectados, de pacientes com PCM instalada na forma aguda ou crônica, de animais imunizados ou igualmente infectados pelo fungo. Outra eram células T normais, usadas como controle. Travassos conta que somente os linfócitos T provenientes
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • 23
de pessoas ou de animais infectados pelo fungo eram capazes de proliferar em presença da gp43 ou do P10. Do mesmo modo, a produção de anticorpos contra a gp43 era alta nos indivíduos infectados. Segundo o pesquisador, esses resultados atestam que a gp43, além de ser um bom antígeno para diagnóstico, aciona uma resposta proliferativa de linfócitos T protetora contra a micose.
Vez ou outra, a equipe de Travassos - de 17 pesquisadores, incluindo estudantes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) - parava para compartilhar as novidades, já que a pesquisa dividia-se em três subprojetos. Um deles consistia na clonagem e no seqüenciamento completo do gene da gp43. Foi esse trabalho- resultante da tese de doutoramento de Patricia Cisalpino -que possibilitou toda a pesquisa subseqüente para o mapeamento do epitopo de células T.
Surgiam outras razões para festejar à medida que se conhecia melhor o comportamento bioquímico do fungo. Ao encerrar o doutoramento, Rosana Puccia ficou com a impressão de que a gp43 poderia ter uma atividade enzimática, por meio da qual poderia quebrar proteínas. Como verificou posteriormente, não era bem assim. Rosana, em colaboração com Adriana Carmona, do Departamento de Biofísica da Unifesp, encontrou outra molécula, uma serino-tiol protease, esta sim uma enzima do fungo que faz o que a gp43 não poderia fazer. Não parece estar associada diretamente a reações do sistema imunológico, mas se constitui provavelmente em um fator de virulência do P. brasiliensis. "É possível que essa enzima tenha uma ação degradando compostos da matriz extracelular e ajude desta forma
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o fungo a invadir os tecidos", diz a pesquisadora.
Isolamento difícil - Ainda há muito por saber sobre a PCM. O próprio fungo exibe um comportamento bastante discreto. Numa região en-
dêmica de São Paulo (Botucatu, Manduri, Pardinho e Pratânea), pesquisadores da área de microbiologia e imunologia do Instituto de Biocências da
em ambiente natural. Ensaios realizados em laboratório demonstraram que um pesticida de uso comum, o Benlate, em concentrações de 25 a 100 vezes menores que produtos similares, elimina até 98,3% dos fungos em amostras infectadas de células de animais.
O trabalho evolui agora para a determinação da variabilidade genética de moléculas-chave como a gp43 e para o desenvolvimento de vacinas de plasmídeos contendo gene da gp43, para imunização experi-
mental de animais. ~ Travassos confia que ~ ~ métodos mais preci-
As regiões Sudeste e Centro-Oeste apresentam
as maiores incidências de PCM no Brasil. um dos
sos de diagnóstico podem melhorar o conhecimento epidemiológico da PCM, cuja notificação não é obrigatória. Há poucos casos de internamento hospitalar (entre 50 e 75 casos por ano em São Paulo), mas a alta reatividade dos testes de sensibilidade, a chamada reação intradérmica, entre jovens em áreas endêmicas (62% em São Paulo, 52% na Venezuela e 41% no Equador) indica que a PCM pode estar se
mais países mais atingidos na América latina
Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Botucatu, tiveram de coletar e examinar cerca de 40 ani-. . mms- morcegos, cap1varas, serpen-tes e tatus - até descobrir em apenas um deles, o tatu-galinha (Dasypus novemcinctus), especialmente no pâncreas, o reservatório natural do fungo.
Mesmo assim, o fungo não tem sido encontrado mais facilmente em ambientes quentes, úmidos e sombreados, os preferidos dos tatus. Com base em um estudo que reuniu a Unifesp e a Universidade Estadual de Londrina, foi sugerido que o uso de fungicidas agrícolas pode estar interferindo na dificuldade de se encontrar o P. brasiliensis
propagando numa velocidade maior do que se consegue detectar. •
PERFIL:
• LUIZ RODOLPHO RAlA GABAGLIA
TRAVASSOS, 61 anos, graduou-se em Medicina na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde desenvolveu o doutorado e lecionou entre 1963 e 1980. É professor titular da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) desde 1980. Projeto temático: Biologia Molecular e Imunobiologia de Componentes Exocelulares Purificados de Paracoccidioides Brasiliensis - Relação entre Estrutura e Função Investimento: R$ 249.090,00
Cobertura de diamante
Dentro dos cilindros, o vácuo é quase total. A temperatura, próxima a 800 graus Celsius. Nessas condições, um dos laboratórios da Universidade de São Francisco (USF), em Atibaia, produziu uma das maiores áreas recobertas de diamante sintético no Brasil, com 80 centímetros quadrados. A película que cobre a placa arredondada (10,2 centímetros de diâmetro e 0,25 milímetro de espessura) tem uma espessura de 80 a 100 microns (um micra é um décimo do milímetro). João Roberto Moro, responsável pelo laboratório de Diamantes e professor da Faculdade de Engenharia da USF, conta que essas placas poder ser úteis na indústria aeroespacial - por exemplo, em juntas dos braços de satélite que se abrem no espaço e não podem ter lubrificantes, que se desfazem sob gravidade muito baixa. O trabalho desenvolveu-se em colaboração com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Instituto de Estudos Avançados do Centro Técnico Aeroespacial (CTA), ambos de São José dos Campos. É também o ponto alto de um projeto de
CIÊNCIA
... e Moro, da USF, com o reatar: aplicações em braços de satélites
pesquisa que focava inicialmente o desenvolvimento de tubos de 0,9 mm, com aplicações práticas mais imediatas (em brocas de dentista, por exemplo) . Formado pela Unicamp, Moro conta que agora sua equipe consegue também fazer camadas com até 1 milímetro de diamante sintético, de propriedades de alto interesse: é o material mais duro que qualquer outro, quimicamente inerte, isolante elétrico e de baixo coe-ficiente de atrito.
laboratórios novos no Ceará
•
Chegou no final de ano o quarto e último lote de equipamentos importados da Alemanha, a um custo de US$ 1 O milhões, que vão renovar os laboratórios da Fundação Núcleo de Tecnologia Industrial do Ceará (Nutec) e das três universidades estaduais. A nova aparelhagem permitirá também a criação do curso de Ecologia da Universidade Estadual do Ceará e, no caso da Nutec, atender a demandas do setor produtivo. •
Eletricidade e água no sertão
Aos poucos, os moradores das propriedades rurais de Araripina, Serra Telhada e Afogados da Ingazeira, no interior pernambucano, deixam de assistir televisão movida a bateria e de usar óleo diesel e querosene para iluminar suas casas. O Núcleo de Apoio a Projetos de Energias Renováveis (Naper) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) está instalando sistemas de captação e produção de energia solar nesses municípios, a um cus-
Energia solar: conforto
to de US$ 800 a US$ 1.100 por unidade. O financiamento provém do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Eletrobrás e de entidades não-governamentais. Estão em operação 126 sistemas, compostos por uma placa captadora, uma bateria e um controlador de voltagem, que alimentam até quatro pontos de luz de 60 Watts por cinco horas e, se faltar sol, armazenam energia por 48 horas. Além de prepararem
os moradores para cuidar dos equipamentos, os pesquisadores instalaram cinco sistemas de bombeamento de água para poços acionados a energia solar, os Amazonas ou cacimbões. O reservatório de água é feito com placas prémoldadas feitas no próprio local pelos moradores. Criado em 1995, o Naper procura amenizar o precário quadro da eletrificação rural, não rentável para as concessionárias. No Nordeste, apenas 14% das propriedades rurais recebem energia elétrica. •
Enfoque diferenciado no exame de HIV
Pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) aplicaram em recém-nascidos o chamado teste de carga virai, que pode detectar diretamente a presença do vírus HIV, causador da Aids. Trata-se de um enfoque inusitado. Para saber se um filho de uma mãe com HIV pode desenvolver a doença, normalmente se avalia a presença de anticorpos contra o vírus, não do próprio HIV - e os anticorpos não indicam necessariamente a contaminação pelo vírus. Apresentado no final de janeiro na Conferência sobre Retrovírus e Infecções Oportunistas, em San Francisco, nos Estados Unidos, o teste reduz de 18 meses para um mês a confirmação da infecção em bebés e abre a possibilidade de iniciar logo o tratamento com drogas antivirais. Os pesquisadores estimam que essa alternativa pode reduzir pela metade os custos em testes de laboratórios e medicamentos profiláticos. •
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • 25
CIÊNCIA
SAÚDE PÚBLICA
A genética da surdez Teste simples detecta problemas de audição em recém-nascidos
D e cada 1.000 crianças, uma nasce com problemas de sur
dez. Dados mundiais indicam que 60% dos casos são causados pela herança genética do bebê. No Brasil, mesmo que a maioria dos casos tenha causas não-genéticas, como rubéola, meningite ou falta de oxigênio no parto, com a melhoria da atenção da saúde materno-infantil a proporção de casos de origem genética tende a aumentar progressivamente. Entretanto, dificilmente a surdez é constatada antes que a criança complete dois anos. Nessa altura, ela já pode ter sofrido prejuízos, causados pela falta de estímulos cerebrais relacionados com a fala, que vão prejudicá-la pelo resto da vida. É consenso entre os médicos que a melhor época para o tratamento ocorre por volta de um ano e meio.
Um teste simples e barato pode mudar essa situação e mostrar, logo na maternidade, se o bebê tem o problema. É o que indicam os primeiros resultados de um estudo que vem sendo realizado no Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética ( CBMEG) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O teste, que custa apenas o equivalente a US$ 5, indica com certeza se o recém-nascido tem o problema genético mais comum relacionado com a surdez, a mutação 35delG no gene conexina 26.
"É importante informar à população, aos médicos e aos pesquisadores a existência desse teste, tão simples quanto outros, já feitos rotineiramente': diz a coordenadora do estudo, a pesquisadora Edi Lúcia Sartora-
26 • JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
to. O projeto, chamado Aplicação das Técnicas de Biologia Molecular no Diagnóstico Etiológico da Deficiência Auditiva, começou em 1999, com apoio da FAPESP, e tem prazo de dois anos para ser terminado.
Além de Edi, participa do estudo a médica Andréa Trevas Maciel Guerra, do Departamento de Genética Médica da Unicamp, atuando como geneticista responsável pela triagem e avaliação clínica das crianças envolvidas. A contribuição da FAPESP foi de R$ 10 mil, mais US$ 10 mil. Essa verba cobre, basicamente, a aquisição de material de apoio.
Maior precisão - O teste é apenas um dos primeiros resultados da pesquisa, que envolve o estudo de outros genes relacionados à surdez. ''Além do diagnóstico precoce, à medida que os estudos avançarem será possível fazer prognósticos mais precisos sobre a doença, uma vez que existem diferentes graus de surdez e diferentes genes envolvidos", diz Edi. Como se trata de um problema genético, é possível calcular a probabilidade do aparecimento de casos de surdez nu-
ma família. Já se sabe, por exemplo, que o simples aparecimento da mutação 35delG não deixa a criança surda: é preciso que ambos os pais tenham o mesmo problema, mais comum em pessoas de origem italiana, grega ou espanhola.
Para se fazer o teste, recolhe-se uma pequena amostra do sangue do recém-nascido, que pode ser colhida mesmo num pedacinho de papel. O resultado sai em algumas horas. A
pesquisadora trouxe a idéia do teste do congresso da Sociedade Americana de Genética Humana realizado em 1998 em Denver, no Colorado, nos Estados Unidos. Aqui, adaptou a metodologia, conhecida como PCR alelo-específico.
O teste consiste em ampliar a região do gene a ser estudada, por meio de uma reação em cadeia de polimerase. O especialista verifica, então, se a região apresenta a mutação mais freqüente nos casos de surdez de origem genética. Essa mutação é conhecida como 35delG e ocorre no gene conexina 26, encontrado no braço longo do cromossomo 13. É um chamado hot spot (ponto quente) do gene- um lugar suscetível a alterações, provavelmente por causa da repetição da base guanina.
Edi está realizando uma campanha para divulgar a existência do teste, especialmente entre entidades de
apoio aos deficientes auditivos. Ela admite que o teste precisa de materiais específicos e pessoal qualificado e de uma avaliação prévia cuidadosa, realizada por um geneticista clínico. Mas, na execução e análise, é muito simples. Além disso, é mais barato que o teste otoacústico, um exame capaz de determinar o nível de audição do bebê por meio de uma sonda que mede vibrações sonoras no canal auditivo, que custa US$ 7,50.
Dois testes - Desde 1993, o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos (NIH) vem recomendando a realização do teste otoacústico nos recém-nascidos, reconhecendo a importância dos problemas de surdez serem descobertos antes dos dois anos de idade. Em janeiro deste ano, a prefeitura de Campinas tornou obrigatória a realização desse exame nas maternidades do município.
Amostras de sangue - Até o mês de janeiro, a pesquisa tinha estudado 27 famílias. De acordo com Edi, a idéia da pesquisa surgiu em conversas com Andréa, começando no Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação Doutor Gabriel Porto (Cepre), da Unicamp.
Uma participação fundamental partiu de Joyce Maria AnnichinoBizzacchi, coordenadora -associada do Centro de Hematologia e Hemoterapia (Hemocentro) da Unicamp,
gene conexina 26 rputante para que a criança nasça surda.
De posse dessas informações, os pesquisadores pretendem fazer o aconselhamento genético das famílias com problemas de surdez hereditária. Nestes casos, examinam o histórico familiar e, quando necessário, explicam os riscos de recorrência ou surgimento da surdez. Vão lembrar, principalmente, que as crianças heterozigotas têm 25% de chance de terem filhos com deficiência auditiva de ori
z gem genética se casarem com ~ outra também heterogizota. :il ::>
O risco aumenta quando ~ se sabe que as populações do
sul da Europa, de onde se origina grande parte dos brasileiros, têm as proporções mais altas de genes mutantes. A porcentagem mais alta é a da Itália, onde 4% da população é heterozigota para a mutação 35delG. Outros índices altos: Grécia, com 3,5%, e Espanha, 2,3%. Por outro lado, nunca se encontrou a mutação entre pessoas de origem asiática. A pesquisadora diz que
não pede que a lei seja emendada ou alterada. Também não quer envolver-se diretamente em assuntos políticos.
Edi: em campanha para divulgar o teste genético de surdez
A proporção nos Estados Unidos, outro país de população de origem heterogênea, é de 1%, igual à do Brasil.
Mas defende que, se o teste otoacústico encontrar algum problema de surdez na criança, ela seja submetida também ao teste genético. "O exame otoacústico informa se o bebê vai ter um problema de audição, mas não diz se sua causa é genética ou não': explica. "Também não informa o grau de surdez que a criança tem ou desenvolverá. O ideal seria que, depois do teste otoacústico, fossem feitos, além de outros testes audiológicos, os testes genéticos nos recém-nascidos com problemas", acrescenta.
Edi se diz disposta a passar a metodologia para outros centros, fora da Unicamp, e para laboratórios interessados em fazer a análise. Para ela, essa divulgação faz parte da pesquisa. "A FAPESP está apoiando um projeto importante para a saúde pública e os resultados devem ser divul-gados", observa.
pelo estudo em colaboração do rastreamento da mutação 35delG em 620 amostras de sangue colhidas ae cordão umbilical de recém-nascidos da região de Bragança Paulista.
A partir dessas amostras, foi possível chegar à conclusão de que a mutação 35delG é "muito freqüente" no Brasil. "Falar em termos de população brasileira é difícil, porque ela é muito heterogênea': diz Edi. Mas o índice encontrado está em torno de 1%, o que significa que aproximadamente 1 entre cada 100 recém-nascidos são heterozigotos para a mutação (com a mutação no gene conexina 26 herdada apenas do pai ou da mãe) .
Logicamente, nem todas essas crianças são surdas. A surdez provocada pela mutação 35delG do gene conexina 26 é dada pelo padrão autossômico recessivo: tanto o pai como a mãe da criança precisam ter o
"De qualquer maneira, outros estudos são necessários, pois os dados disponíveis se baseiam apenas em amostras da população", comenta Edi. Na França, por exemplo, até hoje apenas 68 indivíduos foram estudados com relação à mutação.
Origem e tratamento - Nos casos de surdez de origem genética, 70% são não-sindrômicos, ou seja, a criança não tem problemas de formação que possam estar ligados à surdez. Como os órgãos estão bem formados, o tratamento é facilitado.
Existem muitos genes envolvidos nos casos de etiologia genética da surdez - até o momento, 14 já foram mapeados e clonados. Mas na grande maioria dos casos de surdez de origem genética a causa está numa mutação do gene conexina 26. A mutação mais freqüente, ocorrendo em
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • 27
70% dos casos, é a deleção de uma base, a guanina. É nessa deleção que consiste a mutação 3SdelG. O tratamento mais indicado é um implante de cóclea, uma parte do labirinto, em espiral, também conhecida como caracol. O período ideal para esse implante ocorre quando a criança tem por volta de um ano e meio. Nessa fase, ela tem mais oportunidades de aproveitar os estímulos cerebrais ligados à fala, muito desenvolvidos nessa época.
Para o implante ter resultado, a cóclea da criança deve estar íntegra e não ter nenhum comprometimento neurológico. É o que acontece nos casos de origem genética. A mutação 3SdelG do gene conexina 26 não altera a estrutura da cóclea. Apenas faz com que o produto desse gene, uma proteína também chamada conexina, não chegue a funcionar.
Ou seja, o tratamento tem tudo para dar certo se for realizado no momento apropriado. O problema é identificar a causa genética e providenciar sua correção antes que esse período passe. Além disso, ressalta a pesquisadora, é muito importante o diagnóstico naqueles casos de etiologia indefinida em que existe uma angústia muito grande em estimar os riscos de recorrência na família. É o que o exame desenvolvido pelos pesquisadores da Unicamp pode fazer . •
PERFIL:
·A professora Em LúCIA SARTORATO tem 37 anos. Formada em Química pelo Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), tem mestrado e doutorado em Genética Médica, obtidos no Instituto de Biologia da mesma universidade. Desenvolveu parte de sua tese de doutorado no Centro Médico da Universidade de Nova York, nos Estados Unidos. É pesquisadora do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética (CBMEG) da Unicamp desde 1997. Projeto: Aplicação das Técnicas de Biologia Molecular no Diagnóstico Etiológico da Deficiência Auditiva Investimento: R$ 10 mil e US$ 10 mil
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CIÊNCIA
AMBIENTE
A qualidade é um mito Poços contaminados são comuns entre produtores de leite
V ida na fazenda significa ambiente limpo, ar puro e águas
cristalinas, que correm de cascatas paradisíacas e de rios ainda não tocados pela poluição, certo? Lamentavelmente, não é bem assim. Uma investigação científica realizada em Jaboticabal, na região nordeste do Estado, derrubou o mito da água limpa, pelo menos a envolvida na produção do leite, ao evidenciar a baixa qualidade das fontes utilizadas cotidianamente para higiene de equipamentos e úberes dos animais, consumo do gado e dos próprios produtores.
O resultado surpreendeu o próprio pesquisador responsável por esse trabalho, o médico veterinário Luiz Augusto do Amaral, professor da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista (Unesp ), em Jaboticabal. Antes de iniciar o estudo, Amaral suspeitava da possível contaminação dos mananciais, mas não poderia imaginar que o problema fosse tão grave.
No final do trabalho, o pesquisador verificou que 90% das amostras da água utilizada na limpeza de equipamentos e do úbere dos animais, colhidas em 30 propriedades produtoras de leite, estavam fora dos padrões microbioló
água empregada para consumo animal e humano também se mostrou com índices elevados de contaminação por microrganismos, indicadores de sua baixa qualidade higiênica e sanitária.
Em estudos anteriores, Amaral identificou, em 30% das amostras de água utilizada na produção de leite, higiene de equipamentos e úbere dos animais, colônias de bactérias Staphylococcus aureus, apontadas nas cidades como as causadoras de infecções hospitalares, de difícil resolução. Essas bactérias, transmitidas por meio da água durante a lavagem do úbere, podem provocar mastites, uma inflamação da glândula mamária que gera desconforto nos animais, reduz a produtividade e deprecia a qualidade do leite. Os Staphylococcus aureus podem se constituir em fonte de intoxicações em consumidores de
gicos de potabilidade. A Amarai : a situação é preocupante, mas reversível
leite bovino, principalmente crianças e idosos, lembra o pesquisador.
As conclusões da pesquisa que ele desenvolveu, intitulada Qualidade Higiênico-Sanitária e Teor de Nitratos em Amostras de Água de Dessedentação Animal e Humana em Propriedades Leiteiras Situadas na Região Nordeste do Estado de São Paulo, com R$ 9,2 mil financiados pela FAPESP, preocupam também por outra razão. Os produtores não apenas desconhecem que a água não é apropriada como, ao contrário, estão convencidos de que a água é boa e, segundo eles, muito melhor do que a consumida nascidades (58,6% dos entrevistados).
Confiança - Amaral constatou uma idéia generalizada: para os produtores, não há por que se preocupar muito com a qualidade da água fornecida aos animais, já que o gado geralmente consome qualquer tipo de água. Outra razão para a tranqüilidade é que, de acordo com a opinião unânime dos moradores das propriedades que ele estudou, a água é boa. Metade dos produtores contou que a água de suas terras "é melhor que a da cidade". Os moradores de algumas propriedades chegam ao extremo de levar a água para acidade, pois acreditam que seja melhor que a fornecida pelo sistema de tratamento público. Carregam satisfeitos seus galões também porque "a água da cidade tem gosto ruim".
A pesquisa contraria frontalmente as impressões dos produtores. Havia algum manejo de dejetos em apenas três das propriedades visitadas. Como sabemos, se não tratados adequadamente, os resíduos, especialmente os orgânicos, como fezes e urina, tornam-se fontes de microrganismos patogênicos (bactérias, vírus, protozoários), que se infiltram no solo, favorecidos eventualmente pela chuva, atingem a água subterrânea, que abastece as propriedades na zona rural, e causam doenças ao ser humano e aos animais. Em apenas uma entre as 30 propriedades se fazia a limpeza e desinfecção periódica
do reservatório de água, que em geral se apresentava em condições inadequadas, depreciando ainda mais a qualidade da água.
Epidemias- A história tem mostrado as conseqüências do descuido
derada uma importante via de transmissão de agentes causadores de doenças, principalmente em bovinos, suínos e aves.
Segundo Amaral, minas e poços rasos, mais sujeitos à contaminação que os profundos, constituem qua-
Fonte de água a céu aberto: precariedade e falta de controle sanitário
Poços rasos Espaço livre para a proliferação
por microrganismos
Profundidade Ocorrência (em metros) (em%)
O-lO 56,5
I 1-20 20,0
21-30 6,6
mais de 30 13,3
Fonte: Luiz Augusto do Amarai/ Unesp
com a água, que, diga-se logo, não se restringe ao Brasil. Para exemplificar o papel da água na transmissão de doenças, Amaral cita os surtos de cólera ocorridos em 1848 em Londres, descritos em estudos clássicos pelo médico epidemiologista inglês John Snow (1813-1858) e, no Brasil, a epidemia de cólera dos anos 90. No caso dos animais, lembra o pesquisador, a água é consi-
se a totalidade das fontes de abastecimento nas áreas rurais tanto aqui quanto nos Estados Unidos, por exemplo. Faltam no Brasil levantamentos sobre a ocorrência de doenças veiculadas pela água, mas nos Estados Unidos já se verificou que metade dos casos de doenças transmitidas por ela, na década de 70, apresentou uma relação direta com a água subterrânea contaminada, a despeito do inegável- ainda que limitado - poder filtrante do solo.
As propriedades que Amaral visitou não eram assim tão pequenas, como se poderia imaginar num primeiro momento. O pesquisador selecionou os locais onde seriam colhidas as amostras de água por sorteio, a partir de um universo de 100 propriedades agropecuárias previamente identificadas nos municípios de Pitangueiras, Sertãozinho, Pontal, Taiacu, Taiúva, Monte Alto, Barrinha, Jaboticabal, Morro Agudo, Vi-
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO OE 2000 • 29
radouro, Terra Roxa e Sales de Oliveira - todas elas fornecedoras de leite para a indústria de laticínios da região nordeste do Estado.
A maioria das 30 propriedades selecionadas (82,7%) tinha entre 11 e 300 alqueires (em São Paulo, 1 alqueire equivale a 24,2 mil metros quadrados). Quase metade delas (ou 44,8%) abrigava uma criação com 51 a 100 animais, seguida por outro grupo, de 23,3% das localidades, com menos de 50. Não eram terras dedicadas exclusivamente à pecuária: grande parte da área era ocupada pelo cultivo de cana-deaçúcar, que favorecia o adensamento dos animais (de 0,5 a 30 animais por alqueire, resultado que em alguns casos facilitava a contaminação do solo e dos lençóis freáticos, segundo o pesquisador).
A profundidade - Em quase um terço das propriedades (31,0%) moram de 16 a 30 pessoas, vindo em segundo lugar, com 27,6% do total, aquelas com 6 a 10 moradores. Os poços constituíam 73,3% das fontes de água, e as mi-nas, 26,67%. Um detalhe importante a respeito dos po-
Um ponto positivo: predominavam os bebedouros para animais de cimento ou de concreto (66,6%), que facilitam a limpeza e a desinfecção. A água dos bebedouros é que não era boa. Amaral verificou que 43,3% das amostras de água colhidas na época de chuvas e 50% no período de estiagem apresentaram-se fora dos padrões para consumo animal recomendados pela resolução número 20 do Conselho Nacional do Meio Ambiente ( Conama), de 18 de junho de 1986.
O pesquisador explica que, segundo essa determinação, a água utilizada para dessedentação animal pode conter 4 mil coliformes fecais por 100 mililitros de água e 20 mil coliformes totais. Para Amaral, são valores condescendentes, que deveriam ser revistos. "Uma água com esses níveis de indicadores bacterianos de poluição fecal pode ser perigosa para animais, principalmente jovens, como os bezerros", diz.
Reservatório: água não-potável
Fora dos padrões- Mesmo de acordo com os limites atuais delineia-se um quadro de alto risco para a saúde bovina. Nas amostras de água utilizada na produção de leite, na la-
Contaminação comprovada
A maioria das amostras de fontes de água (poços e minas), reservatórios e de consumo humano encontra-se fora dos padrões
microbiológicos de potabilidade estabelecidos pelo Ministério da Saúde ços: a profundidade variava até 10 metros em 56,6% dos casos e até 20 em 20% do total. "A pouca profundidade limita o poder filtrante do solo e expõe as fontes de água à contaminação, principalmente por águas de escoamento superficial", diz Amaral.
PERÍODO FONTES RESERVATÓRIOS CONSUMO
Havia, é certo, algum cui-dado. Havia tampa em 93,1% dos poços e calçada ao redor de 70% deles. No entanto, as obras por si só não justificariam o pouco cuidado em relação ao tratamento da água: em apenas 6,6% das propriedades -ou, em termos absolutos, duas residências- utilizava-se filtro de água, e em apenas 3,3%, cloro. "A maioria consumia a água diretamente da torneira situada no interior das residências", conta o pesquisador.
30 • JANEIRO I FEVEREIRO DE 1000 • PESQUISA FAPESP
HUMANO Amostras Contaminação Amostrils Contaminação Amostras Contaminação
(%) (%) (%)
Chuvas 27 90,0 27 90,0 9 96,7
Estiagem 25 83,3 29 96,7 27 90,0
Água ruim também para os animais
A maioria das amostras de água de consumo animal e utilizada na produção de leite encontra-se igualmente fora dos padrões microbiológicos de potabilidade estabelecidos pelo Conama.
A situação é ainda mais grave no período de chuvas do que nas análises das amostras para consumo humano
PERÍODO CONSUMO ANIMAL
Amostras Contaminação (%)
Chuvas 13 43,3
Estiagem IS 50,0
Fonte: Luiz Augusto do Amarai/ Unesp
PRODUÇÃO DE LEITE
Amostras Contaminação (%)
30 100,0
27 90,0
Bebedouros: facilidade na limpeza
vagem de equipamentos e do úbere do animal, colhidas no estábulo em períodos de chuva, Amaral constatou que 100% estavam fora dos padrões microbiológicos estabelecidos para esse tipo de água, contidos no Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal. Nos períodos de estiagem, o índice foi de 90%. Em 70% das amostras durante a época de chuvas e 66,7% delas, em época de estiagem, havia Escherichia coli, indicadora fidedigna de poluição fecal, evidenciando o risco da existência de patógenos de origem intestinal, que podem infectar os animais e os seres humanos. Em relação à água consumida pelo animal, 43,3% das amostras estavam fora das especificações oficiais, em períodos de chuvas, e 50% na estiagem.
Nas amostras de água de fontes utilizadas para consumo humano, diretamente nas moradias das pessoas que habitam a propriedade rural, em períodos de chuva, 96,7% (equivalente a 29 das 30 propriedades) estavam fora dos padrões de potabilidade estabelecidos pela Portaria número 36 de 19 de janeiro de 1990, do Ministério da Saúde. Na estiagem, o índice foi de 90%, correspondente a 27 das 30 propriedades.
Água para animais: com bactérias
Registre-se também a presença de nitrato, composto químico que se origina de matéria orgânica e adubos químicos. Dependendo da concentração na água, podem ser nocivos à saúde humana e animal.
Cont raste - A baixa qualidade da água verificada nesse estudo contrasta com o perfil tecnológico da produção pecuária dessa região bastante desenvolvida do Estado de São Paulo. Nas propriedades estudadas, é comum o uso de ordenha mecânica e o resfriamento do leite na própria fazenda, por exemplo. Da água é que se descuida. "A situação é preocupante."
Mas da própria pesquisa emergem os subsídios para o início de um trabalho não apenas de prevenção da contaminação como de tratamento nos casos em que os lençóis freáticos já se encontram afetados. "É preciso proteger as fontes, monitorar periodicamente a qualidade da água e tratar a água nos casos em que o comprometimento da qualidade esteja em grau elevado", diz o pesquisador, que comprova que o problema é um pouco mais abrangente. Ele próprio coordena uma pesquisa em águas de propriedades de suinocultura, também com o apoio da FAPESP. O tra-
balho ainda está em andamento, mas os resultados preliminares desenham uma situação semelhante à verificada na área leiteira.
Da própria Unesp de Jaboticabal partem não apenas o delineamento do problema, mas também algumas soluções. Uma delas, que conta com a participação do professor Jorge de Lucas Jr., do Departamento de Engenharia Rural, diz respeito à avaliação de biodigestores, para a melhora da qualidade sanitária de dejetos orgânicos, com posterior aplicação no solo. "São caminhos que devem ser mostrados para permitir ao produtor rural a compensação econômica e o controle da poluição do meio ambiente, a fim de proteger a saúde animal e o homem no meio rural", afirma Amaral, que alerta para a necessidade de debater mais intensamente a qualidade da água no meio rural em congressos e encontros com produtores. "A situação é reversível, desde que todos nós, das universidades, das cooperativas, das empresas e produtores, nos empenhemos para começar a considerar a água um nutriente essencial aos animais e aos seres humanos." •
PERFIL:
• LUIZ A UGUSTO DO AMARAL, 47 anos, é médico veterinário graduado pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista (Unesp ), em Jaboticabal, com especialização em Saúde Pública e mestrado e doutorado na área de Saúde Ambiental na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). Leciona no Departamento de Medicina Veterinária Preventiva e Reprodução Animal da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Unesp em Jaboticabal desde 1978. Projeto: Qualidade Higiênico-Sanitária e Teor de Nitratos em Amostras de Água de Dessedentação Animal e Humana em Propriedades Leiteiras Situadas na Região Nordeste do Estado de São Paulo Investimento: R$ 9.200,00
PESQUISA FAPESP • JANEIRO I fEVEREIRO DE 1000 • 31
Soma, Yanasse e Lorena: alternativas na administração do espaço nas empresas
MATEMÁTICA
As fórmulas do lucro
Pesquisa operacional refaz processos e acentua a economia de materiais
Como cortar uma placa de ma-eira para fazer peças para móveis de
modo a obter o maior rendimento possível? Como picotar uma imensa bobina de papel em folhas pequenas com a menor perda possível? E como empilhar contêineres, de modo a otimizar o aproveitamento do espaço, sem, evidentemente, deixar que a pilha desabe? Questões desse tipo não afligem apenas os administradores das empresas. Fazem parte de uma área relativamente nova da engenharia de produção, a chamada Pesquisa Operacional (PO), que ganha espaço no Brasil. Enraizada na matemática aplicada, na computação e na estatística, a pesquisa operacional auxilia a tomada de decisões em áreas tão distintas como finanças, medicina, engenharia elétrica, agricultura, saúde,
32 • JANEIRO I FEVEREIRO DE 1000 • PESQUISA FAPESP
telecomunicações, transportes, engenharia civil, engenharia mecânica, esportes ou operações militares. No Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos, uma equipe coordenada pelo engenheiro eletrônico Horácio Hideki Yanasse, responsável pelo projeto temático Corte e Empacotamento Assistido por Computador, tem conseguido mostrar a empresas a validade da pesquisa operacional.
Mesmo que os resultados finais, além de confidenciais, estejam sujei-
Equações de rara versatilidade
Modelos matemáticos desenvolvidos para a área de corte e empacotamento resolvem problemas práticos encontrados em ambientes totalmente diferentes. Por exemplo, os valores inteiros não negativos (ou seja, O, 1, 2, 3, ... ) atribuídos às
tos a freqüentes revisões e ajustes, há o que contar. A LinSoft, uma empresa de Recife, Pernambuco, desenvolve programas de computador para o carregamento de produtos sobre paletes, com base na pesquisa realizada por um dos integrantes do grupo, o engenheiro Reinaldo Morabito, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Os programas são utilizados pela rede de supermercados Bom Preço com o objetivo de aumentar a eficiência na armazenagem e distribuição de produtos. Funcionam também em Campinas, num centro de distribuição de cargas da Transportadora Americana, que "atua como um laboratório de aplicação para os métodos desenvolvidos", diz Morabito. "A assimilação dessas técnicas num momento de elevada competição entre as empresas pode ampliar a eficiência logística de uma empresa e representar a diferença entre lucros e prejuízos."
Algoritmos - Para atingir essa eficiência, os pesquisadores desenvolvem algoritmos matemáticos. Algoritmos são um conjunto de instruções que viabilizam uma tarefa específica. Podem ser comparados a uma receita culinária, por conterem as indicações por meio das quais se pode chegar a um resultado desejado - uma torta doce, salgada ou um pudim. Os algoritmos são expressos por um conjunto de instruções de programação que indicam as operações a serem executadas pelo computador. O grupo dedica-se à área conhecida como corte e empa-
variáveis x1, x2, x3, x4 e x5 e que satisfazem a uma equação simples, do tipo x1 + 5x2 + 10x3 + 25x4 + 50 x5 = 70, poderiam representar as possíveis combinações nas quais uma barra de metal de 70 centímetros de comprimento poderia ser cortada- em pedaços de 1, 5, 10,25 e 50 cm, por exemplo.
A combinação x1 = 10, x2 = 2, x3 = O, x4 = O, x5 = 1 significaria
cotamento e trabalha no desenvolvimento de algoritmos de corte, facilitando a busca de soluções para os mais variados problemas.
São Paulo (USP), reduzem a distância entre a teoria e as aplicações e fortalecem a interação com as empresas.
Em São Carlos, a Fultec, uma pequena fundição de metais, refez a programação de fornadas e melhorou a capacidade dos fornos. Como resultado, produz mais com menos gastos. Em Araras, também no interior paulista, a fábrica de móveis Colombini tira partido há anos de técnicas de corte de placas de madeira para otimizar a produção de partes de móveis. Mas não são apenas as pequenas empresas que renovam suas formas de organização do espaço. Tradicional fabricante de divisórias de madeira, a Duratex tem registrado ganhos de produtividade após adotar os algoritmos de corte numa serra industrial instalada
Indústria de papel: algoritmos permitem a redução das perdas
Segundo Yanasse, a aplicação de técnicas da pesquisa operacional em bancos inclui a localização de postos de atendimento de agências bancárias e redefinição de políticas de filas ou do número ideal de caixas para manter um nível de serviço satisfatório. Na eletrônica, pode ajudar no desenvolvimento de circuitos integrados. Soma diz que é possível evitar as interrupções freqüentes nas conexões telefônicas.
Fabricação de móveis: otimização no corte de placas de madeira
Morabito e Arenales prevêem economias significativas, principalmente em segmentos industriais que manipulam matéria-prima de custo elevado, como na microeletrônica, ou grande escala de produção, como na indústria de papel e celulose. Neste caso, bobiem Botucatu.
"Temos de oferecer soluções melhores que as disponíveis': diz o matemático Luiz Antonio Nogueira Lorena, colega de Yanasse no Inpe. As alternativas mais convenientes consideram também o tempo de computação necessário para sua operacionalização: além de mais simples, a resposta ao problema deve chegar logo. "Não adianta apresentarmos uma solução mais eficiente se a complexidade de sua execução tomar um
que a barra de 70 centímetros poderia ser cortada em 1 O pedaços de 1 centímetro cada, 2 pedaços de 5 centímetros cada e 1 pedaço de 50 centímetros. A equação é, pois, um modelo que fornece uma representação matemática de todas as combinações possíveis dos pedaços de 1, 5, 10, 25 e 50 centímetros que podem ser cortadas de uma barra de 70 centímetros.
tempo excessivo de computação", avalia Yanasse. Em fase de conclusão, o trabalho contou com apoio da FAPESP, que lhe destinou R$ 153,3 mil.
As investigações teóricas conta~ com a colaboração do engenheiro de produção Nei Yoshihiro Soma, do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), também em São José dos Campos. Em São Carlos, Morabito, da UFSCar, e o matemático Marcos Nereu Arenales, da Universidade de
Essa formulação pode ser utilizada também para representar as possíveis combinações de moedas de 1, 5, 10, 25 e 50 centavos que somam R$ 0,70. Se surgisse a incumbência de desenvolver uma máquina para dar um troco de R$ 0,70 a partir das pilhas de moedas de 1, 5 10, 25 e 50 centavos, seria possível resolver o problema com a mesma equação matemática.
nas de papel com mais de 4 metros de largura devem ser cortadas de acordo com medidas padronizadas, para fabricação, por exemplo, de papel sulfite. De acordo com os pesquisadores, a utilização de algoritmos adequados pode reduzir o volume de aparas em alguns percentuais, o bastante para gerar milhões de reais de economia ao final de um ano de atividade.
•
PERFIL:
• HORACIO HIDEKI YANASSE, 47 anos, graduado em engenharia eletrônica no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), fez o mestrado no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o doutorado no Massachusetts Institute of Technology, nos Estados Unidos. É pesquisador do Inpe desde 1975. Projeto: Corte e Empacotamento Assistido por Computador Investimento: R$ 153.312,69
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO OE 2000 • 33
TECNOLOGIA
PROCESSOS PRODUTIVOS
Ferramenta de luz infravermelha
Empresa incubada no Ipen amplia o uso industrial do laser
M icrofuros quase invisíveis a olho nu, cortes perfeitos, es
tampagens metálicas de alta precisão sem uso de moldes, gravações de logomarcas mais rápidas e baratas. Essas são algumas das aplicações industriais do atual processamento de materiais por meio de laser. Um tipo de técnica que começa a se expandir no Brasil por empresas como a LaserTools, instalada no Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec), sediado no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), no câmpus da Universidade de São Paulo (USP). A empresa originou-se, em 1998, na Divisão de Óptica do Ipen a partir do projeto Aplicações de Lasers no Processamento de Materiais, que faz parte do Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP. A LaserTools conta com o aporte financeiro de R$ 111 mil e US$ 90 mil e o apoio do Programa de Capacitação de Recursos Humanos para Atividades Estratégicas (RHAE) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). São R$ 154 mil destinados à contratação de bolsistas de junho de 1999 a maio de 2002.
A atividade da LaserTools não é exatamente oferecer um produto, mas um serviço que emprega a tecnologia de laser para agregar valor a diversos tipos de materiais e equipamentos. A empresa, por exemplo, faz cortes de alta precisão com medidas da ordem de 30 micrometros (um micro metro é igual a um metro dividido em um milhão de partes), furos com tamanhos de 20 a 100 micrometros, solda-
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gens sem propagação de calor, tratamentos térmicos e gravações superficiais ou profundas. Entre os materiais que podem ser processados com laser destacam-se aço carbono, aço inox, titânio, tungstênio, alumínio, ligas de cobre, silício e cerâmicas.
A empresa trabalha com um tipo de laser chamado de estado sólido de neodímio (Nd):YAG. O Nd é um
da empresa e coordenador do projeto, explica que o correto é utilizar a expressão "feixe de luz laser", em vez do popular "raio laser". Raio é indicado para descargas rápidas, como as atmosféricas, de duração curta.
Custo menor - Morato conta que a LaserTools já desenvolveu soluções para várias empresas. Para a Faber-
Mo rato: "A ind ústria nacional ainda desco nhece as reais possibilidades do laser"
elemento químico conhecido como terra rara e o YAG é a designação de um cristal sintético, também chamado de granada, constituído por óxido de ítrio e de alumínio. A presença de neodímio nesse cristal é mínima. É uma impureza que emite luz ao ser excitada (ou "bombeada", como dizem os físicos) por um tipo de lâmpada específica. A luz é ampliada num dispositivo chamado cavidade óptica, que é o "coração" do aparelho laser. A seguir, ela é direcionada de forma a produzir um feixe de luz de alta intensidade, pertencente à faixa de luz infravermelha, portanto invisível ao olho humano. O físico Spero Penha Morato, sócio
Castell, implementou a marcação de lápis. Esse processo substitui os métodos pantográficos tradicionais para fazer a matriz do carimbo e permite gravar com mais velocidade, mais qualidade e a um custo menor. Na KG Sorensen, a LaserTools presta serviços de gravação de inscrições num porta-brocas de dentista, uma peça de alumínio. A gravação a laser substitui com vantagem de preço e tempo de execução o método silk-screen tradicional. Ainda para a indústria odontológica, estão em desenvolvimento vários processos de gravação de logotipos e códigos de identificação em instrumentos e pinos de titânio para implantes.
O laser utilizado na empresa é invisível e produz fagulhas luminosas ao tocar no metal
)
) l
cionalizar os bicos injetores de motores a diesel usados no Brasil". Eles são importados e os furos, por onde passa o combustível, são feitos na Suíça. Para executar esse serviço, a LaserTools planeja dois caminhos. Fazer os furos por encomenda ou dar assessoria para a compra de uma máquina dedicada- ou seja, específica para essa atividade- e acompanhar a produção.
Laser mais potente - Para realizar os diversos tipos de serviço que se propõe, a LaserTools tem um instrumental aparentemente modesto. "Temos dois lasers: um para corte,
A variedade de usos do laser abrange desde gravações de logomarcas e códigos até cortes, furos e soldas em diversos tipos de metal
A Smar Equipamentos obteve com a LaserTools um processo de solda sem propagação de calor para sensores de pressão de ar em máquinas industriais. Para o Centro de Pesquisas da Telebras, o laser inseriu nomes nos chips e fez soldas em dispositivos utilizados nos equipamentos de telefonia celular. Além desses exemplos, há um serviço prestado a outra empresa do Cietec, a Desystems, que desenvolve uma bateria para coração artificial envolta em titânio. A LaserTools faz o corte, a solda e a identificação do encapsulamento da bateria.
Também furos micrométricos estão sendo produzidos para a Eletro-
tela Tecnologia, fabricante de impressoras de jato de tinta para gigantografia- grandes painéis ou banners de propaganda. Dispositivos com furos tão diminutos servem para a passagem da tinta, permitindo uma impressão de alta precisão. "Isso só o laser faz e só nós fazemos", salienta Mora to.
O número e a variedade de produtos, exemplificados no mostruário exibido na pequena sede da LaserTools, são surpreendentes. A tecnologia a laser tem alcance muito amplo. "A indústria nacional ainda não sabe das reais possibilidades do laser", afirma Morato. E cita mais uma possibilidade em andamento: "Podemos na-
furo e solda e outro para marcação ou gravação." O alvo da tecnologia da empresa é tornar os processos de corte e furação cada vez mais eficientes e precisos. "Para isso vamos obter um laser mais potente, que permitirá desenvolver processos como os de furos de bicos injetores."
Uma das grandes aplicações do laser, destacada por Morato, é a substituição da estamparia tradicional de metais, sobretudo para a produção em pequena escala. "Se alguém quer fazer só SOO peças, o custo do estampo ou molde é tão alto que a produção fica inviável. Com o laser, o estampo desaparece. A nova técnica é integrável à progra-
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO OE 1000 • 35
mação dos computadores e a sistemas de controle numérico."
Outra possibilidade do laser, ainda não utilizada no Brasil, é o corte de laminados híbridos- por exemplo, uma lâmina formada por uma camada de metal junto com outra de grafite, para facilitar a lubrificação. "Sem o laser, o processo seria muito caro, pois o laminado híbrido é feito de materiais de durezas diferentes. Se usássemos serra, por exemplo, quebraríamos o grafite", explica Morato.
Formação acadêmica - A LaserTools foi fundada em novembro de 1998 e é formada por sete sócios, incluindo o coordenador Spero Morato. São eles Wagner de Rossi, Nílson Dias Vieira Júnior, Gessé Eduardo Calvo Nogueira, José Roberto Berretta, Niklaus Ursus Wetter e José Tort Vidal. Todos tiveram formação acadêmica e profissional na Divisão de Óptica Aplicada do Ipen, criada no início dos anos 80. Na fase atual, o objetivo deles é consolidar metodologias e processos para o uso do laser em aplicações industriais de maior demanda, como as gravações superficiais e profundas, a microfuração e a solda sem transmissão de calor.
Até agora, a receptividade da empresa tem sido muito boa em vários setores industriais, segundo Spero, e ainda há um bom caminho pela frente. "O processo de incubação da LaserTools, no Cietec, deve durar mais dois ou três anos, e então esperamos estar no mercado de uma vez. Hoje temos encomendas e os resultados do projeto já geram uma receita, embora pequena", revela o coordenador. •
PERFIL:
• SPERO PENHA MORATO, 56 anos, é professor de pós-graduação do Ipen. Fez graduação e mestrado na USP e doutorou-se em Física do Estado Sólido pela Universidade de Utah, Estados Unidos. Foi superintendente do Ipen entre 1990 e 1995. Projeto: Aplicações de Lasers no Processamento de Materiais Valor: R$ 111 mil e US$ 90 mil
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TECNOLOGIA
CONSTRUÇÃO CIVIL
Mistura na medida
Estudo analisa a adição de polímeros à massa de contrapisos
Escondida dos olhos e dos pés humanos, existe quase sempre,
embaixo de cada piso, uma camada chamada de argamassa onde se misturam cimento e areia. Não importa o tipo de acabamento. Carpetes, cerâmicas, madeiras e emborrachados são assentados à laje sobre esse contrapiso, que muitas vezes também assume a função de evitar a presença deletéria da umidade. Contra esse inimigo, os construtores aplicam junto ao contrapiso camadas de mantas ou membranas asfálticas.
Porém, há cerca de cinco anos, uma nova técnica começou a ser utilizada. Misturados à argamassa de contrapiso, começaram a ser adicionados ao cimento e à areia vários tipos de polímeros, materiais conhecidos como plásticos. Assim, a camada ganhou dupla função - assentamento regular do piso e estanqueidade. A primeira proporciona o nivelamento ou caimento necessário para escoar a água para o ralo e mantém uma porosidade adequada para receber o piso. No entanto, essa porosidade deve ser controlada para que não permita a passagem de água. Aí, entra a outra propriedade do contra· piso- reter a umidade, função exercida pelos polímeros. "Estanqueidade não é impermeabilização, que se caracteriza por exigir porosidade zero': afirma a professora Mercia Maria Semensato Bottura de
partamento de Engenharia de Construção Civil da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP). Ela foi a coordenadora do projeto de pesquisa Argamassas Modificadas com Polímeros para Contrapisos de Edifícios, financiado pela FAPESP.
O estudo analisou as atuais práticas da adição de polímeros à argamassa. Pelas diversas vantagens dessa mistura, incluindo a de ser mais econômica, ela é cada vez mais adotada pela construção civil. O problema é que, pela falta de informações mais precisas sobre essa técnica, o uso é feito sem muito critério, resultando em alto risco de fissuras e em infiltrações, além do desperdício de material e de mão-de-obra.
Com o objetivo de dar parâmetros a essa atividade, Mercia desenvolveu o estudo baseada nos materiais à venda no mercado. "Estudamos os in-
Barros, pesquisadora do De- Mercia: análise dos procedimentos de mercado
gredientes, as proporções de cada um na mistura da argamassa e as técnicas de execução do contra piso. Avaliamos a resistência e a eficiência da camada estanque, ou seja, em que condições a água chega a umedecê-la, mas não consegue passar por ela", explica.
Após um ano e quatro meses de estudo, os resultados surpreenderam a pesquisadora, que contou com a colaboração do engenheiro civil Eduardo Henrique Pinheiro de Godoy, que fez sua dissertação de mestrado sobre esse tema. Eles identificaram o estirenobutadieno (SBR) como o polímero que apresentou os melhores resultados na maioria dos testes de resistência mecânica, aderência e estanqueidade. Isso ajudou a derrubar um mito na construção civil que indica o polímero de base acrílica, que é o mais caro de todos aqueles utilizados para esse fim, como o melhor, tecnicamente, para compor a argamassa.
Segundo a professora Mercia, nos testes realizados, verificou-se que esse material apresentou o maior teor de ar incorporado, o que inviabiliza sua utilização, porque há formação de muitos capilares acessíveis à água, deixando a camada mais permeável. Por esse motivo, ela sugere novos estudos para que se identifique a origem do problema e se proponha uma modificação na composição desse polímero.
Vantagens do polímero - Sabia-se, desde o início da década de 70, a partir de pesquisas realizadas fora doBrasil, que a adição de polímeros melhorava a eficiência da argamassa, porém não havia um estudo sistêmico que avaliasse qual deles teria o melhor desempenho e em que quantidade deveria ser usado. Segundo a professora Mercia, com esses elementos, frutos da pesquisa, os construtores poderão obter o melhor desempenho e a melhor relação custo-benefício nessa operação.
As vantagens do uso da argamassa com polímeros em comparação à impermeabilização tradicional são muitas. Em primeiro lugar, reduz-se a espessura da camada de 4 a 6 centímetros no sistema convencional para 2 a 3 centímetros no novo método.
Isso resulta em economia de material e de mão-de-obra na construção de todo o pavimento, com uma redução de custo de 50% a 60%. Além disso, não é preciso contratar empresa especializada, pois o trabalho é realizado pelos próprios operários da obra.
O estudo visou a solucionar basicamente os problemas de áreas internas frias, como cozinhas, banheiros, áreas de serviço e sacadas, onde são
parte de cimento pa:ra cinco de areia), mantendo sempre a mesma consistência e densidade de massa.
Os polímeros estudados foram os três tipos encontrados no mercado: o acetato de polivinila (PVAc), o mais antigo e mais largamente usado; o SBR, menos conhecido e de preço intermediário; e o estireno-acrílico, que chega a custar três a quatro vezes o preço do PVAc e é tido como o de me-
Os testes de retenção de umidade usam tubos com água sobre os corpos-de-prova
maiores os riscos de infiltração. Nesses locais, o contrapiso deve proporcionar o maior grau possível de estanqueidade. Além da capacidade de barrar os líquidos, o estudo pÔde avaliar outros itens importantes, como resistência, compressão e tração. Também verificou a escala de deformação - o quanto essa camada suporta sem se romper ou fissurar -e qual a capacidade de aderência da argamassa tanto em relação à base -na laje - quanto ao revestimento.
A melhor porção - A primeira etapa da pesquisa concentrou-se na caracterização dos materiais. Para a argamassa, foram escolhidos aqueles geralmente empregados pela construção civil, ou seja, areia de granulação média e cimento comum, do mesmo tipo utilizado na execução de estruturas. Na mistura, foram testadas porções de 1:3 (uma parte de cimento para três de areia) e de 1:5 (uma
lhor desempenho pelo setor. Empregando esses materiais, foram obtidas no total14 proporções de argamassa. Assim, foram construídos corpos-deprova de argamassa- sem aplicação à laje - para testar o desempenho de cada uma das proporções obtidas.
Esforço de flexão - Os corpos-deprova foram submetidos a esforços de compressão para medir a força máxima que cada placa era capaz de suportar antes de se romper e determinar o grau máximo de deformação. Foram feitos ainda testes de tração, simulando o que acontece com uma laje sob esforço de flexão. Esse experimento é o mesmo que apoiar uma régua em suas duas extremidades e aplicar uma carga no centro. Essa régua irá fletir, ou seja, a parte de baixo da régua fica com suas fibras tracionadas, enquanto a parte de cima fica com as fibras comprimidas. A esse efeito de tração e com-
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pressão em uma mesma seção da peça dá-se o nome de "flexão': Isso é o que normalmente ocorre com uma laje que está apoiada em sua borda. O centro dela, submetido aos carregamentos comuns, como pessoas caminhando, móveis, etc., estará submetido à flexão. Esse teste serve para saber qual a resistência da argamassa em relação ao esforço submetido.
Mais uma bateria de testes analisou o desempenho do contrapiso. A produção das placas para esses testes obedeceu a um procedimento, simulando o que acontece numa obra. Nesta etapa foram avaliadas também várias formas de preparação da base - desde lançar a argamassa sem nenhum preparo, testando-se aplicações de camadas de polímero, polímero com cimento e cimento com água, para saber qual delas proporcionaria melhor aderência. Combinando as 14 proporções de argamassa usadas com as formas de preparo de base obteve-se um grande número de placas, que foram submetidas a testes de estanqueidade e aderência.
A pesquisa desenvolveu também a maneira correta
Superfície mais lisa - Outro ponto fundamental é garantir uma boa compactação da argamassa, seguida de sarrafeamento, que significa o corte da camada que sobra além do nível necessário. A porção da argamassa é cortada e desempenada para deixar a superfície mais lisa e menos porosa possível.
Para a professora Mercia, os resultados do estudo, além de servir de referência para indicar o melhor polímero ao mercado, mostram a necessidade de se conhecer com mais detalhes a composição dessas substâncias e, a partir de novas pesquisas, levantar elementos para uma possível formulação de normas técnicas para a fabricação de polímeros específicos para a construção civil. Na opinião da professora, isso seria um passo importante num setor tão carente de normalização.
No ensaio de estanqueidade, foram fixados sobre as placas tubos de PVC com 40 centíme
de fazer a preparação e o assentamento do cóntrapiso
Os recursos utilizados na pesquisa recém-finalizada serão úteis para as novas pesquisas a serem desenvolvidas e, além disso, viabilizarão novos trabalhos na graduação e no mestrado. O financiamento da FAPESP, de R$ 13,6 mil, foi destinado à compra de materiais e equipamentos, como fôrmas metálicas, balanças eletrônicas, misturador
tros de diâmetro e 1 metro de altura, formando uma coluna d'água. As placas eram pesadas em balança de precisão antes e depois de submetidas à ação da água. Assim, foi possível saber o quanto de umidade cada uma absorvia e identificar qual delas proporcionava o melhor desempenho como camada estanque.
A conclusão da pesquisa esclareceu muitas dúvidas não só em relação ao tipo de polímero mais eficiente, no caso o SBR, mas também quanto às características da camada de estanqueidade. Quanto à porção ideal da argamassa, o melhor desempenho foi verificado na proporção 1:3, mas a professora não descarta o uso de 1:5 em algumas áreas
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onde as exigências de estanqueidade sejam menores.
O estudo demonstrou ainda que, para se obter maior eficiência do contrapiso, são necessários alguns procedimentos no seu preparo. Em primeiro lugar, ficou comprovado que a melhor técnica de preparo da base, antes do lançamento da argamassa, é a aplicação da mistura de cimento, água e polímero, diferente da argamassa por não conter areia. Essa camada tem a capacidade de penetrar nos poros da base, pois é muito fluida, garantindo a ligação da base com a argamassa mais condensada. Assim, se não houver preparo da base, não existirá uma perfeita aderência.
planetário e dinamômetro de tração. Eles fazem parte, agora, do laboratório do Departamento de Engenharia de Construção Civil da Poli. •
P ERFIL:
• Mercia Maria Bottura de Barros é coordenadora do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Construção Civil da Escola Politécnica (Poli) da USP. Graduada em Engenharia Civil pela Universidade Federal de São Carlos, em 1985, fez mestrado e doutorado na Poli. Projeto: Argamassas Modificadas com Polímeros para Contrapisos de Edifícios Investimento: R$ 13.600,00
TECNOLOGIA
INOVAÇÃO
Crescem as adesões
PIPE investe mais de R$ 1 O milhões em pequenas empresas
Asexta rodada de inscrições para o Programa de Inovação
Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), encerrada em 30 de novembro, recebeu 73 novas adesões. Entre essas empresas, o maior número pertence à área de engenharia elétrica, com 13 projetas. Em seguida vem computação, com 12, engenharia mecânica, 8 e engenharia civil, S. Também estão participando empre-
sas das seguintes áreas: medicina, engenharia de materiais, educação, genética, bioquímica, administração, turismo, geociências e agronomia.
Os novos ped idos chegaram de todo o Estado, de cidades grandes e pequenas. A liderança ficou com São Paulo, com 26 pedidos, vindo a seguir Campinas, 9, São Carlos e São José dos Campos, 5 cada, e Catanduva, São Bernardo do Campo, Osasco, Ribeirão Preto e Piracicaba, com 2. Com um pedido cada, inscreveram-se, por exemplo, empresas de Jaboticabal, Itu, Ilha Solteira, Paraibuna, Itariri e São Joaquim da Barra, além de mais 13 municípios.
Até o momento, o total de recursos repassados pela FAPESP para as 96 empresas que já tiveram seus projetas aprovados, sem necessidade de futura contrapartida, já atingiu R$ 7,7 milhões e US$ 2,3 milhões.
Valorizar a pesquisa - Criado em 1995, o PIPE é o primeiro programa da FAPESP destinado a fi nanciar diretamente a pesquisa na empresa, por meio de um pesquisador contratado ou associado. O alvo são as empresas com menos de cem funcionários que pretendem desenvolver produtos, serviços e sistemas com tecnologia de ponta.
Os projetas inscritos são submetidos à análise de assessores indicados pela FAPESP. Se aprovado, a empresa começa a empreender a primeira fase do programa, que consiste na realização de estudos para comprovar a viabilidade técnica das idéias propostas. Se bem demonstradas e receberem a aprovação dos assessores, o projeto passa para a segunda fase, quando efetivamente, a pesquisa se desenvolve. Ao contrário da primeira, que tem duração de seis meses, na segunda o período de elaboração do objeto do projeto é de dois anos. O limite de financiamento na primeira fase é de R$ 50 mil e na segunda, R$ 200 mil, incluindo a compra de material de consumo e equipamento importado.
A Fundação recebe novos pedidos para o PIPE duas vezes por ano, nos dias 30 de junho e 30 de novembro, e faz a análise dos projetas no período máximo de 120 dias. •
PIPE - Participantes e Investimentos - la Fase PIPE- Participantes e Investimentos- r Fase
Edital Inscrições Aprovados R$ US$ Edital Aprovados R$ US$ lo 80 31 928.025,00 241 .864,80 I o 23 2. 771 .497,80 896.848,21 20 66 23 726.898,00 204.771 ,71
30 31 13 372.390,00 96. 127,50 20 lO 1. 169.016,00 442.496,00
40 44 16 498.510,00 87. 131,65 30 4 484.890,00 164.460,00 50 33 13 430.848,00 68.016,00
40 3 323.350,00 111.493,00 60 73
Total 327 96 2.956.671 ,00 697.9 11,66 Total 40 4.748.753 ,80 1.615.297,21
PESQUISA FAPESP • JANEIRO I fEVEREIRO DE 2000 • 39
TECNOLOGIA
Uma receita para fabricar telhas
Junte escória de alto-forno siderúrgico, que são os restos da primeira etapa da produção de aço, mais fibras vegetais de bananeira, sisai ou eucalipto. Moa tudo com areia e água, acrescente pitadas de produtos alcalinos como cal e gesso agrícola (um resíduo da indústria de fertilizantes) e coloque tudo em fôrmas onduladas. Esses são os ingredi entes da receita para fazer te-
ria de alto-forno que se acumula em grandes montanhas fora das siderúrgicas, sem uso, embora a sua utilização seja conhecida mas pouco empregada pela indústria de telhas." O projeto tem a colaboração de pesquisadores da Poli-USP, Esalq e Engenharia de São Carlos-USP.
Parceria produz inversor solar
Uma parceria entre a empresa Conections e a Universida
Teste de durabilidade e conforto térmico
de Estadual de Londrina (UEL) resultou no desenvolvimento de um inversor solar, um tipo de aparelho que permite captar a energia elétrica acumulada por painéis solares e transformá-la em energia utilizável à noite em equipamentos ele-
lhas da equipe do professor Holmer Savastano Júnior, do grupo de Construções Rurais e Ambiência do Departamento de Zootecnia da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da USP, de Pirassununga. O projeto Sistemas de Cobertura para Construções de Baixo Custo: Uso de Fibras Vegetais e de Outros Resíduos Agroindustriais tem financiamento da Finep e já produziu 300 unidades que estão em testes finais de conforto térmico e durabilidade. "O uso de matérias-primas diferentes do cimento para a fabricação de telhas torna esses produtos mais baratos e aproveita resíduos que seriam desperdiçados, como a escó-
trônicos e na ilu-minação. "O inversor utiliza duas baterias semelhantes a de automóveis que duram de seis a oito horas", afirma Marcos Teixeira, sócio da empresa. "Embora ainda não tenhamos estipulado o preço final do aparelho, sabemos que ele custará menos que o importado e terá melhor qualidade que os similares nacionais", garante. "Acreditamos que o inversor será muito útil em fazendas, casas de campo e em granJaS para aquecer os pintinhos". O projeto foi desenvolvido pela empresa e pelo departamento de engenharia eletroeletrônica da UEL, sob a coordenação dos professores César Santos e César Melo.
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Supercomputador Made in Brasil
Dentro de alguns meses, a Universidade de Nova York estará recebendo o Spade li , um supercomputador montado no Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) da Escola Politécnica da USP. Depois de mostrar, por meio de um protótipo, resultados melhores que computadores similares da IBM e de, igualmente, experimentais da Nasa e da Universidade de Berkeley, o Spade vai integrar o Laboratório de Pesquisas de Meios de Comunicação, da UNY. "A intenção inicial é usá-lo como meio para produzir e apresentar uma ópera virtual, em que a tores e a música serão sintetizados no computador e apresentados num enorme vídeo walf', informa o professor Sérgio Takeo Kofuji, coordenador de áreas de sistemas digitais do LSI. Os espectadores assistirão à ópera munidos de órulos especiais que permitirão uma imagem tridimensional composta pelos vários monitores que serão alimentados pelo Spade. A parceria Poli-Universi-
Spade: ópera em Nova York
dade de Nova York tem o apoio financeiro da National Science Fundation (NSF), a principal agência de fomento americana. O Spade possui 144 processadores instalados em paralelo e uma memória, em disco, de 400 gigabytes.
Falta inovação no setor de alimentos
A indústria de alimentos no Brasil investe pouco em inovação tecnológica e quando faz prefere soluções criadas em outras indústrias - a de máquinas, por exemplo- ou desenvolvidas no exterior. A conclusão está na tese de doutorado do professor José Ednílson de Oliveira Cabral, apresentada na Universidade de Reading, na Inglaterra. Pesquisador e atual gerente de negócios tecnológicos da Embrapa Tropical, de Fortaleza, no Ceará, Cabral enviou 1 mil questionários e recebeu 242 de empresas de pequeno, médio e grande porte. "Desse total, apenas 66 (27,3%) apresentaram algum tipo de inovação, ou seja, algo novo para a empresa, para o Brasil ou para o mundo", afirma. Em relação à natureza da inovação, 57,2% referem-se aos processos de fabricação e 33,3% a modificações tecnológicas nos produtos. Outros números mostram que apenas 40 empresas têm algum contato ou parceria com instituições de pesquisa ou universidades. Confirmou-se, também, que o investimento em pesquisa é baixo nesse setor, representando, na média, 0,29% do faturamento das empresas.
HUMANIDADES
CIÊNCIA POLÍTICA
A descentralização pós-abertura Elites nem sempre estão preparadas para abrir mão do centro
Quinze anos depois de os governos civis começarem a falar
em um projeto de descentralização administrativa no País, uma pesquisa acadêmica está fazendo a primeira radiografia de quais são as disposições e condições reais dos municípios de porte médio (entre 50 mil e 200 mil habitantes) para assumir a execução de serviços à comunidade, como saúde, educação, saneamento, habitação, assistência e outros.
Com financiamento da FAPESP, o estudo, intitulado Democracia, Administração e Governo Local, faz parte de um consórcio internacional, o Democracy and Local Governance, em que 29 pesquisadores, distribuídos predominantemente em países europeus, mas também nos Estados Unidos e na Ásia, aplicam um questionário sobre percepções e atitudes dos governos locais. "O objetivo é estudar as mudanças no poder local e suas relações com o processo de transformação do País': afirma achefe do departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP), Maria Hermínia Tavares de Almeida, uma das coordenadoras da pesquisa brasileira. "Foram escolhidas cidades de porte médio porque nelas é mais fácil observar alguns fenômenos." Os resultados das pesquisas internacionais estão sendo colocados em um grande banco de dados disponível na Internet.
A pesquisa brasileira é a primeira da América Latina. "Em 1996, eles queriam alguém no continente e meu nome foi sugerido por um cole-
Maria Hermínia: detectando semelhanças nos valores e atitudes de elites locais e federais
ga da Universidade de Nova York, Adam Przaworski, ao coordenador do consórcio, Henry Teune, da Universidade de Pensilvânia", diz Maria Hermínia. Os pesquisadores do Democracy and Local Governance formam uma rede voluntária e reúnemse periodicamente em congress~s internacionais para discutir suas experiências e comparar resultados. "Cada um deve buscar financiamento em seu país", afirma a professora.
Maria Hermínia coordena o estudo juntamente com Elisa Pereira Reis, professora de sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). "Minha primeira pesquisa, que ainda está em andamento, tem como objetivo perceber quais são os valores e as atitudes das elites ligadas ao governo federal, ou seja, deputados e senadores", relata Elisa. "O que estamos percebendo nessa pesquisa com elites locais é que existem algumas semelhanças entre elas e as federais, como, por exemplo, a valorização da liberdade e da igualdade -pelo menos no discurso", complementa.
O primeiro ano de pesquisa, o de 1998, foi totalmente dedicado à aplicação dos questionários. "Recebemos R$ 73,7 mil (posteriormente, foram liberados mais R$ 2,5 mil), e com esse valor contratamos a Feedback, uma empresa de pesquisa de opinião que aplicou o questionário em uma amostra de 20 municípios, entrevistando 15 lideranças em cada cidade, umas governamentais, outras não", conta a professora Maria Hermínia. ''Acrescentamos ao survey algumas questões voltadas para a realidade brasileira. Como, por exemplo, perguntas sobre violência e segurança pública. Perguntávamos como eles se sentiam em relação às desigualdades sociais", observa Elisa.
Seleção - Os 20 municípios foram selecionados aleatoriamente de um total de 241, com um desenho amostral feito por um profissional de estatística de modo a obter uma amostra significativa das cidades de porte médio no Brasil. Os Estados foram divididos em três grupos. O primeiro, o que tinha o maior número de muni-
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO OE 1000 • 41
opws de porte médio; o segundo, um número menor; e um terceiro, com pouquíssimos. "Foram escolhidos 13 municípios do primeiro grupo, 3 do segundo e 1 do último", relata Maria Hermínia. Algumas das cidades: Botucatu, Guaratinguetá e Mogi-Guaçu, em São Paulo; Candeias, na Bahia; Sapucaia do Sul, no Rio Grande do Sul; Jataí, em Goiás; e Caratinga, em Minas Gerais.
A escolha dos 15 entrevistados não foi aleatória. "Escolhemos por cargo ou representatividade na comunidade: desde o prefeito, o delegado, o vereador, o presidente de sindicato ou de associações em- As lideranças locais não aceitam que a educação seja responsabilidade dos municípios ...
presariais, até o padre ou o presidente do Rotary Club", explica Maria Hermínia.
Desde o início, as pesquisadoras estão contando com a ativa participação de Leandro Piquet Carneiro, um pesquisador carioca com doutorado na área de cultura política, experiente em técnicas de análises de dados de survey e que tem uma bolsa de pós-doutorado independente, também pela FAPESP, dentro do próprio projeto. A construção de bancos de dados, além da elaboração de bibliografias comentadas de temas correlatas à pesquisa, está a cargo de quatro bolsistas de iniciação científica, dois deles pagos pela Fundação. Estudo abrangeu 20 municípios brasileiros de porte médio, entre eles Guaratinguetá, SP
Um passo à frente - A pesquisa desenvolvida por Maria Hermínia, Elisa e Carneiro deu um passo à frente em relação aos estudos feitos internacionalmente. "Desde o princípio nós achamos que uma pesquisa de valores e atitudes não era suficiente para explicar a hipótese do estudo, que era a de que lideranças mais pluralistas e democráticas tenderiam a ser mais localistas", argumenta Maria Hermínia.
Os pesquisadoras decidiram, assim, investigar qual era a capacidade de gestão de cada município. Adapta-
42 • JANEIRO I fEVEREIRO DE 1000 • PESQUISA FAPESP
ram, para isso, o questionário de uma pesquisa piloto realizada pelo IBGE que avaliava as condições institucionais das cidades. "Foi uma grande sorte e coincidência eles terem feito esse estudo", festeja Maria Hermínia. As pesquisadoras pretendem apresentar a nova abordagem aos outros pesquisadores do consórcio Democracy and Local Governance.
Entenda-se por capacidade de gestão não só o poder financeiro, que pôde ser levantado por Maria Hermínia na Secretaria do Tesouro Na-
cional (que há pouquíssimo tempo tem dados de orçamentos dos municípios de porte médio, segundo a professora), mas também características como grau de informatização das prefeituras, existência de conselhos, instrumentos de planejamento e outros. "Além disso, levamos em conta as normas constitucionais e a legislação complementar que estabelecem competências e atribuições dos três níveis de governo, já que estamos em um sistema federativo", explica a professora.
breza do País. "Todos acham que é preciso se preocupar com a pobreza, mas ninguém toma a responsabilidade para si", afirma Maria Hermínia.
... mas consideram que saúde, assistência, saneamento e obras sejam de competência municipal
Os pesquisadores calculam que o projeto Democracia, Administração e Governo Local se estenderá até o fim do ano 2001. Maria Hermínia e Carneiro já estão trabalhando sobre um paper que será apresentado no próximo congresso da International Associations of Politicai Science (IPSA) e que faz parte do pró
As pesquisadoras ainda levaram em consideração a distribuição da população por setor da atividade econômica e criaram alguns indicadores de capacidade municipal. "Na saúde, por exemplo, utilizamos os três tipos de adesão ao Sistema Único de Saúde (SUS) : se o município está no tipo pleno significa que ele tem capacidade maior de assumir o serviço", explica Maria Hermínia. Do mesmo modo, o tamanho da rede de escolas municipais e o índice de adesão ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), do governo federal, são indicadores da capacidade municipal de assumir a educação.
Primeiras conclusões - Uma das primeiras conclusões a que o estudo chegou, embora ainda esteja em uma fase de "juntar as peças do quebracabeça", é que o fato de lideranças governamentais ou não-governamentais serem a favor genericamente da descentralização não significa que elas sejam a favor da descentralização de serviços específicos. "A educação, por exemplo, não é tida como um serviço que deve ser de responsabilidade local, nem a habitação", conta Maria Hermínia. "Já saúde, assistência, saneamento e obras são conside-
rados de competência municipal", complementa. Ao serem questionados sobre se os serviços deveriam ser de competência local, os entrevistados deviam dizer também se o município estava apto para tanto. "A questão do meio ambiente é a última preocupação para eles; nem chega a ser um problema", avisa ela. "Já o saneamento, todos consideram que é obrigação do município e acham que têm capacidade para assumir:'
"Também não há diferenças de opiniões entre pessoas de partidos políticos diferentes", conta. "A esquerda tende a ser um pouquinho menos municipalista do que o centro e a direita, mas a diferença é pouco significativa", avalia. A pesquisa agora está passando pelo momento de tentar descobrir por que essas lideranças consideram determinados serviços de responsabilidade do município e outros não. "Já vimos que não são seus valores localistas que determi-. ))
nam ISSO.
Para Elisa Pereira Reis, o estudo vai contribuir para fazer um perfil das elites locais atuais e compará-las com as existentes há 20 ou 30 anos. "Já podemos dizer que as elites atuais são mais descentralizadoras do que aquelas", afirma. Uma semelhança entre as elites do passado e as atuais diz respeito à preocupação com a po-
ximo relatório da FAPESP. "No fim do ano pretendemos lançar um livro com vários artigos", afirma Maria Hermíria. •
PERFIS:
• MARIA HERMÍNIA TAVARES DE ALMEIDA é chefe do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da USP. Defendeu tese de doutorado sobre a constituição da política trabalhista no Brasil. Sua tese de livre-docência chama-se Crise Econômica e Interesses Organizados. Ultimamente, tem estudado o federalismo e a descentralização de políticas sociais, além das políticas de privatização das empresas públicas. • ELISA PEREIRA REis é professora do Departamento de Sociologia da UFRJ. Defendeu a tese de doutorado As Origens Agrárias do Autoritarismo no Brasil. É Ph.D. em Ciência Política pelo Massachusetts Institut of Technology (MIT). • LEANDRO PIQU ET CARNEIRO é bolsista de pós-doutorado no Departamento de Ciência Política da USP. É doutor pela IUPERJ, Rio de Janeiro. Projeto: Democracia, Administração e Governo Local Investimento: R$ 76.200,00
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HUMANIDADES
ARQUITETURA
Indo em busca da nossa paisagem
Grupo faz um inventário dos espaços livres do País
H á cinco anos, quando Sílvio Soares Macedo deu início ao
projeto Quadro do Paisagismo no Brasil, QUAPÁ, o arquiteto descobriu de cara que a pesquisa teria uma bibliografia de referência bas
zados em 35 cidades brasileiras e com um acervo de mais de 30 mil imagens. O trabalho teve o apoio da FAPESP, que investiu R$ 280 mil na execução do projeto, e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico ( CNPq), responsável pelas bolsas para estudantes.
Não contentes em guardar o mapeamento na universidade, o grupo, comandado por Soares Macedo, abriu o resultado de seus esforços
Fábio Namiki, contendo todo o banco de dados rastreados desde 1994. No fim do ano passado, Soares Macedo lançou o livro Quadro do Paisagismo no Brasil ( 145 páginas, R$ 45,00), resultado da pesquisa e uma referência teórica e iconográfica do paisagismo nacional, que acabou tomando forma de um documento que descreve o comportamento da construção de paisagens no País nos últimos 200 anos. Com tiragem inicial de 5 mil exemplares,
o livro está sendo distribuído para bibliotecas de universidades, livrarias e institutos culturais.
"No momento em
tante reduzida. Professor titular de Paisagismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU/USP) e atualmente lançando três livros de abordagens específicas sobre a matéria, ele conta terse surpreendido com a escassez de literatura referente ao tema. A saída foi reunir cerca de 20 alunos e ex-alunos da faculdade ligados ao Laboratório da Paisagem da FAU/USP e mandá-los literal- Sílvio Soares Macedo: pesquisa catalogou 2 mil projetas em 35 cidades
que começamos a redigir o primeiro relatório do projeto, percebemos que o livro havia transcendido seu caráter técnico e poderia tomar forma de um trabalho de base para a discussão do paisagismo brasileiro", descreve o autor, que fez, então, da lacuna acadêmica sobre estudos atualizados do paisamente a campo para
dar início a um inventário das linhas projetuais dos espaços livres no Brasil, o que inclui o levantamento de todo tipo de praça, parque ou calçadão de cidades das cinco regiões do País.
Apesar da falta de registro e dos caminhos desordenados pelos quais se desenvolveram os projetas urbanos no Brasil, o que ocorre em praticamente toda a paisagem resultante de inserções em locais públicos e abertos do País, a equipe do QUAP Á concluiu uma primeira etapa da pesquisa, o que significa a catalogação de mais de 2 mil projetas locali-
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para o público. Entre as iniciativas, a montagem de uma sala na última edição da Bienal Internacional de Arquitetura, que se realizou em São Paulo no período de novembro ajaneiro passados, com uma seleção de 30 imagens do projeto ampliadas em grande painéis, logo na entrada do Pavilhão Ciccillo Matarazzo, uma mostra com curadoria do autor e do arquiteto Mauro Font. A equipe também preparou um CD-ROM em associação com a Semiotic Systems intitulado Paisagismo Brasileiro: Guia de Praças e Parques, produzido por Luiz Fernando Meira e
gismo brasileiro, uma fonte nova de discussão e de desenvolvimento de novos projetas.
Os estilos - O trabalho de pesquisa foi árduo e dividido em três etapas. Na primeira, foi feito o levantamento paisagístico em 17 cidades, que já se sabia, de antemão, que tinham projetas de porte. Entre elas estavam várias capitais de Estados brasileiros e cidades de porte médio. A segunda etapa incluiu as demais capitais (à exceção de Palmas, TO) e novas cidades médias, chegando-se, na terceira etapa, às 35 cidades com proje-
O Passeio Públ ico no Rio de Janeiro, marco do projeto paisagístico no País
Parque do lbi rapuera, em São Paulo: uma releitura do Eclet ismo Jardins do prédio do MEC, no Rio
de Janeiro: pr imeiro espaço moderno
tos paisagísticos analisados. "Para o segundo livro, vamos incluir cidades que ficaram de fora, como Petrópolis, no Rio de Janeiro, Maringá e Cascavel, no Paraná, entre outras", diz Sílvio Macedo.
Para realizar a pesquisa, a equipe do projeto foi diversas vezes a cada uma das cidades. O destino inicial eram as prefeituras, onde se encontravam as plantas dos parques, praças e calçadões das cidades, além, muitas vezes, de desenhos e fotografias . O material era remetido a São Paulo, analisado e feita a triagem. Em seguida, a equipe retornava à cidade para fazer o levantamento do atual estado daqueles locais, por meio de fotografias e desenhos. A triagem, segundo Sílvio Macedo, obedeceu a dois principais critérios: a importância daquele espaço urbano para a cidade e para a comunidade, mesmo que não tivesse nenhum arquiteto de renome como autor do projeto paisagístico, e/ou que o projeto fosse significativo dentro das três linhas de projetas paisagísticos (Ecletismo, Moderno e Contemporâneo) e se encontrasse bem conservado.
O Ecletismo, explica o arquiteto, é uma das correntes que compõem a paisagem construída no Brasil e descreve o tipo de projeto criado para a contemplação. A concepção eclética, a mais tradicional corrente projetual, é de origem totalmente européia, adaptada ao cotidiano nacional, a partir do século XIX. Esta influência é especialmente francesa e inglesa, sendo seus principais autores no Rio de Janeiro Glaziou e Villon. O Passeio Público, no Rio de Janeiro, de 1783, o primeiro projeto paisagístico no Brasil, é representativo dessa corrente. O estilo pode ser facilmente identificado pela presença de elementos como fontes, gazebos, quiosques e lagos, que, em geral, correspondem a imitações pictóricas de ícones europeus e pode ser observado em espaços nas capitais e nos mais distantes lugarejos do interior do Brasil.
A concepção Moderna diz respeito à criação de base nacionalista,
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • 45
Parque São Clemente, em Nova Fribu rgo: espaço para a contemplação
feita de elementos essencialmente brasileiros e produzida sobre uma forte preocupação funcional e social, na qual se encaixa, por exemplo, a obra de Burle Marx. O primeiro espaço dessa vertente é o prédio do Ministério da Educação (antigo MEC) no Rio de Janeiro. Já a concepção Contemporânea é uma ruptura com o Moderno. "Trata-se de uma grande mistura, marcada principalmente pela colagem de muitas influências e pela liberdade de criação", descreve o pesquisador. Soares Macedo acrescenta que o paisagismo chamado de Contemporâneo é fortemente marcado por traços de trabalhos franceses, espanhóis e ingleses antigos, o que inclui uma série de modelos e elementos de construção em desuso há muito tempo. Isso tudo junto com elementos do paisagismo japonês, francês, americano e espanhol contemporâneo, por exemplo.
Terceira corrente - A verificação da corrente de produção paisagística Contemporânea no QUAPÁ foi outra novidade no estudo de paisagismo brasileiro. Até então, os livros de referência sobre o tema identificavam o paisagismo como Eclético e Moderno. A pesquisa mostrou que existe essa terceira vertente, ainda
46 · JANEIRO I FEVEREIRO DE 1000 • PESQUISA FAPESP
em formação, mas presente em todo o País. O curioso é que esse tipo de trabalho já está em curso há pelo menos 15 anos no Brasil, mas, até então, segundo o
O estilo contemporâneo do Jardim Botânico de Curitiba, obra de 1991
grupo de pesquisado-res, nada foi publicado a respeito. Ao menos nada que atingisse a dimensão nacional do QUAP Á.
"O Brasil trata a obra de Burle Marx, o paisagista oficial do modernismo, como sua última vanguarda e, por isso, deixa de obsérvar a importância do que de novo se vem construindo", observa o autor. Isso não significa desmerecer o trabalho do paisagista, que teve diversos projetos incluídos na pesquisa . Assim, o livro conta com uma farta documentação da obra de Burle Marx, devidamente ilustrada por plantas e fotografias . Mas a inegável importância do paisagista está na sua posição de contestado e criador de novos parâmetros de comparação por meio de uma perspectiva histórica.
Descobertas - A rápida ramificação da pesquisa, que teve uma espécie de edição prévia em 1998, contendo 450 imagens de cerca de 300 espaços visitados, deve-se principalmente à
sua natureza desbravadora. "Descobrimos dados surpreendentes, como o fato de termos pelo menos 60 arquitetos com projetos bem articulados e bem executados trabalhando sozinhos por vários cantos do País em anonimato." Entre esses cantos, o arquiteto destaca projetos que considera bastante sofisticados e permanecem "escondidos" do olhar dos centros de estudos, como praças de Teresina, no Piauí, ou de Belém do Pará. "Outra constatação é que, se São Paulo sabe pouco do paisagismo carioca, o Rio de Janeiro sabe menos ainda do paulista, e assim por diante, ou seja, o Brasil não conhece a paisagem do Brasil", sustenta Soares Macedo.
Em um dos tópicos do livro Quadro do Paisagismo no Brasil, que trata de projetos urbanos, o arquiteto apresenta, por exemplo, a Praça Carlos Gomes, em Campinas, SP, e a Praça Dom Pedro II, em Belém, PA, como dois desses achados - desconhecidos por quem não vive nestes
----------------------------------------------------------------------------------------------------,.~
O Bosque Alemão, em Curitiba, de 1996: colagem de vários elementos
lugares-, que representam uma vertente da produção chamada de Ecletismo.
Nesse tópico, a pesquisa é apresentada com o apoio de fotografias de projetos, mostradas ao lado de suas plantas originais e, quando possível, de imagens de idades diferentes do mesmo local. Assim, são descritos e analisados, por exemplo, os projetos do Jardim da Luz, de São Paulo, a Avenida Central, do Rio de Janeiro, e o Parque Municipal René Giannetti, de Belo Horizonte. "Para essa comparação, e mesmo para que fosse possível obtermos medida de análises, uma das regras do levantamento foi rastrear apenas os projetos que tivessem documentos nas prefeituras das cidades visitadas."
Cada trabalho catalogado é acompanhado dos acontecimentos históricos que o circundaram no momento de sua criação e construção. Partindo desde o trabalho de mestre Valentim, no século 18, cada autor é registrado dentro de seu contexto de produção. Assim, a pesquisa acaba por fazer algumas justiças históricas, lembrando de paisagistas como Reynaldo Dieberger e seu pai, João Dieberger, que juntos produziram mais de meio século de paisagismo no Brasil.
Praça Vinícius de Moraes, São Paulo: novo modo de usar a vegetação
Do filho, o autor emprestou, além dos projetos, um texto sobre a produção de um jardim, escrito em 1928, que, no livro, abre o tópico dedicado ao Ecletismo: "A arte de fazer-se um jardim é a mesma como que se pinta uma tela, como se compõe uma poesia, ou se constrói uma casa. Como em todas as artes, distinguem-se ali os serviços bem acabados, onde a longa experiência e o gosto natural unem-se aos recursos do material e plantas". Mas sem, entretanto, assumir algum tipo de tom de homenagem. "É apenas o levántamento atualizado da paisagem urbana brasileira, mais especificamente dos espaços abertos e públicos", observa o professor. "A grande questão é que ninguém havia feito isso até hoje no País."
Este ano, o grupo parte para uma nova fase de estudos que também abrangerá a produção de espaços privados, além de espaços públicos, mas que integram, de forma indireta, a paisagem pública. Mas também nesse momento, narra o pesquisador, várias teses nascidas no grupo do arquiteto estão em andamento. Em São Paulo, os pesquisadores Denise Franquini e Wolfgang Stechenko desenvolvem trabalhos de mestrado, e Fabio Robba, de doutorado. Em Campo Grande, MS, Guttenberg
Weingartner desenvolve um doutorado e a arquiteta e professora Vera Tangari, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), concluiu sua tese de doutorado sobre o Rio de Janeiro. Todos com trabalhos vinculados à pós-graduação da FAU/USP e utilizando dados do QUAP Á.
O projeto está nesse momento desenvolvendo a etapa final da segunda parte da pesquisa e ultimando o lançamento dos livros Parques Brasileiros e A Praça Brasileira, e do CD-ROM Quadro do Paisagismo no Brasil - A história do paisagismo brasileiro. •
PERFIL:
• SíLVIO SOARES MACEDO é arquiteto formado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, onde é professor titular de Paisagismo e coordenador do Laboratório de Paisagem. Desenvolve, desde 1976, projetos de pesquisa na área de paisagismo, sendo autor de Higienópolis e Arredores, livro sobre as transformações urbanas sofridas pelo bairro do título. Edita a revista Paisagem e Ambiente, produzida na faculdade. Projeto: Quadro do Paisagismo no Brasil Investimento: R$ 280 mil
PESQUISA FAPESP · JANEIRO I FEVEREIRO DE 2000 • 47
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LIVROS
ISTVÁN ]ANCSO
Estranhos estrangeiros Falando dos outros, falamos de nós mesmos
Como os mitos entranhados na memória coletiva trazem a marca do nacional, a percepção dos significados de histórias dessa
ordem pode ser enriquecida pela análise atenta de quem vive outra realidade: o estrangeiro. Essa questão remete a muitas outras, dentre as quais a darelação do historiador com o emaranhado de suas próprias circunstâncias, terreno onde medram dificuldades que não podem ser menosprezadas, principalmente quando a prática historiográfica tem por cenário e objeto um universo de identidades nacionais erigidas com base em referências cruzadas, caso da América Latina. O livro de Alberto Aggio - Frente Popular, Radicalismo e Revolução Passiva no Chile, São Paulo, Annablume/FAPESP, 1999,230 p., enfrenta esta dificuldade, e o resultado é instigante.
A forma de exposição adotada difere um tanto do que é tido por padrão acadêmico, com o que ganha o leitor. A matéria, organizada em três grandes conjuntos de problemas, é apresentada em sete capítulos. O primeiro traz um painel sumário da história política do Chile, abrindo espaço para o enunciado dos marcos teóricos da análise (cap. 2). Nos três capítulos subseqüentes tem lugar a exposição da matéria histórica propriamente dita, com a narração das vicissitudes do movimento modernizador chileno e de seus protagonistas (cap. 3). Os capítulos seguintes dão conta da trajetória da Frente Popular e de seus desdobramentos imediatos, por meio do relato da história da articulação política bem-sucedida que reuniu em coalizão partidos de centro (o Radical), de esquerda (o Comunista e o Socialista) e o da Democracia Unificada, além de setores do movimento sindical organizados na Confederação dos Trabalhadores do Chile. Conta-se aí como a coalizão consolidou-se com a indicação do radical Pedro Aguirre Cerda para concorrer à presidência e como se deu o triunfo da Frente Popular em 1938. Esta parte da obra completa-se no quinto capítulo, onde é feita a análise das dimensões política e econômica do período de governo da Frente Popular e do radicalismo. No sexto capítulo o leitor é brin-
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dado com detalhado painel do debate historiográfico que tem por foco de interesse a experiência política acumulada durante os períodos da modernização chilena, da Frente Popular e do radicalismo. Finalmente, o autor conclui o estudo com a sua explicação do enigma político chileno configurado por volta de 1930 e tragicamente encerrado em 1973.
Finda a leitura do texto, percebe-se que o seu tema central- o seu enigma - não é o anunciado pelo título. A obra, e vem daí seu "caráter reflexivo [na] origem" (p. 23), é etapa de uma linha de reflexão cujas origens estão na purgação do trágico colapso, em 1973, da experiência socialista com liberdade, assunto da primeira visita do autor a este distante país que é o passado chileno (vide Aggio, A., Democracia e Socialismo, São Paulo, Edunesp, 1993). Na verdade, o tema/enigma com o qual o autor é confrontado é o da esquizofrênica relação das elites políticas latino-americanas com a modernização capitalista imposta-assumida-erigida comovalor supremo a subordinar todos os outros na definição do papel do Estado. Nesse ponto, Aggio recusa a cantilena dóminante que atribui a este o papel de demiurgo das patologias sociais convertidas em entranhada natureza dos povos do continente. Sua análise demonstra que, no caso do Chile, o Estado foi, em vez de causador dessas patologias, o grande campo de batalha onde travaram-se combates decisivos dos que forcejavam por debelá-las contra aqueles outros cujas condições de dominação tinham por pré-condição a reiteração ampliada das causas profundas dessas patologias sociais.
Ainda que não seja difícil divergir do autor quanto ao seu modo de operar sofisticadas categorias gramscianas de análise, em especial a de "revolução passiva", seu livro é merecedor de muita atenção, até porque revela que nós, brasileiros, somos estrangeiros bem estranhos: falando dos outros, falamos de nós mesmos.
! STVÁN ]ANCSó é prof do Depto. de História da FFLCH da USP
LANÇAMENTOS
Teoria da Relatividade Especial e Geral
O livrinho, tão acanhado, não dá a idéia da sua preciosidade. Mas, escrito num estilo delicioso e claro, eis a súmula, pelo próprio gênio da celebrada Teoria da Relatividade, Albert Einstein (Editora Contraponto, 136 págs. R$ 19), pela primeira vez em
português. "Esse livro pretende dar uma idéia, a mais exata possível, da Teoria da Relatividade, àqueles que se interessam pela teoria, mas não dominam aparato matemático da física teórica", promete o cientista, falando apenas da maior revolução científica do século.
Astronáutica: do Sonho à Realidade
O lançamento deste estudo do renomado astrônomo Ronaldo Rogério Freitas Mourão coincide com os 30 anos da chegada do homem à Lua, cujo percurso ele descreve com minúcia num texto saboroso que se lê como ficção. Mas a obra explicita toda
a trajetória do desenvolvimento da técnica, desde a colocação em órbita do Sputnik, o satélite russo, em 1957, até o 21 de julho de 1969, quando a Apolo 11 desceu em solo lunar. Uma boa história da conquista espacial (Bertrand Brasil, 686 págs., R$ 55).
O Teorema do Papagaio
Nem sempre é preciso ensinar sem dar prazer. Ainda mais a árida história da matemática. O professor Denis Guedj, docente da Universidade de Paris, decidiu contar a epopéia numérica por uma intricada trama que incluiu Manaus,
de onde chega, para uma livraria de Paris, a coleção de livros de matemática, a maior do mundo, de um estranho homem. Para entender todos os mistérios, os heróis têm de passar em revista Tales, Pitágoras, Fermat, Euler e Bhaskara (Companhia das Letras, 502 págs.).
REVISTAS
Novos Esrudos Novos Estudos Cebrap
Eis o número 55 (novembro de 1999) desta referência bibliográfica quadrimestral para pesquisadores e leigos. O sabor especial desta edição é a celebração dos 30 anos do Centro Brasileiro
=:=.~~..:=~~ de Análise e Planejamento, o Cebrap. Mas, além
de relembrar glórias passadas e remeter às futuras, a revista também traz artigos sobre outros temas. Entre esses: Considerações sobre a poesia brasileira em fim de século, de Iumna Simon; as diversidades e identidades étnicas no Brasil, de Simon Schwartzman; entre outros.
Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental
Tendo como editor Manoel Tosta Berlinck, essa publicação trimestral chega ao vol. II, no 4 (dezembro de 99). Com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP),
a edição reúne artigos de pesquisadores da PUC-SP, Unicamp e da Rede Universitária de Pesquisa. Entre os temas desté número: Benjamin, Proust e o sadismo, de Ernani Chaves; O desejo na Grécia Antiga, de Zeferino Rocha; A entrada do chiste na cena analítica, de Luciano Balboa; e, entre outros, o incesto e as ocorrências incestuosas, de Aluísio de Menezes.
Wired
Capaz de reunir beleza gráfica e conteúdo inteligente, a Wired é leitura de poucos e bons. Na edição de fevereiro, o artigo de capa traz uma longa entrevista com um pioneiro da cibernética, Kevi Warwick, contando como será possível ao homem do futuro
melhorar, com a tecnologia, partes de seu corpo. Detalhe: o cientista já iniciou os trabalhos com implantes em seu próprio corpo. Mais: arquitetos imaginam uma arquitetura que use de tudo e modifique tudo.
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FERNANDO GONSALES
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ESPECIAL PATENTES
Proteção à tecnologia
Especialistas apresentam mecanismos de defesa da propriedade intelectual dos resultados de pesquisa
Em dezembro do ano passado, a Fundação de Amparo à Pesqui
sa do Estado de São Paulo - FAPESP reuniu um grupo de especialistas brasileiros e estrangeiros no workshop Propriedade Intelectual e Patentes. Objetivo: analisar estratégias para aprimorar seus próprios procedimentos relativos à proteção da propriedade intelectual de produtos resultantes das pesquisas que financia e, de modo mais amplo, indicar caminhos para que as instituições de pesquisa possam zelar melhor pelos resultados do trabalho de seus pesquisadores.
Na verdade, nesse campo de propriedade intelectual e patentes de produtos originários da pesquisa brasileira verifica-se um certo impasse. Cada uma a seu modo, as instituições nacionais avançam no desenvolvimento tecnológico e no entrosamento com o setor empresarial, mas ainda tratam com pouca atenção o patenteamento dos resultados das pesquisas - cuidado indispensável quando se almeja a produção em escala industrial dos resultados de experimentos nascidos em laboratório, o retorno social dos investimentos realizados e, mais ainda, financiamentos extras à pesquisa, desta feita de origem privada, capazes de complementar os recursos públicos.
As patentes, por si só, não asseguram o repasse da tecnologia, mas dão às empresas a possibilidade de tecer contratos coesos com as instituições de pesquisa. Sem patente, dificilmente as empresas sentem-se à vontade para investir durante um ou dois anos no desenvolvimento de um produto nascido em um laboratório acadêmico. Portanto, sem uma política clara e eficaz de proteção da propriedade intelectual, será praticamente impossível para as instituições de pesquisa avançarem nos acordos de licen-
PESQUISA FAPESP
ciamento com as empresas. No cenário internacional, as oportunidades estão definidas: já há muitos anos, as indústrias começaram a ver as universidades com outros olhos, especialmente na medida em que as pesquisas em informática e biologia molecular começaram a dar resultados que poderiam gerar lucros.
Dentro desse panorama, a FAPESP, com seu longo histórico de financiamento à pesquisa científi
ca e tecnológica no Estado de São Paulo, e com a atenção especial que vem dispensando nos anos mais recentes à inovação tecnológica - com os programas de Parceria para Inovação Tecnológica (PITE) e Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PITE)-, não poderia manterse ao largo da questão da propriedade intelectual e patentes. Daí seu esforço para atuar de forma mais ativa nesse campo, do qual o workshop foi um ponto de partida.
Neste encarte organizado por Carlos Fioravanti estão resumidas as apresentações de cinco especialistas convidados pela FAPESP. Elas retratam diferentes estratégias de instituições de pesquisa- dos Estados Unidos, de Israel ( escolhido por ser um país que, como o Brasil, contribui com cerca de 1% da produção científica mundial, embora com uma atuação bem mais incisiva no campo da propriedade intelectual) e do próprio Brasil. Os relatos respondem às principais dúvidas dos dirigentes das instituições e dos pesquisadores a respeito do registro das idéias. Mostram que não são poucas as possibilidades de acordos com o setor empresarial e, por fim, indicam como a universidade pode auxiliar a criação e a consolidação de empresas, principalmente quando os mecanismos de proteção à propriedade intelectual já se encontram implantados.
PATENTES
ESTADOS UNIDOS
Da descoberta à cotnercialização
Formado em Economia Política pela Universidade de Indiana, David Allen vive
o desafio de fazer com que a Universidade Estadual de Ohio - a segunda maior nos Estados Unidos, com cerca de 50 mil alunos - amplie os vínculos com o setor empresarial e ajude a transformar a economia do Estado de Ohio, de perfil industrial e conservador, ainda com baixa competitividade nas atividades ligadas à informação e à Internet. Não lhe falta experiência para dar conta do recado. Depois de implantar o Centro de Criação e Desenvolvimento de Empresas na Universidade do Estado da Pensilvânia, Allen transferiu-se para a Universidade de Ohio, onde, de 1991 a 1997, dirigiu o Instituto de Biotecnologia Edison, um centro de pesquisas com renda anual de USS 2 milhões (metade proveniente de contratos com indústrias), e coordenou o Escritório de Transferência de Tecnologia. Atualmente, como vice-presidente-assistente do Escritório de Licenciamento de Tecnologias da Universidade Estadual de Ohio, desenvolve parcerias com empresas e supervisiona os contratos de licenciamento de tecnologias, um campo em que a instituição já construiu certa tradição: do orçamento anual de pesquisa da universidade, cerca de USS 200 milhões, USS 36 milhões provêm de empresas ou associações de empresas. Allen fez duas apresentações no seminário sobre patentes promovido pela FAPESP, Da Descoberta à Propriedade Intelectual e Da Propriedade Intelectual à Comercialização, sintetizadas a seguir.
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Para começar, algumas definições importantes. Uma invenção é uma formulação ou método tecnológico novo e útil, que pode ser comunicada por meio de notificação por escrito ao departamento de patentes ou escritório de licenciamento de tecnologia. A propriedade intelectual cobre um conjunto de tipos de tecnologia, na forma de invenções, patentes, direitos autorais, marca
David Allen registrada, dados e, cada vez mais, know-how. Uma licença é um con
trato que dá à empresa os direitos à propriedade intelectual. Normalmente outorgamos direitos, mas não vendemos a propriedade intelectual. Quando se vende a propriedade intelectual não se pode mais retomá-la e não há garantia de que será desenvolvida.
A Universidade Estadual de Ohio- a segunda maior nos Estados Unidos, com cerca de 50 mil alunos e um orçamento anual de pesquisa deUS$ 210 milhões, dos quais US$ 36 milhões provenientes de empresas ou associações de empresas- não cria empresas, mas trabalha com quem tem interesse em fundar uma empresa que licencie a propriedade intelectual. Nosso escritório cuida de todo o processo de desenvolvimento da tecnologia, da proteção à propriedade intelectual ao licenciamento a empresas. Cuidamos também da comercialização, preparando os contratos que, às vezes, são necessários já no início do processo, a exemplo dos acordos de confiança e de transferência de material. Outros aparecem mais tarde, como os acordos de opção e de licenciamento.
Em 1999, recebemos 100 comunicados de invenções, a maior parte da área de engenharia e medicina. Em 1998, foram apenas 75. Em 1998, registramos 33 patentes, duas a mais do que no ano anterior, e assinamos 26 acordos de comercialização, sendo 13 para licenciamento e 13 para opções, quando a empresa decide num segundo momento se vai realmente aceitar o licenciamento. Algumas opções realizadas no ano passado serão acordos de licenciamento no próximo ano. Recebemos dos contratos com empresas cerca de US$ 1,6 milhão, normalmente com uma variação de 20% para mais ou para menos de um ano para outro.
Em uma reunião com os inventores, determinamos o procedimento mais adequado, ao verificar se a tecnologia já foi publicada ou noticiada em alguma conferên-
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PATENTES
cia ou encontro científico. Freqüentemente, temos de tratar da garantia da propriedade intelectual o mais rápido possível. Já fizemos isso até de um dia para o outro, mas certamente não é uma situação desejável. Nesse encontro, vemos também se a invenção é o resultado de um programa de financiamento ou se há outra empresa ou instituição que, por ter patrocinado a pesquisa, pode ter algum tipo de direito autoral ou propriedade intelectual sobre os resultados.
Para aceitar um projeto e providenciar a patente, exigimos uma demonstração de que a idéia realmente funciona. Não é necessário que se te-nha uma redução de operação à
ESTADOS UN I DOS
se quer realmente avançar para o acordo de licenciamento. Em metade dos casos, fazemos com a empresa um acordo de financiamento para a pesquisa avançar até a fase de desenvolvimento.
Os inventores recebem metade dos primeiros US$ 75 mil em royalties. A outra metade é destinada ao escritório de licenciamento para cobrir despesas com o processo. Depois, os inventores recebem um terço dos royalties, independentemente de permanecerem ou não na universidade. O outro terço vai para o departamento da faculdade onde trabalham ou trabalharam e a parte res-
tante para a agência que financia a pesquisa adicional.
prática, mas um conceito e uma redução conceituai à prática, de forma que se possa demonstrar como, de fato, se poderia desenvolver a tecnologia. A demonstração conceituai em geral não é suficiente para iniciar a comercialização do projeto. Mais cedo ou mais tarde é preciso demonstrar que o projeto pode realmente se tornar operacional.
''Um projeto só avança quando
há transferência real de conhecimento
do laboratório para a empresa''
Para desenvolver um produto com uma empresa, não basta fazer o registro das patentes, que normalmente são incompletas e necessitam de mais trabalho. Patentes, por si mesmas, apenas começam o jogo da comercialização. Um projeto só avança quando há transferência de conhecimento real do pessoal do laboratório para a empresa e quando ocorre,
Procuramos também conhecer os objetivos do inventor. O que ele realmente quer? Ele meramente concluiu mais uma pesquisa financiada ou estaria interessado em comercializar a tecnologia? E de que maneira? É importante que o pesquisador compreenda o que é necessário para se comercializar a tecnologia, já que a tecnologia por si mesma não se transfere. O que se transfere é o conhecimento embutido na tecnologia. o que acontece é que o conhecimento passa dos laboratórios dos pesquisadores para a empresa.
É importante também saber que contatos os inventores têm com os setores ligados à produção, porque de 50% a 70% dos acordos de licenciamento provêm de contatos feitos pelos próprios inventores com ex-alunos ou ex-colegas, que agora trabalham na indústria, ou ainda empresários que conheceram em reuniões, encontros ou conferências. É um mito a idéia de que saímos a campo em busca de empresas. Em geral, as empresas é que nos encontram, porque estão em conta to com os inventores.
Para apresentar o projeto às empresas, formulamos um resumo não confidencial, de uma ou duas páginas, que identifica de forma ampla o que a tecnologia pode fazer, sem especificar de que modo faz. Em seguida, fazemos um acordo confidencial, por meio de uma negociação com o inventor, e procuramos convencer a empresa a visitar os laboratórios da universidade e a conhecer os outros pesquisadores que participam daquele projeto. Quando há sinais claros de interesse, apresentamos nossas condições e damos um prazo para a empresa decidir
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mais do que um bom contrato, um encontro de mentes.
Observamos também que quase todas as patentes bem-sucedidas são renegociadas a cada três anos. É muito difícil chegar a um acordo ideal já no começo, porque os cinco anos seguintes é que definem a viabilidade da comercialização da tecnologia. Na maioria das vezes, é a taxa de royalties que mudamos. Sempre pisamos duro para fazer o produto mais competitivo. Muito raramente pedimos ·mais e muito raramente ganhamos mais. Mas o ponto aqui é o relacionamento, que deve ir bem para assegurar o sucesso do projeto.
Normalmente, não é a tecnologia que não funciona, são as pessoas que não conseguem ou não querem criar os relacionamentos e as condições necessárias para que o projeto se concretize. Caso as empresas não sejam capazes de desenvolver a tecnologia, nós a tomamos de volta e a repatenteamos. Nos últimos dois anos repatenteamos três tecnologias porque as companhias licenciadas não foram capazes de desenvolvê-las ou não tinham atingido as condições estabelecidas no acordo.
Não estamos nesse negócio para ganhar dinheiro. Mais do que ganhar dinheiro, pretendemos, sim, melhorar a universidade e responsabilizá-la, como instituição, pelos recursos que recebe. Desejamos nos tornar mais competitivos, o que implica ter as melhores faculdades, atrair e manter os melhores estudantes e conseguir mais financiamentos para pesquisas. Se, ao contrário, perdermos competitividade, os alunos vão para outras escolas, como o Instituto de Tecnologia de Mas-
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ESTADOS UN I DOS
sachusetts ou a Universidade de Stanford, que se formaram nas duas últimas décadas nesses mesmos moldes.
Pôr a tecnologia em uso e aumentar a competitividade não significa apenas assegurar o patrocínio de pesquisas, mas principalmente ter boas faculdades e bons estudantes. Chegaremos a esses resultados à medida que desenvolvermos as cinco estratégias que nos impomos.
A primeira é mudar a estrutura interna da universidade, que deve incutir novas políticas e uma cultura mais atual de desenvolvimento científico e tecnológico. Temos alguma dificuldade com os estatutos legais do Estado a respeito de propriedade intelec-tual, mas conseguimos uma flexi-
PATENTES
da como uma universidade tecnológica. Queremos abrilhantar nossos astros na pesquisa nessa área, de modo que os pesquisadores possam se ver como excepcionais e serem reconhecidos pelo trabalho que realizam.
Por fim, queremos fortalecer o trabalho em conjunto com outras entidades. Criamos um conselho de liderança com homens de negócios, que coordenam os grupos de tecnologia e indicam os interesses das empresas. Desse modo, estaremos certos de constar na agenda dos empresários quando precisarem de serviços na área tecnológica. Esse conselho tem funcionado muito bem. A
proximidade é um ponto a favor: a sede do conselho fica a cerca de
bilidade maior em patentes e na comercialização dos resultados de pesquisas.
O segundo ponto é redefinir o comportamento administrativo. Concluímos que precisávamos acabar com a duplicação de procedimentos, de uma coordenação e de um sistema de contabilidade mais visível na universidade. Ampliamos o quadro de pessoal, reforçamos a ação da equipe que
'' Queremos consta r na agenda
dois quilômetros do câmpus. Na incubadora de negócios da
universidade, onde as empresas nascentes podem se estabelecer desde que mantenham um relacionamento com a universidade, está estabelecido que 30% dos funcionários serão alunos de graduação. Desse modo, os estudantes poderão se desenvolver e, após sair dos laboratórios universitá-
dos empresários quando precisarem de serviços na área
tecnológica''
busca financiamentos externos para as pesquisas, e fui indicado para vice-presidenteassistente, para cuidar da contabilidade dos contratos, do patenteamento e dos cantatas com as empresas.
A terceira meta é ampliar o fluxo de tecnologia da universidade com as empresas. Para isso, estamos formando uma equipe de comercialização de tecnologia e criando uma instituição não-lucrativa cuja única função será produzir empresas a partir das pesquisas da universidade.
Fazemos com as empresas um contrato por um período de 60 meses, no qual se avalia a viabilidade de comercialização de um jeito mais aberto, sem os critérios de decisões e a política de prioridades da universidade. Nesse tempo, assessoramos a empresa e, se necessário, buscamos financiadores adicionais. Trabalhamos com fundos de investimento de risco, que inicialmente põem deUS$ 100 mil a US$ 2 milhões numa companhia de desenvolvimento tecnológico. Com essa ajuda financeira, as empresas constroem a atividade comercial de um modo muito mais confortável do que a universidade poderia proporcionar. O financiamento chega normalmente quando já há um produto em fase de testes e um público bem definido.
A quarta meta da estratégia de parceria em tecnologia é realmente contar às pessoas o que estamos fazendo e identificar nosso papel como agentes críticos do processo. Somos um ponto-foco que permite à universidade se posicionar melhor no futuro e se tornar conheci-
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rios, entrar nos negócios tecnológicos estabelecidos, primeiro nas
incubadoras e depois na Cidade da Ciência, que é o parque de pesquisa.
Procuramos criar condições para que depois eles próprios abram seus próprios negócios. Designamos um pesquisador sênior que os orienta e diz o que devem saber. Sem liderança, não se vai a parte alguma. Esse é um ponto claro para nós há muito tempo. Cada um, do funcionário rríais simples ao presidente, vive se perguntando o que pode fazer para, desde o ensino médio, os nossos colleges, criar um ambiente positivo e desenvolver a capacidade de trabalho e a criatividade nos amigos.
Podemos medir esse empenho coletivo por meio do volume de financiamento recebido ou da contribuição para novos negócios e por nossa capacidade de atrair os melhores estudantes do país, que no passado iriam para outras universidades. Podemos avaliar nosso trabalho também pelo acervo de patentes de invenções, royalties e companhias de start up.
Com esse modelo, esperamos ser capazes de drenar mais capital e estabelecer um programa de pesquisa de classe mundial a um quilômetro do câmpus, numa área onde ainda não há muito mais que o verde. Precisamos comunicar o que a universidade faz. De nosso orçamento, 60% vêm dos contratos de licenciamento com 26 empresas, 20% do Estado de Ohio e 20% de doações. E, descobrimos, o melhor jeito de motivar as pessoas a assinar aqueles cheques para a universidade é mostrar os ganhos econômicos que podemos proporcionar.
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PATE N TES
ISRAEL
Os riscos e as possibilidades de negócios
Paulina Ben-Ami, vicepresidente de patentes e propriedade intelectual
da Companhia Yeda de Pesquisa e Desenvolvimento, a empresa de transferência de tecnologia do Instituto Weizmann de Ciências, criada em 1959, explicou por que os institutos de pesquisa de Israel, tanto quanto os dos Estados Unidos, não se cansam de propor projetas conjuntos com o setor empresarial. Em primeiro lugar, porque nesses países o Estado financia a pesquisa apenas parcialmente. Em segundo lugar, por causa da "consciência da necessidade de transferir à sociedade os resultados da pesquisa desenvolvida nas instituições com financiamento público". Brasileira e israelense, formada em Química pela Universidade de São Paulo, com pós-graduação na Universidade Hebraica de Jerusalém, Paulina foi diretora da Divisão de Química e Biotecnologia do Escritório de Patentes de Israel, até se transferir para a Yeda, em 1990. Sua exposição, Proteção da Propriedade Intelectual em uma Instituição Acadêmica, deixou evidente a importância da proteção dos resultados de pesquisa, quando se cogita a produção em escala industrial: "Nenhuma empresa assina um contrato de licença sem que a invenção esteja protegida por um pedido de patente ou já patenteada", comentou. Perita em propriedade intelectual, Paulina participou de projetas da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (Ompi) em países da América Latina, incluindo o Brasil.
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A patente é uma modalidade de propriedade industrial que protege uma invenção que é nova, tem caráter inventivo e é útil. Sendo uma propriedade, a patente tem valor econômico e permite uma série de operações financeiras, tais como sua venda ou licenciamento a fim de manufaturar produtos ou fornecer serviços protegidos pela patente. De modo geral, as opções estratégicas
Paulina Ben-Ami de um titular de patente incluem: 1 - A exploração própria da patente;
2 - O uso da patente para impedir sua exploração por terceiros; 3 - A transferência dos direitos da patente a terceiros, mediante compensação financeira; 4- A concessão de licença a terceiros, que pode ser exclusiva, excluindo o próprio titular, ou não-exclusiva, mediante pagamentos de royalties e outras compensações; e 5 - O uso da patente como sua parte na constituição de uma nova empresa (start up).
Quando o titular da patente é uma instituição acadêmica, somente as opções 3 a 5 são viáveis. Por não ser produtora ou fornecedora de serviços, a instituição não explora a patente por si própria e não usa a patente para impedir que 'outros a explorem, porque uma de suas finalidades é transferir a tecnologia gerada nos seus laboratórios à sociedade. A transferência dos direitos da patente a terceiros, apesar de viável, é pouco usada, restando, portanto, o licenciamento da patente a empresas ou o estabelecimento de companhias start up baseadas na tecnologia patenteada.
Quais os motivos que levam as universidades e os institutos de pesquisa a procurar essa colaboração com a indústria e o setor empresarial? Por um lado, a busca de verbas para a pesquisa, em países como os Estados Unidos e Israel, nos quais a pesquisa universitária é financiada apenas parcialmente pelo Estado, e, por outro lado, a consciência da necessidade de transferir à sociedade os resultados da pesquisa desenvolvida nas instituições com financiamento público.
Os contratos entre uma instituição acadêmica e as empresas interessadas nas tecnologias propostas podem ser de vários tipos: a - Contrato de pesquisa com opção a licença, segundo o qual a empresa financia a pesquisa ainda em estágio pre-
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ISRAEL
liminar por um prazo determinado (geralmente de um a três anos) e tem a opção de negociar uma licença se os resultados da pesquisa forem positivos; b- Contrato de pesquisa e de licença, que fixa desde o início o financiamento da pesquisa e as condições da licença; c - Contrato de opção, feito quando o pedido de patente já foi depositado, a pesquisa está mais avançada e a empresa requer um certo tempo para avaliação da invenção; e d- Contrato de licença, feito após a concessão da patente, muito raro porque geralmente as invenções nas instituições acadêmicas são de caráter preliminar e necessitam de pesquisa adicional antes de sua comercialização.
PATENTES
As desvantagens: 1 - A dificuldade de licenciar projetas em estágio muito preliminar; 2 - Decisões lentas (quanto maior a empresa, mais tempo para a tomada de decisão); 3 - O financiamento da pesquisa depende de concluir com sucesso e nos prazos determinados etapas ( milestones) do projeto definidas no contrato; 4- A falta de investimento agressivo no desenvolvimento ou marketing do projeto por vários motivos, inclusive a prioridade a outros projetos;
5 -A exigência de sigilo e de limitação de colaboração com outros
O contrato entre uma instituição acadêmica e uma empresa deve considerar os interesses das duas partes e estipular, por um lado, que os interesses da empresa sejam assegurados por meio do depósito de um pedido de patente para cada invenção resultante da pesquisa financiada pela empresa antes de sua publicação científica, e, por outro lado, que
''É importante que os direitos da
licença voltem
pesquisadores; 6- O perigo de mudança repentina da estratégia da empresa, que pode resultar no término do projeto em qualquer estágio, independentemente de seus resultados. Por essa razão é importante que todas as patentes estejam no nome da instituição e é preciso assegurar no contrato que todos os direitos da licença voltem à insti-
à instituição caso o contrato com a em presa
seja interrompido''
os interesses acadêmicos sejam assegurados por meio da definição do prazo concedido ao licenciado para proceder com o depósito do pedido de patente (geralmente, de dois a três meses), evitando, assim, a protelação da desejada publicação científica.
Uma das grandes dificuldades no licenciamento de projetos acadêmicos à indústria reside no fato de as pesquisas acadêmicas serem de caráter preliminar (seed stage) e progredirem a passos lentos. Uma forma mais recente de promover o desenvolvimento de novos produtos baseados em pesquisa acadêmica consiste no estabelecimento de empresas novas (start up) com a ajuda de capital de risco ( venture capital), provido por particulares ou por fundos de investimento de capital de risco. Essas empresas start up investem um capital inicial para desenvolver a tecnologia até um estágio mais avançado que permite, então, a venda da tecnologia e/ou da start upa uma empresa estratégica ou a outros investidores e/ou negociação de suas ações na bolsa de valores.
Vamos agora comparar as vantagens e as desvantagens do licenciamento de um projeto acadêmico a uma empresa estratégica ou a uma start up. As vantagens de um contrato com uma companhia estratégica incluem: 1 - Um período mais longo de financiamento da pesquisa; 2 - A capacidade para desenvolver, produzir e vender os produtos, e compromisso contratual para fazê-lo; e 3 - Pagamento de honorários de licença (license fees), além dos royalties da venda.
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tuição em caso de interrupção do contrato por parte da empresa.
As vantagens de um contrato com um fundo de capital de risco e a criação de uma start up incluem: 1 - O financiamento maior da pesquisa inicial; 2 - Decisões mais rápidas; e 3 - O fato de a instituição e os pesquisadores receberem ações da coml?anhia start up.
E as desvantagens: 1 -A possibilidade de concessão de licença a uma organização inexperiente; 2 - A limitação de recursos financeiros; 3 - A dificuldade em recrutar profissionais capacitados para a pesquisa e o desenvolvimento da tecnologia e para a administração da start up; 4- A possibilidade de fusão ou venda da start upa terceiros ou ao público; e 5 - O perigo de conflitos de interesses entre os acionistas e o Conselho de Diretores da start up.
O estudo da Yeda, que em hebraico significa conhecimento ou know-how, a empresa de transferência de tecnologia do Instituto Weizmann de Ciências, pode servir como exemplo da forma que uma instituição acadêmica protege a propriedade intelectual e transfere com sucesso os resultados de sua pesquisa aplicada ao setor empresarial.
A Yeda, criada em 1959, funciona como um braço comercial do Instituto Weizmann, uma instituição sem fins
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PATE NTE S
lucrativos fundada em 1934, que conta com cerca de 400 professores e pesquisadores, 250 estudantes de mestrado, SOO doutorandos, 200 pós-doutorandos, 800 técnicos e engenheiros e 250 funcionários administrativos. Cerca de 900 projetos de pesquisa básica e aplicada encontram-se em andamento. Do orçamento de cerca US$ 170 milhões anuais, 50% são fornecidos pelo estado e de 10% a 15% provêm de royalties de projetos licenciados.
Os vice-presidentes de Ciência e Tecnologia e de Propriedade Intelectual da Yeda identificam e avaliam os projetos de pesquisa com potencial comercial, os quais são, então, apresentados ao Comitê de Patentes interno, do qual fazem
I SRAEL
Os assessores desse fundo têm livre acesso aos pesquisadores do instituto, para que possam eles também identificar e monitorar as oportunidades, mesmo antes dos resultados finais. Desde seu estabelecimento, cinco companhias start up foram criadas - três na área de Ciências Biológicas, uma em Eletroóptica e uma em Biossensores -e dois outros projetos estão em negociação. Um contrato feito entre a Yeda, o instituto e este fundo, já no seu estabelecimento, determinou as condições referentes a equity (participação acionária) e antidiluição, tanto da Yeda como dos pesquisadores, ao financiamento da pes-
quisa e aos royalties. A Yeda tem contratos de pes
parte os dois VPs e mais o presidente da Yeda e o VP de Transferência de Tecnologia do instituto. Os projetos aprovados são então protegidos através do depósito de pedidos de patente e oferecidos para licença, por meio de sua apresentação no siteda Yeda na Internet e a empresários que visitam o instituto ou por meio de contatos com empresas ou investidores de capital de risco feitos pela dire-
''Se os pesquisadores põem uma quantia do paga menta no
laboratório, o instituto contribui com uma
quantia igual''
quisa e de licença com mais de 20 empresas, 65% das quais são estrangeiras, e participou na criação de cerca de 20 companhias start up. Os royalties anuais recebidos das vendas, principalmente no exterior, dos produtos licenciados (quatro medicamentos e um cartão inteligente), da ordem de vários milhões de dólares, só tendem a crescer com o lançamento de no-
ção da Yeda ou por intermédio dos cientistas. Identificadas as empresas interessadas na licença ou os investidores interessados em estabelecer uma start up, começa o processo das negociações, levado a cabo pelo presidente da Yeda, assessorado pelos VPs e com a colaboração dos cientistas.
Sendo Israel um mercado pequeno, de 6 milhões de habitantes, nem sempre as indústrias nacionais podem absorver e desenvolver tecnologias originadas nas universidades. Isso faz com que grande parte dos esforços da Yeda se dirija à procura de empresas estrangeiras para licenciar as pesquisas do instituto. Também as start ups estabelecidas pela Yeda em Israel, no final das contas, procurarão empresas estrangeiras para a negociação de sua tecnologia. Por essa razão, a Yeda investe muito no patenteamento das invenções no estrangeiro, principalmente Estados Unidos, Europa e Japão, e na preparação dos contratos de licença.
Outra característica sui generis refere-se à criação de um fundo de capital de risco dedicado ao Instituto Weizmann. Esse fundo, estabelecido em 1996 com capital estrangeiro (cerca de US$ 17 milhões), por iniciativa do instituto, tem o direito exclusivo da primeira oportunidade com relação aos frutos da pesquisa feita na entidade, ou seja, todos os projetos em andamento no instituto, incluindo aqueles em oferta de licença, são apresentados pela Yeda primeiro a esse fundo, o qual pode escolher entre eles os projetos que considera interessantes para a criação de uma start up.
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vos produtos farmacêuticos nos Estados Unidos e na Europa.
Deduzidas as despesas, a Yeda entrega 60% dos royalties ao Instituto Weizmann, para aplicação em novas pesquisas, e distribui os 40% restantes aos pesquisadores e aos inventores, sejam professores, estudantes ou técnicos, de acordo com a divisão que eles próprios acertaram e comunicaram à Yeda antes de depositado o pedido de patente. Se os pesquisadores resolvem colocar uma quantia do seu pagamento pessoal no laboratório em que trabalham, o instituto contribui com um valor igual.
A proteção da propriedade intelectual, por meio das patentes, é muito importante nesse processo da comercialização porque nenhuma empresa assina um contrato de licença sem que a invenção esteja protegida por um pedido de patente ou já patenteada. A Yeda recebe anualmente de 70 a 80 novas propostas (em 1999, 90) e deposita de 50 a 60 novos pedidos de patente inicialmente em Israel ou nos Estados Unidos, dos quais cerca de 40 são, após 12 meses, depositados no exterior.
Os custos envolvidos no processo de patenteamento são altos, mas necessários. Uma vez licenciadas, todas as despesas das patentes são pagas pelo licenciado, inclusive as de data anterior à da licença. Em 1999, a Yeda pagou diretamente cerca de US$ 900 mil de despesas com patentes, dos quais US$ 400 mil foram recebidos de volta dos licenciados. Além disso, estimamos que os pagamentos relativos a patentes da Yeda feitos diretamente por licenciados foram da ordem de US$ 2 milhões.
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PATENTES
I S RAEL
En1 contato direto con1 os pesquisadores
R enée Ben-lsrael, cientista social formada nos anos 70 pela Universidade
de São Paulo, trabalha desde 1988 na Yissum Companhia para o Desenvolvimento da Pesquisa, o escritório de licenciamento de tecnologia da Universidade Hebraica de Jerusalém, uma das mais antigas de Israel, com 1.200
Renée Ben-lsrael
A Yissum, em hebraico, significa aplicação. É uma empresa privada economicamente autônoma, que tem o monopólio da comercialização dos resultados de pesquisa da Universidade Hebraica de Jerusalém. Temos cerca de 1.200 cientistas e 24 mil estudantes- 30% dos doutorados de Israel são realizados na Universidade Hebraica. Estão em andamento no momento cerca de 3.500 projetos de pesquisa, financiados por verbas internas, provenien
cientistas e 24 mil estudantes. A equipe de 15 funcionários da Yissum vive atenta para descobrir quais projetas de pesquisa em andamento na universidade (3.500, no momento) serão concluídos em breve e, principalmente, quais podem ser produzidos comercialmente. Como os colegas, Renée é uma profissional de múltiplas tarefas. Atende os inventores, a quem serve de guia no labirinto jurídico da propriedade industrial, avalia a maturidade e as possibilidades de desdobramentos comerciais dos projetas de pesquisa, providencia o registro das patentes e prepara os acordos de licenciamento de tecnologias com as empresas. Como gerente de propriedade intelectual faz, enfim, a articulação entre pesquisadores, empresários e investidores. Um trabalho que ela considera uma legítima acrobacia, com regras claras, mas também indispensável dose de sorte. Na apresentação que fez na FAPESP, Administração de Propriedade Intelectual Universitária: A Arte da Acrobacia, Renée tratou das possibilidades e das dificuldades de trabalho com os pesquisadores e com os empresários interessados em novas tecnologias.
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tes do Estado e das mensalidades de alunos, e externas, públicas ou particulares.
A Universidade Hebraica conta com duas entidades para administrar os recursos financeiros: a autoridade para Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e a Yissum. A primeira lida com as bolsas de estudo e com as verbas de origem não-comercial. Negocia fundos de pesquisas com outras universidades, procura contatos com agências de financiamento e fomenta a cooperação internacional.
A Yissum cuida dos assuntos comerciais. Fazemos arranjos comerciais com indústrias, fundos de risco e desenvolvemos uma série de outras possibilidades comerciais. A Yissum registra entre 40 e 50 novos pedidos de patentes por ano e o portfólio ativo é de aproximadamente 800 pa~ntes e 200 projetos à venda, ou seja, oferecidos para diversos tipos de colaborações econômicas. Lidamos com a academia, com a indústria, com o mundo legal dos advogados e da propriedade industrial e com o mundo financeiro, cada um com suas próprias regras, características e interesses. Como sobreviver andando nessa corda bamba sem perder o foco e a dignidade? É A Arte da Acrobacia.
Nossas funções se desdobram em três categorias interligadas que exigem alto nível de coordenação: política, entre entidades e internacional. O trabalho é político, num sentido amplo, antes de mais nada, porque propriedade intelectual tornou-se um assunto popular, questionado eticamente no sentido da própria atividade comercial no câmpus e em áreas como a biotecnologia e a utilização de reservas naturais, por exemplo. Se há algum tempo podíamos trabalhar sossegadamente, sem sermos questionados, hoje devemos explicações, respostas e relatórios a diversos grupos, pois os projetos são financiados pelo Estado, por bancos, por uma indústria ou por um consórcio de empresas. Temos o dever de explicar. De
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PATENTES ISRAEL
certa maneira, vivemos num que é a mercadoria que temos para aquário, estamos sob um escrutínio constante.
A segunda categoria seria a da coordenação das relações interpessoais e entre entidades. Não basta haver uma tecnologia de alto nível, um excelente mecanismo de proteção de propriedade intelectual e uma companhia muito interessada nas novas técnicas. Sem unir todas as peças do quebra-cabeça, não
'' Podemos recusa r algo brilhante em termos científicos,
porque fazemos distinção entre ciência
e tecnologia''
vender, e 20% em itens variados, como trocas de equipamentos, serviços legais e auditoria. De que forma obtemos tais resultados com apenas 15 funcionários? Antes de mais nada, com a otimização das forças locais, a experiência na seleção de projetos (com o tempo desenvolvemos um certo faro, que ajuda a não perder tempo com projetos inúteis) e finalmente com o outsour-
teremos nenhum acordo. A articulação internacional é importante porque não
há mais ciência feita em um só lugar. Estamos vendo, por um lado, avançarem os projetos internacionais puramente acadêmicos como mistos, feitos com a indústria, e, por outro, as companhias se fundirem ou serem englobadas umas por outras. Temos de agir de acordo com essa realidade. Além disso, é dificílimo realizar um licenciamento clássico de uma tecnologia, protegida por uma patente, a uma única empresa. Vivemos mais e mais situações mistas, nas quais uma tecnologia pertence a diversas entidades, é protegida por diversas patentes e copyrights e é licenciada a um grupo de capital de risco, que por sua vez quer lançá-la em bolsa de valores quando atingir um estágio mais avançado.
Cuidamos do trabalho de relações públicas, dentro e fora da universidade, do marketing da própria companhia e das invenções e do financiamento às pesquisas. Por ser de certa forma uma empresa de serviço, temos de atender a todos os telefonemas e depois fazer a triagem.
O turnoverda Yissum em 1999 foi de cerca deUS$ 15 milhões. O orçamento interno é de um décimo, distribuído do seguinte modo: 40% em salários, 40% em patentes,
cing, a utilização de forças externas. Delegamos o trabalho do registro
das patentes a profissionais especializados, por diversos motivos. Primeiro, porque temos de dar cobertura a diversos campos e seria difícil manter um grupo de advogados de patentes que pudesse cobrir todas as áreas da universidade. Segundo, porque trabalhamos num mundo profissional e temos de procurar a melhor solução possível para cada problema.
No Departamento de Propriedade Intelectual, do qual faço parte, recebo os primeiros telefonemas e faço a primeira triagem. Pergunto aos pesquisadores: Já publicou? Vai publicar quando? Em que estágio está a pesquisa? Recebeu bolsa ou financiamento de alguém a quem esteja devendo alguma explicação? Tem colaborador em outro lugar? Essas perguntas são essenciais porque a partir das respostas poderemos estabelecer se temos nas mãos uma tecnologia patenteável ou não e até mesmo se temos direito a essa tecnologia. Há casos de bolsas ou de financiamentos que exigem boa parte dos direitos de propriedade intelectual ou de uma parceria que dificulte a futura comercializa~ão e inutilize nosso trabalho.
Para ser patenteada a invenção deve ser original, nãoóbvia e ter alguma aplicação útil. Esses são os critérios
formais, que não bastam.
Receita Gerada com Novos Contratos em 1999 Para que a Yissum resolva investir num plano que inclua a proteção da propriedade intelectual, a invenção deve preencher mais alguns requisitos, que levam em conta o tempo, esforço do desenvolvimento de marke-
7.000
6.000
5.000
[ 4.000
.. :l 3.000
2.000
1.000
o Pesquisa Serviços Total
Fonte:Yissum Companhia para o Desenvolvimento da Pesquisa da Universidade Hebraica de Jerusalém
PESQUISA FAPESP
• Ciências Naturais
• Medicina
• Agricultura
• Farmácia
• Outros
• Total
ting, de contratos, enfim, de toda a equipe.
Em certos casos registramos uma idéia sem esses critérios, quando há um feedback, por exemplo, de uma empresa de capital de risco, que precisa do número do registro da patente para levar
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I S RA EL
o projeto à bolsa de valores e conseguir financiamento. O interesse comercial não precisa ser imediato, pois a Yissum procura conciliar projetas a curto e longo prazos.
Consultamos especialistas das indústrias e procuramos recolher o máximo de informação possível, por meio de uma consultaria interna, da equipe de marketing ou de propriedade intelectual e até mesmo os agentes de patentes, antes de tomar a decisão final, que é sempre da Yissum. Depois dessa análise, enviamos uma carta padrão ao inventor comunicando que vamos ou não registrar a patente e salientando que o critério de seleção é puramente comercial. Podemos recusar algo brilhante em termos
PATE N TE S
que uma patente possa ser importante apenas daqui a dez anos, pode não ser inteligente registrá-la hoje, porque daqui a dez anos ela terá dez anos de vida a menos; • O mercado já existe ou será preciso esperar que se desenvolva?; • Quais os investimentos realizados nesse mercado?; • Em que estágio se encontra a invenção? É uma idéia ou há indicações de que realmente possa funcionar? Se registramos muito cedo, a patente pode expirar antes de o produto chegar ao mercado; • Quais serão as reivindicações dessa patente? É uma pa
tente de um processo, que depois será difícil saber quem a está utili
científicos, porque fazemos distinção entre ciência e tecnologia. Há algum tempo se discutiu amplamente se as patentes deveriam ser utilizadas como publicações na promoção de cientistas na universidade. Minha recomendação foi que não. Patentes podem ser conferidas a muitos assuntos cientificamente pouco relevantes.
''É importante ver zando, de uma molécula ou de um material?; • Qual é a dinâmica nessa área? Esse campo está se desenvolvendo tão rápido que, quando conseguirmos a aprovação do registro, a patente já estará obsoleta? Isso acontece muito com computadores, uma área em que as patentes têm de ser licenciadas rapidamente para não perderem o valor;
a pessoa do outro lado como quem também
está procurando o sucesso. E sermos sinceros e diretos ''
Até o começo de dezembro de 1999, tivemos 71 novas solicita-ções para registras de patentes. Re-gistramos 47. Normalmente, registramos por ano entre 45 e 50 patentes, a maioria provisórias. Foram concedidas 21 patentes e licenciamos 16.
Há dois tipos de abordagens para registrar uma patente. O conservador consiste em enviar uma página redigida sobre a invenção a algumas empresas e, se houver interesse pelo projeto, registrar a patente. Ou então quando houver alguém que mantenha essa patente e que pague por ela. O outro enfoque é mais aventureiro e exige dois tipos de pergunta. A primeira: será que essa invenção pode ser patenteada? É uma pergunta fácil, porque, como já sabemos, uma idéia para ser patenteada não pode ser óbvia e deve ser original e ter um potencial comercial. A outra pergunta é mais relevante: quando dizer que uma invenção é comercialmente atraente?
Hoje, a Yissum conseguiu ter um patrimônio que lhe permite um certo comportamento aventureiro. Pode se dar ao luxo de registrar patentes mesmo que não sejam imediatamente bem-sucedidas. Creio que são essas as perguntas mais relevantes: • Quais as necessidades do mercado? São coisas realmente importantes ou algo irrelevante?; • Qual o tamanho do mercado? A invenção vai servir apenas para laboratórios esotéricos ou atenderá a um público bem mais amplo?; • Qual a situação do mercado no momento? O invento responde a uma necessidade atual ou diz respeito a uma demanda que pode surgir daqui a alguns anos? Se ocorrer
lO
• Quem são os inventores? São líderes conhecidos nas respectivas
áreas? Sabem quais são as necessidades do mercado ou apenas inventam soluções para problemas inexistentes? Já tiveram outros sucessos, são cooperativos?
Não há respostas fáceis. Damos uns chutes, inteligentes e educados, mas, ainda assim, chutes. Temos todas as ferramentas de análise, mas nem sempre temos sucesso. Não temos comitês· de análise de patentes, que não queremos usar porque já tivemos muitos problemas. Eles são tradicionalmente lentos e nós necessitamos de rapidez e agilidade.
Usamos às vezes consultaria externa, que nos ajuda a apresentar uma tecnologia não confidencial a uma empresa. Jogamos verde para colher maduro. Nem sempre temos sucesso. O problema nesse esquema são as restrições acadêmicas, já que os pesquisadores querem publicar rapidamente o resultado de seus trabalhos.
Outro fator importante é olhar nos olhos de quem está falando. Há pouco tempo, na Holanda, expliquei longamente a situação e as perspectivas de uma patente a um empresário até que, de repente, ele comentou que o projeto estava lhe parecendo em ritmo muito lento. Em seguida, perguntou por quê. Entendi o problema dele. Concordei e fui ver como poderia acelerar o trabalho. É importante ver a pessoa do outro lado como quem também está procurando o sucesso. E sermos sinceros e diretos, como ele foi. E, finalmente, o que nunca é demais: sorte. É o que desejo a todos os que estão começando esta aventura, muito fôlego e muita sorte. ·
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PAT EN T ES
BRAS I L
O resultado das estratégias das instituições brasileiras
C om uma notável visão da história e das perspectivas
O Brasil, apesar de ter assinado a Convenção da União de Paris em 1883, que organizou o assunto da propriedade intelectual no final do século passado, pouco fez no decorrer deste século para introduzir a cultura, estabelecer políticas públicas coerentes e difundir os princípios da propriedade intelectual.
da propriedade intelectual no Brasil, Maria Celeste Emerick, coordenadora de Gestão Tecnológica da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro, mostrou quão pouco eficazes e estruturadas são, ainda, as formas
Maria Celeste Emerick
Um marco no cenário nacional sobre a propriedade intelectual é a ratificação pelo Brasil, com o decre-
de atuação das instituições nacionais de pesquisa nessa área - algumas vezes a inconsistência mesclando-se com a displicência, a ponto de permitir que importantes materiais ou resultados de pesquisas deixem o País sem qualquer controle. Maria Celeste- socióloga formada pela Universidade Federal de Juiz de Fora (Uf JF), de Minas Gerais - ingressou em 1986 na Fiocruz, onde, em 1990, participou da criação e passou a coordenar a área de Gestão Tecnológica, que elabora e implementa a política de Propriedade Intelectual e Comercialização de Tecnologia na instituição. Maria Celeste dividiu sua apresentação Propriedade Intelectual e Comercialização de Tecnologia em Instituições Acadêmicas no Brasil em três partes. Na primeira, descreveu as mudanças no cenário brasileiro na década de 90. Em seguida, analisou os resultados de políticas institucionais de propriedade intelectual. Por fim, expôs sugestões por meio das quais as agências de financiamento poderiam promover de modo mais intensivo a comercialização dos resultados da pesquisa no Brasil.
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to legislativo n° 1.355, de 30 de dezembro de 1994, do Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (Trips), um acordo internacional que mudou bastante as regras do jogo no campo da propriedade intelectual. Costuma-se dizer que a Convenção de Paris era uma convenção sem dentes e o Trips é uma convenção com dentes: dá prazos e estabelece obrigatoriedade de patenteamento em determinados setores, como a biotecnologia, química fina e alimentos. Ao ratificar esse acordo, o Brasil teve de rever a legislação sobre propriedade industrial e direito autoral. Teve de fazer novas leis sobre proteção de software, proteção de cultivares, além de outras ainda em estudo, como o projeto de lei de proteção de topografia de circuitos integrados, em fase de discussão no Congresso Nacional.
O decreto no 2.553, de 16 de abril de 1998, que regulamenta os artigos da Lei 9.279/96, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, pretende estimular o patenteamento nas instituições acadêmicas, por meio da premiação do inventor. Depois das portarias dos Ministérios da Ciência e Tecnologia no 88/98 e da Educação no 322/98, que regulamentaram esse decreto, tanto as universidades como as instituições de pesquisas vinculadas ao Ministério da Ciência e Tecnologia deveriam cumprir o que está determinado, que basicamente é prever o ganho para o servidor-inventor.
Chamo a atenção para um detalhe da Lei de Patentes, a questão da titularidade, ou seja, a quem pertencem as invenções. A invenção pode pertencer exclusivamente ao empregador, exclusivamente ao empregado ou pertencer às duas partes, como acontece nas instituições públicas brasileiras. Em geral, o titular é a própria instituição, que pode também prever a co-titularidade. Em princípio o empregador tem o direito da titularidade, mas há possibilidade de pensar em outras alternativas.
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BRASIL
Três expenencias estão ampliando a discussão no Brasil sobre propriedade intelectual: o Grupo Interministerial, a Rede Temática e o Projeto Inventiva.
O Grupo Interministerial foi criado em 1995 no âmbito da Câmara de Comércio Exterior, articulado pela Casa Civil. É composto por todos os ministérios que produzem tecnologia ou regulam o desenvolvimento da ciência e tecnologia. Seu principal objetivo é definir a política de governo e apoiar as negociações internacionais. Não tínhamos interlocuto-res nos ministérios, inclusive no
PATENTES
·A dificuldade em estabelecer o preço de uma tecnologia; • O desconhecimento do mercado.
Outra iniciativa é o Projeto Inventiva, desenvolvido em conjunto pelo Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo e pelo INPI, com apoio do Sebrae e da Federação e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo ( Ciesp/Fiesp). Procurou detalhar as demandas e as dificuldades dos inventores e estimular a criatividade e a
inovação nas instituições de pes
de Ciência e Tecnologia, até muito recentemente.
A Rede Temática de Propriedade Intelectual, Cooperação, Negociação e Comercialização de Tecnologia (Repict), criada no âmbito da Rede de Tecnologia do Rio de Janeiro, é uma entidade privada sem fins lucrativos que congrega instituições de pesquisa, fomento e associações empresariais do Estado, com o objetivo de
''A maior dificuldade das instituições
acadêmicas são as cooperações informais ou não formalizadas adequadamente''
quisa e nas indústrias. A amostragem: 14 institutos tecnológicos, 12 incubadoras tecnológicas, 3 centros educacionais, 37 microempresas, 5 empresas de grande porte, 2 associações de inventores e 5 secretarias estaduais de indústria e comércio ou de ciência e tecnologia.
O relatório final, concluído em marco de 1998, indicou:
contribuir para subsidiar a formulação e a implementação política de propriedade intelectual nas empresas, universidades e instituições de pesquisa do Rio de Janeiro. Mas o foco já saiu do Rio e ganha expressão nacional, com a participação de instituições com bastante experiência, como Petrobras, Embrapa, USP, Unicamp, IPT, Fiocruz e outras instituições acadêmicas e associações empresariais.
No evento Política de Propriedade Intelectual, Cooperação, Negociação e Comercialização de Tecnologia: Análises e Proposições, realizado pela Rede em 1998, com 165 participantes de 15 Estados, fizemos documentos dos grupos de trabalho que constituem um diagnóstico do País. Nada muito diferente do que sabemos, mas foi construído coletivamente, de forma participativa. Esse diagnóstico indicou: • O desconhecimento profundo da necessidade de proteção dos processos de patenteamento, negociação e comercialização dos resultados da pesquisas; • A carência de políticas governamentais e institucionais de regulamentação de propriedade intelectual no País; • A carência de gestores, professores e pesquisadores nessa área; • A necessidade de mudar a cultura no ambiente acadêmico e nas agências de fomento a respeito da propriedade intelectual; • A inexistência de políticas claras das agências de fomento nesse campo; • A desigualdade de condições de negociações das universidades e institutos brasileiros nas parcerias com instituições estrangeiras;
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com patentes;
• 93% das instituições não fazem previsão orçamentária de gastos
• 85,7% não concedem prêmios ou vantagens econômicas aos inventores em decorrência da exploração das patentes; • 64% não utilizam cláusulas relativas à propriedade intelectual nos acordos, convênios ou contratos de cooperação em pesquisa ou assistência técnica; • 57% tratam diretamente com o INPI do depósito e do acompanhamento dos processos de patente para reduzir os custos; • 36% fazem ~usca do estado-da-arte em patentes; • Apenas quatro entre as instituições de pesquisa analisadas dispõem de uma política formal de propriedade intelectual; • Nenhuma adota critérios de seleção das invenções a serem protegidas.
O resultado a que se chegou é portanto muito parecido com o diagnóstico da Rede Temática: inexistência de políticas de propriedade intelectual e comercialização de tecnologia nas instituições acadêmicas e tecnológicas, pouco patenteamento nas universidades, poucos contratos negociados e poucas negociações que dêem retorno financeiro.
Não basta saber quando e como fazer um pedido de patente. É preciso ter um entendimento geral da política e cultura institucional e da pesquisa. A maior dificuldade das instituições acadêmicas são as cooperações informais ou não formalizadas adequadamente. Nessa área, o calcanhar-de-aquiles é o fluxo informal e descontrolado de informações entre pesquisadores de instituições brasileiras e estrangeiras.
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PATENTES
Em minha análise, inspirei-me em quatro grupos de instituições: · Os institutos de pesquisas vinculados a empresas estatais (Petrobras, Eletrobras e Telebrás, que têm esse assunto bastante bem organizado há duas décadas). • O Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), vinculado ao governo estadual, com bastante experiência nessa área; • Duas instituições públicas, a Fiocruz e a Embrapa, vinculadas ao governo federal, portanto, a órgãos executivos
BRAS I L
na Unicamp e em outras instituições com experiência em parcerias e cooperação tecnológica. É comum a existência de várias instâncias que tratam do assunto e uma não dialogar com a outra.
É uma tourada negociar qualquer tecnologia porque os departamentos jurídicos normalmente estão defasados no entendimento das leis relacionadas à transferência de tecnologia e, na prática, dificultam demais os acordos com as empresas. Outro grande nó é a pre-
de governo; • A universidade, peculiar por explorar um conjunto maior de áreas do conhecimento e dispor de maior liberdade de pesquisa do que outras instituições públicas.
''Boa parte
cariedade dos mecanismos de planejamento, financiamento e avaliação das pesquisas. Boa parte das instituições não sabe que projetos está realizando, a que se propõem e se terminaram com êxito. Em geral as instituições ficam satisfeitas apenas com o número de trabalhos publicados.
De modo geral, a propriedade intelectual não integra a visão estratégica das instituições. Na maiorias das vezes, é
das instituições não sabe que projetas
está realizando, a que se propoem e se
terminaram com êxito''
Se não mudarmos nossa cultura, perderemos tudo o que fizemos e estamos fazendo na pesquisa.
um pesquisador sozinho ou um grupo pequeno que procura, isoladamente, descobrir os mecanismos de proteção de seu trabalho, nem sempre com resultados satisfatórios. Mas não adianta fazer uma patente sem olhar para o mercado, sem pensar em dinheiro. A patente deve ser vista como um mecanismo que pode contribuir para que o resultado de uma pesquisa chegue até o mercado.
Os Centros de Pesquisa e Desenvolvimento da Petrobras e da Telebrás talvez sejam das poucas instituições brasileiras que montaram uma estrutura e uma visão estratégica nessa área. Não vejo a proteção à propriedade intelectual ser tratada com a mesma atenção na USP,
A Propriedade Intelectual no Brasil
Patentes
Quando um pesquisador estrangeiro chega, queremos mostrar os
equipamentos e os laboratórios mais modernos. Muitas coisas são levadas por não termos regras, procedimentos e organização nas instituições.
Na Fiocruz uma patente já foi roubada por um estagiário estrangeiro. E depois nós é que somos acusados de piratear. Tanto a entrada quanto a saída de pesquisadores precisa ser mais orientada e regulamentada. Nossos pesquisadores vão para outros países com o bolso cheio de DNA de pacientes, da forma mais aberta possível, sem imaginar quanto vale o material com uma característica génética específica para testar produtos farmacêuticos.
Instituições Patentes depositadas No Brasil No exterior
Patentes concedidas No Brasil
Negociadas No exterior
Fiz um levantamento sobre o número de patentes depositadas e concedidas no Brasil e no exterior e de licenciamentos em seis instituições (ver quadro). No caso da Petrobras, o número de patentes depositadas e concedidas é bastante expressivo, tanto no Brasil quanto no exterior. A Petrobras faz anualmente uma revisão do que poderia licenciar e, nos dois últimos anos, abandonou uma série de pedidos de patente cuja continuidade não parecia mais interessante. Há apenas oito patentes negociadas, mas é um resultado que, disseram-me, é realmente expressivo, porque o Centro de Pesquisas da Petrobras trabalha muito para ele mesmo e grande parte das tecnologias é usada
Petrobras* 257 760 366
IPT 128 2
USP** 114
Unicamp 103 I
Embrapa*** 72 5
Fiocruz 16 28
* Polít ica de patenteamento e licenciamento em revisão. ** Nova política de propriedade intelectual em discussão. - IS programas de computador, I I 3 marcas, 4 1 cultivares
67
26
18
9
(3 de milho, I O de arroz, 3 de sorgo e 2 de algodão) registrados.
Fonte: Coordenação de Gestão Tecnológica da Fiocruz
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684 8
4
6
13 17
pelo próprio sistema Petrobras. A Petrobras trata do assunto com muita prá
tica e documentos internos norteadores. Há muitas empresas e patentes chegando ao mercado que ela dominava até há pouco tempo.
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BR ASIL
O IPT também formulou na década de 70 uma política de propriedade intelectual, com a criação do Núcleo de Inovação Tecnológica, atualmente sob os cuidados da Coordenadoria de Relações com o Mercado. O IPT também está mudando suas estratégias: fez uma instrução normativa em julho de 1999, que trata da premiação dos inventores, e outra em setembro, que estabelece diretrizes para elaboração e aprovação de propostas para proteção e comercialização.
A USP começou em meados
PATE N T ES
os acordos de cooperação tecnológica, cujo número está crescendo. De 31 acordos negociados em 1999, 17 foram assinados.
O papel das agências de fomento é fundamental para mudar a situação. Por falta de conhecimento das implicações da divulgação antecipada ao depósito de pedido de patente, andam na contramão da proteção dos resultados das pesquisas. Algumas exigem participação de resultados, por meio de cláusulas contratuais, mas ainda é
bastante restrito o gerenciamento da década de 80, com a criação do Grupo de Assessoramento e Desenvolvimento de Inventos (Gadi). A portaria mais recente, deste ano, transfere esta área, antes ligada à Consultaria Jurídica, para a Coordenadoria Executiva de Cooperação Universitária e Atividades Especiais (Cecae), vinculada à Reitoria.
'' As publicações não podem ma is ser consideradas como o único indicador
dos resu I ta dos
do processo e a avaliação dos resultados. Muito se perde e ninguém sabe o que faz. Outras exigem participação na titularidade, mas nada se define a respeito da participação nos custos. Como resultado, o outro titular desiste de colocar a agência como co-autora, porque não há ninguém para conversar sobre como dividir e fazer o pagamento desses A Unicamp, que também ten
tou cuidar desse assunto de alguma forma desde os anos 80, criou
de uma pesquisa''
em 1998 o Escritório de Difusão e Serviço Tecnológico, o Ediste. Informaram-me que estão procurando mudar a estratégia, verificando quais patentes estão concedidas ou depositadas e escrevendo para todos os inventores para analisar se as patentes ainda estão válidas, se houve continuidade na pesquisa e se há empresa interessada no desenvolvimento da tecnologia. Enfim, estão de alguma forma provocando a comunidade acadêmica.
A Embrapa sentiu muito os efeitos da globalização na área da agricultura, com a entrada no País de empresas de grande porte e a competição acirrada. Em 1999, saíram duas deliberações, uma sobre a propriedade intelectual de cultivares obtidas isoladamente ou em parceria e outra sobre a política de negócios tecnológicos. A Embrapa passa por um processo de regulamentação bastante rigoroso desde 1996.
A Fiocruz começou informalmente em 1986, quando criou o Núcleo de Estudos Especiais da Presidência, que pela primeira vez fez menção ao assunto. Já tínhamos uma pequena história: o depósito da primeira patente e o primeiro acordo já nesse espírito da negociação e proteção datam de 1911.
Damos um pequeno passo atrás do outro, mas já com alguns resultados. Uma patente de uma vela repelente a insetos gerou oito licenças não-exclusivas. Quando o resultado de uma pesquisa consiste em tecnologia pouco competitiva, licenciamos a várias empresas. Estão em curso negociações mais expressivas com três ou quatro empresas do exterior, mas os resultados ainda são bastante preliminares. Estamos procurando organizar
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custos. Há também as agências que
desistiram de reivindicar direitos de propriedade intelectual porque elas não conseguem gerenciar os resultados das pesquisas ou projetas que possam levar a patentes e não têm qualquer política nessa área. Queremos que as agências sejam nossas parceiras e financiem os projetas, que reivindiquem os direitos de participação nos resultados, mas que ajudem também no financiamento do desenvolvimento do produto e na busca de parcerias com o setor produtivo.
Na minha opinião, as agências de fomento poderiam: • Elaborar, implementar e gerenciar uma política de propriedade intelectual, não apenas manter uma cláusula contratual de eventual participação nos resultados, e criar uma definição estratégica do que quer ao alocar recursos financeiros num projeto de pesquisa; • Incorporar a patente ou outra forma de pesquisa protegida como indicador de resultado; • Criar uma modalidade de bolsa adequada a formar profissionais para atividade executiva e não apenas acadêmica.
Um dos maiores problemas da Ciência e Tecnologia no Brasil é que os pesquisadores nadam, nadam e morrem na praia. Conseguem bons trabalhos, mas param na hora de fazer um protótipo e finalizar o produto.
Em geral, nossos dirigentes não olham para o resultado dos projetas que param na bancada do laboratório. São geradas muitas teses e livros, mas pouco resultado chega ao mercado. As publicações não podem mais ser consideradas como o único indicador do resultado e da relevância de uma pesquisa.
PESQUISA FAPESP
PATE N TES
BRASIL
Os tneandros do registro de patentes
Luiz Otávio Beaklini colocou-se à frente da platéia do auditório
da FAPESP, em dezembro de 1999, apenas dois meses depois de ter sido nomeado diretor de patentes do Instituto Nacional de Propriedade Industrial. Mas, ao longo de sua exposição, A Atuação do Instituto Nacional
Luiz Otávio Beaklini
Trabalho no INPI há mais de 20 anos como examinador de patentes e há menos de dois meses fui nomeado diretor de patentes. Encontrei uma diretoria cheia de desafios, especialmente com uma grande quantidade de pedidos de patentes não examinados. Trata-se de um problema de muitos anos, cuja solução desafia os administradores. Não vou prometer ·que será tudo resolvido em curto espaço de tempo, mas as medidas que estão sendo tomadas
de Propriedade Industrial, conseguiu aplacar as críticas a respeito do modo de funcionamento da instituição à medida que descrevia as dificuldades atuais e as alternativas criadas para evitar o atraso no exame dos pedidos de patentes - a cada ano, chegam cerca de 18 mil novos pedidos. Beaklini conhece os desafios do novo cargo que ocupa. Com uma equipe reduzida, tem de cuidar de uma demanda crescente de pedidos de análise de patentes. Mas, esperançoso, acredita que a nova legislação nacional, os acordos internacionais e os cursos realizados em empresas e instituições de pesquisa permitirão que se modifique rapidamente o quadro da propriedade industrial no Brasil. Especialista em Propriedade Industrial pela Organização Mundial da Propriedade Industrial (Ompi) e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Beaklini é engenheiro civil com pós-graduação no Centro Tecnológico da Universidade Federal Fluminense (UFF). Embora há 20 anos no INPI, não perdeu o elo com o ambiente acadêmico: foi professor visitante da Universidade George Washington, nos Estados Unidos, entre 1997 e 1998. Desde 1983 leciona na Escola de Engenharia da UFF.
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permitirão modificar completamente o cenário atual da propriedade industrial no Brasil.
Entrei no INPI quando parecia que o instituto iria se tornar um grande escritório de patentes. Havia um programa de modernização patrocinado pela Ompi, o Banco de Patentes, e um grupo de 140 examinadores havia sido contratado e treinado por especialistas dos maiores escritórios do mundo. O INPI sempre recebeu aproximadamente 10 mil depósitos de patentes por ano. Para esse número, 140 examinadores bem treinados seriam suficientes, mas a equipe logo se viu reduzida para 80, já incluídos os 16 recém-contratados pelo único concurso público que o INPI foi autorizado, e a situação começou a se complicar. A cada ano acumulavam-se mais pedidos não examinados.
De uns anós para cá, quando o Brasil adotou uma nova legislação de propriedade industrial, que não mais excluía de patenteabilidade setores como o químico, o farmacêutico e o alimentício, ao mesmo tempo em que a economia dava sinais de ter entrado num padrão menos desorganizado, o volume de solicitações de patentes explodiu. De 10 mil em 1994, foi aumentando a cada ano e está agora em 18 mil, sem sinais de que este crescimento vá parar.
O governo federal agora está consciente do problema e, ao editar a Medida Provisória 2014/99, incluiu um dispositivo permitindo a contratação temporária de examinadores. O contrato é de apenas um ano, mas estamos muito felizes porque vemos uma solução para nosso atraso.
Em 1998 só conseguimos decidir 5 mil pedidos. Em 1999, passamos para 10.784. Não é o ideal, mas é bem mais do que antes. Conseguimos reverter a curva de análise de pedidos de patentes, que era decrescente e hoje aponta para cima.
São muitas as causas do grande atraso do INPI, algumas delas decorrentes de decisões que não se mostraram as mais acertadas. A Lei de Patentes de 1971 excluiu de
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BRAS IL PATENTES
patenteabilidade produtos quími- A Medida Provisória 2014/99 cos, farmacêuticos e alimentícios. O Brasil não era o único país do mundo a fazer uma reserva de mercado para estes setores. O Japão, a Itália e a Holanda também já optaram por este caminho. Cada um desses países utilizou esse período em que poderia utilizar medicamentos criados em outros países sem ter de pagar royalties para desenvolver sua indústria farmacêutica, assim como o Brasil.
''Vamos reduzir determinou que os pedidos depositados até 31 de dezembro de 1994 e referentes a matéria que àquela data não poderia ser privilegiável sejam considerados indeferidos, na data de 31 de dezembro de 1999, um dia antes da aplicação do acordo Trips. É a melhor solução para o INPI, pois elimina uma grande disputa entre qual a interpretaÇão da lei.
o prazo mínimo de aceitação de um pedido
de patentes de dois ou até seis meses para,
no máximo, um dia''
Por causa do impedimento legal à concessão de patentes nestes campos, o INPI decidiu não examinar os pedidos de patente nessas três áreas. Os processos foram se acumulando e, passados alguns anos, cresceram como uma bola de neve.
Em 1994, a assinatura pelo Brasil do acordo Trips ( Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights) complicou essa realidade. Ninguém percebeu na época, ou não foi possível tomar as medidas necessárias a tempo. O acordo Trips determina: nenhum país que assinou o acordo pode manter uma lei que proíba patente em qualquer setor tecnológico, como o Brasil fazia com o farmacêutico. Isso cria um conflito, pois os pedidos de patentes dessas áreas, depositados na vigência de uma lei que não permitia seu patenteamento, que estiverem aguardando decisão até o próximo dia primeiro de janeiro de 2000, quando o acordo começa a vigorar, como serão julgados? Enquanto um grupo acha que aqueles pedidos devem ser indeferidos, pois foram depositados numa lei que não o permitia, outro acredita que deva ser exatamente o contrário e não existe razão para que não possam ser patenteados, desde que sejam novos e inventivas.
Cerca de 70% dos pedidos de patentes vêm do exterior. A maio
ria é depositada por meio de um acordo internacional chamado PCT que traz um Relatório Internacional de Buscas, uma lista representativa do estado da técnica, preparado por uma Autoridade Internacional de Buscas (conhecido como ISA, em inglês). O INPI, como todos os demais escritórios de patentes do mundo, utiliza essa listagem para acelerar o exame técnico dos pedidos de patente.
Apesar de o INPI arrecadar com os pedidos e a manutenção das patentes, quase não fica com esse dinheiro. Vivemos à míngua, porque não recebemos autorização para usá-lo e no final do ano o governo raspa o que sobrou. Mas isto também está mudando, e para melhor. O governo tem mostrado um apoio ao INPI como nunca se viu antes.
Quais são as perspectivas? Na Diretoria de Patentes, pretendemos reduzir o que for apenas formalismo dos procedimentos de análise de patentes. A idéia é não fazer exigência apenas por aspectos formais. Já vi o INPI devolver um pedido de patente porque a margem excedia três milímetros as normas predeterminadas. É um absurdo este· grau de preciosismo, enquanto o órgão leva meses para fornecer o número de depósito do pedido, coisa que deveria ser feita em uma hora.
Vamos reduzir o prazo
Pedidos deferidos e patentes expedidas mínimo de aceitação de um depósito de patente, de dois ou até seis meses para, no máximo, um dia. Não estou falando do exame técnico, mas do ato de depositar o pedido. O exame mesmo vai aguardar os outros procedimentos, o sigilo de 18 meses, a publicação e o pedido de exame. A despeito das dificuldades, esse, a meu ver, é ocaminho pelo qual vamos produzir uma pressão maior ainda vinda do setor privado nacional para nos obrigar a
4.000
3.000
2.000
1.000 • Pedidos deferidos
• Patentes expedidas
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999
Fonte: INPI aumentar nossa eficiência.
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