26
1 CONFORTO E AMBIENTE ESCOLAR Doris C. C. K. Kowaltowski, Lucila C. Labaki, Silvia A. Mikami G. Pina 1 1. INTRODUÇÃO O ambiente escolar e o conforto ambiental que ele proporciona aos usuários, alunos, professores, funcionários e diretoria pode ser estudado sob diferentes enfoques. A bibliografia existente abrange estudos sobre arquitetura escolar, conforto ambiental nos seus vários aspectos, térmico, luminoso, acústico e funcional, relação ambiente escolar e desempenho escolar, ambiente físico e comportamento do usuários e por fim as avaliação pós- ocupação das edificações das escolas. A evolução da arquitetura escolar está intimamente relacionada com a história da humanidade e a importância dada à educação nas várias fases do desenvolvimento sócio-econômico dos povos. Houve épocas de informalidade na educação, mas com a proliferação da Cadernos de Arquitetura. Bauru, DAUP/FAAC/UNESP, n. 3 jul./dez. 2001. 1 Docentes do Departamento de Arquitetura e Construção, Faculdade de Engenharia Civil, UNICAMP Caixa Postal 6021, 13083-970, Campinas, SP [email protected] indústria e da nova ordem capitalista no século XIX surge, no ocidente, a exigência de um novo tipo de trabalhador e daí a necessidade de educar para o trabalho. No século XIX, caracterizado pela obsessão pela ordem, pontualidade, organização do tempo, impostas pela indústria, a escola surge como disciplinadora da ordem social. ENGUITA (1989) mostra-nos o cenário desta situação através de um guia publicado pela Sociedade para a Melhoria da Instrução Elementar na França em 1817, onde fica explícita a rigidez das obrigações. Por outro lado, também começa a surgir uma preocupação com o espaço do ensino para que as normas sejam corretamente seguidas: “... permanece o professor suficientemente silencioso, fazendo se obedecer mediante gestos? Realiza-se a leitura realmente a meia voz? Está em ordem o mobiliário? Cumpre-se realmente a máxima: cada coisa em seu lugar e um lugar para cada coisa? São suficientes a ventilação e a iluminação? Têm bastante espaço os alunos? É correta a atitude dos alunos? Colocam claramente as mãos atrás das costas durante os movimentos e deslocam-se marcando o passo? Estão satisfeitos os alunos? Estão bem visíveis os rótulos das punições e são utilizados? Exerce corretamente o professor uma vigilância permanente sobre o conjunto dos alunos? ”

CONFORTO E AMBIENTE ESCOLAR - dkowaltowski.net · 5 do clima local em relação à insolação e ventilação. Falta, no entanto, detalhamento para o conforto ambiental. A Fundação

Embed Size (px)

Citation preview

1

CONFORTO E AMBIENTE ESCOLARDoris C. C. K. Kowaltowski, Lucila C. Labaki,Silvia A. Mikami G. Pina1

1. INTRODUÇÃO

O ambiente escolar e o confortoambiental que ele proporciona aosusuários, alunos, professores, funcionários ediretoria pode ser estudado sob diferentesenfoques. A bibliografia existente abrangeestudos sobre arquitetura escolar, confortoambiental nos seus vários aspectos,térmico, luminoso, acústico e funcional,relação ambiente escolar e desempenhoescolar, ambiente físico e comportamentodo usuários e por fim as avaliação pós-ocupação das edificações das escolas.

A evolução da arquitetura escolar estáintimamente relacionada com a históriada humanidade e a importância dada àeducação nas várias fases dodesenvolvimento sócio-econômico dospovos. Houve épocas de informalidade naeducação, mas com a proliferação da Cadernos de Arquitetura. Bauru,DAUP/FAAC/UNESP, n. 3 jul./dez. 2001.

1 Docentes do Departamento de Arquitetura eConstrução, Faculdade de Engenharia Civil,UNICAMPCaixa Postal 6021, 13083-970, Campinas, [email protected]

indústria e da nova ordem capitalista noséculo XIX surge, no ocidente, a exigênciade um novo tipo de trabalhador e daí anecessidade de educar para o trabalho.

No século XIX, caracterizado pelaobsessão pela ordem, pontualidade,organização do tempo, impostas pelaindústria, a escola surge comodisciplinadora da ordem social. ENGUITA(1989) mostra-nos o cenário desta situaçãoatravés de um guia publicado pelaSociedade para a Melhoria da InstruçãoElementar na França em 1817, onde ficaexplícita a rigidez das obrigações. Poroutro lado, também começa a surgir umapreocupação com o espaço do ensinopara que as normas sejam corretamenteseguidas: “... permanece o professorsuficientemente silencioso, fazendo seobedecer mediante gestos? Realiza-se aleitura realmente a meia voz? Está emordem o mobiliário? Cumpre-se realmentea máxima: cada coisa em seu lugar e umlugar para cada coisa? São suficientes aventilação e a iluminação? Têm bastanteespaço os alunos? É correta a atitude dosalunos? Colocam claramente as mãosatrás das costas durante os movimentos edeslocam-se marcando o passo? Estãosatisfeitos os alunos? Estão bem visíveis osrótulos das punições e são utilizados?Exerce corretamente o professor umavigilância permanente sobre o conjuntodos alunos? ”

2

A organização espacial da escola jáapresentava configurações quemostravam a importância dada àordenação, antes mesmo doaparecimento da indústria. FOUCAULT(1987) mostra-nos a ordenação por fileirasexistente no século XVIII, definindo oespaço serial, organizando as celas, oslugares, os espaços de circulação,imprimindo os valores de obediência,transformando a escola em um espaço devigiar, de hierarquizar funções,possibilitando o controle simultâneo aotrabalho. Faz referências ao sistema daarquitetura panóptica construída com oobjetivo de controlar todos os movimentosde uma determinada comunidade. Nocaso das escolas, o panóptico determinacada criança em seu lugar, sem barulhoou conversa, onde não há dissipação oudesordem. “A visibilidade é umaarmadilha” é usada como lema(FOUCAULT, 1987). A ordenação espacialtransformava a sala de aula em pequenosobservatórios e a disciplina proporcionavaum controle sobre os alunos.

2. SITUAÇÃO NO BRASIL

No Brasil, durante a 1a República, osedifícios escolares situavam-se na maioriaem áreas contíguas a praças, comoreferência à expressão do poder e daordem política em curso. No final do século

XIX e início do século XX, a arquiteturaescolar, principalmente no Estado de SãoPaulo, esteve voltada para atender asaspirações das classes sociais maisabastadas. A prosperidade cafeeira e aindustrialização crescente davam adevida importância à educação. Osfundamentos republicanos tornaram ainstrução primária obrigatória, universal egratuita (CORRÊA et al, 1991). A história daarquitetura escolar paulista está refletidanos mais de 170 edifícios que foramconstruídos entre 1890 e 1920,caracterizados por prédios escolares dearquitetura monumental (pé direito alto,grandes janelas, elevação do nível daedificação em relação à rua, com imensasescadarias) e em sua grande maioriaprojetados por arquitetos de renomeinternacional, principalmente os deformação européia (Victor Dugubras,Manuel Sabater, Carlos Rosencrantz, ArturCastagnoli, entre outros). O programaarquitetônico era basicamente compostopor salas de aula e um reduzido númerode ambientes administrativos. Destacava-se a simetria da planta com uma rígidaseparação entres as alas femininas emasculinas e toda a concepção doespaço era condicionado pelo CódigoSanitário de 1894 (FDE, 1998).

As manifestações culturais como aSemana de Arte Moderna de 1922 e aRevolução de 30 vão influenciar os setores

3

da educação, refletindo-se nitidamentena arquitetura escolar: o edifício, aospoucos, vai deixando de ser compacto, éextinta a divisão entre os sexos, aimplantação apresenta característicasmais flexíveis, como o uso de pilotisdeixando o térreo livre para as atividadesrecreativas (FDE, 1998).

Finalmente, a composição modularcomeça a despontar na década de 70 doséculo XX. A criação da CONESP(Companhia de Construções Escolares deSão Paulo) teve um papel fundamental naracionalização construtiva da edificaçãoescolar. É criado o módulo “embrião”,composto por 2 a 6 salas de aula, direçãoe administração, sanitários e quadra deesportes, com espaço previsto para futurasampliações. A simplificação do padrãoconstrutivo possibilita um atendimentomais rápido à constante demandaexistente, seja em novas escolas, seja emampliações ou reformas (SOARES, 1995).Posteriormente, a FDE (Fundação para oDesenvolvimento de Educação) criadaem 1987, assumiu a elaboração dosmétodos de trabalho acompanhando aconstrução das escolas e oferecendosuporte técnico e operacional aoplanejamento da rede física e da unidadeescolar.

Especificações da antiga CONESP(Companhia de Construções Escolares doEstado de São Paulo) descrevem oambiente escolar em mais detalhe,caracterizando os usuários nas suasvariadas faixas etárias, apresentando oscurrículi a serem adotados e os objetivos econceitos do prédio escolar. Nestesconceitos são incluídos aspectos dasexigências funcionais e operacionais,flexibilidade no uso dos espaços, apossibilidade de ampliações erecomendações para uma simplicidadeprojetual com racionalidade no sistemaconstrutivo e aproveitamento daindustrialização. As especificações aindaenfatizam o conforto ambiental,chamando a atenção para a avaliaçãodo clima local em relação à insolação eventilação. Falta, no entanto,detalhamento para o conforto ambiental.A Fundação de Desenvolvimento Escola –FDE, apresenta algumas recomendaçõesmínimas referentes ao conforto paraambientes escolares. Tal documentaçãoapresenta dados sobre dimensões deambientes, de aberturas, recomendaçõespara circulação, escadas e rampas,número de sanitários e alguns níveis deconforto luminoso. Nota-se a ausência deindicações referentes ao confortoacústico, fator essencial no processo deaprendizagem.

4

Tabela 1. Padronização de Ambientes Escolares determinados pela FDE.

AMBIENTE PÉ-DIREITO(m)

NÍVEL DEILUMINAÇÃO

(lux)

INSTALAÇÕES

Administração 2,40 300 Interruptor, tomada, telefone, lumináriasProfessores 2,40 300 Interruptor, tomada, lumináriasSala de Aula 3,00 300 Tomadas, lumináriasSala de Leitura 3,00 500 Interruptor, tomada, luminárias, telefone, FM /TVA capacidade do número de salas varia de 02 a 23 salas de aulaForro obrigatório ( exceto no galpão)Iluminação fluorescentePintura semi- impermeável até a altura do peitorilIluminação mínima = 1/5 da área do pisoVentilação mínima = 1/10 da área do pisoVentilação cruzada obrigatória nas áreas pedagógicas

Os prédios escolares existentes hojeseguem a modulação determinada pelaFDE, com alvenaria em blocos deconcreto, a partir de um programaarquitetônico composto funcionalmentepor sala de direção e administração,ambiente pedagógico, vivência e serviçosgerais. As exigências para os ambientesseguem uma padronização mostrada naTabela 1 com recomendações ainda dasespecificações da Fundação (FDE, 1990).

Especificações da antiga CONESP(Companhia de Construções Escolares doEstado de São Paulo) descrevem o

ambiente escolar em mais detalhe,caracterizando os usuários nas suasvariadas faixas etárias, apresentando oscurrículi a serem adotados e os objetivos econceitos do prédio escolar. Nestesconceitos são incluídos aspectos dasexigências funcionais e operacionais,flexibilidade no uso dos espaços, apossibilidade de ampliações erecomendações para uma simplicidadeprojetual com racionalidade no sistemaconstrutivo e aproveitamento daindustrialização. As especificações aindaenfatizam o conforto ambiental,chamando a atenção para a avaliação

5

do clima local em relação à insolação eventilação. Falta, no entanto,detalhamento para o conforto ambiental.A Fundação de Desenvolvimento Escola –FDE, apresenta algumas recomendaçõesmínimas referentes ao conforto paraambientes escolares. Tal documentaçãoapresenta dados sobre dimensões deambientes, de aberturas, recomendaçõespara circulação, escadas e rampas,número de sanitários e alguns níveis deconforto luminoso. Nota-se a ausência deindicações referentes ao confortoacústico, fator essencial no processo deaprendizagem.

A CONESP considera importantes osfatores de acessos e fluxos no entorno e nointerior da escola em relação à infra-estrutura urbana e vias de trânsito, bemcomo recomenda estudos especiais emrelação à implantação de um projeto e atopografia do local. O programa denecessidades, proposto pela CONESP eatual FDE para uma escola é composto deconjuntos funcionais: pedagógicos, deserviço de vivência, apoio técnico eadministrativo. São apresentados critériospara o dimensionamento de uma unidadeescolar em função das áreas úteis e decirculação e elementos construtivos. Odimensionamento baseia-se em umamodulação de 90 cm por 90 cm no eixodas paredes, que resulta em uma sala deaula padrão de 51,84 m2 (7,20m x 7,20m).

Os conjuntos funcionais são detalhadoscom seus espaços mínimos, apresentadosna Tabela 2. Nos atuais editais deconcursos para obras de novas escolas osprojetos ainda são orientados por estasespecificações.

O prédio escolar do ensino público,principalmente no Estado de São Paulo,está controlado e padronizado. Noentanto, o ambiente escolar,especificamente o interior da sala de aula,agrega características físicas,arquitetônicas, organizacionais e aspectosparticulares dos professores e alunos que,interrelacionados, afetam o clima socialdo ambiente (MOSS, 1979). O autor emquestão explicita que o contexto global,incluindo o tipo de escola, o programaeducacional adotado, os problemassubjetivos de cada classe, podem afetardiretamente a sociabilidade interna ouindiretamente através das característicascitadas acima e que terão diferentesresultados caso a escola adote uma linhapedagógica mais aberta ou tradicional. Aconfiguração física e arquitetônica daescola pode motivar inovaçõesambientais. Este fator é mais aceito emescolas alternativas no Brasil na quais osambientes podem estar abertos e sãoconhecidos como “escolas sem paredes”,propondo na sua metodologia de ensino aparticipação conjunta entre mestres,alunos e ambiente.

6

Os prédios escolares existentes hojeseguem a modulação determinada pelaFDE, com alvenaria em blocos deconcreto, a partir de um programaarquitetônico composto funcionalmentepor sala de direção e administração,ambiente pedagógico, vivência e serviçosgerais. As exigências para os ambientesseguem uma padronização mostrada naTabela 1 com recomendações ainda dasespecificações da Fundação (FDE, 1990).

As características organizacionais afetama coesão e participação dentro da salade aula; a linha educacional adotadapelos professores (seja ela mais rígida ouflexível) e a orientação despendidaindividualmente a cada aluno influem nodesenvolvimento e comportamento dosusuários com o ambiente. A configuraçãodo espaço da sala de aula adquire umpapel fundamental na formação doindivíduo, principalmente no que dizrespeito à ordem e imposições dasociedade e modo de vida.

A disposição espacial na maioria dasescolas no Brasil ainda segue os padrõesdas carteiras enfileiradas, a posição doprofessor diante do quadro negro etambém as normas para as construçõesdos edifícios escolares. Tivemos um breveperíodo de modificações nas plantas econcepção arquitetônica como a escolaprojetada por Vilanova Artigas que

expressa uma maior liberdade de projeto.Trata-se da Escola Pré-primária da VilaAlpina (após 1966) em que os espaçosabertos têm prioridade sobre as salas deaula, evitando as formas quadradas e oscorredores fechados. (BRUAND, 1981).

Pesquisas em arquitetura escolar, portanto,revelam uma grande variedade departidos que os projetos podem adotar. Osmais comuns no cenário local são asedificações com a planta tradicional,apresentando salas de aulas enfileiradasnos dois lados de um corredor central(Figura 1), e há uma versão maissimplificada de salas abrindo de umcorredor lateral (Figura 2). A segundaplanta oferece maior conforto ambientalem clima quente e úmido, sendo quetodas as salas de aula apresentamcondições de ventilação cruzada,possibilidade de orientação solarotimizada (esta orientação, no caso doexemplo apresentado, não estátotalmente aproveitada) e umadiminuição de interferências acústicasvindo das próprias salas de aula. Nosúltimos cinqüenta anos experimentou-senovos layouts para projetos de escolas(Figura 7).

7

Tabela 2. Programa Arquitetônico (FDE, 1990).

Ambientes No. Áreaunitária

(m2)

Áreatotal(m2)

Circulação(m2)45%

Áreatotal(m2)

Diretor/Assistente 1 12,96 12,96 5,83 18,79Secretaria 1 32,40 32,40 14,58 46,98Almoxarifado 1 12,96 12,96 5,83 18,79Coordenador Pedagógico 1 12,96 12,96 5,83 18,79Professores 1 25,92 25,92 11,66 37,58Telessala 1 51,84 51,84 23,33 75,17D

IREÇ

ÃO

/A

DM

INIS

TRA

ÇÃ

O

Sanitários de Administração 2 6,48 12,96 5,83 18,79Biblioteca 1 77,76 77,76 34,99 112,75

Aula Prática/Laboratório

1 77,76 77,76 34,99 112,75

PED

AG

OG

IA

Sala deAula 8 51,84 414,72 186,62 601,34

Cozinha 1 32,40 32,40 14,58 46,98Despensa/Cozinha 1 16,20 16,20 7,29 23,49Refeitório 1 58,32 58,32 26,24 84,56Grêmio 1 25,92 25,92 11,66 37,58Depósito Material Ed. Física 1 9,72 9,72 4,37 14,09Vestiário de Alunos 2 12,96 25,92 11,66 37,58Sanitário de Alunos 2 19,44 38,88 17,50 56,38Sanitário Especial 1 3,24 3,24 1,46 4,70Galpão 1 207,36 207,36 207,36

VIV

ÊNC

IA

Quadro de Esportes 1 600,00 600,00Depósito Material Limpeza 1 9,72 9,72 4,37 14,09Sanitário-VestiárioFuncionários

1 6,48 6,48 2,92 9,40

SERV

IÇO

S

Depósito 1 12,96 12,96 5,83 18,79Área Total 1.616,73

8

Figura 1. Esquema de edificação escolarcom salas de aula distribuídas através decorredor central

Figura 2. Esquema de edificação escolarcom salas de aula distribuídas através decorredor lateral

Figura 3. Esquema de edificação escolarcom laboratórios distribuídos através decorredor lateral e centro de salas de aulaem torno da biblioteca

Figura 4. Esquema de edificação escolarcom salas de aula abertas em torno deespaço multi-uso

9

Figura 5. Esquema de edificação escolarcom salas de aula em espaço aberto comuso flexível em torno de área de estudosindividuais e centro de recursos didáticos

Figura 6. Proposta de planta baixa paramódulos de escolas de ensino médioapresentando ambientes variados paraacomodar a metodologia “team teaching”

c = salas de aula, m = sala de multi-uso ; a= administração; b = biblioteca, au = auditório,g = ginásio, l = laboratórios, ei = área de estudos individuais, r = recursos didáticos, h ou mf= sala multi uso, e = estacionamento, s = sanitários, p sala de professores, cz = cozinha, ar= sala de artes, m = sala de música, ci = sala de ciências

10

Figura 7. Exemplo de uma planta baixa de um projeto de escola de segundo grau,optando por uma configuração complexa e variada dos ambientes de ensino.

Experimentou-se além do partido doprédio escolar também com a sala deaula, o seu formato, o tipo de mobiliário eequipamento. O arranjo da sala idealcontinua sendo pesquisado e discutido.Para acomodar o ensino com informáticae o uso de uma variedade deequipamentos audiovisuais, a sala de aulanecessita novas adaptações e projetos. Há

centros de estudo que propõemconfigurações inovadoras para o espaçode ensino. No Brasil, a sala de aula dofuturo está sendo discutida sob váriospontos de vista. Há centros de estudodesta sala de aula do futuro queapresentam projetos como mostrados nasFiguras 8 e 9.

11

Muitos trabalhos discutem o ensino dofuturo e a configuração física apropriadapara as novas escolas. Discute-se oformato e os arranjos ideais para aulas que

utilizam equipamentos audiovisuais (Figura10). São citados os arranjos em “U”, tipoanfiteatro, com mesa central ou tipoteatro como exemplos (IDEAL, 2001).

Figura 8. Esquema de uma sala de aula dofuturo para o ensino fundamental

Figura 9. Esquema de uma sala de aula dofuturo com uso de computadores para oensino médio

Figuras 8 e 9: Propostas do Centro de Capacitação Profissional da USP.

Figura 10. Diferentes arranjos de salas de aula para o uso de equipamento audiovisual.

12

Critica-se os prédios escolares atuais comsalas de aulas de padrão usual como “ummonte de cadeiras voltadas para umquadro negro e uma mesa de professorbem imponente em cima de um tablado”(KANITZ, 2000). Argumenta-se que estaconfiguração desmotiva os alunos e aarquitetura destas escolas valoriza aautoridade e não o indivíduo. Aconfiguração das salas tradicionais nãopermite o olhar no rosto dos colegas declasse para trocar idéias. Orelacionamento entre usuários de umaescola é prejudicado com conseqüênciasnegativas educacionais. Inicia-se assim adiscussão da psicologia ambiental emrelação ao espaço de ensino.

3. RELAÇÃO DO COMPORTAMENTOHUMANO COM O AMBIENTEESCOLAR

A relação do comportamento humanocom o ambiente escolar estudaprincipalmente a interação aluno/comportamento/aprendizado. Muitosestudos portanto, têm seu ponto deinteresse focado em questõespedagógicas, no processo educativo enos recursos metodológicos disponíveis naescola. O comportamento agressivo e osatos de vandalismo; a atenção e a apatia;as origens do comportamento em grupoou individual no ambiente da escola; as

formas de aprendizado e os métodosadotados; a caracterização doaprendizado, são os aspectos maisestudados.

SOMMER (1974) descreve o grau departicipação dos usuários do ambienteescolar sendo muitas vezes decorrente daorganização e estrutura funcional daescola. De acordo com Sommer existem“pseudo-espaços fixos” onde a rigidez daorganização espacial cria uma imagemde uma arquitetura inflexível. Os usuários,neste caso, não sabem como usar aspropriedades deste espaço. Não háestímulo para a interação com oambiente, que acontece tipicamente emespaços configurados sob a forma desucessivas fileiras de carteiras que, mesmosendo móveis, raramente são modificadasna sua configuração. Existe, portanto, anecessidade de “humanizar” o espaçointerno, atribuindo características pessoaisa ele, adequando a proporção com aescala humana, permitindo amanipulação do mobiliário pelos usuários,enfatizando a necessidade de paisagismo,harmonia entre os elementos construtivos,as cores e materiais (KOWALTOWSKI, 1980).

A conexão entre a escala do ambiente eo comportamento do usuário é tratadaem uma pesquisa de BARKER & GUMP(1964). São aplicadas técnicas oriundas dapsicologia ambiental sobre um

13

determinado grupo para a identificaçãodo comportamento em um contextoespacial específico. A pesquisa consiste naanálise da participação dos alunos emescolas com diferentes dimensões:pequenas e grandes. O estudo mostra queo ambiente escolar é um ecossistema,sendo que as escolas grandes (com maisde 500 alunos), mesmo oferecendo umambiente físico mais complexo, nãoproduzem um ambiente educacional maisrico em relação às escolas menores. Naescola pequena a participação “percapita” em atividades, tais como gruposextra curriculares, jornal da escola ougrêmio, são mais favorecidas.

SOMMER (1969), em um outro experimento,estuda a ecologia de participação dosalunos em uma sala de aula de arranjotradicional. É usada a técnica de registrosda fala dos alunos e do número de vezesem que os estudantes participaram deuma discussão (fosse entre estudante einstrutor ou estudante com estudante). Oresultado favoreceu as pequenas escolasem que o tempo de participação mútuafoi bastante superior (5,8 minutos para asescolas pequenas; 2,4 minutos para asmédias e 2,6 minutos para as grandes). Ajustificativa que o pesquisador apresenta éque nas médias e grandes escolas ocorreum distanciamento dos alunos que selocalizam no fundo da sala de aula (nocaso da configuração em fileiras

consecutivas), ocasionando anecessidade de repetição dosquestionamentos para a perfeita audiçãoe compreensão, o que pode ocasionaruma gradativa apatia por parte dosalunos. Neste tipo de arranjo, osestudantes que estão nas fileiras da frenteparticipam mais do que os que estão nasfileiras subseqüentes e os que estão nocentro, mais do que os que estão naslaterais. Em uma segunda etapa, a sala dapesquisa descrita acima, foi re-arranjadacom o mobiliário em forma circular, antesdo início da aula. Para a surpresa dopesquisador, em 20 das 25 classesenvolvidas no estudo, os alunos reverteramo mobiliário para a configuração rotineira(em fileiras) antes da aula começar. Istodemonstra a necessidade de interação dousuário com o ambiente para propiciarmelhorias do seu desempenho, para asatisfação e produtividade.

Um tipo de interferência no espaço escolaré o ato de vandalismo que, porapresentar-se de forma negativa,necessita estudos para o seu controle.Existe a hipótese que o comportamentodo usuário vândalo é uma reaçãoatribuída a ambientes em que a ausênciade elementos humanizadores épredominante (KOWALTOWSKI, 1980).Ambientes dominados pela iluminaçãoartificial, vidros opacos impedindo a visãodo exterior, presença de grades de

14

proteção, monotonia de formas, cores emobiliário, falta de manutenção, excessode ordem, rigidez na funcionalidade, faltade personalização e impossibilidade demanipulação pelo usuário são descritoscomo desumanos e, portanto, menossatisfatórios ou menos apreciados. Otrabalho de KOWALTOWSKI (1980)demonstra que ambientes providos deelementos da humanização (escalapequena, paisagismo, elementosdecorativos e características vindas daarquitetura residencial) têm um nível desatisfação mais alto e propiciam assim umambiente psicológico mais favorável aocomportamento social adequado. Estapesquisa sobre o vandalismo escolartambém deixa claro que a qualidadearquitetônica do ambiente é insuficienteno controle dos atos destrutivos. As causasdo vandalismo são complexas, mas umambiente físico agradável econstantemente bem mantido com umdetalhamento que inibe a ação doscriminosos, pode contribuir para adiminuição destes atos.

O estudo “O Vandalismo em EscolasPúblicas (CAMPELLO et al, 1993) mostra adificuldade em definir as causas da suaocorrência, com especulações sobre oscaracteres psicológicos do indivíduo quedepreda, da inserção social da escola nobairro ou dos aspectos físicos do ambienteconstruído. O objetivo do estudo foi reunir

informações para a possível prevenção deatos de vandalismo e o entendimento darelação entre “escola x comunidade” e“escola x aluno” e também a definiçãomelhorada da concepção do prédioescolar. Os resultados apontam parasoluções construtivas e especificação demateriais e também para uma relaçãoafetiva com o prédio escolar,transformando-o em um espaçosignificativo para a comunidade atendida.

A relação do comportamento humanocom o ambiente construído é estudada nateoria da arquitetura e na psicologiaambiental. A teoria arquitetônica trata darelação ambiente físico/comportamentohumano principalmente através derecomendações projetuais. Textos clássicose trabalhos em ecologia humanarelacionam elementos arquitetônicos coma escala e proporções do ambiente físico.Configurações espaciais específicas comonichos; caminhos; acessos, a distribuiçãode luz no ambiente, através da relaçãoentre as aberturas e o espaço físico; aintensidade das cores, texturas, e seusrespectivos efeitos sobre o usuário etambém a simbologia de cada elementopresente na obra são discutidas para umahumanização da arquitetura(KOWALTOWSKI, 1980). Em 1959, Rasmussen(1998) dizia que a arquitetura deve serfacilmente compreensível para as pessoas,já que ela está relacionada com a vida

15

cotidiana do homem. O arquiteto devebuscar formas e elementos que estimulema relação homem/ambiente. O espaçoprojetado pode trazer a sensação deconforto ou segurança, ou imprimir umacaracterística de ambiente social ecoletivo ou então individual e íntimo.Através da vivência com os diversosespaços construídos, o homem vaisomando as suas experiências individuais eaprende a conviver com o que aarquitetura lhe oferece.

A história da arquitetura e a sua teoriamostram, portanto, exemplos quepromovem a integração do homem como meio envolvente e fornecem soluçõesfuncionais, estéticas e conceituais queincorporam conhecimento sobre asnecessidades mais profundas do homem,sua condição social e relação com oentorno físico. A psicologia ambiental trataessencialmente da percepção humanado ambiente que envolve o indivíduo e ossentimentos resultantes em relação a estemesmo ambiente (GIFFORD, 1997). O meioambiente exerce uma influência direta noindivíduo, esteja este vivendo emcomunidade ou mesmo em um ambienteisolado. A interação do homem com estemeio causa efeitos diretos que irão nortearo seu modo de vida. Tanto o homemexerce suas influências sobre o meio,como este mesmo meio irá exercer fortesinfluências sobre ele. A psicologia

ambiental é interdisciplinar, envolvendo aantropologia, sociologia, ergonomia, aengenharia e os meios de planejamento ea arquitetura. O estudo destas relaçõesentre o ambiente construído e ocomportamento humano ficou conhecidocomo RAC (Relação AmbienteComportamento).

A percepção do espaço passa por umprocesso de regulação de distâncias quepodem ser pessoais ou sociais,considerando as influências e regrasculturais, a sensação de medo ousegurança que o ambiente ofereceatravés da disposição dos elementosarquitetônicos. Estas influências fazem comque o indivíduo crie um “entorno próximo”no qual ele sente que tem completodomínio sobre o que o envolve e no qualele possui segurança para interagir com omeio. Quatro conceitos são aplicáveispara a caracterização da qualidade doambiente e a interação do homem comeste espaço físico: privacidade; espaçopessoal; espaço territorial e densidadeterritorial.

No conceito de privacidade, cadaindivíduo percebe, sente e atua em umambiente conforme o seu ponto de vista, oque vai originar um espaço ao seu redorno qual ele está apto a agir comnaturalidade e confiança. Para que anoção de privacidade seja estabelecida,

16

é preciso reconhecer as seguintes etapasque conformarão o espaço individual:percepção, cognição e comportamento.A partir da estrutura cognitiva, o indivíduotoma uma série de ações de controle paraconverter o esquema existente numesquema ideal (LEE, 1977). Este esquemaideal transforma-se no espaçoexclusivamente pessoal, onde qualquerameaça desagradável pode transformar-se num sentimento de invasão, cujatendência será, então, a repulsa.

O espaço pessoal é um espaço imaginárioem torno do indivíduo onde este impõelimites evitando uma aproximaçãoindesejável por parte de outras pessoas. Ohomem está envolvido pelo meio; então, énatural que ele delimite a sua zonapessoal, ou seja, o seu entorno maispróximo e onde ele tem completo domínio(SOMMER, 1969). HALL (1977), demonstracomo este espaço é utilizado nasdiferentes culturas. A percepção doespaço é dinâmica, relacionando-se coma ação num dado espaço, em vez derelacionar-se com apenas a visão atravésda observação passiva.

No espaço territorial o indivíduo necessitade uma “demarcação” para que ele sintaque pertence ao meio, ou que o meiopertence a ele. Neste caso, não é maisuma relação de proximidade com osoutros elementos e sim de possessividade.

O sentimento egocêntrico impera e todomovimento é centrado ou realizado aoredor do indivíduo. “O território é umaestruturação do espaço estático (atravésdo qual se movimenta o espaço pessoal) acujo respeito uma pessoa experimenta umcerto sentimento de posse” (LEE, 1977). Oambiente físico é o maior envolvido naquestão e a demarcação do territóriopode ter caráter fixo como a própriaresidência ou o local de trabalho outemporário em ambiente público. Parapersonalizar o ambiente, ele utilizaelementos de identidade, como crachás,placas sobre a mesa de trabalho oudiante da porta da sala ocupada, bemcomo a exposição de objetos pessoaiscomo o retrato dos filhos, por exemplo. Nasatitudes de defesa utiliza faixas desegurança não permitindo a passagem,ou barreiras físicas.

No conceito de densidade territorial osíndices populacionais estão relacionadoscom as questões da proximidade e com asexperiências coletivas, influenciando obem-estar do homem. O comportamentodo indivíduo pode sofrer alteraçõesquando este está inserido em grandesmassas populares e multidões. O impactoda densidade sobre ele pode causaratitudes positivas, negativas, mudança decaráter e personalidade. A sensaçãodenominada “crowding” talvez seja omaior problema e perturbação que o

17

indivíduo pode sofrer quando ascondições individuais de territorialidade eprivacidade são violadas. A sensação desufocamento e fobia podem tornar-seexacerbadas em uma situação pública. Aexteriorização deste sentimento poderevelar-se sob a forma de umcomportamento influenciado pelamultidão ou até a vontade de estar emcompleto anonimato, o “passar sem servisto”. A densidade está relacionada como ambiente físico. Neste aspecto, algunsfatores são condicionantes para osentimento de “crowding”: a escala doambiente versus a taxa de ocupação; aintensidade da iluminação; o arranjo domobiliário e até a existência de paredesem formas curvas (GIFFORD, 1997).

Os conceitos que foram apresentados(privacidade, espaço pessoal,territorialidade e densidade) são degrande importância em estudosrelacionados com o comportamentohumano no ambiente construído. Elesfornecem os subsídios para verificar aeficiência destes espaços nos aspectossociais, pessoais, de trabalho,produtividade e também no ambiente deaprendizado, a escola. Através delespodemos estudar como a arquitetura estáinfluenciando e satisfazendo ou não, avivência de cada usuário, fornecendosubsídios de futuros projetos, ou aintrodução de melhorias nas edificações

existentes. Assim devem ser levantados osfatores: função do ambiente, seja estepúblico ou privado; necessidades coletivase/ou individuais para o exercício dasfunções vitais; preferências e expectativasindividuais em relação ao espaço utilizado;diferenças culturais e nos hábitos;gradiente de privacidade exigido;dimensão do ambiente relacionado coma densidade e o tempo de permanênciano local; normas de vivência a que estãosujeitos os indivíduos; interação social entreos usuários; entorno urbano e aacessibilidade; condicionamento salubredo ambiente; satisfação e expectativa dequalidade de vida do usuário.

Pensando no espaço da sala de aula, elaapresenta-se como ambiente fértil emestímulos e comportamentos diversos, “asinterações entre a criança e seu ambientesão contínuas, recíprocas eindependentes” (BIJOU & BAER, 1980),ambos formam uma unidade inseparávele interligada. Também o própriocomportamento da criança pode serfonte de estímulos para os outros queconvivem no mesmo ambiente, gerandouma atitude de caráter social.

A maioria das nossas escolas apresenta ocriticado modo de ensino tradicionalutilizando-se dos espaços de forma poucocriativa. Além disso, na literatura nacional,estudos demonstram que a maioria das

18

edificações escolares apresentacondições ambientais aquém dasdesejadas. As principais falhas observadasdizem respeito às condições de confortotérmico e à funcionalidade. A lotaçãoexcessiva nas salas de aula é apontadacomo a causa principal das precáriascondições de funcionalidade. Na maioriadas escolas, faltam ambientes específicospara atividades como laboratórios,bibliotecas e salas de vídeo. Existem muitasadaptações nos prédios escolares, comtransformações de ambientes comocantinas em salas de aula, salas de aulaem refeitório e vice-versa. Obras deadições de espaço físico, semplanejamento, também são freqüentes,causando um aproveitamento dopatrimônio físico aquém do desejado oudeteriorando a qualidade existente. Amanutenção precária ou inexistente dasconstruções escolares é freqüentementecitada na literatura (ORNSTEIN & BORELLI,1995).

Um levantamento feito pelo Sistema deAvaliação da Educação Básica (SAEB,1995) demonstrou que a percentagem dealunos que freqüentam prédios escolarescom defeitos construtivos é alta erelaciona-se ainda com a localização, noterritório nacional, da escola. Os defeitosapontados são de: telhado, paredes, pisos,portas e janelas, banheiros, cozinha,instalação hidráulica e elétrica, carteiras,

mesas e armários, bem como amanutenção da área externa. O institutode Estudos e Pesquisas Educacionais(INEP/MEC, 2000) também revela que 13%da população apontam como ruim oestado dos prédios escolares e a falta dematerial didático como um problemagrave da educação pública brasileira.

A adoção de projetos padrão para asedificações escolares tem sido uma dascausas de problemas de confortoambiental. A padronização, muitas vezes,não leva em conta situações locaisespecíficas, resultando em ambientesescolares desfavoráveis. O projeto-padrãonecessita de flexibilidade, de modo apermitir ajustes para condições peculiaresde implantação (CAMARGO, 1991 eSOUSA, 1991).

O projeto-padrão, principalmente parainstituições como escolas, hospitais ecreches, é uma prática comum emprojetos públicos de interesse social. Osprojetos usam como base programas denecessidades padronizados das atividadesestipuladas pelos órgãos administrativosdos equipamentos urbanos. O partidoarquitetônico procura atenderprincipalmente objetivos econômicos, aracionalidade construtiva e afuncionalidade como mostrado nasespecificações da CONESP citadasanteriormente.

19

A adaptabilidade do projeto a situaçõesvariáveis de topografia e formato de lote éde grande importância. A adequação doprojeto padrão a situações específicasprovenientes do local de implantação,como acesso, orientação ao sol,afastamento a fontes de ruído nemsempre são eficientes. A padronizaçãoconstrutiva não é uma prática nova. Já naépoca romana havia uma sistematizaçãoda construção imposta pelo governo. Narenascença italiana está prática foireforçada através de uma padronizaçãoestilística. Após o grande incêndio deLondres em 1666, normas foram criadas,promulgando a padronização de projetosde moradias com o objetivo de aumentara segurança de usuários de edificaçõesurbanas (KOSTOF, 1995).

A Modernidade estabeleceu para aarquitetura deste século várias premissas. Aprodução industrial influenciou aconstrução civil com a aplicação intensada tecnologia, racionalidade e aumentode produção, implicando empadronização de projeto e seuselementos. Esta prática levou aodesenvolvimento de uma arquitetura demassas, rompendo o vernáculo local eestabelecendo normas universais paraacomodações mínimas (ROWE, 1993). Oresultado arquitetônico destas premissasnem sempre atende as aspirações reaiscom satisfação, deixando de lado as

particularidades de tempo, espaço ecultura.

Nos países em desenvolvimento, apadronização do projeto e o funcionalismona sua forma mais pura foram aplicadosaos projetos de interesse social, tais comohabitação e instituições. Os projetos destanatureza, seguindo um acordo decavalheiros, nunca deveriam ostentarriquezas ou estética diferenciada e manteruma imagem institucional (NEWMAN,1972). Projetos de conjuntos habitacionaise seus equipamentos comunitáriosrefletem a imposição desta filosofia. Asedificações decorrentes foram despidasde todo e qualquer elemento que nãorefletisse a funcionalidade e objetividadedo programa do projeto. Nos anos 70 doséculo XX, o funcionalismo perdeu força,simbolizado pela implosão do conjuntohabitacional Pruett-Igo, demonstrando ainadequação da arquitetura de massas,projetada para “servir a todos e ao mesmotempo servir para ninguém” (ROWE, 1993).Apesar desta discussão e da evidência dosresultados, a implantação de projetos-padrão continua nos programas damaioria das instituições no Brasil.

20

4. O CONFORTO NO AMBIENTEESCOLAR

Observa-se que, nos países onde hánormas e códigos de obras rigorosos, ascondições de conforto atingem os níveisadequados na maioria das suasconstruções. As pesquisas do ambienteescolar, nestes países, concentram-se nadescoberta de detalhes que possamcontribuir especificamente para oaumento da aprendizagem. Sãoestudados elementos específicos como:tipo de projeto arquitetônico e deconfiguração de sala de aula; porte daescola e lotação das salas de aula;agrupamentos de estudantes; lotação earranjo físico do mobiliário; espaçosalternativos; tipos de janelas, luminárias easpectos da composição da luz; ruídosexternos (do bairro); organização domaterial didático nas paredes das salas deaula (GIFFORD, 1997). Existem aindaestudos que procuram definir com maisprecisão os níveis de parâmetros deconforto como a temperatura do arinterno que pode propiciar melhordesempenho escolar. Outros estudosrelacionam-se às preocupações com aeconomia e o gerenciamento de prédiosescolares, que implicam em gastos commanutenção e a eficiência energética daedificação, por tanto na sustentabilidade

dos projetos escolares (GIFFORD, 1997 eYANNAS, 1995).

Na literatura internacional as pesquisasmostram resultados sobre vários aspectos,relacionados a seguir. São importantes osfatores de conforto ambiental e háelementos arquitetônicos que influenciamdiretamente no processo deaprendizagem (GIFFORD, 1997 eMONTEIRO et al, 1993):

A acústica de salas de aula é o fator maisproblemático para se atingir níveisfavoráveis de conforto. Observa-se que oconforto acústico é o fator que contribuimais expressivamente para o aumento ounão do nível de aprendizado. O controlede ruídos externos é visto como essencial epode ser conseguido através deisolamento acústico, o que às vezes exigeo condicionamento térmico artificial.Ruídos de longa duração interferem commaior intensidade no aprendizado dosalunos. A influência de ruídos varia emrelação ao sexo e personalidade. Assim,meninas são mais suscetíveis a ruídos oumais distraídas por interferências acústicas.Crianças extrovertidas também mostrammaior susceptibilidade ao ruído externo.Dependendo da tarefa executada noambiente escolar, os níveis de confortoacústico são diferenciados. Como o ruídointerfere no processamento deinformações e na percepção de controle

21

dos alunos, tarefas difíceis exigem um nívelde som mais baixo. O controle dascondições acústicas internas da sala deaula muitas vezes exige modificação nametodologia de ensino e a diminuição dalotação das salas, além da aplicação demateriais acústicos atenuantes noambiente.

O conforto térmico de um ambiente éessencial para a sensação de bem-estar eo bom desenvolvimento das atividadesdos usuários. Situações de desconforto,causadas seja por temperaturas extremas,falta de ventilação adequada, umidadeexcessiva combinada com temperaturaselevadas, radiação térmica devido asuperfícies muito aquecidas, podem serbastante prejudiciais, causandosonolência, alteração nos batimentoscardíacos, aumento da sudação.Psicologicamente tem também seusefeitos, provocando apatia e desinteressepelo trabalho. Estas situações sãoextremamente desfavoráveis numambiente escolar.

Resultados de outras pesquisas queavaliam o conforto térmico de edificaçõesescolares em clima quente mostram emseus resultados um quadro muito parecido,independentemente da região e tipologiaconstrutiva pesquisada. A maioria dasescolas é considerada quente no verão ecom ventilação inadequada. Este

resultado está intimamente relacionadocom a orientação das aberturas em salasde aulas e a inadequação dos elementosde proteção solar, gerando assiminsolação excessiva. Mesmo sendo aorientação inadequada uma condiçãodifícil de ser corrigida, podem serintroduzidos adequadamente dispositivosde controle solar, que evitem a incidênciade insolação sobre os usuários da sala deaula, melhorando expressivamente seuconforto térmico. Um grande número deavaliações mostra que nas salas de aulado pavimento térreo, no caso de escolasde dois pavimentos, o conforto térmico émaior. Isto se relaciona diretamente com odetalhamento do telhado dasconstruções, onde falta o isolamentotérmico adequado e há ausência deventilação no ático, entre a laje e otelhado da edificação. Estes elementos demelhoria podem ser introduzidosfacilmente na maioria das escolas. Aventilação natural em níveis adequadospara o conforto nas épocas de calor é umproblema mais complexo, nem semprepossibilitando soluções construtivas simples.O aumento de aberturas implica em trocaou adição de esquadrias. A ventilaçãocruzada, indicada como uma soluçãosimples, muitas vezes cria problemas deacústica, quando são abertas janelas ouportas para ambientes como corredoresou o pátio. (MIMBACAS et al., 1998,

22

BITTENCOURT et al., 1995 e SAN JUAN &ROSENFELD, 1995)

Tamanho da escola e das salas: Apolêmica sobre o dimensionamento dapopulação escolar, que se reflete notamanho e complexidade do projetoarquitetônico, tem sido motivo defreqüentes estudos. Esses estudos mostramque: numa escola grande há umprograma educacional mais rico ediversificado, ao passo que em escolaspequenas são oferecidas aos alunosmaiores oportunidades de liderança emmuitas atividades escolares. É importantedimensionar as escolas de modo aatender a esses dois aspectos.

Plantas e fachadas: projetos de escolascom grande descentralização físicareduzem o tempo de interação entrealuno e professor em 20%, o que afetanegativamente o aprendizado. Fachadasbem cuidadas e com alguma imponênciaarquitetônica produzem um aumento nadisciplina e menor índice de vandalismo.Por outro lado, estudos mostram que osindivíduos expressam sua relação com oambiente em função da realização deseus objetivos e sugerem que a satisfaçãoestá mais estruturada na qualidade deensino do que nas qualidades do prédioescolar.

Lotação e arranjo físico da sala de aula:uma lotação alta afeta o movimento físicodos alunos e o seu acesso aos recursosdidáticos. O arranjo do mobiliário devepropiciar a disposição das atividades emseparado, com o professor em posição fixae destacada. Os experimentos comescolas “sem paredes” demonstramresultados positivos apenas commetodologias educacionaiscuidadosamente planejadas. Atividadesescolares confinadas em salas de auladelimitadas por barreiras físicas ainda sãobenéficas, devido ao isolamento acústicoproporcionado. A disposição de materialdidático nas paredes deve seguir umaorganização lógica: parede de frente commaterial novo sendo introduzido; paredeslaterais com material para memorização;a parede de fundo é dinâmica, contendomaterial diversificado, trabalhos de alunose comemoração de eventos, commodificações freqüentes. Essaorganização tem como objetivo fazer comque a criança concentre sua atenção nomaterial de aprendizado.

Luz e cor: como observado nas pesquisasnacionais, a literatura internacionaldemonstra claramente a superioridade daluz emitida no espectro total, obtida com ouso das lâmpadas daylight, ou pela luznatural vindo das janelas. Há umaexpectativa do efeito positivo das cores noambiente escolar. Estudos demonstram um

23

aumento nos testes de QI quandorealizados em ambientes com coresalegres, como laranja e amarelo. Oproblema com esses dados é que osestudos não controlaram unicamente ascores, mas os ambientes onde serealizavam os testes estavam tambémadequados em relação a níveis de luz,limpeza e organização. Na literatura depsicologia ambiental há afirmações sobrea influência das cores no comportamentohumano. Estas, muitas vezes, são aplicadasao ambiente escolar com grandesexpectativas. Estudos recentes em escolasmostram que, em condições denormalidade psicológica, a influência dacor é reduzida.

Organização espacial: o grau departicipação dos usuários do ambienteescolar é muitas vezes decorrente daorganização e estrutura funcional daescola. Foi possível comprovar que osalunos sentados na frente e no meio dasala participam com maior freqüência dasatividades verbais tais como discussões eque esta participação influenciapositivamente no rendimento escolar.

Afirma-se que o conforto ambiental é umaparceria entre ambiente físico(características do local, arquitetura daedificação e o uso dos espaços). Portantoo comportamento dos usuários de umaescola, específico ao conforto ambiental

deve ser estudado também. Há poucostrabalhos que relacionam ocomportamento humano com o confortoambiental mesmo dentro da bibliografiasobre conforto. É evidente que existe ocomponente humano e suas reaçõesinfluenciam no ajuste dos níveis deconforto. Há a percepção do ser humanoem relação ao espaço que ocupa e aescolha voluntária da posição que vaiocupar no ambiente, da vestimenta queutiliza, das interferências que realiza noambiente físico. Um estudo importantedemonstrou, através da avaliaçãoaplicada em dois dias de estaçõesclimáticas opostas que o desempenhoinsatisfatório do conforto térmico alterou apercepção do usuário sobre os demaisitens avaliados: acústico, luminoso eergonômico (ARAÚJO, 1999), confirmandoa importância do conforto ambientalpresente em seus vários aspectos. Éimportante, então, a pesquisa detalhadadas condições do conforto ambiental e apossibilidade de introdução de melhoriaspara propiciar um ambiente educacionaladequado ao ensino público.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO A P R. O conforto ambiental noplanejamento da qualidade dosambientes escolares: estudo de caso doColégio Sagrado Coração de Maria In: II

24

ENCONTRO LATINO-AMERICANO DECONFORTO NO AMBIENTE CONSTRUÍDO eV ENCONTRO NACIONAL DE CONFORTONO AMBIENTE CONSTRUÍDO. Anais...Fortaleza, CE, p. 83 resumo, CD-ROM. 1999.

BARKER, R., GUMP, P. V. Big School, SmallSchool, High Scholl Size and StudentBehavior. Stanford: California, StanfordUniversity Press,1964.

BIJOU, S. W.; BAER, D. M. ODesenvolvimento da Criança - Umaanálise comportamental. Trad. Rachel R.Kerbauy, São Paulo: EPU, 1980.

BITTENCOURT, Leonardo; et al. Efeito deprotetores solares verticais e horizontais naventilação natural de salas de aula do 2ºgrau. In: III ENCONTRO NACIONAL: IENCONTRO LATINO-AMERICANO DECONFORTO NO AMBIENTE CONSTRUÍDO.Anais... Gramado, RS p. 383-388. 1995.

BRUAND, Yves. Arquitetura contemporâneano Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1991.

CAMARGO, P. de. Escolas Estaduais terãoMudanças na Arquitetura em 92, em OEstado de São Paulo, Geral, 15 de Nov.1991, p. 12.

CAMPELLO, C.; ENGELSBERG, V.Vandalismo em Escolas Públicas, anais deENTAC, 1993, p. 779-784.

SÃO PAULO. Secretaria do Estado dosNegócios da Educação. CONESP,Companhia de Construção Escolares doEstado de São Paulo. Especificaçõesescolares 1º Grau. São Paulo, Fevereiro de1977.

CORRÊA, M. E. P.; MELLO, M. G. de; NEVES,H. M. V. Arquitetura Escolar Paulista 1890 -1920. São Paulo: FDE , 1991.

ENGUITA, M. F. A Face Oculta da Escola;educação e trabalho no capitalismo. Trad.Tomaz Tadeu da Silva. Porto Alegre: ArtesMédicas, 1989.

SÃO PAULO. Secretaria do Estado dosNegócios da Educação. FDE, Fundaçãopara o Desenvolvimento Escolar.Especificações da Edificação Escolar dePrimeiro Grau. São Paulo, 1990.

SÃO PAULO. Secretaria do Estado dosNegócios da Educação. FDE, Fundaçãopara o Desenvolvimento Escolar.Arquitetura Escolar e Política Educacional.São Paulo,1998.

FOUCAULT, M. Vigiar e Punir; nascimentoda prisão. Trad. Lígia M. Pondé Vassallo.Petrópolis: Vozes, 1987

GIFFORD, R. Environmental Psychology:Principles and Practice. 2. ed. Boston, USA:Allyn and Bacon, 1997.

25

HALL, E. T. A Dimensão Oculta. Rio deJaneiro: Livraria Francisco Alves, 1981(1977?).

INEP/MEC, 2000: http://www.inep.gov.br/notícias/news_387.html

KANITZ, S. Revolucione a sala de aula,Veja, edição 1671, ano 33, no. 42, 18 deoutubro de 2000,

KOSTOF, S. A history of architecture: Settingand Rituals. New York: Oxford UniversityPress, 1995.

KOWALTOWSKI, D. C. C. K. High schoolbuilding design in relation to new andchanging teaching methods and theirgoals. Berkeley, /Cal/: Dissertação(Mestrado) – University of California, 1970.

KOWALTOWSKI, D.C.C.K. Humanization inArchitecture : Analysis of Themes ThroughHigh School Building Problems. Berkeley,/Cal/: Tese - University of California, 1980.

LEE, T. Psicologia e Meio Ambiente. Trad.Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: ZaharEditores, 1977.

MIMBACAS, A. et al. Avaliação dedesempenho térmico, lumínico e acústico:escola padrão de alvenaria (EPA) e“Projeto Nova Escola”. In: VII ENCONTRONACIONAL DE TECNOLOGIA DO AMBIENTE

CONSTRUÍDO. Anais... Florianópolis, /SC/ p.339-346. 1998.

MONTEIRO, C. et al. A satisfação comocritério de avaliação do ambienteconstruído: Um estudo aplicado ao prédioescolar. In: AVANÇO EM TECNOLOGIA EGESTÃO DA PRODUÇÃO DE EDIFICAÇÕES.Anais... São Paulo/SP/ 1993.

NEWMAN, O. Defensible Space. New York:Collier Books, 1972.

ORNSTEIN, S. W., BORELLI, José Neto. Odesempenho dos edifícios da redeestadual de ensino: O caso da Grande SãoPaulo - Avaliação técnica: primeirosresultados. São Paulo: Laboratório deProgramação Gráfica da Faculdade deArquitetura e Urbanismo da Universidadede São Paulo. 1995.

RASMUSSEN, S. E. Arquitetura Vivenciada.Trad. Álvaro Cabral. 2. ed. São Paulo:Martins Fontes, 1998.

ROWE, P. G. Modernity and Housing.Massachusetts: MIT Press, 1993

SAEB, 1995: http://www.inep.gov.br/notícias/news_387.html

SAN JUAN, G. A. & ROSENFELD, E. El diseñobioclimático de edificios de usodiscontinuo en educacion. In: III

26

ENCONTRO NACIONAL: I ENCONTROLATINO-AMERICANO DE CONFORTO NOAMBIENTE CONSTRUÍDO. Anais... Gramado,/RS/ p. 365-370. 1995.

SOARES, T., A Escola Pública Paulista naTransição Democrática : 1984 – 86. Tese deDoutorado, Instituto de Economia daUNICAMP, Campinas, 1995.

SOMMER, R., Personal Space: thebehavioral basis of design. New Jersey,Prentice-Hall Englewood Cliffs, 1969.

SOMMER, R., Tight Spaces; hardarchitecture and how to humanize it. NewJersey, Prentice-Hall Englewood Cliffs, 1974.

SOUSA, de M., Vale colar: Estado lançaescolas-modelo com projetosdiferenciados, em Construção, São PauloNo 2285, nov., pp 12-13,1991,.

YANNAS, Simos. Educational buildings inEurope. In: III ENCONTRO NACIONAL: IENCONTRO LATINO-AMERICANO DECONFORTO NO AMBIENTE CONSTRUÍDO.Anais. Gramado, /RS/ p. 49-69. 1995.