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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ ALINE PINHEIRO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E IRAQUE: UMA ANÁLISE DA ORGANIZAÇÃO E DAS MEDIDAS IMPOSTAS AO IRAQUE NO PERÍODO DO PÓS-11 DE SETEMBRO (2001-2006) CURITIBA 2016

CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E IRAQUE: UMA … · metodologia que foi usada como base para a análise das resoluções é a difundida no livro “Análise de Conteúdo”, de Laurence

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

ALINE PINHEIRO

CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E IRAQUE: UMA ANÁLISE DA

ORGANIZAÇÃO E DAS MEDIDAS IMPOSTAS AO IRAQUE NO PERÍODO DO

PÓS-11 DE SETEMBRO (2001-2006)

CURITIBA

2016

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ALINE PINHEIRO

CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E IRAQUE: UMA ANÁLISE DA

ORGANIZAÇÃO E DAS MEDIDAS IMPOSTAS AO IRAQUE NO PERÍODO DO

PÓS-11 DE SETEMBRO (2001-2006)

Monografia apresentada como requisito

parcial para conclusão do curso de Bacharel

em Ciências Sociais, Setor de Ciências

Humanas, Letras e Artes, Universidade

Federal do Paraná.

Orientador: Prof.º Alexsandro Eugenio Pereira

CURITIBA

2016

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ALINE PINHEIRO

CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E IRAQUE: UMA ANÁLISE DA

ORGANIZAÇÃO E DAS MEDIDAS IMPOSTAS AO IRAQUE NO PERÍODO

DO PÓS-11 DE SETEMBRO (2001-2006)

Trabalho de conclusão de curso aprovado como requisito parcial para obtenção do

grau de Bacharel no curso de Graduação de Ciências Sociais, Setor de Ciências

Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná, pela seguinte banca

organizadora:

________________________________

Orientador: Profº. Dr. Alexsandro Eugenio Pereira

Departamento de Ciências Sociais, UFPR

_________________________________

Ma. Claudia Stephan

_________________________________

Me. Leonardo Mèrcher Coutinho Olímpio Melo

4

AGRADECIMENTOS

Agradeço inicialmente ao meu orientador, Prof. Dr. Alexsandro Eugenio

Pereira, que teve a paciência de corrigir e me aguentar durante todo o

processo da monografia. A sua cooperação e bondade foi demonstrada bem

antes, quando decidiu que eu teria uma bolsa de iniciação científica, mesmo

perto do fim do curso e com outros alunos também requisitando a vaga. Serei

eternamente grata pelos seus atos.

Devo também lembrar e agradecer todos os professores que tive aula,

tanto no ensino básico, como na Universidade Federal do Paraná. Estejam

cientes que cada um de vocês me ajudou e me ensinou muito durante todos

esses anos.

Gostaria de agradecer ao NEPRI por ter me agraciado em fazer parte do

seu corpo pesquisador e aos seus membros, pelos conselhos, os quais foram

extremamente úteis para a construção dessa pesquisa.

Agradeço também aos poucos, mas valorosos amigos que conquistei na

Universidade, Scheila Mª Ferreira, Thais M. Filipi, Maikon Ferreira, Natalia

Granato, Miriane P. Rodrigues, Bianca Kaizer, Camila Thur, Larissa Pereira,

Jorge Zonatto e Dinalva R. N. Maurício, entre outros que não mantive contato,

mas permanecem em meu coração. Obrigada pelos momentos alegres,

frustrantes e desesperadores que passamos juntos. Devo lembrar igualmente

dos meus amigos de toda hora, André T. Ribeiro, que num momento de agonia

me fez enxergar que a melhor maneira de honrar o meu pai era não desistindo

de cursar a Universidade. As fofas Jessica Nabeshima, Jessica C. Maran,

Priscila H. Sato, Nathaly I. Colombo e Rayra Carlos, por continuarem me

amando durante todos esses anos.

Por fim, dedico este trabalho e o meu diploma a minha família. A minha

mãe Roseli de Jesus Silva, que assumiu a responsabilidade de ser pai e mãe

ao mesmo tempo logo que entrei na faculdade. As minhas irmãs Patricia de J.

Pinheiro e Liliane da S. Pinheiro, que sempre me ajudaram, incentivaram e se

orgulharam de mim. Ao meu sobrinho querido, Caio da S. P. Pereira, que

inclusive me ajudou ao procurar as siglas que tinha usado neste texto. Aos

meus avós, já falecidos, José H. Pinheiro e Zulmira da S. Pinheiro. Ao meu avô

João Mª da Silva e a minha vó, a matriarca da família, guerreira e inspiração

como mulher, Maria Dolores de Oliveira.

Apesar de não poder agradecer e dedicar este trabalho pessoalmente a

ele ressalto aqui a importância do meu pai, Jorge da Silva Pinheiro, que nunca

me julgou e sempre me apoiou, este momento não existiria sem o senhor e

obrigada por esperar eu passar e me matricular na UFPR, para enfim

descansar.

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RESUMO

Este trabalho tem a finalidade de analisar o Conselho de Segurança da ONU e sua atuação no

período Pós-Guerra Fria. A pesquisa concentrou-se num caso específico, o do Iraque a partir

de 2001, contemplando o período pós-11/09 até o ano de 2006. O estudo analisou a

bibliografia já produzida sobre a ONU e a Guerra do Iraque, principalmente na relação entre os

dois. Além disso, foi feita a análise das resoluções impostas ao Iraque pelo Conselho de

Segurança, entre 2001 até 2006, disponíveis no site do órgão. O primeiro objetivo estava em

compreender o papel do órgão decisório das Nações Unidas, para isso é preciso um estudo de

caso, a escolha pelo Iraque é por se tratar de uma intervenção não autorizada pela ONU,

polêmica e recente. Outro propósito era descobrir como a organização acompanhou e o que

decidiu sobre a situação desse país durante o período selecionado. Com a investigação dos

documentos do Conselho, foi possível identificar quais posições e medidas foram tomadas. A

metodologia que foi usada como base para a análise das resoluções é a difundida no livro

“Análise de Conteúdo”, de Laurence Bardin, onde se categoriza os resultados mais comuns

para que se averigue sua frequência. Dentre os principais resultados encontrados, constatou-

se a falta de uma autorização explícita de intervenção ao Iraque, a manutenção das missões

de observação no território do Iraque, a UNAMI (Missão de Assistência das Nações Unidas

para o Iraque) e UNIKOM (Missão de Observação das Nações Unidas no Iraque-Kuwait), a

prorrogação de certas resoluções remanescentes da Guerra do Golfo, a criação e permanência

da Força Multinacional e ação da ONU na reconstrução do país, ao conduzir o Nation-Building

e usar seus programas de assistência humanitária na região.

Palavras-chaves: Relações Internacionais; Organizações Internacionais; Nações Unidas;

Conselho de Segurança; ONU; Iraque.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADM: Armas de Destruição em Massa

AGNU: Assembléia Geral das Nações Unidas

AIEA: Agência Internacional de Energia Atómica

CIJ: Corte Internacional de Justiça

CSNU: Conselho de Segurança Nações Unidas

DPKO: Department of Peacekeeping Operations

E-10: Os dez membros rotativos do Conselho de Segurança das Nações

Unidas

EU: European Union

EUA: Estados Unidos da América

FDI: Fundo de Desenvolvimento do Iraque

GRL: Goods Review List

IAMB: Conselho Internacional de Aconselhamento e Monitoramento

NY: New York

OFF: Oil for food

OI: Organização Internacional

OIP: Office of the Iraq Programme

ONG’s: Organizações Não Governamentais

ONU: Organização das Nações Unidas

OPEP: Organização dos Países Exportadores de Petróleo

OTAN: Organização do Tratado do Atlântico Norte

P-5: Os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU

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PNUD: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

S-G: Secretário-Geral

TNP: Tratado de Não-Proliferação Nuclear

UN: United Nations

UNAMI: Missão de Assistência das Nações Unidas para o Iraque

Uncitral: United Nations Comission on International Trade Law

UNICEF: Fundo das Nações Unidas para as Crianças

UNIKOM: Missão de Observação das Nações Unidas no Iraque-Kuwait

UNMOVIC: United Nations Monitoring, Verification and Inspection Commission

UNSCOM: United Nations Special Commission

UNSCPRP: United Nations Security Council Provisional Rules of Procedure

URSS: União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

WFP: Programa Alimentar Mundial

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Lista de ilustrações

Figura 1 - Organograma oficial, retirado do site da ONU Brasil ................... 19

Figura 2 – Imagem da resolução S/res/1443 (2002) ........................................... 87

9

Lista de tabelas

TABELA 1 – LISTA DE RESOLUÇÕES APROVADAS PELO CONSELHO DE

SEGURANÇA DA ONU (2001-2006)................................................................ 59

TABELA 2 – CONTEÚDO DAS RESOLUÇÕES ANALISADAS NA PESQUISA

.......................................................................................................................... 78

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SUMÁRIO

Lista de abreviaturas e siglas .......................................................................... 6

Lista de ilustrações .......................................................................................... 8

Lista de tabelas ................................................................................................ 9

Introdução ...................................................................................................... 11

Capítulo I – A Organização das Nações Unidas e sua importância no

cenário internacional ..................................................................................... 15

1.1 Sistema ONU ............................................................................................. 17

1.2 Conselho de Segurança e a sua atuação .................................................. 27

1.3 Conselho de Segurança e a Guerra do Golfo ............................................ 37

Capítulo II – Iraque: contexto mundial pós-11 setembro, resoluções e as

consequências ............................................................................................... 44

2.1 A conjuntura no pós-11 de setembro ........................................................ 45

2.2 As resoluções sobre o Iraque .................................................................... 55

2.3 As consequências da Guerra do Iraque, dentro do território e

internacionalmente ........................................................................................... 64

Conclusão ....................................................................................................... 70

Referências ..................................................................................................... 75

Apêndice ......................................................................................................... 78

Anexo .............................................................................................................. 87

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INTRODUÇÃO

A organização internacional escolhida como objeto a ser estudado neste

trabalho é a Organização das Nações Unidas (ONU), destacando o seu órgão

decisório e mais importante, o Conselho de Segurança (CSNU). Ao assinarem

a carta das Nações Unidas os países acordaram em conferir a

responsabilidade de punição, aos membros do CSNU, a forma utilizada são as

resoluções, podendo conter, sanções, recomendações, operações de paz e até

intervenções militares. Portanto, cabíveis a qualquer país membro das Nações

Unidas que descumpra a Carta ou outras diretrizes da Organização. São os

quinze membros do Conselho que decidem quais as resoluções que têm

importância e quais devem ser aprovadas. Na elucubração de Castro (2007)

ele explica que o processo decisório do CSNU, os cinco membros permanentes

(Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia e China) têm um peso maior,

pois podem usar o poder de veto sobre qualquer proposta em discussão, o que

já lhes garante a isenção de ser alvo das resoluções.

Assim sendo, como Macedo (2009) enfatiza os Estados que decidiram

fazer parte da ONU, renunciaram ao uso unilateral da força, pois a organização

proíbe de tal, exceto em três casos: em legítima defesa individual ou coletiva,

por luta pela autodeterminação dos povos, ou quando o Conselho de

Segurança decide que é necessário agir para defender os princípios da ONU.

O Conselho de Segurança reproduz em sua composição os países

vitoriosos da 2ª Guerra Mundial. Esses países possuem poder de veto, o que

dificulta a capacidade do Conselho para solucionar controvérsias, Machado

(2005) afirma que essa condição impede que um conflito de interesses seja

resolvido, o que desestimula a negociação neste órgão. No caso que vou

apresentar é exatamente o que acontece. França, China e Rússia questionam

os Estados Unidos da América (EUA) e Reino Unido sobre as pretensões de

uma intervenção no Iraque. O que não impediu para que estes tomassem as

medidas que acharam devidas, isto é, intervir com bombas e militarmente

naquele país do Golfo.

A autora Larissa Ramina (2003) trabalha com a ideia de que o ato contra

o Iraque fazia parte da estratégia de segurança nacional dos Estados Unidos

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que, depois da Guerra Fria, procurou substituir a doutrina da contenção, que

responsabilizava os Estados Unidos pela proteção do mundo capitalista contra

a expansão do comunismo soviético. Segundo a autora o pós-Guerra Fria teria

levado os EUA a perder a ideologia e o papel como guardião do capitalismo,

levando a sua política externa a cair no mesmo problema de como comportar-

se com o fim da bipolaridade. Os atentados ao World Trade Center e ao

Pentágono acabaram com o dilema que foi protagonizado pelos EUA,

engatilhando diversas ações do país para reestabelecer sua hegemonia.

O Iraque, então, passa a ser visado. Os americanos estabelecem com o

National Security Strategy Document os países que devem ser tratados como

ameaças tanto para eles, quanto para a comunidade internacional. Ramina

(2003) e Delgado (2004) ao refletirem sobre as ações promovidas pela aliança

anglo-americana, descartaram a ideia que esses países estarem certos ao

alegarem os seus atos como legítima defesa, podendo fazer uso preventivo da

força. Neste texto será explicado, com a ajuda desses autores, que não havia

indícios que o Iraque poderia deter armas de destruição em massa, portanto,

não configurando como uma ameaça aos outros países.

Impedidos de intervirem pelo CSNU, ao menos legalmente, os EUA

resolvem usar seu poder e tomar medidas drásticas, invadindo o país em

questão. As justificativas elencadas por Delgado (2004) são a de que Saddam

Hussein, “um agressor internacional”, já tinha invadido dois países em dez

anos, recusava-se a cooperar com o regime de inspeções e teria assassinado

milhares de curdos, xiitas e opositores do regime.

Nesta pesquisa, o objetivo é estudar o Conselho de Segurança da ONU

e ações tomadas em relação ao Iraque, já que um estudo sobre a ONU em si

não poderia ser bem trabalhado em uma monografia, por sua abrangência na

quantidade de funções e de sua complexidade. Por isso, escolhi o órgão de

maior importância e funções. Ao levantar a bibliografia para este estudo os

textos relacionados tiveram como tema à ONU, o CSNU e o Iraque. O objetivo

específico é analisar como Conselho de Segurança acompanhou a situação do

Iraque, apresentando recomendações, a partir da aprovação de resoluções

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específicas sobre o país desde 2001 e focando, também, na intervenção

comandada pelo governo norte-americano.

Com esse pensamento dividi a pesquisa da seguinte forma: a primeira

parte dedicada à ONU e seu órgão máximo, o CSNU, e para melhor explicação

subdividi em três itens - o primeiro dedicado a apresentar as funções e

capacidades das Nações Unidas, a partir de textos que discutam a importância

desse ator internacional, levando em conta as críticas atribuídas por eles à

organização. O segundo item enumera e desenvolve as críticas relacionadas

ao Conselho de Segurança, assim como sua importância e exemplos de ações

autorizadas por ele. No último item apresento aspectos históricos relacionados

às ações tomadas pelo Conselho de Segurança na Guerra do Golfo, servindo

esse fragmento para apresentar o capítulo seguinte, já que o objeto estudado

sofre direta influência e consequências do confronto que ocorreu na região do

Golfo em 1991.

Focarei, no capítulo dois, em apresentar o caso da Guerra do Iraque,

fazendo deste um estudo de caso, a partir da análise do papel das instituições

internacionais no pós-Guerra Fria. Faz-se necessário analisar um caso

específico para que os erros e acertos cometidos por tal organização sejam

apresentados e para que pensemos na instituição em questão, não apenas

pensando de forma teórica ou jurídica, de seu papel legal instituído por

acordos. A escolha pelo Iraque é por se tratar de uma intervenção não

autorizada, polêmica e recente.

Esta parte do trabalho também será subdividida em três partes,

começando pelo contexto que envolveu a ação unilateral anglo-americana, o

pós 11 de setembro e as consequências para as relações internacionais. No

mesmo momento será refletido sobre a questão do uso preventivo da força e

sua legitimidade, serão trabalhados os seguintes autores: José Manuel Pina

Delgado (2004), Paulo E.V.B. Macedo (2009), Jorge S. Paulo (2008) e Larissa

Ramina (2003). O segundo item apresenta a análise e o destaque para certas

resoluções do Conselho. Também serão usados os resultados da pesquisa de

Pinheiro (2014), resultado da iniciação científica entre 2013 e 2014, de mesmo

tema. A partir das resoluções aprovadas pelo Conselho de Segurança, a autora

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tentou descobrir como a organização acompanhou a situação do Iraque usando

os documentos coletados no site do órgão, apontando os temas recorrentes

nas resoluções e algumas das ações mais importantes em cada ano entre

2001 até 2006. O terceiro item trata das consequências da ação de intervenção

liderada por EUA e Reino Unido, as ações posteriores da ONU/CSNU, o

cenário internacional e de acontecimentos nos anos posteriores no Iraque.

A pergunta-problema norteadora foi: quais foram as decisões tomadas

pelo Conselho de Segurança da ONU na intervenção não autorizada dos EUA

no Iraque?

Entre os materiais e métodos necessários deste estudo foi utilizado

material bibliográfico que examina a questão do Iraque em geral e o Conselho

de Segurança de modo particular. A metodologia utilizada na pesquisa para

análise das resoluções é baseada na análise documental, método esse

difundido por Laurence Bardin no livro Análise de Conteúdo. No caso da

pesquisa, serão analisados os documentos do Conselho de Segurança,

essencialmente as vinte resoluções do período pós-11 de setembro até 2006,

com o objetivo de apontar os temas recorrentes nas resoluções e as sanções

que reforçam certas medidas e/ou posições, expressas em outras resoluções.

Este estudo se faz necessário para o maior aprendizado sobre o CSNU

e a política defendida pelos seus membros permanentes, já que os

representantes de cada país membro desse órgão são escolhidos pelo seu

país, tendo como trabalho refletir os ideais do governo representado. Para isso,

é necessário analisar um caso específico. A escolha do Iraque é por se tratar

de uma intervenção não autorizada e extremamente polêmica. Analisar o

comportamento do CSNU, a partir das sanções no caso específico do Iraque é

a forma pela qual se pode identificar quais tipos de questões e quais foram as

decisões tomadas sobre esse país. O ponto de partida é o 11 de setembro,

pois este foi o estopim para a guerra ao terrorismo iniciada no governo Bush.

A discussão envolvendo a Guerra do Iraque, a intervenção não

autorizada e as consequências dela são enormes. Tanto que são usados nesta

pesquisa diversos textos de várias áreas de conhecimentos, como o direito.

Sendo possível pela multidisciplinaridade da área das Relações Internacionais.

15

Capítulo I – A Organização das Nações Unidas e sua importância no

cenário internacional

A ideia de conceber uma Organização Internacional (OI), segundo

Ricardo Seitenfus (1997), é restringir que os valores e ideais dos Estados

comandem a dinâmica internacional, reconhecendo o outro e aceitando a

diferença entre esses atores. Ao fazer isso, os países envolvidos tentam mudar

o cenário nas relações internacionais que é visto como anárquico1, que tende a

ser de competição e apreensão devido às relações interestatais no “campo”

militar, o qual é tratado de forma diferenciada devido a sua relevância para os

países. A importância é tamanha, que o tema segurança internacional é tratado

de forma diferente nas Nações Unidas, algo que será destacado no

desenvolvimento desse trabalho. Como o autor ressalta, ao juntar-se a uma OI,

os Estados soberanos passam a ter que respeitar as normas estabelecidas

pela entidade para que possam fazer parte desta. Ele define a formação da

Instituição aqui estudada:

[...] trata-se de uma sociedade entre Estados, constituída através de um Tratado, com a finalidade de buscar interesses comuns através de uma permanente cooperação entre seus membros. O artigo 2 § 6º, da Carta das Nações Unidas ressalta o voluntarismo desta participação, pois a ONU não pode impor sua autoridade a um Estado que não a compõe. (SEITENFUS, 1997, p. 26).

Já Sato (2003) argumenta que instituições internacionais podem sofrer

por ter que lidar com diferentes percepções e anseios políticos contraditórios

dos seus filiados, o que faz com que, por vezes, elas não desenvolvam os seus

trabalhos de maneira mais efetiva. O mesmo autor afirma, ao estabelecer

certas normas internacionais, o que normalmente é composto de tratados, não

há garantias de que essas serão cumpridas e que delas surgirão padrões de

comportamento, por que na falta de autoridade supranacional independente

dos Estados, as instituições continuam fortemente dependentes das

1 Ambas as teorias majoritárias das Relações Internacionais, realismo e liberalismo, entendem

que a política internacional interestatal não possui um governo capaz de controlar os Estados. Mas há quem discorde disso “Segundo a exposição de Rosecrance, a anarquia – para a qual tenderia naturalmente o relacionamento entre as nações – foi evitada nos últimos duzentos anos com base em esforços passíveis de serem catalogados sob um dos três seguintes esquemas: equilíbrio de poder, ameaça nuclear de destruição recíproca (nuclear deterrence) ou concertação entre uma coalizão de países.” (AMORIM, 1998, p.1).

16

percepções e da vontade de agir dos governantes dos Estados. Eiiti Sato

(2003) explica que a principal forma de sanção nesses casos é a condenação

moral, a existência e a eficácia de arranjos. Outro fator lembrado pelo autor é a

ampla e complexa rede de organizações internacionais que trabalham de forma

integrada, o enorme fluxo de bens, recursos financeiros, informações, pessoas

e outros elementos podem circular em todo o mundo. E que embora,

geralmente, elas sejam voltadas para uma determinada área das relações

internacionais, exercem influência significativa sobre todas as demais.

Quando pensamos em Organização Internacional a ONU destaca-se.

Neste trabalho esta Instituição vai ser o tema, junto com a Guerra do Iraque e a

relação entre os dois, destacando o posicionamento do Conselho de

Segurança. Serão trabalhados textos sobre as Nações Unidas e sobre o país

citado. Começarei pela entidade com 193 países membros, segundo seu site

oficial no Brasil, que tem como foco manter a paz entre seus filiados e

promover o desenvolvimento mundial.

Martins escreve algo parecido sobre os objetivos das Nações Unidas.

Detentora dos anseios de paz e harmonia de toda a população mundial, a ONU, como vislumbramos, tem como finalidades primordiais a resolução de litígios, mantendo a paz entre os Estados e a prerrogativa de mobilizar a sociedade internacional para deter uma agressão que possa ocorrer. (MARTINS, 2013, p. 3).

Dawisson Lopes (2007) destaca o fato da ONU ser a Instituição

Internacional central nas relações internacionais contemporâneas. Muito devido

à abrangência das atividades que desempenha nos ramos de segurança

internacional, problemas humanitários, educação, saúde, problemas

ambientais, migrações internacionais, comércio, entre outros temas globais.

Sendo uma de suas funções tentar amenizar problemas causados pelos

Estados2, o que faz com que ela tenha um papel importante no direito

administrativo internacional, pois possuí diversas agências administrativas sob

a sua supervisão, levando a contribuir para a produção de legislação

2 Thales Castro lembra ”O Sistema ONU, em sentido ampliado com seu conjunto de programas

de cunho social (PNUD, Unicef...), dever ter um papel maior e mais incisivo nos planos socioeconômico, cultural, e humanístico, no que Ryan chamou de “welfare internationalism” ou “bem-estar internacionalista”, incluindo perspectivas de redução da fenda que separa o Norte industrializado e Sul em processo de desenvolvimento” (CASTRO, 2007, p. 46).

17

administrativa internacional. Lopes (2007) destaca o papel do Secretariado e

das agências especializadas da organização no processo gerativo:

A ONU, graças a sua vocação universalista e representatividade em escala planetária, é talvez a instituição que mais tem avançado – apesar dos não raros reveses – a gestão pública internacional em campos como os direitos humanos e o meio ambiente. Daí provém parte substancial da autoridade adquirida no pós Guerra Fria, em tempo de globalização da economia e da política internacionais. Outra noção que vem ao encontro do novo papel político onusiano – no mundo sob o impacto da globalização – é a de “bens comuns globais” (global commons). Está-se a referir aos novos espaços que, em função, sobretudo, de avanços tecnológicos, passam a transcender a jurisdição territorial dos Estados. Configuram novas áreas, comumente descritas como “espaços extraterritoriais”, crescentemente sujeitas à regulação do direito internacional. O alto mar, a atmosfera, as terras glaciais da Antártica, o espaço sideral e o campo eletromagnético da Terra são considerados espaços extraterritoriais – todos eles tutelados legalmente por documentos com o timbre da ONU. (LOPES, 2007, p. 63).

A ideia deste capítulo é expor o sistema onusiano, sua atuação no

sistema internacional e as criticas sobre tal. Está parte do estudo será dividida

em três seções: na primeira vou descrever a estrutura da Organização, o ato

de sua criação, a ideologia que dá vida a ela, sua atuação nos principais casos,

ao tentar cumprir suas funções, e as críticas feitas à ONU. No segundo ponto,

destacarei a atuação do Conselho de Segurança, as funções que lhe foram

atribuídas e as controvérsias por causa de suas obrigações, principalmente o

veto. Apresentarei sua composição, por que e como foram estabelecidas. Na

última seção irei historicamente apresentar o que aconteceu na Guerra do

Golfo, enfatizarei a ação do CSNU, pois este é um dos primeiros conflitos que a

ação deste órgão da ONU não terá entraves entre as grandes potências da

Guerra Fria. Outro fato importante, é que várias resoluções ao Iraque,

causados pelo confronto com o Kuwait, serão reafirmadas durante a Guerra do

Iraque em 2003.

1.1 O sistema ONU

Antes de avançar nas análises e na parte teórica, apresentarei a estrutura

orgânica da ONU, para que se compreenda melhor o funcionamento desta. A

complexidade da organização tem base na sua estrutura que elege a cada um

dos órgãos suas funções e seus ocupantes, determinando quem e como certos

espaços devem ser ocupados.

18

A ONU tem seis órgãos internos e que se relacionam com outros

organismos internacionais e agências especializadas. São eles: a Assembléia

Geral, o Conselho de Segurança, o Conselho Econômico e Social,

Secretariado, a Corte Internacional de Justiça (CIJ) e o Conselho de Tutela. Ela

também tem: organismos regionais, agências especializadas, conferências

periódicas e comissões. Seus programas abrangem a área cultural, a ajuda

humanitária, o desenvolvimento econômico e rural, a proteção na relação

emprego e trabalho, a regulação do comércio exterior (Uncitral – United

Nations Comission on International Trade Law), a regulação de tecnologia

sensível com inspeção de armas de destruição em massa, etc. Ela é centro de

uma rede de articulações, principalmente em temas específicos, como

qualidade de vida e de desenvolvimento socioeconômico. Sendo possível

observar tais especificidades no organograma abaixo e no site oficial da

instituição.

Thales Castro (2007) defende que a centralidade decisória e política da

ONU estão no CSNU, pois esse decide matérias substanciais e de

procedimento na organização, cabendo à Assembléia Geral da ONU (AGNU)

questões orçamentárias. Em seguida pode-se observar o organograma oficial

das Nações Unidas, onde estão indicados, os principais órgãos da ONU, acima

citados, seus programas e fundos, assim como os órgãos subsidiários e outros

departamentos.

19

FIGURA 2 – ORGANOGRAMA OFICIAL DA ESTRUTURA DAS NAÇÕES UNIDAS

FONTE: Site ONU Brasil, 2016.

20

O ato da criação das Nações Unidas acontece com o fim da Segunda

Guerra Mundial em 1945. Cinquenta países assinaram a Carta da entidade,

que só teve sua criação oficializada quando China, Estados Unidos, França,

Reino Unido e a ex-União Soviética ratificaram a Carta (24/10/1945). Esses

cinco países tem destaque perante os outros, pois seus representantes no

Conselho de Segurança detêm o poder de veto nas resoluções analisadas

nesse órgão. Aziz Saliba (2008) apresenta como foi formado o CSNU:

Conforme assevera Bailey, “as principais potências dentre os vencedores [da 2ª guerra mundial] intencionavam assumir um papel preponderante na manutenção da segurança e paz internacionais no futuro pós-guerra (...)” Deve-se ressaltar que o seleto grupo de “principais potências” incluía, inicialmente, “The Big Three”: Estados Unidos, Reino Unido e União Soviética, mas nas negociações que ocorreram antes da Conferência de São Francisco, foram acrescentadas a China (numa concepção que ficou conhecida como “the fourpolicemen”) e, por fim, a França. (SALIBA, 2008, p.19).

Esperava-se da ONU, naquele momento, que “se convertesse em polícia

do mundo” (LOPES e CASARÕES, 2009, p. 17). Mas o conflito entre a

potência americana e a potência soviética barrava as ações do CSNU, já que

as medidas precisavam obter o apoio de ambas para serem aprovadas. Aureo

Gomes (2009) cita Bellamy, lembrando que mesmo os capítulos VI e VII da

Carta da ONU propuseram quais os meios para a manutenção da paz e

segurança internacional. Outra análise que Gomes (2009) traz de Bellamy é o

número de vezes que o veto foi usado, são 238 vezes que ao menos um dos

membros do Conselho de Segurança fez uso do artifício, entre 1945 a 1990,

evidenciando as dificuldades da organização naquele período, devido à

polaridade entre EUA e URSS.

Entre outros motivos que impediram a Instituição de exercer o papel

pensado no ato de sua criação estão a fundação da Organização do Tratado

do Atlântico Norte (OTAN) e o Pacto de Varsóvia. Segundo Lopes e Casarões

(2009), mesmo sendo prevista na Carta da ONU a possibilidade de

organizações regionais, sendo a partir daí possível a dinâmica interestatal ser

regulada tanto pela lógica de “segurança coletiva universal” como pela “balança

regional de poder“, tal ato, segundo eles, levou a “um furo na tese de que a

ONU se teria constituído com o objetivo primário de promover a doutrina da

21

segurança coletiva universal – conforme mencionava, em seus discursos, o

presidente Roosevelt.” (LOPES e CASARÕES, 2009, p. 18).

Em sua reflexão Aziz (2008) explica que, se a Assembléia Geral fosse

mais poderosa, daria às pequenas e médias potências maior participação nos

processos decisórios da ONU, mas venceu a ideia de que o Conselho de

Segurança seria capaz de agir mais rápido e efetivamente se tivesse maiores

poderes do que a AGNU. Em sua análise, Aziz explica que o papel da

Assembléia Geral é “secundário”, já que pode discutir qualquer assunto que

esteja agraciado pela Carta ou por qualquer atribuição ou finalidade dos órgãos

nela previstos, exceto se a questão estiver nas mãos do CSNU e esse estiver

exercendo as suas funções sobre o determinado assunto. Portanto, a

capacidade de decisão é toda deste órgão, algo que a Assembléia Geral e o

Secretário-Geral (S-G) não possuem.

Além dessas questões, Thales Castro (2007) aponta que os membros

permanentes do Conselho de Segurança pretendiam manter o status quo

reservando o direito de ter armas nucleares aos cinco membros permanentes

(P-5) 3. Ao assinarem o Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) – sendo a

China a última assinar em 1964 - estes países tiveram o direito assegurado de

manter suas armas e passaram a vigiar os outros países para que não

adquirissem armamento nuclear, preservando a ordem mundial que coloca

estes atores no centro das decisões da ONU. Outra forma de controlar a

atuação das Nações Unidas é manter a dependência política e financeira dessa

organização pelos Estados. Ele aponta da seguinte forma:

[...] a ONU tem sua atuação limitada pela preservação da soberania e da integridade estatal dos Estados (art. 2, incs. 1,2 e 7 da Carta)... mostra os interesses dos países vencedores em, propositadamente, formular um organismo internacional que não configurasse um verdadeiro world government. (CASTRO, 2007, p. 42).

Além disso, o autor ressalta que devemos fazer uma reavaliação crítica

da ONU. Para ele, o estadocentrismo que aparecia no Tratado de Paz de

3 A sigla faz referência aos cinco membros permanentes do CSNU e será usada em todo o

texto com o mesmo significado.

22

Westphalia4, continua presente nos mecanismos decisórios e orgânicos da

organização.

A ONU, contudo não se restringe a ser apenas um centro harmonizador em prol de valores, práticas e posturas ditas universais. De forma mais realista, a ONU está imbuída das assimetrias e precariedades que são típicas e inerentes às relações interestatais (sistema westphaliano) com seu jogo de poder e relações de força [...] das promessas kantianas da paz perpétua. É necessário separar a ONU, imbuída de idealismo principista, do CSNU, com seu realismo multilateralista e sua composição excludente – produtos da fórmula de Yalta

5. (CASTRO, 2007, p. 36).

Outra influência para a Instituição, segundo Castro, seria o

institucionalismo liberal-internacionalista. Ele explica o por que...

A renúncia ou transferência parcial de soberania para um organismo supranacional traria a governança democrática e a paz coletiva por meio do estabelecimento do comunitarismo à luz do pensamento kantiano. Os valores da isonomia e de igualitarismo jurídico dos Estados-Membros, de legitimidade multilateral, de comunitarismo e de jurisdicionalidade externa por meio da Corte Internacional de Justiça (CIJ) perfazem o liberalismo de cunho idealista que norteou sua missão fundamental. (CASTRO, 2007, p. 45).

A ONU busca, assim, evitar uma nova guerra mundial, algo que é

descrito no Preâmbulo da Carta das Nações Unidas segundo o qual, ela

deveria ser a balança para manter a harmonia entre os seus membros para

que o comportamento desses seja mais altruísta.

Durante o período da Guerra Fria, três acontecimentos marcantes

levaram ao desenvolvimento das operações de paz, ação de extrema

importância para a organização e que passa pela autorização de seu principal

órgão. Aureo Gomes (2009) demarca a Guerra da Coreia (1950) como o

primeiro acontecimento, quando a Coreia do Norte decidiu atacar Seul, a ONU

repreendeu o país autorizando a intervenção norte-americana no local.

Segundo o autor, para muitos a ação indicava a capacidade da organização em

4 Foram tratados estabelecidos com o fim da Guerra dos Trinta anos. Dawisson Lopes explica o

conceito de Paz de Westphalia “A manutenção da ordem constitui a tarefa a ser desempenhada pelas potências que, por diversos meios (o recurso à força entre eles), promoveriam a continuidade no status quo. Por sua vez, as demandas por mudança, geralmente acobertadas pelo mote da “justiça”, costumam vir de Estados fracos, ou das organizações da sociedade civil.” (LOPES, 2007, p.50). 5 Devido a Conferência de Yalta, em conjunto com outras conferências, os países membros da

ONU decidiram o formato de cinco membros permanentes no CSNU e o seu direito ao veto, esses atributos dados a esses representantes é chamado de fórmula de Yalta. Tal explicação está disponível no texto de Castro (2007).

23

incitar a ação coletiva entre os Estados membros e evidenciava um papel

relevante para o organismo nas questões de segurança internacional, mas ele

lembra que, na época, a URSS decidiu boicotar o Conselho de Segurança, o

que levou à autorização para a operação na Coreia. A segunda ação

destacada por Gomes (2009) é a Crise de Suez, em 1956, quando o governo

egípcio tentou nacionalizar o Canal de Suez o que levou à aliança entre

França, Inglaterra e Israel para o combate e a ocupação da Península do Sinai

por Israel. Tanto URSS e EUA eram contrários à invasão, mas o Conselho de

Segurança estava travado pelas posições da França e da Inglaterra. As

discussões sobre o tema foram para a Assembleia Geral e o Secretariado ficou

responsável por achar alguma saída. Após consultas com os países

envolvidos, foi criado uma força neutra (United Nations Emergency Force)

enviada para a fronteira entre Egito e Israel e que também substituiu os

invasores do território. E a terceira operação da ONU que o autor destaca foi

realizada no Congo, em 1960, poucos dias antes da independência do país,

soldados congoleses amotinaram-se, atacaram civis brancos e pilharam as

cidades. Bruxelas, em um ato unilateral, enviou tropas para sua ex-colônia para

tentar proteger seus conterrâneos que ainda se encontravam no país. O

primeiro-ministro do país recém-criado requisitou que a ONU interviesse com

envio de tropas para restaurar a paz e expulsar os ex-colonizadores. O

secretário-geral apoiou a requisição e garantiu uma resolução do Conselho de

Segurança autorizando a operação.

Os acontecimentos supracitados proporcionaram à ONU a oportunidade de realizar o que se convencionou designar como operações de paz. Em seus primórdios, as operações de paz, cerceadas pelas idiossincrasias de um sistema bipolar, tinham como princípios normativos a tríade consentimento, neutralidade e imparcialidade: as tropas deveriam ser enviadas com o consentimento das partes envolvidas; deveriam ser imparciais e não beneficiar nenhum dos lados em questão; e, por fim, deveriam estar levemente armadas e só poderiam utilizar meios coercitivos em casos de legítima defesa. Segundo palavras do então Secretário-Geral Dag Hammarskjõld (apud BARNETT; FINNEMORE, 2004, p. 127) [...] Entre 1945 e 1987, a ONU conseguiu implementar, segundo o cômputo de Bellamy et al. (2004), catorze operações de paz, nas quais as tropas raramente eram enviadas no decorrer do conflito e cujos mandatos, na sua maioria, autorizavam o monitoramento de um existente acordo de paz, ajudando os Estados a cumprirem seus compromissos políticos, ou mesmo a manutenção de um cessar-fogo entre as partes. (GOMES, 2009, p. 290).

24

Martins (2013) lembra também do caso do Zimbábue, no qual a

imposição de sanções econômicas obteve sucesso na defesa dos direitos

humanos e da segurança internacional e as sanções voltadas para recriminar a

política do apartheid na África do Sul, ambas tratavam-se de assuntos internos.

No mesmo texto, o autor afirma que a estrutura da ONU funcionou bem em

raras ocasiões, como em casos citados por Aureo Gomes, devido ao confronto

entre os protagonistas do mundo bipolar. Apesar disso, no seu ponto de vista, a

organização se aprimorou e se deparou com grandes ameaças à paz e à

segurança internacional durante o período citado. Mas Martins ressalta também

o ponto de vista de autores que defendem o atual sistema, que tem base no

veto para o P-5, argumentando o seguinte: “[...] uma vez que o sistema evitou,

de forma satisfatória, o confronto armado entre as grandes potências,

permitindo, no entanto, que pequenos conflitos armados acontecessem.”

(MARTINS, 2013, p. 10).

O término da Guerra Fria estabelece a volta da ideia de que a ONU

cumpriria o seu papel de autoridade. A pesquisa de Lopes e Casarões (2009)

cita que naquele momento o número de resoluções aprovadas aumentou,

conflitos foram resolvidos6, forças de manutenção de paz funcionavam e

sanções foram aplicadas. Este estudo levantou os seguintes números: até

1989 as resoluções tinham média de quinze por ano, depois dessa data elas

saltaram para sessenta por ano e as sanções, que só tinham sido aplicadas

duas vezes, foram usadas quinze vezes no pós-Guerra Fria. Ambos os autores

e Gomes (2009) ressaltam que a ONU passou a ter que lidar com mais

conflitos étnicos e intraestatais do que entre Estados, algo que a instituição não

estava preparada. Os exemplos citados são: Ruanda, Somália e Iugoslávia.

Nesses casos os países envolvidos sofreram pela falta de preparo, hesitação

ou indiferença da ONU para lidar com tais situações. A instituição, então, teve

6 Os autores citam os seguintes: “a guerra Irã-Iraque terminou em 1988, após a aprovação de

uma resolução pelo Conselho de Segurança; forças soviéticas abandonaram o Afeganistão no período de 1988-1989, sob intermediação do Secretário-Geral da ONU; a independência política da Namíbia foi finalmente conseguida, com base em uma resolução do Conselho de Segurança de 1978; em 1989, as forças cubanas iniciaram a retirada de Angola; e as forças de manutenção da paz (peacekeeping forces) estavam obtendo êxito crescente nas empreitadas pela América Central.” (LOPES E CASARÕES, 2009, p. 20).

25

que se adaptar com o novo contexto internacional. Os conflitos, segundo a

pesquisa de Gomes, eram...

[...] entre Estados soberanos com características similares (exércitos organizados, por exemplo). Os conflitos simétricos deram lugar aos conflitos assimétricos, entre atores com capacidades diferentes, sejam eles um Estado e uma facção rebelde [...] (GOMES, 2009, p. 292).

O estudo de Aureo Gomes (2009) é sobre as operações de paz da ONU.

Em suas pesquisas ele destaca Bellamy, que aponta as mudanças entre 1988

e 1993 sobre o tema, já que a ONU passa a empreender mais operações do

que nos quarenta anos anteriores. Essas operações passaram a ser mais

complexas do que apenas monitorar cessar-fogo, tendo que prover ajuda

humanitária, econômica, entre outras coisas. Mais Estados passaram a apoiar

a promoção de normas e valores nas missões, principalmente preceitos como o

da paz democrática, liberalização comercial e o respeito aos direitos humanos.

Isso passa a acontecer com mais frequência com fim do mundo bipolar. O

maior interesse dos Estados de participarem das missões deve-se à

visibilidade internacional que essas missões geram. Mas Amorim tem sérias

desconfianças sobre essa forma de atuação e, principalmente, no interesse

seletivo dos países em ações humanitárias em apenas certos países:

Alguns observadores chegam a notar um desengajamento do Norte em relação ao Sul, sob o manto de uma ênfase maior na assistência humanitária – de impacto positivo mais imediato sobre a opinião pública nos países doadores – do que na promoção de uma verdadeira parceira internacional para a promoção do desenvolvimento econômico e social. O desinteresse estratégico em que caíram certas regiões do mundo em desenvolvimento, ao invés de se refletir em uma redução nos níveis de tensão regional, parece, ao contrário, favorecer a eclosão de conflitos devastadores em termos humanos e materiais. (Amorim, 1998, p. 3).

Vale a pena trazer comentários de Celso Amorim (1998), que aponta

não só o aumento na imposição de regimes de sanções, mas também nos

alvos das sanções que, por exemplo, passam a focar seus alvos em partes

dentro de um Estado, além das proibições específicas (o exemplo que ele usa

são as sanções centradas no setor aeronáutico no caso da Líbia).

Para Vítor Viana (2011), o fim da Guerra Fria revelou a vulnerabilidade

dos Estados para o perigo externo, o que trouxe problemas não conhecidos

para esses atores. Dentre os perigos mais lembrados são os atentados

26

terroristas como os que aconteceram em New York (NY), Madri e Londres. Ao

analisar as consequências do 11 de setembro de 2001, o autor entende que

esse acontecimento não alcançou o nível de ruptura, algo que o fim da Guerra

Fria causa, mas que teria levado a consequências estratégicas de grande

magnitude. Esse caso será focado, explicado e debatido no capítulo II deste

trabalho, já que o atentado em NY teve consequência direta na Guerra do

Iraque.

As consequências do fim da Guerra Fria vinham revelando a crescente vulnerabilidade dos estados a intrusões externas, como o terrorismo internacional e outras formas de criminalidade transnacional, a crescente importância dos actores não estatais, o fenómeno de desestruturação dos estados, e as tensões entre as dinâmicas de globalização e fragmentação. Por isso, o que verdadeiramente aqueles atentados terroristas ilustraram foi a globalização das ameaças e do cenário estratégico, e a força crescente dos atores não estatais. (VIANA, 2011, p. 25).

Devido à importância para o caso aqui estudado, a atuação da ONU e

da CSNU durante a Guerra do Golfo será analisada de forma separada no item

1.3, enquanto os aspectos relacionados ao órgão decisório da organização

serão analisados a seguir.

Thales Castro (2007) concluiu que a ONU não vem desempenhando o

papel central nas relações internacionais, o qual era esperado na sua

fundação, devido a essa estrutura e aos valores entrelaçados a sua fundação,

também “propositadamente atrelados à politicidade da ordem mundial.”

(CASTRO, 2007, p. 48). E segundo ele...

O CSNU, por conta de sua natureza assimétrica (relação P-5/E-10) e por conta de sua estrutura cratológica (legalidade da posse de armas nucleares para os P-5), tem papel mais expressivo como ator político das Relações Internacionais pós-bipolares, essencialmente em decorrência de sua finalidade de preservar o status quo da ordem mundial centrada na unipolaridade norte-americana. (CASTRO, 2007, p. 48).

Este item teve a função de apresentar a ONU, começando por sua

estrutura que tem diversos órgãos, departamentos, escritórios, programas,

comissões, agências especializadas, etc., tornando-a enorme e complexa.

Suas ações variaram com os anos, devido às mudanças no sistema

internacional e no seu número de componentes, causando a transformação

27

interna da organização. Ademais foram apresentadas as críticas feitas pelos

autores estudados, entre elas o papel da AGNU, o fato de que as Nações

Unidas não conseguiria realmente atuar e controlar os conflitos pelo mundo de

forma efetiva.

A seguir o foco passa a ser Conselho, que será estudado de forma mais

intensa, desde suas funções, os problemas resultantes de suas incumbências,

e a sua atuação ao longo da história. Essa atenção devesse ao fato deste ser o

órgão decisório, responsável pelas punições aos membros da ONU. Além do

mais ele é o centro desta investigação.

1.2 Conselho de Segurança e sua atuação

A opção de separar a pesquisa entre o complexo sistema onusiano e o

funcionamento do CSNU tem o objetivo de destacar a importância deste órgão.

Como apresentado anteriormente, cabe a ele as decisões políticas mais

importantes da ONU e toda a responsabilidade da manutenção da paz, da

segurança e estabilidade internacional. Além do mais ele tem uma

configuração polêmica, ao estipular cinco países com poder de vetar as

resoluções e outros dez membros rotativos, os quais não possuem o mesmo

recurso para intervir.

De fato, as principais atribuições do Conselho são as de aplicar, da forma que entenderem conveniente, os Capítulos VI e VII da Carta, referentes, à solução pacífica de controvérsias, ou em ato contínuo, à ação relativa a ameaças à paz, ruptura da paz e atos de agressão. (MARTINS, 2013, p. 7).

A composição é a seguinte: cinco membros-permanentes, China, EUA,

França, Reino Unido e Rússia7. Já os membros rotativos são dez no total (E-

10) 8, cinco de países africanos e asiáticos, um da Europa Oriental, dois da

7 Originalmente a URSS ocupava o lugar da Rússia e Taiwan o da China.

8 “Nesta esteira, inicialmente, ficou estabelecido que seriam apenas 11 membros, número que

entenderam suficiente, uma vez que a ONU iniciou suas atividades apenas com meia centena de Estados-membros. Ocorre, no entanto, que nas décadas que se sucederam à referida decisão, houve uma verdadeira multiplicação dos Estados-membros, fruto principalmente do processo de descolonização ocorrido à época.” (Martins, 2013, p. 3). Em 1963 foi ampliado de onze para quinzes membros na CSNU, devido ao processo de descolonização a AGNU recebe mais países afro-asiáticos o que deixava mais assimétrico esse órgão em relação ao CSNU.

28

América Latina e dois da Europa Ocidental. A duração dos mandatos dos

membros não permanentes é de dois anos, não existindo a possibilidade de

reeleição desses Estados. Esses são escolhidos através de eleição promovida

pela Assembleia-Geral, sendo preciso que a votação seja favorável de dois

terços dos presentes. Enquanto a Presidência do Conselho de Segurança é

exercida de modo rotativo por todos os seus membros, a ordem é alfabética

seguindo o nome em inglês do país, com duração de um mês, como pode ser

visto no site oficial do Conselho de Segurança9. A crítica de Martins trabalha

sobre o porquê dos membros rotativos:

No entendimento de Nader (2010), tais requisitos possuíam o intento de propiciar às potências médias, presença constante no Conselho, assegurando uma maior legitimidade em suas decisões. Entretanto, na prática, os citados critérios, permitiram apenas que Estados com pouca relevância na geopolítica internacional, almejassem com sucesso, um acento rotativo. (MARTINS, 2013, p. 4).

Como o mesmo autor apresenta, há autores que acreditam ser

importante a presença do E-1010, que inclusive podem ter seus representantes

na Presidência do órgão.

Ao comentar o artigo 23 da Carta, o aclamado internacionalista francês Allain Pellet celebra a possibilidade de um Estado com escassos recursos materiais ou humanos, poder ocupar até mesmo a presidência do CSNU, graças ao princípio da rotação alfabética na sua ocupação. (PELLET, 1991 apud Martins, 2013, p. 4).

Dentre as principais funções do Conselho, Martins (2013) destaca que

está a responsabilidade de punir Estados membros que porventura tenham

descumprido a Carta da instituição ou resoluções impostas a todos. É nas

reuniões que os representantes dos países votam se é necessário, a partir de

suas resoluções, aplicar: sanções11, recomendações, operações de paz e até

intervenções militares, sendo todas essas ações cabíveis a qualquer país

membro das Nações Unidas. São os cinco membros permanentes que

decidem quais pontos das resoluções têm importância e quais devem ser

9 As informações sobre a composição e mandatos também foram retiradas do texto Hugo

Lázaro Marques Martins (2013). 10

Sigla para identificar os dez membros rotativos do CSNU, a mesma será usada durante o texto com o mesmo significado. 11

Sanções podem ser embargos (proibição de exportações para o país alvo), boicotes (proibições de importações), restrições de ordem financeira ou de relacionamento cultural ou esportivo.

29

aprovados, pois têm o direito ao veto. De forma geral, segundo Martins (2013),

o importante é que nenhum membro permanente vote contra a resolução, não

importando a existência de abstenções. Para ele, a parte boa do sistema ser

baseado no veto de alguns membros é que as decisões dos conselheiros não

ficaram atreladas ao voto afirmativo, o que poderia dificultar ainda mais as

ações. Para Thales Castro (2007), a configuração e os poderes deste órgão

fazem com que a ordem mundial seja mantida, só sofrendo alterações com o

fim da bipolaridade entre EUA e URSS, mantendo o status quo sob os

programas bélicos, favorecendo os cinco membros permanentes e elegendo

uma hegemonia unicêntrica, à americana12.

Para facilitar a compreensão da importância do Conselho de Segurança

e visualmente destacar tal ponto, listarei suas atribuições, usando as

informações encontradas no texto de Martins (2013).

1. Recomendar à AGNU a admissão de novos membros à ONU,

cabendo a ele a decisão final da admissão ou não do país.

2. Decidir pela suspensão ou expulsão de um Estado.

3. Investigar qualquer controvérsia ou situação que possa geral

atrito ou conflitos nos países ou no contexto internacional.

4. Criar, por intermédio de resoluções, comissões e órgãos

subsidiários, para auxilia-lo, como em casos de agressão,

desarmamento e terrorismo13.

5. Criar comitês de Aplicação de Sanções, servindo para cuidar de

conflitos específicos que estão acontecendo. Sua obrigação é

verificar a implementação e aplicação de sanções econômicas,

financeiras, diplomáticas e de comercialização de arsenais

militares. 12

Castro (2007) usa o termo “realismo multilateralista” para explicar a conduta e negociação dos membros do Conselho, inclusive os nãos permanentes, como poder-interesse-força, perpetuando “um realismo hierárquico-hegemônico” liderado pelos americanos. Segundo o autor, o comportamento unipolar controla o soft e o hard power. O Conselho então, por ser o único órgão com poder de barrar os anseios dos Estados, acaba por não conseguir frear os EUA, pois este faz parte dele. Assim como a ONU tem limitada sua ação, devido ao acordo selado na Carta da Instituição, preservando a soberania e a integridade estatal de seus membros. Para ele, existe ainda um engessamento do CSNU devido ao “déficit de representatividade e de composição”. 13

Por exemplo, o Comitê contra o Terrorismo (criado 2001) e Comitê para não Proliferação de armas de destruição em massa (2004).

30

6. Criar Tribunais ad hoc para julgar penalmente indivíduos que

tenham cometido graves crimes contra a humanidade em um

determinado conflito.

7. Elaborar planos para o desarmamento, um “sistema de

regulamentação dos armamentos”, para que não seja necessário

intervir em possíveis Estados que pensem em se armar, o que

poderia levar a uma corrida armamentista no cenário

internacional.

8. Em caso de problemas com governos ou derrubada destes, ou

em casos de regiões que estejam em competição entre grupos, o

órgão deve mediar acordos referentes à tutela das regiões

afetadas.

9. Deve tomar as medidas necessárias para fazer cumprir sentenças

proferidas pela CIJ e aquelas que não foram cumpridas

voluntariamente.

10. São os conselheiros que elegem os membros CIJ.

11. Junto com AGNU, decidem se um Estado não filiado à ONU pode

se tornar membro da CIJ.

12. Talvez um dos mais importantes, seja a capacidade de indicar o

nome do Secretário-Geral, que deve então ser aprovado pela

AGNU.

Uma das atuações mais controversas dentre as listadas e que

pertencem apenas ao CSNU está o monopólio sobre a autorização da coerção

militar da organização, que segundo Amorim (1998) pode deixar de lado o

direito individual ou coletivo de autodefesa. Celso Amorim explica a base legal

e os poderes possíveis graças a esse fato.

As decisões inspiradas nos dispositivos do Capítulo VII – que podem ir do embargo de armas, passando por sanções abrangentes para chegar à autorização de intervenção armada – constituem as únicas manifestações verdadeiramente impositivas da autoridade do Conselho de Segurança, na medida em que dispensam o consentimento das partes. Garantir que a imposição da ordem internacional pelo Conselho de Segurança seja fundada na justiça – e não apenas no poder – exige, antes de mais nada, que a autorização da coerção seja disciplinada por uma agenda multilateral, capaz de refletir interesses políticos coletivos e coerentes com os dispositivos da Carta da ONU. O recurso a medidas de Capítulo VII não pode nem ser posto a serviço de

31

agendas individuais, nem ser arbitrário ou excessivamente liberal, sob pena de uma desvalorização do critério da ameaça à paz e segurança internacionais como gatilho acionador da coerção, e sob risco de uma intervenção indevida e indiscriminada em assuntos internos (como se sabe o Artigo 2.7 da Carta proíbe a ingerência em assuntos internos salvo em situações colocadas sob a égide do Capítulo VII). (AMORIM, 1998, p. 7).

Além da fórmula de Yalta e de outros pontos já mencionados, a Carta

das Nações Unidas autoriza os representantes no CSNU, os quais refletem

uma visão política direcionada pelos seus países, a adotar as suas próprias

regras de procedimento que deverão estar prescritas no regimento interno -

United Nations Security Council Provisional Rules of Procedure (UNSCPRP) -

desde que estas não estejam em desacordo aos preceitos da Carta. Para

Martins (2013), essas duas questões levam autonomia em seus procedimentos

deliberativos, permitindo aos membros do órgão decidir e negociar da forma

que acharem melhor.

Jane Boulden (2006) argumenta que além dos membros permanentes

terem a capacidade de vetar ações, só o fato da existência do veto dá a

capacidade deles de “controlarem” a agenda do Conselho, mesmo

considerando que os Estados membros da ONU e o seu Secretário-Geral,

podendo solicitar a atenção do Conselho para qualquer assunto, pedindo

formalmente uma reunião para que se debata a questão. Enquanto o Conselho,

os países que o compõem, tem o direito de determinar o que constitui ameaça

à paz e à segurança internacional, o veto significa que os cinco têm a

capacidade de determinar ambos para fins de ação do CSNU. Apesar disso, a

entidade não é um tribunal internacional, mas uma instância diplomática

multilateral.

Thales Castro (2007) aponta três tipos de forma de usar o veto: o

regular, ocorre no processo final da votação da resolução, negando a validade

desta. O duplo veto, que é resultado do veto na execução prática dos

trabalhos, “podem vetar quaisquer emendas ou procedimentos técnicos, desde

que sejam enquadrados na forma de matéria substantiva ou em outras formas

de apreciação procedimentalista do texto da resolução em pauta” ou podem

vetar a resolução integralmente na sua versão final, quando estiver em votação

por meio da moção para votação (“move to the previous question”). E o último é

32

o indireto/escondido, quando, nas negociações, nos bastidores, percebe-se o

potencial veto por parte de algum dos membros, por exemplo, a questão

iraquiana de 2003.

Segundo os pesquisadores Celso Amorim (1998) e Eiiti Sato (2003), o

direito de veto reservado apenas às grandes potências reconhece

explicitamente uma hierarquia entre Estados no cenário internacional, mas

essa seria a condição de assegurar a existência da ONU. Martins (2013)

lembra que, além das características citadas, outro ponto de desequilíbrio é

apontado por críticos e por potências que pretendem ocupar um espaço no

Conselho, pois o “caráter restrito e elitista do Conselho de Segurança

apresenta-se claramente definido em sua composição, que refuta a faceta

universalista da ONU e da AG e privilegia 15 membros, respaldados pelo seu

poder econômico e militar” (MARTINS, 2013, p. 3).

Thales Castro (2007) segue a mesma linha afirmando que os países

detentores desse poder usam tal poder nas relações de troca dentro do órgão e

com outros países fora dele sob a ordem do dia. O “veto é uma demonstração

clara de força política e é também considerado como instrumento de barganha

na obtenção de outros interesses na agenda externa dos P-5” (CASTRO, 2007,

p. 114). Outro fator importante levantado por este autor, é que mesmo

barganhando algumas de suas ações são voltadas para o exercício de sua

liderança hegemônica, enquanto certas ações tomadas pelo EUA pensariam

também nos “interesses da coletividade”, sendo comum acontecer no CSNU

esse tipo de equilíbrio entre atos egoístas e outros mais “altruístas”. As atitudes

do Conselho são contestadas por ele, afirmando, que se agisse para “manter a

paz e segurança internacional teria evitado crises humanitárias, guerras civis,

conflitos internos e interestatais de forma ágil, neutra, precisa e objetiva.”

(CASTRO, 2007, p. 96). No mesmo livro, Castro (2007) escreve sobre os EUA

hierarquizarem a importância das situações que ocorrem na esfera

internacional a partir do seu interesse.

Primeiramente, os EUA hierarquizam, em termos de interesses nacionais, e tipificam uma determinada problemática (faxinas étnicas, golpes de estados, guerras civis, guerras interestatais) de acordo com sua agenda interna. Tal hierarquização é trazida para atenção da instância P-3 e, subsequentemente, para a instância P-5. Se não

33

houver interesses imediatos em ambas às instâncias (P-3 e P-5), a temática é então dialogada com os demais países do CSNU. Se não houver interesse de nenhuma das partes em lidar com a crise ou houver um fator de impedimento (veto, por exemplo), a problemática terá pouca abrangência e eficácia no CSNU. (CASTRO, 2007, p. 82).

Um dos especialistas, Sato (2003), também lembra que há vetos não

declarados, onde uma das potências, sabendo que sua proposta de resolução

sofrerá o veto de um dos cinco membros permanentes, deixa de apresentar a

questão ao Conselho. Para ele, o uso da fórmula de Yalta, seja ele literalmente

ou não, não é necessariamente um fracasso da organização, só que não há

consenso sobre o assunto. Mesmo assim ele crítica: “o veto é um dos

mecanismos que limitam as ações da organização, este apenas demonstra a

diferença entre as grandes potências vencedoras da 2º Guerra Mundial e os

outros estados membros da ONU.” (SATO, 2003, p. 162).

Outro ponto de controvérsia, assim levantado por Amorim (1998), é a

duração das sanções. Vários países, inclusive China, Rússia e França,

reclamam do reverse veto14. Isso acontece quando um único membro

permanente impede que um regime de sanções seja encerrado, agindo de

forma unilateral. Esse é o caso das sanções relacionadas à Guerra do Golfo

dirigidas ao Iraque e da postura dos EUA e do Reino Unido em relação ao caso

- tais circunstâncias serão melhores relacionadas no próximo item.

Mas esses poderes dirigidos ao Conselho não são aceitos facilmente.

Os pesquisadores Amorim (1998) e Castro (2007) escrevem sobre a

insatisfação de certos membros da instituição, que pedem a mudança nesse

órgão para que mais países façam parte, quebrando a ordem estabelecida

desde a 2ª Guerra Mundial. Isso porque é algo normal, segundo Sato (2003),

os Estados relutarem em ceder parte de sua soberania para instâncias

internacionais porque, de certo modo, suas ações políticas e visões acerca do

mundo e das coisas acabam por passar pelo crivo dessas instituições. Só que

tal situação seria, também, custosa para as grandes potências, pois teriam que

14

Segundo Fassbender (2002), foi o caso das sanções direcionadas ao Iraque que levaram à descoberta do 'reverse veto’, este é ato de bloquear o fim ou de alteração de uma ação que já foi autorizada ou ordenada pelo CSNU. A ação não vai contra a Carta da organização, pois esta não especifica o processo de votação para uma rescisão ou modificação de uma ação, o que faz uma resolução permanecer em vigor até que seja revogada pelo Conselho.

34

se prostrar a uma instância internacional, podendo assim ter que abrir mão da

possibilidade de usar diretamente o poder de que dispõem para promover seus

interesses. Na visão do autor, os Estados mais fracos desconfiam das

organizações e temem que, em determinadas circunstâncias, venham a ser

utilizadas como instrumentos de intervenção das grandes potências até mesmo

em seus assuntos internos. O trecho abaixo é do texto de Patriota (1998), nele

o escritor relata os poderes que foram concedidos com o tempo ao Conselho e

que fazem aqueles países que não são do P-5 temerem as suas ações.

Sem que se haja convocado uma conferência de revisão da Carta para redefinir o mandato do Conselho de Segurança, preocupações ligadas a problemas humanitários, direitos humanos, terrorismo, a proteção da ordem democrática, a não proliferação passaram a ocupar um espaço crescente em sua agenda, redefinindo, em certa medida, o seu campo de ação. (PATRIOTA, 1998, p. 163).

Historicamente a maioria dos conflitos que o Conselho resolveu intervir

concentrou-se em esforços diplomáticos antes ou durante ações para

assegurar condições de paz depois do cessar fogo, como reconstrução e

assistência humanitária, conforme Sato (2003). Já Amorim (1998) afirma que

as ações tomadas pelo CSNU relacionadas à diplomacia preventiva ou às

ações de manutenção e imposição da paz tinham caráter de improvisação, pois

no período da Guerra Fria esses atos não eram possíveis devido aos

constantes vetos entre 1946 e 1990, 279 no total15. Por isso, há casos de

conflitos que foram resolvidos fora da organização.

Celso Amorim (1998), no seu texto estudado para essa pesquisa,

apresenta outro ponto de tensão na ONU. É o fato dessa organização não

possuir exército próprio. As questões relacionadas com a coerção militar,

quando autorizado pelo Conselho, deveram ser repassadas para os exércitos

nacionais ou para coalizões de Estados membros (coalitions of the willing).

Dentre as obrigações dos envolvidos nesses casos, está reportarem ao CSNU

as ações militares para que possa desempenhar satisfatoriamente suas

prerrogativas na legitimação do uso da força, não somente ao determinar o

15

Thales Castro (2007) contrasta esse número, afirmando que 89,1% das resoluções foram aprovadas, entre 1990 e 2004. Ele chama esse aumento “excessivo” de aprovações num curto período de tempo, como “fabricação de consensos”, e que foi impulsionado pela unipolaridade do governo estadunidense com o fim da URSS.

35

início da coerção armada, mas verificar se as ações estão corretas e

determinar o melhor momento para acabarem.

Conforme Jane Boulden (2006) observa outro ponto importante são as

atividades autorizadas pelos conselheiros16 devido ao interesse do P-5. Sendo

elas enquadradas em três categorias gerais de atividades. A primeira inclui os

conflitos em que um ou mais dos membros permanentes têm um interesse forte

ou vital. Normalmente o problema não entra na agenda do CSNU, mas se

consegue entrar, significa que o membro permanente em questão permitiu que

chegasse lá, seja para permitir ou incentivar a assistência ou para ter

aprovação dos outros para uma resposta planejada.

For example, the very fact that the Bush administration decided to persevere in the Council after the first unanimous resolution on Iraq, filtering an issue of ‘vital’ national interest through difficult and contentious Council negotiations, is an indication of the importance of the legitimizing power on offer. (BOULDEN, 2006, p. 413).

A segunda categoria que Boulden (2006) explica é a que inclui áreas

onde os membros permanentes têm interesses “menores”, sendo que se um ou

mais membro permanente sente que algo deve ser feito ou deseja que algo

que algo seja feito, mas prefere não fazê-lo ou não pode fazer por si próprio.

Sendo passíveis de ser reivindicações da mídia, ONGs, grupos de interesse,

pressão da opinião pública e interesse nacional. E na última categoria, a autora

explica que estão os conflitos em que os membros permanentes não têm

qualquer interesse, portanto, não há nenhum ou uma resposta limitada do

Conselho de Segurança.

Castro (2007) explica que até 1993 o CSNU não podia contar com

atores não estatais para auxilia-los nas investigações sobre os casos que

chegavam para a observação do órgão, como ONGs ou indivíduos. Mas graças

à “fórmula de Arria” 17, implantada como auxiliador para os trabalhos do

Conselho durante o conflito na Ex-Iugoslávia, o diálogo com outros atores foi

16

Os conselheiros são representantes escolhidos pelos Estados membros do CSNU, os cinco permanentes e os dez rotativos. 17

Segundo Thales Castro (2007), esse nome foi dado em homenagem ao seu criador, o embaixador Diego Arria que presidiu o CSNU. Em março de 1993, durante o seu mandato, ele resolveu convidar todos os delegados para conversar com um padre iugoslavo para ter mais informações sobre as violações de direito humanos na antiga Iugoslávia.

36

estreitado, o que se mostrou de grande utilidade para a tomada de decisões

fundamentadas com as informações colhidas com esses atores. Outro avanço

causado pelos conflitos da Ex-Iugoslávia foi a inédita cooperação realizada

entre a ONU e a OTAN para a manutenção da segurança internacional em uma

determinada região. Foi neste mesmo caso que se percebeu que, em certos

conflitos, seria necessário dar respostas rápidas e enérgicas logo no inicio,

para que não tivessem problemas de proporção ainda maior no país alvo, ato

que não só foi aprendido por não ter acontecido neste caso. Este conflito é um

dos que possui maior importância e consequências, assim como o do próximo

item que trouxe novas perspectivas ao CSNU.

Para finalizar, Thales Castro (2007) explica que devesse examinar as

atitudes do Conselho, devem ser examinandas de forma indissociável e

simultânea, na esfera normativa e discursiva, tanto como ação política,

diplomática e jurídica.

Justifica-se tal visão pelo fato de o CSNU ser ocupado por diplomatas manuseando uma linguagem diplomática cuidadosa que, por meio de processo de negociação política de alto nível formula diretrizes jurídicas de cunho vinculante para os 192 Estados-Membros.” (CASTRO, 2007, p. 96).

Conforme a visão de Castro (2007), na esfera jurídica, o CSNU é uma

das poucas instâncias que produz na ONU legislação de aplicabilidade

imediata. Politicamente é órgão estratégico com densidade política na

manutenção da ordem e da governança mundiais, devido a sua composição. E

diplomaticamente é instrumento de negociação com código próprio de

linguagem.

Como apresentado o CSNU tem lhe atribuído funções que mexem com o

destino de países em conflito ou naqueles países que o P-5 entenda que

possam configurar ameaça a paz internacional. Foram trabalhadas também as

críticas pelo seu formato e aparato burocrático, legal e institucional que este

órgão tem acesso. Outro foco deste item foram alguns conflitos os quais

trouxeram novas maneiras do CSNU agir e interagir para melhor entender e

resolvê-los.

37

No próximo item o centro das atenções será um dos conflitos mais

marcantes para as mudanças da forma de agir do Conselho e que tem direta

influência na Guerra do Iraque em 2003, a Guerra do Golfo, o qual deixa

marcas específicas no Iraque.

1.3 Conselho de Segurança e a Guerra do Golfo

Durante a pesquisa para este trabalho pareceu necessário fazer da

Guerra do Golfo um subitem na análise, pois constantemente nos textos o

confronto apareceu de forma importante tanto para a Instituição aqui estudada,

quanto para a Guerra do Iraque de 2003. Por isso, essa parte do estudo serve

como transição entre os capítulos I e II.

Aziz Saliba (2008) concluiu nos seus estudos, assim como os autores já

citados anteriormente, que a Carta da ONU é instrumento instaurador de uma

nova ordem internacional e que levou a uma “ruptura paradigmática como

modelo antecessor de soberania absoluta“ (SALIBA, 2008, p. 173) por ser um

sistema de normas obrigatórias para todos os Estados, estabelecendo regras e

funções para o CSNU. Ele é fundamental para a organização, pois é

responsável pela manutenção da paz e da segurança internacional, como

também já foi apresentado. Seus poderes são utilizados em caso de “ameaça à

paz, ruptura da paz ou ato de agressão” quando detectadas por seus membros,

podendo adotar medidas coercitivas sem uso de força ou, se achar necessário,

com coerção militar. O destaque do texto de Aziz está na reflexão a seguir, pois

está relacionada com a credibilidade da Instituição e de seu órgão mais

importante.

Ao conjugarmos a obrigação de promover e estimular o respeito aos direitos humanos com o princípio da boa-fé, concluímos que o Conselho de Segurança, como toda a ONU, estarão obrigados a respeitar as normas de direitos humanos que a própria Organização ajudou a criar e que procura proteger. Contudo, vislumbramos, a partir da práxis, ofensas, pelo CSNU, do direito à vida, direito à saúde, direito de ir e vir, direito à propriedade, direito de petição, direito ao julgamento por um órgão independente e imparcial, direito à reparação de danos e do direito ao devido processo legal. (SALIBA, 2008, p. 173).

38

A análise acima apresentada tem importância devido ao envolvimento e

a instituição, pois na Guerra do Golfo houve o agravamento de problemas

humanitários na região, causados pelas sanções impostas ao Iraque.

Como anteriormente discutido, Aziz Saliba (2008) também fala da inércia

do CSNU até os anos 90, mesmo nas graves crises, depois a quantidade e a

intensidade das sanções cresceram significativamente. Ele lista os países que

fizeram parte desse novo momento, sofrendo imposição de medidas

coercitivas: Afeganistão, Angola, Coréia do Norte, Costa do Marfim, Etiópia,

Eritréia, Haiti, Irã, Iraque, Iugoslávia, Libéria, Líbia, Rep. Democrática do

Congo, Ruanda, Serra Leoa, Somália e Sudão, e atores não estatais, como

Taliban e Al-Qaeda. Patriota (1998) já apontava que o Conselho vinha facilitado

soluções pacíficas para as crises herdadas da Guerra Fria, só que a falta de

influência dos membros não permanentes e dos outros membros da AGNU nos

processos decisórios provocou questionamentos sobre a legitimidade do órgão.

Outro problema que permaneceu foi o receio que não se tivesse equilíbrio nas

intervenções militares legitimadas pelo Conselho, na proporção no uso da

força, como a preocupação de que pudesse manter suas ações durante muito

tempo respaldando seus atos pelo Capítulo VII. Antônio Patriota (1998)

preocupou-se em questionar as intervenções excessivamente prolongadas, os

efeitos das sanções sobre países terceiros e o grande impacto que estas

podem exercer sobre a população do país alvo, na opinião do autor estas

questões devem ser pautadas, pois o objetivo não era prejudicar a população e

sim alvos específicos18.

A invasão ao Kuwait pelo Iraque testou a credibilidade da ONU, pois

esta teve que reagir, o que causou a Guerra do Golfo (1990-91). Lopes e

Casarões (2009) afirmam que o Conselho de Segurança agiu rapidamente e

firme com tal situação, algo fora do padrão onusiano. Na visão deles, a

intervenção pode ser contestada, pois os autores apontam que nem todas as

18

Ao escrever sobre a Guerra do Golfo Saliba comenta, ”Foi neste conflito que o CSNU passou a adotar as smart sanctions (sanções inteligentes), pois a medida é dirigida contra os indivíduos e entidades, normalmente ligadas ao regime transgressor. O princípio seria custos (financeiros, humanitários etc.) menores que o uso da força e seriam mais aceitáveis para a comunidade internacional que as sanções abrangentes. Sendo difícil serem usadas pelo regime para manipular a opinião pública interna contra a ONU (e/ou comunidade internacional).” (SALIBA, 2006, P. 74).

39

ações foram baseadas na Carta da ONU e nem levaram em conta o capítulo

VII. Celso Amorim (1998), Niels Blokker (2000) e Saliba (2008) ressaltam a

intensificação das atividades do Conselho depois de 1992, consensualmente o

estopim foi a ação armada contra a ocupação do Kuwait pelo Iraque. Um dos

motivos foi a Agenda para a Paz concebida por Boutros-Ghali, o Secretário-

Geral (S-G) na época, que esperava que as ações coordenadas pelo Conselho

fossem mais intrusivas e militarizantes. Porém, tal característica não foi

cumprida nos casos da Somália e da Bósnia “pondo fim ao curto período após

a crise do Golfo em que a ordem unipolar pós Guerra Fria pareceu coexistir em

harmonia com o multilateralismo.” (AMORIM, 1998, p. 2).

Antônio Patriota (1998) elenca as preocupações do então S-G Boutros-

Ghali com o risco de que os Estados encarregados das intervenções se

aproveitassem da legitimidade conferida pelo Conselho de Segurança para

alcançar objetivos que não eram estabelecidos pelas resoluções. O então

Secretário, no entanto, incentivou as forças multinacionais19 devido ao aspecto

financeiro, pois criava a impressão de que a ONU se mobilizava, mas quem

arcava com os custos eram os países envolvidos nas missões ao invés da

Organização. Outro problema notado pelo autor é da duração das sanções e

das condições para seu término, pois as sanções permanecem em vigor até

que a decisão de revoga-las passe pelo Conselho, como já apresentado, o P-5

pode usar o ‘reverse veto’, impedindo que as sanções sejam derrubadas. Esse

tipo de situação “também tem estimulado uma dinâmica confrontacionista entre

o norte e o sul, além de dividir os membros permanentes” (PATRIOTA, 1998, p.

145).

Os acontecimentos que levam ao conflito da Guerra do Golfo tem início

dia 02/08/1990, com a invasão do Iraque ao Kuwait. Estaria entre os principais

motivos a demarcação de fronteira, o direito do país sobre o campo petrolífero

limítrofe de Rumeila e o outro seria de que o Kuwait havia vendido mais

petróleo do que teria sido acordado na OPEP (Organização dos Países

19

Niels Blokker (2000), explica que o modelo ‘delegated enforcement action’ 'não é explicitamente mencionado na Carta das Nações Unidas como um dos instrumentos de que o Conselho de Segurança pode lançar mão.

40

Exportadores de Petróleo), causando a queda nos preços, como Brito (2014)

detalha em seu livro. Para Bardo Fassbender…

Iraq’s invasion of Kuwait in the summer of 1990 provided the Council with a chance to demonstrate that it had, following the end of the East-West conflict, reassembled its strength and was able once more to shoulder its responsibilities as they are laid down in the Charter.” (FASSBENDER, 2002, p. 274).

O Conselho na res. 662/90 expressou que a anexação do Kuwait pelo

país era nula. Na sequência dessa resolução foram aplicadas sanções, as

quais proibiram qualquer comércio de armamentos e outros materiais militares

com o Iraque. A proibição também do transporte de mercadorias provenientes

ou destinadas ao Iraque e o congelamento dos fundos financeiros do governo e

de todas as demais pessoas jurídicas iraquianas, como apontado por Patriota

(1998). Com a recusa do governo de Saddam Hussein em cumprir com as

determinações do Conselho, uma coalizão de trinta países foi montada para a

operação “tempestade no deserto”, que começou em 17/01/1991 e foi

suspensa em 27/02/1991, quando o Ministro das Relações Exteriores do Iraque

Tariq Aziz avisou ao CSNU que o Iraque concordava em cumprir as resoluções

impostas.

Saliba (2008) traz em sua pesquisa o fato da crise humanitária e os

danos na estrutura terem sido causados no Iraque, devido às resoluções

impostas ao país20. O autor apresenta dentre os problemas: o aumento no

número de mortes, doenças e queda nas condições de vida da população

iraquiana21 que, segundo ele, era um dos mais altos do Mundo Árabe, antes da

guerra do Golfo. O aumento nos preços dos alimentos, na época em 1.000 por

20

“Secretary-General Pérez de Cuéllar remarked that the way in which Resolution 678 was implemented ‘shows that there is a need for an improved and more institutionalized mechanism for reporting to the Council by the concerned states’. The Council, he said, ‘needs to preserve for itself the authority to exercise guidance, supervision or control with respect to the carrying out of actions authorized by it’... At the same time critical voices grew stronger, saying that the Council, rather than having objectively assessed the case, had been put in the service of the United States and its interest in an unhampered oil supply from Kuwait. Other critics argued that the scale of the military operation, and the loss of human lives it involved, was out of proportion to the defended territory of less than 18,000 square kilometres, which makes Kuwait slightly smaller than New Jersey, and a people counting less than a million.” (FASSBENDER, 2002, p. 276). 21

Essa situação causou tensão entre membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU. Já que França, Rússia e China, não fecharam os olhos para os custos humanos do embargo.

41

cento, e os salários foram reduzidos. O sistema de telefonia foi quase todo

destruído e os correios não funcionavam. Usinas de energia, refinarias e

depósitos de petróleo tinham sido destruídas durante a operação. Faltava óleo

diesel, produtos químicos e peças, o que influenciava no tratamento da água e

esgoto, inclusive deixando de funcionar. A coleta de lixo era escassa ou

inexistente. Sem contar, por óbvio, os bombardeios aéreos que causavam

danos à infraestrutura do país. Celso Amorim (1998) segue a mesma linha,

explicando que o regime abrangente e intrusivo aplicado ao Iraque pela

resolução 687 levou ao aumento de doenças, desnutrição, mortalidade infantil,

o que passou a ser custoso, levantando dúvidas sobre sua eficácia. Por outro

lado...

[...]"benefício" avaliado em função do nível de certeza adicional que se deseja ter sobre se o Iraque efetivamente cumpriu com sua obrigação de eliminar as armas de destruição em massa que possuía e não voltou a tentar produzi-las. Em plano mais geral, é possível afirmar, que começa a emergir um consenso entre os Estados membros a favor de uma limitação do alcance das sanções a alvos precisos, de modo a minimizar seus possíveis impactos humanitários e seus efeitos sobre terceiros. (Amorim, 1998, p. 9).

Antônio Patriota (1998), que escreveu um livro sobre o confronto no

Golfo, levantou três pontos de novas situações que o confronto fez o CSNU

lidar: a demarcação de fronteira, o desarmamento e controle de armamentos, e

o esquema de compensação. Mesmo que a intervenção ao Iraque em 1991

tenha baseado suas ações na concepção de segurança coletiva, a opinião do

autor é que a punição ao Iraque foi descabida, sendo desproporcional a

agressão que aquele país cometeu, o que teria levado a desagregação da

coalizão. A Guerra do Golfo gerou a resolução 687 na qual, segundo o

diplomata, pela primeira vez se adotou ações abrangentes num pós-conflito,

colocando-o como obrigatório ao Estado agressor e tendo como base o

Capítulo VII da Carta da ONU.

Fassbender ressalta os acontecimentos que levaram a tal situação.

In early 1998, the Council left it in doubt whether the United States was entitled to use military force in order to ensure Iraqi compliance with its disarmament obligations. While the US government believed that it could rely on Resolution 678, other permanent members of the Council, namely China, France and Russia, held that any military action would require a new express authorization by the Council. This dispute

42

regarding a question so vital to the UN, the legitimate use of force in international relations, could not be resolved in the Council because of the veto power held by each permanent member. Resolution 1154 (1998), by which the Council on 2 March 1998 endorsed the diplomatic solution accomplished by the UN Secretary- General at the very last minute, spoke of ‘severest consequences for Iraq’ in the event of a violation of its obligations, without making clear whether or not such consequences could include the use of military force. On 16 December 1998, the United States and the United Kingdom launched four days of air strikes against Iraq, arguing, as they had before, that they had legal authority to use force to respond to Iraqi ceasefire violations. Russia, China and a number of non-permanent members again disagreed. (FASSBENDER, 2002, p. 277).

Dunne (2003) apresentou no seu texto o que aconteceu nos anos

seguintes às sanções. As informações do autor dão conta de que Bill Clinton

começou seu mandato como presidente dos EUA, procurando

"despersonalizar" as tensões e sugerindo que o seu país poderia aceitar

Saddam Hussein. Mas as crises que ocorrem em seguida levam a política de

Bush, que pediu a queda do governo iraquiano e do seu chefe de Estado.

Bluth (2004), Malone e Cockayne (2006) e Dunne (2003), são autores

que explicam o que aconteceu com o fim em si da Guerra do Golfo, entre os

principais fatos está a ampliação, em Novembro de 1997, da crise envolvendo

as armas de destruição em massa e sanções que lesavam o Iraque. Os EUA e

o Reino Unido pressionavam militarmente, ameaçando o Iraque para que

cumprisse as obrigações com a United Nations Special Commission

(UNSCOM). Enquanto a França e a Rússia tentavam aliviar as sanções

econômicas e advertiam e incitavam o governo iraquiano a cooperar com a

UNSCOM. No final de 1998, a Operação Raposa do Deserto dividiu ainda mais

os membros permanentes do Conselho de Segurança, distanciando os dois

polos, citados anteriormente. Só sendo amenizado com o êxito da missão do

Secretário-Geral Kofi Annan a Bagdá, aliviando por via diplomática a mais séria

crise (até então) registrada sobre o caso.

Como Bluth (2004) apresenta, no final de 1999, os Estados Unidos

contestavam as análises dos inspetores da UNSCOM, pois estes afirmavam

que o país tinha destruído as suas armas de destruição em massa e cessado

os programas de desenvolvimento nesta área. Não convencidos, alegavam que

o Iraque continuava trabalhando com armas de alto potencial destrutivo. O

43

apogeu dessa desconfiança resultou nos discursos proferidos por George W.

Bush e Tony Blair no ano 2001, no qual classificam o Iraque como parte do

eixo do mal e na política de Guerra ao terror. O que será estudado no próximo

capítulo, já que este ato levou os Estados Unidos e seus aliados a atacarem o

Iraque em 2003.

Bardo Fassbender (2002) explicou que, apesar de todos esses

problemas, o Conselho permaneceu no centro das atenções dos governos dos

Estados que fazem parte da organização, principalmente das potências

internacionais.

Quando foi apresentado o sistema ONU e o CSNU notou-se no material

apresentado que apesar de extremamente importante no sistema internacional,

as ações das Nações Unidas mais efetivas devem ser autorizadas pelo CSNU,

sendo este reflexo da política escolhida pelos Estados do P-5, são eles que

resolvem o que é melhor para as questões debatidas neste órgão por serem

detentores do veto.

Pode-se observar com esse primeiro capítulo que as Nações Unidas

detêm poder sim, porém estão nas mãos do P-5, ficando refém dos seus

próprios mecanismos burocráticos, jurídicos e institucionais, que travam sua

ação. O Conselho consegue agir em conflitos, especialmente com o fim da

Guerra Fria, um exemplo é a Guerra do Golfo, este provoca novas formas do

Conselho agir em conflitos e causa discussões sobre o reverse veto.

O último item serviu para estabelecer conexões entre os capítulos dessa

monografia, adianto que o principal ponto de relação entre as ações tomadas

pelo CSNU na Guerra do Golfo e a invasão no Iraque em 2003 são as sanções

usadas pelos EUA para comprometer o Iraque, são aquelas relacionadas à

proibição da produção e uso de armas de destruição em massa. No próximo

capítulo essa questão ganhará destaque, além do contexto antes da invasão

ao Iraque de 2003, as resoluções do Conselho sobre o tema e as

consequências desses atos ganham destaque, principalmente o que está

relacionado ao CSNU e a ONU.

44

Capítulo II – Iraque: contexto mundial pós- 11 setembro, resoluções e as

consequências

Nesta parte do trabalho será apresentada a situação internacional

depois dos atentados às torres gêmeas do World Trade Center, a política

externa de George W. Bush e questões relacionadas ao uso preventivo da

força, no primeiro item do capítulo. Além disso, na segunda seção, serão

trabalhadas as questões sobre a coalizão que invadiu o Iraque e as medidas

tomadas pela ONU, na verdade, pelo seu órgão decisório, o Conselho de

Segurança. Por último será apresentado as consequências da invasão dos

EUA e de seus aliados ao Iraque, e os atos do CSNU durante o conflito,

principalmente pontos como a estrutura política e de relação com os EUA.

Em seu texto de 1998, Celso Amorim apontava o ressurgimento tímido

da multipolaridade, mesmo indicando certo desequilíbrio unipolar da potência

americana, o que, poderia levar ao distanciamento com Conselho com os anos.

Esse distanciamento também poderia acontecer com o compromisso de

segurança coletiva, no qual todos tem responsabilidade na comunidade

internacional. Lá nos anos 90, o autor fazia previsões de comportamentos que

poderiam causar problemas ao CSNU, como: não atender às preocupações

dos EUA ou responder positivamente as questões que os EUA estejam

interessados. Em sua visão, a credibilidade do Conselho poderia ser

seriamente afetada se uma das situações anteriores acontecesse. No decorrer

do capítulo, veremos que, além de ser contestada pelo governo de

Washington, a comunidade internacional e estudiosos vão criticar as ações da

CSNU sobre o caso aqui estudado.

Outra questão importante no texto será a ruptura no cenário

internacional causada pelos atentados de 2001 em Nova York. Rodrigues

(2014) lembra que tal acontecimento trouxe transformações na agenda

internacional dos EUA como nas relações internacionais de modo geral. A

atenção para a segurança fica maior com o combate ao terrorismo,

principalmente com a guerra ao terror, já que até aqueles atentados era comum

o terrorismo interno nos países e que passaram então a ser interestatal.

Medeiros (2002) escreveu sobre o assunto: “O terrorismo internacional está, via

45

de regra, associado a conflitos regionais. Busca, quase sempre, o avanço de

uma causa e o restabelecimento do equilíbrio, muitas vezes perdido no quadro

do conflito em que se insere.” (MEDEIROS, 2002, p. 64). Em seu estudo ele

afirma que o terrorismo avança por redes de simpatizantes ou diásporas

étnicas. Os terroristas treinados e financiados por Estados que o usam para

pressionar outros Estados. Como vai ser estudado, o terrorismo terá maior

atenção nas Nações Unidas, devido aos fatos ocorridos, principalmente, no dia

11 de setembro 2001.

2.1 A conjuntura no pós-11 de setembro

Vianna (2011) aborda a questão da conjuntura internacional no período

dos atentados terroristas de 2001 nos EUA. Como já citamos, dominava a

unipolaridade no sistema internacional, os EUA, que atuava de forma isolada e

unilateral. Com o fim do “mundo bipolar” da Guerra Fria, cresceu a

vulnerabilidade dos Estados a intrusões externas, o terrorismo internacional e

outras formas de criminalidade transnacional, o maior destaque para os atores

não estatais, a desestruturação dos Estados e a globalização. Vianna concorda

com Ricupero (2003), que acredita que os acontecimentos citados não podem

ser comparados ao fim da Guerra Fria. Sobre a tragédia em New York “[...]

aqueles atentados terroristas ilustraram foi a globalização das ameaças e do

cenário estratégico, e a força crescente dos actores não estatais [...]“

(CANTALAPIEDRA, 2009, p. 25). Mas Cantalapiedra levanta outro ponto

interessante e de importância notável...

Destacaria as seguintes: a nova dimensão do terrorismo transnacional e o seu carácter de ameaça global que abriu um novo campo no problema securitário; o fim da «santuarização» do território dos Estados Unidos; a afirmação da importância dos conflitos assimétricos (não «clausewitzianos») na conflitualidade internacional; a alteração do conceito de dissuasão; o advento da prioridade dada ao combate ao terrorismo global e à proteção dos territórios e das populações; a inversão da estratégia global norte-americana, particularmente evidenciada com a invasão do Iraque, privilegiando o unilateralismo, o recurso a «coligações de vontade» e a prática da guerra preventiva (estratégia posteriormente revertida por Obama); a alteração do equilíbrio estratégico no Médio Oriente, decorrente da Guerra do Iraque; os efeitos da guerra no Afeganistão, teatro de operações onde está em jogo a credibilidade da Aliança Atlântica e o sucesso da luta contra o terrorismo transnacional.(CANTALAPIEDRA, 2009, p. 55).

46

Aos olhos do governo norte-americano, Cantalapiedra (2009) relata que

o terrorismo internacional seria ameaça não só para a segurança estatal, mas

também a segurança humana, política (da democracia, império da lei, direitos

civis e liberdades fundamentais), econômica (prosperidade, mercado livre e

livre circulação de pessoas), social e ambiental. Não é à toa que se tornou

prioridade nas agendas governamentais, principalmente estadunidense, o que

levou à cooperação entre vários países na luta antiterrorista.

A Guerra ao Terror observa Cantalapiedra (2009) em seu estudo, tinha

como base o National Security Strategy Document, no qual visavam

estabelecer uma ordem internacional favorável aos valores e interesses dos

americanos, onde não seria possível a ascensão de uma potência hegemônica

regional ou global que pudesse desafiar a ordem internacional e sua potência,

favorecendo-o, já que Washington lideraria os outros países. Essa nova ordem

deveria respeitar os interesses das nações mais desenvolvidas para que se

mantivesse o status quo do sistema internacional. O autor trata as pretensões

do governo estadunidense como imperiais e aponta o comportamento de Bush

como...

Presidência Imperial, ao conseguir que todo o país cerre fileiras em

torno do Presidente como comandante-em-chefe de uma situação de

guerra. Esta situação acentua‑se sobretudo após as eleições de

Novembro de 2002, em que Bush consegue a maioria nas duas

câmaras do Congresso. (CANTALAPIEDRA, 2009, p. 55).

Na visão de Rubens Ricupero (2003) a dois momentos importantes no

contexto internacional recente. O primeiro momento corresponde à queda do

muro de Berlim e o segundo é posterior ao 11 de setembro. No primeiro,

esperava-se que as barreiras entre as duas partes dos mundos, até então

divididos, iria “(...) desencadear o autêntico degelo das relações internacionais”

(RICUPERO, 2003, p. 11). Os regimes comunistas são desmantelados e ocorre

o estabelecimento de uma homogeneidade para legitimação do poder, dos

tipos de organização econômica das sociedades em direção ao modelo de

democracia representativa-pluralista e a economia capitalista de mercado,

47

segundo Ricupero (2003). Com o fim da Guerra-Fria vários conflitos eclodiram,

como o de Moçambique, Camboja, entre outros.

Nota-se, no texto Rubens Ricupero (2003), que o período de 1989 até

2001 tem como característica a solução de quase todos os problemas

internacionais graves de forma rápida e, no plano econômico, a aceleração da

globalização – revolução tecnológica das telecomunicações e da informática,

também há a internacionalização da produção pelas empresas transnacionais –

que só foi possível com o fim do “confronto” entre os EUA e a URSS.

Muitos esperavam que os países centrais ficassem longe de possíveis

confrontos. A elucubração de Ricupero (2003) vai pela linha de que o atentado

ao World Trade Center muda a forma dos EUA comportar-se perante os outros,

esse país começa a guerra com o Afeganistão e dois anos depois com o

Iraque. Essas guerras levam o autor fazer uma analogia que compara os EUA

com o Império Romano, pois o país possuía poderio militar e recursos

econômicos e, com isso, poderiam fazer o que quisessem como tentar

implantar naqueles no Afeganistão e no Iraque o modelo de governo norte-

americano, alterando a estrutura da organização dessas sociedades.

Manifestações de terrorismo foram vistas em outros lugares além dos

EUA como, por exemplo, a Rússia e o Reino Unido, mas é o governo

estadunidense que de forma oportuna “instala” a “guerra global contra o

terrorismo”, a fim de saciar suas necessidades repressivas, deixando a

economia em 2º plano.

[...] os norte-americanos deixem-se tentar pelo uso e abuso unilaterais do desmesurado poder militar que acumularam, a ponto de torná-los praticamente invulneráveis contra adversários mal armados e de fazer com que os benefícios das guerras ultrapassem de longe seus custos em vidas humanas (as próprias, não as alheias). (RICUPERO, 2003, p. 14).

A consequência dessas ações foi a militarização da política externa, o

que trouxe o unilateralismo do governo dos EUA no uso do poder e o

aprofundamento das divergências. Para Ricupero (2003), isso mostra que

existe, a princípio, unanimidade na solidariedade, mas esta é transformada em

temor, rejeição e antagonismo depois da reação americana. Existe o apoio

48

contra o governo dos talibãs e do seu apoio ao terrorismo. As coisas mudam

quando o discurso sobre o “eixo do mal” começa a ser empregado pelos EUA.

Cria-se uma situação perigosa ao desestabilizar o Oriente Médio, devido

à localização geográfica e por causa do petróleo, como explica Rodrigues

(2014). A autora enfatiza que existe a tentativa de transformar o Iraque em um

“espelho” dos EUA no que tange as instituições, mas isto foi barrado pelos

ataques terroristas e o contra ataque de vários governos ao redor do mundo. A

guerra contra o terrorismo volta a impor barreiras que tinham sido quebradas

com o fim do Muro de Berlim. A tendência globalizante é freada, por exemplo,

aumentando a dificuldade para viajar entre países, a venda ou importação de

produtos e serviços.

Segundo Ricupero (2003), das 16 tentativas dos EUA de nation-building,

apenas duas obtiveram sucesso (Alemanha e Japão), outras duas tiveram

resultados duvidosos (Granada e Panamá) e doze falharam22, levando em

conta como critério a duração da democracia de, no mínimo, dez anos depois

do fim da ocupação. Isso porque o sucesso estaria condicionado às

circunstâncias especiais.

Emerson Maione de Souza (2009), ao rediscutir as teorias da Escola

Inglesa à luz do pós-11 de Setembro, chama atenção para a afirmação de Tim

Dunne (citado no seu artigo) que, entre o 11/09/2001 até 20/03/2003, o

governo estadunidense parece jogar com as próprias regras. A concepção dos

EUA ser uma hiperpotência tem como base o fato do país usar a ideia de

direito de autodefesa e o argumento da ação preventiva nas ações contra

Afeganistão e Iraque, que teriam sido legitimadas mesmo sem ameaça

eminente e o fato deles negarem estender a outros países essas justificativas

para o uso da força.

Outro autor trabalhado no texto de Souza é Galia Press-Barnathan,

segundo o qual:

[...] devido às potenciais consequências devastadoras da atual proliferação de armas de destruição em massa e a aquisição destas

22

Ricupero (2003) não cita quais foram os casos que falharam.

49

por grupos terroristas, tornou se necessário deter não apenas o uso de tais armas (a antiga lógica da guerra fria), mas também o seu desenvolvimento e aquisição. Deter tais ações pela ameaça da força deu lugar à ascensão do uso da preempção (na verdade querendo dizer guerra preventiva). A ameaça de intervir é justificada pelo argumento de que o fortalecimento de tais grupos terroristas não estatais coloca em risco a própria existência da sociedade internacional. (SOUZA, 2009, p. 141).

Ian Holliday (2003) lembra que, no discurso de 20 de setembro de 2001,

o presidente Bush fez da guerra contra o terrorismo central ao seu governo e

também de todos os seus aliados. Ao examinar a teoria da guerra justa,

Holliday lembra que intervenções podem acontecer de duas formas,

militarmente ou na forma não militar. A intervenção governamental humanitária

pode existir nas duas formas. Ela também pode ser uma intervenção

humanitária transnacional, intergovernamental e não governamental. O que

muda segundo a análise de Holliday é a natureza do agente intervindo:

Estado(s) ou não Estado(s). A intervenção pode ser coercitiva ou não

coercitiva. E pode ser interna ou externa para a sociedade de destino. Se a

ação é singular ou coletiva na hora de intervir é o que define se ela é ética ou

não. Outra questão importante, se ação é coercitiva ou não coercitiva, e se

engajamento é interno, a intervenção está dentro de fronteiras

internacionalmente reconhecidas, ou ação externa, com medidas fora dessas

fronteiras.

No entanto, este apoio não se fez presente em relação à invasão ao

território iraquiano em 2003, uma vez que esta operação não recebeu

autorização do Conselho de Segurança da ONU, como Ramina (2003) escreve

devido aos fundamentos para a invasão se basearem em argumentos vagos e

pouco precisos de apoio ao terrorismo internacional e o desenvolvimento e

estocagem de – pretensas - armas de destruição em massa, principalmente as

de caráter biológico.

Na verdade, após os ataques de 11 de setembro, Buzan e Gonzalez-

Pelaez (2005) lembram que os EUA receberam apoio incondicional da

comunidade internacional no combate ao terrorismo internacional, fato que

gerou uma formidável coalizão para a incursão militar no Afeganistão, no intuito

de modificar o regime político existente lá, que seria abertamente favorável a

50

grupos armados, sendo que, em alguns casos, os talibãs – grupo religioso que

comandava as ações políticas no país – os abrigavam, treinavam e

financiavam, criando evidentes situações de ameaça à paz internacional. Este

era o caso do grupo terrorista Al Qaeda, comandado por Osama Bin Laden,

que realizou os ataques aos Estados Unidos e que, comprovadamente, tinham

a base de suas operações no Afeganistão.

Outro ponto importante a reforçar é sobre a região do Oriente médio,

inclusive o Iraque, que possui características específicas como Rodrigues

(2014) explica em seu texto, a incidência de democracia na região ainda é

baixa, no sentido contrário do potencial energético, que é enorme (a segunda

maior fornecedora de energia do mundo). Outro ponto diferencial é a disputa

entre árabes e israelenses, que ocorrem nessa região. Para a autora essa

disputa é carregada de elementos socialmente arraigados, como a cultura e a

religião, por exemplo, e o próprio Iraque já teve rusgas com Israel.

Oren Barak (2007) tenta mostrar a ideia segundo a qual o “dilema de

segurança” é um conceito criado (durante a Guerra Fria) para explicar porque

os Estados querem tanto se defender de um sistema internacional “anárquico”

e acabam lutando com outros. Ao tentar melhorar sua segurança, na falta de

um governo global capaz de proteger os Estados contra ameaças potenciais à

sua segurança, eles podem desencadear respostas violentas por outros

Estados, que podem entender tal situação como ameaça. Como ressalta em

seu texto Barak, a violência atual no Iraque é causada pelo “dilema de

segurança”, gerada pela invasão do EUA, entre as principais comunidades

iraquianas – xiitas, sunitas e curdos.

Tal contexto levou o então Presidente norte-americano George W. Bush,

a defender e por em prática a célebre tese de “legítima defesa preventiva”,

utilizando-se, dentre outros argumentos, da Resolução 1368 de 12 de setembro

de 2001, que autorizou a resposta armada norte-americana, logo após os

ataques terroristas, explicitado no texto de Martins (2013). Estes sim

configuraram nítidas ameaças à paz e à segurança internacional,

reconhecendo, assim, “o direito natural” dos Estados “à legítima defesa

individual ou coletiva”. Entretanto, o governo norte-americano e britânico

51

interpretou de forma extensiva a resolução citada anteriormente, empregando a

mesma, além da invasão ao Iraque, para intimidar alguns países

historicamente hostis aos EUA e as suas pretensões.

Para estes quatro autores, Paulo (2008), Ramina (2003), Platiau e Vieira

(2006), entende-se, a partir da Carta das Nações Unidas, que apenas o

Conselho de Segurança poderia determinar “a existência de qualquer ameaça

à paz”, sendo vetado ao Estado fazê-lo. Por isso, a ação do governo

estadunidense para estes não seguiu os preceitos da instituição. Um dos

problemas é a fórmula de Yalta, como Platiau e Vieira (2006) destacam: “Esse

problema ressurgiu em 2003, quando a França ameaçou vetar uma nova

resolução autorizando a intervenção no Iraque. Essa paralisia do Conselho é

um dos argumentos que levam os Estados a agir fora dele.” (PLATIAU; VIEIRA,

2006, p.188). Para estes dois escritores, outro problema é o que determina a

existência de uma ameaça. Para eles as novas ameaças (terrorismo, armas de

destruição em massa e novas tecnologias de ataque), tem um complicador

maior, o inimigo não tem como ser “personificado” e não à como identificar a

existência do apoio de um Estado.

No caso iraquiano, os EUA alegaram que o Estado iraquiano poderia

fornecer armas de destruição em massa ou de tecnologia nuclear para Al-

Qaeda ou outros terroristas. Foram sublinhados outros Estados, que

possuíssem tal material, conhecido como o “Eixo-do-mal”, são eles: Coreia do

Norte, Irã, Síria, Líbia e Iraque. Rinaldi (2012) explica que as autoridades do

governo norte-americano no período ligavam Saddam Hussein e o governo

iraquiano com a Al-Qaeda e o Talibã, segundo o qual estariam desenvolvendo

Armas de Destruição em Massa (ADM).

Delgado (2004), Paulo (2008) e Ramina (2003) contestam a visão dos

EUA de ataque por legítima defesa, argumento usado por Bush para invadir o

Iraque. O Paulo (2008) alega legítima defesa e deve ser curta e transitória, fora

disso, pode ser considerada ilegal pelo Conselho. Ele também enfatiza que

“uso preventivo da força pode gerar dilemas de segurança e corridas aos

armamentos, e criar uma dinâmica de equilíbrio de poder, possível causadora

de guerras devastadoras...” (PAULO, 2008, p. 39). Delgado (2004) considera

52

legítima a defesa preventiva, quando um Estado dá um passo para atacar

outro, mas este não ocorreu integralmente ou não foram sentidos. E o uso

preventivo da força, quando Estado sofre perigo de um ataque num futuro

próximo pelo fato de outro estar a desenvolver armamento com capacidade

para atingi-lo. Seria nessa ideia que os EUA gostariam de encaixar o seu

ataque. O problema, como apresentado anteriormente, é que não havia provas

do Iraque estar produzindo armas que ameaçassem a potência. Platiau e Vieira

(2006) destacam que as intervenções preventivas são por eles caracterizadas

como o uso de força militar com antecedência ao uso da força pelo inimigo.

Platiau e Vieira (2006) destacam que essas novas ameaças

desenvolveram novas tecnologias de ataque e o foco passa a ser ‘chamar

atenção’ ao invés da quantidade de pessoas mortas. No seu texto, eles alegam

que a intervenção do governo estadunidense no Iraque dividiu a comunidade

internacional.

Parte dela seguiu os Estados Unidos com argumentos de legítima defesa preventiva, ou mesmo em nome da democracia e dos direitos humanos. Outra parte entendeu o fato como ilegítimo e ilegal, pois não respeitava a Carta das Nações Unidas [...] (PLATIAU e VIEIRA, 2006, p. 190).

Já Larissa Ramina (2003) traz a visão do que aconteceu no Conselho.

Onde os Estados Unidos tentaram convencer França, Rússia e China para que

aprovassem uma resolução que determinasse rigorosas inspeções de armas

no Iraque e a autorização para o uso da força, caso o governo iraquiano não

cooperasse. Tentando forçar, assim, certo “consenso internacional” para utilizar

a força militar contra o Iraque. São duas razões: resolução do Conselho de

Segurança lhes conferiria legitimidade internacional e ampliaria a possibilidade

de dividir os custos militares com os aliados, além de facilitar a colaboração

com os países árabes. “Evitou-se, de um lado, a autorização para um ataque

imediato, mediante a exigência de dois tempos, o primeiro para as inspeções, o

segundo para as eventuais sanções.” (RAMINA, 2003, p. 3). Ela explica que o

Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, e treze membros do Conselho de

Segurança fizeram oposição às alegações do governo norte-americano de que

o Iraque teria infringido as zonas de exclusão aérea ou mantinham armas com

grande potencial destrutivo.

53

Com tudo isso, Souza (2009) apoiava os críticos que concluíam que a

ONU não teria conseguido evitar o confronto entre os EUA e seus aliados

contra o Iraque. Para ele, a organização não esmoreceu frente à pressão dos

EUA, o que levou muitos Estados a expressar coletivamente sua visão

contrária à guerra e apontando o comportamento unilateral do governo norte-

americano. Por outro lado, a ONU acabou por exercer uma influência limitada

sobre os EUA. Na visão de Souza (2009) a guerra no Iraque demostra a

dominação militar do governo estadunidense, mas apresentou limitações da

hegemonia dos EUA, indicando a importância do gerenciamento compartilhado

das ameaças à ordem internacional.

Outra análise polêmica é de Ayerbe (2005), segundo o qual o

unilateralismo da política externa de George W. Bush não foi improvisado no

calor dos atentados de 11 de setembro. A política externa do então Presidente

já vinha definindo certo padrão para as ações na política externa dos EUA.

Desde a posse, redefine a posição do país frente a importantes tratados internacionais, sinalizando várias diferenças em relação à administração anterior, como as decisões contrárias à ratificação do protocolo de Kyoto, à criação do Tribunal Penal Internacional (TPI) e à proposta de revisão do Tratado Anti-mísseis Balísticos (TAB). Os atentados contribuem para consolidar no interior do establishment as posições favoráveis à entronização dos Estados Unidos como principais responsáveis pela vigilância e punição dos inimigos da ordem, já não como guardiões do “mundo livre”, mas como protetores das fronteiras que separam a “civilização” da “barbárie”, dotando a guerra declarada ao terrorismo de contornos bem amplos. (AYERBE, 2005, p. 343).

O ataque ao Afeganistão e a rápida vitória militar contribuíram para

fortalecer o unilateralismo da potência hegemônica. Segundo Ayerbe (2005),

devido a isso tais atos foram nomeados de “Doutrina Bush”, o então Presidente

norte-americano estava decidido sobre que caminhos seguir, tanto que sofreu

resistência dos aliados e forçou definições em relação às prioridades da

agenda internacional. Mas tal ação não ficou impune. Sua política teve

dificuldades para conquistar e manter o apoio de vários países na Guerra

contra o Iraque.

Conforme a pesquisa de Bluth (2004) apura, o Iraque desconfiava que

os EUA mantivessem as sanções ao país com o uso do reverse veto, mesmo já

54

sendo pressionado por outros países para que as sanções fossem levantadas,

no final dos anos 90. A partir de um determinado momento, o governo

iraquiano deixou de cooperar com a United Nations Special Commission

(UNSCOM) e, consequentemente, os inspetores das agências foram expulsos,

o que levou à realização da Operação Raposa do Deserto, sendo mantidas as

sanções. Mas as coisas mudaram com o 11 de setembro, dos EUA e o Reino

Unido, aliados, alegavam que os iraquianos teriam voltado a produzir armas de

destruição em massa e que poderiam repassar para a Al-Qaeda e poderiam

configurar uma ameaça regional. Em seu texto Bluth (2004) aponta o momento

em que os aliados contra o eixo-do-mal decidiram que Saddam Hussein não

deveria permanecer como chefe político iraquiano.

Bush in Crawford, Texas, on 6 April 2002, he was confronted with the fact that the United States had decided to resolve the Iraq issue by removing Saddam Hussein from power. The strategic choice for Britain now was whether to join the American effort or to let the Bush administration go it alone. At the root of the decision to support the United States was the fear of an international order in which the US, increasingly divorced from the rest of the world, unilaterally pursued its own agenda: an agenda, moreover, rooted in a neo-conservative stance described as ‘hegemonist realism’, which embodies a sceptical view of international regimes and the United Nations, and sees the enormous power of the United States, and the willingness to employ it, even over other countries’ objections, as the principal means of securing America’s interests. By contrast, the international order that Blair envisaged for the twenty first century was one that would rest on the foundation of international norms and principles, on the United Nations as the locus of legitimacy and international security, and on a united western world that would propagate these principles, with more and more states joining and working towards the gradual elimination of totalitarianism, terrorism and global poverty. The threat of international terrorism would be so much harder to tackle if the western world was divided. (BLUTH, 2004, p. 875).

A importância de Bluth (2004) e seu texto estão em trazer a visão de

Blair e da política britânica. Dentre os pontos, a ênfase da potencial ameaça

regional que seria o Iraque e de que o regime de Hussein era brutal. De forma

resumida, o autor pontua as declarações públicas de Tony Blair sobre o Estado

iraquiano. Dentre os temores apresentados, um deles seria que os iraquianos

terem programas de Armas de Destruição em Massa (ADM) clandestinos,

apesar de não haver relação comprovada entre o regime de Saddam e a Al-

Qaeda, havia o medo de que o Iraque possuísse armas biológicas e químicas e

que este pudesse disponibilizar aos terroristas. Saddam Hussein, apesar de

estar contido devido às sanções, demonstrava a inclinação para a agressão no

55

passado, sendo uma ameaça para a região. O escritor explica que havia receio

de que o país desenvolvesse mísseis balísticos de longa distância e armas

nucleares, já que tinha o conhecimento para tal. Por último, a coalizão

apontava o político iraquiano como uma ameaça iminente para o seu próprio

povo.

Como visto nesta seção, os EUA aproveitaram-se de sua posição de

potência hegemônica para implantar sua visão no pós Guerra-Fria, além disso,

sua luta contra o terrorismo levou os EUA a atacar o Iraque. Tal ato, apesar

das alegações de legítima defesa contra a possível aliança entre terroristas e

governo iraquiano, não foram aceitas pela maioria da comunidade

internacional.

No próximo ponto serão apresentadas as resoluções e ações difundidas

pelo Conselho de Segurança sobre o conflito tema desse trabalho. Nelas serão

definidos os temas mais recorrentes, como os principais atos do CSNU perante

o conflito em cada ano entre 2001 a 2006.

2.2 As resoluções sobre o Iraque

Neste momento da monografia serão elencadas as opiniões dos autores

estudados e os resultados por eles encontrados sobre as resoluções

envolvendo o conflito de 2003, o qual coloca de um lado o Iraque e no outro os

EUA e seus aliados. Também usarei os resultados da iniciação científica de

Pinheiro (2014), onde foi feito a identificação de padrões, estabelecendo temas

para as medidas adotadas nas resoluções.

Platiau e Vieira (2006) problematizam a resolução 1441. A base dessa

resolução era a resolução 687, a qual autorizava o uso da força contra o Iraque

caso produzisse material de destruição em massa e outros materiais bélicos.

Mesmo assim, não autorizava a intervenção automaticamente, exceto após a

confirmação de alguma violação das imposições feitas pelo Conselho, o que

não foi demonstrado. As inspeções da United Nations Monitoring, Verification

and Inspection Commission (UNMOVIC) e da Agência Internacional de Energia

Atômica (AIEA) no país não concluíram que houvesse armas de destruição em

56

massa no país. O resultado da intervenção atestou-se a veracidade dos

relatórios das inspeções. Os autores afirmam que se antes a intervenção já era

questionada, depois da resposta negativa sobre a existência de ADM’s no país,

foi mais ainda.

Ao não encontrar as armas, os Estados Unidos e os seus aliados, perderam a oportunidade de arregimentar suporte político considerável entre os demais membros da comunidade internacional; segundo, a resistência da população iraquiana à ocupação do seu território foi, indubitavelmente, um duro revés à legitimidade da intervenção. Com efeito, é, pelo menos no caso da justificativa da intervenção humanitária, um requisito essencial que os ‘libertadores’ sejam bem recebidos pelos ‘oprimidos’ [...]. (DELGADO, 2004, p. 209).

Como apresentado no primeiro capítulo, ao assinar como membro das

Nações Unidas, os Estados ficam vedados de utilizar ações de força de forma

unilateral, exceto nos casos em que o país tenha sofrido uma agressão ou

esteja prestes a ser alvo de uma ação que coloque a sua paz e segurança em

risco, assim como dos demais membros da organização. Desse modo, a

legítima defesa é possível, mas deve ser julgada e afirmada como tal. ”Os

Estados renunciaram ao uso unilateral da força em favor de um imenso

mecanismo de segurança coletiva, a Organização das Nações Unidas.”

(MACEDO, 2009, p. 7).

Diferente de outros autores apresentados anteriormente nesse trabalho,

Machado (2005) conclui que o sistema de segurança coletiva da ONU falhou

no caso aqui estudado. “Houve uma ruptura institucional na medida em que a

coalizão liderada pelos EUA foi à guerra sem uma autorização expressa do

Conselho de Segurança.” (Machado, 2005, p. 11). O mesmo autor traz a visão

sobre o principal veto player23 no caso iraquiano. É a França que articula um

possível veto sobre o projeto de resolução que pedia intervenção no Iraque,

alegando que as inspeções não tinham sido conclusivas e que o

desarmamento poderia ser feito com o reforço nas inspeções, sem a

necessidade de coerção militar no país. A intenção francesa era fortalecer a

multipolaridade, tentando equilibrar o poder dos EUA que era considera o único

hegemônico, a França pretendia ser reconhecida como concorrente para ser a

outra grande potência. Para isso, precisava bloquear o governo norte-

23

São os países capazes de vetar qualquer resolução, os cinco membros permanentes (P-5).

57

americano, diminuindo sua moral, aumentando a influência francesa, o CSNU

foi o espaço usado para que isso acontecesse. A França então se torna a

porta-voz dos opositores da guerra. A outra forma foi o uso do seu poder

ameaçando a entrada de dez países que queriam fazer parte do bloco europeu

e que apoiavam a ofensiva contra o Iraque.

A maioria dos governos envolvidos com a intervenção teve que justificar

a seus cidadãos o porquê de apoiarem a coalizão promovida pelos EUA.

Delgado (2004) alega que isso acontecia, pois as pessoas não entendiam o

porquê de um país distante e que parecia não ofertar perigo deveria ser alvo de

tantos esforços. Por isso, foi preciso criar justificativas para derrubar o ditador

Saddam Hussein, dentre elas o princípio de legítima defesa preventiva, pois os

EUA alegavam estar ameaçados por ADM’s dos iraquianos e estas poderiam

cair nas mãos de terroristas. As seguintes razões foram levantadas no texto de

Delgado:

1. A autorização implícita do CSNU com a resolução 1441,

amplamente usada pelo Reino Unido. Sendo a possibilidade

refutada pelos EUA, que assim como os outros países do P-5 não

entendiam que era legal, por isso, a tentativa de aprovar uma

resolução específica autorizando o ato.

2. Outra razão seria que a ação no Iraque serviria como intervenção

humanitária para promover melhor qualidade de vida para os

iraquianos e acabar com a opressão que o governo impunha.

3. Por último, a intervenção pró-democrática serviria para acabar

com o regime opressor e difundir a liberdade que viria com a

democracia.

Para Delgado (2004) entende que as justificativas serviram para que não

se cogitasse que a guerra aconteceu em busca do petróleo ou de reafirmação

da hegemonia do governo norte-americano. Ele entende que essas

justificativas teriam como alvo “[...] a) os Estados refractários; b) a opinião

pública nacional, especialmente a britânica; c) os próprios iraquianos e a

audiência árabe em geral; d) a opinião pública dos outros países ocidentais.”

58

(DELGADO, 2004, p. 225). Mas em sua visão, as razões alegadas pela

coalizão não teriam convencido a comunidade internacional.

Thales Castro (2007) destaca o fato de um projeto de resolução ter sido

apresentado por EUA, Reino Unido e Espanha ao CSNU, na qual seria

autorizada a intervenção no Iraque. Para não sofrer a derrota, o projeto foi

retirado três dias antes da invasão, dia 17.03.2003. Onze dias depois a S/RES

1.472 obteve unanimidade em reiniciar o programa humanitário “petróleo por

alimentos” (oil for food - OFF) 24, no qual, segundo Castro, 60% da população

do país teria se beneficiado enquanto esteve ativa.

Outra resolução importante para este pesquisador é a res. 1483 que pôs

fim a 13 anos de sanções contra o Iraque, possibilitando gradativa abertura de

trocas comerciais e, por consequência, levou ao fim do regime Baath em

Bagdá. Ao mesmo tempo forneceu o controle da economia, do comércio

exterior e do futuro político das forças anglo-americanas e deixou a ONU com o

papel limitado ao setor humanitário, a cargo do Department of Peacekeeping

Operations (DPKO). Grant (2003) explica que a resolução 1.500 de agosto

aprovou estabelecimento do governo transitório do Iraque e, inicialmente, por

12 meses a Missão de Assistência das Nações Unidas para o Iraque (Unami).

Posteriormente, Castro (2007) explica que o CSNU pediu para que o

Conselho de Governo Provisório no território iraquiano apresentasse um

calendário para redigir uma Constituição, por meio de uma Assembléia com

poderes constituintes originários e realizar eleições. Ao mesmo tempo,

autorizou-se a criação de uma força multinacional para participar da segurança

interna e institucional do Iraque, com vistas a promover também o diálogo e a

reconciliação nacional em uma sociedade marcada pela rivalidade étnica,

linguística e religiosa. Em novembro de 2005 foi aprovada, de forma unânime

no Conselho votou–se para a continuidade por mais um ano da Unami e no

24

“In SCR 706, adopted on 15 August 1991, the Council established an elaborate “oil-for-food” program allowing Iraq to export a quota of oil and to use the resulting export revenues to purchase humanitarian supplies, all under the controlling eye of the UN.9 In creating this OFF Program, the Council decided to control a sovereign state’s revenues and direct its expenditures – not only to the benefit of its own population, but also for payment of costs incurred by the UN in the destruction of Iraqi arms, of compensation, and of the Iraq-Kuwait boundary settlement process.” (MALONE; COCKAYNE, 2006, p. 3)

59

mesmo ano foi legitimado o papel central da ONU na reconstrução nacional

iraquiana, de promoção do diálogo inter-religioso e de consolidação das

instituições democráticas.

Outro fator que Castro (2005) ressalta é que nenhuma das resoluções

do Conselho constituiu um tribunal para julgar o regime de Saddam Hussein

(1979-2003), mesmo assim ele foi julgado e condenado pelo governo interino

iraquiano.

Na pesquisa de iniciação científica de Pinheiro (2014), as resoluções do

CSNU foram fonte de análise, estabelecendo como período a ser estudado as

resoluções entre 2001 a 2006, o ponto inicial foi o pós-11 de setembro, já que

alguns autores fazem desse acontecimento um marco teórico importante nas

relações internacionais. Além da parte teórica, foi usada a técnica de análise

documental, criada por Laurence Bardin, para analisar as vinte resoluções

encontradas no período estipulado.

Dentre os resultados apenas as resoluções de 2005 e 2006, quatro no

total, são nomeadas no site como Iraque. As outras resoluções são

referenciadas pelo site do CSNU como o conflito Iraque e Kuwait.

TABELA 1 – LISTA DE RESOLUÇÕES APROVADAS PELO CONSELHO DE

SEGURANÇA DA ONU (2001-2006)

Ano: Nº de Resoluções: Códigos das resoluções

2001 1 1382 (01)

2002 5 1409, 1441, 1443, 1447 e 1454 (02)

2003 7 1472, 1476, 1483, 1490, 1500, 1511 e 1518 (03)

2004 3 1538, 1546 e 1557 (04)

2005 2 1619 e 1637 (05)

2006 2 1700 e 1723 (06)

FONTE: Elaboração da própria autora, 2014.

Seguindo nessa linha, a pesquisa feita pela autora deste texto revelou

que em 2001, a única resolução pós-11 de setembro, na relação que pode ser

60

vista no quadro acima, teve como objetivo chamar atenção dos países

membros da ONU e do Iraque. As principais decisões foram tentar estabelecer

Goods Review List (GRL) 25 e os procedimentos que seriam adotados. E,

também, manter por mais um período as resoluções 986 (95) e a res. 1284 (99)

- exceto alguns parágrafos - por 180 dias e a resolução 1360 (01) por 150 dias.

Já no ano seguinte, as respostas para a observação de Pinheiro (2014)

apontaram que as decisões foram manter as mesmas resoluções citadas

anteriormente, renovadas pelo mesmo período de tempo. Esse fato aconteceu

duas vezes naquele ano. A resolução 1409 (2002) até 4/12/02 também foi

renovada. As principais decisões dessa Resolução estão na Tabela 2(cf.

Apêndice 1).

A GRL (S/2002/515) foi colocada em pauta, sendo necessários ajustes

no conteúdo e nos procedimentos de implementação. O Secretário-Geral foi

convocado para apresentar relatórios ao Conselho para que houvesse uma

prestação de contas sobre a equidade na distribuição de suplementos

essenciais para as necessidades dos iraquianos. Ele também deveria consultar

as partes interessadas, avaliando a implementação da GRL. Conforme a

pesquisa realizada para esse trabalho, a GRL foi adotada para ser base para o

Programa Humanitário no Iraque, como apresentada na resolução 986(95).

Durante a Guerra do Golfo, e até 2002, o Iraque sofria restrições que foram

sanadas com a autorização da venda ou fornecimento de qualquer produto e

commodities, exceto militares. As contas que estavam bloqueadas foram

liberadas para serem usadas, podendo também financiar venda ou fornecer

produtos e commodities autorizados. Foi pedido também ao Secretário-Geral e

Office of the Iraq Programme (OIP) que definisse as taxas de consumo e níveis

de utilização para substâncias químicas, biológicas e de medicamentos e o

período apropriado do ano para o uso, tentando evitar que fosse utilizado para

fins militares.

A tal resolução 1441 (02), reconhece que o Iraque vinha violando as

resoluções anteriormente impostas. Sendo assim, o CSNU pediu que o Iraque

25

Lista de itens que não podem ser usados ou fornecidos pelo país a pedido do Conselho.

61

fornecesse acesso a todos os lugares e pessoas aos inspetores da UNMOVIC

(Comissão das Nações Unidas de Vigilância, Verificação e Inspeção) e da

AIEA para que realizassem as investigações que julgassem necessárias. Além

disso, Pinheiro (2014) descobriu em sua pesquisa, que o Conselho autorizou

essas agências a destruírem, removerem ou desativarem os artigos proibidos.

O CSNU pediu declarações de todos os programas de desenvolvimento de

armas químicas, biológicas e nucleares (localização, sistema de distribuição,

entre outras informações). Ameaçando o Iraque caso deixasse de cumprir uma

das medidas solicitadas, avisando que sofreriam sérias consequências.

Durante o começo da Guerra do Iraque, no ano de 2003, as seguintes

decisões foram tomadas pelo CSNU: a situação do Iraque foi considerada

ameaça à paz e segurança e, com isso, foi criada a Autoridade Provisória da

Coalizão (Autoridade), como visto em Grant (2003), tendo responsabilidades e

obrigações específicas por meio das quais se espera que o país tenha um

governo reconhecido internacionalmente e o trabalho de estabilizar e deixar o

país seguro. Esse órgão deveria informar ao Conselho o progresso feito no

país, determinando que o conselho administrativo e os ministros fossem as

principais “figuras” na administração interina do país. Pinheiro (2014) também

descobriu que todas as proibições relacionadas ao comércio deixariam de ser

aplicadas, exceto as proibições relativas à venda ou fornecimento de armas e

materiais relacionados; e a Criação do Fundo de Desenvolvimento do Iraque

deveria ser feita pelo Banco Central do Iraque.

Em 2003 também foi pedido que o Conselho administrativo fornecesse

ao Conselho, junto à Autoridade e ao representante do Secretário-Geral um

cronograma e um programa para realização da Constituição e de eleições

democráticas. Foi criada a UNAMI (Missão de Assistência da ONU para o

Iraque) de para ajudar o Secretário-Geral.

A pesquisa para este trabalho revelou que os conselheiros determinaram

em 2003, para a segurança e a estabilidade do país, a criação da Força

Multinacional para tomar todas as medidas necessárias, programar eleições e

a constituição e etc. E os Estados membros deveriam contribuir com

assistência e força militar. O CSNU também reiterou a importância de

62

estabelecer no Iraque uma polícia eficaz e forças de segurança

(lei/ordem/segurança) para combater o terrorismo. Requerendo, então, aos

Estados membros e às organizações internacionais e regionais para contribuir

para treinamento e para equipar a polícia e forças de segurança. Foi solicitado

também aos Estados membros, que impedissem o trânsito do Iraque (armas e

financiamento). Foi tido como prioridade, também, estabelecer a participação

do Conselho Internacional de Aconselhamento e Monitoramento (IAMB).

As pesquisas também revelaram que o CSNU tomou como medida o fim

da zona de desmilitarização entre Iraque e Kuwait até o fim do mandato da

Missão de Observação das Nações Unidas no Iraque-Kuwait (UNIKOM), sendo

que essa foi prorrogada até 6/10/03. Foi estabelecido, também naquele ano,

um Comitê do Conselho de Segurança.

Nas análises feitas para este texto descobriu-se que a resolução 1483

(2003), estendeu os arranjos estabelecidos para depósito no Fundo de

Desenvolvimento do Iraque sobre a venda de petróleo. E que o Governo

iraquiano poderia rever as cláusulas dos depósitos do Fundo de

Desenvolvimento do Iraque antes do fim de 2006.

No ano seguinte (2004) a UNAMI teve o mandato renovado, como

também em 2005. E o Conselho também expressou o desejo de uma

investigação sobre o governo do Iraque no período do Saddam Hussein, sobre

suborno e etc.

Em 2005, pode-se observar nas resoluções, que o CSNU concordou

com a formação de um Governo provisório, aprovando um calendário para

eleições e elaboração de uma Constituição. Sendo aprovado, também, o fim

das atividades da Autoridade. O pedido do primeiro ministro, a Força

Multinacional tem sua missão renovada, como foi levantado na pesquisa para

este texto.

As decisões mais importantes de 2006 foram: pedir ao EUA que

continuassem a produzir relatório para o Conselho sobre a Força Multinacional.

E o pedido ao S-G para que continuasse a atualizar o Conselho sobre o Pacto

63

Internacional ao Iraque (pedido pelo Governo iraquiano em acordo com o

Secretário-Geral). A Tabela 2, disponível no Apêndice, sintetiza os conteúdos

das resoluções analisadas pela autora deste texto, separados por temas.

O Apêndice 1 deste trabalho contém a Tabela 2 na qual são sintetizados

os conteúdos das resoluções analisadas, separados por temas. (ver Tabela 2,

Apêndice 1).

Ao demonstrar as decisões tomadas pelo Conselho de Segurança temos

a certeza do que os autores Lopes e Casarões (2009) e José Manuel Pina

Delgado (2004) estavam corretos ao sustentar que o Conselho de Segurança

da ONU não criou medidas que apoiassem a Guerra no Iraque.

A questão levantada por Lopes (2007) de que a ONU sofre com

“problemas” para impor sua autoridade, faz sentido quando observamos que

essa organização não tem exército, como descrito no capítulo I, e, por isso,

precisou pedir aos Estados membros que fizessem parte da Força

Multinacional para ajudar o Iraque. Mas, por outro lado, no caso do Iraque, o

Conselho de Segurança aplicou medidas envolvendo questões econômicas,

como impedimento ao negociar certos produtos e a impossibilidade de

comprar, vender, comercializar de qualquer maneira itens relacionados a

equipamentos militares. Holliday (2012) comentou a respeito das sanções

econômicas que o Iraque sofreu e a pesquisa reiterou.

Quando D. Lopes e G. Casarões (2009) afirmam que os EUA pedem

ajuda com o processo de nation-building, percebe-se que o Conselho age

pedindo eleições, uma nova constituição para o país e atua nas questões

humanitárias. Foi para isso, também, que as missões da UNIKOM e UNAMI

mantiveram-se por tanto tempo em solo iraquiano.

Rubens Ricupero (2003) afirmou em que os EUA tentavam fazer com

que o Afeganistão e o Iraque se tornassem seus espelhos. Em algumas

resoluções do CSNU aparece a ideia de que o Iraque precisa ter eleições

democráticas e diretas, para que tenha um país federal, pluralista e unificado,

ideais e ideias declaradamente ocidentais.

64

Nas resoluções aqui estudadas, as ações mais importantes estão

relacionadas à reconstrução da estrutura administrativa, política e jurídica do

país ou em bloquear o acesso a produtores militares. Pode-se afirmar que o

estabelecimento do Governo transitório, a construção de um calendário para

eleições, a permanência da Força Multinacional no território ocupado e

relacionadas as missões humanitárias da UNAMI e UNIKOM. Também foi

relatado que sanções econômicas foram adotadas para “punir” os atos

terroristas e do antigo governo iraquiano, como também a restrição de produtos

militares, que não poderiam ser comercializados.

Na última seção desse trabalho serão apresentados os impactos das

resoluções do CSNU e da ocupação dos EUA, os possíveis problemas e

melhoras para o país em diversos aspectos. E as implicações do processo de

nation-building no Iraque.

2.3 As consequências da Guerra do Iraque, dentro do território e

internacionalmente

Os atos cometidos pelos EUA abriram uma grave crise no Conselho de

Segurança e também no seu relacionamento com a Europa, ocasionando

problemas com os seus aliados. Parte dos problemas estava na falta de

convicção do porque da ação. Inicialmente, o governo Bush afirmou que

Saddam Hussein tinha ligações com a Al-Qaeda e que, clandestinamente,

desenvolviam armas de destruição em massa. Mas tais afirmações foram

negadas e a guerra contra o Iraque foi justificada para promover a democracia

no Oriente Médio, o que causou mais problemas para o governo

estadunidense.

No texto de Dawisson B. Lopes e Guilherme S. P. e Casarões (2009), os

autores apontam o fato da aliança invasora do Iraque, no qual EUA e o Reino

Unido são os líderes, convocar a ONU para reconstruir o Iraque. As razões

apontadas por eles seriam o despreparo e a falta de autorização política do

CSNU para esta tarefa. Foi, então, que as agências especializadas da ONU

mostraram eficiência: o Fundo das Nações Unidas para as Crianças (UNICEF),

o Programa Alimentar Mundial (WFP) e o Programa das Nações Unidas para o

65

Desenvolvimento (PNUD). O processo de nation-building no Iraque por

consequência da guerra promovida pelos EUA tem como função a

reconstrução de um país e, portanto, de intervenção para que se restabeleçam

as infraestruturas básicas para a partir de operações multidimensionais de paz

se reinstalem as tarefas civis como segurança do território, construção dos

aparatos militares e ajuda humanitária. Outra função é o auxílio administrativo

para construção de ministérios do Estado, provocando uma transição para a

democracia e que deveria levar ao crescimento econômico do país. Aureo de

Toledo Gomes (2009) entende que todas essas medidas têm como fim a

construção de instituições democráticas, o desenvolvimento econômico para a

estabilização de um país, mas que elas acabam, muitas vezes, deixando de

lado a dinâmica dos países. Segundo ele esse ato seria justificado para os

propósitos de estabelecimento da paz.

Oren Barak (2007) afirma que, antes da ocupação em 2003, o Iraque era

um Estado em funcionamento, embora dominado por um setor social e

governado por um líder que cometeu crimes contra o seu povo. Como dito

anteriormente, foi preciso, devido aos danos estruturais, políticos e

humanitários, reconstruí-los com as missões de nation-building. Contudo, era

preciso uma autoridade eficaz e legítima, ou seja, aceita pelas suas principais

comunidades. O problema segundo Barak (2007) é que faltava alguém para

intermediar as comunidades sunita, xiita e os curdos, algo que acontecia

quando Saddam estava no poder. Em sua análise, o autor afirma que os

partidos políticos naquele momento no país, incluindo aqueles proibidos antes

de 2003, não conseguiram apoio maciço da população, apenas uma fração deu

suporte, pois faltava um nome para unir todos. Na confusão que o Iraque se

tornou no pós 2003, o pesquisador ressalta que a confiança na segurança

dividiu-se, já não era mais centrada no governo iraquiano, pois houve o

desmantelamento do setor de segurança e do exército iraquiano com a queda

de Hussein. No campo a segurança ficou a cargo dos clãs ou tribos; nas

cidades, e especialmente em Bagdá, as milícias comunais faziam o serviço. Os

únicos atores influentes com o fim do governo de Saddam foram os líderes

religiosos, que operavam fora do sistema controlado antes de 2003 e que

conseguiram permanecer. Entre as possíveis razões da dissolução do exército

66

iraquiano, Barak (2007) aponta o fato de que eles poderiam se opor aos EUA,

devido à ‘construção da nação’ promovida pelos EUA e as Nações Unidas. Na

visão do governo norte-americano, as tropas de Saddam Hussein se

mantiveram leais ao ex-chefe de Estado, portanto, o ‘caráter’ do exército seria

duvidoso. Por isso, o exército iraquiano teria sido fragmentado logo após a

invasão. Foi sugerido, também, que tal ato foi praticado para agraciar o pedido

de Xiitas e Curdos que foram oprimidos pelo exército e, além disso, sub-

representados, no período anterior ao conflito de 2003. Por isso, teriam exigido

a dissolução total, em troca teriam apoiado o projeto da ‘construção da nação’,

conforme foi discutido por Lima (2012).

Devido à predominância da linha protagonizada por Donald Rumsfeld e

pelo Vice‑Presidente Dick Cheney, os EUA defendeu a desbaathização do

Iraque. Seguindo o modelo de desnazificação na Alemanha no pós 2ª Guerra

Mundial.

[...] o desmembramento das forças de segurança revelou‑se

catastrófico. Culpados por servirem Saddam – mesmo que não lhes restasse outra hipótese –, aqueles que garantiam a ordem pública passaram a estar no desemprego de um momento para o outro. Com

um crescente grau de insubordinação, tornou‑se praticamente

galopante o descontrolo da situação em Bagdade, sob domínio

norte‑americano, ao contrário, por exemplo, de Bassorá, onde os

britânicos iam garantindo uma situação bem mais estável. Terceiro, a descoberta do escândalo de Abu Ghraib. Se a confiança iraquiana e

internacional na estratégia americana do pós‑guerra já não era grande,

pior ficou quando foram publicadas imagens na imprensa sobre abusos e maus tratos a prisioneiros iraquianos na prisão de Abu Ghraib, às

mãos de tropas norte‑americanas. (LIMA, 2012, p. 22).

Além dos problemas no país, Vianna (2011) aponta que a intenção com

a intervenção no Iraque era alterar o equilíbrio estratégico no Oriente Médio.

Vianna argumenta que os EUA tentou moldar a região como ensaio para um

novo ordenamento internacional. Dentre as justificativas dos EUA para a

invasão estavam: acabar com uma ditadura que poderia ameaçar a paz

mundial, por ser detentor de armas de destruição em massa e o suposto apoio

ao terrorismo internacional. A tentativa de instaurar a democracia no Iraque

revelava o ideal de reforma democrática em outros países árabes, dessa forma

alterando o status quo da região. E, por último, confirmar os Estados Unidos

como única superpotência mundial, passível de desempenhar tal papel.

67

Macedo (2009) explica que os EUA tiveram que permanecer em território

iraquiano, num primeiro momento, devido à queda do governo de Hussein, o

que desestabilizou o país, a consequência disso foi a violência perdurar nos

anos que seguiram, principalmente com atentados terroristas. Tal fato justificou

a transição para uma democracia, como modo para colher êxito na proteção

humanitária. Essa imposição é tratada como “ingerência humanitária (que se

pretende legal) com uma ingerência na escolha da forma de governo.”

(MACEDO, 2009, p. 26).

Dentre as questões que Lima trabalha no seu texto de 2012 estão os

problemas enfrentados no final de 2006 no Iraque. O país estava quase perto

da guerra civil, milhares de iraquianos tinham abandonado as suas casas e

Bagdá era palco de lutas, a violência entre milícias e facções e, também, contra

as forças das operações. Para piorar, os rebeldes tinham apoio exterior. O

governo Bush esperava desenvolver a economia, em especial, a criação de

emprego. O Presidente estadunidense então altera a estrutura de comando

responsável no país, provendo alterações metodológicas e estratégicas, o que

causa certa melhora na situação interna no Iraque entre 2007 e 2008. As ações

realizadas foram aumentar o número de barreiras e checkpoints construídos

para evitar que os terroristas chegassem perto de zonas civis populosas em

horários de movimento. No mesmo período, Lima 2012 explica que o governo

dos EUA e do Iraque assinaram um acordo bilateral, onde estabeleciam o ano

de 2011 como prazo final para a retirada de todas as tropas americanas. O

acordo Strategic Framework Agreement for a Relationship of Friendship and

Cooperation, assinado no final de 2006, facilitou a relação entre os governos,

garantindo ali a presença norte-americana, importante à estabilidade interna e

a ajuda no treino das forças de segurança.

No texto de Lima (2012) acompanha quando Obama assume a

presidência dos EUA, explicando que ele resolveu focar sua atenção na Guerra

do Afeganistão, providenciando mais tropas para essa região. E que teve

cooperação com a OTAN, Rússia e Paquistão neste conflito. Já para o Iraque,

ele agirá reduzindo o número de soldados no território e dando fim às

operações de combate.

68

A sua disposição inicial é cumprir a promessa de terminar a presença militar no Iraque e abordar o Médio Oriente com uma iniciativa diplomática forte e presente. Era preciso, na sua percepção, inverter a má imagem dos Estados Unidos na região e reforçar a liderança no sistema. (LIMA, 2012, p. 28).

Daquele momento em diante, segundo a pesquisa de Lima, passasse a

ter certa estabilidade no país, portanto, o foco passou para o treinamento das

forças de segurança iraquianas focando sua capacidade para proteger os

cidadãos, em forma de parceria entre Iraque e EUA. “Iraque tinha deixado de

ser um Estado falhado, mas ainda era um Estado frágil.” (LIMA, 2012, p. 30).

Entre 2009 e 2010 o Iraque, enfim se estabilizou.

A partir desse momento e até ao final de 2011, a missão

norte‑americana ficaria limitada a treino e aconselhamento às forças

de segurança iraquianas quer nas operações de contraterrorismo, quer na proteção quotidiana às populações. Para o Presidente americano, esta guerra durava há demasiado tempo, tinha consumido demasiados recursos, desviado muitos outros da prioridade afegã, e estava na hora

de serem os iraquianos, com o auxílio do aliado norte‑americano, a

«construírem a sua democracia». (LIMA, 2012, p. 31).

No último semestre de 2010, segundo Lima (2012), as sanções que o

Conselho impunha aos iraquianos sobre os programas de desenvolvimento de

armas biológicas e químicas foram levantadas. Chegou ao fim, também, o

programa OFF em 2011e restituiu-se o controle da soberania do país sobre os

recursos energéticos naquele ano. Apesar de o governo iraquiano adquirir

soberania em vários campos, como da administração pública, da política,

judicial e na segurança, os ataques terroristas ainda aconteciam. O terrorismo

agora era voltado para população civil iraquiana, principalmente xiitas, trazendo

mais problemas entre essa comunidade e as outras. Outros alvos eram

relacionados a símbolos do Estado, como polícia ou edifícios governamentais,

portanto, o tema ainda inspirava cuidados, como relata Lima em seu texto.

Fawcett (2013) aponta três pontos que conectam a Guerra de 2003 com

a Primavera Árabe. O primeiro é a prevalência do autoritarismo nos países

daquela região. No Iraque foi imposta pela intervenção a mudança no regime,

causando críticas da comunidade internacional. Porém, nos países árabes,

como o Egito, a mudança no regime era pedida pela população. O segundo

ponto de conexão são as mudanças no equilíbrio regional de poder resultante

do conflito no Iraque, transformando-o então de Estado forte a fraco na região,

69

algo que avançou e cristalizou com a Primavera Árabe, destacando a Turquia

como futura liderança regional, junto com Estados do Golfo árabe (a ordem é

estabelecida por: riqueza, tipo de regime e tamanho da população - o que

poderia protegê-los contra levantes). O último ponto de Fawcett é que ambos

os acontecimentos sofreram com a controvérsia, pois de algum modo sofreram

intervenções de outros Estados. O primeiro devido aos motivos e os resultados

da guerra de 2003, o que dividiu o P-5 sobre aquela ação e causando impacto

nas relações internacionais e na formulação de políticas externas. No segundo

caso, o problema foi a intervenção posterior de países estrangeiros como

aconteceu na Síria e no Egito, o que teria exposto a extensão de uma

multipolaridade emergente no sistema internacional, fato este que segundo o

texto, teria acontecido, graças à guerra do Iraque.

Entre os principais fatos listados neste trabalho, destaco a crise entre o

governo norte-americano e CSNU causada pela falta de apoio na invasão ao

Iraque, e também os impasses entre EUA e Europa, causado pelo mesmo

acontecimento. Também é preciso grifar que foi a ONU que conduziu o

processo de nation-building e que seus programas, como UNICEF, WFP e

PNUD agiram naquele local para melhorar a situação da população. Neste

processo, problemas com as comunidades locais sunita, xiita e curda, foram

obstáculos para a reestruturação do Iraque, assim como o desmantelamento

do exército iraquiano, o que forçou a ONU permanecer por mais tempo no

território. Outro ponto importante foi o estabelecimento da democracia como

regime político, forçando a mudança de regime no país. É bom lembrar que, ao

mudar o Presidente dos EUA, as estratégias em território iraquiano sofreram

alteração, inclusive a importância dada à ocupação, ela passa a ter menor

importância com Barack Obama do que com Bush.

O capítulo II teve a preocupação de tentar estabelecer conexões entre

as ações do CSNU no Iraque e as consequências da invasão do governo norte-

americano ao país. Pode-se perceber que os dois países tem durante todos

esses anos, desde antes a Guerra do Golfo, estabelecendo relações bilaterais

que mudaram com o tempo. Observou-se a importância das ações do governo

francês no caso, assumindo a frente como oposição na ONU.

70

CONCLUSÃO

Este trabalho se propôs a examinar o Conselho de Segurança da ONU

no caso específico do Iraque, para descobrir como a instituição acompanhou a

Guerra que começou no ano de 2003 naquele país. Para tanto foi usado a

bibliografia relacionada com o tema, juntamente com a análise das resoluções,

foi estabelecido com elas os temas recorrentes e os fatos mais importantes em

cada ano entre 2001 e 2006. Esperava-se que a influência do CSNU fosse

menor e mais subordinada as vontades do governo norte-americano, algo que

surpreendentemente não é tão enfático.

Primeiro usei a bibliografia sobre a ONU e o CSNU para poder explicar

quais os possíveis papeis por eles desempenhado no caso, como a partir dos

seus mecanismos houve ou não influência direta dos EUA dentro da

organização. Outro ponto importante foi mostrar o cenário internacional antes

da Guerra do Iraque, inclusive voltando a Guerra do Golfo, mas principalmente

o pós-11 de setembro. A análise, como já foi explicado, também levou em

conta as resoluções do CSNU e por último observou as sequelas do conflito.

Em linhas gerais, percebe-se que a organização tenta-se legitimar como

instituição internacional ao manter mais de 190 membros filiados e atuação em

diversas áreas. Criada com objetivo de promover a paz, trazer estabilidade ao

setor de segurança internacional e evitar mais uma guerra mundial, embora

tenha conseguido até agora, evitar a 3ª Guerra Mundial, não obteve sucesso

em evitar conflitos interestatais de menor porte.

As Nações Unidas detêm poder, mas os seus mecanismos burocrático,

jurídico e sua estrutura decisória, centrado no CSNU, travam suas ações,

mantendo-as subordinadas: a China, EUA, França, Reino Unido e Rússia. Seja

com o uso do veto, travando uma resolução ou partes dela, seja com o uso do

reverse veto, quando decidem não apoiar o levantamento de sanções.

A maioria dos autores estudados questiona as decisões

aprovadas sobre o Iraque no seio da ONU. Como demonstrado, o CSNU ficou

refém de seus próprios dispositivos legais e trâmites. Este não pode reprimir de

71

forma mais firme os atos contra o Iraque, pois os EUA fazem parte do P-5, o

que faz dele detentor do veto. Se alguma sanção contra os seus atos ou de

seus aliados no Iraque fosse levada como projeto para ser discutida no CSNU,

ele teria como travar tal resolução, vetando-a. Entretanto, observou-se a ação

firme da China, da França e da Rússia ao impedirem que fosse autorizada uma

interferência com selo da ONU. O que levou as ações dos EUA a serem

contestadas desde o início, revelando uma política externa unilateral, agressiva

e conservadora do governo Bush. Provando também que o Conselho não

aprovou a decisão de intervenção militar dos EUA, já que não houve consenso

entre os detentores do direito da fórmula de Yalta, mas houve a sinalização de

preocupação do CSNU para coibir atentados terroristas que poderiam partir do

Iraque.

A guerra do Iraque tem como principais causas, as ações relacionadas a

Guerra Iraque/Kuwait. No final de 1998, já aconteciam ações em território

iraquiano comandado pelo governo norte-americano que não obtiveram

consenso e nem autorização do CSNU, por exemplo, a Operação Raposa do

Deserto. Desde 1999, os Estados Unidos contestavam as análises dos

inspetores da UNSCOM, pois estes afirmavam que o Iraque tinha destruído as

suas armas de destruição em massa e cessado os programas de

desenvolvimento nesta área. Não convencidos, os EUA alegavam que o Iraque

continuava trabalhando com armas de alto potencial destrutivo. O apogeu

dessa desconfiança resultou nos discursos proferidos por George W. Bush e

Tony Blair no ano 2001, no qual classificam o Iraque como parte do eixo do mal

e um dos alvos na Guerra ao Terror.

Outra relação entre as duas guerras envolvendo o Iraque está nas

sanções relacionadas a proibição da produção e uso de armas de destruição

em massa que serão usadas para colocar desconfiança sobre o Iraque. O

reverse veto foi usado nessas resoluções, por EUA e do Reino Unido, o que

levou as sanções serem usadas como base para acusar o Iraque de não

obedecê-las.

A outra causa para a Guerra no Iraque é a Guerra contra o terror

imposta pelo governo Bush. Ao tornar o combate contra o terrorismo prioridade

72

nas agendas governamentais os EUA recebeu a cooperação de vários países

na luta antiterrorista. Naquele momento o terrorismo configurou-se como o

principal problema para muitos países, dentre eles, os EUA, o Reino Unido, a

Espanha, a Itália etc. O National Security Strategy Document visava

estabelecer uma ordem internacional favorável aos valores e interesses do

governo norte-americano. Antes mesmo do 11 de setembro, eles já agiam de

forma diferente no departamento de política internacional, tentando evitar a

ascensão de uma potência hegemônica regional, especialmente no Oriente

Médio, ou global que pudesse desafiar a ordem internacional e sua potência.

Desse modo eles definiam quem eram as ameaças tanto para eles, como para

a comunidade internacional.

Como observado no trabalho, alguns autores estabeleceram a invasão

no Iraque uma forma de afirmação da potência militar dos EUA, enquanto a

ideia de ser resposta aos atentados contra ao World Trade Center ser apenas

um pretexto para a invasão naquele país.

No caso iraquiano, o EUA alegou que aquele Estado poderia fornecer

armas de destruição em massa ou de tecnologia nuclear para Al-Qaeda e/ou

outros terroristas, assim como outros países que formavam o “Eixo-do-mal”:

Coreia do Norte, Irã Síria, Líbia e Iraque.

Ao tentarem aprovar uma resolução que determinasse rigorosas

inspeções de armas no Iraque e a autorizassem para o uso da força caso o

governo iraquiano não cooperasse tentaram forçar ‘certo' consenso

internacional’ para utilizar a força militar contra o Iraque.

A duas opiniões possíveis para as ações tomadas pela ONU, em uma

delas a organização é vista como forte, por não ter esmorecido frente à

pressão dos EUA, o que levou muitos Estados a expressar coletivamente sua

visão contrária à guerra e apontar o comportamento dos EUA como unilateral.

No outro lado, a visão de que as Nações Unidas deve pouca influência no

caso, o que levou as decisões do governo norte-americano acontecerem do

modo que acham melhor. Para outros especialistas o resultado pode ser

creditado como falha no sistema de segurança coletiva da ONU, a invasão

73

ocorreu sem maiores problemas, sem autorização expressa do Conselho de

Segurança. Até por que não houve consenso em julgar o caso como legítima

defesa, pois os conselheiros entenderam que não havia quebra nas ações

iraquianas em relação as sanções que perduravam sob aquele país. Daí em

diante lançou-se vários motivos da ação, contudo, nenhum dos pretextos foi

amplamente aceito. Dentre as alegações estava que a res. 1441

subjetivamente autorizava a ação, seria uma intervenção humanitária,

deveriam acabar com o regime ditatorial e serviria para promover a democracia

na região, trazendo a liberdade naquele país.

O maior responsável da falta de apoio a Guerra do Iraque talvez seja o

entrave no Conselho, que teve como articulador a França, ameaçando usar o

veto sobre uma possível resolução de intervenção do Iraque, o que seria uma

derrota inaceitável para a aliança anglo-americana, tornando-se naquele

momento o porta-voz dos opositores da guerra. Dentre as motivações estava o

seu interesse pessoal, pois tentava se elevar como potência hegemônica junto

EUA. Já o motivo alegado pelos governos francês, russo e chinês foram os

relatórios dos inspetores da UNMOVIC e AIEA, que não acharam indícios de

irregularidades no armamento do governo iraquiano. Vale ressaltar o esforço

do governo iraquiano para provar que não possuía ADM’s, aceitando as

inspeções das agências escolhidas pelo Conselho. Só que o bloqueio a uma

nova resolução autorizando a intervenção no Iraque não funcionou como

obstáculo o governo Bush, que agiu do mesmo jeito.

Neste projeto analisei as resoluções entre 2001 e 2006, o que notei foi o

fato de já em 2001 haver uma resolução focando na questão das ADM’s no

Iraque. Outro ponto importante foi saber do projeto de resolução que nem foi

votado, na qual determinava a invasão do Iraque pelo CSNU. Devesse

enfatizar que partir de 2003, com o começo da guerra, foi caracterizado que a

situação no Iraque constituía como ameaça à paz e segurança e, com isso, foi

criada a Autoridade Provisória da Coalizão, para estabilizar o país junto com o

Fundo de Desenvolvimento do Iraque. Houve a volta do programa humanitário

OFF, com a intenção de ajudar nesse processo a população mais pobre, a

missão da UNAMI também serviu para tal. Outro processo direcionado pelo

74

CSNU foi o estabelecimento de eleições, uma nova constituição para o país e a

entrega da segurança para a Força Multinacional. Podendo ser observado

pelos fatos relatados, que o processo de nation-building foi comandado pelas

Nações Unidas.

Dentre os maiores problemas em território iraquiano os atentados

terroristas são os destaques, tanto contra as comunidades locais, como contra

as forças estrangeiras. Estes atos são consequências das ações de 2003,

devido ao desmantelamento do exército iraquiano, o fim do partido Baath e

agravamento dos problemas entre as comunidades xiita, curda e sunita. Os

atentados terroristas a principio eram voltados contra as forças invasoras, com

o tempo passou a ser as comunidades iraquianas (população civil) e

monumentos do Estado.

Outro problema enfrentado pelo Iraque foi sentido na sua potência como

importante ator regional, que perde espaço para outros países e deixa de ser

protagonista.

Como processo do nation-building promoveu-se a capacidade

relacionada à segurança do país, as instituições políticas, jurídicas e

administrativas no molde ocidental, como a promoção da democracia.

Na relação entre EUA e Iraque destaca-se a falta de interesse do

governo Obama em permanecer no país, ao contrário do governo do seu

antecessor, diminuindo as tropas em serviço no Iraque.

O que foi feito é uma tentativa de estudar a ONU, o CSNU e a Guerra do

Iraque entrelaçando estes pontos para melhor entendimento tanto do conflito,

como da influência dessa organização. Por ser um conteúdo extenso e com

vários pontos de inserção, o tema aqui estudado pode ser alvo de novos

estudos nas mais diferentes áreas e de diferentes formas, inclusive,

aprimorado e aprofundado a análise das resoluções do Conselho de

Segurança das Nações Unidas.

75

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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APÊNDICE 1 – SÍNTESE DOS CONTEÚDOS DAS RESOLUÇÕES

ANALISADAS NA PESQUISA.

TABELA 2 – CONTEÚDO DAS RESOLUÇÕES ANALISADAS NA PESQUISA

Ações relacionadas a questões de intervenção humanitária

Todos Estados devem continuar a garantir que os suprimentos humanitários

urgentes cheguem rápido a população do Iraque

1382(2001)

O mandato da UNIKOM renovado até 6/10/03 1490(2003)26

Decide que o representante S-G e a UNAMI devem reforçar seus papéis na

ajuda humanitária, na promoção da reconstrução da economia e para o

restabelecimento das instituições nacionais e locais para se ter um governo

representativo. 1511 (2003)

Convoca a comunidade internacional e as organizações internacionais

humanitárias para fornecer assistência humanitária 1472 (2003)

Todas as aplicações, fora a do programa Oil-for-food, devem ser revisadas

pelo Comitê, como distribuição e utilização de suprimentos/equipamentos

humanitários. 1472 (2003)

Estabelecimento da UNAMI (ajuda do S-G) – ou lembrança

1500(2003)2728

1723 (2006)

Extensão do mandato UNAMI 12 meses

1557(2004)29

1619 (2005)30

Possível revisão do mandato da UNAMI se requisitado pelo Governo do

Iraque em 12 meses ou, antes.

1557(2004)31

1619(2005)32

26

Secretary-General Report (S/2003/656).

27 Menciona a Resolução 1483 (2003).

28 Secretary-General Report (S/2003/715).

29 Secretary-General Report (S/2004/625).

30 Secretary-General Report (S/2005/509).

31 Secretary-General Report (S/2004/625).

32 Secretary-General Report (S/2005/509).

79

Ações relacionadas a resoluções anteriores

Reafirma compromisso da resolução 1284 (99) 1382 (2001)

O Iraque deve cooperar na implementação das resoluções 1382 (2001)

Manteve as resoluções 986 (95), 1360 (01) =150 dias e 1284 (99)

exceto alguns parágrafos por 180 dias.

1382 (2001)

1409 (2002)

1447 (2002)

Extensão as decisões da resolução 1408 (2002) até 4/12/02 1443(2002)

Decide reconhecer que Iraque vem violando as resoluções 687 (1991)

e na cooperação com inspetores da ONU e AIEA

1441 (2002)

Decide dar mais uma oportunidade para o Iraque cumprir com as

obrigações de desarmamento na resolução 687 (91) e verificar o

processo proposto nessa. Decide criar regime de inspeção reforçada.

1441 (2002)

Permanecer em vigor até 3/6/2003 parágrafo 4 1472(2003) 1476(2003)

Reconhece as tarefas e disposições previstas na implementação da

resolução 1546 em cooperação com o governo

1637 (2005)

Ações relacionadas a questões de segurança

A GRL e os procedimentos da resolução 1382(01) tem o prazo de

05/2002 para ser adotada 1382 (2001)

Reafirma obrigação todos Estados para prevenir a venda de

equipamentos militares ao Iraque

1382 (2001)

1546 (2004)

Iraque deve fornecer declarações sobre os programas de

desenvolvimento de armas químicas, biológicas e nucleares, mísseis

balísticos, aeronaves tripuladas. Deve revelar a localização dessas

armas, sistemas de distribuição, locais de pesquisas, instalações de

desenvolvimento e etc. 1441 (2002)

Omissões e declarações falsas sobre armas, entre outros e falha ao

cumprir e cooperar com essa resolução, será considerado como

violação. O Conselho de Segurança deve ser comunicado sobre tal. 1441 (2002)

Iraque deve fornecer acesso imediato e irrestrito a todos os lugares e

a todas as pessoas que a UNMOVIC e AIEA deseja investigar. Deve 1441 (2002)

80

facilitar também a viagem dos entrevistados e as entrevistas devem

ocorrer sem a presença de observadores do governo

UNMOVIC e AIEA deviam escolher a equipe de investigadores, tendo

imunidade e privilégios. Como o direito irrestrito de entrar e sair do

país, como dos locais que serão investigados, incluindo locais

presidenciais. Deveriam ser fornecidos a eles, todos os nomes de

funcionários envolvidos, inclusive os que não fazem mais parte dos

programas que estão sendo investigados. A ONU vai fornecer

segurança das instalações da AIEA e UNMOVIC. Certos locais podem

ter o acesso restringido se as agências de pedirem. Essas também

tem o direito de remover, destruir, desativar ou confiscar tudo que foi

proibido, como fechar instalações ou equipamentos. 1441 (2002)

Decide adotar a GRL (S/2002/515) revisada como base para o

programa humanitário no Iraque. 1409 (2002)

Decide avaliar GRL e os procedimentos para a sua implementação e

considerar qualquer ajuste que deve ser realizado em até 180 dias 1409 (2002)

Pede ajustes na GRL (S/2002/515) e nos procedimentos de

implementação, que posteriormente deve ser revisada.

1447 (2002)

1454 (2002)

Pede que as partes – Iraque e EUA - cumpram as obrigações sob a

lei internacional, essencialmente, aos iraquianos (dentro e fora do

país). 1472 (2003)

Pede contribuição dos Estados membros ONU com assistência, força

militar para a força multinacional. 1511 (2003)

Decide que o Conselho deve analisar os requisitos e a missão da

Força Multinacional (até 1ano), podendo continuar depois do período. 1511 (2003)

Solicita aos Estados Membros de impedir o trânsito do Iraque (armas

e financiamento) 1511 (2003)

Estabeleceram a criação do Comitê do Conselho, as regras

provisórias para identificar indivíduos e entidades relacionados ao

terrorismo. 1518 (2003)

O Iraque deve cumprir as obrigações de desarmamento, a Autoridade

deve manter o Conselho informado e salienta a intenção de rever os

mandatos das agências de investigação (AIEA e UNMOVIC). 1483 (2003)

81

Pede para que se negue asilo para membros do regime anterior

acusados de crimes e atrocidades. 1483 (2003)

Autoriza Força Multinacional, para tomar todas as medidas

necessárias para manter a segurança e a estabilidade, no programa

(eleições e da constituição), à UNAMI, etc.

1511 (2003)

1546 (2004)

Enfatiza importância de estabelecer no Iraque uma polícia eficaz e

forças de segurança (lei/ordem/segurança) para combater terrorismo.

Pede aos Estados-Membros e as organizações internacionais e

regionais, para contribuir no treinamento e com o equipamento das

forças de segurança.

1511 (2003)

1546 (2004)

Reafirma a intenção de rever os mandatos UNMOVIC e AIEA 1546 (2004)

Reconhece o pedido do Governo para manter a Força Multinacional (1

ano)

1546 (2004)

1637 (2005)

1723 (2006)

O mandato da Força Multinacional deve ser revisto ou terminar antes,

se o governo pedir.

1546 (2004)

1637 (2005)

1723 (2006)

Pede EUA continue a produzir relatório para Conselho sobre a Força

Multinacional

1546 (2004)

1637 (2005)

1723 (2006)

Reafirma que atos terroristas não são admitidos. Recorda as

obrigações dos Estados Membros aprovadas na Resolução 1618(05) 1637 (2005)

Solicita aos que usam a violência para subverter o processo político,

para que largue as armas e participe pacificamente da situação.

1637 (2005)

1723 (2006)

Ações relacionadas a questões econômicas

Autoriza a venda ou fornecimento de qualquer produto e commodities

exceto que sejam militares, como foi apontado na Resolução 687(91)

e as que estão relacionados na GRL (S/2002/515). 1409 (2002)

Decide que os fundos da conta bloqueada podem ser usados, para

financiar vendas ou fornecer produtos e commodities autorizados. 1409 (2002)

Apelam aos Estados Membros e as instituições financeiras 1511 (2003)

82

internacionais para fortalecer a ajuda aos iraquianos na reconstrução

e no desenvolvimento da economia e para fornecer empréstimos e

outras assistências financeiras

As exportações de gás natural, petróleo e de seus derivados, devem

ser de acordo com as boas práticas do mercado e devem ter auditores

independentes. Os rendimentos serão depositados no FDI, mas 5%

devem ser depositados no Fundo de Compensação até ter governo

reconhecido. 1483 (2003)

Pede a reestruturação da dívida do Iraque. O petróleo, produtos

petrolíferos e gás natural originários do Iraque devem ser protegidos,

assim como as receitas e as obrigações decorrentes dessas vendas. 1483 (2003)

Os Estados-membros que possuam fundos, outros ativos financeiros

ou recursos econômicos do Governo Saddam ou de seus entes

estatais, empresas ou agências, situados fora do Iraque, como

aqueles adquiridos por Saddam, devem ser congelados. 1483 (2003)

Criação do Fundo de Desenvolvimento do Iraque deve ser feita pelo

Banco Central do Iraque e devem ser fiscalizados por auditores

independentes, os recursos devem ser administrados pela Autoridade. 1483 (2003)

Solicita as instituições financeiras internacionais a ajuda aos

iraquianos na reconstrução e no desenvolvimento da economia 1483 (2003)

Solicitam a transferência de 1 bilhão de dólares ao FDI em recursos

desonerados, descontando da quantia, as despesas da ONU com

contratos autorizados e custos do Programa. 1483 (2003)

Todas as proibições relativas ao comércio, como as disposições

relacionadas aos recursos financeiros ou econômicos deixam de ser

aplicadas, exceto as proibições relativas à venda ou fornecimento de

armas e materiais relacionados, mas a Autoridade pode ter acesso a

esses. 1483 (2003)

Enfatiza a prioridade em estabelecer a IAMB e reitera que o Fundo de

Desenvolvimento do Iraque deve ser usado de forma transparente 1511 (2003)

Recorda os Estados Membros obrigação de transferir recursos

econômicos ao FDI em benefícios dos iraquianos

1511 (2003)

1546 (2004)

Devesse estimular os Estados Membros e as organizações 1511 (2003)

83

(internacional e regional) para reconstrução no Iraque 1483 (2003)

1546 (2004)

Os depósitos de recursos ao FDI e o papel da IAMB será revisto a

pedido do Governo ou depois de 1 ano 1546 (2004)

Estende os arranjos estabelecidos resolução 1483(03) para depósito

no FDI (venda de petróleo)

1637 (2005)

1723 (2006)

Decide que o Governo pode rever as cláusulas dos depósitos do FDI

antes do fim do outro ano (06)

1637 (2005)

1723 (2006)

Reconhece o papel do FDI e da IAMB para assegurar que os recursos

sejam usados da melhor forma

1637 (2005)

1723 (2006)

Ações relacionadas ao Secretário-Geral

Pede consulta do S-G com as partes interessadas, para avaliar a

implementação da GRL antes do fim dos 180 dias e as possíveis

recomendações para revisão da GRL e do procedimento.

1447 (2002)

1454 (2002)

S-G e o Comitê devem entregar relatório 2 semanas antes do fim 180

dias referente às medidas resolução 1360(01)

1409 (2002)

S-G deve apresentar relatório ao Conselho 1 vez por semana até fim

180 dias (pessoal da ONU no Iraque e em consulta ao governo), sobre

a distribuição suplementos essenciais para necessidade dos

iraquianos e se é preciso alguma readequação por causa da despesa.

1447 (2002)

1454 (2002)

O S-G junto com a OIP, em até 60 dias, devem definir as taxas de

consumo e níveis de utilização para cada substância química,

biológica e de medicamentos, como os períodos apropriados do ano.

Evitando o armazenamento para fins militares, entre outros.

1454 (2002)

O S-G e a Autoridade em até 6 meses devem terminar do jeito mais

rentável, as operações do programa Oil-for-food. A agência deve

revisar a utilidade dos contratos e dos financiamentos de tal programa

1483 (2003)

Excluí das funções do S-G, a observação e monitoramento sobre o

Programa, incluindo a questão de exportação de petróleo e derivados

deste.

1483 (2003)

Autorizam o S-G e representantes indicados por ele, para estabelecer

locais alternativos, dentro e fora do Iraque para entrega, inspeção e

1472 (2003)

84

autenticação dos suprimentos e equipamentos para ajuda humanitária

do Programa. Deve rever os contratos do governo para determinar o

que é essencial aos civis.

Pede nomeação de um representante do S-G para fornecer relatórios,

coordenar as atividades pós-conflito, coordenar a relação da ONU e

outras agências de assistência humanitária, junto com Autoridade.

Para restaurar e estabelecer instituições para se ter um governo

representativo, entre outras obrigações. A Autoridade e o

representante S-G devem dar suporte na administração interina até

que o Iraque assuma as suas responsabilidades

1483 (2003)

Pede ao S-G mandar relatórios sobre o programa, que ele deve

assegurar recursos da ONU e associações internacionais para ajudar

a promover o programa do Conselho administrativo (constituição e

eleições).

1511 (2003)

S-G deve negociar a transferência das propriedades não removíveis e

recursos que não podem ser eliminados para o Kuwait e o Iraque

1490 (2003)33

Pede S-G um relatório para o Conselho sobre o mandato da UNIKOM 1490(2003)34

O S-G deve informar sobre as operações de responsabilidade da

UNAMI

1546 (2004)

O S-G deve continuar enviando relatórios ao Conselho sobre a UNAMI 1637 (2005)

Pede para S-G atualize o Conselho sobre o Pacto Internacional ao

Iraque (pedido pelo Governo iraquiano em acordo com o S-G)

1723 (2006)

Ações relacionadas à política do Iraque

Recorda que o Conselho alertou que Iraque vai enfrentar sérias

consequências devido às contínuas violações de suas obrigações

1441 (2002)

Pede aos Estados-Membros e as organizações interessadas para

ajudar na reforma das instituições e na reconstrução do Iraque, para

obter estabilidade e segurança.

1483 (2003)

O Comitê (I) será mantido sob análise e possível autorização de novas

tarefas por seus membros35

1518(2003)

33

Secretary-General Report (S/2003/656).

34 Secretary-General Report (S/2003/656).

85

Autoridade Provisória da Coalizão (Autoridade) tem específicas

responsabilidades, autoridades e obrigações até o Iraque ter um

governo reconhecido internacionalmente etc.

1511 (2003)

Apoia os esforços do Conselho administrativo de mobilizar os

iraquianos

1511 (2003)

Determina que Conselho administrativo e os ministros sejam os

principais órgãos na administração interina, não devem prejudicar o

país, até ter um governo reconhecido.

1511 (2003)

Solicita à Autoridade, no “atual” contexto, para passar as

responsabilidades governamentais para o povo do Iraque assim que

possível ou pedido. Deve informar sobre o progresso ao Conselho

1511 (2003)

Convida o Conselho administrativo para fornecer ao Conselho, junto a

Autoridade e o representante do S-G, cronograma e um programa

para realização da Constituição e de eleições democráticas.

1511 (2003)

Autoridade deve promover o bem-estar dos iraquianos através da

administração do território, trabalhando para o restabelecimento das

condições de segurança e estabilidade e também na criação de

condições para que o povo possa determinar o seu futuro político.

1483 (2003)

Pede a Autoridade, as organizações e indivíduos que continuem

localizando, identificando e repatriando kuwaitianos, iraquianos e

pessoas de outros países que devido ao regime anterior estavam

desaparecidas, assim como propriedades.

1483 (2003)

Reconhece que não é mais necessário à zona de desmilitarização

entre Iraque e Kuwait 687 (1991) – reconhecimento dos voluntários da

Missão de observação (Kuwait) e elogia UNIKOM e DPKO

1490 (2003)36

Decidi o fim da zona de desmilitarização 10 km do Iraque e 5 km do

Kuwait com o fim do mandato da UNIKOM

1490 (2003)37

Determina o fim do Comitê encerrará as atividades até 6 meses 1483 (2003)

Com o fim da Autoridade, o FDI deve ser administrado pelo Governo. 1546 (2004)

Expressa o desejo de uma investigação sobre o governo de Saddam, 1538 (2004)

35

Menciona Resolução 661 (1990).

36 Secretary-General Report (S/2003/656).

37 Secretary-General Report (S/2003/656).

86

sobre suborno, entre outras infrações.

Concorda com a formação do Governo provisório 1546 (2004)

Determina o fim das atividades da Autoridade 1546 (2004)

Aprova o calendário para transição política do Iraque para um governo

democrático (governo soberano interino/ conferência nacional questão

da diversidade do país/ eleições democráticas diretas/ elaboração de

Constituição). A UNAMI e o representante do S-G devem ajudar.

1546 (2004)

Reconhece que o Governo provisório do Iraque vai assumir a

coordenação da ajuda internacional e do programa Oil-for-food

1546 (2004)

Saúda a ação da autoridade governamental, as eleições democráticas

direta, a elaboração da constituição e sua aprovação.

1637 (2005)

Observa que o Governo estabelecido como resultado da eleição

15/12/05 promove diálogo nacional e reconciliação.

1637 (2005)

Congratula comitê de transição do governo do Iraque em busca de um

país, federal, democrático, pluralista e unificado, com respeito aos

direitos humanos e políticos.

1637 (2005)

FONTE: Elaboração da própria autora.

Notas Explicativas:

1) A Resolução 1409 (2002) contém, em anexo, o complemento dos

procedimentos das resoluções 1284 (1999) e 986 (1995) e S/1996/636.

2) As resoluções 1441 (2002), 1546 (2004), 1637(2005) e 1723(2006),

contém cartas em anexo em cada.

3) A Resolução 1382(2001) e 1454 (2002) tem em anexo a proposta da

GRL e dos procedimentos a serem realizados para avaliação.

87

ANEXO

Segue como forma de aproximação para o leitor como forma de acesso

a fonte do material usado neste estudo, a imagem da resolução S/res/1443

(2002) do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

88