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Conselho de Segurança das Nações Unidas - temasmg.comtemasmg.com/wp-content/uploads/2016/11/Guia-miniTEMAS-CSNU.pdf · autorizado pelo presidente John F. Kennedy mostra ao mundo

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ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO....................................................................................................................2

2. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS E O CONSELHO DE SEGURANÇA......2

2.1. Organização das Nações Unidas.......................................................................................2

2.1.1. Surgimento das Nações Unidas........................................................................................2

2.1.1.1 Paz de Vestfália...............................................................................................................2

2.1.1.2 Equilíbrio Europeu..........................................................................................................3

2.1.1.3 Liga das Nações..............................................................................................................6

2.1.2. Carta das Nações Unidas................................................................................................9

2.2. Conselho de Segurança....................................................................................................12

3. FIM DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL E INÍCIO DA GUERRA FRIA..............14

3.1. Um mesmo fim para os envolvidos: termina a Segunda Guerra Mundial.................15

3.2. As conferências do pós-guerra........................................................................................18

3.3. Nova ordem política mundial: tem início a Guerra Fria..............................................21

4. A GUERRA FRIA (1946 – 1962).......................................................................................24

4.1. Os norte-americanos e o capitalismo..............................................................................26

4.2. O efeito soviético...............................................................................................................29

4.3. Equilíbrio de forças..........................................................................................................31

4.4. Uma Europa dividida.......................................................................................................32

4.5. Guerras, revoluções e transformações do oriente.........................................................34

4.6. Para além da dicotomia...................................................................................................37

5. CONTEXTO POLÍTICO AMERICANO.......................................................................38

5.1. Guerra Hispano-Americana: Fulgêncio Batista...........................................................38

5.2. A Revolução Cubana.......................................................................................................40

5.3. Kennedy e os EUA...........................................................................................................44

5.4. Cuba e a Organização dos Estados Americanos...........................................................46

6. A SITUAÇÃO ATUAL......................................................................................................45

7. QUESTÕES A DELIBERAR............................................................................................47

8. BIBLIOGRAFIA................................................................................................................52

Guia de Estudos originalmente produzido por Jessica Holl, Lucas Carvalho, Rubens Fonseca

e Bárbara Habib para o TEMAS 9 –América Latina.

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1 – Introdução

Os eventos observados em outubro de 1962 indicam que um capítulo à parte na

história poderá ser destinado a esse mês de enorme tensão mundial. O Bloqueio Naval

autorizado pelo presidente John F. Kennedy mostra ao mundo quão delicada pode ser

uma estabilidade pacífica trabalhada pelas maiores potências armamentistas do mundo,

Estados Unidos da América e União das Repúblicas Socialistas Soviéticas; estabilidade

essa que vem andando lado a lado da corrida armamentista de maior potencial bélico já

vista, o arsenal nuclear.

As movimentações envolvendo esse cenário transpassam as fronteiras cubanas,

atingindo também toda a comunidade latino-americana e, por conseguinte, ganham

repercussão global. Dessa forma é colocada em pauta a estruturação da comunidade

internacional e de sua segurança como um todo. Portanto, não apenas os chefes de Estado

envolvidos no centro da discussão mostram-se interessados no debate acerca da questão,

mas também a população mundial. O debate, assim, chega ao Conselho de Segurança das

Nações Unidas, órgão responsável por deliberar as decisões mais importantes a respeito

da segurança e paz global.

2 - Organização das Nações unidas e o Conselho de Segurança

2.1 – Organização das Nações Unidas

2.1.1 – Surgimento das Nações Unidas

2.1.1.1 – Paz de Westfália

A constituição de uma Europa formada por Estados legitimamente

independentes fez-se possível durante o século XVII. Segundo Hedley Bull1, à época, os

Estados passaram a reconhecer uns aos outros como tais, o que culminou na constituição

de uma nova sociedade internacional. Tal evolução foi resultado da luta contra uma

possível ordem hegemônica que foi efetivada com a Paz de Westfália2. No século

1 H. Bull. The Anarchical Society [A Sociedade Anárquica], Londres, Macmillan, Nova York, Columbia

University Press, 1977, pag.13. 2 A Paz de Vestfália de 1648 refere-se a um conjunto de tratados que encerrou a Guerra dos Trinta Anos,

iniciada com a intensificação da rivalidade política entre o Imperador Habsburgo do Sacro Império

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anterior, a grande concepção para a Europa fora a visão hegemônica da Monarquia dos

Habsburgos. Com o passar do tempo, seu enfraquecimento e o surgimento de outras

concepções, como a anti-hegemônica, fizeram com que aquele antigo ideal perdesse sua

força no território europeu. A Guerra dos Trinta anos representou o marco final do

domínio hegemônico dos Habsburgos, consolidando a oposição à ameaça difundida por

eles e levando à insurgência de um novo modelo que consagrava certa ordem cooperativa

entre os Estados.

Nas análises mais tradicionais sobre esse a Guerra dos Trinta Anos –

principalmente no estudo da história das relações internacionais – concebe-se que a Paz

de Westfália, além de consolidar a independência do Império Neerlandês, abalou o poder

do Sacro Imperador Romano-Germânico. Ademais, a Guerra também possibilitou aos

governantes dos Estados germânicos o gozo da prerrogativa de estipular a religião oficial

de seus territórios, sem interferência externa, com o reconhecimento legal aos

calvinistas3.

A Paz de Westfália surge, então, não só como marco das aspirações de

surgimento de novos Estados, mas também como o fim de uma luta entre as pretensões

hierárquicas iniciadas pelos Habsburgos na configuração da ordem regional.

Ademais, Westfália não estabeleceu o sistema westfaliano baseado no Estado

soberano nem criou um protótipo do sistema internacional atual embasado na soberania,

mas apenas confirmou a existência de uma ordem cooperativa legal de entidades

autônomas não soberanas4.

Sobretudo, Westfália trouxe maior destaque para a soberania e para a formação

de uma ordem anti-hegemônica entre os Estados visto que consistia no controle que todos

os estados realizavam, de maneira a impedir que se estabelecesse uma hegemonia de

poder entre eles.

2.1.1.2 – Equilíbrio europeu

As compensações de natureza territorial constituíam, principalmente no século

XIX, em um mecanismo comumente utilizado para assegurar o reestabelecimento do

Romano-Germânico e as Cidades-Estado, luteranas e calvinistas, no território do norte da atual Alemanha

que se opunham ao seu controle. Tal guerra teve o envolvimento de potências católicas administradas pelos

Habsburgo, como a Espanha e Áustria, e também de Estados protestantes escandinavos e da França, que,

mesmo sendo católica, temia o domínio dos Habsburgo na Europa e apoiou os protestantes no conflito.

WATSON, A. The evolution of international society: a comparative historical analysis. Londres, Nova

York: Routledge, 1992. pag. 182-197 (350 pp) 3 WATSON (1992, p. 182-197). 4 OSIANDER (2001, p. 270-273).

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equilíbrio de poder. A partir do Tratado de Utrecht de 1713, que concluiu a guerra de

sucessão da Espanha, o princípio do equilíbrio de poder, a ser alcançado por meio de

compensações territoriais, foi mais bem difundido e assinalou a possibilidade das nações

existirem, independentemente do tamanho de seu território. Determinou, também, a

divisão da maioria das terras espanholas, tanto na Europa quanto nas colônias, entre o

Habsburgos e os Bourbons, ad conservandum in Europa aequlibrium na expressão do

documento5.

O equilíbrio de poder na Europa moderna surge após a derrota dos Habsburgos

e verificou-se com a assinatura da Paz de Westfália em 1648. Este equilíbrio serviu como

uma continuação dos propósitos antes definidos por Westfália, de modo a afirmar que

não se buscava evitar as guerras, mas limitar a capacidade dos Estados de exercer domínio

uns sobre os outros. Esse modelo não visava satisfazer nenhum Estado ou ator, mas tão

somente garantir o equilíbrio entre os Estados, de modo que esses se mantivessem

moderadamente insatisfeitos.

Em raras passagens pela história da humanidade, o equilíbrio de poder aparece

para uma grande porção da humanidade, o império e a tirania eram a forma natural de

governo. Esse equilíbrio de poder reflete o ideário de grandes pensadores políticos do

período Iluminista, como as ideias da separação de poderes e do equilíbrio político,

retratadas por Charles de Montesquieu (1689-1755) na obra ―O Espírito das Leis, e a

teoria de Adam Smith de que a riqueza se baseava nas ações individuais ao invés de em

apenas uma ação econômica de governo; além da concepção de Madison, retratada na

obra de Morgenthau, de que ―uma república federal, com várias facções que perseguem

seus próprios interesses segundo algumas regras de jogo, são a expressão intelectual de

uma realidade política que é o equilíbrio de poder6.

Já no início do século XVIII, durante o reinado da rainha Ana da Grã-Bretanha,

desenvolveu-se dentro dos círculos diplomáticos britânicos a ideia de que a paz na Europa

só foi alcançada devido à chamada "balança de poder", pensamento que tinha sido

formulado pela primeira vez por Walpole no Parlamento Inglês em 1714, e que

6 J. Iñíguez – 2010 Disponível na versão em Espanhol em http://clio.rediris.es. Acesso em 28 de Outubro

de 2011

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compartilhava dos princípios que foram construídos nos tratados de paz de Westfália,

Pirineus7 e Oliva8.

Realmente, as vastas ambições de Luís XIV, da França, tinham explodido em

pedaços os pilares de Westfália. Novamente uma nação queria se tornar hegemônica na

Europa, de sorte a colocar em sério perigo a sobrevivência dos demais Estados europeus.

O Tratado de Utrecht9 é, dessa forma, uma revisão e atualização dos princípios

de Westfália. No Artigo VI do tratado aparece a seguinte cláusula: "A segurança e as

liberdades da Europa não podem, sob quaisquer circunstâncias apoiar a união dos reinos

de Espanha e França, caso isso seja feito a partir do domínio de um único rei10.

Assim o equilíbrio político foi formulado a partir da ideia de que nenhum Estado

garantiria sua hegemonia e nem representaria qualquer tipo de perigo no sistema

internacional11. Como dizia Montesquieu, na obra já citada, ―a situação na Europa é a

de que todos os Estados dependem uns dos outros. A Europa é um Estado único composto

por várias províncias.

A tentativa de manter o equilíbrio se sucedeu até o período da Primeira Grande

Guerra no ano de 1914. A Europa, na primeira metade do século, estava dominada por

duas grandes potencias a França e a Inglaterra, mas depois com a insurgência de poder

de outras nações, como a Rússia, e com outros conflitos internos, sucedeu-se a uma

quebra de relações entre as potencias12.

Em seguida, a ascensão do Império Alemão13 fez com que o equilíbrio fosse

retomado, se sustentando pela criação de alianças e tratados que pudessem resolver

problemas interestatais e para fortalecer relações políticas. Mas essas relações não

perduraram por muito tempo, revelando-se frágeis, o que culminou na Primeira Guerra

Mundial14.

7O Tratado dos Pirenéus, assinado em 1659, enquadra-se no contexto das lutas da Restauração. Envolvia

diferentes situações políticas e interesses em confronto, tanto em França e na Espanha como em Portugal.

Gouveia, A. C. — Portugal e a Europa. A Sociedade e as Relações Diplomáticas de Tordesilhas aos

Pirinéus. Revista ICALP, vol. 15, Março de 1989, 89-95. 8 O Tratado ou Paz de Oliva de 1660 foi um dos tratados de paz que colocaram um fim na Segunda Guerra

do Norte (1655 – 1660).

9 Denomina-se de tratado ou Paz de Utrecht o acordo firmado nos Países Baixos que deu fim a Guerra de

Sucessão Espanhola.

10 J. Iñíguez (2010). ―El equilibrio europeo en el siglo XVIII. Los tratados de Utrecht-Rastadt‖

(SecciónTemario de oposiciones de Geografía e Historia), Proyecto Clío 36. ISSN: 1139-6237.

11 J. Iñíguez (2010)

12 GABARITO, Adela. El congreso de Viena y el ―concierto europeu‖, 1814-1830 In PEREIRA, (pp. 63-

84).

13 HOBSBAWM, E. A era dos impérios. [Trad.]. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988 (Capt. 6). 14 CHULZE, Hagen. Estado e nação na História da Europa. [Trad.]. Lisboa: Presença, 1997 (Parte III, Capt.

1,2,3).

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2.1.1.3 – Liga das Nações

Com o término da Primeira Grande Guerra, surgiu o projeto de criação da Liga

das Nações, que foi idealizado pelo então Presidente dos Estados Unidos, Woodrow

Wilson, entre os 14 pontos que formulou e que foram apresentados ao Congresso dos

Estados Unidos em 08 de janeiro de 1918. Esses pontos foram descritos em função da

busca por uma ordem internacional que servisse ao sistema político daquele momento.

14 Pontos de Wilson:

I- Acordos abertos de paz, após os quais não haverá acordos

internacionais secretos de qualquer espécie, e a diplomacia deve

proceder sempre com franqueza e sob os olhos públicos.

II- Absoluta liberdade de navegação nos mares e águas fora dos

territórios nacionais, tanto em paz e na guerra, exceto quando os

mares tenham que ser fechados, na totalidade ou em parte, por uma

ação internacional devido ao cumprimento de acordos

internacionais.

III- A remoção, o tanto quanto possível, de todas as barreiras

econômicas e o estabelecimento de uma igualdade de condições

comerciais entre todas as nações que consentem com a paz e com a

associação multilateral.

IV- Garantias adequadas de que os armamentos nacionais serão

reduzidos até o menor nível necessário para garantir a segurança

nacional.

V- Um reajuste livre, aberto e absolutamente imparcial de todas as

reivindicações coloniais, com base em uma observação estrita do

princípio de que na determinação de todas as questões de soberania,

os interesses das populações colonizadas devem ter o mesmo peso

que as devidas reivindicações das nações colonizadoras.

VI- A retirada dos Exércitos do território russo e a solução de todas

as questões envolvendo a Rússia, visando assegurar uma

cooperação melhor e mais aberta com outras nações do mundo,

obtendo uma oportunidade sem entraves e direcionada para seu

próprio desenvolvimento político e política nacional, garantindo-lhe

sincera recepção na sociedade das nações livres sob as instituições

de sua escolha; e também assistência de todo o tipo que ela possa

precisar e desejar. O tratamento concedido à Rússia por suas nações

irmãs nos meses que virão serão o verdadeiro teste de sua boa

vontade, da compreensão de suas necessidades como distintas de

seus interesses próprios e de sua simpatia inteligente e altruísta.

VII- Bélgica, o mundo inteiro vai concordar, deve ser evacuada e

restaurada, sem qualquer tentativa de limitar sua soberania, a qual

tem direito assim como todas as outras nações livres. Nenhum outro

ato servirá como este vai servir para restaurar a confiança entre as

nações dentro das leis que eles próprios definiram e determinaram

para o governo de suas relações uns com os outros. Sem este ato

toda a estrutura e validade da lei internacional é totalmente

prejudicada.

VIII- Todo o território francês deve ser libertado e as partes

invadidas restauradas, e o mal feito à França pela Prússia em 1871,

na questão da Alsácia-Lorena, que tem perturbado a paz do mundo

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por quase 50 anos, deve ser corrigido, a fim de que a paz possa uma

vez mais ser garantida, no interesse de todos.

IX- Um reajuste das fronteiras da Itália deve ser efetuado

respeitando as linhas reconhecidas de nacionalidade.

X- Os povos da Áustria-Hungria, cujo lugar entre as nações

queremos ver salvaguardada e garantida, devem ter concedida a

mais livre oportunidade para seu desenvolvimento autônomo.

XI- Romênia, Sérvia e Montenegro devem ser evacuadas; os

territórios ocupados restaurados; À Sérvia deve ser concedido o

acesso livre e seguro para o mar; as relações dos vários estados

Bálcãs uns com os outros devem ser determinados pelo conselho

amigável ao longo de linhas historicamente estabelecidas de

lealdade e nacionalidade; garantias internacionais de independência

política e econômica e integridade territorial dos vários Estados dos

Balcãs devem ser garantidas.

XII- À parte turca do presente Império Otomano deve ser

assegurada soberania, mas às outras nacionalidades, que estão agora

sob o governo turco, deve ser provida uma segurança inquestionável

da vida e uma oportunidade de desenvolvimento autônomo; os

Dardanelos devem ser permanentemente abertos como uma

passagem livre para o navios e comércio de todas as nações sob

garantias internacionais.

XIII- Um Estado independente polonês deve ser estabelecido e

deve incluir os territórios habitados por populações polacas, aos

quais deve ser assegurado o livre e seguro acesso ao mar, e cuja

independência política e econômica, bem como a integridade

territorial, devem ser garantidas por convênio internacional.

XIV- A associação geral de nações deve ser formada sob acordos

específicos com o propósito de proporcionar garantias mútuas de

independência política e integridade territorial para os estados de

quaisquer dimensões15.

Segundo o teórico Kissinger, diplomata americano, o presidente Wilson estava

convencido de que todas as nações do mundo tinham igual interesse na paz, e, portanto,

agiriam em conjunto para punir quem a perturbasse [...]16. Sua expectativa visava a

estabilização do sistema e seria fundamentada no que, nos anos seguintes, viria a se

chamar “princípio da segurança coletiva”. Ele expunha a opinião norte-americana

interessada em questões internacionais e também a de muitos europeus que consideravam

a sociedade no período anterior à grande guerra como uma anarquia dos Estados

soberanos. A fim de implementar esse conceito de segurança coletiva‖ nas relações

internacionais, os Estados que se reuniram na Conferência de Paz de Paris, em Versalhes

em 1919, concordaram em criar a Liga das Nações17. O projeto de Wilson fora assim

reformulado, transformando-se em parte contida no Acordo de Versalhes18, firmado com

15 President Woodrow Wilson's Fourteen Points – Congress Library, Disponível na versão em Inglês em

http://www.loc.gov/exhibits/treasures/trm053.html – Acessado em 22 de Outubro de 2012. 16 17 BRÍGIDO, 2010, p.18

18O Acordo de Versalhes (inclusive os tratados acessórios e o estabelecimento da Liga das Nações) é

frequentemente contado como o primeiro ato constituinte de auto-regulação global por parte de uma

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a Alemanha. Dessa maneira, criava-se a Liga, que tinha como dever atuar na preservação

da paz internacional apenas com medidas de caráter recomendatório. Entendia-se,

entretanto, que a simples mediação e os apelos em favor da paz deveriam ser

minimamente suficientes para efetivar sua preservação e manter o equilíbrio das relações

internacionais entre Estados, sem a necessidade do uso de meios militares entre eles.

Devido às suas capacidades limitadas e não dispondo de qualquer instituição para

mediação das interações entre os Estados, as sanções, que tinha como ferramenta de

coerção eram mínimas e adotavam caráter moral, econômico e militares.

O objetivo era, portanto, manter a paz, por meio de um sistema de segurança

coletiva e proteção mútua contra a agressão: ―a ação comum internacional resolveria

conflitos e dissuadiria agressões19. Caso algum Estado–membro da Liga, utilizasse de

qualquer meio hostil para com outro membro, este ato seria recebido como uma afronta

pelos outros membros, podendo gerar grande desentendimento entre eles.

A Liga representava as potências satisfeitas, aquelas que buscavam, em sua

maior parte, manter o status quo territorial, ou seja, o estado atual em que se encontrava

seu território. Ademais, o Congresso norte-americano acabou por não ratificar o Pacto, o

que ocasionou na abstenção americana. Assim como a representação dos Estados Unidos,

a União Soviética não demonstrava grandes interesses em participar da organização.

Apesar de toda a idealização e possível esperança que a Liga trazia para o cenário

internacional, esta não obteve êxito em seus objetivos. A Liga das Nações operou até o

período de 1946.

Seu fracasso se deve ao fato de que nem todas as nações compartilhavam de

igual interesse em algumas questões. Às vezes elas não reagiam da mesma forma em

relação a um ato de agressão e poderiam desacordar quanto às medidas que poderiam ser

tomadas para opor-se a tal ato. Essa Liga também apresentava certa fraqueza gerada por

sua descentralização, de forma que falhou ao tentar evitar a Segunda Guerra. Devido à

abstenção americana na Liga, a falta de uma representação norte americana efetiva era

latente.

Ademais, ressalta-se também como uma causa de enfraquecimento da Liga das

Nações, o fato de que todas as resoluções tinham que passar por consenso, o que

sociedade que se tornara mundial. WATSON, A. The evolution of international society: a comparative

historical analysis. Londres, Nova York: Routledge, 1992. pag. 391. 19BARACUHI, 2005, p. 38

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dificultava o estabelecimento de resoluções, gerando um problema institucional interno

à Liga.

A Conferência de Paz de Versalhes, ainda, não incluiu as potências derrotadas20.

E mesmo nos melhores tempos, o número de membros sempre se evidenciou reduzido,

de sorte que alcançou um máximo de 50 Estados.

Alguns de seus poucos êxitos foram a assinatura do pacto de segurança entre os

Estados da Alemanha, França, Grã-Bretanha e Bélgica e a resolução diplomática de

alguns conflitos internacionais. Porém, uma sequência de conflitos – que não obtiveram

resultado após tentativas de conciliação da Liga – ocasionaram a saída de alguns Estados

da Sociedade das Nações.

Dessa maneira, com o fracasso recorrente da Liga das Nações21 surgiu a

necessidade de criar outra organização internacional no período pós Segunda Guerra, para

efetivamente promover a paz e segurança entre os Estados. Assim, a partir dos ideais de

criação da Liga, nasce a Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945.

2.1.2 – Carta das Nações Unidas

O primeiro acordo que veio a firmar uma nova organização internacional foi

discutido durante o encontro de dois dos mais influentes líderes mundiais na época, o

presidente dos Estados Unidos, Franklin D. Roosevelt e o primeiro ministro britânico,

Winston Churchill, no documento assinado por ambos em 194122, a Carta do Atlântico.

Já em 1942, na Declaração das Nações Unidas23, os acordos que foram firmados e as

reuniões que envolviam as principais potências começaram a estabelecer os princípios de

uma Nova Ordem Mundial, aproximando-se cada vez mais do objetivo da antiga

Sociedade das Nações: a manutenção da paz, de modo a manter os padrões de equilíbrio

e ordem do poder. Após a reunião na Conferência de Yalta24, firma-se a necessidade da

criação de uma nova organização.

20 BRIGIDO, 2010, p. 20

21 A Liga das Nações operou durante até o período de 1946, quando se iniciou a Segunda Grande Guerra.

22 Em 14 de agosto de 1941 a bordo de um navio de guerra na Costa de Newfoundland, as duas potências,

Norte-americana e a Britânica, acordaram na criação de um sistema de segurança a título permanente e,

mais abrangente, exprimiram o desejo de alcançar uma colaboração no domínio econômico mais eficaz

entre todas as nações. Firmando assim a Carta do Atlântico.

23 Termo que foi pela primeira vez utilizado pelo presidente Roosevelt, na reunião onde se juntaram os

representantes das 26 nações que fizeram frente às Potências do Eixo.

24A Conferência de Yalta, ocorrida em fevereiro de 1945, a segunda rodada do encontro entre os três

senhores do Mundo – Roosevelt, Churchill e Stalin – foi a mais famosa de todas as conferências da Segunda

Guerra Mundial, pois nela deu-se a partilha do mundo entre os Três Grandes, nas vésperas da vitória final

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A Carta das Nações Unidas25 foi formalizada na cidade de São Francisco, nos

EUA, em junho de 1945, onde foram debatidos os princípios já esboçados na Conferência

de Dumbarton Oaks de 1944, que haviam sido propostos pelos representantes da

República da China, União das Republicas Socialistas Soviética, Reino Unido e Estados

Unidos, e que viriam a constituir a base das Nações Unidas.

A Carta tem como princípios básicos duas questões fundamentais, apresentadas

em seu artigo segundo: a solução de conflitos de forma pacífica e a interdição do uso da

força nas Relações Internacionais por parte de todos os Estados. Ademais, foi o primeiro

instrumento criado com o fim de impedir o abuso do uso da força, de sorte que assegurou

a paz e a segurança internacionais como interesses coletivos do cenário internacional. Por

meio da Carta, 50 países comprometidos com suas proposições participaram da fundação

da ONU. E dessa forma, os Estados signatários, em prol desses objetivos, se integraram

à organização e se comprometeram a cumprir com seus preceitos.

Em relação à soberania nacional dos países signatários das Nações Unidas, existe

uma cláusula apresentada no Artigo 2º, Capítulo I – Propósitos e Princípios – que atesta

que:

7. Nenhum dispositivo da presente Carta autorizará as Nações

Unidas a intervirem em assuntos que dependam essencialmente da

jurisdição de qualquer Estado ou obrigará os Membros a

submeterem tais assuntos a uma solução, nos termos da presente

Carta; este princípio, porém, não prejudicará a aplicação das

medidas coercitivas constantes do Capitulo VII.

(Carta das Nações Unidas, p. 7).

Assim, esperava-se que, a fim de manter a segurança, os Estados agiriam

coletivamente.

As delimitações da Carta estabeleciam medidas a serem seguidas pelos países que

fossem membros das Nações Unidas e que serviriam para todos os Estados, além de

afirmar que era possível intervir também nas atividades de outros países caso a sua

conduta violasse a proteção dos Direitos Humanos e da Ordem Internacional. Definia,

da Grande Aliança sobre as forças do Eixo. As decisões que foram tomadas naquela ocasião tiveram efeitos

diretos e duradouros sobre povos e nações do mundo inteiro pelo meio século seguinte.

25 Carta das Nações Unidas, Disponível na versão em Inglês em

http://www.un.org/en/documents/charter/index.shtml - Acesso em 25 de Outubro de 2012

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também, que os países que desejassem se tornar membros da ONU deveriam aceitar e

efetivamente cumprir os compromissos descritos na Carta das Nações Unidas.

Os Membros-Fundadores das Nações Unidas são aqueles países que assinaram

e ratificaram a Carta das Nações Unidas enquanto apresentada. A adesão de demais países

é feita por decisão da Assembleia Geral26, por recomendação do Conselho de Segurança.

E no caso de uma possível suspensão, esta pode ocorrer quando o CS decidir, por medidas

preventivas ou coercitivas contra um Estado membro, o que levaria à expulsão deste caso

ocorresse uma violação dos preceitos da Carta. Somente sobre ordem do Conselho, os

direitos desse membro suspenso poderiam ser restabelecidos27.

Keohane (1989) afirma que “as organizações internacionais têm a função de

estabelecer um ambiente de comunicação clara entre os Estados”. Assim, a necessidade

de regulamentar o sistema foi aos poucos retomando sua ordem com a ONU, que se

firmava sobre quatro princípios básicos: a manutenção da paz em todo o mundo; o

desenvolvimento de relações amistosas entre as nações; a ajuda às nações para que

trabalhem em conjunto no intuito de melhorar a vida das pessoas pobres, para acabar com

a fome, com as doenças e com o analfabetismo, e para estimular o respeito aos direitos e

liberdades uns dos outros; e por fim o trabalho no sentido de instituir-se como um centro

destinado a harmonizar a ação das nações para alcançar as supracitadas metas. Para

manutenção das medidas e melhor organização dos segmentos das Nações Unidas foram

formados a Assembleia Geral, o Conselho Econômico e Social (ECOSOC), a Corte

Internacional de Justiça, o Conselho de Tutela e o principal órgão deliberativo da ONU,

o Conselho de Segurança.

Como um dos objetivos primários das Nações Unidas, o Direito Internacional

tem como função definir as responsabilidades legais dos Estados em suas condutas no

ambiente internacional e o tratamento dos indivíduos dentro das fronteiras do Estado.

O Direito Internacional representa uma parte fundamental dentro da organização

visto que tem por função tratar dos Direitos Humanos, do desarmamento, da

criminalidade internacional, dos refugiados, dos problemas de nacionalidade, bem como

das mais diversas questões no âmbito internacional. A Comissão de Direito

Internacional28 foi estabelecida pela Assembleia Geral em 1948, com o intuito de dar

26 A Assembleia Geral é o principal órgão máximo, formulador de políticas, deliberativo e representativo

das Nações Unidas. 27 Os Países Membros da ONU, Disponível na versão em Inglês em:

http://www.un.org/en/members/about.shtml, Acessado em 28 de Outubro de 2012. 28 ILC, sigla em inglês para International Law Comission.

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continuidade ao desenvolvimento progressivo. E, sendo um corpo jurídico especializado,

deve preparar projetos de convenções sobre temas que ainda não tenham sido

regulamentados pela legislação internacional, e codificar as regras do direito

internacional nos campos onde já existe uma prática do Estado29.

A Corte Internacional de Justiça também foi estabelecida pela Carta das Nações

Unidas em 1945 e começou a atuar no ano seguinte. É o principal órgão judiciário das

Nações Unidas. Podem recorrer à Corte todos os países que fazem parte de seu Estatuto.

Já outros Estados poderão fazê-lo sob condições estipuladas pelo Conselho de Segurança,

que pode encaminhar à Corte qualquer controvérsia jurídica. A Corte trata de todas as

questões legais submetidas pelos Estados à ela, além de questões diretamente ligadas a

tratados já estipulados e a assuntos que foram previstos na Carta30.

2.2 – Conselho de Segurança

Assim como os vários órgãos que foram criados pela ONU para a manutenção

de seus objetivos nas diversas áreas atuantes, o Conselho de Segurança, um dos mais

importantes, aparece como o órgão da ONU que tem o poder decisório para tratar de

questões relacionadas à manutenção ou restabelecimento da paz e segurança

internacionais.

Assim como é mencionado no artigo 24 (1) da Carta das Nações Unidas:

A fim de assegurar pronta e eficaz ação por parte das Nações

Unidas, seus membros conferem ao Conselho de Segurança a

principal responsabilidade na manutenção da paz e da segurança

internacional, e concordam em que, no cumprimento dos deveres

impostos por essa responsabilidade, o Conselho de Segurança aja

em nome dele.

Foram então delegados ao Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU),

a função de controle político e o mecanismo de ação. O Conselho de Segurança e a Corte

29 A ONU e o Direito Internacional, Disponível em :http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-

direito-internacional/, Acessado em 30 de Outubro de 2012 30 A Assembléia Geral e o Conselho de Segurança podem solicitar à Corte pareceres sobre quaisquer

questões jurídicas; também aos outros órgãos das Nações Unidas, assim como as Agências Especializadas,

é facultado recorrer à Corte para pareceres sobre questões jurídicas dentro do escopo das suas respectivas

atividades, desde que tenham para isso autorização da Assembléia Geral. Somente países - nunca indivíduos

podem recorrer à Corte Internacional de Justiça. UNIC – RJ (2009), Disponível em

http://unic.un.org/imucms/rio-de-janeiro/64/790/como-funciona-a-corte-internacional-de-justica.aspx

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 13

Internacional de Justiça são os dois únicos órgãos das Nações Unidas com o poder de

decisão obrigatório3132.

O Conselho de Segurança tem por função a análise e definição da existência de

ameaças à paz ou atos de agressão, de sorte que aconselha o uso de meios pacíficos de

resolução de controvérsias e recomenda métodos de ajuste ou termos de liquidação. Em

alguns casos, o Conselho tem a competência de aplicar sanções ou mesmo autorizar o uso

da força, a fim de manter ou restabelecer seus objetivos e ideais.

De acordo com a Carta da Organização das Nações Unidas, os principais

objetivos do Conselho de Segurança são: manter a paz e a segurança internacional, de

acordo com os princípios e propósitos das Nações Unidas; investigar qualquer disputa ou

situação que tenha a possibilidade de transformar-se em um conflito internacional;

recomendar métodos de diálogo entre os países; elaborar planos de regulamentação de

armamentos; determinar a existência uma ameaça para a paz ou ato de agressão e

recomendar quais medidas deverão ser tomadas; solicitar aos países que apliquem

sanções econômicas e outras medidas que não envolvam o uso da força; decidir sobre

ações militares contra os agressores; recomendar o ingresso de novos membros à ONU;

recomendar à Assembleia Geral a eleição de um novo Secretário-Geral e, em conjunto

com a Assembleia, escolher os juízes da Corte Internacional de Justiça; e apresentar

relatórios anuais e especiais à Assembleia Geral33.

Segundo Casarões e Lasmar (2006, pg.78):

O único órgão intergovernamental previsto na Carta das Nações

Unidas é o CSNU. Este órgão pode se reunir a pedido de: um Estado

membro para analisar se a questão constitui uma ameaça à paz e a

segurança internacional; de um Estado não membro „caso trate de

uma controvérsia em que seja parte e desde que aceite previamente,

em relação a essa controvérsia, a obrigação de solucionar

pacificamente sua controvérsia, conforme previsto na Carta.

31 Um dos pontos positivos da atuação da Liga e que obteve sucesso dentro da ONU, a partir de suas lutas sociais direcionadas para a melhoria das condições de trabalho e apoios econômicos dos países melhor desenvolvidos aos países mais pobres, foi a fundação da Corte Permanente de Justiça Internacional que se transformou na Corte Internacional de Justiça. Esta é o principal órgão de justiça das Nações Unidas. O papel do Tribunal de Justiça é resolver, de acordo com o direito internacional, as disputas legais que lhe forem submetidos pelos Estados e emitir pareceres consultivos sobre questões jurídicas submetidas por órgãos autorizados das Nações Unidas e agências especializadas. – International Court of Justice, Disponível na versão em Inglês em http://www.icj-cij.org/court/index.php?p1=1. Acessado em 22 de Outubro de 2012 32 CASARÕES e LASMAR (2006, p.69)

33 BRASIL – CS (2010) Disponível em http://www.brasil-cs-onu.com/o-conselho/.

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 14

O órgão era composto por onze membros, sendo cinco permanentes (os Estados

Unidos, o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, a França, a República China

e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, e seis membros não permanentes

(rotativos). Esses membros são eleitos pela Assembleia Geral da ONU e permanecem

apenas por período de dois anos, sem direito à reeleição ao período imediato. É

importante ressaltar que os permanentes têm, individualmente, o poder de vetar qualquer

decisão do Conselho34.

3 – Fim da Segunda Guerra Mundial e o início da Guerra Fria.

O problema humano que a guerra vai deixar para trás de si ainda

não foi sequer imaginado, muito menos enfrentado por quem quer

que seja. Jamais houve tamanha destruição, tamanha desintegração

da estrutura da vida. (Anne O‟Hare McCormick)

A mais devastadora guerra da história mundial havia ocorrido. O número de

militares e civis mortos, mesmo em contagem parcial, era maior do que a da Primeira

Guerra. A destruição de casas, escolas, igrejas, sinagogas, estradas, pontes, ferrovias,

portos, fábricas, escritórios, aviões, navios, bem como outros equipamentos de uso militar

em tantos países, rivalizava, em seu total, com a devastação causada por todos os

desastres naturais ao longo do século anterior. A capacidade global de produzir alimentos

a curto prazo fora reduzida, uma vez que muitas terras próprias para cultivo estavam

danificadas, animais de criação haviam sido mortos e moinhos de farinha, cervejarias e

panificadoras estavam em destroços. A comida continuou escassa por muito tempo após

o fim da guerra35.

A Segunda Guerra Mundial figura como o mais sangrento acontecimento da

História da Humanidade. Em extensas áreas do globo deixou “um mundo de fome, de

medo de cinzas e escombros, de desespero, sofrimento e violência” (Burns, 1974, p. 983).

O custo humano do conflito é calculado em cerca de cinquenta milhões de mortos e,

“contrariamente à Grande Guerra, uma grande parte das vítimas são civis” (Milza, 1995,

p. 475). “Cerca de trinta milhões de pessoas foram deslocadas durante a guerra, por razões

políticas ou raciais. O choque psicológico e moral é muito grave: o extermínio de judeus,

em particular, e os bombardeios atômicos sobre o Japão manifestam um sentimento de

fim da civilização” (Milza, 1995, p. 475). Ao lado dos terríveis danos pessoais devem ser

34 UNITED NATIONS (2008). 35 BLAINEY (2011, p. 166)

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 15

lembradas as imensas perdas materiais: cidades arrasadas, campos produtivos destruídos,

meios de transporte e de comunicação interrompidos, equipamentos científicos,

industriais e artísticos irremediavelmente danificados. Compreende-se que num mundo

assim tumultuado a situação econômica e financeira de alguns países sofresse abalos

profundos36.

3.1 – Um mesmo fim para os envolvidos: termina a Segunda Guerra

Mundial

Tal conflito foi responsável por modificar o mapa mundial, não só

territorialmente, como também politicamente, deixando-o divido por área de influência,

e representando consequências graves não somente para os países perdedores. As

potências do eixo perderam a guerra por uma série de motivos, dos quais os principais

podem se correlacionar: o uso de recursos e a escolha de estratégias. Os recursos

combinados da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, dos Estados Unidos da

América e da Grã-Bretanha eram cada vez mais amplos. Os russos realocaram sua

produção para o leste dos montes Urais, longe das linhas de batalha e os Americanos

chegavam a pico industrial a cada ano até o final da guerra. A estratégia usada se

relacionou com a quantidade de matéria à disposição quando a vantagem tática dos

Aliados era suficiente para prejudicar a produção do Eixo. Á partir de 1942, enquanto as

potências de um lado já haviam aprendido a concorrer com a estratégia da Blitzkrieg,

produzindo porta aviões e se apoiando suficientemente em suporte aéreo, as potências do

outro não viram que assumiram tarefas demais, tendo consumo extremo contra a Grã-

Bretanha e no Oceano Pacífico em geral. Como apontado por Norman Lowe, historiador,

Hitler não precisa entender que a guerra contra a Grã-Bretanha também envolveria seu

império e que as tropas da Alemanha teriam que ser muito dispersas – na frente russa, nos

dois lados do Mediterrâneo e no litoral oeste da França. Os japoneses cometeram o

mesmo erro: nas palavras do historiador militar Liddell-Hart: “eles se dispersaram muito

além de sua capacidade de manter suas conquistas. Isso porque o Japão era uma ilha

pequena, com poder industrial limitado”37.

A estratégia dos Aliados se encaminhou, em algum momento, a construir

superioridade aérea e naval, que nas batalhas do Atlântico e Pacífico foi decisiva para

36 GIORDANI (2012, p. 763)

37 LOWE (2005, p. 126)

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 16

privar os inimigos de recursos. Com o sucesso da mesma, houve escassez de matérias

primas para o Japão de Hirohito e a Itália fascista de Mussolini, e mesmo para a nação

Nazista, uma vez que os dois primeiros precisavam importar e o último dependia de uma

vitória rápida para a guerra (ainda acreditado que haveria vitória, antes da entrada dos

Estados Unidos), estando com pouca quantidade de petróleo, por exemplo, depois de

194438.

Fora tal correlação, historiadores ainda reconhecem erros táticos graves em

ferramentas estratégicas fundamentais: os japoneses terem construído menos porta aviões

do que encouraçados, deixando seus navios expostos a bombardeios; a obsessão de Hitler

com a invasão Russa, que desgastou sua tropa na Batalha de Stalingrado (1942) e as

deixou exposta para a Normandia (1944); e o não investimento alemão na turbina a jato,

que poderia ter mudado o rumo da guerra ou pelo menos evitado os bombardeios entre

1944 e 194539.

Ao fim da Guerra, só havia lamentações. O Japão, ainda lamentando as perdas

pelos primeiros bombardeios atômicos da história, se rende em 15 de agosto de 1945,

abrindo espaço para a ocupação americana, que institui o SCAP (Supreme Commander

for the Allied Powers). A apatia de uma, por muito pensada, inadmissível derrota e o

ambiente desolador da destruição levam muitos japoneses ao suicídio. O imperador

deveria renunciar sua posição de “ser divino” e seriam impostos um código civil e uma

constituição ao país, que confirmam, em certa medida, a emancipação da mulher e

estabelecem a educação aos moldes americanos. Em longo prazo, é proibida a força

militar no Japão e abre-se espaço para diferentes partidos políticos. Os EUA cuidam do

renascimento econômico do país por causa da linha comunista que se desenvolve na

Ásia40.

A Alemanha estava com a economia desorganizada, ocupantes por todos os

lados, sem energia, comida, água, ou mesmo esperança, uma vez que as cidades pelo país

todo foram reduzidas a escombros. A Alemanha parece ainda mais atingida que o Japão.

Nas regiões ocupadas pelos soviéticos, os estupros, os raptos e os assassinatos

prosseguem durante meses. Milhares de garotas são deportadas para leste e

desapareceram nos bordéis do Exército Vermelho. Reduzidos a trabalhadores forçados, a

escravos, centenas de milhares de homens tomam a mesma direção, dos trabalhos

38 Idem

39 Idem

40 GIORDANI (2012, p. 597).

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 17

forçados de mão de obra, por conta dos acordos de Yalta que autorizam a URSS a tomar

trabalhadores por conta de compensação41.

Na Itália, o Duce e sua esposa haviam se suicidado e ocorria uma divisão no país

semelhante à França, tendo uma parte do governo ajudando as operações aliadas e,

consequentemente, culminando em uma guerra civil. A Itália já estava sobre ofensiva

aliada severa há mais tempo42.

A China continental, ainda imersa na luta pelo poder que viria a trazer duas

chinas diferentes, acabara de sair de uma Guerra Civil para enfrentar o invasor japonês.

Chiang Kai-shek, líder do partido nacionalista dos chineses, o Koumitang e Mao Tsé-

Tung, líder do Partido Comunista Chineses, uniram esforços de 1937 até o final da

Segunda Grande Guerra em 1945, somente esperando para depois retomar seu conflito.

Durante tal luta pelo poder, o comunismo não parava de espalhar sua mensagem nas terras

chinesas, disseminando a ideia e levando Mao e seu partido até a vitória, após o fim do

confronto com os japoneses. Em relação a essa expansão comunista, seria possível dizer

que ―tal medo – ou esperança – se espalhava por muitas partes do mundo‖, uma vez que

haveria um terço da população mundial sobre alguma bandeira vermelha em pouco

tempo43.

Para a União Soviética, as perdas foram inimagináveis. Entre 20 e 25 milhões

de mortos, fora os feridos, mutilados e doentes. Cidades e centenas de milhares de

vilarejos destruídos e um extremo êxodo rural em direção às cidades remanescentes. As

indústrias foram transferidas para outros extremos do país, para proteção, como o Ural e

regiões próximas da Ásia Central, Sibéria Ocidental e Extremo Oriente44.

A vitória trazia incertezas do futuro ao povo francês. As perdas humanas e as

ruínas causadas pela guerra, a sabotagem, a terra arrasada, toda a destruição de um front

do Teatro Europeu se concentrara no país por muito tempo e deixavam uma saudade

profunda e permanente. A III República é extinta para que Charles De Gaulle tente

assumir a presidência de um novo governo, mas ele se demite. É exercido um

tripartidarismo até que é adotada uma nova constituição para a IV República, que tem

suas instituições ameaçadas pela atitude do partido comunista, mostrando ruptura

ideológica no pós-guerra45.

41 MASSON (2011, p. 453-454)

42 GIORDANI (2012, p. 149)

43 BLAINEY (2011, p. 175-176)

44 GIORDANI (2012, p. 29)

43 45 Ibidem

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 18

A Grã-Bretanha agora estava à mercê dos Estados Unidos, economicamente, e

se alegrava somente por suas instituições legais e partes do sistema de governo terem

passado pela guerra de forma intacta. Como em Deighton: Durante a contenda haviam-se

conservado as instituições britânicas, embora no curso das hostilidades se tenham

suspendido muitos direitos democráticos. O Parlamento, a Monarquia e o sistema legal

mantinham-se, em 1945, como modelos de flexibilidade e eficácia num país que não

havia sido invadido e que havia lutado do começo ao fim na frente europeia. Tanto para os aliados quanto para os países do eixo, as consequências, em conjunto, foram

severas. Entre russos, poloneses, alemães, chineses, japonês, e parcelas menores de

americanos, britânicos e outros povos, milhões de pessoas morreram. Vários

representavam a parcela dos refugiados e deslocados para campos de concentração ou

trabalho forçado, gerando para as potências vitoriosas o problema do repatriamento

dessas pessoas. Na Europa, nos territórios diretamente afetados pela guerra, havia

somente devastação, ruínas e centros de produção que haviam ido abaixo, prejudicando

diversas economias. Grandes áreas da Alemanha foram deixadas em ruínas, a Rússia

ocidental fora devastada e a França teve grande parcela de sua riqueza e força de produção

perdidas, assim como o sul da Itália, em parcela menor. Vendo tal situação, as potencias

vitoriosas não permitiriam perdas iguais para ambos os lados, então logo iniciaram

acordos de paz que englobariam o possível, visto a desconfiança crescente entre a URSS

e o Ocidente. Adiante, analisaremos os acordos que geraram a nova estrutura política do

mundo e a repercussão da guerra nesse campo46.

3.2 – As conferências do pós-guerra

As cúpulas e reuniões que decidiriam os rumos de um continente ao final do

"maior dos conflitos” começaram mesmo antes de a Segunda Guerra Mundial acabar.

Como disse Deighton: Nas Conferências de Cúpula de Tehran, Yalta e Potsdam, havia-

se discutido interminavelmente o destino da Europa quando voltasse a paz, porém, na

realidade, apenas se tinha idéia da enormidade dos problemas com que se enfrentaria o

mundo pós-guerra. Até mesmo o destino da Ásia no pós-guerra foi revisto pela

Conferência do Cairo, no Egito, em novembro de 1943, entre Roosevelt, Churchill e

Shiang-Kai-check47.

46 LOWE (2005, p. 126)

47 GIORDANI (2012, p. 760).

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 19

Roosevelt, Churchill e Stálin se encontraram pela primeira vez na Conferência

de Teerã, Irã, também em novembro de 1943, onde os três líderes traçaram objetivos

militares gerais no front da Europa e da Ásia, determinando o próximo estágio da guerra

contra o Eixo. Os soviéticos concordaram em lançar uma segunda contraofensiva no

Leste e os americanos e britânicos entraram em termos sobre a Operação Overlord, que

abriria outro front pela França. Além disso, em troca do controle de algumas ilhas e portos

na Ásia, a URSS declararia guerra ao Japão uma vez que o teatro contra a Alemanha

estivesse terminado. Deu-se início à ideia de organização do pós-guerra europeu: a

Polônia, por pressão de Stálin, ganharia mais território em direção aos rios Oder e Neisse

e a Alemanha seria dividida durante sua ocupação em administrações diferentes. Essas

ideias só foram totalmente concluídas na Conferência de Potsdam em 1945. Também

houve referências e trocas de opiniões sobre uma organização que pudesse promover paz

e segurança em âmbito geral no mundo48. Já com o fim da Segunda Guerra Mundial somente no Teatro de Operações Europeu,

houve o advento da Conferência de Yalta, na Criméia, uma região da União Soviética,

antiga Rússia. Lá se encontravam o primeiro-ministro Churchill, o presidente Roosevelt

e o secretário geral do partido comunista soviético, Stálin. Essa reunião foi fundamental

para determinar os rumos de várias áreas e deixar claras diferentes tensões.

Primeiramente, foi durante esse encontro que fora proposta uma organização que poderia

assumir o fracassado legado da Liga das Nações e fazê-lo funcionar, a Organização das

Nações Unidas, que não passava de um projeto na época. Entretanto, este projeto estava

sendo finalizado com a discussão da influência das três nações, da China e da França

sobre o Conselho de Segurança, órgão que vigiaria a paz. Logo após, vieram as

negociações territoriais e estratégicas: os Estados do Leste europeu teriam seus governos

fixados, com eleições livres em cada um, e o exército vermelho os desocuparia. Porém

tais governos seriam soviéticos. O maior problema foi na fixação dos territórios poloneses

quando o líder da URSS enfrentou o da Grã-Bretanha. Além da permanência do governo

comunista instalado no país, mesmo havendo um legítimo em exílio, a nação soviética

exigia uma parte do território do leste polonês, que havia anexado em 1939. Logo, o

projeto de reorganização para a Europa parecia estar determinado em torno de barganhas

e de duas ideias de democracia divergentes49.

48 Visitado em http://history.state.gov/milestones/1937-1945/TehranConf, tradução nossa.

49 GIORDANI, LOWE (2012, p. 761 e 2005, p. 140-141)

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 20

Foi ratificada, nessa Conferência, a divisão da Alemanha em zonas de ocupação

entre os países Aliados. Ficou determinado que haveria uma divisão, no país inteiro, entre

zonas de ocupação americana, britânica e soviética, assim como em Berlin, que estaria

no meio da zona comunista. Mais tarde incluir-se-ia uma zona francesa, como exposto

por Milza, 1995: “Churchill entendia integrar a França no regulamento final, a fim de

delimitar a influência da URSS na Europa. De fato, a França obterá uma zona de

ocupação e uma cadeira no Conselho de Controle Aliado”50.

Sendo a Conferência de Yalta uma partilha do mundo em que Stálin daria as

cartas ou o estabelecimento de uma convivência para o pós-guerra, era certo que a

realidade ultrapassaria as previsões dessa cúpula51.

Fora essa, outra de mesma importância foi a Conferência de Potsdan, na

Alemanha comunista, de 17 de julho a 2 de agosto de 1945, onde mais uma vez se

encontravam os três grandes líderes: Stálin, Truman – substituto de Roosevelt, falecido

por causa de sua doença – e Churchill, que fora substituído por Clemente Attle depois.

Nessa conferência, várias das tensões e problemas vistos em Yalta voltavam, de forma

mais severa. Os soviéticos viriam a declarar guerra ao Japão no dia 8 de agosto, invadindo

a Manchúria, e as duas bombas atômicas a atingir o último remanescente do Eixo fariam

com que esse país caísse dia 10 de agosto52.

Logo sobravam tensões territoriais a serem discutidas, assim como a questão

alemã. Não havia acordo em relação ao futuro de longo prazo do país, mas foram

pensadas medidas imediatas: a desnazificação do país era algo imediato, assim como seu

desarmamento e a descentralização do governo alemão. Os então líderes do partido

nazista seriam julgados como criminosos de guerra por tribunais de exceção, como o

Tribunal de Nuremberg, e o partido seria desfeito. Não somente isso, foi acertado que a

Alemanha, mais uma vez, deveria pagar indenização aos países vencedores, das quais a

maior da dívida seria direcionada à URSS. A questão territorial ficou decidida quando foi

determinado que a Alemanha perderia grande parte do território conquistado e foi vista a

influência do parido polonês de vertente comunista que, com a ajuda do exército

vermelho, expulsou cerca de cinco milhões de alemães do leste da linha Oder-Neisse,

algo nunca previsto pelos acordos em Yalta53.

50 GIORDANI, LOWE (2012, p. 761 e 2005, p. 140-141)

51 Ibidem

52 GIORDANI, LOWE (2012, p. 762 e 2005, p. 141-142)

53 Ibidem

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 21

3.3. Nova ordem política mundial: tem início a Guerra Fria

Devido ao caos e a destruição, as potências do continente europeu saíam de seus

postos de maiores influenciadoras do mundo para dar espaço a duas novas: Os Estados

Unidos da América e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Os quatro países que

exerceram papéis centrais no passado estavam destruídos: a Alemanha estava dividida e

com seu destino entregue aos vencedores da guerra, a França e a Itália estavam devastadas

e à beira da falência e a Grã-Bretanha, que parecia promissora e intacta, sofreu graves

consequências de qualquer modo. Apesar dos inflamados discursos de presença militar

inglesa no continente, ao final da guerra, essa nação estava esgotada e obrigada a apelar

para auxílio financeiro dos Estados Unidos, rendendo-se mais a uma dependência

desconfortável. “Enfraquecido, correndo o risco de cair na sombra da história, o Velho

Continente está ainda dividido, o oeste submetido à proteção americana, o leste integrado

progressivamente ao totalitarismo soviético, pelo viés das ‘democracias populares‘”54.

Ou seja, começava um quadro tão inédito quanto o das antigas potências caindo,

o das duas novas estarem em condições totalmente diferentes dos inimigos do passado.

Os EUA e URSS já não estavam mais tão isolados do restante do mundo. Os americanos

não sofreram perdas diretas em seu território, por terem lutado a guerra fora de seu

continente, e desfrutavam de ter abastecido tanto os aliados durante a guerra, quanto

vários países logo depois dela, tendo prosperidade advinda desde materiais de guerra até

comida. Os soviéticos ainda tinham o maior exército do mundo e aumentavam sua

influência no Leste. Esse quadro é aqui colocado como inédito, pois, pela primeira vez,

os países de maior poder do mundo não tinham nenhum território no Hemisfério Sul ou

eram fronteiriços. “Washington e Moscou estavam mais distantes uma da outra do que

quaisquer capitais de dois rivais jamais haviam estado”55.

A influência dos grandes já era clara no continente europeu conforme a guerra

acabava, e se intensificou. A partir de 1945, Stálin exercia uma política de integração

forçada nos países ocupados pelo exército vermelho. Letônia, Lituânia e Estônia foram

incorporadas à União Soviética e a Tchecoslováquia teve seu controle tomado à força por

comunistas locais56.

Apesar das acusações de perseguição contra a igreja católica e a censura de

novas ideias no leste europeu, a vida se tranquilizava na medida em que a economia

54 LOWE, MASSON (2005, p. 135 e 2011, p. 473).

55 BLAINEY, LOWE (2011, p. 167 e 2005, p. 135)

56 Ibidem

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 22

voltava a dar passos firmes. Nessa região do Leste, dizia-se que “a maior parte das pessoas

conseguiu moradia (embora bem pequena), acesso á médicos e hospitais, férias

remuneradas, cerveja e tabaco. Aqueles que estavam na parte de baixo da pirâmide social

possuíam mais bens matérias do que seus avós haviam possuído quando tinham a mesma

idade”57.

Portanto, para o lado soviético, havia uma crescente expansão com relação à

política externa: ocorreu a criação do Cominform em 1947, para substituir a antigo

Comintern (Internacional Comunista), com sede em Belgrado, que tinha como função

exercer controle de informação sobre os partidos comunistas europeus; foi feito o

Comecon em 1949, um conselho de assistência econômica exclusivo para os países

comunistas; e em 1948 a Iugoslávia rompeu relações com Moscou, sendo expulsa do

Cominform, por apresentar desvios do “comunismo verdadeiro”58.

Já para os americanos, a estratégia era conter tal expansão vermelha: para não se

sentir cúmplice na imposição comunista a nenhum país, o presidente Truman mostra

oposição dentro da Grécia e da Turquia, com o discurso de garantir a liberdade dos povos,

aprovando o Plano Marshall, opositor do Comecon, para começar os investimentos na

Europa ocidental, principalmente na Alemanha capitalista. Além disso, é fundada a

Organização do Tratado do Atlântico Norte, aliança militar que interviria nos países que

se sentissem ameaçados pelo comunismo, a qual o Pacto de Varsóvia veio a se opor mais

tarde59. Tal influência oposto não poderia ser mais clara na Alemanha dividida pelas conferências

do pós-guerra. Os soviéticos retiravam recursos da parte oriental, como pagamento de

indenização, e os americanos injetavam dinheiro na economia da parte ocidental. Com a

evasão de habitantes da zona soviética para a americana, a questão passou de econômica

para ideológica e política: haveria agora a República Federativa da Alemanha, no Oeste,

e a República Popular Alemã, no Leste. A competição no local era tamanha que em 1947,

Stálin ordenou o bloqueio de suprimentos pelas linhas terrestres, obrigando o governo

americano a abastecer Berlim, a cidade que fora igualmente dividida, mas que se

localizava toda em território soviético, por ar60.

O mundo agora se encontrava frente a uma nova situação geopolítica, militar,

econômica, recursal e ideológica: com a competição das duas grandes potencias, sem

confronto direto, mas sim por propagandas e medidas, existia o advento da Guerra Fria.

57 Ibidem

58 GIORDANI (2012, p. 293)

59 Ibidem

60 BLAINEY (2011, p. 169-170)

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 23

Esse termo fora cunhado por Bernard Baruch, financista americano, em 1947, para

designar a situação. Juntamente com o termo Cortina de Ferro, passou a ser uma constante

no dia a dia de qualquer um. Cortina de ferro é o termo utilizado para definir o escudo

comunista que se estende continentalmente de forma a tocar tanto o Mar Báltico quanto

o Mar Negro e se originou em 1920, quando Ethel Snowden esteve em São Petersburgo

com uma delegação do Partido Trabalhista Britânico, sendo popularizado na presente

conjuntura por Churchill61.

Ocorria também outro fenômeno que abalava a influência do velho mundo e

reafirmava o lugar das novas superpotências: o processo de descolonização mundial.

Havia verdadeiros impérios coloniais até o final da Segunda Guerra, sendo o britânico o

maior, seguido do francês e depois outros como o holandês, o belga, o português, o

espanhol e o italiano (composto de somente três colônias)62.

Primeiramente, o fato de a nação japonesa ter dominado tantos territórios ao

longo das áreas coloniais da Europa, tais como na Malásia, Cingapura e Birmânia,

Indochina Francesa e Índias Orientais Holandesas, e de cada área ter lutado contra os

invasores, tornava mais do que claro que esses futuros países agora não mais pretendiam

voltar ao controle europeu. Juntamente a ideia de irreverência às ingerências externas

aplicava-se uma questão ideológica referente à consciência política e social, resultado da

participação de africanos e asiáticos na guerra63. Em segundo lugar, nas colônias vítimas do grande conflito que foi essa Guerra Mundial,

o nacionalismo, que já existia desde antes da guerra, crescia até mesmo dentro das

políticas europeias: visando a não aliança de suas colônias com o Império Japonês, alguns

países prometeram uma relativa independência à suas colônias depois da guerra e, assim,

houve o advento da Carta do Atlântico64. A Europa já não mais podia controlá-las como

antes, por ter de se preocupar com desgaste militar: empreender seus exércitos para

reprimir movimentos de independência era algo quase inviável após a Segunda Guerra

Mundial. Sendo assim, as novas superpotências mundiais contribuíam para a questão

quando pressionavam a descolonização para acelerá-la. De um lado, os Estados Unidos

61 Ibidem

62 LOWE (2005, p. 136 e 527)

63 Ibidem

64 Carta que estabelecia pontos sobre a independência de vários países, uma que Chruchill almejava que

servisse somente para os países vítimas das agressões da Alemanha, apesar de a ONU ter adotados políticas

diferentes em relação a ela, concordando mais com a ideia estadunidense de que servia para todas as

colônias. Entre os pontos da carta havia um onde se ratificava que os países não deviam se expandir

tomando o território de outros; noutro declarava-se que todos os povos deviam ter o direito de escolher seu

próprio governo

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miniTEMAS | 24

defendiam que a Carta do Atlântico servia para todos os povos e do outro a União

Soviética entrava em contato direto com certas nações africanas para auxiliar seus

processos de independência. O motivo é de que para cada país que tivesse a

independência pela ajuda americana ou soviética, haveria um a mais na contagem de

capitalistas ou comunistas no mundo, na pior das hipóteses sendo mercados potenciais

para influência econômica também65.

Percebe-se a Guerra Fria hoje como uma realidade e consequência

inevitável da Segunda Grande Guerra, uma vez que as tensões já se mostravam a partir

do final dessa. Cada bloco tem sua ideologia, suas medidas, sua proteção, seus objetivos

e seus medos. A bipolaridade se mostra em profundas concepções sobre a vida política,

social e moral dos cidadãos e deve ser enfrentada. Cabe aos blocos decidir o destino da

história, não de um continente ou faceta de poder, mas do mundo66.

4. A Guerra Fria (1946-1962)

Se não existissem Estados distintos, não haveria competição entre

eles e, por conseguinte, não existiria guerra fria nem o perigo de que

essa guerra se converta, em um dado momento, em uma disputa

bélica de fato.

Mas sempre existiram povos diversos e sempre existiu competição

entre eles, e essa competição, que circunstancialmente foi chamada

de guerra fria, só foi interrompida pela verdadeira guerra.

(Mariano Rubió y Tudurí.)67.

Na busca por uma hegemonia planetária, Estados Unidos (EUA) e União

Soviética (URSS), após o fim da Segunda Guerra Mundial, entraram em uma ferrenha

competição bélico-nuclear, espacial e ideológica68, que colocou todo o mundo sob uma

crescente tensão política. Assim, o cenário internacional se viu bipolarizado, dividido em

duas grandes áreas de influência: uma capitalista, liderada pelos norte-americanos, e outra

socialista, liderada pelos soviéticos. Esse período principiado no pós Segunda Guerra é

denominado Guerra Fria, exatamente por consistir em uma época de grande atrito entre

as duas potências, mas atrito esse que ainda não deflagrou nenhum conflito direto entre

os principais Estados envolvidos, apesar de estar repercutindo enormemente em todas as

65 LOWE (2005, p. 136 e 527-530)

66 GIORDANI (2012, p. 764)

67 TUDURÍ (1955) (Tradução livre).

68 PAZZINATO, SENISE (2006).

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miniTEMAS | 25

regiões do planeta. A expressão “Guerra Fria” foi criada por Bernard Baruch, acessor

presidencial dos Estados Unidos, em 1947, no intuito de se referir à crescente rivalidade

entre os EUA e a URSS, no período pós-guerra. Dessa forma, a Guerra Fria é marcada pela peculiar situação de uma tensão constante, em

que os cidadãos, tanto do bloco capitalista quanto do socialista, vivem em uma

permanente incerteza acerca dos rumos políticos e militares que podem ser tomados. O

único fator que impede a deflagração de uma terceira guerra mundial é a “destruição

mútua inevitável” (MAD, em inglês mutually asured destruction), que, ainda assim, é

mais uma suposição em que os indivíduos se fiam, do que uma certeza que eles

compartilham. Entretanto, apesar dos discursos políticos inflamados, os governantes

norte-americanos e soviéticos respeitam consideravelmente as áreas de influência das

respectivas potências, sem que haja o claro intuito, por qualquer uma das partes, de alterar

a divisão do globo (que já está segmentado em áreas influenciadas pelos Estados Unidos

e pela União Soviética)69.

Segundo Thomas W. Wilson (1964), apesar de haver divergências entre os

historiadores acerca da data precisa do início da Guerra Fria, pode-se considerar como

um de seus marcos iniciais março de 1946, quando os Estados Unidos começaram a guiar

suas políticas no sentido de impedir a expansão do poderio soviético tendo se passado

seis meses do término da Segunda Guerra Mundial no Pacífico70. Essa data marca a

decisão do presidente norte-americano H. Truman, de findar com as intenções da URSS

em tomar o Irã. Decisão que foi apenas a primeira de uma série de medidas que teriam

como fim último assegurar a área de influência dos EUA e que teriam como consequência

medidas similares vindas da União Soviética, que também objetivava assegurar sua área

de influência.

Assim, é possível considerar como as principais características desse período, a

bipolaridade do poder planetário e a universalidade das relações entre os Estados71. A

bipolaridade advém, como já expresso, do conflito, até certo ponto, velado entre EUA e

URSS, países esses que apresentaram uma expressiva ascensão no pós-guerra, quando do

enfraquecimento geopolítico das antigas potências europeias. Já a universalidade das

relações dos Estados é fruto, como assinalado por Magnoli (1996), “da desagregação

definitiva dos impérios coloniais”. Com isso, houve a efetivação de um cenário de

verdadeiro intercâmbio diplomático, já iniciado com a criação da Organização das

Nações Unidas. Esse contexto universalista, ainda segundo Magnoli (1996), convergiu

69 HOBSBAWM (2009). 70 WILSON (1964). 71 MAGNOLI (1996).

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miniTEMAS | 26

para o estopim de diversos conflitos regionais, que demonstravam o aumento dos

antagonismos de diferentes Estados, em decorrência do crescimento das interações entre

eles.

Nas palavras de Henry Kissinger – homem de grande influência no âmbito

diplomático dos governos de Richard Nixon e Gerald Ford, dos Estados Unidos: “A

diplomacia contemporânea se desenvolve em circunstâncias sem precedentes. Raras

vezes existiu base menor de entendimento entre as grandes potências, mas jamais foi tão

coibido o uso da força”72. O que assinala como o período da Guerra Fria é marcado pela

inviabilidade da paz e pela impossibilidade da guerra, enquanto os cidadãos vivem sob

uma pressão propagandística e ideológica, de sorte que temem por seu futuro e pelo

próprio presente. Entrementes, apesar do continuado clima de tensão e instabilidade internacional, é

possível delimitar como o período mais crítico dessa guerra, os anos entre 1948 e 1953.

Em 1953, após a morte de Stalin, há quem afirme que a Guerra Fria teria se findado7373,

o que não é exatamente verdade, especialmente quando consideradas a crise de 196, que

envolveu o Muro de Berlim.

4.1. Os norte-americanos e o capitalismo

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, a ascensão norte-americana como

notória potência internacional torna-se evidente. O dólar tornou-se a moeda universal, de

forma a demonstrar que os EUA eram credores das principais antigas potências e de

outros Estados ainda em desenvolvimento; as forças armadas dos Estados Unidos

comandavam as alianças político militares capitalistas, em virtude desse país possuir,

primeiramente armamento nuclear e, posteriormente, a bomba de hidrogênio, os super

bombardeiros dispersos no território europeu e os mísseis intercontinentais com bases

terrestres ou em submarinos; e a Guerra Fria adquiriu o contorno estipulado pela política

externa de Washington74. Assim, observa-se a formação de toda uma região submetida

diretamente à influência norte-americana, região essa que passou a receber o pleno

suporte dos EUA no intuito de evitar a expansão soviética e fortalecer o bloco capitalista.

O início dos movimentos de Washington no sentido de promover essa interação

capitalista deu-se durante a realização das conferências de Yalta e de Postdam, quando

72 Ibdem. 73 MAGNOLI (1996). 74 Ibdem.

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miniTEMAS | 27

da rendição alemã e japonesa75. Foi nesse momento que os Estados Unidos começaram a

perceber o fortalecimento político da URSS em face do enfraquecimento das antigas

potências europeias, que saíram endividadas e destruídas da Guerra. O governo de

Truman, despido dos ideais conciliatórios de Roosvelt, em virtude do monopólio da

bomba atômica76, questiona, então, as decisões obtidas em Yalta, de modo a indicar a

necessidade da diminuição das concessões feitas a Moscou quando dessa reunião.

Logo ao final da Segunda Guerra, ainda em 1945, os Estados Unidos já criam o

Comitê de Investigação de Atividades Antiamericanas do Senado dos Estados Unidos

(CAA), como um subcomitê do Comitê de Negócios Governamentais e Segurança

Nacional do Senado dos Estados Unidos, e coordenado por Joseph McCarthy, senador

pelo partido republicano77. Esse comitê nasce no contexto do crescente medo do “perigo

vermelho”, isto é, da expansão do poderio soviético, que poderia culminar no

alastramento do socialismo pelo mundo. A partir de 1947, o CAA instaura nos EUA um clima de “caça às bruxas”, em que foram criadas listas negras de acusados por

manterem atividades subversivas, cientistas, literários e cineastas foram duramente

perseguidos, os acusados eram intimados a participarem de audiências públicas e suas

penas eram extremamente severas – chegando até à pena capital78. Esse quadro perdurou

até 1954, quando as medidas de McCarty foram publicamente censuradas pelo Senado, o

que o obrigou a encerrar sua atuação política, de sorte que a perseguição aos supostos

socialistas foi significativamente refreada.

Da criação da CAA, é possível depreender o quão temerosa estava a sociedade

americana como um todo – não só os meios políticos – de uma possível expansão da

ideologia soviética. E esse temor era oriundo de uma intensa propaganda governamental,

em que se exaltava o capitalismo como o perfeito canal para efetivação da liberdade

individual79 e de uma sociedade justa, fundamentada no princípio da meritocracia;

enquanto se apresentava o socialismo como o causador da miséria e destituidor da

legítima propriedade privada. Com isso, até determinado ponto, as medidas de McCarthy

obtiveram apoio popular, visto que se propunham a livrar a população norte-americana

da ameaça socialista.

75 Ibdem.

76 Ibdem.

77 PAZZINATO, SENISE. (2006). 78 Como exemplo é possível citar a perseguição que Charles Chaplin, Fred Zinemann e Robert Oppenheimer sofreram, além do caso do casal de cientistas Julius Ethel Rosemberg. Para mais informações ver: SCHWARTZMAN, Simon. A Ciência no Período Pós Guerra (Palestra proferida por ocasião do "II Módulo do Programa de Política e Administração em Ciência e Tecnologia" 1989); HELLMAN, Lillian. A Caça às Bruxas. 2010. 79 BAILEY (1950).

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Independentemente dessas medidas do senador republicano, o clima de

indisposição entre URSS e EUA se manteve, com uma clara tendência a crescer

continuamente. Assim, em fevereiro de 194780, houve a consolidação de uma explícita

política norte-americana que visava o fortalecimento dos aliados capitalistas, a chamada

―Doutrina Truman‖.

Segundo D. Magnoli (1996, pg. 53):

A Doutrina Truman baseava-se na noção operacional de contenção,

desenvolvida pelo conselheiro americano na embaixada em Moscou, George

Frost Kennan. Segundo essa concepção, a União Soviética apresentaria um

antagonismo inconciliável com o mundo capitalista, e a sua „tendência

expansionista‟ só poderia ser detida mediante a „hábil e vigilante aplicação de

uma contraforça em uma série de pontos geográficos e políticos em constante

mudança, correspondentes às mudanças e manobras da política soviética. A definição dessa nova política não se configurou como um ato isolado de qualquer

motivação. O incidente que a originou foi a suspensão, em 1947, por parte da Grã-

Bretanha, do suporte financeiro e bélico dado à Grécia e à Turquia. Isso, pois os

britânicos, como saíram endividados da Segunda Guerra, precisavam reduzir alguns

gastos a fim de poderem reestruturar sua economia internamente. Entretanto, tanto a

Grécia quanto a Turquia constituíam importantes aliados do bloco capitalista, devido a

sua estratégica localização na Península Balcânica. Assim os Estados Unidos decidem

assumir o papel anteriormente exercido pela Grã-Bretanha e fornecer o suporte necessário

aos dois países. Esse foi o primeiro passo que culminou na execução de projetos como o

Plano Marshall e o Plano Colombo, que visavam possibilitar a reconstrução dos países

da Europa e da Ásia, respectivamente, no pós Segunda Guerra, antes que eles decidissem

aderir ao bloco socialista81.

Outro mecanismo de união dos países capitalistas foi a criação da Organização

do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em abril de 1949. Ela surgiu em meio à crise do

Bloqueio de Berlim e era composta, originalmente, pelos Estados Unidos, Canadá,

Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Grã-Bretanha, Grécia, Holanda, Islândia, Itália,

Luxemburgo, Noruega, Portugal, República Federal da Alemanha e Turquia82.

Já no que tange o desenvolvimento tecnológico, a Guerra Fria ocasionou grandes

avanços para os Estados Unidos, que entraram em uma corrida espacial e armamentista

com a União Soviética. Apesar de não terem sido os EUA a deflagrarem a corrida espacial

80 WILSON (1964).

81 MAGNOLI (1996).

82 Ibdem.

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(em 1957 a URSS lança o satélite Sputinik I na órbita da Terra e no mesmo ano a cadela

Laika foi enviada ao espaço tripulando a nave Sputinik II, em 1961 foi lançada a nave

Vostok 1, com Yúri Gagárin, o primeiro homem a fazer um vôo orbital83), em 31 de

janeiro de 1958 foi lançado o satélite Explorer I e em julho do mesmo ano foi criada a

NASA (sigla em inglês para Administração Nacional da Aeronáutica e do Espaço),

responsável pelo crescimento das pesquisas norte-americanas nesse setor. Esse

organismo centralizou as atividades do país relativas ao desenvolvimento de novas

tecnologias que viabilizassem a chegada do homem à Lua, o que, em 1960, foi declarado

como a principal meta a ser alcançada. Como um fruto dessa busca por ultrapassar os

limites da Terra, começou a alçar no imaginário da população questões como a

possibilidade de vida extraterrena e a viabilidade de homens habitarem lugares outros que

a Terra. Por outro lado, na corrida armamentista, foram os Estados Unidos que deram o primeiro

passo em agosto de 1945, com a explosão das bombas de Hiroshima e Nagasaki. Somente

em 1949 a URSS conseguiu realizar o seu primeiro teste nuclear e apenas a partir de 1951

ela passou a deter um arsenal capaz de incomodar, até certo ponto, os norte-americanos.

Daí a criação da bomba de hidrogênio e a posse de mísseis intercontinentais foram passos

quase naturais do governo dos EUA, no intuito de estar sempre um nível acima do poderio

bélico soviético.

Essa corrida armamentista proporcionou, ainda, aos norte-americanos a

formação de uma ampla rede de organismos de inteligência, tanto nas forças armadas,

quanto fora delas84. Aqui, cabe salientar o papel de destaque que essas organizações

tiveram para influenciar os rumos políticos seguidos especialmente pelos Estados

capitalistas; como exemplo é possível citar a ascensão de ditaduras de direita na América

Latina, que tiveram o suporte desses organismos de inteligência.

4.2. O efeito soviético

Após o fim da Segunda Guerra, começaram a surgir no Leste Europeu diversos

regimes socialistas burocráticos de Estado, isto é, as democracias populares85. Elas

consistiram na mais evidente materialização da área de influência da União Soviética,

83 PAZZINATO, SENISE (2006).

84 BAILEY (1950). 85 PAZZINATO, SENISE (2006).

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miniTEMAS | 30

que havia sido legitimada no cenário internacional nas conferências de Yalta e Postdam.

Deu-se, assim, a estruturação do bloco socialista, composto por países de economia

planificada e governados – majoritariamente – por um partido único, o Partido

Comunista86. Essa estruturação constitui-se em uma resposta à Doutrina

Truman e ao Plano Marshall, na medida em que transformou a “faixa de segurança” da

Europa oriental em um bloco de Estados satélites da União Soviética87.

No pós Segunda Guerra, a URSS encontrava-se sob a ditadura pessoal de

Josef Stalin, que já havia eliminado todos os seus adversários comunistas através dos

―Processos de Moscou‖ da década de 30 e consolidado seu controle sobre o Partido

Comunista da União Soviética (PCUS) e sobre o exército durante a Segunda Grande

Guerra88. Assim, Stalin passa a atuar sobre todos os Partidos Comunistas do Leste

Europeu, no intuito de eliminar todas aquelas figuras que se opunham a seu governo. O

único Estado que escapou do expurgo emanado de Moscou foi a Iugoslávia, que, apesar

de socialista, manteve-se neutra durante a Guerra Fria. Em 1949, foi criado o COMECON (Conselho Econômico para Assistência Mútua), cujos

membros iniciais eram União Soviética, Alemanha Oriental, Tchecoslováquia, Polônia,

Bulgária, Hungria e Romênia. O Conselho pode ser compreendido como análogo ao

Plano Marshall dos Estados Unidos, uma vez que objetivava reestruturar a economia do

Leste Europeu, ao mesmo tempo em que centralizava o controle dessa economia em

Moscou89.

A ascensão de Nikita Krushev, em 1956, ao governo da URSS (após e morte

de Stalin em 1953) proporcionou a consecução de uma política mais liberalizante do

regime soviético – processo conhecido como desestalinização do regime. Como o

governo chinês claramente alinhava-se aos defensores da antiga postura stalinista, por

considerarem os norte-americanos indignos de confiança, em 1960, após a ida de Kruchev

aos EUA, ocorre a primeira separação entre a URSS e a China90.

Entrementes, é preciso considerar que as medidas do novo líder a União

Soviética não foram fortuitas, nem fruto de meros caprichos pessoais. Nikita Kruchev

estava inserido em um contexto em que já havia uma significativa pressão internacional

no sentido de se condenar as práticas autoritárias – e, mais do que isso, práticas que

violavam os direitos humanos – cometidas por Stálin. Além disso, apesar da URSS ter

86 PAZZINATO, SENISE (2006).

87 MAGNOLI (1996). 88 Ibdem.

89 Ibdem 90 Ibdem.

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miniTEMAS | 31

explodido sua primeira ogiva nuclear em 194991, os Estados Unidos ainda detinham um

poderio bélico consideravelmente superior, de forma que era mais seguro para os

soviéticos garantirem uma convivência, até certo ponto, pacífica com os norte-

americanos. Daí, Kruchev ter se sentido impelido a adotar medidas mais liberalizantes do

que o seu antecessor.

Todos esses fatos não podem dar a entender que Kruchev estava abrindo a URSS

para o capitalismo, ou abrindo espaço para uma supremacia norte-americana. Isso, pois,

ao mesmo tempo em que as novas medidas foram implementadas, Moscou continuava

atenta no sentido de garantir, ou até ampliar, sua área de influência. Tanto que em 1955

foi criado o Pacto de Varsóvia92 (uma resposta à criação da OTAN em 1949) e o novo

governante continuou a sustentar essa aliança militar93. Aliança esta composta pelos

países europeus de economia planificada (União Soviética, Alemanha Oriental, Bulgária,

Polônia, Hungria, Tchecoslováquia, Romênia e Albânia) e que representava uma proteção

mútua que esses Estados se ofereciam – visto que, caso algum deles fosse atacado por um

inimigo externo, isso representaria um ataque simultâneo a todos os demais membros.

4.3 – Equilíbrio de forças

O “Equilíbrio do Terror” se deu a partir do momento em que tanto os Estado

Unidos quanto a União Soviética detinham significativo arsenal bélico nuclear, o que

tornava qualquer possibilidade de confronto direto entre as duas potências uma

consideração meramente teórica, pelo fato de que o ônus que seria gerado a ambos os

Estados seria excessivamente superior a qualquer possibilidade de lucro9494. Esse

equilíbrio de forças não trouxe o fim das tensões entre o bloco capitalista e o socialista,

apesar de tê-lo suavizado.

Mesmo conscientes de que a agressão militar efetiva ao outro bloco

proporcionaria sua própria destruição, tanto os Estados Unidos quanto a União Soviética

mantiveram suas pregações ideológicas e suas tentativas de influir nas políticas internas

dos países que estavam em sua zona de influência (e, talvez, tentativas até de atrair novos

91 MAGNOLI (1996). 92 MAGNOLI (1996).

93 Cabe salientar que, a partir desse novo momento, o Pacto de Varsóvia deixou de ter como principal

função a proteção militar dos integrantes, de sorte que adquiriu uma função muito mais política, no sentido

de integrar e fortalecer a união bloco socialista.

94 MAGNOLI (1996).

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miniTEMAS | 32

Estados para essa área de influência). Insistência esta que se deu em virtude de o objetivo

nunca ter sido – ou no mínimo já não o ser – a destruição completa do bloco de oposição,

mas, antes, a comprovação teórica e empírica de que essa oposição adotava uma política

ineficiente e, por isso, falha9595. Daí o intenso merchandasing, as alianças feitas com o

maior número de Estados possível e, especialmente, as ideias incutidas no inconsciente

das pessoas – no intuito de exaltar a própria ideologia e rebaixar a outra.

Assim, o clima de tensão perdurou mesmo após ambas as potências disporem de

bombas atômicas e de hidrogênio. O risco de uma destruição instantânea não pairava

apenas sobre elas, mas sobre todos os seus aliados, em especial sobre os países europeus

que se localizavam no limiar das duas áreas de influência, o que veio a reforçar – ainda

que indiretamente – a importância dos acordos de mútua proteção, como a OTAN e o

Pacto de Varsóvia. Com relação à população em geral, que não dispunha das mesmas

informações que os chefes de Estado e que vivia sob os efeitos de uma intensa propaganda

ideológica, os riscos pareciam ainda mais eminentes, pois, aparentemente, tudo dependia

dos interesses do comandante do bloco político antagônico, que era apresentado como

instável e não confiável.

4.4 - Uma Europa dividida

Com a fim da Segunda Guerra, a Europa deixa de ser o principal centro

econômico e político, apesar do Velho Continente manter grande destaque e influência

no meio internacional. Mesmo com os Estados Unidos e a União Soviética terem se

tornado os principais pólos ideológicos, é preciso observar que muitas das ações dessas

potências tinham como alvo a obtenção do apoio dos europeus. Consequentemente, a

Europa acaba dividida em áreas de influência norte americana e soviética, tendo

constituído palco para eventos que solidificaram a bipolarização mundial.

Como marco dessa divisão do continente europeu, é possível citar a “Cortina de

Ferro”, um marco divisório abstrato entre os Estados alinhados à URSS e os alinhados

aos EUA. Essa expressão foi primeiramente utilizada em março de 1946, por Winston

Churchill, não mais na posição de primeiro ministro britânico, quando de um discurso em

Fulton (Missouri, EUA) para diversas autoridades presentes. Nesse discurso, “Churchill

acusava os soviéticos de promoverem a satelitização dos Estados do Leste Europeu e

95 MAGNOLI (1996).

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chamava os Estados Unidos a assumirem a liderança ocidental contra a tirania instalada

naqueles países”96 96. Assim, evidencia-se a dicotomia instaurada no território europeu,

entre os países capitalistas e os socialistas.

A parte capitalista da Europa foi a primeira a sofrer influências da Doutrina

Truman, por ter sido o alvo imediato do Plano Marshall, formulado em 1947, pelo

Secretário de Estado norte-americano George Marshall. Esse Plano consistiu em um

instrumento de solidificação da área de influência norte-americana na Europa e em uma

tentativa de suporte econômico aos Estados europeus que ainda sofriam com os reflexos

da Segunda Guerra em seu sistema financeiro. A crise vivenciada pela Europa envolvia

o racionamento de alimentos e energia, o crescimento da taxa de desemprego e a

diminuição das exportações9797, o que foi agravado pela recessão vivenciada em alguns

Estados e colocou diversas famílias, já vitimadas pelo conflito, em condições subumanas

de vida. Logo, o plano de incentivo econômico se propunha a reestruturar financeiramente

esse continente, que havia sido o mais desestruturado pela Segunda Guerra. Aqui, é

importante ressaltar que esse plano não constituiu uma ação meramente benevolente dos

EUA para com os cidadãos dos Estados que foram devastados pela Segunda Guerra. Foi,

antes de tudo, uma estratégia de Washington para garantir sua influência na Europa e para

assegurar parceiros comerciais aptos a honrarem com seus acordos e a efetivarem novos.

Como uma espécie de resposta ao Plano Marshall, a URSS se fechou

completamente para os países do bloco capitalista e recriou a Internacional Comunista9898

na figura do Cominform, que reuniu, sob o comando do Partido Comunista da União

Soviética, os Partidos Comunistas do Leste

Europeu, bem como os da França e da Itália99. Isso, no intuito de fortalecer suas alianças

políticas, assim como sua hegemonia na Europa oriental.

Duas situações ilustram claramente a divisão do continente europeu em dois

blocos: a construção do Muro de Berlim (ocorrida na madrugada de 13 de agosto de

1961), que materializou o conceito da Cortina de Ferro, e a divisão dos países europeus

em basicamente dois grupos, os membros da OTAN e os membros do Pacto de

Varsóvia100. Naturalmente existiam aqueles países que se mantiveram neutros, entretanto,

eles eram minoria. 96 MAGNOLI (1996, pg. 52). 97 HOBSBAWM (2009). 98 Ibdem.

99 PAZZINATO, SENISE (2006). 100 PAZZINATO, SENISE (2006).

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No que tange aos Estados que adotaram uma postura de neutralidade, é possível

dividí-los em dois grupos: socialista e capitalista. Esses países, apesar de adotarem

políticas semelhantes a uma das potências, não vincularam necessariamente suas ações

às medidas adotadas pelos EUA ou pela URSS. No grupo dos países neutros de economia

socialista, encontra-se a Iugoslávia e a Albânia. Já dentre os países de economia

capitalista que se mantiveram neutros, é possível assinalar a Suíça, a Suécia, a Finlândia

e a Áustria.

4.5 – Guerras, revoluções e transformações no oriente

O encerramento da Segunda Grande Guerra proporcionou à URSS a

oportunidade de expandir sua área de influência especialmente para a Ásia, região em que

foram formados governos que seguiam os padrões da democracia popular soviética. O

exemplo mais notório de um Estado que aderiu ao socialismo e tornou-se forte aliado da

União Soviética – ao menos por certo período de tempo – é a China. A República popular da China, proclamada por Mao Tsé-tung em 1º de outubro de 1949,

em um primeiro momento, alinhou-se com as políticas de Moscou. As primeiras medidas

dessa República foram a implementação da reforma agrária, a expropriação de empresas

estrangeiras e a ratificação de um Tratado de Cooperação com a União Soviética (que

visava a obtenção de recursos para a reconstrução do país), o incentivo à formação de

cooperativas camponesas e o processo de industrialização (que priorizou as indústrias

pesadas)101. Essa política inicial da China foi chamada de ―grande salto para frente‖,

tendo imposto a coletivização agrícola e fundido as cooperativas agrícolas em ―comunas

populares‖. Apesar do entusiasmo gerado na população, seu resultado agricultura também

não ascendeu como o esperado, em virtude de problemas climáticos ocorridos entre os

anos de 1959 e 1960.

Em 1960, quando do primeiro rompimento entre China e URSS, os dois Estados

acabaram rompendo suas relações diplomáticas, o que ocasionou diversos problemas nas

fronteiras e uma polêmica ideológica102 – sobre qual a forma de socialismo defendida

seria a mais adequada.

Entretanto, a Revolução Chinesa não teve repercussões apenas no que se refere

às relações entre a URSS e a China propriamente. Com o advento dessa revolução, os

101 PAZZINATO, SENISE (2006). 102PAZZINATO, SENISE (2006).

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Estados Unidos alarmaram-se quanto à possibilidade de outros Estados asiáticos

adotarem uma economia planificada, nos padrões soviéticos, de sorte que o governo

norte-americano implementou, em 1951, o ―Plano Colombo‖ – que seguiu os mesmos

moldes do Plano Marshall.

Outro reflexo do acirramento das disputas por áreas de influência na Ásia foi a

Guerra das Coreias, que eclodiu em 1950. Desde 1945, com a derrota do Japão na

Segunda Guerra, a Coreia foi dividida no paralelo de 38º, de sorte que a parte norte era

gerenciada pela União Soviética e a sul, pelos Estados Unidos. Já em 1948, houve um

agravamento das tensões locais, que culminou, em 1949, na formação da República

Democrática Popular da Coreia (ao norte) e da República da Coreia (ao sul), de modo que

ambos os governos reclamavam o controle total do território coreano103. Com a retirada

das tropas soviéticas e norte americanas, em 1948 e 1949 respectivamente, ambos os

governos começaram uma intensa campanha propagandística, que acabou por acirrar as

disputas já existentes.

Sob a alegação da Coreia do Sul ter violado o limite do paralelo de 38º, em junho

de 1950, o governo da República Democrática Popular da Coreia promoveu um ataque

surpresa ao território sul coreano. Em resposta, o Conselho de Segurança da ONU

(CSNU), após forte pressão dos Estados Unidos, declararam a Coreia do Norte como

nação agressora e nomeou o norte-americano MacArthur como chefe das operações de

intervenção na região em conflito. Aqui, é preciso observar que a União Soviética se

encontrava ausente na reunião do CSNU, de forma que evitou pronunciar-se quanto à

intervenção na Coreia. Em contrapartida, em outubro de 1950 a China efetiva seu apoio

à Coreia do Norte, de modo a enviar tropas para região, o que obrigou a ofensiva de

MacArthur a recuar de volta para o paralelo 38104.

Esse conflito perdurou até 1953, quando foi assinado o Armistício de

Pannumjom, que restabeleceu a paz da região ao manter como marco divisório das duas

Coreias o paralelo 38105.

Entrementes, apesar de o conflito em si ter terminado, a região continuou como

foco de certa tensão, especialmente por ilustrar claramente a bipolarização mundial entre

os socialistas e os capitalistas.

103 PAZZINATO, SENISE (2006). 104 PAZZINATO, SENISE (2006). 105 MAGNOLI (1996).

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Ainda na Península Asiática, merece destaque o conflito iniciado em 1959, entre

o Vietnã do Norte e o Vietnã do Sul. Essa disputa remonta ao período da Segunda Guerra

Mundial, quando a região da Indochina foi invadida pelo Japão (1941). Nesse momento,

os VietCongs, liderados por Ho Chi Minh, reuniram-se de modo a formar a Liga

Revolucionária para a Independência do Vietnã – que tinha ligações com o Partido

Comunista. Após terem vencido os japoneses, eles iniciaram seu processo de

descolonização, o que os fez entrar em um novo combate com a França, sua antiga

metrópole. A paz só voltou a ser estabelecida na região em 1954, quando na Conferência

de Genebra foi reconhecida a paz do Vietnã, bem como de Laos e do Camboja. Aqui

também ficou estabelecida a divisão em Vietnã do Norte e Vietnã do Sul, liderados por

Ho Chin Minh e Ngo Dinh-Diem, respectivamente. Essa divisão perduraria até 1956, data

em que deveriam ocorrer eleições que reunificassem o país.

Entretanto, em 1955 Ngo Diem deu um golpe e tornou-se ditador do Vietnã do

Sul, que foi proclamado como independente. Ele recebeu o apoio dos norte-americanos,

que temiam a provável vitória dos partidários de Ho Chi Minh, ligado à ala socialista106.

A possível vitória de um governante socialista no Vietnã era tida como preocupante, pois

poderia desencadear um “efeito dominó” em meio a todos os países que estavam se

tornando independentes, o que acarretaria a expansão do modelo de democracia popular

soviética em detrimento do padrão de economia de mercado norte-americano. Essa

ingerência dos EUA, por sua vez, contribuiu com o surgimento dos grupos de oposição,

que questionavam a intervenção norte-americana e eram favoráveis ao governo de Ho

Chi Minh, a Frente Nacional de Libertação e o exército VietCong107.

Essa presença no Vietnã não constitui, entretanto, o único ato de ingerência

norte-americana na região fronteiriça com a URSS. Em 1959, foi feito um acordo entre

os Estados Unidos e a Turquia, segundo o qual seriam instalados 15 mísseis balísticos de

médio alcance (MRBM, sigla em inglês para medium-range ballistic missile) no país.

Esse esquadrão de mísseis, do tipo PGM Júpiter, terminou de ser instalado na região

próxima da cidade de Izmir em abril de 1962, o que deixou o governo de Krushev

consideravelmente alarmado, em virtude dos riscos que a presença desses armamentos na

região poderia trazer para a estabilidade de seu governo.

106 The Air Force in the Vietnam War. Aerospace Education Foundation (2004). 107 Para mais informações ver: GERSTLE, Gary. Na sombra do Vietnã: o nacionalismo liberal e o problema da guerra; MILLER, Bruna, MOTA, Nathália, BELLAS, Leonardo. Vietnã, todos nós estivemos lá: o impacto da guerra nos ex combatentes e na sociedade como um todo.

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4.6 – Para além da dicotomia

Segundo Demétrio Magnoli, “o contexto da Guerra Fria foi o pano de fundo do

movimento de descolonização”108. No período pós-guerra, nasceu uma nova forma de

nacionalismo nos países da África e da Ásia, um nacionalismo que lutava contra o

imperialismo europeu e buscava a autonomia dos povos109; daí a eclosão de diversos

movimentos de independência, que culminaram no surgimento de novos países e na

complexificação das relações diplomáticas em todo o mundo.

Esses novos Estados apresentavam peculiaridades muito diversas das dos países

europeus, em virtude do passado colonial que tiveram. Passado esse que ditou um modelo

de industrialização não pleno e incapaz de proporcionar o desenvolvimento efetivo dos

próprios países. Assim, eles vivenciavam inúmeros problemas econômicos, sociais (como

fome, analfabetismo, baixo desenvolvimento humano) e políticos (dada a fragilidade de

suas instituições que ainda eram demasiadamente recentes).

Nessas circunstâncias, interessava especialmente a esses novos Estados

promover uma alteração nos moldes do comércio internacional – que desvalorizava os

produtos primários e supervalorizava os bens manufaturados – e reordenar as relações

políticas entre as nações, visto que essas relações políticas estavam ancoradas na

hegemonia das ditas potências, em detrimento dos interesses dos demais países110. Dessa

forma, entre os dias 18 e 24 de abril de 1955, é realizada na Indonésia a Conferência Afro

Asiática de Bandung.

Essa Conferência forneceu as bases dos princípios políticos do “não

alinhamento”, isto é, da não adesão às políticas norte-americanas ou às soviéticas, da

manutenção de uma equidistância das duas potências111. Assim, o conflito leste-oeste

poderia ser substituído por um conflito norte-sul, em que a dicotomia estaria entre os

países desenvolvidos e não desenvolvidos.

Como também estavam presentes Estados aliados tanto dos Estados Unidos, como

da União Soviética (como Vietnã do Sul e Japão, Vietnã do Norte e China,

respectivamente), a Conferência não pode chegar a decisões mais precisas; entretanto foi

manifestadamente uma posição contrária ao imperialismo das potências e favorável ao

108 MAGNOLI (1996, pg. 85).

109 PAZZINATO, SENISE (2006).

110 MAGNOLI (1996).

111 Ibdem.

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miniTEMAS | 38

direito de autodeterminação dos povos112. Também foram estipulados os “10 Princípios

da Conferência de Bandung”, que se tornaram a principal diretriz do movimento dos não

alinhados113.

Um ano após Bandung, em 1956, os líderes do Egito, Índia e Iugoslávia reúnem-

se na Ilha de Brioni com o propósito de solidificar as ideias de Bandung em um organismo

mais estável114. O objetivo desse organismo seria atuar no cenário internacional como um

contrapeso nas disputas entre as duas principais potências, como uma terceira força

notoriamente imparcial nas disputas referentes à bipolarização mundial.

A importância desse movimento dos não alinhados consiste em demonstrar que,

apesar da política internacional do período da Guerra Fria estar intimamente relacionada

com as medidas norte-americanas e soviéticas, ela não se resumia a essas medidas. Havia

outros interesses, outros objetivos sendo simultaneamente trabalhados por países que não

estavam ligados diretamente ao eixo das potências tradicionais. Além disso, esse foi o

primeiro momento de grande destaque em que os Estados do dito “terceiro mundo”

ousaram se posicionar autonomamente na defesa de seus próprios interesses, que não

necessariamente convergiam com os interesses das nações de maior destaque no cenário

político internacional.

5 – Contexto político americano

5.1 - Guerra hispano-americana: Fulgêncio Batista

Inspirado na política isolacionista de George Washington115, o presidente dos

Estados Unidos da América (EUA), em 1823, James Monroe proferiu um discurso ao

Congresso Nacional em 2 de dezembro trazendo as diretrizes da política externa

estadunidense para o continente americano. Em resumo, consistia em um apoio norte-

americano aos países para desenvolverem sua autonomia frente aos Estados

colonizadores europeus, afirmando ser uma ―América para os americanos‖116.

112 PAZZINATO, SENISE (2006). 113 Disponível em inglês em: http://www.chinadaily.com.cn/english/doc/2005-04/23/content_436882.htm; acesso em 26/10/2012. 114 MAGNOLI (1996).

115 Afirmava: ―a Europa tinha um conjunto de interesses elementares sem relação com os nossos ou

senão muito remotamente". 116 Disponível em inglês em: http://www.loc.gov/rr/program/bib/ourdocs/Monroe.html . Acessado em 27

de outubro de 2012.

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miniTEMAS | 39

Adicionando às intenções de Monroe por meio do Corolário Roosevelt117, no

final do século XIX e nas primeiras décadas do XX, Theodore Roosevelt passou a realizar

intervenções, principalmente econômica, nas ―nações banhadas pelo Mar do Caribe‖

como Haiti, Costa Rica, República Dominicana e Panamá. Em destaque nessa política encontrava-se Cuba.

A Guerra Hispano-Americana de 1898 possibilitou aos Estados Unidos a

obtenção de territórios de domínio espanhol em várias antigas colônias, como Cuba, por

meio do Tratado de Paz Entre os Estados Unidos e Espanha, que colocava:

Artigo I.

A Espanha abandona toda reclamação de soberania e título sobre

Cuba. E como a ilha, após sua evacuação pela Espanha, será

ocupada pelos Estados Unidos, os Estados Unidos irão, por todo o

tempo que esta ocupação durar, assumir e executar as obrigações

que, sob o Direito Internacional, possam resultar do fato de sua

ocupação, para a proteção da vida e propriedade118.

Cuba tornou-se um Estado independente apenas em 1902, após o aval

estadunidense. Ressalta-se, ainda, em sua Constituição, a possibilidade de intervenção

dos Estados Unidos para respeito a questões internas ou externas por meio da Emenda

Platt119. Não obstante, a cessão da base naval de Guantánamo, em caráter permanente, foi

outra garantida atribuída aos americanos pelo seu auxílio a Cuba em sua independência.

A influência americana na ilha foi algo sempre marcante durante a primeira

década do século XX, com posse de terras em grande escala atribuída a empresas

estadunidenses mostrando que o Estado caribenho permanecia em grande medida

controlado, situação que durou até a revolução de 1959.

Em 1952, Fulgêncio Baptista, líder militar cubano realizou um golpe de Estado,

tomando o poder para si antes das eleições marcadas para aquele ano.

Cuba, em comparação aos demais Estados latino-americanos, detinha a quarta

maior renda per capita, além de encontrar-se próxima ao topo no ranking de educação,

taxa de alfabetização, serviços sociais e urbanização. Porém, a degradação dos benefícios

sociais, a decadência da atividade açucareira120 e a corrupção generalizada foram as

117 A insistência no erro, da parte de alguma nação americana, poderia exigir a intervenção de outra nação

civilizada, fazendo com que a fidelidade dos Estados Unidos à Doutrina nos leve a exercer um poder de

polícia internacional (ROOSEVELT, 1904 in FILHO, J. R. M. 2005).

118 Texto completo do Tratado de Paz entre Estados Unidos e Espanha disponível em inglês

em:

http://avalon.law.yale.edu/19th_century/sp1898.asp . Acessado em 27 de outubro de 2012.

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miniTEMAS | 40

principais causas da insatisfação popular à administração de Baptista. Em contrapartida,

o governo era obrigado a utilizar cada vez mais da força para garantir a sua manutenção

no poder.

5.2 A Revolução Cubana

Insatisfeitas, as classes médias e baixa cubana iniciaram em 1956 um movimento

revolucionário contrário à opressão do governo, o que acabaria por causar uma ruptura

sistêmica, influenciando o ambiente internacional e a história119.

Em um primeiro momento, os anseios das classes oprimidas – lideradas por

Fidel Castro – era o reestabelecimento da ordem constitucional de 1940, de caráter

democrático, liberal e capitalista. Dessa maneira, a opinião americana foi favorável ao

libertário Castro, frente ao – sanguinário – Baptista.

Dentre os fatores de importância central ao sucesso da revolução, pode-se citar

a participação de setores não beneficiados pela corrupção da administração de Baptista e

do Partido Comunista Cubano (PCC). Os primeiros, insatisfeitos com suas baixas

remunerações e pela improbidade da administração de Baptista, eram mais simpáticos à

deserção em face ao risco de combate às forças revolucionárias.

Aliados a Baptista inicialmente em seu golpe de Estado de 1952, os membros do

PCC chegaram a desempenhar funções importantes na administração vigente, com cargos

dentro até do gabinete ministerial. Os benefícios dos cargos foram os principais motivos

para a consolidação da aliança e a sua manutenção. Consciente do progresso do

―Movimento de 26 de Julho120, o partido começou a se aproximar e simpatizar pelos

ideais do movimento. Essa ação estratégica adotada acabou por garantir a permanência

do partido na administração de Castro, até mesmo em importantes cargos, uma vez que o

movimento revolucionário do novo líder carecia de conhecimentos administrativos.

No primeiro dia de janeiro de 1959, a entrada de um grupo de

revolucionários em Havana, a capital de Cuba, deu nova

importância à América Latina no contexto mundial da Guerra Fria.

Desde então, a pequena ilha transformou-se num problema

insolúvel para os EUA, um “espinho na carne” na frase do senador

William Fulbright ao presidente Kennedy. (PRADOS, 1997 p. 12-

13 in MOURA FILHO, 2005, p. 115).

119 HALLIDAY (1994). 120 Conhecido por ―M-26-7‖, liderado pelos irmãos Fidel e Raul Castro, Ernesto Che Guevara e Camilo

Cienfuegos.

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miniTEMAS | 41

No seu início, o movimento revolucionário foi bem recebido pela opinião

pública americana. O então presidente dos EUA, Dwight Einsenhower, reconheceu a

legitimidade do novo governo cubano. Como prova, convidou os representantes cubanos

a Washington com o objetivo de discutir a distribuição de um auxílio econômico. As

desavenças entre as nações começam nesse momento. Uma das principais causas de

desagrado da população com a corrupção constante nas administrações cubanas ao longo

da primeira década do século XX diz respeito ao intervencionismo americano,

principalmente econômico. Embora atuasse como principal parceiro econômico da ilha,

a forte presença americana é apontada como uma das principais causas do baixo

desenvolvimento da ilha desde a sua independência. Frente a isso, os representantes

cubanos viram-se obrigados a recusar o auxílio oferecido por Washington. A prática não

foi entendida como uma atitude comunista, mas apenas uma atividade de cunho

nacionalista extremo por Castro.

Práticas como a execução dos intitulados inimigos da revolução, em processos

que desrespeitavam o princípio do devido processo legal; uma ampla reforma agrária

promovida pelo governo, atingindo fortemente a posse de terras de empresas

estadunidenses; e a presença de integrantes do PCC no governo contribuiu para nutrir o

caráter esquerdista de Cuba frente ao mundo.

Em meio a tais ações, uma das que chamou mais atenção foi a retomada das

relações diplomáticas de Cuba com a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

(URSS). É importante ressaltar que ao aproximar-se da URSS, Cuba não adotava um

posicionamento pró comunismo, ao contrário, buscava manter a neutralidade frente à

disputa ideológica liderada por EUA e URSS.

O manual A Guerra de Guerrilhas121, publicado em 1960 por Ernesto Che

Guevara, não apenas demonstrava como ocorreu o processo revolucionário em Cuba, mas

também disseminava o exemplo aos demais países americanos, na forma de um ideal que

visasse à diminuição do domínio norte-americano sobre Cuba. Movimentos como o

Movimento de La Izquierda Revolucionaria (MIR) na Venezuela, e as Forças Armadas

de Libertação Nacional (FALN), na Argentina, além de militantes dos partidos

121 GUEVARA, C. A Guerra de Guerrilhas, Rio de Janeiro: Futuro, 1991. O conteúdo expresso mostra o

método cubano para a revolução, ao mesmo tempo que crítica a nova perspectiva soviética de obtenção da

revolução por meio de uma via pacífica objetivando o socialismo.

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miniTEMAS | 42

comunistas de países como Brasil, Equador, Chile e Uruguai utilizaram do manual como

matéria para a luta de suas causas122.

O conjunto de acontecimentos acabou por levar os EUA a cortar a importação

de açúcar cubano. Na tentativa de libertar-se da pressão exercida pelos americanos, a ilha

declarou-se oficialmente comunista, passando a obter ajuda militar, econômica e técnica

dos soviéticos123.

5.3 - Kennedy e os EUA

As eleições americanas de 1960 colocaram frente a frente dois candidatos que

deveriam encarar um desafio de proporções ainda desconhecida. Richard Nixon foi a

aposta do Partido Republicano para manter-se no poder, enquanto do outro lado os

democratas escolheram para disputar o pleito John Fitzgerald Kennedy. A campanha

tornou-se uma das mais memoráveis da história dos EUA, com os debates presidenciais

sendo televisionados pela primeira vez para toda a nação.

A vitória de Kennedy trouxe várias responsabilidades ao grupo democrata

oriundas das promessas de sua campanha eleitoral, ao mesmo tempo em que quebrou um

tabu referente à formação religiosa do presidente dos EUA124. Dentre os principais pontos

que deveriam ser trabalhados a partir da sua posse, o presidente teria que deliberar sobre

as questões direta e indiretamente relacionadas com a URSS125, a corrida espacial e, claro,

a questão cubana. “Nós escolhemos ir à Lua nesta década e outras coisas, não porque elas

são fáceis, mas porque elas são difíceis.” (KENNEDY, 1962).

Temendo a teoria do efeito dominó126, o papel político dos EUA em uma frente

ideológica ao comunismo deu-se em caráter de contenção: para evitar a ascensão de

governos comunistas, a influência americana atuaria minando tais forças políticas, além

de fortalecer governos e partidos que advogassem a democracia liberal.

122 BANDEIRA (1998).

123 HOBSBAWM (2001). 124 F. Kennedy, em 1960, foi o primeiro presidente americano eleito com formação católica. 125 A principal preocupação dos EUA, além da disseminação política do comunismo pelo globo, era os

recentes sucessos no desenvolvimento da tecnologia de mísseis balísticos pelos soviéticos. 126 Segundo essa teoria, se um país cair vítima do comunismo, todos os países daquela região estarão

ameaçados ao mesmo.

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Com Einsenhower, tal política de combate ao comunismo ganhou maior

desenvolvimento. Intitulada rollback, era dirigida não apenas aos movimentos

comunistas, mas todos os avanços obtidos por forças totalitárias, visando revertê-las127.

Na tentativa de retroceder o processo de cubanização, Kennedy tomou algumas

ações políticas, econômicas e militares visando resguardar a situação na América Latina.

Dessa maneira, a estratégia escolhida foi retomar a Política da Boa-Vizinhança128,

observada por Roosevelt na década de 1930.

Com o intuito de promover um desenvolvimento econômico e apaziguar as

desigualdades econômicas e tensões na América Latina, os EUA lançaram a intitulada

Aliança para o Progresso129.

A "Aliança para o Progresso" é nosso instrumento específico para

este trabalho neste Hemisfério. Trata-se de um profundo e concreto

programa de desenvolvimento econômico e social, ligado às nossas

tradições históricas. Em larga escala baseado nos heróicos conceitos

estabelecidos pela "Operação Pan-Americana", é um programa de

dez anos para as Américas, um plano para transformar esse período

numa década de progresso democrático. (GOODWIN, 1962, p. 21).

No viés militar, a política empreendida pelos EUA para os demais Estados

nacionais americanos é conhecida como Doutrina de Segurança Nacional. Observa-se

então, uma sucessão de golpes de Estado, por meio de forças militares, além de um vasto

programa de reorientação do conceito de segurança para barrar o avanço do comunismo

nas Américas130.

Com o objetivo de depor Fidel Castro, a CIA recrutou exilados políticos cubanos

e ofereceu-lhe treinamento e equipamentos para cumprir tal missão. A invasão da Baía

dos Porcos ocorreu em abril de 1961 a partir de bases na Guatemala131. Castro já esperava

127 A preocupação estadunidense era de manter uma situação de forças equilibradas. Dessa maneira,

governos autoritários não nutririam o ressentimento da população contra a sua posição, principalmente

quando aliados aos americanos. 128 A ideia central era de que as ditaduras militares, de políticas econômica e social conservadoras, não

garantiam a contenção comunista. Dessa maneira líderes que tinham interesses em promover reformas

sociais democráticas recebiam apoio. 129 RIBEIRO (2006, p.9). 130 MOURA (2003).

131 133 Violação do artigo 2, §4, e o artigo 51, da Carta da ONU, bem como os artigos 18 e 25 da Carta

da OEA e o artigo 1º do Tratado do Rio de Janeiro, os quais proscreviam o uso da força armada, salvo em

caso de legítima defesa contra um ataque armado. Castro poderia invocar o artigo 3, § 1°, do Tratado do

Rio de Janeiro, para pedir a assistência dos outros Estados latino-americano, a fim de repelir a agressão, e

apelar, de acordo com o capítulo 7 da Carta da ONU, para que o Conselho de Segurança interviesse, visando

a restauração da segurança e da paz internacional.

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miniTEMAS | 44

por uma investida direta à Ilha obrigando-se a tomar ações preventivas de treinamento

contra invasões, atitude determinante para o fracasso da operação americana contra

Cuba132.

5.4 - Cuba e a Organização dos Estados Americanos

Em 1933, a cidade de Montevidéu sediou a sétima Conferência Internacional dos

Estados Americanos. A reunião foi liderada pelo então presidente americano, Franklin

Delano Roosevelt, na tentativa de iniciar a promoção da Política da Boa-Vizinhança, em

uma aliança amigável, sem barganhas e nem pressões. As Conferências Interamericanas

de Consolidação da Paz, realizadas em Buenos Aires no ano de 1936, e em 1938 na cidade

de Lima, foram reuniões que promoveram o reforço dessa aliança e estabeleceram

mecanismos de consulta que seriam determinantes para o continente americano durante

a Segunda Guerra Mundial133.

Encerrado o conflito mundial, os EUA emprenharam-se na formulação de um

tratado que visava realizar uma aliança militar entre os países americanos. A partir de tal

esforço, em 1947 era aprovado o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca

(TIAR)134. O tratado criou uma unidade de defesa conjunta entre os seus signatários, onde

qualquer forma de agressão que fosse direcionada a um de seus membros seria

interpretada como um ataque aos demais, exigindo resposta coletiva para tal ato135.

Sob os auspícios do TIAR, os ministros de relações exteriores dos países

membros da OEA reuniram-se na Conferência de Punta del Este, no dia 22 de janeiro de

1962, para deliberar a respeito das ameaças à paz e à independência política dos Estados

Americanos136. A pauta central de tal reunião era a recentemente declarada de Fidel

Castro aos ideais comunistas.

132 HOWELLS (2001).

133 FRANCHINE NETO (2005, p.5).

134 Texto completo do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR, ou ratado do Rio de 1947,

disponível em: http://www.cnen.gov.br/Doc/pdf/Tratados/TRAT0005.pdf . Acessado em 11 de abril de

2013.

135 HELLER (1973).

136 A VIII RMRE foi convocada com base nos artigos 6° e 9° do Tratado do Rio de Janeiro segundo os

quais diziam: Artigo 6°: Se a inviolabilidade ou integridade ou a soberania ou a independência política de

qualquer estado americano for atingida por uma agressão que não seja um ataque armado, ou por um

conflito extracontinental ou intra-continental, ou por qualquer outro fato ou situação que possa pôr em

perigo a paz da América, o órgão de Consulta reunir-se-á imediatamente a fim de acordar as medidas que,

em caso de agressão, devam ser tomadas em auxílio do agredido, ou, em qualquer caso, convenha tomar

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Após dias de reunião, a resolução votada no dia 31 de janeiro de 1962 suspendia

Cuba da OEA e da Junta Interamericana de Defesa (JID).

6 – A situação atual

A aproximação entre Cuba e URSS trouxe para ambas as nações uma série de

vantagens. Os soviéticos, interessados em promover e expandir o seu domínio ao redor

do globo, tiveram nos cubanos um forte aliado em território americano. A ilha de Cuba

seria uma “colônia política” ideal aos ensejos de Moscou no Hemisfério Ocidental. Em

troca do privilegiado ponto de influência, seria encargo do governo de Kruschev atuar

como mais novo fornecedor do país liderado por Castro.

Em destaque a esse câmbio encontrava-se o fornecimento de carregamentos

bélicos, fato de conhecimento geral. Apesar de algumas hipóteses, não se acreditava que

haveria a possibilidade de tais carregamentos conterem armamento nuclear, pois

resultaria em uma ampliação considerável do nível de tensão envolvendo a possibilidade

de um conflito nuclear. Tais hipóteses eram descartadas devido ao fato, conjuntamente,

da URSS não ter instalado mísseis fora de suas fronteiras, nem mesmo no possível curso

de ação para essa atividade, os países vizinhos.

A situação soviética na disputa envolvendo tecnologia militar nos mísseis de

longo alcance era bem inferior se comparada com a estadunidense. Em 1962, o arsenal

de mísseis ICBMs137 era de apenas 20 projéteis, sendo o estado do Alaska o único

americano ao alcance de tal armamento. Além disso, a nova safra de ICBMs estaria

disponível apenas no ano de 1965138.

para a defesa comum e para a manutenção da paz e da segurança no continente. O artigo 9º dispunha: Além

de outros atos que, em reunião de consulta, possam ser caracterizados como de agressão, serão considerados

como tais: a) O ataque armado, não provocado, por um estado contra o território, a população ou as forças

terrestres, navais ou aéreas de outro estado; b) A invasão, pela força armada de um estado, do território de

um estado americano, pela travessia das fronteiras demarcadas de conformidade com um tratado, sentença

judicial ou laudo arbitral, ou, na falta de fronteiras assim demarcadas, a invasão que afete uma região que

esteja sob jurisdição efetiva de outro estado.

137 Intercontinental Ballistic Missile, são mísseis de alcance de longa distância, com média de 5000

quilômetros utilizados para ataques envolvendo armamento nuclear. 138 ALISSON; ZELIKOW (1999).

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miniTEMAS | 46

Fato adicional à preocupação soviética é a instalação de mísseis MRBM

Júpiter139 na Turquia pelos EUA, em abril de 1962140.

A estratégia soviética então se voltou para Cuba. Com receio de que os

americanos pudessem novamente tentar invadir a ilha, Castro viu-se diante de um impasse

quanto à sua decisão de aceitar a ajuda soviética em forma de mísseis. Por um lado, a

possibilidade de não ter como defender-se da investida americana sem o auxílio da URSS

era um fator de extremo peso na decisão. Em contrapartida, havia o receio de que Cuba

estaria tornando-se um fantoche soviético141.

A posição dos EUA sempre foi de desconfiança com as atividades envolvendo

URSS e Cuba. Assim, o presidente Kennedy realizou uma declaração no dia 18 de

setembro afirmando que qualquer tipo de investida contra Cuba não seria realizada por

parte dos americanos, salvo caso a Ilha tomasse atitudes ameaçando as outras nações da

América Latina, tornando-se uma base avançada soviética, com posse de armas

ofensivas142.

As suspeitas dos EUA aumentaram ainda mais em agosto de 1962 com relatórios

da CIA informando a presença de naves soviéticas sobrevoando Cuba. Segundo o diretor

da agência, John McCone, essas atividades só fariam sentido caso Moscou tivesse

interesse em realizar a defesa de uma base de mísseis balísticos que visam os EUA. Dessa

maneira, a atividade de monitoramento da ilha de Cuba recebeu passou a atuar de forma

mais intensa.

A convocação para a reunião da Assembleia Geral da OEA no dia 23 de outubro

de 1962 trouxe uma proposta considerada como pré-estopim a um conflito militar

envolvendo EUA e URSS. A delegação estadunidense propôs um embargo naval em

regime de quarentena a Cuba, restringindo a entrada de todo equipamento bélico oriundo

de qualquer nação. Segundo a mesma delegação, ainda, a proposta baseava-se na defesa

do Hemisfério Ocidental143, justificada pelo Tratado do Rio. A votação ao final do dia

139 PGM-19 Jupiter Medium-Range Ballistic Missile, são mísseis de alcance de média distância, atingindo

2400 quilômetros em média de distância.

140 CORREL, John T. Airpower and the Cuban Missile Crisis. Disponível em inglês em:

http://www.airforce-magazine.com/MagazineArchive/Pages/2005/August%202005/0805u2.aspx.

Acessado em 03 de novembro de 2012.

141 MIKOYAN, Sergio. The Soviet Cuban Missile Crisis: Castro, Mikoyan, Kennedy, Khrushchev, and the

Missiles of November. Disponível em inglês em: http://www.gwu.edu/~nsarchiv/NSAEBB/NSAEBB393/.

Acessado em 03 de novembro de 2012.

142 ALLISON; ZELIKOW (1999).

143 ALLISON, ZELIKOW (1999, p. 119).

Conselho de Segurança das Nações Unidas

miniTEMAS | 47

resultou em 19 delegações favoráveis à proposta defendida pelos EUA, aprovando o

embargo naval a Cuba.

No dia 24 de outubro entra em vigor a quarentena a Cuba e é convocada para o

dia 25 uma reunião extraordinária do Conselho de Segurança das Nações Unidas com o

intuito de discutir o tema.

7 – Questões a deliberar

Cabe ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, em sua sessão

extraordinária, deliberar especialmente acerca do bloqueio naval a Cuba, proposto pelos

Estados Unidos da América em reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Esse bloqueio teria como objetivo impedir que navios e demais embarcações adentrassem

no mar territorial cubano, de sorte a evitar que seja efetivada a construção de uma base

militar soviética na ilha, base esta que poderia abrigar armamentos nucleares, o que viria

a comprometer a segurança de todo o continente americano.

Aqui é importante salientar que no início de 1962, Cuba foi expulsa da OEA,

pois os demais membros consideraram que o regime político cubano, pós-revolução, era

incompatível com os princípios da Organização. Desse modo, o país – por ser o único do

continente não membro da OEA – ficou politicamente excluído do cenário americano.

No que tange ao bloqueio propriamente dito, é preciso analisar sua conformidade

ou inconformidade com os termos do direito internacional então vigente. Como base para

essa análise é possível citar o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, o Tratado

Americano de Soluções Pacíficas144 e a Carta da própria OEA145, de 1948, além da

doutrina e dos costumes146.

144 Ou tratado de Bogotá, firmado em 30 de abril de 1948. Disponível em espanhol em:

http://www.oas.org/juridico/spanish/tratados/a-42.html 145Disponível em: http://www.oas.org/dil/port/tratados_A-

41_Carta_da_Organiza%C3%A7%C3%A3o_dos_Estados_Americanos.htm 146 As leis que regem as relações internacionais são aquelas que foram aceitas pela comunidade

internacional dos Estados, na forma do costume (ou lei costumeira), de tratados internacionais ou que

derivam dos princípios gerais comuns aos principais sistemas legais do mundo. (DAMROSCH, HENKIN,

PUGH, SCHACHTER, SMIT. 2001)

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Ao considerar o âmbito de vigência do Direito Internacional, é preciso ter em

mente o conceito de jus cogens147 que, de forma correlata ao direito erga omnes148, é

baseado na aceitação de valores superiores, inerentes aos direitos do homem, que,

impreterivelmente, devem ser respeitados tanto no direito internacional como no

doméstico149. No caso específico, que envolve Cuba e Estados Unidos, poderiam ser

clamados como direitos invioláveis dos Estados o direito à soberania e à segurança

nacional.

Por um lado, é possível retomar o conclamado conceito de soberania estatal,

construído com a Paz de Westfália150, e afirmar a autonomia dos Estados para gerirem

suas questões internas, bem como seu território. Note-se que o território nacional engloba

a parcela terrestre, o mar territorial e o espaço aéreo correspondente a ambos.

Assim, o fato dos Estados Unidos pretenderem um bloqueio naval a Cuba, em

virtude do alinhamento político desse país e de suas decisões acerca das alianças militares

que efetiva, representaria uma flagrante tentativa de intervenção externa em assuntos que

deveriam ser tratados apenas internamente. Logo, os norte-americanos violariam

duplamente o preceito da soberania estatal – preceito esse que, por sinal, foi um dos

marcos fundadores do Direito Internacional –, primeiro ao tentarem intervir nas decisões

políticas de Cuba e, depois, ao pretenderem controlar parte do território do país.

Entrementes, sob a ótica estadunidense, essa violação à soberania estatal seria

uma violação mínima se comparada à violação engendrada pelos governos cubano e

soviético à segurança nacional dos cidadãos dos Estados Unidos e do continente

americano como um todo151. Como base para a defesa de sua política, os EUA apontam

147 De acordo com a Convenção de Viena sobre os Tratados Internacionais, de 1969, normas de jus cogens,

ou normas peremptórias seriam aquelas ―aceitas e reconhecidas pela comunidade internacional dos

Estados como um todo, como normas que não aceitam qualquer tipo de derrogação e que só podem ser

alteradas por uma norma geral subsequente de direito internacional que apresentem o mesmo caráter‖.

Como exemplo seria possível mencionar a escravidão, a pirataria e o genocídio, apesar da Comissão

Internacional de Direito (ILC, sigla do inglês) não mencionar expressamente qualquer categoria.

(DAMROSCH, HENKIN, PUGH, SCHACHTER, SMIT. 2001). Para mais informações, ver Nicaragua

Case, ICJ (disponível em inglês em: http://www.icj-

cij.org/docket/?sum=367&code=nus&p1=3&p2=3&case=70&k=66&p3=5) e Barcelona Traction Case,

ICJ (disponível em inglês em: http://www.icj-

cij.org/docket/index.php?sum=291&code=bt2&p1=3&p2=3&case=50&k=1a&p3=5)

148 Designa um direito cuja base é inerente à dignidade da pessoa humana, de forma a apresentar um caráter

superior a outras norma, independentemente de sua positivação.(SHAW, 2008).

149 SHAW (2008).

150 (DAMROSCH, HENKIN, PUGH, SCHACHTER, SMIT. 2001).

151 Ver a análise de Alexy sobre o conflito de princípios. Quando a proteção de um princípio leva à

inevitável violação de outro e vice-versa, seria preciso avaliar qual dos dois princípios seria violado em

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que Cuba e União Soviética constituíram um ataque armado com a alocação dos mísseis

na ilha próxima à sua fronteira, o que abriria margem para o exercício do direito de

autodefesa152. O início de um ataque, aqui, é considerado não como o momento de sua

efetivação, mas antes, quando de sua estruturação, o que já seria suficiente para que o

Estado que se sentisse agredido tomasse medidas preventivas, de modo a configurar a

estruturação de uma legítima defesa preventiva.

Para legitimar o bloqueio naval a Cuba, seria possível uma analogia com a

declaração do Comitê Preparatório para a Conferência de Haia sobre Codificação, de

1930, que recomendou, como base para as discussões, que o Estado litorâneo poderia

exercer jurisdição sobre o alto mar nas adjacências de seu território para prevenir ―a

interferência em sua segurança por embarcações estrangeiras153. Apesar dos EUA

pretenderem intervir no mar territorial cubano, e não em alto mar, o fim dessa intervenção

seria o mesmo: a garantia de sua segurança nacional. Considerando-se, ainda, o contexto

da Guerra Fria, esse temor a um ataque soviético é justificado pelo clima de ameaças

entre as duas nações, e não consiste apenas em uma mera preocupação exacerbada do

governo norte-americano.

O Tratado Interamericano de Assistência Recíproca também pode ser

apresentado como indicador da validade jurídica da quarentena a ser imposta a Cuba,

visto que desde o seu preâmbulo reforça a ― essencial relação entre a obrigação de

assistência mútua e defesa comum das Repúblicas Americanas com seus ideais

democráticos e permanente intenção de cooperar com o cumprimento dos princípios de

propósitos da política de paz. Desse modo, a partir do momento em que um Estado

deixasse de demonstrar, não só seus ideais democráticos, mas sua plena disposição para

com a paz continental, romper-se-ia o compromisso de assistência a ele, em especial, se

ele viesse a demonstrar intenções não pacíficas para com outro membro do tratado.

O Artigo 7º do tratado154 reforça mais uma vez a necessidade de se buscar meios

pacíficos para a resolução dos conflitos entre os Estados membros, sem, entretanto, negar

o direito à autodefesa ao país agredido.

menor grau. A partir dessa análise a conduta adotada deveria ser aquela que ocasionasse a violação mais

branda.

152 (DAMROSCH, HENKIN, PUGH, SCHACHTER, SMIT. 2001).

153 (DAMROSCH, HENKIN, PUGH, SCHACHTER, SMIT. 2001).

154 Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, 1948. Disponível em inglês em:

http://www.oas.org/juridico/english/treaties/b-29.html

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Fazendo coro, ainda, à medida proposta pelos Estados Unidos, o Capítulo VIII

da Carta das Nações Unidas, que trata dos Acordos Regionais, reforça a importância das

Entidades Regionais resolverem por si próprias os possíveis litígios entre seus membros;

e seria exatamente esse o objetivo do bloqueio à ilha cubana: impedir a escalada das

tensões na região, que tenderiam proporcionar a eclosão de um conflito. É possível citar

o Artigo 52 dessa Carta, em que fica evidente esse papel que as Entidades Regionais

devem assumir, no sentido de impedir o agravamento das tensões entre seus membros.

Artigo 52

1- Nada na presente Carta impede a existência de acordos ou de

entidades regionais, destinadas a tratar dos assuntos relativos à

manutenção da paz e da segurança internacionais que forem suscetíveis

de uma ação regional, desde que tais acordos ou entidades regionais e

suas atividades sejam compatíveis com os Propósitos e Princípios das

Nações Unidas.

2- Os Membros das Nações Unidas, que forem parte em tais acordos

ou que constituírem tais entidades, empregarão todo os esforços para

chegar a uma solução pacífica das controvérsias locais por meio desses

acordos e entidades regionais, antes de as submeter ao Conselho de

Segurança.

3- O Conselho de Segurança estimulará o desenvolvimento da solução

pacífica de controvérsias locais mediante os referidos acordos ou

entidades regionais, por iniciativa dos Estados interessados ou a

instância do próprio conselho de Segurança.

4- Este Artigo não prejudica, de modo algum, a aplicação dos Artigos

34 e 35.155

O Pacto de Bogotá, que objetiva garantir uma solução pacífica das controvérsias

entre os Estados signatários, também apresenta em toda a sua estrutura a busca expressa

por soluções que evitem a efetivação dos conflitos bélicos, como observa-se já em seu

Artigo 1º.

Artigo 1º

As altas partes contratantes, reafirmando solenemente seus

compromissos contraídos por convenções anteriores e declarações

internacionais, assim como pela Carta das Nações Unidas, convém

em absterem-se da ameaça, do uso da força ou de qualquer outro

meio de coação para a resolução de suas controvérsias e em recorres,

a todo momento, a procedimentos pacíficos.156

155 Carta das Nações Unidas, 1945. Disponível em:

http://www.oas.org/dil/port/1945%20Carta%20das%20Na%C3%A7%C3%B5es%20Unidas.pdf

156 Tratado Americano de Soluções Pacíficas, 1948. Tradução livre. Disponível em espanhol em:

http://www.oas.org/juridico/spanish/tratados/a-42.html

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Entretanto, cabe análise do que é considerado, no tratado, como ― meio de

coação para resolução de controvérsias –, pois, sob a perspectiva cubana, os Estados

Unidos estariam se utilizado de um método de coação para forçar Havana a aderir às

políticas capitalistas. Aqui, a coação configurar-se-ia como coação econômica, pela ótica

do governo de Cuba.

Por fim, cabe ressaltar que, além da juridicidade de um possível bloqueio naval

a Cuba, é importante que seja analisada a conveniência política dessa medida. No

contexto de um conflito ideológico incessante entre EUA e URSS é necessário analisar

até que ponto uma base militar soviética próxima à fronteira norte-americana poderia

comprometer significativamente o equilíbrio de forças na região e a própria paz e

segurança local. Entretanto, cabe também estudo dos efeitos que a definição dessa

medida, que apresenta clara matiz de represália à escolha cubana de aliança com a União

Soviética, traria para a autonomia política dos Estados que momentaneamente encontram-

se alinhados com os EUA, mais especificamente para os países da América Latina e

Caribe. Assim, ao mesmo tempo em que a efetivação do bloqueio poderia sinalizar os

riscos em que um Estado poderia incorrer ao romper com os Estados Unidos, ela também

poderia configurar-se como o único meio efetivo de evitar o desencadeamento de um

conflito direto entre norte-americanos e cubanos – que, significaria uma disputa fática

entre EUA e URSS.

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