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6 Construa o Alicerce de um Projeto Por Vez HÁ VÁRIOS ANOS uma amiga nossa convidou uma decoradora de interiores para renovar a sala de estar em sua casa de família. A decoradora observou que qualquer mudança na sala exigiria mudanças na sala de jantar contígua, de modo que a casa parecesse "integrada". Sem problemas. Mas o eventual tema das salas de estar e de jantar pediu por uma remodelação das escadarias até o segundo andar. Claro, o carpete dos degraus estendia-se por todo o segundo andar (e havia descontos vultosos disponíveis), de modo que o carpete de toda a casa foi jogado para escanteio. Infelizmente, a tentação de escolher cores novas e provocantes para o carpete mostrou-se irresistível. Mas isso significou que ele não combinaria com as paredes ou cortinas existentes. No fim das contas, a família teve de deixar a casa por seis semanas para que a decoradora concre- tizasse sua visão. O efeito final, sem dúvida, foi magnífico. E caro* As empresas enfrentam tentações similares quando mapeiam seu alicerce de execução. Uma vez clara a visão, parece lógico que a maneira mais rápida de criar o alicerce é arrancar processos e sistemas existentes - e tipicamente funcionais. Em tempos de crise ou mudanças perturbadoras, projetos maciços que construam um novo alicerce podem fazer sentido. Uma empresa pode ter de se transformar rapidamente para sobreviver. Mas mudanças maciças são caras e arriscadas, por vezes demasiado caras e arriscadas para que uma empresa as implante de uma só vez. Grandes implementações baseadas em sistemas têm um péssimo histórico de sucessos. A maioria das empresas implementou sistemas extensivos de ERP na esperança de que seus processos centrais de negócios se automatizassem em um alicerce. O porte, a complexidade, os distúrbios, os custos e o aprendizado necessário contribuíram * Este capítulo teve a co-autoria de Nils O. Fonstad, um pesquisador cientista do MIT Sloan Center for Information Sysrems Research. 94

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Construa o Alicerce de um

Projeto Por Vez

HÁ VÁRIOS ANOS uma amiga nossa convidou uma decoradora de interiores para renovar a sala de estar em sua casa de família. A decoradora observou que qualquer mudança na sala exigiria mudanças na sala de jantar contígua, de modo que a casa parecesse "integrada". Sem problemas. Mas o eventual tema das salas de estar e de jantar pediu por uma remodelação das escadarias até o segundo andar. Claro, o carpete dos degraus estendia-se por todo o segundo andar (e havia descontos vultosos disponíveis), de modo que o carpete de toda a casa foi jogado para escanteio. Infelizmente, a tentação de escolher cores novas e provocantes para o carpete mostrou-se irresistível. Mas isso significou que ele não combinaria com as paredes ou cortinas existentes. No fim das contas, a família teve de deixar a casa por seis semanas para que a decoradora concre-tizasse sua visão. O efeito final, sem dúvida, foi magnífico. E caro*

As empresas enfrentam tentações similares quando mapeiam seu alicerce de execução. Uma vez clara a visão, parece lógico que a maneira mais rápida de criar o alicerce é arrancar processos e sistemas existentes - e tipicamente funcionais. Em tempos de crise ou mudanças perturbadoras, projetos maciços que construam um novo alicerce podem fazer sentido. Uma empresa pode ter de se transformar rapidamente para sobreviver. Mas mudanças maciças são caras e arriscadas, por vezes demasiado caras e arriscadas para que uma empresa as implante de uma só vez.

Grandes implementações baseadas em sistemas têm um péssimo histórico de sucessos. A maioria das empresas implementou sistemas extensivos de ERP na esperança de que seus processos centrais de negócios se automatizassem em um alicerce. O porte, a complexidade, os distúrbios, os custos e o aprendizado necessário contribuíram

* Este capítulo teve a co-autoria de Nils O. Fonstad, um pesquisador cientista do MIT Sloan Center for Information Sysrems Research.

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para o fracasso de mais de 50% dessas implementações, com milhões de dólares e muita boa vontade administrativa descendo pelo ralo.1

A alternativa às implementações "big bang" é construir o alicerce de um projeto por vez. Para isso, todo projeto de negócios deve não apenas atingir suas metas de curto prazo, mas também ajudar a implementar (ou pelo menos não solapar) a arquitetura da empresa. Responsabilizar cada um dos projetos pela implementação de uma peça da arquitetura traz, no mínimo, três benefícios. Primeiro, isso assegura que a arquitetura não será uma abstração do mundo, em uma "torre de marfim", mas, sim, um modelo útil de como fazer negócios. Segundo, isso assegura que o alicerce de execução se tornará cada vez mais robusto conforme o negócio e a tecnologia disponível evoluírem. Finalmente, isso pode reduzir dramaticamente as despesas, distribuindo os custos e os riscos da implementação da arquitetura empresarial da firma entre muitos projetos menores e mais maleáveis. Freqüentemente, implementar soluções para projetos de uma maneira arquitetonicamente sadia não sai mais caro, e, com o tempo, o progresso, no sentido de implementar-se a arquitetura desejada da empresa, é substancial.

O Modelo de Envolvimento da TI

Construir o alicerce de um projeto por vez exige o envolvimento dos principais stakeholders no design, na implementação e no uso de novas capacidades processuais de negócios e TI - um modelo de envolvimento da TI. Nós definimos o modelo de envolvimento da TI como o sistema de mecanismos de governança que asseguram que os projetos de negócios e de TI atinjam os objetivos tanto locais como da empresa em geral.2 Nas empresas de melhor desempenho, o modelo de envolvimento possui três ingredientes principais:

1. Governança de TI na empresa como um todo: o framework de direitos decisórios e responsabilidades para estimular comportamentos desejáveis no uso da TI.

2. Gestão de projetos: metodologia formalizada de projetos, com produtos entregáveis claros e pontos de checagem regulares.

3. Mecanismos de vinculação: processos e órgãos decisórios que alinhem incentivos e conectem as atividades do nível dos projetos com a governança geral da TI.

Em grandes empresas, o modelo de envolvimento da TI contém seis grupos principais de stakeholders: a administração geral da empresa, a administração das unidades comerciais e a administração de projeto ou de linha - cada uma das quais existe tanto no lado de negócios como no de TI da empresa. (Ver figura 6-1.) As diferentes perspectivas, objetivos e incentivos desses grupos criam dois desafios: a coordenação e o alinhamento.

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No nível da empresa, os líderes seniores determinam a direção, criam um clima de sucesso e projetam incentivos para atender a metas da empresa como um todo. Os líderes das unidades comerciais concentram-se no desempenho destas últimas. Os líderes de projeto costumam concentrar-se totalmente no sucesso de seus projetos, amealhando todos os recursos empresariais que conseguirem encontrar, mendigar, emprestar ou furtar para cumprir sua função.

O modelo de envolvimento da TI coordena estes três diferentes níveis: empresa, unidade comercial e projeto. A governança de TI estabelece metas e incentivos de alto nível. A administração de projeto aplica a todos os grandes projetos as melhores práticas entre as ferramentas e técnicas de gestão de projetos específicas da empresa, assegurando o sucesso local dos projetos. Os mecanismos de vinculação asseguram que os projetos, conforme avançam, reflitam e moldem as metas e as prioridades de todas as partes.

O segundo desafio do envolvimento é alinhar as atividades de TI e os negócios da empresa para assegurar a geração de valor a partir dos investimentos em TI. Em algumas empresas de alto desempenho, o alinhamento entre negócios e TI está arraigado em todos os processos administrativos. Com mais freqüência, porém, as prioridades

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conflitantes entre os gerentes de negócios e os de TI resultam em diferenças não resolvidas. Os executivos de TI concentram-se em proporcionar o ambiente de TI mais poderoso e sem riscos possíveis. Os líderes de negócios concentram-se em reduzir custos e proporcionar soluções rápidas. A tensão construtiva entre negócios e TI leva à resolução efetiva dessas discrepâncias. O modelo de envolvimento da TI ajuda os líderes a reconhecer e resolver suas diferenças de acordo com objetivos de negócios da empresa como um todo.

Ao vincular a governança de TI com a gestão de projetos, o modelo de envolvimento coordena e alinha ambas. Sem esse modelo, os líderes de projeto agem em isolamento. Eles escolhem soluções que atendam às metas dos projetos, mas as metas gerais de integração e padronização da empresa são ignoradas, e o alicerce de execução jamais emerge. Neste capítulo, nós descrevemos melhor os ingredientes do modelo de envolvimento da TI e damos exemplos de cada um. Então mostramos todos os três em ação, usando um exemplo de caso.

Governança de TI

A governança de TI consiste no framework de direitos decisórios e responsabilidades para estimular comportamentos desejáveis no uso da TI. Ela reflete princípios mais amplos de governança corporativa ao mesmo tempo que se concentra na administração e uso da TI para atingir metas de desempenho corporativo.3 A governança de TI não deve ser considerada isoladamente, pois a TI se vincula a outros ativos-chave da empresa (ou seja, ativos financeiros, humanos, de know-howlpropriedade intelectual, físicos e relacionais). Com isso, ela pode compartilhar mecanismos - como comitês executivos e processos orçamentários - com outros processos de governança de ativos, alinhando com isso os processos decisórios da empresa em geral.

A governança de TI abrange cinco grandes áreas decisórias relacionadas à administração e ao uso da TI em uma firma, todas as quais devem ser dirigidas pelo modelo operacional:

1. Princípios de TI- decisões de alto nível sobre o papel estratégico da TI nos negócios.

2. Arquitetura empresarial: a lógica organizacional dos processos de negócios e infra-estrutura de TI.

3. Infra-estrutura de TI- serviços de TI compartilhados e centralmente coordenados, constituindo parte do alicerce de execução.

4. Necessidades de aplicações comerciais: requisitos comerciais para aplicações de TI compradas ou internamente desenvolvidas que tanto utilizem como construam o alicerce de execução.

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5. Priorização e investimento: decisões sobre quanto e onde investir em TI, incluindo a aprovação de projetos e técnicas de justificação.

Cada uma dessas decisões pode ser tomada por gerentes corporativos, das unidades comerciais ou dos setores - ou alguma combinação entre eles -, tendo o modelo operacional como guia. Assim, o primeiro passo para formular a governança de TI é determinar quem deve tomar cada tipo de decisão e ser responsabilizado por elas. Para ajudar a pensar sobre quem deve tomar tais decisões, oferecemos na tabela 6-1 uma amostra das questões que cada área decisória deve cobrir.

Toda empresa envolve-se na tomada de decisões de TI, mas as firmas diferem de maneira considerável em quão ponderadamente definem responsabilidades e quão rigorosamente formalizam e comunicam processos decisórios. Sem uma governança formal de TI, os gerentes individuais precisam resolver questões isoladas conforme estas surgem. Tais ações individuais podem conflitar entre si e resultar em mau alinhamento e falta de coordenação. Por exemplo, o CIO de uma firma de transporte global foi instruído a cortar o orçamento corporativo de TI. Esse CIO introduziu um sistema de cobrança reversa para reduzir a demanda por serviços de TI. Insatisfeitos com as novas cobranças, os gerentes de cada unidade comercial contrataram especialistas técnicos locais para prestar serviços. Os novos especialistas técnicos não figuravam no orçamento corporativo de TI, de modo que parecia que o CIO havia atingido sua meta, mas as novas contratações nas unidades comerciais haviam aumentado, e não diminuído, os gastos totais de TI da firma. Pior, os funcionários das unidades comerciais desenvolveram serviços locais que comprometiam a integridade da arquitetura empresarial, reduzindo a qualidade do atendimento ao cliente em mais de uma unidade comercial.

Em contraste, quando os gerentes seniores da UNICEF reconheceram que a TI vinha desempenhando um papel cada vez mais estratégico (e mais caro) na promoção da missão organizacional de prestar serviços às crianças, a alta administração definiu o papel da TI na organização, determinou as prioridades de projetos e os níveis de custeio, esclareceu a necessidade de serviços compartilhados e estabeleceu requisitos gerais de padronização e integração.4

Esses gerentes empregaram diretores de divisão responsáveis pela implementação de sistemas globais, e o CIO permaneceu responsável pela prestação de serviços infra-estruturais importantes e pela coordenação do uso da TI na empresa. Ao longo dos últimos anos, a TI transformou fundamentalmente o modo como a UNICEF atua. Andre Spatz, CIO da UNICEF, explica:

Como CIO, invisto grande parte de meu tempo fazendo a governança funcionar em todos os níveis, para educar, treinar, guiar e fazer lobby. Em uma organização global, a governança é um desafio e tanto. Enfrentamos grande pressão por sinergias em toda a UNICEF, e ao mesmo tempo há grande pressão por autonomia local por parte das unidades regionais e nacionais. A liderança de um CIO numa

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organização de TI global não é só comandar e executar. Devemos o tempo todo conceder poderes a pessoas com visão e estratégia executiva e posicionar os elementos da governança dentro de um framework global. Parte de meu papel é assegurar que não centralizemos demais e que nossa organização de TI se adapte aos diferentes ambientes culturais em que atuamos.5

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Empresas com uma governança de TI efetiva têm lucros até 20% maiores do que empresas que buscam estratégias similares.6 Mas a governança de TI é um mistério para muitos tomadores de decisões estratégicas na maioria das empresas. Nossa pesquisa indica que, em média, apenas 38% dos gerentes seniores de uma empresa sabem como a TI é governada. E a ignorância não é uma bênção. A consciência por parte da alta administração dos processos de governança de TI revelou-se o melhor indicador da eficiência da governança. Nas firmas de mais alto desempenho, até 80% dos executivos seniores estão cientes de como a TI é governada.

Em nosso estudo com quase 300 empresas por todo o mundo, não identificamos uma fórmula única para governar a TI. 7 Entretanto, uma coisa é clara: a governança efetiva não acontece por acidente. As empresas de melhor desempenho projetam cuidadosamente a governança, e os gerentes de todas as partes dessas empresas tomam decisões diárias pondo em prática esse modelo.

Gestão de Projetos

A gestão de projetos tornou-se uma competência crítica em muitas empresas, senão mesmo na maioria delas. Cada vez mais as empresas estão adotando metodologias de projeto padronizadas – sejam abordagens da casa, sejam desenvolvidas pela indústria. Uma boa metodologia de gestão de projetos tem passos processuais bem definidos, com produtos seguramente entregáveis a serem avaliados em pontos de checagem regulares, chamados muitas vezes de “portões”. Muitas empresas criam indicadores para avaliar o desempenho dos projetos e realizar avaliações de pós-implementação para melhorar as habilidades dos gerentes de projeto e a metodologia da empresa.

Os projetos ligados à TI têm sido há muito orientados por um ciclo de vida do projeto. Variações no ciclo de vida definem um conjunto de quatro a oito fases dos projetos (por exemplo, proposta, requisitos, especificação, desenvolvimento, implementação e administração de mudanças), cada uma com um conjunto específico de objetivos, produtos entregáveis e indicadores.8 A boa gestão de projetos estabelece um conjunto de portões que verificam o progresso de cada um e avaliam suas chances de atingir as metas. As empresas podem chegar a ter 12 ou 15 portões durante um projeto. Processos disciplinados de gestão de projetos são uma condição necessária para um bom envolvimento. Eles asseguram que todos os projetos executem certas tarefas em certos momentos.

Poucas empresas integraram a governança de projetos em seu DNA como a Raytheon.9 Essa companhia aeroespacial e de defesa tem 80 mil funcionários por todo o mundo, com cerca de 80% da receita provinda do governo e da defesa. A Raytheon também fornece e administra quase todos os sistemas de controle de tráfego aéreo do mundo. Entre 30% e 40% da sua receita é gerada fora dos Estados Unidos. Os clientes

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da empresa são tipicamente homens e mulheres de uniforme (por exemplo, militares e pilotos). Para administrar o grande número de programas dentro de suas sete unidades comerciais semi-autônomas, a Raytheon desenvolveu uma abordagem única para todos os projetos. Rebecca Rhoads, vice-presidente e CIO, explica:

"Q1lando você possui 8 mil programas, logo desenvolve um modelo de governança que administra suas exceções. Você precisa ter uma execução impecável. Mas, se começar a avaliar 8 mil programas todos os meses para certificar-se de que está tudo bem e de que a execução está adequada, você nunca terminará antes de ter de começar de novo. Por isso temos uma estrutura e um modelo de governança que avaliam os programas com base em exceções. Temos tabelas e indicadores, e não examinamos o programa em detalhe a menos que ele tenha originado uma exceção na tabela.

A figura 6-2 apresenta uma versão simplificada do sistema integrado de desenvolvimento de produtos (IPDS) da Raytheon - o processo de múltiplos portões para administrar todos os projetos da firma. O IPDS é usado para desenvolver qualquer solução, seja grande ou pequena, seja de srftware, de hardware ou integrada. Todo projeto tem início com um processo de cotações e se encerra no portão 10 - o exame de prontidão -, após o que a Raytheon está pronta para avançar para a produção. O portão 11 é o exame de pós-implementação. Os portões no topo da figura 6-2 são usados para governar todos os projetos na Raytheon. Os quadros na figura são os exames de TI que ocorrem a cada por tão no IPDS. Abaixo dos quadros estão os comitês e processos que monitoram o projeto do ponto de vista tanto de negócios como de TI.

Para a governança de projetos de TI, a Raytheon aproveita o que faz dela uma empresa forte - a habilidade de administrar 8 mil programas. A cada portão, qualquer projeto passa por uma série de exames de negócios e de TI. Por exemplo, a iniciação do projeto aciona o portão 5, o exame de iniciação, exigindo a aprovação do escritório de administração de programas e do conselho de padrões e arquitetura empresarial. A integração da gestão de projetos de TI na gestão de projetos de negócios atende aos objetivos gerais da TI de criar um alicerce de execução em um projeto por vez.

Mecanismos de Vinculação

Empresas com uma governança de TI eficiente e uma gestão de projetos disciplinada podem ainda assim ter um envolvimento da TI ineficaz. O terceiro ingrediente essencial do modelo de envolvimento da TI são os mecanismos de vinculação que conectam a governança e os projetos da empresa como um todo. A boa governança de TI garante uma direção clara sobre como desenvolver um alicerce para a empresa. A boa gestão de projetos assegura que os projetos sejam implementados efetivamente, com eficiência

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e de maneira consistente com a maximização do aprendizado. Bons mecanismos de vinculação cuidam para que os projetos construam incrementalmente o alicerce da empresa e que o design desse alicerce (seu modelo operacional e sua arquitetura empresarial) seja moldado pelos projetos. A figura 6-3 descreve três importantes tipos de mecanismos de vinculação para qualquer modelo de envolvimento da TI: a vinculação arquitetônica, a vinculação de negócios e a vinculação de alinhamento. Esses três tipos de mecanismos de vinculação resolvem as principais questões de alinhamento e coordenação da empresa, desde que os stakeholders assumam a responsabilidade por eles - e que a governança de TI e a gestão de projetos sejam eficazes.

A vincularão arquitetônica estabelece e atualiza padrões, examina projetos em termos de observância e aprova exceções. Ela conecta as decisões da governança de TI sobre arquitetura com as decisões sobre o design de projetos. Por exemplo, uma empresa em busca do aumento da integração pode ter um mecanismo para insistir em que um projeto para a cadeia de suprimentos, em vez de se concentrar estritamente em

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suas próprias necessidades de dados, reestruture o banco de dados sobre o inventário para facilitar a utilização futura prevista desses dados. As empresas podem concretizar a vinculação arquitetônica com um único mecanismo, como o conselho de revisão arquitetônica. Mais comumente, elas utilizam mecanismos múltiplos, que vão desde programas de treinamento para arquitetos até processos de exceção à arquitetura.

Similarmente, a vinculação de negócios assegura que metas comerciais se traduzam efetivamente em metas de projeto. A vinculação de negócios coordena projetos, conecta-os a iniciativas de transformação mais amplas e concentra-os no combate a problemas específicos da melhor maneira possível. Por exemplo, um mecanismo de vinculação para empresas em busca de processos gerais padronizados é o uso de detentores dos processos com a responsabilidade primária por projetar e atualizar processos. A vincu-lação de negócios também inclui programas de incentivos para orientar comportamentos quando novos projetos exigem novas maneiras de pensar.

Mecanismos para a vinculação de alinhamento asseguram comunicação e negociação constantes entre questões de negócios e de TI. Gerentes de relacionamento entre negócios e TI ou CIOs das unidades comerciais são tipicamente um elo crítico para traduzir nos dois sentidos as metas comerciais e restrições de TI. Outros mecanismos dessa categoria incluem um escritório de gestão de projetos, o treinamento e a certificação dos gerentes de projeto e indicadores para avaliar projetos.

Modelos efetivos de envolvimento têm todos os três tipos de mecanismo de vinculação implementados por via de uns poucos mecanismos bem compreendidos. Observamos anteriormente que as práticas administrativas de uma empresa evoluem durante os estágios de maturidade arquitetônica. Muitas dessas práticas em evolução são mecanismos de vinculação. Conforme são implementadas e aprimoradas, elas contribuem para uma sofisticação crescente do modelo de envolvimento da TI. Com o tempo, os mecanismos de vinculação podem se embutir progressivamente nos proces-sos de governança de TI e gestão de projetos, de modo que a vinculação se torna um hábito organizacional.

Um estudo de caso da Toyota Motor Marketing Europe ilustra como uma empresa vincula seus projetos a objetivos de nível superior, de modo a construir o alicerce de execução com um projeto de cada vez.

A Toyota Motor Marketing Europe: Melhorias Contínuas na Arquitetura

A Toyota Motor Co. é uma das maiores fabricantes de automóveis do mundo, oferecendo uma gama completa de modelos, desde pequenos veículos de passeio até caminhões.lO As vendas globais anuais da Toyota, combinadas com as da Hino e da Daihatsu, totalizaram 7,5 milhões de unidades em 2004, o que gerou quase US$ 130

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bilhões em receita líquida. A Toyota tem 46 montadoras em 26 países e regiões, excluindo o Japão, e comercializa veículos em mais de 140 países, sustentada por uma força de trabalho consolidada de 264 mil pessoas.

A Toyota Motor Europe é a empresa de holding da Toyota Motor Marketing Europe (que cuida do marketing de atacado de veículos, peças e acessórios das marcas Toyota e Lexus na Europa) e da Toyota Motor Engineering & Manufacturing Europe (que administra as operações fabris e de engenharia da Toyota na Europa).

As vendas nas operações da Toyota européia aumentaram 10% de 2003 a 2005 e representaram 13,4% das rendas totais da companhia. A renda líquida na Europa reavivou de uma perda em 2002 e ganho pequeno em 2003 para respeitáveis 6,3% de vendas no ano fiscal de 2005.

Ao longo dos últimos dez anos, as operações da Toyota Motor Marketing Europe (TMME) mudaram dramaticamente. As operações européias tiveram início com uma sede central que lidava apenas com a administração de oferta e demanda das várias operações nacionais com administração independente da Toyota. Conforme as vendas da Toyota cresciam na Europa, a equipe administrativa se deu conta de que precisava assumir maior controle sobre as operações para que a empresa atendesse bem a seus clientes europeus. Por exemplo, antes de 1999, os inventários de novos carros eram mantidos dentro de unidades de base nacional – um cliente que quisesse um Corolla verde com transmissão automática precisaria aguardar meses para consegui-lo, e que o veículo exato poderia estar do outro lado da fronteira, a poucos quilômetros de distância. A mesma situação valia para as peças de reparo. A administração percebeu que a TMME precisava começar a agir como uma única entidade européia, e não como unidades individuais de base nacional.

Princípios Arquitetônicos

Para enfrentar esse desafio, a unidade de TI na TMME vem trabalhando na construção de um alicerce de execução que sustente um modelo operacional europeu. Os membros do grupo arquitetônico não achavam as declarações de estratégia européia da empresa específicas o bastante para proporcionar-lhes a direção necessária. Por isso avaliaram as estratégias correntes para compreender as capacidades operacionais que a empresa vinha tentando construir. Eles as condensaram em uma declaração simples, que usaram para orientar o design da arquitetura. Ludo Vandervelden, CIO e vice-presidente do grupo de logística de veículos, explicou: ''A total satisfação do cliente e a realização de reduções de custos são os pilares em torno dos quais desenhamos nossos processos centrados no cliente. A arquitetura empresarial é o mapa para converter os processos em soluções eficientes e eficazes".11

A partir da declaração dessas capacidades desejadas, o grupo arquitetônico desenhou um conjunto de princípios arquitetônicos de alto nível, mostrando como cada

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princípio ajudava a empresa a atingir suas metas. Esses princípios motivaram o processo de vinculação arquitetônica da TMME. Em 2000, a equipe administrativa endossou os princípios. A unidade de TI empregou-os então para iniciar um diálogo com unidades nacionais sobre a necessidade de observar uma arquitetura empresarial regional. Peter Heinckiens, arquiteto-chefe e gerente geral de estratégia de TI, explicou: "Era importante conectar os princípios arquitetônicos às metas da empresa. Se falássemos aos gerentes de projeto apenas sobre observância arquitetônica, eles a desconsiderariam. Ao conectá-la à estratégia da empresa, nós tornamos a arquitetura relevante. Agora, se os gerentes resistirem a observá-la, nós simplesmente dizemos que com isso eles não estão apoiando a estratégia da Toyota. Isso muda a conversa".

Metodologia de Projetos

O grupo arquitetônico começou então a implementação. Depois de alguns deslizes iniciais, ele constatou que a única maneira de realmente assegurar que os projetos de negócio não violassem a arquitetura era criar para eles um processo disciplinado e nomear um arquiteto para cada projeto (com alguns arquitetos lidando com vários projetos diferentes ao mesmo tempo). Para introduzir disciplina no processo de gestão de projetos, o grupo arquitetônico adaptou e instalou uma metodologia de projetos padronizada.

Incentivos

Heinckiens nomeou um arquiteto de projeto para cada equipe e criou um sistema exclusivo de recompensas para esses arquitetos. O primeiro e mais básico critério usado para avaliar um arquiteto de projetos era saber se o seu projeto havia tido sucesso. Em caso positivo, e se o projeto houvesse ajudado a implementar a arquitetura empresarial, então o arquiteto havia "atingido plenamente" as metas. Se o projeto houvesse tido sucesso e ajudado a implementar a arquitetura empresarial, com o trabalho arquitetônico resultando em melhorias no design da arquitetura empresarial como um todo, então o arquiteto havia "superado" as metas. Esse enfoque na concretização bem-suce-dida dos projetos contribuiu para a aceitação dos arquitetos de projeto por parte das equipes e, de resto, assegurou que as soluções arquitetônicas fossem realistas e se alinhassem com as metas de negócio. Essas mudanças facilitaram a implementação da vinculação arquitetônica na TMME.

Custeio

Outro elemento-chave no modelo de envolvimento da TMME era o custeio. O grupo arquitetônico central tinha uma fonte limitada de fundos para dar suporte aos projetos.

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Por exemplo, se um projeto precisasse se conectar a um banco de dados para verificar o estoque de peças avulsas, e este último precisasse de atualização, caberia ao projeto atualizar o banco de dados e sua interface. Em alguns casos, isso resultava em custos de projeto mais elevados, que levavam o grupo arquitetônico a procurar outros projetos que também exigissem a interação com o banco de dados, de modo a compartilhar o custo. Se nenhum outro fosse encontrado, o grupo arquitetônico custeava por conta própria as despesas extras de desenvolvimento. Heinckiens explicou: "Se você possui um bom envolvimento, a maioria dos esforços arquitetônicos é custeada por meio dos projetos. Estes precisam fazer o trabalho de qualquer modo, por isso o que você está fazendo é apenas pedir a eles que o façam de maneira arquitetonicamente sensata. O custo de fazer alguma coisa direito muitas vezes não é maior, e resulta com freqüência em economias gerais para o projeto".

Autoridade Impositiva

Outro importante componente do modelo de envolvimento da TMME é a autoridade de "puxar o plugue" de um projeto. Graças à primorosa vinculação da arquitetura com as metas estratégicas da empresa e da extensiva educação sobre a sua importância, a equipe arquitetônica conquistou a credibilidade e a autoridade necessárias para encerrar um projeto caso fosse preciso. Essa é uma autoridade raramente usada, mas que constitui uma parte integral da cultura da Toyota.12 Tal opção dá aos arquitetos algum poder adicional para atingir as metas da TMME, e confere maior peso ao processo de vinculação da arquitetura.

Avaliação Inicial

Mas o grupo arquitetônico descobriu que esse nível de envolvimento não bastava. Certos projetos eram comissionados em total desalinho com a arquitetura empresarial, e todo o esforço dos arquitetos de projeto não bastaria para impedir violações da arquitetura. O grupo arquitetônico percebeu que teria de se envolver mais cedo no ciclo de vida do projeto - que teria de se envolver em sua criação. Os membros do grupo criaram uma nova primeira fase na metodologia de projetos – chamada de "avaliação" –, em que o grupo arquitetônico trabalhava juntamente com a equipe administrativa para garantir que o projeto fosse definido de modo compatível com a arquitetura empresarial.

Agora a fase de avaliação proporciona efetivamente o alinhamento da vinculação na TMME. Por exemplo, o grupo de TI foi orientado a criar um serviço na Web que permitisse aos clientes escolher acessórios para automóveis - capas para volante, câmbios e coisas do tipo. A meta era oferecer aos clientes imagens dos acessórios e a

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capacidade de escolher os que preferissem. O grupo arquitetônico deu-se conta de que os dados básicos se encontravam em vários locais, inclusive em uma aplicação cujo fornecedor havia saído do ramo. Em vez de construir um aplicação por cima dessa estrutura de dados, o grupo trabalhou junto com os gerentes de negócio para redimensionar o projeto e incorporar nele o design e a construção de um novo banco de dados para acessórios. O projeto inicial só precisava implementar uma pequena peça desse banco de dados, mas o design facilitou para que futuros projetos concluíssem o trabalho. Ao envolver-se antes do início do projeto e redimensioná-lo, o grupo arquitetônico ajudou a arquitetura a progredir, sem aumentar o custo do projeto inicial.

Resultados

A TMME mensura a eficácia de seus esforços arquitetônicos mediante uma série de indicadores. Ela usa tais indicadores para determinar o grau de observância arquitetônica dos projetos e de que modo a arquitetura está contribuindo para o sucesso comercial. A observância técnica da arquitetura por parte dos projetos aumentou de 26% em 2001 para 93% em 2005. Além disso, a empresa avaliou a medida em que sua arquitetura empresarial habilitou iniciativas estratégicas. A pontuação nessa avaliação subiu 76% entre 2001 e 2005.13

O modelo de envolvimento da Toyota Motor Marketing Europe ajudou a transformar as operações européias da Toyota de um conjunto de unidades nacionais independentes em um modelo operacional mais integrado. E os resultados têm sido positivos: o tempo de entrega de veículos da Toyota na Europa foi reduzido em 35% e o inventário de peças avulsas, em quase 50%. Já as vendas unitárias européias cresceram mais de 11% ao ano de 2001 a 2004.

O Que É um Bom Envolvimento?

Independentemente e juntos, os três ingredientes do envolvimento geram valor de negócio. Sem uma governança de TI eficaz, não há clareza quanto a quem toma as decisões e como essas pessoas são responsabilizadas. Sem uma boa gestão, os projetos correm o risco de exceder riscos e custos e de não atingir seus objetivos. Sem mecanismos efetivos de vinculação, não há oportunidades regulares de discutir e tomar decisões sobre a capacidade de um projeto de aproveitar o alicerce e contribuir para a evolução deste. Em conjunto, os ingredientes do modelo de envolvimento reforçam comportamentos desejáveis para criar um alicerce de execução em um projeto por vez.

Baseando-nos em pesquisas com estudos de caso em 18 empresas, identificamos alguns princípios para assegurar que a governança de TI, a gestão de projetos e os mecanismos de vinculação resultem em um envolvimento bem-sucedido:

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Objetivos claros, específicos e praticáveis. Modelos eficazes de envolvimento da TI elucidam os objetivos estratégicos, de maneira a deixar claros os requisitos de padronização e integração. A primeira atividade do grupo arquitetônico da TMME foi desenvolver essa declaração clara e obter para ela o endosso da alta administração.

Motivação para atender às metas da empresa. Incentivos formais (por exemplo, planos de bônus, exames anuais e indicadores de desempenho) ajudam a concentrar os líderes das unidades comerciais e os gerentes de projeto nas metas da empresa, das unidades e dos projetos. Na TMME, tais coisas estão incorporadas nos sistemas de recompensa dos gerentes e arquitetos de projeto.

Autoridade impositiva. Um complemento para os incentivos formais é a imposição formal. Ambos ajudam a aumentar a credibilidade de um esforço. A imposição proporciona um processo para mudar, descontinuar ou abrir uma exceção para um projeto que não condiga com a arquitetura empresarial desejada. Em várias empresas, o primeiro projeto que foi efetivamente penalizado por inobservância (fosse com um adiamento, fosse com a suspensão dos fundos) constituiu o ponto de desequilíbrio que alavancou a credibilidade dos esforços de envolvimento.

Intervenção e prevenção precoces. Os grupos de TI bem-sucedidos envolvem-se com os projetos de negócio já nos estágios iniciais de desenvolvimento, para evitar, antes de mais nada, que más soluções surjam e para descobrir como aprimorar a arquitetura-alvo. Por exemplo, a organização de TI da Raytheon envolve-se com os projetos de negócio já nos primeiros estágios.

Comunicação transparente e regular em mão dupla. Com o bom envolvimento fica claro para todos como o modelo funciona e quem está envolvido nele. Além disso, o alinhamento e a coordenação não são apenas conquistados; eles são mantidos por meio do diálogo regular entre negócios e TI e entre as unidades comerciais. Isso ajuda a desfazer a impressão de que os processos de envolvimento são apenas uma maneira de o centro corporativo ou a TI imporem sua vontade e permite que as partes aprendam umas com as outras, negociem diferenças e desenvolvam uma compreensão comum do alicerce de execução.

E, como se viu no capítulo 5, os resultados do envolvimento podem ser profundos.

As empresas cujas iniciativas arquitetônicas eram estrategicamente eficazes tinham arquitetos em 81% de suas equipes de projeto; empresas de menos sucesso tinham arquitetos em apenas 49% delas. As bem-sucedidas examinavam um número muito maior de projetos em termos de observância arquitetônica e envolviam mais gerentes seniores na definição e supervisão de iniciativas arquitetônicas.

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SOSCO: o Modelo de Envolvimento em Ação

Uma grande empresa americana de software e serviços vinha se estruturando tradicionalmente para estimular a especialização nas unidades comerciais.14 Essa empresa, que chamaremos de "SOSCO"', não tinha agentes nem filiais. Em vez disso, cada unidade comercial desenvolvera uma central de atendimento com representantes especializados no atendimento ao cliente. Quando um novo CEO foi contratado no início de 2000, ele desenvolveu a visão de um modelo operacional mais integrado (um modelo de Coordenação, com alta integração e baixa padronização). A administração de TI usou essa visão para elaborar uma nova arquitetura empresarial. A nova arquitetura especificou que os clientes da SOSCO ganhariam acesso aos produtos e serviços da empresa mediante múltiplos canais, integrados por meio de uma tecnologia e um ambiente de dados padronizados.

Projetando uma Governança de TI com Sinergias por Toda a Empresa

Para implementar a nova visão de uma firma mais integrada, a SOSCO fez mudanças estruturais enfatizando processos válidos na empresa como um todo. Por exemplo, os departamentos de marketing das unidades comerciais foram consolidados em um setor de marketing corporativo. Uma mudança central foi a criação de uma nova unidade de operações gerais da empresa (CWO). Liderada por um vice-presidente executivo, a CWO é responsável por todos os projetos de âmbito geral.

Além das mudanças estruturais, a SOSCO concebeu processos de governança de TI que estimulam sinergias por toda a empresa. Ela esclareceu os direitos decisórios para cada uma das decisões centrais de TI (ver tabela 6-2), atribuindo a responsabilidade por estas a cinco grupos diferentes:

1. O comitê executivo da SOSCO: consiste no CEO, nos presidentes das sete grandes companhias operacionais, no CIO e no chefe da CWO. Esse comitê reúne-se mensalmente para esclarecer as metas gerais da empresa e distinguir as fronteiras entre a empresa e as unidades comerciais.

2. Operações gerais na empresa: define e implementa grandes projetos refletindo as metas gerais especificadas pelo comitê executivo. A CWO tem um quadro de 275 membros, incluindo 15 gerentes de programa que coordenam múltiplos projetos relativos a um único processo comercial (por exemplo, a gestão do relacionamento com o cliente).

3. A unidade de TI- chefiada pelo CIO corporativo. Os CIOs das unidades comerciais têm duas relações de subordinação – com o CIO e com os gerentes gerais

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de suas unidades. A unidade de TI projeta serviços compartilhados e oferece acordos de nível de serviço, que são negociados com cada unidade comercial. Ela assume a responsabilidade por assegurar que investimentos na infra-estrutura técnica deixem a empresa mais perto do seu alicerce de execução.

4. O comitê arquitetônico: um subconjunto de tecnólogos-chave dentro da unidade de TI. O comitê arquitetônico, com 15 membros, define os padrões técnicos e trabalha com os arquitetos de TI para identificar necessidades comuns entre todas as 700 unidades comerciais e projetos gerais da empresa.

5. O comitê diretivo de investimento: estabelece prioridades para os projetos. Liderado pelo vice-presidente executivo da CWO, este comitê de nove membros inclui gerentes seniores que representam cada uma das grandes unidades comerciais. Ao estabelecer as prioridades de projetos, o comitê considera o valor potencial, para a firma, de projetos tanto específicos das unidades comerciais quanto da empresa como um todo. Ele também leva em conta a disponibilidade da infra-estrutura necessária e o preparo da firma para implementar efetivamente cada projeto.

A SOSCO garante a coordenação das decisões de TI graças a intersecções entre os membros dessas estruturas decisórias. Por exemplo, o vice-presidente executivo da CWO participa do comitê executivo e chefia o comitê diretivo de investimento. Assim, enquanto o comitê executivo define as prioridades da empresa, o vice-presidente executivo assume a responsabilidade por refletir tais prioridades nas decisões de custeio do comitê diretivo de investimento e nos designs de projeto da CWO.

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Cada projeto da SOSCO segue uma metodologia padronizada de desenvolvimento que determina um ciclo de vida de oito fases para o projeto. Todo gerente sênior e todo membro da equipe de projetos têm familiaridade com a metodologia de projetos desenvolvida internamente na empresa. As primeiras fases do ciclo de vida do projeto ajudam a determinar sua viabilidade - a capacidade de implementá-lo, a probabilidade de que ele traga benefícios e a disponibilidade da infra-estrutura necessária. No caso de projetos de âmbito geral, a administração designa um patrocinador do projeto na principal unidade comercial, bem como co-líderes da CWO e da unidade comercial.

Vínculos entre a Governança de TI e a Gestão de Projetos

A SOSCO implementou um conjunto de papéis e processos no nível dos projetos para assegurar que as decisões de governança de TI sejam transmitidas aos projetos e implantadas em toda a firma. No intuito de vincular a gestão de projetos com a governança de TI, a SOSCO implementou os três tipos principais de mecanismos de vinculação para coordenar as metas de projeto com as metas gerais da empresa e atingir resultados dentro do prazo e do orçamento.

Os mecanismos de vinculação da arquitetura consistem em uma rede dos principais tomadores de decisões, incluindo os arquitetos de projeto, a CWO e, no caso dos projetos mais importantes, o CEO. Como a TMME, a SOSCO designa um arquiteto de TI para cada equipe de projeto. Esses arquitetos de projeto são responsáveis por assegurar que os projetos individuais condigam com os padrões tecnológicos e que os projetos relacionados reaproveitem tecnologias quando apropriado. Se um arquiteto de projeto sente que uma exceção à regra é necessária, ou ele busca a aprovação de um dos vice-presidentes assistentes com autoridade para aprovar exceções, ou encaminha o pedido a um comitê arquitetônico.

Os membros da CWO chefiam os projetos gerais da empresa e assumem a responsabilidade pela vinculação comercial. Além disso, para garantir que os grandes projetos estejam nos trilhos, o CEO reúne-se todos os meses com os presidentes das unidades comerciais para rever as finanças e discutir o progresso. Essas reuniões servem para identificar a necessidade de qualquer intervenção da administração sênior, reavaliar distribuições de recurso e metas e evitar surpresas na unidade empresarial ou nos resultados da companhia. Elas são um importante mecanismo de vinculação dos negócios.

Por fim, o CEO estimula comportamentos consistentes com sua visão por meio de um programa de bônus para todos os funcionários baseado nas metas da empresa. Em 2004, cada funcionário da SOSCO - desde o mensageiro até o mais alto executivo - recebeu um bônus de 15% como reconhecimento pela concretização das metas. Os gerentes seniores também foram recompensados por trazerem resultados à empresa e

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por seu sucesso em cumprir seus objetivos individuais. Com isso, a SOSCO sustentou o processo de envolvimento com um sistema de incentivos que premia os comportamentos desejados.

A governança de TI e a gestão de projetos são explicitamente conectadas por meio de mecanismos de vinculação arquitetônica, de negócios e de alinhamento. Como resultado, o processo de gestão de projetos reforça decisões de governança de alto nível. Tipicamente, a SOSCO investe apenas 2% de seus gastos nessa área em projetos posteriormente tidos como inviáveis, e conclui 99% de seus projetos em dia e dentro do orçamento.

Usando a Arquitetura Empresarial Como Bússola Organizacional

Ao descrever os desafios de implementar uma arquitetura de TI, Jim Crookes, arquiteto-chefe da BT, observou: "Implementar uma arquitetura é como velejar. Você precisa usar a energia do vento, mas ele não está sempre soprando na direção em que você quer seguir. É muito mais fácil ziguezaguear adiante do que remar contra o vento, que é o que os arquitetos por vezes tentam fazer. Você precisa aproveitar o impulso dos projetos comerciais para chegar onde deseja, mesmo que isso signifique que nem sempre estará seguindo na direção de suas metas"Y

As empresas que estão construindo um alicerce de execução precisam usar sua arquitetura empresarial como bússola, para seguir rumo ao modelo operacional desejado. Como meio de manter o rumo, elas usam um modelo de envolvimento da TI para influenciar a direção dos projetos e garantir que cada um deles atenda a objetivos tanto locais como gerais.

Quando melhorias arquitetônicas são embutidas nos projetos, as despesas das transformações da arquitetura distribuem-se entre estes com pouco custo incremental para cada um. Ao se envolver com os projetos cedo e regularmente, a empresa pode assegurar que cada um deles contribua para construir a arquitetura e que esta última seja realista e alinhada com suas metas. O envolvimento efetivo assegura que todos os stakeholders compartilhem riscos e responsabilidades associados à transformação dos processos comerciais e dos sistemas de TI que se faz necessária para gerar sinergias no âmbito geral. E com um bom envolvimento a empresa garante que o alicerce correto seja construído de maneira contínua e confiável, em um projeto de cada vez.