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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ CLAUDIA DANIELE CASEIRO CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA: TRIBUTO COBRADO PARA COBRIR O CUSTO DE OBRA PÚBLICA OU PARA CAPTAR A MAIS-VALIA IMOBILIÁRIA? CURITIBA 2011

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

CLAUDIA DANIELE CASEIRO

CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA: TRIBUTO COBRADO PARA

COBRIR O CUSTO DE OBRA PÚBLICA OU PARA CAPTAR A

MAIS-VALIA IMOBILIÁRIA?

CURITIBA 2011

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CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA: TRIBUTO COBRADO PARA

COBRIR O CUSTO DE OBRA PÚBLICA OU PARA CAPTAR A

MAIS-VALIA IMOBILIÁRIA?

CURITIBA 2011

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CLAUDIA DANIELE CASEIRO

CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA: TRIBUTO COBRADO PARA

COBRIR O CUSTO DE OBRA PÚBLICA OU PARA CAPTAR A

MAIS-VALIA IMOBILIÁRIA?

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Prof°. Dr. Francisco Fernando Bittencourt de Camargo.

CURITIBA 2011

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TERMO DE APROVAÇÃO

CLAUDIA DANIELE CASEIRO

CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA: TRIBUTO COBRADO PARA

COBRIR O CUSTO DE OBRA PÚBLICA OU PARA CAPTAR A

MAIS-VALIA IMOBILIÁRIA?

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel em Direito no Programa de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, de de 2011.

Coordenador Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite Curso de Ciências Jurídicas

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: Prof. Dr. Francisco Fernando Bittencourt de Camargo

Universidade Tuiuti do Paraná – Direito Tributário Prof. Dr.

Universidade Tuiuti do Paraná – Prof. Dr.

Universidade Tuiuti do Paraná –

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AGRADECIMENTOS

Este momento de minha vida é mais que o cumprimento de uma etapa.

Esta é a realização de um sonho, um ideal, pois é impossível medir ou

descrever os esforços para se chegar à conclusão dessa fase da vida.

Apesar de parecer um clichê, agradeço primeiramente a Deus, fonte de

inspiração, vida e coragem que me sustentou até aqui. Que me fez crer no

impossível e entender o que não estava ao alcance da minha razão. Um Deus,

que me mostrou o que era certo a partir dos meus erros e que me deu

combustível para continuar.

Aos meus amigos, os quais seria injusto nomeá-los, mas meu coração já

os elegeu e cada um sabe disso. Em algumas poucas palavras, me ensinaram

que a vida é muito mais e que vale a pena ir adiante. Em especial, aprendi com

eles a ser menos “frouxa” e encarar tudo de frente com mais coragem.

Agradeço ao corpo docente e, em especial, ao Professor, Advogado e

Orientador Doutor Francisco Fernando Bittencourt de Camargo que me

ensinaram e transmitiram conhecimento e experiência pessoal na caminhada

rumo ao tão sonhado grau de Bacharelado em Direito.

Por fim, mas não menos importante, meus sinceros agradecimentos à

minha família que estava presente em todos os dias na luta para a efetivação

deste meu sonho, sempre com paciência, amor, estímulo e compreensão

quando da minha ausência em seus cotidianos, mesmo que a mim faltasse a

paciência, a dedicação e compreensão para com eles.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO................................................................................................... 08

2. FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA............. 10

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA.................... 10

2.1.1 Histórico Geral............................................................................................... 10

2.1.2 Evolução no Brasil......................................................................................... 11

2.1.3 Contribuição de Melhoria na Constituição Federal de 1988......................... 17

2.2 ASPECTOS GERAIS....................................................................................... 19

2.3 PRINCÍPIOS .................................................................................................... 19

2.3.1 Princípio da Legalidade................................................................................. 19

2.3.2 Princípio do Enriquecimento Sem Causa...................................................... 21

2.3.3 Domínio Eminente......................................................................................... 23

2.3.4 Princípio da Isonomia Tributária.................................................................... 23

2.3.5 Capacidade Contributiva............................................................................... 25

2.3.6 Proibição de Confisco................................................................................... 30

2.3.7 Princípio da Proporcionalidade..................................................................... 31

3. CONCEITO E ELEMENTOS DO FATO GERADOR DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA............................................................................................................

32

3.1. CONCEITO..................................................................................................... 32

3.2. REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA................................................................. 37

3.2.1 Critério Material............................................................................................. 38

3.2.2 Critério Espacial............................................................................................ 38

3.2.3 Critério Temporal........................................................................................... 39

3.2.4 Critério Subjetivo........................................................................................... 42

3.2.4.1 Sujeito Ativo............................................................................................... 42

3.2.4.2 Sujeito Passivo........................................................................................... 44

3.2.5 Critério Quantitativo....................................................................................... 46

3.2.5.1 Limites da Base de Cálculo........................................................................ 47

3.2.5.2 Custo da Obra Pública............................................................................... 48

3.2.5.2.1 Aspectos relevantes do Decreto-Lei nº 195/67...................................... 49

3.2.5.3 Valorização Imobiliária............................................................................... 51

3.2.5.4 Alíquota...................................................................................................... 55

3.3 Modelo Alemão e Modelo Inglês...................................................................... 58

3.4. Motivos que impedem a plena utilização do Tributo....................................... 61

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4. CONCLUSÃO.................................................................................................... 64

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................. 68

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RESUMO

A presente monografia tem por objetivo delinear de forma geral a espécie tributária denominada contribuição de melhoria, examinando as suas origens, características e os motivos encontrados em doutrina que impedem a sua plena utilização. O tributo em estudo é pouco utilizado pelos entes federativos, as razões apontadas são: a falta de vontade política, complexidade para a sua instituição e falta de estrutura, especialmente por parte dos Municípios, para determinar a zona de influência da valorização imobiliária. A contribuição de melhoria é um tributo justo, já que não permite que poucos, em detrimento de muitos e financiados por todos, aufiram ganhos, em forma de valorização imobiliária, sem nenhum tipo de contraprestação, já que para a instituição da mesma é necessário que haja uma obra pública da qual ocasione valorização sobre os imóveis a arcar com o custo da obra. A contribuição de melhoria é um instituto tributário que possui vasta aplicação no direito comparado, podendo ser detectados três sistemas básicos de cobranças, a saber, sistema de custo, sistema de valorização e sistema misto. Isso porque a sua hipótese de incidência é mista. Os julgados pesquisados refletem que normalmente os entes tributantes não observam a base de cálculo do tributo, consubstanciada na valorização imobiliária, bem como não respeitam os limites individuais (valorização) e o total (custo da obra).

PALAVRAS–CHAVE: Direito tributário. Competência tributária. Princípios tributários. Contribuição de Melhoria. Valorização imobiliária. Custo da obra.

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1. INTRODUÇÃO

A atividade tributária é o instrumento pelo qual o Estado arrecada dinheiro

para que, após, o aplique com vistas a realizar os objetivos previstos na Constituição

Federal.

O tributo objeto deste estudo é muito pouco explorado em nosso direito, os

motivos justificadores da sua pouca utilização encontrados na doutrina serão

explorados, considerando a crise fiscal experimentada pelos municípios, os

principais beneficiários de uma imposição desta natureza, que a partir da sua

adoção passariam a contar com uma fonte adicional de receitas, que fatalmente

implicaria o crescimento de sua capacidade de investimento em melhorias no

ambiente urbano.

A contribuição de melhoria é espécie tributária que tem como fato gerador a

valorização imobiliária motivada por obra realizada pelo poder público.

O atual trabalho ressalta o caráter de justiça fiscal proporcionado pela

contribuição de melhoria, que permite buscar junto aos proprietários de imóveis

beneficiados pelo incremento patrimonial proporcionado por obras públicas, uma

espécie de “ressarcimento” ao poder público pelos investimentos realizados em

determinada área.

Iniciando o presente estudo pelos fundamentos jurídicos da contribuição de

melhoria, por uma breve análise histórica do tributo, de forma geral e em especial

sua evolução no Brasil, ao longo das Constituições de 1934, 1937, 1946, 1967/1969

e a de 1988. Estudaremos ainda, os princípios constitucionais tributários que com

ela se relacionam.

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Após, serão traçados os seus contornos, englobando assim o conceito e os

elementos do fato gerador da contribuição de melhoria, enfocando a regra-matriz de

incidência, com análise de relevantes aspectos extraídos dos dispositivos do

Decreto-Lei nº 195/67, que regulamenta a matéria do plano federal, e a alíquota. E

por fim, versaremos do modelo alemão e inglês do tributo em comento, bem como

os motivos que impedem a sua plena utilização.

Pode-se considerar a contribuição de melhoria, como o tributo mais justo do

sistema tributário nacional, pois não permite que certa parcela populacional tenha

acréscimo econômico, sem esforço algum, já que o contribuinte que tiver seu imóvel

beneficiado por obra pública e com valorização do mesmo deverá arcar com o

pagamento da exação.

Por outro lado, também se pode afirmar que se trata de um ótimo meio de

desenvolvimento urbanístico sem maiores ônus para a pessoa política que o instituir

e, no âmbito municipal, mostra-se uma ótima solução para grandes problemas

enfrentados, principalmente ante a atual crise econômica enfrentada por quase

todas as pessoas jurídicas de direito público.

Entretanto, muitas vezes os procedimentos adotados para a instituição de

cobrança do tributo não estão em conformidade com a legislação, acarretando a sua

nulidade pela declaração do Poder Judiciário.

Dessa forma, os gestores públicos para que tenham êxito na aplicação

dessa fonte de arrecadação pouca utilizada, é preciso que se atente para as razões

de sua pouca utilização e os problemas comumente presentes e, então começar a

instituir tal tributo com o principal objetivo de aumentar as receitas dos Municípios de

forma isonômica e justa.

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2. FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA

2.1.1 Histórico Geral

Saraiva, Caruso e Santos defendem que a origem da contribuição de

melhoria ocorreu no século XIII, na Inglaterra:

“As primeiras notícias de contribuição de melhoria datam de 1250, na Inglaterra. Procurava-se um meio para custear os grandes empreendimentos do Estado, ao mesmo tempo em que se constatava um benefício especial, para alguns móveis, em relação aos outros, advindos da realização de tais obras.” (1999, p.252)

Após um bom tempo, em 1691 a Assembléia de Nova Iorque baixou uma

ato legislativo instituindo uma contribuição especial denominada de special

assessment, o que, para Bilac Pinto, seria a origem do fenômeno, não importando

que tenham ocorrido ensaios anteriores. Seu apogeu deu-se em 1912, quando o

avanço se justificou em face da necessidade de se recuperarem os investimentos

públicos no desenvolvimento do Oeste americano. (Bilac Pinto, pp.19, 95 e 96)

Contrariando essa idéia, a categoria norte-americana abrangia os chamados

benefit assesment e os cost assessment (de benefício e de custo), sendo a primeira

espécie a que mais se aproxima da atual contribuição de melhoria, por compreender

os benefícios produzidos pela realização de uma obra pública. A segunda espécie,

ao contrário, era cobrada em decorrência do exercício do poder de polícia estatal,

sendo seu objetivo o exercício do poder regulamentar com vistas à preservação da

ordem pública e, subsidiariamente, a arrecadação. São exemplos desta última o

assessment de custo de passeio, de limpeza de estradas, dentre outros.1

Lembra Carlos Marques que,

1 Estas atividades são justificativas para a cobrança do tributo denominado taxa que, como se sabe,

repousa em atividade pública consubstanciada numa prestação efetiva de serviço público divisível e específico ou a sua disponibilização ao contribuinte, bem como no exercício da atividade de polícia estatal.

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“... até este momento a ratio essendi da cobrança era a realização de uma obra pública, onerando-se a coletividade apenas como forma de recuperar os recursos financeiros usados na execução da atividade administrativa. Não se falava do segundo aspecto, moderno, considerado como causa para incidência do vínculo, que é a mais-valia imobiliária resultante da obra.” (2005, p.8)

E Leonetti, citando Baleeiro, complementa a evolução do tributo em face

dos avanços perpetrados pela França:

“Assim, a partir da pioneira experiência francesa (...) começou-se a delinear o atual perfil da contribuição de melhoria, informada, como bem lembra Baleeiro, pelo princípio do não enriquecimento sem causa, típico do direito privado. Por este princípio, sempre que alguém experimentar acréscimo em seu patrimônio econômico, ou este deixar de sofrer diminuição, à custa do empobrecimento de outrem, sem que haja razão jurídica para tal, está obrigado a indenizar este, pelo valor do qual seu patrimônio foi aumentado. Neste diapasão, a contribuição de melhoria, antes de colimar a arrecadação de recursos para o Estado, visaria o ressarcimento deste pelo enriquecimento experimentado pelos proprietários de imóveis beneficiados por obras públicas.” (2000, p.88.)

A evolução mundial da exação e o aumento do seu uso é resumida por

Leonetti, valendo transcrever:

“No século XX, a contribuição de melhoria, nas suas mais variadas formas, conheceu intensa utilização, em quase todos os países, embalada na crença de ser o tributo mais justo de todos e escorada na necessidade de urbanização (ou reurbanização) das cidades, principalmente aquelas atingidas pelas duas grandes guerras.” (2000, p.90)

No plano mundial em síntese, esse é o breve relato do acontecido no que se

refere à contribuição de melhoria. É notável que suas origens sejam remotas e que

vários países tiveram a sua própria existência, adaptando o tributo em comento de

acordo com a realidade de cada um, da forma que acreditavam ser mais justa e

funcional. No Brasil não foi diferente e, dessa forma, passa-se ao estudo da

evolução do tributo no âmbito nacional.

2.1.2 Evolução no Brasil

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Desde o Brasil Império já se ensaiava a imposição de certa forma de

pontualidade atrelada a uma obra pública. Assim, foi em 1812, quando na cidade de

Jaguaribe, interior da Bahia, conseguiu-se autorização para lançar fintas2, visando à

edificação de obras públicas.

Comenta Carlos Roberto Marques que,

“Em 1818, o mesmo ocorreu na cidade de Mariana, Minas Gerais, onde foram criadas fintas para reparo de várias pontes. Apesar da aproximação maior com as taxas, já se começava a falar de obras públicas como fundamento de uma exação pública. Em 1825 surgiu a Lei nº 816, determinando que do montante indenizatório inerente à desapropriação se reduzisse a valorização imobiliária causada por uma obra pública ao restante da propriedade. Começava-se, no Brasil, a se combater a mais-valia imerecida. Essa lei foi revigorada em 1855 pelo Decreto Imperial nº 1664.” (2005, p.12)

Segundo João Batista Moreira, quando se foi apurar o montante

indenizatório necessário à implementação do processo expropriatório, os financistas

supreenderam-se com o valor elevado, constatando que a parte remanescente das

propriedades utilizadas para passagem da nova via pública tiveram brutal

valorização em razão da obra, de modo que, para minimizar a grande despesa do

Estado na operação, decidiu abater do quantum a indenizar a parcela referente à

citada valorização (1981, p.182). Segundo Bilac Pinto, esse princípio teve ampla

aplicação, com surpreendentes resultados para o Poder Público. (Bilac Pinto, p.61)

Entretanto,

“Inserido nesta gama de diplomas legislativos antecedentes, aquele que efetivamente cria um gravame público aproximado à contribuição de melhoria é o Decreto de nº 21.390, de 11/05/1932, que instituiu a „taxa especial de benefício‟, cuja competência tributária foi assegurada à União, Estados e Municípios.” (2005, p.13)

2 Contribuição municipal ou paroquial extraordinária, proporcional aos haveres de cada um. (Definição

retirada do Dicionário virtual Priberam da Língua Portuguesa).

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Avaliando a justificativa do legislador3 para a criação da referida taxa,

sustenta Arx Tourinho ser o citado estatuto o mais importante como precursor da

contribuição de melhoria. (1986, p.142)

Em linhas gerais, essas foram às legislações infraconstitucionais de maior

importância na evolução do tributo, ainda não chamado de contribuição de melhoria

e, nem tão pouco a efetiva caracterização como espécie de exação.

Primeira previsão constitucional da contribuição de melhoria deu-se na

Constituição de 1934, cuja redação do art. 124 era o seguinte “provada à valorização

do imóvel por motivo de obras públicas, a Administração, que as tiver efetuado,

poderá cobrar dos beneficiados contribuição de melhoria”.

Pode-se concluir, portanto, que a Carta Magna de 1934, ao instituir essa

espécie tributária “tem grandes méritos: deixa claro que deve haver uma valorização,

a qual deve estar de fato comprovada, para que o Poder Público fique autorizado a

„cobrar‟ a contribuição de melhoria”. (2002, p.20)

Poucos anos após, uma nova Constituição foi outorgada, em 1937.

Dispondo sobre o tema Carlos Roberto Marques faz referência ao,

“Texto constitucional de 1937 que silenciou acerca da referida espécie tributária, dando ensejo à discussão acerca da sua existência ou não sob o escudo da referida carta, ficando vencedora a tese defendida pelo colendo STF, de que a omissão do texto constitucional não teve o condão de retirar a contribuição de melhoria do sistema tributário nacional”. (2005, p.14)

Em 1946, com mais uma Constituição promulgada, a contribuição de

melhoria “(...) retornou o texto no art. 30, I, autorizando a União, Estados e Distrito

Federal a cobrá-la quando houvesse valorização do imóvel em razão de obra

3 “Todo serviço de caráter local, produzindo benefícios locais ou restritos a uma determinada zona,

deve ser custeado por uma taxa local, especial ou de benefício, paga pelos direta ou indiretamente beneficiados e cujo produto correspondente ao custo do serviço”.

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pública, não podendo a cobrança exceder os limites das despesas realizadas”

(2005, p.25), nem ao acréscimo de valor que da obra decorrer para o imóvel

beneficiado.

Em 1949, a União, através da Lei nº 854, regulamentou o tributo tentando

complementar a Constituição então vigente. Aspecto interessante desta lei é

ressaltado por Accioly, no sentido de que o seu art. 3º, letra “b”, estabelece a

possibilidade de a iniciativa de execução da obra partir dos proprietários que

venham a se beneficiar com ela, possibilitando a distribuição entre os mesmos para

financiar o custo do beneficiamento ou melhoramento levado aos imóveis,

característica que dá à contribuição de melhoria uma feição sui generis. (1951,

p.101)

Lecionando sobre o tema Carlos Marques conclui que o “poder público da

época pretendia imprimir à contribuição de melhoria um caráter contratual

semelhante ao do special assessment norte-americano”. (2005, p.15)

A contribuição de melhoria é definitivamente colocada no cenário nacional

com uma espécie tributária distinta da taxa a partir da EC nº 18 à Carta de 1946.

Assevera Fenelon Teodoro Reis que a mistura existia em razão da ausência

de conceituação legal para se destacar taxa da contribuição de melhoria, daí a

confusão de muitos doutrinadores ao considerarem a contribuição de melhoria como

taxa. Essa dúvida se materializou na Súmula nº 129, da jurisprudência predominante

do STF, quando assentou que “na conformidade da legislação local, é legítima a

cobrança da taxa de calçamento”. (Revista Ajuris, março 1978, p.39)

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Em 26 de outubro de 1966 foi promulgada a Lei nº 5.172 (Código Tributário

Nacional), reproduzindo, no seu art. 81, o conceito constitucional do tributo em

comento, ficando com a seguinte redação:

Art. 81. A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.

No art. 82 da mesma legislação anteriormente mencionada, estabelecem os

requisitos mínimos necessários para a instituição da cobrança da contribuição de

melhoria, qual seja:

Art. 82. A lei relativa à contribuição de melhoria observará os seguintes requisitos mínimos: I - publicação prévia dos seguintes elementos: a) memorial descritivo do projeto; b) orçamento do custo da obra; c) determinação da parcela do custo da obra a ser financiada pela contribuição; d) delimitação da zona beneficiada; e) determinação do fator de absorção do benefício da valorização para toda a zona ou para cada uma das áreas diferenciadas, nela contidas; II - fixação de prazo não inferior a 30 (trinta) dias, para impugnação pelos interessados, de qualquer dos elementos referidos no inciso anterior; III - regulamentação do processo administrativo de instrução e julgamento da impugnação a que se refere o inciso anterior, sem prejuízo da sua apreciação judicial. § 1º A contribuição relativa a cada imóvel será determinada pelo rateio da parcela do custo da obra a que se refere a alínea c, do inciso I, pelos imóveis situados na zona beneficiada em função dos respectivos fatores individuais de valorização. § 2º Por ocasião do respectivo lançamento, cada contribuinte deverá ser notificado do montante da contribuição, da forma e dos prazos de seu pagamento e dos elementos que integram o respectivo cálculo.

Um ano após, a Constituição de 1967 manteve a contribuição de melhoria

como espécie tributária autônoma, porém, extinguiu o limite individual, conforme

ficou insculpido no art. 19, III, § 3º. Vejamos:

Art. 19 - Compete à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios arrecadar: III - contribuição de melhoria dos proprietários de imóveis valorizados pelas obras públicas que os beneficiaram.

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§ 3º - A lei fixará os critérios, os limites e a forma de cobrança, da contribuição de melhoria a ser exigida sobre cada imóvel, sendo que o total da sua arrecadação não poderá exceder o custo da obra pública que lhe der causa.

O governo expede o Decreto-Lei nº 195, em 24 de fevereiro de 1967,

dispondo sobre a contribuição de melhoria, definindo como seu fato gerador o

acréscimo do valor do imóvel ocasionado em razão de uma obra pública (art. 1º),

bem como, estabelece em seu art. 2º um rol de obras públicas suscetíveis de gerar a

mais-valia imobiliária. Note,

Art. 1º A Contribuição de Melhoria, prevista na Constituição Federal tem como fato gerador o acréscimo do valor do imóvel localizado nas áreas beneficiadas direta ou indiretamente por obras públicas.

Art. 2º Será devida a Contribuição de Melhoria, no caso de valorização de imóveis de propriedade privada, em virtude de qualquer das seguintes obras públicas: I - abertura, alargamento, pavimentação, iluminação, arborização, esgotos pluviais e outros melhoramentos de praças e vias públicas; II - construção e ampliação de parques, campos de desportos, pontes, túneis e viadutos; III - construção ou ampliação de sistemas de trânsito rápido inclusive todas as obras e edificações necessárias ao funcionamento do sistema; IV - serviços e obras de abastecimento de água potável, esgotos, instalações de redes elétricas, telefônicas, transportes e comunicações em geral ou de suprimento de gás, funiculares, ascensores e instalações de comodidade pública; V - proteção contra secas, inundações, erosão, ressacas, e de saneamento de drenagem em geral, diques, cais, desobstrução de barras, portos e canais, retificação e regularização de cursos d‟água e irrigação; VI - construção de estradas de ferro e construção, pavimentação e melhoramento de estradas de rodagem; VII - construção de aeródromos e aeroportos e seus acessos; VIII - aterros e realizações de embelezamento em geral, inclusive desapropriações em desenvolvimento de plano de aspecto paisagístico.

Apesar da Emenda Constitucional de 1969, ter sido outorgada pelos

ministros militares, teve no art. 18, II o mérito de ressuscitar os dois limites utilizados

para a cobrança do referido tributo, ou seja, o limite total e o limite individual.

Notemos:

Art. 18. Além dos impostos previstos nesta Constituição, compete à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir: II – contribuição de melhoria, arrecadada dos proprietários de imóveis valorizados por obras públicas, que terá como limite total a despesa

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realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.

A Emenda Constitucional nº 23 de 1983, eliminou o limite individual,

voltando apenas o limite total. Outra mudança efetuada pela emenda em epígrafe foi

a modificação do vocábulo “valorizados” por “beneficiados”, conforme veremos

adiante.

Adverte Carlos Marques que,

“a Emenda Constitucional 23/1983 alterou a redação da Constituição vigente, reiterando o termo “valorização” e colocando em seu lugar a expressão “imóveis beneficiados”, o que levou alguns juristas da época a sustentar que não era mais condição para a cobrança da contribuição de melhoria a ocorrência da mais-valia imobiliária, bastando um benefício qualquer fundado pela obra pública”. (2005, p.16)

Em linhas gerais está é a síntese da evolução história do tributo no Brasil,

antes da Constituição de 1988, passamos a análise da contribuição de melhoria

posteriormente a este marco histórico.

2.1.3 Contribuição de Melhoria na Constituição Federal de 1988

De início, é importante salientar que já é pacífico o entendimento

jurisprudencial, conforme veremos adiante, de que a Constituição Federal de 1988

recepcionou as normas contidas no Código Tributário Nacional e no Decreto-Lei nº

195/67, mantendo como limite total à despesa realizada e como limite individual o

acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.

O que ampara está tese de recepção das legislações tributárias, para

Janczeski (1998, p.33) são as disposições do §5º, do art. 34, da ADCT, que assenta:

“Vigente o novo sistema tributário nacional, fica assegurada a aplicação da

legislação anterior, no que não seja incompatível com ele e com a legislação referida

nos §§ 3º e 4º”.

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Já para Aliomar Baleeiro,

“a jurisprudência, depois da Emenda Constitucional nº 23/83 e da Constituição de 1988, exige a comprovação da valorização imobiliária, decorrente de obra pública, como pressuposto legitimador da cobrança do tributo. O Supremo Tribunal Federal, nos RE nºs 115.863; 116.147 e 116.148-5-SP-1993, assim como o STJ, tem rejeitado lançamentos de contribuição de melhoria sem a demonstração do pressuposto de valorização do imóvel, dando acolhida aos arts. 81 e 82 do CTN e ao Decreto-Lei nº 195/67”. ( 2002, p.579)

Tanto é verdade que, o STF editou a súmula 496, para que cessasse tal

discussão. In verbis: “São válidos, porque salvaguardados pelas Disposições

Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1967, os Decretos-Leis

expedidos entre 24 de janeiro e 15 de março de 1967.”

A Constituição Federal de 1988 veio prescrevendo a regra, no tocante a

contribuição de melhoria no art. 145, III da seguinte maneira:

“Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: (...) III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.”

Para Priscilla Figueiredo o Texto Constitucional merece ser analisado

separadamente da seguinte forma:

“I- Sujeito composto: „União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios‟. II- Predicado verbal: „poderão instituir (...) contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas‟. III- Verbo Principal: „instituir‟. IV- Verbo auxiliar: „poderão‟. V- Objeto direito do verbo „instituir‟: „contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas‟. VI- Adjunto nominal: „de melhoria‟(caracteriza o nome “contribuição”). VII- Adjunto adnominal: „decorrente‟ (adjetivo vazio, que pede complemento). VIII- Complemento nominal do adjunto adnominal: „de obras públicas‟.” (2002, p.39)

A mesma autora dissertando sobre o adjunto adnominal “decorrente de

obras públicas”, menciona que:

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“É lícito concluir que se a explicativa é dispensável é porque é inerente à contribuição de melhoria ser decorrente de obra pública. E, de fato, como vimos, a obra pública é condição necessária à tributação. Isto é, não se tributa por meio de contribuição de melhoria mais-valia imobiliária que não tenha sido causada por obra pública. Assim, ser decorrente de obra pública é inerente á contribuição de melhoria. Sabe-se, pela tradição de nosso Direito e pela doutrina, que só se exige contribuição de melhoria em razão de valorização imobiliária causada por obra pública (decorrente de obra pública)... Logo no texto constitucional a menção à obra pública é indispensável. Se o texto silenciasse a respeito, nada impediria que o legislador ordinário criasse uma contribuição de melhoria sobre valorização imobiliária decorrente de obras privadas, como a construção de um shopping que valorizasse um bairro ou a instalação de um pólo industrial pela iniciativa privada que levasse desenvolvimento a uma região, proporcionando-lhe valorização imobiliária”. (2002, pp. 41-42)

Em resumo, essa foi à evolução histórica da contribuição de melhoria no

âmbito constitucional. Então, continuemos a análise dos fundamentos jurídicos da

contribuição de melhoria, passando o estudo aos aspectos gerais e após aos

princípios gerais que norteiam o tributo em explanação.

2.2 ASPECTOS GERAIS

Leciona Luis Guillermo Roldán Molina que o fundamento jurídico imediato

da contribuição de valorização, confirma-se no poder de tributação do Estado, em

virtude de sua autoridade soberana impositiva que o faculta a exigir dos associados

um desprendimento patrimonial, seja em razão de seu capital, sem em razão de sua

renda ou, por causa de um serviço ou benefício determinado que recebam, não

importando o sistema de governo adotado e a origem de sua autoridade. (1981,

pp.10-11)

2.3 PRINCÍPIOS

2.3.1 Princípio da Legalidade

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Reza o art. 5, II, da CF que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de

fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

No direito público o Estado gerencia o interesse público, que é indisponível.

Administra dinheiro público, onde há necessidade de prestação de contas e de

controle da Administração Pública. Por essa razão costuma-se dizer que no direito

público impera o princípio da estrita legalidade, isto é, o Poder Público só age em

virtude de lei. Todos os passos do administrador público estão delimitados por lei.

Pertencendo o direito tributário ao ramo do direito público, submete-se,

especialmente, ao princípio da estrita legalidade, que novamente encontra-se

respaldo no inciso I, do artigo 150, da CF, ao proibir a União, os Estados, o Distrito

Federal e os Municípios de “exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”. 4

Priscilla Figueiredo diz que uma vez que só se cria tributo por meio de lei, o

Poder Público que, tendo executado uma obra pública, pretenda exigir contribuição

de melhoria com base em valorização imobiliária dela decorrente deverá editar lei

estabelecendo:

“- publicação de memorial descritivo da obra executada; - publicação do custo efetivo da obra; - identificação da área afetada (relação dos imóveis afetados); - aferição do quantum de valorização referente a cada imóvel afetado; - soma do total das valorizações; - base de cálculo referente a cada imóvel; - alíquota”. (2002, p.83)

Desta feita, concluímos que de acordo com o princípio da legalidade, pode-

se fazer o que a lei não proíbe, de forma que o administrador público é dado o que

está na lei e também o que for justo, o que estiver previsto na Constituição Federal.

Em poucas palavras, este princípio constitui um procedimento inteiramente vinculado

à lei.

4 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos

Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

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2.3.2 Princípio do Enriquecimento Sem Causa

Para parte da doutrina, o fundamento da contribuição de melhoria estaria

neste princípio milenar que veda o enriquecimento injusto, sustentando-se que seria

injustificado que todos os membros da coletividade arcassem com os ônus de uma

obra pública quando somente um número determinado de proprietários se

beneficiaram com a mesma, conforme assevera Lovato. (1994, p.39).

É o que defende Fenelon Teodoro Reis, cuja conclusão é a seguinte:

“A contribuição de melhoria é o tributo que se apóia no enriquecimento sem causa, ou melhor, é o tributo cujo fato gerador, ou pressupostos jurídicos, é o acréscimo do valor do imóvel localizado nas áreas beneficiadas, direta ou indiretamente por obras públicas”. (1978, p.12)

Geraldo Ataliba contrapõe a esta assertiva, com a tese de que antes da lei

criadora da contribuição de melhoria o enriquecimento era lícito, e tinha como causa

natural a obra pública. Somente a partir do advento da lei é que o enriquecimento se

tornou injurídico, e o enriquecer, sem causa. Em destaque seguem as razões

firmadas pelo tributarista:

“... antes da consagração do instituto da contribuição de melhoria, no Brasil, toda vez que alguém se enriquecia em virtude de valorização trazida a seu imóvel por obra pública, esse enriquecimento era lícito, legítimo e tinha causa amparada pela ordem jurídica, porque não havia a infirmação dessa causa. Entretanto, a partir do momento em que surgiu a lei criando a contribuição de melhoria – que consiste em a administração atribuir-se a valorização decorrente de obras públicas por ela empreendidas – ficou desamparado, sob o aspecto jurídico, o enriquecimento que anteriormente era lícito (...) Perde aquele enriquecimento a sua justa causa, que decorria do princípio da licitude implícita. A partir da Lei da contribuição de melhoria o enriquecimento passa a ser sem causa”. (1964, pp.81-82)

No mesmo sentido, lembra Carlos Roberto Marques que:

“A teoria do enrichessement sans cause não se presta como justificativa para a cobrança da contribuição de melhoria pelas razões sustentadas por Ataliba, que coloca a obra pública como causa natural do enriquecimento. Com a lei instituidora da referida exação, o que antes era lícito, deixou de ser. É com a norma que o acréscimo patrimonial engendrado por uma obra pública passa a ser injustificado.

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A valorização também pode decorrer de outros fatores que não a obra pública, e nem por isso se fala de enriquecimento sem causa daquele que experimentou. Com efeito, a causa será sempre existente, eis que a valorização imobiliária sempre será conseqüência de alguma coisa ...quando este incremento patrimonial for motivado por uma ação estatal, como a obra pública, com recursos provenientes de toda a coletividade, ele passa a ser imerecido, sendo imperioso que ocorra uma contrapartida para se corrigir a desigualdade, dando ensanchas ao surgimento da contribuição de melhoria, com forte carga de extrafiscalidade”. (2005, p.22)

Entretanto Aliomar Baleeiro diz que,

“A contribuição de melhoria oferece matiz próprio e específico: ela não é a contraprestação de um serviço público incorpóreo, mas a recuperação do enriquecimento ganho por um proprietário em virtude de obra pública concreta no local da situação do prédio. Daí a justificação do tributo pelo princípio do enriquecimento sem causa, peculiar ao Direito Privado. Se o Poder Público, embora agindo no interesse da coletividade, emprega vultuosos fundos desta em obras restritas a certo local, melhorando-o tanto que observa elevação no valor dos imóveis aí situados, com exclusão de outras causas decorrentes da diligência do proprietário, impõe-se que este, por elementar princípio da justiça e de moralidade, restitua parte do benefício originado do dinheiro alheio”. (2002, p.570)

Priscilla Rodrigues diz que o verbo poder mencionado no art. 145, III da

Constituição Federal expressa uma das características da competência tributária,

que é a sua facultatividade, como regra geral. Mas tratando-se de contribuição de

melhoria abre-se uma exceção. E para explicar melhor essa afirmação ela utiliza os

ensinamentos do professor Geraldo Ataliba que diz

“que há obrigatoriedade para o Estado sem instituir o tributo se da obra pública resultar valorização imobiliária, sob pena de se caracterizar enriquecimento sem causa do proprietário do imóvel valorizado. Referido enriquecimento passa a ser sem causa jurídica a partir da existência da norma que atribui ao Estado essa mais-valia. Em outras palavras: se a mais-valia pertence ao Estado, este não pode abrir mão dela, favorecendo indevidamente o proprietário do imóvel valorizado”. (2002, p. 44)

A mesma autora conclui que,

“no que se refere à contribuição de melhoria, à pessoa política – que efetuou as despesas com a execução de obra pública que proporcionou valorização a imóveis particulares – não é facultativo escolher se institui ou não a contribuição de melhoria. ...o Estado estará dispensado de instituir e cobrar a contribuição de melhoria quando a valorização imobiliária for tão pequena que não compense o custo das atividades implicadas nesse mister, a exemplo do que ocorre nos casos de dispensa de licitação por ser o valor considerado insignificante”. (2002, pp. 44-45)

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Acerca da valorização imobiliária estudaremos melhor adiante. Já no que

se refere ao princípio do enriquecimento sem causa para concluir o que seja o

mesmo, utilizo as palavras do Dicionário Jurídico da Academia Brasileira de Letras

Jurídicas, que diz ser o enriquecimento ilícito "o acréscimo de bens que, em

detrimento de outrem, se verificou no patrimônio de alguém, sem que para isso

tenha havido fundamento jurídico".

2.3.3 Domínio Eminente

Da concepção de Moreira Neto sobre tal princípio, se

“extrai que o mesmo representa a faceta peculiar da soberania estatal incidente sobre todos os bens compreendidos em seu território, justificando formas de intervenção do Estado na propriedade privada para corrigir o seu uso anti-social ou assegurar a sua função social, bem como sobre a ordem econômica, onde a interferência pública se faz presente para garantir a observância dos princípios gerais que norteiam o capítulo da ordem econômica (CF, art. 170)”. (2001, p.359)

A contribuição de melhoria serve, nos dias de hoje, também como forma de

intervenção do Estado na propriedade alheia com o fim de ordenar o pleno

desenvolvimento da função social urbana, desde que foi inserida como mecanismo

assecuratório da política urbanística gravada no art. 4º, IV, “b”, do Estatuto da

Cidade (Lei nº 10.257/01).

Consoante se depreende do Estatuto da Cidade, constitui diretriz básica da

política urbana assegurar a justa distribuição dos benefícios e ônus decorrente do

processo de urbanização, ex vi do art. 2º, IX, do citado diploma legislativo, podendo

o poder público, para viabilizar tal fim, se valer do direito de preferência, ou da

contribuição de melhoria, é o que lembra Carlos Roberto Marques. (2005, pp. 25-26)

2.3.4 Princípio da Isonomia Tributária

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A igualdade tributária tem afinidade com o princípio da capacidade

contributiva, já que a idéia central é de que todos são iguais perante a lei, e assim,

todos devem ser tratados de forma igual e, desigualmente os desiguais, na medida

de suas desigualdades.

Esta linha de raciocínio segue Luciano Amaro quando diz que,

“Esse princípio implica, em primeiro lugar, que, adiante da lei “x”, toda e qualquer pessoa que se enquadre na hipótese legalmente descrita ficará sujeita ao mandamento legal. Não há pessoas “diferentes” que possam, sob tal pretexto, escapar do comando legal, ou ser dele excluídas. (...) Em resumo, todos são iguais perante a Lei. Mas há um segundo aspecto a ser analisado, no qual o princípio se dirige ao próprio legislador e veda que ele dê tratamento diverso para situações iguais ou equivalentes. Ou seja, todos são iguais perante o legislador (= todos devem ser tratados com igualdade pelo legislador). (2006, p.135)

Se o Estado fizer com que o ônus decorrente das despesas com a obra

pública recaia apenas sobre os proprietários de imóveis a ela adjacentes, exigindo-

lhes contribuição de melhoria mesmo quando não haja valorização imobiliária,

estará, inequivocamente, ferindo o princípio da isonomia, segundo o entendimento

de Priscilla Rodrigues. (2002, p.84)

“Desde logo se percebe que não havendo benefício especial todos recebem, igualmente, o mesmo benefício geral. Logo, não há desigualdade que justifique tratamento diferenciado, razão pela qual a exigência violaria o princípio em tela. Por outro lado, se houver valorização imobiliária decorrente de obra pública e não houver exigência de contribuição de melhoria, também restará violado o princípio em tela. Isto porque, se há desigualdade que justifique tratamento diferenciado, ele deve ser levado a efeito por meio de lei. Assim, se os proprietários de imóveis circunvizinhos à obra pública recebem, além do benefício geral, um benefício especial, consubstanciado na mais-valia imobiliária, é justo que contribuam para a reposição de, pelo menos, parte dos gastos implicados na execução da obra que foi custeado pela coletividade. Assim, desde que haja valorização imobiliária decorrente de obra pública é imperativo que se exija dos beneficiados contribuição de melhoria, em atendimento ao princípio da isonomia.” (2002, pp.84-85)

Das citações acima descritas, aduz que o princípio da isonomia tributária

está diretamente ligado ao princípio da capacidade contributiva, já que o inciso II, do

artigo 150, da Constituição Federal deixa claro que as pessoas em situações iguais

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sejam tratadas da mesma forma e não que todos, indistintamente, sejam tratados

igualmente. Em realidade é o que extrai da lição de Amaro que tratando do tema

alega que hão de ser tratados com igualdade aqueles que tiverem igual capacidade

contributiva, e com desigualdade os que revelem riquezas diferentes e, portanto,

diferentes capacidades de contribuir.

2.3.5 Capacidade Contributiva

A incidência do princípio em comento está inserido no art. 5º, caput, da CF,

portanto, é uma cláusula pétrea, onde veda a cobrança de quantias iguais a quem

teve valorização imobiliária desproporcional em relação aos demais.

“Mas é o ideal de justiça, mensurado pela idéia de igualdade e equidade,

que mais seduz para se explicar o fundamento da contribuição de melhoria, eis que

teve um benefício ou vantagem deve pagar o valor correspondente, mensurável

proporcionalmente” é o que menciona Carlos Roberto Marques. (2005, p.36)

O princípio da capacidade contributiva é a expressão do princípio da

isonomia em matéria tributária. Ora, se cada um deve contribuir na medida de sua

capacidade econômica, e se esta capacidade econômica varia de pessoa para

pessoa, obviamente que haverá tratamento desigual levando em conta esta

desigualdade para se definir quem deve e quem não deve pagar tributos e em que

medida deve pagá-los.

Em poucas palavras, podemos dizer que capacidade contributiva é a norma

determinando o que cada cidadão deverá pagar de tributo de acordo com as suas

riquezas. Tal princípio está explícito no art. 145, §1º, da Constituição Federal e é

assim definido por Carrazza:

“O princípio da capacidade contributiva hospeda-se nas dobras do princípio da igualdade e ajuda a realizar, no campo tributário, os ideais republicanos.

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Realmente, é justo e jurídico que quem, em termos econômicos, tem muito pague, proporcionalmente, mais imposto de que quem tem pouco. Quem tem maior riqueza deve, em termos proporcionais, pagar mais imposto do que quem tem menor riqueza. Noutras palavras, deve contribuir mais para a manutenção da coisa pública. As pessoas, pois, devem pagar impostos na proporção de seus haveres, ou seja, de seus índices de riquezas.” (2008, p.87)

Apesar de o autor mencionar reiteradamente impostos, ele não nega a

possibilidade de aplicação do princípio em comento a contribuição de melhoria,

valendo transcrever:

“Nada impede que também as taxas e a contribuição de melhoria sejam graduadas segundo a capacidade econômica dos contribuintes, tendo em vista, inclusive, o princípio da igualdade. Apenas, isto fica ao talante do legislador ordinário, não sendo uma exigência do art. 145, §1º, da CF.” (2008, p.86)

Tal posicionamento é contestado por Aristóphanes Accioly, o mesmo

entende que, em razão do seu caráter individualista, seria inaplicável a contribuição

de melhoria o princípio da capacidade contributiva, assim se manifestando:

“Trata-se de ganho individual propiciado aos proprietários de imóveis e todos esses proprietários são tratados de forma proporcionalmente igual, sem qualquer atenção ao fato de que se trate de pequeno ou de grande proprietário. Jamais, para a contribuição de melhoria, se leva em conta a capacidade contributiva do cidadão, expressa tal capacidade pela renda ou pela riqueza de que seja possuidor. O tributo é sempre lançado proporcionalmente ao beneficiamento recebido, trata-se de rico ou de pobre”. (1951, pp.99-100)

Posição um pouco mais moderada é a de Geraldo Ataliba, entendendo que

nem sempre o princípio ocorrerá quando houver mais-valia imobiliária, uma vez que

“a verificação mais-valia imobiliária decorrente da obra pública não importa em

manifestação de capacidade contributiva. Nem sempre isto é índice de capacidade

contributiva...”. (1964, p.103)

Contrapondo esta posição, José Marcos Domingues de Oliveira menciona:

“O erro de entendimento contrário é não reconhecer o incremento de valor do imóvel como aumento de riqueza e, pois, índice de capacidade contributiva, que deriva indubitavelmente da valorização, confundindo-se

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aquela com imediato aumento de disponibilidade financeira (que não é o produto da obra pública, mas talvez eventual alienação bem sucedida)”. (1998, p.110)

Parafraseando o próprio autor, a contribuição de melhoria é tributo que se

funda na capacidade contributiva, tendo em vista que o seu fato gerador (valorização

imobiliária) enuncia circunstância indicativa daquela capacidade. “Os tributos

graduados na capacidade contributiva sofrem a incidência do princípio já na

tipificação dos seus fatos geradores e os integra necessariamente (vender

mercadoria, ser proprietário de imóvel, obter valorização imobiliária, etc)”. (1991,

p.51)

Ao tratar do tema, Carlos Roberto Marques menciona:

“Com efeito, a obra pública, ao ensejar a valorização do imóvel, acrescenta ao patrimônio um incremento econômico que de per si denuncia um aumento de potencialidade financeira do contribuinte, possibilitando a incidência do tributo com demonstração de capacidade contributiva. O binômio custo/benefício sequer é substrato do fato gerador, considerando-se apenas o benefício”. (2005, p.42)

Priscilla Figueiredo dispondo sobre o tema lança uma problemática,

expondo que se,

“Poderia uma Prefeitura que executasse obras públicas (pavimentação, água, esgoto, iluminação publica etc.) em um bairro pobre e pouco valorizado isentar da contribuição de melhoria aos proprietários de imóveis que, pela modéstia, já são isentos de IPTU? Temos para nós que sim. (...) O aumento do valor do imóvel como efeito da obra pública, além do imposto, em nada altera a capacidade econômica do contribuinte. (...) Na verdade, há que se distinguir a capacidade contributiva considerada no momento da instituição do tributo e a capacidade contributiva no momento da concessão de uma isenção (não-incidência tributária). (...) A nosso ver, trata-se da mesma coisa, já que a desigualdade social, assim como a falta da capacidade de contribuir, justifica tratamento desigual de desfavorecidos, em obediência ao princípio da isonomia. Concluímos, portanto, que o princípio da capacidade contributiva tem aplicação nos casos de contribuição de melhoria não para efeito da configuração do fato que, se ocorrido faz nascer o tributo, mas para eventuais isenções.” (2002, pp.86-87)

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Desta feita, cada um deve contribuir com a sua capacidade econômica,

sofrendo as conseqüências da exação da forma proporcional as suas riquezas,

consoante dispõe o art. 145, §1º, da CF.

Acerca da capacidade contributiva do sujeito passivo cria-se uma

problemática interessante: será que podemos considerar a contribuição de melhoria

um tributo real, ou seja, aquele tributo cuja hipótese de incidência não leva em

consideração eventuais qualidades (econômicas) do sujeito passivo? O STF já usou

tal classificação para declarar inconstitucional a alíquota progressiva do IPTU,

alegando que tal tributo não é compatível com a capacidade contributiva. Cabe aqui

a pergunta: a contribuição de melhoria seria mesmo compatível com o princípio da

capacidade contributiva? Ou seja, o fato de ter sua propriedade valorizada em razão

de uma obra pública significa necessariamente que se terá dinheiro para pagar o

tributo? Se o contribuinte não dispor de dinheiro para tanto, certamente ficará

inadimplente e poderá ter o imóvel penhorado, sendo muitas vezes levado a se

desfazer do imóvel, o que implica tributação com efeito de confisco (vedada pela

Constituição da República).

Há discussão acerca da classificação dos impostos no aspecto material ou

pessoal da hipótese de incidência, com a Constituição de 1988, passou a ter enorme

importância a distinção entres os impostos reais e pessoais e, como vimos

anteriormente, é defendido por Carrazza que o princípio da capacidade contributiva

é sim aplicado a Contribuição de Melhoria e, em uma interpretação analógica, a

classificação dos impostos acima mencionada também aplica-se ao tributo ora

comentado, já que ambos estão inteiramente relacionados.

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Assim, há doutrinadores que entendem que os tributos reais não estão

sujeitos à capacidade contributiva, qual seja o fato não necessariamente atenderá as

qualidades do sujeito passivo e a capacidade contributiva, a hipótese de incidência

não considera a descrição do aspecto pessoal do contribuinte. Notemos a definição

de impostos reais de Geraldo Ataliba:

“São impostos reais aqueles cujo aspecto material da h.i. limita-se a descrever um fato, ou estudo de fato, independente do aspecto pessoal, ou seja indiferente ao eventual sujeito passivo e suas qualidades.” (2003, p.141)

Grande parte da doutrina considera a contribuição de melhoria como um

tributo pessoal, ou seja, tem vínculo com o sujeito passivo vindo a atender a

capacidade contributiva, já que estes estabelecem diferenças tributárias em função

das condições próprias do contribuinte. Vejamos o que diz Geraldo Ataliba sobre o

tema:

“São impostos pessoais aqueles cujo aspecto material da h.i. leva em consideração certas qualidades, juridicamente qualificadas, dos possíveis sujeitos passivos. Em outras palavras: estas qualidades jurídicas influem, para estabelecer diferenciações de tratamento legislativo, inclusive do aspecto material da h.i. Vale dizer o legislador, ao descrever a hipótese de incidência, faz refletirem-se decisivamente, no trato do aspecto material, certas qualidades jurídicas do sujeito passivo”. (2003, p.142)

Comenta ainda o autor:

“Impondo a Constituição que, sempre que possível os impostos tenham “caráter pessoal”, está postulando incessante empenho do legislador, no sentido de aprimorar a legislação, para ir atendendo às peculiaridades, características e singulares dos contribuintes, de modo a considerar suas diferenças – de cunho econômico – fazendo com que a carga tributária de cada qual reflita suas condições individuais.” (2003, p.143).

Uma vez que o STJ já pacificou o entendimento de que a classificação dos

impostos em reais e pessoais aplicam-se a contribuição de melhoria. Desta maneira,

podemos concluir que os tributos reais não estão sujeitos à capacidade contributiva,

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uma vez que não consideram as condições pessoais do contribuinte. Enquanto os

pessoais atingem a capacidade contributiva do sujeito passivo.

2.3.6 Proibição de Confisco

Carlos Roberto Marques define a proibição de confisco como sendo a

“garantia individual que decorre do princípio da capacidade contributiva, desde que

ao legislador é defeso instituir tributo sem observar a capacidade econômica do

contribuinte, salvaguardando-o das investidas confiscatórias do Estado no domínio

privado”. (2005, p.45)

A importância da aplicação do princípio em comento, à contribuição de

melhoria, se justifica na garantia constitucional que estabelece e, favor do

contribuinte o direito de ser onerado em seu patrimônio de acordo com as suas

riquezas.

Tal afirmativa está contida no estabelecido no art. 81, do CTN, de onde se

extrai que a cobrança da exação terá como limite individual o acréscimo de valor que

da obra resultar para cada imóvel. Estando de acordo com o previsto na Constituição

Federal, em seu art. 150, IV, na medida em que veda a incidência do ônus sobre o

montante acima do valor efetivamente gerado a título de mais-valia na propriedade

do contribuinte.

A tributação pela via da contribuição de melhoria sobre valor além daquele

que efetivamente traduza a mais-valia experimentada pelo sujeito passivo

representaria, em ultima ratio, medida confiscatória praticada pelo poder público,

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postura que agrediria o princípio constitucional da proibição do confisco, que se

amarra, de forma iniludível, à capacidade contributiva e a proibição do excesso.5

Lembra ainda, Carlos Roberto Marques, que:

“Por outro lado, há na tributação da mais-valia advinda de uma obra pública custeada por todos os membros da sociedade viola o princípio de proibição de desigualdade contido art. 150, II, da Constituição, consubstanciando privilégio odioso a ser afugentado pela cobrança da contribuição de melhoria, cujo fundamento maior, como já sabemos, é a isonomia”. (2005, p.48)

O professor Jorge Vargas concluindo sobre o tema lembra que o direito não

tem um fim em si mesmo; existe uma função da sociedade, por isso não pode se

afastar da realidade. Assim a Constituição Federal deve ser interpretada como um

todo, de forma que o princípio do não-confisco deve ser aplicado em conjunto com

os demais princípios constitucionais. Lembra o autor que

“a vedação ao efeito confiscatório da tributação é uma garantia fundamental, e por assim ser, a ela deve se dar a maior eficácia possível, por isso os efeitos confiscatórios podem estar presentes em qualquer situação, havendo um limite tanto ao tributo isolado, quanto à carga tributária municipal, estadual ou federal, e ainda à carga tributária em sua totalidade. Esta garantia deve ser vista como um instrumento de proteção do direito de propriedade em sentido amplo, ou seja, protege tanto a renda como o patrimônio e também a livre iniciativa. O direito da propriedade é limitado pela sua função social, e dentro deste limite está o dever de pagar impostos. O direito de propriedade pode sofrer restrições, em razão de sua função social, desde que se respeite o limite da proporcionalidade... As presunções e ficções tributárias são confiscatórias quando impõem uma tributação superior àquela que corresponde à realidade, e não permitem a restituição daquilo que foi cobrado a maior.” (2003, pg.177 e 179)

Ainda, afirma o professor “qualquer enriquecimento ilícito do Estado, por

menor que seja, é confiscatório”. (2003, pg.178)

2.3.7 Princípio da Proporcionalidade

5 Segundo aponta José Marcos Domingues de Oliveira: “A jurisprudência argentina. Citada por

Giuliani Fonrouge, considera confiscatória (e, pois, inconstitucional) a contribuição de melhoria que não guarde prudente relação com a valorização imobiliária adjudicada ao imóvel. Capacidade contributiva, op. cit., p.109.

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O princípio da proporcionalidade, de certa forma, também decorre do

princípio da isonomia. Ora, esta medida deve corresponder, justamente, à proporção

da desigualdade.

A relação de proporcionalidade se estabelece entre o benefício especial

auferido pelo contribuinte (mais-valia) e o que deve pagar a título de contribuição de

melhoria.

A proporção em que o contribuinte deve contribuir dependerá de dois

fatores: do custo efetivo da obra e do quantum valorização experimentado pelo

imóvel pelo qual é proprietário, segundo o que ensina Priscilla Figueiredo Rodrigues:

“Daí a possibilidade das seguintes hipóteses: a) se a soma das valorizações for menor ou igual ao custo da obra, cada qual deve contribuir com tanto quanto recebeu em aumento de valor (limite individual); b) se a soma das valorizações for maior do que custo da obra, este (o custo total) deve estabelecer o limite máximo arrecadatório ao qual o Poder Público esta adstrito. Vê-se, pois, que a proporção em que se contribui pode ser maior ou menor, dependendo da valorização e do custo da obra. São, de fato, em nosso entender, limites intrínsecos a este tributo. Esta proporção é de fundamental importância para a definição da base de cálculo, assim como da alíquota, donde resultará o quantum debeatur.” (2002, p.88)

Em poucas palavras o princípio em comento estabelece a cobrança de

tributos de forma proporcional à capacidade contributiva de cada sujeito passivo.

3. CONCEITO E ELEMENTOS DO FATO GERADOR DA CONTRIBUIÇÃO DE

MELHORIA

3.1. CONCEITO

Encontra-se, na doutrina de Geraldo Ataliba, o seguinte conceito do tributo

em estudo:

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“A contribuição de melhoria é o instrumento jurídico pela qual se transfere aos cofres públicos a valorização imobiliária, causada por obras públicas, cuja expressão financeira (de valorização) é atribuída pela ordem jurídica ao estado. É que a Constituição atribui tais valorizações (total ou parcialmente, conforme a lei, segundo critérios político-financeiros) à pessoa pública que empreende tais obras”. (2003, p.175)

Para Hugo de Brito Machado,

“... a contribuição de melhoria é a espécie de tributo cujo fato gerador é a valorização de imóvel do contribuinte, decorrente de obra pública, e tem por finalidade a justa distribuição dos encargos públicos, fazendo retornar ao Tesouro Público o valor despendido com a realização de obras públicas, na medida em que destas decorra valorização imobiliária.” (2007, pp.455-456)

Ainda, de acordo com o pensamento de Paulo de Barros Carvalho, pode-se

dizer que

“... as contribuições de melhoria levam em conta a realização de obra pública que, uma vez concretizada, determine a valorização dos imóveis circunvizinhos. A efetivação da obra pública por si só não é suficiente. Impõe-se um favor exógeno que, acrescentado à atuação do Estado, complemente a descrição factual. E a valorização imobiliária nem sempre é corolário da realização de obras públicas. Muitas há que, sobre não acarretarem incremento de valor nos imóveis adjacentes, até colaboram para a diminuição de seu preço no mercado. Por isso, do crescimento valorativo que o imóvel experimente, em razão da obra efetuada pelo Estado, quer o direito positivo brasileiro que seu proprietário colabore com o Erário, pagando a chamada contribuição de melhoria”. (2010, pp.73-74)

Resumidamente, dos conceitos acima expostos extrai-se que o poder

público ao executar obra pública que consequentemente, acarrete valorização

imobiliária no imóvel do particular, fato indispensável para sua caracterização, esse

por sua vez, deverá arcar com o aumento do valor do imóvel, devolvendo ao cofre

do ente que executou tal obra, o valor correspondente a valorização imobiliária

ocasionada.

São esses fatores, considerados conjuntamente, que se inserem no

conteúdo da contribuição de melhoria, formando uma relação de causa e efeito,

vinculando-se o benefício auferido pelo proprietário particular em seu patrimônio

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(efeito) diretamente à obra realizada pelo poder público. É o que assevera Misabel

Abreu Machado Derzi.

“Observe-se que a Constituição não autorizou instituir contribuição de melhoria para custear obras públicas. Ela somente permite instituir contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas, ficando estabelecida a relação causa e efeito entre a vantagem e a obra”. (2002, p.575)

Abordando o tema, Bernardo Ribeiro de Moraes se posiciona no sentido de

que “sem „obras públicas‟ executadas materialmente não se poderá exigir o efeito

tributo. Sem melhoria também não se poderá exigi-la, pois contribuição é de

melhoria”.6 (1999, p.585)

O mesmo autor define contribuição de melhoria como sendo a “espécie

tributária exigida em razão da obra pública, a ser paga pelos proprietários dos

imóveis por ela valorizados”. (1999, p.585)

“Contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas”. O professor

Geraldo Ataliba reconhece que “nenhum tributo, até agora, designado contribuição,

no Brasil – salvo a de melhoria -, é contribuição verdadeira, no rigoroso significado

do conceito, que se centra na materialidade da h.i.”. (2003, p. 182)

Ensina Priscilla Rodrigues que “em razão de complemento, concluímos que

no Brasil apenas obra pública pode ensejar contribuição de melhoria se ela for causa

de mais-valia imobiliária”. (2002, p.47)

6 Com efeito assim vem decidindo os Tribunais: 1) FATO GERADOR – VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL

BENEFICIADO. “I- Sem valorização imobiliária, decorrente de obra pública, não há contribuição de melhoria, porque a hipótese de incidência desta é a valorização e a sua base é a diferença entre os dois momentos: o anterior e o posterior à obra pública, vale dizer, o quantum da valorização imobiliária. II. Precedente do STF: RREE 115.863/SP e 116.147/SP (RTJ 138/600 e 614). 2) FATO GERADOR – VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL BENEFICIADO. É ilegal o lançamento de valorização ou específico benefício, apropriados à obra pública realizada local da situação do imóvel”. Resp 35.133-2/SC. STJ. 1ª T. Rel. Min. Milton Luiz Pereira. DJU 17/04/95.

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Assim para melhor compreensão do conceito de contribuição de melhoria

faz-se necessário uma compreensão mais detalhada do que seja obra para José

Cretella Júnior

“é as operações de interesse geral, levadas a termo sobre imóveis por conta ou sob fiscalização de uma coletividade pública, trabalhos de construção, reparação, modificação, adaptação ou manutenção de bens imóveis, realizadas total ou parcialmente pela Administração para fins de utilidade pública”. (2000. p.379-380)

Celso Antônio Bandeira de Mello é ainda mais breve no conceito de obra

pública, definindo como sendo “a construção, a reparação, a edificação ou

ampliação de um bem imóvel pertencente ou incorporado ao domínio público. Obra

pública não é serviço público”. (2006, p.674)

Priscilla Rodrigues menciona que,

“Toda obra pública, no entanto, pressupõe um serviço público correspondente a esta operação humana. Ela é o resultado dessas atividades de construção, reparação, edificação ou ampliação. Quando se fala em obra pública deve-se entender „resultado de um serviço público de execução de obra pública‟, para efeito de tributação através da contribuição de melhoria. Trata-se de serviço público em sentido amplo, pois tais atividades se desenvolvem em regime jurídico de direito público e unicamente para atender ao interesse público – isto é, tem por finalidade proporcionar um benefício difuso”. (2002, p.48)

Tratando de obra pública, a autora em comento, diz que é fato pelo qual

podem resultar dois efeitos: a) uma valorização dos imóveis por ela afetados; ou b)

uma desvalorização. Leciona,

“Assim se da obra podem resultar tanto uma vantagem (caso em que caberia a contribuição) quanto uma desvantagem (caso em que caberia indenização), é lícito concluir que não basta à obra para a instituição do tributo. Necessário se faz a apuração dos efeitos dela decorrentes, da qual depende a exigência do tributo. Além destes dois efeitos, poderá acontecer ainda que a obra pública não resulte efeito algum; ou seja, pode ocorrer que os imóveis afetados por esta obra mantenham seus valores inalterados – caso em que, por óbvio, também não há que se falar em instituição de contribuição de melhoria”. (2002, p.49)

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Efeitos estes que veremos melhor a seguir, quando tratarmos da

valorização imobiliária.

E finalizando a interpretação do conceito constitucional, a autora entende

que é,

“... lícita a conclusão de que o Poder Público se sinta autorizado a instituir a contribuição de melhoria. Sem a valorização imobiliária que tenha sido causada pela obra pública não pode o Poder Público instituir contribuição de melhoria (...). A contribuição de melhoria decorre de obra pública porque sem obra não há que se falar em tributação (...). Destarte, podemos dizer que, havendo contribuição de melhoria, certamente haverá uma obra pública que lhe deu origem; entretanto, a recíproca não é verdadeira, pois nem sempre que houve obra pública haverá valorização imobiliária e, conseqüentemente, contribuição de melhoria”. (2002, p.52)

Colhe-se por fim, da lição de Priscilla Rodrigues:

“... o constituinte de 1988 deixou por conta da doutrina sugerir aos aplicadores do Direito o conceito de contribuição de melhoria. (...) portanto, ainda que o texto constitucional não fale expressamente em valorização imobiliária, essa idéia está presente na Constituição. Além disso, o próprio nomen júris do tributo traz consigo importante carga semântica: a contribuição é de melhoria – isto é, trata-se de contribuição devida em razão de uma melhoria. A mais-valia imobiliária é a indicação de que houve melhoria; ou, em última análise, é a própria melhoria”. (2002, pp.38-52)

Essa discussão não tem mais sentido, já que o Supremo Tribunal Federal já

decidiu a questão, conforme se depreende da doutrina de Leonetti que “o próprio

Supremo Tribunal Federal já reconheceu, em julgamento datado de 15 de abril de

1994, que, mesmo sob a égide da Constituição de 1988, a valorização imobiliária

continua sendo requisito imanente à contribuição de melhoria”. (2000, p.112)

Ricardo Lobo Torres critica o elemento de valorização do imóvel como

aspecto conceitual da contribuição de melhoria, situação que, para ele é capaz de

confundir a espécie tributária em estudo com o imposto sobre a mais-valia

imobiliária, nestes termos:

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“...se a contribuição de melhoria é devida pela valorização do imóvel ou pelo enriquecimento injustificado, pouco importando o custo da obra pública, é claro que o seu quantum se confunde com o dos impostos sobre o incremento do valor dos imóveis, ou seja, dos tributos genéricos sobre a mais-valia imobiliária ou do imposto de renda sobre o lucro imobiliário...” (1986, p.390)

João Baptista Moreira, atraído pela doutrina alemã, segue outro segmento

doutrinário, onde insere o aspecto recuperação de gastos como elemento conceitual

da contribuição de melhoria, quando aduz que “é a espécie do gênero tributo que,

em nosso sistema tributário – e também, no alemão e em outros construídos por sua

influência – recupera, diretamente os custos da obra pública...” (1981, p.98)

Postura que encontra reflexo na doutrina de Arx Tourinho, para quem:

“A contribuição de melhoria, ao contrário, é a recuperação de gastos públicos em obras que trazem benefício para os imóveis. Há um liame entre a atividade pública determinada e a imposição tributária”. (1986, p.98)

Tratando sobre a matéria Carlos Roberto Marques, menciona que:

“Não se pode comungar desta hóstia. É que, considerando-se o comando emergente da norma do art. 145, III, da Constituição Federal c/c o art. 1º, do Decreto-Lei nº 195/67, não se pode ignorar a cumulação de dois aspectos para a conceituação da contribuição de melhoria: a mais-valia e a realização da obra”. (2005, p.51)

Os doutrinadores acima são adeptos do modelo alemão, onde a

contribuição de melhoria é uma imposição tributária, desenvolvida de forma que o

poder público possa recuperar os custos de determinada obra pública, efetivamente

realizada. Adiante estudaremos melhor o entendimento doutrinário alemão, acerca

do tributo ora explanado.

3.2. REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA

A legislação descreve um fato hipotético que pode ocorrer no mundo real

em um determinado tempo e espaço. Em outras palavras, a norma jurídica que

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regula comportamentos humanos pela determinação do critério material, critério

espacial, critério temporal, critério subjetivo, que por sua vez é dividido em: sujeitos

ativo e passivo e, por fim, o critério quantitativo, composto pela base de cálculo e

alíquota, isto é, à norma completa que estabelece hipótese e conseqüência,

denomina-se “regra-matriz”.

Carlos Roberto Marques escrevendo sobre o tema, lembra que:

“... para se caracterizar o nascimento da obrigação tributária, impede ocorrer a subsunção de todos os elementos descritos na norma tributária, o que na hipótese sub examine se manifesta através dos seus elementos objetivos (obra pública, valorização imobiliária, base de cálculo e alíquota) e subjetivos (sujeitos ativo e passivo)”. (2005, p.53)

Assim sendo, passamos ao estudo detalhado de cada critério da regra-

matriz de incidência da contribuição de melhoria.

3.2.1 Critério Material

O critério material da hipótese de incidência da contribuição de melhoria é

“auferir valorização imobiliária decorrente de obra pública”.

3.2.2 Critério Espacial

O critério espacial deve condicionar a tributação a áreas sujeitas aos efeitos

da obra. Lembra Priscilla Rodrigues que,

“os efeitos da obra pública, muitas vezes, não se restringem aos imóveis a ela adjacentes. Assim, todos os imóveis adjacentes ou localizados nas proximidades da obra pública que por ela sejam valorizados poderão acarretar o ônus tributário aos seus proprietários”. (2002, p.124)

Pode-se dizer que critério espacial abrange a extensão territorial em que

incidirá a contribuição de melhoria.

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3.2.3 Critério Temporal

Considera-se ocorrido o fato temporal no momento da ocorrência da

valorização imobiliária. Priscilla Rodrigues entende que não é possível presumir uma

valorização, porque da obra podem decorrer efeitos tanto positivos (valorização)

quanto negativos (desvalorização). Pode ocorrer ainda de não se alterarem os

valores dos imóveis afetados pela obra. E que a possibilidade da “ocorrência do fato

que faz nascer o tributo só se pode dar em momento posterior à conclusão da obra

pública, e não antes”. (2002, p.125)

Para Paulsen,

“... como, na contribuição de melhoria, o fato gerador é a valorização imobiliária decorrente de obra pública, não se pode considerá-lo ocorrido antes da realização da obra. Assim, de um lado, a lei instituidora deve ser precedente e a cobrança da contribuição superveniente à conclusão da obra e á valorização imobiliária que lhe seja inerente”. (2008, p.1285)

Deve-se atentar ao tempo em que se deve considerar o fato gerador da

obrigação tributária. Isso porque no que diz respeito à contribuição de melhoria o

fato gerador é a valorização imobiliária decorrente da obra pública, conforme já

analisamos, há um nexo de causalidade e, dessa forma, não se pode considerá-lo

ocorrido antes da realização da obra. Tem-se, portanto, que instituir a exação deve

ser anterior à obra e a cobrança posterior à conclusão e consequentemente da

valorização imobiliária, trata o mesmo autor acima citado.

A valorização imobiliária só pode ser aferida após a conclusão da obra,

assim vem decidindo os tribunais vejam:

“CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. FATO GERADOR. OBRA INACABADA. VALORIZAÇÃO IMOBILIÁRIA. INEXISTÊNCIA. Impossível apreender a existência de valorização imobiliária com as obras ainda em andamento. O „benefício‟, a „valorização‟ são, in casu, apenas potencial, eis que nada se efetivou. É a valorização imobiliária causada pela obra pública a hipótese de incidência da contribuição de melhoria. Ensinanos Geraldo Ataliba que

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essa valorização é o único critério objetivo, isônomo e mensurável, para a aplicação do art. 145, III, da Constituição Federal. „Sua base imponível é a valorização; a medida da valorização é o critério do tributo. Valorização é a diferença positiva de valor de um imóvel entre dois momentos: antes e depois da obra‟ (Hipótese de incidência tributaria, 5ª ed., pp.151/151)” (1º TACSP, 3ª Câm, AC 473.444-3, rel. Juiz Franco de Godoi).

E ainda caso a obra pública que ensejou a contribuição de melhoria não

seja concluída, caberá aquele que pagou indevidamente o tributo, a repetição do

indébito, conforme já decidiu o STJ. Vejamos:

TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. OBRA INACABADA. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA E FATO GERADOR DA EXAÇÃO. OBRA PÚBLICA EFETIVADA. VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL. NEXO DE CAUSALIDADE. INOCORRÊNCIA. DIREITO À RESTITUIÇÃO.(...) 3. A base de cálculo da contribuição de melhoria é a diferença entre o valor do imóvel antes da obra ser iniciada e após a sua conclusão (Precedentes do STJ: RESP nº 615495/RS, Rel. Min. José Delgado, DJ de 17.05.2004; RESP 143996/SP; Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 06.12.1999) 4. Isto porque a hipótese de incidência da contribuição de melhoria pressupõe o binômio valorização do imóvel e realização da obra pública sendo indispensável o nexo de causalidade entre os dois para sua instituição e cobrança. 5. Consectariamente, o fato gerador de contribuição de melhoria se perfaz somente após a conclusão a obra que lhe deu origem e quando for possível aferir a valorização do bem imóvel beneficiado pelo empreendimento estatal. 6. É cediço em doutrina que: '(...) Só depois de pronta a obra e verificada a existência da valorização imobiliária que ela provocou é que se torna admissível a tributação por via de contribuição de melhoria.' (Roque Antonio Carrazza, in 'Curso de Direito Constitucional Tributário', Malheiros, 2002, p. 499 7. Revela-se, portanto, evidente o direito de a empresa que pagou indevidamente a contribuição de melhoria, uma vez que incontroversa a não efetivação da valorização do imóvel, haja vista que a obra pública que deu origem à exação não foi concluída, obter, nos termos do art. 165, do CTN, a repetição do indébito tributário. 8. Precedentes: RESP 615495/RS, Rel. Min. José Delgado, DJ de 17.05.2004; RESP 143996/SP, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 06.12.1999. 9. Recurso Especial provido." (REsp 647.134/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 1º.2.2007)

O poder público que executar a obra terá o prazo decadencial para o

lançamento deste tributo, começando a fluir do primeiro dia do exercício seguinte

àquele em que a obra pública foi concluída, é o que prescreve o art. 173, I, do CTN.

O lançamento da contribuição de melhoria é feito de ofício. Como indica o

art. 9º do Decreto-Lei nº 195/67 e os julgados dos tribunais, conforme explicitado

acima, só é possível depois de executada a obra, embora seja admitida com a

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conclusão parcial desta, para justificar a cobrança da contribuição relativa aos

imóveis em relação aos quais, possamos considerar a obra concluída. Explica Hugo

de Brito:

“... na pavimentação de uma avenida, a contribuição pode ser lançada em relação aos imóveis da área aonde vai ficando pronta a pavimentação. Feito o lançamento, cada contribuinte deverá ser notificado do montante da contribuição, da forma e dos prazos de seu pagamento e dos elementos que integram o respectivo cálculo”. ( 2003, pp.711-712)

Primeiramente, para que ocorra o lançamento tributário da contribuição de

melhoria faz-se necessário a apresentação dos cálculos, por meio do Poder Público,

que embasarão a cobrança, o valor presumido, sujeito a impugnação. O STJ já se

manifestou quanto ao tema, vejamos:

“TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. ARTS. 81 E 82 DO CTN. DECRETO-LEI 195/67. BASE DE CÁLCULO. VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM. ÔNUS DA PROVA. (...) 3. “Só depois de pronta a obra e verificada a existência da valorização imobiliária que ela provocou é que se torna admissível a tributação por via de contribuição de melhoria” (CARRAZZA, Roque Antonio. "Curso de Direito Constitucional Tributário", São Paulo: Malheiros, 2006, pág. 533). 4. O lançamento da contribuição de melhoria deve ser precedido de processo específico, conforme descrito no art. 82 do Código Tributário Nacional. 5. Cabe ao Poder Público apresentar os cálculos que irão embasar a cobrança da contribuição de melhoria, concedendo, entretanto, prazo para que o contribuinte, em caso de discordância, possa impugná-los administrativamente. Trata-se, pois, de um valor presumido, cujo cálculo está a cargo da própria Administração. 6. O procedimento administrativo não exclui a revisão pelo Judiciário.” (STJ, 1ª T., REsp 671560/RS, Rel. Ministra Denise Arruda, mai/07)

O lançamento da contribuição de melhoria se perfaz através da publicação

dos editais exigidos em lei e, uma vez executada toda obra, publicado o respectivo

demonstrativo de custos e notificado o proprietário de forma induvidosa, quanto ao

valor da contribuição, oportunizando-lhe o exercício da impugnação.

É possível admitir a publicação de um único edital após a conclusão da

obra, contudo, é imprescindível notificar o contribuinte do lançamento do crédito

tributário, referente à Contribuição de Melhoria.

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Em sendo a Contribuição de Melhoria um tributo cujo lançamento se opera

de ofício, segundo já mencionamos, a notificação do contribuinte pode-se dar

quando do recebimento do carnê de pagamento, para que possa se constituir o

crédito tributário. Nesse sentido decidiu o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná,

vejamos:

DIREITO TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO CONTRIBUINTE - INAPLICÁVEL NO CASO DE CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA A PRESUÇÃO DE ENTREGA DO CARNÊ PARA PAGAMENTO - IMPOSSIBILIDADE DO EXERCÍCIO DA IMPUGNAÇÃO - APLICAÇÃO DO ART. 82, PARÁGRAFO SEGUNDO, DO CTN - ÔNUS DA PROVA QUE COMPENTE À FAZENDA PÚBLICA - LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO QUE NÃO SE CONSTITUIU VALIDADAMENTE - CORRETA A EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - APLICAÇÃO DO § 4º, DO ART. 20, DO CPC - DIMINUIÇÃO DA VERBA ARBITRADA EM PRIMEIRO GRAU - SENTENÇA REFORMADA NESTE PONTO - APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA EM PARTE. (TJPR - 3ª C.Cível - AC 0537665-8 - Londrina - Rel.: Des. Paulo Roberto Vasconcelos - Unânime - J. 10.02.2009).

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IPTU, TAXA DE COLETA DE LIXO E CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. NOTIFICAÇÃO DE LANÇAMENTO. INDISPENSABILIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. UTILIZAÇÃO DE QUAISQUER MEIOS DE COMUNICAÇÃO. ENVIO DO CARNÊ DE PAGAMENTO. COMPROVAÇÃO. ÔNUS DA FAZENDA MUNICIPAL. 1. A notificação do contribuinte é ato indispensável à constituição do crédito tributário (art. 145, CTN), e sua regularidade atende aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV, CF). (TJPR, Ação Originária nº 482814-4 – Toledo, Publicada no DE TJPR 21.09.2009)

Enfim, denota-se dos julgados acima que, para se utilizar do recebimento do

carnê de pagamento como notificação do contribuinte para se constituir o crédito

tributário, deve o ente federativo que realizou a obra causadora da valorização

imobiliária, comprovar o envio do carnê de pagamento para o contribuinte, em caso

de discussão sobre a composição do crédito tributário.

3.2.4 Critério Subjetivo

3.2.4.1 Sujeito Ativo

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O titular do direito subjetivo é o sujeito que pode instituir e exigir o tributo. O

sujeito ativo da contribuição de melhoria será a pessoa política que, realizar a obra

pública, da qual decorra valorização imobiliária.

Prescreve o art. 145, III, da CF que a União, Estados, Distrito Federal e

Municípios poderão instituir contribuição de melhoria decorrente de obra pública,

competindo a cada entidade federativa, através do respectivo poder legislativo,

editar sua lei própria pela qual criará a contribuição de melhoria dentro das suas

competências, e a cobrança ficará a cargo da unidade administradora realizadora da

obra pública, consoante art. 3º do Decreto-Lei nº 195/67 com a seguinte dicção:

Art. 3º A Contribuição de Melhoria a ser exigida pela União, Estado, Distrito Federal e Municípios para fazer face ao custo das obras públicas, será cobrada pela Unidade Administrativa que as realizar, adotando-se como critério o benefício resultante da obra, calculado através de índices cadastrais das respectivas zonas de influência, a serem fixados em regulamentação deste Decreto-lei. § 1º A apuração, dependendo da natureza das obras, far-se-á levando em conta a situação do imóvel na zona de influência, sua testada, área, finalidade de exploração econômica e outros elementos a serem considerados, isolada ou conjuntamente. § 2º A determinação da Contribuição de Melhoria far-se-á rateando, proporcionalmente, o custo parcial ou total das obras, entre todos os imóveis incluídos nas respectivas zonas de influência. § 3º A Contribuição de Melhoria será cobrada dos proprietário de imóveis do domínio privado, situados nas áreas direta e indiretamente beneficiadas pela obra. § 4º Reputam-se feitas pela União as obras executadas pelos Territórios.

Assim, pode-se dizer que a competência para a instituição e cobrança da

contribuição de melhoria é comum. O que se indaga é se a cobrança pode ser

realizada, ao mesmo tempo, por dois ou mais entes da federação, se é possível a

delegação da capacidade tributária ativa, do ente tributante para uma outra pessoa

jurídica que execute a obra.

Bernardo Ribeiro de Moraes acena para esta possibilidade, desde que a

realização da obra tenha sido, efetivamente, executada por todos os entes

federados, nestes termos:

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“A exigência de uma contribuição de melhoria por parte de um poder tributante não exclui a cobrança de outra, por parte de outro poder tributante, desde que sejam dois poderes tributantes, ambos realizadores de obras que valorizem a propriedade imobiliária do contribuinte”. (1999, pp.596-597)

Cumpre observar ainda o que demonstra Carlos Roberto Marques.

“... preenchidos os pressupostos de incidência da contribuição de melhoria, deverá o ente federativo competente cobrá-lo, uma vez que tal postura não se insere na prerrogativa discricionária da administração fazendária. Concluído, portanto, todo o percurso necessário a formação da fattispècie tributária em estudo, surge o poder-dever de cobrança, eis que, como sabido, o agente público é mero gestor da coisa pública, incidindo na espécie o princípio da indisponibilidade da coisa pública e o da supremacia do interesse público sobre o privado”. (2005, p.77)

É o que sustenta Rubens Miranda de Carvalho, quando aduz que:

“Deverá cobrar a contribuição de melhoria porque a cobrança de qualquer tributo, desde que preenchidos os euremas da sua incidência, não fica ao arbítrio do Poder Público, mas é absolutamente obrigatório para aqueles que, como funcionários ou gestores da coisa pública, tem o poder-dever da sua cobrança”. (1999, p.83)

Como denota Lovato, se uma obra beneficia um pequeno número de

munícipes, não será uma faculdade que estará em pauta, mas o poder (dever) do

administrador Público em resguardar interesses da coletividade, obrigando-o ao

exercício da competência impositiva, eis que do contrário estará se operando em

desfavor do patrimônio público, e em prestígio dos interesses de uma minoria.

Conclui o citado autor que, em sendo um dos objetivos principais da tributação a

procura do bem comum, a não imposição da contribuição de melhoria aos

beneficiados com a obra importaria desvio da finalidade por afastamento do fim geral

a que está submetido o Agente Público, mostrando-se cabível na hipótese a

interposição de ação popular (Lei nº 4.717/64) por parte de qualquer cidadão. (1994,

p.175)

3.2.4.2 Sujeito Passivo

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É aquele que figura no pólo passivo da relação e, portanto, está obrigado a

satisfazer a prestação, como contribuinte. No caso da contribuição de melhoria

podem figurar no pólo passivo da relação somente proprietários de imóveis, somente

aqueles que, em razão de serem proprietários, auferem um aumento de valor de seu

imóvel provocado por obra pública. Como ensina Roque Carrazza: “a hipótese de

incidência da contribuição de melhoria não é ser proprietário de imóvel urbano ou

rural, mas a realização de obra pública que valoriza o imóvel urbano ou rural”. (2008,

p.472)

Como ressalta Arx Tourinho, contribuinte é aquele que, segundo o direito

positivo, mantém “relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo

fato gerador”, e responsável é aquele que, não sendo contribuinte, está obrigado ao

pagamento do tributo, em razão de “disposição expressa em lei”. (1986, p.164)

Conforme Rubens Miranda de Carvalho ensina, reportando-se ao art. 3º, §

3º, do Decreto-Lei nº 195/67,

“... não somente os proprietários de imóveis diretamente beneficiados pela obra pública, mas também aqueles indiretamente beneficiados por ela, como tal entendidos aqueles cujos imóveis, embora distantes – muito ou pouco, não importa – da obra pública, sejam atingidos pelos resultados benéficos da mesma, sempre considerando-se como resultados benéficos a valorização dos mesmos imóveis”. (1999, p.85)

A respeito do contribuinte da contribuição de melhoria Barreto diz que “com

esteio no princípio da capacidade contributiva (CF, art. 145, §1º), poderão ser

erigidos como contribuintes, além do proprietário, o titular do domínio útil, o

usufrutuário e o compromissário-comprador imitido na posse”. (1998, p.589)

O método de aferição correto de valorização imobiliária dentro de uma

determinada zona de influência deve ser exercido a posteriori, de modo que se

possa avaliar a valorização ocorrida após a realização da obra. Sustenta Bernardo

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Ribeiro de Moraes que o resultado apresentará como zona de influência certa área

estabelecida através de figuras geométricas, como formas circulares, coroas lados

paralelos etc., de sorte a determinar a área sobre a qual a obra pública produziu o

efeito da valorização, bem como a sua quantificação, considerando cada imóvel

individualmente. Conclui o autor que nem sempre a proximidade com a obra

resultará necessariamente em valorização maior que a advinda a um imóvel mais

distante do seu centro, assim exemplificando:

“Existem obras que geram valorização dos imóveis lindeiros, ao longo da direção do melhoramento, v.g., a pavimentação de uma rua, em que os imóveis situados na via pavimentada recebem diretamente o benefício. Todavia, não se pode negar, nesses casos, a valorização de imóveis situados em vias transversais e próximas daquela onde foi executada a obra. A obra pública relativa a determinado viaduto, ou elevado, valorizam os imóveis nas pontas do melhoramento, excluindo os imóveis lindeiros. Cada um tem a sua característica em relação à respectiva valorização de imóveis”. (1999, p. 611)

Lembra Carlos Marques que,

“Outro aspecto relevante é o constante do art. 8º, § 4º, do Decreto-Lei nº 195/67, de onde se extrai que „os bens indivisos serão considerados como pertencentes a um só proprietário e aquele que for lançado terá direito de exigir dos condôminos as parcelas que lhe couberem‟. A regra se coaduna com o art. 124, do CTN, que consagra a solidariedade tributária das pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal, assim como daquelas expressamente designadas por lei. O que de peculiar se revela é que o legislador deu cunho indivisível à prestação, podendo o fisco escolher qualquer um dos co-proprietários para o pagamento da contribuição de melhoria, e o eleito poderá buscar dos demais a parcela que a cada um compete (art. 8º, § 4º, do Decreto-Lei nº 195/67), mas não poderá argüir o benefício de ordem (parágrafo único, do art. 124, do CTN)”. (2005, p.80)

A contribuição de melhoria será cobrada dos proprietários de imóveis de

domínio privado, na forma do art. 2º, do Decreto-Lei nº 195/67. É nítido que a norma

exclui da incidência do tributo os imóveis públicos, assim considerada toda a

categoria de bens públicos: de uso comum, uso especial e dominicais.

3.2.5 Critério Quantitativo

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Abrange a base de cálculo e a alíquota, que, combinadas, determinam o

debitum tributário. É o mandamento que se determina, por imputação, a quantia em

dinheiro que o sujeito passivo deve entregar ao Estado quando da ocorrência do fato

jurídico tributário.

3.2.5.1 Limites da Base de Cálculo

Para o professor Paulo de Barros Carvalho base de cálculo

“é a grandeza instituída na conseqüência da regra-matriz tributária, e que se destina, primordialmente, a dimensionar a intensidade do comportamento inserto no núcleo do fato jurídico, para que, combinando-se à alíquota, seja determinado o valor da prestação pecuniária. Paralelamente, tem a virtude de confirmar, infirmar ou afirmar o critério material expresso na composição do suposto normativo. A versatilidade categorial desse instrumento jurídico se apresenta em três funções distintas: a) medir as proporções reais do fato; b) compor a específica determinação da dívida; e c) confirmar, infirmar ou afirmar o verdadeiro critério material da descrição contida no antecedente da norma”. (2008, p. 219)

A base de cálculo é expressão numérica compreendida no núcleo da

hipótese de incidência da espécie tributária sobre a qual recai a alíquota, de modo a

resultar na quantia devida pelo contribuinte. Como ensina Rodrigues, “sem a base

de cálculo não há como determinar, numericamente, o valor da prestação pecuniária

devida pelo sujeito passivo, o que se faz conjugando-a com a alíquota”. (2002,

p.128)

Como se constata da lição de Célio Armando Janczeski:

“A hipótese de incidência não é nem a obra em si, nem o enriquecimento do contribuinte, mas a diferença do valor de uma propriedade antes e depois da execução da obra. Executada a obra, compara-se o valor do imóvel antes e depois da execução, obtendo-se daí o maior valor adquirido pela propriedade como conseqüência daquela”. (1999, p.106)

Segundo Priscilla Rodrigues

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“Se, porventura, a base de cálculo expressar o custo da obra rateada entre os imóveis afetados por ela, como tem ocorrido com freqüência, não estaremos diante da contribuição de melhoria, mas de taxa de serviço público inespecífico e indivisível consistente no serviço público geral de execução de obra pública, ... que é inconstitucional, por ofensa ao princípio da isonomia”. (2002, p.122)

Complementa a mesma autora,

“Temos afirmado que o critério material da contribuição de melhoria é auferir valorização imobiliária decorrente de obra pública. Logo, o que deve ser dimensionado na base de cálculo da contribuição de melhoria é quanto o proprietário do imóvel valorizado pela obra pública auferiu, ou seja, qual o quantum de valorização experimentado pelo imóvel em decorrência da obra pública. Tratando-se de valorização imobiliária, esse quantum deve

ser expresso em moeda”. (2002, pp.128-129)

Estevão Horvath sustenta que:

“Com efeito, o limite para o quantum a ser cobrado a título do tributo aqui analisado é o importe correspondente a essa valorização. Este, por sua vez, pode nada ter a ver com o custo da obra realizada pelo Estado, razão suficiente para dizer-se eu este custo não pode ser (juridicamente falando) imposto como limite para a cobrança dessa contribuição. Quer isso significar que a soma dos valores arrecadados pode ir além ou ficar aquém do valor correspondente ao custo da obra publica, sem que esta circunstância interfira no aspecto quantitativo do tributo em questão”. (2002, p.135)

Encerra Carlos Roberto Marques que:

“A base de cálculo de representar o valor efetivo auferido com a execução da obra pública, evitando-se com isso o lucro imerecido de alguns em afronta ao princípio da igualdade, da mesma forma que se impõe como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultou ao imóvel, prestigiando-se, o princípio da capacidade contributiva”. (2005, p.89)

Em poucas palavras é possível concluir que a base de cálculo da

contribuição de melhoria será a diferença do valor do imóvel antes e após a

realização da obra pública, ou seja, “é preciso haver direta relação de causa e efeito

entre a obra e a valorização”, de acordo com Ataliba. (2004, p.174)

3.2.5.2 Custo da Obra Pública

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Um dos elementos caracterizador do fato gerador da contribuição de

melhoria, é a obra pública. A CF, no art. 145, III confirma essa assertiva quando

autoriza os entes da federação a cobrar contribuição de melhoria decorrente de obra

pública, conforme já analisamos anteriormente.

3.2.5.2.1 Aspectos relevantes do Decreto-Lei nº 195/67

O art. 2º, do Decreto-Lei nº 195/67 exemplifica um rol de obras públicas,

sobre as quais será devida a cobrança do tributo em comento, havendo valorização

imobiliária na propriedade de particular, conforme já nos referimos anteriormente.

Estudando o art. 2º, do Decreto-Lei nº 195/67, Bernardo Ribeiro de Moraes

sustenta que a enumeração estabelecida na referida regra não é taxativa, o que

importa dizer que outras obras além daquelas arroladas podem gerar um incremento

imobiliário justificador da contribuição de melhoria. (1999, p.601)

Sobre o mesmo tema Arx Tourinho, assim se manifesta:

“Essa relação de espécies de obras públicas não é taxativa, porém, exemplificativa. Não teria sentido que o texto legal, com eficácia nas órbitas federal, estadual e municipal, imprimisse imposições ou restrições quanto aos tipos de obras públicas que ensejariam a contribuição de melhoria. Existem obras que são realizadas exclusivamente pelos Municípios; outras pelos Estados-Membros ou pela União. Não seria conveniente que o texto federal bitolasse a imposição do tributo entravando as administrações públicas”. (1986, p.173)

Na leitura do artigo supracitado é possível notar que várias das obras

mencionadas acarretaram em depreciação imobiliária, fato analisando

anteriormente. Mas por outro lado, haverá também aquelas que efetivamente

resultarão em valorização imobiliária (urbanização em geral), tornando nítido que os

municípios serão, em tese, os maiores instituidores dessa exação.

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Outro aspecto relevante é o que dispõe o art. 3º, do Decreto-Lei nº 195/67, é

que não é necessário que o bem imóvel seja limite com a obra pública, bastando

que se encontre na sua zona de influência, o que demonstra que o critério adotado

pelo legislador não é o da contigüidade, mas o da proximidade.

Neste sentido denota o professor Bernardo Ribeiro de Moraes: “certas

obras, mormente as que oferecem equipamentos urbanos, levam melhoria a imóveis

que se situam na zona de influência”. (1999, p.601)

Envolvendo a realização de obra de pavimentação, interessante exemplo

nos dá Helio de Caires e José Carlos Pellegrino, vejamos:

“Ora, é sabido que quando ocorre uma obra de pavimentação numa determinada via pública, os imóveis nela situados recebem diretamente o benefício; porém as ruas transversais e próximas das mesmas também sofrem uma influência e de certo modo uma valorização que, nos dias que correm, não são levadas em conta e nem admitidas pelo poder público como tributáveis para fins de cobrança de contribuição de melhoria‟”. (1975, p.271)

Como asseveram os citados autores, a situação em destaque vem sendo

tributada pela via da taxa de pavimentação, cobrando-a exclusivamente dos

proprietários dos imóveis localizados no logradouro que recebeu a atividade

administrativa, rateando-se seu custo total pelas testadas respectivas. (1975, p.271)

Sobre o lançamento tributário realizado por meio de testadas, já decidiu o

Tribunal de Justiça do Paraná, no sentido de que sem a comprovação da

valorização imobiliária é impossível de acontecer. Segue a ementa do acórdão:

“TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - PAVIMENTAÇÃO DE VIA PÚBLICA - CUSTO DA OBRA - NULIDADE DO LANÇAMENTO - APELAÇÃO PROVIDA. O lançamento efetuado com base no custo da obra em função da testada do imóvel beneficiado é absolutamente nulo, porquanto o fato gerador da contribuição de melhoria é a valorização imobiliária resultante da realização da obra pública.” (TAPR, 3ª Câm. Cível, AC 136869-4/PR. Rel. Juiz Rogério Coelho, Nov/99, DJPR de 03.12.1999)

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Outra observação que se impõe acerca da obra pública é realçado por Bilac

Pinto. Sustenta o doutrinador que não é qualquer obra pública que justificará a

incidência da contribuição de melhoria. Somente aquelas permanentes, que

efetivamente incorporem uma valorização na propriedade imobiliária particular terão

força para fazer incidir o tributo. (Bilac Pinto, p. 282)

3.2.5.3 Valorização Imobiliária

Com a emenda Constitucional nº 28/93, e com o advento da Constituição

Federal de 1988, foi iniciada uma mudança de entendimento no que concerne ao

fato gerador da contribuição de melhoria. Suprimiu-se do texto legal a expressão

“valorização imobiliária”, falando a Emenda nº 23 apenas em benefício, o que se

refletiu na atual Carta Constitucional a possibilidade de cobrança da “contribuição de

melhoria decorrente de obra pública”, segundo mencionamos anteriormente no

tópico da evolução histórica no Brasil.

Este fato levou alguns autores, como Arx Tourinho, a sustentar que a

valorização imobiliária não era mais elemento do fato gerador da contribuição de

melhoria, bastando à ocorrência de qualquer benefício gerado pela realização da

obra pública. Assim se manifesta o autor,

“o poder reformador teria dado margem à ampliação do fato gerador da contribuição de melhoria, de modo a compreender não só o acréscimo patrimonial do bem imóvel, mas qualquer outro benefício que, por acaso, sobrevenha à coisa”. (1986, pp.152-157)

Conclui o autor que “toda valorização é benefício, mas nem todo benefício é

valorização”.

No mesmo sentido se posiciona Aliomar Baleeiro, vejamos:

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“... a adoção pelo direito brasileiro do critério do benefício e não o do custo, o fato gerador da contribuição de melhoria é a valorização efetiva do imóvel, de que seja proprietário, ou enfiteuta, o contribuinte, por decorrência de uma das obras públicas arroladas pelo Decreto-Lei nº 195, de 1967. Não basta a existência da obra realizada pelo sujeito ativo no local de situação do imóvel passivo. É indispensável que dessa obra, por uma relação de causa e efeito, origine aumento positivo do valor do imóvel...” (2002, p.579)

Registra Carlos Roberto Marques que “não basta a obra pública, mas o

advento desta com conseqüente incremento patrimonial. É necessária a valorização

imobiliária, tendo como causa a obra pública”. (2005, p.70)

E desta valorização proporcionada à propriedade imobiliária particular, só

torna-se ilegítima a partir do momento em que a Lei assim passa a considerá-la.

Para o STJ a base de cálculo tem que considerar a valorização.

“CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. FATO GERADOR. VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL. ARTS. 81 E 82, DO CTN.DL Nº 195/67. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. 1. A entidade tributante, ao exigir o pagamento da contribuição de melhoria, tem de demonstrar o amparo das seguintes circunstâncias: a) a exigência fiscal decorre de despesas decorrentes de obra pública realizada; b) a obra pública provocou a valorização do imóvel; c) a base de cálculo da é a diferença entre dois momentos: o primeiro, o valor do imóvel antes da obra ser iniciada; o segundo, o valor do imóvel após a conclusão da obra. 2. „É de natureza da contribuição de melhoria a valorização imobiliária‟ (Geraldo Ataliba). 3. Diversidade de precedentes jurisprudenciais do STJ e do STF. 4. Adoção, também, da corrente doutrinária que, no trato da contribuição de melhoria, adota o critério de mais valia para definir o seu fato gerador ou hipótese de incidência (no ensinamento de Geraldo Ataliba, de saudosa memória). 5. Recurso provido.” (STJ, 1ª T., REsp 615495, rel. Min. José Delgado, abr/04)

E mais,

“1. A contribuição de melhoria tem como fato gerador a real valorização do imóvel, não servindo como base de cálculo tão-só o custo da obra realizada. (REsp nº 280.248/SP, relator ministro Francisco Peçanha Martins, 2ª T., DJ de 28.10.2002). 2. Recurso especial provido.” (STJ, 2ª T., REsp 629471/RS. Rel. Ministro João Otávio de Noronha, fev/07).

Em sentido contrário, entendendo que é dispensável a valorização

imobiliária, bastando que haja “melhoria”, se posiciona Bernardo Ribeiro de Moraes,

“Melhoria não é sinônimo de valorização ou de acréscimo de valor, mas é vantagem, melhoramento, v.g., caso de aumento da capacidade de

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aproveitamento econômico da propriedade. A obra pública pode trazer melhoria ao imóvel do contribuinte, v.g., maior acessibilidade, maior conforto, maior higiene, maior valor etc. a contribuição de melhoria (dispensável a valorização), por execução de obra pública... Hoje, após a promulgação da Constituição de 1988 (...) o objeto da contribuição de melhoria é a „obra pública‟ (art. 145,III), sem qualquer referência a „valorização imobiliária‟ dela decorrente. Basta a execução de obra pública que atinja o imóvel do contribuinte, levando-lhe uma melhoria, para a contribuição de melhoria ser devida”. (1999, pp. 589-600)

Geraldo Ataliba bem define o que é valorização imobiliária,

“A realização de obras públicas, em regra, gera um efeito específico notável: determina incremento no valor dos imóveis adjacentes e vizinhos. Esta valorização é algo novo no mundo, introduzindo como repercussão da obra. É algo de novo que se confunde com a obra, mas é nitidamente efeito seu. É o fruto da combinação da obra com algo já existente: os imóveis que lhe são avizinhados.(...) A ordem jurídica há de atribuir o algo novo a alguém... O proprietário do imóvel a isto nada pode opor: é que o valor de seu bem persiste o mesmo, nesta hipótese. Não pode exigir que a valorização se incorpore ao seu patrimônio. Não pode pretender que o sobrevalor acrescido a seu patrimônio, em virtude de causa alheia a seu trabalho, lhe pertença”. (2004, pp.175-176)

A afirmativa é criticada por Helio Aires e José Carlos Pellegrino, no sentido

de que nem sempre as obras de melhoramento produzem valorização instantânea

nos imóveis ribeirinhos, citando como exemplo o caso de:

“...uma galeria de águas pluviais, de grandes dimensões, projetada para atender as necessidades de uma imensa bacia sujeita à periódicas inundações. Durante a sua execução, não corre processo de valorização algum; concluída a obra e colocada a mesma em funcionamento, somente depois da estação das chuvas é que a população local se dará conta de que as inundações costumeiras deixaram de ocorrer, devido à presença do melhoramento; muitas vezes, levado pelo ceticismo e pela descrença, o povo aguarda uma segunda estação, para certificar-se de forma definitiva, de que realmente o melhoramento funciona. Aí, então, ocorre o processo de valorização, iniciando de forma muito lenta na primeira estação”. (1975, p.272)

Ensina Rubens Miranda de Carvalho deve haver uma contemporaneidade

entre a valorização do imóvel e a obra pública, que aquela deve anteceder, a fim de

que possa haver uma relação de causa e efeito entre ambas.7 (1999, p.81)

7 Neste sentido já decidiu a 16ª Câmara Cível do 1º TACSP na apelação cível nº 427.6443-7, cujo

acórdão foi publicado na RT 679/109.

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Paulo de Barros Carvalho e Hugo de Brito Machado se posicionaram no

sentido de que é indispensável à valorização para caracterizar a melhoria. E o STF

por sua vez, se posicionou neste mesmo sentido, melhoria x valorização devem ser

consideradas como sinônimos para os efeitos do art. 145, III, da CF. Vejamos:

“Sem valorização imobiliária decorrente de obra pública, não há contribuição de melhoria, porque a hipótese de incidência desta é a valorização e a sua base é a diferença entre os dois momentos: o anterior e o posterior à obra pública, vale dizer, o quantum da valorização imobiliária. Precedentes do STF: RREE 115.863-SP e 116.147-SP”. (STF, 2ª T., RE 114.069-1-SP, Min. Carlos Velloso, abr/94).

Priscila Figueiredo da Cunha Rodrigues leciona que:

“A expressão „de melhoria‟ qualifica o objeto, isto é qualifica a „contribuição‟. A contribuição que pode ser instituída pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios é a „de melhoria‟, ou seja é uma contribuição devida em razão de uma melhoria. (...) Mas que melhoria seria essa? Não é qualquer melhoria que abre espaço à tributação, mas tão-somente aquela que decorre de obra pública...”. (2002, p.46)

A obra pública normalmente proporciona valorização às propriedades

particulares próximas. Para a retenção dessa mais-valia o ordenamento jurídico

disponibiliza ao poder público vários instrumentos para captação de recursos. Ocorre

que a execução de uma obra pública poderá ensejar efeito reverso, de diminuição

do valor patrimonial do bem particular, conforme já visto, situação que conduzirá o

Estado à obrigação de indenizar, em razão de uma “pioria” ocasionada pelo simples

fato da obra, reconhece Marques. (2005, p.113)

Ao ensejo do estudo do tema assim exemplifica Sacha Calmon:

“... criou-se o tributo denominado „Betterment Tax‟ (...) O objetivo era, assim, captar a mais-valia, sem nenhuma correlação, na construção de um cemitério (obra pública), ocasionando a desvalorização dos imóveis lindeiros, entendiam os ingleses que, nesse caso caberia ao Poder Público indenizar os proprietários pela „pioria‟...” (2004, p.575)

Concluindo sobre o tema Carlos Roberto Marques, diz que:

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“... cuidando-se a execução da obra pública de comportamento regular da Administração Pública, a justificativa da responsabilidade no caso de „pioria‟ está no princípio da igualdade e da solidariedade social, viabilizando-se através da indenização a equânime distribuição dos ônus oriundos de atos ou efeitos lesivos. Injusto seria que apenas um membro da coletividade experimentasse um sacrifício, quando o benefício social engendrado pela atividade administrativa produz efeitos erga omnes. Embora regular, o ato é injusto, e a responsabilidade estatal surge para dar vida à justiça distributiva”. (2005, p.118)

Exemplificando a matéria, Carlos Roberto Marques demonstra que:

“... a atividade estatal, onde se insere a realização de obras públicas deve trazer benefícios à coletividade, mas nem sempre esses benefícios correspondem à efetiva valorização de propriedades imobiliárias, não materializando, por conseguinte, a hipótese de incidência da contribuição de melhoria. Imagine-se uma obra de construção de via expressa ligando determinada área famosa pela sua tranqüilidade ao centro da cidade. O acesso ao centro de urbe torne-se bem mais rápido, mas em contrapartida o aumento do fluxo de veículos prejudicou a paz tradicional do local. Iniludível que a obra trouxe benefício, mas por outro lado não se pode afirmar que tenha gerado mais-valia aos bens da cercania”. (2005, p.72)

O STF já pacificou o entendimento de que a valorização imobiliária é

indispensável para a caracterização da contribuição de melhoria, sem a mesma não

há que se falar no tributo em explanação, pois, para que haja a incidência do mesmo

é necessária à realização de uma obra pública da qual decorra a valorização

imobiliária.

3.2.5.4 Alíquota

Só pode ser determinada por lei, já que é de fundamental importância na

determinação do quantum devido. A lei deve descrever todos os aspectos da norma

que cria uma obrigação pecuniária compulsória, tal qual o tributo, em atendimento ao

princípio da legalidade. É através da alíquota que se gradua a porção da base de

cálculo que cabe ao Estado. Tal afirmação encontra exceções, como nos ensina

Paulo Barros de Carvalho:

“Etimologicamente, alíquota, vocábulo latino da primeira declinação, quer

dizer parte, a parcela que se contém no todo um número exato de vezes. Esse deve ser o motivo pelo qual a doutrina insiste em considerá-la como a quota, fração ou parte, que o Estado chama para si, do valor dimensível

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(base de cálculo) manifestado pelo fato jurídico tributável. Por certo que na maioria das vezes é o que ocorre. Mas não pode se tomar como regra geral. Se conseqüentemente a alíquota se apresenta em forma de percentagem, nada impede que seja concebida em termos monetários”. (2010, p.227)

Pela conjugação da alíquota com base de cálculo chega-se à soma em

dinheiro que o sujeito passivo deve ao fisco. Esse resultado deve corresponder a

uma parte da base de cálculo, sob pena de ofensa ao princípio da proibição de

tributo com efeito de confisco (art. 150, IV, da CF). Assim, se a alíquota

corresponder a um percentual de base de cálculo não poderá, em princípio, ser

maior ou igual a 100% do valor da base de cálculo.

Tratando-se de contribuição de melhoria a regra comporta exceção.

Vejamos o ensinamento de Priscilla Rodrigues:

“Se a finalidade é fazer face ao custo da obra, realmente a arrecadação total, por meio de contribuição de melhoria, não pode ultrapassar esse custo, até porque entendemos que o Estado não pode utilizar-se do expediente de realizar obras públicas para obter lucro. Destarte, nada mais lógico do que o custo ser o próprio limite total. Por outro lado, não pode o Estado „retirar‟ do administrado mais do que lhe proporcionou, sob pena de confisco ou, eventualmente, tributação. Isto é, se a base de cálculo é o quantum de valorização experimentado pelo imóvel, tal quantum é o próprio limite individual, pois o que lhe exceder implicará abrangência do valor do imóvel – valor, este, correspondente à base de cálculo do IPTU ou do ITR, conforme se trate de imóvel urbano ou rural, respectivamente. É preciso ter em mente que o limite total correspondente à soma de todas as despesas efetivamente ocorridas na execução da obra, valor, este, que só pode conhecer após finda sua realização. Tudo quanto se arrecade através da contribuição de melhoria não pode ultrapassar esse valor. Portanto, conhecendo-se o custo efetivo da obra pública, caberá a cada imóvel valorizado uma “cota-parte” proporcional à valorização individual que cada imóvel recebeu. Se o limite individual corresponde ao quantum de valorização experimentado por cada imóvel, que pode variar de obra para obra e de imóvel para imóvel, haverá situações em que o Poder Público se ressarcirá inteiramente das despesas implicadas na execução da obra, situações em que se ressarcirá apenas parcialmente e situações em que não se ressarcirá. (2002, pp.130-131)

Paulsen discorrendo sobre os limites, individual e total, diz que o mesmo

decorre da própria natureza do tributo. “Além da valorização imobiliária, o

proprietário do imóvel situado na zona de influência não se distingue dos demais

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contribuintes, não se justificando que dele se exija valor superior; além do custo da

obra, nenhuma receita se justifica”. (2008, p.1320)

No mesmo sentido, Hugo de Brito é mais rigoroso.

“Se a título de contribuição de melhoria a União, o Estado ou Município cobra mais do que o incremento de valor dos imóveis, ou cobra mais do que o custo da obra pública, na verdade está cobrando imposto, e não contribuição de melhoria. E, se cobra imposto que não se compreende em sua competência tributária, fere a Constituição”. (2007, p.330)

Em poucas palavras Baleeiro resume a discussão, dizendo que o limite da

contribuição de melhoria não é só o do art. 4º, do Decreto-Lei nº 195 – o custo da

obra – mas também a valorização individual do art. 18, II, da Emenda nº 1/1969.

(2002, p.584)

A Ministra Eliana Calmon, ao julgar o RESP 362788/RS, que esta exação

tem como limite geral o custo da obra, e como limite individual a valorização do

imóvel beneficiado, considerando ilegal a fixação da contribuição de melhoria sem

observância do limite individual de cada contribuinte. Vale transcrever a ementa do

referido decisum, verbis:

TRIBUTÁRIO – CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA – CTN ARTS. 81 E 82 – 1. A contribuição de melhoria tem como limite geral o custo da obra, e como limite individual a valorização do imóvel beneficiado. 2. Prevalece o entendimento no STF e no STJ de que não houve alteração do CTN pelo DL 195/67. 3. É ilegal a contribuição de melhoria instituída sem observância do limite individual de cada contribuinte. 4. Recurso Especial conhecido e provido. (STJ, 2002, DJU 05.08.2002)

Priscilla Rodrigues ao tratar do tema, diz que,

“O Poder Público proporciona um aumento do patrimônio dos proprietários desses imóveis, que, no entanto, estão sujeitos a devolver esse aumento de valor, pagando contribuição de melhoria. Assim, o Estado proporciona o aumento do patrimônio “retirando” o acréscimo em forma de obrigação pecuniária – isto é, “dá” em valorização imobiliária e “retira” em dinheiro. Se o contribuinte pagou ao Estado tanto quanto recebeu, seu patrimônio permaneceu inalterado; assim, esse aumento no valor de seu imóvel não deve ser computado para efeito de IPTU ou de ITR. Entretanto, nos casos em que a valorização imobiliária for maior do que lhe foi exigido por meio de contribuição de melhoria, a valorização excedente que permanece

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incorporado ao seu patrimônio deve ser computada na base de cálculo daqueles impostos. Destarte, não vemos problema algum quanto ao excedente de valorização que permaneça no patrimônio dos proprietários de imóveis valorizados por obra pública, porque sobre esse aumento ele estará, de algum modo, pagando mais imposto”. (2002, pp.133-134)

Sobre a matéria Paulsen diz que,

“Sendo fato gerador da contribuição de melhoria a realização de obra que implique um benefício para o contribuinte vinculado ao imóvel, tem-se que a lei deve preexistir à obra, e que a obrigação tributária somente surgirá com a sua realização. Importa a lei vigente quando da execução de obra”. (2008, p.1316)

Em síntese, alíquota será uma percentagem do valor da base de cálculo,

observando os limites individuais e total do imóvel beneficiado pela obra pública e os

princípios norteadores do direito tributário, já abordados anteriormente.

3.3 Modelo Alemão e Modelo Inglês

Sacha Calmon faz referência ao modelo alemão como sendo,

“Outra matriz histórica da contribuição de melhoria nos vem da Alemanha, fulcrada juridicamente no direito romano, mas com sentidas influências do Direito germânico, extremamente atento ao senso comunitário e à repartição dos custos sociais, na paz e guerra... O Pragmaticamente, porém, deixaram de lado o fator „valorização‟, para se fixarem no „custo da obra‟. O benefício não é tomado como base de cálculo mas como indicativo do contribuinte (o dono do imóvel na área de interesse). Relatam os doutos que a „Beitrag‟ alemã liga-se aos planos de urbanização e as leis de construção, apresentando-se com um tributo destinado a recuperar a posteriori o gasto estatal com obras públicas, sem nenhuma finalidade eqüidosa, como ocorre com a contribuição da matriz inglesa (já que lá se invoca a eqüidade para cobrar dos que são valorizados em suas propriedades em razão de obras públicas, financiadas por toda a sociedade, pois, é óbvio, os recursos públicos advêm dos tributos pagos pela sociedade, como um todo).” (2004, p.75)

Não se pode a contribuição de melhoria ser mensurada tendo por limite o

custo global da obra, como pretende Bernardo Ribeiro de Moraes, sob pena de se

transformar o tributo em mero instrumento recuperador de dispêndios realizados

pelo poder público, hipótese que representaria, ainda, agressão ao princípio da

isonomia que lhe serve de fundamento. (1999, p.595)

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Para Aires Barreto, o único limite que se recolhe é o individual, uma vez que

se afina com o princípio da capacidade contributiva, porque, conforme salienta Aires

Barreto, há obras acarrecadadoras de grande valorização imobiliária, embora de

custo pouco expressivo, ao passo que outras são geradoras de pequena

valorização, sem embargo do custo elevado despendido. Com efeito, se a obra foi

financiada pela sociedade, não tendo sido a valorização motivada por qualquer ato

praticado pelo proprietário, deve o montante ser revertido em favor da coletividade,

pouco importando o custo da obra. (1989, pp.276-277)

Sacha Calmon ao citar a vertente inglesa diz que,

“Reza a lenda que a coroa britânica resolveu retificar o rio Tâmisa, nas imediações de Londres, e murar as suas margens no trecho citadinho. E fez-se o empreendimento, a custos bem elevados. Termina a obra, verificou-se que os súditos de sua majestade, especialmente os londrinos, tinham acabado de obter grande conforto. O rio já não transbordava, alagando a cidade. Logo se pôs o Parlamento britânico a discutir o caso e chegou à conclusão de que uma classe especial de súditos auferida especial vantagem patrimonial: os afortunados proprietários da áreas rurais próximas à cidade, agora ótimas (antes algadiças e pantanosas e, por isso mesmo, inaproveitáveis). ... E a plus valia a valorização, não decorrera do esforço próprio dos donos, nem de investimentos particulares em benfeitorias, nem da desvalorização de libra esterlina. Decorrera, em verdade, da realização da obra pública. Teria se resolvido, então, instituir um tributo específico com a finalidade de „capturar a mais-valia imobiliária decorrente daquela obra pública‟, cuja base de cálculo seria precisamente a expressão da valorização obtida por cada um dos proprietários. Assim, teria ocorrido a contribuição pela melhoria em imóvel de particular, decorrente de obra pública. Criou-se o tributo denominado „Betterment Tax’... o objetivo era, assim, captar a mais-valia, sem nenhuma correlação com o custo da obra. Em compensação, na construção de um cemitério (obra pública), ocasionando a desvalorização do imóveis lindeiros, entendiam os ingleses que, nesse caso, caberia ao Poder Público indenizar os proprietários pela „pioria‟”. (2004, p.74)

De acordo com o modelo inglês, a melhoria deverá sempre existir, e deverá

necessariamente ser buscada, apurada e identificada na valorização imobiliária.

Vejamos quais são os doutrinadores brasileiros que são adeptos desta tese.

O mesmo autor acima mencionado a CF/88 optou pela contribuição de

melhoria recuperadora, a posteriori, do custo da obra pública valorizadora, tendo por

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base de cálculo geral o custo total da obra, a ser repartido, no todo ou em parte,

conforme a lei, entre os contribuintes. Diz ele que está convencido de que a

contribuição recuperadora da mais-valia desapareceu do nosso Direito, tanto que a

Constituição nem se fala mais em “valorização”. (2004, p.486)

O sistema constitucional brasileiro para Geraldo Ataliba adotou o critério de

atribuir parcialmente às valorizações imobiliárias decorrentes de obra pública ao

poder público, isto é, a valorização individual decorrente de obra pública. Deveras, o

art. 145, III da CF não é mera autorização; é imperativo (imprescindível) por razões

de justiça e isonomia. (2004, p.177)

No ponto de vista do autor acima aludido, a lei brasileira adotou,

equivocadamente, os critérios de certa legislação norte-americana correspondente a

um tipo de “special assessment” que nada tem a ver com a contribuição de melhoria.

Pois em vez de se adotara aqui a legítima c.m. (benefit assessment), adotou-se o

“cost assessment” que corresponde ao financiamento de obras públicas, por um

instrumento semicontratual: a requerimento dos interessados; com consentimento,

quanto ao projeto de custos, por parte dos interessados; os quais podem opinar,

discutir e questionar a conveniência e oportunidade da obra, seu projeto e

orçamento; e o pagamento é na medida do custo, repartindo proporcionalmente por

todos. Conclui o autor que os brasileiros copiaram o cost assessment, supondo que

se tratava do benefit assessment, não se dando por conta das diferenças entre os

dois. Para tornar claro exemplifica o doutrinador:

“Um grupo de pessoas resolve reservar-se uma área distante do núcleo urbano, para mora em condições especiais, por razões de comodidade, conforto, segurança ou outras. Tal comunidade não reúne condições numéricas que tornem viável a extensão de serviços e equipamentos públicos. Não é correto – ou não é financeiramente possível ao Município – onerar toda a sociedade com os custos de tal extensão. A única saída está

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no autofinanciamento disso. Foi para tais hipóteses que se criou o cost assessment, de cunho eminentemente contratual”. (2004, p.181)

De acordo com Baleeiro os dois modelos: o inglês e o alemão, não são tão

distantes como à primeira vista pode parecer, evoluíram e se aproximaram, de modo

que para o Brasil, a contribuição de melhoria, pode-se dizer que é um sistema misto.

“Seja como for, é inegável que, na ordem jurídica brasileira, inexiste oposição entre custo e benefício. Nela, benefício individual + obra pública (causa eficiente) são o núcleo material da hipótese da contribuição de melhoria, em que nenhum desses elementos é simples adjetivo, mas ambos são substanciados à configuração do fato jurídico. A base de cálculo, coerentemente, será o valor do benefício individual dela decorrente, globalmente limitada à cobrança pelo custo da obra”. (2002, p.576)

Neste mesmo sentido, Leandro Paulsen se manifesta,

“Considerando que fato gerador é a situação definida em lei como necessária e suficiente ao surgimento da obrigação principal (art. 114 do CTN), tem-se que o fato gerador da contribuição de melhoria é misto. Pressupõe tanto a realização da obra (fato vinculado à atividade do Poder Público) como a valorização imobiliária (fato que diz respeito ao contribuinte). Realmente, a atividade do Poder Público, por si só, embora necessária, não é suficiente para o surgimento da obrigação tributária, pois se exige, também, a valorização imobiliária decorrente; da mesma maneira, a valorização imobiliária, embora necessária, não é suficiente para o surgimento da obrigação tributária, pois tem de ter decorrido da obra pública. Não é correto, pois, dizer-se que o fato gerador da contribuição de melhoria é vinculado ou que é não-vinculado, pois qualquer destes enquadramentos levaria a equívoco. O fato gerador da contribuição de melhoria, em verdade, é misto.” (2008, p.1315)

É de salientar-se que o modelo alemão baseia-se no custo da obra para

instituir a contribuição de melhoria, enquanto para o modelo inglês a melhoria deve

sempre existir para que possa exigir a cobrança do mesmo. Pode-se dizer que o

Brasil adotou o sistema misto para a contribuição de melhoria, já que se faz

necessário a valorização imobiliária e, o rateio do valor a ser cobrado pelos imóveis

valorizados não podem ultrapassar o custo total da obra realizada.

3.4. Motivos que impedem a plena utilização do Tributo

A seguir serão mencionados os principais entendimentos encontrados na

doutrina acerca das razões pelas qual a contribuição de melhoria é pouca utilizada.

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Saraiva, Caruso e Santos apontam vários fatores que justifica a pouca

utilização do tributo, de uma só vez, como a complexidade de sua estrutura, mau

aplicação, falta de pessoal preparado para possibilitar a observação dos requisitos

legais:

“Na verdade, não é fácil instituir esse tributo, devido à complexidade de seus mecanismos; por isso não é, quando previsto a legislação, exercitado, ou, quando o é, opera-se com inconveniência. (...) a técnica de arrecadação e o procedimento administrativo da contribuição de melhoria não são simples. Com isso, há pouca utilização dessa fonte de receita, principalmente nos municípios, pois não dispõe de pessoal especializado para tal”. (1999. p.261)

É defendido por Mayrink que a falta de edição de lei, pelos Municípios, por

falta de vontade pública, obsta a criação e cobrança do tributo em comento:

“A ausência de instrumento normativo, a lei complementar ainda não editada, atribui-se, na verdade, a falta de vontade pública. Mas essa lei é necessária. O potencial de geração de recursos da contribuição de melhoria é grande, podendo abranger todos os tipos de obras públicas, bastando, para tanto, que cada ente federativo, ao legislar sobre o tributo, o faça corretamente, para evitarem intermináveis pendências judiciais, que acabariam por inviabilizar, de vez, a cobrança do tributo”. (2004, p.67)

Há quem entenda que “o desuso se dá especialmente pelo despreparado do

poder público, que insiste na não obediência dos princípios do tributo”. (1998, p.35)

Leonetti enumera três motivos para o problema em tela, sejam eles:

“a) falta de tradição, entre nós, da adoção de um tributo com tal perfil, o que faz com que sua instituição seja, quase sempre, malvista entre os contribuintes; b) o (mau) costume brasileiro segundo o qual as obras públicas devem ser custeadas integralmente pelo Estado; c) a hesitação do ordenamento jurídico pátrio, inclusive o constitucional, em adotar este ou aquele tipo de contribuição de melhoria, gerando incerteza entre os próprios legisladores, bem como na doutrina e na jurisprudência, e produzindo legislações híbridas, como o próprio Decreto-Lei nº 195/67”. (2005, p.126)

De acordo com Sabbag a maior dificuldade para a implementação do tributo

é delimitar-se a área de influência da obra pública, isto é, o quantum os imóveis

foram beneficiados, já que na sua definição, há vários tipos de valorização. Vejamos:

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“A cobrança deve obedecer à área de influência ou zona de beneficiamento, o reforça exigir o gravame daqueles proprietários de imóveis contíguos ou lindeiros(...). A propósito, a delimitação da área traduz-se na maior dificuldade na cobrança desse tributo, pois, como é cediço, há vários tipos de valorização: (I) longitudinal, em que se valorizam os imóveis ao longo da obra; (II) a radial, ao redor da obra; ou (III) em pontos extremos, nas extremidades da obra”. (2008, p.104)

O mesmo autor supramencionado ao discorrer sobre o duplo limite da

contribuição de melhoria, qual seja, a valorização individual e o custo da obra,

aponta mais uma dificuldade, pois

“... é inarredável afirmar que a contribuição de melhoria se torna, nesse aspecto, um tributo de difícil implementação prática, devido à dificuldade de o Poder Público promover as avaliações e estimativas que mais se aproximem da realidade”. (2008, p.106)

Hugo de Brito sustenta que a classe política nacional não estaria

interessada em transparência dos custos das obras públicas, gerando uma prévia

má-fé da Administração, já que é requisito indispensável para a cobrança da

contribuição de melhoria, entravando o desenvolvimento do tributo.

“É sabido que as obras públicas geralmente são contratadas por valores muito elevados, acima dos valores de mercado, de sorte que a transparência geralmente não é conveniente para a Administração, e muito menos para as empreiteiras de obras públicas. Mesmo assim, preferimos acreditar que a verdadeira razão para a inaplicação da contribuição de melhoria, no Brasil, reside na exigência de publicação do orçamento da obra, e do direito do contribuinte de impugnar o respectivo valor”. (Porque não se cobra contribuição de melhoria no Brasil, texto sem paginação)

Outra causa apontada pelo pouco uso do tributo é a complexidade geradora

da burocratização para a instituição da contribuição de melhoria encontrada face das

exigências do Código Tributário Nacional:

“Apesar de ser legítima a cobrança da contribuição de melhoria apresenta-se bastante complexa, pois o ente federado se obriga a cumprir os requisitos dispostos no art. 82 do CTN, o que justifica de certa forma o abandono do Governo em utilizar-se desta espécie tributária, preferindo solucionar seus problemas de caixa elevando a alíquota de outros tributos, principalmente as contribuições sociais”. (Revista Tributária e de Finanças Públicas, nº 57, p.67)

No mesmo sentido encontra-se a lição de Ataliba:

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“As normas gerais vigentes (arts. 81 e 82 do CTN) estabelecem tantos requisitos para a aplicação da c.m. (contribuição de melhoria) que a tornam de impossível aplicação, além de deformá-la, descaracterizando-a. São nitidamente inconstitucionais e, pois, não obrigatórias para Estados e Municípios, que tem direito de instituir seus tributos sem serem peiados por lei complementar, em casos, como a c.m., nos quais a dicção constitucional foi suficiente pata delinear a competência”. (2004, p.179)

Para concluir o que os autores acima citados expõem, pode-se utilizar o

pensamento de Marques que defende que há uma infinidade de entraves no que diz

respeito à efetiva aplicação pela Administração Pública. Em realidade, deve-se

tornar o procedimento mais simples, de modo a difundir o tributo, especialmente por

se tratar de instrumento que possui robusta carga de extrafiscalidade e forte apego

aos princípios da igualdade e da solidariedade social. (2005, p.126)

4. CONCLUSÃO

Contribuição de melhoria é um tipo de tributo, cuja incidência ocorre sobre o

incremento imobiliário auferido por quem não obrou para o resultado com o seu

capital ou trabalho, sendo a obra pública realizada pela Administração Pública a sua

motivação. Cujo valor, a ser recebido pelo ente federativo que realizar a obra

pública, e aos proprietários de imóveis que foram beneficiados por ela o pagamento,

tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de

valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.

É um tributo que busca evitar uma injusta repartição dos benefícios

decorrentes de obras públicas. Isto porque o fundamento da contribuição é impedir

que os proprietários privados aufiram uma valorização de seu imóvel às custas do

investimento público concretizado na obra.

O fundamento jurídico da contribuição de melhoria está no princípio da

igualdade, ao passo que a divisão das obras a serem realizadas pela administração

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pública devem, ou pelo menos deveriam, apresentar a imparcialidade e a

impessoalidade do administrador ao escolher os imóveis que irão se beneficiar com

a obra pública, causadora da instituição da contribuição de melhoria, sem com o

objetivo de produzir vantagens para a coletividade e não apenas a alguns

particulares, sendo posta a disposição de todos de forma genérica e indiscriminada.

É justo, o tributo, já que não permite que poucos, em detrimento de muitos e

financiados por todos, aufiram ganhos, em forma de valorização imobiliária, sem

nenhum tipo de contraprestação.

Outra característica que torna justa são os limites total e individual para a

sua cobrança. Em outras palavras, não se pode demandar dos beneficiados mais

que o total pago pelo ente público instituidor da exação para a realização da obra,

bem como é vedado exigir-se, individualmente, mais do que a valorização imobiliára

experimentada pelo contribuinte. Pois o tributo não visa lucro por parte do Estado –

limite total – e também não enseja um ganho imobiliário sem contraprestação por

parte dos contribuintes – limite parcial.

Ela, como visto no terceiro capítulo desta monografia, tem uma hipótese de

incidência mista: é preciso ocorrer a valorização imobiliária de imóveis particulares

em razão de uma obra pública. Não basta, pois, apenas a obra pública para que

haja a tributação, é necessário que dela resulte um acréscimo no valor do imóvel, de

forma a estabelecer um nexo de causalidade entre a atuação estatal e o aumento de

valor dos imóveis afetados pela obra.

Para se apurar a base de cálculo da contribuição de melhoria é preciso levar

em conta os elementos do seu fato gerador, no caso a valorização imobiliária

associada a obra pública, devendo a alíquota criada por lei complementar incidir

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sobre o valor que traduza a valorização imobiliária, expressão a ser alcançada

através da comparação do valor do bem antes e depois da execução da obra.

Mas nem toda obra pública gera a valorização imobiliária, dela també, pode

resultar a “pioria” imobiliária. O Poder Público responsável pela execução da obra

que gere a desvalorização imobiliária estará obrigado a indenizar o proprietário do

imóvel que sofrer as consequências, independente de culpa, já que a

responsabilidade do Estado é objetiva, exigindo apenas o nexo de causalidade entre

entre o resultado danoso e a ação estatal.

É importante frisar que não é qualquer obra pública que é capaz de gerar a

plus valia ao imóvel, além daquelas arroladas na regra do art. 2º, do Decreto-Lei nº

195/67, já que a enumeração é apenas exemplificativa, mas também aquelas que se

destinam à satisfação de interesses primários da sociedade, na medida em que se

materializem através de obras de construção, reforma ou ampliação de bens de uso

comum do povo.

A obra tem que ter natureza permanente, e os bens sujeitos à incidência da

contribuição de melhoria não precisam ser contíguos à obra, bastando estar dentro

da sua área de influência para serem passíveis de onerações. Obviamente, em

nome do princípio da proporcionalidade e da capacidade contributiva, o pagamento

do gravame deve ser calculado tendo como referência o efeito da valorização que

individualmente foi gerado a cada imóvel, recaindo- se sobre os contribuintes de

acordo com as respectivas valorizações experimentadas.

Há duas correntes doutrinárias sobre o fato gerador e fato imponível desse

tributo. Em uma, é exigida a valorização imobiliária ou melhoria, onde o limite para

cobrança - é o valor da obra pública considerado como teto mais o valor agregados

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dos imóveis da área afetada. Já seu cálculo é baseado na diferença do valor venal

do imóvel antes e após a realização da obra pública. Um exemplo típico de

contribuição de melhoria, é quando o município cobra pelo asfalto de uma rua dos

munícipes residentes no local. A outra, basta o benefício decorrente da obra pública.

Porem ambas devem ser amparadas em lei, conforme art. 82 do Código Tributário

Nacional.

Em homenagem ao princípio da indisponibilidade da coisa pública e da

supremacia do interesse público, cabe ao gestor da coisa pública, diante da

ocorrência do fato gerador da contribuição de melhoria, executar a sua competência

impositiva, visto que não é uma faculdade, mas um poder-dever de resguardar os

interesses da coletividade.

A cobrança da contribuição de melhoria não é suscetível de recair sobre

bens públicos, mas só sobre a propriedade privada, consoante dispõe o art. 2º, do

Decreto-Lei nº 195/67, eis que a ausência de capacidade contributiva do ente

público é impeditiva de oneração de seu patrimônio.

O tributo é de competência comum, podendo ser instituído e cobrado por

qualquer entidade da federação, contando que presentes os seus pressupostos.

Pode ser cobrado concomitantemente por mais de uma pessoa administrativa

concretizada, desde que resultante de mais de uma obra realizada e com natural

valorização relacionada direta e individualmente a cada uma delas.

Confrontando as decisões judiciais analisadas, pode-se dizer que os

Municípios ao servirem-se da contribuição de melhoria como forma pura e simples

de divisão dos custos da obra pública, equivocam-se. Ao passo que ao utilizarem-se

do custo da obra, da metragem do imóvel e de sua testada como base de cálculo,

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esquecem dos requisitos básicos para sua instituição, qual sejam a valorização

imobiliária decorrente de obra pública, respeitando os limites individuais e total do

imóvel.

Na realidade, o que parece realmente impedir a efetiva utilização dessa

exação é o seu desconhecimento, de suas caracteríticas, objetivos e de suas

vantagens, tanto pelo Poder Público como pelos contribuintes.

Os Municípios brasileiros devem prestar mais atenção à possibilidade da

ampla utilização desse tributo e editar leis que regulamentem a matéria conforme os

dispositivos legais (CTN e Decreto-Lei nº 195/67), de modo a propiciar um maior

desenvolvimento urbanístico de forma justa e isonômica no que diz respeito à

distribuição dos ônus e bônus.

A insistência no erro pode gerar duas consequências, ambas negativas: ou

a Administração Pública sempre sairá perdendo no Judiciário, prejudicando toda a

coletividade, ou, deixará de realizar obras públicas, já que os resursos são escassos,

dificultando o desenvolvimento urbano, que a médio e longo prazo fariam enorme

diferença.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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