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Ana Cristina Teixeira CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA NA BUSCA DO SER ÉTICO Monografia apresentada como exigência parcial para obtenção do título de especialista em Psicopedagogia pela PUC - SP Pós graduação "Lato Sensu" Orientadora: Profa. Dra. Neide de Aquino Noffs. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo 2004

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Ana Cristina Teixeira

CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA

NA BUSCA DO SER ÉTICO

Monografia apresentada como exigência parcial para obtenção do título de especialista em Psicopedagogia pela PUC - SP

Pós graduação "Lato Sensu"

Orientadora: Profa. Dra. Neide de Aquino Noffs.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

2004

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CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA

NA BUSCA DO SER ÉTICO

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Agradecimentos

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Dedicatória

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Cada um que passa em nossa vida, passa sozinho,

Pois cada pessoa é única e nenhuma substitui a outra.

Cada um que passa em nossa vida, passa sozinho,

Mas não vai só, nem nos deixa sós; leva um pouco de

Nós mesmos, deixa um pouco de si mesmo.

Há os que levam muito, mas há os que não levam nada;

Há os que deixam muito, mas há os que não deixam nada.

Esta é a maior responsabilidade de nossa vida e prova

Evidente de que duas almas não se encontram por acaso.

Antoine de Saint-Exupéry

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Índice

Introdução ........................................................................................................... 8

Capítulo I - O Campo da Ética ....................................................................... 13

1- A Origem da Ética na Filosofia........................................................... 13

2- Ética, Moral e Valores ........................................................................ 17

Capítulo II - A Personalidade Moral segundo Piaget........................................... 22

Capítulo III - Diferenciando a Ética Teórica da Ética Aplicada.......................... 26

Capítulo IV - A Escola e o seu Papel na Formação Moral do Educando ............ 30

1- A Violência na Escola e a Crise de Valores Morais ........................... 35

Capítulo V - Formação Docente .......................................................................... 43

1- O Papel do Educador na Escola .......................................................... 44

2- As Dimensões da Competência do Educador ..................................... 47

3- A Relação entre as Formações Pessoal e Profissional do Educador .. 48

4- Contribuições da Psicopedagogia Institucional .................................. 51

Conclusão ............................................................................................................ 56

Bibliografia .......................................................................................................... 61

 

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Receita de Ano Novo

Para você ganhar um belíssimo Ano Novo cor do arco-íris, ou da

Cor da sua paz,

Ano Novo sem comparação com todo tempo já vivido (mal vivido

Talvez ou sem sentido)

Para você ganhar um Ano não apenas pintado de Novo, remendado

Às carreiras,

Mas Novo nas sementinhas do vir-a-ser;

Novo até no coração das coisas menos percebidas

(A começar pelo seu interior) Novo,

Espontâneo, que de tão perfeito nem se nota, mas com ele se come,

Se passeia, se ama, se compreende, se trabalha,

Você não precisa beber champanhe ou qualquer outra birita,

Não precisa expedir nem receber mensagens

(Planta recebe mensagens? Passa telegramas?)

Não precisa fazer lista de boas intenções para arquivá-las na gaveta

Não precisa chorar arrependido pelas besteiras consumi das

Nem parvamente acreditar que por decreto de esperança a partir

De janeiro

As coisas mudem e seja tudo Claridade,

Recompensa, Justiça entre os homens e as nações,

Liberdade com cheiro e gosto de pão matinal, Direitos respeitados,

Começando pelo Direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo que mereça este nome,

Você, meu caro,

Tem de merecê-lo, tem de fazê-lo novo,

Eu sei que não é fácil, mas tente, experimente, consciente.

É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre.

Carlos Drummond de Andrade

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Introdução

Vivemos momentos tumultuados na história da civilização humana. A ordem

dos tempos contemporâneos é ser "fast", ou seja, rápido. Ordem esta que infecta

nossos lares por todos os lados: pela televisão, rádio, computador, mídia impressa...

Estamos sempre correndo contra o tempo, apesar de sabermos que ele é implacável. E

com pressa total, vamos vivendo em um mundo que insiste em ser globalizado.

A globalização, pensada não só na área econômica, mas em termos

socioculturais também, passa por nós como um rolo compressor. E quem está fora dos

padrões é excluído dessa "dança".

Mergulhados neste mundo caótico, onde é exigido ter especificações,

especializações, e por estarmos inseridos em um contexto altamente tecnológico, não

nos sobra mesmo muito tempo para refletir sobre o nosso papel enquanto cidadãos.

Ainda assim, sabemos muito bem que, conforme a nova lei nacional para a

educação, a ação para a cidadania é o grande objetivo a ser alcançado.

Parece-nos completamente pertinente citar a definição de cidadania encontrada

nos Parâmetros Curriculares Nacionais (1998, p.20):

A cidadania deve ser compreendida como o produto de histórias vividas pelos

grupos sociais e constituída por diferentes tipos de direitos, obrigações de

organizações e de instituições. O debate sobre a questão da cidadania é hoje

diretamente relacionado com a discussão sobre o significado e o conteúdo da

democracia, sobre as perspectivas e possibilidades de construção de uma sociedade democrática.

É preciso ficar claro que pensar na construção de uma sociedade democrática é

acreditar em um mundo melhor e, assim, alcançar um modo de vida feliz. Para obter

êxito nessa empreitada, o ser humano precisa extrapolar suas conquistas individuais a

fim de seguir em direção ao bem comum, sair do plano individual e olhar para o

coletivo.

A sociedade brasileira é formada por diferentes etnias que contribuem para que

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o país seja marcado por uma grande variedade cultural e social. Para viver

democraticamente em uma sociedade pluralista, como a nossa, é necessário respeitar a

diversidade em busca do bem comum.

Dentre todas as instituições, identificamos na escola, um papel importante ao

propiciar um espaço para o diálogo e para o aprender a conhecer, o aprender a fazer, o

aprender a ser e o aprender a conviver, além de trabalhar questões socioculturais que

estão diretamente vinculadas a nossa realidade, valorizando, assim, a riqueza de nossa

diversidade.

A própria sociedade global, ao nos impelir a transformações e ajustes, nos faz

refletir sobre os novos papéis que vão se desenhando para todos. E a escola ganhou

uma nova dimensão social, já que a família e o Estado explicitaram para ela uma

maior responsabilidade na educação dos jovens.

É importante que a escola ajude os educandos a construírem seus

conhecimentos, sem perder de vista as relações humanas embasadas em uma postura

ética. A escola esbarra, então, na preocupação com a formação moral da criança e do

adolescente, o que passa a ser cada vez mais uma questão preponderante na educação.

Dessa forma o papel do educador precisa ser revisto e a dimensão do seu

trabalho deve ser aclarada. O educador agora trabalha com seus alunos no intuito de ir

além do desenvolvimento teórico de conhecimentos morais, mas repensando em como

contribuir de fato para que esses jovens se tomem cidadãos mais colaboradores,

responsáveis e conscientes de suas atitudes e mais dignos de seu lugar no mundo.

Para que isso seja possível, o professor deve estar preparado e saber que não

está sozinho, mas deve confiar no clima de diálogo e entrosamento entre os docentes e

direção. Será que o clima de (auto-)confiança e harmonia poderá ser sentido por todos

(alunos e professores) e assim favorecer a verdadeira construção de valores morais?

Como a escola poderá oportunizar momentos que priorizem o trabalho sobre Ética

como tema transversal no Ensino médio?

A escola está inserida em um contexto social maior, funcionando como um

reflexo do que acontece na sociedade. E como já foi dito anteriormente, estamos diante

de uma era de muitos conflitos fazendo com que o homem busque novas alternativas,

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questione seus valores.

Com o intuito de sintonizar com as mudanças pelas quais o mundo globalizado

está passando, o governo começou a repensar projetos educacionais que visassem ao

desenvolvimento da cidadania e à conquista da autonomia de todo e qualquer aluno.

Desta forma, o presidente na época sancionou a Lei 9394, em 1996, a conhecida Lei

de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).

É bem verdade que, a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos

em 1948, muitos países começaram a rever seus projetos educacionais. Desde então,

temas como educação e cidadania ganharam espaço e relevância no terreno

sócio-político brasileiro. Esses temas foram amplamente reconhecidos e valorizados

pela nossa Constituição Federal em 1988, sendo um importante passo para a

conquista da cidadania.

A LDB, inspirada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, gerou uma

nova estrutura de ensino, lançando parâmetros para guiar o conteúdo de cada

disciplina escolar de forma a integrá-la à discussão dos temas transversais.

A reformulação do ensino médio no Brasil, estabelecida pela Lei de Diretrizes

e Bases, foi de fato implantada apenas em 1998 pelas Diretrizes do Conselho

Nacional de Educação e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais visando a atender a

uma crescente necessidade de atualização da educação brasileira.

Percebemos com esse breve resumo histórico o quão moroso é o processo de

mudanças no âmbito educacional no Brasil. Tampouco podemos negar a grande

distância que há entre a lei e a sua prática. Conhecemos a realidade brasileira, e na

verdade, os princípios e fundamentos da nossa Constituição ainda se encontram muito

mais em um patamar idealizado.

Há uma pergunta que pode incitar a muitas discussões: até que ponto o

educador e a escola conseguiram entender e lidar de fato com os Parâmetros

Curriculares impostos pela Lei? Neste momento, podemos fazer uma ressalva e pensar

em quanto nós, os educadores, fomos acolhidos e preparados por esta Lei para

colocarmos em prática tudo aquilo que é pregado por ela. Nem podemos nos esquecer

de que ela vigora desde 1996, ou seja, há quase oito anos.

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Vamos falar um pouco sobre os PCNs- Parâmetros Curriculares Nacionais -

e a sua proposta. Foram elaborados em 1998 pela Secretaria do Ensino Fundamental.

Existem os PCNs que abrangem as três áreas de conhecimentos: a área de linguagens,

códigos e suas tecnologias, a área de ciências da natureza, matemática e suas

tecnologias e a área de ciências humanas e suas tecnologias. E há, também, o PCN dos

temas transversais, cujo objetivo principal é justamente orientar para uma educação

comprometida com a cidadania. São textos usados para a reflexão dos alunos

enfocando os seguintes assuntos: ética, meio ambiente, pluralidade cultural, orientação

sexual e saúde.

O nosso interesse recai sobre o tema transversal Ética e de como ele pode ser

articulado entre as diversas áreas de conhecimento, ou seja, em história, filosofia...

Como esse tema pode ser abordado na transversalidade possibilitando que se

estabeleça uma relação entre aprender, na realidade e da realidade, conhecimentos

teoricamente sistematizados.

Encontramos um importante gancho para o presente trabalho na apresentação

dos PCNs (1998, p.93): "Questões éticas encontram-se a todo momento em todas as

disciplinas. Vale dizer que questões relativas a valores humanos permeiam todos os

conteúdos curriculares".

Em primeiro lugar, nesta pesquisa, trataremos do campo da Ética. Exporemos

sua definição e origem, abordaremos sua relação com os termos Moral e Valores

desde sua origem.

Nesta pesquisa temos como objetivo verificar se as noções de Ética podem ser

construídas ao longo da escolaridade e, em especial no ensino médio, de uma maneira

transversal. Como ensiná-la em meio a uma crise moral, que se iniciou na segunda

metade do século XX, e como saber se a escola está realmente preparada, em todos os

aspectos, para assumir a responsabilidade ou corresponsabilidade da formação moral

de seus alunos.

Outro aspecto que esta investigação pretende abordar é o da relação entre

moral e personalidade, fundamentada por Josep Maria Puig. O autor fala em

construção da personalidade moral, sendo que esta só acontece na ação. E para tanto, o

educador precisa rever como desempenhar o seu papel de forma a fazer com que o

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jovem reflita e aja.

Puig também fala sobre a importância de se restabelecerem os valores morais,

pois vivenciamos um tempo em que o certo e o errado se confundem, tomando a

tarefa de definir os valores ainda mais complexa.

Ao refletir sobre esse tema trazido por Puig, fica claro como é importante

levantar discussões que visem à valorização dos princípios éticos e morais, tendo

sempre em vista o crescimento pessoal aliado ao bem comum. E também acreditar

que somente as relações humanas propiciam o nosso enriquecimento interior.

Finalizaremos o trabalho refletindo sobre o papel do educador frente à

educação moral. Discutiremos sobre a sua formação e de como a psicopedagogia pode

ser útil para que o educador consiga resgatar a dimensão, não apenas técnica, mas

política e ética do seu trabalho. Trataremos, enfim, da importância da atuação do

psicopedagogo na instituição escolar.

Gostaríamos de citar um pensamento de Frei Betto do livro A Mulher

Samaritana, que retrata a importância de se abordar o tema Ética em uma educação

moral:

Quando não se atenta para a dignidade das pessoas, as relações pessoais se

transformam em relações de troca, como no comércio. São esquecidos os

valores éticos, a vida interior das pessoas e, portanto as relações de Dom.

Passa-se a ter medo do amor e de amar.

Como ser um educador sem amor? Sem amor pelo que faz? Sem amor pelas

pessoas que estão a sua volta, pelos seus alunos?

Será que a escola pode resgatar valores? Ou será que devemos construir novos

valores para um novo tempo que clama outras necessidades?

Tudo tem seu tempo... o tempo de plantar e o de colher. Nós, enquanto

educadores e cidadãos, também plantamos para colher...

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Capítulo I - O Campo da Ética

Neste primeiro capítulo temos como objetivo falar da Ética e de sua relação

com as Ciências Sociais. Contaremos um pouco de sua história, desde sua origem na

Filosofia da Antiguidade até ser estudada nos dias de hoje como uma Ciência.

Em seguida, relacionaremos Ética, Moral e Valores trazendo o significado de

cada termo e como estão conectados.

1- A Origem da Ética na Filosofia

Enfrentamos diariamente todo tipo de dilemas. Precisamos tomar decisões que

nem sempre são aquelas que satisfazem nosso prazer. E, então, abrimos mão do

interesse pessoal em vista de uma amplitude maior: o interesse comum.

O ser humano vive em sociedade, nasce dentro dela, mas isto não significa que

nasça preparado para seguir condutas e comportamentos pré-estabelecidos pela

sociedade.

Esses conflitos são, também, alvos de estudo da filosofia, pois esta área

conforme a autora Terezinha Rios (2002, p.17):

Caracteriza-se então como uma reflexão que busca compreender o sentido da

realidade, do homem em sua relação com a natureza e com os outros, do

trabalho do homem e seus produtos: a cultura e a história.

Verificamos que é inegável o fato de que a ética possui vínculos com a filosofia.

Veremos a seguir pensamentos de alguns filósofos que muito contribuíram para

a discussão sobre o tema ética.

O filósofo alemão Immanuel Kant do século XVIII afirma não existir bondade

natural. Para ele somos todos egoístas, destrutivos, ambiciosos, cruéis, agressivos, e

matamos, mentimos e roubamos em nome dos prazeres. O dever aparece como

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estritamente essencial para que sejamos morais.

Segundo Kant, é preciso entender que o dever não pode ser reduzido a uma

lista

de virtudes. Ele é uma forma que deve valer para toda a ação moral.

Kant complementa seu raciocínio explicando que o dever e a liberdade da

consciência moral devem caminhar juntos. Para tanto, o dever precisa estar dentro de

nós, em nosso íntimo, e não vir de uma imposição externa.

Retomando os dois primeiros parágrafos para amarrá-los à ideia de que os

valores morais são um processo em construção, não podendo ficar no patamar de uma

imposição de modelos externos, é preciso investir e acreditar na educação para a ética.

Conforme a afirmação de Gabriel Chalita (2001, p.119):

A educação para a ética prepara o ser humano para o equilíbrio de aceitar que não devem prevalecer as vontades individuais e que o bom senso determinará o ponto consensual. Isso é a ética - um código, uma opção comum, um interesse de todos para que o que é de todos seja preservado, que o bem seja buscado e cada um entenda que acima de seus caprichos há uma humanidade.

O que nos parece importante aqui é a reflexão sobre a urgência de respeitar os

espaços alheios, de buscar uma consciência e responsabilidade sobre o peso dos

nossos atos. E cabe à educação para a ética e cidadania levantar essas discussões. Nos

próximos capítulos iremos explicitar melhor essa questão e aprofundá-la mais.

O filósofo grego Sócrates, já em seu tempo, ocupava-se em questionar valores

como coragem, justiça, piedade, amizade, entre outros. O filósofo não se preocupava

apenas em saber o que a sociedade pensava sobre esses valores, mas se as pessoas

tinham consciência de suas atitudes, se seu caráter era verdadeiramente bom.

Para a autora Marilena Chauí (2000) foram as questões socráticas que deram

origem à ética. É a consciência do agente moral o ponto de partida para definir onde

os valores e obrigações morais podem ser estabelecidos. A autora (2000, p.337) diz:

Para que haja conduta ética é preciso que exista o agente consciente, isto é,

aquele que conhece a diferença entre o bem e o mal, certo e errado, permitido

e proibido, virtude e vício. A consciência moral não só conhece tais

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diferenças, mas também reconhece-se como capaz de julgar o valor dos atos

e das condutas e de agir em conformidade com os valores morais, sendo por

isso responsável por suas ações e seus sentimentos e pelas consequências do

que faz e sente. Consciência e responsabilidade são condições indispensáveis

da vida ética.

Outro filósofo que muito enriqueceu o campo da ética foi Aristóteles, que

nasceu na Macedônia e se tomou um grande discípulo de Platão. Para ele, a ética é

tida como uma "arte de viver" e é o caminho que se trilha em busca da felicidade.

Aristóteles sistematizou todo o conhecimento daquela época sobre os campos

do pensamento e da prática, classificando-os em três categorias, a saber: as ciências

produtivas, as ciências práticas e as ciências teoréticas, contemplativas ou teóricas.

Iremos nos ater ao campo das ciências práticas, pois a ética encaixa-se nele. Segundo a definição de Chauí (2000, p.41) sobre a classificação aristotélica, ao

campo das ciências práticas pertencem:

As ciências que estudam as práticas humanas enquanto ações que têm nelas

mesmas seu próprio fim, isto é, a finalidade da ação se realiza nela mesma, é o

próprio ato realizado. São elas: ética, em que a ação é realizada pela vontade

guiada pela razão para alcançar o bem do indivíduo, sendo este bem as virtudes morais (coragem, generosidade, fidelidade, lealdade, clemência,

prudência, amizade, justiça, modéstia, honradez, temperança, etc.); e política,

em que a ação é realizada pela vontade guiada pela razão para ter como fim o

bem da comunidade ou o bem comum.

A autora ressalta a importância de Aristóteles para o estudo da ética, pois ele

aponta a vontade guiada pela razão, um dos eixos da conduta ética, como grande

contribuição à consciência moral deixada por Sócrates.

Outro aspecto a ser comentado é a inseparabilidade entre ética e política, como

pudemos observar na explicação anterior sobre a classificação das ciências práticas

feita por Aristóteles. Chauí confirma essa tendência dos filósofos da Antiguidade,

explicando que não há como desvincular a conduta do indivíduo e os valores da

sociedade, ou seja, há uma estreita relação entre ética e política.

Ao fazer esta pequena retrospectiva sobre o campo da ética, fica evidente que a

relação entre essas duas áreas é de suma importância para o presente trabalho. E

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aproveitamos o momento para citar um pensamento de Terezinha Rios (2002, p.19)

que, ao refletir sobre a ética, retrata-a como "...espaço da reflexão filosófica que se

define como a reflexão crítica, sistemática, sobre a presença dos valores na ação

humana".

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2- Ética, Moral e Valores

Não poderíamos nos alongar mais neste capítulo sem conceituar as três

palavras- chave em nosso trabalho: Ética, Moral e Valores. Iremos, então,

conceituá-las a partir de alguns autores e traçar as relações existentes entre elas.

De início acreditamos ser oportuno trazer a origem das palavras ética e moral.

De acordo com o autor Adolfo Vázquez (2003, p.24) "Certamente, moral vem do

latim mos ou mores, "costume" ou "costumes", no sentido de conjunto de normas ou

regras adquiridas por hábito". E sobre a outra palavra, o autor diz: "Ética vem do

grego ethos, que significa analogamente "modo de ser" ou "caráter" enquanto forma

de vida também adquirida ou conquistada pelo homem".

Vázquez confere o vínculo que há entre ética e moral argumentando que a

primeira serve de fundamentação para a segunda, ou seja, articulam-se como ciência

específica e seu objeto respectivamente.

No entanto, essa relação não aparece contida nas origens etimológicas das duas

palavras. O autor (2003, p.24) ainda comenta que " ... originariamente, ethos e mos,

"caráter" e "costume", assentam-se num modo de comportamento que não corresponde

a uma disposição natural, mas que é adquirido ou conquistado por hábito".

O autor Josep Puig (1998), que discute a questão da educação moral como um

processo de construção, preconiza que a moral deve ser construída a partir de uma

grande reelaboração das formas de vida e dos valores considerados coerentes frente a

cada situação. Este autor (1998, p.70) define: "A moral é, portanto, um produto

cultural cuja criação depende de cada sujeito e do conjunto de todos eles".

Puig também enfatiza que a educação moral não pode ser encarada

simplesmente como socialização, pois não pode ser imposta unilateralmente. E

reconhece como necessários os processos de participação e de cooperação. São eles

que permitem a formação de um sentimento ativo e crítico de cada membro da

sociedade.

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Ao refletirmos sobre termos usados por Puig, tais como: construção,

produto cultural, socialização e formação de sentimentos, percebemos a sincronia

com o discurso de Vázquez (2003, p.24) sobre"... esse caráter não natural da maneira

do homem que, na Antiguidade, lhe confere sua dimensão moral". Já que Puig, ao

empregar esses termos, exprime algo a ser conquistado pelo homem através de

construção e aprendizagem.

Ao explicar o termo ética, Vázquez deixa claro que esta não cria a moral, mas

tenta determinar a sua essência, origem e todas as condições que envolvem a conduta

e os juízos morais. Conforme a definição do autor (2003, p.23) "A ética é a teoria ou

ciência do comportamento moral dos homens em sociedade, ou seja, é ciência de uma

forma específica de comportamento humano".

Vázquez (2003, p.23) enfatiza o caráter científico da ética e argumenta

"Enquanto conhecimento científico, a ética deve aspirar à racionalidade e objetividade

mais completas e, ao mesmo tempo, deve proporcionar conhecimentos sistemáticos,

metódicos e, no limite do possível, comprováveis".

Ele conclui afirmando não competir à ética a postulação ou o estabelecimento

de normas, e que o seu objeto de estudo são as normas e os atos morais que se

conformam com elas.

Ao abordar o campo da ética, Vázquez também tece considerações importantes

sobre a relação desta com a filosofia. Explica que a ética não pode ser mais aceita

desvinculada da ciência e da própria realidade humana moral, portanto não há como

conceber a ética como puramente filosófica.

É claro que as questões éticas sempre fizeram parte do pensamento filosófico, e

nem podemos deixar de lado os filósofos da Antiguidade e suas ideias, pois foram eles

que contribuíram para o embasamento da ética, conforme já vimos e comentamos na

primeira parte deste capítulo.

Hoje é inegável o envolvimento da ética com outras ciências, tais como: a

psicologia, a antropologia social, a sociologia, a economia política, a teoria do direito e

outras. E a que se deve sua ligação com tais ciências? A resposta é de Vázquez (2003)

que analisa a estreita relação da ética com as ciências sociais e aponta para o

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comportamento moral como uma forma específica do comportamento do homem,

cuja manifestação se dá em vários planos: psicológico, social, prático - utilitário,

jurídico, religioso ou estético.

O autor (2003, p.84) também apresenta uma definição completa para o termo moral:

A moral é um sistema de normas, princípios e valores, segundo o qual são

regulamentadas as relações mútuas entre os indivíduos ou entre estes e a comunidade, de tal maneira que estas sejam normas, dotadas de um caráter

histórico e social, sejam acatadas livre e conscientemente, por uma convicção

íntima, e não de maneira mecânica, externa ou impessoal.

Vázquez sistematiza uma série de traços essenciais da moral. Vale destacar que

a moral é um fato social, sendo que o indivíduo desempenha o papel central, pois cabe

a ele reconhecer e interiorizar as normas e deveres estabelecidos.

É interessante perceber o progresso moral que se verifica através dos tempos. Ainda lançando mão da obra de Vázquez, para dar consistência a nossa pesquisa, o

autor constata que o progresso moral está vinculado ao progresso histórico-social.

O sentido do termo progresso, aqui, é o avanço observado nas atividades

humanas básicas e nas formas de relação ou organização que o ser humano adquire em

suas atividades práticas e individuais.

Cada povo, cada sociedade tem o seu próprio progresso histórico-social. E esse

progresso vem marcado de consequências positivas ou negativas da visão moral. E não

cabe a nós o julgamento de tais consequências, nem tampouco comparar o avanço

moral entre as diversas sociedades, pois ele é relativo e só tem sentido dentro da

história de um povo, única e exclusivamente.

Sobre o ato moral, Vázquez (2003, p.77) diz que ele implica "...a consciência de

um fim e a decisão de realizá-lo". O autor complementa explicando que "A decisão de

realizar um fim pressupõe a sua escolha entre outros".

O ato moral compreende vários elementos interligados: motivo, intenção ou

fim, decisão pessoal, emprego de meios adequados, resultados e consequências, Ele só

pode ser avaliado dentro do código moral no qual está inserido, apenas assim poderá

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ser compreendido, fazendo parte de um contexto.

Como já vimos, ética e moral, embora estejam intimamente ligadas, não são a

mesma coisa para muitos autores. Para Terezinha Rios (2002) os conceitos de ambas

as palavras se confundem ou se identificam no dia a dia. A autora, porém, faz uma

distinção semelhante à proposta por Adolfo Vázquez. Rios (2002, p.23) fala que, "a

ética se apresenta como uma reflexão crítica sobre a moralidade, sobre a dimensão

moral do comportamento do homem".

Mais à frente a autora (2002, p.24) continua "A moral, numa determinada

sociedade, indica o comportamento que deve ser considerado bom ou mau. A ética

procura o fundamento do valor que norteia o comportamento, partindo da

historicidade presente nos valores".

O autor Yves de La Taille (2002) procura outro caminho para explicar a tênue

linha que separa ética de moral aproveitando para entender o porquê da palavra ética

ser encontrada em qualquer contexto atualmente. La Taille analisa que o termo ética

acaba sendo usado para minimizar o impacto da palavra moral, como se fosse possível

que, ao empregar o vocábulo ética, todos os conflitos e problemas a respeito de

valores não o acompanhassem.

O autor complementa sua explicação comparando os termos "educação moral"

e "formação ética". O primeiro parece ocupar uma posição mais conservadora

enquanto que o segundo relaciona-se a uma "imunidade pedagógica" contra o

autoritarismo ou laxismo. La Taille define, dentro desse contexto, o autoritarismo

como o falar de moral e o laxismo como o não falar de ensino de valores.

O termo ética vem assumindo ares de contemporaneidade. Serve de

justificativa para qualquer assunto; ser ético ou não, está na moda. Por isso precisamos

deixar claro que neste trabalho estamos abordando a ética como formação para a

construção de valores morais, peça fundamental para o pleno exercício da cidadania.

Ainda nos falta falar sobre valores. Vamos, então, recorrer à obra de Vázquez

para mais uma vez fundamentar nosso trabalho. Primeiramente o autor relaciona o

termo valor à necessidade de escolha implícita em todo ato moral e define que o objeto

valioso depende da relação com o sujeito, pois é ele quem lhe confere um determinado

valor.

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Vázquez (2003, p.141) conclui que o valor "... não é propriedade dos objetos

em si, mas propriedade adquirida graças à sua relação com o homem como ser social.

Mas, por sua vez, os objetos podem ter valor somente quando dotados realmente de

certas propriedades”.

Ao se referir a valores morais, Vázquez (2003, p.149) explica que:

Os valores existem unicamente em atos ou produtos humanos. Tão-somente o

que tem um significado humano pode ser avaliado moralmente, mas, por sua

vez, tão-somente os atos ou produtos que os homens podem reconhecer como

seus, isto é, os realizados consciente e livremente, e pelos quais se lhes pode

atribuir uma responsabilidade moral. Neste sentido, podemos qualificar

moralmente o comportamento dos indivíduos ou de grupos sociais, as intenções

de seus atos e seus resultados e consequências, as atividades de instituições

sociais, etc.

Já o autor Ubiratan D'Ambrosio (2000, p.18) pondera que, somente quando

subordinado a parâmetros é que o comportamento de cada indivíduo é aceito pelos

seus próximos, esses parâmetros são denominados de valores, "... que determinam os

acertos e equívocos na produção e utilização das intermediações criadas pelo homem

para sua sobrevivência e transcendência".

D'Ambrosio comenta que, em nome de nossos meios de sobrevivência e de

transcendência, muitos valores acabam mudando. É certo que alguns se perpetuam e

são eles os responsáveis pela ética maior. Estamos falando do respeito pelo outro, da

solidariedade com o outro e da cooperação com o outro.

O autor sinaliza que a humanidade caminha em direção contrária à ética maior,

que a busca da sobrevivência associada à transcendência ficou relegada a um segundo

plano. E a defesa do sistema de valores (fundamentalismo) passou a ser prioridade.

Neste ponto, D' Ambrosio refere-se às verdades absolutas propostas por

modelos criados pela filosofia, religião e ciência, como um grande perigo à autonomia

do indivíduo, à reflexão crítica, enfim, à democracia.

O desafio a ser enfrentado atualmente é entender o que é Educação Moral na

perspectiva da sobrevivência. Neste sentido é que nos propomos a colaborar dando o

autor Puig como referência desta conversa.  

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Capítulo II - A Personalidade Moral segundo Puig

"O único progresso verdadeiro é o progresso moral. O resto é

simplesmente ter mais ou menos bens".

José Saramago

Em sua obra "A construção da personalidade moral", o autor Josep Puig

inova por relacionar moral e personalidade e inferir que a dimensão moral precisa ser

incorporada à personalidade.

o que nos faz crer na relevância desta obra é a concepção da educação moral

como uma construção da personalidade, sendo essa visão pensada dentro de uma

perspectiva psicopedagógica, legitimando-a para o embasamento do presente trabalho

e especialmente deste capítulo.

Puig (1998, p.20) destaca que "A educação moral é uma tarefa destinada a dar

forma moral à própria identidade, mediante um trabalho de reflexão e ação a partir das

circunstâncias que cada sujeito vai encontrando no dia-a-dia".

O autor traz a ideia da educação moral como um processo de construção de si

mesmo, mas reforça que essa construção não se dá sozinha; a comunidade impulsiona

e orienta o sujeito nesse processo.

Conforme Puig, o grande foco da educação moral é a sua "contribuição para a

reconstrução das formas de vida social". Ou seja, precisamos pensar o processo da

educação moral como uma ferramenta em prol da comunidade.

Outro aspecto digno de comentário sobre a obra de Puig é a visão de uma

educação integral. Todas as dimensões da formação humana precisam ser

contempladas e, inclusive, a dimensão moral deveria ser encarada como uma parte

essencial da educação integral.

Esse ponto da teoria de Puig já é interessante o suficiente para fazermos uma

ponte com a psicopedagogia, à medida que ambas reforçam a importância de

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considerar o indivíduo em sua integralidade, respeitando todas as dimensões

humanas.

Voltando ao raciocínio do autor, o ser humano se depara com a necessidade de

decidir sua vida, resolver conflitos, tomar posições. É, então, que esbarramos na

moralidade. A educação moral tem como tarefa ensinar ao sujeito a conviver em uma

comunidade, a lidar com o jogo do individual e, ao mesmo tempo, do coletivo.

A educação moral vista por Puig aparece atrelada à idéia de autonomia moral,

em que é preciso haver espaço para a liberdade pessoal. Ela não pode se limitar ao

processo da socialização, um dos paradigmas morais, ou corre-se o perigo de

incorrê-la aos processos sociais de adaptação.

A clarificação de valores, também citada por Puig ao dissertar sobre educação

moral, significa estimular o sujeito a compreender seus verdadeiros valores a fim de se

comprometer com eles, esse é um outro paradigma moral. O cuidado aqui é com o

caminho a que esse paradigma pode conduzir: o valor da tolerância e do respeito às

opções diferentes precisa ser visto com cautela, pois esse valor levado ao extremo

pode tender à indiferença, algo muito preocupante.

Por outro lado, o processo de clarificação de valores auxilia o sujeito a

esclarecer por si mesmo o que tem ou não tem valor para ele. Portanto, pode ser um

importante caminho para o autoconhecimento.

Puig também discorre sobre a educação moral cognitiva e evolutiva baseada no

desenvolvimento do juízo moral, tecendo comentários sobre a contribuição de Piaget

para esse tópico. A proposta da educação moral, segundo essa visão, é a construção de

"personalidades autônomas aptas para a cooperação".

Um dos termos-chave para entender o trabalho de Puig é a autonomia da

consciência moral, por ser condição constitutiva da personalidade moral.

Examinaremos a seguir esse termo, primeiramente a palavra consciência, definida

como o "saber sobre o saber". Através da consciência passamos a ser responsáveis

pelo nosso comportamento, e nesse caminho, nos tornamos morais. De acordo com o

autor (1998, p.79): Atinge-se a moralidade quando podemos refletir sobre o comportamento

interpessoal, sobre a convivência social, sobre o tipo de vida que se leva, sobre os

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valores que pretendem conduzir o comportamento ou sobre as vivências

conflitivas. Adquire-se a capacidade de atribuir valor, pensar e decidir por si

mesmo sobre os próprios valores, pensamentos e decisões. A consciência se faz

juízo do sujeito que a possui.

Sobre autonomia entende-se que um sujeito possui essa capacidade quando

consegue agir de acordo com sua vontade, segundo um precesso de reflexão embasado

em motivos e razões.

A consciência moral autônoma apenas acontecerá verdadeiramente se o próprio

sujeito se comprometer na sua construção e se houver a cooperação de todos. Para a

viabilização desse processo é imprescindível ter a linguagem como ferramenta, pois é

através da intermediação do diálogo que existem as trocas de idéias entre as pessoas.

Puig explica que são três os procedimentos que permitem a consciência moral

autônoma operar: o juízo moral, a compreensão e a auto-regulação. O primeiro está

relacionado à formação de opiniões racionais sobre o que deve ser e diz respeito a

juízos sobre o correto e o errado. O segundo, em oposição ao primeiro, preocupa-se

em reconhecer a particularidade das situações concretas e as respostas que vão mais

além da razão, como a consciência, a conciliação, a benevolência e o amor. Já o

terceiro procedimento está ligado ao esforço de cada um para guiar sua própria

conduta.

Tanto o juízo moral quanto a compreensão possuem um caráter mais reflexivo

e cognitivo. Enquanto que a auto-regulação vai ao encontro das dimensões condutuais.

Em suma, o juízo moral visa ao acordo, a compreensão procura o entendimento e a

auto- regulação almeja a autodeterminação. Os três procedimentos de deliberação e de

ação moral são considerados elementos funcionais da consciência, e por estarem

integrados, não funcionam isoladamente.

Não podemos encarar os elementos procedi mentais como os únicos

responsáveis pela formação da identidade moral. O autor refere-se, também, à

importância da história de vida de cada sujeito e o valor que ele próprio lhe outorga

para a construção de sua identidade, a que Puig denomina de elementos substantivos.

É importante destacar que para se construir uma identidade moral se faz preciso

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uma imagem da relação de si próprio com o meio. E este processo é composto de

representações valorativas positivas ou negativas.

O autor também observa a contribuição dos meios de experiência moral para

a construção da personalidade moral. Puig (1998, p.151) comenta:

A construção da personalidade moral se produz sempre no interior ou em relação a um certo número de meios de experiência; isto é, se produz em função

de um contexto de desenvolvimento que apresenta dificuldades valorativas, que

aporta uma determinada cultura moral e, fmalmente, que serve de espaço no qual

transcorre o processo de formação moral do sujeito.

Com isso, Puig quer frisar a importância do contexto para a construção da

personalidade moral, referindo-se aos meios como "elementos ativos com

características sociais, culturais e históricas diferenciais".

Para finalizar este capítulo, gostaríamos de reforçar a importância de olhar para

a personalidade moral como um processo em construção, que engloba a formação da

consciência moral autônoma e integra-se com o desenvolvimento dos elementos

procedimentais e dos substantivos, constituindo, assim, a identidade moral de cada

indivíduo.

A partir deste recorte podemos refletir sobre de que forma a escola participa do

processo da formação moral de seus alunos, e assim, passaremos a examinar as

questões ligadas ao ensino da ética na instituição escola.

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1.

Capítulo III - Diferenciando a Ética Teórica da Ética Aplicada

Gostaríamos de iniciar este tópico mencionando um pensamento que servirá

como base para a nossa reflexão sobre a distinção entre a ética teórica e a aplicada

(prática). Ubiratan D'Ambrosio (2000, p.I9) diz que "O maior equívoco da filosofia

ocidental tem sido considerar o homem como um corpo mais uma mente, e separar o

que sentimos do que somos. O conhecimento tem focalizado corpo e mente, muitas

vezes privilegiando um sobre o outro".

Para o autor é preciso reconhecer que o ser humano é sensorial, intuitivo,

emocional e racional ao mesmo tempo, e que todas as suas competências precisam ser

desenvolvidas e estimuladas. Como a escola propicia espaço e vez para que todas as

instâncias do educando sejam respeitadas e valorizadas?

A escola está passando por transformações, tentando se adaptar às demandas de

uma nova realidade, não só sociais como políticas também, e, portanto, não cabe mais

a ela aquela velha roupagem tradicional, que por ser segmentada, segmentava os

alunos.

De acordo com Rafael Yus (2002), a escola "nova" em oposição à tradicional,

deve visar à educação integral. Esse precisa ser o seu eixo principal. O que se espera da escola é que ela possa olhar para o aluno como um ser

global com diversas potencialidades e oferecer a ele uma forma de interagir mais

respeitosa.

Conforme o discurso de Yus sobre a educação para a paz, podemos pensar nela

dentro da formação ética. O autor (2002, p.I5) fala que:

Na escola, deve ter um autêntico caráter transversal, não se restringindo a uma

efeméride, nem tampouco ao desenvolvimento colateral de alguma disciplina, mas sim impregnando o "clima escolar". Não apenas entrando no âmbito cognitivo do estudante, mas também no âmbito emocional e espiritual.

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Podemos depreender desse comentário a importância que se deve dar aos

diversos âmbitos do indivíduo, percebendo o aluno como um ser humano que tem

muitas capacidades, além da cognitiva.

Aproveitando o gancho da fala de Yus, podemos entrar no tema sobre a

distinção entre a ética teórica e a aplicada tecendo a seguinte relação: enquanto a

escola se detiver frente à preocupação única de desenvolver o âmbito cognitivo de

seus alunos, estará indiretamente promovendo a ética apenas em termos teóricos.

Estamos falando da escola rotulada de "tradicional", voltada somente ao saber

disciplinar, ao acúmulo de conhecimento.

A ética aplicada só poderá ser eficaz se estiver na prática do dia a dia escolar,

dentro e fora da sala de aula. E a sua garantia está na forma com que os educadores e

administradores escolares irão conduzir esse tema: é necessário pensar no diálogo

como método pedagógico e na construção da democracia como finalidade. Assim,

construindo as noções de ética, professores e alunos estarão lidando com suas outras

dimensões, a emocional e a espiritual.

Paulo Freire (1996, p.I53) ao tratar do tópico Ensinar exige disponibilidade

para o diálogo comenta "A razão ética da abertura, seu fundamento político, sua

referência pedagógica; a boniteza que há nela como viabilidade do diálogo".

As palavras do mestre sinalizam para o caminho a seguir pelos educadores

rumo à educação integral: o diálogo. Freire (1996, p.67) diz que "É neste sentido

também que a dialogicidade verdadeira, em que os sujeitos dialógicos aprendem e

crescem na diferença, sobretudo, no respeito a ela, é a forma de estar sendo

coerentemente exigida por seres que, inacabados, assumindo-se como tais, se tomam

radicalmente éticos".

o caminho do diálogo faz com que o professor, principalmente o professor do

ensino médio, se exponha mais e se depare com a sua ignorância, mas, segundo Freire,

quando há segurança pessoal não existem motivos para se envergonhar. Esta é, sem

dúvida, uma postura ética que por si própria, já é um exemplo a ser seguido pelos

alunos.

Há muitas questões sobre como trabalhar a formação ética dos educandos na

escola. Sobretudo, será que a ética pode ser ensinada?

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Os nossos governantes, através da LDB, nos impuseram a ética como um tema

transversal a ser trabalhado com os nossos alunos, assim como se impõem conteúdos

disciplinares. Isso, no entanto, não significa que o exercício da cidadania esteja

garantido.

Há muito que se rever, a começar pelos novos papéis aluno/professor como

promovem muitos educadores. Refletindo sobre estas transformações, encontramos na

definição sobre educando/educador de Puig grande sintonia com este novo pensar, de

acordo com o autor (1998, p.226):

"O educando tem um papel privilegiado: é o investigador que conduz

ativamente as pesquisas. Já o educador fica relegado a um plano secundário; na

melhor das hipóteses, pode inspirar a busca com alguma indicação acertada, que,

em todo caso, deverá ser operacionalizada sempre pelo investigador-educando;

ou se limitará a colaborar em tarefas logísticas acessórias e talvez, em momentos

de esperança, possa dar ânimo ao investigador-educando".

O autor Miguel Zabalza (2000) reavalia o papel da escola e preocupa-se em

questionar sobre o seu comprometimento para com os valores morais. Para ele a escola

Dão pode negligenciar a sua responsabilidade na formação ética de seus alunos. E cita

que de acordo com o relatório da UNESCO sobre a educação para o século XXI, esta

precisa apoiar-se em quatro pilares básicos: aprender a conhecer, aprender a fazer,

aprender a viver e aprender a ser. Os quatro pilares integrados têm como preocupação

o desenvolvimento de todas as nossas capacidades, desde a inteligência até a

sensibilidade.

Zabalza traça três níveis de ação da escola para trabalhar com a educação em

valores. São eles: por meio dos próprios compromissos institucionais; por meio do

currículo e por meio de nosso próprio exemplo como professores.

Ao pensarmos em como trabalhar a ética de uma maneira concreta, percebemos

que esses três níveis de ação são fundamentais e encontram-se inter-relacionados. Para

alcançar esses níveis de ação, é necessário refletir sobre o novo papel de todos os que

fazem parte do ambiente educativo, ressaltando o que já fora mencionado

anteriormente.

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A escola e o corpo docente só conseguem articular a ética como tema

transversal, quando há o mesmo espírito imbuído em todos, quando é possível o

trabalho em equipe, quando alunos, professores e administradores escolares

engajam-se nos mesmos projetos e causas.

Seguindo esses passos, encontramos a rede de escolas Salesianas, que

anualmente cria projetos envolvendo toda a comunidade escolar para o fortalecimento

e propagação da Campanha da Fraternidade. Essas campanhas buscam temas de

grande importância para toda a sociedade e visam a contribuir para a conscientização

em torno da problemática dos temas, trazendo informações sobre o assunto, abrindo

um espaço para a reflexão sobre ele e discutindo atitudes e práticas que tragam

contribuições e até soluções para o bem comum. Uma verdadeira aula de cidadania e

formação ética e moral.

A Campanha da Fraternidade deste ano de 2004, chama-se "Água, fonte de

vida". O tema será explorado durante o ano todo, não apenas com pesquisas científicas

sobre a água, mas também com discussões sobre a sua importância e preservação. Para

isso, será necessário o trabalho em conjunto, uma equipe multidisciplinar envolvida na

exploração de vários aspectos sobre o mesmo tema, tais como: científicos, históricos,

geográficos, filosóficos, etc.

Somente podemos conceber a ética como algo a ser ensinado e aprendido na

escola, quando vivenciada e interiorizada por cada indivíduo, passando a fazer parte da

comunidade escolar. Portanto, para construirmos a ética, precisamos trabalhar com os

nossos educandos a partir de tarefas concretas.

É fundamental neste momento que possamos discutir sobre o papel que a escola

desempenha na formação moral de seus alunos para que não se perca de vista a

construção da ética em uma dimensão real e concreta.

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Capítulo IV - A Escola e o seu Papel na Formação Moral do Educando

"A educação é aquilo que transforma o potencial das pessoas em realidade,

que atualiza o potencial que existe em cada um".

Autor desconhecido

Parece-nos oportuno iniciar este capítulo levantando duas questões que servirão

como guia deste capítulo: A escola pode limitar-se à preocupação com o

desenvolvimento das capacidades linguísticas, matemáticas e pré-profissionalizantes

de seus alunos?

Quanto à segunda questão: Partindo do ponto de que o ambiente familiar é uma

das bases da conduta moral dos jovens, qual seria a postura da escola em relação à

educação moral?

Para Brian RiU (2002, p.122) " ... a escola tem que aceitar que é apenas um dos

muitos parceiros no projeto da educação sobre valores." O autor explica que a escola

atua dentro de limites nesse campo, e que, em seu trabalho só haverá ressonância

quando promover crenças, atitudes e valores que estejam em sintonia com os da

família.

Hill propõe algumas diretrizes para a educação moral: Desenvolvimento de

um discurso, Negociação dos valores centrais, Reabilitação do bem comum,

Celebração da diversidade e a Educação de pessoas melhores.

A primeira diretriz fala em se desenvolver um discurso que possibilite ao

jovem olhar para os valores como algo em si. Quanto à Negociação dos valores

centrais, ela prioriza a prática, sugerindo que os alunos preparem uma lista dos seus

direitos, visando a promover um diálogo com toda a comunidade educativa e familiar.

A diretriz Reabilitação do bem comum vai além das duas primeiras. Aqui a

ênfase recai sobre até que ponto os direitos de cada indivíduo vão ao encontro do bem

comum. E a Celebração da diversidade pontua a importância de reconhecer o valor

individual, incentivando a criatividade cultural e demonstrando respeito à diversidade,

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vendo nela uma oportunidade de crescimento.

A última diretriz fecha o ciclo como se fosse o grande objetivo em si; ser uma

pessoa melhor implica um novo olhar de si mesma e do outro. Para tanto, é necessário

que o jovem aprenda a refletir, e que seus pensamentos e atos sejam pautados em

valores pessoais e comunitários mais solidários.

O processo de preparar o jovem para ser mais reflexivo deve ser contínuo e ter

suas raízes na Educação Infantil. Perceber como a criança vai se modificando com o

tempo e a partir de suas experiências vividas, e dar espaço para que isto aconteça, é de

suma importância para entender sua construção pessoal.

O grande estudioso Jean Piaget foi quem mudou os rumos do campo da

educação, apresentar sua teoria sobre a construção da inteligência. Diferentemente da

educação tradicional que vê a criança como um pequeno adulto, raciocinando e

pensando como ele, Piaget afirma que o pensamento da criança não pode ser

comparado ao do adulto.

Ao prefaciar o livro de Piaget (1994) "O juízo moral na criança", Yves de La

Taille atesta a forma científica com que Piaget estudou a moralidade da criança

partindo de dados empíricos. La Taille observa as relações entre prática e teoria que

Piaget traça, enfocando que a ação vem antes da abstração.

Maria Luiza Costa (2001), em sua análise sobre a teoria de Piaget, descreve os

processos de construção da inteligência, que Piaget utilizou para compreender a

origem do conhecimento humano. No entanto, Costa vai mais além e preocupa-se em

mostrar que outros desenvolvimentos ocorrem em paralelo ao cognitivo. Conforme a

autora (2001, p.l5) "À medida que a criança apresenta novas condições de ações

provenientes de seu desenvolvimento intelectual, o desenvolvimento afetivo e social

também apresenta novas possibilidades".

Costa reforça que Piaget traz de novo não somente uma construção da

inteligência, mas a construção simultânea do indivíduo enquanto sujeito social e

afetivo.

Nossa preocupação é a de frisar a importância de olhar o sujeito de uma forma

integral, relacionando todos os seus desenvolvimentos; do cognitivo ao social. É a

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construção global de uma pessoa que faz com que a nossa pesquisa tenha validade.

Para tanto, precisamos repensar o papel da escola e explicitar sua função na educação.

... o objetivo principal da educação é compor a razão intelectual e moral; como

não se pode moldá-la de fora, a questão é encontrar o meio e os métodos

convenientes para ajudar a criança a constituí-la ela mesma, isto é, alcançar no

plano intelectual a coerência e a objetividade e no plano moral a reciprocidade.

(Piaget, 1972, p.161)

Podemos perceber, através dessa citação, como Piaget atrela a importância do

plano intelectual ao moral. Portanto, cabe à escola discutir de que forma pode

contribuir para o desenvolvimento global da educação de seus educandos, ou seja,

trabalhar não apenas o aspecto intelectual, mas também o moral, já que ambos

encontram-se intimamente ligados.

Piaget vê na instituição escolar uma possibilidade de socialização da criança,

condição básica para que a formação moral seja constituída. É a socialização que cria

um ambiente propício para que as negociações de valores morais aconteçam.

Em sua teoria, Piaget compartilha tanto da maturação estrutural quanto das

inegáveis influências da experiência do meio social e físico para o desenvolvimento

intelectual e moral da criança.

Refletindo sobre a vida social da criança na "escola tradicional", o autor (1972)

pondera que a relação professor-aluno não deve ser a única estimulada, e que o diálogo

entre as crianças precisa ser encorajado. Já na "escola ativa", nome de acordo com a

nomenclatura de Piaget que se refere a uma escola favorecedora de situações em que a

criança possa fazer experiências morais, à vontade entre seus pares, as crianças tendem

a se soltar mais e são espontâneas, podendo surgir o espírito de colaboração.

Sobre os processos de socialização Piaget (1972, p.180) comenta:

A escola tradicional reduzia toda a socialização, intelectual ou moral, a um

mecanismo de pressão. A escola ativa, em quase todas as suas realizações,

distingue, ao contrário, cuidadosamente, dois processos de resultados bem

diferentes e que só se tornam complementares com muito cuidado e tato: a pressão

do adulto e a cooperação das crianças entre si.

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No estudo sobre o desenvolvimento moral da criança, Piaget constata que ela,

criança, nutre inicialmente respeito por seus pais, em uma mistura de amor e medo.

Por isso mesmo obedece às regras que lhe são impostas por eles. Trata-se do que o

autor denominou de moral heterônoma; seguir um caminho imposto pelo outro, ou por

premiação ou por punição.

Para chegar à moral autônoma, ou seja, pensar e decidir seu próprio caminho, há

uma longa construção em que a escola pode ajudar seus alunos. Cada degrau desse

percurso representa uma grande evolução, e é nesse contexto que a socialização entre

os educandos é fundamental, pois passam a lidar concretamente com seus direitos e

deveres, formando, aos poucos, seus valores morais.

O estudo do desenvolvimento de uma moral autônoma, conforme o que vimos no

capítulo anterior, é um dos temas de interesse de Puig, pois ele a considera como

condição básica para o exercício da cidadania numa sociedade democrática. Para Puig,

a autonomia moral pressupõe uma ativa participação da razão na elaboração e

legitimação das regras. É uma moral do diálogo, do acordo, e resultado de uma

interação cooperativa com os outros membros da sociedade.

O autor constata que a educação moral só será desenvolvida se o indivíduo puder

colocá-la em prática, sendo que, de início, seu uso será imperfeito, mas que, com o

galgar dos degraus, irá se aprimorando. Desta forma, Puig está endossando a

importância da evolução de estágios no desenvolvimento do juízo moral de uma

criança, proposta por Piaget. A escola representaria, então, um espaço fundamental

para que seus alunos constituam e possam aprimorar sua formação moral.

Outro ponto bastante interessante a que Puig alude é a questão da "clarificação de

valores", conforme já mencionamos em outro capítulo. Ela tem como objetivo fazer

com que os alunos descubram seus próprios valores, mas pode ser considerada um

paradigma moral por limitar a tarefa de educar a um processo de esclarecimento

pessoal, correndo-se o risco de ficar sempre num plano subjetivo.

A tarefa de buscar meios para ajudar o adolescente a se descobrir e entender quais

são realmente os seus valores, também deve ser desempenhada pela escola. E apesar

do autor reconhecer a dificuldade na atualidade em se estabelecerem os verdadeiros

valores dentro de uma sociedade democrática, não há como a escola rejeitar essa

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tarefa.

Puig (2000, p.42) comenta sobre a confusão de valores "Isso tem relegado a

educação de valores morais, éticos e estéticos ao abandono e ao desaparecimento nos

programas de estudo. Não há nada a ensinar sobre valores porque tudo está igualmente

correto".

Há alternativas em que a escola precisa investir: a interdisciplinaridade pode ser

uma delas. Através de várias disciplinas, como língua portuguesa, filosofia, psicologia

e história, temas, como Ética, podem ser trabalhados.

Não existem fronteiras entre as disciplinas no que tange à preocupação com a

formação ética e moral dos nossos alunos, pois a especificidade de cada matéria

escolar serve de gancho para a outra. Por exemplo: os aspectos históricos, filosóficos e

científicos de um tema qualquer podem ser complementares e servirem de pano de

fundo para que as noções de ética sejam construídas no espaço escolar. Diálogos

constantes entre os professores de todas as disciplinas passam a ser essenciais para que

todos adotem a mesma linguagem e entrem em sintonia.

O verdadeiro trabalho multidisciplinar é aquele que acontece primeiramente

dentro da sala dos professores, com muitas trocas de ideias e objetivos em comum,

assim o projeto terá chances de vingar dentro de cada sala de aula e poderá atingir sua

meta.

Puig fala da importância de se desenvolver a tolerância e o respeito à

individualidade em nossos alunos. São valores imprescindíveis para a formação ética e

que vão ao encontro das diretrizes traçadas por Brian Hill e comentadas no início deste

capítulo.

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2. 1- A Violência na Escola e a Crise de Valores Morais

Há uma citação que nos faz refletir sobre a interpretação desse "planeta

confuso", conforme Philippe Perrenoud (2000, p.141):

Parece cada vez menos razoável negar a dimensão educativa do trabalho do corpo

docente, mas seria tão absurdo quanto injusto esperar dos professores virtudes

educativas infinitamente maiores do que as da sociedade que lhes confere a

incumbência de ensinar. Ainda que eles fossem exemplares, não poderiam

mascarar o estado do mundo. “Nosso planeta é confuso!", todos os alunos vêem

isso todos os dias nas ruas e nos meios de comunicação.

Não podemos deixar de mencionar a crise que está por trás disso, e que abrange

crise de valores morais e a sua estreita relação com a violência. Palavras e

expressões, tais como, verdade, justiça, respeito ao outro, liberdade, direito,

igualdade e tantas mais, parecem não ter sentido algum. Nesta sociedade de

contrastes, onde (quase) tudo é permitido, válido e reforçado pela mídia, os valores

morais acabam por se confundirem.

Para Elizabeth Campbell (2002), a educação precisa fortalecer esses valores. A

autora vê na família a base para a formação moral; no entanto, a escola pode muito

bem reforçá-la e ampliá-la. Ela complementa afirmando que o espírito de

cooperação precisa ser instigado em nossos alunos, e que a luta individual e a

competição, isoladamente, não conquistarão uma sociedade melhor.

É bem verdade que há muitas dúvidas sobre as propostas existentes que trabalham

a educação para a cidadania. Qual seria o melhor caminho para se alcançar esse

objetivo de forma real e sairmos do patamar da idealização?

Neste momento em que questionamos a educação para a cidadania, é importante

repensar sobre ações concretas que tenham sentido na vida dos jovens e que

possam contribuir para o desenvolvimento de sua formação ética.

O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foi criado pelo Ministério da

Educação, em 1998, e tem como referência primordial a articulação entre o

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conceito de educação básica e o de cidadania. É um exame voluntário para os

alunos que já concluíram o ensino médio.

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A matriz desse exame foi confeccionada a fim de representar a associação entre

conteúdos, competências e habilidades. As competências são ações e operações às

quais recorremos para estabelecer relações com e entre pessoas, objetos, situações

que queremos conhecer. Já, as habilidades são especificações das competências

estruturais em contextos específicos e são aperfeiçoadas e articuladas por meio das

ações e operações, possibilitando, assim, uma nova reorganização das

competências.

O Enem é estruturado com base em cinco competências (anexo A) que

correspondem aos requisitos mínimos para que a interação social seja pautada pela

autonomia do cidadão em uma democracia. Essas cinco competências funcionam de

forma integrada expressando-se em 21 habilidades (anexo B). Entende-se que o

processo de construção das competências e habilidades ocorre desde o nascimento

na interação com o meio físico e social. Em resumo, esse exame busca verificar

como o conhecimento construído pode ser efetivado pelo aluno através da

demonstração de sua autonomia de julgamento e de ação, de atitudes, valores e

procedimentos frente às situações-problema que se aproximem das condições reais

de convívio social e de trabalho individual e coletivo.

O que nos faz refletir sobre esse exame mais precisamente é a sua prova de

redação, pois, de acordo com Maria Bernadete Abaurre (2002), essa prova além de

explicitar o importante papel da escola brasileira na formação dos jovens, pode criar

condições para promover o desenvolvimento do discurso sobre cidadania.

Com a produção de texto pretende-se que o jovem viva o papel de autor, que

consiga transpor certos limites para a resolução de uma situação-problema. Esses

limites vão além da própria língua escrita, pois o aluno precisa reorganizar os

conhecimentos já construídos com o propósito de escrever um texto

dissertativo-argumentativo sobre o tema oferecido.

A avaliação da redação é pautada nas cinco competências que estruturam toda a

prova, mas adequadas especificamente à produção de texto.

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Competências da redação

I Demonstrar domínio da norma culta da língua escrita.

II Compreender a proposta de redação e aplicar conceitos das várias áreas de

conhecimento para desenvolver o tema, dentro dos limites estruturais do texto

dissertativo-argumentativo.

III Selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações, fatos, opiniões e

argumentos em defesa de um ponto de vista.

IV Demonstrar conhecimento dos mecanismos linguísticos necessários para a

construção da argumentação.

V Elaborar proposta de intervenção para o problema abordado demonstrando

respeito aos direitos humanos.

Gostaríamos de citar a redação do Enem de 2003, que teve como título "A

violência na sociedade brasileira: como mudar as regras do jogo?" Fica evidente que já

não há mais como evitar essa realidade. E escrever sobre a violência é uma forma de

lidar com ela. É um meio inteligente de convidar o jovem a pensar e discutir sobre o

assunto, fazendo com que ele se envolva com essa problemática, procurando soluções

para ajudar a mudar "as regras do jogo".

Para Perrenoud (2000), a educação para a cidadania corre o risco de virar apenas

uma boa intenção, se não houver um investimento na criação de situações que se

apresentem para tomadas de consciência, para a construção de valores, de uma

identidade moral e cívica.

O autor vê na prevenção da violência dentro e fora da escola um fator

preponderante para o seu combate. É preciso esclarecer que a violência é

compreendida em toda a sua extensão; não é só agressão física, é agressão à liberdade

de expressão também.

A escola precisa rediscutir seu sistema que, por muitas vezes, acaba por reprimir

os alunos, sendo esta uma outra forma de violência legitimada por um sistema escolar

que não atende à demanda da atualidade; as necessidades do século XXI são outras.

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De acordo com Perrenoud (2000, p.146), "A escola sabe que agora está condenada a

negociar, a não usar mais a violência institucional sem se preocupar com as reações".

Ao abordarmos a negociação como um instrumento a favor da democracia, é

necessário salientar que negociar também exige aprendizagem. E antes de mais nada,

o corpo docente de uma escola deve saber muito bem como usar esse instrumento.

As regras, quando impostas de cima, podem ser interpretadas como opressão,

gerando violência. Portanto, a escola deve ter em mente que a negociação das regras

reafirma a posição democrática que ela precisa assumir.

Não podemos deixar de mencionar a violência contra a diversidade sociocultural,

muitas vezes incitada por alguns membros do corpo docente da escola, através de

atitudes ou falas preconceituosas e discriminadoras.

Muitas vezes é o professor que não tolera o aluno que tem opinião própria,

diferente da dele. Há, também, aquele professor que não consegue impor limites e

acaba por aceitar tudo de seus alunos.

Ambos os casos são perigosos. A intolerância de um educador pode ser tão

maléfica quanto a inabilidade do outro em colocar limites. São perfis diferentes que

empobrecem o desenvolvimento da formação ética dos alunos, pois os mestres são

exemplos de conduta a seguir.

Uma das maneiras de coibir a violência na escola é oferecer aos alunos um

espaço neutro, aberto ao diálogo, em que todos - alunos e educadores - possuem

direitos e deveres. Isso inclui dois valores fundamentais: o respeito e a tolerância.

Enquanto não forem trabalhados esses valores, as atitudes serão as mesmas:

continuaremos a ouvir deboches, risos maldosos e brincadeiras de mau gosto nas

escolas.

Outro ponto a questionar é a falta de dignidade e a existência de "dois pesos e duas

medidas" na nossa sociedade, dentro dos lares, dentro das escolas, em todas as esferas

e camadas sociais. Os governantes, por exemplo, perderam a sua credibilidade, pois

muitas vezes ouvimos um discurso muito diferente da prática. Assistimos ao

predomínio de interesses individuais sobre o coletivo.

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A questão que Perrenoud (2000) lança é saber até que ponto os valores que a

escola transmite é aquilo de que os jovens precisam, em outras palavras, trata-se de

uma reflexão sobre a incoerência no sistema educacional. Como defender princípios

em uma sociedade que cultua o individualismo?

Voltando ao tema sobre violência, Catherine Blaya (2003), psicóloga e docente

do "Instituto Universitário de Formação na França, comenta que o tipo de violência

mais frequente na escola é o da agressão verbal, e seu efeito cumulativo leva ao

estresse e à insegurança.

Tudo o que não podemos admitir é a colaboração da escola para a formação de

jovens inseguros com rebaixamento de sua auto-estima. Bem sabemos as dificuldades

inerentes à fase da adolescência, uma época especial para qualquer ser humano que

traz consigo mil e uma modificações para o jovem, tanto físicas quanto psicológicas.

Para ampliarmos um pouco mais o nosso conhecimento sobre a adolescência,

mencionaremos dois importantes teóricos das teorias da Personalidade e do

desenvolvimento Social, Sigmund Freud e Erik Erikson.

Segundo as explicações de Campos (2002) sobre Freud e Erikson, o primeiro

classifica a adolescência como uma fase intitulada de Genital, que compreende o

período dos 12 aos 18 anos. É quando acontece um novo despertar da energia sexual.

De acordo com essa teoria, nesse período os objetos sexuais do jovem são as pessoas

do sexo oposto, podendo o professor ocupar este lugar.

Já Erikson nomeia essa fase de Identidade vs. Confusão de Papéis e vai além de

Freud, dizendo que o jovem examina não só sua identidade sexual, mas também, a sua

identidade ocupacional.

É preciso que o educador esteja atento a esse processo de auto-conhecimento de

seus jovens alunos para que possa auxiliá-los. E encarar esse momento de grandes

mudanças como absolutamente normal, tendo sempre em mente que ele próprio

também foi um adolescente.

E é justamente na fase da adolescência que a violência parece aumentar. Perrenoud (2000) faz a relação entre a violência e o ensino médio. No momento em

que o jovem se vê em meio a tantos corredores e professores, parece não haver mais

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ninguém para conduzi-lo. Agora é que ele mais precisa de apoio para conversar

sobre suas inquietações, exatamente quando os índices de violência são mais

alarmantes.

Durante a fase da adolescência, o aluno precisa do apoio de seus professores. Infelizmente muitos destes não acreditam que devam desempenhar um papel mais

amplo e que a formação ética e moral de seus jovens alunos não lhes diz respeito. Na

verdade, esses professores pensam que ao se ocuparem plenamente da especificidade

da sua disciplina, estarão cumprindo com o seu dever, desempenhando, assim, sua

função única de transmissor de conhecimentos.

Cabe a cada professor incentivar seu aluno, deixá-lo expor suas idéias. De acordo

com Françoise Dolto (1996), o professor é a pessoa mais indicada para compreender

as mudanças ocasionadas por essa fase. É uma idade muito delicada, pois, em geral, o

jovem oscila tanto de humor quanto de opinião.

Dolto frisa que o adolescente não demonstra de imediato o que se faz de positivo

por ele e muitas vezes ridiculariza os adultos. No entanto, a autora (1996, p.22)

comenta que "É preciso aguentar a desconsideração, tendo esta percepção: sim, estou

sendo desconsiderado porque sou adulto, mas o que lhes digo ajuda-os e anima-os".

O fato de o educador não revi dar, no mesmo nível, certos comentários de seus

alunos, também é uma preocupação em tentar não incitar a violência. Não podemos ir

pela contra-mão do que tentamos pregar: uma sociedade mais tolerante resgatando os

valores éticos e morais por vezes "esquecidos" pelos próprios educadores.

Os valores éticos que queremos que a escola transmita aos jovens precisam estar

claros para todos, precisam ser amplamente discutidos. É necessário que saibamos em

que terreno estamos pisando e para onde queremos ir. Esta reflexão deve nos guiar

para a luz, já que no momento a sociedade encontra-se a mercê de uma grande onda

consumista, em que assistimos passivamente a valorização do ter sobre o ser. Um

indivíduo é reconhecido por suas conquistas materiais, só isso é o que parece ter valor

atualmente.

É fundamental que o educador seja visto como um ser humano que enfrenta

dilemas em seu cotidiano, como qualquer outra pessoa. O docente precisa estar sempre

se reciclando e se manter aberto a novas possibilidades, sem, no entanto, se afastar da

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sua essência.

A seguir falaremos sobre a formação docente em toda a sua extensão, relacionando

a sua formação pessoal e profissional, agregando a ela a preciosa contribuição da

Psicopedagogia Institucional.

 

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Capítulo V - Formação Docente

O autor Lino de Macedo (1994) faz um estudo sobre a formação de professores

dentro da proposta construtivista de Piaget e destaca quatro pontos como sendo

essenciais. Em primeiro lugar está a consciência que o professor precisa ter em

relação a sua prática pedagógica. Depois vem a visão crítica que o educador deve

adotar frente às atividades e procedimentos em sala de aula e aos valores culturais de

sua profissão. Em seguida, a atenção volta-se para a nova postura do professor; que

deve ser de um pesquisador e não mais um transmissor. E finalmente está a busca de

um melhor conhecimento dos conteúdos escolares e das características do

desenvolvimento e aprendizagem dos alunos.

Iremos investigar a profissão professor, e para tanto, discutiremos questões

relacionadas ao seu papel na escola, às dimensões de sua competência. Abordaremos,

também, de que forma a sua formação pessoal relaciona-se com sua formação

profissional, e como podemos articular os quatro pontos destacados por Lino de

Macedo: consciência, visão crítica, nova postura e melhor conhecimento dentro da

formação docente. Por fim falaremos de como o profissional psicopedagogo pode

colaborar com o trabalho do professor.

Queremos, com este capítulo, pensar em um professor que, apesar de todas as

dificuldades, ainda sente orgulho de sua profissão e está comprometido com a

educação, permitindo que se enxergue nele, além de um professor, um educador que

faz a

diferença.

Macedo fala aos professores que (1994, p.61):

... estejam abertos para um futuro que lhes "pede" que saiam de sua casa,

dialoguem com o mundo, modifiquem formas de resolver problemas e que nisso

sejam tão radicais quanto possível. Por fim, que se tomem livres para todas as

possibilidades de promover esse encontro e caminhar em busca deste ponto que sempre caracterizou seu trabalho docente: o desenvolvimento de seus alunos.

Para Zabalza (2000, p.22) os professores de hoje em dia "... renunciaram a ser

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educadores e limitam-se a explicar suas matérias". É bem verdade que encontramos

este tipo de profissional também, mas não acreditamos que possa haver uma real

desvinculação do papel do professor e o do educador.

1- O Papel do Educador na Escola

O papel do educador dentro da escola vem sendo, mais do que nunca,

questionado. Isso acontece porque as transformações pelas quais a sociedade

contemporânea passa, afetam todas as esferas do nosso cotidiano.

O impacto das mudanças políticas, sociais e culturais é sentido e vivido, também,

na esfera da educação e do ensino. Portanto, é necessário reavaliar o papel do

educador nesta nova realidade, dentro de uma escola que tenta se adaptar às exigências

de Parâmetros Curriculares e que lida com alunos (crianças e jovens) que possuem

novas necessidades.

Para começar, é necessário resgatar o valor da profissão de professor. Fazer com

que ela volte a ocupar um lugar digno dentro da sociedade. Conforme José Carlos

Libâneo (2002, p.10):

Para isso, há muitas outras tarefas pela frente. É preciso resgatar a

profissionalidade do professor, reconfigurar as características de sua profissão na

busca da identidade profissional. É preciso fortalecer as lutas sindicais por salários

dignos e condições de trabalho. É preciso, junto com isso, ampliar o leque de ação

dos sindicatos envolvendo também a luta por uma formação de qualidade, de modo

que a profissão ganhe mais credibilidade e dignidade profissional.

Contudo, essa luta não atinge apenas os âmbitos políticos e sociais. O novo

professor precisa estar conectado não somente a uma formação inicial mais ampliada,

mas também, a uma formação continuada que permita ao profissional estar

constantemente se reciclando e trocando ideias sobre a sua prática.

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45  

3.

Precisamos acreditar e fazer crer que o papel do professor na escola é sim

fundamental. De acordo com Libâneo (2002, p.27):

Não só o professor tem o seu lugar, como sua presença toma-se

indispensável para a criação das condições cognitivas e afetivas que ajudarão

o aluno a atribuir significado às mensagens e informações recebidas das

mídias, das multimídias e formas variadas de intervenção educativa urbana. O autor também frisa que é o professor o responsável por "introduzir os

alunos nos significados da cultura e da ciência por meio de mediações

cognitivas e interacionais.

Um dos pontos destacados e tratados por Miguel Arroyo (2000) é o difícil

andamento do reconhecimento social da profissão professor. O autor defende a

teoria de que a vida pessoal e a profissional do professor se confundem afetando

profundamente a imagem social do educador.

Em se tratando especificamente dos docentes do ensino fundamental II e

médio, Arroyo comenta que a indefinição profissional e pessoal é ainda mais

forte, pois esse nível de ensino é reconhecido como intermediário e, no

imaginário social, acredita-se

O autor (2000, p.32) explica que "O reconhecimento social desses

profissionais acompanha o reconhecimento social do campo em que trabalham,

dos sujeitos com que trabalham, ou dos valores a que sua ação se vincula". No

caso do docente do ensino fundamental II e médio, que lida com o adolescente,

há o seu reconhecimento social atrelado ao da juventude.

Arroyo enfatiza que, apesar de a adolescência ter conquistado um espaço

maior na sociedade, infelizmente ainda não foi possível que o docente do "nível

intermediário" redefinisse seu caráter e conquistasse um estatuto socialmente

definido.

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Voltando ao papel do professor na escola, não basta apenas que ele seja

reavaliado; ele deve estar inserido em uma nova escola afiada com a realidade de

um mundo contemporâneo, cujo papel também deve ser rediscutido. Rios (2002,

p.45) fala que “O educador desenvolve sua prática no espaço da instituição que é

a escola".

A escola e o professor precisam caminhar juntos a fim de oferecerem uma

educação básica de qualidade que, de acordo com Libâneo (2002), sustenta-se em

quatro grandes objetivos: formação geral e preparação para o uso da tecnologia,

desenvolvimento de capacidades cognitivas e operativas, formação para o

exercício da cidadania crítica e formação ética.

Ao seguir esses quatro preceitos para uma educação de qualidade, o docente e

a escola irão, dessa forma, redes cobrir suas respectivas funções, para que todos juntos

viabilizem ao aluno refletir, sobre o seu papel também.

Gostaríamos de mencionar as novas atitudes docentes listadas por Libâneo

(2002, p.29 a p.45) que refletem um posicionamento frente às novas demandas da

sociedade:

1- Assumir o ensino como mediação: aprendizagem ativa do aluno com a

ajuda pedagógica do professor.

2- Modificar a idéia de uma escola e de uma prática pluridisciplinares para

uma escola e uma prática interdisciplinares.

3- Conhecer estratégias do ensinar a pensar, ensinar a aprender a aprender.

4- Persistir no empenho de auxiliar os alunos a buscarem uma perspectiva

crítica dos conteúdos, a se habituarem a aprender as realidades enfocadas nos

conteúdos escolares de forma crítico-reflexiva.

5- Assumir o trabalho de sala de aula como um processo comunicacional e

desenvolver capacidade comunicativa.

6- Reconhecer o impacto das novas tecnologias da comunicação e

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informação na sala de aula (televisão, vídeo, games, computador, internet,

CD-ROM etc),

7- Atender à diversidade cultural e respeitar as diferenças no contexto da

escola e da sala de aula.

8- Investir na atuação científica, técnica e cultural, com ingredientes do

processo de formação continuada. 9- Integrar no exercício da docência a dimensão afetiva.

10- Desenvolver comportamento ético e saber orientar os alunos em valores e

atitudes em relação à vida, ao ambiente, às relações humanas, a si próprios.

2- As Dimensões da Competência do Educador

De acordo com Rios (2002), competência quer dizer saber fazer bem. Para

que o professor consiga atingir essa excelência, precisa buscar respaldo em algumas

dimensões. São elas: a técnica, a estética, a política e a ética.

Da dimensão técnica podemos dizer que está ligada à capacidade de trabalhar

com os conteúdos, enquanto que a dimensão estética relaciona-se à sensibilidade

responsável pela criação. Já a dimensão política preocupa-se com as questões

pertinentes ao papel do sujeito na sociedade. E, por fim, a dimensão ética pautada na

relação do sujeito com o outro, em vista de interesses maiores, o bem comum.

A tecnicidade e o conhecimento profundo que um educador precisa possuir ao

lidar com os conteúdos a serem ensinados, a consciência política responsável pela

construção e manutenção da sociedade e a sensibilidade, mola propulsora da

criatividade, são fundamentadas pela dimensão ética do educador. É preciso que o

professor faça uma articulação entre todas as dimensões de sua competência para

saber fazer bem.

A visão de que as dimensões não podem ser dissociadas é reconhecida por

Rios, que vê a ética como mediadora de todas as dimensões. A autora (2002, p.65) fala

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que:

A ética é mediação, mas também síntese de técnica e política. Ela está

expressa na escolha técnica e política dos conteúdos, dos métodos, do sistema

de avaliação, etc., ou ela tem de desvendá-los. O educador enquanto

profissional é portador de valoração em sua prática.

Para a autora, o resgate da relação dessas dimensões faz com que o educador

possa refletir sobre a sua ação e busque uma outra significação para o seu trabalho.

Rios (2002) esclarece, também, a diferença entre o "saber fazer bem" e o

"saber fazer o bem". O primeiro diz respeito a uma dimensão técnica, ou seja, saber

fazer a docência. O segundo termo, conforme Arroyo (2000), relaciona-se a uma

imagem amorosa que acompanha o professor desde sempre, a imagem de - "o

professor bonzinho" - vinculada ao educador que nada tem a ver com o sentido de

competente.

De acordo com Arroyo (2000) essa imagem compromete a luta da profissão

professor em definir seu estatuto, ajudando a desvalorizar o profissional.

3- A Relação entre as Formações Pessoal e Profissional do Educador

Iniciaremos este tópico comentando sobre a autoridade do educador, pois

acreditamos que o verdadeiro significado da palavra autoridade só pode ser

descoberto ao procurarmos por ele na articulação da formação profissional e pessoal

do docente.

A autoridade não reside no "saber" que o docente possui. Sua legitimação está

em como o professor lida com esse "saber", algo ligado a sua subjetividade. Ao falar

sobre o tema autoridade, Paulo Freire (1996, p.102) reflete sobre uma autoridade

docente democrática, que transcende um discurso sobre autoridade por ela mesma:

"É a segurança que se expressa na firmeza com que atua, com que decide, com que

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respeita as liberdades, com que discute suas próprias posições, com que aceita

rever-se".

Freire coloca os momentos do ensino dos conteúdos e da formação ética como

inseparáveis. O autor (1996, p.106) fala que "O ensino dos conteúdos implica o

testemunho ético do professor".

Considerando essa reflexão pensamos no incontestável poder de "modelar"

seus alunos que um professor detém e, em verdade, isso acontece pelo próprio modelo

que o educador acaba sendo para os educandos.

Mais do que com palavras ou discursos, o educador transmite aos educandos

seus valores e crenças através de atitudes e ações.

Estamos nos adentrando em um campo muito delicado, porque abrange mais do

que a competência técnica ou científica do professor, pois queremos nos reportar à

pessoa que está por trás do educador.

Gostaríamos de associar a ideia dos parágrafos anteriores ao significado da

profissão professor que procuramos resgatar. Arroyo (2000, p.54) fala que "A

recuperação do sentido de nosso ofício de mestre não passará por desprezar a função

de ensinar, mas reinterpretá-la na tradição mais secular, no ofício de ensinar a ser

humanos".

Podemos entender que o ser humano só se humaniza a partir de relacionamentos

com outros humanos. Aqui podemos refletir sobre a relação entre o educador e o

educando, entre o ensinar e o aprender; pensando em seres humanos e seus diferentes

canais de expressão, distintas modalidades de aprendizagem. Abordaremos mais

profundamente essa questão quando tratarmos do espaço psicopedagógico na escola e

sua contribuição ao desvelar a relação ensino-aprendizagem.

Ao olharmos para o professor como profissional e ser humano, tocamos em uma

indissolúvel relação entre estas partes. Conforme Lucíola Santos (2002, p.55):

No campo da formação docente, busca-se conhecer como o professor é formado nas e pelas instituições escolares, seja na sua formação inicial, ou antes dela, seja pela sua prática profissional. Busca-se também compreender como sua história de vida e trajetória profissional se intercruzam, modelando seus

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comportamentos, suas perspectivas profissionais e sua visão e concepções sobre a educação, o processo de ensino e a organização do trabalho escolar.

Quanto à esfera da formação profissional do professor, gostaríamos de destacar

a importância de se investir não apenas em uma formação inicial, mas também na

continuada.

Libâneo (2002) expõe o baixo nível da formação inicial na atualidade,

culminando com profissionais despreparados para enfrentar as transformações da

contemporaneidade. O autor propõe uma reorganização das práticas de formação que

reflita sobre a integração das situações da prática junto à teoria, ao longo dos cursos.

Para Libâneo (2002, p.95), a prática profissional se tomaria "instância

permanente e sistemática na aprendizagem do futuro professor e como referência para

a organização curricular".

A ideia da articulação entre a formação inicial e a continuada é apresentada

pelo autor. A inicial estaria relacionada aos contextos de trabalho, fazendo com que as

disciplinas fossem revistas pela prática. E a continuada levaria os professores à

universidade para repensar mais profundamente essa prática.

César Coll (1999), um dos responsáveis pela reforma curricular na Espanha, ao

tratar da mudança curricular advinda da reforma educacional, reforça que a formação

dos professores - inicial e permanente - é fator de grande relevância para se conseguir

uma melhoria na qualidade da educação.

Outro ponto relacionado à formação docente que devemos destacar é a

importância da reflexão crítica sobre a sua prática. De acordo com Freire (1996, p. 42

e 43) "A prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento

dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer".

É justamente na formação permanente do professor que Freire destaca como

sendo o momento ideal para que haja uma reflexão crítica sobre a prática. O autor

(1996, p. 43 e 44) diz "É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se

pode melhorar a próxima prática".

Libâneo (2002) enfatiza a tendência em nos voltarmos para o professor

reflexivo como um meio de se repensar a formação inicial e continuada do docente.

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Selma Pimenta (2002, p.95) faz uma análise do conceito professor-reflexivo

e vê como positiva a "valorização do sujeito/professor" e o caminho aberto para a

"autoria/autonomia na docência". A autora, porém, alerta para os limites dessa

abordagem, pois é possível incorrer em uma "excessiva

subjetivação/individualização".

De maneira geral, o professor vai adquirindo conhecimentos e saberes ao

longo de sua vida, quer seja durante sua formação inicial e continuada, quer seja no

exercício prático de suas atividades, quer seja em sua história de vida.

Abordar a formação pessoal do professor requer refletir sobre muitas questões

inerentes ao tema. Olhar para a sua história de vida é compreender melhor sua

identidade, perceber como ela foi se constituindo e formando uma subjetividade.

O professor, enquanto pessoa, está também em constantes transformações,

passando por processos de autoconhecimento. É o crescimento interior que abre o

leque de possibilidades para sua vida pessoal e profissional.

4- Contribuições da Psicopedagogia na Instituição Escola

A psicopedagogia se ocupa da aprendizagem humana, que adveio de uma demanda - o problema de aprendizagem, colocando num território pouco explorado, situado além dos limites da Psicologia e da própria Pedagogia - e evoluiu devido à existência de recursos, ainda que embrionários, para atender a essa demanda, constituindo-se, assim, numa prática.

(Nadia Bossa, 2000, p.21)

A autora explica que, tendo em vista o problema de aprendizagem, a

psicopedagogia primeiramente ocupa-se do processo de aprendizagem.

Bossa (2000) fala que o trabalho psicopedagógico pode caminhar em duas

direções: a clínica ou a preventiva. Trataremos do trabalho preventivo, pois este

acontece dentro da instituição escola e tem como objetivos: atuar junto ao professor,

em sua formação e orientação; lidar com os problemas de aprendizagem já instalados,

elaborando um plano de intervenção e avaliando o currículo dos docentes; e eliminar

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os transtornos que já existem, num processo clínico que vise à prevenção de outros

transtornos.

Para compreender o processo de aprendizagem, seguiremos as explicações de

Alicia Fernández. Segundo a autora (1990), esse processo pressupõe a articulação de

quatro níveis de elaboração do sujeito: organismo, corpo, inteligência e desejo.

É fundamental entender que uma dificuldade de aprendizagem representa um

sintoma que o sujeito traz. Conforme Fernández (1990, p.127) "... ao estar atrapado o

aprender, está perturbada a capacidade de comunicar os afetos e as ideias". Aqui a

questão é a "má articulação inteligência - desejo".

A autora (1990, p.116) explica que "O sintoma cristaliza a modalidade de

aprendizagem em um determinado momento, e a partir daí esta perde a possibilidade

de ir transformando-se e de ser utilizada para transformar".

Gostaríamos de salientar que o trabalho psicopedagógico na escola vem orientar

o docente a lidar com as diferentes modalidades de aprendizagem de seus alunos,

possibilitando um vínculo melhor entre o educador e os educandos. Mas isto não é só,

o professor tem a possibilidade de entrar em contato com a sua própria modalidade de

aprendizagem. Fernández (1990, p.116) fala que "... essa modalidade tem uma

construção pessoal a partir dos quatro níveis (organismo, corpo, inteligência e desejo)

da história pessoal e da significação dada à mesma".

Ao tratar dos problemas de aprendizagem, Fernández (1990) considera que todo

sintoma tem sentido e funcionalidade dentro de um grupo familiar e em um

determinado sistema educacional nos quais o aluno está inserido. A autora (1990,

p.49) quer com isso enfatizar a importância de se recorrer à família e à escola para

compreender o sintoma com maior clareza sem, contudo, privar o aluno " ... de um

espaço pessoal que lhe permita recortar-se - diferenciar-se, e a nós ajude a observar o

possível atrape da inteligência e a corporeidade" .

Neide Noffs (2003) redefine o lugar do professor, do aluno, do plano de ensino e

dos conteúdos do ponto de vista psicopedagógico. O professor agora é encarado como

o ensinante; o aluno como o aprendente; o plano de ensino é visto como a instituição

escola; os conteúdos, como o saber. A questão para Noffs (2003, p.73) é "Como

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transformar informações em conhecimentos e conhecimentos em saber apropriado

pelos aprendentes vai ser o desafio em nosso desempenho".

Noffs (2003, p.73) aborda outras importantes questões a serem trabalhadas pela

psicopedagogia a fim de promoverem uma real mudança na instituição escola:

Deslocar a questão do modo de ensinar para a do como deve ser o ensino, para

que o aluno aprenda na instituição que frequenta, é a ousadia do trabalho

psicopedagógico. Descobrir formas de interligar ensino-aprendizagem; descobrir

estratégias facilitadoras respeitando tanto ensinantes-aprendentes em seus

estágios evolutivos reais; transformar as unidades de ensino de forma lenta e

gradativa, pela revisão dos papéis, atribuições de cada segmento, propiciará a

consciência crítica e o aprender apropriado, acreditando-se dessa forma, sem ser

invasiva, e reduzindo-se as ameaças aos professores e equipes em efetivo

exercício, podemos realmente contribuir para a transformação da escola, a partir

de estilos democráticos, nos quais o delegar, a autonomia, a cooperação e o

compartilhar sejam executados.

A autora rediscute o processo de transmissão de conhecimento e, baseada na

teoria de Femández, Noffs (2003, p.74) comenta que, para que o ser humano

transforme o ensino em conhecimento, é preciso "... que o aprendente outorgue a

confiança e direito de ensinar ao professor, bem como passe por quatro níveis de

elaboração (orgânico, corporal, intelectual e semiótico ou desejante)".

Mais uma vez nos deparamos com o processo de aprendizagem perpassando

pelos quatro níveis mencionados acima. De acordo com Femández (1990, p.52) "A

aprendizagem é, então, uma das funções para a qual estes níveis podem

inter-relacionar- se com o exterior e por sua vez conformar-se, a si mesmos, em um

processo dialético".

Costurando a Psicopedagogia à Psicanálise, temos em comum o fato de ambas

tratarem a afetividade e a inteligência como dimensões indissociáveis e

complementares da conduta humana.

De acordo com Bossa (2000, p.26), "A Psicanálise encarrega-se do mundo

inconsciente, das representações profundas, operantes através da dinâmica psíquica

que se expressa por sintomas e símbolos, permitindo-nos levar em conta a face

desejante do homem".

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A Psicanálise toma-se, então, uma grande aliada da Psicopedagogia por trazer

à tona questões relacionadas ao nível desejante do sujeito. A relação entre o desejo e a

aprendizagem é de suma importância para entender as dificuldades no processo de

aprendizagem estudadas à luz da Psicopedagogia.

Essa teoria estuda os mecanismos inconscientes, pois a raiz da particularidade de

cada um encontra-se no inconsciente. Cada sujeito tem a sua forma de ver e fazer as

coisas, respondendo diferentemente aos esquemas de assimilação e acomodação.

Costa (2001, p.9) explica que para Piaget "A construção da inteligência pode ser

esquematizada como uma espiral crescente voltada para a equilibração resultante da

combinação dos processos de assimilação e acomodação". A autora reforça a teoria de

que, para Piaget, a origem do mecanismo de equilibração pode estar no inconsciente,

articulando, assim, a concepção de Piaget com a teoria de Freud - a Psicanálise.

De acordo com a Psicanálise, a dificuldade de leitura-escrita aparece quando a

particularidade do sujeito vira um incômodo, o aluno vira um "aluno-problema". Essa

teoria busca analisar o significado da dificuldade de aprendizagem. Até que ponto o

sintoma não é a forma que o sujeito encontra inconscientemente para se expressar.

A sujeito vai se constituindo conforme suas condições. Primeiramente a criança

se constitui no desejo da mãe, depois no do pai e no de sua família, seguindo o script

de vida que lhe foi oferecido ou até mesmo imposto.

A Psicopedagogia vem auxiliar o educador a repensar as dificuldades de

aprendizagem que por ventura seus educandos apresentarem, sugerindo que o

professor desenvolva um outro "olhar" para o seu aluno, vendo um ser integral e

buscando um sentido maior, mais profundo para as aparentes dificuldades que o aluno

possa apresentar.

A orientação psicopedagógica para os professores pode ser de grande valia para

se trilhar por um caminho mais centrado na aprendizagem, menos preocupado com o

ensino. Noffs comenta (2003, p.142 e 143) que "Os encontros com professores,

sempre com a equipe técnica, permitem reduzir "a proibição pelo conhecer", facilitam

a circulação do saber. Os professores ensinam o que sabem, mas, como

psicopedagogas, nos autorizamos a desvelar o desconhecido".

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Como resultado desse trabalho, o vínculo entre professores e alunos se fortalece.

De acordo com Noffs (2003, p.143), "Isso vislumbra a possibilidade de vínculos

de confiança e credibilidade, que se apresentam como elementos essenciais no

apreender, permitindo surgir o sujeito, o cidadão, que só pode exercer seu papel em

plenitude porque prendeu".

A respeito pelo ser humano significa permitir e estimular sua própria construção

e identidade. O trabalho psicopedagógico vem ao encontro dessa afirmação e

possibilita m novo "olhar" para o aprendente, acreditando que ele possui inúmeras

possibilidades.

A Psicopedagogia institucional preconiza a necessidade de se desenvolver não

penas a autonomia do educador, mas também a do educando. Ela vem fazer uma

releitura da relação dos níveis corporal, orgânico, intelectual e desejante, mostrando

que o emocional e a inteligência são ambos essenciais no processo de aprendizagem.

Pensamos, também, que o trabalho do psicopedagogo institucional deve ser

realizado dentro de um perfil de assessoramento onde o refletir ético ocorra, pois seu

maior comprometimento está em lidar com relações humanas, oferecendo um espaço

para a transformação e melhoria da qualidade de ensino-aprendizagem, que, em última

análise, visa ao bem comum.

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Conclusão

O estudo da Ética, como tema transversal a ser articulado pelas diferentes áreas

de conhecimento no ensino médio, nos faz pensar na dimensão técnica e humana que a

instituição escola e o corpo docente possuem para contribuir que a formação dos

jovens brasileiros seja pautada na autonomia, na crítica e na cooperação, elementos

básicos para o exercício da cidadania.

Foi imposto às escolas que adotassem e seguissem os PCNs referendados na

nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996. No entanto, uma pergunta ainda

permanece: como fazer a fim de que os Parâmetros sejam reais para os adolescentes e

não sejam apenas textos distantes que abordem temas que nada têm em comum com a

nossa sociedade?

Não há discussão quanto à importância de se abordar o tema Ética no ensino

médio, mas a instituição escola, juntamente com seu corpo docente, precisa estar

instrumentalizada para lidar com esse tópico. A força desta instrumentalização está na

integração do corpo docente e discente, fazendo com que todos trabalhem para o

traçado de metas e objetivos comuns, ultrapassando a barreira do individualismo.

Vivemos um momento de grandes transformações científicas e tecnológicas em

que assistimos a uma crise de valores morais. É preciso que a escola assuma a sua

parte na tarefa de construir uma democracia, repensando como trabalhar os valores

humanos, como: a justiça, a solidariedade, a honestidade, o reconhecimento da

diversidade e da diferença e o respeito à vida e aos direitos humanos, valores básicos

para a manutenção da democracia.

Conforme o estudo teórico apresentado neste trabalho, a Ética, como um tema a

ser tratado de forma transversal e articulado por diversas disciplinas escolares, poderá

abrir o caminho da educação para a cidadania à medida em que a própria escola

conseguir promover a integração e o envolvimento de vários professores que, ao

trabalharem juntos, darão um sentido mais amplo aos projetos escolares,

desenvolvendo conceitos complementares como: autonomia e cooperação,

subjetividade e objetividade, crítica e reflexão. Desta forma a aula expositiva, muitas

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vezes embasada em um diálogo punitivo, dará lugar a um outro tipo de relação

aluno-professor, estruturada em um diálogo agora interativo.

Esses projetos escolares adquirem um valor mais concreto ao serem

desenvolvidos com os alunos do ensino médio, pelo fato de estes já possuírem um

senso maior de justiça e estarem construindo uma moral autônoma, ingredientes

essenciais para o exercício da cidadania.

Acreditamos ser a Ética um tópico básico para a educação moral na escola. Os

autores Uma Veiga e José Araújo (2002, p.IIO) concluem que "Não é possível ao

homem viver sem ética. O ser humano é um ser de relações, e a busca por ser ético é

que pauta tais relações".

A Ética é uma ciência cujo objeto de estudo é a moral. Queremos estabelecer

uma relação entre esses termos, ética e agir moral, reflexão e ação. A ética, como

reflexão, caminha paralela ao agir moral, ou seja, à ação.

Em seu estudo sobre a moralidade na criança, Piaget observa que antes da

tomada de consciência vem a ação, ou seja, a ação precede uma elaboração mental

sobre o fato, enquanto Puig reforça a importância do exercício ou uso por parte do

aprendiz para garantir a construção de valores morais.

Podemos somar as idéias de Puig e as de Piaget para refletir sobre' prática e

teoria. Ambos os autores sinalizam a importância da prática na formação moral.

Entendemos que a Ética deve ser construída através de diálogos e negociações

sobre tarefas concretas. Portanto, a escola só elabora verdadeiramente esse tema com

seus alunos quando parte de propostas e projetos multidisciplinares que garantam sua

prática.

A fim de que o Jovem construa seus valores morais é preciso que ele esteja

engajado em campanhas ou projetos que visem ao bem comum para que, dessa forma,

o campo de atuação seja ampliado para fora da escola. Estamos falando de um papel

ativo e participativo que o jovem deve desempenhar. Citamos, anteriomente, a

Campanha da Fratemidade que as Escolas Salesianas desenvolvem com toda a

comunidade e que visa não apenas refletir sobre um tema (o tema de 2004 é sobre a

preservação da água e sua importância), mas também colocar em prática medidas

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importantes para a coletividade.

Ulisses Araújo e Júlio Aquino (2001), ao falarem da construção de relações

sociais dentro de princípios mais justos, solidários e democráticos, comentam que não

se trata de resgatar valores passados tradicionais. Sobre essa construção, os autores

(2001, p.11) esclarecem que ela:

... passa necessariamente pela incorporação, nas práticas cotidianas, de princípios e

valores já conhecidos mas que nunca foram de fato consolidados por nenhuma

cultura, como os que foram consagrados em 1948 na Declaração Universal dos

Direitos Humanos.

Puig destaca, como ideia central de sua teoria, a educação moral como tarefa a

dar forma à identidade de cada sujeito através de reflexão e ação, a partir das

circunstâncias da vida cotidiana. O objetivo maior da educação encontra-se justamente

na construção da personalidade moral.

Pensamos em como a escola, pode contribuir para a construção da

personalidade moral, primeiramente possibilitando um espaço para que esse processo

ocorra.

Acreditamos na contribuição psicopedagógica quanto à urgência em se

discutir os novos papéis da escola e do psicopedagogo, ressignificando o papel do

professor e do aluno a fim de seguirem o rumo certo não apenas para a formação

moral dos educandos, mas para o desenvolvimento de sua capacidade intelectual e

criativa.

A instituição escola, ao se posicionar como espaço importante no processo de

socialização dos alunos, precisa verificar se o projeto de educação está adaptado à

realidade e se consegue cumprir, de maneira eficaz, as tarefas intelectual e

educacional, incluindo nelas o ético.

Podemos dizer que não compete à escola e a seu Corpo Docente apenas um

papel técnico, mas muito antes, ela deve rever sua filosofia e assumir seu papel ético e

político diante da sociedade.

Os papéis do aluno e do professor precisam ser revistos também. O

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adolescente, que é o nosso aluno em questão, passa por uma fase de mudanças não

só físicas, mas também psicológicas. Ele busca uma identidade. De acordo com

Alfredo Oliva (2004, p.340) :

... é necessário considerar que essa identidade, apesar de ser uma característica pessoal é experimentada em um contexto social determinado, em que o sujeito estabelece uma série de relações e experimenta novos papéis. Essa identidade vai incluir as normas dos grupos nos quais o adolescente se integra, os valores que interioriza, sua ideologia pessoal e os compromissos que assume e vai recolher as experiências do passado para dar significado ao presente e dirigir sua conduta futura.

O professor deve dar lugar ao aluno para que este se desenvolva como um

sujeito ativo. A postura do educador deve ser pautada no diálogo para promover

conversas, trocas de ideias e discussões entre seus educandos. Com o avanço das

séries escolares, o que deve mudar é a complexidade das negociações sobre diversos

assuntos. À medida em que o aluno dispuser de mais recursos internos e externos,

maior será a sua desenvoltura para resolver situações-problema e exercitar seus

direitos e deveres como cidadão.

A fim de atingir o objetivo de formar seres humanos mais conscientes e

conhecedores de suas capacidades, é preciso resgatar o valor da profissão educador e

investir na formação inicial e continuada desse profissional. O professor precisa

conhecer e desenvolver suas potencialidades também. Precisa, antes de mais nada,

acreditar no seu ofício.

Um dos caminhos para isso é a formação de equipes interdisciplinares na

escola que possam discutir projetos pedagógicos, que dêem um suporte não apenas

técnico ao professor, mas que colaborem para a formação do professor reflexivo,

aquele que, enfim, se preocupa com a aprendizagem significativa de seus alunos.

Queremos um professor investigador, um educador que se comprometa com o

"aprender a aprender".

Nesse contexto, podemos inserir o trabalho psicopedagógico institucional

como uma grande ferramenta para a integração do desenvolvimento profissional e

pessoal do professor, na medida em que possibilita o acesso do educador às diversas

áreas do conhecimento permitindo articulá-las à sua prática, colaborando para o

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repensar do vínculo professor/aluno e estimulando os processos criativos e de

autoconhecimento do professor enquanto pessoa.

Noffs (2003) explica que o "olhar" da Psicopedagogia recai sobre as

modalidades da aprendizagem do ensinante e do aprendente. Entender que cada um -

professor e aluno - tem o seu estilo próprio é dar um largo passo em direção à

Pedagogia recriada.

O grande elemento mediador da prática psicopedagógica é o agir/refletir, e

podemos dizer, sem dúvida, que este elemento se articula com o tema aqui proposto, a

Ética, como tema transversal a ser construído na instituição escola, especialmente no

ensino médio, pois seu objetivo só será alcançado a partir de uma prática, de uma ação

e de uma reflexão sobre essa prática.

A Psicopedagogia institucional fundamentalmente trata de relações humanas e

sua grande contribuição refere-se à construção coletiva do conhecimento, integrando

de forma transversal, todas as suas dimensões: conceitual, atitudinal e procedimental.

Encontramos aqui um vínculo profundo e especial com a Ética, enquanto tema

transversal que perpassa todas as áreas de conhecimento, a busca de uma sociedade

que priorize as relações humanas norteadas pela noção do bem comum e do respeito

ao outro.

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