8
6 boletim junho/julho 2013 criatividade e protagonismo da arte na escola 9 Guto Lacaz; Edson Kumasaka. Pares ímpares, 2005-2013. Wish Report, n. 40.

criatividade - artenaescola.org.br · questão o que é arte e o que é cultura. Que arma - dilha! Essas definições estão muito longe de ser um consenso, quanto mais a identificação

  • Upload
    hadien

  • View
    214

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

6 boletimj u n h o / j u l h o 2 0 1 3

criatividadee protagonismo da arte na escola

9G

uto

Laca

z;Ed

son

Kum

asak

a.Pa

res

ímpa

res,

2005

-201

3.W

ish

Repo

rt,

n.40

.

Como você desperta a motivação dos seusalunos nas aulas de Artes?

> Motivar os alunos se torna tarefa fácil uma vez que a arte, dentrode sua multiplicidade, engloba sonhos e desejos, medos e angústias.Tento despertar em meus alunos o fascínio pela Arte levantando hipó-tese daquilo que fascinou o artista a materializar suas ideias. O quemais poderia motivar um ser humano é aquilo que já está dentro dele.Sendo assim, a arte torna-se o caminho.Isaac Kassardjian Jr / São Paulo (SP)

> Todo o meu projeto de trabalho deste ano perpassa o uso da meto-dologia de leitura de imagens. Isso torna a aula bem dinâmica, permi-tindo que os alunos dêem suas opiniões a respeito da obra estudada.Para um aluno se sentir motivado, ele precisa participar ativamente daconstrução de seus conhecimentos. Dou voz aos meus alunos e conse-quentemente, aprendo muito com eles.Carlim Silva / Campos dos Goytacazes (RJ)

> Procuro planejar aulas em que a construção do conhecimento emarte e por meio da arte seja fundamental. Proponho desafios, moti-vando-os à pesquisa, colocando-os em contato com diversas temá-ticas, possibilitando quando possível o contato direto com a arte.Estimulo a coleta de diversos materiais, ampliando o repertório, naperspectiva de contribuir nos processos de criação pessoal, que serevelam por meio de poéticas singulares, tornando-os sempre osprotagonistas em minhas aulas de arte.Denise Velho da Silva / São João da Barra (RJ)

> A motivação acontece quando os alunos percebem o olhar e a aborda-

gem diferenciada do professor, que consegue trazer para perto o signifi-

cado e o valor de ser um agente criativo e produtor de arte em sua cul-

tura. Aula de arte que se dá por meio da apreciação, troca de experiên-

cias, valorização e sensibilização para o cuidado que vai além das inter-

venções rotineiras.

Alyne Moura / Osasco (SP)

> Penso ser importante provocar olhares. Procuro estabelecer relaçãocom acontecimentos do cotidiano e sobre os quais demonstrem inte-resse. Os assuntos vão se encaixando e as redes se formando. Porexemplo, trabalhando com a cor eu posso atraí-los para observarem ascores dos materiais que carregam, indagando o porquê daquelas esco-lhas. Ou posso convidá-los a sair da sala de aula para um passeio pelaescola, se quero despertar um novo olhar para o entorno.Ana Beatriz / Bagé (RS)

> A motivação acontece quando aprender e fazer arte tornam-se uma ati-

vidade prazerosa. As nossas aulas de arte são sempre uma descoberta, um

desafio. Temos a parte teórica do conhecimento, mas o mais gostoso é

quando eles descobrem que podem criar usando diversos materiais.

Marcia Ovchinnikov / São Paulo (SP)

editorial

2

expedei nteO Boletim Arte na Escola éuma publicação da redeArte na Escola, produzidocom o patrocínio daFundação Iochpe.

ISSN 1809-9254Instituto Arte na Escola;Alameda Tietê, 618 – casa 3CEP 01417-020, São Paulo,SP Fone (11) [email protected]

EditoraSilvana ClaudioJornalista responsávelFábio Galvão MTB 20.168/SPRedaçãoFábio Galvão e Cecília Galvão(CGC Educação)Projeto GráficoZoziPadronização bibliográficaShirlene Vila Arruda

FlaPa rofessor

ILUSTRAÇÃOIlustram esta edição

composições meta-industriaisde pares provocativos, Paresímpares, criados pelo artista

plástico Guto Lacaz efotografadas por Edson

Kumasaka para a revistaWish Report , de 2005 a

2013. Agradecemos ao artis-ta, ao fotógrafo e a revista acessão do uso das imagens.

Gut

oLa

caz;

Edso

nKu

mas

aka.

Pare

sím

pare

s,20

05-2

013.

Wis

hRe

port

,n.

25.

DUVE, Thierry de. Fazendo escola (ou refazendo-a?). Trad. Alexânia Ripoll. Chapecó: Argos Ed. daUnochapecó; Porto Alegre: MARGS, 2012.(Coleção Argos: grandes temas).Um dos grandes pensadores da atualidade nocampo da arte, Thierry de Duve escreve a partir desuas experiências de ensino com a visão crítica dequem conhece profundamente o sistema artístico.

Dicad itL ue re a

Na sociedade do conhecimento a grande questãoque se coloca é como alocar de maneira produtivao tempo da escola. Ninguém questiona a necessi-dade de levar o conhecimento ao aluno – mas, queconhecimento? O que é essencial e o que é aces-sório? Os exames estandardizados que se consa-graram como medida universal que torna os siste-mas comparáveis entre si privilegiaram a línguamaterna e a matemática. Na opinião respeitada doProf. Antônio Nóvoa, Reitor da Universidade deLisboa e responsável por processos de formação deprofessores nos quatro cantos do mundo “a Arte éum elemento central de qualquer currículo”.Neste Boletim você poderá ler reflexões sobre opapel da Arte e da Criatividade nas escolas, na vozde professores brasileiros que as utilizam como fer-ramenta central de aprendizado e em novas pro-postas de redes escolares que estão surgindo naEspanha, mas também no Brasil e em outras latitu-des. Esta discussão, sempre fértil, coloca o profes-sor de arte no centro da cena educacional – estemesmo professor que conta com apenas uma horapor semana para ministrar sua disciplina.De incongruência em incongruência convidamos oleitor a pensar e a apreciar os “pares ímpares” deGuto Lacaz, onde uma vez mais a arte antecipa avida e diz, de forma mais direta e sintética, o quemuitas letras e palavras se esforçam por concluir.Numa sociedade do conhecimento sim – mas essen-cialmente visual – o que será de nosso aluno se elenão for capaz de decodificar este código e entendere se expressar através da forma, linha, cor?

Evelyn Berg IoschpePresidente do Instituto Arte na [email protected]

3

Não > Esta pergunta tem alimentado um deba-te que surgiu entre os game designers, consumi-dores, associações e governo quando a ministraMarta Suplicy apontou que os jogos eletrônicosnão contariam como artigos válidos para o Vale-Cultura. Para defender seus interesses, cada ladotem apresentado argumentos que colocam emquestão o que é arte e o que é cultura. Que arma-dilha! Essas definições estão muito longe de serum consenso, quanto mais a identificação desuas fronteiras. Se é que existem, de fato.Como pesquisador, vejo que a questão tem umaresposta bastante direta: Não. Games são mídia.Como nos conta o filósofo Douglas Kellner(2001), as produções midiáticas (cinema, progra-mas de TV, novelas, músicas, livros…) se transfor-mam em mercadorias, cujas “imagens, sons eespetáculos ajudam a urdir o tecido da vida coti-diana, dominando o tempo de lazer, modelandoopiniões políticas e comportamentos sociais, efornecendo o material com que as pessoas forjamsua identidade”. Apesar de não ser esse o enfo-que do filósofo, vejo que esta é uma descriçãoque se enquadra nos games também – pois,assim como outras mídias, pertencem a nossacultura, (re)produzindo-a. Apenas como exemplo,convido o leitor a pensar no Mario Bros., Pac Mane Space Invaders como parte dessas produçõesmidiáticas, e nos contatos que temos com essessímbolos que já não se limitam a sua aparição nojogo, mas estão nos toques de celular, tatuadona pele, pichado nos muros da cidade, apropria-do pela publicidade etc.. O próprio McLuhan(1964) já considerava os jogos como mídia, poissão “situações arbitradas que permitem a parti-cipação simultânea de muita gente em determi-nada estrutura de sua própria vida corporativaou social”. Assim, podemos identificar os jogoscomo parte dessa produção midiática queinfluencia a sociedade contemporânea.Produtos culturais que pertencem ao nossorepertório, nosso cotidiano. Meu ponto apenasé: este pode não ser um efeito necessário daarte, mas seguramente é um efeito das mídias.Essas discussões ainda continuarão, especial-mente porque não se sabe ao certo o que é cul-tura, o que é arte e, infelizmente, o que é game.Minha hipótese é de que é uma mídia, queainda estamos aprendendo a lidar.

Mauro Berimbau - mestre em comunicação e consumo

pela ESPM, com o tema Advergames: comunicação e consumo

de marcas, instituição onde leciona e mantém o laboratório de

desenvolvimento e pesquisa lúdica GameLab

Games são arte?

Cleie rode Ideias

Sim > O vídeo e os jogos interativos são considerados manifes-tações artísticas emergentes e também uma das mais interessantesda atualidade. Não só por dissolver os limites entre as diferentesformas de arte, já que a forma inculta de entretenimento dos video-games alcançou uma posição importante na estética intelectual nomundo da arte, mas também por obter o reconhecimento de pos-suírem potencial interativo e lúdico, e ainda, um valor cultural quevai além da tela revolucionando os padrões de criatividade, intera-tividade e design.Historicamente, os videogames surgiram como recursos cada vezmais exigentes, e consequentemente, acabaram por instigar a evo-lução das capacidades e das condições dos computadores.Existe uma ironia implícita ao se investigar as qualidades culturaisdo vídeo e dos jogos interativos. Desde a época de pico dos jogosde arcade (fliperama), na década de 1970 e início dos anos 80,conhecida como a "idade de ouro" dos videogames, a popularida-de, a inovação tecnológica e ainda a estética desses jogos nos trou-xeram narrativas escapistas, mundos sedutores decorados comcores fluorescentes e os célebres símbolos pop do nosso tempo. Osambientes introspectivos são triviais ou complexos na melhor dashipóteses, e são sedutores e ilusórios na pior delas. A indústria dosvideogames já ultrapassou há muito tempo a de Hollywood em ter-mos da renda bruta anual, e se tornaram a segunda maior indús-tria de entretenimento nos Estados Unidos depois da música.A apropriação deste gênero e a reconfiguração do potencial destesjogos por uma jovem geração de artistas propiciaram ao videoga-me a conquista de relevância e status de artefatos artísticos. Estesartistas possuem as habilidades, a tecnologia e a ética cultural parafazer ou modificar os jogos, onde regras podem ser alteradas. Oobjetivo não é realização, mas consciência, e o método não é fuga,mas a participação. Estes artistas projetam e enxergam os jogoscomo arte, e o que eles constroem não são apenas peças de entre-tenimento, mas narrativas que permitem momentos de engajamen-to público e de crítica social. Um fascínio aparente com a tecnolo-gia obsoleta, com o ultrapassado, com o disponível, e com o custoacessível são os ingredientes da receita para o contra-ataque naindústria do jogo eletrônico e a recuperação de uma forma de artecom potencial ainda não reconhecido, que vai além de seu criador.Durante a criação de uma obra de Game Arte o artista determinaque o público seja o co-criador de sua obra, colocando na mão dojogador pelo menos uma parte do ato criativo. De modo que asobras interativas somente existem em sua totalidade no momentoque o participante esteja interagindo, ou seja, co-criando a obrapreviamente estabelecida pelo artista. Embora esse relacionamentodireto da arte-artista-público seja comum em outros movimentosartísticos, como o Fluxus e até mesmo em obras experimentais sur-realistas, na Game Arte essa relação ocorre de maneira ainda maisexplícita devido ao processo colaborativo de criação.A Game Arte permite abordar discussões acaloradas que vão alémdo lúdico para exaltar questões sociais da atualidade, debate sobreum espaço real de convivência e colabora para os avanços dosrecursos de interatividade homem-máquina.

Marilia Pasculli - Curadora de arte digital e artista multimídia. Diretora artísti-

ca da empresa Verve Cultural, assina a criação e a curadoria da Galeria de Arte

Digital do SESI-SP.

4

>> Sai o velho modelo de aula expositiva, com o pro-fessor falando e escrevendo na lousa e os alunoscopiando, com disciplinas estanques e distantes darealidade. Entra um ensino personalizado, com oaluno protagonista do saber, elaborado por projetosinterdisciplinares e com conteúdos que façam senti-do para a vida e para o futuro dos alunos. A comu-nidade é convidada a participar. O uso adequadodas novas tecnologias ganha destaque. E a forma-ção contínua do professor é cada vez mais exigidacomo garantia da aprendizagem.Neste novo cenário, o ensino de Artes ganha rele-vância e torna-se um aliado imprescindível para tor-nar o ambiente escolar mais criativo, atraente edemocrático.Esta nova dinâmica vem acompanhada de váriosmovimentos no Brasil e no mundo. Um deles é aRede Internacional de Escolas Criativas, idealizadapelo professor espanhol Saturnino de La Torre (vejaentrevista nas páginas 6 e 7). Ela nasceu em junhode 2012 e já atua no Brasil, Argentina, Bolívia, Chile,Colômbia, México, Peru e Portugal.A coordenadora da rede no Brasil, professora VeraLúcia de Souza e Silva, da FURB - UniversidadeRegional de Blumenau, explica que a finalidadedesta ação educativa inovadora "está assentada napesquisa colaborativa, na formação transdisciplinare ecoformadora, e na possibilidade de mobilidadede docentes para uma formação de qualidade, pro-gressiva e sustentável, tanto no âmbito científicocomo humano". Atualmente, o Brasil tem quatroescolas na rede.Na opinião do reitor da Universidade de Lisboa,António Nóvoa, a Arte é um elemento central dequalquer currículo, de qualquer escola. Nóvoa sus-tenta ainda que a formação dos professores deveser feita através "de dinâmicas de reflexão sobre aprática e de cooperação com os colegas mais expe-rientes, ideias que sublinham a importância do pro-fessor reflexivo e do trabalho colaborativo".Outra experiência inovadora de educação e ensinode Artes acontece no novo Museu de Arte do Rio, o

MAR, inaugurado em março passado, e que abriga aEscola do Olhar, um espaço onde o professor é oprotagonista. A nova instituição tem 11 salas dese-nhadas especificamente para a pesquisa e a forma-ção continuada e já firmou parcerias com universi-dades e institutos de pesquisa. “Queremos o olhardo professor de Artes com atitude, com cidadania,conhecendo o seu território", afirma a gerente deeducação do MAR, Janaína Melo.Janaína diz que após a formação, os professoresrecebem uma vista da equipe da Escola do Olharpara conhecer como o trabalho está influenciando aaprendizagem dos alunos em sala de aula.Em breve haverá cursos de artes para os alunos, paracuradores e também para a comunidade. "Queremosformar uma escola do saber em Artes, um saber com-partilhado", afirma a gerente de educação.As novas experiências educativas brasileiras sãotema de um documentário que será exibido nosegundo semestre deste ano. "Quanto sinto que jásei" é uma parceria entre três jovens - AntonioLovato, Anderson Lima e Raul Perez – que decidiramviajar pelo Brasil em busca de propostas educacio-nais inovadoras. Foram mais de 50 entrevistas evisitas a sete instituições que estão transformandoo modo de ensinar.Lovato conta que teve a ideia do documentárioquando conheceu a experiência inovadora do educa-dor Eurípedes Barsanulfo. "Nos anos de 1920 eleconstruiu uma escola onde meninos e meninas estu-davam juntos, era multisseriada e havia professoresnegros". Nas suas andanças, o jovem cineasta cons-tatou que a arte está sempre presente nestes proje-tos que estão mudando a cara da escola. A “arte ali-menta a expressividade e a criatividade. Ela nãosegrega e faz o aluno ser protagonista do aprendi-zado", diz.A experiência aproximou os jovens de outro movi-mento internacional, as chamadas EscolasDemocráticas. Atualmente, segundo ele, são cercade 100 colégios democráticos em todo o mundo. Odocumentário rendeu o convite para representarem

Transformaré preciso

>

A arte pode ser o vetor da transformação na escola?

Escola do Olhar -Museu de Artedo Rio - MAR

"Quanto sintoque já sei"

EMEFDesembargador

Amorim Lima

LINKS

5o Brasil na reevo.org, um projeto para construir umespaço na internet que promova iniciativas educativascentradas em um aprendizado pleno e no desenvolvi-mento humano, respeitando a cultura do seu entorno.Uma das instituições visitadas por Lovato é a esco-la municipal desembargador Amorim Lima, no bairrodo Butantã, em São Paulo. Símbolo de que é possí-vel construir uma escola pública de qualidade, aAmorim Lima usou como referência a Escola daPonte, em Portugal, uma das pioneiras e principaisresponsáveis por esta linha de renovação. A direto-ra da Amorim Lima, Ana Siqueira, conta que a cultu-ra e a comunidade foram os grandes responsáveispela mudança radical da escola, há 17 anos."A partir de uma Festa Junina, priorizamos a culturapopular brasileira. Para os jovens, que reclamaramque não podiam mais tocar suas músicas, criamosum Festival de Música. Tudo isto com o envolvimen-to da comunidade do entorno", lembra. A partir daí,a escola começou a criar várias oficinas de dança,

música, capoeira. Ana relata que uma das mães res-gatou com as outras mães como eram as brincadei-ras de infância. Todas decidiram recriar estas brinca-deiras com os filhos no final das aulas, na sexta-feira. Algum tempo depois, as mães formaram umacompanhia de teatro. E as oficinas, que anteseram no contraturno, passaram a fazer parte dagrade escolar.Ana Siqueira faz questão de dizer que outro pontodeterminante foi mudar a estética da escola."Quebramos paredes, tiramos as grades, pintamos ocinza de laranja, fizemos jardins. Uma aluna disse:ainda bem que vocês tiraram as grades; não somosloucos nem estamos presos", recorda a diretora. Naconcepção dela, esta mudança de olhar, de estética,aliada ao apoio da comunidade, tornaram a AmorimLima uma escola onde todos gostam de estudar."Sem a comunidade este projeto não teria dadonenhum passo. E nós traçamos o projeto de escolaa partir da Cultura e da Arte. E a Arte faz o mundo". <<

>G

uto

Laca

z;Ed

son

Kum

asak

a.Pa

res

ímpa

res,

2005

-201

3.W

ish

Repo

rt.

6

Como conquistar uma educação de qualidade?Uma sociedade que não valoriza a educação e o pro-fessor perde a consciência do futuro. O futuro de umpaís não está na tecnologia, nem em preparar exce-lentes especialistas, mas sim em elevar o nível cultu-ral, artístico e ético dos seus cidadãos. Essa é achave de uma cidadania cuja formação se reverterápara toda a sociedade. Mas a qualidade transforma-se muitas vezes em um slogan de um discurso admi-nistrativo e político, longe da prática docente, doreconhecimento social do professor, do investimentona formação e na promoção de experiências inovado-ras e criativas. O melhor exemplo de qualidade huma-na é encontrado em escolas e instituições criativas.Em escolas que se propõem a tirar o melhor de cadaaluno e desenvolver seu potencial. Delas sairão cida-dãos e profissionais alegres e capazes de fazer avan-çar a sociedade nas mais diversas áreas. Uma socie-dade plural precisa de engenheiros, advogados,médicos, administradores, mas também de artistasque são o fermento dos valores humanos, que seentregam à criação e desfrutam do seu trabalho,como ocorre com os bons professores.De que forma a Arte pode ajudar a escola a ser maisatraente para os alunos?As manifestações artísticas são, no geral, a expressão

criativa por excelência. A arte é criação em todas assuas manifestações, uma vez que implica a sensibili-dade e a complexidade das pessoas, intuição eimprevisibilidade no processo, manejo dos recursos elinguagens, com respeito ao ambiente e originalidadeno resultado ou no produto. Neste sentido, criam-seambientes propícios para estimular a criatividadevisual, plástica, sonora, cênica, corporal e de qual-quer outro tipo. A arte muda a percepção da pessoae o mundo interior dela.Como formar um bom professor de Arte?Um bom professor deve ter três tipos de competên-cias básicas: didática para saber comunicar, atrair,impressionar e motivar a autoaprendizagem; psicope-dagogia para saber adaptar o conteúdo à idade ematuridade dos alunos; e domínio dos conteúdoscurriculares para saber recriá-los, transformá-los eenriquecê-los com as experiências de vida, que sãoas principais fontes de aprendizagem. As duas primei-ras competências são comuns a qualquer professor.Um bom professor precisa ainda ter criatividade parasurpreender, estimular e despertar no aluno a crençade que ele pode aprender por si mesmo. Um profes-sor de Arte tem que dominar o código do seu campode forma teórica e prática. Se ensina pintura, tem quesaber pintar; se música, compor; se artes plásticas,

O que esperar da escola do

futuro

>

“Um bom professor de Artes cria espaços e cenáriospara o estudante se surpreender e surpeender oseu professor com suas criações”

>>

entrevits a

O catedrático de Didática e Inovação Educacional da Universidade de

Barcelona e criador da Rede Internacional de Escolas Criativas diz que

instruir não é educar uma criança

SATURNINO DE LA TORRE

7

modelar ou esculpir; se artes cênicas, desempenharpapéis diferentes. Um bom professor de Artes criaespaços e cenários para o estudante se surpreendere surpeender o seu professor com suas criações.Quando ele conseguir isso, terá deixado uma marcacriativa em seus alunos.De que maneira a família e a comunidade podemtrabalhar juntos para melhorar o aprendizado dosestudantes?"Para educar uma criança, é preciso toda a tribo", dizJ. A. Marina (escritor e filósofo espanhol), citando umprovérbio africano em seu livro "A Educação deTalentos". A família, a escola, o bairro, a comunidade,a cidade inteira se convertem em cenários educativos.Uma coisa é instruir, transmitir conhecimentos, outraé formar e educar uma criança, um adolescente ou umjovem. Para instruir basta um professor medíocre, um"ensinante" ou um trabalhador do ensino, comoalguns sindicalistas preferem chamar. O professor nãoé um trabalhador do ensino, nem tampouco um médi-co é um trabalhador da saúde. São profissões quevão além das horas estabelecidas pelo relógio, comoabsurdamente pretendem algumas administrações.Pretender "medir" a hora trabalhada do professor éanular a sua consciência e sua missão educativa etorná-lo um "ensinante". A função educativa e forma-dora requerem a colaboração da família, das institui-ções municipais, da comunidade porque formar valo-res não se faz mediante lições escolares, mas delições de vida. Como trabalhar juntos? Convertendo aescola em espaço a serviço da comunidade, dos vizi-nhos, alunos, ONGs, atividades culturais e esportivas,celebrações de festas. A interação é a melhor estraté-gia didática para a educação sistêmica e integral.Como tal, a escola ou outro espaço da comunidade,tornam-se cenários de formação.

Como será a escola do futuro?Tenho um duplo prognóstico sobre a escola do futu-ro. Um, pessimista, em que ela seguirá mantendo amesma estrutura curricular e se apegando a modelosdo passado, e outro, de um movimento com escolasinovadoras e criativas, adaptadas aos novos tempos.As políticas do governo seguem escravas de diretrizese normas internacionais, priorizando as disciplinastradicionais, como matemática, ciências, línguas e lei-tura e subestimando as disciplinas baseadas noâmbito artístico e expressivo, mais estimuladoras dacriatividade. Também seguirá prevalecendo o discursodo desenvolvimento acadêmico baseado na interna-cionalização e padronização dos resultados, nahomogeneização, nos padrões e medidas fornecidaspor agências como o Pisa (exame internacional deavalição da Organização para Cooperação eDesenvolvimento Econômico). Serão escolas dasegunda onda da industrialização que preparam paraa competitividade. Em outra vertente, encontramosescolas e instituições educativas que adotam o dis-curso do desenvolvimento humano, que preparamcompetências para a vida e despertam o potencial deseus alunos e a ampliação da consciência tanto pes-soal como social, ambiental e planetária. Escolaspreocupadas com a sustentabilidade, como a escolamunicipal Visconde de Taunay, em Blumenau, querecebeu recentemente o reconhecimento da RedeInternacional de Escolas Criativas, com sede emBarcelona, na Espanha. Cada vez teremos mais esco-las como esta e as que estão trabalhando em outrascidades de Santa Catarina, como Orleans, VargemBonita, ou outros Estados, como São Paulo,Fortaleza, Goiás. Elas compõem um importante movi-mento para a mudança que queremos na educação. <<

>

Guto Lacaz; Edson Kumasaka. Pares ímpares, 2005-2013. Wish Report, n. 34.

Os endereços e dados para contato com os Polos da RedeArte na Escola estão no site www.artenaescola.org.br

8

Patrocínio

<<

>> Ensinar e aprender em rede estão no DNA do Arte naEscola desde a sua fundação, em 1989. Uma provadeste compromisso é o trabalho de 20 anos do Artena Escola em Santa Catarina, comemorado em maio,em Joinville. Durante dois dias, uma grande rede deconhecimento, envolvendo os sete Polos no Estado,professores, acadêmicos, pesquisadores e secretáriosmunicipais de educação, debateu "O papel do profes-sor na sua formação contínua".Além de workshops e oficinas, o evento contou compalestras dos professores Saturnino de La Torre, daUniversidade de Barcelona (leia entrevista), e AnaMariza Filipouski (UFRGS).O sucesso do Arte na Escola em Santa Catarina éresultado, segundo suas coordenadoras, de trêsações: a união entre os Polos, as parcerias com assecretarias de educação e a qualidade dos materiaiseducativos do instituto.Um dos encontros mais significativos entre os Polosaconteceu em 1996, quando as Universidades deBlumenau (FURB) e de Joinville (UNIVILLE) realizarama I Semana Integrada de Arte-Educação. A iniciativadeu origem à pós-graduação “O Ensino da Arte:Fundamentos Estéticos e Metodológicos”. Da pós,nasceu o livro “Arte e o Ensino da Arte – Teatro,Música, Artes Visuais”.Rozenei Cabral, coordenadora da FURB, ressalta que"estas parcerias interinstitucionais são bem comunsentre os Polos em Santa Catarina". Nadja Lamas, daUNIVILLE, diz que os Polos "têm desenvolvido açõesem parceria, com trocas, auxílio mútuo, desenvolvi-mento de projetos conjuntos, que fazem a diferençana região".Na Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC),em Criciúma, a coordenadora Silemar Maria Medeirosrelata que sempre "há uma aproximação entre oscoordenadores que faz com que essa ideia de rede semultiplique". Carla Sussenbac, da Universidade doContestado (UNC), no município de Canoinhas, enfa-tiza que "as ações conjuntas com os outros polos for-talecem as discussões e a troca de experiências, oque contribui para um trabalho eficaz".

Os convênios com o poder público são cruciais paraa formação continuada dos professores. A professoraFabiola Costa, que coordenou o Polo na UniversidadeFederal de Santa Catarina (UFSC), em Florianópolis,por 18 anos, diz que quando "as secretarias de edu-cação mobilizam seus professores e a equipe pedagó-gica a participarem deste tipo de formação elas via-bilizam as mudanças pedagógicas que ocorrem nochão das escolas".Roseceli Vieira, da Universidade do PlanaltoCatarinense (UNIPLAC), frisa que para "Lages e regiãoé de grande importância a parceria com a secretariado Estado na formação, pois eles liberam os profes-sores" para os encontros dos grupos de estudo.A Gerente de Educação de Lages, Maria de FátimaOgliari, afirma que a integração com a UNIPLAC asse-gura ao "poder público buscar a fundamentação teó-rica e o embasamento para prática pedagógica dodocente e a formação continuada do conhecimento".Em Joinville, a secretaria de Educação e a UNIVILLEdesenvolvem projetos comuns há 16 anos. ASupervisora de Artes da Secretaria de Educação,Ilcirene Dias, conta que a partir do segundo semestrede 2011 os supervisores das escolas também passa-ram a ter encontros periódicos com a equipe do Artena Escola. "Eles tem uma melhor compreensão doensino da arte e ganham respaldo conceitual e meto-dológico para supervisionar o ensino da arte noâmbito da escola", diz.Ilcirene destaca ainda que em breve o número deaulas de artes passará de uma aula semanal paraduas aulas semanais. "Em pesquisa realizada peloInstituto Arte na Escola observou-se que nas escolasque possuem um bom ensino da arte o índice deaproveitamento na língua portuguesa e matemática émaior, o que aumenta o índice no Ideb", diz a repre-sentante da secretaria de Educação de Joinville.Os Polos do Arte na Escola em Santa Catarina estãoorganizando agora um livro com a temática dos 20anos de Arte na Escola em Santa Catarina, além deartigos nas revistas eletrônicas da FURB e daUniversidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), quenão é Polo, mas é parceira. Tudo em rede, claro.

Santa Catarinacelebra 20 anosde Arte-Educaçãoem Rede

Gut

oLa

caz;

Edso

nKu

mas

aka.

Pare

sím

pare

s,20

05-2

013.

Wis

hRe

port

,n.

23.