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Cuidados de criação para o
desenvolvimento na primeira
infância
Plano de vinculação dos objetivos de Sobreviver
e Prosperar para transformar a saúde e o
potencial humano
Lançamento em maio de 2018
“Se mudarmos o começo da história, mudamos a história
toda.”
Raffi Cavoukian, O Começo da Vida
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 2
Índice
Esta é uma tradução não oficial. O Plano de cuidados de criação, as perguntas de consulta e o link da
pesquisa on-line estão disponíveis em vários idiomas para facilitar a maior participação na segunda consulta
on-line do Plano de cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância.
Elaborado pela OMS e pelo UNICEF, em colaboração com a Aliança para a saúde da mãe, do
recém-nascido e da criança (PMNCH), a Rede de Ação do ECD e muitos outros parceiros.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 3
Vinculação dos objetivos de sobreviver e prosperar
para transformar a saúde e o potencial humano
No centro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, a Estratégia Global para a Saúde das Mulheres,
das Crianças e dos Adolescentes (2016-2030) prevê um mundo em que todas as mulheres, crianças e
adolescentes usufruam de seu direito à saúde física e mental e ao bem-estar, tenham oportunidades sociais
e econômicas e possa participar plenamente na construção de sociedades prósperas e sustentáveis.
É essencial para essa visão que as crianças pequenas tenham garantidas, por seus direitos humanos, as
condições para sobreviver como prosperar.
Sabemos por que isso é importante. Os três primeiros anos de vida de uma criança, desde a gravidez até
a idade de 3 anos, são um período de maior suscetibilidade às influências ambientais, no qual se
estabelecem as bases para a saúde, o bem-estar, a aprendizagem e a produtividade durante toda a vida e na
geração subsequente.
Sabemos o que ameaça o desenvolvimento na primeira infância. Desde a gravidez, passando pelo
período neonatal, a lactância e a idade dos primeiros passos, a pobreza extrema, a insegurança, a violência,
as toxinas ambientais e os problemas de saúde mental dos pais diminuem a capacidade das famílias e dos
cuidadores de proteger, apoiar e promover o desenvolvimento das crianças pequenas.
Sabemos do que as crianças necessitam para desenvolver seu potencial. Os cuidados de criação
abrangem condições promotoras de saúde, nutrição, segurança e proteção, cuidados responsivos e
oportunidades para aprendizagem precoce.
Sabemos o que fortalece a capacidade da família e do cuidador de apoiar o desenvolvimento de
crianças pequenas. Um ambiente favorável de políticas e programas que propiciem às famílias e aos
cuidadores conhecimentos, recursos e serviços para oferecer cuidados de criação às crianças pequenas.
Um plano para os cuidados de criação
O Plano de cuidados de criação é um roteiro de ação. Fundamenta-se em evidências recentes sobre o
processo de desenvolvimento na primeira infância e as políticas e intervenções efetivas para promover o
desenvolvimento na primeira infância. Descreve:
• por que é imprescindível que os esforços para melhorar a saúde, o bem-estar e o capital humano
comecem nos primeiros anos, desde a gravidez até os três anos de idade;
• as principais ameaças ao desenvolvimento da criança na primeira infância;
• como os cuidados de criação protegem as crianças pequenas dos piores efeitos da adversidade e
promovem o desenvolvimento físico, emocional, social e cognitivo;
• de que necessitam as famílias e os cuidadores para oferecer cuidados de criação às crianças
pequenas.
O Plano descreve como uma estratégia de todo o governo e toda a sociedade pode promover e fortalecer os
cuidados de criação das crianças pequenas. Destaca princípios norteadores, as ações estratégicas
necessárias e o monitoramento de metas e marcos essenciais para o progresso e o êxito.
As experiências no início da vida têm impacto profundo sobre o desenvolvimento infantil — afetam a
aprendizagem, a saúde, o comportamento e, por fim, as relações sociais, o bem-estar e a renda na vida
adulta. O investimento nos primeiros anos é um dos mais efetivos e eficientes que um país pode fazer para
eliminar a pobreza extrema e a desigualdade, estimular a prosperidade coletiva e criar o capital humano
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 4
necessário para a diversificação e o crescimento das economias. Um mundo cada vez mais digital valoriza
ainda mais as capacidades originadas na primeira infância, como a capacidade de raciocínio, a aprendizagem
contínua, a comunicação eficaz e a colaboração. As pessoas que não adquirem essas habilidades desde cedo,
facilitando a aprendizagem e a adaptação na infância e na adolescência, tendem a ser deixadas ainda mais
para trás. Sabemos que milhões de crianças pequenas não estão desenvolvendo todo o seu potencial por
causa de carências nutricionais, falta de amor e estimulação precoce, oportunidades limitadas de
aprendizagem precoce e exposição ao estresse. A boa notícia é que o acúmulo de conhecimentos científicos
e de implementação, convergente com o crescente compromisso global e nacional, está começando a
inverter a situação.
Por que este plano agora?
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
acolheram o desenvolvimento infantil como
essencial para catalisar a transformação que o
mundo busca alcançar até 2030. Nos ODS
relacionados com a fome, a saúde, a educação e a
justiça estão inseridas metas relativas a desnutrição,
mortalidade infantil, aprendizagem precoce e
violência — metas que, associadas a outras, definem
uma agenda para melhorar o desenvolvimento na
primeira infância. A Estratégia Global do Secretário-
Geral das Nações Unidas para a Saúde das Mulheres,
das Crianças e dos Adolescentes 2016–2030
sintetizou essa nova visão nos objetivos de
Sobreviver, Prosperar e Transformar. A
oportunidade de incentivar os investimentos no
desenvolvimento da criança na primeira infância
nunca foi tão grande como agora. Os governos e a
comunidade global de interessados diretos como um
todo assumiram compromissos no sentido de
alcançar os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável. Instituições mundiais, entre as quais
estão o Unicef, o Banco Mundial, a UNESCO e a
Organização Mundial da Saúde, priorizaram o
desenvolvimento da criança na primeira infância nos
seus programas do trabalho. Por esse motivo, é mais
urgente que nunca que trabalhemos em conjunto e
de maneira unificada em prol de objetivos comuns.
Este plano ajudará a guiar as ações necessárias para
obter resultados.
Que contribuição pode dar este
Plano?
Este Plano contém instruções estratégicas para apoiar o desenvolvimento holístico de crianças até 3 anos de
idade. A finalidade é inspirar múltiplos setores — inclusive nas áreas de saúde, nutrição, educação, proteção
social e infantil, água e saneamento, entre outros — sobre o que se pode modificar para atender às
Empregos e habilidades no futuro:
implicações para os cuidados de criação
Várias “megatendências” estão definindo o futuro. Precisamos considerar agora como os cuidados de criação das crianças nascidas hoje pode prepará-las melhor para o amanhã. Em resumo, os argumentos para investir na “infraestrutura da substância cinzenta” nunca foram tão fortes. As mudanças tecnológicas, sobretudo a automação (inteligência artificial), estão contribuindo para as modificações do trabalho da atualidade e dos empregos do futuro. Isso significa que os cuidados de criação precisam dar às crianças a segurança necessária para se prepararem para a incerteza e as mudanças, pois não há previsão clara das habilidades e competências que serão necessárias no futuro. Ao mesmo tempo, estamos vivendo mais e as pessoas idosas necessitarão de cuidados e proteção das crianças de hoje, que serão os adultos de amanhã. Além disso, em razão do aumento da sobrevida, algumas partes do mundo apresentam ou estão passando por um rápido crescimento da população jovem, que acarretará um número muito grande de adultos em idade economicamente ativa, que precisam ser capacitados para o futuro, não só para novos empregos, mas para novas relações sociais, incluindo a empatia necessária para cuidar dos outros. Isso significa que determinadas habilidades, em especial as habilidades socioemocionais e interpessoais, tendem a se tornar mais importantes que nunca, assim como as habilidades cognitivas de ordem superior (originalidade, fluência de ideias e aprendizagem ativa) que precisam ser combinadas à automação. Os alicerces das habilidades futuras são criados desde cedo, incluindo as habilidades sociais e de adaptabilidade, resiliência, curiosidade e confiança. Essa constatação reforça a defesa de investimentos nos primeiros anos para melhorar o capital humano. A formação de cérebros nunca foi tão importante.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 5
necessidades das crianças mais novas. Expressa a importância dos cuidados responsivos e da aprendizagem
precoce como componentes integrais da atenção de qualidade para crianças pequenas e ilustra como os
programas existentes podem ser melhorados para abordar de maneira mais abrangente as necessidades das
crianças pequenas. O Plano promove o uso de recursos locais, presume a adaptação ao contexto local e
promove a apropriação no âmbito da comunidade. Descreve os alicerces, as ações e a liderança do governo
que devem ser implementados para que todas as crianças alcancem seu potencial humano.
O Plano contém instruções estratégicas. Será complementado por orientação operacional e outros recursos
para facilitar o planejamento, a implementação e o monitoramento das ações propostas no âmbito nacional
(www.nurturing-care.org).
Público-alvo
Este Plano dirige-se a uma grande variedade de interessados diretos. Em primeiro lugar estão os
formuladores de políticas nacionais e os gestores de programas nos ministérios e departamentos de saúde,
nutrição, educação, proteção infantil e proteção social. Dirige-se também a grupos da sociedade civil,
parceiros de desenvolvimento, associações profissionais, instituições acadêmicas e iniciativas de
financiamento, mundiais e nacionais. Além disso, pretende ser uma fonte de inspiração para parlamentares,
prestadores de serviços, instituições educacionais, setor privado e meios de comunicação a respeito do
papel que podem desempenhar para assegurar que cada criança desenvolva todo o seu potencial. Por fim,
mas não menos importante, por meio desses canais de interessados diretos, o Plano dirige-se às famílias, aos
pais e a outros cuidadores que cuidam de crianças pequenas no dia a dia.
O Plano convoca todos os setores, e especialmente o setor da saúde, cujos serviços têm amplo alcance de
gestantes, famílias e crianças pequenas, a:
• colmatar lacunas no apoio às crianças mais novas, complementando o trabalho do setor de
educação em seus esforços para melhorar a educação pré-escolar;
• trabalhar em conjunto com a proteção social e a proteção infantil para assegurar a segurança
material e social das famílias e comunidades, bem como proteger as crianças pequenas da
negligência, da violência e do abuso;
• contribuir para a concretização dos direitos de todas as crianças, sobretudo as mais vulneráveis, e
assegurar que nenhuma criança, em nenhum lugar, seja deixada para trás.
Sabemos por que o desenvolvimento na primeira infância é
importante
Tanto a ciência do desenvolvimento na primeira infância quanto a economia do desenvolvimento do capital
humano destacam a importância dos três primeiros anos de vida como a base da saúde e do bem-estar ao
longo da vida para as gerações atuais e as subsequentes.
A ciência do desenvolvimento na primeira infância
Nas três últimas décadas, descobertas científicas convergentes em vários campos concluíram que elementos
cruciais da saúde, do bem-estar e da produtividade na infância na adolescência e na vida adulta têm suas
bases estabelecidas durante a gravidez e os três primeiros anos de vida. Quando um bebê nasce, seu cérebro
já tem quase todos os neurônios; aos 2 anos, uma enorme quantidade de conexões neuronais surge em
resposta à estimulação pelos cuidadores. As conexões não usadas nos primeiros anos se debilitam e são
perdidas. Esse rápido desenvolvimento cerebral (neuroplasticidade) durante um período muito curto no
ciclo de vida humano é estimulado por nosso modelo humano genético, estabelecido durante centenas de
milhares de anos, mas é comandado pelas experiências da criança pequena. Desde cerca de 8 semanas de
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 6
gravidez, o feto começa a experimentar o mundo, inicialmente pelo tato, e numa fase mais adiantada da
gravidez, pelos sentidos do paladar, da audição, do olfato e da visão. Esses canais sensitivos permitem que a
criança em desenvolvimento aprenda com o ambiente e se adapte, fisiológica e psicologicamente. Essa
aprendizagem adaptativa inicial, inclusive pela modificação da expressão de genes, é que torna cruciais os
primeiros anos. Embora esses processos de epigênese ocorram ao longo de toda a vida, é nos primeiros anos
que eles criam projetos para adaptações futuras ao ambiente.
Graças a esses processos iniciais de desenvolvimento, as experiências durante os três primeiros anos de vida
afetam significativamente o desenvolvimento durante a infância, a adolescência e a vida adulta, e até
mesmo o desenvolvimento humano na próxima geração.
A importância dos cuidados de criação para todos os recém-nascidos,
especialmente os prematuros
Os cuidados de criação começam antes do nascimento, quando as mães e outros cuidadores podem começar a conversar com o feto e cantar para ele. O feto em crescimento já escuta ao final do segundo trimestre de gravidez, e o bebê consegue reconhecer a voz da mãe após o nascimento. Imediatamente depois do parto, o contato de pele com pele, a amamentação e a presença de um companheiro para apoiar a mãe facilitam o surgimento do vínculo materno-infantil desde cedo e criam o alicerce para a nutrição ideal e interações e cuidados de qualidade. Pouco depois do nascimento, os bebês respondem ao ver rostos, sentir o toque delicado e ser colocados no colo, assim como ao som da fala dirigida a eles. Os cuidadores logo aprendem a atrair a atenção dos bebês para interações responsivas, essenciais para o desenvolvimento ideal do cérebro em rápido crescimento do bebê. As descobertas da neurociência e da psicologia do desenvolvimento mostram que essas práticas são muito benéficas para o desenvolvimento da criança na primeira infância, com efeitos duradouros. Desde os primeiros meses de vida, o tempo de qualidade passado com o bebê em atividades de conversar, contar histórias, ler livros, ouvir música e brincar produz benefícios a curto e longo prazo para o desenvolvimento cognitivo e socioemocional da criança. Embora sejam necessários para todos os bebês, os cuidados de criação são ainda mais necessários para os bebês vulneráveis. Infelizmente, com frequência eles recebem muito menos cuidados. Os pais precisam receber informações e orientação sobre a interação com bebês prematuros e de baixo peso ao nascer, pois seus comportamentos e respostas costumam ser menos previsíveis que os de bebês a termo. Sem os cuidados de criação, esses lactentes correm o risco de ter dificuldades durante o desenvolvimento. Essas dificuldades podem ser um problema ainda maior para os pais, já estressados pelo nascimento de um bebê “pequeno”. Por conseguinte, bebês prematuros e de baixo peso ao nascer podem receber menos atenção e, às vezes, ser negligenciados ou maltratados, com aumento do risco de desenvolvimento insatisfatório. Os serviços de saúde e os profissionais dessa área têm a responsabilidade específica de criar um ambiente favorável, antes do nascimento, por ocasião do parto e nos primeiros meses após o nascimento, com informações e orientação aos pais, além de apoio às famílias, sobretudo de bebês com problemas perinatais. As intervenções durante o período neonatal, como o método mãe-canguru (MMC), são efetivas na melhoria dos desfechos neonatais em bebês pequenos e têm efeitos benéficos comprovados ao longo de toda a vida. Entretanto, para que os benefícios sejam máximos, o MMC tem de ser acompanhado de cuidados de criação específicos e reforçados em casa. Do mesmo modo, o leite materno é o alimento ideal para quase todos os recém-nascidos e portanto, as mães de lactentes prematuros e de baixo peso ao nascer devem receber todo o apoio para a amamentação exclusiva desde o nascimento.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 7
A economia do desenvolvimento na primeira infância
As habilidades de aprendizagem e as competências pessoais e sociais básicas são adquiridas bem cedo, e as
competências subsequentes dependem desse alicerce. Além disso, as competências iniciais facilitam a
aprendizagem de novas habilidades, além de gerarem segurança e motivação para aprender ao longo da
vida. A intervenção precoce não só é efetiva como também torna mais custo-efetivas as intervenções
essenciais posteriores ao longo da vida e aumenta suas chances de êxito.
Os cuidados de criação, e as intervenções preventivas e promotoras para melhoria dos cuidados de criação
nos primeiros anos, têm mais resultados e menor custo que intervenções corretivas posteriores para tentar
compensar deficiências iniciais. Estudos a longo prazo em países de todo o espectro socioeconômico
revelam que programas nutricionais e psicossociais implementados durante os primeiros anos de vida têm
benefícios significativos para a saúde e o bem-estar, a escolaridade e a renda, as relações pessoais e a vida
social na vida adulta.
Se não houver intervenção, estima-se que a renda anual média de adultos que enfrentam adversidades na
primeira infância seja cerca de um terço menor que a de seus pares. Essa situação torna mais difícil que eles
e suas famílias melhorem de vida, acarretando debilitantes ciclos intergeracionais de pobreza. Esses custos
individuais se acumulam em toda a sociedade, restringindo a criação de riqueza e corroendo as receitas
nacionais. Estima-se que alguns países gastem menos em saúde atualmente do que a previsão de perda no
futuro em decorrência da elevada carga de deficiência do crescimento e do desenvolvimento na primeira
infância.
Em um estudo realizado na Jamaica, crianças com nanismo nutricional receberam suplementação alimentar
e estimulação cognitiva em visitas a domicílio. A estimulação foi mais firmemente associada a aumento de
renda na vida adulta. As crianças pequenas cujos pais haviam participado do estudo se desenvolveram
melhor que as crianças no grupo de controle, demonstrando benefícios intergeracionais. A renda anual de
adultos que receberam essa intervenção precoce na Jamaica, bem como daqueles que receberam uma
intervenção de suplementação nutricional na Guatemala, foi de 25% a 44% maior que a de participantes do
grupo de controle, que não tiveram acesso a nenhuma intervenção.
Comprovou-se também que as intervenções precoces melhoram consideravelmente a saúde cardiovascular
na vida adulta. Além disso, as habilidades interpessoais promovidas por relações afetuosas seguras com pais
e cuidadores geram empatia e autocontrole que inibem a criminalidade e a violência.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 8
Sabemos o que ameaça o desenvolvimento na primeira infância
Um ambiente ideal durante a
gravidez e os três primeiros
anos promove o
desenvolvimento físico,
emocional, social e cognitivo,
enquanto um ambiente
adverso prejudica o
desenvolvimento a curto
prazo e, o que é importante,
também a longo prazo. A
adversidade implacável,
também denominada
estresse tóxico quando
intensa, sem apoio e
oportunidades de
compensação ou recuperação, afeta o desenvolvimento psicológico e neurológico de crianças pequenas.
As ameaças ao desenvolvimento da criança podem ocorrer durante a gravidez, o parto, o período neonatal,
a lactância e a idade dos primeiros passos. Por exemplo, a adversidade durante a gravidez, com consequente
baixo peso ao nascer e parto prematuro, aumenta o risco de dificuldades do desenvolvimento e doenças
crônicas na vida adulta. Outros fatores que ameaçam o desenvolvimento na primeira infância são deficiência
nutricional materna, exposição a toxinas, infecção pelo HIV, problemas de saúde mental dos cuidadores,
amamentação insuficiente, desnutrição e nanismo nutricional, doenças, lesões, estimulação cognitiva
limitada, negligência e maus-tratos, deficiências e violência doméstica e comunitária.
Fatores de risco biológicos
Nascimento Prematuridade, complicações no parto Fatores intrauterinos Nutrição materna, infecções maternas, uso materno de substâncias, restrição do crescimento intrauterino Nutrição da criança Amamentação insuficiente, desnutrição proteico-calórica, carência de micronutrientes (iodo, ferro, zinco) Infecções da infância Parasitoses, infecção pelo HIV, malária, diarreia crônica Exposição ambiental ao longo da vida Metais pesados (chumbo e mercúrio), toxinas ambientais (arsênico, desreguladores endócrinos, pesticidas, bifenilas policloradas), poluição do ar doméstica Fatores de risco circunstanciais
Pais Depressão e saúde precária, baixa escolaridade, altos níveis de estresse
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 9
Condições da criança Cuidados insensíveis ou não responsivos; maus-tratos das crianças, inclusive castigos físicos; orfandade; situação de refugiado Família Oportunidades insatisfatórias de aprendizagem no lar, ambiente doméstico superlotado ou caótico, uso indevido de álcool e substâncias pelo cuidador, limitações econômicas, pobreza, exposição a violência, inclusive violência por parceiro íntimo Comunidade Violência na comunidade, má qualidade dos ambientes de cuidados iniciais fora do lar, falta de serviços de saúde e sociais, acesso limitado ou ausência de acesso a alimentos nutritivos, falta de acesso a saneamento ou a água limpa, estigmatização social de crianças com deficiências do desenvolvimento
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 10
A pobreza extrema e a luta pela sobrevivência em
condições de guerra e conflito tornam muito difícil
para as famílias cuidar das crianças pequenas;
também causam dificuldade a paternidade ou
maternidade precoce, as deficiências e
incapacidades, a violência familiar, o abuso de
substâncias e a depressão materna, entre outros.
Além disso, nessas condições aumenta a
probabilidade de exposição infantil a múltiplas
adversidades, incluindo serviços limitados. Os
cuidados de criação dependem de famílias
funcionais e dos sistemas de apoio a elas. A
adversidade e a falta de serviços de apoio podem
abalar a capacidade das famílias de oferecer
cuidados de criação às crianças pequenas. As
ameaças ao desenvolvimento da criança na primeira
infância tendem a se acumular, em geral associados
a pobreza, falta de serviços e exclusão social.
Portanto, a exposição a um risco costuma significar
exposição a múltiplos riscos.
Desse modo, a proteção, o apoio e a promoção do
desenvolvimento da criança na primeira infância
demandam a ação coordenada de múltiplos
parceiros de vários setores.
Sabemos que há um número
muito grande de crianças em
risco de ter um desenvolvimento
deficiente
Calcula-se que 250 milhões de crianças (43%) abaixo
de 5 anos de idade em países de baixa e média
renda correm o risco de ter um desenvolvimento
deficiente em razão da exposição não cumulativa à
pobreza extrema e ao nanismo nutricional. Estima-
se que 71 países tenham mais de 30% de crianças
pequenas em risco de aprendizagem deficiente,
educação insatisfatória e renda reduzida na vida
adulta. Quantidades sem precedentes de crianças
vivem em Estados frágeis e em condições de
violência, guerra, desastre e deslocamento.
Embora a quantidade de crianças em risco seja
maior em países com limitação de recursos, as crianças de todo o mundo podem ser expostas a adversidades
que prejudicam o desenvolvimento ideal. Portanto, essa agenda é verdadeiramente global.
Saúde mental dos pais
A boa saúde mental e a forte motivação do afeto são
importantes para que os cuidadores tenham empatia com as
experiências de uma criança pequena e controlem as próprias
emoções e reações à dependência do bebê sem hostilidade.
Os problemas de saúde mental em mulheres que estão
grávidas ou deram à luz recentemente estão entre as
morbidades mais comuns relacionadas com a gravidez. Nos
países de baixa e média renda, com limitação de recursos, a
prevalência de transtornos mentais perinatais comuns, entre
os quais estão os transtornos depressivos, de ansiedade e de
adaptação, é muito maior que nos países de alta renda por
causa de outros fatores de risco, como estresse
socioeconômico, gravidez não planejada, o fato de ser muito
jovem ou não ser casada, falta de empatia e apoio do parceiro
íntimo e a sujeição a violência ou hostilidade dos sogros. Entre
os fatores de proteção figuram o maior nível de instrução e o
trabalho remunerado seguro, além de um parceiro gentil e
confiável. A depressão também afeta o pai.
Os problemas de saúde mental afetam as emoções, a
concentração, o julgamento e o raciocínio; as mulheres
deprimidas são mais propensas a apresentar depressão do
humor, irritabilidade, pessimismo e dificuldade para expressar
carinho, afeto e prazer. Tendem também a apresentar
inquietações e ansiedade, inclusive acerca dos cuidados com o
lactente, que influenciam a interação social, até mesmo com o
bebê. A depressão materna foi diretamente associada a
maiores taxas de doenças diarreicas e respiratórias das
crianças, nanismo nutricional e internações hospitalares,
menor taxa de conclusão dos esquemas de vacinação
recomendados e pior desenvolvimento socioemocional de
crianças pequenas.
Intervenções efetivas para reduzir a depressão e promover a
saúde mental materna foram desenvolvidas e testadas em
países de baixa e média renda com poucos especialistas em
saúde mental; em geral, são implementadas por agentes
comunitários de saúde capacitados e sob supervisão
profissional. As intervenções destinadas a melhorar a saúde
mental materna têm impacto positivo na saúde e no
desenvolvimento do lactente, e as intervenções para promover
a saúde e o desenvolvimento do lactente têm impacto positivo
no humor materno. Os efeitos sobre a saúde e o
desenvolvimento do lactente são maiores quando há
integração dos componentes materno e infantil.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 11
Sabemos que as crianças pequenas necessitam de cuidados de
criação para desenvolver todo o seu potencial
Os cuidados de criação são aqueles que o cérebro do lactente
espera e dos quais depende para o desenvolvimento saudável.
Os cuidados de criação são o conjunto de condições que propiciam saúde, nutrição, proteção e segurança da
criança, cuidados responsivos e oportunidades de aprendizagem precoce. A criação significa manter as
crianças seguras, sadias e bem nutridas, dar atenção e responder a suas necessidades e interesses, incentivá-
las a explorar e dar a elas oportunidades para aprender. Para que sejam capazes de oferecer cuidados de
criação, os cuidadores devem ter segurança econômica e social, participar de redes sociais de apoio, ter
Situações humanitárias e cuidados de criação
Há uma necessidade urgente de integrar um plano de cuidados de criação a políticas, programas e serviços humanitários. Quantidades sem precedentes de crianças estão vivendo em condições da guerra, desastre e deslocamento, nas quais a concentração de adversidades aumenta o risco de comprometimento de desfechos do desenvolvimento capaz de limitar suas possibilidades ao longo da vida. Cerca de 250 milhões de crianças vivem em países afetados por conflitos armados, enquanto 160 milhões de crianças estão muito suscetíveis a crises de segurança alimentar e fome. Apesar dessa enorme necessidade, há grave carência de serviços de desenvolvimento da criança na primeira infância em situações humanitárias. Aproximadamente 2% do financiamento humanitário global destina-se à educação, por exemplo, e apenas uma diminuta fração deste é alocada para o desenvolvimento na primeira infância. Uma das ações mais importantes é a atenção ao cuidador para capacitá-lo a oferecer cuidados de criação. Ao longo da trajetória de crise e deslocamento, as crianças e famílias enfrentam riscos sem igual que ameaçam a capacidade dos cuidadores de oferecer esses cuidados. Antes da fuga ou do deslocamento, a exposição a desastres, conflitos, violência e guerras, incluindo experiências como a perda de membros da família, pode aumentar muito o estresse do cuidador e a insegurança econômica e arruinar seu bem-estar. Durante a fuga, as exposições adicionais à violência, a falta de acesso a serviços básicos, a falta de abrigo e a instabilidade podem influenciar ainda mais a capacidade das famílias de oferecer cuidados de criação para as crianças. Por fim, outros fatores pós-fuga ou pós-deslocamento dentro da comunidade de acolhimento são a instabilidade, a violência e a exclusão, que podem restringir o acesso a serviços de saúde, educação e proteção social e infantil. Mesmo que as famílias possam continuar em seus lares ou retornar a eles, o processo de restauração de estabilidade, proteção e segurança dentro das comunidades afetadas pode levar anos. Além disso, as próprias condições de emergência podem durar décadas, moldando toda a vida de gerações.
Quatro princípios são importantes nessas circunstâncias frequentemente caóticas e em rápida transformação:
1. Uma abordagem holística voltada para o bem-estar da família e da criança demanda atenção não só à proteção para garantir a sobrevivência, mas também à saúde mental, à nutrição e às oportunidades de aprendizagem, além da possível necessidade de serviços mais intensivos para famílias e crianças submetidas aos maiores níveis de adversidade e estresse.
2. O conforto da segurança e das rotinas deve ser restabelecido assim que possível, por meio de apoio familiar, programas de aprendizagem precoce e outros serviços.
3. O capital social das comunidades deve ser reconstruído, com atenção à coesão social e relações positivas encorajadoras entre os membros das comunidades deslocada e de acolhimento.
4. A elaboração de pesquisas, que respeitem as diferenças culturais e circunstanciais, para medição, implementação e avaliação dos cuidados de criação é vital para orientar a prática e a política em situações humanitárias.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 12
autonomia para tomar decisões de acordo com o princípio do melhor interesse da criança e estar
convencidos do importante papel que desempenham na vida das crianças sob seus cuidados.
Os cuidados de criação constam de cinco componentes
inter-relacionados e indivisíveis: boa saúde, nutrição
satisfatória, proteção e segurança, cuidados responsivos
e oportunidades de aprendizagem precoce. Nos primeiros
anos de vida, pais, membros da família imediata e
cuidadores são os mais próximos da criança pequena e,
portanto, os melhores provedores dos cuidados de
criação. É por esse motivo que o ambiente familiar seguro
é importante para as crianças pequenas. Para garantir aos
cuidadores tempo e recursos para oferecer cuidados de
criação, é necessário dispor de políticas, serviços e apoio
comunitário.
Muitos países já dispõem de serviços de saúde e nutrição,
bem como de medidas para a proteção e segurança,
embora com frequência seja preciso melhorar seu
alcance e sua qualidade.
Palavras da figura:
Componentes dos cuidados de criação
Boa saúde
Nutrição satisfatória
Cuidados responsivos
Proteção e segurança
Opportunidades de aprendizagem precoce
É menos comum a integração do apoio aos cuidados responsivos e às oportunidades de aprendizagem nos
pacotes de serviço; portanto, em muitas situações, esses componentes necessitam de investimento
específico e desenvolvimento de competências.
Os cuidados de criação não são importantes apenas para promover o desenvolvimento das crianças
pequenas; também protegem essas crianças dos piores efeitos da adversidade por meio da diminuição de
seus níveis de estresse e de mecanismos de encorajamento emocional e de enfrentamento cognitivo. São
especialmente importantes para crianças com dificuldades de desenvolvimento e deficiência, bem como
para a prevenção de maus-tratos de crianças. Podem ser incentivados e promovidos por leis, políticas,
serviços, atividades comunitárias e relações sociais que melhorem o ambiente, apoiem os pais e fortaleçam a
família e as relações entre pais e filhos.
Definições
Boa saúde
A boa saúde de crianças pequenas resulta de vigilância parental das condições físicas e emocionais da
criança, resposta afetuosa e apropriada a suas necessidades diárias, proteção das crianças pequenas de
perigos domésticos e ambientais, práticas de higiene que minimizam infecções, uso de serviços preventivos
e promotores da saúde, além de busca de atenção para doenças prevalentes da infância. Essas ações
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 13
dependem, por sua vez, do bem-estar físico e mental
de pais e cuidadores. Por exemplo, a anemia materna
por deficiência de ferro pode causar depressão e
apatia, com diminuição da capacidade da mulher de
se envolver nos cuidados de criação. A situação é
agravada quando a criança também é apática ou
indiferente em razão de desnutrição e anemia. Os
problemas de saúde mental dos pais tendem a
prejudicar a parentalidade e os cuidados, e sabe-se
que a depressão acomete até um terço das mulheres
grávidas ou que deram à luz recentemente,
sobretudo as que não têm apoio do parceiro ou da
família. Portanto, os cuidados de criação também
demandam atenção às necessidades dos cuidadores.
Nutrição adequada
A nutrição materna durante a gravidez afeta a saúde
e o bem-estar da mulher, assim como a nutrição e o
crescimento da criança em desenvolvimento. As
gestantes com carência de micronutrientes precisam
receber suplementos (inclusive ferro). As crianças
pequenas prosperam com amamentação exclusiva do
nascimento aos 6 meses de idade e contato corporal
próximo, ou contato de pele com pele, e início da
amamentação imediatamente após o nascimento. A
partir dos 6 meses, além do leite materno, as crianças
pequenas precisam de alimentos complementares,
com frequência e diversidade suficientes, que
contenham micronutrientes necessários para o
rápido crescimento físico corporal e cerebral. Os
suplementos de micronutrientes e o tratamento da
desnutrição são necessários quando a alimentação
diária não consegue manter o crescimento saudável.
Cuidados responsivos
Os cuidados responsivos incluem a sensibilidade aos
movimentos, sons e gestos da criança, além de sua
interpretação e resposta apropriada a eles. Os
cuidados responsivos são a base da proteção de
crianças contra lesões, do reconhecimento e da
resposta a enfermidades, da aprendizagem
enriquecida e da construção da confiança e de relações sociais. O conceito também foi aplicado à
alimentação responsiva, especialmente importante para a alimentação efetiva de lactentes de baixo peso ou
doentes. O relacionamento entre os cuidadores e uma criança pequena, quando ela ainda não aprendeu a
falar, é expresso por abraços, contato visual, sorrisos, sons e gestos. Essas interações agradáveis para ambos
Intervenções para apoiar os cuidados
responsivos e dar oportunidades para a
aprendizagem precoce
Lactentes e crianças muito pequenas dependem completamente dos cuidadores para reconhecer suas necessidades e responder a elas, não só relacionadas com a nutrição e segurança, mas também com a participação social, a estimulação cognitiva, as brincadeiras, a tranquilização e a regulação das emoções. Cuidadores efetivos observam os sinais da criança, interpretam o que eles indicam e respondem de maneira previsível e de acordo com a necessidade. Os cuidadores sensíveis, responsivos, previsíveis e afetuosos facilitam o desenvolvimento socioemocional inicial da criança, promovem o vínculo emocional seguro entre os pais e o lactente e ajudam a ampliar a capacidade cognitiva do bebê. Os cuidados de criação ajudam a proteger as crianças dos efeitos do estresse tóxico. As intervenções para promover cuidados responsivos e dar oportunidades de aprendizagem precoce devem: 1. Incentivar e apoiar o cuidador por meio de elogios e apoio a seus esforços de responder à criança. 2. Fortalecer a relação entre pais e filhos, destacando a preferência específica da criança por eles, e os gestos da criança pequena para se aproximar do cuidador, e mostrando como participar de atividades agradáveis que o cuidador e a criança podem fazer juntos. 3. Demonstrar e orientar brincadeiras e conversas entre o cuidador e a criança a partir de iniciativas da criança e incentivar o cuidador a falar com a criança sobre o que acredita que ela sente, vê, deseja e gosta. Os pacotes genéricos de orientação são essenciais para dotar os prestadores de serviço em diversos setores — saúde, educação, nutrição, atenção a crianças, emergências, proteção infantil e social, além de outros serviços para a família — de conhecimentos e habilidades para apoiar os cuidadores na capacidade de oferecer cuidados responsivos e oportunidades de aprendizagem precoce, tanto como parte dos contatos de rotina quanto daqueles com essa finalidade específica. Recomendações, apropriadas para a idade e o desenvolvimento, relativas a atividades lúdicas e de comunicação podem guiar os orientadores ao ajudarem os cuidadores a interagir de maneira responsiva com a criança e dar à criança oportunidades essenciais de aprendizagem precoce, com uso de objetos domésticos e brinquedos caseiros e por meio de conversas, canto e leitura conjunta de livros.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 14
criam um canal de comunicação pelo qual a criança pequena aprende a linguagem, forma conhecimentos e
conhece o mundo ao seu redor. Essas interações sociais estimulam as conexões no cérebro.
Os cuidados de criação ajudam a proteger as crianças dos efeitos do estresse tóxico. As intervenções para promover cuidados responsivos e dar oportunidades de aprendizagem precoce devem: 1. Incentivar e apoiar o cuidador por meio de elogios e apoio a seus esforços de responder à criança.
2. Fortalecer a relação entre pais e filhos, destacando a preferência específica da criança por eles, e os
gestos da criança pequena para se aproximar do cuidador, e mostrando como participar de atividades
agradáveis que o cuidador e a criança podem fazer juntos.
3. Demonstrar e orientar brincadeiras e conversas entre o cuidador e a criança a partir de iniciativas da
criança e incentivar o cuidador a falar com a criança sobre o que acredita que ela sente, vê, deseja e
gosta.
Oportunidades de
aprendizagem precoce
Às vezes se supõe erroneamente que
as crianças só começam a aprender
aos três ou quatro anos de idade,
quando entram jardim de infância ou
na pré-escola e começam a conhecer
cores, formas e letras. Na realidade, a
aprendizagem é um mecanismo inato
do ser humano que assegura nossa
boa adaptação a novas circunstâncias
e começa na concepção, a princípio
como um mecanismo biológico
(epigênese). Nos primeiros anos, a
aquisição de habilidades e
competências é interpessoal, ou seja,
ocorre no relacionamento com
outras pessoas por meio de sorrisos e
contato visual, conversas e canto,
demonstrações, imitações e
brincadeiras simples, como “acenar
com a mão para dar tchau”. As
brincadeiras com objetos domésticos
comuns (p. ex., canecas de metal,
potes vazios e panelas) podem ajudar
uma criança a aprender sobre o
contorno, a textura e a natureza dos
objetos e o que se pode fazer com
eles. Até mesmo um cuidador
ocupado pode adquirir motivação e
confiança para conversar com a
criança durante as refeições, o banho
e outras atividades da rotina
doméstica. Essas interações ajudam a
Prevenção dos maus-tratos de crianças
Os maus-tratos de crianças abrangem o abuso físico, sexual e emocional, bem como a negligência que ocorrem, na maioria das vezes, embora não somente, nas mãos de pais e cuidadores. Em escala mundial, estima-se que 23% das crianças sejam vítimas de abuso físico; 36%, de abuso emocional; 16%, negligência; e 18% das meninas e 8% dos meninos, de abuso sexual. Os maus-tratos e outras experiências adversas na infância podem ter efeitos fortes e duradouros sobre a arquitetura cerebral, o funcionamento psicológico, a saúde mental, os comportamentos de risco para a saúde (p. ex., tabagismo, abuso de álcool e drogas, sexo sem proteção, mais violência), as doenças não transmissíveis (p. ex., doenças cardiovasculares e câncer) e as doenças transmissíveis (como HIV e DST). A maior prevalência do castigo físico em que se golpeia uma criança com um objeto como uma vara, um cinto ou um sapato ocorre entre 3 e 4 anos de idade.
A prevenção dos maus-tratos de crianças é crucial para salvar cérebros, melhorar o desenvolvimento na primeira infância e criar as bases para a saúde e o bem-estar durante toda a vida. Apesar disso, as condutas baseadas em evidências para enfrentar os maus-tratos de crianças ainda são pouco desenvolvidas na maioria dos países de baixa e média renda, embora os esforços para remediar essa situação tenham se intensificado depois da inclusão na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da Meta 16.2 de “acabar com todas as formas de violência contra crianças”.
Em 2013, uma revisão sistemática sobre a efetividade das intervenções para os pais na redução da parentalidade abusiva e no aumento da parentalidade positiva concluiu que, embora a validade dos resultados da maioria dos estudos não fosse clara devido a riscos de viés, os resultados do dois estudos maiores e de maior qualidade sugeriram que as intervenções destinadas aos pais podem ser viáveis e efetivas na melhoria da interação entre pais e filhos e do conhecimento dos pais com relação ao desenvolvimento infantil nos países de baixa e média renda e, portanto, talvez sejam úteis para prevenção de maus-tratos de crianças nesses meios.
“INSPIRE: sete estratégias para pôr fim à violência contra as crianças” é um pacote técnico de intervenções baseadas em evidências, entre as quais estão intervenções de apoio a pais e cuidadores. A implementação desse pacote no âmbito nacional está no centro da estratégia da Parceria Global pelo Fim da Violência contra Crianças.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 15
criança a aprender sobre outras pessoas e a importância de levar em conta seus sentimentos e perspectivas.
Os cuidados afetuosos e protetores de adultos em ambiente familiar, com orientação nas atividades diárias,
e o relacionamento com outras pessoas propiciam importantes experiências de aprendizagem precoce para
as crianças pequenas.
Proteção e segurança
As crianças pequenas não podem proteger a si mesmas e são vulneráveis a perigos inesperados, dor física e
estresse emocional decorrentes de negligência e violência. Existem diversas políticas destinadas a proteger
as crianças, incluindo regulamentações de assentos para automóvel e tampas resistentes à abertura por
crianças em frascos de substâncias possivelmente nocivas. Quando começam a se deslocar sozinhas, elas
podem engolir e tocar objetos perigosos, e um ambiente sujo ou inseguro pode estar repleto de ameaças. As
crianças pequenas podem sentir medo extremo quando abandonadas ou ameaçadas de abandono ou
castigos. Em todo o mundo, as maiores taxas de castigos cruéis, como surras dolorosas com uso de objetos,
ocorrem em crianças que estão começando a andar. Todos esses casos acarretam níveis incontroláveis de
medo e estresse que podem programar os sistemas de resposta da criança pequena de maneiras que
acarretem desajustamento emocional, mental e social. As crianças podem se retrair socialmente, passar a
desconfiar de adultos ou exteriorizar o medo pela agressão de outras crianças. Os cuidados de criação
abrangem a garantia de proteção e segurança a crianças pequenas indefensas.
Sabemos como apoiar as famílias e os cuidadores para oferecerem
cuidados de criação
O desenvolvimento ideal da criança ao longo
da vida demanda cuidadores com tempo e
recursos para oferecer cuidados de criação. As
políticas, os serviços, a comunidade e a família
criam o ambiente propício, que facilita os
cuidados de criação. As convenções
internacionais promovem a paz, a segurança e
os direitos humanos; as políticas globais
promovem ambientes e práticas saudáveis; os
sistemas de proteção social do país proveem
segurança econômica e previdência social para
as famílias, além de políticas trabalhistas que
permitem às famílias se ausentar do trabalho
ou dispõem de instalações para alimentação e
cuidados das crianças pequenas. Os serviços de
saúde, educação e bem-estar social dão às
famílias, aos pais e aos cuidadores informações
necessárias sobre desenvolvimento infantil e
serviços, incluindo serviços especializados para
crianças com dificuldades de desenvolvimento.
O apoio aos pais é prestado por grupos
comunitários, comunidades religiosas e
serviços de saúde, educação e sociais. Visitas a
domicílio são feitas às famílias vulneráveis para
dar a elas apoio, informações, assistência, além
de estabelecer comunicação entre elas e famílias e crianças com necessidades comuns. Em cada nível, um
Saúde ambiental O acesso à água limpa, ao saneamento, a boas condições de higiene, ao ar limpo e a um ambiente seguro são essenciais para proteger a saúde infantil e favorecer seu desenvolvimento. A urbanização crescente, a industrialização e a mudança climática estão prejudicando os ambientes nos quais crescem as crianças. A criação de ambientes sustentáveis e a redução da exposição infantil a riscos ambientais modificáveis é um elemento decisivo da agenda de cuidados de criação e essencial para permitir que as crianças prosperem. Há evidências sólidas de que a exposição à poluição do ar interno e externo pode causar diversas doenças em crianças e adultos, inclusive condições respiratórias agudas e crônicas (p. ex., pneumonia e doença pulmonar obstrutiva crônica), câncer de pulmão, cardiopatia isquêmica e acidente vascular cerebral. A exposição a toxinas ambientais, mesmo em baixos níveis, pode acarretar considerável incapacidade. As toxinas como mercúrio e chumbo são nocivas para todos, mas as crianças pequenas são as mais vulneráveis. Seu sistema nervoso ainda está se desenvolvendo e absorve 4 a 5 vezes mais chumbo que o de adultos, enquanto o mercúrio pode afetar o desenvolvimento do cérebro de bebês ainda no útero. Esses poluentes e toxinas danificam o cérebro, afetam a cognição, o rendimento escolar e o comportamento socioemocional, além de causarem deficiência intelectual. A criação de ambientes saudáveis, verdes e sem toxinas garantirá o crescimento ideal das crianças pequenas.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 16
ambiente favorável possibilita os cuidados de criação das crianças pequenas pelas famílias e pelos
cuidadores.
No Quadro ** os serviços e as intervenções que abrangem os cinco componentes dos cuidados de criação
são apresentados junto com uma seleção de metas globais e de leis e políticas para ilustrar as interações
sinérgicas que criam ambientes favoráveis.
Compromisso com objetivos globais Circunstâncias favoráveis, incluindo as leis e políticas Serviços e intervenções
Boa saúde
Objetivo 3, meta 3.2: Até 2030, acabar com as mortes evitáveis de recém-nascidos e crianças menores de 5 anos, com todos os países objetivando reduzir a mortalidade neonatal para pelo menos 12 por 1.000 nascidos vivos e a mortalidade de crianças menores de 5 anos para pelo menos 25 por 1.000 nascidos vivos.
Acesso à atenção à saúde de qualidade.
Cobertura universal de saúde: quando todas as pessoas têm acesso a serviços de saúde de qualidade de que necessitam sem que isso cause dificuldades financeiras. É especialmente importante que os cuidadores e as famílias tenham acesso a uma grande variedade de serviços de saúde de qualidade nos estabelecimentos de saúde e nas comunidades, incluindo promoção, prevenção, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos.
Planejamento familiar Imunização materna
Prevenção e abandono do tabagismo e do uso de álcool e substâncias
Prevenção da transmissão materno-infantil do HIV
Apoio à saúde mental dos pais
Atenção pré-natal e ao parto
Prevenção do parto prematuro
Atenção essencial ao recém-nascido com atenção extra a bebês pequenos e doentes
Método mãe-canguru para bebês com `baixo peso ao nascer` Imunização infantil Detecção precoce de doenças ou condições incapacitantes (p. ex., visão, audição) Busca tempestiva e apropriada de atenção para crianças doentes
Atenção integrada às doenças prevalentes da infância
Atenção às crianças com dificuldades de desenvolvimento e deficiências
Nutrição satisfatória
Objetivo 2, meta 2.2: Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular os pobres e as pessoas em situação vulnerável, incluindo crianças, a alimentos seguros, nutritivos e suficientes durante todo o ano.
Segurança alimentar
Código Internacional de Comercialização de Substitutos do Leite Materno e Orientação correspondente: a comercialização indevida de produtos alimentícios é um fator importante que muitas vezes afeta negativamente a opção materna de amamentar corretamente. O Código e a Orientação sobre o fim da promoção indevida de alimentos para lactentes e crianças pequenas são instrumentos importantes para criar um ambiente geral que permita às mães escolher a melhor alimentação possível, com base em informações imparciais e isenta de influências comerciais, e ter pleno apoio nessa escolha.
Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC): os serviços de maternidade têm a importante função de apoiar as mães na criação de vínculo com o filho pelo contato corporal e na instituição de práticas ideais de amamentação pela colocação do bebê ao seio imediatamente após o nascimento, não administração de água e proibição da distribuição de amostras de fórmula. Os dez passos da IHAC descrevem condições essenciais para proteger, promover e apoiar a amamentação. A Iniciativa Comunidade Amiga da Criança amplia o apoio à amamentação além do estabelecimento de saúde.
Nutrição materna
Apoio à amamentação exclusiva e à continuação da amamentação após 6 meses
Apoio à alimentação complementar e transição apropriada para uma dieta saudável da família
Suplementação de micronutrientes para mãe e criança de acordo com as necessidades
Monitoramento do crescimento, e intervenção quando indicado
Eliminação de parasitos
Tratamento da desnutrição moderada e grave
Cuidados responsivos
Relacionados com todos os objetivos enumerados neste quadro
Acesso a informações e orientação sobre cuidados responsivos
Licença remunerada para os pais: a licença remunerada para os pais está associada a muitos benefícios para a saúde das crianças, inclusive apoio ao vínculo materno-infantil, aumento das taxas de início e duração da amamentação e aumento da probabilidade de vacinação e atenção preventiva aos lactentes. O
Contato de pele com pele imediatamente após o nascimento Método mãe-canguru para bebês de baixo peso ao nascer Alojamento conjunto da mãe e do lactente e alimentação sob demanda
Orientação e apoio para cuidados responsivos
Apoio à saúde mental das mães após o nascimento
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 18
pai de um recém-nascido se envolve mais com a criança pequena e assume mais responsabilidades de cuidados quando tem licença do trabalho.
Serviços de cuidados infantis acessíveis: o aumento do número de mulheres na força de trabalho, a grande quantidade de mães solteiras e a deficiência ou incapacidade de pais ou crianças tornam necessária a oferta de creches de qualidade e acessíveis.
Participação do pai, da família ampliada e de outros parceiros
Apoio social por famílias, grupos comunitários e comunidades religiosas
Serviços de apoio aos pais nas comunidades
Visitas a domicílio para famílias vulneráveis
Serviços especializados de bem-estar social para famílias afetadas por violência e abuso de substâncias
Oportunidades para aprendizagem precoce
Objetivo 4, meta 4.2: Até 2030, garantir que todas as meninas e meninos tenham acesso a um desenvolvimento de qualidade na primeira infância, cuidados e educação pré-escolar, de modo que eles estejam prontos para o ensino primário.
Acesso a informações, apoio e assistência sobre a oferta de oportunidades para aprendizagem precoce
Acesso universal à creche, pré-escola e educação primária de qualidade: a educação nos primeiros anos de vida, apropriada para o desenvolvimento, é crucial para o desenvolvimento cognitivo e social da criança e sua preparação para a escolaridade formal. É importante que as crianças de todos os grupos demográficos tenham acesso à pré-escola e à educação primária gratuitas, e ainda mais importante para crianças de populações vulneráveis, pois o estresse afeta negativamente a aprendizagem infantil.
Informação, apoio e orientação sobre oportunidades de aprendizagem precoce
Brincadeiras de cuidadores com crianças, grupos de leitura e contação de histórias
Brinquedoteca e biblioteca móveis
Creche e pré-escola de qualidade
Proteção e segurança
Objetivo 1, meta 1.2: Até 2030, reduzir pelo menos à metade a proporção de homens, mulheres e crianças, de todas as idades, que vivem na pobreza, em todas as suas dimensões, de acordo com as definições nacionais.
Objetivo 16, meta 16.2: Até 2030, acabar com abuso, exploração, tráfico e todas as formas de violência e tortura contra crianças.
Ambientes domésticos e comunitários limpos e seguros, padrões de vida mínimos
Proteção social e serviços sociais: auxílio financeiro na forma de subsídios sociais e pensões fornecem renda direta, regular e previsível aos lares pobres e vulneráveis. Eles são uma parte importante e crescente do bem-estar social em muitos países. A segurança de rendimentos reduz a pobreza doméstica, melhora o acesso à atenção à saúde, aumenta a cobertura de imunização e nutrição materna e infantil, além de promover a frequência escolar e o avanço acadêmico.
Apoio à renda: quando os cuidadores não têm renda suficiente, não conseguem atender às necessidades básicas das crianças, inclusive de saúde e educação, o que afeta o desenvolvimento na primeira infância. Uma remuneração mínima e outras formas do apoio à renda podem melhorar a vida de milhões de crianças cujos cuidadores trabalham na economia formal e informal.
Oferta de água limpa e saneamento
Boas práticas de higiene em casa, no trabalho e na comunidade Prevenção e redução de poluição interna e externa
Ambientes saudáveis, sem toxinas
Espaços familiares e de lazer seguros em áreas urbanas e rurais
Prevenção de violência familiar e por parceiro íntimo e serviços para essas situações
Princípios norteadores
Direito da criança de sobreviver e prosperar
O governo e a sociedade são obrigados a proteger os direitos das criança e assegurar seus cuidados familiares. O Plano de cuidados de criação está firmemente identificado com a aceitação universal do direito da criança, com todas as obrigações assumidas pelos Estados Partes na Convenção sobre os Direitos da Criança e o Comentário Especial 7 sobre o Desenvolvimento da Criança na Primeira Infância.
Não deixar nenhuma
criança para trás
A equidade está vinculada à concretização dos direitos humanos. É imprescindível que os governos assegurem a cobertura equitativa das intervenções, especialmente para os grupos populacionais excluídos, marginalizados ou com outras vulnerabilidades, que correm grande risco, como as crianças dos grupos de minorias, refugiados, usuários de drogas e profissionais do sexo. Nesse sentido, é fundamental assegurar que crianças com deficiências e crianças pequenas em situações humanitárias não sejam deixadas para trás. A cobertura universal e a inclusão dos grupos mais vulneráveis são decisivas para garantir que todas as crianças aproveitem todo o seu potencial de desenvolvimento.
Cuidados centrados na
família
Nos 2 a 3 primeiros anos de vida, os membros da família imediata são as pessoas sempre presentes e mais constantes na vida das crianças. Assim, eles são os principais cuidadores, mas, para oferecer cuidados de criação, as famílias, em todas as suas formas — biológicas e sociais — necessitam de apoio. Além da mãe, a participação do pai é vantajosa para a mãe, a criança pequena e a família mais ampla. As famílias estão no centro dos cuidados de criação de crianças pequenas.
Uma estratégia de toda a
sociedade
A natureza holística e a importância coletiva do desenvolvimento da criança na primeira infância demandam uma política abrangente, com inclusão de todos os agentes, entre os quais figuram os governos, a sociedade civil, as instituições acadêmicas, o setor privado e todos os participantes dos cuidados de crianças pequenas.
Cuidados de criação para crianças com
deficiência
As deficiências na infância representam um enorme peso emocional e econômico sobre a criança afetada e a família. Cuidar de crianças com deficiências é um desafio, principalmente nas circunstâncias em que a infraestrutura e o acesso a serviços e apoio são insatisfatórios. As crianças com deficiência têm necessidades complexas que demandam diversos serviços de saúde e sociais, além de apoio, de acordo com uma ampla avaliação dos recursos e das necessidades individuais e familiares, bem como de barreiras ambientais, e estimuladores da participação e do funcionamento das crianças e das famílias. A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde e o programa de Reabilitação Baseada na Comunidade contêm bons planos para elaborar e implantar intervenções holísticas em contextos locais, nas quais as crianças com deficiência e suas famílias tenham acesso regular a saúde, educação e oportunidades de aprendizagem precoce, com oferta de intervenções mais direcionadas e apoio de acordo com necessidades específicas. As estratégias direcionadas para equacionar as desigualdades na saúde para essas crianças e suas famílias concentram-se no fortalecimento dos serviços formais, em particular na atenção primária à saúde e nos serviços e apoios baseados na comunidade; na conscientização da comunidade para reduzir o estigma e melhorar o acesso à atenção; no apoio social por meio de grupos de pais e associações e do empoderamento dos cuidadores e das famílias. Os programas de capacitação de cuidadores oferecidos às famílias de crianças com deficiência buscam melhorar as habilidades dos cuidadores de realizar com as crianças atividades de comunicação, interações lúdicas e rotinas domésticas, aumentar a segurança no controle de comportamentos difíceis, reforçar o conhecimento sobre a condição da criança, além de estratégias de enfrentamento e resolução de problemas. Outros elementos do programa podem ser acrescentados segundo o comprometimento específico da criança e as necessidades da família.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 20
A mudança da política à ação demanda um esforço combinado e a participação de todos os setores da sociedade em âmbito local, nacional, regional e global. A apropriação conjunta e a responsabilidade coletiva assegurarão o alcance e o impacto desejados de intervenções bem planejadas e custo-efetivas.
Ação de todo o governo
Os cuidados de criação demandam uma estratégia de todo o governo na qual políticas de todos os setores contribuam sistematicamente para melhorar os cuidados de criação das crianças pequenas. Estruturas intersetoriais do governo podem facilitar a coordenação, identificar interesses mútuos e incentivar a colaboração e o intercâmbio de informações.
Transformação dos cuidados de criação em realidade
Visão
A oferta de um bom começo de vida para todas as crianças é cada vez mais urgente em um mundo digital e interconectado que avança muito depressa, onde não há igual distribuição da prosperidade e o desenvolvimento humano ótimo é essencial para a produtividade, a saúde e o bem-estar social. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) constituem uma oportunidade de conectar o desenvolvimento na primeira infância aos esforços para alcançar equidade, produtividade, prosperidade e crescimento sustentável em um futuro coletivo mais pacífico. A visão deste plano é
Um mundo no qual toda criança tenha a oportunidade de
desenvolver seu pleno potencial e nenhuma criança seja deixada
para trás.
Metas
A agenda de Desenvolvimento Sustentável oferece uma plataforma integrada para promover o
desenvolvimento da criança na primeira infância. Muitos dos objetivos e das metas dos ODS têm uma
influência direta sobre o ambiente de apoio e os serviços de que as crianças pequenas necessitam para se
desenvolver. Ao mesmo tempo, o desenvolvimento na primeira infância é fundamental para alcançar muitos
dos objetivos ambiciosos no plano dos ODS.
Portanto, os objetivos e as metas dos ODS
constituem um amplo guarda-chuva sob o qual
a visão dos cuidados de criação pode avançar.
A Estratégia Global para a Saúde das Mulheres,
das Crianças e dos Adolescentes extraiu 17
metas dos ODS, em torno dos objetivos de
Sobreviver, Prosperar e Transformar. Esse
subconjunto de metas está diretamente
associado com as ações necessárias para pôr
em prática este Plano de cuidados de criação e,
portanto, os países devem adotar todas elas.
No centro dos esforços estão as metas mais
estreitamente relacionadas aos principais
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 21
fatores de risco e ao objetivo final que este Plano pretende alcançar, a saber, que todas as crianças possam
desenvolver plenamente seu potencial. Portanto, cinco metas dos ODS são destacadas como marcos
especiais para a programação e o investimento nacional em apoio aos cuidados de criação.
Imagem anterior
1 Erradicação da pobreza
2 Fome zero
3 Boa saúde e bem-estar
4 Educação de qualidade
5 Igualdade de gênero
6 Água limpa e saneamento
7 Energia acessível e limpa
8 Emprego digno e crescimento econômico
9 Indústria, inovação e infraestrutura
10 Redução das desigualdades
11 Cidades e comunidades sustentáveis
12 Consumo e produção responsáveis
13 Combate às alterações climáticas
14 Vida debaixo d’água
15 Vida sobre a terra
16 Paz, justiça e instituições fortes
17 Parcerias em prol das metas
Estratégia global
Sobreviver
Prosperar
Transformar
Plano de cuidados de criação
• Objetivo 1, meta 1.2:
Até 2030, reduzir pelo menos à metade a proporção de homens, mulheres e crianças, de todas as
idades, que vivem na pobreza, em todas as suas dimensões, de acordo com as definições
nacionais.
• Objetivo 2, meta 2.2:
Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular os pobres e
pessoas em situações vulneráveis, incluindo crianças, a alimentos seguros, nutritivos e suficientes
durante todo o ano.
• Objetivo 3, meta 3.2:
Até 2030, acabar com as mortes evitáveis de recém-nascidos e crianças menores de 5 anos, com
todos os países objetivando reduzir a mortalidade neonatal para pelo menos 12 por 1.000
nascidos vivos e a mortalidade de crianças menores de 5 anos para pelo menos 25 por 1.000
nascidos vivos.
• Objetivo 4, meta 4.2:
Até 2030, garantir que todos os meninos e meninas tenham acesso a um desenvolvimento de
qualidade na primeira infância, cuidados e educação pré-escolar, de modo que eles estejam
prontos para o ensino primário.
• Objetivo 16, meta 16.2:
Até 2030, acabar com abuso, exploração, tráfico e todas as formas de violência e tortura contra
crianças.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 22
Essas metas devem ser prioridades máximas e os governos, com todos os interessados diretos, devem
elaborar planos de ação que as contemplem integralmente para ajudar a construir uma base sólida para os
cuidados de criação de toda criança.
Estratégia de implementação proposta
Todas as famílias necessitam de algum apoio, mas algumas famílias necessitam de todo o apoio possível.
Nem todas as crianças e famílias necessitam da mesma intensidade e diversidade de intervenções e serviços
para oferecer cuidados de criação às crianças pequenas. Todas as famílias necessitam de informação,
afirmação e estímulo. Às vezes, algumas famílias necessitam de mais apoio por meio de encaminhamentos,
recursos e amparo. Uma pequena parte das famílias necessita de apoio intensivo mais prolongado, por
exemplo, quando os pais ou as crianças passam por dificuldades duradouras. Este Plano reconhece três
níveis de apoio: universal, direcionado e indicado. Juntos, eles devem formar uma perfeita continuidade da
atenção, pois as famílias podem transitar entre eles, dependendo dos desafios que enfrentem em diferentes
períodos da vida.
As estratégias universais apoiam
os cuidados de criação e a
prevenção primária para todos.
Elas são promotoras e tentam
diminuir a probabilidade de
surgimento de problemas e a
necessidade de intervenção
posterior. Quando há
problemas, asseguram sua
identificação precoce e o
encaminhamento aos serviços
apropriados. O objetivo das
estratégias universais é
beneficiar todas as famílias,
cuidadores e crianças de um país
ou distrito. O princípio básico é a
expectativa de benefício para
todos sem levar em conta o risco ou os recursos financeiros. São exemplos de estratégias universais:
• Leis e políticas como registro de nascimento, proteção social e serviços de hospital amigo da criança.
• Serviços de informação ao público sobre desenvolvimento infantil e serviços para crianças,
divulgados por meios de comunicação de massa e por serviços da saúde, educação,
desenvolvimento social, extensão rural e outros que alcancem grande número de famílias.
• Integração de recomendações e orientações básicas sobre cuidados de criação aos contatos de
rotina dos cuidadores e das crianças pequenas com os serviços de saúde (p. ex., atenção pré-natal,
atenção pós-natal, imunizações, visitas a domicílio), educação (p. ex., educação de adultos), serviços
sociais (locais de pagamento de bolsas e pensões), setor religioso e grupos e serviços comunitários.
Alguns desses serviços têm usado vídeos em ambulatórios pré-natais e pós-natais com o objetivo de
sensibilizar todas as gestantes para a capacidade de seus lactentes e os meios para promover o
desenvolvimento da criança.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 23
As estratégias direcionadas concentram-se em
indivíduos ou comunidades em risco de
problemas posteriores por causa de fatores como
pobreza, desnutrição, gravidez na adolescência,
exposição ao HIV ou a violência, deslocamento ou
emergências humanitárias. O objetivo é diminuir
os efeitos prejudiciais do estresse e da privação
mediante o reforço da capacidade individual de
enfrentamento e a oferta de apoio extra. As
famílias e os cuidadores em risco necessitam de
acesso contínuo ao apoio universal e contatos
adicionais com prestadores de serviço treinados,
profissionais ou não, nos estabelecimentos de
saúde, nas comunidades ou em casa. Podem
necessitar também de outros recursos, como
benefícios financeiros. A avaliação contínua
assegura que as famílias e os cuidadores em risco
deixem o apoio direcionado quando prontos ou
tenham acesso ao apoio ainda mais especializado
das estratégias indicadas.
São exemplos de estratégias direcionadas:
• Programas de visita domiciliar a mães
muito jovens e seus filhos por meio de
serviços estendidos de equipes
profissionais ou por agentes comunitários
que são capacitados e adequadamente
incentivados e apoiados.
• Grupos de participação na comunidade
para idosos, pessoas com deficiência,
indivíduos socialmente isolados e outros cuidadores em risco.
• Creches de qualidade e custo acessível, por meio de centros comunitários ou outras formas de
cuidados organizados para crianças pequenas.
As estratégias indicadas ou direcionadas destinam-se a indivíduos, famílias ou crianças com necessidades
especiais, por exemplo, crianças pequenas sem pais, crianças nascidas com peso muito baixo, crianças com
desnutrição grave, deficiências e dificuldades do desenvolvimento ou crianças pequenas cuja mãe está
deprimida ou que vivem em lar violento. Essas famílias e crianças necessitam de serviços e assistência
especiais de acordo com as necessidades identificadas.
São exemplos de estratégias indicadas ou direcionadas:
• Tratamento e apoio em casos de depressão perinatal por meio de grupos de mães ou visitas
domiciliares a mulheres com exame de rastreamento positivo para depressão materna por
trabalhadores capacitados, profissionais ou não profissionais (da comunidade).
• Atenção de qualidade para lactentes prematuros com participação direta dos pais e interação de
cuidados desde o nascimento, com acompanhamento e monitoramento adequados nos primeiros
meses ou anos.
HIV e desenvolvimento na primeira
infância
O número de mulheres em idade reprodutiva que vivem com HIV está aumentando, graças à ampliação do acesso ao tratamento capaz de salvar vidas, mas infelizmente também a níveis persistentes de infecção de mulheres jovens. Em alguns países com elevada carga de HIV na África meridional, por exemplo, até um terço das crianças nasce de mulheres que vivem com o HIV. Mesmo com o tratamento que permite salvar vidas, as famílias afetadas pelo HIV enfrentam os desafios da doença crônica, do estigma e da pressão financeira causada pelas despesas com a doença e o tratamento. Em mulheres que vivem com HIV é maior a probabilidade de depressão durante a gravidez e depois do parto, mesmo quando o bebê não é infectado pelo HIV. Além desses riscos sociais e pessoais aos cuidados de criação e ao desenvolvimento na primeira infância, surgiram preocupações com os possíveis efeitos adversos da exposição do bebê ao vírus da imunodeficiência humana durante a gravidez e/ou os efeitos dos medicamentos antirretrovirais. Vários estudos relataram que bebês não infectados, mas expostos ao HIV correm maior risco de ser natimortos, ter baixo peso ao nascer e ser prematuros. Por sua vez, esses desfechos do parto estão associados a atrasos e dificuldades do desenvolvimento. As mulheres que vivem com HIV e seus filhos pequenos necessitam de apoio adicional. A ampliação com êxito de programas para evitar a transmissão materno-infantil do HIV oferece oportunidades excepcionais de integrar o apoio para os cuidados de criação. Vários programas na África meridional estão testando os benefícios não só para as crianças pequenas, da melhoria dos cuidados responsivos por meio de atividades lúdicas e de comunicação, mas também para a saúde mental das mulheres, a retenção e adesão ao tratamento e o uso ampliado dos serviços de saúde, incluindo o planejamento familiar.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 24
• Intervenções de reabilitação e apoio comunitário centradas na família para crianças com atrasos do
desenvolvimento e deficiências.
Cinco ações estratégicas
“Se não estiver fazendo nada, faça alguma coisa
Se estiver fazendo um pouco, faça mais
Se estiver fazendo muito, faça melhor.”
Michael Marmot
Os programas efetivos na melhoria do desenvolvimento da criança na primeira infância em países de alta,
média e baixa renda destacam sistematicamente um conjunto de boas práticas. Esta agenda requer o
compromisso político sólido e permanente do governo, impulsionado por um desejo de reduzir as
iniquidades, a pobreza e a injustiça social.
É necessário combinar políticas, serviços, conhecimento e motivação pública para capacitar as famílias a
oferecerem cuidados de criação. Os investimentos orientados por evidências devem criar ambientes
universalmente favoráveis e incluir a ênfase em comunidades, famílias e crianças com maior necessidade,
além de ser acompanhados por sólidos sistemas de monitoramento e mecanismos de prestação de contas.
Este plano propõe cinco áreas de ação em conformidade com essas boas práticas:
1. Organizar a iniciativa, criar consciência social e investir.
2. Reconhecer que as famílias e as comunidades estão no centro dos cuidados de criação.
3. Criar ambientes favoráveis por meio de políticas, informações e serviços.
4. Monitorar o progresso na implementação, os resultados e o impacto.
5. Reforçar evidências locais e inovar para expandir.
Em cada área de ação, as atividades específicas devem ser levadas adiante no âmbito nacional com a
liderança e a coordenação do governo.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 25
Ação estratégica 1 Organizar a iniciativa, criar
compromisso e investir em cuidados de criação
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 26
O apoio a famílias e cuidadores como
alicerce para o desenvolvimento na
primeira infância demanda
investimentos em políticas de apoio;
serviços de saúde, nutrição, saúde
ambiental, bem-estar social e
proteção infantil, além de recursos
comunitários como serviços
integrados de informação e
assistência. Requer compromisso
político sólido e permanente
associado a investimento efetivo.
Depende de uma estratégia conjunta
liderada pelo governo e coordenada
estreitamente entre diferentes
setores e níveis de governo; além
disso, inclui a colaboração de
instituições nacionais e internacionais
pertinentes e de outros interessados
diretos.
Para facilitar a perfeita
continuidade da
atenção entre os
setores: planejamento
conjunto,
implementação por
setor, monitoramento e
melhoria conjuntos.
As políticas, os serviços e as
informações em diferentes setores
devem ser alinhados, coordenados e,
quando oportuno, integrados. É
essencial que haja um órgão
coordenador nacional para dirigir a
visão e supervisionar os esforços,
inclusive nos âmbitos provincial,
municipal e comunitário. O aumento
da dotação orçamentária total para o
desenvolvimento na primeira infância,
dirigida aos três primeiros anos antes
da pré-escola, é uma medida crucial
que os governos precisam tomar, com uma distribuição equilibrada voltada para a qualidade e a cobertura
dos serviços.
Financiamento dos cuidados de criação
A instituição de ambientes de apoio e de sistemas, força de trabalho e infraestrutura para os cuidados de criação requer financiamento suficiente, sustentável, equitativamente distribuído, eficiente e flexível. O financiamento para os cuidados de criação nos primeiros anos provém de uma mescla de fontes públicas e privadas — incluindo contribuições substanciais das famílias em muitas circunstâncias. Essa mescla, combinada a modelos variados de prestação de serviço, requer coordenação, governança sobre a alocação de recursos e prestação de contas. Os aumentos de financiamento público são essenciais. Embora crescentes, os investimentos atuais na variedade de insumos necessários para os cuidados de criação (apoio aos pais, serviços de saúde e nutrição desde cedo, proteção e oportunidades de aprendizagem precoce), ainda são insuficientes. É necessário que os governos aumentem tanto a alocação quanto a eficiência do gasto de recursos domésticos por: defesa da priorização de investimentos cruciais no desenvolvimento de capital humano durante a gravidez e os três primeiros anos de vida de uma criança; diálogos políticos e apoio para o fortalecimento da gestão financeira pública de recursos para saúde, nutrição e educação. O financiamento por doadores (incluindo fundações e outras fontes) deve ser harmonizado e alinhado para apoiar a implementação de programas para os cuidados de criação, e doadores internacionais precisam se prontificar a aportar os recursos financeiros necessários para os países de baixa renda e aqueles afetados por conflitos e violência. O aumento da cobertura dos serviços de cuidados de criação e a melhoria contínua da qualidade e equidade dos serviços demandam um aumento do financiamento de todas as fontes. O setor privado pode ter importância crucial, com contribuições orçamentárias por meio de iniciativas de responsabilidade social empresarial (RSE) e da implementação de políticas e serviços de cuidados de criação para seus empregados. Por fim, o pagamento de creches e programas para a primeira infância com recursos próprios é comum nos meios de baixa renda, o que acarreta altas despesas domésticas e preocupação com a equidade. Além do pagamento habitual, as famílias podem receber pedidos de contribuição com alimentos e trabalho manual para ajudar a manter a infraestrutura, além de dinheiro para ajudar a cobrir os salários. Em alguns países, subsídios e uma escala progressiva de preços podem ajudar a reduzir a carga das famílias mais necessitadas. Os programas de transferência condicional de renda podem aumentar os rendimentos familiares e incentivar o uso dos serviços de cuidados de criação. Enquanto se trabalha em prol de um futuro no qual os governos priorizem e destinem financiamento suficiente a programas de qualidade que sejam implantados em larga escala e alcancem todas as crianças até três anos, há diversas oportunidades para obter os recursos financeiros necessários. Entre elas figuram financiadores bilaterais e multilaterais (Associação Internacional de Desenvolvimento); novos grupos de investidores como o Power of Nutrition; o Fundo de Reserva do Mecanismo Mundial de Financiamento para apoiar o movimento Cada Mulher, Cada Criança; e as fundações que procuram apoiar a oferta de cuidados de criação para crianças pequenas em muitas das regiões mais desfavorecidas do mundo.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 27
Ações propostas no âmbito nacional:
1. Convocar um mecanismo de coordenação multissetorial de alto nível, com inclusão de todos os
interessados diretos.
2. Avaliar a situação atual, incluindo as crianças em risco de desenvolvimento insatisfatório, ativos e
oportunidades de fortalecimento de serviços, além de recursos que possam ser aproveitados para
apoiar os cuidados de criação.
3. Desenvolver uma visão comum, estabelecer objetivos e metas, além de preparar um plano de ação
coordenado, se possível apoiado por uma política nacional integrada de desenvolvimento na
primeira infância.
4. Definir com clareza funções e responsabilidades para implementar o plano nacional em todos os
níveis e equipar as autoridades subnacionais e locais com os recursos para agir.
5. Preparar uma estratégia de financiamento a longo prazo, aproveitando os meios de financiamento
disponíveis que apoiam os componentes dos cuidados de criação
Ação estratégica 2 Reconhecer que as famílias e as
comunidades estão no centro dos cuidados de
criação
Dar visibilidade a um problema invisível.
Para que o compromisso político, as políticas e o investimento em saúde e outros setores tenham um
impacto duradouro no desenvolvimento infantil, é indispensável que os cuidadores sejam orientados e
capazes de agir e que disponham de recursos jurídicos quando os direitos não forem respeitados. O
empoderamento de mulheres, famílias e comunidades é essencial para melhorar os cuidados de criação,
combater a pobreza e prevenir e tratar a desnutrição. A comunicação, o engajamento e a participação são
indispensáveis para dar visibilidade a um "problema invisível", definir metas simples e de fácil compreensão,
demonstrar como elas podem ser alcançadas e o que cada um pode fazer para alcançá-las.
A responsabilidade social aumenta a conscientização da comunidade sobre seus direitos e demandas de
serviço. As leis, combinadas a comitês de saúde e outros, orçamento e monitoramento participativo,
avaliação pelos cidadãos e ouvidorias são alguns dos mecanismos que têm sido usados efetivamente nos
países com o objetivo de dar autonomia às comunidades e famílias para que demandem maior quantidade e
melhor qualidade dos serviços e para contribuir para sua implementação e melhoria.
As intervenções de empoderamento das mulheres e comunidades para criar um ambiente de apoio e
fortalecer as práticas de atenção domiciliar incluem a prática da aprendizagem e ação participativa em
grupos de mulheres, visitas a domicílio de profissionais, enfermeiros ou agentes comunitários de saúde,
além de orientação por meio de serviços comunitários e nos estabelecimentos de saúde.
É importante que haja uma estratégia sólida de comunicação liderada pela sociedade civil, pelo governo e
por parceiros internacionais. O objetivo é a ampla informação e conscientização sobre a importância e as
vantagens sociais de possibilitar que as crianças pequenas desenvolvam todo o seu potencial, como as
crianças aprendem e se beneficiam da participação de pais e cuidadores e como isso melhora a saúde, a
renda e a participação como cidadãos produtivos na vida adulta. A estratégia deve procurar dar autonomia a
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 28
líderes e cidadãos em todos os níveis para que triunfem por mérito próprio, motivá-los a liderar a mudança,
ser responsáveis pelo progresso e cobrar resultados dos que detêm o poder.
Ações propostas no âmbito nacional:
1. Garantir que as vozes, crenças e necessidades das famílias sejam incorporadas a planos locais e
nacionais.
2. Mobilizar vencedores locais para que adotem os cuidados de criação e impulsionem a mudança em
sua comunidade.
3. Fortalecer estratégias nacionais de comunicação a fim de empoderar as comunidades e as famílias
para promover e apoiar os cuidados de criação.
4. Assegurar que municípios e comunidades
tenham acesso a recursos técnicos e financeiros
que possibilitem a eles promover, apoiar e exigir
serviços de cuidados de criação de qualidade e
adequados às circunstâncias.
5. Apoiar a prestação de contas por meio de leis,
orçamento e monitoramento participativo, bem
como outros mecanismos geradores de
transparência de recursos e resultados.
Ação estratégica 3 Criar
ambientes de apoio por
meio de políticas,
informação e serviços
As famílias e os cuidadores necessitam de sistemas
integrados de apoio aos cuidados de criação. Todos os
cuidadores de crianças pequenas necessitam de
informações básicas e algum nível de apoio. As
comunidades e famílias em risco necessitam de apoio
adicional, como benefícios materiais ou financeiros e
contatos mais frequentes com um prestador de serviço
ou orientador qualificado. As crianças com dificuldades
do desenvolvimento e deficiências, expostas à violência,
abuso, negligência ou dissolução familiar e as famílias em
conflito e outras condições de emergência necessitam de
serviços especializados.
O sistema de saúde, com seu extenso alcance de
cuidadores e crianças pequenas, precisa avançar para
complementar o trabalho da educação na oferta de
escola pré-primária e na proteção social e infantil ao
ajudar famílias em situação de pobreza e que enfrentam dificuldades sociais e de outros tipos.
Pontos de contato para apoio aos
cuidados de criação
As evidências indicam que os profissionais que trabalham com famílias podem ser treinados para promover e apoiar o desenvolvimento na primeira infância e criar habilidades de cuidados durante os serviços que já prestam. Entre os exemplos estão agentes comunitários de saúde, assistentes sociais, trabalhadores de creches, pediatras e outros que trabalham com crianças com deficiências do desenvolvimento. Portanto, o apoio aos cuidados de criação pode ser plenamente integrado a serviços existentes como mecanismo para fortalecer as habilidades das pessoas que trabalham com famílias de crianças pequenas. O apoio aos cuidados responsivos e à aprendizagem precoce pode ser integrado a diversos serviços governamentais e não governamentais existentes, entre eles:
• Saúde e nutrição infantil: atenção preconcepção, atenção pré-natal, atenção pós-natal, imunização, monitoramento do crescimento, atenção às doenças prevalentes da infância, orientação e suplementação nutricional, reabilitação nutricional, serviços para crianças com dificuldades do desenvolvimento ou deficiências.
• Educação: educação secundária; educação de adultos; creches e centros para crianças, pré-escola, serviços para crianças com dificuldades do desenvolvimento ou deficiências.
• Proteção social: programas de apoio à renda, sistemas de seguro-saúde, programas laborais, cuidados das crianças fora do meio familiar.
• Proteção infantil: serviços para as crianças em risco de negligência e maus-tratos.
Esses pontos de contato introduzem, apoiam e reforçam serviços prestados diretamente para a promoção específica dos cuidados de criação.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 29
Existem muitas oportunidades para fortalecer os serviços existentes. Muitos serviços têm contato com as
famílias e os cuidadores, como os projetos humanitários, de extensão rural e de água, saneamento e higiene.
Esses podem ser otimizados para a abordagem holística dos cuidados de criação.
Em geral, a atenção a todos os domínios dos cuidados de criação demanda a revisão do material e dos
instrumentos pertinentes para assegurar a boa utilização dos pontos de contato para prestação de serviços
integrados. Isso demanda conscientização, criação de material e recursos informativos, bem como
treinamento. Em muitos casos, também é necessário desenvolver novas competências da força de trabalho,
fortalecer os sistemas de encaminhamento para famílias e crianças que precisam de apoio adicional e
atualizar os sistemas de informação de saúde e outros com indicadores que acompanhem a qualidade e a
cobertura das intervenções de apoio aos cuidados de criação. O entendimento comum dos setores sobre o
significado e a configuração dos cuidados de criação garantirá a uniformidade do conteúdo e das
competências desejadas no material, nos currículos, na força de trabalho e nos serviços.
Se houver participação de agentes comunitários de saúde, é imprescindível assegurar remuneração
adequada e vinculação a serviços de atenção à saúde e especializados formais.
Há muitos ensinamentos a extrair do projeto piloto e de ampliação e dos estudos de intervenção e
implementação sobre maneiras de criar sistemas para os cuidados de criação. Pode-se aprender também
com países que instituíram sistemas nacionais para promover o desenvolvimento na primeira infância ou
estão em processo de expansão. É indispensável que a consolidação de boas práticas seja uma característica
central das estratégias para criar sistemas, e a adaptação de estratégias genéricas às circunstâncias nacionais
e locais é crucial para o êxito.
Ações propostas no âmbito nacional:
1. Identificar oportunidades para fortalecer os serviços existentes em diversos setores, incluindo
educação, saúde, proteção infantil e social, agricultura e meio ambiente.
2. Atualizar os padrões nacionais e os pacotes de serviço para que reflitam os cinco componentes dos
cuidados de criação.
3. Atualizar os perfis de competência e reforçar a capacidade da força de trabalho para dar apoio
holístico aos cuidados de criação.
4. Reforçar as capacidades de monitoramento do desenvolvimento infantil e estabelecer a perfeita
continuidade dos serviços de referência.
5. Providenciar mentoria e supervisão de pessoal treinado, criar recursos nacionais de excelência e
assegurar serviços de qualidade.
Ação estratégica 4 Monitorar o progresso da
implementação, os resultados e o impacto de todos
os componentes dos cuidados de criação
Para a implementação efetiva de políticas, programas e serviços para o desenvolvimento da criança na
primeira infância, são essenciais a medição e a prestação de contas. Os sistemas efetivos de monitoramento
têm de seguir a estrutura lógica que corrobora a visão e o plano de ação nacional, além de abranger
insumos, produtos e resultados. O monitoramento deve ser uma responsabilidade comum dos interessados
diretos de todos os setores.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 30
Muitos indicadores relacionados com os cuidados de criação já são parte de sistemas rotineiros de
informação em saúde e são acompanhados nos países, por exemplo, os indicadores relacionados com saúde
e nutrição. Quanto a outros componentes dos cuidados de criação, em especial os cuidados responsivos e a
aprendizagem precoce, é preciso integrar aos planos e sistemas nacionais de monitoramento novos
indicadores de acompanhamento do progresso individual e populacional.
A escolha dos indicadores depende das prioridades estratégicas específicas e é limitada por considerações
práticas e pelas fontes de dados disponíveis. Os países precisarão selecionar indicadores pertinentes para
complementar os indicadores genéricos recomendados pelos ODS e a Estrutura de Monitoramento da
Estratégia Global com os objetivos de identificar com clareza se há progresso na forma prevista e de fornecer
informações para apoiar a gestão cotidiana do programa e o processo de decisão.
Os sistemas de coleta de dados, bem como o uso e a notificação dos dados coletados devem ser planejados
desde o início dos esforços. Dados desagregados, inclusive por sexo, idade, renda/patrimônio, raça, etnia,
estado migratório, deficiências e localização geográfica, são necessários para fornecer informações sobre
iniquidades e permitir a concentração nas populações em risco.
A coleta rotineira de dados tem um custo em termos de tempo do pessoal e outros recursos; portanto, cada
ponto de coleta de dados deve estar relacionado a um mecanismo de decisão específico e devem-se alocar
fundos suficientes para permitir o acompanhamento da ação.
Os cartões de pontuação e painéis são instrumentos úteis para a apresentação de dados aos formuladores
de políticas, à equipe do programa e aos prestadores de serviço, bem como aos meios de comunicação, à
sociedade civil e aos parlamentares. Podem facilitar a comunicação e o uso de dados no processo de
decisão.
Existem várias áreas críticas com necessidade de pesquisa e investimentos para desenvolver melhores
métodos e instrumentos de medição, por exemplo, monitoramento populacional do desenvolvimento de
crianças de 0 a 3 anos. Mais detalhes sobre uma estrutura de resultados genéricos e possíveis indicadores e
métodos de medição serão colocados à disposição na orientação operacional (www.nurturing-care.org) .
Ações propostas no âmbito nacional
1. Combinar os indicadores que serão monitorados para acompanhar o progresso do desenvolvimento
na primeira infância, de acordo com o plano nacional.
2. Atualizar os sistemas de informação de rotina para incluir os indicadores com desagregação
pertinente e capacitar os trabalhadores da linha de frente para medição.
3. Disponibilizar os dados em formato simples de usar para todos os interessados diretos.
4. Apoiar a avaliação populacional periódica do desenvolvimento infantil, das práticas de cuidados
domiciliares e dos fatores de risco para cuidados de criação.
5. No processo de decisão, usar dados sobre programas para cuidados de criação, inclusive pela análise
multissetorial anual do progresso.
Ação estratégica 5 Reforçar evidências locais e
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 31
inovar para expandir os cuidados de criação
Para alcançar o bem-estar holístico de crianças pequenas, são necessárias evidências sobre grupos efetivos
de intervenções. As intervenções nas áreas de saúde, nutrição, proteção e segurança, cuidados responsivos
e aprendizagem precoce podem ser integradas em um único pacote ou sua prestação pode ser coordenada
dentro dos serviços multissetoriais e entre esses serviços. São necessárias mais evidências das ciências que
estudam o neurocomportamento, a saúde e a nutrição para saber quais intervenções devem ser oferecidas e
determinar quais são a melhor ocasião e a melhor maneira de combiná-las ou oferecê-las de maneira
integral.
Embora a pesquisa no âmbito global seja decisiva para gerar mais evidências sobre intervenções efetivas e
sua execução em apoio ao desenvolvimento na primeira infância, os países precisam investir em pesquisa de
implementação para adaptar aos contextos locais inovações criadas e experimentadas em estudos
controlados.
Os métodos da ciência de implementação possibilitam que a equipe do programa aprenda sobre obstáculos
à expansão com qualidade e a identificar soluções por meio de ciclos de aprendizagem rápida e melhoria
contínua da qualidade. As questões de implementação comuns também dizem respeito à criação de
demanda para intervenções de cuidados de criação de qualidade nas comunidades e nos sistemas de saúde;
cálculo do custo adicional de oferecer novas intervenções dentro dos sistemas existentes; identificação de
indicadores de monitoramento que podem ser acrescentados aos sistemas existentes de dados de saúde
para orientar o progresso e impacto; e determinação do impacto de acrescentar novas intervenções a
sistemas existentes de prestação de serviços.
A reunião de evidências locais para operacionalizar os cuidados de criação nos sistemas de saúde e em
outros sistemas exigirá parcerias entre equipes multidisciplinares de pesquisadores, executores e
formuladores de políticas. A estimulação da liderança em pesquisa nacional e a definição de prioridades
serão essenciais. A viabilização da revisão por pares e da aprendizagem conjunta é importante para o
compartilhamento de boas práticas e o enfrentamento de problemas de implementação.
Ações propostas no âmbito nacional:
1. Promover a colaboração de implementadores do programa e cientistas para gerar evidências locais
para cuidados de criação.
2. Acompanhar evidências globais das medidas que funcionam e como apoiar os cuidados de criação.
3. Usar evidências locais e globais para orientar inovações para ampliação.
4. Apoiar uma plataforma nacional de aprendizagem e formar comunidades de prática para possibilitar
a aprendizagem por pares.
5. Documentar os achados e resultados e disponibilizá-los para domínio público global.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 32
Funções e responsabilidades
Contribuições de setores e circunscrições
O desenvolvimento na primeira infância é fundamental para o desenvolvimento humano, que interessa a
todos na sociedade. Os impactos não podem ser alcançados por apenas um setor. Esta seção concentra-se
nos três setores em maior contato com as famílias e crianças —saúde, educação e proteção social e infantil.
Entretanto, embora o setor de saúde tenha muitos pontos de contato com as gestantes, as famílias e os
cuidadores das crianças pequenas, uma estratégia de todo o governo exige ações em outros setores,
inclusive nas áreas de nutrição, educação, proteção infantil, bem-estar social, agricultura, trabalho, água e
saneamento.
Do mesmo modo, a participação de todos os interessados diretos é essencial e deve incluir cuidadores e
famílias, comunidades e municípios, prestadores de serviço e gestores setoriais, líderes políticos e sociedade
civil, doadores e setor privado.
A função do setor de saúde
Com frequência, o setor da saúde não é visto como um agente importante para o desenvolvimento da
criança na primeira infância, mas os serviços geralmente oferecidos por trabalhadores da saúde durante a
gravidez e nos três primeiros anos de vida da criança ocorrem na ocasião perfeita para abordar o
desenvolvimento na primeira infância. O contato com o serviço de saúde durante a atenção pré-natal pode
assegurar os nutrientes adequados no útero para propiciar o desenvolvimento cerebral, bem como prevenir
traumatismos por ocasião do parto e riscos para a saúde materna associados ao parto domiciliar. A
promoção e o apoio da amamentação ao nascer favorecem o vínculo e a continuação da amamentação
exclusiva, com melhoria do desenvolvimento mental da criança. O contato com cuidadores nas ocasiões de
vacinação das crianças dá oportunidades para orientá-los sobre a importância dos cuidados afetuosos e da
estimulação. Os serviços prestados a crianças em risco, como programas de reabilitação para lactentes com
desnutrição aguda ou de baixo peso ao nascer são plataformas importantes para orientação sobre cuidados
responsivos e aprendizagem precoce.
A seguir, são apresentadas cinco recomendações sobre a maneira como o setor de saúde pode ajudar a
promover cuidados de criação:
1 Garantir o acesso a serviços de saúde e nutrição de qualidade para mulheres e crianças pequenas.
Como muitas intervenções nas áreas de saúde e nutrição têm impacto direto sobre o desenvolvimento
infantil, é preciso implementá-las em altos níveis de cobertura e com qualidade. A campanha pela cobertura
universal de saúde enseja a oportunidade de assegurar que os pacotes de serviço da atenção contínua para
mulheres e crianças pequenas sejam acessíveis, efetivos e de baixo custo.
2 Tornar os serviços de saúde e nutrição mais responsivos para apoiar os cuidados de criação. O apoio
aos cuidados responsivos, as oportunidades de aprendizagem precoce e a saúde mental dos pais devem ser
efetivamente integrados em pacotes de serviços de atenção pré-natal, atenção pós-natal, consultas de
crianças enfermas e sadias em quaisquer outros pontos de contato apropriados em que as famílias tenham
contato com serviços. Isso melhora a qualidade dos serviços de rotina, além de contribuir para a satisfação
do cuidador e sua demanda de serviços. É necessário ainda que os serviços de saúde respondam às crianças
com necessidades especiais e detectem se são vítimas, ou se há risco, de maus-tratos.
3 Estender o alcance a famílias e crianças em maior risco de desenvolvimento insatisfatório. As famílias
e crianças em risco de desenvolvimento insatisfatório serão beneficiadas por contatos adicionais
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 33
direcionados além dos serviços de rotina. Demonstrou-se que a visita a domicílio e os grupos de
aprendizagem participativos efetivamente ajudam as famílias e crianças a superar os desafios dos cuidados
de criação. Os agentes comunitários de saúde capacitados podem desempenhar um importante papel nesse
apoio, como extensão da atenção prestada em serviços de saúde. (Quadro)
4 Instituir atenção de referência e serviços especializados para famílias e crianças com dificuldades do
desenvolvimento e deficiência ou em risco de maus-tratos. Além de fortalecer os serviços de rotina e
direcionados, os países devem investir em competências e serviços locais que atendam às necessidades de
famílias e crianças com indicação de apoio especial, como crianças com dificuldades do desenvolvimento ou
deficiência, cuidadores com doença mental e crianças com condições de saúde crônicas ou em risco de
maus-tratos. Estes podem incluir os cuidados por não especialistas, que demonstraram efetividade na
melhoria da comunicação e das habilidades adaptativas das crianças ao mesmo tempo em que promoveram
o bem-estar, a autoconfiança, as habilidades parentais e o conhecimento dos cuidadores.
5 Colaborar com outros setores para assegurar a continuidade da atenção para os cuidados de criação.
Para criar um ambiente favorável, no qual nenhuma família ou criança seja deixada para trás, o setor de
saúde precisa colaborar com outros setores para assegurar que famílias e crianças, em particular as mais
vulneráveis, sejam apoiadas por um conjunto completo de redes de segurança. Creche de baixo custo e de
qualidade, incentivos financeiros para famílias pobres, ambientes limpos e sem risco, além de condições de
trabalho “amigas da criança” são alguns exemplos dessa colaboração.
A função do setor de educação
Tradicionalmente, o setor de educação sempre se preocupou mais com crianças maiores, e somente nos
últimos anos começou a incluir crianças pré-escolares. Ainda assim, as instituições de educação podem ter
uma função importante no apoio a crianças menores de 3 anos. Um grande número de crianças é atendida
em creches, algumas de apenas 2 ou 3 meses, enquanto os cuidadores buscam emprego ou vão trabalhar.
Os profissionais das creches necessitam de treinamento e supervisão para cuidar dessas crianças. Como é
cada vez maior o número de crianças pequenas matriculadas em pré-escolas em todo o mundo, os currículos
e os programas de estudos gerais devem ser adequados ao seu grau de desenvolvimento, e não um
“rebaixamento” do currículo destinado a crianças mais velhas. A seguir, são apresentadas cinco
recomendações sobre a maneira como o setor de educação pode ajudar a promover cuidados de criação:
1 Reforçar o fato de que a educação começa ao nascer. A aprendizagem não espera até que as crianças
cheguem à porta da escola. A aprendizagem começa em casa. Os programas comunitários de atenção
infantil e os grupos de pais podem ser núcleos importantes para promover experiências de aprendizagem
precoce em casa e nos programas de atenção infantil. Esses primeiros momentos criam as bases para a
aprendizagem durante toda a vida, apoiando o desenvolvimento cognitivo, físico, social e emocional. O
melhor é que as oportunidades de aprendizagem precoce ocorram em uma atmosfera que promova
curiosidade, motivação, forte autoconceito, autorregulação e valorização da linguagem e cultura doméstica.
Por meio da participação e do início precoce, os parceiros de educação podem ajudar a assegurar a
continuidade da mensagem e do apoio aos cuidados de criação ao longo dos primeiros anos — em casa, nos
programas de atenção infantil, na pré-escola e na escola primária.
2 Assegurar boas práticas de saúde, higiene e nutrição adequada em toda pré-escola e em outros
programas para a primeira infância. Os programas de atenção infantil, as pré-escolas e outros programas
para a primeira infância constituem um ótimo ambiente para oferecer refeições ou lanches nutritivos,
possibilitar ampla atividade física, praticar boa higiene e promover melhores práticas de alimentação e
nutrição em casa. As parcerias entre agentes de saúde, higiene e nutrição também facilitam o
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 34
monitoramento do crescimento, do desenvolvimento físico, de práticas de higiene e do bem-estar geral de
crianças pequenas nesses ambientes.
3 Incluir a participação familiar como parte central de programas de primeira infância de qualidade.
Embora tradicionalmente a educação tenha se concentrado nas crianças, há cada vez mais evidências da
importância da participação familiar na pré-escola e em programas de atenção infantil. A atuação voluntária
de pais, a voz dos pais no processo de decisão, a educação dos pais e a formação de redes de contatos
promovem o empoderamento e a consequente confiança da família na importante função que
desempenham na vida das crianças, o que abrange tanto as crianças inscritas nos programas quanto as
crianças mais novas em casa. Obstáculos financeiros podem limitar a participação infantil nos programas
disponíveis. Quando as famílias são valorizadas e incluídas no planejamento e na execução do programa, há
oportunidade de elaborar programas apropriados para as circunstâncias, de baixo custo e de qualidade.
4 Integrar crianças com necessidades especiais e estender aos mais vulneráveis. Todas as crianças têm
direito ao acesso a programas de primeira infância. Não obstante, com frequência, as famílias mais
vulneráveis são invisíveis e não obtêm acesso aos serviços. A identificação dessas famílias por avaliação
comunitária, diálogos e extensão é essencial. A expansão de pré-escolas e da atenção infantil comunitária
também é uma oportunidade única de incluir crianças com necessidades especiais e preparar professores e
administradores para assegurar sua plena participação.
5 Investir na educação de adolescentes e adultos. A educação de adultos e a garantia de educação
secundária para jovens que serão mães e pais estão associadas ao melhor desenvolvimento na primeira
infância. A integração dos cuidados de criação aos currículos de escola secundária pode preparar
adolescentes para promover e apoiar os cuidados de criação quando se tornarem pais.
A função do setor de proteção social e infantil
Os setores de proteção social e infantil (em alguns países denominados bem-estar social) são essenciais para
produzir um ambiente de apoio aos cuidados de criação mediante a oferta de “redes de segurança” que
fortaleçam a capacidade de famílias vulneráveis de oferecer cuidados de criação e ter acesso aos serviços
necessários. Entre os exemplos estão o apoio direcionado aos lares mais vulneráveis com crianças pequenas,
obras públicas sensíveis às necessidades do desenvolvimento na primeira infância, creches para crianças de
0 a 3 anos, vínculos com centros comunitários de desenvolvimento na primeira infância e programas para
pais. A criação de um ambiente seguro, de apoio e cuidados ajuda as crianças a evitar todos os tipos de
violência. Os cuidados responsivos reduzem a prevalência de violência em etapas posteriores da vida de
crianças expostas a circunstâncias violentas. A seguir, são apresentadas quatro recomendações sobre a
maneira como a proteção social e infantil pode ajudar a promover cuidados de criação:
1 Garantir a cidadania para todas as crianças. Milhões de pessoas em países de baixa e média renda
não têm acesso a serviços básicos e de proteção dos seus direitos em razão da deficiência dos sistemas de
registro civil e de identificação nacional. Isso inclui a cobertura universal de saúde, os projetos de educação e
proteção social, as respostas humanitárias a emergências e conflitos, o comércio e a segurança. Para apoiar
os cuidados de criação, todas as crianças devem ter direito ao registro de nascimento e à documentação dos
acontecimentos importantes subsequentes com a finalidade de fornecer dados de qualidade para
elaboração dos programas.
2 Proteger as famílias e crianças da miséria. A garantia de uma renda básica a crianças, gestantes,
vítimas de acidentes de trabalho, pessoas em idade economicamente ativa que não tenham renda suficiente
e idosos é essencial para aliviar os efeitos da pobreza sobre crianças pequenas. A identificação de
populações vulneráveis e a oferta de garantias básicas de segurança social não só melhoram a qualidade de
vida doméstica, mas também facilitam o acesso à atenção à saúde e a outros serviços essenciais.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 35
3 Vincular benefícios a serviços que apoiem os cuidados de criação. Os mecanismos de proteção social
alcançam muitas famílias vulneráveis e, dessa maneira, oferecem oportunidades importantes para ampliar
os cuidados de criação pelo alcance de gestantes, crianças pequenas e suas famílias e pelo fornecimento de
informações, apoio, proteção e serviços. Esses vínculos têm benefícios mútuos comprovados e, ao mesmo
tempo, aumentam o impacto de programas de proteção social.
4 Assegurar a continuidade entre os serviços comunitários e a atenção de referência de qualidade. As
crianças em risco de desenvolvimento insuficiente por causa de fatores biológicos (como prematuridade ou
deficiência) ou influências ambientais (como violência na comunidade ou em casa) necessitam de serviços
com oferta de atenção mais especializada. Assegurar pessoal com qualificações apropriadas, centros que
prestem um conjunto integral de serviços e sistemas que conectem múltiplos serviços em uma continuidade
de atenção são medidas essenciais para atender os mais necessitados.
5 Proteger as crianças de maus-tratos e dissolução familiar. Assegurar que os profissionais em todos os
setores compreendam os perigos dos maus-tratos de crianças, sejam capazes de identificar se uma criança
está sendo maltratada e saibam o que fazer se suspeitarem de maus-tratos. Identificar estratégias para
reduzir a violência doméstica e contra crianças, como grupos para homens que sejam pais, campanhas
nacionais e campeões locais. Buscar soluções que mantenham a unidade familiar.
Compromisso com a ação
Compromissos concretos e ações coletivas são necessários para implementar as ações estratégicas e
concretizar a visão deste Plano. Os compromissos assumidos por governos e interessados diretos com a
Estratégia Global para a Saúde das Mulheres, das Crianças e dos Adolescentes constituem a base sobre a
qual se podem estabelecer outros compromissos em apoio a uma estratégia holística de fortalecimento dos
cuidados de criação.
O apelo aos compromissos:
Governos, parlamentares, responsáveis pelas decisões e formuladores de políticas em todos os níveis
deverão:
• Comprometer-se com uma visão de equidade e desenvolvimento humano com as crianças
pequenas em posição central; apoiar os cuidados de criação pela garantia de políticas, orçamentos,
planos operacionais, módulos de treinamento e instrumentos; promover cuidados de criação;
disponibilizar recursos humanos, técnicos e financeiros para fortalecer serviços em âmbitos
nacional, subnacional e local; e implementar progressivamente uma estratégia de todo o governo e
toda a sociedade para os cuidados de criação.
A sociedade civil em todos os níveis deverá:
• Defender o aumento da atenção aos cuidados de criação e os investimentos nesses cuidados;
reforçar a capacidade da comunidade de apoiar os cuidados de criação e criar um ambiente
favorável, acompanhar o progresso, assumir a responsabilidade e responsabilizar outros
interessados diretos pelos compromissos.
As instituições acadêmicas e de pesquisa em todos os níveis deverão:
• Gerar novas evidências sobre os benefícios dos cuidados de criação, estratégias efetivas de
implementação, seus custos e custo-efetividade, além de seu impacto nas gerações atuais e futuras;
divulgar amplamente informações sobre evidências e inovações; e integrar os cuidados de criação ao
treinamento prévio e aos currículos de profissionais que trabalham com crianças pequenas e
famílias.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 36
A comunidade empresarial em todos os níveis deverá:
• Investir em um ambiente de apoio aos cuidados de criação, no local de trabalho, na comunidade e
na sociedade, por meio de políticas institucionais justas, investimento de recursos e
responsabilidade social.
Os meios de comunicação em todos os níveis deverão:
• Apoiar os mais necessitados e promover boas práticas de cuidados de criação por meio de
informações de qualidade.
As Nações Unidas e outras organizações e iniciativas multilaterais deverão:
• Sintetizar evidências, elaborar orientações normativas, oferecer assistência técnica, monitorar o
progresso e trabalhar em parceria para manter os cuidados de criação no topo da agenda de
desenvolvimento sustentável.
Os parceiros bilaterais de desenvolvimento e as instituições filantrópicas deverão:
• Mobilizar recursos financeiros e técnicos, estimular a pesquisa e a inovação e apoiar a
implementação e o monitoramento de políticas e planos nacionais para cuidados de criação.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 37
Marcos
Marcos: até 2023
Marcos nacionais Marcos mundiais
Todos os países desenvolveram um mecanismo de
coordenação nacional e planejam adotar uma
estratégia holística para os cuidados de criação.
Rede mundial estabelecida e aberta a todos os
interessados diretos para apoiar os cuidados
de criação.
Todos os países estão fortalecendo a capacidade da
força de trabalho para apoiar os cuidados
responsivos e a aprendizagem precoce.
Diretrizes, pacotes de serviços genéricos e
ferramentas de implementação para apoiar
os cuidados de criação prontamente
disponíveis.
Todos os países instituíram a continuidade da
atenção com serviços de referência para
famílias e crianças com necessidades especiais.
Todos os países possibilitaram ativamente que as
famílias e comunidades apoiem os cuidados de
criação por meio de informações, serviços e
fundos.
Evidências sobre estratégias efetivas para
participação da comunidade e organismo
para cuidados de criação sintetizadas e
amplamente disponíveis.
Todos os países coletaram dados nacionais e
subnacionais sobre a qualidade e a cobertura
das intervenções relativas aos cinco
componentes dos cuidados de criação.
Monitoramento de metas específicas dos
cuidados de criação em todos os países e
notificação periódica como parte do
acompanhamento do progresso dos ODS.
Todos os países estão investindo em pesquisa de
implementação para reforçar evidências locais
com o objetivo de orientar a ampliação efetiva
das intervenções de cuidados de criação.
Aumento dos investimentos em pesquisa
longitudinal para avaliar a custo-efetividade
dos cuidados de criação e das intervenções
relacionadas ao longo da vida.
Cuidados de criação para o desenvolvimento na primeira infância — Plano global para ação e resultados 38
Anexos
Um glossário será incluído no documento final.
Um quadro de resultados e os indicadores propostos serão incluídos no documento final.
As referências serão incluídas no documento final.
Diretrizes e estratégias globais pertinentes serão incluídas no documento final.