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Curso de Direito Financeiro - Carlos Alberto de Morae Ramos Filho

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Aborda as normas de direito financeiro, o processo de elaboração do orçamento e as peças de planejamento público.

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  • CARLOS ALBERTO DE MORAES RAMOS FILHODoutorando em Direito Tributrio pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUCSP).Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e pela Universidade Federalde Pernambuco (UFPE). Professor de Direito Financeiro e Tributrio no Centro Universitrio deEnsino Superior do Amazonas (CIESA). Procurador do Estado do Amazonas. Advogado.

  • Rua Henrique Schaumann, 270, Cerqueira Csar So Paulo SP

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  • ISBN 978-85-02-16035-4

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Ramos Filho, Carlos Alberto de MoraesCurso de direito financeiro / Carlos Alberto de Moraes Ramos Filho. So Paulo : Saraiva, 2012.

    1. Direito financeiro - Brasil I. Ttulo.

    11-09317 CDU-34:336 (81)

    ndices para catlogo sistemtico:1. Direito financeiro 34:336 (81)

    Diretor editorial Luiz Roberto Curia

    Gerente de produo editorial Lgia Alves

    Editor Assistente Raphael Vasso Nunes Rodrigues

    Produtora editorial Clarissa Boraschi Maria

    Preparao de originais Maria Izabel Barreiros Bitencourt Bressan,Bernardete Rodrigues de Souza Maurcio e Daniel Pavani Naveira

    Arte e diagramao Cristina Aparecida Agudo de Freitas e Claudirene de Moura Santos Silva

    Reviso de provas Rita de Cssia Queiroz Gorgati e Regina Machado

    Servios editoriais Andra Patrcia da Silva e Vinicius Asevedo Vieira

    Capa Fonte Design

    Produo digital Estdio Editores.com & CPC Informtica

    Data de fechamento da edio: 20-10-2011

    Dvidas? Acesse www.saraivajur.com.br

    Nenhuma parte desta publicao poder ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prvia autorizao da Editora Saraiva. Aviolao dos direitos autorais crime estabelecido na Lei n. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Cdigo Penal.

    129.480.001.001

  • Dedico este livro, com muito amor, Andrea, esposa querida, fonte de toda inspirao.

  • Dizem que o mundo governado por algarismos, mas o queeu sei que so os algarismos que mostram se ele bem ou mal

    governado.

    Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832)

  • Abreviaturas e Siglas Utilizadas

    ACO = Ao Cvel Originria

    ADC-MC = Medida Cautelar em Ao Declaratria de Constitucionalidade

    ADCT = Ato das Disposies Constitucionais Transitrias

    ADI = Ao Direta de Inconstitucionalidade

    ADI-MC = Medida Cautelar em Ao Direta de Inconstitucionalidade

    ADI-MC-QO = Questo de Ordem em Medida Cautelar em Ao Direta de Inconstitucionalidade

    ADI-MC-REF = Referendo na Medida Cautelar na Ao Direta de Inconstitucionalidade

    ADI-QO = Questo de Ordem em Ao Direta de Inconstitucionalidade

    Ag. = Agravo

    AgRg = Agravo Regimental

    AI-AgR = Agravo Regimental no Agravo de Instrumento

    Ap. Cv. = Apelao Cvel

    Apn = Ao penal

    art. = artigo

    arts. = artigos

    c/c = combinado com

    CF = Constituio da Repblica Federativa do Brasil

    cit. = citado(a)

    CN = Congresso Nacional

    CP = Cdigo Penal

    CTN = Cdigo Tributrio Nacional (Lei n. 5.172, de 25-10-1966)

    Des. = Desembargador(a)

  • DF = Distrito FederalDJ = Dirio de Justia (da Unio)

    DJE = Dirio de Justia Estadual

    DJe = Dirio da Justia (da Unio) eletrnico

    EC = Emenda Constitucional

    ed. = edio

    Ed. = Editora

    EDcl = Embargos Declaratrios

    EM = Exposio de Motivos

    EREsp = Embargos de Divergncia em Recurso Especial

    FUNDEF = Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorizao doMagistrio

    FPE = Fundo de Participao dos Estados

    FPM = Fundo de Participao dos Municpios

    ICMS = Imposto sobre Operaes relativas Circulao de Mercadorias e sobre Prestaode Servios de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicao

    IF = Interveno Federal

    IF-AgR = Agravo Regimental na Interveno Federal

    Inq = Inqurito

    IPI = Imposto sobre Produtos Industrializados

    ISS = Imposto sobre Servios de Qualquer Natureza

    j. = julgado(a)

    LC = Lei Complementar

    LDO = Lei de Diretrizes Oramentrias

    LOA = Lei Oramentria Anual

    LRF = Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n. 101, de 4-5-2000)

  • Min. = Ministro(a)MP = Medida Provisria

    MS = Mandado de Segurana

    MS-AgR-QO = Questo de Ordem em Agravo Regimental em Mandado de Segurana

    n. = nmero

    ob. cit. = obra citada

    p. = pgina(s)

    PEC = Proposta de Emenda Constituio

    p. ex. = por exemplo

    PASEP = Programa de Formao do Patrimnio do Servidor Pblico

    PIS = Programa de Integrao Social

    PPA = Plano Plurianual

    RE = Recurso Extraordinrio

    RE-AgR = Agravo Regimental em Recurso Extraordinrio

    RE-ED = Embargos Declaratrios em Recurso Extraordinrio

    REsp = Recurso Especial

    REsp-AgR = Agravo Regimental em Recurso Especial

    Rev. = Revisor(a)

    RMS = Recurso Ordinrio em Mandado de Segurana

    Rp = Representao

    RTJ = Revista Trimestral de Jurisprudncia do Supremo Tribunal Federal

    [s.d.] = sem data (data no presente na publicao)

    [s.n.] = sine nomine (sem casa de publicao)

    STF = Supremo Tribunal Federal

    STJ = Superior Tribunal de Justia

    TJGO = Tribunal de Justia do Estado de Gois

  • TJSP = Tribunal de Justia do Estado de So Paulo

    TRF = Tribunal Regional Federal

    UF = Unio Federal

    v. = volume

    ZFM = Zona Franca de Manaus

  • ndice

    Abreviaturas e Siglas Utilizadas

    Prefcio

    Apresentao

    Captulo IA Atividade Financeira do Estado

    1. Estado: origem, conceito e elementos1.1. Origem do Estado1.2. Conceito de Estado1.3. Elementos constitutivos do Estado

    1.3.1. Populao1.3.2. Territrio1.3.3. Governo1.3.4. Finalidade

    2. Necessidades pblicas

    3. Servios pblicos

    4. Poder de polcia

    5. Atividade financeira do Estado: conceito

    6. A atividade financeira do Estado Liberal: a fiscalidade

    7. A atividade financeira do Estado Intervencionista: a extrafiscalidade

    8. Cincias que estudam a atividade financeira do Estado8.1. Cincia das Finanas8.2. Direito Financeiro8.3. Direito Tributrio

  • 9. Estado de Direito: a ordenao jurdica das finanas pblicas

    Captulo IIO Direito Financeiro

    1. Conceito de Direito

    2. Direito e Cincia Jurdica

    3. Sistema do direito positivo e sistema da Cincia do Direito

    4. Direito Pblico e Direito Privado

    5. Direito Financeiro: conceito

    6. Contedo das normas de Direito Financeiro6.1. Abrangncia do campo do Direito Financeiro6.2. Destinao das receitas tributrias6.3. Sistema Financeiro Nacional

    7. Relao do Direito Financeiro com outros ramos do Direito

    8. Fontes do Direito Financeiro8.1. Constituio8.2. Leis complementares

    8.2.1. Normas gerais de Direito Financeiro8.3. Leis ordinrias8.4. Leis delegadas8.5. Medidas provisrias8.6. Resolues do Senado

    Captulo IIIDespesas Pblicas

    1. Conceito

    2. Despesas pblicas e despesas privadas: distino

    3. Classificao3.1. Classificaes doutrinrias

  • 3.1.1. Quanto periodicidade3.1.2. Quanto competncia3.1.3. Quanto extenso3.1.4. Quanto ao aspecto econmico

    3.2. Classificao legal3.2.1. Despesas correntes3.2.2. Despesas de capital

    4. Princpios das despesas pblicas

    5. Estgios5.1. Fixao5.2. Realizao

    5.2.1. Programao5.2.2. Licitao5.2.3. Empenho5.2.4. Liquidao5.2.5. Ordem de pagamento5.2.6. Suprimento5.2.7. Pagamento

    6. As despesas pblicas segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal6.1. Despesas obrigatrias de carter continuado

    6.1.1. Conceito6.1.2. Requisitos para efetivao

    6.2. Despesas com pessoal6.2.1. Noes gerais6.2.2. Conceito6.2.3. Apurao da despesa total com pessoal6.2.4. Limites legais

    6.2.4.1. Receita Corrente Lquida6.2.4.2. Limites estipulados para a Unio6.2.4.3. Limites estipulados para os Estados e para o Distrito Federal6.2.4.4. Limites estipulados para os Municpios

  • 6.2.5. Os gastos com pessoal e a terceirizao de mo de obra6.2.6. Requisitos para efetivao6.2.7. Controle das despesas com pessoal6.2.8. Mecanismos de correo de desvios

    6.3. Despesas com a Seguridade Social6.3.1. Noes gerais6.3.2. Requisitos para efetivao

    6.4. Transferncias voluntrias6.4.1. Noes gerais6.4.2. Requisitos para efetivao6.4.3. Destinao dos recursos recebidos6.4.4. Suspenso de transferncias voluntrias

    6.5. Destinao de recursos pblicos para o setor privado6.5.1. Noes gerais6.5.2. Requisitos para efetivao6.5.3. Concesso de crdito6.5.4. O Sistema Financeiro Nacional

    7. O regime dos precatrios

    8. O regime de adiantamento8.1. Conceito8.2. Restries

    Captulo IVReceitas Pblicas

    1. Conceito

    2. Classificao2.1. Classificaes doutrinrias

    2.1.1. Quanto periodicidade2.1.2. Quanto origem2.1.3. Quanto aplicao

    2.2. Classificao legal

  • 2.2.1. Receitas correntes2.2.1.1. Receitas tributrias

    2.2.2. Receitas de capital

    3. Estgios3.1. Previso

    3.1.1. Noes gerais3.1.2. A previso da receita segundo a LRF

    3.2. Realizao3.2.1. Lanamento3.2.2. Arrecadao3.2.3. Recolhimento

    4. Dvida ativa

    5. As receitas pblicas segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal5.1. Noes gerais5.2. A LRF e o princpio da anualidade tributria

    6. Renncia de receita6.1. Noes gerais6.2. Requisitos6.3. Modalidades

    6.3.1. Anistia6.3.2. Remisso6.3.3. Subsdio6.3.4. Crdito presumido6.3.5. Iseno em carter no geral6.3.6. Reduo de alquota6.3.7. Reduo de base de clculo6.3.8. Suspenso6.3.9. Diferimento6.3.10. Restituio de tributo

    6.4. Previso da receita tributria e da renncia fiscal na LDO e na LOA

    7. Fundos especiais

  • 8. Repartio das receitas tributrias8.1. Introduo: a discriminao de rendas tributrias8.2. Repartio de receitas: conceito8.3. Critrios de repartio das receitas tributrias

    8.3.1. Partilha direta em favor dos Estados e do Distrito Federal8.3.2. Partilha direta em favor dos Municpios8.3.3. Partilha indireta em favor dos Estados, do Distrito Federal e dos

    Municpios8.4. Proibio de reteno e restries quanto repartio constitucional de

    receitas tributrias

    9. Disponibilidade de caixa

    Captulo VOramento Pblico

    1. Conceito

    2. Princpios oramentrios2.1. Exclusividade2.2. Universalidade2.3. Especializao2.4. Programao2.5. Anterioridade2.6. Anualidade2.7. Unidade2.8. No afetao2.9. Transparncia

    3. Leis oramentrias3.1. Plano Plurianual

    3.1.1. Noes gerais3.1.2. O PPA segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal

    3.2. Lei de Diretrizes Oramentrias3.2.1. Noes gerais

  • 3.2.2. A LDO segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal3.2.2.1. Anexo de Metas Fiscais3.2.2.2. Anexo de Riscos Fiscais

    3.3. Lei Oramentria Anual3.3.1. Noes gerais3.3.2. A LOA segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal

    4. Controle de constitucionalidade das leis oramentrias

    5. Ciclo oramentrio5.1. Proposta oramentria5.2. Elaborao oramentria

    5.2.1. Iniciativa5.2.2. Exame prvio dos projetos5.2.3. Mensagem aditiva5.2.4. Emendas5.2.5. Discusso e votao5.2.6. Sano ou veto5.2.7. Promulgao e publicao

    5.3. Execuo oramentria5.3.1. Programao financeira e cronograma de desembolso5.3.2. Verificao do cumprimento das metas e limitao de empenho5.3.3. Relatrio Resumido da Execuo Oramentria5.3.4. Relatrio de Gesto Fiscal

    6. O problema da falta de oramento

    7. Vedaes constitucionais em matria oramentria

    8. Entrega dos recursos dos Poderes Legislativo e Judicirio, do Ministrio Pblicoe da Defensoria Pblica

    9. O oramento pblico e a reserva do possvel

    10. Controle e fiscalizao da execuo oramentria10.1. Noes gerais10.2. Controle interno

  • 10.3. Controle externo

    Captulo VICrditos Adicionais

    1. Ajustes oramentrios

    2. Acepes da palavra crdito

    3. Crditos adicionais: conceito

    4. Espcies4.1. Crditos suplementares

    4.1.1. Conceito4.1.2. Caractersticas4.1.3. Vigncia

    4.2. Crditos especiais4.2.1. Conceito4.2.2. Caractersticas4.2.3. Vigncia

    4.3. Crditos extraordinrios4.3.1. Conceito4.3.2. Caractersticas4.3.3. Vigncia

    Captulo VIICrdito Pblico

    1. Conceito

    2. Natureza jurdica

    3. Tcnicas da captao do emprstimo

    4. Classificao4.1. Quanto pessoa jurdica que obtm o crdito4.2. Quanto origem territorial da dvida4.3. Quanto aos prazos de durao

  • 4.4. Classificao constitucional

    5. Princpios dos emprstimos pblicos

    6. Regime constitucional do crdito pblico

    7. O crdito pblico, a dvida pblica e a Lei de Responsabilidade Fiscal7.1. Noes gerais7.2. Conceituaes legais7.3. Limites da dvida pblica e das operaes de crdito7.4. Reconduo da dvida aos limites7.5. Operaes de crdito

    7.5.1. Condies para efetivao7.5.2. Vedaes legais

    7.6. Operaes de crdito por Antecipao de Receita Oramentria7.6.1. Conceito7.6.2. Condies para efetivao7.6.3. Vedaes legais

    7.7. Concesso de garantias7.8. A LRF e os restos a pagar

    8. Crdito pblico sem autorizao legislativa

    9. Crdito pblico estadual, distrital e municipal

    10. Limites e condies fixados pelo Senado para as operaes de crdito

    11. Limites para o montante da dvida consolidada e mobiliria fixados pelo Senado

    Referncias

    Notas

  • Prefcio

    Recentemente li um texto exemplar de Gabriel Garca Mrquez que dizia ao final que tudo queacontece acontece por uma razo!.

    E assim, certamente por alguma razo tive o prazer de viajar a Manaus e conhecer Carlos Albertode Moraes Ramos Filho, autor da presente obra, que tenho agora o imenso prazer em apresentar.

    A academia nos proporciona vrios prazeres, dentre eles, o da amizade distncia selada atravsda proximidade das ideias. Aproximamo-nos atravs de nossas estantes e conversamos no silnciode nossos gabinetes com os autores dos livros que nos acompanham dia a dia e, assim, temos grandesamigos com os quais compartilhamos ideais e doutrina, cada qual em sua forma peculiar de pensar.

    Nos livros expomos mais que nossas ideias, mas tambm um pouco de nossa personalidade, denossa vida, de nossa profisso, de nossos princpios, enfim, o livro um relato da alma, onde cadaautor exprime aquilo que sente a respeito de seu tempo. Em cada frase est a peculiaridade do autor.Impregnados no texto esto os seus princpios, seus valores, sua subjetividade. Se assim no fosse,seria uma mera transcrio de leis ou um comentrio raso sobre normas preestabelecidas.

    Um livro jurdico no se reduz a isto. E este livro no um comentrio ao Direito Financeiro; mesmo um tratado de conduta moral, um grito de alerta ao resgate da tica no trato da coisa pblica.

    O autor demonstra uma preocupao constante com a conduta moral, correta, adequada, justa dosagentes estatais, alis, no s nesta obra, mas em tantos outros trabalhos que j publicou.

    A relevante atuao profissional do autor como Procurador do Estado do Amazonas explica asoportunas lies de quem conhece profundamente a mquina estatal. Soma-se a isso a imparcialidadee o zelo que a vivncia acadmica exige do professor universitrio e mestre em Direito.

    O autor alia-se, com esta obra, aos que se fazem porta-voz da luta atual em busca de umaconscincia coletiva para o trato tico da coisa pblica.

    No se concebe mais, em pleno sculo XXI, o silncio de cidados e gestores pblicos diantedos escndalos dirios envolvendo o Errio.

    Uma mudana de postura o que se proclama no Brasil. Impera hoje uma sociedade mais atenta econhecedora dos fatos, no mais permitindo que seja colocada ela s margens das decises estatais.

    Este livro amplia o foco da doutrina e d exemplos de uma postura estatal, longe ainda de ser oideal, mas com certeza, com contornos bem diferentes de alguns poucos anos atrs.

    Mudana de foco o que se exige neste momento. Falamos hoje aps quarenta e cinco anos doCdigo Tributrio Nacional e somente depois de onze anos da Lei de Responsabilidade Fiscal, ou

  • seja, o tema contemporneo mesmo a questo da gesto eficiente.O foco em anlise aborda toda a atividade financeira estatal, incluindo nas respectivas anlises

    as receitas e despesas no contexto do oramento pblico.Novos paradigmas devem ser traados neste novo milnio. H uma gerao que tem o dever

    social de conhecer a estrutura estatal, ao contrrio das geraes anteriores, que podiam argumentarque no lhes eram apresentados os dados referentes ao sistema financeiro brasileiro. Hoje os dadosesto a todos disponveis via on line.

    A era da tecnologia desvenda informaes necessrias para serem refletidas, criticadas ealteradas quando necessrio. Ou seja, o papel social efetivo exigido de todos os cidados, nocabendo mais o discurso vazio da mera agresso s ineficincias estatais.

    O Estado hoje tem que ser visto em seus novos parmetros e esta transparncia, consequncia darevoluo tecnolgica que se aprimora neste sculo XXI, altera profundamente a relao entre oEstado e o cidado-contribuinte.

    No cabe mais a figura do Estado arbitrrio e opressor nem da sociedade inerte e conformista. Omomento do Estado transparente, da sociedade cooperativa e alerta. Exigem-se instituies abertas,eficientes, com normas claras, objetivas e justas.

    Toda a confuso doutrinria que se insere hoje exatamente porque esta exignciacontempornea se instaurou concomitantemente a uma estrutura ainda arcaica e com integrantes deuma gerao sofrida e descrente do papel do Estado.

    As crticas genricas e vazias sobre a atuao arbitrria do Poder Executivo, em todas as esferas(municipal, estatal e federal), esto ultrapassadas. O Estado contemporneo exige uma crticafundamentada e pontual, de forma a corrigir os erros e omisses, com o intuito de construir umaestrutura fiscal melhor.

    Estudar o Direito Financeiro , pois, envolver-se nos problemas constitucionais deste Pas e,particularmente, na democracia, invocando necessariamente o oramento participativo, que no podemais ser tratado como mera discusso acadmica.

    Com este Curso de direito financeiro temos em mos tanto a legislao pertinente ao tema comotambm uma excelente diretriz para o conhecimento das finanas pblicas no Brasil.

    Acreditamos que aps a leitura desta obra os leitores somar-se-o queles que acreditam nacapacidade de alterao do Estado atravs de uma conduta tica e justa na aplicao do dinheiropblico.

    Denise Lucena Cavalcante

  • Doutora em Direito pela PUCSP.Professora de Direito Tributrio e Financeiro

    da Universidade Federal do Cear UFC.Procuradora da Fazenda Nacional.

  • Apresentao

    Este livro foi concebido com o intuito de ser, essencialmente, didtico, sendo resultado dacompilao e organizao das anotaes para as aulas da disciplina Direito Financeiro, queministramos em Instituies de Ensino Superior desde 1998.

    Cabe, portanto, a advertncia prvia de que ele foi elaborado com o propsito de servir,precipuamente, como roteiro de estudo aos alunos dos cursos de bacharelado em Direito, estando deacordo com os programas adotados pelas Faculdades de Direito de nosso Pas, para os cursos degraduao e ps-graduao.

    Embora voltada primordialmente ao pblico acadmico, acreditamos que, tendo em vista o seucontedo tcnico e o rigor cientfico com o qual procuramos conduzir a exposio dos assuntostratados nesta obra, nela tambm encontraro utilidade os profissionais das diversas carreirasjurdicas que fazem do Direito Financeiro a matria de sua preferncia. Tambm servir de subsdioaos que desejam submeter-se a concursos pblicos que exijam conhecimentos gerais desta rea.

    Como bem observa Paulo de Barros Carvalho, o saber cientfico dos tempos atuais enfticoem um ponto: todos entendem que no h como abrir mo da uniformidade na apreciao do objeto,bem como da rigorosa demarcao do campo sobre o qual haver de incidir a proposta cognoscitiva(Direito tributrio, linguagem e mtodo. So Paulo: Noeses, 2008, p. 6).

    Assim, demarcando o campo sobre o qual incide nossa proposta cognoscitiva, cabe salientar quea presente obra abrange os quatro campos em que se desenvolve a atividade financeira do Estado objeto do Direito Financeiro dispostos na ordem que nos parece razovel: despesas pblicas,receitas pblicas, oramento pblico e crdito pblico.

    No que tange uniformidade na apreciao do citado objeto de estudo, ressalte-se que todos ostemas inerentes ao Direito Financeiro foram tratados, nesta obra, luz de critrios estritamentejurdicos, ao contrrio de muitos livros at hoje editados sobre a matria, que, no dizer de JosSouto Maior Borges, mesclam s questes jurdicas, abordagens econmico-financeiras em inslitaconfuso metodolgica (Introduo ao direito financeiro. 2. ed. So Paulo: Max Limonad, 1998, p.7). Trata-se, em outras palavras, de um Curso de Direito Financeiro , no de Cincia das Finanas,tendo em vista o alerta de Geraldo Ataliba acerca da irremedivel imprestabilidade dasconsideraes de cincia das finanas para resolver problemas exegticos de direito financeiro(Apontamentos de cincia das finanas, direito financeiro e tributrio . So Paulo: Revista dosTribunais, 1969, p. 39).

  • Todos os temas analisados na presente obra foram examinados luz da Constituio Federal e dalegislao infraconstitucional que disciplina a matria, tendo sido includas em notas de rodap ou noprprio corpo do texto referncias jurisprudncia do Supremo Tribunal Federal (STF) e doSuperior Tribunal de Justia (STJ) acerca de cada um dos temas estudados.

    Esperamos, com esta despretensiosa iniciativa, estar contribuindo para os estudos daqueles quedebruam suas atenes sobre o relevante tema da regulao jurdica das finanas pblicas.

    Crticas e sugestes sero bem recebidas.

    Carlos Alberto de Moraes Ramos [email protected]

  • Captulo I

    A Atividade Financeira do Estado

    1. ESTADO: ORIGEM, CONCEITO E ELEMENTOSConsiderando que o Direito Financeiro regula a estrutura e o exerccio da atividade financeira

    estatal, e sendo esta um instrumento para o atingimento das finalidades do Estado[1], restaevidenciado que o modo de ser e atuar do Estado e seus valores repercutem na configurao dosconceitos e institutos daquele ramo jurdico.

    Assim, tendo em vista que uma das chaves para a melhor compreenso das finanas pblicas estno conhecimento dos aspectos fundamentais do Estado[2], procederemos neste captulo a uma breveanlise de alguns desses aspectos.

    Ressalte-se que a expresso finanas pblicas derivada do francs finance, que por sua vezse forma do antigo verbo finer (conseguir um fim) , segundo Cludio Martins, usada no s paratraduzir os recursos do Estado, seno tambm a administrao e o emprego destes (grifamos)[3].Do conceito transcrito, v-se que a expresso finanas pblicas comumente empregada paradesignar a prpria atividade financeira do Estado[4].

    Por vezes, a expresso Finanas Pblicas principalmente quando grafada com iniciaismaisculas utilizada para designar no a atividade financeira estatal em si, mas o estudo que tempor objeto esta mesma atividade, caso em que usualmente tomada como sinnima de Cincia dasFinanas[5].

    Em nossa concepo, as finanas pblicas no constituem cincia alguma, mas, isto sim, objetodo conhecimento de vrias cincias (dentre as quais, consoante ser exposto, a Cincia das Finanas,o Direito Financeiro e o Direito Tributrio). Por conseguinte, na presente obra, a expresso finanaspblicas ser empregada como sinnimo de atividade financeira do Estado, cujo conceito seradiante delineado.

    1.1. Origem do EstadoOs homens reuniram-se, embrionariamente, em grupos sociais, porque concluram ser

    imprescindvel sua sobrevivncia a colaborao mtua.Esses grupos, de organizao precria, passaram, paulatinamente, a solicitar a satisfao de

    necessidades gerais, impossveis de serem atendidas pela manifestao individual de cada um dosseus elementos ou mesmo pelo esforo coordenado de cada grupo.

  • Surgiu, assim, a necessidade de criar um ente politicamente organizado para gerir os interessespblicos. Este ente organizado, que o prprio Estado (do latim status, que significa estar firme),apresenta-se, portanto, como o responsvel direto pela administrao dos interesses da coletividade.

    Com o progresso da civilizao, acentuou-se no Estado, alm da funo de rgo poltico,monopolizador do poder, o carter de sistema orgnico de servios pblicos para satisfazer snecessidades gerais da populao[6].

    1.2. Conceito de EstadoO Estado como ordem poltica da sociedade conhecido desde a Antiguidade. O seu conceito

    vem evoluindo, a partir da polis grega e da civitas romana, graas aos questionamentos e spesquisas realizadas por diversos estudiosos.

    impossvel, no entanto, encontrar um conceito nico de Estado que seja totalmente aceito porparte dos doutrinadores. Isto porque o Estado um organismo social muito complexo e os conceitos,por sua vez, so pontos de vista especficos, embora geralmente formais, de cada autor.

    O conceito de Estado varia, de fato, segundo o ngulo em que considerado[7]. Assim, do pontode vista sociolgico, concebido como corporao territorial dotada de um poder de mandooriginrio; sob o prisma poltico, considera-se a comunidade de indivduos, fixada sobre umterritrio, com potestade superior de ao, de mando e de coero; sob o aspecto constitucional,caracteriza-se como pessoa jurdica territorial soberana.

    Todavia, apesar da dificuldade em conceituar com preciso o Estado, observa-se nos conceitos ejuzos de diversos autores alguns elementos que so fundamentais para a estruturao de um conceitobsico de Estado, quais sejam: 1) uma sociedade permanente de pessoas; 2) um determinadoterritrio; 3) um governo independente; e 4) uma finalidade especfica, que a busca do bem comum.

    Considerando-se esses elementos, teremos chegado a uma viso global e abrangente do processode conceituao do Estado, visto que se adapta s opinies da grande maioria dos doutrinadores.

    Podemos, assim, conceituar o Estado como a pessoa jurdica soberana, constituda de um povoorganizado sobre um determinado territrio, sob o comando de um governo, para fins de alcanaro bem comum daquele povo[8].

    1.3. Elementos constitutivos do EstadoComo vimos logo acima, existem certos elementos indissociveis que compem a estrutura

    formadora do Estado e que, consequentemente, so indispensveis sua existncia. So os chamadoselementos constitutivos do Estado, ou, como preferem outros autores, elementos essenciais doEstado.

    Com algumas poucas excees, concorda a maioria dos autores como sendo trs os elementos

  • essenciais do Estado, embora divirjam quanto sua identificao. So esses elementos de ordemmaterial e de ordem formal.

    Os elementos materiais so a populao e o territrio, porque se erigem em fatores concretos,sensveis. O elemento formal identificado com o poder poltico ou alguma de suas expresses,como autoridade, governo ou soberania , que o vnculo que agrega o grupo humano[9].

    Entendemos, com outra parcela da doutrina[10], que deva ser acrescentada, entre os elementosformadores do Estado, ao lado dos trs j mencionados, a finalidade, que o seu elemento espiritual( ou final ou teleolgico, como preferem alguns), sem o qual no haveria justificativa para aexistncia do Estado[11].

    Assim, para manter certa coerncia com o conceito de Estado por ns adotado[12], vamosconsiderar como sendo quatro os elementos essenciais do Estado: populao, territrio, governo efinalidade[13].

    1.3.1. PopulaoA populao a totalidade de pessoas residentes num territrio, de forma indiscriminada,

    incluindo-se, portanto, nesse aglomerado humano, os nacionais e os estrangeiros[14]. a basehumana da sociedade estatal.

    comum confundir populao com povo. A populao, como foi dito, corresponde a todas aspessoas presentes no territrio do Estado, num determinado momento, inclusive estrangeiros. J opovo o conjunto de indivduos (sditos) sujeitos s mesmas leis de um mesmo Estado.

    Convm, tambm, que se faa a distino entre populao e nao. Populao , simplesmente, oaglomerado de indivduos e no o conjunto de pessoas que tem os mesmos ideais, as mesmasaspiraes etc. Nao , no dizer de Jos Geraldo Brito Filomeno, a sociedade natural de homens,na qual a convivncia e sobretudo o culto das mesmas tradies, o respeito aos mesmos costumes, euma lngua comum levam conscincia nacional singular[15]. De forma mais sinttica, pode-sedefinir nao como o conjunto de pessoas unidas pelo sentimento de patriotismo ou, no dizer deAderson de Menezes, de parentesco espiritual[16].

    impossvel a existncia do Estado sem o elemento humano (populao), pois para ele que oEstado se forma.

    1.3.2. TerritrioO Estado uma sociedade e, como tal, compreende um conjunto de indivduos visando

    obteno de determinado fim. Para que o grupo social constitudo possa atingir sua finalidade, deveconcentrar esforos em comum em determinado lugar, que constituir a base fsica do referidogrupo[17].

    O territrio , assim, a base fsica do Estado[18]. o espao geogrfico onde o povo se fixou,

  • em que se desenvolvem as relaes sociais e dentro do qual o governo exerce sua soberania[19].Constituindo-se no espao no qual os rgos estatais tm o poder de impor sua autoridade, oterritrio define o mbito da competncia no espao dos rgos supremos do Estado[20].

    O elemento territorial tomado em um sentido amplo, no compreendendo somente a terra, mastambm os rios, lagos, lagoas, mares interiores, golfos, baas, estreitos e demais acidentesgeogrficos, portos ancoradouros, o mar territorial, o subsolo, inclusive o espao areo[21]. Almdisso, em virtude das convenes internacionais sobre o princpio da extraterritorialidade, incluitambm os terrenos em que se localizam as embaixadas de um pas no exterior e os navios eaeronaves de sua bandeira[22].

    1.3.3. GovernoEm qualquer forma de sociedade humana, existe uma necessidade de ordem e hierarquia, sem as

    quais seria impossvel manter unido determinado grupo[23]. De fato, na medida em que algunsassumem o controle de um poder suficiente para resolver as questes que a todos afetam, ocupamuma posio diferenciada no mbito daquela sociedade, uma posio de mando que implica, porparte de seus destinatrios, uma de obedincia[24].

    a esta autoridade que chamamos de governo, que est acima dos indivduos (governados) e emigualdade de condies com os demais governos[25]. o governo o elemento condutor do Estado,que detm e exerce o poder absoluto de autodeterminao e auto-organizao emanado do povo.

    O governo caracteriza-se por ser uma organizao poltica efetiva e estvel, em condies depresidir e manter a ordem[26] e as instituies internas e representar o Estado no seu relacionamentocom os demais membros da comunidade internacional[27].

    Alguns autores preferem usar a expresso poder poltico ou soberania no lugar da palavragoverno. Entendemos que no h inconveniente em empregar como sinnimos os termosapresentados, pois todos, em sua essncia, designam a mesma coisa: o exerccio do podersoberano[28].

    1.3.4. Finalidade impossvel que se tenha uma noo completa de Estado, sem ter conscincia de sua finalidade,

    que alcanar o bem comum de certo povo, situado em determinado territrio. Sem esse elementoteleolgico, inexistiria o prprio Estado.

    Bem comum, por sua vez, nas palavras de Jos Geraldo Brito Filomeno, a realizao globaldo ser humano, quer do ponto de vista biolgico, quer do psquico, o que deve ser propiciado peloEstado mediante criao de condies de cunho poltico (mantendo as seguranas interna e externa),jurdico (buscando o Estado de direito mediante a criao, execuo e aplicao do ordenamentojurdico) e social (proporcionando populao em geral, e sua faixa mais carente, em especial,

  • condies de superao de sua insuficincia e necessidades de cunho educacional, de sade,saneamento bsico, lazer etc.) (grifos no original)[29].

    Uma sociedade de natureza poltica como o Estado no tem um fim em si mesmo. O fim doEstado, sociedade poltica que , consiste em fornecer condies para os homens que a compem (eque nela possuem direitos e deveres), inseridos noutros grupos, que a integram verdadeirassociedades menores , alcanarem os seus fins[30].

    Os autores que no consideram a finalidade como elemento essencial do Estado sustentam queela j est implcita na ideia de sociedade. De fato, toda sociedade, qualquer que seja a sua natureza(cultural, comercial, poltica, partidria), pressupe uma reunio de indivduos para fins comuns[31].Cumpre destacar, no entanto, que existe uma diferena fundamental que qualifica a finalidade doEstado: este busca o bem comum de certo povo, situado em determinado territrio. H, portanto, umafinalidade prpria do Estado, que lhe d um carter muito peculiar[32].

    Para atingir sua finalidade, como adiante se ver, o Estado emprega diversos meios, que variamconforme as pocas, os povos, os costumes e a cultura. Seu objetivo, todavia, sempre o mesmo eno se confunde com o de nenhuma outra instituio[33].

    O Estado no deve ser confundido, portanto, nem com as sociedades em particular, nem com asociedade em geral.

    2. NECESSIDADES PBLICASSegundo Dalmo de Abreu Dallari, os agrupamentos humanos caracterizam-se como sociedades

    quando tm uma finalidade, um fim prprio a atingir[34].Entre as sociedades polticas, h uma que se destaca das demais por possuir um poder direto

    sobre o indivduo, bem como por sua amplitude: o Estado. Todas as demais sociedades tm aorganizao e a atividade reguladas pelo Estado, que pode suprimi-las ou favorec-las[35].

    O que justifica a existncia do Estado so as necessidades humanas. As necessidades humanas,no dizer de Walter Paldes Valrio, so as sensaes de carncia ou deficit de algo prprio conservao de sua existncia individual ou social, que as pessoas experimentam, conjugadas aosimpulsos para faz-las desaparecer[36]. Na lio do autor referido, as necessidades humanas, paracuja satisfao a busca dos meios adequados a suprimi-las oferece certo limite ou escassez, tomam adesignao de necessidades econmicas[37]. Bem econmico, por seu turno, tudo aquilo que tem aqualidade de ser capaz de satisfazer as necessidades humanas, existindo em quantidade limitada[38].

    No so, entretanto, todas as necessidades humanas que justificam a existncia do Estado, pois asindividuais so aquelas que as pessoas experimentam de modo singular, independentemente de suasrelaes com a sociedade ou com o Estado, e que, justamente por isso, devem ser satisfeitas pelo

  • prprio indivduo, por seu prprio esforo e custo, podendo a forma de satisfao variar de pessoapara pessoa, de acordo com a capacidade econmica de cada uma[39]. o caso das necessidades devesturio, alimentao, habitao etc.

    Tambm no age o Estado no atendimento das necessidades coletivas, como tais consideradasaquelas que pertencem a determinados grupos ou setores bem definidos. o caso dos interesses deum condomnio, de um clube, de uma associao etc. Tal espcie de necessidades humanas sentidapelas pessoas como integrantes do grupo social especfico a que pertencem[40] e deve ser satisfeitapelo esforo da referida coletividade, considerada esta como a soma de seus indivduos.

    H, todavia, certas necessidades que no podem ser satisfeitas pelo esforo do indivduo nemmesmo pelo esforo coordenado dos integrantes de determinada coletividade, pois so do interessede todos os segmentos da sociedade[41]. So as chamadas necessidades coletivas pblicas ou, maisresumidamente, necessidades pblicas, cuja satisfao o Estado assumiu ou confiou a outrasentidades de direito pblico, e que so atendidas, basicamente, pelo processo do serviopblico[42]. Dito de outro modo, consideram-se pblicas as necessidades coletivas atendidas peloEstado[43].

    Percebe-se, do exposto, que toda necessidade pblica , em princpio, coletiva[44], mas arecproca est excluda, pois existem necessidades coletivas que no so necessidades pblicas[45].O que caracteriza estas ltimas , precisamente, a forma de necessrio atendimento pelos chamadosservios pblicos.

    Em sentido lato, pode-se conceituar necessidade pblica como tudo aquilo que incumbe aoEstado (ou a outras entidades a ele submetidas) satisfazer, em decorrncia de uma deciso polticainserida em norma jurdica, seja de nvel constitucional, seja de nvel infraconstitucional[46]. Soescolhas polticas, como dito, que definem uma necessidade como pblica e, por consequncia,delimitam o raio de atuao do Estado; escolhas, como salienta Jos Souto Maior Borges, quetraduzem preferncias eventuais dos detentores do poder poltico ou das maiorias congressuais[47].Inexiste, de fato, no estgio atual do conhecimento cientfico, como acentua o autor referido, umcritrio vlido, universalmente aceito, para revelar quais as necessidades a serem providas peloEstado e quais as que devero ser satisfeitas pelos particulares[48].

    Em sentido estrito, necessidades pblicas so aquelas que interessam aos cidadosindistintamente, sem que se possa determinar o grau de interesse que cada um tenha individualmentena existncia do servio ou da atividade pblica de que se trate.

    Ressalte-se que a definio de necessidades pblicas (em sentido amplo) depende dascircunstncias de tempo e de lugar[49]. So, de fato, variveis no tempo as necessidades pblicas:nas sociedades polticas primitivas, as necessidades consideradas pblicas eram extremamentereduzidas; limitavam-se, em geral, defesa contra a agresso externa, segurana interna e

  • distribuio da justia. Hoje, as necessidades pblicas abrangem desde a assistncia ao nascituro,prolongando-se infncia, adolescncia e velhice desamparada, at recreao pblica. Noquadro vasto e diversificado, situam-se, tambm, a educao, a sade, a habitao, o fomento produo etc.

    Tambm so variveis no espao as necessidades pblicas: na mesma poca, elas se apresentamde modo desigual entre os vrios pases, em virtude de suas peculiaridades geogrficas, culturais epolticas.

    Advirta-se, ainda, que as necessidades gerais (pblicas), cuja satisfao busca a atividadeestatal, no so, simplesmente, a soma dos interesses individuais, mesmo porque aquelas vo almdo interesse das pessoas que, em dado momento, constituem o Estado[50].

    3. SERVIOS PBLICOSAo conceito de necessidade pblica corresponde o de servio pblico: a necessidade pblica

    sentida pela coletividade; o servio pblico produzido pelo Estado visando a satisfao daquelanecessidade. A cada interveno do Estado, tendente a satisfazer uma necessidade pblica,corresponde a prestao de um servio pblico[51].

    A expresso servios pblicos pode ser tomada em, pelo menos, duas acepes: em sentidoobjetivo e em sentido subjetivo.

    Em sentido subjetivo (ou orgnico), corresponde o servio pblico s organizaes de pessoal ematerial que atuam sob a responsabilidade de entidades pblicas, para o desempenho de funes eatribuies de sua competncia.

    O servio pblico, em sua acepo objetiva, pode ser definido como a atividade de oferecimentode utilidade ou comodidade materialmente fruvel pelos administrados, pelo Estado ou por quem lhefaa as vezes[52], sob regime de direito pblico (o regime jurdico-administrativo)[53].

    Servios pblicos gerais (tambm conhecidos como universais) so os prestados uti universi,isto , que atendem de forma indistinta a todos os cidados[54], sendo, por conseguinte, insuscetveisde utilizao individual e mensurvel. Atendem a toda a coletividade, sem objetivar usuriosdeterminados[55], como os de iluminao pblica, de coleta de lixo etc. O servio pblico geral indivisvel: no suscetvel de fracionamento entre os usurios, isto , no se pode individualizar oservio recebido por cada usurio[56].

    Os servios pblicos especficos (tambm chamados de singulares ou especiais), ao contrrio,so os prestados uti singuli[57]. So os que, embora se encontrem mobilizados para servirindistintamente a todos, possibilitam a individualizao do beneficirio (destinatrio)[58], sempreque a sua prestao se torna concretamente necessria, como os de fornecimento de energia eltrica e

  • de gua. Os servios especficos gozam, portanto, de divisibilidade, isto , da possibilidade de, pelomenos aproximadamente, avaliar-se a utilizao individual (efetiva ou potencial) pelo usurio[59].

    Tanto os servios pblicos gerais como os especiais esto organizados para satisfazer umanecessidade pblica[60], apesar de os ltimos atenderem de modo particular e individualizado aalgumas pessoas.

    4. PODER DE POLCIAA atividade administrativa estatal no se restringe aos servios pblicos.Com efeito, no mbito da referida atividade, o Estado, por vezes, levado a praticar atos que no

    prestam comodidade aos indivduos (como ocorre nos servios pblicos), mas limitam a atividadedos particulares, impondo-lhes abstenes e, desta forma, preservam a sociedade de males[61]. Taisatos configuram o chamado poder de polcia, podendo ser citados como exemplos: no sair comveculo, salvo se devidamente licenciado; no portar arma, salvo se previamente autorizado etc.

    O ato de polcia isto , aquele que envolve o exerccio do poder de polcia , ao contrrio dosservios pblicos, no exercido em benefcio de quem o pede, mas constitui restrio a direitoseu, em funo do bem-estar da coletividade. Nesse sentido a precisa lio de Celso AntnioBandeira de Mello: Enquanto o servio pblico visa a ofertar ao administrado uma utilidade,ampliando, assim, o seu desfrute de comodidades, mediante prestaes feitas em prol de cada qual,o poder de polcia, inversamente (conquanto para a proteo do interesse de todos), visa arestringir, limitar, condicionar, as possibilidades de sua atuao livre, exatamente para que sejapossvel um bom convvio social. Ento, a polcia administrativa constitui-se em uma atividadeorientada para a conteno dos comportamentos dos administrados, ao passo que o servio pblico,muito ao contrrio, orienta-se para a atribuio aos administrados de comodidades e utilidadesmateriais (grifos no original)[62].

    O poder de polcia a prerrogativa que o Estado tem de, observadas as normas jurdicas,disciplinar o exerccio dos direitos individuais relacionados com o uso, o gozo e a disposio dapropriedade e com o exerccio da liberdade dos administrados, compatibilizando-os com o bem-estar social ou com o prprio interesse do Poder Pblico.

    que o interesse geral (pblico), cuja satisfao busca o Estado, nem sempre coincide com osinteresses individuais. Isto porque, como dito anteriormente, o interesse geral no a soma dosindividuais.

    Poder de polcia , assim, a atividade preventiva ou repressiva, exercida pela Administrao,com o propsito de condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais,em benefcio do interesse pblico, promovendo, assim, o bem-estar geral[63]. Destina-se a polcia

  • administrativa a prevenir o surgimento (quando ainda no aconteceu) de atividades particularesnocivas aos interesses sociais ou pblicos ou a obstar (paralisar, impedir, reprimir) seudesenvolvimento.

    O campo de atuao tradicional do poder de polcia do Estado vasto, incluindo todas asrestries impostas pelo Poder Pblico aos indivduos, em benefcio do interesse coletivo, sade,ordem pblica, segurana, e, ainda mais, os interesses econmicos e sociais. Engloba, pois, dentreoutras atividades, o controle da circulao nas vias pblicas, a vigilncia sanitria (exercida sobre ocomrcio de alimentos e medicamentos), a higiene dos logradouros pblicos e o controle deepidemias[64].

    Cumpre destacar, entretanto, que as novas exigncias da vida moderna, materializadas,sobretudo, no alargamento da ao legislativa a reas outrora inexploradas tais como meio ambiente,a esttica das cidades, a proteo do consumidor, conduziram evoluo do prprio conceito deordem pblica. Assim, o poder de polcia, que o principal instrumento do Estado no processo dedisciplina e conteno dos interesses individuais, reproduz, na evoluo de seu conceito, essa linhaascensional de interveno dos poderes pblicos. De simples meio de manuteno da ordem pblicaele se expande ao domnio econmico e social, subordinando ao controle e ao coercitiva doEstado uma larga poro da iniciativa privada[65].

    Atualmente, por conseguinte, o poder de polcia incide sobre as mais variadas matrias, sendovasto o seu campo de atuao: h polcia de caa e pesca, destinada proteo da fauna terrestre eaqutica; polcia de diverses pblicas, destinada defesa dos valores sociais; polcia florestal,com a finalidade de proteger a flora; polcia de pesos e medidas, volvida ao controle e fiscalizaode pesos e medidas; polcia edilcia, que se ocupa da disciplina das construes etc.[66]

    O poder de polcia manifesta-se por atos normativos (gerais, abstratos e impessoais) ou atosconcretos. Dos primeiros so exemplos os regulamentos (venda de bebidas nos perodos eleitorais ecarnavalescos). Dos segundos so exemplos os atos administrativos de interdio de atividade nolicenciada; de apreenso de mercadoria deteriorada; de guinchamento de veculos que no oferecemcondies ideais de uso; de embargo de obra que no obedece ao ato de aprovao[67].

    O poder de polcia tambm compreende os atos de fiscalizao pelos quais se previnem osdanos decorrentes da ao dos administrados. o caso de fiscalizao dos restaurantes, bares elanchonetes, no que concerne higiene e qualidade dos alimentos postos ao consumo pblico; dasconstrues, no que respeita segurana e habitabilidade etc. Essas manifestaes redundam naexpedio de alvars, licenas e autorizaes[68].

    5. ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO: CONCEITO

  • O Estado, para atingir sua finalidade o bem comum de certo povo, situado em determinadoterritrio , desenvolve uma srie de atividades: presta servios pblicos (educao, sade, dentreoutros), exerce poder de polcia, constri obras pblicas etc. Essas atuaes constituem a chamadaatividade administrativa do Estado, que, em suma, visa ao atendimento das necessidadesconsideradas pblicas (interesses relevantes que o Estado, por meio de deciso poltica, encampa).A atividade administrativa , por isso, considerada a atividade-fim do Estado, visto que constitui ofim, a finalidade para a qual o Estado foi criado[69].

    O Estado-Administrao, todavia, no poderia manter-se nem cumprir suas finalidades se nodispusesse de uma massa adequada de meios econmicos, que se alimenta ou de rendaspatrimoniais do prprio Estado (e de atividades comerciais ou industriais por ele exercidas) ou,ento, obtida, pelo poder de imprio, pela riqueza dos cidados. Na Idade Mdia, as entradas daprimeira espcie (receitas originrias) que tinham o papel preponderante. No Estado moderno,todavia, os referidos ingressos foram perdendo a importncia e, hoje, a segunda modalidade (receitasderivadas) que, em maior proporo, preenche, por intermdio dos tributos, as necessidades doerrio pblico[70].

    V-se, portanto, que, para que o Estado possa desenvolver sua atividade--fim, necessitacarrear recursos financeiros, sem os quais no seria possvel movimentar a mquina administrativaem direo ao atendimento das necessidades pblicas[71]. Surge a a chamada atividade financeirado Estado, a qual, ressalte-se, no se restringe mera arrecadao dos meios indispensveis satisfao das necessidades pblicas[72].

    De fato, as finanas pblicas (nas quais se coordenam elementos econmicos, polticos ejurdicos[73]) esto constitudas pelos gastos (despesas pblicas) e seu financiamento (receitaspblicas) no contexto do oramento do Estado[74].

    Esta a concluso a que se chega aps a leitura da definio proposta por Rubens Gomes deSousa, que entende a atividade financeira do Estado como a que visa a obteno, a administrao eo emprego de meios patrimoniais que lhe possibilitem o desempenho daquelas outras atividades quese referem realizao de seus fins (grifamos)[75].

    Desse conceito no se afasta Carlos Mersn, que leciona: Na atividade financeira estatalenvolvemos o conjunto dos atos de um governo tendentes obteno dos ingressos e realizaod o s egressos, compreendendo-se tambm as gestes necessrias para estes e aqueles(grifamos)[76].

    Segundo Geraldo Ataliba, a atividade financeira do Estado consiste no levantamento, gesto edespesa dos dinheiros pblicos (grifamos)[77].

    No mesmo sentido a lio de Ruy Barbosa Nogueira, segundo o qual atividade financeira

  • estatal consiste em toda ao que o Estado desenvolve para obter, gerir e aplicar os meiosnecessrios para satisfazer s necessidades da coletividade e realizar seus fins (grifamos)[78].

    Da anlise dos conceitos propostos pelos autores supracitados, percebe-se que, na concepodestes, a atividade financeira do Estado desenvolve-se, basicamente, em trs campos afins: a) areceita, que a obteno dos meios patrimoniais necessrios realizao dos fins visados peloEstado; b) a gesto, que consiste na administrao e conservao do patrimnio pblico; c) adespesa, que o emprego (utilizao, aplicao), pelo Estado, dos recursos patrimoniais disponveispara a realizao dos fins a que se destinam[79].

    Registre-se, por outro lado, a existncia de concepo doutrinria ligeiramente diversa, a qualacrescenta aos verbos obter, despender e gerir, acima referidos, o verbo criar, que seriarepresentativo do crdito pblico, assim entendido o procedimento do Estado para, medianteoperaes de emprstimos, captar recursos monetrios e aplic-los aos gastos pblicos, tanto paracustear investimentos como para antecipar receita, quando desequilibrado o oramento.

    Na esteira desse raciocnio, Aliomar Baleeiro leciona consistir a atividade financeira do Estadoem obter, criar, gerir e despender o dinheiro indispensvel s necessidades, cuja satisfao oEstado assumiu ou cometeu queloutras pessoas de direito pblico (grifamos)[80].

    Filia-se, igualmente, a esta corrente doutrinria Jos Souto Maior Borges, que assevera:Internamente, as vrias manifestaes da atividade financeira do Estado se exercem medianteoperaes de: a) receita tributria, ou seja, a proveniente da arrecadao de impostos, taxas econtribuies, e receita patrimonial; b) despesa; c) oramentao; d) crdito, e.g., os emprstimospblicos internos voluntrios (grifamos)[81].

    6. A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO LIBERAL: A FISCALIDADENos sculos XV e XVI, poca das grandes navegaes, encontramos o Estado associado aos

    comerciantes com o objetivo de desenvolver o comrcio e a explorao colonial. Era o chamadomercantilismo.

    O liberalismo econmico nasceu com a decadncia do regime econmico mercantilista e osurgimento da burguesia. O Estado Liberal, que emergiu da Revoluo Francesa (1789) epredominou durante o sculo XIX, tinha como postulados principais a livre iniciativa e a livreconcorrncia. Com o advento de tal modelo, operou-se uma dissociao bem ntida entre a atividadeeconmica e a atividade poltica: as decises econmicas (as relativas ao emprego de fatoresescassos) caberiam inteiramente aos membros da comunidade, em princpio sem qualquerinterferncia do Estado[82].

    Sob esse prisma, a funo do Estado era essencialmente abstencionista, ficando o plano

  • decisrio poltico circunscrito quelas funes elementares do Estado e indispensveis para o livredesenvolvimento da atividade dos particulares[83]. Era o chamado Estado-Polcia (LtatGendarme): aquele que, em face das liberdades em geral (e das de indstria e comrcio,especialmente), assumia uma funo puramente negativa (neutra), atribuindo-se-lhe, unicamente, aresponsabilidade de policiar a ordem pblica e, desse modo, criar as condies idneas quepermitissem a plena expanso das referidas liberdades[84].

    Na ideologia do liberalismo econmico, a atividade financeira do Estado era quase sempreneutra pois no influenciava no contexto social ou na conjuntura econmica[85] , tendo, aprincpio, natureza adjetiva e carter meramente instrumental da ser tradicionalmente conhecidac o mo atividade-meio[86] (ou de segundo grau). As atividades instrumentais ou adjetivas(atividades-meio) do Estado so as que, embora no atendendo diretamente comunidade, atuamcomo um instrumento ou meio para a execuo das outras atividades atravs das quais se realizamdiretamente as polticas executivas dos governos (atividades-fins)[87]. Isto significa que, naconcepo do liberalismo, a atividade financeira no est includa entre os fins do Estado, no seesgotando, pois, em si mesma.

    Os tributos, nesse contexto, caracterizam-se pela chamada fiscalidade, que significa autilizao do instrumental tributrio com o exclusivo objetivo de prover os cofres pblicos, para queo Estado possa realizar seus fins (isto , a consecuo do bem comum)[88]. A fiscalidade secaracteriza, pois, por objetivar a sustentao dos encargos prprios do rgo central daadministrao[89].

    Nesta perspectiva meramente fiscal, a atividade financeira do Estado no visa a direta satisfaodas necessidades pblicas, mas representa um instrumento fundamental cujo regular funcionamentoconstitui condio indispensvel para o desempenho das chamadas atividades substantivas,materiais ou atividades-fins, assim entendidas as atribuies especficas do Estado que estas sim visam diretamente ao atendimento das necessidades pblicas (necessidades priorizadasinstitucionalmente)[90]. O objetivo da atividade financeira estatal, nesta perspectiva, ser um meiopara o Estado atingir seu fim[91].

    No era permitido, segundo tal doutrina, que os tributos alterassem as regras do mercado,intervindo na livre iniciativa e na livre competio, o que se eivaria de insanvel equvoco, naopinio dos proslitos da fiscalidade estrita[92].

    A postura de neutralidade do Estado Liberal e de sua atividade financeira, de modo especfico gerou contrastes chocantes: fortunas imensas se acumulavam nas mos dos dirigentes do podereconmico; o luxo, a ostentao, a nsia irrefreada de ganhar cada vez mais criaram o conflito entreas classes patronais e assalariadas. Organizaram-se, neste perodo, as grandes empresas, os trusts,os cartis, os monoplios e todas as formas de abuso do poder econmico, acentuando-se cada vez

  • mais o desequilbrio social, enquanto o Estado Liberal, fiel sua postura de simples gendarme, atudo assistia de braos cruzados, limitando-se a policiar a ordem pblica[93].

    7. A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO INTERVENCIONISTA: AEXTRAFISCALIDADEOs problemas que se abateram sobre a sociedade em decorrncia da sua postura de neutralidade

    levaram o Estado a refletir sobre o alargamento de seus deveres para muito alm da misso degarantir uma ordem jurdica para o exerccio dos direitos. Atividades consideradas anteriormenteexcepcionais passaram a constituir o exerccio regular, normal, de competncia, compreendida jagora na esfera prpria do Estado[94].

    O advento da Segunda Guerra Mundial iria estimular ainda mais a atitude intervencionista doEstado. Este, assumindo amplamente o encargo de assegurar a prestao dos servios fundamentais atodos os indivduos, ampliou sua esfera de ao, e a necessidade de controlar os recursos sociais eobter o mximo proveito com menor desperdcio, para fazer face s emergncias da guerra, leva aao estatal a todos os campos da vida social, no havendo mais qualquer rea interdita interveno do Estado[95].

    Surge, nesse contexto, ao lado do fim meramente fiscal (funo adjetiva) da atividade financeirado Estado, a possibilidade de interveno governamental na sociedade atravs das finanas pblicas,o que evidenciaria a existncia de um fim extrafiscal da atividade financeira estatal[96], que sedistingue da simples fiscalidade porque no se limita a retirar do patrimnio dos particularesrecursos pecunirios para a satisfao de necessidades pblicas: trata-se, no dizer de Jos SoutoMaior Borges, de funo tipicamente intervencionista e redistributiva (grifos no original)[97].

    A extrafiscalidade, segundo Raimundo Bezerra Falco, a atividade financeira que o Estadoexercita sem o fim precpuo de obter recursos para seu errio, para o fisco, mas sim com vistas aordenar ou reordenar a economia e as relaes sociais (grifo no original)[98].

    Se, no Estado liberal, as finanas pblicas eram quase sempre neutras, atendendo ao objetivo definanciar o mnimo gendarme[99], no Estado moderno, intervencionista, elas so concebidas comoinstrumento de poltica fiscal dos mais poderosos[100]. O Estado, para realizar seus fins, abandonasua posio de neutralidade com respeito ao funcionamento do sistema econmico: o chamadoEstado do Bem-Estar Social (Welfare State ), ou simplesmente Estado Social, aquele cujafinalidade essencial promover o bem-estar geral, atualizando os postulados liberais do Estado deDireito e harmonizando--os com as exigncias da justia social[101].

    As finanas pblicas modernas, portanto, passaram a se caracterizar precisamente pelasmanifestaes extrafiscais da atividade financeira do Estado. As finanas pblicas, em sua funo

  • extrafiscal, tendem a influir no contexto social ou na conjuntura econmica, regulando-os oumodificando-lhes certos ngulos estruturais[102].

    O Estado atua, nessa perspectiva intervencionista, editando normas de contedo financeiro oufiscal pelas quais impulsiona medidas de fomento ou de dissuaso, como, por exemplo, quandoconcede benefcios fiscais ou impe cargas tributrias mais ou menos pesadas, estimulando(incentivando) determinadas atividades econmicas ou desestimulando (coibindo) outras[103]. Oobjetivo estatal, em tais casos, a realizao de outros valores (sociais, polticos ou econmicos)constitucionalmente assegurados, que prevalecem sobre finalidades meramente arrecadatrias derecursos monetrios[104].

    o caso, por exemplo, da majorao do Imposto de Importao (II) pelo Poder Executivo (art.153, 1o, da CF) com o fim de obstaculizar as operaes de importao que visa satisfazerdiretamente o interesse pblico de proteo indstria nacional[105] ou da cobrana do ImpostoTerritorial Rural (ITR) com o fim de desestimular a manuteno de propriedades rurais improdutivas(art. 153, 4o, I, da CF/1988[106]) que visa satisfazer diretamente o interesse pblico de que apropriedade atenda a sua funo social (art. 5o, XXIII, da CF)[107].

    Tambm como manifestao do carter extrafiscal da atividade financeira do Estado pode sercitado o caso da cobrana progressiva do IPTU com o fim de desestimular a manuteno depropriedades urbanas no edificadas, subutilizadas ou no utilizadas (art. 182, 4o, II, da CF) que,a exemplo do ITR, visa satisfazer diretamente o interesse pblico de que a propriedade atenda a suafuno social (art. 5o, XXIII, da CF)[108].

    Assim, enquanto nas finanas com carter fiscal, a atividade financeira estatal um instrumentoindireto (ou de segundo grau) em relao aos fins do Estado (pois se apresenta apenas como meiopara cobrir os gastos pblicos e estes, por sua vez, que satisfazem s necessidades pblicas)[109],a atividade financeira com carter extrafiscal serve, ela prpria, para atingir a finalidade imediata doEstado, aparecendo, pois, como um instrumento direto (ou de primeiro grau) para a consecuo dosfins pblicos[110].

    Em verdade, como bem destaca Raymundo Juliano Rgo Feitosa, os fins (fiscais ou extrafiscais)da atividade financeira do Estado so, em certa medida, aqueles delineados em um modelo de Estadodefinido no texto da Constituio Federal[111]. A cada modelo de Estado (liberal ouintervencionista), ressalta Sylvio Santos Faria, as atividades financeiras estatais se amoldam comoum corolrio da teoria poltica dominante, apresentando-se elas como um meio auxiliar, uminstrumento de execuo das doutrinas e dos postulados polticos vigentes e caracterizadores do tipoestatal[112].

    , portanto, a concepo das finalidades do Estado que, em ltima anlise, ir determinar oscontornos e definir o contedo das finanas pblicas[113].

  • 8. CINCIAS QUE ESTUDAM A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADOCincia o conjunto de conhecimentos coordenados relativamente a determinado objeto.Extrai-se, do conceito supra, que cada cincia tem seu objeto prprio de estudo, o qual, por sua

    vez, somente adquire significado por se colocar num sistema de referncia, que pode ser definidocomo o modelo (corte metodolgico) por intermdio do qual o objeto do conhecimento pode serestudado pelo ser cognoscente[114].

    O objeto da cincia, como leciona Ruy Barbosa Nogueira, pode ser tomado no sentido materialou no sentido formal: No sentido material, objeto significa o prprio assunto estudado. No sentidoformal, significa o aspecto ou mtodo pelo qual a respectiva cincia estuda o contedo oumatria[115].

    Assim, consoante o citado autor, vrias cincias podem ter como objeto material de estudo omesmo assunto, desde que cada uma aprecie ou trate este sob aspectos ou prismas diferentes, isto ,de forma peculiar. As cincias que tm por objeto material de estudo o mesmo assunto so cinciasafins, mas diferenciadas pela forma que cada uma estuda a matria[116].

    o que ocorre com a atividade financeira do Estado[117], que objeto material de estudo detrs disciplinas distintas, mas afins: a Cincia das Finanas, o Direito Financeiro e o DireitoTributrio[118]. Vejamos, separadamente, cada uma delas[119].

    8.1. Cincia das FinanasNo dizer de Aliomar Baleeiro, a Cincia das Finanas a disciplina que, pela investigao dos

    fatos, procura explicar os fenmenos ligados obteno e dispndio do dinheiro necessrio aofuncionamento dos servios a cargo do Estado, ou de outras pessoas de direito pblico, assim comoos efeitos outros resultantes dessa atividade governamental (grifos no original)[120].

    Procurando conceituar tal disciplina, Geraldo Ataliba assim leciona: A cincia das finanasestuda os princpios polticos, econmicos e administrativos que orientam o poder pblico noexerccio de sua atividade financeira e os processos desta ao[121].

    A Cincia das Finanas, conforme a lio dos autores citados, estuda a atividade financeira doEstado como observadora dos fenmenos ocorridos na Administrao Pblica, no que toca despesa, receita, ao oramento e ao crdito pblicos: ela observa aqueles fenmenos financeiros,mas no regula nada; apenas indaga quais so, como so e por que so tais fenmenos[122], indicasolues compatveis com a satisfao das necessidades resultantes da realidadesocioeconmica[123] e d informaes, orientaes e subsdios para o Direito Financeiro e oTributrio normatizar aquela atividade[124]. A Cincia das Finanas caracteriza-se, assim, por serpr-jurdica ou pr-legislativa[125], pois objetiva prestar um auxlio ao ente poltico, fornecendo

  • dados econmicos, polticos, administrativos etc., para que o legislador formule sua decisopoltica[126], enquanto o Direito Financeiro (bem como o Tributrio) trabalha com a norma jeditada[127]. A Cincia das Finanas, como se v, constitui o pressuposto informativo e orientadorpara as normas jurdicas que regulam as finanas pblicas[128].

    Em outras palavras, a Cincia das Finanas trabalha com fatos do mundo econmico, financeiro epoltico, ao passo que o Direito Financeiro e o Direito Tributrio, encarando os mesmos fatos sob oaspecto formal, apresentam esquemas, meios ou instrumentos, bem como os estruturam com base emprincpios de Direito Pblico, necessrios para a dinamizao dos institutos desses campos[129].

    A Cincia das Finanas representou o marco inaugural do estudo das finanas pblicas.Conquanto tenha o nome de Cincia, no revela verdadeira natureza cientfica, pois, ao contrriode abrigar unidade metodolgica, caracteriza-se pelo sincretismo, tanto que estuda o seu objeto aatividade financeira do Estado por vrios ngulos, quais sejam, o poltico, o social, oadministrativo, o histrico, o antropolgico, o econmico e outros[130].

    A Cincia das Finanas , portanto, disciplina metajurdica, visto que destituda de trao dejuridicidade, no se inscrevendo entre os ramos do Direito, mas no quadro das cinciaspolticas[131].

    8.2. Direito FinanceiroEstudando o mesmo objeto, isto , a atividade financeira do Estado, a Cincia das Finanas e o

    Direito Financeiro so disciplinas materialmente afins, relacionadas, mas distintas por seu objetoformal, isto , pela forma diferente que cada uma delas trata o mesmo fenmeno[132].

    A Cincia das Finanas examina a atividade financeira estatal do ponto de vista terico,especulativo (speculari, observar), isto , analisa essa matria pelo prisma da pesquisa e elaboraode princpios diretores, de sistematizao cientfica, para orientar a melhor forma dedesenvolvimento da atividade financeira do Estado[133]. Em outras palavras, estuda essa atividadesomente para conhec-la e nada mais.

    J o Direito Financeiro constitudo pelas normas que disciplinam (regulam) a atividadefinanceira estatal[134]. , no dizer de Eduardo Marcial Ferreira Jardim, o ramo do Direito Pblicocomposto pelo plexo de normas que disciplinam uma parcela da atividade financeira do Estado, nocaso os campos da despesa pblica, receita pblica e oramento pblico, observando que a receitapblica retrocitada diz respeito destinao das receitas tributrias, podendo dispor, outrossim,sobre todos os aspectos no tocante s demais receitas[135].

    Na lio de Ariosto Rocha, na existncia das leis escritas que est a separao entre a Cinciadas Finanas e o Direito Financeiro: enquanto aquela constituda de normas abstratas, este o denormas concretas, positivas, escritas, emanadas do Governo[136].

  • De fato, a Cincia das Finanas estuda as leis inflexveis que governam os fenmenosfinanceiros, na sua manifestao espontnea, sem traar normas coercitivas[137]. As soluespropostas pela Cincia das Finanas, todavia, seriam puramente abstratas se o Direito Financeiro (ouo Tributrio, como adiante veremos) no interviesse para normatiz-las. Assim, o Direito assume ofenmeno socioeconmico que constitui o objeto da Cincia das Finanas e o torna jurdico, isto ,manda ser cumprido o que a Cincia das Finanas entendeu de interesse para a Nao[138].

    O estudioso do Direito Financeiro, como ressalta Amlcar de Arajo Falco, no mais sepreocupa, pelo menos necessariamente, com os meios financeiros de que, em tese, possvel dispor,nem com a prtica que seja prefervel adotar, para atingir determinadas finalidades. Tudo vemdeterminado de modo coercitivo e obrigatrio, de forma que a tarefa que se enseja a de promover,quando a oportunidade se apresente, a incidncia e a atuao da norma legal[139].

    8.3. Direito TributrioO Direito Tributrio descendeu do Direito Financeiro, tendo sido concebido como um sub-ramo

    deste, mas que acabou adquirindo foros de disciplina prpria, apresentando maior desenvolvimentodoutrinrio e maior riqueza de diplomas no direito positivo[140] de vrios pases, inclusive nobrasileiro.

    A autonomia cientfica do Direito Tributrio em face do Direito Financeiro decorreu do fato de,na vida econmica do Estado moderno, as receitas pblicas serem preponderantemente de origemtributria (obtidas, pois, por meio do poder de imprio, da riqueza dos cidados), j que as rendaspatrimoniais do prprio Estado no se mostram suficientes para arcar com os custos das atividadesinstitucionais necessrias consecuo das finalidades que a entidade pblica se prope a alcanar.Da a razo que justificou o surgimento de uma disciplina jurdica didaticamente autnoma,destacada do Direito Financeiro, para regular o fenmeno tributrio[141].

    Segundo Rubens Gomes de Sousa, o Direito Tributrio o ramo do Direito Pblico que rege asrelaes jurdicas entre o Estado e os particulares, decorrentes da atividade financeira do Estadono que se refere obteno de receitas que correspondam ao conceito de tributos (grifos nooriginal)[142].

    Tal conceito, no entanto, ao restringir o objeto do Direito Tributrio s relaes entre o Estado(como credor) e os particulares (como devedores)[143], esquece que nem sempre o Estado quefigura no polo ativo da relao jurdica (pois h os tributos parafiscais, que so arrecadados porentidades no estatais a quem a lei atribui a capacidade de figurar como credor da obrigao) e que,por outro lado, em algumas ocasies, no so particulares os ocupantes do polo passivo deobrigaes tributrias (como no caso das entidades pblicas imunes, que no se eximem da condiode responsveis por tributos que lhes caiba reter na fonte art. 9o, 1o, do CTN)[144].

  • O referido conceito, por outro lado, tem a virtude de indicar que o Direito Financeiro e oTributrio tm em comum suas atribuies: ambos visam disciplinar, normativamente, a atividadefinanceira do Estado.

    Todavia, enquanto o Direito Financeiro cuida da atividade financeira do Estado em suatotalidade, abrangendo receita, despesa, oramento e crdito pblicos[145], o Direito Tributrioregula um item apenas da atividade financeira do Estado: o campo restrito da obteno das receitasderivadas provenientes dos tributos (receitas tributrias).

    Nesse sentido a definio formulada por Paulo de Barros Carvalho: o direito tributriopositivo o ramo didaticamente autnomo do direito, integrado pelo conjunto das proposiesjurdico-normativas que correspondam, direta ou indiretamente, instituio, arrecadao efiscalizao de tributos [146].

    O Direito Tributrio, portanto, est para o Direito Financeiro como a parte est para o todo: este,abrangendo, do ponto de vista jurdico, toda a atividade financeira desenvolvida pelo Estado, eaquele, alcanando unicamente a parte da mesma atividade que se refere obteno das receitas denatureza tributria[147].

    Cotejando os referidos ramos do direito positivo, destaca Fernando Facury Scaff: O DireitoTributrio limita a arrecadao; o Direito Financeiro busca a melhor utilizao dos recursosarrecadados em prol do bem comum. Um vinculado a uma ideia individual, de retirada de dinheirodo bolso privado; o outro vinculado a uma ideia de bem pblico, de satisfao das necessidadespblicas[148]. E conclui o autor citado: Imagina-se uma forte separao entre esses dois mbitos,mas ela no existe, pois se trata das duas faces da mesma moeda. Sem um no existe o outro. Soantitticos e complementares, devendo resultar em um equilbrio que permita a convivncia emsociedade[149].

    Podemos, pois, dizer que o Direito Tributrio, como o Financeiro, tambm cuida da atividadefinanceira do Estado, em virtude de a receita tributria encontrar-se no bojo desta atividade.

    9. ESTADO DE DIREITO: A ORDENAO JURDICA DAS FINANASPBLICASAntes de adentrar no estudo de cada um dos campos em que se desenvolve a atividade financeira

    do Estado estudo que, advirta-se desde j, ser realizado sob o ngulo essencialmente jurdico ,enfatizar-se-, nas linhas seguintes, a relevncia da noo de Estado de Direito para o surgimento e aevoluo da disciplina jurdica das finanas pblicas.

    Como de sabena, o poder do Estado somente se caracteriza como poder jurdico, quandoorganizado e exercido segundo princpios e regras de Direito. Assim, quando submetido o Estado ao

  • imprio da lei (princpio da legalidade), surge o que se convencionou denominar Estado deDireito[150].

    Somente com o advento do Estado de Direito[151], que nasceu das Revolues que acabaramcom o velho regime absolutista da Idade Mdia, se cogitou de normas delimitadoras da ao doEstado-poder, estabelecendo balizas s prerrogativas dos governantes, nas suas relaes recprocas,e, outrossim, nas relaes com os governados, consoante leciona Gustav Radbruch: No Estadoabsolutista, um compromisso legal da administrao no era exequvel se alcanasse a cabea daadministrao: pois o soberano absolutista, que na qualidade de cabea da administrao nopoderia desviar-se do direito, como sujeito da legislao poderia a qualquer tempo modificar odireito para aquele caso isolado, e o ato, inadmissvel como ato administrativo, como ato legislativopoderia afirmar sua validade.

    Somente quando o Estado constitucional, com base na doutrina da diviso dos poderes, retirado senhor feudal cabea da administrao o exerccio exclusivo do poder legislativo, torna-sevivel um comprometimento dos rgos administrativos pelos rgos legisladores, umcomprometimento do Estado administrador por intermdio do Estado legislador, umautocomprometimento do Estado, a legalidade da administrao, e, como sua consequncia,direito dos sditos contra o Estado como tal, direitos subjetivos, pblicos, e limites legais administrao[152].

    Os pilares do Estado de Direito resumem-se, pois, em quatro, consoante lio de Carlos AriSundfeld[153]: a) a supremacia da Constituio ante o poder legislativo ordinrio[154]; b) aseparao dos Poderes[155]; c) a superioridade da lei; d) a garantia dos direitos individuais[156].

    Resta justificado, destarte, o que inicialmente dissemos: que a ideia de regulao jurdica dasfinanas pblicas surgiu justamente com o advento do Estado de Direito, sendo dele umaconsequncia. De fato, a concepo de Estado de Direito apresenta-se como um dos pressupostosfundamentais da existncia do Direito Pblico onde esto inseridos o Direito Financeiro e oTributrio , justamente porque este estabelece normas para as atividades do Estado, e evidenteque somente com base no pressuposto da submisso da atividade pblica a uma ordenao jurdica(fundamento do Estado de Direito) seria possvel conceber um Direito Financeiro fixando preceitospara disciplinar a gesto dos recursos pblicos, limitando, destarte, o poder das autoridades[157].

    Em suma: o Estado, em um primeiro momento, cria o ordenamento jurdico-positivo pelalegislao (constitucional ou infraconstitucional) e, num segundo momento, quando no exerccio desuas atividades em geral e das atividades financeiras em particular , submete-se ao seu imprio(princpio da legalidade)[158].

    A atividade financeira do Estado , assim, uma atividade jurdica, porquanto, independentementedos seus fins (fiscais ou extrafiscais), patente sua submisso, em qualquer hiptese, s normas

  • jurdicas vigentes[159]. No Estado de Direito (liberal ou social) no h atividade financeira semlei[160].

    O carter jurdico da atividade financeira estatal bem acentuado por Rbison de Castro, queexpe: Nos Estados modernos, regidos pelo Direito, toda atividade por eles exercida rege-se pornormas de comportamento, isto , pelo prprio Direito. Possuindo o Estado uma atividade financeira(obter, despender, gerir e criar), para que o Estado a exera, dever estar ela circunscrita s normasjurdicas, para atender s finalidades da prpria existncia do Estado. E conclui o precitado autor:O Estado, embora tenha que exercer sua atividade financeira, somente poder atend-la se a mesmafor regrada por normas jurdicas que imponham uma conduta onde, a partir da, o prprio Estado seamoldar s leis por ele expedidas[161].

    justamente a circunstncia de a vontade do Estado ser necessariamente regulada pela lei, comodestaca Raymundo Juliano Rgo Feitosa, que permite que o conhecimento jurdico seja empregadonos estudos dos problemas que resultam da normatizao da atividade financeira estatal[162].

  • Captulo II

    O Direito Financeiro

    1. CONCEITO DE DIREITOAntes de adentrarmos propriamente na anlise do Direito Financeiro, mister se faz iniciar os

    nossos estudos pelo conceito[163] do todo unitrio, do Direito, do qual o Direito Financeiro fazparte, como um de seus ramos.

    O termo direito pertence classe das palavras plurvocas, isto , das que possuem mais de umsentido. o que Joo Maurcio Adeodato chama de carter multvoco do vocbulo[164].

    O primeiro sentido do vocbulo direito como norma ou conjunto de normas que integram oordenamento jurdico positivo formalmente vlido[165] e que disciplinam as aes (norma agendi) o chamado direito objetivo , podendo ser definido, sob este aspecto, como sistema deimperativos autorizantes[166].

    A segunda acepo do termo como permisso trata-se do direito subjetivo , quando entoo direito definido como permisso concedida por meio de norma jurdica, nas palavras deGoffredo Telles Jnior[167], ou faculdade de agir de conformidade com o que ela dispe (facultasagendi), como prefere Vicente Ro[168].

    Finalmente, apresenta-se o vocbulo direito designando a qualidade especial do ato justo,sendo definido, nesse passo, como o justo nos termos da lei[169].

    Para os fins deste trabalho, tomaremos o direito no primeiro dos sentidos apontados, como sendoo conjunto de regras de conduta[170] coercitivamente impostas pelo Estado[171].

    2. DIREITO E CINCIA JURDICAO Direito tomado em sua acepo objetiva uma ordem (ordenao) da conduta

    humana[172]. Uma ordem, por sua vez, um sistema de normas.Concebe-se o Direito, assim, como um conjunto de regras de conduta aplicveis a diversos e

    amplos setores da vida social.Tais regras de conduta (denominadas normas jurdicas) no descrevem a realidade como , mas

    apenas como deve ser[173]. O Direito , pois, normativo (prescritivo): ele no descreve;prescreve[174].

    O Direito tomado como objeto de estudo de uma cincia: a Cincia do Direito. Ele, por si s,

  • no cincia, como pretendem alguns[175], mas apenas objeto dela[176].Enquanto o Direito traduz-se nas normas jurdicas, a Cincia do Direito corresponde a um

    conhecimento do ponto de vista tcnico-jurdico que tem por objeto aquelas normas em simesmas[177].

    A Cincia Jurdica , enquanto cincia, descritiva: tem por finalidade conhecer de fora o Direitoe descrev-lo com base em seu conhecimento[178], organizando logicamente aquele sistema denormas jurdicas e interpretando suas unidades e seu conjunto[179]. A Cincia do Direito, comodestaca Marcello Caetano, toma as normas jurdicas e interpreta-as, extrai delas o sentido quepermita lig-las a outras por intermdio de princpios informadores comuns, relaciona estes entre si ecria institutos doutrinrios mediante a construo jurdica articulando-os em sistema[180].

    O Direito posto se manifesta em linguagem, com funo prescritiva (linguagem-objeto), ao passoque a Cincia que o descreve tambm aparece como discurso lingustico, mas em funo descritivaou teortica (metalinguagem descritiva)[181].

    A distino entre o Direito e a Cincia Jurdica reside, pois, no fato de que esta no atribuideveres ou direitos, alm de suas proposies formuladas poderem ser verdadeiras ou no, ao passoque aquele atribui direitos e deveres, alm de suas normas serem vlidas ou invlidas.

    3. SISTEMA DO DIREITO POSITIVO E SISTEMA DA CINCIA DODIREITOMuitos autores estabelecem distino entre ordenamento e sistema jurdico. O ordenamento,

    nessa linha de pensamento, seria o texto bruto, o conjunto das mensagens legisladas[182], queintegrariam um domnio heterogneo (por serem produzidas em tempos diversos e em diferentescondies de aparecimento). J o sistema apareceria em decorrncia da contribuio do cientista(jurista), que compe as partes e outorga ao conjunto o sentido superior de um todo organizado (semcontradies, sem lacunas, isento de ambiguidades e pronto para ser compreendido pelodestinatrio), em condies, pois, de ser aplicado[183]. Em sntese: o ordenamento corresponderiaao direito positivo (direito posto) e o sistema, Cincia do Direito.

    No entanto, como bem observa Paulo de Barros Carvalho, no se pode negar a condio desistema a um estrato de linguagem tal como se apresenta o direito positivo[184]. Com efeito,consoante expe o citado autor, qualquer tecido de linguagem ter, necessariamente, aquele mnimode racionalidade inerente s entidades lgicas, de que o ser sistema uma das formas[185].

    Assim, no possvel estabelecer diferena entre ordenamento jurdico e sistema jurdico[186],visto que o primeiro, como tecido de linguagem que , apresenta-se como um sistema.

    Podemos, isto sim, estabelecer distino entre direito positivo e Cincia do Direito, mas ambosapresentam-se como sistemas.

  • Assim, consoante leciona Paulo de Barros Carvalho, as normas jurdicas formam um sistema, namedida em que se relacionam de vrias maneiras, segundo um princpio unificador[187]. O sistemado direito caracteriza-se pela circunstncia de suas normas estarem dispostas numa estruturahierarquizada (regida pela fundamentao/derivao nos aspectos material e formal), o que lheimprime possibilidade dinmica, regulando, ele prprio, sua criao e suas transformaes. Nessecontexto, a Carta Magna exerce papel fundamental na dinmica do sistema do direito positivo, poisimprime carter unitrio ao conjunto de normas, e a multiplicidade destas, como entidades da mesmandole, confere o carter de homogeneidade ao direito positivo[188].

    4. DIREITO PBLICO E DIREITO PRIVADOA ordenao jurdica una: o Direito no se divide. No Direito no existem um direito pblico e

    um privado. Os chamados ramos do Direito nada mais so que uma criao da Cincia Jurdica,mediante a qual os cientistas acreditam poder visualizar de modo mais adequado o seu objeto deestudo, consoante expe Paulo de Barros Carvalho: o direito posto, na sua continuidade normativa,oferece flagrante heterogeneidade de contedos, vista sua pretenso de regular as condutasintersubjetivas no contexto social. Da a diviso, de cunho puramente metodolgico, entre os vriosramos do sistema jurdico, providncia estratgica do sujeito do conhecimento para poderaproximar-se do objeto que pretende conhecer[189].

    Como bem destaca o doutrinador citado, qualquer tentativa de demarcao das fronteiras de dadoramo do Direito perder sua consistncia em contraste com o princpio da fundamental unidadesistemtica do ordenamento jurdico[190].

    A autonomia de qualquer ramo do Direito , portanto, relativa, pois ser sempre eexclusivamente didtica. Esto eles os ramos interligados por uma base comum que constitui oordenamento jurdico. O Direito , assim, uno, indivisvel, mas, por questes de didtica, foidividido para ser possvel o seu ensino e aprendizado. O desdobramento do Direito em disciplinasserve apenas, no dizer de Eduardo Bottallo, para atender imperiosa necessidade de dividir paramelhor conhecer[191]. Dessa maneira, dividiu-se o Direito em vrios ramos, os quais no soindependentes, a no ser didaticamente[192].

    Divide-se, tradicionalmente, o direito (objetivo) em pblico e privado[193]. Tal distino,conhecida pelos romanos[194], s adquiriu grande interesse com o advento do Estado deDireito[195].

    A conceituao do que seja direito pblico bem como a diferenciao com o direito privado temconstitudo um dos mais rduos temas da doutrina, que formulou diversos critrios para diferenci-los, dentre eles o critrio do sujeito e o do interesse.

  • Com base no critrio do sujeito (ou titular) da relao jurdica, diz-se que o direito pblicoquando rege as relaes dos Estados entre si, ou do Estado e seus membros, enquanto o privado aquele que rege a vida dos particulares[196]. Segundo o critrio do interesse e da utilidade queenvolve, seriam pblicas as normas que tutelam interesses pblicos (gerais), sendo privadas asnormas que regulam interesses privados (individuais). Ambas as correntes so criticadas.

    A dicotomia entre esses dois ramos cumpre vrias funes, no havendo um critrio nico paradiferenci-las. Talvez adotar uma viso formalista facilitaria essa distino: isso significa voltar aateno para o regime jurdico criado pelas normas.

    O Direito Pblico, disciplinando os interesses gerais da coletividade, caracteriza-se pelaimperatividade de suas normas, que no podem nunca ser afastadas por conveno dos particulares.J o Direito Privado, que versa sobre as relaes dos indivduos entre si, tem na supletividade deseus preceitos a nota caracterstica, isto , vigora apenas enquanto a vontade dos interessados nodisponha de modo diferente que o previsto pelo legislador[197].

    Embora a diviso morfolgica do direito em pblico e privado tenha sido objeto de inmerascrticas, em face da ideia de que o fim do Direito satisfazer interesses gerais, persiste a referidadistino que aceita sob o ponto de vista tcnico e didtico[198].

    Integram o primeiro o Direito Constitucional, o Direito Administrativo, o Direito Processual, oFinanceiro, o Tributrio, o Eleitoral, o Municipal, o Penal e o Internacional Pblico. Ao segundopertencem o Direito Civil, o Empresarial (Comercial) e o Internacional Privado.

    5. DIREITO FINANCEIRO: CONCEITOCada doutrinador tem um modo particular de definir o Direito Financeiro. Apresentamos, aqui,

    algumas dessas definies para, em seguida, oferecer aquela que nos parece mais apropriada.Segundo Paulo Nader, o Direito Financeiro o ramo do Direito Pblico que disciplina a receita

    e a despesa pblica[199].Para Aliomar Baleeiro, o Direito Financeiro o conjunto das normas que regulam a atividade

    financeira[200]. Tal atividade financeira, no caso, aquela desenvolvida pelo Estado[201].Walter Paldes Valrio concebe o Direito Financeiro como a disciplina que se preocupa com a

    regulamentao jurdica da atividade financeira do Estado, tanto em sua feio esttica quanto em suafeio dinmica[202]. E esclarece o citado autor os termos de sua definio: No aspecto esttico,trata da conceituao dos institutos financeiros que compem a atividade financeira do Estado e, noaspecto dinmico, refere-se s relaes jurdicas que se estabelecem entre o Poder Pblico e outrostitulares de direitos, que so os indivduos submetidos ao impacto da Administrao no desempenhodessa atividade (grifos no original)[203].

  • Para Jos Souto Maior Borges, o Direito Financeiro a parte do Direito objetivo que regula aatividade financeira do Estado e entes pblicos descentralizados[204].

    O Direito Financeiro, em nossa percepo, pode ser definido como o ramo didaticamenteautnomo do Direito, formado pelo conjunto harmnico das proposies jurdico-normativas quedisciplinam as relaes jurdicas decorrentes do desempenho da atividade financeira do Estado,exceto o que se refira obteno de receitas que correspondam ao conceito de tributos[205].

    Tal definio destaca que a autonomia do Direito Financeiro, como de qualquer outro ramo doDireito, exclusivamente didtica, pois, embora destacado para efeito de estudo, relaciona-se comos demais ramos jurdicos.

    A definio proposta ressalta, tambm, que o objeto do Direito Financeiro, como de qualqueroutro ramo do Direito, so relaes jurdicas. No quaisquer relaes, mas somente as que surgemem consequncia da atividade financeira estatal.

    A referida definio exclui, no entanto, do campo do Direito Financeiro tudo quanto se refira obteno de receitas que correspondam ao conceito de tributos (art. 3o do CTN), a fim de afast-lodo campo prprio do Direito Tributrio.

    Ressalte-se que o conceito anteriormente exposto do Direito Financeiro enquanto ramo dodireito positivo. Tomado, contudo, como ramo da Cincia Jurdica, o Direito Financeiro pode serdefinido como o conjunto de proposies cientficas que se voltam para a descrio das normasjurdicas.

    6. CONTEDO DAS NORMAS DE DIREITO FINANCEIRO

    6.1. Abrangncia do campo do Direito FinanceiroComo um conjunto de normas jurdicas, o mbito de incidncia do Direito Financeiro, como

    visto, abrange um setor particular do complexo universo das atividades estatais: a atividadefinanceira.

    O plexo de normas do Direito Financeiro disciplina, pois, os campos da: a) despesa pblica; b)receita pblica (entre as quais se incluem as receitas tributrias); c) oramento pblico; d) crditopblico[206].

    No que tange despesa pblica, ao oramento e ao crdito pblico, ocupa-se o DireitoFinanceiro de todos os aspectos a eles inerentes.

    Relativamente receita pblica, impende destacar que o regramento do Direito Financeiro dizrespeito a todos os aspectos (instituio, arrecadao e destinao) das receitas no tributrias. Jno tocante s receitas tributrias, cuida o Direito Financeiro apenas do aspecto da destinao delas.

    Com efeito, apesar de o Direito Tributrio, como visto, re