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Maria Divanira de Lima Arcoverde Rossana Delmar de Lima Arcoverde Leitura, Interpretação e Produção Textual DISCIPLINA O ato de escrever: perspectivas teóricas Autores aula 06

D I S C I P L I N A - ead.uepb.edu.br · 2 Aula 06 Leitura, Interpretação e Produção Textual Aula 06 Leitura, Interpretação e Produção Textual Para começo de conversa

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Maria Divanira de Lima Arcoverde

Rossana Delmar de Lima Arcoverde

Leitura, Interpretação e Produção Textual D I S C I P L I N A

O ato de escrever: perspectivas teóricas

Autores

aula

06

Aula 06  Leitura, Interpretação e Produção TextualCopyright © 2007 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte e da UEPB - Universidade Estadual da Paraíba.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central - UEPB

Governo Federal

Presidente da RepúblicaLuiz Inácio Lula da Silva

Ministro da EducaçãoFernando Haddad

Secretário de Educação a Distância – SEEDCarlos Eduardo Bielschowsky

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

ReitorJosé Ivonildo do Rêgo

Vice-ReitoraÂngela Maria Paiva Cruz

Secretária de Educação a DistânciaVera Lúcia do Amaral

Universidade Estadual da Paraíba

ReitoraMarlene Alves Sousa Luna

Vice-ReitorAldo Bezerra Maciel

Coordenadora Institucional de Programas Especiais - CIPEEliane de Moura Silva

A6751 Arcoverde, Maria Divanira de Lima. Leitura, interpretação e produção textual./ Maria Divanira de Lima Arcoverde, Rossana Delmar de Lima Arcoverde. – Campina Grande; Natal: UEPB/UFRN, 2007.

15 fasc.“Curso de Licenciatura em Geografia – EaD”.Conteúdo: Fasc. 1- Linguagem: diferentes concepções; Fasc. 2 - leitura – perspectivas teóricas; Fasc. 3 - o jogo discursivo no processo de leitura; Fasc. 4 - leitura – antes e além da palavra; Fasc. 5 - a leitura como prática social; Fasc. 6 – produção textual-perspectivas teóricas; Fasc. 7 – a tessitura do texto; Fasc. 8 – gêneros textuais ou discursivos; Fasc. 9 – gêneros textuais e ensino; Fasc. 10 – a escrita como processo; Fasc. 11 – recursos de textualidade – coesão; Fasc. 12 – recursos de textualidade – coerência; Fasc. 13 – produzindo gêneros textuais – o resumo; Fasc. 14 – produzindo gêneros textuais – a resenha; Fasc. 15 – produzindo gêneros textuais – o memorial

ISBN: 978-85-87108-59-3

1. Leitura (Lingüística). 2. Produção de textos. 3. Educação a Distância. I. Título.22 ed. CDD 418.4

Coordenador de EdiçãoAry Sergio Braga Olinisky

Projeto GráficoIvana Lima (UFRN)

Revisora TipográficaNouraide Queiroz (UFRN)Thaísa Maria Simplício Lemos (UFRN)

IlustradoraCarolina Costa (UFRN)

Editoração de ImagensAdauto Harley (UFRN)Carolina Costa (UFRN)

DiagramadoresBruno de Souza Melo (UFRN)Dimetrius de Carvalho Ferreira (UFRN)Ivana Lima (UFRN)Johann Jean Evangelista de Melo (UFRN)

Revisores de Estrutura e LinguagemRossana Delmar de Lima Arcoverde (UFCG)

Revisoras de Língua PortuguesaMaria Divanira de Lima Arcoverde (UEPB)

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Copyright © 2007 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte e da UEPB - Universidade Estadual da Paraíba.

Apresentação

Nossa trajetória nesta aula está circunscrita nas bases teóricas sobre o ato de escrever, traçando um percurso sobre as diferentes visões que têm sido encontradas nas últimas décadas. Nesse caminho, estudaremos as implicações teórico-metodológicas

do uso social da escrita na vida das pessoas.

Discutiremos, assim, situações de produção de textos escritos, enfatizando alguns conceitos provocados pelas reflexões sobre formulações teóricas advindas das teorias lingüísticas. Vamos ainda realizar atividades, colocando a produção escrita como uma prática social, que se instaura pelas situações de interação sócio-discursivas, em que estão envolvidos escritor, texto, interlocutores e a situação social.

Lembre-se, então, de que devemos continuar atuando com o mesmo procedimento dado às aulas anteriores, quais sejam: ler cuidadosamente o conteúdo, realizar as atividades propostas e buscar esclarecimentos para dirimir todas as possíveis dúvidas.

O glossário será apresentado ao longo da aula, assim como nas aulas anteriores, para ajudar na compreensão dos conceitos abordados.

ObjetivosCom esta aula, esperamos que você:

compreenda que o ato de escrever pode ser estudado sob vários enfoques teóricos;

aprenda que a atividade de escrever é de natureza social e dialógica, que se constitui na interação verbal.

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Para começo de conversa...A noção de linguagem como uma atividade de natureza social que se realiza por meio

das interações verbais tem provocado algumas mudanças sobre o ato de produção escrita, tanto no meio acadêmico, quanto nas práticas de professores.

Contudo, a expressiva quantidade de estudos nessa área revela que há caminhos diferentes para explicar como se dá esse processo. Os estudos levam a refletir, então, que se trata de uma atividade multifacetada, que envolve diversos aspectos e que exige de quem escreve uma série de ações, desde saber sobre o que se vai escrever, como vai escrever e para quem vai escrever, dentre outros.

Escrever, assim, não é tarefa fácil. Constitui fonte histórica e profícua de pesquisas no campo dos estudos da linguagem. Lingüísticas e interessados nessa área se debruçam para descobrir as múltiplas facetas envolvidas na construção do conhecimento sobre o que é escrever.

O percurso teórico sobre a questão da escrita é diverso e emerge das diferentes concepções de linguagem que produzem tendências de práticas divergentes sobre a atividade de escrever.

Vejamos então esse percurso em algumas vertentes e as implicações para o trabalho com a produção textual em sala de aula.

Alguns pesquisadores adotam uma visão experimental-positivista que recaem sobre o plano da mensuração. Há nessa vertente uma preocupação em tratar os fenômenos ou qualquer objeto de investigação pela apresentação de meios específicos para se medir os vários aspectos da problemática focalizada.

O trabalho de produção escrita, com base nessa abordagem, também é algo que deve ser realizado pela aplicação de ações, de modo que resultem em um produto final, acabado e que pode ser medido. Assim, essa perspectiva está centrada no produto textual que o indivíduo é capaz de escrever. O que constatamos, a partir dessa perspectiva, é a fragmentação das práticas de ensino da escrita, isoladas de outros conteúdos, sendo muitas vezes, tratadas como momentos específicos, em sala de aula para “Redação”, de natureza especificamente escolar. Assim, vemos as famosas situações escolares em que professores pedem aos seus alunos, logo após o regresso às aulas e depois de longas férias: “Escrevam uma redação com o título: minhas férias.” Quem de vocês não já vivenciou situação semelhante?

Há nesse modelo de produção escrita um tratamento dado exclusivo para o produto final que o aluno realiza sem se preocupar com o processo de escrita do texto, além de desconsiderar as condições necessárias para que ele seja produzido.

Essa perspectiva teórica perdurou durante longo tempo nas práticas escolares, tendo em vista que a linguagem ainda era vista como um instrumento de comunicação e que servia, essencialmente, para expressar sentimentos, expor emoções, entre outras.

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As propostas a seguir foram retiradas de um livro. Não são para você realizar, mas para ler e analisar. Assim, responda:

Como você se posiciona em relação a essas propostas?

Questões para nortear seu posicionamento:

Qual o foco central das propostas? A proposta contempla as condições necessárias para a realização de um texto? Qual a finalidade dessa atividade? O que o professor espera do aluno?

a) Reduza o texto seguinte a aproximadamente um quarto de sua extensão original. Dê-lhe um título.

b) Observe a gravura e escreva um texto com começo, meio e fim.

Sem consultar o conteúdo que será apresentado posteriormente, recrie uma dessas propostas, considerando sua avaliação anterior. É importante que você produza sem estudar o conteúdo que virá a seguir na aula.

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Continuando nossa conversa...Vejamos agora outro modo de abordagem sobre produção textual.

A partir da década de oitenta, um novo olhar voltou-se para essa questão, decorrente das teorias cognitivas, bem como da Lingüística Textual. Nessa perspectiva, uma proposta de produção escrita não pode se resumir a um pedido de “escreva um texto”, “seja criativo e elabore um texto em algumas dezenas de linhas” ou então, pedir que um aluno escreva um texto com base, apenas, em uma gravura. É preciso considerar outros aspectos relevantes para o processo de produção textual.

É válido reconhecer que nessa nova vertente, conhecida por cognitivista, há uma ampliação sobre o ato de escrever, vez que defende que a escrita, assim como a leitura, é uma atividade de compreensão, em que o escrevente utiliza seus esquemas mentais para produzir as idéias em um texto.

Essa forma de tratamento do texto levou muitos estudiosos a constatarem que outras questões merecem destaque e são importantes para a produção textual. A escrita de um texto se dá por um processo que deve levar em conta etapas em seu processamento, tais como: planejamento, revisão e reescrita. Na verdade, isso pode ser considerado um avanço, pois se vê um olhar menos tradicional para o ato de escrever.

No entanto, o que ainda vemos nessa abordagem é uma tendência que incide o processo de escrever como uma capacidade, sobretudo, cognitiva, mostrando que ela decorre da aquisição de determinadas competências, que segundo alguns autores, trazem conseqüências nas práticas didáticas, tendo em vista que

levavam o professor que adotava tais referências a enfocar, no ensino-aprendizagem de leitura e produção de textos, sobretudo as capacidades e processos cognitivos do aprendiz (quase sempre internos e de difícil avaliação e ensino) e a adotar descrições textuais de um grau de abstração que se aproximava de um ensino gramatical, desta vez, no nível do texto.

ROJO, 2001, p. 164.

Nessa perspectiva, o trabalho com a escrita na escola é legitimado pela “pedagogia da exploração temática” que solicita aos alunos a escrita de uma redação sobre determinado tema, sem definir um objetivo específico. Em geral, o aluno é convocado a escrever narrações, descrição e dissertações, sendo esta última a preferida de situações em concursos e vestibulares. Dessa forma,

A redação escolar foi vista como um ‘não-texto’, pois, além de não apresentar, em muitos casos, determinados padrões de textualidade, suas condições de produção revelam produtos meramente escolares.

BUNZEN, 2006, p.149.

Ligüística Textual

A Lingüística textual considera o texto como

unidade básica para a produção, tanto da leitura

quanto da escrita.

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A proposta do ENEM - 2005, é um bom exemplo desse modelo escolar requerido para a escrita de textos:

Com base nas idéias presentes nos textos acima, redija uma dissertação sobre o tema:

O trabalho infantil na realidade brasileira.

Ao desenvolver o tema proposto, procure utilizar os conhecimentos adquiridos e as reflexões feitas ao longo de sua formação. Selecione, organize e relacione argumentos, fatos e opiniões para defender seu ponto de vista e suas propostas, sem ferir os direitos humanos.

Proposta da prova do ENEM, 2005

Outro exemplo pode ser observado nesta proposta retirada de um livro didático:

“Seguindo esse mesmo processo, componha um texto focalizando a vida diária de uma das seguintes personagens:

um estudante um carteirouma criança uma dona de casaum agricultor uma secretáriaum motorista um professor”

SARGENTIM, H. Produção de textos: ensino fundamental. São Paulo: IBEP, 2004, p. 94.

O que vemos nessas atividades é que, embora as propostas oferecessem textos informando sobre os temas que ajudam ao escritor a saber sobre o que vai escrever, se tratam de propostas que artificializam o processo de escrita, pois esse aluno/candidato não é esclarecido quanto às condições de produção da linguagem que ele deve elaborar. A situação acaba por legitimar uma escrita vazia, sem propósito e sem valor funcional. Nessas propostas, escrever se revela como uma simples tarefa de preenchimento de idéias que vão compor um “texto” ou uma “dissertação”.

Condições de produção

As condições de produção do texto escrito exercem influência sobre a forma como o texto é organizado. Assim, na escrita é preciso considerar, o momento da produção, os objetivos, a quem se destina o texto escrito, onde vai circular o texto e o enunciador do texto, seja escrito ou oral.

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É necessário, portanto, extrapolar essa noção cognitivista em relação ao ensino de escrita, mostrando que saber falar português nem sempre significa saber escrever. O aluno de língua materna precisa aprender a agir em situações de interação social, especialmente, aquelas em que se deve fazer uso da língua escrita, nas diversas esferas da comunicação humana.

Retome a proposta de produção escrita que você elaborou no item 2 da atividade 1 e com base nas discussões teóricas apresentadas avalie a atividade e teça comentários.

Questões para nortear sua análise:

Você pediu apenas para escrever um texto?

Você explicitou os objetivos da escrita?

Você explicitou para quem a produção será destinada?

Você esclareceu o lugar onde a produção irá circular?

Você apresentou em que suporte (revista, jornal, livro) o texto escrito será publicado?

Discuta sua análise com um colega.

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Em última instância, escrever só faz sentido se houver espaço para isso na vida pessoal ou social. Trata-se, pois, de um entendimento de que a escrita tem uma função social e de que é necessário se reconhecer o uso significativo dessa prática.

Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém como pelo fato de que se dirige para alguém.

[...]

A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apóia sobre mim numa extremidade, na outra apóia-se sobre meu interlocutor. A palavra é o território comum do locutor e do interlocutor.

BAKHTIN/VOLOCHINOV, 1929, p. 113;

Continuando nossa conversa...

Sendo assim, tomando como enfoque esse processo na construção social do conhecimento, a produção de textos deve ser vista como uma atividade que requer a participação conjunta de duas ou mais pessoas, interagindo na busca de uma mesma

finalidade, pois uma escrita na visão interacionista supõe “encontro, parceria, envolvimento entre sujeitos, para que aconteça a comunhão de idéias, das informações e das intenções pretendidas” (IRANDÉ, 2003, p. 45).

Quando produzimos um texto, produzimos para alguém, estamos em interação com outra pessoa, um leitor, embora nem sempre presente no ato da escrita.

É nesse sentido que Geraldi há muito argumenta:

Por mais ingênuo que possa parecer, para produzir um texto (em qualquer modalidade) é preciso que

1. se tenha o que dizer;se tenha o que dizer;

2. se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer;se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer;

3. se tenha para quem dizer o que se tem a dizer;se tenha para quem dizer o que se tem a dizer;

4. o locutor se constitua como tal, enquanto sujeito que diz o que para quem diz ; o locutor se constitua como tal, enquanto sujeito que diz o que para quem diz ;

5. se escolham as estratégias para realizar.se escolham as estratégias para realizar.

GERALDI, 1995, p. 137

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Daí resulta o entendimento de que é ineficaz a escrita de frases, de quantidade de palavras soltas, de textos sem propósitos, de escrita inventada sem um motivo relevante. Você se lembra das propostas analisadas na atividade 1?

Nesse sentido, considerar a escrita nessa abordagem é focalizar o processo interacionista da escrita, de modo que quem escreve entenda as condições de produção do texto, em que a escrita se constitua numa situação que prioriza aquilo que o autor conhece sobre: os objetivos que deve cumprir com a sua escrita, o leitor a quem se destina o texto produzido, em que suporte vai circular sua escrita, se num jornal, numa revista, num livro; e onde vai circular socialmente o texto (na escola, num determinado grupo social).

CartaCapital. Ano XIII, 4 de abril de 2007, n. 438, p. 20

Onde foi publicado o texto?

Qual o fato noticiado?

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Que motivos levaram a produção da notícia?

Para quem você acha que se dirige o texto?

Qual o ponto de vista de quem escreveu o texto?

No entanto, é preciso refletir além dessa visão. Assim, a noção de que a linguagem é uma prática discursiva, de natureza interacional e dialógica e amplia nossos conceitos sobre essa prática.

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Um pouco mais de conversa...

Usar a escrita, assim, é muito mais do que o domínio dos códigos de um sistema lingüístico que podem ser utilizados para registrar documentos, narrativas, para publicar informações, enviar bilhetes ou noticiar fatos. Escrever é fazer uso social de

um instrumento cultural e ideológico que permite ao sujeito refletir, elaborar o conhecimento e tomar consciência ideológica de si e do mundo que o rodeia. É, antes de tudo, fazer-se lido e ler, compreender, responder, perguntar ou argumentar. É usar uma língua, que carrega consigo valores, entoações, estilos, gêneros e discursos. É, portanto, fazer uso de uma linguagem social, cultural, ideológica, política.

Partindo desse princípio, a língua em uso é, por natureza, dialógica, porque não sendo única, está sempre impregnada pelas palavras de outros. Como diz Bakhtin (1975, p. 89), “todo discurso é orientado para a resposta”. Assim, o discurso é sempre um diálogo vivo que se constitui “pelo que já foi dito e pelo que ainda não foi dito” e está sempre orientado para um outro social, para uma resposta, uma compreensão e uma variedade de vozes, perpassadas pelas visões de uma época, cultura ou grupo social.

Vejamos a notícia abaixo sobre um uma medida tomada no Rio por razão da realização dos jogos PanAmericamos 2007.

Às vésperas dos Jogos Pan-Americanos 2007, que acontecem em julho, o Rio começa a passar por uma cirurgia plástica para receber os visitantes dos quatro cantos do mundo. A prefeitura anunciou uma reforma iniciada pela fresagem – remoção da camada de asfalto para ser reaproveitada no recapeamento – e sinalização de 23 ruas do município. [...] Asfaltar a venida não vai, porém, livrar os turistas de tropeçarem nos buracos nas calçadas e no canteiro central de pedras portuguesas.

Por mais que as belezas naturais encham os olhos dos visitantes, será uma decepção encontrar as mazelas com as quais os cariocas são obrigados a conviver no dia-a-dia. “O investimento na questão urbana da cidade está muito defasado. Nem o Pan seria suficiente para atualizar as demandas”, constata Antonio Barbosa, mestre em Urbanismo e professor da Universidade Veiga de Almeida.

[...]

CÔRTES, C. Maquiagem no Rio. Isto é. São Paulo: Três editorial. n. 1957, ano 30, 2 de maio de 2007, p. 64.

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Segundo a autora desta notícia, Celina Côrtes, o Rio passará por uma “cirurgia plástica” e na voz de Antônio Barbosa “o investimento na questão urbana da cidade está muito defasado”. Os enunciadores usam a linguagem escrita para dizer de um fato, para um leitor virtual – o leitor da revista “Isto é”, com o objetivo de informar, criticar, expor argumentos, o que os levam a fazer escolhas, no sentido de não perder esse leitor de vista.

Neste exemplo, podemos ver como na relação entre o título da reportagem e as vozes da imprensa se constroem consensos, se apresentam desencontros, conflitos que podem desvelar as múltiplas faces dos discursos. A escolha das palavras/enunciados, as formas de dizer revelam e representam o discurso do outro que podem nos ajudar a entender o fato, nos fornecendo subsídios para criticar, aceitar ou rejeitar, num jogo complexo de dizeres com entoações valorativas que orientam e direcionam nosso modo de interagir com a notícia.

Produzir um texto, então, é trilhar os percursos dos discursos já ditos, os não-ditos e aqueles que ainda estão por dizer, evidenciando o grande embate dialógico de duas palavras ou de dois enunciados. E essa produção se dá por meio da escrita de gêneros textuais ou discursivos, imbricados em uma rede discursiva que os institui, como modos particulares de enunciar (ARCOVERDE, 2004).

É válido lembrar, então, que quando escrevemos, usamos enunciados/discursos, produzimos gêneros textuais (orais ou escritos), engendrados no contexto social que circulam socialmente. Devemos produzir textos/enunciados que queremos dizer para alguém, com finalidades específicas e por razões diversas. Escrevemos para opinar, formar opinião, enviar recados, informar, para analisar conceitos, para defender ou se contrapor a pontos de vista, para orientar como se faz uma comida, para indicar caminhos, mostrar índices, entre outros.

Cabe, portanto, à escola diversificar as atividades de produção textual e levar em consideração as práticas sociais de uso da linguagem (oral ou escrita) nas diferentes esferas da comunicação. É importante que na escola, as situações de produção escritas estejam relacionadas às necessidades de uso da linguagem, assim como acontece na vida cotidiana. A escola não deve, portanto, artificializar esse processo, pois pode correr o risco de falsear situações reais e significativas de uso da linguagem.

Gêneros textuais (orais ou escritos)

Retomaremos a questão dos gêneros textuais (orais ou escritos) nas próximas aulas.

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O que significa estabelecer condições para a produção de textos escritos?

Como podemos avaliar a relação entre as atividades da leitura e da escrita? Elas são atividades independentes ou são processos concomitantes?

Produzir textos deve ser uma atividade que considera as práticas sociais de uso da linguagem (oral ou escrita) nas diferentes esferas da comunicação. Comente.

Nesta aula, apresentamos quatro perspectivas teóricas que norteiam o processo de produção textual. Mostramos ainda, alguns modelos de produção textual e solicitamos que você elaborasse uma proposta de produção textual. Para tanto, você elaborou, bem como analisou sua proposta.

Agora, você deve retomar sua análise e produzir uma nova proposta, com base nas discussões em pauta.

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Concluindo nossa conversa...No que se refere ao trabalho de produção textual Rojo (2001, p. 173) argumenta que

a linguagem escrita deve se constituir como discurso(texto) significativo, inserido numa situação de produção significativa, formatado num gênero, ao invés de se enfocar letras, sons, palavras, estruturas gramaticais ou textuais.

Assim, é importante lembrar que uma proposta de produção textual é uma atividade que deve possibilitar ao autor percorrer os caminhos singulares das práticas sociais, buscando nelas os fios dialógicos e ideológicos que tecem um texto. E, desse modo, o autor poder se inscrever numa atividade enunciativo-discursiva, ressignificando a escrita e fazendo um uso social da linguagem. E é sobre essa questão que discutiremos na aula seguinte.

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Leituras complementaresSugerimos como leituras fundamentais para o aprofundamento da conversa que

iniciamos nesta aula:

BUNZEN, C. Da era da composição à era dos gêneros: o ensino de produção de textos no ensino médio. In: Português no ensino médio e formação do professor. São Paulo: Parábola editorial, 2006, p. 139-161.

O texto aborda uma longa e densa discussão, tendo os professores em formação como seu público-leitor, e reflete os objetos de ensino e as práticas de letramento escolar que estão em uma perspectiva sócio-histórica e cultural envolvidos na prática de produção textual. Entre confrontos e diálogos, o autor incorpora avanços nos estudos da linguagem para ressignificar a prática de produção textual em sala de aula.

GERALDI, J. W. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

O autor aborda o trabalho lingüístico, elegendo o processo interacional como o espaço de construção de sujeitos e da própria linguagem. Consiste, portanto, de um referencial no campo da linguagem para aqueles interessados em entender “as ações que se fazem com a linguagem, as ações que se fazem sobre a linguagem e as ações da linguagem na constituição dos sujeitos.”

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ResumoNesta aula aprendemos que a atividade de produzir textos escritos emerge das diferentes concepções de linguagem que produzem tendências de práticas divergentes sobre essa atividade. Isso significa que o trabalho de produção escrita pode ser visto como: a) o resultado de um produto final, centrado no produto textual que o indivíduo é capaz de escrever, o que implica na fragmentação das práticas de ensino da escrita, isoladas de outros conteúdos, sendo, muitas vezes, tratadas como momentos específicos, em sala de aula para “Redação”; b) um processo que deve levar em conta as etapas de planejamento, revisão e reescrita. Podemos considerar um avanço nas práticas de ensino de produção textual, contudo ainda está centrada na capacidade cognitiva de quem escreve e na superficialidade do processamento do texto; c) um processo sócio-interacionista em que produzir um texto requer a participação conjunta do leitor e do interlocutor, interagindo na busca de uma mesma finalidade. Escrever é uma prática social que requer conhecimento das condições de realização do texto: para quê, para quem, como, quando e onde se escreve; d) um processo de produção de discursos/enunciados que circulam socialmente. Um texto se produz pelo permanente diálogo que se instaura entre os enunciados/discursos e os interlocutores envolvidos sócio-historicamente. O entendimento dessas abordagens sobre a produção escrita mostra que a escola deve diversificar as práticas de produção textual, oferecendo situações de escrita que estejam relacionadas às necessidades de uso da linguagem, assim como acontece na vida cotidiana.

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Auto-avaliaçãoLeia as afirmações a seguir e teça comentários.

Seus comentários ajudarão você a identificar os pontos positivos de sua aprendizagem e também os aspectos que você ainda deverá melhorar. Assim, avalie seu desempenho como aluno nesta aula.

A produção textual é uma atividade que pode ser explicada por diferentes vertentes teóricas.

Escrever é uma atividade social que deve se inserir numa situação de produção significativa.

ReferênciasANTUNES, I. Aula de português: encontro e interação. São Paulo: Parábola. 2003.

ARCOVERDE, R. D. de L. A escrita numa perspectiva enunciativo-discursiva. In: Os surdos em contexto digital: o encontro com a palavra escrita em Língua Portuguesa. Tese de Doutorado, LAEL/PUC-SP, 2004, p. 54-75.

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BAKHTIN/VOLOCHINOV. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo, Hucitec, 1929.

BAKHTIN, M. Questões de literatura e de estética: a teoria do romance. São Paulo: Unesp, 1975.

BRONCKART, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999.

BUNZEN, C. e MENDONÇA, M. (Orgs.) Da era da composição à era dos gêneros: o ensino de produção de textos no ensino médio. In: Português no ensino médio e formação do professor. São Paulo: Parábola editorial, 2006, p. 139-161.

GERALDI, J. W. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

GOMES-SANTOS, S. N. Recontando histórias na escola: gêneros discursivos e produção escrita. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

KOCH, I. G. V. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez, 2003.

ROJO, R. H. R. A teoria dos gêneros em Bakhtin: construindo uma perspectiva enunciativa para o ensino de compreensão e produção de textos na escola. In: BRAIT, B. Estudos enunciativos no Brasil: histórias e perspectivas. Campinas, SP: Pontes, 2001, p. 163-185.

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