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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4 Cadernos PDE VOLUME I

DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · Toledo-PR no Colégio Estadual Dario Vellozo e no Centro de Educação ... do Curso de Letras da Universidade Estadual do Oeste do ... onde cada

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE

VOLU

ME I

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VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: PRECONCEITO E ENSINO

Autora: Márcia Regina Ciambroni1

Orientador: Ciro Damke 2

Resumo

A variação linguística causa discriminação a um grande número de pessoas, embora tantas discussões permeiem este campo. Com base na experiência profissional, podemos perceber que a discriminação e o preconceito diante da variação linguística, em qualquer lugar ou segmento social, estão muito intensificados, apesar dos esforços científicos da linguística e dos constantes debates promovidos no sentido de combater este comportamento social. Como educadores temos o compromisso de contribuir para que este comportamento seja mudado, através de nosso relacionamento, de discussões e reflexões alimentadas por um vasto material bibliográfico, isto posto em prática em nossas aulas. Este artigo teve por objetivo trabalhar um projeto junto aos professores e estudantes do Ensino Médio do Colégio Estadual Dario Vellozo, no Município de Toledo-PR, sobre as diferentes formas de se falar a língua portuguesa, considerando os diversos fatores que influenciam a variação linguística. Espera-se, com isso, demonstrar que a língua é heterogênea e que as diferentes avaliações sobre as variedades têm base social e não científica, na busca de diminuir o preconceito linguístico e a discriminação.

Palavras - chave: variação linguística; discriminação; preconceito; ensino.

1 Introdução

O Brasil é um país plurilíngue, isto em virtude das línguas que perduram

através da imigração e que estão presentes em todas as regiões, segundo Seiffert

(2009) especialmente no Sul e Sudeste. As dimensões territoriais, que ultrapassam 1 Especialista em Pedagogia Social, graduada em Letras, Professora da disciplina da Língua Portuguesa em Toledo-PR no Colégio Estadual Dario Vellozo e no Centro de Educação Básica de Jovens e Adultos – CEEBJA.2 Doutor em Sociolinguística e Dialetologia pela Ruprecht-Karls Universität Heidelberg – Alemanha, Professor do Curso de Letras da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – campus de Marechal Cândido Rondon e do Programa de Mestrado em Língua Portuguesa – UNIOESTE – Cascavel – PR.

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os 8.547 mil Km², e a população que, de acordo com o censo do IBGE/2010, é de

190.755.799 (cento e noventa milhões, setecentos e cinquenta e cinco mil e sete-

centos e noventa e nove) habitantes, é um dos indicadores que nos diferenciam

enormemente de Portugal, pátria mãe de nossa língua, que possui 92.000 Km² e sua

população aproxima-se dos 12 milhões de habitantes (INE/2008). Esta comparação

é relevante, pois:

[...] quando os portugueses se instalaram no Brasil, o país era povoado de índios. Importaram, depois, da África grande número de escravos. O português europeu, o índio e o negro constituem, durante o período colonial, as três bases da população brasileira. Mas, no que se refere à cultura, a contribuição do português foi de longe a mais importante (TEYSSIER, 2007, p.62).

Com o tempo, os portugueses que chegaram para colonizar terras

brasileiras tiveram o seu idioma acentuado, mas com “traços específicos” que

influenciaram os indígenas, africanos e mestiços a falarem de maneira diferente.

Mesmo assim, essa convivência fez com que o Tupi se tornasse a língua geral e

passou a ser usada nas expedições pelos bandeirantes. Mas, entrou em decadência

no século XVIII, porque os portugueses, atraídos pela riqueza encontrada no país,

mais especificamente o ouro e o diamante, vieram em grande número para a

exploração e a língua materna daquele país passou a vigorar também aqui. Através

do Marquês de Pombal foi instituído o “Diretório”, ou “Diretório dos Índios”, um

documento que proibia o uso das línguas nativas e oficializava a língua portuguesa

no Brasil. Interessava aos portugueses preservar a colônia, por conta de uma

política de integração entre o Império e o Vale Amazônico, tolhendo a liberdade dos

indígenas, na possibilidade de inseri-los na sociedade colonial. Instalou-se, com isto,

o advento de um novo idioma em terras brasileiras.

Com este artigo pretendemos conhecer, discutir e entender dados sobre o

fenômeno da linguagem, principalmente sobre a linguagem oral, pautada em sua

significação como expressão do comportamento sócio-interacionista na atualidade.

1.1 A relação entre a fala e os falantes

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A Revista Língua Portuguesa, em sua edição de nº 16 de 2009, trouxe à

tona discussões de autores renomados para aguçar o interesse do leitor em

conhecer os meandros da linguagem. Como cita Edmilson José de Sá3: “As

condições sociais influem no modo de falar dos indivíduos, gerando certas variações

na maneira de empregar uma mesma linguagem”. Aqui o autor foca a variação

linguística, já apontando um dos fatores que levam os sujeitos envolvidos no

discurso a se diferenciarem no ato da fala. A comunicação, evidentemente acontece

e permite que os mesmos adquiram ou descubram sua identidade cultural e sua

função social.

Estabelecidos assim os papéis sociais, é inevitável que uma língua se

desenvolva, pois que os seus falantes também passam por uma evolução que,

certamente, não tem nada a ver com as regras estáticas estabelecidas em uma

gramática. É um consequente desenvolvimento natural, fortemente influenciado pelo

contexto sócio-histórico.

O precursor da Sociolinguística Variacionista, William Labov comentou, em

entrevista à Revista Virtual de Estudos da Linguagem (ReVel), em agosto de 2007,

que: “O objeto de estudo da Sociolinguística é a língua, o instrumento que as

pessoas usam para se comunicar com os outros na vida cotidiana. Esse é o objeto

que é o alvo do trabalho em Variação Linguística” ( apud SÁ, 2009, p.56). É o que

percebemos em nossos círculos de conversa, seja no trabalho, na família, com os

amigos e conhecidos. Dependendo de onde estamos, usamos formas diferentes

para expressar a linguagem, o que a faz heterogênea, diversificada. É natural dos

falantes que se preocupem e se pronunciem a respeito do uso “correto” ou não da

língua, pois que a mesma acaba definindo os limites do poder que exerce, quando

da competição de grupos para a conquista dos bens sociais e as melhores

oportunidades em cargos de prestígio, ditados por essa mesma sociedade.

Neste cenário, a escola tem nos ofertado oportunidades de vivenciar

profundamente a linguagem como prática social, pois “[...] a fala está,

indissoluvelmente, ligada às condições da comunicação, que, por sua vez, estão

sempre ligadas às estruturas sociais” (YANGUELLO apud BAKHTIN, 2002, p. 14). 3 (Mestre em Linguística – UFPE, Professor do Centro de Ensino Superior de Arco Verde em Pernambuco, pesquisador em Dialetologia e autor do livro Estudos de Variação Linguística pela Editora Textonovo, São Paulo.

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Se tomarmos a condição do Brasil, onde cada região tem suas características

próprias, isto se amplia ainda mais. No entanto, mesmo tendo a pluralidade étnica

tão explícita e a diferença de classes posta, não há o reconhecimento, ou a

aceitação da variabilidade da língua que, consequentemente, leva ao preconceito e

discriminação linguísticos. E, em se falando de preconceito e discriminação, a

grande maioria das pessoas sequer imagina o quanto é relevante tal disparate

quando se trata da língua. Como se tal comportamento discriminatório só fosse

vivenciado em relação à cor, situação econômica e religiosidade.

Com base na experiência profissional, agregada à convivência social com

diversas instituições, podemos perceber que a discriminação e o preconceito diante

da variação linguística, em qualquer lugar ou segmento social, estão muito

acentuados. Na escola, onde a comunicação precisa ser efetivamente melhor

trabalhada e a língua padrão ainda mais orientada, não podemos permanecer

indiferentes frente a um dos maiores compromissos dos educadores que é,

justamente, afastar tais comportamentos, uma vez que a influência do meio é um

dos fatores que alimenta os diferentes falares. Não se trata, de forma alguma,

desconsiderar a gramática normativa, mas saber que os contextos exigem mudança

de comportamento e, por que não, da maneira de como falamos.

Marcos Bagno esclarece:

[...] existe um outro lado da variação linguística que, me parece, é talvez mais relevante para a educação em língua materna do que o lado propriamente científico do fenômeno. É o conjunto de consequências sociais, culturais, ideológicas que a variação linguística faz surgir em qualquer comunidade (BAGNO, 2008, p.59 grifos do autor).

A todo instante somos influenciados pelo ambiente em que estamos

inseridos momentaneamente, uma vez que representamos papéis diante da

sociedade da qual somos formadores, conforme o que nos consta como necessário

dentro do contexto. São colocadas as nossas vivências sociais, nossos acúmulos

culturais e toda a nossa ideologia frente à de todos os sujeitos que enveredam

conosco pelos mais, talvez, impensáveis espaços. Sendo assim, entendemos que o

estudo e a reflexão sobre a variabilidade da língua, bem como e, principalmente, a

sua aceitação nas escolas, como bagagem do indivíduo que é parte desta mesma

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sociedade, pode, sim, diminuir ou, por que não dizer, acabar com o preconceito e a

discriminação linguísticos.

Uma de nossas preocupações é que na escola, e consequentemente em

toda extensão de suas relações sociais, os estudantes e os professores estão se

desrespeitando enquanto sujeitos formadores das mais diferentes linguagens que

circundam a comunicação. Como justificativa para tal comportamento, não podemos

ignorar as histórias de vida que cada um traz consigo, incorporando - as ao dia a dia

com os familiares, à rotina com os colegas de trabalho, os momentos com os amigos

e muito mais.

Estabeleceu-se através do tempo que a gramática normativista é a única

forma de se falar “certo” e que os envolvidos com a língua, teoricamente estão

dentro das escolas, sejam professores e estudantes. Os conceitos que se tem de

linguagem limitam-se a reluzi-la a um número de regras e normas tradicionais, que

perduram por séculos, como se pudéssemos dissociá-la dos falantes, recusando,

assim, as relações sociais e vivência histórico-cultural que cada um acumula durante

a vida. Com este discurso, é comum ouvirmos pessoas de todas as classes sociais

dizerem que “não sabem falar português”, limitando a linguagem ao aprendizado

didático que acontece no âmbito escolar.

Enquanto não reconhecermos que no Brasil falamos e ouvimos o português

brasileiro, e não o português de Portugal, seremos forçados a conviver com a

discriminação e o preconceito linguísticos, na recusa de que sabemos, sim, falar a

nossa língua.

Em sala de aula são muitas as situações em que a multiplicidade da fala é

alvo de chacota entre os estudantes e, até, destes mesmos estudantes com relação

aos seus professores e, infelizmente destes últimos para com aqueles. É de extrema

necessidade que levemos para dentro do contexto escolar este debate, pois que não

se tem a noção de “erro”. Aqui nos valemos da “colaboração” da imprensa, seja ela

falada e/ou escrita, das milhares de publicações de manuais, de encartes, para se

“ensinar” a língua portuguesa, propagando o “certo” e, o que é mais degradante,

vendendo muito.

Com esta reflexão é possível adentrar a uma desconstrução que atua na

cooperação do relacionamento linguístico entre falante e interlocutor e destruir este

estigma estendendo outro comportamento para todos os segmentos sociais. Ou,

deixar bem claro que todos nós precisamos (re) conhecer que “[...] as palavras não

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têm realidade fora da produção linguística; as palavras existem nas situações nas

quais são usadas” (GNERRE, 1991, p.19).

A variação linguística, como forma de manifestação da língua, ainda causa

estranheza à sociedade brasileira em pleno século XXI, embora muitas discussões

permeiem este campo. No entanto, pergunta-se: o que falta para a Educação

garantir o respeito dos sujeitos à diversidade linguística e reconhecê-los no

diferente?

Concentremos agora nossas concepções baseadas em dois estudiosos e

pesquisadores, sendo Saussure e Labov:

Saussure concebia a linguística como uma parte de [...] ‘uma ciência que estuda a vida dos signos no seio da vida social’. No entanto, de modo bastante curioso, os linguístas que trabalham dentro da tradição saussuriana (e isso inclui a grande maioria) não levam em conta de modo nenhum a vida social: trabalham com um ou dois informantes em seus escritórios, ou examinam seu próprio conhecimento da langue. Além disso, insistem em que as explicações dos fatos linguísticos sejam derivadas de outros fatos linguísticos, não de quaisquer dados ‘externos’ sobre o comportamento social” (LABOV, 2008, p. 217, grifo do autor).

Nossas observações de que as variações se relacionam com os fatores

externos da língua têm amparo nos conceitos de Labov.

Onde quer que estejamos, temos a linguagem como fenômeno de interação

social e, por isso mesmo precisa ser adaptada aos diferentes contextos em que

vivemos, também por inserção social, alimentada pela necessidade de convivência.

Sendo assim, todo falante precisa reconhecer-se como fonte inesgotável de variação

da língua, que assim deve ser vista como heterogênea.

Com relação ao ensino da variedade padrão na escola, Bortoni-Ricardo

afirma “[...] que a linguística recomenda que a norma culta seja ensinada nas

escolas, mas que, paralelamente, se preservem os saberes sociolinguísticos e os

valores culturais que o aluno já tinha aprendido antes, no seu ambiente social. [...]”.

(BORTONI-RICARDO, 2006, p. 26).

Considerando isto, entendemos que a escola é um espaço de discussão,

onde podemos buscar histórica e cientificamente, também, as relações que

estabeleceram os nós a serem desatados na transformação da linguagem.

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Partindo deste pressuposto, sentimos que o preconceito e a discriminação

podem, sim, perder espaço nos relacionamentos sociais. Teríamos, então,

preservadas as diversidades étnicas, a sabedoria popular, a cultura regional e tudo

quanto possa colaborar para com a diversidade linguística.

Historicamente, o ser humano se confunde com a linguagem, pois não

podemos conceber um sem a outra e vice-versa, já que vemos aí uma rede de

relações aprofundadas diante do progresso de ambos. A sociedade muda conforme

o que lhe é imprescindível, torna o que lhe é preciso mais aprazível, altera as regras

daquilo que lhe é necessário. Isto nos leva a admitir que os falantes estão em

mudança permanente, mudando também a língua, conscientemente ou não.

De acordo com o Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa (2009), um dos

significados de linguagem é “[...] qualquer meio sistemático de comunicar ideias ou

sentimentos através de signos convencionais, sonoros, gráficos, gestuais etc.” Este

conceito nos leva a assimilar a linguagem como um conjunto bastante amplo de

significação e que, efetivamente, atende às mais diferentes formas de comunicação.

Diante disto, Faraco afirma:

[...] tratamos da nossa complexidade simbólica que se manifesta nas múltiplas linguagens constitutivas da intrincada rede de formas sociais de expressão, de manifestação de sentidos e de comunicação. Tratamos também dos sistemas de comunicação dos outros animais, diferenciando-os das nossas linguagens (FARACO, 2005, p. 118, grifos do autor).

A linguagem tem sido objeto de estudo de muitos pesquisadores. Tais

estudiosos se debruçam em hipóteses que, muitas vezes por eles próprios, caem no

descrédito. O progresso da humanidade faz com que tudo se transforme com ela e o

que hoje é dado como “certo”, amanhã pode não servir mais para esta mesma

sociedade. Entendemos que temos o código mais completo de comunicação entre

os seres vivos, mas não podemos esquecer que este sistema sofre alterações,

passa pela variação constante a que está submetida a linguagem.

Se levarmos em conta a nossa “proximidade” com os macacos,

inevitavelmente nos questionamos: como tudo teria começado? “Quando os seres

humanos começaram a falar?” (FARACO, 2005, p. 118). Como percebemos, este

questionamento nos remete, evidentemente, ao início da criação ou do

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aparecimento da espécie humana e pode deixar transparecer toda uma rede de

relações, que vai instigar a nossa curiosidade em torno de outros assuntos como

religiosidade e política, por exemplo. Ficaríamos discutindo tais temas

incessantemente, pois que são muito profundos e evidenciam tanto um quanto o

outro, o preconceito e a discriminação, em abordagens que se fizeram mais claras à

sociedade. Mas, vamos nos deter na linguagem, nos desdobramentos aos quais ela

nos leva e nos quais permite-nos adentrar de maneira apaixonante. Estas reflexões

começam a nos entreter mesmo na infância, muito embora possam passar

despercebidas para alguns. Mas, quem de nós já não pode ter se perguntado como

tudo teria começado, em que “ordem” ocorreu a efetivação da comunicação

(falamos, gesticulamos, ou escrevemos primeiro?) e em que tipo de sociedade?

Enfim, de onde veio tudo isso? Nós, os humanos, temos o ímpeto de romper com as

expectativas e, talvez por tal comportamento nos diferenciemos tanto dos outros

animais. Afinal, somos racionais. Estabelecemos movimentos e, com eles,

organizamos o que, socialmente, se faz necessário. Inevitavelmente, alimentamos a

cultura.

E se alimentamos a cultura, vale citarmos aqui que a linguagem é um fruto

cultural, mas é, também, um instrumento político que se impõe pelo poder da

palavra que, segundo Bourdieu (1977) “[...] é o poder de mobilizar a autoridade

acumulada pelo falante e concentrá-la num ato linguístico” (apud GNERRE, 1991,

p.5). Ainda agora refletimos a opinião de quem acredita que a linguagem

consagrada pelos literários é que deve servir de modelo, como que sinônimo de

“status”, para a pessoa ser socialmente aceita como culta, limitando, assim, as

questões de interesse e domínio políticos. A literatura acabou, por muitos anos,

servindo de direcionamento para aqueles que queriam fazer parte do grupo seleto

dos letrados, como se devesse ser seguida como único caminho à escrita “correta”.

A língua é, até então, um elemento padrão, abstrato e idealizado, expresso

nas gramáticas tradicionais. Mas, mesmo hoje convivemos fortemente com este

pensamento arraigado à sociedade, produto elaborado para impor regras sobre a

diversidade da língua que é alimentada por fatores sociais, econômicos, culturais,

entre outros.

Buscamos no Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa (2009), o significado

do vocábulo “língua”, para esboçar, talvez, uma razão que justifique tamanha

discrepância em se aceitar outros falares, diante de um sistema tão democrático. E,

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de acordo com a rubrica linguística temos como um dos significados: “[...] sistema de

representação constituído por palavras e por regras que as combinam em frases que

os indivíduos de uma comunidade linguística usam como principal meio de

comunicação e de expressão, falado ou escrito.”

Atendendo às reflexões nesta área, salientamos que a corrente que se

forma entre língua e sociedade as apresenta como “[...] grandezas de ordem distinta,

ou melhor, têm organizações estruturais diversas.” (BENVENISTE, 1968, apud

BENTES; MUSSALIM, 2005, p.27). Sob esta ótica, deparamo-nos com a língua que

é um instrumento de comunicação e, bem por isso vale considerar que sofre as

influências do meio, ilimitadamente, adequando-se às necessidades dos falantes,

proporcionando aos detentores da fala, nós seres humanos, um campo sem igual de

desenvolvimento e de possibilidades, sem que sequer possamos imaginar a

extensão na transmissão de mensagens. Porém, esses mesmos sujeitos, na sua

grande maioria, partem para defender o discurso do senso comum, sem noção do

que é “erro”, ou ainda equivocados quanto ao conceito de “erro”, uma vez que fazem

valer o que está inserido há séculos no seu comportamento e amparado pela

gramática normativista ou pela imposição de suas regras estagnadas em manuais

que tratam de “ensinar” a escrever / falar.

Ainda nos valendo da falsa noção do que seria “erro”, no entendimento da

grande maioria das pessoas, e que os estrangeirismos estariam descaracterizando a

nossa língua, as leituras nos levam, a saber, que “[...] Há pouco mais de um século,

o médico Castro Lopes faria grande barulho pela imprensa, defendendo a

substituição de palavras francesas, usadas em abundância entre os letrados no Rio

de Janeiro de então, [...]” (FARACO, 2004, p.9). Isto mereceu a movimentação e a

crítica de estudiosos da época que já não acreditavam na “pureza” da língua

portuguesa, ou nem mesmo de língua alguma, pois que qualquer uma recebe a

interferência de palavras / expressões estrangeiras.

Há poucos anos, para sermos mais exatos no final do século XX, o então

deputado Aldo Rebelo enviou à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 1676 / 99

propondo, em síntese, que as expressões estrangeiras fossem substituídas dentro

do prazo de 90 (noventa) dias da publicação da mesma. Ainda em FARACO, (2004)

na apresentação da obra que organizou temos afirmações pontuais de instituições e

escritores, as quais citamos a seguir, a título de enriquecimento da informação: a

Academia Brasileira de Letras (ABL), através de seu presidente em questão,

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Tarcísio Padilha e o gramático Evanildo Bechara, condenou o projeto, admitindo que

o mesmo estaria “fora de sua época” e seria incapaz de produzir o efeito pretendido

(p.10); o escritor Luís Fernando Veríssimo considerou-o “improcedente e xenófobo”

(p.10); a escritora Lya Luft qualificou tal projeto de “fascista” (p.10); a Associação

Brasileira de Linguística (ABRALIN) organizou um simpósio sobre o assunto e

encaminhou documentos elaborados pelos sócios ao deputado, colocando-se à

disposição para assessorar o projeto de tamanha envergadura, “[...] de modo a

garantir a transparência do processo e a participação de especialistas nos debates e

formulação de normas e leis que tenham como objetivo definir uma política

linguística para o país” (p.11). Poderíamos continuar com tais manifestações e

depoimentos contrários ao projeto, sustentados por quem, como nós, atribui a tal

documento um discurso equivocado, já que não acompanha a intencionalidade real

que se deva dar ao desenvolvimento da língua, lado a lado com seus falantes; mas,

priorizaremos o foco em questão que é a importância de se estudar a variedade.

Quanto à variação linguística nos apoiamos em Bagno (2001) que nos leva a

refletir sobre o papel de professores da língua portuguesa, colocados sob a visão da

sociedade como os responsáveis pelos baixos índices de avaliações de nossos

estudantes quanto à escrita, leitura e interpretação e que têm duas incógnitas para

serem resolvidas: ensinar português ou ensinar brasileiro?

Uma resposta concisa e rápida seria: devemos ensinar a norma-padrão. Já que só se pode ensinar algo que o aluno ainda não conhece, cabe à escola ensinar a norma-padrão, [...]. Ensinar o padrão se justificaria pelo fato dele ter valores que não podem ser negados – em sua estreita associação com a escrita, ele é o repositório dos conhecimentos acumulados ao longo da história. Esses conhecimentos, assim armazenados, constituíram a cultura mais valorizada e prestigiada, de que todos os falantes devem se apoderar para se integrar de pleno direito na produção / condução / transformação da sociedade de que fazem parte (BAGNO, 2001, p.58 - 59, grifos do autor).

Compreendemos, assim, que apesar de tantas formas de linguagem, nós,

seres humanos, temos a que se faz incomparável qualitativa e quantitativamente,

uma vez que supera de maneira ilimitada a extensão de mensagens. Nenhum outro

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ser é capaz de se comunicar como nós, em um “sem número” de enunciados, com

tamanha condição e propriedade.

Já traçamos uma rápida apreciação de significados entre linguagem e

língua que vem associar-se a este projeto, despertando a nossa curiosidade diante

de tantas línguas faladas no mundo todo e que trazem em si uma variabilidade que

perpassa preconceitos e discriminações. A seguir, alguns dados curiosos:

Com uma população calculada em 6,6 bilhões de pessoas, o planeta Terra comporta cerca de 6,7 mil idiomas diferentes. Um para cada 985 mil pessoas, certo? Mais ou menos. De acordo com um estudo realizado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), há línguas faladas por quase 900 milhões de pessoas, enquanto cerca de 500 idiomas têm uma média de menos de 100 falantes (QUANTAS, 2009, s/p).

Aqui cabe teorizar os termos dialetos e socioletos que são, respectivamente,

ligados às comunidades linguísticas geograficamente definidas e as socialmente

delimitadas.

Cada língua tem sua complexidade diante da gramática, mas nenhuma é

melhor ou pior do que a outra. Essa afirmativa está em Antonio Houaiss:

Ora, essas [...] línguas podem ser submetidas, todas, sem exceção, a um denominador comum: estruturam-se isonomicamente, isto é, são entre si comparáveis sem que nenhuma seja ‘melhor’ do que outra, ainda que possam ser variamente classificadas por sua tipologia, sua fonação, sua morfologia, sua sintaxe, etc. (HOUAISS, apud FARACO, 2005, p. 137).

Diante do exposto, observamos na escola, e mais especificamente em sala

de aula, situações crescentes do preconceito linguístico, carregadas de

discriminações.

Sabedores de que não há, como dissemos anteriormente, uma língua

melhor que outra, temos em Calvet (2002, p.12) o que consideramos uma pérola,

em se tratando da amplitude de reflexão a que nos levam tais palavras: “[...], as

línguas não existem sem as pessoas que as falam, e a história de uma língua é a

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história de seus falantes.” Sendo assim, percebemos que, se línguas e falantes se

misturam e se completam, há uma troca de experiências e vivências históricas que

acabam por evidenciar o plurilinguismo, inevitavelmente. É preciso, entretanto, dizer

que isto pode gerar conflitos entre os falantes, uma vez que se faz necessária a

comunicação e acabam, então, criando uma “terceira” língua. Este contexto todo nos

permite um aprofundamento substancial na discussão deste assunto, com uma

bibliografia extensa a ser desvendada por quem se interessar, até porque

objetivamos focar que a ocasião faz o discurso que assume o poder que lhe é

conferido. E em se tratando do poder das palavras, notadamente vale lembrar que,

mesmo a população conhecendo o significado de centenas delas, não tem acesso

ao conteúdo ideológico que carregam. É preciso muito mais do que conhecer a

significação destas palavras contida nos dicionários como, por exemplo, vislumbrar

conhecimentos e conceitos sócio-políticos. Passa, assim, esta mesma população a

vivenciar as diferenças culturais e a injustiça diante da distribuição de renda, das

oportunidades na aquisição de bens materiais e tudo o mais que, socialmente, lhe é

de direito.

Estabelecendo uma ligação entre os termos “palavra”, “poder” e “política”

vislumbramos o tão explícito papel da escola que não pode fugir de ensinar aos seus

estudantes o idioma de maior prestígio.

Para reforçar esta colocação, fomos buscar a seguinte citação de Bortoni –

Ricardo em “Nós cheguemu na escola, e agora? – sociolinguística & educação”.

[...] O ensino sistemático da língua é de fato uma atividade impositiva. Para alguns estudiosos, há mesmo uma incompatibilidade entre uma democracia pluralista e a padronização linguística. Isto fica mais evidente em países plurilíngues, onde os falantes de línguas minoritárias têm de aprender e usar, em muitos domínios, a língua majoritária. Mas nesses países, os grupos étnicos minoritários têm feito valer seus direitos e as escolas, desenvolvido métodos de ensino bilíngue ou bidialetal, comprometidos com o respeito e a preservação das características linguístico - culturais desses grupos (BORTONI-RICARDO, 2006, p. 14).

Isto posto, convenhamos: nossos estudantes não têm respeitada a sua

cultura e, tão pouco, o seu conhecimento linguístico, primeiramente repassados “de

pai pra filho”. E ainda incorremos na ineficiência ao lhes transmitir a língua padrão,

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pois que este é o papel, cobrado pela sociedade, de que a escola deve dar conta e

desenvolver. Tendemos ao tradicionalismo, sem nos esquecer que tal imposição vai

muito além da ideia simples que se tem dos significados das palavras estagnadas no

dicionário ou manuais gramaticais.

Não temos o direito de limitar o saber de nossos estudantes, obedecendo a

regras impositivas de um poder discriminatório. A escola não pode ignorar tal direito

aos alunos: saber que existem várias maneiras de se falar a mesma coisa e, apesar

disso, efetivar a comunicação e estabelecer, democraticamente, o conhecimento.

Assim, abre-se o leque da justiça social, das possibilidades em se conquistar uma

posição melhor, por exemplo, no mundo do trabalho, com mais dignidade na

formação intelectual destes cidadãos e, consequentemente, no seu padrão de vida.

E por falar em respeito, validamos a importância da língua como bem cultural, se

não o mais importante.

É preciso que seja repassado à comunidade que o preconceito linguístico é

fato e que a discriminação ocorre escancaradamente nos mais diferentes meios

sociais. Mas, também se faz necessário descobrir caminhos para que tal injustiça se

desfaça. Até porque estaremos ganhando em muito, histórica e culturalmente, em se

tratando da riqueza que há para um povo com a miscigenação encontrada em nosso

país. Porém, não seria demais esclarecer que, tanto as variedades linguísticas,

quanto o preconceito e a discriminação, não são frutos especificamente da mistura

de raças no Brasil, mas que ocorrem em qualquer país, nas mais distantes

comunidades do mundo e que tais falantes são influenciados por fatores como o de

localização geográfica, o gênero, a condição econômica, o grau de escolaridade, a

faixa etária e outros tantos.

Muitos países, por questões óbvias ligadas à diversidade, precisam lidar

com essas diferenças que se despontam em índices que medem o rendimento

escolar dos estudantes, em especial os de baixa renda, desconsiderando totalmente

os fatores citados anteriormente. Quando estes estudantes chegam à escola são

colocados diante de uma língua não usual para a realidade na qual estão inseridos.

Uma língua carregada de normas, de regras, que não faz parte de seu cotidiano e,

por isso mesmo, tão difícil de assimilar e, ainda, na visão dos mesmos (apesar de

imposta e já incorporada – e, pasmem, também aceita!) desnecessária. Mal sabem

eles que esta “ferida” coloca-os de frente com uma variedade denominada de

“inculta”, que os distancia da classe de maior prestígio social, dilacerando as

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possibilidades de desenvolvimento sócio - cultural e crescimento econômico. Através

da língua, acabam por fazer parte, mesmo sendo a maioria, de uma classe

estigmatizada e, constantemente, avaliada. Para alimentar este enfoque,

consideremos a seguinte citação:

O mais importante nessa reflexão sobre o estigma e o prestígio atribuídos às formas linguísticas é saber que esses juízos de valor não têm a ver com as características propriamente linguísticas do fenômeno, mas sim com avaliações sociais lançadas sobre os falantes, isto é, sobre os seres humanos que empregam essa ou aquela forma linguística. [...] as formas linguísticas vão ser julgadas e avaliadas de acordo com os juízos e valores sociais atribuídos a quem se serve delas. [...] Qual o prestígio que elas têm na sociedade? Muito pouco, quase nenhum, principalmente numa sociedade como a brasileira, extremamente injusta na distribuição da renda e marcada por um alto grau de exclusão. [...] Assim, aquilo que para o sociolinguista representa apenas ‘diferença’ no uso da língua, para as pessoas em geral vai representar, de fato, um ‘erro’, um ‘defeito’, um sinal de ‘ignorância’ (BAGNO, 2008, p.76-77, grifos do autor).

O comunicar-se faz parte do comportamento das pessoas e, entende-se,

portanto, que tais pessoas estejam inseridas na sociedade. Mas, não como algo que

deva ser considerado certo ou errado, pois que a realidade traz, necessariamente, a

comunicação como um elo de relação social. A língua constitui parte essencial da

identidade dos sujeitos que, para um bom convívio social, precisam se respeitar.

Sendo assim, é como ter que respeitar a diversidade de tudo o que integra a cultura

entre os povos, neste caso, o povo português e o povo brasileiro. Construímos, sob

a égide da língua portuguesa de Portugal, uma língua integrante das características

da nossa nacionalidade: a língua brasileira. Não há como negar que continuamos

enfrentando situações extremas de “não aceitação” em torno de que somos uma

nação constituída de sua própria cultura e que deve, efetivamente, tornar-se

independente.

1.2 Pesquisa de Campo: a realidade no Colégio Estadual Dario Vellozo

Diante da revisão bibliográfica realizada consideramos a necessidade de

analisar as diferentes formas de se falar a língua portuguesa, estudar os diferentes

15

meandros da comunicação, no sentido de diminuir o preconceito linguístico e a

discriminação, junto aos professores e estudantes do Ensino Médio do Colégio

Estadual Dario Vellozo, de Toledo, no Paraná. Para atingir este objetivo, fez-se

prioridade conhecer e compreender o que os sujeitos entendem por variação

linguística, colocando em debate as evidências que causam esta variação,

contextualizando-a de acordo com as relações sociais, sem ignorar, no entanto, a

importância da norma padrão. Levantamos os diferentes pontos que evidenciam o

preconceito no que se refere à interação dos sujeitos da pesquisa e apresentamos a

variação linguística como forma diversa de expressão da linguagem na sociedade.

Abre-se um leque de expectativas e muitas possibilidades ultrapassam o

campo das ideias no que tange discutir a discriminação e o preconceito à variação

linguística. A partir deste breve desvendar, podemos compreender os motivos da

negação ao diferente, sejam eles naturalizados, passados de pais para filhos,

emergentes da sociedade ou mesmo por se tratar de richas entre “guetos”.

Definimos o Colégio Estadual Dario Vellozo, da cidade de Toledo - PR. para

local das pesquisas, por se tratar de um dos espaços profissionais no qual estamos

inseridos como professora de Língua Portuguesa. Também por haver experiência

nesta discussão no cotidiano em sala de aula e com os colegas professores. O

contato com estudantes do ensino médio, ressaltando os da 1ª série, trouxe à tona

uma realidade que não deve ser diferente de muitas comunidades escolares

espalhadas pelo Brasil: estudantes que vêm dos distritos vizinhos misturam-se aos

do município, com suas características peculiares que se espelham no jeito de

vestir, nos materiais escolares que carregam, nos pratos típicos que consomem em

suas casas e, às vezes na escola, nas músicas que apreciam e, evidentemente

(objeto de nosso estudo) no modo de falar. Diferenças gritantes quanto às condições

social, econômica e cultural. Num simples olhar, as individualidades se sobrepõem e

os sujeitos que detêm a fala mostram os seus valores como reflexos das suas

relações sociais, embebidas pelo cunho de uma hierarquia política, de autoridade e

poder da palavra, instaurada durante a sua história de vida. Instala-se, assim, um

ambiente propício para que cada um lute, ainda que inconscientemente, pela

valorização da sua história. Uma história que se adapta ao contexto,

automaticamente, mas que não estabelece as possibilidades “do diferente” de

maneira clara, alimentando o preconceito em linhas gerais. Não é diferente com o

preconceito linguístico que, embora camuflado, está tão intensificado no dia a dia.

16

A metodologia utilizada para o desenvolvimento do projeto, hoje

concretizado neste artigo, teve por base o universo de estudantes do ensino médio

no período vespertino e os professores de todas as áreas, com exceção da

disciplina da língua portuguesa. Então, para que o número de questionários pudesse

ter representatividade, mas não fosse muito extenso, elencamos no ano de 2010,

como amostra intencional, os estudantes do 2º ano, 22 (vinte e dois) que totalizavam

a turma. Os professores foram selecionados de forma bastante aleatória.

Elaboramos os questionários, em número de 15 (quinze) e, conforme íamos

encontrando os colegas, explicávamos a pesquisa e pedíamos para nos

devolvessem preenchidos.

As respostas dos questionários dos estudantes foram recolhidas 100%, pois

estávamos em sala aguardando o retorno. No entanto, com os colegas professores

somente 8 (oito) devolveram os questionários preenchidos. Como estamos

trabalhando com uma pesquisa qualitativa, o número de questionários que não

retornaram, no levam a hipóteses eticamente construídas: 1ª, não tiveram como

responder devido ao grande acúmulo de tarefas extras à sala de aula, que envolve o

professor; 2ª, por se tratar de uma pesquisa que será publicada algumas pessoas

não gostam de serem avaliadas, mesmo não tendo solicitado a identificação dos

sujeitos; 3ª, mesmo em pleno século XXI, independente da formação, as pessoas

não gostam de participar de pesquisas e isto restringe o campo das análises.

Mas de qualquer forma estamos com os dados coletados e é a partir deles

que iremos dialogar para saber até que ponto, estudantes e professores

compreendem algumas categorias que perpassam pela discussão da variação

linguística.

Para melhor visualização das respostas organizamos quadros comparativos

entre estudantes e professores. Montamos um total de seis perguntas iguais para os

estudantes e os professores.

Estudantes ProfessoresRespostas Quantidade Respostas Quantidade

17

É uma forma ou meio de comunicação

É um tipo de língua

É o ato de nos comunicarmos

É um instrumento para comunicar

É um tipo de código para interagir

15

01

01

04

01

É a capacidade inata da espécie humana de aprender e comunicar-se

É o meio de se expressar

É descrição do que pronunciamos

01

06

01

QUADRO 1- O que é linguagem? Fonte: Pesquisa realizada, 2010 - CEDV

Em relação à primeira pergunta, nós já temos conhecimento sobre o que os

pesquisadores têm divulgado. Agora vamos nos familiarizar com o que estudantes e

professores têm a dizer sobre o que é linguagem. A maioria dos estudantes, como

também dos professores, disse que é: forma ou meio de comunicação ou expressão;

ou ainda, um instrumento para se comunicar. O que nos remete entender que,

embora a conceituação de maneira “popular” esteja a contento, com exceção das

respostas onde constam que é um tipo de língua, ambos expressam a falta de

conhecimento teórico - científico sobre o tema. Neste sentido podemos dizer que 01

(um) sujeito não teve total apreensão; no entanto, 97% dos sujeitos têm o

conhecimento ou ideia do que é a linguagem.

Se formos comparar as respostas destes sujeitos com as informações que

os pesquisadores divulgam, podemos afirmar que não estão fora do contexto

teórico. No entanto, nossa preocupação é que este entendimento seja algo do senso

comum e não uma construção elaborada, a partir do acúmulo de conhecimento e

elementos disciplinares, tendo em vista o pouco tempo, em termos de horas-aula,

que, atualmente, as disciplinas básicas têm para expor todo conteúdo programático.

Estudantes ProfessoresResposta Quantidade Resposta Quantidade

18

Verbal e escrita. Formal e informal

Rádio, televisão, comícios

Oral, visual e gestual

Inglês, espanhol, português, oral e de sinais

19

01

01

01

As linguagens verbal, visual, escrita e de sinais

FFala, gestos, vestimentas, hábitos e costumes, expressões faciais

07

01

QUADRO 2- Quais as formas de linguagem que você conhece?Fonte: Pesquisa realizada, 2010 - CEDV

Na segunda pergunta houve divergência na conceituação e até mesmo

equivoco na interpretação do que foi questionado, pois alguns sujeitos confundiram

formas de linguagem com meio de comunicação e até mesmo idiomas. Sabemos

que existem duas formas de linguagem; verbal e escrita e destas derivam várias

outras, mas meio de comunicação, hábitos, vestes, idiomas não fazem parte deste

contexto.

Dentro da quantificação a maioria dos sujeitos expressou compreensão do

que são as formas e, para nosso contentamento, 90% dos estudantes. Os

professores, possivelmente por não atuarem na área de língua portuguesa,

demonstraram certa confusão.

Estudantes ProfessoresRespostas Quantidade Respostas Quantidade

É a forma como as informações são transmitidas

É algo importante para a humanidade

21

01

Forma de como as pessoas se relacionam, expressam ou comunicam

É o pensamento exteriorizado através de várias formas

É a linguagem utilizada entre sujeitos ou objetos na troca de informação

06

01

01

QUADRO 3 - O que é comunicação? Fonte: Pesquisa realizada, 2010 - CEDV

Neste quadro podemos ler as respostas como corretas, já que houve

situações que foram expostas de forma subjetiva e não direta como pedia a questão.

19

Embora a comunicação seja algo do que ouvimos falar constantemente na mídia, há

diferentes entendimentos, mas aqui nos restringimos a trabalhar no sentido de

comunicação como forma de expressão.

Estudantes Professores

Respostas Quantidade Resposta QuantidadeTodos os tipos de mídia

Elencaram: rádio, TV, internet, revistas, jornais, etc.

22 Por meio da fala

Escrita, oral, gestual, artística, religiosa, cultural

Comunicação visual e através de rádios, televisão e jornal escrito

01

06

02

QUADRO 4 - Quais as formas de comunicação que você conhece? Fonte: Pesquisa realizada, 2010 – CEDV

Os estudantes tiveram, nesta questão, concepções baseadas no seu

cotidiano que está ligado, fortemente, à mídia nas diferentes formas com que ela se

apresenta. Então, 100% dos estudantes do 2º ano compreenderam naquele

momento que as formas de comunicação são iguais aos meios de comunicação. O

professor, na sua maioria respondeu corretamente, no entanto o senso comum e os

vícios da linguagem coloquial também afetaram uma das respostas: apresentou

como formas de comunicação o rádio, a televisão e o jornal.

Aqui fica nítida a atribuição do senso comum nas respostas, principalmente

as que se referem às colocações dos estudantes, personagens que, para além do

conteúdo escolar, incorporam uma linguagem quase que, exclusivamente, fruto da

informação advinda da internet, onde tudo é mídia e o repasse se torna instantâneo.

Preocupação maior para os docentes, tendo em vista que o conhecimento deve ser

algo construído pelos sujeitos e não um processo adquirido por osmose.

20

QUADRO 5 - O que é preconceito, em linhas gerais? Fonte: Pesquisa realizada, 2010 – CEDV

Aqui está o grande nó de nossa pesquisa, pois o entendimento do que é

preconceito é o primeiro passo para se trabalhar as suas formas e como fazer para

que ele não tenha espaço na sociedade. Diz o Dicionário Houaiss que é: “qualquer

opinião ou sentimento, quer favorável, quer desfavorável, concebido sem exame

crítico”. Quer dizer que é algo que fazemos sem total apreensão e discernimento do

conteúdo. Os sujeitos desta pesquisa colocaram-no de diversas formas. Algumas

delas especificaram as situações como que sinalizando os tipos de preconceitos que

podem existir. Se analisarmos estas respostas pelo que conhecemos de nossos

estudantes cremos que, de modo geral, entendem a significação das palavras.

Porém, não percebem a dimensão com que estão contextualizadas em seu

Estudantes ProfessoresRespostas Quantidade Respostas Quantidade

É o ato de não aceitar as diferenças.

É algo muito ruim.

É tudo o que fazemos para o outro só por causa de suas diferenças.

É ter um pré-conceito.

É o ato de discriminar e julgar.

É agredir alguém física, verbal e espiritualmente.

É um modo de excluir

É quando uma pessoa foge dos padrões estabelecidos pela sociedade.

01

01

05

06

03

01

04

01

É julgar sem conhecer.

Discriminar as formas de comunicação e expressão.

É algo (conceitos) arraigado no indivíduo de forma distorcida conforme tabus.

É não aceitar as individualidades / as diferenças entre as pessoas.

04

01

01

02

21

cotidiano. A ambiguidade entre preconceito e pré-conceito algumas vezes não é

reconhecida, pois não ligam preconceito ao ato de discriminar e este é um dos

problemas que leva à discriminação da variação linguística.

Tivemos ainda uma última questão que foi: Você já sofreu preconceito

linguístico? Comente - (se não aconteceu com você, relate a experiência que possa

ter presenciado com outra pessoa). 36% dos estudantes expuseram que já sofreram

o preconceito linguístico e, destes, a relação está na pronúncia das palavras, como

trocar “r” por “rr” ou vice-versa. Condição que aqui, na região oeste do estado, já

deveria ter sido superada, levando em consideração o número de imigrantes

alemães e italianos que é relevante. E quando estes estão residindo nas lavouras e

seu círculo de amizades está restrito aos vizinhos forma-se um novo dialeto local ou

regional. No entanto, quando seus filhos buscam a área urbana, onde os “guetos”

são outros, há um estranhamento de ambos os lados e várias são as

consequências, de brincadeiras inocentes a bulling, que causam constrangimentos

ou provocam dores maiores.

Dos 22 estudantes, a maioria de 64% disse nunca ter sofrido o preconceito

linguístico. Cremos ser importante um novo levantamento para cruzar informações

sobre a origem dos estudantes e saber até que ponto a variação linguística é

respeitada.

No caso dos professores não foi diferente: as respostas da justificativa dos

que já sofreram preconceito são de dois professores, que correspondem a 25% de

nossa amostra. A maioria de 75 % disse nunca ter sofrido preconceito linguístico.

É importante destacar que o número pode parecer irrelevante, pois estamos

falando de menos de 10 pessoas, em cada categoria, que sofreram preconceito,

mas temos que entender que os números são relativos à amostra selecionada.

Multiplicando este número pela quantidade de estudantes e professores, não será

bela a imagem de preconceito e discriminação linguísticos que teremos no espaço

escolar em pleno século XXI.

Considerações Finais

22

Para finalizar este artigo, precisamos enfatizar que para nós, estudiosos da

língua, o assunto não pode e não deve ser concluído. É necessário admitir que não

temos a pretensão de atribuir nenhuma “receita” de como se trabalhar com o

fenômeno da variação linguística, mas, sim, contribuir com uma constante reflexão

que se faz inadiável e clamar por uma postura diferenciada diante da reeducação

sociolinguística. Não devemos menosprezar a continuidade dos estudos e

aplicações diante deste tema para que, quem sabe, e nós acreditamos que sim,

possamos colaborar com a promoção e renovação dos sujeitos envolvidos, que, na

verdade, somos todos nós. Tudo por um pouco mais de respeito e justiça

Não nos causa surpresa alguma que a sociedade brasileira se espante com

as constantes veiculações na imprensa sobre a variedade linguística, como vem

sendo tratada. Entendemos que não se deve ignorar a língua normatizada, ou a

chamada língua padrão e que a escola, tem sim, obrigação de repassá-la ou, se

preferirem, ensiná-la.

A nossa língua portuguesa identifica-nos historicamente e, também nos

ditames da história, vimos o país acolher pessoas das mais diversas nacionalidades,

cada qual com sua cultura, com fatores enraizados que justificam tamanha

diversidade linguística. É oportuno adentrar os espaços educacionais, em todos os

níveis de escolaridade, para despertar a importância de se discutir a variação

linguística como algo indissociável ao ser humano, diante da heterogeneidade das

línguas.

Esta reflexão permitirá, efetivamente, ampliar o papel da escola e propiciar

aos seus sujeitos, enquanto educadores e educandos, a condição de repensar seu

comportamento e a sua mudança de atitude diante da discriminação e do

preconceito linguísticos. Não podemos admitir que os nossos jovens percam os

valores voltados para o respeito às diversidades que, no caso da língua,

principalmente na oralidade, são evidentes quando da convivência com seus

colegas e professores. Dispomos de uma gama considerável de publicações neste

segmento, atendendo às especificidades do momento, adequando a linguagem às

necessidades dos falantes. Não nos cabe admitir que pretendam estagnar algo que

está em constante movimento: a língua.

23

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