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Da mobilização para o trabalho à política social uma reflexão acerca da evolução das políticas de localizacâo da população. Carlos B. Vainer

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Cadernos IPPUR - Ano III n1 Jan-Abr 1989

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C A D E RN O S P U R U F R JJ A N / A B R 1 9 8 9 A N O I I I N P 1

Da Mobilização para o Trab alho à Po lítica Soc ial uma reflexão acerca daEvolução das Políticas de Localização da Popu laçãoCarlos B Vainer

Flutuações na Atividad e Imo biliária e Variaçõ es nos Com ponentes do PreçoFinalMartim O Smoika

Lutas Pela Terra na Baixada da Guanabara: 1.950 1964

Frederico Guilherme B de A raújo

História Urbana e Movimentos SociaisFranklin D Coelho

A Luta Pelo Espaço Urbano: A questão da CopacabanaElizabeth D Cardoso e Lilian F Vaz

A Irregularidade da Moradia dos PobresEduardo G de Carvalho e Luciana C Lago

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C A D E R N O S P U R / U F R J

J A N / A B R 1 9 8 9 A N O III Nº 1

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A P R E S E N T A ÇÃO

A produçã cientí ica do Instituto de Pesquisa e PlanejamentoUrbano e Regional (IPPUR) incluía no presente núe ro dos CadernosPUR/UFRJ encontra-se referida a 1988. Assim, a ediçã dos CadernosPUR/UFRJ v . 3 n5 1 expressa a busca da superaçã da descontinuidadeque tem limitado o esforç editorial realizado pelo Instituto e, aconsolidaçã de condiçõs pré ias indispensáeis a um projeto mais am-bicioso de divulgaçã científica.

Este volume inclui artigos com posiçõs teó icas e metodolói-cas diversas e, aind a, com distintos procedimentos de pesquisa e basesdocumenta is. Procuramos contr ibuir, com esta seleção, para o reconhe-cimento do grau de complexidade e matur idade atingido pela produçãacadêica da áea de planejamento urbano e regional . Sã temas deste

volume: Lutas Socia is e Reivindicaçã Populares; Polí icas Públicas;Uso do Solo Urbano e Atuaçã do Capital Imobiliá io.

Acreditamos que estes temas e a maneira como foram tratados pe-los autores tenham permitido um registro estimulante de prá ica de en-sino e pesquisa do IPPUR.

A Comissã Editorial

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A G R A D E C I M E N T O S

Agradecemos o apoio recebido da Fundaçã José Bonifá io e daEditora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sem o qual nã te-ria sido poss ível a execuçã deste tra balho.

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S U M a R H )

Da mobil izaçã para o trabalho à polí ica social -uma reflexã acerca da evoluçã das polí icas delocalizacâ da popula ção. Carlos B . Vainer .........?

Flutuaçõs na atividade e variaçõs nos componentesdo preç final do imóel. Martin Oscar Smolka 29

Lutas pela terra na Baixada da Guanabara: 1950 -1964 . Frederico Guilherme Bandeira de Araujo 43

Histó ia urbana e movimentos sociai s. Franklin DiasCoelho 73

Luta pelo espaç urbano a questã "da Copac abana".Elizabeth Dezouzart Cardoso e Lilian Fessler Vaz ?1

A "irregularidade" da moradia dos pob res . EduardoGuimarã s de Carvalho e Luciana Corrê do Lago 105

CADERNOS PUR/UFRJ Rio de Janeiro v.3 n® íP.1-118 jan./abr.1989

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D A M O B I L I Z A Ç Ã O P A R A O T R A B A L H O ÀP O L Í T I C A S O C I A L U M A R E F L E X Ã OA C E R C A D A E V O L U C S O D A S P O L Í T I C A S

D E L O C A L I Z A Ç Ã O D A P O P U L A Ç Ã O

Carlos B. VainerProfessor do IPPUR/UFRJ

'(...) parcela razoáel de migrantes desiludidos por constantesfrustraçõs recorre à Comissã Pastoral da Terra (CPI) para en-contrar a soluçã de seus anse ios. Esta, quando bem orientada,consegue promover a correta integraçã do trabalhador, amparan-do-o , defendendo-o contra injustiçs e contra a exploraçã(...). Lamentavelmente, alguns bispos extremistas com delibera-da má fé ou sendo usados em sua ingenuidade, inoculam o óio nocoraçã dos humildes , que os procuram es vulneráel situaçã dedesespero , estimulando uma açã polí ica que leva invariavel-mente à luta de classes (.. .). Por tudo isso, fazem-se neces-sáias urgentes providêcias por parte do governo no sentido deorientar o migrante, nã o deixando à prória sor te. A mobili-zaçã conjunta de governo e iniciativa privada poderia promoverum centro de recebimento e encaminhamento do migrante, atravéde segmentos do exército, federaçõs, associaçõs de classe eoutros (... )' (Jeremias Lunardelli Neto, Presidente da Associa-çã dos Empresáios da Amazôia; '0 Migrante na Amazônia", inJornal do Brasil, 23/10/84).

'(...) a necessidade de evitar o êodo no campo e reverter acorrente migratória , no sentido da zona urbana para a zona ru-ra l, é um dos imperativos da Seguranç Interna' (General deBrigada Rubens Dayma Denys, Secretá io-Geral do Conselho de Se-guranç Nacional; Exposiçã de Motivos n5 021/85, aprovada peloPresidente José Sarne^ e« H/«?/85) .

CADERNOS PUR/UFRJ, Rio de Janeiro, 3(í):?-28 , jan./abr.í89

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"PAÍ H50 TEM LUGAR PARA HIGRANTE S. De todos os pontos do paíestã partindo levas de brasileiros, atrá de casa e trabalho,mas dificilmente eles serã bem recebidos ei algus lugar (...).Até Rondônia, que já foi eldo rado , gastou este ano Czí 2 mi-lhõs eu passagens para devolver os retirantes à suas regi ões.Sã Paulo , o uais frequente ponto final dessas viagens receberásó este ano 500 mil bras ileiros ( ...) . O fantasma de abril de1983 - quando a cidade viveu u» dos seus piores momentos comsaquí e quebra-quebra - começ a voltar (...). Durante o ú-timo fim de semana , só na Zona Leste da cidade , seis supermer-

cados foram saqueados ' (Jornal do Brasi l, página, 12/07/87).

Introduçã

Quando se intensifica» as invasõs na periferia de Sã Paulo evê à luz do dia as guerras de quadrilhas nas favelas cariocas, quandorecrudesce o desem prego , sucedem-se monotamente , na imprensa e ei de-clarações oficia is , as críticas à nossa "macrocefalia urbana ' e aosexagerados fluxos migrató ios que se dirigem à grandes c idad es.Quando os senrterra se mobilizam no Rio Grande do Sul, aponta-se comosoluçã seu "reassentamento" na Amazônia , onde poderã 'refazer a vi-da ". Diante da multiplicaçã de saques promovidos pelos 'flageladosda seca ', propugna-se o deslocamento de nordestinos para regiõs menoscastigadas pela natureza. Face ao aguçmento dos choques nas frontei-ras agr ícolas, clama-se por uma açã que controle e regule as «ssasde migrantes que buscas o Eldorado. Na implantaçã de grandes barra-

gens, planeja-se e executa-se o deslocamento forçdo de milhares defamília s. Quando os interesses mineradores esbarram nos limites dosterritó ios indí enas, sugere-se que a má localizaçã das reservascons titu i obstáulo à utilizaçã produtiva de recursos naturais indis-pensáeis ao desenvolvimento.

Em di f erçn

te s

circunstâncias, frente à «is variadas formasassumidas pelos conflitos socia is, a localizaçã e o deslocamento es-

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pacial de populaçõs parece» fornecer una chave capar de equacionar eresolver tensõs que se manifestam. Tudo se passa como se uma parcelacada vez maior dos brasileiros estivesse no lugar errado, dirigindo-separa regiõ s que nã deveriam busca r, estabelecendo-se em áeas inade-quadas - "saturadas". Deste diagnóstico, tíico de um certo senso co-mum - bom senso? - mais ou menos general izado, decorre uma propostaterapêtica: o Estado deve intervir para re lo ca üza r pessoas, reorien-tar fluxos, enfi m, "racionalizar" nossa organizaçã espacial . Ordenaro terr itório, isto é, dispor a populaçã es ordem no terr itório.

Polí icas de organizaçã terri tori al, polí icas de localizaçãda população, pol í icas migrató ias: a relaçã populaçã-terri tó io

evidencia-se como campo e objeto de intervençã est ata l.Mas a verdade é que o Estado brasile iro tem uma longa histó ia

de açã neste te rreno. Desde que se anunciou a inevitabilidade daaboliçã da esc ravidão, desde que se abriu a transiçã para o trabalholivre, o Estado,.apesar de sua profissã de fé liberal, investiu fir-memente na áea da gestã de fluxos e local izaçã de populações, comuma decidida polí ica de recru tamento, sel eção, transporte e 'assenta-men to' de imigrantes. A dimensã da açã do Estado, assim como a pre-senç de um subsí io governamenta l à imigraçã , permitem sugeri r, in-

clus ive, que foi este um dos atos fundadores da modernidade deste Es-tado (1).A parti r de então, acumulou-se enorme experiê cia de interven-

çã dos processos de local izaçã de populações, um extraordiná io"kno«how" de controle territorial dos trabalhadores. Hospedarias deimigrantes, centros de triagem e encaminhamento de migrantes , Marchapara Oeste , Batalha da Borracha, polí icas de colon ização, deslocamen-tos maciçs e planejados de popu lações, eis alguns dos episó ios destahis tória . Polí icas populacionai s, sem dúvida, mas també polí icasterri toriais; isto é, discursos e açõs que, de maneira mais ou menos

clara , acionam concepçõs acerca da qualidade e quantidade da popula-ção, acerca do signif icado e funçã do te rr itório.

Nã pretendemos, neste pequeno artig o, reconstituir esta história (2)i nosso objetivo é bem mais modesto: buscar alguns marcos e re-ferêcias que possam subsidiar uma reflexã sobre o que se passa nessavertente do que , seguindo uma certa tradiçã conceituai discut ível ,

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vent sendo chamado de "polí icas públ icas '

Espaç Vazio e Mobilizaçã para o Trabalho

A primeira cons tataçã que se impõ a partir de uma perspectivahistó ica é a da al te ração, extremamente rápida , nos conceitos aciona-dos pelo Est ado . Há menos de 40 anos , o paí era visto coio consti-

tuío essencialmente por um enorme espaç vazi o. A construçã da na-cional idade, nesta visão, impliçva na ocupaçã /valor izaçã do terri-tório. Até o iníio dos anos 50 , em certa medida, ainda ecoava entreas elites polí icas e intelectuais o diagnó tico produ zido, no iníiodo século, por Alberto Torres:

"Assim coso tivemos governo antes de ter povo - Tomé de Souzachegou praticamente antes de qualquer realidade demográ icaconsi stente, assim como surgiu a chefia do Estado antes dequalquer ógã de Estado (...) assim fixamos os limites de nos-so territóio antes de ocupá lo: tivesos territóio nacionalantes de habitantes para el e. Isto foi, convé reconhecer, umagrande ousadia de nossos antepassados. Mas complica um pouconossos problemas" (TORRES, 1978, p . 53) .

A palavra-de-ordem de levar as fronteiras demográicas e econômicas até as fronteiras polí icas quase sempre conduzia à convicçã deque a ocupaçã do territóio dependia do povoamento , e este , por suavez , da imigração. Dessa mane ira, o pensamento geopolí ico nacional

se harmonizava com as preocupaçõs mais pragmá icas e os reclamos dacafeicultura pauli sta, que pedia braços - adest rados , discipl inados ,sempre que possí el brancos. Meio séulo apó a abo lição, o presiden-te da Sociedade Nacional da Agricu ltura , Antonio Queiroz Tel les, in-sistia num discurso que veio à luz na segunda metade do séulo XIX:

"Nã há dúvid a, pois, de que Sã Paulo (.. .) precisa de qui-

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nhentos mil (imigrantes - C.V .), vindos parceladamente es levas

de cem mil por ano, dentro de um lustro. Em seguida, outrotanto , nas nessas proporçõs ou talvez maior es, atendendo-se aofato de serem agricultores e consti tuíos em famílias' (TELLES,1846, P. 752).

E em í949, abrindo os trabalhos da I Conferê cia Brasileira deImigraçã e Colonização, o presidente do Conselho de Imigraçã e Colo-nização, Ministro Jorge Latour , declarava:

'Sã meus votos os de que nesta assembléa se firme a idéa pa-ra ser propagada, de que o Brasil deseja tonifica r-se, erguer-se com o sangue euro peu' (flpud. C.I. C., 1949).

Nã bastav a, no entanto, selecionar, recrutar, transportar erecepcionar os imigrantes ... era necessá io localizá-los . E nã fal-tara» discussõ s e diretrizes a resp eito . Por um lado, estabeleceu-se , a parti r da Consti tuiçã de 1934, consenso quanto a impedir a for-•çã dos entã chamados "fcastos ethnicos' , como aqueles que teriassurgido nas zonas coloniais do su l. Tratava se de ter uma polí ica

ativa de 'assisilaçã" dos estrangeiros (3), e a legislaçã vai fixarum limite má imo à concentraçã de imigrantes da mesma nac ionalidade.Por outro lado, assistir-se-á a um en o m e esforç para formular as ba-ses 'científicas' de usa polí ica de localizaçã de est rangeiros :

'De que serviria saber , com efeito, que o tipo branco é aclisável na regiã trop ical de nosso país, se este conhecimento nãnos daria nenhum critéio seguro para distribuirmos pelas nos-sas vá ias regiõs climáticas as diversas etnias imigrantes ouos tipos antropoló icos que elas nos trazem" (VIANNft, 1934, p .80).

'O que nó desejamos - os que investigamos, coso antropo-socio-logistas, como bio-sociologistas, como antropo-geografistas,como demologÍ tas e desografista s, os problemas da raç - é queos nossos antropometristas e biometristas nã dispersem seus

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esforçs e ori ent ei suas pesquisas no sentido de nos dar as ba-

ses cientí icas para a soluçã de alguns problemas «is urgen-tes e imperativos, como os que se prendem à formaçã de nossanacional idade no seu aspecto quantitativo e qualita tivo. Porexemplo: o problema da mestiçgem das ra ças . Ou o da seleçãeugê ica da imigração. Ou o da distribuiçã rac ional das et-nias arianas segundo o crité io de sua maior ou menor adaptabi-lidade à diversas zonas do pa ís' (idem, ibidem, p . 89) .

Sempre muito pragmáticos, e sem sentirem necessidade de recor-rer à coorte de especialistas aciaa citad os, os paulistas encontramcom facilidade as razoes que justificam localizar os imigrantes nasfazendas de café

'A imigraçã rura l que Sã Paulo precisa e deve rea lizar, deiníio, um está io indispensá el, durante alguns ano s, nas fa-zendas de café (...) onde os imigrantes se aclimatarã à con-diçõs de vida e de trabalho do pa ís' (TELLES, 1946, p . 753)(4).

E o nacional? E aqueles que 'apesar de toda a sua energia eheroísmo, nã resolvem o problema do progresso econôico do Brasil"?(NEIVA, 1949, p . 227). E aquele 'homem livre vivendo 'au jour lejour' , como dizem os franceses, ou 'van der Hand in der Mund', comodizem os a lemães, ou mesmo 'ao Deus da rá', como nó d izemos'? (ROQUET-TE PINTO, 1933, p . 19 ). Coiso evitar que seja mal recebido nas "re-giõs em que os colonos trabalham a horas certas e paga» «l ta paramudar de fazenda"? (idem, ibidem, p. 19).

Uma coisa é certa : ele 'nã se adapta ao trabalho extenuante

das nossas culturas" (LOBO, 1935 , p . 97 ). hesmo seus maiores defenso-res concordarão que nã se pode 'esperar qualquer transforeaçã nosseus hábitos de trabalho incerto e indisciplinado" (ROQUETTE PIN TO,1933, p . 20 ). A úica saía é, poi s, educálo para o trabalho:

'Algumas colônias bem organizadas e bem localizadas poderia»preparar para a atividade sistemáica necessá ia os que preci-sam emigrar ou »smo os que terã que praticar a cultura de ir-

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rigaçã" <idem, ibidem, p . 20 ).

Assiste-se ao progressivo surgimento , eu noae da defesa do tra-balhador nac ion al, de uma politica de colonizaçã co» brasile iros , cu-ja concepçã era a de um verdadei ro aldeamento da populaçã nativadispersa cora vistas a sua educaçã para o traba lho . Exemplar, mas nemde longe extr aordinário, é o projeto de núleos em áeas irrigadas,que deveriam transformar nordestinos errantes em colonos irrigantes.

"0 colono irrigante precisa ser moldado, trabalhado , formado

nas minú ias de qualidades morais e nos conhecimentos ténicospara a nova vida . 0 posto deve ser a verdadeira escola profis-sional agr ícola, o quartel da disciplina do trabalho e a igrejada formaçã espiritual capaz de transformar o elemento inúil -flagelado - ei céula produtiva - colono irrigante" (DUQUE,1939, p. 155).

També as colô ias agríolas nacionais, parte do grande projetode Marcha para o Oeste lançdo por Varg as, deveriam transformar as•ssas nômades, deseducadas , inconstantes, em verdadeiros 'exécitosdo trabalho ... incutindo-lhes há itos de atividade e de economia '(DIP, 1941, p . 9) . Caberia a estas colônias, ao mesmo tempo que aocupaçã /valor izaçã do terr itório, a "valorizaçã do capita l humano",suposto que:

"a medida da utilidade socia l do homem é dada pela sua capaci-dade de produçã" (idem, ibidem, p . 9) .

Nã surpreende que estas verdadeiras instituiçõs discip linares

tenham levado o insuspeito Uaibel a registrar:

'Ao entrar-se na Colôia compreende-se desde o primeiro momentoque aqui é uma áea de vida planejada e controlada" (UAIBEL,1979, P. 173).

Polí ica eugênica, polí ica imigratóia, polí ica migratória ,

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políica de defesa do trabalhador nacional, marcha para oest e, dife-rentes denominações e facetas de um amplo esforç de mobilizaçã depopulaçõs - nacionais e estrangeiras - para o trabalho . Controle dapopulação, controle do ter ritório , tratava-se de produzir trabalhado-res , localizados adequadamente: o nacional educado para o trabalhoprodutivo, o estrangeiro educado para a nacionalidade (5).

A Gestio Regional dos Excedentes

Os anos 50 e 60 verã um paí profundamente transformado. E aconcepçã de que o Brasil era um imenso territóio vaz io, cuja popula-çã estava por ser consti tuí a e conformada , é superada pela imagem deum paí em que coexistem espaçs cheios e espaçs vazios. A progres-siva emergêcia da questã agrá ia e sua fusã /subordinaçã à questãregional (Nordeste) vã suscitar a elaboraçã de uma nova equaçã po-pulaçã -terr itó io e uma nova solu ção, sob o formato do planejamento

regional.Camargo obse rvou , com pertinência, que o "problema regional ' e

a legitimaçã do planejamento regional representaram uma maneira decontornar a questã agráia:

"(...) deslocando o centro das atençõs do Estatuto do Traba-lhador Rural para a SUDENE, acoberta-se, a nível governamental ,a moderaçã ref ormis ta, contornando os conflitos de classe que,aqui e ali, afloram no camp o. Diluindo-os em um todo maior,

desloca-se a questão, rea l, da disparidade das classes para oplano, també real, da disparidade regional , diante da qual oEstado será, mais comodament e, o natural mediador" (CAMARGO,1981, P. Í1) (6).

Essa transfiguraçã da 'questã agráia" em 'questã Nordes te'nã foi nem pacífica , nem linea r. Se nos debruç rmos sobre os docu-mentos da época, ver ificaremos que o dest ino a ser dado à populaçã

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nordestina dividia claramente os campos entre os que afirmavam a pri-

mazia da questã agrária , defesa da permanê cia dos nordes tinos noNordeste; entre os que se alinhavam pelo desenvolvimento/planejamentoregional, convicçã de que a migração, já em curso, nã apenas erainexoráel, como, mais que isso, deveria ser estimulada e organizada.

Assim, e» seu famoso relatório, o Grupo de Trabalho para o De-senvolvimento Econôico do Nordeste recomenda que se considere

'de imediato a viabilidade de promover uma corrente imigratóiaorganizada em direçã ao interior maranhense e goiano e a ou-tras regiõ s da periferia do Po lígono, onde já exista ou estejaem const ruçã uma infra-estrutura de est radas. 0 Governo terácomo tarefa delimitar as regiõs onde conviria abrir uma frentede imigraçã nordes tina, indicar os tipos de unidade produtivaagropecuáia recomendá eis (... ), estimar os custos de transla-do e de instalaçã dessa população, indicar o tipo de assistê -cia té nica e financeira que deverá ser proporcionada à mesma,sugerir as culturas que devem ser fomen tadas , indicar a formade comercial izaçã recomendá el (...), estudar os mercados po-tenciais e sugerir as linhas de políica de garantia de preçs

(...) o objetivo ú timo que se tem em vista é transferir da re-giã semi-áida algumas centenas de milhares de pessoas, criarnessa regiã uma economia com menor potencial demográico emais elevado nível de produtividade , e deslocar a fronteiraagríola do Nordeste" (GTDN, 195?, p . 85 ).

Este deslocamento planejado, esta gestã regional de populaçãse explicita claramente como mecanismo de controle políico e socialem texto da Procuradoria Geral da República, reproduzido no primeironúero do Boletim Econôico da SUDFNE:

"A crescente pressã demográica que se constata no Nordestetem suscitado problemas sociais e polí icos de suma gravidadeque podem ser sintetizados nos seguintes fatos: a) clima geralde insatisfaçã; b) criaçã de ressent imentos em relaçã àáeas mais desenvolvidas do paí; c) aparecimento de associa-

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çõs camponesas com vistas a resolver o problema imediato doacesso à ter ra' (A pud. OLIVEIRA, 1981 , p . 1 14).

A esta altu ra, como é sab ido , já de longa data vem crescendo omovimento de nordestinos que se desloca», seja para o Sul, seja para aAmazônia. Trata -se, pois , tã soment e, de acelerar e organizar a re-distribuição em marcha , dessa porque Sã Paul o, que nã podia parar,já havia descoberto que os nordestinos podem ser disciplinados para otrabalho no trabalho ... e na velha Hospedaria de Imigrantes ecoam no-vos sotaques.

A extraordináia mob ili zação de populaçõs é olhada , nesta éo-ca, com grande otimi smo. 0 «deio desenvolvisentista conforta-sefrente a uma realidade em profunda transformação, frente à multidõsque abandona» os campos atrasados para se engajarem na corrente doprogresso urbano-in dastrial. 0 enxugamento demográico do campo cria-ria as condições para sua modernização, eliminando o sub-emprego rurale tornando o trabalhador «ais prcdüivo e valorizado; por outro lado,forneceria os braç s necessários à grandiosa tarefa da industrializa-ção.

'A introduçã de técnicas » is aprimoradas de lavoura e pecuária (...) conduzem a melhores saf ras e tende» a reduzir o volu-me de sã -de-obra corresponden te a uma determinada produção.Cria-se em consequênc ia , ura excedente de população, que ficadisponível para outras ativ idades . Só a industrializaçã pode-rá absorver esse exced ent e, proporeionando-lhe trabalho e novasoportunidades para »lhoria de seu padrã de vida. 0 êodo ru-ral será um sintoma de progresso se tiver couo causa real umaumento da produtiv idade da agricultura, paralelo a uia demandacorrespondente de trabalho nas indútrias e serviçs urbanos"(KUBITSCHEK DE OLIVEI RA, 1955, p. 125).

A reforma agráia poderia ter »dificado os rumos deste proces-so? É provável , aas ela foi derro tada. Agora, sobretudo apó 64, cosio estabelecisento da pax agraria latifundiá ia, o planejamento regio-nal vai se encarregar de preparar a passagem a um territóio nacional

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integrado, funcionalizado, submetido a uma centralizaçã doravante in-

discut ível , a uma hegemonia po lítica, econô ica e cultural inquestio-náel .

Que determinadas parcelas da populaçã tenham se tornado exce-den tária s, que o campo e o Nordeste sejam reconhecidos como territórios superpovoados, que, mais do que tudo , a produçã de excedentáiosseja explicitamente apresentada como objetivo de pol ítica, tudo issonã é senã a prova de que o capit al integrou e submeteu populaçõs eterritó io a sua lógica. Longo caminho já foi percorrida desde osanos 30, e mesmo do nã tã distante pós-guer ra.

Integraçã Naci ona l e Mobili zaçã do Ter ritó io

Com a questã agráia 'resolvida' (pax agráia + modernização) ,e tendo o planejamento regional realizado sua tarefa históica (7),impõ-se o planejamento territorial global, com seu conhecido lema:"integraçã nacional ", fio invé de um olhar em que as diferenç s re-gionais sã focalizadas a partir (de dent ro) das reg iões, um olhar deconjunto, em que a totalidade (hierarquizada) se impõ à particulari-dades . 0 territóio vai ser 1?) analiticamente decomposto, e 2?)funcionalmente recomposto e mobilizado.

A centralizaçã e o paulatino esvaziamento das agêcias regio-nais de planejamento sã sinal do que está ocor rendo . Do centro ema-nam polí icas de criaçã de poios, regiões-p rogramas , grandes projetosque vã redefinir a ocupaçã/ut ilizaçã do espaço. As instâcias go-vernamentais formalmente competentes para estabelecer as diretrizes do

ordenamento territorial nã estã mais capacitadas para encarnar eviabilizar o novo formato de intervençã . E as decisõ s est ratégicas,com real impacto, passam à óbita das grandes agê cias setoriais na-cionais (estata is - Ele trobrás, Pet robrás, Vale do Rio Doce - ou pri-vadas).

Agora, a ocupaçã do territó io nã mais estará associada àocupaçã produt iva da pop ulação. 'Et pour cause": o terr itó io é cap-

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turado dire tamente e mobi lizado , quase sem mediações, na esfera da va-lor izaçã do capi ta l.

A populaçã continua sendo Bobi1izada, «itas vezes de for»vio len ta. Mas o sentido desta mobilizaçã nã é mais o mesmo. Hã setrata mais de agrupar populaçõs para leválas ao trabalho. Nem setrata , apen as, de liberar os trabalhadores de seus laçs com "espaçstrad icionais ' e, desta forma, gerar uma forç de trabalhocirculan te/móvel apta a se oferecer onde nec essário . Trat a-se, issosi», de liberar o espaç da populaçã que o ocupa/imóbili za/b loqueia,que o inviabiliza econo micamente. De "recursos humanos" a serem valo-

rizados, a populaçã vai progressivamente sendo transformada em custoa ser contabilizado - basta ver os estudos para implantaçã dos gran-des projetos , que contemplam sempre uma rubrica de despesa que poderiaser chamada de 'limpeza de terreno".

é importante destacar que nesta nova eta pa, as escalas em quesã concebidas as intervençõs espaciais nã tê nenhuma relaçã com aescala da vida concreta das pessoas . E os fluxos migrató ios decorreicada vez mais de decisõs territoriais globais, totais, nacionais(quando nã internacionais) , tornando definitivamente anacrôicos nos-sos «althus ianos que ainda trabalham com noções como "excedentes demo-gráicos estruturais".

Um belo dia, o colono gaúho do Alto Uruguai descobre que o Es-tudo do Inventáio Hidroenergéico da Bacia do Rio Uruguai, baseado nolevantamento encomendado em í69 à Canambra Engineering Consultant Li-mit ed, fez dele um excedentário. Estã previstas 22 barr agens. Estáprogramado seu deslocamento.

Tomemos a barragem de Hachadinho:

"Com a construçã da bar rag ei serã inundados 23.400 ha de ter-ra at ingindo parcialmen te 16 municípios, dos quais Bar racão,Esmeralda , Guarama, Getúio Vargas, hachadinho, Mareeiino Ra-mos , Maximiliano de Alm eida , Pai« Fil ho, Sananduva, Sã José doOuro e Viadutos estã situados no Estado do Rio Grande do Sul ,e Anita Garibaldi, Campos Novos , Capinzal e Piratuva no Estadode Santa Cata rina . A formaçã do reservató io co» 270 quilôe-tros quadrados, implicará na inundaçã do distr ito de Carlos

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Gomes (municíio de Viadutos) e de cerca de povoados e no

deslocamento de íí209 pessoas. També será atingido o postoIndíena Ligeiro (municíio de Tapeja.ra), habitado pelos Kai-gang (Grupo G ê)' (SIGAUD, Í986, p. 6? ).

A histó ia de Hachadinho será a mesma de Itaipu, Sobradinho ,Itaparica, Passo Rea l

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é cedo para dizer , tanto mais que a populaçãluta. para. impedir que uma lóica espacial que em tudo lhe é estranhase imponha, subverta seu espaç e sua vida . Sob o lema "áuas para avida e nã para. a morte", 20 mil pessoas manifestas contra a. constru-çã das barragens, contra o segredo que cerca as decisõs a este res-peito , e denunciais:

'uma violência, um dilúio de á uas para a sorte (...) Mas essacatátrofe acontece unicamente porque os grandes grupos econômico s, por interesses gananciosos , simplesmente resolveram di-vidir a Améica do Su l, em trê grandes regiõs (...) é ondequerem colocar suas grandes indútrias modernas, especialmenteas agroindú trias (...)" (Comissã Regional de Atingidos porBarrag ens. Apud SI GAUD, í?86, p . 8 4).

Coso estamos longe daquela harmoniosa complementaridade entredes locamento de populações rurais e industrializaçã E « is longeainda daquelas políticas que tudo fizeram para trazer os pais e avódestes colonos para o Brasil , para ocuparem território, para se inte-grarem a usa nova nacionalidade

Este é apenas us exemplo, dentre muitos que se poderiam encon-tr ar . 0 controle territor ial de populaçõs tende progressivamente avisar a desocupaçã - e nã a ocupaçã - do terr itório . Des locar, di-recionar , levar de um canto a outr o, gerindo e neutralizando tensões.A populaçã errante de sertanejos que se recusavam ao 'trabalho exte-nuante das nossas culturas* nã exist e mais; em seu lugar, uma popula-çã de trabalhadores errantes que buscam extenuantemente um lugar noterr itório.

Controle espacia l concebido e implementado numa escala quaseinaccessí el, segundo uma lóica es tudo estranha e indiferente às

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real idades regionais e locais . Expropriação espacia l plenamente con-sumada.. . nã fora a resist ência, a vontade de ficar, a luta para nãser capturado por "providêcias do Gov ern o, no sentido de orientar omigrante nã o deixando à prória sor te" , a decisã de invadir e acam-par.

Frente à polí ica da mobi1izaçã forçada , a possibilidade damobilizaçã em torno a uma políica de aut oe ob i 1 idade (ou contra-mo-bi lid ade ). Ao fazer do espaç e da mobi lização espac ial objetos depolítica , o,Estado faz, inevitavelmente, do espaç e seu controle ob-jetos de luta.

Políicas Higratóias e Políicas Sociais

As pol í icas e prá icas de mobili zação de populaçõs transfor-maram as populações nômades que cir culavam "improdut ivamente" por umterritóio 'vazio ' em infantaria ligeira (excedentá ia) do capi tal.

Na aparência , o mesmo nomadismoi na verdade, duas lóicas espaciaisantagônic as. Ant es, uma circulaçã que ocorria fora da esfera da va-lorizaçã (do ter ritório , do trabalho, do capital ); agora, uma circu-laçã que, embora submet ida , ou melho r, porque submetida à lóica queimpera nesta esfera, nã pode levar a lugar nenhum.

0 mito desenvolvimentis ta, constantemente alimentado pelo Esta-do, e muitas vezes por uma intelectualidade modern izadora , se dissol-ve: o desenvolvimento nã integra os "margina is", simplesmente redefi-ne a natureza e forma da "marginalização".

Nesse contexto, as políicas sociais aparecem como o ersatz deum projeto integrador que nã se rea liz ou. É a próriaa modernidadeinstaurada que cobra a 'díida soc ial ', isto é, impõ polí icas com-pensatórias que financiem e amenizem as novas formas de marginaliza-ção. Desta forma, também, de manei ra substantiva e imediata , a popu-laçã se transforma em 'custo socia l". No âbito do Estado se discuteque parcela de recur sos será consagrada ao desenvolv imen to, que parce-la será destinadda ao "social", a derrubar de uma vez por todas a pu-

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dica folha de parreira que escondia o tráico divócio entre desenvol-vimento e bem-estar social.

No que se refere às pol í icas de localizaçã de população, elasse distanciaram definitivamente de suas origens, em que se afirmavamcomo mecanismos de mobilizaçã do trabalho . Certamente que o discursocont inua falando da diminuição dos desequi lí rios regioanis, da racio-nalização da dist ribu ição da popu lação, mas o que temos, de fato, é agestã territorial dos excedentes.

0 discurso éico da marcha para oeste se esvaiu. 0 aceno espe-rançoso do desenvo lvimento econômico clau dica. Neste quadro, as polí

ticas migratórias e de localizaçã de populaçõs aparecem, cada vezma is , como Política (perni timo-nos o P maiú culo) i e, como é comum emnossa sociedade, a Política se faz inúeras vezes, polícia.

Até que ponto pol íticas sociais ativas poderiam neutralizar einverter esta lóica de confronto e da violêcia que começ a se re-produz ir em todos os es pa ços ' Até que ponto seriam capazes de blo-quear u* processo que aponta para a possibilidade de uma críica glo-bal à lóica espacial dom ina nte

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Eis aí perguntas que nã nos arriscamos a responder. Eis per-guntas que não podem ser respondidas sem uma discussã profunda acercado sentido e eficáia das polí icas sociais compensató ias. Foucaultnos diz de como o home» ocidental aprendeu 'pouco a pouco o que signi-fica ser ui espé ie viva num mundo vivo, ter um corpo, condiçõs deexi stência, probabilidade de vid a, ter uma saúe individual e coleti-va , forças que se pode modif icar e um espaç onde se as pode repartirde maneira óima" (FOUCAULT, 1976, p . 187). E quando, aparentemente,nã há «ai s espaço onde repartir os homens?

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N O T A S

(1) Warren Dean chamou a atençã para a importâcia do subsí io aoafirmar:'Qualquer cá culo da viabilidade do sistema da grande lavoura de-pois da aboliçã da escravatura deve parti r desse fato espan toso:nã foi ela que pagou pela substitu içã de braços, e sia a popula-çã intej ra, inclusive os libertos" (DEAN, Í77 , p . 152) .

(2) A recuperaçã histó ica e anáise da intervençã do Estado no pro-cesso de produção da mobilidade espacial do trabalho vem sendo ob-jeto de uma pesquisa desenvolvida no Instituto de Pesquisa e Pla-nejamento Urbano e Regiona l (IPPUR/UFRJ), com apoio da FINEP. Soba coordenaçã do autor , Pablo Benett i, Vania Ramos de Azevedo, He-lion Póoa Neto e Frederico Guilherme Bandeira de Araúo consti-tuem uma equipe que teve enorme importâcia na coleta de informa-çõs e na elaboraçã das idéas aqui expre ssa s. Como de praxe,cabe registrar nossa inteira responsabilidade individual por este

texto e suas incorreções.

(3) Na exposiçã de motivos com que apresenta ao Ministro do Trabalho,Indútria e Comécio o ante-projeto elaborado pela comissã encar-regada de propor a regulamentaçã dos dispositivos constitucionaisreferentes à iaigraçã , Oliveira Vianna combate duramente "o libe-ral ismo da velha const ituiçã e das nossas leis de imigraçã e co-lonizaçã" e afirma:"0 problema da integraçã do colono na nossa sociedade, a sua in-

corporação à nacionalidade como elemento plá tico e constitutivo,bem como o problema da sua nacionalização, da sua abrasile iração,identificando-o com os ideais e tendê cias de nossa civ ilização,nada disto nos preocupava" (VIANNA, in H.T.I .C., 1936, p. DVII I).

(4) Para mostrar a extraordiná ia longevidade deste tipo de postura,basta citar a manifestaçã de outro próer pauli sta, aeio séuloantes:

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"A expe riência dem ons tra , pelo menos na província de Sã Pa ul o,

que a loc al iza ção dos imigran tes nas fazendas é o melhor si st em a,poi s após três ou quatro ano s, a famí ia assim co loca da , se é sóbria e labo riosa , terá acum ulado um pecúlio su ficiente para a com-pra de uma terr a, onde seu trabalho será tanto mais frutíero queele já est ari a ac limatado , conhecerá a lígua nacional e terá ad-qui rido as noções especi ai s necessárias à ag ri cu lt ur a, que não vêsenã da prática e sã tã diferentes na Europa e no Bra sil ' (An-tônio Prad o, discurso no Sena do, em 1888. Ap ud . MARTI NS, 1773, P .11 0 .

(5) Já em 1 906, Silv io Romer o propugn ava a mob ili zação do "enorme pro-letariado nacional":'posto ao lado do estra ngeir o para educar-se com ele no trabalho eo ir abrasileirando' (ROMERO, 1906, p. 51 ).

(6) Hais ou menos no mesmo sentido aponta Medeiros:"(...) foi justam ente nesse período que se intensificaram as con-dições que ace ler ara m o proce sso de exp uls ão do campe sin ato e queo movime nto campo nês se consoli dou em difere ntes estrut uras orga-niza tiv as. Com o desenvolvimento das lutas sociais no campo , aques tão começou a tomar seus conto rno s mais ca rac ter ísti cos , colo-cando ei jogo o pacto político vig ent e. Nesse con tex to, intensi-ficaram-se os debate s sobre a questã ao nível das classe s domi-nan tes , num esforço de responder nã mais em termos re tórico s, massim conc re tame nte, à incipiente est rutura ção de nova s propost asque poderi am rom per radi calmen te com as rel ações de pode r dominan-te s. A prime ira resposta a esse fato foi a criação da SU DE NE . Nofinal do governo Kubit sch ek, a questão agráia era transformada na

Questão No rd es te . Bus cav a-s e, ass im, matizá-la re gion alme nte ,criar con dições de reso lvê-la te cn icamen te . 0 prob lem a, que erade confr onto de cla sse s, apareci a como um desequ ilíbrio regional"(MEDEIROS, 1982, p. 109).

(7) Francisco de Oliveira mostra como o planejamento regional e a SU-DENE foram mecan ismos que desart icular am padrões que confi gurav am

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a regiã "fechada" (OLIVEIRA, 1981).

B I B L I O G R A F I A C I T A D A

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F L U T U A Ç Õ E S N A A T I V I D A D E E V A R I A Ç Õ E SN O S C O M P O N E N T E S D O P R E Ç O F I N A L D O

I M Ó V E L

Marti» Oscar SmolkaProfessor do IPPUR/UFRJ

Introduçã

Neste texto examinaremos o comportamento ao longo do ciclo imo-bil iário, dos principais componentes que entra» na fornaçã do preçfinal dos inoveis. COMO ficará claro na di scussão, ne» sempre serápossíel estabelecer de modo inequíoco a direçã das variaçõs destespreçs ou custos, uma vez que estã sujeitos a determinaçõs bem co»ple xas . Ou seja, de uma maneira geral uma forç responde por suas va-riações, forç s estas nem sempre independentes ou convergentes. Daíque, procuramos aqui , apontar apenas algumas das tendêcias mais sig-nificat ivas para cada u» destes componentes, cosiderados num contextoisolado dos de»is e num alto ní el de abs tra ção. Deste 'experimento",con tud o, será poss íel extrai r algu» s indicaçõs importantes e subs-tanciais para uma eventual avaliaçã empíica da rea lidade.

I. 0 Preç do Terreno

Diz-se e» geral que o preç do terreno depende essencialmenteda procura , uma vez que a oferta é tida como bastante inelá tica.Assim, a princíio o preç do terreno tenderia a variar com o níel deatividade imobiliá ia. No entanto, dois qualificativos se impõm. A

CADERNOS PUR/UFRJ, Rio de Janeiro, 3(i):29-4i, jan,/ahr.í8?

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demanda por terrenos pode variar no tempo tanto conforme a expectativafutura de preç s neste mercado (especulaçõs), quanto e i funçã dascaracterí ticas da atividade imobiliária. Sobre este útimo ponto ob-servamos que uma maior verticalizaçã permite que, para um mesmo ní elde atividade (medida pelo núero de unidades habitacionais produzi-das) , a procura por terrenos pressionem menos a oferta do que no casode que toda edificaçã constituí se em unidades unifaail iare s.

huit,o embora parcela considerável da valorizaçã imobiliáiapossa ser atribuía ao deslocamento dos gradientes de preç de terre-

no , decorrentes do intenso crescimento urbanoi isto em si nã é sufi-ciente como expl icação. Com efei to , o Eâltia de ocupaçã do solo urba-no assume també considerável - senã maior - importância . Neste sen-tido, sugerimos que a valorizaçã imobiliáia está associada a pró rialóica de atuaçã dos incorporadores. Estes ao privilegiar um segmentosuper ior do mercad o, reforçando a segregaçã social no espaço, ampliama diferenciaçã intra-urbana puxando para cim a, por assim dizer , ospreç s imob iliários(l). Assim, os gradientes de preços imobiliá iosestariam sujeitos a dois tipos de modificaçõs: por um lado um deslo-camento paralelo decorrente do crescimento urbano e por outro uma mo-dulaçã desta inclinaçã provocada pelo padrã de estruturaçã in-tra-urbana.

Isto sugere que, em geral, os preçs dos terrenos inclinam-se aapresentar uma tendêcia crescente no tempo, embora nã uniforme paraas diferentes á eas e per íodo s. Aqueles fatores que atuariam no senti-do de reduz ir a pressã sobre os terrenos (como a vert ical ização) ten-deriam em par te, ao men os, a ser compensados pelos efeitos da segrega-çã social do espaç associada a esta modal idade de ocupaçã urbana .Por tan to, para efeito de aná ise podemos concluir à guisa de uma pri-

meira aproximaçã ao tem a, que naqueles perídos de maior atividaderelativa do setor de ponta imobiliá io, se esperaria um aumento na va-riância interáeas dos preços de terrenos, acompanhado ou nã do cres-cimento da méia dos pr eços , caso o nível de atividade imobiliáia co-mo um todo fosse maior ou menor.

Sã várias, con tudo, as situaçõs intermediá ias també vislum-brávei s. Na medida em que ea certos perí dos de expansã extensiva (emcontraposiçã a intensiva sugerida a pouco) amplia-se a atuaçã sobre

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outros segmentos ou submercados imobiliáios urbanos de sais baixarenda, se pode verificar uma reduçã generalizada da necessidade deterrenos para um mesmo volume de habitaçõs.

Contudo, a tendêcia crescente dos preçs dos terrenos produzpor sua vez outros efeitos bem «is complexos sobre a prória ativida-de imobiliáia e sobretudo sobre o prório mercado fundiáio; efeitosestes decorrentes da procura de terrenos para finalidades outras queas de edificaçã propriamente di ta.

Trata-se aqui de se considerar a articulaçã entre o mercadofundiáio e o de capitais atravé da utilizaçã de terreno como reser-va de valor ou a procura especulativa de terrenos como forma alterna-tiva as aplicaçõs de capitais (2).

Isto implica concretamente que, ceteris raribus ao longo doperído de expansã da atividade imobiliáia aumente també a procuraespeculativa por terrenos. Ou seja , uma aceleraçã daquela atividade,esquenta a procura "produtiva" por terrenos , cuja valorizaçã estimulaas aplicaçõs especulat ivas neste mercado . A reaçã desta útima de-manda é, pelas razõs já expostas, pequena no iníio ganhando conside-ráel ípeto na medida em que se consolidam as expectativas

al ti st as O) , e persiste bem alé da reversã do ritmo da atividadeimobiliá ia. Este útimo fenôeno ocorre principalmente quando a retraçã no nível da atividade imobiliáia se faz acompanhar de queda nataxa de juros no mercado de capi tais . Vale dizer, a busca de outrasformas de reserva de valor, sustenta ainda a demanda por terr as. Aqueda da taxa de juros tende assim a ser acompanhada por uma elevaçãdo preç de terrenos em vista da dificuldade do mercado de capitais deconcorrer com o mercado fundiáio nas conjunturas de baixa (procura deterrenos para reserva de v alor ).

Em sum a, uma eventual sincronizaçã do ciclo imobiliáio com oda economia como um todo faz com que se mantenha a valorizaçã persis-tente dos terrenos, embora em ritmo variado. Em consequêcia, a parti-cipaçã do preç do terreno na formaçã do preç final do imóel tendea apresentar o seguinte padrão.

No iníio da expansã imobiliáia o preç final dos imóeiscresce mais rapidamente do que a dos terrenos, na medida em que seaproxima do auge inverte-se a relaçã que se manté alta daí por dian-

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te, isto é partic ipaçã crescente ou constante segundo o declí io ounã dos preç s das habit ações. Ou seja , nesta útima fase - embora ocrescimento dos preçs de terrenos seja cada vez mais modesto -, suaparti cipaçã aumenta na proporçã da queda dos preç s dos imó eis. Ca-so estes preçs seja» sustentados artific ialmente, como por exemplo ,pela indexaçã dos financiamentos habit acionais, ao longo da retraçãdeste mercado, o preç dos terrenos tenderã a praticamente estabili-zar sua pa rt ic ipação.

Esta análise, cont udo, nã se aplica necessariamente se, poroutros fatores , ocorrer algum descompasso entre dois ciclus eu pau ta.Has acompanhar passo a passo o que ocorrer ia aí, seria extremamentelaborioso uma vez que sã variadas e complexas as situaçõs possí eisque caracterizariam esta diacronia. Para nossos propó itos basta ria,talve z, recordar que os preçs dus terrenos enquanto preçs de ativosfinanceiros, variam inversamente à taxa de juros, implicando na possi-bilidade de uma certa desestabi 1 izaçã da art iculaçã entre os doismovimentos cí licos e» pauta.

Assim, a existêcia de um sistema financeiro protegido para aproduçã habi tacional, faz com que naquelas fases de expansã da ati-

vidade imobiliáia recursos sejas drenados do mercado de cap ita is. Co»isso ao mesmo tempo que a economia è ativada (via multiplicadores, porexemplo), e consequentemente a deíanda no mercado de capi tais, é si-multaneamente reduzida a oferta de cap ita is. Por outro lado quando asexpectativas de ganhos sã maiores no mercado de capitais (taxa de ju-ros crescente) , estebelece-se um patamar míimo de preç para que osdetentores de terrenos os liberes para a produçã habitacional . Esteútimo fato aliado ao custo de oportunidade de aplicaçã de recursosprovenientes'do sistena financeiro habitacional (protegido estimula arealizaçã de operaçõs de valorizaçã imobiliáia fict í ia) destina-das a transferir recursos deste sistema para o mercado de capit ais,frata-se de produzir tipicamente imóeis que embora de alto custo uni-táio sejam facilmente negociados ou utilizáeis como garantia de ou-tras operaçõs financei ras, isto é imóeis para investimento (ex.: es-túios de luxo, apart-hotéis, e tc.) .

Em resu mo, a interveniêcia do mercado fundiáio por um lado nosistema financeiro habitacional e por outro no mercado de capit ais,

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pode provocar situaçõs e* que, ora um ora outro mercado (fundiáio ede capit ais), estabelece patamares míimos de preços. Estes patamares,e aqui o ponto importante sâ mó eis poré« com certa rigidez para bai-xo.

2 . Os Custos de Const ruçã

Os custos de construçã tendeu em princípio , a acompanhar osmovimentos do nível de atividade imobiliáia na medida da pressãexercida pela demanda por materiais de construcâ e mão-de-obra, sobreuma dada oferta.

Aqui trê qualificativos fazem-se necessários. Em primeiro lu-gar há que se notar que a atividade da edificaçã residencial competenestes mercados de fatores com outras atividades de construçã civ il(obras públic as, etc.) cuja dinâica nã acompanha necessariamenteaquela do ciclo imobiliário. A indútria produtora de materia is de

construção, por sua vez , frente a uma expansã da demanda por seusprodutos, pode investir na ampliaçã da capacidade ou em novos produ-tos, potencializando uma oferta a preçs inferiores. Finalmente, ocusto da mã-de-obra é influenciado pelo níel de atividade de outrossetores da economia o que faz com que uma eventual diacronia entre asflutuaçõs nestes setores em relaçã as imobiliáias torne possí elque a oferta de mã-de-obra acompanhe ou nã a demanda no setor imobi-li ário.

Daí que para se avaliar o comportamento dos custos da constru-çã ao longo do ciclo imobil iáio é necessá io examinar tanto os fato-res endóenos como exó enos na formaçã destes custo s.

Os fatores endóenos associam-se essencialmente a ganhos deprodutividade decorrentes da escala do empreendimento e da organizaçãdo canteiro de obras, o que incidentalmente, depende do cronograma deexec ução, isto é do perí do mé io de produção.

Para simpl ificar a análise, partimos de uma situaçã em quetanto o setor imobiliáio como a economia estariam superando uma cri-

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se. No iníio da recuperaçã quando a produçã imobiliá ia é reati-vad a, a maior demanda por materiais de construçã poderia ser atendidasem maiores pressõs sobre os preçs pela reutilizaçã da capacidadeinstalada do setor produtor de materiais de const rução. Com a acelera-çã do ritmo de produçã habitacional vã surgindo dificuldades de su-primento de materiais na medida em que a capacidade de produçã destesmateriais vai se defasando em relaçã à encomendas.

Esta defasagem é atribuí a tanto à maturaçã em si dos investi-mentos realizados para ampliar esta capac idade, quanto ao prório re-tardamento desta decisã de investir que somente é feita apó a per-cepçã de que a recuperaçã da demanda é de fato cont íua e duradoura.Por outro lado, record amos, que dada as caracterí ticas da atividadede edificaçã (baixa composiçã orgâica , etc .) esta reage mais pron-tamente à demanda , do que aquele setor pro dutor.

A defasagem entre os ciclos dos dois setores em pauta, provocao aumento dos preçs de materiais (áios no suprimento, etc.) o que éfacilmente transferido ao pre ço, ou arcado pelas imobiliáias dado asaltas margens de lucro que ainda prevalecem (como discutido anterior-

mente).Os problemas de suprimento pode» ainda manifestar-se també na

ampliaçã do perí do de produçã da habi tação. Este processo pode serreforçdo caso a recuperaçã econôica seja acompanhada num primeiromomento pela intensificaçã de obras pú licas (construçã pesada) delongo perído de produçã; e num segundo momento quando a economia co-mo um todo també em expansã absorve aqueles materiais e mã-de-obranas montagés industriais associadas ao maior níel de investimento.

Portanto , na recuperaçã do setor imobiliáio os custos de

construçã devem representar pequena parcela na formaçã dos preç sfinais para vigorosamente ir aumentando sua par tic ipa ção. Ou se ja , oaumento da importâcia destes custos fazem-se tanto em termos absolu-tos quanto em relaçã à evoluçã do preç final do imóel na medida emque estes útimos tendem a de cl in ar a partir do final da expansã imo-bi li ári a.

tiutatis autandi para o perído de ret raçã , observando-se ape-nas que o abandono de pequenas firmas imobiliáias do mercado , aliado

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à vi5C05idade dos preçs dos imóeis, acelera aquela participaçã re-lativa dos custos de construçã no preç final.A necess idade de diversif icaçã de mercados pelas maiores em-

presas - expansã extensiva aos mercados de mais baixa renda - assina-la ao mesmo tempo a oportunidade de racionalizaçã dos méodos de pro-duçã/edificaçã nestes mercados.

3. Custos Financeiros

0 Componente de custos financeiros num empreendimento imobiliário depende essencialmente de trê fatores; a saber: do custo em si dodinheiro ou taxa de juros efetiva, do íntante relativo de recursosnecessários, e do tempo méio de realizaçã do empreend imen to. Comoestes fatores claramente flutuam no tempo, o mesmo consequentementedeverá ocorrer com os custos financeiros, embora como veremos a seguirnem sempre estes fatores se movem na mesma direçã nas diferentes fa-

ses do ciclo.Huito embora a taxa de juros dos financiamentos habitacionais éhabitualmente (ex.: SFH) fixa em termos reais ou tabelada para dife-rentes programas ou operaçõs imobiliá ias, na práica o custo realdos custos financeiros necessários num empreendimento pode var iar. Is-to é fá il de perceber quando se observa que as linhas de créito dis-poníe is raramente cobrem integralmente os custos - parte dos recursosdevem vir do prório incorporador, edificador, etc. Ora , numa situaçãem que o mercado financeiro oferece outras alternativas para a aplica-çã (e tomada) de capitais a taxas de retorno (juros) distintas do queprevalece no sistema financeiro habitacional, tais recursos para o em-presá io imobiliáio deverã ser imputados ao seu custo de oportunida-de . Assi m, naqueles perídos de expansã em que a taxa de juros demercado é rela tivamente baixa e o retorno é alto na aplicaçã imobi-liáia o empresá io tenderá a mobilizar relativamente maior parcela derecursos prórios (reinvestimento de lucros imobilá ios). Observa-senestes perí dos ainda a canalizaçã de recursos do mercado financeiro

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para o setor habitacional provocando pelo, excesso de liquidez, o"boa» especulativo imobiliáio e con ele as operaçõs de larga escalaenvolvendo significativas transformaçõs no ambiente construío aexemplo dos grandes projetos de urbanizaçã privada (ex.: CondomíioItaipu, etc.), tíutatis itutand i os recursos tenderã a ser desviadosdo setor imobiliáio para o mercado de capitais nos perídos de retra-ção.

A consequêcia disto tudo , alé das associaçõs e fusõs entrefinanceiras e imobiliáias no perído de expansã e absorçã dos úti-mos pelas-primei ras , na ret raçã, é que tanto numa como na outra fa-se, embora por motivos disti ntos, eleva-se o componente de custo fi-nanceiro na composiçã do preç final do imóel. No primei ro, pela -por assim dizer - remuneraçã de juros por rendas fundiá ias e no se-gundo pela imputaçã de um maior preç pelos recursos pró rios compro-metidos, como colateral no empreendimento imobiliáio (4 ).

Quanto aos dois outros fatores já listados , interessa observarainda em referêcia ao processo descrito a pou co, que o montante derecursos financeiros necessá ios, depende do empreendimento imobiliário em pau ta. 0 que por sua vez se associa a prória modalidade da in-

corporação. Assim, a rea lizaçã de um empreendimento em que o proprie-táio cede o terreno em troca de algumas unidades construí as, ou emque o mesmo é realizado sob "administ raçã" , permite que , ao menos soba óica do empresáio imobiliáio, um volume substancialmente menor derecursos pró rios seja necess ário . 0 inverso é váido para os casos deum-projeto inovador organizado deiigentemerite pelo incorporador e oscapitais a ele associado, em que a maior valorizaçã ocorre algum tem-po âiíâ a conclusã do empreendimento, isto é, quando se consolidam ese percebem externai idades que o empreendimento internaiiza. A reali-zaçã de um e outro empreendimento está claramente associado, a cadauma das fases do cic lo, discutidas há pouco.

Final mente , no que concerne ao tempo méio de realizaçã do em-preendimento, vimos anteriormente que o mesmo depende da estratéia deadministraçã pela firma de sua carteira de encomendas. Por outro la-do, das notas acisa pode-se inferir" que aquele tempo méio nã dependedo prório custo do dinheiro e do montante de recursos necessáios aser mobilizados.

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O ponto que nos interessa aqui é que a ampliaçã e reduçã dotempo méio de produçã nã atua necessariamente no sentido de refor-çr as tendêcias descritas a pou co. Assis, quando dinheiro torna-sepor assim dizer "quente" as imobiliáias deveriam em princí io reduziro tempo méio de produção.

Ho entanto, nestes períodos, confrontadas por usa reduçã deencomendas ou da demanda em geral , o retardamento das entregas podetornar-se conveniente para que elas mantenham ativa sua carteira deempreend imen tos. Isto é particularmente interessante quando acompanha-do da necessidade de reduçã de custos (em especial os de administra-çã e de subcon tra tação) como estraté ia de resistê cia a perí dos dedepressão. Este artifí io de que se valem as saiores empresas parapermanecer no mercado em perí dos de depressã está obviamente condi-cionado a que tais empresas desfrutem de fato de posiçã dominantee\ou hegemôica no mercad o. Trata-se assim, de um dos mecanismos 'dar-winianos" pelo qual conc retamente, na retraçã dos negócios , proces-sa-se a concentraçã de capitais pela sobrevivêcia dos mais fortes .

Inversamente, para os perídos de fatura de créito e baixopreço, a compet ição com as empresas menores que entram no mercado fazcom que aquelas empresas maiores procurem encurtar o perído de produ-çã para aumen tar sua carteira de encome ndas. Isto exige em geral, areorganizaçã das empresas para fazer frente aos problemas de controledaí decorrentes.

Em suma , ambas as situaçõs indicas que o perído sé io de pro-duçã atua no sentido contrá io ao esperado: ora ampliando o tempo deexposiçã quando o custo é alto ora reduzindo quando é baixo A expli-caçã para o fenôeno (paradoxo?) depende aparentemente da importâciarelativa de estraté ias de valorizaçã isobiliáia que nã se esgotas

no âbito financeiro.

Harge» de Comercializaçã

Observemos de iníio que a durabilidade do imóel e do relati-

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vãente largo perído de produção, sã tidos como responsá eis pelasdificuldades do setor eu responder prontamente a eventuais expansõsou re trações da de ma nd a.

Or a, um aumento da demanda efetiva tenderá a se manter por al-gum t em po . Ao longo deste pe ríodo, a tendê cia então, é de que os imóveis venham a ser comercia lizados mais favoravelmente, isto é, o mer-cado absorverá mais facilmente eventuais elevaçõs do preç final,elevaçõs estas-que incidem diretamente na margem de comercializaçãdos imóveis .

A real ização destes ganhos comerciais, por sua vez, est imula,coma forma de captu rar aquela margem de pre ço, a venda antecipada dosimóeis (no lançmento da pla nta ). Com o resultado encurta-se o perí-do de realização destes ganhos pelas imobiliáias como um todo.

Por outro lado, em períodos de retraçã da demanda, desapare-cem, por def ini ção, estes ga nho s, implicando como já vis to, també nasaía do mercado das pequenas imob iliái as, incapazes, por razõs or-ganizacionais, de realizar outras modalidades de g anho s.

A margem de comercializaçã pode ainda variar ao longo do cicloem funçã da composiçã das hab itações e/ou do controle maior exercido

sobre este mercado exercido pelos capitais oligopol izados, principal-mente o incorporador.

A concorrê cia de corte oligopolista ao menos por certos seg-mentos específicos do mercado imobiliá io (notadamente o de mais altarenda) permite que se mantenham elevadas as margens de comercializaçãmesmo em per íodos de queda de demanda agregada no mercad o. Isto é con-seguido atravé dos diferentes expedientes utilizados para a expansãda demanda efetiva tal como já fartamente discutido nas seçõs ante-riores.

Ass im, a concentraçã dos capitais imobiliáios e concomitante-mente maior sofist icaçã e execução de bons empreendimentos permiteuma atuaçã mais diligente sobre segmentos especíicos da demanda. Ouseja, a atuaçã das imobiliáias segmenta o mercado de tal modo a quenestes segmentos a competiçã nã se faz por preç s mas pela partici-paçã (sarket shares) ou até mesmo ã nível de produtividade (reduçãde período mé io de pro dução, et c. ). A capacidade destas empresas he-gemôicas de evitar 'guerras de preçs" ainda que as custas de certa

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reduçã voluntá ia da oferta permite , em suma, manter elevadas as mar-gens de comercial izaçã ao menos em certos segmentos do mercado, mesmonos perí dos de retraçã do mercado como um todo.

A sustentaçã destes ar tif ícios, é no entanto pequena, se com-parada a, por exemplo, ao mercado de outros bens duráeis industriali-zados, em vista da fragilidade das barreiras de entrada nestes sub-lercados imobiliáios.

5. Conclusõs

A anáise realizada a pouc o, a uma primeira vista, apresentaresultados aparentemente contraditó ios ou inconsistentes, uma vezque, como advertímos em diferentes momentos deste texto, sã váiosos fatores responsá eis pela variaçã destes preçs ou componentes depreços. Nã é poss ível admit ir, obviamente, que em dado perído todosaqueles componentes cresçm ao mesmo tempo se o preç final se manté

estáel ou declinante Vale dizer , temos na realidade menos grau deliberdade do que inferida em cada uma daquelas análises.

Este útimo ponto sugere de imediato que os preçs imobiliáiosapresentam forte conteú o inflacionáio independentemente de even-tuais pressõs exó enas da demanda sobre o estoque existente. Vale di-zer, a dinâica interna do setor, estimulada ou nã por fatores exter-nos é capaz por si só de desencadear desequilí rios de natureza tipi-camente inflacionáia.

Isto, como foi visto neste texto, decorreria tanto de processos

de segmentaçã associados ao 'fechamento por dentro do mer cad o' quantode certa 'rigidez' para baixo como aquelas identificadas na articula-çã entre o mercado fundiáio e financeiro, alé é claro das pró riasimplicaçõs de articulaçõs entre os capitais financeiros e imobiliários e o consequen te endividamento das últi mas .

A integraçã e/ou sintet izaçã agora dos resultados obtidos nosdiferentes argumentos arrolados acima nã é simples, uma vez que a di-reçã resultante para estes momentos dependerá da magnitude ou inten-

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sidade relativa dos processos considerados . Somente numa anáise his-tóica concreta será poss ível avaliar a importâcia assumida por cadaum destes mecan ismos que concorrem na determinaçã destes preços . Quãmaior, por exemplo, deverá ser a valorizaçã esperada nas aplicaçõsem terrenos era comparação a outros tí ulos exis tentes no mercado decapit ais, ou qual o desempenho míimo necessá io nos setores produti-vos para atrair recursos comprometidos em terrenos, sã questõs quecertamente só poderã ser respondidas empir icamen te.

Sobre as referências ao ganho imobiliá io que prevalece a cadaperíodo , bastaria observar que, apontar os processos que sio responsáveis pelos movimentos de preçs mais significativos para cada perídoconcreto, significa ipso facto, revelar o tipo de operaçã de valori-zaçã que lhe é associado como imaginamos ter ficado evidente na análise cond uzida.

N O T A S

(1) Este ponto é desenvolvido noutros trabalhos do autor (cf. Ssolka ,'1981, 1983, 1987, etc.).

2 ) A rigor o mercado de habitaçõs deveria igualmente ser aí contem-plado, mas, para facilitar a discussão, por ora será conveniente

abst ra í-lo.

(3) A prória expansã da demanda especulativa se encarrega de acele-rar a valor izaçã dos terr enos.

(4) Recordemos a anáise acima no item 1 acerca dos movimentos dospreçs de terreno.

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B I B L I O G R A F I A

SHOLKA, M. O. . 'Preto da Terra e Valorizaçã Imobiliá ia Urbana Espaçpara Enquadramento Conceituai da Que stão' in Revista da SociedadeInteramericana de Planejamento, col.XV, núero 60, Dez . 8i.

SHOLKA, H.O.."Estruturas Intra-Urbanas e Segregaçã Social no Espaç:Elementos para uma Discussã da Cidade na Teoria Econômica".

IPED/PNPE - Séie Facsimile n.13, Nov.83.

SHOLKA, H.O..'Desenvolvimento Capitalista e Estruturaçõs In tra Hrb anano Brasil Noçõs Gerai s". Revista Espaç S Deba tes, ano XIII , vol .I, n.2 í, 1987.

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L U T A S P E L A T E R R A N A B A I X A D A D A

G U A N A B A R A : 1 9 5 0 - 1 . 9 6 4 ( i )

Frederico Guilherme Bandeira de AraúoPesquisador do IPPUR/UFRJ

I. Introduçã

Quem acompanha a problemáica agráia brasileira e, em espe-cial, o seu desenrolar no Estado do Rio de Jane iro, deve ter em menteos inúeros e frequentes conflitos onde a luta pela terra é a questãcentral.

Dentro do territóio fluminense algumas regiõs se destacam pe-la severidade do problema e pela amplitude que os conflitos vê alcan-çando. Dentre essas, a Baixada da Guanabara ocupa uma triste posiçã

de dest aque . Capivari, Sã José da Boa Mort e, Parque Estori l, etc, sãnomes que trazem à lembranç a violêcia das classes proprie tá ias e acada vez mais obstinada resistêcia dos trabalhadores rurais.

Essa situaçã de conflito na regiã contudo, nã tem sua origeme esgotamento no present e. Pelo contrário , vem ocorrendo desde há mui-to tempo, o que faz necessáio para a compreensã mais profunda da lu-ta pela terra na reg ião, que se desvende como se configurou a proble-máica hoje observada.

Todavia qual o 'passado' que interessa7

A históia nã é umasucessã de fatos que se sucedem linearmente. As transformaçõs se dãatravé de rupt uras . E nestes momentos de corte, de crise, as contra-diçõs tornam-se mais aparen tes, as prórias leis do desenvolvimentosocial mostram-se mais percept íveis.

0 perí do que culminou cora o golpe de 1964 foi um perído crítico da formaçã soeial brasile ira, determinante para sua histó iaPresen te. A crise políica configurad? com a demissã de Jâio Quadros

CADERNOS PUR/UFRJ, Rio de Janeiro, 3(í>:43-72, jan./abr.1989

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trouxe à tona a luta pelo pode r, articulada em torno de interesses que

se realinhavam na nova etapa de desenvolvimento do capitalismo nativo ,vigente a partir das transformaçõs estruturais efetuadas durante ogoverno Kubits che k. A opçã industrial imposta imprimiu novos rumos àeconomia e acelerou o movimento de concentraçã de capital e forç detraba lho. Os grandes conglomerados urbanos tiveram suas taxas de cres-cimento populacional aumentadas vertiginosamente.

Na cidade do Rio de Janeiro esse processo se traduziu espacial-mente com a expansã da malha urbana na direçã dos municí ios periféricos da Baixada da Guana bar a. Durante ciais de uma déada a fronteiraurbana avanç u avidamente sabre a zona rural, caracterizando um dosvetores princ ipais de vertiginosa valorizaçã da terra e a consequenteagudizaçã da luta por sua posse. Os confli tos daí originados se man-tê na atualidade, poré ea dimensã d istinta , pois tanto a conjunturacomo os parâetros estruturais modif icaram-se.

A luta pela terra na Baixada da Guanabara teve seu momento maiscrí ico nos anos turbulentos que antecederam à 1964, coroando mais deuma déada de confrontos , onde a ocupaçã do espaç na regiã sofria ,parci almen te, uma violenta transformaçã rural -urbana. Apreender esseprocesso é fundamental para se responder à questõ s que a luta de ho-

je coloca.A perspectiva do trabalho desenvolvido foi capta r, a partir das

contradiçõs oriundas da produçã capitalista do espaç brasileiro,como se desenvolveu o confronto entre os diversos interesses presentesna áea rural da Baixada da Guanabar a. A luta pela terra, como dimen-sã da luta de classes, foi o objeto da investigaçã . Nã e i abstrato,nem como conjunto de lutas virtuais, mas a partir das açõs ocorr idas,da real idade v iva.

Restar ia ainda, nesta breve introduçã , precisar com mais cla-

reza a regiã enf oca da . O termo "Baixada da Gua nabara ' é a designaçãde uma das dez zonas fisiográ icas coa que o IBGE (censos de 1950 e1960) divide o Estado do Rio de Janeiro, compreendendo os municíiosde Cachoeiras de Hacac u, Duque de Cax ias , Itaboraí, Hag é, Nilópoli s,Nite rói, Nova Iguaç , Sã Gonçlo e Sã Joã de Heriti (2). Portanto,a des ignaçã nã se orig ina de nenhuma relaçã objetiva com os movi-mentos sociais que este trabalho se propõ desvend ar. Todavia , foi no

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espaç compreendido por essa Baixada que as questõs de terra oridun-

das, direta ou indiretamente, da 'pressã ' exercida pelo crescimentourbano do Rio de Janeiro provocaram inúeros conflito s, sendo que osmais sign ificativos, no per íodo , ocorreram em Duque de Caxias , NovaIguaç , Hagé, Itaboraí e Cachoeiras de Macac u.

A delimitaçã da áea objeto é, no entanto, ainda precáia sesimplesmente se considera os cinco municíios arrola dos. 0 "locus" dainvestigaçã propr iamente dit o, pode ser definido como a áea ruraldesses municí ios compreendida entre o limite da faixa urbana e a en-costa da Serra do Mar, e que será designado no correr do texto como

áea dos conflitos da Baixada da. Guanabara, ou simplesmente, 'áea. J a stendi toa".

II. Anatomia Crí ica

Em agosto de 1961 eclodiu na Fazenda Sâ Lourenç em Xerém, mu-nicíio de Duque de Caxias, um movimento de lavradores que, por suascaracter ísticas, representou momento de inflexã na históia da lutapela terra na região. Pela primeira vez naquele perído trabalhadoresrurais assumiram a defesa armada das terras que ocupavam, num níel demobilizaçã que extrapolava totalmente o pequeno grupo atingido dire-tamente pela açã judicial movida pelos que se apresentavam como pro-prietá ios da área.

Duzentos e cinquenta homens armados rechaçram a tropa da política militar fluminense que tentava executar açã de despejo contrasete posse iros. A dimensã inusitada da resistêcia forçu o recu o. 0

despejo foi suspenso e o governador Celso Feçnha decretou a 'utilida-de para fins de desapropr iação' da áea conflit ada, garantindo, pelomenos em termos imediatos, a permanêcia dos 'posseiros' na terra.

Esse movimento inaugurou o breve per íodo , encerrando em abrilde 64, em que a luta pela terra dos trabalhadores rurais da Baixada daGuanabara assumiu uma forma mais combativa de grandes mobilizaçõs co-letivas. As condiçõs para essa mudanç todav ia, foram engendradas ao

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longo de anos de lut a, onde o que ressaltava era a fragmentaçã do mo-

vimento e a mí ima resistê cia efet iva à opressã das classes dominan-tes.

A Luta na Déada de 50

Parte da Baixada da Guanabara que, apó ter sido abandonada pe-

los Sr s. de Engenho no final do séulo XIX, nã foi coberta pela exu-berante produçã citríola da primeira metade do séulo atual , sofreu,gradua lmente , a ocupaçã de migran tes . Apó a 2^ Guerra Mundial porém,passou a haver no local um crescente acirramento da luta pela terra,aguçado , ainda ma is , com as mudanças estrutura is efetuadas na economiado pa ís. Estas transformaçõs provocaram um vertiginoso crescimento dapopulaçã dos grandes centr os, determinando processos de expansã ur-bana sobre áeas rurais na Baixada da Guanabara.

0 assé io da classe dos proprie tários contra os "posseiros" du-rante a déada de 50 teve o respaldo dos governos estadual de AmaralPeixoto (PSD - í5i a 1954) e de Miguel Couto Filho (PSD, posterior-mente PSP - Í55 a 1958). A forç do pessedismo fluminense afirmava-seatravé do apoio aos 'coronéis' do interior, mecanismo que garantia ocontrole eleitoral quase que absoluto das massas rura is. A repressãaos embrioná ios movimentos de res ist ência, apesar da intervençãconstante do aparelho policia l, baseava-se muito mais na "cobertura' àaçã de milí ias privadas sob o comando dos donos de te rra .

Nas áeas dos principais aovimentos de lavradores ocorridos naBaixada da Guanabara no iníio da déada de 60, es gera l, ja' haviam

acontecido conflitos na déada anterio r. Na pró ria fazenda Sã Lou-renço, em 1952, houve uma açã de expu lsão.

Nessa éoca a embrionáia Associaçã de Lavradores Fluminenses(ALF) tinha pouca base na massa camponesa da regiã (e do Estado), pa-ra real izar um apoio efetivo aos 'posseiros" ameaçados. 0 movimento delavradores apenas começva a expressar-se de forma mais orgânica . Al-gumas Associaçõs já haviam sido criadas , como a de Pedra Lisa em No-

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va Iguaç , fundada na déada de 40. A ALF, de âbito estad ual, havia

nascido no iníio dos anos 50 . Posteriormente, a criaçã de núleosdessa, entidade deu origem à associaçõs municipais . Apesar de nã apa-rente, a par tic ipaçã do PC foi decisiva para a criaçã da ALF e dasAssociaçõs locais que surgiram na região.

A estratéia geral do PC havia mudado durante esse perído deformaçã das primeiras organizaçõs de lavradores no Estado do Ri o,passando da proposta de 'Uniã Nacional ", contida no Hanifesto deigosto de 1945. para a proposta da "Frente Democrá ica de LibertaçãNacional' (FDLN), no Hanifesto de Agosto de 1950. No que toca à ques-tã do campo a nova postura expressava de modo contundente o enfrenta-mento com a oligarquia latifundiáia. 0 programa de lutas, todavia ,traduziu-se na Baixada da Guanabara num trabalho gradual e sistemáicode criaçã de organizações, que culminou, no iníio da déada de 60 ,com o domí io quase que absoluto das cúulas das Associaçõs locais eda Federaçã Es tadual .

Os principais partidos criados no pó-guerra (PSD, UDN e PTB)nã apresentavam, no per íodo, nenhum trabalho de base no seio dos la-vradores da Baixada da Guanabara . Só mais tarde , na segunda metade dosanos 50, é que o PTB, amparado na máuina do executivo es tadual do go-

verno Roberto Silveir a, se voltaria para o movimento no campo. Dequalquer modo , mesmo tentando competir em faixa idêtica, o trabalhodo PTB, de cunho es5encialmente eleitoral, caracterizava-se por umapráica clientelista e, em alguns momentos, pela organizaçã atravédo aparelho de Estado de entidades paralelas à influenciadas pelo PC.

A explosã de lutas pela terra nos anos 50 expandiu-se por todaa 'áea de conf lito s'. No municíio de Duque de Caxias , alé do casoda Fazenda Sã Lourenço, houve confrontos nos seguintes locais Fazen-da Capivari , Fazenda Piranema, Fazenda Penha-Ca ixão, em 1951 e 1954;

áea da localidade de Xerém, em 1955; e Fazenda Mato Grosso , em 1956,cujo conflito teve ampla repercussã pelo envolvimento de parlamenta-res da Câara Caxien se.

Em 1960 os 'posse iros' da Fazenda Mato Grosso sofriam nova in-vestida, numa açã que agora envolvida també ocupantes da FazendaSangra-hacaco, Estrela Velha , Soledade e Quebra-Coco. Este momento daluta se dava num contexto já bastante distinto do que o de 1956. Nã

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só o quadro gera l da luta de classes se mostrava em franca agudização,

como , no Estado do Rio, o movimento de lavradores se aprofundava estermos organizativos e assentava bases para modificar suas formas deluta.

Prenúcios de u i Novo 'Momento' de Luta

A nova postura só teve expressã de maiores dimensõs em Í6i,na luta da Fazenda Sã Lourenço. Mas desde o final da déada de 50 ,perído do governo Roberto da Silvei ra, o movimento começva a se ma-nifestar mais sol idamente. Apesar dis to, numa aparente contradição,esse governador petebista teve o apoio de grande parte dos trabalhado-res urbanos concentrados na Baixada da Guanabara, sob influêcia doPIB e do PC. A práica liberal do mandatáio estadual, no clima do de-senvolvimentismo jucelinista , ficou mais realçda pela marcante dife-renç com os doi5 governos anteriores do que por suas realizaçõs con-cre tas . No entanto o Executivo petebista nã deixou de trilhar uma po-líica de cooptaçã e contro le dos setores sociais mais combat ivos. Noque diz respei to à luta camponesa , o populismo de Roberto da Silveiranada mais foi do que a utilizaçã de formas nã violentas de contençãe subordinaçã do movimento. A ampla (mas nã irrestrita) liberdadepolíica vigente no perído referenciava-se també no governo federalde JK . A representaçã dos lavradores passou a ter acesso quase quedireto e informal ao Paláio do Ingá.

Em contraposiçã a esses beneplácitos, que , segundo os pró rioscamponeses, permitiu maior espaç políico para a organizaçã se for-

talec er, o governo Roberto da Silveira buscou combater os avançs queestivessem fora de seu dom ínio . Basicamente procurou quebrar a hegemo-nia do PC nas entidades dos lavradores.

No primeiro ano de sua gestã começ u a estruturar a execuçãda polí ica em relaçã ao ca mpo. Em maio de 1959 enviou à Assemblé aLegis lativa mensagem propondo a criaçã do Plano de Colonizaçã e

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novo ógã imediatamente elaborou ura 'Plano Piloto de Açã Agrária'

(PPAA), a ser implantado no estado. A proposta, engendrada num perídoem que a questã de terras já mostrava claramente o níel de conflitosque poderia atingir, tinha como essencial o alíio dessa tensã atra-vé de assistêcia jurí ica aos "posseiros" ameaçados, e a utilizaçãde terras pú licas em projetos de colonizaçã que absorvessem a forçde trabalho rural. Nã deixava de abordar també o problema, da grila-gem, questã crucial na Baixada da Guanabara . Porém, de modo algumcontinha alguma medida que pudesse ser hostil ao lati fúndio . Aliás, autil izaçã das terras publicas para 'soluçã da questã agrária' sem-pre foi proposta das classes dominantes do campo.

Em relaçã ao movimento de lavradores, o que adquiriu maiorsignificado no 'Plano' de Roberto da Silve ira, foi a competêcia de'promover a aquisição, mediante compra ou desapropriaçã de fazendasem lit ígio". Apesar das definiçõs formais, a açã da PPAA variou bas-tante conforme seu Executor , ou, mais claramente, em funçã da políi-ca real do governo com relaçã à questã agrária. Durante o perído deRoberto da Silveira sete áeas foram decretadas 'de utilidade púl icapara fins de desapropr iaçã" em decorrêcia, de confli tos exi stentes.Eram, na ordem cronolóica dos primeiros decretos, as seguintes fazen-

das: Sã Pe dro, Ponta do Largo, Largo e Atalho, Rio das Ostras, Tenen-te Pacheco, Parat imirim e Independê cia, Sã José da Boa Morte e Enge-nho do Mato.

Nos útimos meses em que esteve à frente do Executivo Fluminen-se, o governador petebista parecia estar promovendo um processo cres-cente de desapropriações. Apesar di sto, nem todas as áeas sob açãdos decretos foram realmente desapropriadas em sua ges tão. Dessa s,trê estã dentro da "áea dos conflitos': as Fazendas Sã Pedro e Te-nente Pache co, em Nova Iguaç ; e a Fazenda Sã José da Boa. Morte, em

Cachoeiras de Macacu.Durante o perído Roberto da Silveira nã só à esses casos al-

vos da açã governamental se restringiram as lutas dentro da "áea dosconfl itos". Particularmente em Duque de Caxias , váios movimentosocorreram, como na. Fazenda Barro Branco, no Distrito de Imbariê emí60; na Fazenda Piranema, Distrito de Xerém, no ann de í59i e na Fa-zenda. do Surdo, també em 1959.

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Por trá dos Moviment os de resistência dos 'posse iros', cada

vez mai s ar tic ula dos, a açã cre scente das Associ ações de Lav rad ore sque começaram a se mul tip lic ar. Como consequência desse crescimen to ede uma det erminad a pol ític a de organ ização, a ALF se transfo rmou em

lhadores Agrícolas Flum ine nse , realiza da em 1959. A reunião foi orga-

Aur ícol as do Bras il (UL fAB ). Na época já exis tiam cerca de 30 associa -ções de lavradores no Est ad o. Na mesma é oca o PTB, através do gove rnode Robert o da Silv eira , realiza va outra conferência est adu al, tendo àfrente o Exec utor do PPAA e uma Fede ração para lela criad a por esse ó-gão.

No to ta l foram cr iadas trê Fede rações até 1964- a Federação

Federação orga niza da sob os auspício s do gover no est adu al pe tebi st a,cujo nome ofi cia l era Fede ração dos Lav radore s do Ri o, mas que tor-nou- se conheci da entr e os cam pon ese s ligados à FALERJ como 'FederaçãFantasma'; e a l i t e r a ç ã o d o s C í r c u l o s O p e r á r i o s F l u m i n e n s e (FCOF), en-

(IPES) . Tod avi a, a FAL ERJ era a única com exp ress ão rea l na luta dos

lavradores do esta do. No Rio de Janeiro somente ela obteve o reconhe-ciment o ofic ial do Hinistério do Tra bal ho, dentro da leg islaçã sindi-ca l, em 1963, adotando o nome de Federação dos Pequeno s Lavrad ores e

0 final da década de 50 rep resentou nova transformação radi calna linha pol ític a do PC , com conse quênci as dete rmi nan tes em sua inter-venção concreta na luta dos lavradore s da Baixada da Gua nab ara . A I k icla racão de Harco de 1958 propunha a formaçã de uma 'frente úni ca 'das forçs interessadas na luta contra o imperialismo aaer ica no. Quan-to à ques tão ag rári a, havia uma br ut al di fe rença em r elação à propos-tas contida s no progra ma da FDLN do iníio dos anos 50. Em vez da abo-liçã do latif úndio e entr ega aos cam ponese s sem te rr a, 'facil itar oacesso à terr a.. ." Em vez de abo lição da mei a, te rça, etc. , 'ap licaçãdos direito s dos trabal hadore s do campo já consol idadas em lei..." eassim por diante.

Se no plano do discurso os postulados desse novo posicionamento

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do PC tiveram eco , sendo de modo geral incorporados pelas entidadesmais expressivas do campesinato no Rio de Janeiro, no plano da açãnem sempre o conflito pôe ser contido na Baixada da Guanabara, espe-cialmente no perído 1961-1964.

Contudo,'perpassando todas as mudançs de linha e sobrepujandoa luta interna, o PC manteve a práica de estabelecer entidades de ca-ráer sindical para o movimento de lavradores no Rio de Janeiro . Noâbito naciona l essa polí ica foi determinante na criaçã da ULTAB em1954, e na construçã da CONTAG, em Í963 .

Todavia, nã só os lavradores avanç ram sua organizaçã durante

a déada de 50. Os proprietáios també se articularam em entidades decla sse . No plano estadual foi criada a Federaçã das Associaçõs Ru-rais do Estado do Rio de Janeiro (FARERJ) que , já em Í55, organizavaa íi Conferê cia Rural Fluminen se, reunindo os proprietáios agríolasdo Esta do. As associaçõs de âbito municipal també multiplicaram-se.Dessas organizaçõs é importante marcar que sua intervençã em relaçãao movimento de lavradores, na 'áea dos conflitos', foi inexpressivacomo ógã polarizador da defesa dos interesses de classe dos proprie-tários .

Em primeiro lugar, porque, como a áea havia sido abandonadapelos proprietá ios no final do séulo passado, com a decadêcia docultivo de cana-de-açúcar, nã havia, durante o período, produçã emque esses proprietá ios estivessem envolvidos diretamente. També nãhaviam arrendatáios que preenchessem esse pape l. 0 fato diminuí ascondiçõs concretas de articulaçã entre os donos de t err a.

Em segundo lugar, havia a questã da grilagem, de dimensõsinimagináeis em toda a Baixada da Guanabara . Os interesses comuns deoposiçã aos 'posseiros', que uniam proprietáios e grileiros, namaioria das vezes proprietários-grilei ros, ganhavam maior consistêcia

políica nã na tradic ional associaçã de cla sse , mas na articulaçãde compromisso em torno de liderançs políicas locais, onde o estabe-lecimento de um sistema de 'apadrinhamento' permitia uma açã mais"eficaz" contra os lavradores. Isto porque esta "associaçã" normal-mente tinha nas mãs a burocracia local e influêcias no poder políi-co estadual , funçã de seu 'controle ' eleitoral nas áeas sob domínio .

Essas "organizaçõs" informais respondiam essencialmente aos

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interesses de setores ligados à propriedade da ter ra, ao comécio lo-

cal e à exploraçã de ativ idades marginais, como jogo e lenocínio. Eminúeros casos esses diversos ramos de atividade eram objeto da açãdo mesmo "grupo" ou capit alist a. A dimensã do que representava essecapit al, sua orige m, sua contradiçã estrutural com o grande capitalmonopolist a, faziam com que seus representantes tendessem a uma posi-çã de cunho nacionali sta. Fundamentalmente as classes dominantes quetinham seu poder estabelecido na Baixada da Guanabara nã representa-vam o setor do capital nacional associado ao transnaciona l. A contra-diçã existente porém, nã aparecia objetivada concretamente na re-gião. 0 perí do nã significou um momento de investida do grande capi-tal (nacional ou estrangeiro) sobre atividades produtivas ou a terrana Baixada.

A sucessã no Executivo Federa l, completada no iníio de í6ícom a posse de Jâio Quadr os, teve correspondêcia no Estado do Rio deJaneiro provocada pela morte de Roberto da Silveir a, es fins de feve-rei ro . Seu sucesso r, o vice-governador Celso Peçanha , eleito pelo PSD ,assumiu pos ições em relaçã à questã agráia que foram em grande par-te de encontro ao anseio do movimento dos trabalhadores rura is, dina-mizando bastante o trabalho do PPAA. A gestã deste ógã caracteri-zou-se pela defesa dos 'posseiros' em litígio, a desapropriaçã efeti-va de algumas áeas es conflito __ inclusive casos pendentes do gover-no anterior __ e o respeito e apoio à Associaçõs representativas doslavradores.

0 propói to do aproveitamento das terras púlicas també tevecerto avanç no perído de Celso Peçanha, com a concretizaçã do pro-jeto de desapropriaçã e colonizaçã da Fazenda Engenho do Hat o, emNiterói. Foi al iás, o ú ico elaborado conforme os desí nios da lei3951 que criou o Plano de Colonização, e o úico a ter algum ní el de

reali zação. Nas outras áeas desapropriadas o ato promoveu a elimina-çã do confronto imediato, mas o Estado nã chegou a assumir a condu-çã de um pos ter ior processo de colonização.

0 governo Celso Peçnha tomara posse num perído em que os con-flitos pe la terra no es tado já encontravam-se em fase de agudização. Apressã por parte dos donos de terra era crescente, ao mesmo tempo esque a resistêcia dos "posseiros" incorporava a experiêcia recente de

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mais de uma déada de confrontações. As "boas intençõs" do novo go-vernador nâ poderiam reverter essas tendências, por mais que sua pro-posta contasse com o apoio das cúulas dirigentes das organizaçõescamponesas. E, até o iníio de agos to, com a desapropriaçã da Fazendado Engenho do Hato , nada havia sido feito que pudesse ser identificadopela massa lavradora , como a caracterizar uma nova situaçã que a li-vrasse da perspectiva sombria em que viv ia. Pelo contrário, a realida-de mostrava que só atravé da açã direta poderiam ter alguma possibi-lidade de êxi to , mesmo que limitado e temporário.

Como já foi afirmado, a explosã dos 'posseiros' na Fazenda Sã

Lourenço, em meados de agosto , expressou toda essa si tuação. Um pontoa partir do qual a luta dos lavradores caracterizou-se por uma mobili-zaçã crescente, nã só dos atingidos diretamente pela açã dos 'gri-leiros', mas da massa de trabalhadores rurais das regiõs próxim as. E,alé diss o, inaugurou um perído nã mais exclusivamente de resistê -cia, mas també de ofensiva, com as ocupaçõs organizadas de terr a.

Os determinantes dessa transformaçã nã se encontravam somentenas injunçõs da luta de classe loca l. No plano nacional as bandeiraspopulares empunhadas por Jâio Quadros em sua campanha passavam pelocrivo da prática , com crescente saldo negativo para os trabalhadores .A renúncia , ao final de agosto, representou o 'golpe de misericódia"nas escassas ilusõs que ainda restavam nas classes subordinadas queo haviam apoiado sete meses antes.

0 segundo semestre de 1961 també trouxe acontecimentos signi-ficativos dentro do movimento campon ês. Se na Baixada da Guanabara ocaso da Fazenda Sã Lourenç marcou o iníio de uma nova postura deluta, no plano da organizaçã polí ica mais ampla dos trabalhadores docampo o I Congresso Nacional dos Lavradores e Trabalhadores Agríolasdo Brasil foi o ponto crucial. Realizado na capital mineira, em meados

de novembro de 1961, o encont ro, promovido principalmente pelas LigasCamponesas e a ULTAB, reuniu cerca de 1600 delegados e teve como eixonevrágico a discussã da Reforma Agrária . 0 documento final do Con-gresso caracterizou uma posiçã de classe que, definindo a lianças, nãse confundia ideologicamente e nem se colocava a reboque de outros se-tores.

Entret anto, se as resoluçõs do encontro continham um tom radi-

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cal e clas sista , a prória realizaçã do evento nã deixou de expres-

sar , mais do que usa políica de alianças, um entrelaçmento com ou-tros se tor es. 0 Congresso teve apoio do Estado para sua rea lização.Joã Goulart, convidado, discursou no encerramento, recebendo um "di-ploma" de reconhecimento, juntamente cosi o Governador de Hinas GeraisMagalhã s Pint o, banqueiro e articulador do golpe de 1964 . També oDeputado Federal Tenóio Cavalcanti recebeu um 'voto de louvor' doscongress ista s. Ali ás, o parlamentar participara do conclave como mem-bro da delegaçã fluminense, convidado pela Associaçã de Duque de Ca-

Fluminense. realizada em setembro.No contexto da Naçã o Congresso de Belo Horizonte foi a áicede uma demonstraçã de forç do campes inato que, respaldada nos movi-mentos das | jgas Camponesas no Nordeste, do MASTER no Rio Grande doSul , da FALERJ no Rio de Janei ro, etc ., determinou certo impacto so-bre as classes dominantes. No entanto, a efervescêcia políica do pe-rído permitiu que o discurso radical e o clamor das palavras de ordembem colocadas encobrissem a verdadeira dimensã da forç do campesina-to em luta . Nã só as avaliaçõs futuras iriam desvendar a mácaracriada, mas a prória praxis imediata iria rasgála com ironia.

0 discurso das cúulas dirigentes distanciava-se da realidadecamponesa, onde a "sabedoria" políica separava os problemas locaisimediatos da questã da luta pelo controle do Esta do. Apesar disto , o'momento' da luta de classes no Brasil ocorrido durante o segundo se-mestre de 1961, signi ficou , para as classes subordinadas do camp o, umatransformaçã no sentido do enfrentamento de suas reivindicaçõs espe-cíicas - fundamentalmente a posse da terra - de modo organizado eofensivo.

Por outro lado, as classes dominantes , a partir da posse de

Joã Goulart , começram a articular-se para bloquear sua açã ou der-rubá-lo , cada vez mais assustadas com a "permissividade" do Executivopara com os movimentos popu lares. Os latifúdios passaram a ampliar ereforçr as suas sempre presentes milíias privadas . Setores da bur-guesia nacionalista esforçvam-se por tentar executar algumas refor-mas , à seu modo , que aliviassem a tensã crescente. Essas tentativaschocavam-se principalmente com a reaçã da oligarquia e da burguesia

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rural, mais aguçda no referente à Reforma Agra ria.

A Luta no Segundo 'Momento' (apó Sâ Lourenço)

A Baixada da Guanabara, tornou-se pa lco de incontáeis escaramu-çs entre donos de terra e trabalhadores rurais , caracterizadas cadavez mais pela açã direta dos últi mos . Praticamente coincidindo com a

luta na Fazenda Sã Lourenço, era agosto de i96i , "posseiros" da Fazen-da Piranema, em Duque de Caxia s, també reagiram com armas aos ataquesordenados pelo "gri leiro". Apesar da destruiçã de algumas benfeito-rias conseguiram permanecer no local, mantendo-se porém, constante oclima de violê cia que culminou, em fevereiro de 1962, quando 609 fa-míias foram ameaçdas judicialmente de despejo. Mais uma vez a mobi-lizaçã dos atingidos e o apoio dos lavradores de toda regiã conse-guiu impedir a expulsão.

Em Tinguá, na fronteira entre Nova Iguaç e Duque de Caxias ,explodiu em outubro um verdadei ro 'levante armad o", com a ocupaçã deterras das Fazendas Reunidas (Cachoeira, Bembeca e Maced o). Nenhumadessas áeas foi desapropriada por qualquer dos governadores fluminen-ses até Í64 e , tampouco, pelo governo federal , Até meados de novembroos lavradores seguiam ocupando militarmente as fazendas, todavia , ain-da no perído de Celso Peçnha no executivo estadual, foram expulsos.

A áea do denominado Parque Capivari (projeto de loteamento quecobria parte da antiga Fazenda Capivar i), no Distrito de Xeré em Du-que de Caxi as, foi ocupada durante novembro de 1761. Quando a terracomeçva a ser cultivada os lavradores foram pressionados a abandonar

o loca l. Apesar dis to, diante da resi stência , nã foi efetuada, a ex-pulsã.

Ainda no mesmo novembro de 1961 ocorreu em Cachoeiras de Hacacua já citada 'rebelião' dos "posseiros" da Fazenda Sã José da Boa Mor-te, um dos movimentos marcantes da nova dimensã que tomava a luta doscamponeses . 0 decreto do Governador Roberto da Silveira desapro-priando a áea nã tivera nenhuma consequê cia pr ática. A tensã rei-

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nante cresceu com a tentativa dos proprietá ios de auiientar a cobrançdo tributo sobre a produçã dos que estavam estabelec idos no local. 0aparec imento de diversos 'donos' press ionando os ocupantes já haviamotivado a criaçã de uma das poucas Ligas Camponesas que se organiza-ram no Estado do Rio.

Apesar da dimensã do movimento, a FALERJ nã se fez prese nte.As diferenças poli ticas entre a direçã das Ligas e do PC determinara»esse afastamento . A falta de apoio das organizaçõs de maior peso foium dos fatores cruciais para o isolamento da luta e da intransigêciapor parte do Pode r. Celso Peçnha recusou-se a decretar a desapropria-

ção, medida que tomara em outros casos até menos graves , o que indica-ria també a dimensã das forçs que se opunham aos 'posseiros" em BoaMorte.

Imediatamente apó o declí io dessa luta acontecia a ocupaçãorganizada de terras do Núleo Agríola Santa Alice, em Itaguaí que,todav ia, durou pouc o, vencida pelos contingentes policiais que forasexecutar o desp ejo. Entre as lutas do período, os casos das FazendasSã Nicolau em Rio do Our o, 45 üstrito de Magé, e Barro Branco e i Ili-bar iê 35 Distrito de Duque de Cax ias, tiveram o componente inusitado

da participaçã direta de tropas do Exérc ito. Em junho de 1962, nova-mente a regiã fronteira de Nova Iguaç e Duque de Caxias entrou emconvul são, desta vez com a invasã armada da reserva Florestal de Tin-guá, que també nã contou com a parti cipaçã dominante de associaçõsde lavradores e nem da FALERJ, o que signif icava oposiçã à conduçãda luta.

Dando segmento a essa impressionante sequêcia de confl itos,ainda sob o calor da ocupaçã em Tinguá, explodia novamente o confron-to na Fazenda Capiva ri. A expulsã frustrada em novembro do ano ante-rior nã eliminara a açã judicial, que seguiu tra mitando. E» julhode 1962 a justiç decretou o despejo dos 'posseiros'.

0 impasse permaneceu até que , em agosto , membros do PPAA e daSecretaria do Trabalho anunciaram aos lavradores a desapropriaçã daFazenda Capiva ri, juntamente com as .Fazendas Penha-Caixã e Piraneraa,por ato do Governador Carvalho Janot i, que havia assumido há apenas ummês. 0 anú cio das desapropr iaçõs permitiu uma soluçã imediata parao caso da Fazenda Capivari e evitou iminentes despejos nas Fazendas

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Penha-Cai:;ã e Pir ane ma. Porém, o decreto estadual nã efetivou-se como depó ito da indenizaçã . A situaçã das fazendas permaneceu tensa ,explodindo mais uma vez na Capivari um levante armado, já em 1963.

0 decreto de Carvalho Janoti foi assinado ainda na esteira dotrabalho executado por Irêio Hatos, à frente do PPAA, na gestã deCelso Peçanha. Durante o governo deste as fazendas declaradas de 'uti-lidade pú lica para fins de desapropriação' foram: Engenho do Mato,Sã Lourenço, Ponta do Largo, Largo e Atalho, Santa Alice e VargemGrande.

Em todas essas cinco áeas foram depositadas as indenizaçõs e

o Estado assumiu a pos se, a exceçã de Santa Alice, objeto de decretofederal semelhante em 1963. Em nenhuma porém, o projeto de venda delotes foi implementado, inclusive na Fazenda Engenho do Mato, ondechegou a iniciar-se um trabalho de colonização. A permanêcia dos'posseiros' seguiu de forma nã legal, situaçã que, em muitas dasáreas , continua até os dias atua is .

A saía de Celso Peç nha do Executivo Fluminense representou umcorte na políica agráia estadua l, que vinha tendo certa continuida-de , pelo menos de propósitos, desde a criaçã do EiaDflj£_XaJflaÍl:

tio com Roberto da SiIveira . 0 novo Governador, Carvalho Janot i, doPSD, tendo assumido por ser o Presidente da Câara Estadua l, mandatotampã de pouco mais de seis meses , quase nada fez em relaçã à ques-tõs do camp o. Apó o decreto relativo a Piranema, Capivari e Penha-Caixâo, logo depois de sua posse, somente houve mais um úico ato dedesapropriação, o das te rras da Ci a. Têt il Améica Fabril , no 6

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- Dis-trito de Magé, em janeiro de 1963 . Nenhum dos dois decretos foi efeti-vado , nem por Carvalho Janot i, nem por seu sucessor, Badger da Silvei-ra . Iniciou-se o esvaziamento políico do PPAA , que efetivamente nãconcretizou mais nada até 1964, quando entã foi extinto apó abri l. 0prório apoio material dado aos lavradores atravé de suas entidadesfoi corta do, voltando a ser canalizado primordialmente pelo cliente-lismo dos políicos ligados ao governo.

0 momento dessa mudanç na políica estadual correspondeu a umpico na cri se por que vinha passando a nação. A intensificaçã dos mo-vimentos nas cidades e no campo colocou em crise a alianç PTB-PSD,base inicial de sustentaçã do governo no Congresso . 0 realinhamento

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das forcas político -par tidárias , unindo a partir de entã PSD e UDN,derrubou nos primeiro dias de junho o 15 Gabinete Parlamentarista.

Nesse clima de tensã as classes trabalhadoras fizeras us movi-mento de âbito nacional com caráer estritamente políico: no dia 5de julho convocaram uma greve geral de protesto contra a indicaçã deAuro de Moura Andrade para 15 Hini stro . A paraiizaçã atingiu os gran-des centros urbanos exigindo um gabinete nacionalista comprometido como programa de reformas de bas e. A dimensã e o caráer da greve foram,indubitavelmente , fatores de peso para a resoluçã do impasse.

Essa greve foi també um passo decisivo na organizaçã dos tra-

balhadores à ní el naci onal . No mê seguin te, o IV Encontro Nacionaldos Trabalhadores reconheceu o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT)contrariando a legislaçã vigen te.

Por outro lado, as forçs de direi ta, capitaneadas peloIPES/IBAD, criaram inúeras organizaçõs locais e setoria is de pres-são, alé de patrocinarem grupos para-ai1íares como o MA C. No Estadodo Rio hav ia, atuando no movimento camponês, uma organizaçã com to-das as caracterí ticas de fazer parte desse esquema: o Plano de Amparoaos Lavradores.

Mas a.principal forma encontrada pelos organismos reacionáiospara tentar desmobilizar os camponeses foi a criaçã de entidades pa-trocinadas pela Igreja Cat ólica, compet indo diretamente com as orga-nizaçõs de influêcia esquerdista. Porém, este tipo de intervençãnã teve eco na Baixada da Guan abara. No Estado do Rio a principaláea rural de atuaçã da direita foi o Vale do Paraíba, onde patroci-nou ativistas sindicais e obteve a colaboraçã de grupos polí icos lo-cais.

A crise polí ica da naçã se aprofundava. Mesmo assiia, a situa-çã cr ítica, rura l e urban a, da Baixada da Guanabara nã era esquecidapelo Poder Execu tivo. Em setesbro, já es plena derrocada do Ministéioempossado dois meses antes, foi criado o Grupo Executivo de Aiuda àB a i x a d a d a G u a n a b a r a

Nas eleiçõs parlamentares de outubro, com o resultado favorável em seu conjunto à forçs naciona listas, a luta pelas reformas debase ganhou novo impulso, assoc iada, no perído que se seguiu, à cam-panha pelo restabelecimento do presidencialismo. Nesse clima pó-elei-

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toral foi criada por Goulart a Superintendêcia dE Políica Agráia(SUPRA), que viria a ter uma presenç ativa nas questõs de terra naBaixada da Guanabara, assumindo o papel cumprido pelo PPAA.

A regulamentaçã do novo ógã só foi promulgada no final doano e , efet ivamente , a SUPRA só começu a ter açã em 1963. Este anocomeçu com mudançs que marcaram o iníio de um vertiginoso acirra-mento da luta de clas ses. Em 6 de janeiro o plebiscito restabeleceu opresidencia lismo. Dia 31 do mesmo mê os eleitos de outubro tomaramposse, configurando o quadro geral em que o equilírio políico osci-lou a favor das forçs progressi stas. As eleiçõs de 1962 haviam sido

a grande tentativa do capital transnacional e seus associados de assu-mir o poder políico pela via legal. A tendêcia centro-esquerdistasdo elei torado, e as insinuaçõs de que o Executivo tentaria vencer obloqueio conservador do Congresso atravé do apelo direto à classestrabalhadoras, levaram o céebro articulador da direita naquele momen-to, o IPES, a concluir da inevitabilidade de uma soluçã de força, ca-so quisesse efetuar as transformaçõs a que se prop unha. A conspiraçãcontra Joã Goulart soltou-se das amarras 0 presidente, no entanto,tentava seguir caminhando pelo fio da navalha.

As greves operá ias e as ocupaçõs de terra avolumavam-se emtodo o país, passando, muitas vezes, por cima das direçõs das entida-des de classe. 0 governo tentava nã atritar com sua base de apoio . Emabril de 1963, mesmo contrariando a Legislaçã Trabalhista, o Ministrodo Trabalho Almiro Afonso reconheceu o CGT. Aos trabalhadores do campoestendeu os direi tos trabalhistas atravé da regulamentaçã do sindi-calismo rural , cujo núero de entidades saltou de 300 em julho de1963, para 1500 em març de 1964.

No Estado do Rio a movimentaçã camponesa també tomava expres-sõs de cunho políico mais amplo. No final de abril de 1963 as enti-

dades dos lavradores e parlamentares fluminenses promoveram uma con-centraçã no Palá io do Ingá, com cerca de 5 mi trabalhadores docampo , entregando manifesto ao Governador Badger da Silveira que exi-gia, ent-re outras pont os, a imediata Reforma Agráia no Rio de Janeiroatravé da SUPRA e do PPAA.

Nesse contexto de impasses e contradiçõs agudas é que novamen-te explodiu a luta na Baixada da Guanabara. Hais uma vez , apesar do

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decreto do governo estadual no ano anterior, a. desapropriaçã nã com-pletou-se nas Fazendas Capivari, Penha-Caixã e Piranema. A tensãvoltou a cre sce r. Na Fazenda Capivari os camponeses tornaram a serpressionados pela empresa ENCO, que havia adquirido a áea e elaboradoum proje to de loteamento para mor adia. Face a indefiniçã do governoestadual e a iminêcia de lutas na área , em abril de 1963, pela pri-meira vez o governo federal, atravé da SUPRA, agiu diretamente numconflito de terra no Estado do Rio, decretando a "utilidade púlica"das mesmas fazendas atingidas pelo ato do Governador Carvalho Janoti,e incluindo també agora a Fazenda hato Gros so. Apesar disto, a ENCO

manteve a açã de reintegraçã de pos se .No iníio de junho o decreto federal ainda nâ havia tido qual-

quer desdobramento pr ático , estando o despejo prestes a ser decretado.Nã suportando mais a tensão, os 'posseiros' de Capivari, Penha-Caixãe Piranema , auxiliados por lavradores de toda a regi ão, rebelaram-seocupando a Fazenda Capi vari . Eram cerca de dois mil homens lideradospelo padre Aniba l e ura lavrador que ficou conhecido como 'Antonio Ca-pacete Verd e". Mais uma vez a explosã da massa contrariava a estratégia das entidades de cla sse , que nâ conseguiram nem impedir o movi-men to, nem assumir sua condução, como em outros ca sos. A FALERJ colo-cou-se frontalmente contra a "insurre ição".

0 'levante de Cap ivar i' també pô a nú divergêcias e contra-diçõs entre setores da burguesia nac iona list a. 0 Governador Badger daSilvei ra, alé de acusar os lavradores de estarem sendo conduzidos por"agitadores profis sionai s", acusou o Superintendente da SUPRA, JoãCarus o, de ser o orientador das "agitaçõs" no campo . Por outro lado,setores da burguesia local contrá ios a Badg er, afirmavam estar o pa-dre Anibal agindo sob o comando do Governador.

Nesse mar de acusaçõs rec íprocas porém, dois aspectos tornam-se claros: primeiro, que o movimento foi usado como argumento na lutapolíica entre setores das classes dominantesi segunda, que os líeresdo "levante" apenas polarizavam a impulsividade presente no movimentocamponê da reg ião. A questã de haver ou nâ provocadores diluia-sefrente à tendêcia ao confronto com os proprietá ios e à assunçã deformas mais efetivas de pressã sobre o Estado.

0 fato expressava o distanciamento das direçõs das entidades

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relaçã à trajetó ia da luta, e a divergê cia entre sua práica e

os anseios presentes no âago do movime nto . Independente da avaliaçãsobre a correçã da polí ica levada a cabo pelas organizaçõs dos la-vradores, o 'levante de Capivari ' mostrou que, na 'áea dos confli-tos", pelo menos parte significativa da base nã estava 'ganha' paraessa polí ica,

Apesar do movimento de resistêcia e pressã ter se esgotado euseio a uma aparente v itória , a efetiva desapropriaçã das terras rea-lizada "a pulso" por Joã Caruso , esta, ainda assim, nã se concreti-zou para os "posseiros". Antes do final de junho a justiç declarou

insuficiente o depó ito efetuado pela SUPRA. A situaçã que pareciater sido def inida, voltou ao impasse. Nada foi resolv ido até abri l de1964.

As divergêcias quanto à polí ica agrária, entre os governosfederal e estadual expressavam-se nas atuaçõs da SUPRA e do PPA A. En-quanto a primeira iniciava uma práica agressiva de intervençã nosconflitos, o PPAA , que já tivera atuaçã semelhante principalmente du-rante os perí dos de Roberto da Silveira e Celso Peçanha, tornava-seum ógã inóuo, ou , melhor dizend o, ostensivamente contráio aos in-teresses dos lavradores.

A SUPRA, ocupando o espaç deixado pelo ógã estadual, nã li-mitou sua açã à Fazendas Capivari , Piran ema, Hato Grosso e Penha-Caixã . Na mesma éoca do decreto referente a estas áreas, a FazendaSanta Ali ce, ea Itaguaí, que já havia sido desapropriada pelo governoestadual, era objeto de açã da Superin tendência . Posteriormente, oógã federal decretou a desapropriaçã da Fazenda Cachoe irinha, emHagé de uma áea no Inibé eu Campos; e da Fazenda Tocaia, em Hagé.Mas o trabalho da SUPRA no estado nã se restringiu a esse tipo de in-tervençã. Procurou dar apoio e assistêcia ao campes inato, mantendo

relaçõs com suas entidades de clas se . Autorizou també a venda de lo-tes dos Núleos Coloniais da Baixada da Guanabara e distribuiu tíulosde propriedade.

0 Presidente percebera que sua busca de sustentaçã pol ítica ,atravé da luta pelas reformas de base, nã poderia ficar apenas nocampo das pal avr as. A questã agrária , pela polarizaçã que gerava noCongresso, levara o Executivo a um impasse que entravou as demais re-

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formas previs tas. Goulart tentou partir para a ofensiva incentivando a

sindicalizaçã rura l, e tentando realiz ar, por decretos, uma reformaagráia parc ial, dentro dos limites que a lei lhe permitia. No famosocomí io do dia Í de març de 1964 o Presidente anunciou à naçã a de-sapropriaçã das terras ao longo das rodovias, ferrovias e a çudes .

0 trabalho visando o cresc imento da organizaçã dos trabalhado-res do campo iniciou com a aprovaçã do Estatuto do Trabalhador Ruralem març de 1963. Porém, só em meados do mesmo ano, com a criaçã da

taçã do E s ta M f l . é que a sindicalizaçã no campo deu um sal to, cul-

minando com a cri ação, no final de 1963, da CO NTAG.interessante, nesse pont o, fazer um paralelo entre os movi-

mentos sindicais urbano e rur al. 0 primeiro, fruto de suas condiçõsespec í icas de matura ção, durante o ano de 1963 conquistava certa in-dependê cia em relaçã ao sis tema, organizando-se alé da LegislaçãTrabalh ista com a criaçã do CG T.

No entanto o campesinato seguiu um caminho inverso. Das Asso-ciaçõs e Federaçõs independentes do Est ado , regist radas como socie-dades c ivi s, que , em funçã de sua combatividade era m, na prática, re-conhecidas como representantes dos trabalhadores do campo, passou aorganizar-se em sindicatos, terminando na criaçã da CONTAG "patroci-nada" pelo gov ern o. No nordeste a sindicalizaçã enfraqueceu as Lisase a lideranç de Francisco Julião. No Estado do Rio de Janeiro, a di-reçã das entidades camponesas "promoveu" a transformaçã das Associa-çõs em Sindicatos e da FALERJ e« FPLP A. No final de 1963 já haviam 10sindíatos e uma federaçã reconhecidos, e mais 23 sindicatos aguar-dando a legalização.

A éplosividade dos trabalhadores rura is, quase sempre em cho-que com a orientaçã das d ireções , manteve-se acesa até a derrocada de

1964 , quando porém, ficou claro que o está io de organizaçã e politi-zaçã eram insuficientes para resist ir e superar a ruptura que estavaacon tecendo. Na Baixada da Guanab ara, apó o "levante de Capivari",nã houve, até abril de 1964, movimentos de envergadura semelhante.Por ém, a pressã dos propr ietá ios e a mobilizaçã dos lavradores nãdeixou de crescer mantendo particularmente a 'áea dos conf litos ' emtensã permanen te. 0 acirramento da luta a partir de meados de 1961,

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caracterizando um momento de tendêcias ofensivas, nâ significou, pa-ra o conjunto dos trabalhadores do campo na região, um nível de cons-ciêcia que extrapolasse a especificidade das questõs agrárias.

No perído do golpe as divergêcias internas do PC em relaçã àestraté ia já tinham se tornado expressas nos 'rachas' que originaramo PCdoB e a PQ LOP. Nâ há indíios da presenç da segunda organizaçãno movimento dos lavradores da baixada da Guanabara . Já quanto aoPCdoB, vá ios depoimentos se referiram à sua atuaçã na região, entre1962 e Í964, mesmo ressaltando o está io embrioná io de organizaçã ea precariedade de quadros.

A prá ica desse partido na áea foi de uma agressiva políicade ocupaçã das terras improdutivas, independente de seu estado legalde propriedade , o que muitas vezes originou conf litos com a orientaçãdo PC e das entidades dos lavradores. No iníio de 1964 o PCdoB "con-trolava" oito áeas ocupadas, provavelmente todas dentro da Baixada daGuanabara. Este "controle", das auto-denominadas 'áeas livres", sig-nificava a lideranç do partido na preparaçã da ocupaçã e na poste-rior organizaçã produtiva e de def esa .

Os 'rachas' no Estado do Rio , atingindo també as bases, oca-

sionaram uma perda de influêcia do PC . De qualquer mod o, na Baixadada Guanabara , a atuaçã dos novos grupos e partidos de esquerda nãteve peso suficiente para imprimir um rumo diferente ao conjunto domovimento de lavradores da região. Apesar da politizaçã precá ia e dopredomíio das 1iderançs reformista s, a explosividade potencial doscamponeses , marcada pelos exemplos dos conflitos armado s, tornou-seuma ameaç cons tante , tanto para a classe dos proprietá ios de terralocal, como para as forçs de direita em geral . Juntamente com a lutados trabalhadores rurais do Rio Grande do Sul e do Nordeste, o movi-mento no Estado do Rio , onde a Baixada da Guanabara destacava-se, re-presentou um dos poios vivos da luta agráia no p eríodo .

As forçs do latifú dio, em oposição, armavam-se numa estratégia de guerra c iv il , preparando-se até mesmo para combater o Exérc ito .No 12 de abril de 1964 a greve geral convocada pelo CGT fracassou. NaBaixada da Guana bara, entre os camponeses, houve muita movimentaçãdas lideranças. Alguns esquemas para obtençã de armas foram articula-dos. (Ias, como se sabe, os fuzis nunca sairam dos arsenais do "Almi-

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ran te" . Durante alguns dias ainda perdurou certa expectativa de resis-tência ent re os grupos org aniza dos, apó o que as próprias direçõspart idárias ordena ram o 'dispersar'. 0 grosso dos lavradores restouindefeso frente à repressão que se desencadeou na regi ão es busca dos1í eres e de ar ma s. Inaugurou-se um longo per íodo de per segui ções,tortura, morte..,

'...agora-, se nã vem a revo lução, eu estava cer to que nó tínhamos a reforma agrária, nã i00Z, mas pelo menos 7< Ò7. nós. tính am òs, a reforma agrária autênt ica em todo o ter rit ório nacio-

na l. Mas infelizmente essa revolução ret ardou, estabe leceramleis que vieram reforçar todos os lat ifundiário s, as multina-cionai s, e o result ado é o que está aí fome e falta de produ-çã no campo e com isto todo mundo na cidade está so fr endo".(Depoimento de Manoel Ferreira, ex-presidente da FALE RJ, ao au-tor).

III. Ponto Final

Nas páginas antec eden tes os contendores principais das lutasforam tratados de "posseiros" e "gri le iro s". Po rém, a observação cri-teriosa da história dessas lutas, revela que, sob o jargã da éocaescondia-sE uma gama diferenciada de atores soci ais. Os dois termosusados con tinha« evidentemente u« caráte r po líti co , que no fundo defi -nia a essência da luta, servindo para cada lado expressar a visão doopositor.

'Posseir os' significava o conjunto das categorias rurais de nãpro pri etário s, oprim idos pelo latifúndio e cuja demanda báica comumera o acesso à terra: p arc eir os, assala riados agr ícol as, arrendatáriosprodutores e posse iros propr iamen te d it os . Em oposi ção, para o conjun -to de trabalhadores rur ais , eram 'grileiros" todos os que se avocavamcom direitos sobre a terr a, ses serem , como eles , produtores diret os,prop riet ários leg ais, arrendatários nã produto res , loteadores e gri-

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leiros propriamente ditos.

As lutas entre 'posseiros' e 'grileiros' na Baixada da Guanaba-ra inscrevem-se dentro de determinado contexto da luta de classes noBrasil, onde a expansã urbana das grandes metróoles foi um fenôenomarcan te, ü confl ito entre os interesses que conduziram o processocontinha dentro de si um ponto central: a apropriaçã privada da terratanto no campo como nas cidades que cres ciam . Ho espaç rural essaproblesá ica era gravada pela concentraçã da terra nas mãs de umadiminuta classe de grandes propr ietários, confrontando-se com enormemassa de trabalhadores desprovidos de propriedade fund iária .

A tendêcia de modificaçã do espaç tipicamente rural em urba-no detonou o processo de valorizaçã da terra em toda a Baixada daGuanabara . Em sentido amplo, a terra na regiã tornou-se interessantepara o Cap ita l, nã como base para a produção, mas, principa lmente,como objeto de especu lação, o que provocou uma ascensã vertig inosa deseu preç e uma intensa grila gem. Se, por um lado, esse processo ex-pressou uma tendê cia transformadora na ordenaçã do espaço, na 'áeados conflitos" significou també o elemento desencadeador de lutas,sendo a razã direta ou indireta do asséio da classe dos proprietários sobre os trabalhadores rurais. Esses conflitos, via de regra,eclodiram na tentativa de expulsã de l avradores, ou quando da imposi-çã do pagamento de alguma forma de renda. Nos anos imediatamente an-teriores à í64 as ocupaçõs organizadas també foram motivos imedia-tos da explosã de lutas.

Apesar do acelerado crescimento grande parte da Baixada da Gua-nabara nã foi atingida concretamente pela malha urbana no per íodo .Vá ias lutas porém, surgiram em locais onde tentava-se estabelecerprojetos de loteamento. Nas áeas dos trê casos de maior repercussãrelatados Sã Lourenço, Capivari e Sã José da Boa Morte apenas

parte da antiga Fazenda Capivari tornou-se zona habitacional.As diversas categorias de trabalhadores rurais sem propri edade,

sempre, de alguma forma, resistiram ao processo que tendia a destruílos como clas se. Durante a déada de 50 , quando a tensã com os pro-prietáios começou a intensifica r-se, esta resistêcia se fez de modoquase sempre desart iculado, apesar das tentativas de organizaçã etrabalho polí ico desenvolvidos fundamentalmente pelo PC . No iníio

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dos anos 60 o aguç mento da situaçã particular da região, aliado ao

contexto pol í ico em efervescê cia e à crise econôica em ace leração,fez com que o movimento dos lavradores avançsse em sua capacidade deoposiçã aos ataques das classes proprietárias. A resistê cia assumiuum cará er ativo e de mobilizaçã coletiva para o que as entidadesclassistas tiveram papel chav e. 0- conflito na Fazenda Sã Lourençsimbolizou o divisor d'áua entre esses dois momentos da luta dos cam-poneses.

0 avanç do movimento porém, provocou choques entre a tendêciaao confr onto, crescente no seio trabalhadores rurais, e a orientaçãdas cúulas das entidades na reg ião. Alguns casos mostraram a perda dehegemonia das dir eções, como o 'levante de Capiva ri" , onde a luta sedeu à revelia das A s s o c i a ç õ e s d e L a v r a d o r e s e da F e d e r a ç ã o . 0 trabalhode organização e sus tentaçã das ent idades pela base parece nã tersido consolidado.

A táica do enfrentamento passou a ser encarada por grande par-te dos lavradores como a ú ica forma da obtençã de algum nível deêxi to, mesmo que limitado e provisório . Em alguns casos o Estado seviu forçdo a intervir iniciando processos de desapropriaçã que , semais tarde nã se efetivaram, pelo menos momentaneamente garantiram a

permanê cia dos "posseiros". Esse tipo de ganho foi fundamental paraas condiçõs de sobrevivêcia dos trabalhadores rurais e para o avançpolí ico na luta mais ampla pela reforma agrária.

0 perído pó-64 consolidou o processo de transformaçã por quevinha passando a reg ião. Cont udo, se por um lado a resistêcia campo-nesa foi destruída, a vertiginosa expansã urbana arrefeceu. Nã houvea transformaçã total como anunciavas as perspectivas no iníio dosanos 60. Ainda hoje subsistem grandes zonas de caracterí ticas rurai s,o que nã pode ser atr ibuído, em seu con jun to, à resistêcia dos la-vradores anterior ou posterior à mudanç de regi me. 0e qualquer iodo,antes de 1964, e® alguns casos particulares a luta dos camponeses im-pediu a efetivaçã imediata da nova forma de ocupaçã do e spaço.

A consideraçã da evoluçã dos conflitos na Baixada da Guanaba-ra, as vitórias, derrotas e impasses que o movimento atingiu , nã po-dem ser ignorados se se pretende fazêlo avançar, e dar passos concre-tos no caminho da transformçã da sociedde brasileira no interesse das

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classes dominadas. Para isto, é necessá io també ter claro que ui dos'nó gordios" dessa transformaçã é a resoluçã da questã agrária, eque os trabalhadores do campo sã fundamentais nesse processo.

B I B L I O G R A F I A 3 )

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- Diáio Oficial do Estado do Rio de Janeiro

- Diáio Oficial da Uniã

- Encontro (MAB - Nova Iguaç)

- Folha da Cidade (Duque de Caxias)

- Jornal do Brasil (Rio de Janeiro)

- Luta Democráica (Rio de Janeiro)

- 0 Fluminense (Niteró)

- 0 Hunicipal (Duque de Caxias)

- Vaz Operáia

D E P O I M E N T O S

- Brálio Rodrigues - Ex-Secretáio da Diretoria da FALERJ

- Celso Peçnha - Deputado Fede ral, Ex-Governador do Estado do Rio de

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Janeiro

- Eraldo Líio de Azevedo - Predisente da FETAG - RJ

- Eurico Natal - Lideranç do movimento de lavradores no perído in-vestigado

- Irêio Hatos Pereira - Ex-Executor do PPAA no Governo de Celso Peç-nha

- José Pureza - Ex-Procurador da FALERJ, Ex-Presidente da FPLPA

- Hanuel Ferreira - Ex-Presidente da FALERJ

- Nilson Venâcio - Lideranç no movimento de lavradores no perídoinvest igado

- Otacílio Lacerda - Ex-Vereador do PSB em Duque de Ca xias .

N O T A S

(1) Este trabalho é a sí tese da Tese de Mestrado, de mesmo título,apresentada pelo autor ao Programa de Planejamento Urbano e Regio-nal COPPE-UFRJ, em 1782.

(2) Esse conjunto de municí ios é o relacionado no censo de 1950 . No

de 1960 houve novo arran jo, entrando o municí io de Rio Bonito esaindo o de Nova Iguaçu. Para este trabalho foi mantida a composi-çã de 1 950.

(3) Estã relacionadas exclusivamente as referêcias que tratam da re-giã estudada. Para a bibliografia completa vide a Tese de mesmot ítu lo .

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H I S T Ó R I A U R B A N A £M O V I M E N T O S S O C I A I S Í 1 >

Franklin Dias CoelhoPesquisador do IPPUR/UFRJ

I . Introduçã

Os.registros sobre lutas urbanas no Brasil incorporaram, emsuas análises , marcos conceituais produzidos a partir da realidade dospaíes capitalistas centrais. Acreditamos que a reflexã sobre os Mo-vimentos Sociais Urba nos, influenciada por estes referenciais teói-cos , apresenta a tendêcia a uma uniformidade e homogeneizaçã analítica que reduz a percepçã da dinâica e rupturas do conflito urbanoem nossa formaçã econôica e soc ia l.

Uma maior absorçã de nosso processo histó ico exige a incorpo-

raçã do saber acumulado sobre a evoluçã urbana e as transformaçõsespaciais no interior das grandes cidades bras ilei ras. 0 processo demodernizaçã da economia brasile ira produz uma especializaçã espacialque revela as determinaçõs dos diversos padrõ s de acumulaçã em umadeterminada sociedade. Este estudo visa acompanhar o ritmo destastransformaçõs espaciais em nossa formaçã econô ica e social a partirde um olhar para o urbano e o conflito social na cidade.

Na medida era que a sociedade c ri a, dest ró e recria seu esp aço,encontraremos na estruturaçã urbana herançs da divisã social e es-pacial do traba lho. Estas herançs impedem a produçã de formas espa-ciais que reflitam cada tempo de acumulaçã , pelo contrário , reafirmamas diferençs de seletividade na apropriaçã de espaçs e na superpo-siçã de temp os . Deste mod o, a forma concreta de realizaçã da moder-nizaçã da estrutura urbana revela-se na sucessã de espacialidadescriadas e nas necess idades de materi alizaçã de novos processos so-ciais.

CADERNOS PUR/UFRJ, Rio de Janeiro, 3( 1) 73 -8 ? jan./abr.í89

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Viv e-s e, assim, no espaç urbano uma constante tensã entre o

velho e o no vo . Um conflito entre espaç herdado e espaç projetado,entre ma nutenção e tr ansformação, entre cons trução e desvalorizaçã(2). 0 processo de transformaçõs espaci ais, de continuidades e des-continuidades no urba no, nã é apenas uma dinâica fí ico-urbaní tica,ias significa um processo de dominaçã espacial, uma estraté ia declasse, segundo Henri Lefebvre (3).

Neste sent id o, o 'ambiente cons tru ído ' é a forma concre ta doprocesso de acumulação nas cidades. Esta forma concreta de estrutura-çã do espado urbano, incorporando o conflito entre o velho e o novo

presente nas transformações sociais e espaciais, é um aspecto funda-mental para se avançr na compreensã das lutas urbanas no país.

Por ou tro lado, há a necessidade de recuperaçã do nosso passa-do , elemento importante para o entendimento das atuais relaçõs so-ciai s. Os registros sobre Movimentos Sociais Urbanos no Rio de Janeiroapon tam, a part ir dos anos 70, o surgimento de um fenôeno novo - asassociaçõs de moradores - seu estabelecer uma relação com a fase po-pulista ant erior a Í964 , com algumas exceçõs que confi rmam a regra. 0esforç de estabelecer as continuidades e descontinuidades que ligamas lutas urbanas no passado e no presente ainda é, concre tamente , umaconstrução analítica a ser reali zada em nossa formaçã so ci al .

A necessidade de contextualizaçã destes movimentos sugere ummaior cuidada com a utilizaçã de categorias anal íticas elaboradas ereelaboradas a partir da realidade dos paíes capitalistas centrais.Na anáise de experiências concretas devemos estar atentos para nãrep roduzi r, mecanicamente e sem med iações, a gêese e tipologia do mo-vimento que se crist aliza no interior da produção teóica sobre Movi-mentos Sociais Urbanos. Jordi Borja desenvolveu uma tipologia para osMovimentos Sociais Urbanos que se sobrepõ a prória dinâica destes

movimentos.0 esforç desenvolvido no sentido de uma recuperaçã históica

das lutas urbanas no país nã é apenas o de documentá-las, mas o deaprofundar algumas dimensõs e contradiçõs que surjam na identifica-çã das especi ficidades do processo h is tórico . Esta recuperaçã histórica nos permit irá pensa r, em que níve l, na realidade brasileira, osregistros de lutas populares anteriores a 1964 se articulam com os

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chamados "novos movimentos sociais urban os" . Ou sej a, como se dá aruptura entre o velho e novo em termos de movimentos sociais urbanos.

II. A Ditensã Históica do Conflito Urbano

Ainda que um dos estudos pioneiros - o de José Alvaro Hoisé -recupere a relaçã cora o perí do populista (4), o conjunto das pesqui-

sas reali zadas , contudo, nã trabalhou no sentido de analisar a dimen-sã histó ica da relaçã entre evoluçã urbana e movimentos sociais.Esta relaçã teu sido trabalhada por autores que tangenciais o t ema.

Os próprios marcos concei tuais devem ser repensados de modo aincorporar uma visã histó ica das transformaçõs espaciais no inte-rior do espaç urb ano . 0 esforç de elaboraçã conceituai envolve anecess idade de trabalhar a relaçã entre histó ia urbana e movimentossociai s, ou sej a, noçõs que incorporem a relaçã entre transformaçõsespacia is e reiv indicaçõs sociais no interior das cidades brasilei-

ras.Neste campo podemos afirmar que há uma fragilidade no interior

da produçã teó ica brasil eir a. Na incorporaçã dos marcos conceituaisda nova sociologia francesa tem predominado os estudos ea que a lóicade transformação do espaç urbano , e sua prória evolução, sã pensa-das segundo as estraté ias de transformaçã de uso promovidas pelo se-tor incorporador e amparadas pela açã do Estado (5) .

Ao lado dos processos econô icos de formaçã do espaç urbanodeve-se pensar nã só o ambiente cons tru ído, ou seja, a totalidade dosobjetos imobil iá ios, .como també as estruturas de controle social epolit ico, que se forma i no interior da cid ade .

Loojkine procurou avançr na compreensã do urbano enquantoconceito sócio-espac ial. Cont udo, ao trabalhar com o urbano coao lugarem que se concentram as condiçõs gerais de produção, que integram es-pacialmente os meios de produçã e os meios de reproduçã da forç detrabalho, manteve uaa concepçã ainda economicista do conflito u rbano.

No esforç de romper cora esta concepçã economicista devemos

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cotidianos de resistê cia dos trabalhadores ou ainda pela diversidade

de processos de consumo existentes nesse espaç , criam as condiçõspara o desenvolvimento de uma especializaçã espacial no interior doespaç urbano.

A especializaçã espac ial traduz-se ea zonas de poder polí icoe econômico, era centros financeiros e de negócios, ea hierarquizaçãde bairros e zonas perif éricas, onde se encontram disseminados os lu-gares de reproduçã da forç de tra balho. Ela expressa a correlaçãexistente ent re divisã social do trabalho e as formas de urbanização,que se materializam nesses espaçs diferenciados presentes no urbano.

Essas desigualdades e diferenças significam a forma materia ldas relaçõs sociais de produçã e a expressã territorial concre ta dadivisã ténica e social do t rabalho.

Existe uma especia lização no interior das cidades que revela asdeterminaçõs espacia is dos diversos padrõs de acumulaçã es uma de-terminada formaçã soc ial . A existê cia de um espaç herdado pelo ca-pital faz com que ele entre em conflito com o prório espaç que en-gendr ou. 0 espaç urbano como superposiçã de tempos (6), - como memória viva de perídos histó icos -, tem no seu ambiente construío asítese de processos soci ais, que podem ser acompanhados a partir datransformaçã do dia-a-dia da cidade, considerando cada tempo e espaçde acumulação.

III. A Históia da Anti-Oisciplina

Alé da dimensã de resistêcia da forma, é necessá io resgatar

a noçã de urbano , presente nos trabalhos de Lefebvre (7). 0 urbanoenquanto ponto de encontro nã só econô ico como polí ico e ideolói-co . Do mesmo modo que a cooperaçã urbana reproduz processos de inte-graçã , especial izaçã e emulação, ela reproduzirá aqueles ligados ànecessidade de vigilâcia e controle.

A concentraçã de trabalhadores exigirá um disc iplinamento,tanto pelos deslocamentos espaciais no mercado de trabalho com o, tam-

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bém, pela utili zaçã de méodos que permitam o contro le minucioso de

sujeicao constante do tempo e espaç dos trabalhadores, impondo umarelaçã de docilidade/ut ilidade frente à temporalidade e espacial idadedo capital.

Esta disciplina refere-se tanto a una relaçã de subordinaçãdo corpo dos homens à necessidades de aptidã e capacidade no proces-so de trabalho, como també a um determinado tipo de organizaçã doespaço. Segundo Foucault,

"a discipl ina é um tipo de organizaçã do espaç e uma ténicade distr ibuiçã dos indivíuos atravé da inserçã dos corposem um espaç individualizado, c lassifi catório, combinatório.Isola em um espaç fechado, esquadrinhado, hierarquizado, capazde desempenhar funçõs diferentes segundo o ob jet ivo , especíicoque dele se exige (., .). Em segundo lugar a discip lina é umcontro le do tem po. Isto é, ela estabelece uma sujeiçã do corpoao temp o, com o objetivo de produzir o máimo de rapidez e omáimo de eficáia ( ...). Em terceiro lugar, a vigilâcia é umdos principais instrumentos de con trol e. Nã é uma vigilâciaque se exerce de modo fragmentá io e descontínuo, mas que é ou

precisa ser vista pelos indivíuos que a ela estã expos tos,como cont ínua, perpéua e permanente: que nã tenh : limites,penetre nos lugares mais recôndi tos , esteja presente em toda aextensã do espaço' (MACHADO, Roberto . 'Por uma Genealogia doPod er' . Introduçã a Hicrofíica do Pod er. Graa l, 1982, p.XVII).

Enquanto ponto de encontro, pensada políica e ideologicamente,a cidade capitalista reproduz socialmente as necessidades de controle

e vigilâcia presentes no processo de trabalho . Esses processos políticos e ideoló icos, de disciplinar e organizar o espaç de acordo coma mobilidade e espacial idade do capi tal, interferem diretamente noprocesso de reproduçã da forç de trabalho e consequentemente nasreivindicaçõs sociais.

Neste senti do, o pensamento de Foucault contribui para a com-preensã de uma história da disciplina e do contro le no interior das

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cidades. Avanca» na compreensã dos dispositivos disciplinares os tex-

tos que relac iona» a higienizaçã da famí ia e das moradias com o pro-cesso de desenvolvimento urbano (8).

Con tud o, como afirma Michel de Certeau (9), é preciso empreen-der nã apenas a históia da disciplina, como a de Foucault, reas umahistóia da anti-di sciplina, estudando, juntamen te, quais sã os dis-posit ivos, as operaçõs disponíeis para os agentes resistirem ao sis-tema da supervisã ou da disciplina.

A concepçã de uma históia da anti-disciplina pode ser pensadaa parti r de uma relaçã de tensã entre a ideologia dominante e pro-

cessos con tra -hegemônicos. Esta tensã tanto está presente nos «vi-mentos sociais urbanos como perpassa o conjunto da vida cotidiana.A perspectiva de resgatar a histó ia da anti-disciplina e da

contra-hegemonia das classes subalternas acabou por unir Foucault eThompson em uma linha de pesquisa sobre a histó ia de resistê cia po-líica no interior do espaç urb ano. Embora situados e» campos metodo-lóicos dife rentes, o tema da cultura operá ia ampla«nte pesquisadapela historiografia inglesa , que deve sua renovaçã a Thompson, apare-ce como o contraponto do tema da disciplina industrial que está indis-sociavelmente ligada a Foucault (Í0) .

é segundo essa perspectiva que se te» recuperado a histó ia dosanarquistas no iníio do séulo a partir de estudos do processo dedisciplinarizaçã da forç de traba lho. Este processo se realiza nosespaç s de produção e de reprodução. 0 espaç de moradia das classessubal ternas nã escapará a desejo de disciplinar izaçã manifestadospelos domina ntes . Com as lentes de Foucault e Thompson se tem penetra-do no interior das fábricas , dos bairros e vilas operáias do iníioda industr ializaçã no pa ís, atentos à manifestaçõs de resistê ciacotidiana nas grandes cidades brasileir as.

A proposta de pesquisa da relaçã entre evoluçã urbana e aovi-mentos sociais envolve uma perspectiva de trabalho na qual aborda-se ahistóia da anti-disciplina e dos »vimentos contra-hegeaônicos, se-gundo noçã util izada por Grasse i. Para que possamos captar uma dimen-sã pol ítica, ideolóica e cultural desses processos de resistêcia énecessá io trabalhar numa linha sugerida por Hobsbawn, procurando rom-per co» a históia operá ia de 'dentro do aovi sent o' que apresenta a

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tendêcia de identificar 'classe ope rária ' cos "movimento operáio" ,

ou lesmo com organizaçõs, ideologias ou partidos especíicos (í).A históia da resistêcia, segundo essa linha de raciocí io, deve serpensada a partir da reproduçã em níe l das práicas cot idianas. 0 co-tidiano é um espaç de reproduçã e nele se desenvolve o que Bourdieudenominou de habitus

"sistemas de disposiçõs inconscientes que constituem o produtoda interior izaçã das estruturas objetivas e que , enquanto lu-gar, geomér ico dos determinismos objetivos e de uma determina-

ção, do futuro e das esperanç s subjet ivas, tende a produzirpráicas e, por esta via, carreiras objetivamente ajustadas àestruturas obj etivas' (BOURDIEU, Pier re. "Campo de Poder, CampoIntelectual e Habitus de Classe". In: A Economia das TrocasSimbólica s. Perspectiva, 1 987).

Segundo a visã de Bourdieu, temos as estruturas sóio-econôi-cas que sobredeterminam o habitus tipo de aquisiçã conservadora quedá lugar a prá icas ou est ratéias nas quais há disposiçõs prá icas,que estarã de acordo com as estruturas dominantes. Esta concepcçãtem elementos importantes para pensar as estra téias de reproduçã anível da p ráica coti diana, mas podes nos 1 imitar na fatalidade queestabelece para este processo.

Há, por tan to, que pensar tambéi o 'contra-habitus" e os proces-sos de resistêcia nos espaçs de morad ia. A forma particular comoconflito de classes se expressa na cidade tes uma dimensã espacial ecultu ral de oposiçã a um modo de vida imposto aos trabalhadores e àcamadas populares.

IV . Hovisentos Sociais Urbanos e a Produçã do Espaç

A dimensã de movimentos sociais urbanos como movimentos con-tra-hegemôicos em relaçã à estraté ias de dominaçã sóio-espaciais

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é apenas um dos elementos constitutivos de movimentos socia is. Um ou-tro elemento, o de construçã de identidades, també deve ser pensadoem funçã do espaç e das presençs e ausê cias que definem uma iden-tidade social.

Estes dois elementos estã presentes nos diversos momentos daslutas urbanas em nosso pa ís. Eles refletem um processo de produçã doespaç que nã pode ser desligado das representaçõs que se desenvol-vem em funçã da cooperaçã urbana , das especializaçõs espacia is e dasegregaçã social .

Nesse sent ido, a urbanizaçã enquanto organizaçã do espaço,como afirma Milton Santo s, é o resultado objetivo de uma

'multiplicidade de variá eis que, atuando atravé da históiasua inécia passa a ser dinâmic a. Por inécia e dinâ ica enten-demos que a forma é tanto resultado como condiçã do processo.As formas espaciais sã ativas e nã passi vas, mesmo que suaautonomia com relaçã a outras estruturas sociais seja relati-va . Mas as formas espaciais també obrigam as outras estruturassociais a modifi car-se, procurando uma adaptaçã sempre que nã

possam criar outras f ormas' (SANTGS, H . op . cit., p .30).

A concepçã de formas espaciais ativas permite a leitura denossa formaçã econô ica e soc ial a parti r da estru turaçã do espaçurban o. Esta proposta signi fica, metodologicamente, uma inversã darelaçã econôica e social versus espaço, onde a organizaçã espacialé normalmente pensada de uma forma passiva e a partir de sobredetermi-naçõs econômicas e socia is. Trata -se , ao cont rário , de pensar a formaurbana de uma maneira at iva. Constatar uma lóica de potencializaçã

de acumulaçã presente no urbano - que se reali za no nível da organi-zaçã do espaç - percorrendo um caminho inverso, e identificando atéque ponto essa organizaçã espacia l condic iona a pró ria formaçã so-cial.

Acompanhando essa inversã, podemos pensar os espaçs diferen-ciados na cidade como unidade de continuidade e descontinuidade pre-sentes na forma urbana . A existêc ia de espaçs equipados e nã equi-pados significa uma especializaçã e spacial, cristaliza formas sociais

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e conforma diferentes modos de vida no interior do espaç urb ano . Umaconcepçã de espaç definido como u« jogo de ausêcias e presenç s(12).

A parti r de identidades e dif erenças, a urbanizaçã pode serpensada como um processo de transformaçõs sóio-espaciais no interiordas cidades. Essas transformaçõs internas, a hierarquizaçã dos bair-ros , a segregação soci al, a expansã intensiva nos núleos centra is eextensiva nas peri feri as, integras-se enquanto usa divisã social eespacial expressam uma compreensã em que a forma é efeito e condiçãdo processo de acumulaçã c apit alist a. Acompanhando o movimento global

da socie dade, as transformaçõs espaciais se caracterizarã por pro-cessos de cris tal izaçã/destruiçã de formas espacia is e identidadessociais.

A dimensã históica do processo de lutas urbanas em que se in-corpore a noçã de contra-hegemonia e de const rução de identidades sócio-espaciais ainda necessita de um trabalho de pesquisa sais sistemático . Entretan to, podemos localizar diferentes momentos da produçã doespaç urbano no Rio de Janeiro e a material ização desses conflit os,que sinte tizam relações de forçs entre clas ses e crista lizam e des-troem formas espaciais e identidades sociais.

Podemos situar quatro momentos significat ivos que permitem umaanalise, no Rio de Jane iro, dos movimentos sociais como um processo deresistê cia sócio -espac ial . Nã há aqui um sentido de recuperaçã his-toriográfico , mas sim uma intençã de localizar as princ ipais lutasurbanas que se caracter iza» por oposiçã a um tempo e espaç impostoem cada fase de urbanizaçã e de formaçã das cid ade s.

Um primeiro momento a ser pensado é o da Revolta da Cachaç e aorganizaçã da cidade col onial . Alguns histori adores do séulo XVII jáfalavam da populaçã carioca como um povo "irr everente , indisciplina-

do, rebelde". Eu meados daquele séulo é cr iad a, pelo Rei de Portuga l,a Companhia do Comécio Gera l do Brasil que, entre medidas que favore-ciam seu monopó io na comercializaçã de alguns produtos, impô novosimpostos e proibiu a fabricaçã da cachaç nascida de uma identidadede interesses comerciais e de uma reaçã da população a uma maior pre-senç da administraçã da metrópole , a Revolta da Cachaç inicia-se a08 de novembro de 1660 com a destruição do Governador e tomada da Câ

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sara Huni cipal. A rebeliã será debelada somente eu 07 de abril deíóóí, seus líeres serã anistiados com exceçã de Jerô imo Barbalhocondenado à morte por uma corte marcia l (13).

A cidade do Rio de Janeiro, no perído colonia l, tem uma história rica de motins e rebeliões, que refletem a dinâica da prória or-ganizaçã da cidade e de sua pop ulação. Expressam, também, uma dimen-sã da cidade colonial , onde a rua era o confim da cas a. As ruas , lu-gar de senhores e escravos, estreitas e tortuosas, acolhiam as ativi-dades de sustentaçã da metró ole e os serviç s que asseguravam a au-to-suficiê cia da casa colonial. Sem alinhamento e normas de discipli-

nar ização, as ruas do perí do colonial abriga rão, no Rio de Jane iro,uma populaçã rebelde e insubmissa, que necessitará ser di sciplinada.

Um segundo momento, é o da transiçã entre cidade comercial eindustrial e a Revolta da Vac ina . Com os primeiros surtos industriais,a imigraçã e a libertaçã dos esc ravos, os pobres convertem-se emelementos principais da paisagem do núleo central da cidade comer-cia l. Sobre eles concentram-se agora os problemas da cida de. A medici-na social passa a indicar a necessidade de normalizar o funcionamentodo espaç coleti vo, de disciplinarizar a populaçã urban a. Sob a éide

da ideologia higiení tica surgem as prime iras preocupaçõs com a in-tervençã rac iona l no urban o. A necessidade de hierarquizaçã das zo-nas comerciais , industriais e habitacionais na cidade, de potenciali-zar a acumulaçã via transformaçõs urba nas , encontrará na hig iene, nasaúe da popul ação, no asseio e limpeza, a neutra lidade necessá ia pa-ra uma intervençã sobre o modo de vida do conjunto da populaçã cita-dina. Para que a cidade se higienize trata-se agora de disciplinar asclasses subalternas e decompor seus espaçs coletivos de moradia.

As campanhas sanitá ias de Osvaldo Cruz e as transformaçõs donúleo central da cidade promovidas pelo Prefeito Pereira Passos ex-pressam necessidades de adequaçã do espaç urbano, de estabelecimentode uma especiali zaçã espacial no seu interior , de diferenciaçã e in-tegraçã de espaços . Expulsos dos bairros cen tra is, os trabalhadoressubiram os morros ou segui ram, junto com a linha fé rea, a direçã dossubúbios (14).

A introduçã de equipamentos colet ivos estabelece as condiçõsde rea lizaçã de um dos elementos de discip linarizaçã da populaçã

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urb ana . Ao mesmo tempo em que fixam, imobilizam e regulamentam eles

sel ecionam. Surgem as 'váias populaçõs" no urbano, algumas delas re-sist irã à se letividade e à se gr egação.

A Revolta da Vacina é um exemplo dessa res ist ência. Durantequatro dias , em novembro de 1904, a populaçã pobre tomou conta da ci-dade levantando barr icada s, surrando vacinadores e invadindo préiospúbl icos . Mas o alvo político nã era apenas as campanhas sanitá iasde Osvaldo Cru z. As ruas estavam repletas de desabrigados e desempre-gad os, 'deserdados de uma urbe renovada" , como os chamou Benchimol(15), que viram destruídos seus espaç s de moradia atravé das refor-

mas de Pereira Pass os. 0 "bota abai xo', como ficou conhecido o Prefei-to , deslocara milhares de pessoas de suas casas e de usa ambiêcia quepermi tia formas de trabalho au tônom o. A revolta signif icava, também, atentat iva de res istir a esse tipo de expropriação, que impõ uma mobi-lidade e prepara as formas de segregaçã espacial.

Os moradores de cort iços, estalagens e casas de côodo encon-tram no interior dessas habitações , ou na sua ambiência, formas socia-lizadas de consumo e modos de vida que necessita» ser decompostos , in-dividual izados. Claridade e espaç indica» a ideologia higienista queorientará as campanhas sanitá ias e as demoliçõs do iníio do séuloXX. Ao capitalismo industrial que se forsava cabia intervir nesseexécito de despossuídos, de impor uma mobilidade, de fazêlos circu-lar. As formas de resistêcia expressavam uma identidade coletiva nosentido da fixaçã e prese rvaçã da relaçã entre espaç s de moradia emodos de vida.

Um terceiro momento é o de intensif icaçã do processo de subs-tituiçã de importaçõs e de explosão metropol itana. 0 Bras il , na década de 56, caracterizou-se por UB conjunto de transformaçõs sóio-espaciais que configura u» marco decisivo para as déadas poste riores .

A intensificaçã do padrã de acumulação, voltada para a substituiçãde importaçõs, indicava na processo de internacionalizaçã do capi-ta l. A integraçã entre capita is nacionais e estrangeiros colocava li-mites em qualquer estratéia de uit desenvolvimento cap italista autôo-mo, a nã ser com rupturas políicas e sociais muito profundas.

A trajetó ia da sociedade b ras ile ira , no per íodo, é marcada pe-las contradições deste processo em que há u» descolamento ent re a «-

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nopol izaçã da economia , a integraçã cos o mercado internacional e aestrutura políica admin istra tiva. As marchas e contra-marchas expres-sam o choque entre os distintos projetos de mudanç e desenvolvimentopresente nas diversas forçs polí icas do país.

A saía desenvolvimentista de Juscelino Kubitscheck imprimiu umritmo maior à transformaçõs urbanas e, consequentemente, à desi-gualdades soe tais e espaciai s. 0 Plano de Metas, concentrando os maio-res investimentos em infra-estrutura como fator germinador do desen-volvimento econômico, prior izou as condiçõs de produçã especif ica-mente capitalista s, ou sej a, aquelas ligadas diretamente a valorizaçãdo capital.

A reaçã da populaçã à sua exclusã do processo de moderniza-çã da economia brasileira explode com os quebra-quebras generalizadosem torno dos transportes coletivos de «assa . Ao lado dos vigorososprotestos contra as precáias condiçõs de transporte surgem formas deluta com maior ní el de organização. Os comitê democrá icos de bair-ros e as Uniões Femininas expressam uma tentativa do Partido Comunis tade atuar nos espaç s de moradia. Estas iniciativas nã contam commaior apoio do partido e se carac terizarã pela açã de um movimento

feminino que ganhou corpo no iníio da déada de 50 (16).A distâcia políica entre o Partido Comunista e essas formas

de organizaçã se reflete na prória forma como Leôcio Basbaum des-creve o fechamento das Uniõs Fe min inas. A açã de Jusce lino, fechandoao mesmo tempo o Clube da Lan terna, uma organizaçã conservadora liga-da aos mil ita res , e as Uniões Femin inas, é descrita por Basbaun (17),como positiva na medida em que impedia a organizaçã da direita e aca-bava com "uma Associaçã de Mulheres" sem grande expressã de massa .

A luta na esfera da reproduçã tinha um aspecto complementarpara o Partido Comunista . Sua ligaçã com o movimento sindical nãserviu para potencial izá lo e acabou por reproduzir uma relaçã com oEstado que estava presente no interior do movimento sind ical . Ou sej a,durante esse perído nã se desenvolveram ou se consolidaram formasautô omas de org anização. Apenas o movimento das mulheres se expandiua níel nacional com uma estrutura própria .

As reiv indicaçõs destes movimentos mantiveram-se no nível dasreivindicaçõs imediatas , nã se construindo uma maior identidade em

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torno de projetos políi cos que incorporasses a participaço dos tra-

balhadores no seu espaç de moradi a. Desta forma, a práica di en te -lista gerada nos bairros pela políica populista nã encontrou maiorreaçã do Partido Comu nista.

Apesar dos limites que podem ser identificados nas lutas urba-nas na déada de 50, é inegáel que a explosã metropolitana provocouuma explosã pol ítica. Os movimentos pelo congelamento dos alugué s,contra remoçõs e contra a carestia parecem ser uma , apenas uma, dasfaces do elevado grau de necessidades soci ais . A políica populistafoi a outra,face.

A políica ur bana, nesse período, era direcionada no sentido deviabilizaçã de uma estratéia de desenvolvimento que fazia das re-giõs metropolitanas o locas de efetivaçã da demanda do setor de bensde consumo dur ável . A cidade se modernizava e exc luía. E as revoltaspopulares naquele período, muito alé ou muito antes do Estado, tinhacomo alvo a exclusã e a segregação.

Essa dimensã da reaçã dos trabalhadores nã se dava enquantouma consciêcia voltada para si, atravé de um elemento externo , masexpressava a apreensã da prória vida cotidiana e a visibilidade daexpol iaçã urb ana.

Um quarto momento refere-se aos denominados "novos" movimentossoe tais, que surgirã a partir da déada de 70 . 0 urbano agora é ex-pansã incontrolada da peri feria, é verticalizaçã inconsequente; ésegregação, violêcia e impunidade. Has é, também, expressã de novoscaminhos democráicos, de direitos coletivos e de reconhecimento dacidadania.

V. Algumas Consideraçõs Finais:As velhas lutas urbanas e os novos «viientos sociais

Este estudo traz , em sua prória formulaçã, um trabalho de re-construçã analí ica no sent ido de contribuir nã só para o resgate denossa formaçã social e polí ica como, também, para o prório debate

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teóico sobre movimentos sociais urbanos.Na medida eu que o paradigma teóico de movimentos sociais ur-

banos se apresenta de uma forma ahis tórica , nao localizando claramenteos elementos de ruptura entre as velhas lutas urbanas e os novos movi-mentos, o resgate do processo de urbanizaçã pensado historicamente apartir da especificidade do conflito de classes no interior das cida-des , permite um aprofundamento de marcos conceituais e de uma melhorqualificaçã dos novos movimentos sociais na realidade polí ica brasi-leira.

Esta abordagem assegura que se pense o dilema entre a continui-

dade cora o passado e a const ruçã de um novo futuro, sempre presenteno esforç de carac terizar as contribuiçõs dos novos movimentos so-ciais urbanos . Ao inserir no debate teóico o saber acumulado sobre astransformaçõs no espaç urbano, assumimos um aspecto paradoxal, sa-lientado por Berman (18), de que na nossa vida urban a, em benefíio domoderno, precisamos preservar o velho e resistir ao novo.

A partir desta visão, a compreensã dos novos movimentos so-ciais urbanos assume uma nova complexidade e profundidade. Os velhos eos novos movimentos sociais urbanos assumem una dimensã de resistê-

cia sócio-espacial que melhor qualificam a luta atual pelo direito acidade.A estraté ia das classes dominantes se traduziu em processo de

apropriaçã e imposiçã de uma espac ial idade. A segregaçã socia l noespaç urbano expressa por um lado o processo de especializaçã espa-cial e por outro um processo de al ienaçã em relaçã à produçã do seuespaç de vida e à pró ria cid ade.

Os novos movimentos sociais têm, assi m, elementos de continui-dade coe o passado por expressarem també processos de resistêcia àformas de dominaçã só io-espactais na cida de. Mas expressam uma dinâmica políica nova quando procuram construir uaa identidade social en-quanto cid adãos, integrando as lutas pelos direitos colet ivos e indi-viduais.

O debate sobre a reforma urbana recupera esta dimensã » is am-pla do direi to à cidadania e à ci dade . Neste sent ido, este estudo seopõ à noçã de que modernidade e histó ia estã diamet ralmente opos-ta s. É mantendo vivo os laçs com o passado que melhor poderemos cora-

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preender as dimensõs modernas do 'grito da rua"

N O T A S

(í As referê cias bá icas na elaboraçã destes marcos conceituaissã: Manuel Castell, Hovi«ntos Sociales Urbanos, Ed.Siglo XXI,1974; Cid ade, Democracia e Socialismo, -Rio de Jane iro, Paz e Ter-ra, 1980Í Jordi Bor ja , Hovimentos Sociales Urban os, Buenos Aires,Ed.SIAP , 1975i Jean Loojkine, El Marxismo, el Estado ü la QuestionUrbana, Ed.Siglo XXI, México , 1979 .

(2) A respeito da relaçã entre espaç herdado e espaç projetado ver:LIPIEÎZ, Ala n. La capita l et sa espace. Paris: Maspero , 1977.

(3) Ver: LEFEBVRE, Hen ri. 0 Direito a Cida de. Sã Paulo: Documentos,1969.

(4) Ver: MOISÉS, J.A.. Classes Populares e Protesto Urbano. Sã Pau lo.Tese apresentada à Universidade de Sã Paulo , 1974.

(5) Ver: TOPALOV, Cristian . La Urbanizació Capitalista. Méico: Edi-torial Edicol, 1973, PP.133-147.

(6) Ver: SANTO S, Milton. Espaç e Sociedad e. Ed . Vozes, 1980, p.42 .

(7) Ver: LEFEBVRE, H., op. c it.

(8) COSTA, Jurandir Freire . Ordem Méica e Norma Familiar. Graal,1979).

(9) Ver: CERTEAU, Michel de . "Teoria e Méodo no Estudo das PráicasCotidi anas". In: Cotidiano , Cultura Popular e Planejamento Urban o.Sã Paulo: FAU/USP, 1985.

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(10> Ver: RAGO, Margareth. Do Cabaré ao Lar. A Utopia da Cidade Disci-plinar. Paz e terra, Í85.

(ií Ver: HOBSBAWN, Eric J .. 'Históia Operáia e Ideologia '. In: Mun-dos do Trabalha. Paz e Terra, 1987.

(12) A esse respeito ver: Henri LEFEBVRE. La Presencia a la Aus ênc ia.Contribuició a la Teoria de las Repre sentacions , Héxico . Fondode Cultura Econô ica, 1983.

(13) Ver: FREITAS, Môica Gondin de . A Históia da Revolta da Cach aça.IPPUR/UFRJ, 1988.

(14) Ver: ABREU, Mauríio de A. Evoluçã urbana do Rio de Jane iro.IPLAN/ZAHAR, Rio de Janeiro, 1987.

(15) Ver: BENCHIMOL, Jaime. Pereira Passos - Um Haussman Tropical. Te-se apresentada à COPPE/UFRJ, Rio de Janei ro, 1982.

(16) Ver: COELHO, Franklin D. Evoluçã Urbana e Hovimentos Sociais: Aslutas urbanas no Rio de Janeiro (1950-1970). Relatóio de Pesqui-sa BENNETT/CNPq, 1987.

(17) Ver: BASBAUN, Leôncio. Histó ia Sincera da Repú lica (1930 a1960). Sã Paulo: E d. Alfa-ôega.

(18) Ver: BERMAN, Marshall . Tudo que é sóido desmancha no ar . SãPaulo Companhia das Letras, 1987.

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U J T A P E L O E S P A ÇO U R B A N O :

A Q U E S T 2 0 " D A C O P A C A B A N A "

Elisabeth Dezouzart CardosoPesquisadora do Centro de Memoria da Eletricidade/ELEIROBRÄ

Lilian Fessler VazProfessora do IPPUR e FAU/UFRJ

Una Linha de Bondes para Copacabana: uaa questã polêica

Até fins do séulo XIX, Copacabana nã passava de um area l de-serto e distante da áea urbana do Rio de Janeiro, da qual estava se-parada por vá ios morros que tornavam difícil o acesso até lá. Ma s,em torno do ú timo quartel daquele século , alguns investidores já vol-tavam os olhos para Copacabana enquanto áea de expansã urban a. Paraisso, fazia-se necessá io comunicar a áea à malha urbana atravé de

uma linha de transporte cole tivo, o que significava levar o bonde docentro até essa praia. A histó ia do bairro de Copacabana tem iníiocos a malograda 'empresa da Copac abana ', primeira tentativa feita nes-se sentido para o local.

A " emp res ada Copacabana' foi o nome do empreendimento dos con-cessionáios da primeira linha de carris para a regiã - o Conde deLages e o Dr . Francisco Teixeira de Magalhãs - e do proprietáio deterras no local, Alexandre Wag ner . 0 objetivo era promover a criaçãde um novo bai rro , à semelhanç do que foi realizado pelo Barã de

Drummond, na mesma época, e que resul tou na formaçã do bairro de VilaIsabel.Desde 1872, o mordomo da casa imperial - Conde de Lages e o Dr .

Francisco Teixeira de Magalhãs pleiteavam o priviléio pelo perídode 5® anos e outras vantagens para estabelecer na costa de Copacabana"edificaçõs apropriadas para banhos e um novo arrabalde ligado aocentro da cidade por carris de ferro por traçã animada" (í).

CADERNOS PÜR/UFRJ , Rio de Janeiro, 3(í):9i -104, jan./abr,1989

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A 22 de dezembro de Í872 , o Conselho de Estado deu um parecer

favorá el ao pedido de Lages e Magalhães, desde que fossem respeitadosos direitos da Botanical Garden Rai1 Road, que monopolizava o lucrati-vo transporte de carris do centro para a zona sul da cidad e, até Bota-fogo, e alegava possuir o priviléio de operar nessa parte da cidade.Pouco depo is, a 11 de janeiro de 1873, uma Resoluçã Imperial estabe-leceu que essa companhia nã possuia o privilé io que opunha à conces-sã de Lages e Mag alhães .

Finalmente, a 4 de novembro de 1874, pelo decreto n? 5.785, oConde de Lages e o Dr . Magalhães receberam a concessã para implantar

a linha de carris para Copacabana , onde també deveriam estabeleceruma estacã balneá ia e diversas edif ica ções. A linha teria um traje-to complicado, desviando-se da linha da Botanical Garden , o que exigiaum grande investimento inicial. Os concessionários, nã conseguindoreunir capitais suficientes e sofrendo o combate da Botanical Garden,nã conseguiram dar iníio às obras, apesa r das duas prorrogaçõs deprazo que obtiv era ». Em 1876 associaram-se ao comerciante AlexandreWagner , que havia enviado à munic ipalidade um pedido de aceitaçã dediversas ruas que pretendia abrir em terras que havia adquirido no ar-rabalde de Copacabana.

A associaçã de Wagner com Lages e Hagalhãs possib ilitaria aoprimeiro a ocupação de seu loteamento e aos concessioná ios a conclu-sã de seu projeto de faze r, alé da linha, as construçõs necessárias , sem os embaraços de desapropri ações. Por outro lado, o empreen-dimento deveria ser rent ável, mesmo antes de atingir Copacaban a. Comoa linha de carris da 'empresa da Copacaba na' passava por váias áeasda cidade, cuja ocupaçã se acelerava - Glória , Cat ete , Flamengo e Bo-tafogo - seria poss ível obter rend imentos co« o transporte de passa-geiros nesses trechos, até entã exclusivos da Botanical Gar den . As-

sim, em 1878, os trilhos chegaram até o Largo do Machado , a partir deonde a linha nã ava nçou.

A nova linha de carris ficou pronta para oper ar, com todos osequipamen tos em funcionamento , depois de realizadas viagens experimen-tais e de anunciada publicamente a reduçã de 50X no preç das passa-gens cobradas pela Botanical Garden naquele trecho . Com tudo isso, ofato de o bonde , afinal , nã tra fegar, só poderia causar indignaçã

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geral. Realmente, depois de aprontada a linha, os concessionáios so-

licitaram ao governa a permissão para iniciar o tráego no trecho ini-cial (2), mas este pedido nunca foi apreciado, nem julgado, deferidoou rejei tado (3). Depois de dois anos à espera de despacho, o governose manifestou atravé do decreto n9 7673, de 2i de fevereiro de 1880,que declarou caduca a conce ssão, anulando portanto qualquer pretensãde levar adiante o projeto.

Era o fim da 'empresa da Copacabana", mas era també o começde uma acirrada polêica na imprensa - a questã da Copacabana. Acontrovésia sobre a linha de.carris para o distante deserto arenoso

estava nos jornais , envolvendo os responsáeis pelas empresas de Copa-cabana e do Jardim Botâ ico e ainda importantes figuras da sociedade eda po líti ca .

A malsinada linha havia nascido em meio a criticas nada suti s.Em 1876, o jornal A Reforma relatava as boas relaçõs do conde com afamíia imperial, o que lhe facil itou a obtençã da concessão. Alédisso , dizia que o mordomo de SS.AA . imperiais teria feito um arranjocom a Botanical Garden , que lhe pagaria mil contos de rés em troca do"dote principesco' (4).

Com a reprovaçã geral susci tada pela frustraçã da expectativado públic o, o assunto passou para a ordem do di a. Dizia-se que tudonã teria passado de um grande cambalacho, que os concessionáios nãpretenderam construir a linha, mas apenas negociar a concessã ; a re-cusa da empresa americana em acei tar o acordo é que forçu Lages e Ha-galhâ s a iniciar a cons trução. Gs jornais discutiam o assunto eraeditor iais, uns defendendo a empresa do Jardim Botânico, outro s, a deCopacabana, outros criticando o gov ern o. As acusaçõs eram claras,aludindo a arranjos escusos, negociatas e propinas; os acusados erasnomeados e, quando protegidos pela sua alta nobreza, apenas caricatu-

rados; o valor das propinas ofertadas ou recebidas era publicado comtodos os zeros.

Noticiava-se que a Botanical Garden teria pago alta soma para apublicaçã do decreto de caducidade da adversária:

"Diz-se que parte desses 700.000$ foi destinada, a tíulo dedoação, aos concessionáios e o res to dividido pelos advogados

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administrativos e mais despesas' (5).

Já a Revi sta Ilus tra da re fe ri a- se a 1000 con tos de réis - 'arolha de ou ro ' - (6).Um dos mais irritados ex-futuros usuários da li-nha até Copacabana era o Dr . Fi guei redo Maga lhães , proprie tário deterras e de uma casa de saúde no sau dáve l ar ra bal de . Revol tado com odesfech o do cas o, escr eveu uma série de arti gos na Gazeta de Not ícia s,em dezem bro de 1881 (7) . Sob o títul o 'A Mora lida de entre Nuvens e aPatifaria entré Linhas de Carris Urb ano s', o autor denunciava os cam-balachos e clamava pela honra do Es tad o, pela «oral do gove rno, pelo

ate ndi men to aos ans eio s da pop ula ção (que iam de enco ntro aos seuspróprios intere sses ). Sem poup ar a Bot ani cal Gar den , dizia que atéDeus temia ir a Co pac aba na, porq ue lá pode ria

"perder o seu latim cath olic o e apan har liçã de inglez pro-test ante, dada por schi smat icos , que negam a supremacia dos go-ve rn os , mas não ( ) admitem a tr ansub sta nc iação de home ns hon-rado s em mini stro s de pão az ya o '.

Enquanto os articuli stas da Gazeta de Notícias , do Glob o, doCru zei ro, do Jorna l do Comérci o disc utia m qual das empre sas teve seusdireitos feridos e se o governo agiu corret amente ao cassar a conces-são, a própri a imprensa era envol vida na ques tão, dep ois de publi cadaa not ícia que uma verb a de 1 con to de r éis por mês vinh a sen do 'despe-jada do Tesouro nas algibeiras d'um dos homens de bem d'0 Cruze iro'(8) . Pol ític o5, emp res ário s, min ist ros , a nobr eza e a imprensa eramenvolvidos na trama cada vez mais densa e escusa.

Não há no tíci as de inqu éri to s, re tr at ação ou en tr ega de cargospúbli cos , como poderia sup or -se , dado os altos postos que os envolvi-

dos ocu pav am. Como disse o Or . Figueired o Magalh ães, ao final, a ven-cedo ra es tend eu a mão à ve nc id a, tudo ficou como estava e o públi co. ..a ver navios.

Dos capitais do Sr . Wagner e da empresa Copacabana praticamentetudo se p er de u, à exceção de uma p.equena rua pa ra le la à da Lap a, aber-ta para dar pas sagem à nova li nha sem co rre r jun to à exi stente - ruaConde de Lages.

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Q Bonde chega a Copacabana

He5so havendo caducado desde 1880 a concessã de Lages e Maga-lhães, a Botanical Garden ainda nã estava segura de que seu supostoprivilégio nã seria aais desrespeit ado. A desconfianç da empresaera tal que forais firmados documentos em que os concessioná ios decla-ravas desistir definitivamente do empreendimen to, es troca de elevadaquantia para cada um (9).

Apesar diss o, tanto o Or . Magalhãs como Wagner tornariam a

apresentar projetos de implantaçã de linhas de carris para Copacaba-na, respondendo a editais do governo. Este, deve-se destacar, tomavaposições am bíguas, ora favorecendo a Botanica l Garden , ora nã tomandopart ido alg um.

A partir de 1881 o Ministro da Agricu ltura , Comécio e ObrasPúli cas contactou a Companhia Jardim Botâ ico (10), informando que ogoverno se dispunha a resolver sobre a concessã de novas linhas decarris na zona servida pela empresa. Mostrava ainda a necessidade darevisã de seu contrato que estava prestes a expirar (ií , e que paratal considerar ia, alé de diversas medi das, a construçã de um ramalpara Copa caba na. Mas a Companhia Jardim Botâico nã apresentou pro-posta alguma.

A 31 de dezembro de 1881 foi publicado um edital de concorrê-cia para a execução daquela linha . As condiçõs do edi tal eram quaseimpratiçáeis mas, aesmo assim, foram apresentadas trê propostas .Entre elas , uma do Or . Francisco Teixeira de Magalhãs e outra da Jar-dim Bot ânic o. Nenhuma das trê propostas foi acei ta, sendo que a daJardim Botâ ico consistia no simples prolongamento de sua linha paraaquela pra ia, ficando em desacordo com o traçdo e outras condiçõs doedital de concor rência, e por isso foi rej eita da. Em protesto, a com-panhia enviou uma carta ao Governo Imperial onde, mais uma vez, rei-vindicava o reconhecimento do seu priv ilégio.

Meses depois , o novo Ministro resolveu que a Jardim Botâicodeveria apresentar nã só uma proposta de extensã de suas linhas, mastambé» as bases de um novo contrato , pois o vigente se encerrar ia em1893 . 0 governo impunha a construçã da linha para. Copacabana atravé

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de um túnel no Leme como condição de renovaçã de cont ra to . A compa-nhia apresentou nova proposta que nã foi aceita.

A 29 de dezembro de Í882, o governo publicou outro edita l deconcorrê cia para a construçã de uma linha de carris para Copacabana .A Companhia Jardim Botâico nã enviou proposta alguma e recorreu con-tra o edi tal , mas duas outras propostas foram apresentadas, dentro dascondiçõs exigidas . A empresa vencedora, Duvivier 8 Compa nhia, era naverdade a firma comercial de Alexandre Hagner.

Duvivier 8 Ci a. assinaram contrato com a municipalidade, no dia28 de març de 1883, "para cons trução, uso e goz o, durante 30 an os, de

uma linha de carri s de ferro por traçã animada ligando o centro dacidade à praias da Saudade e de Copacabana" (12). Pelo contrato, alinha nã poderia correr paralela aos trilhos da Companhia Jardim Bo-tânico , salvo acordo, e os concessioná ios se obrigavam a fazer diver-sos melhoramentos na cidade e a manter, durante o prazo da concessãum estabelecimento balneáio em Copacabana.

Vinte dias antes de Duvivier S Companhia assinarem contrato como gove rno, Alexandre Hagner conseguiu obter do Governo Imperial exten-sa áea de terrenos de marinha adjacentes à suas propriedades em Co-pacabana, que passou, em parte, para as mãs do conde d'Eu. No mê deabri l, a Companhia Jardim Botâ ico entrou com recurso junto ao Conse-lho de Estado "contra o procedimento arbitráio do gover no", ou seja,contra a concessão outorgada à Duvivier 8 Companhia (13) . A CompanhiaJardim Botânico, diante das novas articulaçõs que Alexandre Hagnerprocurava junto ao Governo Imperial , expô toda a trama e mais uma vezreclamou o reconhecimento dos direitos da Compa nhia . Em 29 de setem-bro de 1883 , a concessã de Duvivier 8 Companhia foi considerada cadu-ca sob a alegaçã de que as plantas apresentadas estavam 'em desacordocom o contrato" (14).

Nos anos seguintes ainda foram apresentadas outras propostaspara a implantaçã de uma linha de car ris e até de uma linha féreapara Copacabana.

Por fim , a Companhia Jardim Botâ ico levou o bonde para o arra-balde: a implantaçã da 1 inha para

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Cop acabana foi uma das condiçõspara a renovaçã do seu cont rato, assinado a 30 de agosto de 1890 . 0cont rato estabelecia ainda a cons trução de outras linhas ou ramais e

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preçs de passagens. Foi somente a partir de entã que a negociaçãpassou a ser feita com o governo municipal e nâ mais com o governo daUnião.

A realidade da chegada do bonde trouxe novas perspectivas paraos proprietáios de terra em Copacabana, entre eles Alexandre Wagner.Este conseguiu interessar diversas pessoas, bancos e empresas no de-senvolvimento do futuro bairro e assim crio u a Empresa de ConstruçõsCivi s, a 26 de janeiro de 1891. No mesmo an o, antes mesmo de estarconstruí a a linha de car ri s, a Empresa de Cons truções Civis já apre-sentava à adminis traçã municipal seu primeiro projeto de arruamento

para Copacabana, bastante semelhante ao ant eri or, nas mesmas terrasque haviam pertencido a Alexandre Wagner, desde o Leme até a atual ruaSiqueira Campos (Í5). As duas empresas logo se aliaram para promover aocupaçã da re gi ão.

No dia 15 de «io de 1892, foi aberto o túe l da rua Real Gran-deza, e dois meses apó os bondes passaram a trafegar pelo areal até aestaçã situada no centro da praia , na esqu ina das ruas Barroso (Si-queira Camp os) e Nossa Senhora de Copac abana (16) . Logo foram cons-truí os dois raiais até as extremidades da praia: ui para a Igrejinha

(no deserto Arpoador), e outro para o Leme . 0 ramal da Igrejinha foiinaugurado em 1894 e o do Leme, em 1900.

Deve-se destacar que a decisã de estende r uma linha de carrispara a orla maríima e lá construir mais dois ramais nã agradou a to-dos os acionistas da Companhia Jardim Bot ânic o. Váios de seus dire-tores foram contráios a esta proposta . Prevalece ram, no entanto, osvotos calcados em sóidos interesses: o desenvolvimento da urbanizaçãde Copacabana . A implantaçã da linha de car ris levaria 'a civiliza-çã" a Copacaban a. Foram , no ent ant o, os esforços do capital imobi-liáio que levaram o bonde para o arrabalde.

A articulaçã de interesses que se conjugaram para promover aurbanizaçã da praia envolvia personal idades dos meios políico e em-presarial, da nobreza e proprietáios de ter ras . A Empresa de Cons-truçõs Civis reuni u, entre seus acio nist as, diversas personalidadesque representavam o capital comercial e o capita l bancário, alé demembros da administraçã públ ica, propri etários fundiá ios e mesmoacionistas da Ci a. Jardim Botâico (17).

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Na trama que se criou no conflito de interesses se envolverammuitos personagens importantes, cujos nomes ficaram depois gravados emplacas de ruas do bai rro.

A Questã da Copacabana* e a Foriaçâ dos Bairros da Nova Zona Sul

0 priv ilégio de zona, pelo qual a Companhia Jardim Botâ icotanto se empenhou, era muito mais que a garantia de ser a úica trans-

portadora na linha para Copacabana. Era, na realidade, o monopóio detodo o transporte coletivo por meio de carris de ferro para a zona sulda cidade e o controle decisivo sobre certas condiçõs de urbanizaçãdessa área . Alé do solo do local (areia) dificultar enormemente acirculaçã de veíulos sobre rodas, exigindo o uso de trilhos ou pavi-mentaçã di spendiosa para iniciar sua ocupação, o pró rio sí io da ci-dade favorecia aquele que cont rola sse certos acessos à região. 0 úi-co acesso à zona sul , partindo do cen tro, era atravé de estreita pas-sagem entre o mar e o maciço da Cario ca , onde surgira» os bairros da

Glória, Catete e do Flamengo. 0 controle dessa passagem garantia nãapenas o acesso ao aristocráico Botafogo, mas a toda a áea que sesegue , que hoje compreende os bairros do Jardi» Botânico, da Gáea eda Lagoa, por um lado, e de Copacabana, Leme, Ipanema e Leblon, porou tr o. Para a Companhia Jardi» Botânic o, o privi lé io de atuar nessazona, em part icular, significava també a capacidade de influir pode-rosamente no futuro processo de sua ocupaçã : ampliando sua clientel a,garantindo os preçs altos das passagens, uma vez que nã ter ia con-correntes, e rendas adiciona is, atravé da valorizaçã dos imóeis queeventualmente possuíse ou viesse a construir naqueles lugares.

Nã é pois sem sentido que, durante cerca de 20 anos, a Com-panhia Jardim Botâico tenha travado uma luta sem tréuas pelo monopólio da implantaçã das linhas de carr is para a zona sul carioca, muitoantes que essa regiã fosse viável è ren tável para transporte e lotea-men to. Assim, observa-se a precocidade da previsã do que seria umaverdadeira mina de our o, cuja riqueza despontaria algumas déadas mais

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ta rde, é de se supor que os contendores, ambos estrangeiros, já co-

nhecessem os processos de expansã urbana que se apoiam na préexis-têcia de uma linha de transporte coletivo mode rno. Nesse processo, osproprietá ios de terras podem obter maiores rendas e as empresas detransporte, maiores lucros.

Uma vez implantada a linha , era necessá io promover a ocupaçãda área , o que era o principal interesse nas aliançs proprietá iosfundiá ios/empresas de transporte. Nas vastas áeas despovoadas te-riam que ser criadas novas ruas, novas casas, novos bairros, enfi m.

A expectativa de construir em areais distantes e desertos cer-tamente nã poderia dar bom resultado na éoca da "empresa da Copaca-bana", mas a desanda por um novo espaç urbano surgiria brevemente .Inicia lmente a atraçã de Copacabana foi o fato de ser um local excep-cionalmente salubre nos arrabaldes de uma cidade infecta e empes tiada .Dizia-se que aquela praia era um "portentoso sanatório". Esta se-ria una condiçã importante poré nã suficiente para explicar suaocupação. Só essa qualidade deixaria Copacabana à margem do processogeral de urbanizaçã porque propic iaria o surgimento de uma estaçã deveraneio no loca l. No entan to, dois outros fatos importantes levaramà consol idação de Copacabana enquanto bai rro, intimamente integrado à

estrutura urbana: o crescimento acelerado da populaçã carioca e a di-ferenciaçã dessa populaçã ea classes cada vez mais d ist int as.

é preciso considerar que no fina l do Impé io e no iníio da Re-púlica uma classe social em ascençã - a burguesia - precisava afir-mar-se e revelar-se nã só como grupo social diferente e superior aosde renda menos eleva da, ias també como grupo socialmente diferente etã importante quanto a tradicional aristocracia , cujo poder começ vaa entrar em deca dência . A burguesia, para se firmar como expoente deuma nova composição social , precisava divulgar sua nova men tal idade,

seus há itos nov os, sua fortuna, sua modernida de. Para isso precisavaviver um modo de vida nov o, habitar uma arquitetura nova , num espaçurbano novo , moderno e diferenciado dos dem ais . Se todos passaram aser iguais perante a lei, era importante mostrar as diferenç s entrepessoas e clase s. A moda, a arquitetura, o modo de vida e o espaçurbano serviram para frisar essas d ife renças.

No centro da cidade , o novo espaç /sí bolo era a Avenida Cen-

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trai , eixo da emergente áea central de negócios . 0 bairro residen-

cial nov o, burguê e mode rno, sem o ranç colonia l do Rio Antig o, sei»o tradicionalismo do Engenho Velho, ou a decadente nobreza de Botafo-go , seria Copa caba na. E foi al i, na Avenida Atlântica , que expoentesda nova burgues ia construíam seus modernos palacetes e bangalôs, jána primeira déada do séulo XX.

Assim, Copacabana concretizava uma tendê cia que já se delinea-va: a ocupaçã da zona sul da cidade por camadas da populaçã de ren-das altas e médias . Da mesma forma como a cidade se organizava inter-namente diferenciando-se em áeas funcionais (central, industrial, re-

sidenc ial), a segregaçã das classes sociais no espaç urbano passou ase delinear com traçs mais fortes, embora no iníio do séulo aindafosse um fenôeno pouco acentuado.

A part icipação dos meios de transporte colet ivos nesse processojá foi estudada por Carlos Nelson P. dos Santos (18) e Maurí io Abreu(19). Eles mostraram como, no caso carioca, os bondes e os trens con-tribuí am para a estratif icação sóio-espacial da cidad e, embora estajá se esboçsse antes mesmo do surgimento desses meios de trans porte .A medida que uma linha de carri s era implantada em áeas já ocupadaspelas classes abastadas, privilegiando os moradores com o seu serviçe os proprietá ios com a valorizaçã dos seus imóeis, consolidava-seessa ocup ação, socialmente dif ere nci ada .

O estudo da questã 'da Copa cabana' revela um novo componenteno processo de diferenc iação social zona norte/zona sul do Rio de Ja-neiro : a contr ibuiçã nada suti l da Companhia Jardim Bot ânico. Refe-rimo-nos a dois aspectos da atuaçã dessa empresa: a questã das tari-fas , no plano sócio-econômico, e a questã da propaganda, no planoideolóico.-

O transporte para as áeas servidas pela Companhia Jardim Botâ

nico era relativamente mais caro do que o transporte para outrasáreas, em 1881, pagava-se 200 réis tanto para uma viagem do Centro aoCaju quanto do Centro ao Largo do Machado (20). Para os bairros si-tuados mais ao sul , inclusive Bota fogo, era necessáio pagar mais umases são. Isto significava que morar sais ao sul e trabalhar no centroimplicava em custos de transporte mais altos do que morar em boa parteda zona nor te. A decisã da escolha do lugar de moradia pelas classes

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trabalhadoras era certamente influenciada por essa c ons ide ração.

Nã é por outra razã que, nas negociaçõs para prorrogaçã daconcessã da Companhia Jardim Botâico e editais para propostas de li-nhas para Copacabana sempre constava a clásula da obrigatoriedade dareduçã dos p reç s das passagens dessa empresa. Pelo mesmo motivo a"empresa da Copacabana" prometia ser um benefí io para o pú lico,pois , instituía a concorrência , os preç s das passagens seriam redu-zid os. Por isso, també o desapontamento público , ea 1879/1880, quan-do a linha de Lages, Magalhãs e Wagner, do Centro ao Largo do Machadoficou pronta à espera da permissã para funcionar: todos sabiam que opreç das passagens nesse trecho baixaria de 200 para 100 r éis.

Um estudo mais aprofundado ou um estudo comparativo sobre aformaçã de outros bairros certamente traria mais luz à questã da di-ferenciaçã sócio-espacial da cidade . Nesse ponto nã se pode esque-cer o fator ideolóico, fundamental nessa ques tão. E, nesse aspecto,novamente detecta-se a participaçã da Companhia Jardia Botâ ico noprocesso, à medida que fazia uso da propaganda para promover sua novalinha para Copa cabana. Essa propa ganda, impressa nos cupons de passa-gen s, divulgava o novo bair ro, apoiando-se na sua salubridade . E cer-tos versos tinham endereç certo: passageiros que pudessea adquirir

terrenos e construir casa s.

'Quem quiser estar sob as asasda fortuna soberanacompre terrenos e casassomente em Copacabana "

'Representantes das elites endinheiradaselegante aoçiae do alto amor

"dandys" de fina luva e boa havanapara um "flirt" nã há ninho melhordo que Copacabana".

'Investidores (proprietáios e capitalistas)aproveitai melhor a vossa ganaoh que mina, lançi as vistas

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sobre Copacabana'.

Nesse senti do, visava» os »ssos inves tidores que a Empresa deConstruções Civis que , em 1893, anunciava nos jornais :

'Capital Reprodutivo (sic) - o melhor emprego de capit al é acompra de terrenos no futuroso bairro de Copacabana , pelos pre-çs porque ainda os vende a Empresa de Construçõs Civis" (21).

É drfícil avaliar quanto, de fa to, essa propaganda influiu, se-lecionando pela renda seus futuros moradore s. Mas é fáil perceberque as tarifas mais altas e o chamamento dos ricos foram dois fatoresdeliberadamente cri ados pelas empre sas, que tenderiam a excluir do no-vo bairro e proximidades aqueles que nã pertencessem à camadas méiae alta da popu lação.

Os recursos da propaganda criados pela Companhia Jardim Botâi-co viriam a benef iciar o cap ita l imobiliáio em formação, no caso aEmpresa de Construçõs Civi s. As articulaçõs destas empresas e desuas precursoras e sucessora s, constituem u» dos exemplos »is marcan-tes da atuaçã do capi tal urbano no Rio de Janeiro e da sua conse-

quêcia sobre os padrões de urbanizaçã da c idade.

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N O T A S

(1) Veja-se documentos do Conselho de Estado do Ministéio do Império . Lata 390, pasta 11, IHGB.

(2) Foi comum as empresas receberem permissã para circular no pri-meiro trecho da linha; a prória empresa Botanical Garden, antesde levar seus trilhos até o Jardim Botânico, operou no traje toentre o Centro e o Largo do Mach ado.

(3) Jornal do Comercio, 30 de novembro de 1881. Carta do Dr . Fran-cisco Teixeira de M aga lhães.

(4) A Reforma, 28 de janeiro de 1 876.

(5) Gazeta de Notícias, n2 329, 27 de novembro de 1881 .

(6) Revista Illustrada, n&s 274 a 278, dezembro de 1881 .

(7) Gazeta de Notícias , n?s 335 a 342, 1881.

(8) Revista Illustrada, n^s 277 a 278, dezembro de 1881 .

(9) A Questã de Privilé io - Recurso para o Conselho de Estado In-terposto pela Ci a. Brasileira Ferro Carril Jardim Botâico contrao Procedimento Arbitráio do Govern o. In Relatóio da Cia . Loco-motora, 1873. Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeir o.

(10) Desde abril de 1881 a Botanical Garden Rail Road nacional izou-se,passando a ser chamada Companhia Ferro Carri l do Jardiei Bot ânico.Mais tarde absorvida pela Light.

(11) Uma vez extin to o prazo de sua concessão, em 9 de outubro de1893, todos os seus bens e equipamentos passariam para o Estado.

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(Í2) BERG ER, Paulo e Eneida - Históia dos Subúbios - Copacabana.

Prefeitura do Distrito Federal, s/d p. 5 5.

(13) Idem nota (?).

(14) DUNLOP, Charles J. - Apontamentos para a Históia dos Bondes noRio de Janeiro. Vo l. II A Companhia Ferro Carril Jardim Botânic o. Ed. Gráica Laemmert Ltda., R.J., s/d .

(15) A Empresa de Construçõs Civis (leia-se A . Wagner e seus genros eherdeiros T . Duvivier e 0 . Simon ) era proprietáia de mais da me-tade da áea dos bairros de Copacabana e Lem e, possuindo terrastambé de outro extremo da praia (Arpoador). Atualmente os doisbairros ocupam áea de 7, 67km

2

.

(lá 0 tráego atravé do Túel Velho foi exclusivo da Companhia doJardim Botânico, até pouco antes da abertura do Túel Novo, em1706.

(17) CARDOSO, Elizabeth D . - 0 Capital Imobiliáio e a Expansã da Ha-

lha Urbana do Rio de Janeiro: Copacabana e Gra jaú. H.S c. Geo-grafia/UFRJ, 1986 p. 70.

(18) SANT OS, Carlos Nelson P . dos - Transportes de Massa - Condiciona-dores ou Condicionados? in Revista de Administrçâ Municipal144, set/out 1977, ed . especial .

(19) ABREU, Maurí io de A. e Brons tein, Olga - Políicas Públicas,Estrutura Urbana e Distr ibuiçã de Populaçã de Baixa Rendana áea Metropolitana do Rio de Janeiro. R.J., ConvêioIBAM/CNPU/IDRC, Í978, inédito.

(20) Gazeta de Not ícias, n° 329, 27 de novembro de 1881.

(2í Jornal do Comercio , 25 de novembro de 1893.

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A " I R R E G U L A R I D A D E " D A M O R A D I A D O S

P O B R E S

Eduardo Guimarãs de CarvalhoLuciana Corrê do Lago

Pesquisadores do IPPUR/UFRJ

Introduçã

Estudos sobre o parcelamento do solo na periferia das cidadesbrasileiras identificais esta produço como irregular, es funçã da de-sobediê cia generalizada à posturas municipais, que impõm a instala-çã de infra-estrutura - água, esgoto , aeio-f io, arborização, calç-mento . Tal procedimento permitiria aos loteadores oferecer lotes nãurbanizados, e acess íeis à populaçã pobre, elementos que identificamos loteamentos populares.

No curso de uma investigaçã (1) passamos a questionar a idéade que a irregularidade explicaria esta acessib ilidade , sobretudo emfunçã da signif ica tiva produçã "regular" de lot es, que nã vinhasendo considerada nas anáises (2). Neste trabalho buscamos reinter-pretar esta produ ção, considerando tanto os loteamentos regulares comoirregulares, exorcizando assim o vié que marca os estudos sobre otem a. Para fazer isto detemo-nos na foram pela qual esta mercadoriafoi produzida: uma produçã por etapas.

1. A Zona Oeste do Rio de Janeiro

A Zona Oeste do Rio de Janeiro constitue -se em um intrigantedesafio - tanto para planejadores como para pesqui sadores . Ela com-

CADERNOS PUR/UFRJ, Rio de Janeiro , 3(1):105-11Ó, jan./abr.1989

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preende - grosso modo - as regiõs de Bangu - incluindo-se a áea deRealengo-, Campo Grande - considerado em conjunto com Guaratiba- eSanta Cruz , e está ligada ao centro da cidade por duas vias princi-pais: a Estrada de Ferro Central do Brasil e Avenida Bras il, A distâ-cia ao cent ro varia de 35 a 80 quilômetros. Sua ocupaçã se dá de for-ma mais intensa a partir da déada de 50 , quando a região, até entãmarcada pelo uso 'rural' da terra, se transforma em um dos vetores deexpansã da malha urbana da cidade, juntamente com a Baixada Fluminen-se, esta. útima fora dos limites do municíio do Rio de Jane iro. Nessemomento , grande parte dessas áeas sã introduzidas no mercado imobi-

liáio da cidade, atravé da articulaçã de dois processos de produçãdo espaç:

a . Produçã de lotes urbanos, dirigida à populaçã de baixarenda.

b . Auto-produçã da morad ia.Trata-se em primeiro lugar de uma regiã reconhecidamente po-

bre: 57,422 da populaçã residente (estimada em 1.200.000 habitantes,pelo censo de 1980) ganha até 2 salá ios mí imos (FASE 1986). Em se-gundo lugar, tanto a produçã acadê ica como o Movimento de Regulari-zaçã de Loteamentos da Zona Oeste indicam que a ocupaçã destas ter-ras foi feita fora da lei, atravé de loteamentos irregulares (3). Aproduçã de casas e unidades em conjuntos habitac ionais , atravé dosistema financeiro da hab itação, que se inicia na déada de 60 , repre-senta apenas 0,04X face à produçã tot al de l otes .

'...as imensas cháaras foram retalhadas em loteamentos popula-re s, na sua grande maioria irregulares e clandestinos."(FASE1986, pg.5).

'Nesta perifer ia, notavelmente distante dos espaçs centrais e ,dos mercados de traba lho, localiza-se a maior parte dos lotea-mentos populares que se encontram em situaçã irregular." (COU-TINHO M., 1985, pg 39) .

'Outro ponto central da literatura diz respeito ao estatuto ju-ríico dos loteamentos, tidos em sua grande maioria como clan-

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destinos por nã cumprirei principalmente as exigêcias de in-

fra-estrutura e serviçs urbanos", (grifo da autora) (VALADARESL . Í983 , pg 49 ).

2 . A Irregularidade e os Loteamentos

Os dados referentes ao perído 1936 a 1986 indicam que a produ-çã de loteamentos na Zona Oeste do Rio de Janeiro é signif icativamen-te regular (61.352 do total de 727 loteamentos ). Os irregulares repre-sentam 17,42 e os clandest inos 21,12 da pro dução. Or a, esta primeiraabordagem nos chamou atençã para o fato de que havia uma presençmarcante de loteamentos regu lares, que nã estavam sendo levados emconsidera ção. Passamos assim a questionar a acessibi lidade de formamais abrangente: qual a relaçã entre moradores/compradores pobr es, eos loteamentos - regulares e irregulares?

Dividimos a exposiçã em trê part es. Vimos em primeiro lugaras caracterít icas fundiáias (propriedade da terra) de cada uma das

áeas que compõm a Zona Oeste - a produçã no espaço. Em segundo lu-gar anali samos a produçã de loteamentos na Zona Oeste , na perspect ivatempo ral, ou seja como o parcelamento se desenvolveu no perído 1936 a1986, incorporando entã as diferenç s espaciais anali sadas . Finalmen-te caracterizamos a produçã segundo os diferentes tipos de loteado-res , atravé do tempo e do espaço.

3 . A Produçã no Espaç

A históia da propriedade nas trê áeas que compõm a ZonaOeste (Bangu, Campo Grande e Santa Cruz) é muito dife renciada.

Bangu se organiza desde o séulo XIX ao redor da instalaçã daCi a. Progresso Industrial do Brasil. A fárica adquiriu quatro grandes

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fazendas (Reti ro, Guand u, Viegas e Bangu), ao que tudo indica, por

duas razoes principa is. Primeiramente ela devia ter acesso fáil aosmananciais de água , sua fonte de ene rgia. Em segundo lugar, estas pro-priedades eram as garantias reais oferecidas nos emprétimos bancáios(hipoteca). Todas as terras localizadas na áea de Bangu foram em al-gum momento propr iedade da fábrica, e ingressaram no mercado atravéde vendas feitas por ela.

As terras de Santa Cruz, antes pertencentes à Coroa, tornaram-se propriedade da Un ião, constituindo a Fazenda Naci onal . A maior par-te das terras é propr iedade púl ica. 0 acesso for« l-legal a estas

terras deu-se atravé de aforamentos e arrendamentos, para uso sobre-tudo agrícol a. Uma pequena parte foi vendida a particulares. Esta par-ticu laridade gerou uma prá ica de ocupaçã de f ato . Tais ocupaçõs fo-ram també usuais para fins de loteamentos clandestinos (grilagem deterras).

Campo Grande compunha-se de fazendas e cháaras e, a partir de1930, estas terras ingressam no mercado imobiliá io, quando decai aproduçã de cítri cos . 0 parce lamento do solo corresponde ao processode venda e desmembramen to destas terras: primeiro em porçõs maiores(síios, glebas) e depois em loteamentos.

Relacionando-se as áeas à situaçã jurí ica dos loteamentos ,obté-se o seguinte quadro:

78X dos loteamentos de Bangu é regular;58X dos loteamentos de Campo Grande é regular;2 7 7 . dos loteamentos de Santa Cruz é reg ular.

Esta diferenciaçã deve ser atribuía à situaçã fundiáia des-cr it a. Em Bangu há um maior rigor no parce lamento e alienaçã de ter-ras em funçã de todas per tencerem a um úico pr opr ietário . A intensi-dade de negociações em Campo Grande, envolvendo nú ero muito maior de

propriet ários , explica a maior ocorrêcia de "irregula ridades". Final-mente o fato de Santa Cruz pertencer à Uniã (o que dificulta a vendalegal de ter ras) explica a prá ica de ocupaçã e o alto ídice de"irregularidades". A situaçã fundiáia t odavia, nã explica a relaçãentre os loteamentos e seus moradores: extensas áeas de Bangu foramregu larmente ocupadas por extratos baixos da popul ação.

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4 . A Produçã no Tempo

Para efeito de anáise agrupamos a produçã por déadas (4).Observa-se no perído:a . que 402 da produçã tota l de lotes se dá na déada de 50 .

Esta é a ú ica dé ada era que a produçã irregular é maiorque a regula r. A irregularidade decresce a partir de 50,tendo praticamente desaparecido em 80.

b . que há um aumento do núero méio de lotes por loteamento

até 50 - quando alcanç 50Í lotes por loteamento - decres-cendo a partir daí, chegando a 215 lotes por loteamento em8 0

c. que a áea méia dos lotes atinge 450 ma

na déada de 40, edescresce a partir de en tão, tendo hoje 322 m

a

.d . Muitos loteamentos sã parcelamentos de lotes maiores produ-

zidos anter iormente. Oos cinquenta e oito loteamentos produ-zidos nas déadas de 30 e 40, vinte sofreram novo parcela-mento nas déadas seguinte s. Os loteamentos de 70 e 80, porsua vez, sã em grande parte modif icaçõs de projetos ante-riores:

70: 182 da produçã da dé ada é modificaçã de loteamentosanteriores.

80: 572 da produçã da déada é modificaçã de loteamentosanter iores.

A crescente regularidade da produçã vai assim caracterizar aárea. Qual o significado deste processo?

5 . A Produçã Segundo os Agentes

Inicialmente verificamos se a regularidade/irregularidade dosloteamentos poderia ser atribuí a aos loteadores, classificando-os emquatro grupos (5), segundo a maneira pela qual se apresentam no merca-

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do imobil iá io, ou seja , sua maior ou menor especiali zaçã em relaçãao ramo de negócios imobi liá ios. Esta classi ficaçã (part iculares,imobiliá ia, empresas de outros ramos , sistema financeiro da habita-ção) , todavia, nã se revelou muito expl icat iva, uma vez que a produ-çã regular/ irregular aparecia indistinta e equilibradamente distri-buía entre os diversos tipos , excetuando-se o sistema financeiro dahab ita ção. Observando entã a estraté ia de atuaçã dos loteadores,atravé de entrevistas, pudemos agrupálos diferentemente (6):

a. Loteadores por etapas;b. Empresas construtoras.

5.1 Loteadores por Etapas

Os loteadores por etapas nã estocam terr as. Os lucros obtidosnum loteamento permitem o emprendimento subseq uente . Sua atuaçã obe-dece a uma séie consecutiva de etap as, que possibilita a oferta des-tes lotes à camadas baixas da populaçã:

a. Aquisiçã da propr iedade, normalmente atravé de promessa decompra e venda.b. Abertura de ruas e venda dos primeiros lotes atravé de con-

tratos parti culares (à vezes aprovaçã do projeto nestaetapa).

c. Com estas venda s, obtençã de recursos para prosseguir asobras (galeria s, meio-f io, arborização). Quando o loteadorobtiver a terra atravé de promessa de compra e venda , aquitaçã das prestaçõs e escritura definit iva poderá serfeita nesta f ase. É evidente que nem sempre o é, e que mui-tos permanecem apenas com a promess a.

d . Prosseguimento das vendas e aprovaçã do projeto (caso nã atenha).

e . Obtençã do 'aceit e' quando entã as obras sã consideradasconcluí as pela administraçã municipal (ou nã ob tém, per-manecendo o loteamento irregular).

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Os loteadores por etapas, «smo atuando de forma irregular ou

clandestina, frequentemente obedecem à posturas municipais relativasao desenho (tamanho de lotes, tes tadas, largura de ruas e calçadas ,etc) , visando uma possível regula riz ação. Eles sã agentes de um pro-cesso descapitalizado (7), onde a situaçã de i rregularidade , ao menosno iníio do processo, é a condiçã para o empreendimento. A regulari-zaçã do loteamento (quitaçã das prestaçõs para a compra do terrenoe conclusã das obras) vai depender do capital levantado com a vendados lotes.

Observa-se que a práica por etapas é muito mais ampla na cida-

de , e que se dá també entre alguns loteadores que estocara ter ras , masexecutam o loteamento "em etapas' , à maneira tíica dos loteadores poretapas.

Quanto à ven da, tudo indica que a prá ica era de financiaratravé de pres tações pré-fi xadas. Poster iormente foi-se adotando acorreçã mo ne tári a.

5.2 . Empresas Construtoras

Os loteadores que denominamos empresas construtoras tê as se-guintes características bá icas

1. Eles estocam terras.2. Fazem geralmente mais do que um empreendimento por vez.3 . A produçã é nitidamente regular (lotes e casas sã vendidos

atendendo todas as exigêcias legais).4 . Os lotes sã oferecidos frequentemente com casas pront as,

financiadas pela Caixa Econômica, contando os loteadores comrecursos próprios para o financiamento dos lot es.

Na medida em que os loteadores por etapas estabelecem o preçdos lotes pela pura "intu içã", as construtoras elaboram cáculos ba-seados na reposiçã do cap ital investido, antecipando com precisãseus lucros, e objetivando recursos para novo investimento. A diferen-ç entre os dois grupos está no fato de que os primeiros atuam intui-

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tivamente: um novo loteamento poderá ocorrer ou ni o. Os segundos, jáestimam em seus cáculos 'capitali stas' um subsequente empreendimento .As diferençs nio param aí, rebatendo-se na forma de pagamento dos lo-te s. Os prime iros, "intuitivos", estabelecem prestaçõs pré-fixadas.Os segundos, "capi talis tas", usam o sistema de prestaçõs reajustáveis , segundo a variaçã das OTNs/ORT Ns.

Os loteadores por etapas, responsá eis por aproximadamente 60 Xda produçã total de lotes, desaparecem do cená io na presente décad a.Mantê-se em 80 no mercado apenas empresas construtoras - duas dasquais co rg ra nd es estoques de terra - e a CEHAB (responsáel, nos ú-

timos seis anos, por um terç dos lotes produzidos).

6 . 0 Enobrecimento da Zona Oeste: Observaçõs Finais

A produçã de lotes pode ser remet ida a um eixo , situando-se aproduçã por etapas num extremo, e noutro a produçã das construtoras.Uma sé ie de caracterí ticas de uma forma pode» se combinar com a deoutr a, aproximando os loteamentos para um ou outro extremo do eixo.Este e ixo é temporal , e a produçã inicialmente por etapas passa a sertoda. ela de construtoras.

A produção, hoje, tornou-se regular: com o fim da produçã poretapas a possibilidade do loteamento permanecer se» infra-estrutura émíni ma . Ao cont rário, a comercial izaçã das construtoras geralmente seinicia após o témino das obr as. Como os financiamentos sã corrigi-dos, os loteamentos tornam-se inacessí eis à populaçã de baixa renda(8). Os loteamentos da Zona Oeste hoje sã regulares, oferecidos a uma

clientela de classe média . O produto inclui geralmente casa pronta ,com financiamento pela Caixa Econ ômica . Observa-se , consequentemente ,uma enorme diminuiçã na produção, que representa hoje 1/5 daquela de1950/59.

Aqueles loteadores que sairá» do mercado , atribuem as modifica-çõs ocorridas à legislaçã (municipal, estadua l e federal), declaran-do alguns que esta exige a conclusã das obras antes do iníio das

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vendas - o que nã é correto: tanto a lei federal(6766) , como a legis-laçã munic ipa l, estipulara prazos , bastante flexíeis na prática, paraexecuçã das obr as . Indicam també que com a inflaçã do período, tor-nou-se essencial o uso da correçã monetá ia das pre stações. Segundoeles, estes dois fatores inviabilizam o investimento: primeiro por nãdisporem de capital inicial para execuçã de todas as obras exig idas,segundo, porque a inflaçã inviabiliza a oferta dos lotes à camadasde baixa renda , cujos saláios nã acompanham a correçã monetá ia dasprestações.

Os fenôenos ocorridos na zona oeste, entretan to, devem sercompreendidos a partir de uma perspectiva mais ampl a. 0 enobrecimentopode ser pensado em funçã de dois fatores, nã excludentes . Primei-ramente deve-se lembrar que houve um grande achatamento salarial noperído o bser vado . Por outro lado houve uma valorizaçã (?) das terrasda reg ião, causada princ ipalmente por uma signif icativa concentraçãde terras loteáeis nas mãs de duas empresas (10) . Esta concentraçãda propriedade da terra toma sua rea l dimensã no processo de valori-zaçã do solo , com a ida de indútrias para a área, e com a consequen-te implantaçã de infra estrutura (estradas, transporte, luz, água) .

Estes dois fatores somam-se na produçã deste enobrec imento da ZonaOeste.

Podemos finalmente concluir que a regularidade/irregularidadeda produçã de loteamentos deve ser remetida ao quadro mais amplo deuma produçã por etapas que , acredi tamos, caracterizou a ocupaçã daZona Oe st e. Esta produção parte sempre de uma situaçã irregular, pre-tendendo no percurso das etapas regular izar-se, o que torna os lotesmais baratos do que aqueles que seguem o figurino desde o in ício . Istoexpl ica os dois ver sos desta produção. Do lado do loteador o lote ébarato - seja porque a situaçã de propriedade nã está clara, sejaporque ele a comprou em prestações. Do lado do comprador, estes lotessã mais bara tos, uma vez que ganham valor de mercado menor que aque-les plenamente regulares e que permitem uma escritura defin itiva . Poristo, uma séie de lotes, hoje regulares, forara comercializados paraessa populaçã porque foram feitos POR E TAPAS.

0 loteamento irregular nã passa de um empreendimento feito emetapas que nã consegue cumprir todas ela s, e chegar à regularidade -

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com todas as obras realizadas, e com a docu me nta do em ordem.

N O T A S

(í) 0 presente trabalho está baseado em pesquisa realizada pelo Insti-tuto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regiona l IPPUR/UFRJ emconvê io com a FIN EP, cujo relató io final intitula-se: 'Produçã

imobiliáia e uso do solo urbano: estudo das relaçõs entre capi-tal imobiliáio e propriedade fundiáia na estruturaçã da cidadedo Rio de Jane iro' . Essa pesquisa foi coordenada pelo Prof. LuizCesar de Queiroz Ribei ro, e os autores fizeram parte do corpo depesquisadores.

(2) Regular/irregular: categorias usadas pela administraçã municipa l.

(3) Loteamento regular: sã considerados regulares os loteamentos cujoprojeto é aprovado (PAL) pela autoridade m unicip al, e que cumprin-do a legislação, obtêm, no prazo legal (prorrogáel) o acei te dasobras (arruamento, galeria de áuas e esgoto, meio-fio, arboriza-çã etc .) alé de ter regularizado a situaçã de propri edade.Existem todavia loteamentos com o aceite dado pela administraçã e

• que de fato nã atendem todos os requisitos legais . Só um trabalhode campo mais detalhado poderá dimensionar estes casos.Loteamentos ir regulares: sã aqueles cujo projeto é aprovado pelaautoridade municipal, e que nã obtê o aceite das obras.Loteamentos clandestinos: sã aqueles que nã tê projeto aprovado

pela autoridade munic ipa l. Com o advento da lei 6766/79, o descum-primento das exigê cias legais (aprovaçã do loteamento mediantecomprovaçã de que o loteador atendeu à exigêcias urbaní ticascom a respect iva transcriçã no regis tro de imóeis) passou a sercrime, imputando-se pena ao lot'eador.

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(4) i. Déada de 30 (1936/1939)2. Déada de 40 (Í40/1949)3. Déada de 50 (1950/Í59)4. Déada de 60 Í960/Í69)5. Déada de 70 (Í70/Í79)6. Déada de 80 (ÍB0/Í86)

Chamamos atençã para o fato da produçã na déada de 30 e 80 nãcorresponderem a 10 anos. No primeiro caso, em funçã do registrode PAL's (projetos aprovados de loteamento) só ter sido feito me-

todicamente a partir de 1936.

(5) Estes dados foram extraí os das plantas que compõm o arquivo doDepartamento de Edificaçõs da Pre feit ura.

(6) CARVALHO, Eduardo G . e LAGO, Luciana Correa do. "A produçã de lo-teamentos na Zona Oeste do Rio de Janeiro' , comunicaçã apresenta-da ao II Encontro Nacional da ANPU R, 1987, Teresópolis.

(7) Ver RIBEIRO, L.C.Q. 'Produçã imobiliáia e uso do solo urbano:estudo das relaçõs entre capi tal imobiliáio e propriedade fun-diáia na estruturaçã da cidade do Rio de Janeiro", IPPUR-FINEP.

(8 Antes os lotes eram oferec idos a quem ganhava até trê salá iosmínimos, hoje a prestaçã equivale a trê saláios mínimos, afir-mam váios loteadores.

(9) Alguns loteadores imputam como uma das causas da valo rização, asrestriçõs legais contidas no plano de zoneamen to. Segundo elesexistem hoje poucas áeas destinadas a loteamentos populares, ondeo lote míimo (125 m

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) é per mit ido . Entretanto comparando-se asáeas loteadas no perído pesquisado (36/86) com a áea urbanizável definida pelos Planos de Estru turaçã Urbana (PEU) para a re-gião, nã parece have r e scassez 'legal' de terras:

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RABANGUCAMPO GRANDESANTA CRUZ

AREA LOTEADA m

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AREA UR BA NI ZM L mB

135149223420770112366052

19600002920000012170000

(10) Uma sendo proprietáia de praticamente todas as terras de Bangu ,e outra, afirmando ter em estoque equivalente a 10 anos de suaproduçã atual - estimando assim um estoque aproximado de 10.000lotes, o que signif ica 102 da áea urbanizável de Campo Grande(PEU), - concentra grande parte das terras de Campo Grande, ondeatua privilegiadamente.

COUTINHO, Mare ia. "Regularizacio de loteamentos. 0 começ de uma expe-riêcia no Rio de Jane iro". In: 4 Estudos. Rio de Janeiro: Iplan

Rio (Instituto de Planejamento M unicipal). 1 985.

FASE. 'Situando a questã dos loteamentos" . Proposta 29, Rio de Janei-ro, 1986.

S/iNTOS, Carlos Nelson F . dos. 'Loteamentos na Periferia Metropolita-na" . In: Revista de Adm in ist ra do Municip al. Jan./Mar. . Rio de Ja-neiro: IBAM, 1985.

VALAD ARES, Licia do Prado. 'Estudos recentes sobre a habitaço noBrasil". In: Debates Urbanos 3 . Rio de Janeiro: Zahar, 1983.

B I B L I O G R A F I A

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S U M A R I O D O S N ÚM E R O S A N T E R I O R E S

CADERNOS PUR/UFR J Rio de Janeiro v.i n2 í jan./abr .í86

Polí ica migratória recente no Brasi l. Notas para uma ava liação.Carlos B. Vai ner.

Notas sobre a renda da terra urba na. Luiz Cesar de Queiroz Ri-beiro.

Estru turaçã intra-urbana e desenvolvimento industrial capitalis -ta . Mart im Oscar Smolka .

0 fato metropolitano - enigma e pode r. Ana Clara Torres Ribeiro.

Conflito social e produçã do espaço. Carlos Enrique Gua nziroli.

CADERNOS PUR/UF RJ Rio de Janeiro v.2 n2 1 jan./abr.1987

Trabalho, cap ita l e espaç urbano- notas sobre o caso brasi leiro .Rosáia Piquet.

Observaçõs sobre a questã reg ional. Hermes M. Tava res.

0 capi tal incorporador e seus movimentos de val ori zação. MartimOscar Smolka.

Qualidade dos serviç s pú licos prestados aos favelados: opiniãdos moradores do Pere irão, Morro do Urubu e Vila Cati ri. AnaElena Behrens.

Algumas notas sobre Topalov. Pedro Abramo Campo s.

Por que é necessário o estudo do Norte Flu min ens e. Carlos Eduar-do Rebel lo de Medonça.

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C o n t r i b u i ço e s

Os artigos sã submetidos à apresentaçã do Conselho Editorial,a quem caberá a decisã final sobre a oportunidade de publicação.

0 Conselho Editorial comunica aos autores a decisã sobre a pu-bl ica ção, mas nã se compromete a devolver origina is nã pub licado s.A decisã resulta de uma seleçã entre os textos submet idos à rev ista,que leva em conta o espaç disponível e a oportunidade do t ema .

Cada autor recebe dois exemplares do núero em que for publica-do seu trab alho . Os originais devem ser encaminhados à Comissã deDocumentaçã e Divulgaçã do IPPUR.

Normas para apresentaçã'-

. Datilografia em espaç duplo;

. Núero de páinas nã excedentes a 30;

. Notas e bibliografia no final dos artigos;

. Citações e referê cias completa s (ABNT-66).

Todo o material poderá ser normalizado de acordo com os padrõ sda revista.

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C A D E R N O S P I J RRevista do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional -IPPUR/UFRJ ISSN 0103-1988Préio da Reitoria - Sala 541 Cidade UniversitáiaIlha do Fundã21.910 - Rio de Janeiro - RJ

C O M I S S ÃO E D I T O R I A LAdauto Lúio CardosoAna Clara Torres RibeiroHermes Magalhãs Tavares

C O O R D E N A ÇS O D E D O C U M E N T A C S O E D I V U L G A ÇÃOAna Clara Torres Ribeiro (Coordenadora)Claúia Tavares RibeiroMaria Helena da Silva OliveiraPatríia H . Miguez Glasser (Secretáia)Paula Maria Abrantes Cotta de Mello

Pedro Abramo Campos

D I G I T A ÇS O E D I A G R A M A C S OPatríia Haria Miguez Glasser

R E M I S S OEd. da Universidade Federal do Rio de Janeiro