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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS Agravo de Instrumento Cv Nº 1.0024.12.135523-4/001 <CABBCABCCBBACADBCAADDCBAACBCABCCBABAADDADA AAD> EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO POPULAR – TUTELA ANTECIPADA – OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER – ARTIGO 461 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – RELEVÂNCIA DA FUNDAMENTAÇÃO E JUSTIFICADO RECEIO DE INEFICÁCIA DO PROVIMENTO FINAL – REQUISITOS DEMONSTRADOS – APREENSÃO DE PERTENCES PESSOAIS NECESSÁRIOS À SOBREVIVÊNCIA DIGNA DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA MORALIDADE – DECISÃO REFORMADA. 1. Os requisitos autorizadores do deferimento da tutela específica de urgência em ação cujo objeto seja o cumprimento de obrigação de fazer e de não fazer são a relevância do fundamento e o justificado receio de ineficácia do provimento final, na forma do artigo 461 do Código de Processo Civil, pressupostos esses menos rigorosos do que os exigidos pelo artigo 273 do CPC. 2. Verificando-se do conjunto probatório do instrumento que os agentes dos requeridos afrontaram preceitos éticos em suas condutas de fiscalização, com a apreensão de pertences essenciais para a sobrevivência, com o mínimo de dignidade, da população em situação de rua, e sem a lavratura do correspondente auto, incorrendo em imoralidade, deve ser reformada a decisão que indeferiu a antecipação de tutela nos autos da ação popular. 3. Recurso provido. AGRAVO DE INSTRUMENTO CV Nº 1.0024.12.135523-4/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - AGRAVANTE(S): ANDRE NOVAIS MACHADO - AGRAVADO(A)(S): ESTADO DE MINAS GERAIS, MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE Fl. 1/35

decisão - bens da população em situação de rua

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decisão do TJ MG - bens da população em situação de rua

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TRIBUNAL DE JUSTIA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Agravo de Instrumento Cv N 1.0024.12.135523-4/001

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO AO POPULAR TUTELA ANTECIPADA OBRIGAO DE NO FAZER ARTIGO 461 DO CDIGO DE PROCESSO CIVIL RELEVNCIA DA FUNDAMENTAO E JUSTIFICADO RECEIO DE INEFICCIA DO PROVIMENTO FINAL REQUISITOS DEMONSTRADOS APREENSO DE PERTENCES PESSOAIS NECESSRIOS SOBREVIVNCIA DIGNA DA POPULAO EM SITUAO DE RUA VIOLAO AO PRINCPIO DA MORALIDADE DECISO REFORMADA.

1. Os requisitos autorizadores do deferimento da tutela especfica de urgncia em ao cujo objeto seja o cumprimento de obrigao de fazer e de no fazer so a relevncia do fundamento e o justificado receio de ineficcia do provimento final, na forma do artigo 461 do Cdigo de Processo Civil, pressupostos esses menos rigorosos do que os exigidos pelo artigo 273 do CPC.2. Verificando-se do conjunto probatrio do instrumento que os agentes dos requeridos afrontaram preceitos ticos em suas condutas de fiscalizao, com a apreenso de pertences essenciais para a sobrevivncia, com o mnimo de dignidade, da populao em situao de rua, e sem a lavratura do correspondente auto, incorrendo em imoralidade, deve ser reformada a deciso que indeferiu a antecipao de tutela nos autos da ao popular.

3. Recurso provido.Agravo de Instrumento Cv N 1.0024.12.135523-4/001 - COMARCA DE Belo Horizonte - Agravante(s): ANDRE NOVAIS MACHADO - Agravado(a)(s): ESTADO DE MINAS GERAIS, MUNICPIO DE BELO HORIZONTEA C R D O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 8 CMARA CVEL do Tribunal de Justia do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, unanimidade, em dar provimento ao recurso.DESA. TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO

Relatora.

Desa. Teresa Cristina da Cunha Peixoto (RELATORA)

V O T O

Conheo do recurso, reunidos os pressupostos intrnsecos e extrnsecos de sua admissibilidade.

Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de antecipao de tutela da pretenso recursal interposto por Andr Novais Machado contra a deciso de primeiro grau de fls. 114/118-TJ que, nos autos da Ao Popular ajuizada em face do Estado de Minas Gerais e do Municpio de Belo Horizonte, indeferiu a tutela antecipada.

Asseverou o recorrente, em sntese, que testemunhou a abordagem de agentes dos requeridos aos ditos moradores de rua, com apreenso de pertences pessoais, como cobertores, roupas, alimentos, remdios e, inclusive, documentos de identificao (fl. 04), caracterizando ato lesivo moralidade administrativa, entendendo que a deciso apresenta contedo extremamente discriminatrio, alheio realidade da populao em situao de rua que se utiliza de utenslios como papelo por no possuir outro modo de se abrigar das intempries (fl. 08).

Afianou, ainda, que no se pode aferir que o material recolhido se trate apenas de entulho, sendo que a retirada dos documentos de identificao desses cidados torna-se prtica compatvel com o extermnio desse segmento populacional, acrescentando que a supremacia do interesse pblico jamais poder amparar atos perpetrados pelo Estado que violem direitos fundamentais de modo to injusto e arbitrrio (fl. 11) e que o Poder de Polcia deve ser exercido nos liames da legalidade (fl. 12), tendo os rus violado o princpio da dignidade da pessoa humana e o direito fundamental cidadania.

Assim, afirmando o preenchimento dos requisitos para a tutela antecipada, requereu o provimento do recurso, com a antecipao da tutela recursal, para impor ao Estado de Minas Gerais e ao Municpio de Belo Horizonte, com fulcro no artigo 461 do Cdigo de Processo Civil, a obrigao de no fazer consistente na absteno de atos que violem os direitos fundamentais dos moradores em situao de rua, notadamente a paralisao de atos de apreenso ilegal de pertences pessoais e de documentos de identificao, realizados pelos agentes dos rus (fl. 26), com a fixao de multa diria para o caso de descumprimento da obrigao.s fls. 129/133, foi deferida a antecipao da tutela recursal para determinar aos rus que se abstivessem de atos que violassem os direitos fundamentais dos moradores em situao de rua, especialmente a apreenso de documentos de identificao e de pertences pessoais necessrios sobrevivncia, bem como para determinar a lavratura de auto de apreenso, em caso de necessidade, sob pena de multa diria de R$1.000,00 (mil reais).

Informaes prestadas fl. 140.

Contraminuta apresentada pelo Municpio de Belo Horizonte s fls. 145/150 e pelo Estado de Minas Gerais s fls. 196/207.

Em deciso de fls. 189/190, foi determinada a intimao do Municpio de Belo Horizonte para se manifestar sobre o episdio narrado pelo agravante em petio de fls. 174/175, quedando-se a municipalidade, no entanto, inerte, sendo mantida a deciso inicial s fls. 193/194, com o indeferimento da reconsiderao requerida pelo ente estatal.

A d. Procuradoria-Geral de Justia se manifestou s fls. 223/235, opinando pelo provimento do recurso.

Revelam os autos que Andr Novais Machado ajuizou Ao Popular em face do Estado de Minas Gerais e do Municpio de Belo Horizonte, se insurgindo contra abusos e ilegalidades praticadas por agentes pblicos em desfavor de moradores em situao de rua, requerendo a concesso da tutela especfica concernente determinao judicial de obrigao de no fazer, liminarmente, nos termos do art. 461, do CPC, para determinar aos rus (...) que se abstenham de atos que violem os Direitos Fundamentais dos moradores em situao de rua, notadamente a paralisao de atos de apreenso ilegal de pertences pessoais e de documentos de identificao, realizados pelos Agentes dos Rus (fl. 54), com a fixao de multa diria para o caso de descumprimento da obrigao de no fazer.

O magistrado primevo, no obstante, indeferiu a tutela antecipada, ao argumento de estar ausente a verossimilhana das alegaes formuladas na pea de ingresso (fl. 188), o que motivou a presente irresignao, limitando-se a controvrsia dos autos ao exame dos requisitos para a pretendida antecipao.

Inicialmente, impende registrar que a questo do cabimento da ao popular no foi objeto da deciso agravada, o que impede a sua anlise por esta Corte Revisora, sob pena de supresso de instncia, a despeito da alegao do Estado de Minas Gerais em contraminuta (fl. 199), o mesmo se observando em relao preliminar de ilegitimidade passiva suscitada fl. 200.

De todo o modo, gostaria de destacar que, a meu sentir, o pedido do autor encontra amparo no artigo 5, inciso LXXIII da Constituio da Repblica, constituindo a ao popular importante medida de controle da Administrao, a ser exercido pelo cidado, com o objetivo de invalidar atos praticados com ilegalidade, dos quais resultem leso moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimnio histrico cultural.Elucida JOS DOS SANTOS CARVALHO FILHO, a esse respeito, que quando a Constituio se refere a princpios lesivos moralidade administrativa, deve entender-se que a ao cabvel pelo simples fato de ofender esse princpio, independentemente de haver ou no efetiva leso patrimonial, acrescentando que O princpio da moralidade impe que o administrador pblico no dispense os preceitos ticos que devem estar presentes em sua conduta. Deve no s averiguar os critrios de convenincia, oportunidade e justia em suas aes, mas tambm distinguir o que honesto do que desonesto (Manual de Direito Administrativo, 24 ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, pgs. 20 e 22).Outrossim, no se pode afastar a legitimidade para a causa do Estado, com fulcro no artigo 6 da Lei n 4.717, de 29 de junho de 1965, que regula a Ao Popular, eis que, consoante a documentao acostada ao processo, os atos impugnados foram praticados por agentes de ambos os requeridos, notadamente atravs da Polcia Militar e da Guarda Municipal, configurando o litisconsrcio passivo necessrio.

Posto isto, em relao concesso da tutela liminar na ao popular, tem-se que a Lei n 4.717/65, originariamente, no previa tal possibilidade, em que pese o entendimento de seu cabimento, tendo em vista o poder geral de cautela do juzo, o que restou alterado com o advento da Lei n 6.513/77, que incluiu o 4 no artigo 5 da LAP, estipulando que na defesa do patrimnio pblico caber a suspenso liminar do ato lesivo impugnado.

Neste aspecto, o dispositivo deve ser interpretado no sentido de que todos os bens tutelados pela ao popular, e no somente o patrimnio pblico, so passveis de proteo em sede liminar, aplicando-se, de toda a forma, os dispositivos do Cdigo de Processo Civil, subsidiariamente, estabelecendo expressamente o artigo 22 da Lei da Ao Popular que aplicam-se ao popular as regras do Cdigo de Processo Civil, naquilo em que no contrariem os dispositivos desta lei, nem a natureza especfica da ao.

Consoante a lio de GEISA DE ASSIS RODRIGUES, Aps a introduo de tutela no sistema do processo ordinrio, tanto no artigo 273 quanto no artigo 461, que permite a antecipao da tutela especfica, inquestionvel a possibilidade da concesso da antecipao parcial ou total do pedido, desde que presentes os requisitos autorizadores previstos no artigo 273 do CPC (Aes Constitucionais, Organizador FREDIE DIDIER JR., 5 ed., Salvador: Jus Podivm, pg. 322).

Tambm leciona RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO:

Por fim, registre-se que a tutela de urgncia, que na ao popular se faz atravs de provimento liminar (Lei 4.717/65, art. 5, 4), est sensivelmente ampliada com o advento da tutela antecipada (CPC, art. 273). Em sede doutrinria procuramos demonstrar que essa inovao no empece nem imbrica com o processo cautelar, que remanesce com o seu fim especfico: outorga de segurana atual a pessoa, coisa, situao ou ao prprio processo, tudo em ordem a garantir a utilidade, a eficcia do provimento futuro, perseguido principaliter.

O que se passa, como explica J. E. Carreira Alvim, que o provimento antecipatrio, que antes era possvel quase s no mbito do processo cautelar, espraia-se agora para todo o processo de cautela do juiz. Como a concesso do provimento jurisdicional no mais uma graa do Estado, mas um direito da parte, preparem-se juzes e tribunais para o exerccio de sua nobre misso de outorgar tutela na forma da lei, no devendo o termo poder [o autor refere-se ao caput do art. 273] ser entendido como um passaporte para a omisso, deixando para a sentena o que, segundo a lei, deva ser, de logo, antecipado.

Desse modo, sendo a ao popular uma demanda veiculada em rito ordinrio, num processo de conhecimento (cognio ampla e exauriente), e desde que pressentes os pressupostos para a antecipao dos efeitos da tutela (prova inequvoca, conduzindo a um juzo favorvel de verossimilhana da alegao, presentes os quesitos especficos incisos I e II e 2 do art. 273), afigura-nos possvel a aplicao dessa tutela de urgncia no mbito da ao popular, at porque o CPC lhe fonte subsidiria (Lei 4.717/65, art. 22).

O fato de, na ao popular, se lobrigarem interesses difusos, de cunho indisponvel, no nos parece empecilho antecipao dos efeitos da tutela, presentes os requisitos indicados no art. 273 do CPC, incisos e pargrafos. (Ao Popular, 6 ed., So Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, pgs. 277/278).A propsito, dispe o artigo 273 do Estatuto Processual:

Art. 273. O juiz poder, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequvoca, se convena da verossimilhana da alegao e: (Redao dada pela Lei n 8.952, de 1994)

I - haja fundado receio de dano irreparvel ou de difcil reparao; ou (Includo pela Lei n 8.952, de 1994)

II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propsito protelatrio do ru. (Includo pela Lei n 8.952, de 1994)

1 Na deciso que antecipar a tutela, o juiz indicar, de modo claro e preciso, as razes do seu convencimento. (Includo pela Lei n 8.952, de 1994)

2 No se conceder a antecipao da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. (Includo pela Lei n 8.952, de 1994)

3 A efetivao da tutela antecipada observar, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, 4o e 5o, e 461-A. (Redao dada pela Lei n 10.444, de 2002)

4 A tutela antecipada poder ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em deciso fundamentada. (Includo pela Lei n 8.952, de 1994)

5 Concedida ou no a antecipao da tutela, prosseguir o processo at final julgamento. (Includo pela Lei n 8.952, de 1994)

6 A tutela antecipada tambm poder ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. (Includo pela Lei n 10.444, de 2002)

7 Se o autor, a ttulo de antecipao de tutela, requerer providncia de natureza cautelar, poder o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em carter incidental do processo ajuizado. (Includo pela Lei n 10.444, de 2002) (g. n.)

Nesta particular, anoto que os requisitos autorizadores do deferimento da tutela especfica de urgncia em ao cujo objeto seja o cumprimento de obrigao de fazer e de no fazer, como na hiptese dos autos, so a relevncia do fundamento e o justificado receio de ineficcia do provimento final, na forma do artigo 461 do Cdigo de Processo Civil:Art. 461. Na ao que tenha por objeto o cumprimento de obrigao de fazer ou no fazer, o juiz conceder a tutela especfica da obrigao ou, se procedente o pedido, determinar providncias que assegurem o resultado prtico equivalente ao do adimplemento.

1A obrigao somente se converter em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossvel a tutela especfica ou a obteno do resultado prtico correspondente.(Includo pela Lei n 8.952, de 1994)2A indenizao por perdas e danos dar-se- sem prejuzo da multa (art. 287).(Includo pela Lei n 8.952, de 1994)3Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficcia do provimento final, lcito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificao prvia, citado o ru. A medida liminar poder ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em deciso fundamentada.

4O juiz poder, na hiptese do pargrafo anterior ou na sentena, impor multa diria ao ru, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatvel com a obrigao, fixando-lhe prazo razovel para o cumprimento do preceito.

5Para a efetivao da tutela especfica ou aobteno do resultado prtico equivalente, poder o juiz, de ofcio ou a requerimento, determinar as medidas necessrias, tais como a imposio demulta por tempo de atraso, busca e apreenso, remoo de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessrio com requisio de fora policial.

6O juiz poder, de ofcio, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva. (g. n.)

Com efeito, esclarecem NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, em comentrio ao artigo 461 do CPC, que:

Adiantamento da tutela. A tutela especfica pode ser adiantada, por fora do CPC 461, 3, desde que seja relevante o fundamento da demanda (fumus boni iuris) e haja justificado receio de ineficcia do provimento final (periculum in mora). interessante notar que, para o adiantamento da tutela de mrito, na ao condenatria em obrigao de fazer ou no fazer, a lei exige menos do que para a mesma providncia, na ao de conhecimento tout court (CPC 273). suficiente mera probabilidade, isto , a relevncia do fundamento da demanda, para a concesso da tutela antecipatria da obrigao de fazer ou no fazer, ao passo que o CPC 273 exige, para as demais antecipaes de mrito: a) a prova inequvoca; b) o convencimento do juiz acerca da verossimilhana da alegao; c) o periculum in mora (CPC 273 I) ou o abuso do direito de defesa do ru (CPC 273 II). (Cdigo de Processo Civil Comentado e Legislao Extravagante, 9 ed., So Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, pg. 587).

Feitas essas consideraes, passando-se ao exame das provas coligidas, afere-se a relevncia do fundamento do autor, alm do justificado receio de ineficcia do provimento final, requisitos menos rigorosos do que os exigidos pelo artigo 273 do CPC, a saber, a verossimilhana da alegao e o fundado receio de dano irreparvel ou de difcil reparao, na medida em que, de fato, os agentes dos requeridos afrontaram preceitos ticos em suas condutas de fiscalizao, incorrendo em imoralidade.

O documento de fl. 120 informa, nesse diapaso, que a Comisso Especial para Monitoramento de Polticas para a Populao em Situao de Rua, vinculada ao Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos - CONEDH, recebeu denncias de que agentes da Prefeitura de Belo Horizonte estavam recolhendo pertences de moradores em situao de rua, levando sem justa causa e com apoio de fora policial, utenslios, roupas, alimentos, cobertores, documentos, etc., situao que configura grave violao aos direitos dessa populao altamente vulnervel, diminuindo assim suas possibilidades de sobrevivncia, e contrariando os princpios constitucionais da dignidade da pessoa humana, constando dos quadros de fls. 122/125 que teria o Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da Populao em Situao de Rua efetuado diversos atendimentos por abuso financeiro e econmico e violncia patrimonial, com a apropriao e destruio de bens, alm da subtrao/invalidao/ocultao de documentos.

As reportagens jornalsticas juntadas s fls. 93/117 e publicaes de fls. 78/81, tambm, informam que os moradores em situao de rua vm sofrendo violncias diversas, com abordagens truculentas por parte de agentes dos requeridos e recolhimento de pertences pessoais, inclusive documentos de identificao, como corroboram as fotografias de fls. 85/90 e o vdeo juntado fl. 83, filmado embaixo do Viaduto da Avenida Francisco Sales, nesta Capital.

Nesse vdeo, descreve um morador em situao de rua que agentes dos rus, alm de recolherem cobertores e papeles usados como isolantes trmicos e proteo, jogam gua nos locais utilizados como abrigo, segundo ele em poca de frio e chuvas, sendo incontroversa a colocao de obstculos mltiplos com o intuito de retir-los desses locais e impedir que ali se estabeleam, tendo repercutido nessa cidade, negativamente, evidncia, a colocao de pedras e objetos pontiagudos debaixo de viadutos.

Demais disso, a documentao juntada s fls. 176/180 demonstra que, mesmo aps a antecipao da tutela recursal por esta Desembargadora, o Centro Nacional de Defesa de Direitos Humanos da Populao em Situao de Rua e Catadores de Materiais Reciclveis CNDDH recebeu denncia no sentido de que, em 02/01/2013, um grupo de pessoas foi abordado por agentes da Prefeitura Municipal e policiais militares, que teriam feito apreenses de objetos pessoais sem a lavratura do respectivo auto, a exemplo de cobertores, roupas e objetos de higiene pessoal, denncia que no foi infirmada pela municipalidade, sem embargo da oportunidade que lhe fora conferida.O prprio Prefeito do Municpio de Belo Horizonte, Exmo. Sr. Mrcio Lacerda, em entrevista, como se v do documento de fl. 66, teria assegurado que o morador de rua no pode se estabelecer na via. Ele pode, no mximo, ficar com o cobertor. A prefeitura tem a obrigao e o direito de recolher todos os utenslios que ele estiver carregando.

Entretanto, em que pese a opinio das autoridades constitudas, comungo do entendimento do agravante de que para quem tem onde dormir, com conforto e segurana, compreensvel caracterizar as roupas velhas e sujas, cobertores baratos distribudos em regra por religiosos e outros pertences de populao de rua como entulho (fl. 08) e que considerar a propriedade dos pobres como bens de segundo escalo revela uma concepo elitista que nega o princpio da igualdade, pois pressupe que o direito propriedade aplicvel em diferentes nveis, conforme a classe social (fl. 09).No se olvida do incmodo causado por essa populao e da situao delicada que envolve o Poder Pblico e os cidados que vivem margem do Estado, questo complicada que est longe de ser solucionada e que perpassa por problemas outros de educao, sade e moradia, existindo legislao tratando do assunto no Municpio de Belo Horizonte, como o Decreto n 14.146, de 07 de outubro de 2010, que instituiu o Comit de Acompanhamento e Monitoramento da Poltica Municipal para a Populao em Situao de Rua, a quem compete, dentre outras coisas, propor medidas que assegurem a articulao das polticas pblicas municipais para o atendimento populao em situao de rua e instituir grupos de trabalhos temticos, em especial para discutir as desvantagens sociais a que foi historicamente submetida a populao em situao de rua, bem como analisar e propor formas de incluso e compensao social (fl. 76).

certo, ademais, que parcela da populao de rua, geralmente influenciada pelas drogas, vive a par da legalidade, praticando delitos e causando insegurana ao restante dos cidados, o que merece, sim, ser repelido, porm, penalizar as pessoas em situao de rua com a retirada de pertences que lhe permitem um mnimo de dignidade, afronta a razoabilidade e outros princpios que norteiam a Administrao Pblica, devendo os seus direitos ser respeitados.

Ora, consoante salientado s fls. 129/133, as polticas pblicas no se revelam efetivas, no se mostrando suficientes os abrigos disponibilizados pela Administrao para acolher a populao em situao de rua, sem desconsiderar os esforos da municipalidade e do ente estatal, com o fim de solucionar ou ao menos minorar o grave problema, no se podendo permitir, pois, que sejam retirados dessas pessoas menos favorecidas pela sorte, os pertences essenciais para a sobrevivncia, com um mnimo de dignidade, o que ofende o artigo 1, incisos II e III da Carta Maior, que trazem a cidadania e a dignidade da pessoa humana como fundamentos da Repblica Federativa do Brasil, e igualmente o inciso LIV do artigo 5 da CR/88, segundo o qual ningum ser privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal, alm de seu artigo 3, que trata dos objetivos fundamentais do estado.

O Decreto Federal n 7.053/2009, que institui a Poltica Nacional para a Populao em Situao de Rua e seu Comit Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, do mesmo modo estabelece no artigo 5 que So princpios da Poltica Nacional para a Populao em Situao de Rua, alm da igualdade e equidade: I - respeito dignidade da pessoa humana; II - direito convivncia familiar e comunitria; III - valorizao e respeito vida e cidadania; IV - atendimento humanizado e universalizado; e V - respeito s condies sociais e diferenas de origem, raa, idade, nacionalidade, gnero, orientao sexual e religiosa, com ateno especial s pessoas com deficincia.

Dessa maneira, a despeito da supremacia do interesse pblico que deve nortear a atuao da Administrao, no se negando o poder de polcia administrativo que, segundo o doutrinador JOS DOS SANTOS CARVALHO FILHO, consiste na prerrogativa de direito pblico que, calcada na lei, autoriza a Administrao Pblica a restringir o uso e gozo da liberdade e da propriedade em favor do interesse da coletividade (Manual de Direito Administrativo, 13 ed., Ed. Lmen jris, 2005, pg. 56), necessria a reforma da deciso de primeiro grau, constatando-se, nesse juzo inicial, a existncia de abusos por parte dos agentes dos rus em relao populao em situao de rua, que no podem ser tolerados pelo ordenamento jurdico. como ponderou, com percucincia, a d. Procuradoria-Geral de Justia:

As prticas que vem sendo adotadas pelo Municpio de Belo Horizonte, com o apoio da Polcia Militar, em relao s pessoas em situao de rua, evidenciam uma estratgia higienista do Poder Pblico, cuja pretenso a de foras essas pessoas a buscarem os servios que a municipalidade lhes oferece (deficitrios, frise-se), a exemplo dos abrigos, atravs do desfazimento de seus espaos de sobrevivncia em grupo ou mesmo pela via do recolhimento de objetos de uso pessoal e documentos de identificao.

Conforme salientado pelo autor em seu bem elaborado recurso, ao subtrair mveis de uso pessoal e exclusiva propriedade, os agravantes tm praticado verdadeiro roubo institucionalizado contra a populao em situao de rua, prtica que configura exacerbao do poder de polcia, que, por sua vez, deve buscar seus limites no catlogo de direitos fundamentais.

Alegam os agravados que inexiste prova inequvoca da verossimilhana das alegaes. Sem razo, contudo, haja vista que basta uma rpida anlise das provas que instruem a inicial para verificar a verossimilhana dos fatos. Nesse sentido, verifica-se que as apreenses, alm de registradas em fotos e vdeos que integram os autos, foram confirmadas pelo Sr. Prefeito de Belo Horizonte, que declarou que a prefeitura tem a obrigao e o direito de recolher todos os utenslios que ele estiver carregando. De igual modo, dezenas de notcias dando conta de abordagens truculentas e de retiradas foradas de pertences de pessoas em situao de rua foram trazidas aos autos pela parte autora, alm de um ofcio do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da Populao em situao de rua, referente a atendimentos realizados em Minas Gerais no perodo de fevereiro/2011 e novembro/2012. Todos esses documentos, juntos, revelam as violaes aos direitos humanos da populao em situao de rua, por parte dos agravados.

Essas violaes refletem a ameaa de leso grave e de difcil reparao. Alis, esse grupo populacional j vem sofrendo toda sorte de leses, na medida em que os agentes municipais, com o resguardo da Polcia Militar, tm procedido apreenso, recolhimento e destruio de objetos pessoais de suma importncia para essas pessoas, como cobertores, remdios, exames e documentos de identificao.

Por fim, de suma importncia destacar que, o exerccio do poder de polcia no pode se apartar do devido processo legal, garantia de que ningum ser privado da liberdade ou de seus bens sem obedincia a regras anteriormente postas. A propsito, os autos revelam que os bens tm sido retirados de seus proprietrios sem a lavratura do auto de apreenso correspondente, e, aps o recolhimento, esses objetos so levados para aterros sanitrios onde so destrudos, sem que seus proprietrios tenham a oportunidade de reav-los (fls. 230/232).Destarte, evidenciados os requisitos legais, ainda que sob o prisma do artigo 273 do CPC, deve ser reformada a deciso agravada, decidindo esta eg. Corte de Justia sobre a concesso da tutela antecipada na ao popular:

EMENTA: Agravo de instrumento. Ao popular. Incompetncia absoluta inocorrente. Fundamentao concisa. Antecipao de tutela. Constrio judicial sobre bens. Requisitos presentes. Deferimento mantido. Recurso no provido. 1. A competncia ratione personae restrita s hipteses legais. 2. A ausncia de fundamentao gera nulidade da sentena, o que no ocorre no caso de fundamentos concisos. 3. Para a concesso de tutela antecipada pressupe o atendimento dos respectivos requisitos legais. 4. A constrio impostas aos bens do recorrente necessria para resguardar o errio pblico. Esta circunstncia justifica o deferimento da tutela antecipada. 5. Agravo de instrumento conhecido e no provido, mantido o deferimento da tutela antecipada e rejeitadas duas preliminares. AGRAVO DE INSTRUMENTO CV N 1.0556.10.001892-9/007 - COMARCA DE RIO PARDO DE MINAS - AGRAVANTE(S): ASCENDINO ROMUALDO DOS REIS, GERDAU AOS LONGOS S/A, ANDRE BIER GERDAU JOHANNPETER E OUTRO(A)(S), CLAUDIO JOHANNPETER, NIVALDO RIBEIRO DE ALMEIDA - AGRAVADO(A)(S): ANTONIA DE LOURDES TEIXEIRA E SILVEIRA E OUTRO(A)(S), JOS GONALVES DIAS - INTERESSADO: EDNILSON DE SOUZA NASCIMENTO E OUTROS, j. 31/08/2012.EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AO POPULAR. PERMUTA DE IMVEIS ENTRE O MUNICPIO DE GOVERNADOR VALADARES E O INSTITUTO DE PREVIDNCIA MUNICIPAL. ALEGAO DE IRREGULARIDADES E SUPOSTA VIOLAO AO DISPOSTO NO ART. 14, XV, DA LEI MUNICIPAL N. 5.887/2008. LIMINAR DETERMINANDO A PARALISAO DAS OBRAS. ANTECIPAO DE TUTELA. REQUISITOS. COMPROVAO. RECURSO NO PROVIDO. - Deve ser ratificada a deciso que defere o pedido de antecipao de tutela formulado por populares, para fins de cessao de quaisquer atividades no terreno de propriedade do IPREM-GV, porquanto verossmeis as alegaes de irregularidades sobre um dos imveis objetos de permuta, bem como suposta violao ao disposto no art. 14, XV, da Lei Municipal n. 5.887/2008, que dispe sobre a reestruturao do aludido instituto, notadamente no que diz respeito necessidade de aprovao do Conselho Deliberativo para fins de transao de bens imveis pertencentes ao instituto. AGRAVO DE INSTRUMENTO CVEL N 1.0105.11.034261-2/001 - COMARCA DE GOVERNADOR VALADARES - AGRAVANTE(S): A & C CENTRO CONTATOS S/A - AGRAVADO(A)(S): GERALDA DE OLIVEIRA MENDES E OUTRO(A)(S) - RELATOR: EXMO. SR. DES. WASHINGTON FERREIRA, j. 24/04/2012.EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO -AO POPULAR- MEIO AMBIENTE - AUTORIZAO PARA CORTE DE RVORE CENTENRIA - SUSPENSO - LIMINAR - VEROSSIMILHANA DA ALEGAO E PERICULUM IN MORA - PRESENA - DEFERIMENTO. - Restando comprovada a plausibilidade do direito alegado, quanto necessidade de suspenso da determinao de corte de rvore centenria existente no municpio de Raul Soares, bem como o perigo de demora, correto se apresenta o deferimento da tutela liminar pleiteada. - Recurso no provido. AGRAVO DE INSTRUMENTO CV N 1.0540.07.013194-6/001 - COMARCA DE RAUL SOARES - AGRAVANTE(S): IEF INST ESTADUAL FLORESTAS - INTERESSADO: ZIL ROCHA DE FARIA - AGRAVADO(A)(S): JESUS ALVES MENEZES, j. 16/12/2011.

No discrepa o posicionamento do colendo Superior Tribunal de Justia:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. LITISPENDNCIA. AUSNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. DEFICINCIA NA FUNDAMENTAO RECURSAL. SMULA N 282. AO POPULAR. AUSNCIA DE LESIVIDADE MATERIAL. ILEGALIDADE. POSSIBILIDADE. ART. 5, LXXIII DA CONSTITUIO FEDERAL. TUTELA ANTECIPADA. PRESENA DOS REQUISITOS DO ART. 273, DO CPC. 1. A interposio do recurso especial impe que o dispositivo de Lei Federal tido por violado, como meio de se aferir a admisso da impugnao, tenha sido ventilado no acrdo recorrido, sob pena de padecer o recurso do prequestionamento, requisito essencial admisso do mesmo, o que atrai a incidncia do enunciado n 282 da Smula do STF. Falta de prequestionamento quanto existncia de litispendncia. 2. Hiptese em que a Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF - divulgou uma lista incorreta de aprovados no Vestibular 2000, decorrente de erro no gabarito usado para a correo das provas, o que proporcionou que alunos que haviam obtido nota suficiente para terem acesso segunda fase do vestibular fossem considerados reprovados, enquanto aqueles que no tinham nota suficiente puderam realizar a segunda prova, como se tivessem sido aprovados. 3. A Ao Popular regulada pela Lei n 4.717/65, art. 1, limitava o cabimento da ao s hipteses de lesividade ao patrimnio pblico, por isso que restava suficiente, anulao do ato por via da ao popular, a mera ilegalidade. 4. Alegao de inadequao da ao popular para este fim, merc de valorados anomalamente os pressupostos do art. 273 do CPC. 5. Restando evidenciada a importncia da cidadania no controle dos atos da administrao, com a eleio dos valores imateriais do art. 37, da CF, como tutelveis judicialmente, coadjuvados por uma srie de instrumentos processuais de defesa dos interesses transindividuais, criou-se um microssistema de tutela de interesses difusos referentes probidade da administrao pblica, nele encartando-se a ao popular, a ao civil pblica e o mandado de segurana coletivo, como instrumentos concorrentes na defesa desses direitos eclipsados por clusulas ptreas. 6. Consectariamente, a partir da Constituio de 1988 tomou-se possvel a propositura da ao popular com o escopo de anular, no s atos lesivos ao patrimnio econmico do Estado, como tambm ao patrimnio histrico, cultural, ambiental e moral. 7. Precedente do STF: "o entendimento no sentido de que, para o cabimento da ao popular, basta a ilegalidade do ato administrativo a invalidar, por contrariar normas especficas que regem a sua prtica ou por se desviar de princpios que norteiam a Administrao Pblica, sendo dispensvel a demonstrao de prejuzo material aos cofres pblicos, no ofensivo ao inciso L I do art. 5 da Constituio Federal, norma esta que abarca no s o patrimnio material do Poder Pblico, como tambm o patrimnio moral, o cultural e o histrico." (RE n 170.768/SP, ReI. Min. Ilmar Galvo, DJ de 13.08.1999). 8. A tutela antecipada pressupe direito evidente (lquido e certo) ou direito em estado de periclitao. lquido e certo o direito quando em consonncia com a jurisprudncia predominante do STJ, o guardio da legislao infraconstitucional. 9. O exame do preenchimento dos pressupostos para a concesso da tutela antecipada previstos no artigo 273, deve ser aferido pelo juiz natural, sendo defeso ao STJ o reexame desse juzo de admissibilidade, sob pena de violao do enunciado da Smula 7 do STJ. Precedentes desta Corte: REsp 505729/RS; REsp 190686/PR; MC 2615/PE; AGA 396736/MG; Resp 373775/RS; REsp 165339/MS; AGA 199217/SP. 10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, improvido. (REsp 552.691/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/05/2005, DJ 30/05/2005, p. 216)Consequentemente, o provimento do recurso medida de rigor, no prosperando a alegao do Municpio de Belo Horizonte de que em momento algum nos autos restou cabalmente demonstrada a apreenso de pertences pessoais de moradores em situao de rua (fl. 149), tendo reconhecido, na esteira dos boletins de intervenes apresentados s fls. 152/163, o recolhimento de materiais como papeles, lonas, mveis e colches, no se prestando, da mesma forma, as assertivas do Estado de Minas Gerais (fls. 196/207), manuteno da deciso objurgada.

Por fim, invivel que se decote a multa imposta aos rus em caso do descumprimento da obrigao de no fazer, penalidade que se encontra albergada pela legislao processual (artigo 461, 4 do CPC), visando compeli-los ao cumprimento da deciso judicial, o que, de acordo com o autor e a documentao j aludida, no estaria sendo observado pela municipalidade no caso concreto, mostrando-se o montante estabelecido s fls. 129/133 condizente com a situao especfica.Com essas consideraes, dou provimento ao recurso para, reformando a deciso primeva, deferir a antecipao dos efeitos da tutela, na forma da deciso de fls. 129/133, determinando aos rus que se abstenham de atos que violem os direitos fundamentais dos moradores em situao de rua, especialmente a apreenso de documentos de identificao e de pertences pessoais necessrios sobrevivncia, exceo de qualquer tipo de objeto ou substncia ilcita, sem impedi-los, entretanto, da fiscalizao necessria ao bom desempenho das polticas pblicas pertinentes, determinando, ainda, que, em havendo necessidade de se proceder a apreenses, seja lavrado o auto correspondente, sob pena de multa diria de R$1.000,00 (mil reais) para o caso de descumprimento da obrigao.

Custas recursais, ex lege.

Des. Bitencourt Marcondes - De acordo com o(a) Relator(a).Des. Alyrio Ramos - De acordo com o(a) Relator(a).SMULA: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO."

Fl. 22/22