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Cópias do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça e da Rela- ção de Lisboa e da sentença da 3.ª vara cível da comarca de Lisboa proferidos nos processos de depósito dos modelos industriais n.os 1712 e 2588. Sentença de fl. 78: O digno agente do Miniatério Público, em nome do Estado (Direcçrão-Geral do Comércio), intentou esta acção sumária contra a sociedade José Nunes dos San- tos & C.ª (Filhos), L.da, com sede na Rua do Mundo, 139, desta cidade, para efeito de serem declarados nulos os registos n.os 1712 e 2588, respectivamente em 25 de Junho de 1932 e 24 de Fevereiro de 1937, na Repartição da Propriedade Industrial, com os seguin- tes fundamentos: E m 24 de Junho de 1931 a ré apresentou naquela Repartição um requerimendo pedindo para depositar um modelo de enxugador de tinta para escritório, que considerava original, modelo que foi recebido e regis- tado com o n.° 1712; e em 1 de Setembro de 1936 a ré apresentou na mesma Repartição um modelo de enxu- gador de tinta para escritório, também considerado pela ré como original, modelo que foi recebido e re- gistado com o n.° 2588. Esses modelos, porém, care- ciam de n ovidade. E m 8 de Setembro de 1928 havia sido apresentado modelo perfeitamente idêntico na Repartição de Pa- tentes e Registos de Helsínquia, Finlândia, por Unno Rikkonen, ficando o modelo ali registado com o n.° 14 334. São anuláveis os títulos de depósito dos modelos referidos, por falta de novidade ou origina- lidade. Essa anulação se requer. A ré contestou a acção nos seguintes termos: O direito de se requerer a anulação do modelo n.° 1712 acha-se prescrito, visto já terem decorrido mais de vinte anos entre a sua concessão e a data da propositura desta acção. A ré só teve oonhecimento do registo do modelo feito em 1928 por Unno Rikkonen depois de decorrido o prazo da prescrição. Os dois mo- delos foram concedidos sob a vigência da Lei de 21 de Maio de 1896 e do Regulamento de 28 deMarço de 1895, que lhe devem ser aplicados. A novidadedo modelo, no domínio dessa lei e regulamento, éexigível apenas quanto ao território português. Determinao artigo 168.° da referida lei que são garantidos contra a imitação ou cópia os desenhos e modelos que figurem em exposições realizadas em Portugal; donde secon- clui que a novidade só é exigível quanto ao território português, visto que, excepcionalmente se estabelece a garantia quanto aos desenhos e modelos que figurem em exposições realizadas em Portugal, embora depro- veniência estrangeira. Ao tempo da concessão vigorava a Convenção da União de Paris, de 20 de Março de 1883, paraapro- tecção da propriedade industrial, e, segundo o ar- tigo 4.°, quem tiver feito o depósito de um pedidode patente de invenção de um modelo de utilidade,deum desenho ou modelo industrial num dos países com- tratantes gozará, para efectuar o depósito nos outros países e sob reserva de direito de terceiros, de um di- reito de prioridade durante doze meses, para aspaten- tes de invenção e modelos de utilidade. Esta disposição é reproduzida no texto da revisão daquela Convenção e m Londres e começou, a produzir os seus efeitosem Portugal em 7 de Novembro de 1949 (Decreto-lei n.° 37 468, de 5 de Julho de 1949, Diário do Governo de 6 de Fevereiro de 1950 e artigo 52.°, § único,do actual Código da Propriedade Industrial). Não semos- tra que o referido finlandês haja pedido prioridadeem Portugal, pelo que o seu modelo não pode produzir quaisquer efeitos em Portugal, designadamente sobo aspecto da novidade. O artigo 4.° da convenção declara que as patentes pedidas nos diferentes países ccntradantes pelosnacio- nais dos países da União serão independentesdaspaten- tes obtidas para o mesmo invento nos outros países aderentes ou não à União; e esta disposição deveen- tender-se de um modo absoluto e no sentido dequeas patentes pedidas durante o prazo de prioridadesão independentes, tanto sob o ponto de vista das causas de nulidade e caducidade como sob o da duraçãonor- mal. Aplica-se a todas as patentes existentes àdata da sua entrada em vigoir. À excepção da prescrição, deve proceder quanto ao modelo n.° 1712 e a acção deve ser julgada improcedente e não provada. Na réplica o autor alega que não é de admitira ex- cepção da prescrição na presente causa, porque só podem adquirir-se por prescrição e ser, portanto, objecto de posse as coisas e direitos que sejam suscep- tíveis de apropriação (artigos 479.° e 506.° do Código Civil). Os modelos em causa pertenciam ao domínio público quando foram feitos os registos respectivos, pois que em 8 de Novembro de 1928 havia sidodepo- sitado na Finlândia o modelo de Unno Rikkonen. A prioridade de direito conta-se do depósito, enão da concessão do privilégio (artigo 44.° do Códigoda Propriedade Industrial). O privilégio do finlandêstinha um ano, a partir do depósito na Finlândia, parareque- rer a prioridade em Portugal (artigo 52.° docitado código). Não usou desse direito, e por isso omodelo caiu no domínio público. Estando no domínio público. não podia ter sido admitido o depósito requeridopela ré, por falta de novidade, visto não se considerarnovo o modelo que, dentro ou fora do País, já foiobjecto de depósito anterior (§ 1.° do artigo 51.° do citado código). Tendo sido admitido este depósito, éeleanu- lável por força do n. ° 3. ° do artigo 69.°do citadocódige, quando se reconheça que o modelo não tem novidade- Isto se diz quanto ao modelo n.° 1712, e com maier@@ razão se aplica ao modelo n.° 2588, que foideposi@@ em 1 de Setembro de 1926. Nos termos do Regulamento

delos foram concedidos sob a vigência da Lei de 21 · acção sumária contra a sociedade José Nunes dos San- ... depois de decorrido o prazo da prescrição. ... Esta simples consideraçao

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Cópias do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça e da Rela- ção de Lisboa e da sentença da 3.ª vara cível da comarca de Lisboa proferidos nos processos de depósito dos modelos industriais n.os 1712 e 2588.

Sentença de fl. 78:

O digno agente do Miniatério Público, em nome do Estado (Direcçrão-Geral do Comércio), intentou esta acção sumária contra a sociedade José Nunes dos San- tos & C.ª (Filhos), L.da, com sede na Rua do Mundo, 139, desta cidade, para efeito de serem declarados nulos os registos n.os 1712 e 2588, respectivamente em 25 de Junho de 1932 e 24 de Fevereiro de 1937, na Repartição da Propriedade Industrial, com os seguin- tes fundamentos: E m 24 de Junho de 1931 a ré apresentou naquela

Repartição um requerimendo pedindo para depositar um modelo de enxugador de tinta para escritório, que considerava original, modelo que foi recebido e regis- tado com o n.° 1712; e em 1 de Setembro de 1936 a ré apresentou na mesma Repartição um modelo de enxu- gador de tinta para escritório, também considerado pela ré como original, modelo que foi recebido e re- gistado com o n.° 2588. Esses modelos, porém, care- ciam de n o v i d a d e . E m 8 de Setembro de 1928 havia sido apresentado

modelo perfeitamente idêntico na Repartição de Pa- tentes e Registos de Helsínquia, Finlândia, por Unno Rikkonen, ficando o modelo ali registado com o n.° 14 334. São anuláveis os títulos de depósito dos modelos referidos, por falta de novidade ou origina- lidade. Essa anulação se requer. A ré contestou a acção nos seguintes termos: O direito de se requerer a anulação do modelo

n.° 1712 acha-se prescrito, visto já terem decorrido mais de vinte anos entre a sua concessão e a data da propositura desta acção. A ré só teve oonhecimento do registo do modelo feito em 1928 por Unno Rikkonen depois de decorrido o prazo da prescrição. Os dois mo-

delos foram concedidos sob a vigência da Lei de 21 de Maio de 1896 e do Regulamento de 28 de Março de 1895, que lhe devem ser aplicados. A novidade do modelo, no domínio dessa lei e regulamento, é exigível apenas quanto ao território português. Determina o artigo 168.° da referida lei que são garantidos contra a imitação ou cópia os desenhos e modelos que figurem em exposições realizadas em Portugal; donde se con- clui que a novidade só é exigível quanto ao território português, visto que, excepcionalmente se estabelece a garantia quanto aos desenhos e modelos que figurem em exposições realizadas em Portugal, embora de pro- veniência estrangeira. Ao tempo da concessão vigorava a Convenção da

União de Paris, de 20 de Março de 1883, para a pro- tecção da propriedade industrial, e, segundo o ar- tigo 4.°, quem tiver feito o depósito de um pedido de patente de invenção de um modelo de utilidade, de um desenho ou modelo industrial num dos países com- tratantes gozará, para efectuar o depósito nos outros países e sob reserva de direito de terceiros, de um di- reito de prioridade durante doze meses, para as paten- tes de invenção e modelos de utilidade. Esta disposição é reproduzida no texto da revisão daquela Convenção e m Londres e começou, a produzir os seus efeitos em Portugal em 7 de Novembro de 1949 (Decreto-lei n. ° 37 468, de 5 de Julho de 1949, Diário do Governo de 6 de Fevereiro de 1950 e artigo 52.°, § único, do actual Código da Propriedade Industrial). Não se mos- tra que o referido finlandês haja pedido prioridade em Portugal, pelo que o seu modelo não pode produzir quaisquer efeitos em Portugal, designadamente sob o aspecto da novidade. O artigo 4.° da convenção declara que as patentes

pedidas nos diferentes países ccntradantes pelos nacio- nais dos países da União serão independentes das paten- tes obtidas para o mesmo invento nos outros países aderentes ou não à União; e esta disposição deve en- tender-se de um modo absoluto e no sentido de que as patentes pedidas durante o prazo de prioridade são independentes, tanto sob o ponto de vista das causas de nulidade e caducidade como sob o da duração nor- mal. Aplica-se a todas as patentes existentes à data da sua entrada em vigoir. À excepção da prescrição, deve proceder quanto ao modelo n.° 1712 e a acção deve ser julgada improcedente e não provada. Na réplica o autor alega que não é de admitir a ex-

cepção da prescrição na presente causa, porque só podem adquirir-se por prescrição e ser, portanto, objecto de posse as coisas e direitos que sejam suscep- tíveis de apropriação (artigos 479.° e 506.° do Código Civil). Os modelos em causa pertenciam ao domínio público quando foram feitos os registos respectivos, pois que em 8 de Novembro de 1928 havia sido depo- sitado na Finlândia o modelo de Unno Rikkonen. A prioridade de direito conta-se do depósito, e não

da concessão do privilégio (artigo 44.° do Código da Propriedade Industrial). O privilégio do finlandês tinha um ano, a partir do depósito na Finlândia, para reque- rer a prioridade em Portugal (artigo 52.° do citado código). Não usou desse direito, e por isso o modelo caiu no domínio público. Estando no domínio público. não podia ter sido admitido o depósito requerido pela ré, por falta de novidade, visto não se considerar novo o modelo que, dentro ou fora do País, já foi objecto de depósito anterior (§ 1.° do artigo 51.° do citado código). Tendo sido admitido este depósito, é ele anu- lável por força do n. ° 3. ° do artigo 69.° do citado códige, quando se reconheça que o modelo não tem novidade- Isto se diz quanto ao modelo n.° 1712, e com maier@@ razão se aplica ao modelo n.° 2588, que foi deposi@@ em 1 de Setembro de 1926. Nos termos do Regulamento

de 1895 e da Lei de 1896, exigia-se o requisito «novi- dade» para o registo dos títulos de depósito. Na tréplica a ré alega que o modelo não caiu no

domínio público pelo facto de o finlandês não ter reque- rido prioridade em Portugal para o modelo em questão. Pela Lei de 1896 a movidade só era exigida dentro do território português. Para o depósito do finlandês pro- duzir efeitos em Portugal tinha de ser efectuado neste país dentro do prazo estabelecido no artigo 4.° da Con- venção da União de Paris, revista na Haia em 6 de Novembro de 1925; e, como não o fez, o depósito da ré produziu todos os seus efeitos jurídicos em Portugal. O que tudo visto: Sobe a excepção deduzida pela ré. A prescrição do

direito de acção de nulidade só se dá no caso contem- plado no n.° 2.° do artigo 635.° do Código Civil - o da nulidade do privilégio concedido hatendo carta ante- riormemte concedida sobre o mesmo objecto. Nos mais casos -diz o artigo 635.°- a acção de nulidade dura enquanto subsiste o exclusivo da invenção. Esta simples consideraçao conduz à manifesta im-

procedência da excepção. O modelo de enxugador de tinta que a ré apresentou na Repartição da Proprie- dade Industrial em 1931, considerado como original, e bem assim o outro modelo de enxugador de tinta, também considerado pela ré como original e apresen- tado naquela Repartição em 1 de Setembro de 1936 e que ficaram registados sob os n.os 1712 e 2588, não eram novos. Não eram novos porque em 8 de Novembro de 1928

havia sido apresentado modelo perfeitamente idêntico na Repartição de Patentes e Registos de Helsínquia, Finlândia, por Unno Rikkonen, modelo que ali foi registado sob o n.° 14 334. O finlandês Rikkonen teve prioridade em Portugal para a protecçao da proprie- dade industrial respeitante àquele modelo, dentro dos doze meses seguintes ao depósito na Finlândia. Não o requereu nem mesmo depois de estar em vigor em Por- tugal a Convenção da União de Paris para a protecção da propriedade industrial, publicada no Diário do Governo de 6 de Fevereiro de 1950. Os modelos em questão foram concedidos sob a vigi-

lância da Lei de 21 de Maio de 1896 e do Regula- mento de 28 de Março de 1895. Nos domínios destes diplomas legais, a novidade do modelo não era exigida apenas quanto ao território português, nenhum pre- ceito legal assim o determinando. Os modelos não eram novos porque modelo igual estava registado na Fin- lândia. Pertenciam ao domínio público quando foram feitos os respectivos registos na Repartição da Proprie- dade Industrial, e, pertencendo ao domínio público, não podiam ser apropriados exolusivamente por qual- quer pessoa. Nos termos do n.° 1 do artigo 37.° da citada Lei de

1895, são nulos os privilégios concedidos se os inventos ou descobrimentos forem conhecidos do público, prá- tica ou tècnicamente, por alguma descrição técnica, divulgada em escritos nacionais ou estrangeiros, ou por qualquer outro modo. Nos termos do artigo 174.° da citada Lei de 1896, só se concede ou reserva o título de depósito aos desenhos e modelos novos, e, como ficou dito, os modelos em causa não eram novos. Pelo exposto, e em termos de direito, julgo a acção

procedente e provada e declaro nulos os mencionados registos de modelos n.os 1712 e 2588 na Repartição da Propriedade Industrial. Custas pela ré.

Lisboa, 30 de Maio de 1955. - Alberto Toscano.

Mais certifico, narrativamente, que esta sentença foi confirmada por Acórdão da Relação de Lisboa de 9 de

Março de 1956 e por Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Abril de 1957, que transitou em jul- gado. O que certifico é a verdade em face dos aludidos

autos, a que me reporto no caso de dúvida, em meu poder e cartório. Por assim ter sido ordenado e nos termos do ar-

tigo 70.° do Código da Propriedade Industrial, § único, passei a presente, que assino depois de conferida. Foi esta certidão passada pelo funcionário Fragoso.

Lisboa, 8 de Junho de 1957. - O Chefe da 2.ª Sec- ção, 3.ª Vara, Geraldino Joaquim de Carvalho.

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

O digno agente do Ministério Público, como repre- sentante do Estado (Direcção-Geral do Comércio), propôs a presente acção contra a sociedade José Nunes dos Santos & C.ª (Filhos), com sede nesta cidade, para o efeito de serem anulados os registos dos depósitos de modelos de enxugadores de tinta para escritório n.os 1712 e 2588, efectuados, respectivamente, por des- pachos de 25 de Junho de 1932 e 24 de Janeiro de 1937. Alega o autor que em 24 de Junho de 1931 a ré apre-

sentou na Repartição da Propriedade Industrial um requerimento pedindo para depositar um dos referidos modelos, considerado como original, tendo esse modelo sido registado com aquele n.° 1712, e em 1 de Setembro de 1936 o outro modelo de enxugador, também por ela considerado como original e que ficou registado com o dito n.° 2588. Com o fundamento de que tais modelos eram, porém,

«cópia fiel» de outro, já, em 8 de Novembro de 1928, apresentado na Repartição de Patentes e Registo, em Helsínquia, Finlândia, por Unno Rikkonen, onde ficou registado com o n.° 14 334, e por isso careciam de no- vidade à data dos pedidos de depósito, pede a decla- ração de nulidade dos títulos de depósito dos modelos de enxugadores referidos, por falta de novidade ou ori- ginalidade e por força dos n.os 1.° e 3.° do artigo 69.° do Código da Propriedade Industrial (Decreto-Lei n.° 30 679, de 24 de Agosto de 1940). Defendendo-se por excepção, alegou a ré a prescrição

do direito à anulação do modelo n.° 1712 pelo decurso de mais de vinte anos entre a respectiva concessão e a propositura da causa e pela sua evidente boa fé, dado que só depois daquele prazo teve conhecimento do re- gisto de 1928 de Unno Rikkonen, que apenas, aliás, beneficiou da concessão de 29 de Abril de 1932, pelo que se não pode falar na falta de novidade quanto ao dito modelo n.° 1712. Que é, ainda, certo, quanto a ambos os modelos, por

concedidos na vigência do Regulamento de 28 de Março de 1955 e da Lei de 21 de Maio de 1896 (artigo 168.°), que a respectiva novidade só era exigível quanto ao território português. Por outro lado, e em face do artigo 4.° da Convenção

da União de Paris, de 20 de Março de 1883, revista na Haia em 6 de Novembro de 1925 (Diário do Governo de 31 de Dezembro de 1931), disposição sensivelmente reproduzida na Convenção de Londres de 2 de Junho de 1934, com efeitos em Portugal, a contar de 7 de No- vembro de 1949 (Decreto-Lei n.° 37 468, de 5 de Julho do mesmo ano, e Diário do Governo de 6 de Fevereiro de 1950), o prazo do direito de prioridade de desenhos e modelos industriais em país diverso daquele onde pri- mitivamente se registaram é de seis meses; e, não se mostrando que o referido proprietário do desenho re-

gistado na Finlândia haja pedido qualquer prioridade em Portugal, não pode o seu modelo, assim, produzir quaisquer efeitos, designadamente sob o aspecto de no- vidade.

Finalmente que do disposto no artigo 4.°-bis da Convenção revista na Haia e que a revisão de Londres quase reproduz, a qual se deve aplicar por analogia e maioria de razão aos desenhos e modelos industriais, mais uma vez resulta a inanidade do pedido formulado no presente processo. Conclui pela procedência da excepção de prescrição

quanto ao modelo n.° 1712 e pela improcedência da causa.

E m resposta alega o autor não ser de admitir a ex- cepção de prescrição, visto só poderem por ela adqui- rir-se as coisas e direitos apropriáveis, e não os que pertencem ao domínio público, no qual caíra já o mo- delo de Rikkonen quando a ré promoveu os mencionados registos de 1931 e 1936. Depositado, com efeito, em 8 de Novembro de 1928

o modelo do finlandês e por este não requerida priori- dade no nosso país dentro do prazo de um ano, a contar do depósito, e não da concessão do privilégio (ar- tigos 44.° e 52.° do Código da Propriedade Industrial), nem eram legalmente susceptíveis de admissão os depó- sitos da ré, desprovidos de novidade (artigo 43.° do Có- digo Civil) e por isso anuláveis nos termos do n.° 3.° do artigo 69.° do mesmo diploma, nem poderia a depo- sitante beneficiar da alegada prescrição pelo já expresso motivo de se encontrar no domínio público o aludido modelo de 1928.

0 argumento de ter a ré depositado os seus modelos no regime da legislação anterior ao Código de 1940 improcede inteiramente, exigível como era já então o requisito de «novidade» (artigo 237.° do Regulamento de 15 de Dezembro de 1894 e 187.° da Lei de 21 de Maio de 1896). E que assim não fosse não se teria completado em

1940 qualquer possível prazo de prescrição. Treplicando, manteve a ré toda a matéria da con-

testação, negando que tivesse caído no domínio público o modelo do finlandês, por falta de requerimento de prioridade, e acentuando como sòmente exigível a no- vidade em território português, em face do artigo 168.° da citada Lei de 1896. Mas, independentemente da eficácia dos questionados

depósitos, ter-se-á verificado a prescrição deduzida, por apropriação e registo do modelo de Rikkonen pela ré e sua consequente desafectação do domínio público, sem embargo do disposto no Código da Propriedade Industrial de 1940. Por sentença de fls. 78 e seguintes foi a acção jul-

gada procedente e provada e declarados nulos os men- cionados registos n.os 1712 e 2588, e, tendo a ré apelado da mesma sentença, foi ela confirmada pelo acórdão a fls. 127 e seguintes. Desta decisão interpôs a ré o presente recurso de re-

vista, cujo provimento pede, fundado nas seguintes conclusões: Quanto ao modelo n.° 1712: As coisas do domínio público são susceptíveis de de-

safectação e portanto pode ser-lhes aplicável o regime da prescrição. Houve uma desafectação tácita do refe- rido modelo, quer pela sua apropriação pela recorrente, quer pelo reconhecimento do seu exclusivo por parte do Estado. O direito ao uso exclusivo do referido mo- delo por parte da recorrente foi por esta adquirido por prescrição, visto ter durado mais de dez anos e a sua boa fé não ter sido posta em dúvida. As regras de aqui- sição dos direitos por prescrição não colidem com os

preceitos por que se regia a propriedade industrial en- tão em vigor, nem com os que actualmente a regalam. Nesta parte o acórdão violou os artigos 370.° a 372.°,

380.°, 506.° e 532.° do Código Civil e ainda, por errada interpretação, os artigos 187.° da Lei de 21 de Maio de 1896 e, por erro de aplicação, os artigos 37.°, n.° 1.°, da mesma lei e 69.° do actual Código da Propriedade Industrial, bem como o artigo 8.° do Código Civil. Quanto a ambos os modelos: A considerarem-se aplicáveis à hipótese sub judice

os artigos 632.° e 635.° do Código Civil, a acção de anulação caducou quanto a ambos os modelos há longo tempo, pois verifica-se a hipótese prevista no n.° 2.° do artigo 632.° A caducidade é uma excepção de que o tribunal deve conhecer oficiosamente, não estando por isso sujeita a alegação das partes e, não tendo tomado conhecimento dela, o acórdão recorrido violou os citados artigos 635.° e 632.°, n.° 2.°, do Código Civil, bem como os artigos 481.°, n.° 3.°, e 660.°, aplicável por força do artigo 715.°, todos do Código de Processo Civil, e ainda, por erro de aplicação, os artigos 668.°, n.° 4.°, e 717.° do referido código, podendo e devendo ainda o tribunal ad quem conhecer da mencionada excepção (artigo 726.° do mesmo código). À data em que foram requeridos os depósitos de

ambos os modelos a novidade só era exigida para o ter. ritório nacional, por isso que a falta de divulgação den. tro ou fora do País só foi determinada no novo Código da Propriedade Industrial, e para tanto o legislador entendeu necessário declará-lo expressamente, ou os preceitos desse código não podem ser aplicáveis à hi- pótese sub judice, sob pena de se dar à lei efeitos re- troactivos. As regras da Convenção Internacional então em vigor

também levam à conclusão de que os depósitos da re- corrente são inteiramente válidos e insusceptíveis de anulação. Decidindo o contrário violaram-se as disposições dos

artigos 187.° e 168.° da Carta de Lei de 21 de Maio de 1896 e artigo 4.° da Convenção de Revisão de Paris, de 20 de Março de 1883, para a protecção da propriedade industrial, revista na Haia em 6 de No- vembro de 1925, à qual Portugal aderiu (apêndice ao Diário do Governo de 31 de Dezembro de 1931), e, por erro de aplicação, o artigo 37.°, n.° 1.°, da mesma lei, artigo 632.°, n.° 1.°, do Código Civil e artigo 69.° do actual Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto n.° 30 679, de 24 de Agosto de 1940, in- fringindo, além disso, o artigo 8.° do Código de Pro- cesso Civil. O douto agente do Ministério Público junto deste

tribunal, inteligentemente, opina, em resumo, que as regras do artigo 69.° do Código da Propriedade Indus- trial são de aplicação imediata a todos os proprietários industriais, incluindo aqueles que à data da sua publi- cação tinham já as suas situações criadas, desde que essas situações jurídicas não foram exceptuadas. Não interessa assim averiguar se, no momento em

que os registos anulandos foram efectuados, era sòmente exigido o requisito «novidade» em relação ao território nacional, visto a lei nova dispor precisamente o con- trário no artigo 51.° e § 1.° Quanto ao registo n.° 1712, efectuado em 25 de Ju-

nho de 1932, mesmo que se tivesse tornado válido pels prescrição, seria anulável pelo artigo 69.°, n.os 1.° e 3.°, do citado código, por carência de novidade e logo que entrado em vigor este novo diploma. Finalmente, o conhecimento oficioso da caducidade

pertence exclusivamente ao juiz da 1.ª instância quande se trate pròpriamente de aplicação do artigo 481.° de Código Civil e, considerada como uma excepção pe-

rempta, dela não podem tomar conhecimento nem a Relação nem o Supremo. De resto, o artigo 635.° do Código Civil refere-se sò-

mente a inventos, e não a modelos, e tanto ele como o artigo 632.°, n.° 2.°, do mesmo código foram revo- gados pela Lei de 1896 e depois pelo novo Código da Propriedade Industrial. Conhecendo: Em 25 de Julho de 1932 e em 24 de Fevereiro de

1937 foram concedidos à recorrente os títulos de de- pósito dos modelos n.os 1712 e 2588, de enxugadores de tinta, que, nos termos do artigo 16.° da Lei de 21 de Maio de 1896 (diploma orgânico da propriedade in- dustrial em vigor ao tempo), constituíam os documentos comprovativos da propriedade dos referidos modelos. Obteve a recorrente a referida concessão declarando que os aludidos objectos eram da sua concepção ou execução (vide requerimentos a fls. 22 e 35). Em 29 de Julho de 1954, alegando que à data dos

pedidos da ré os modelos por ela depositados careciam de novidade, veio o Ministério Público, pela presente acção, pedir a anulação daqueles registos, com invo- cação dos n.os 1.° e 3.° do artigo 69.° do Código da Propriedade Industrial, publicado em 24 de Agosto de 1940. Alega mais que àquela data se encontrava já em utilização um modelo precisamente igual ao da recor- rente, apresentado e depositado na competente Repar- tição de Patentes de Helsínquia, Finlândia, desde o ano de 1928, por Unno Rikkonen. Constata-se documentalmente nos autos - e nem ela

foi negada pela recorrente - a exactidão de tal alega- ção, pelo que, e antes de mais, se tem de dar como veri- ficado que não havia novidade nos modelos registados pela recorrente à data em que foi concedido o seu de- pósito. Ora, nos termos do disposto na alínea b) do artigo 4.°

daquela Lei de 1896, que dizia que os títulos de de- pósito de modelos industriais garantem a propriedade da realização de uma forma nova dos respectivos objec- tos, do artigo 174.°, que determinava que só se conce- diam ou conservavam os títulos de depósito aos modelos novos, e do artigo 187.°, que permitia a anulação desses títulos quando não fossem novos, nos termos daquele artigo 174.°, tem de concluir-se que já então, nas datas em que foram concedidos os modelos em questão, era elemento indispensável para a concessão e manutenção da garantia da propriedade industrial a um modelo que ele fosse novo, e o contrário não pode deduzir-se do disposto no artigo 166.° do mesmo diploma, que signi- fica que o simples facto de ter sido concedido o título não importa nem é suficiente para se considerar novo o modelo que efectivamente o não seja. Em parte alguma consignou essa lei ou o Regula-

mento de 28 de Março de 1895, em vigor em tudo o que por ela não era contrariado, a limitação duma novidade ao território nacional, e a disposição do artigo 168.°, invocado pela recorrente como demonstrando o contrá- rio, em lugar de ser uma extensão excepcional do con- ceito legal de novidade, é uma garantia estabelecida, quanto aos modelos que figurem em exposições reali- zadas em Portugal, de não ser por tal motivo invali- dada essa novidade, como mais claramente se diz no § 2.° do artigo 51.° do actual Código da Propriedade Industrial. Posteriormente, esse código, aprovado pelo Decreto

n.° 30 679, de 24 de Agosto de 1940, reproduzindo no seu artigo 43.°, no essencial, o disposto no acima alu- dido artigo 174.°, esclarecendo e precisando a noção legal de novidades, condição basilar da garantia con- cedida por tal instituição, preceituou no seu artigo 51.° não ser de considerar novo o modelo que, dentro ou

fora do País, já foi objecto de depósito anterior, e con- tinuou a permitir a anulação, já ordenada pelo ar- tigo 187.° e n.° 1.° da Lei de 1896, logo que se re- conheça que o modelo não tem novidade. Tanto pela lei antiga como pela lei nova não foram,

em conclusão, objecto de protecção legal os modelos que não sejam novos, não podendo ser-lhes concedidos ou conservados os respectivos títulos (artigo 174.° da Lei de 1896 e artigo 43.° do código de 1940). Não tendo Unno Rikkonen requerido o direito de prioridade em Portugal, nos termos do artigo 4.° da Convenção de Paris de 20 de Março de 1883, e faltando ao original português o requisito de novidade, o modelo depositado em Portugal havia caído no domínio público.

Quando, porém, se entendesse que tal originalidade só passou a ser exigida pelo novo Código da Proprie- dade Industrial, a situação jurídica constituída, como muito bem diz o ilustre agente do Ministério Público junto deste Tribunal, ficava sujeita à aplicação das re- gras que constam desse artigo, por não exceptuada delas.

As leis relativas à propriedade (e a propriedade in- dustrial tem a mesma natureza que a propriedade na lei civil regulada), diz-se no lugar citado por aquele douto magistrado (Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, vol. IV, pp. 233 e segs.), aplicam-se imediatamente a todos os proprietários, que estão sujeitos a todas as transformações e evoluções dos direitos que o objecto dela exige. E m tais condições, era irrelevante a alegada prescri-

ção como meio de aquisição de propriedade do primeiro dos referidos modelos, fundada numa pretendida de- safectação tácita do domínio público em que ele caíra pela falta de depósito em Portugal do modelo do súb- dito finlandês. Sempre se observará, porém, que, mesmo que assim

não fosse, não podia entender-se ter havido no caso de- safectação, que é faculdade exclusiva das entidades de direito público, embora nem sempre exigida uma de- claração expressa (M. Rodrigues, p. 148), por isso que o Estado, ao conceder e manter a propriedade do modelo à recorrente, partia do pressuposto, conside- rado então verdadeiro, de ter sido ela o seu criador e desconhecia a sua entrada no domínio público por falta daquele depósito. Paul Roubier, no seu notável trabalho sobre a pro-

priedade industrial, é de parecer que o depósito do modelo não desapossa, em proveito do que toma a ini- ciativa de o fazer, nem o domínio público nem o ver- dadeiro autor do modelo. O Prof. Marcelo Caetano, no seu Manual de Direito

Administrativo, 3.ª ed., p. 595, diz que a grande di- ficuldade em admitir a desafectação tácita reside em determinar quais os casos em que a Administração pro- cede intencionalmente. O exame sumário referido no artigo 183.°, n.° 5.°,

da Lei de 1896 não constituía uma investigação sufi- cientemente ampla para se ficar sabendo se o modelo a conceder caíra ou não no domínio público nem se o depositante era ou não, como se inculcava, o seu ver- dadeiro criador. Daí o não importar à concessão do título que o modelo depositado fosse efectivamente novo, como se dispunha no já referido artigo 156.°, e o dizer- -se agora, no artigo 46.° do actual código, que a con- cessão do depósito implica mera presunção jurídica de novidade. O desconhecimento em que se estava im- pede se tome o acto da concessão do modelo como re- núncia intencional por parte do Estado aos direitos provenientes da sua posse no domínio público.

Nas conclusões f) a i) da sua alegação, afirma ainda a recorrente que a acção caducou desde que se consi- derem aplicáveis ao caso os artigos 632.° e 635.° do Código Civil, pois se verificaria a hipótese prevista no n.° 2.° daquele artigo 632.° A própria recorrente reconhece, porém, que tais arti-

gos, versando, de resto, sobre a propriedade dos inven- tos, e não sobre a dos modelos, ainda não previstos especialmente no Código Civil, estão revogados pelas leis que posteriormente vieram regular a propriedade industrial. Acresce que, não tendo essa caducidade sido apre-

ciada como motivo de rejeição in limine, nos termos do artigo 481.°, n.° 3.°, do Código de Processo Civil, só poderia ela operar como consequência de excepção peremptória, oportunamente alegada, visto não ser do conhecimento oficioso dos tribunais, e tal alegação não foi feita pela ré recorrente. E porque assim se não podem dar como violadas ou

erradamente interpretadas e aplicadas as disposições legais citadas nas conclusões do recorrente se nega a revista, com custas pela recorrente.

Lisboa, 26 de Março de 1957. - Mário Cardoso - A. Gonçalves Pereira - Agostinho Fontes - A. Sam- paio Duarte - Lencastre da Veiga.

Declaração

Declara-se, para os devidos efeitos, que este acórdão foi devidamente notificado, tendo transitado em jul- gado.

Secretaria do Supremo Tribunal de Justiça, 12 de Abril de 1957. - O Chefe da 1.ª Secção, João Alves de Nóbrega.