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Desafios à modernização do sistema portuário brasileiro: a experiência do porto de Santos. MOACIR DE MIRANDA OLIVEIRA JR. Mestre e Doutorando em Administração FEA/ USP esde o início do processo de privatização e desregulamentação brasileiro iniciado no Governo Collor - de melancólico final - o sistema portuário brasileiro tem se constituído talvez no mais emblemático dos setores quanto à representação das resistências e dificuldades colocadas rumo à modernização e eficência necessárias. Alguns avanços foram realizados no curto mandato do Presidente Itamar Franco e neste-primeiro ano do Governo Fernando Henrique Cardoso, mas são grandes os desafios a serem superados até que o sistema portuário brasileiro possa atender às demandas que são colocadas frente às novas bases da competitividade impostas pela globalização. A discussão sobre a importância dos portos no desenvolvimento econômico brasileiro, e qual o caminho que a reforma portuária deveria tomar, foi objeto de pesado jogo de forças políticas e ocupou significativo espaço na mídia nos últimos anos, principalmente até a promulgação da Lei 8.630/93, conhecida como Nova Lei dos Portos. O objetivo desta pesquisa foi contribuir para o esclarecimento acerca de alguns aspectos polêmicos quanto à modernização do sistema portuário brasileiro. Os resultados desta pesquisa apontam importantes desafios a serem superados quanto às relações de trabalho e gestão de recursos humanos; quanto à inadequação da tecnologia e dos equipamentos utilizados nas operações portuárias; e quanto à indefinição do modelo de gestão portuário que articula Estado e capital privado após a promulgação da Lei 8.630/93. Foi definida para esta pesquisa a forma de um estudo de caso. A opção pelo Porto de Santos se deu por ser o mais representativo, devido ao fato de ser isoladamente o porto com maior tonelagem movimentada (excluídos granéis líquidos), e por onde circula o maior volume de divisas referente à exportação e importação. Outro fator que determinou a escolha do porto de Santos é que ele pode ser definido como porto universal 1 , uma vez que realiza a maior parte das funções atribuídas a um embarcadouro deste tipo. O Porto de Santos A Companhia Docas do Estado de São Paulo é uma sociedade de economia mista, de capital autorizado, vinculada ao Ministério dos Transportes, regendo-se pela legislação relativa às sociedades por ações 2 , que tem por objetivo realizar a administração e a exploração comercial do Porto de Santos e demais instalações do Estado de São Paulo. O Porto de Santos conta hoje com 11.600m de cais acostável, com profundidade entre 6,6 e 13,5m, pertencentes à CODESP. Além disso, existem mais 1.413m de cais, com profundidades entre 5,0 e 11,0m, de uso privativo. O Porto possui 11 berços de atracação, 78 armazéns, com capacidade total de armazenagem de 1.200.000t, podendo ainda ser estocadas em pátios e galpões 400.000t. O Porto de Santos é o maior da América Latina. Em 1992 movimentou 28,5 milhões de toneladas, sendo que 70% desta tonelagem pelo cais da CODESP, e os demais 30% pelos terminais de uso privativo da COSIPA (produtos siderúrgicos e seus insumos), DOW QUÍMICA (produtos químicos), ULTRAFÉRTIL fertilizantes e matérias

Desafios à Modernização do Sistema Portuário Brasileiro

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de ser isoladamente o porto com maior tonelagem movimentada (excluídos granéis líquidos), e por onde circula o maior volume de divisas referente à exportação e importação. Outro fator que determinou a escolha do porto de Santos é que ele pode ser definido como porto universal 1 , uma vez que realiza a maior parte das funções atribuídas a um embarcadouro deste tipo. MOACIR DE MIRANDA OLIVEIRA JR. O Porto de Santos Mestre e Doutorando em Administração FEA/ USP

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Desafios à modernização do sistema portuário brasileiro:

a experiência do porto de Santos. MOACIR DE MIRANDA OLIVEIRA JR.

Mestre e Doutorando em Administração FEA/ USP

esde o início do processo de privatização e desregulamentação brasileiro iniciado no Governo Collor - de melancólico final - o sistema portuário brasileiro tem se constituído talvez no mais emblemático dos setores quanto à representação das resistências e dificuldades colocadas rumo à modernização e eficência necessárias. Alguns avanços foram realizados no curto mandato do Presidente Itamar Franco e neste-primeiro ano do Governo Fernando Henrique Cardoso, mas são grandes os desafios a serem superados até que o sistema portuário brasileiro possa atender às demandas que são colocadas frente às novas bases da competitividade impostas pela globalização.

A discussão sobre a importância dos portos no desenvolvimento econômico brasileiro, e qual o caminho que a reforma portuária deveria tomar, foi objeto de pesado jogo de forças políticas e ocupou significativo espaço na mídia nos últimos anos, principalmente até a promulgação da Lei 8.630/93, conhecida como Nova Lei dos Portos. O objetivo desta pesquisa foi contribuir para o esclarecimento acerca de alguns aspectos polêmicos quanto à modernização do sistema portuário brasileiro.

Os resultados desta pesquisa apontam importantes desafios a serem superados quanto às relações de trabalho e gestão de recursos humanos; quanto à inadequação da tecnologia e dos equipamentos utilizados nas operações portuárias; e quanto à indefinição do modelo de gestão portuário que articula Estado e capital privado após a promulgação da Lei 8.630/93.

Foi definida para esta pesquisa a forma de um estudo de caso. A opção pelo Porto de Santos se deu por ser o mais representativo, devido ao fato

de ser isoladamente o porto com maior tonelagem movimentada (excluídos granéis líquidos), e por onde circula o maior volume de divisas referente à exportação e importação.

Outro fator que determinou a escolha do porto de Santos é que ele pode ser definido como porto universal1, uma vez que realiza a maior parte das funções atribuídas a um embarcadouro deste tipo.

O Porto de Santos

A Companhia Docas do Estado de São Paulo é uma sociedade de economia mista, de capital autorizado, vinculada ao Ministério dos Transportes, regendo-se pela legislação relativa às sociedades por ações 2 , que tem por objetivo realizar a administração e a exploração comercial do Porto de Santos e demais instalações do Estado de São Paulo.

O Porto de Santos conta hoje com 11.600m de cais acostável, com profundidade entre 6,6 e 13,5m, pertencentes à CODESP. Além disso, existem mais 1.413m de cais, com profundidades entre 5,0 e 11,0m, de uso privativo.

O Porto possui 11 berços de atracação, 78 armazéns, com capacidade total de armazenagem de 1.200.000t, podendo ainda ser estocadas em pátios e galpões 400.000t.

O Porto de Santos é o maior da América Latina. Em 1992 movimentou 28,5 milhões de toneladas, sendo que 70% desta tonelagem pelo cais da CODESP, e os demais 30% pelos terminais de uso privativo da COSIPA (produtos siderúrgicos e seus insumos), DOW QUÍMICA (produtos químicos), ULTRAFÉRTIL fertilizantes e matérias

primas), CUTRALE (sucos cítricos, soja e pellets) e CARGILL (soja e pellets).

Primeiro porto a movimentar conteineres no Brasil, o Porto de Santos responde hoje por pouco mais da metade do movimento de conteineres dos portos brasileiros. Acusa um crescimento de 220% no seu movimento deste tipo de carga desde a entrada em funcionamento do Terminal de Conteineres, em 30 de agosto de 1981.

Modernização da gestão portuária; Tecnologia e know-how

A indústria portuária joga um peso central na competitividade da economia dos países. A

eficiência - associada à agilidade das operações, integridade das cargas e baixo custo - é determinante para o atendimento de prazos e preços competitivos no mercado internacional.

Como podemos ver no quadro a seguir, a terceira geração de portos, de acordo com a classificação proposta pela UNCTAD em 1992, deve estar focada no cliente, com uma forte vocação comercial, integrando o porto e as áreas de retroporto com a cadeia de transportes; deve ocorrer uma forte integração da comunidade portuária (inclusive pela gestão municipalizada dos portos), tendo como principais modalidades de carga transportada os granéis e unitizados e a carga conteinerizada.

Como podemos ver pelo quadro, os principais elementos indutores de vantagem competitiva na industria portuária hoje são a tecnologia e o know-how. Ou seja, a visão das operações portuárias como forte mão-de-obra intensiva é algo em fase terminal

Conteinerização: a indústria portuária se torna capital-intensiva

NISHIZAWA( 1992) afirma que o transporte conteinerizado foi visto pela primeira vez no transporte marítimo internacional em 1966, com o navio conteiner modificado Estados Unidos, distribuído em serviço transatlântico, carregando 226 unidades de conteineres de 35 pés3.

COUPER(1986) explica que o ímpeto inicial no sentido da mecanização nos portos data de meados dos anos 40, a partir da América do Norte e oeste europeu, que detinham os mais altos custos com mão-de-obra. Entretanto, as maiores pressões pela unitarização e conteinerização vieram a partir das companhias com linhas regulares de carga, a partir dos anos 60. Essas companhias perceberam que o tempo de permanência nos portos estava continuamente crescendo e em algumas rotas constituía aproximadamente 60% dos custos de operação.4

HIROMOTO(1992) afirma que as principais características que foram proporcionadas pela conteinerização foram as seguintes:

"a. À medida que os tipos de carga tornam-se padronizados, torna-se mais fácil usar diversos sistemas de transporte;

b. Como resultado, as manobras de carga têm sido feitas com maior rapidez, e o fluxo do transporte

porta-a-porta tem apresentado grandes melhorias; c. Como houve redução no tempo das

manobras de carga, tornou-se possível aumentar o tamanho das embarcações e reduzir os custos, aproveitando o transporte em larga escala;

d. A embalagem dos produtos foi simplificada, e o peso da carga diminuiu. Reduziram-se os danos causados às embalagens por vermes, ratos e umidade; os prêmios de seguro também sofreram redução;

e. Devido à padronização e automatização da documentação de transporte, o processo burocrático tornou-se melhor e mais rápido;

f. As manobras de carga foram padronizadas; reduziu-se a mão-de-obra e o uso de equipamentos de grande porte."5

A conteiner ização oferece grande flexibilidade no manuseio de cargas. O conceito de unitarização permite que as mais variadas cargas possam ser transportadas a partir de um volume padronizado, agil izando os processos de manipulação de cargas e acarretando as vantagens acima citadas. Podemos afirmar que, depois do surgimento dos portos organizados e da adoção de guindastes para manipulação de carga, a conteinerização é a mais importante mudança ocorrida na história da indústia portuária.

O transporte marítimo responde hoje por 90% do transporte de carga no comércio internacional6. O crescimento da importância do transporte de carga por via marítima acentuou-se a partir da década de sessenta e acarretou transformações radicais de natureza organizacional e tecnológica nas organizações portuárias.

Segundo COUPER(1986), de 1970 a 1981 o tráfego de mercadorias movimentadas em containeres em nível mundial cresceu de 47 milhões de toneladas para 280 milhões de toneladas, numa

taxa anual de crescimento de 18,5%7.

O gráf ico ao lado apresenta o desempenho do Porto de Santos na movi-mentação de conteineres.

Como podemos verificar pelo gráfico, o Porto de Santos parece estar com sua capa-cidade de manipulação de carga conteinerizada estran-gulada, haja visto que o volume

de manipulação deste tipo de carga parou de crescer, apesar da tendência mundial de migração de outros tipos de carga para a carga conteinerizada. De fato, desde a inauguração do TECON - Terminal de Conteineres, em 1981, não houve nenhum grande aporte de recursos no sentido de capacitar o Porto de Santos para lidar com a tendência mundial e sempre crescente de manipulação de carga conteinerizada.

Um levantamento dos equipamentos utilizados nos processo de manipulação de carga no Porto de Santos nos proporciona um quadro desta ausência de investimentos e nos mostra que grande parte da tecnologia empregada nos processos de manipulação de carga está bastante aquém da que se espera do ancoradouro mais importante da América Latina. Isto nos leva a questionar a validade de análises comparat ivas , pr incipalmente nos meios de comunicação, de desempenho entre os portos brasileiros e alguns dos principais portos de outros países, pois não podemos comparar desempenho e produt ividade a part ir de uma grande heterogeneidade de capital intensidade e atualização tecnológica.

Os dados a seguir ajudam também a entender a estabilização dos volumes referentes à quantidade de carga conteinerizada e manipulada, contrariando a tendência mundial de crescimento de carga desta natureza, e a conseqüente ineficiência associada à manipulação de carga pelos padrões tradicionais, em comparação aos novos padrões determinados pela manipulação de carga conteinerizada em terminais especializados.

Os dados são os seguintes8:

de 30 anos (38,5%), e apenas um terço destes equipamentos possui menos de dez anos de uso.

A realidade é ainda mais crítica para os guindastes elétricos da CODESP, que não podem ser utilizados com recursos de "grab"(48,6% com mais de 30 anos). Em termos percentuais o quadro pode ser visualizado a seguir.

A maior parte dos guindastes elétricos da CODESP que podem ser utilizados com recuros de "grab" (pá coletadeira em forma de cunha, utilizada para manipulação de granéis sólidos) estão com mais

Relações de trabalho nos portos: "Enxugamento", mudanças nas

qualificações requeridas e terceirização

COUPER( 1986) afirma que os trabalhadores, portuários podiam ser classificados anteriormente como desqualificados ou semi-qualificados. Após o advento das novas tecnologias estes trabalhadores passaram a ser classificados como desqualificados ou altamente qualificados.

Apesar de haver ainda tarefas repetitivas nos sistemas de conteineres, há também trabalhos que exigem alta qualificação, iniciativa e raciocínio rápido, e do qual dependem a velocidade e a segurança de operações altamente dispendiosas, bem como uma complexa cadeia de transportes.

COUPER(1986) registra que, em pesquisa realizada em 44 portos de todos os continentes, o número total de trabalhadores operacionais, que era de 201.958 em 1970, passou a 144.083 no início dos anos 80, uma redução média de 28,7%. Para os países desenvolvidos a queda média foi de 30%, e para os países em desenvolvimento de 15,7%. Ele atribui essa d i ferença nos países em desenvolvimento à legislação ou pressão sindical, ou a ambos os fatores.

Como conseqüência da mudança dos processos de trabalho, o trabalhador polivalente tem sido aceito já em vários portos. Segundo

COUPER(1986)9, operadores de manipulação de cargas são freqüentemente treinados num conjunto de veículos e máquinas que vão de caminhões a guindastes móveis.

Esta tendência à multiqualificação tem entretanto sido alvo de resistência de entidades sindicais em muitos países, que avaliam que esta medida implica em perda implícita de postos de trabalho.

O Sr. Bartolomé de Boer, do Serviço das Indústrias Marítimas da Sede Central da OIT -Organização Internacional do Trabalho, destacou, em encontro realizado em Callao, no Peru, as necess idades de capaci tação dos países em desenvolvimento, assinalando que existe uma população a capaci tar de aproximadamente 1 .200.000 t raba lhadores , e para a tender a necessidade de capacitação desta população é necessár io formar aproximadamente 35.000 Instrutores Portuários.

A formação de recursos humanos, segundo ainda o representante da OIT, é vital para pôr em funcionamento os novos sistemas operativos de acordo com os avanços tecnológicos capazes de gerar melhores serviços, mais ágeis e mais seguros.10

Os dados co le tados jun to à CODESP configuram um quadro de mudanças importante na quantidade de postos de trabalho dos doqueiros. O Relatório Anual de 1992 informa que em 1974 a quantidade de funcionários na CODESP era de 16.287, salientando a redução crescente do quadro de pessoal pelo qual a empresa vem passando, e ressaltando os esforços da empresa em reduzir este quadro de forma a aumentar a produtividade e "adequar o número de funcionários às suas reais necessidades"".

O quadro a seguir nos dá a dimensão do processo em curso.

Dos 181 cargos existentes no Plano de Car-gos e Salários em vigor na CODESP, um único cargo, o Trabalhador de Capatazias, responde por mais de 25% (898 sobre 3538) da perda de postos de trabalho da CODESP. O Trabalhador de Capatazias é, dentre os cargos operacionais, o de menor nível de qualificação requerida, e podemos infer i r que a perda de pos tos de t rabalho operacionais está se concentrando nos cargos menos qual i f icados , que estão se tornando desnecessários com a conteinerização.

Durante a fase de levantamento de dados primários, foi analisada a relação dos contratos em andamento na CODESP em 30/11/93. Eram 111 os contratos administrados pela CODESP nesta data.

Foi rea l izada uma ca tegor ização que representasse as principais atividades contratadas a terceiros, e tivemos o seguinte resultado:

1. Contratos de locação de equipamentos para utilização nas Operações Portuárias : 17 2. Contratos relacionados à dragagem do porto: 4 3. Manutenção Operacional: 21 4. Manutenção de equipamentos adminis-trativos e de apoio : 5 5. Obras e manutenção civil: 9 6. Manutenção elétrica e eletrônica: 8 7. Consultoria em engenharia: 12 8. Consultoria administrativa: 7 Como podemos observar, é elevado o índice

de repasse de atividades a terceiros na CODESP e está principalmente localizado nas atividades de manutenção e, em segundo lugar em importância, na locação de equipamentos operacionais. As atividades de consultoria também ocupam um papel importante nas atividades contratadas junto a terceiros.

Podemos inferir que a diminuição de postos de t rabalho nos quadros da CODESP está também fortemente associada à terceirização de ativi-dades, o que implica que a perda de postos de trabalho verificada na CODESP pode estar sendo com-pensada em algum nível pelo surgimento de postos de trabalho nas empresas contratadas.

A partir do Governo Sarney foram tomadas algumas medidas no

sentido de restringir as contratações de forma a acelerar o processo de "enxugamento" das organizações portuárias brasileiras e da CODESP em particular. Das entrevistas realizadas com os administradores da CODESP, dois Decretos foram ressaltados dentro do contexto de restrição às contratações de mão-de-obra na empresa. São eles o Decreto 95.682, de 26 de janeiro de 1988, alterado pelo Decreto 95.781 de 04 de março de 1988, assinados pelo ex-Presidente José Sarney e ministros; e o Decreto 17, de 1 de fevereiro de 1991, assinado pelo ex-Presidente Fernando Collor e ministros. O conteúdo dos decretos proibia a contratação de mão-de-obra para empresas estatais e parece es tabelecer uma for te relação de complementaridade com a política de privatização proposta pelo Governo Federal, onde a terceirização seria mais um passo no processo.

Seguindo padrões de atuação de portos internacionais, a partir de 1991 a CODESP procedeu ao estabelecimento de quatro Resoluções da Presidência concedendo estímulo pecuniário para o desligamento da empresa.

A primeira delas foi a Resolução da Presidência n. 51/91, de 16 de abril de 1991, que concedia em caráter temporário incentivo pecuniário aos empregados em condições de se aposentar.

A segunda e a terceira são as resoluções 175/ 93 e 176/93, ambas de 18 de junho de 1993, a primeira também concedendo em caráter temporário incentivo pecuniário aos empregados em condições ide se aposentar, e a segunda com o mesmo caráter, mas tendo como público-alvo os funcionários de hidrovias, também ligados à CODESP.

A quarta Resolução da Presidência é a de número 272/93, de 5 de outubro de 1993, que con-cede incentivo pecuniário ao desligamento voluntário de empregados. Diferentemente das demais resoluções, esta expande o seu público-alvo para todos os funcionários da CODESP interessados em desfrutar do abono pecuniário e não apenas àqueles em condições de se aposentar.

A nova lei dos portos e o modelo de gestão portuário

Em 25 de fevereiro de 1993 foi promulgada a Lei 8.630/93. Esta lei foi tratada pela grande imprensa como a Lei de Modernização dos Portos.

Os principais aspectos da reforma aprovada na câmara, e que constam da nova lei, são: "a) descentralização com criação de Autoridades Portuárias nos Conselhos, nos quais serão representadas todas as partes interessadas; b) possibilidade de transferir os portos públicos a entidades privadas; c) opção para os terminais privativos operarem cargas de terceiros; d) privatização da operação portuária; e) criação, em todos os portos, de órgãos de gestão da mão-de-obra portuária, acabando com as atividades de empresa monopolista de trabalho temporário desenvolvidas pelos sindicatos de trabalhadores avulsos, no fornecimento de mão-de-obra para a estiva (closed shop); e f) autonomia tarifária das Autoridades Portuárias."12

A Lei 8.630/93 se propõe a mudar radicalmente o cenário das relações de trabalho portuárias no Brasil. O closed shop, ou controle do mercado de t rabalho exercido pelos t rabalhadores que não possuem vínculo empregatício, no Brasil chamados de avulsos, seria extinto e as atribuições dos sindicatos de avulsos passariam para os Órgãos Gestores de Mão-de-Obra.

Além disso, os trabalhadores terão assento, ao lado de empresários e Governo, no CAP -Conselho de Autor idade Por tuár ia , órgão responsável pelagestão estratégica descentralizada do Porto de Santos, constituindo a chamada "gestão tripartite" dos portos.

A nova lei propõe também a criação de uma força de trabalho multiqualificada, que possa atender às demandas por maior produtividade no setor, adequar-se às novas tecnologias e, mas não explicitamente, "quebrar" a poderosa estrutura sindical portuária dos trabalhhadores avulsos, organizada por categorias.

Finalmente, a nova lei cria as condições para a privatização dos portos brasileiros. E nesse ponto que toma forma a indefinição quanto ao modelo de gestão a ser aplicado aos portos brasileiros. Seguindo o princípio da desregulamentação e dos estímulos à negociação entre as partes, a nova lei ao criar a figura do "operador portuário" não explicita a forma como deve ser feita a concessão para a operação do porto pelas empresas privadas. Uma possibilidade, por exemplo, seria o "lotea-mento" dos diversos cais de atracação entre os

operadores portuários interessados. Outra opção seria a concessão de todo o porto para um pool de operadores portuários que partilhariam seus interesses, e ainda uma outra opção seria a combinação anterior com a supervisão pela CODESP, alçada à condição de "reguladora". Os prazos das concessões também são um dos pontos importantes da questão. São diversas as possibilidades e o CAP - Conselho de Autoridade Portuária - tem para si a responsabilidade de resolver essa indefinição. Uma das questões decorrentes desta indefinição é a responsabilidade pelos inadiáveis investimentos em infra-estrutura e equipamentos, que vimos que são mais do que prementes.

Conclusões

O Porto de Santos está em fase bastante avançada de terceirização de atividades. Associados a estes processos, medidas do Governo Federal e da Presidência da CODESP de restrição às contratações e de estímulo à aposentadoria e demissão voluntár ias , respect ivamente, complementam o quadro de diminuição da participação do Estado na gestão portuária, abrindo caminho para a privatização do setor. Neste contexto, a Lei 8.630/93 veio criar as condições para este propósito.

A articulação destes fatos levou a uma redução bastante acentuada no quadro de pessoal da CODESP, principalmente dos trabalhadores menos qualificados. A flexibilidade no contrato de trabalho, na fo rma de remuneração e na possibilidade dos trabalhadores executarem mais de uma atividade já está em curso, apontando para uma transformação significativa nos padrões de relações de trabalho no Porto de Santos.

Entretanto, a pesquisa aponta algumas dificuldades para o avanço das mudanças nas organizações portuárias brasileiras, e no Porto de Santos em particular. São três os principais desafios colocados:

1. A inadequação da infra-estrutura associada à obsolescência dos equipamentos utilizados nas operações portuárias, face às demandas colocadas pela conteinerização e modernização dos navios; 2. Problemas na gestão de recursos humanos, com trabalhadores pouco comprometidos e pouco qualificados e relações de trabalho ainda pouco claras;

3. Indefinição quanto ao modelo de gestão a ser adotado após a promulgação da Lei 8.630/93.

Estas questões entrelaçam-se e se interde-terminam.E preciso que se defina o modelo de gestão para que se atribuam responsabilidades quanto aos investimentos em infra-estrutura e equipamentos.

Ao longo da condução do necessário processo de mudanças, a opção pelo confronto en t re e m p r e s á r i o s e as ca t ego r i a s de trabalhadores avulsos portuários tem sido uma es t r a t ég ia que se most rou ine f i caz até o momento. Mesmo após a promulgação da Lei 8.630/93, o closed shop persiste. Aspectos relacionados ao desenvolvimento e qualificação des ta f o r ç a de t r aba lho avu l sa às novas demandas técnicas e organizacionais foram ao longo do tempo completamente relegadas, seja pelos empresários do setor, que os remuneram, seja pelos próprios sindicatos que, fechados na de fe sa de in te resses co rpo ra t i v i s t a s , não atentaram para a defasagem e vulnerabilidade em que estavam incorrendo.

Entretanto há aspectos positivos e avanços a ressaltar. A atual estrutura decisoria definida pela Lei 8.630/93, descentralizando para a esfera do Porto de Santos as grandes orientações estratégicas para a gestão eficiente, através do CAP - Conselho de Autoridade Portuária, oferece uma oportunidade excelente para o avanço das mudanças centrada na transparência de interesses e compromissos das diversas partes envolvidas diretamente: estado, t rabalhadores e empresár ios , bem como a comunidade santista.

A existência de uma instância decisoria de caráter estratégico, com assento para todas as partes, oferece ainda a possibi l idade de coordenação do processo de mudanças e definição conjunta dos papéis a serem desempenhados pelos agentes envolvidos nas operações portuárias, dada a necessidade de definição de um novo modelo de gestão para o Porto de Santos.

Esse são passos importantes na direção de uma gestão eficiente no Porto de Santos, que podem alavancar as condições para as correções que se fazem necessárias, de forma a gerar o comprometimento dos trabalhadores com a qual idade, produtividade e eficiência do Porto de Santos; aportar a infra-estrutura e tecnologia necessárias e definir os papéis no novo modelo de gestão.