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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO LINHA DE PESQUISA: POLÍTICAS PÚBLICAS E PRÁTICAS EDUCATIVAS DESENHO ANIMADO E EDUCAÇÃO: Calça Quadrada, Cabeça Redonda? MARGARIDA SONIA M. MONTE SILVA Orientadora: Profª. Dra. Adelaide Alves Dias JOÃO PESSOA 2010

DESENHO ANIMADO E EDUCAÇÃO: Calça Quadrada ......6 SILVA, Margarida Sonia Marinho do Monte. Desenho animado e educação: Calça quadrada, cabeça redonda? 2010 . 180p. Tese (Doutorado

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO LINHA DE PESQUISA: POLÍTICAS PÚBLICAS E PRÁTICAS ED UCATIVAS

DESENHO ANIMADO E EDUCAÇÃO: Calça Quadrada, Cabeça Redonda?

MARGARIDA SONIA M. MONTE SILVA

Orientadora: Profª. Dra. Adelaide Alves Dias

JOÃO PESSOA 2010

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MARGARIDA SÔNIA M. MONTE SILVA

DESENHO ANIMADO E EDUCAÇÃO: Calça Quadrada, Cabeça Redonda?

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba como requisito parcial para obtenção do grau de Doutora em Educação, sob a orientação da Profª. Dra. Adelaide Alves Dias.

JOÃO PESSOA 2010

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S586d Silva, Margarida Sônia M. Monte

Desenho animado e educação: calça quadrada, cabeça redonda?/ Margarida Sônia M. Monte Silva. – João Pessoa : UFPB, 2010.

167 f.: il.

Orientadora: Adelaide Alves Dias. Tese (Doutorado) – UFPB /CE.

1. Pedagogia crítica. 2. Desenho animado. 3. Representação simbólica. 4. Internalização. 5. Resistência.

UFPB/BC CDU: 37.013(043)

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MARGARIDA SONIA M. MONTE SILVA

DESENHO ANIMADO E EDUCAÇÃO: Calça Quadrada, Cabeça Redonda?

Aprovada em: ____/____/______

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________ Orientadora: Profª. Drª. Adelaide Alves Dias – UFPB

___________________________________________________ Profº. Dr. Walter Matias Lima – UFAL

____________________________________________________ Profª. Drª. Glória das Neves Dutra Escarião – UFPB

____________________________________________________ Profª. Drª. Sônia de Almeida Pimenta – UFPB

____________________________________________________ Profº. Dr. José Vaz Magalhães Neto – UFPB

JOÃO PESSOA 2010

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A Gilberto, lugar seguro das minhas lembranças. A João Gabriel, filósofo e razão da minha vida. A Sarinha, anjo e alegria do meu viver.

Dedico

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AGRADECIMENTOS

Ao Deus misericordioso, por ter me concedido mais uma vitória na minha vida.

Aos meus queridos pais, José e Giselda, obrigado por tudo que me ensinaram e me apoiaram por toda uma vida.

Aos meus irmãos: Hildebrando, Edmundo e Leonardo em cuja determinação eu me espelho.

Às minhas irmãs, companheiras e amigas, fontes de apoio incondicional, Lúcia, Helena e Zelinha, que carinhosamente chamo de: As três Marias.

A João Gabriel que, com sua “filosofia infantil”, me motivou a escolher o tema desse trabalho e pelas suas sugestões durante o percurso de elaboração.

A Sarinha, que com alegria, serenidade e companheirismo tornou menos árdua a caminhada.

À direção, ao corpo docente e aos funcionários da Escola de Educação Básica da Universidade Federal da Paraíba, pela acolhida carinhosa e por permitirem a realização da pesquisa.

Às amadas crianças participantes da pesquisa de campo, que com seu conhecimento e capacidade me conduziram a saber mais sobre elas.

A Michelle Kely Batista Silva, pelo seu excelente trabalho de filmagem das rodas de conversa.

À profª. Drª. Adelaide Alves Dias que orientou esse trabalho, obrigada pelo profissionalismo eficiente, pela justiça e principalmente pela amizade.

À amiga Nazaré Zenaide sempre presente em minha vida com sua ajuda eficiente, amizade grandiosa, incentivo constante e humildade edificante. Obrigada por permanecer minha amiga.

A Mara Simões, que com bondade esteve presente, de maneira prestimosa sem reclamar diante dos meus inúmeros limites.

A todos os colegas da turma 26 do Doutorado em Educação pelo incentivo e companheirismo.

Finalmente, a todos que contribuíram para a realização deste trabalho.

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SILVA, Margarida Sonia Marinho do Monte. Desenho animado e educação: Calça quadrada, cabeça redonda? 2010 . 180p. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal da Paraíba. Universidade Federal da Paraíba – UFPB, João Pessoa, 2010.

RESUMO

A tese contém uma análise da relação entre os conteúdos transmitidos pelo desenho animado Bob Esponja e a formação da subjetividade infantil utilizando os conceitos de representação simbólica, internalização e resistência, baseados em Piaget (1978) Vygotsky (2007) e Giroux (1986), respectivamente. Nesta investigação, participaram 62 crianças de 03 a 05 anos, alunos da Escola de Educação Básica da Universidade Federal da Paraíba, matriculados nos turnos manhã e tarde em 2009. A pesquisa etnográfica utilizou a observação direta, entrevistas com os alunos e rodas de conversa antes e depois que os mesmos assistiram ao vídeo do desenho animado Bob Esponja. Os dados obtidos e submetidos a análise indicam que os conteúdos do referido desenho interferiram na subjetividade dos espectadores infantis de 03 e de 04 anos, em proporção maior do que naqueles de 05 anos. Esta interferência é demonstrada pela preferência em “ser” o personagem principal do desenho, adotando atitudes e comportamentos padronizados, no entanto, não os impedindo de acrescentar aos conteúdos do desenho animado um sentido próprio. A tese defende ainda que a educação escolar tem potencial para capacitar os alunos no sentido de educar para mídia televisiva, especificamente os desenhos animados, através do diálogo e análise crítica, procedimentos adotados pela pedagogia crítica. Concluímos que devemos integrar à escola os estudos de educação para a mídia televisiva, como instrumento pedagógico e como objeto de estudo para que se desenvolva nos alunos uma postura crítica diante dela. Palavras-chave : Desenho animado – Representação simbólica – Internalização – Resistência – Pedagogia crítica.

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SILVA, Margarida Sonia Marinho do Monte. Cartoon and education: square pants, round head? 2010. 180p. Thesis (Doctorate in Education) – Post-graduation Program in Education. Federal University of Paraíba. Federal University of Paraíba – UFPB, João Pessoa, 2010.

ABSTRACT

The thesis presents an analysis of the relation between the contents transmitted by the SpongeBob animated series and the infantile subjectivity formation using the concepts of symbolic representation, internalization and resistance based on Piaget (1978) Vygotsky (2007) and Giroux (1986) respectively. In this investigation sixty-two children, between 03 and 05 years old, took part. They were students from the Basic Education School of the Federal University of Paraíba, enrolled in the morning and afternoon shifts in 2009. The ethnographic research used the direct observation, interviews with the students and dialogues in circle before and after they watched the SpongeBob series video. The data obtained and submitted to analyses indicate that the contents, of the mentioned cartoon, intervened in the subjectivity of the infantile spectators, between 03 and 04 years old, in a proportion higher than in those who were 05 years old. Such interference is demonstrated by the preference of “being” the main cartoon character, adopting standardized attitudes and behaviors. Nevertheless, this does not prevent the children from adding their own meaning to the cartoon’s contents. The thesis still advocates that the school education has the potential to prepare the students as concerns educating them by means of the television media, specifically, the cartoons, through the dialogue and the critical analysis; procedures adopted by the critical pedagogy. We concluded that we should integrate to school the educational studies for the television media as both a pedagogical instrument and a study object so as to promote a critical behavior in the students in regard to the media. Keywords: Cartoon – Symbolic representation – Internalization – Resistance – Critical pedagogy.

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SILVA, Monte Margarida Marinho Sonia. Dibujos animados y educación: ¿pantalones cuadrados, cabeza redonda? 2010 .180p. Tesis (doctorado en educación) – Programa de posgrado en educación. Universidad Federal de Paraíba. Universidad de Federal de Paraíba – UFPB, João Pessoa, 2010.

RESUMEN La tesis presentada contiene un análisis de la relación de los contenidos transmitidos por el dibujo animado Bob Esponja y la formación de la subjetividad infantil mediante los conceptos de representación simbólica, internalización y resistencia, basados en Piaget (1978), Vygotsky (2007) y Giroux (1986) respectivamente. En esta investigación han participado 62 niños de 3 a 5 años, alumnos de la Escuela de la Educación Básica de la Universidad Federal de Paraíba, matriculados por la mañana y por la tarde en el año de 2009. La investigación etnográfica ha utilizado la observación directa, entrevistas con estudiantes y ruedas de conversación antes de que ellos hubieran visto el video del dibujo animado de Bob Esponja como también después de que lo habían visto. Los datos obtenidos y sometidos a análisis indican que los contenidos de ese diseño, interfiere en la subjetividad de los espectadores infantiles de 3 y de 4 años en una proporción más amplia que en los de 5 años. Esa interferencia es demostrada por la preferencia en "ser" el personaje principal del diseño, adoptando actitudes y conductas estandarizadas, sin embargo, no les impide añadir a los contenidos del dibujo animado un sentido propio. La tesis sostiene todavía que la educación escolar posee el potencial para habilitar a los alumnos hacia la educación de los medios de televisión, específicamente los dibujos animados, mediante el diálogo y el análisis crítico, procedimientos adoptados por la pedagogía crítica. Hemos llegado a la conclusión de que debemos integrar a la escuela, los estudios de educación para los medios de televisión, como una herramienta pedagógica además de un objeto de estudio para que se desarrolle en los aprendices una postura crítica frente a ella. Palabras clave: Dibujo animado – Representación simbólica – Internalización – Resistencia - Pedagogía crítica.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – D. A. Popaye .......................................................................................33

Figura 2 – D. A. Pockemon...................................................................................34

Figuras 3 – Desenhos Animados Disney .............................................................38

Figuras 4 – Contos de Fadas ...............................................................................39

Figura 5 – Maurício de Sousa e seus personagens .............................................39

Figura 6 – D. A. Pockemon ..................................................................................40

Figura 7 – Criança assistindo televisão ................................................................41

Figura 8 – Heróis de desenhos antigos ................................................................42

Figuras 9 – Produtos com ilustrações de desenhos animados ............................45

Figura 10 – D. A. As meninas super poderosas ...................................................46

Figura 11 – D. A. O Laboratório de Dexter ...........................................................47

Figura 12 – D. A. Dragon Ball-Z ...........................................................................47

Figura 13 – D. A. Pica-Pau...................................................................................48

Figura 14 – D. A. Jimmy Nêutron ........................................................................48

Figura 15 – D. A. Tom e Jerry ..............................................................................49

Figuras 16 – D. A. Bob Esponja Calça Quadrada ...............................................50

Figura 17 – D. A. Bob Esponja .............................................................................51

Figura 18 – Morada de Bob Esponja ...................................................................51

Figura 19 – Patrick ...............................................................................................52

Figura 20 – Lula Molusco .....................................................................................53

Figura 21 – Sr. Siriguejo.......................................................................................54

Figura 22 – Sandy ................................................................................................54

Figuras 23 – Produtos com ilustrações de Bob Esponja .....................................83

Fotos 1 – Brindes da lanchonete Burger King ......................................................83

Figuras 24 – Ilustrações de vários desenhos animados.....................................104

Figuras 25 – Ilustrações referentes ao d.a. Bob Esponja...................................105

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Nº total de alunos de 3 a 5 anos (2009) ..........................................102

Quadro 2 – Número de meninos e meninas pesquisados quanto ao

reconhecimento do desenho animado Bob Esponja, seus

personagens e sua preferência por eles. .......................................103

Quadro 3 – Caracterização das crianças em função do reconhecimento do

desenho animado Bob Esponja e sua preferência. .........................106

Quadro 4 – Número de alunos por turma e turno que participaram da segunda

fase da pesquisa: ............................................................................110

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LISTA DE SIGLAS

UFPB – Universidade Federal da Paraíba EEB – UFPB – Escola de Educação Básica da Universidade Federal da Paraíba D. A. – Desenho Animado CEMC – Cultura Educacional Mundial Comum AGEE – Agenda Globalmente Estruturada para a Educação

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SUMÁRIO

1 CONTEXTUALIZANDO O TEMA ....................................................................13 1.1 Criança e Visibilidade Social .......................................................................21 2 CULTURA INFANTIL E DESENHO ANIMADO ................................................30 2.1 A Televisão e o Telespectador ..................................................................30 2.2 Desenhos Animados ....................................................................................37 2.2.1 Um pouco da história...................................................................................37 2.2.2 Os desenhos animados e a criança ............................................................40 2.2.3 Se liga nessa!..............................................................................................44 2.2.4 Bob Esponja Calça Quadrada ...................................................................50 3 SUBJETIVIDADE E DESENVOLVIMENTO INFANTIL ....................................57 3.1 Construção, Interação, Cognição – Jean Piaget: Um olhar ......................58 3.2 Construção, Interação, Cultura – Lev, Vygotsky : Outro olhar .................65 3.3 Globalização, Indústria Cultural e Consumo .............................................72 3.4 Construção, Interação, Cultura, Resistência – Henry Giroux: Olhares que se cruzam ..............................................................................................88 4 ORGANIZAÇÃO DOS DADOS DA PESQUISA ..............................................98 4.1 Natureza e Lócus da Pesquisa ...................................................................98 4.2 Procedimentos na Construção e Análise dos Dado s..............................100 4.3 Descrição e Análise da Primeira Fase da Pesqui sa – Aproximação e Busca ..102 4.4 Descrição e Análise da Segunda Fase da Pesquis a – Interação e Registro .108 4.4.1 Escolha do episódio ..................................................................................108 4.4.2 Assistindo ao episódio...............................................................................110 4.4.3 Roda de conversa e confecção dos desenhos..........................................111 4.4.4 Você quer ser Bob Esponja? “Falas” das crianças.....................................113 4.4.5 Fazendo arte – fantasia e realidade .........................................................114 4.4.6 Na pista dos saberes.................................................................................155 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................159 REFERÊNCIAS ...................................................................................................161 APÊNDICES .......................................................................................................168

Apêndice 1 ....................................................................................................169 Apêndice 2 ....................................................................................................170

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1 CONTEXTUALIZANDO O TEMA

Estudiosos das mais diversas áreas de conhecimento dedicaram-se e ainda

se dedicam a pesquisar sobre desenhos animados e sua relação com a

comunicação, educação, brincadeiras e jogos, sexualidade, violência, estados

psicológicos e imaginário infantil. Os efeitos dos desenhos animados sobre quem os

assiste são incontestáveis. O que desejamos conhecer é como ocorre tal influência

numa determinada faixa etária do desenvolvimento humano.

Os desenhos animados são parte integrante da mídia televisiva que, hoje,

assume, junto à escola e à família, papel significativo na educação das novas

gerações. Com esta afirmativa não estamos atribuindo falta de autonomia aos

telespectadores diante da mídia televisiva. Apesar de sabermos que os textos

midiáticos são carregados de sentido e servem a propósitos e interesses

preestabelecidos, investigamos aquele que os recebe e sua relação com eles. A

criança, quando assiste aos desenhos animados, constrói sentido para o que vê na

televisão. O que nos interessa investigar é como eles influenciam a subjetividade de

crianças de 3 a 5 anos de idade. O desenho animado Bob Esponja Calça Quadrada

é o instrumento midiático que utilizamos para estudar essa relação. Diante de tais

concepções instituímos como tese para essa investigação:

O desenho animado Bob Esponja com seus conteúdos, ao mesmo tempo que diverte, interfere na formação da subjetividade de crianças de 3 a 5 anos de idade que, por sua vez, constroem sentido para o que assistem mediante o contexto social em que estão inseridas.

Nossos objetivos, nesse estudo são: investigar como ocorre o processo de

construção de sentidos em crianças de 3 a 5 anos de idade ao assistirem o desenho

animado Bob Esponja, isto é, como ele influencia em suas subjetividades; verificar

qual a frequência com que crianças de 3 a 5 anos assistem ao desenho animado

Bob Esponja, e a preferência em relação ao mesmo dentre outros desenhos

animados; atribuir à criança a condição de receber e participar como autora das

produções culturais; e, por último, pretendemos incentivar educadores a

desenvolverem o hábito de relacionar-se criticamente diante da mídia televisiva,

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especificamente diante dos desenhos animados, tornando-os em meios que

contribuam para o desenvolvimento infantil de forma emancipatória.

Apresentamos o trabalho de pesquisa através de 4 (quatro) capítulos. O

primeiro deles, que ora estamos escrevendo, intitula-se “Contextualizando o Tema”,

que contém a exposição da tese, objetivos, justificativa e considerações sobre os

capítulos desenvolvidos. Ainda nesse primeiro capítulo, dissertamos sobre a criança

e visibilidade social, a televisão e o espectador, os desenhos animados, contando

um pouco da história dos mesmos, sua relação com as crianças e descrevemos

alguns desenhos animados veiculados pela televisão brasileira. O desenho animado

Bob Esponja, que foi escolhido como instrumento na pesquisa, também é descrito

nesse primeiro capítulo. Bob Esponja Calça Quadrada é um desenho animado

veiculado através da televisão brasileira, desde 1999 e tem sido objeto de estudo de

dissertação de Mestrado, artigos de periódicos e de trabalho de conclusão de curso.

Citamos alguns desses estudos no desenvolvimento dessa investigação, a exemplo

de Boutin (2006) que apresentou a dissertação de Mestrado: “Aspectos Pedagógicos

do Desenho Animado Infantil Bob Esponja” à Universidade Metodista de São Paulo

em São Bernardo do Campo. Pillar (2009) com o artigo: “Efeitos de humor de Bob

Esponja” e Medeiros (2009) que apresentou: “Produções de sentido em Bob Esponja

Calça Quadrada”. Ainda Lira (2005) escreveu “O Merchandising Capitalista no

Desenho Bob Esponja” e Silva (2008) apresenta “Desenho Animado: Instrumento de

Manutenção Social”, ambos os trabalhos apresentados na conclusão de cursos de

Graduação.

Quanto a forma como abordamos a infância é concedendo-lhe visibilidade,

captando suas opiniões e concepções, não interpretando suas falas nem tampouco

transcrevendo-as. Consideramos que há a necessidade de não esquecer a criança

como sujeito, cidadã, que tem voz e que produz cultura. As crianças têm o direito de

dar um sentido diferente aos conceitos e ações e produzir uma nova leitura do

mundo, e queremos garantir a elas esse direito.

Estudar a mídia através de um desenho animado é investigar como ocorre a

relação entre mídia e ficção no desenvolvimento infantil. Lembramos que as

pesquisas revelam os desenhos animados como preferência das crianças, dentre

outras narrativas ficcionais (FANTIN, 2006). O desenho animado Bob Esponja Calça

Quadrada que é como instrumento na nossa pesquisa tem um dos maiores índices

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de audiência no Brasil, se comparado aos outros 170 países em que é veiculado

(PILLAR, 2009).

Como motivação pessoal, ao exercermos o magistério superior, temos

estudado o papel do desenho animado como estratégia pedagógica, acompanhando

o trabalho de conclusão de Curso de Pedagogia de alguns alunos estagiários.

Também apresentamos artigos em simpósios e congressos que tratam do desenho

animado como texto, e como seus conteúdos são compreendidos pelas crianças. O

interesse pelo estudo do desenho animado remonta ainda à constatação no seio

familiar, ou seja, nos filhos, da preferência desse tipo de mídia televisiva e a inerente

necessidade em acompanhar o desenvolvimento dos mesmos.

Outra justificativa podemos encontrar no papel que a televisão exerce na

vida das pessoas. Como meio de comunicação de massa ela tem um papel

importante na formação do sujeito como veículo de informação e comunicação junto

com outros meios (MOLINA e PRADOS, 2009). Às vezes é reconhecida como

estimuladora da violência, apatia e consumo, porém, também é reconhecida como

estimuladora do conhecimento, informação e diversão (FERNANDES, 2003). Advém

dessa dicotomia, a escolha do título da tese em questão. Quando apresentamos a

indagação Calça Quadrada, Cabeça Redonda?, estamos nos referindo à

possibilidade dos conteúdos do desenho animado Bob Esponja em homogeneizar

ou não o pensamento daqueles que o assistem. A realidade das crianças brasileiras

quanto à preferência pela televisão, além de outros meios midiáticos, é

acrescentada à preferência também de muitos pais, pois estando a criança

assistindo TV em casa, estaria, em termos, longe dos riscos que a rua oferece como

drogas, prostituição, roubo, violência, dentre outros, no horário oposto ao que

frequentam a escola. No Brasil, o tempo de permanência na escola ainda é inferior

ao que a criança permanece fora da escola.

Na escola, a TV não é utilizada como estratégia pedagógica na maioria das

vezes e, assim, os alunos assistem a filmes infantis, documentários, entrevistas,

desenhos animados, apenas como entretenimento. Quando bem planejada, essa

atividade alcança o objetivo proposto, e os alunos correspondem com prazer e

aprendizagem. Portanto, cabe aos educadores considerar a cultura da mídia como

uma força educacional substancial, uma pedagogia pública, como afirma Giroux

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(2003), e utilizá-la para a construção de conhecimento crítico, reflexivo e

emancipatório dos alunos.

Vejamos através dos tempos, como chegamos aos dias de hoje à cultura de

imagens.

Desde a Antiguidade Clássica até o Renascimento a tradição oral

prevaleceu na organização do conhecimento. Sem registros escritos, a fala

preenchia, além da função de comunicação, a de conservação do conhecimento.

Era a supremacia auditiva que, mesmo após o surgimento da escrita, perdurou por

muito tempo, pois o conhecimento da mesma era então monopólio de uma elite de

escribas alheia às massas iletradas. Até o século XV, a literatura existia para ser

narrada em público, e o manuscrito era apenas um instrumento acessório dessa

vasta e influente cultura oral.

A cultura tipográfica introduziu a visão como o primeiro dos sentidos na

hierarquia, tomando o lugar da audição. A linguagem escrita liberou o homem da

dependência da memória do falante para a aquisição do conhecimento. Por meio de

caracteres, a escrita conservaria o conhecimento.

Séculos depois, os meios eletrônicos estenderam e extrapolaram os limites

usuais da visão e da audição, alterando nossa realidade cotidiana. Uma

sensibilidade nova parece se instalar no indivíduo contemporâneo, cada vez mais

incapaz de viver sem estímulos audiovisuais.

Os meios de comunicação como jornal, rádio, televisão, trem, carro, moeda,

etc. são verdadeiras extensões do homem, pois servem para vinculá-lo aos outros

homens. Eles são mensagens que podem exercer efeitos distintos sobre a mente.

As sociedades contemporâneas industrializadas são consideradas

sociedades de massa, ou seja, compostas por grande número de indivíduos

anônimos. As instituições dominantes, escolas, igrejas, etc., tentam prover as

necessidades dessa multidão de pessoas. Essas instituições também criam outras

perspectivas, da mesma forma em que desenvolvem mecanismos eficazes para

controlar essas massas humanas, fazê-las produzir, consumir e se conformar.

Uma sociedade assim, exige mecanismos culturais adequados, capazes de

transmitir informações com rapidez para o maior número de pessoas possível. São

mecanismos que transmitem uma visão de mundo dos diferentes povos,

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ultrapassando barreiras de espaço físico e social. Tais instrumentos são

principalmente o rádio, a televisão, a imprensa e, mais recentemente, a informática,

que fazem parte da cultura niveladora, homogeneizadora, produto da indústria

cultural.

A indústria cultural, centrada nesses meios de comunicação de massa, tem

um ritmo acelerado de produção e consumo e constitui uma esfera da atividade

econômica. Ela ainda exerce um papel fundamental na organização social e está,

sem dúvida, associada ao exercício do poder e à ordenação da vida coletiva.

Os meios de comunicação de massa penetram em todas as esferas da vida

social moderna, no meio urbano ou rural, na vida profissional, nas atividades

religiosas, no lazer, na educação, na participação política. Eles também difundem

maneiras de se comportar, propõem estilos de vida, modos de organizar a vida

cotidiana, de se vestir, de construir sua casa, maneiras de falar e de escrever, de

sonhar, de sofrer, de pensar, de lutar, de amar.

Eles ainda funcionam de forma homogeneizadora dirigindo mensagens

comuns a todos, gerando necessidades e expectativas massificadas. “A lógica de

sua maneira de funcionar é o amaciamento dos conflitos sociais: A indústria cultural

parece homogeneizar a vida e visão do mundo das diversas populações” (SANTOS,

2005). Percebemos, no entanto, que a própria indústria cultural também está

suscetível a contradições na vida social. Sobre as mensagens transmitidas o

controle não é total, pois por mais homogêneo que seja o conteúdo delas não é

possível substituir integralmente a percepção das pessoas.

Os meios de comunicação, e, em particular a televisão, exercem alguma

influência sobre quem deles faz uso e utilizam a linguagem como instrumento. São

as palavras que levam os indivíduos a se modificarem, como também os gestos e as

imagens. A linguagem em geral, portanto, além de ser um conjunto de estímulos

(sinais) visuais compreende, ainda, o modo como as pessoas se organizam. Daí,

também, sabe-se que a “leitura” de elementos idênticos ou semelhantes pode ter

muitas possibilidades. Por conseguinte as consequências da linguagem podem ser

negativas ou positivas, dependendo do seu uso e dos meios que são utilizados para

transmiti-la. A linguagem exerce um papel importantíssimo na vida das pessoas.

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As novas tecnologias da comunicação introduziram outras linguagens, invadindo com imagens, som e informações, de maneira tão forte, intensa e insistente, quase todos os cantos e recantos do Planeta e de nossa privacidade (CARLOS, 2006).

É o texto – imagem, que reeduca o olhar, o perceber do espectador. A

imagem tem um papel fundamental na leitura de mundo, tanto para os letrados como

para os iletrados e, comprovadamente, mais para estes últimos.

Os programas televisivos têm o poder de ativar a percepção para os

diferentes níveis de consciência crítica. A ética presente na escolha das imagens

das imagens transmitidas pela televisão e cinema pode inibir ou estimular estilos de

conduta. O filósofo brasileiro Brissac Peixoto, 1992 (apud PAIVA, 2005) mostra a

potência do imaginário vigilante do cinema, orientando estilos de gosto e formas de

conduta, configurações ético-estéticas no cenário urbanizado das grandes cidades.

Com certeza, o telespectador tem a liberdade de exercer sua faculdade de julgar,

porém, devemos nos lembrar da possibilidade menor de que dispõem as crianças,

ainda, de utilizar seu senso crítico. Os desenhos animados povoam o imaginário

infantil de heróis e vilões que representam figuras sedutoras e poderosas, mas, às

vezes, estranhas e mesquinhas. Essa ambiguidade, pode não ser percebida pela

criança. A TV exerce uma ação de sedução e condicionamento sobre ela a ponto de

se transformar uma necessidade fundamental como alimentar-se ou divertir-se.

Através da TV são difundidas imagens junto às diversas culturas locais,

como um tipo de padronização do imaginário e estilo de vida, mobilizando momentos

preciosos de investimento afetivo. O caráter da interculturalidade dos programas

televisivos exibidos internacionalmente merece também atenção, quando nos

reportamos à mídia televisiva e à objetividade infantil.

As imagens televisivas trazem consigo outro tipo de ambiguidade, ou seja,

apresentam uma sátira dos costumes como também uma apologia das convenções

(PAIVA, 2005). Estaria de acordo com o caráter ambíguo da globalização, isto é,

inovar e conservar.

A outra reflexão que podemos destacar é que a dicotomia entre o bem e o

mal muitas vezes torna-se banal nos desenhos animados e para as crianças pode

não ficar claro o que é certo e errado. Nota-se que, nas tramas dos desenhos

animados, os humilhados e desgraçados pela ação do destino ou pela maldade dos

poderosos absorvem o espírito individualista, adquirem uma consciência ressentida

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do mundo e a partir de um plano pessoal partem para destruir seus algozes

(COSTA, 2002).

Passamos a descrever o segundo capítulo onde desenvolvemos o marco

teórico cujo título é Subjetividade e Desenvolvimento Infantil, e foi subdividido em

quatro sessões ou itens. Os conceitos de representação simbólica definido por Jean

Piaget (1978) e de internalização apresentado por Vygotsky (2007) (sessões 1 e 2

deste capítulo) são importantes para a compreensão desse processo, como também

o conceito de indústria cultural (sessão 3), criado por Adorno e Horkheimer (1985),

sociólogos participantes e fundadores da Escola de Frankfurt, juntamente com

outros estudiosos da Teoria Crítica da Sociedade (sessão 5). Outro elemento

conceitual importante está contido nos estudos de Giroux (1986), que nos possibilita,

através dos conceitos de resistência e pedagogia crítica, uma visão não tradicional

da escola (sessão 4).

A representação simbólica é a característica marcante do segundo estágio

de desenvolvimento cognitivo proposto por Piaget (1978). Nesse estágio, a

compreensão e o pensamento simbólico são reorganizados, porém, não há lógica. O

pensamento da criança geralmente é egocêntrico , sendo, incapaz de considerar

outras perspectivas que não sejam as suas e animista , atribuindo motivação e

características humanas a objetos inanimados e aos animais. Ainda nesse estágio, a

criança tem dificuldade para distinguir entre fantasia e realidade, e essencialmente,

baseia suas conclusões no pensamento intuitivo.

Os estudos sobre mídia que utilizam a teoria piagetiana, em sua maioria,

focalizam-se nas características cognitivas do pensamento pré-operacional (2 a 7

anos, apesar de as crianças desse estágio apresentarem progressos espetaculares

em relação ao anterior no âmbito de vários saberes como linguagem, desenho e

atividades práticas de vida diária. É nesse estágio que elas apresentam maior

suscetibilidade de serem influenciadas pelos estímulos simbólicos provocados pelos

conteúdos da TV, inclusive com possibilidades de criar ou reforçar padrões já

existentes de consumo. É fundamental que percebamos como a mídia televisiva

atua na construção e produção das memórias infantis estando seus conteúdos

presentes nas áreas econômica, social, familiar, escolar, etc (FISCHER, 2007).

O conceito de internalização é por Vigotsky explicado não como um

determinismo social sobre o individual. Ao contrário, a criança se apropria do social

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de uma forma muito particular, de maneira que internalização e transformação

interagem constantemente. Nas pesquisas sobre subjetividade e mídia televisiva, a

teoria vygotskyana (2007) ajuda a explicar como realmente a qualidade das trocas

provindas dos conteúdos cognitivos influencia decisivamente na forma como as

crianças tornam mais complexo o seu pensamento e processam novas informações.

O conceito indústria cultural foi empregado pela primeira vez em 1947,

quando foi publicado o livro Dialética do Esclarecimento de Adorno e Korkheimer.

Esse conceito, explicaram eles, visava substituir “cultura de massas”, pois esta

expressão induz ao engodo que satisfaz aos interesses dos detentores dos veículos

de comunicação de massa. Estes últimos querem dar a entender que cultura de

massas é como uma cultura surgindo espontaneamente das próprias massas. Para

Adorno (2002), tal não ocorre, pois afirma ele que a indústria cultural é quem adapta

seus produtos ao consumo das massas e determina o próprio produto, e, o conceito

de indústria cultural dá base à intencionalidade de formação de um tipo de cultura.

Adorno e Horkheimer (1985) expõem de modo bem claro que a cultura se

converteu em mercadoria. A proposição advém da expressão desenvolvida por eles

de indústria cultural, a qual refere-se às indústrias interessadas na produção em

massa de bens culturais, ressaltando que a expressão não diz respeito às empresas

produtoras nem às técnicas de difusão de bens culturais, e sim a um movimento

histórico-universal.

Os desenhos animados, como um tipo de mídia televisiva, encerram duas

possibilidades: a produção de sentido por parte do espectador, como também, são

dotados de intencionalidade que corresponde aos interesses das classes

dominantes. Perpassando sobre essas possibilidades apresentamos a sessão:

Globalização, Indústria Cultural e Consumo .

Por último, no item 4, ainda como base teórica, concentramos a atenção nos

estudos de Henry Giroux (1986), que tratam da resistência e pedagogia crítica em

Educação. Ele analisa a escola como um local de dominação e reprodução, mas

que, ao mesmo tempo, permite um espaço de resistência. Nesse âmbito, nos

presenteia com a possibilidade da pedagogia crítica. Tais elementos conceituais se

apresentam necessários quando, na consecução de um dos objetivos da pesquisa,

almejamos alertar para a necessidade da reflexão crítica frente à mídia televisiva,

especificamente frente aos desenhos animados.

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O quarto capítulo transcorre como, metodologicamente, conduzimos a

pesquisa e o intitulamos: Organização dos Dados da Pesquisa . Está subdividido

em: Natureza e Lócus da Pesquisa; Procedimentos na Construção e Análise dos

Dados; Descrição da Primeira Fase da Pesquisa – Aproximação e Busca e

Descrição da Segunda Fase da Pesquisa – Interação e Registro..

Nas considerações finais, intencionamos enfatizar os aspectos conclusivos

da pesquisa, como também opiniões e sugestões relativas às conclusões.

1.1 Criança e Visibilidade Social

Um dos objetivos dessa investigação é contribuímos, para a afirmação de

que a criança produz e é produzida na/pela cultura. Dentro dessa concepção

sociocultural, o conceito de criança é uma construção histórica e sua constituição se

dá mediante interações sociais. A criança não é um ser passivo e deve ser

compreendida como um ser capaz de experimentar, criticar e julgar (DIAS, 2009).

Atualmente, está também se tornando um consenso entre os investigadores

da infância que, em suas pesquisas, devem revelar o ponto de vista da criança

(VASCONCELOS e SARMENTO, 2007). Isto significa que não damos voz à criança,

posto que a ela já está atribuída esta capacidade, mas nos empenhamos em escutá-

la. Para tanto, os estudos investigativos sobre a infância precisam colocar a criança

no centro da indagação, considerando-a interlocutora privilegiada e co-autora nas e

das pesquisas. As pesquisas devem buscar conhecer as crianças por meio do que

elas mesmas expressam, observando a vitalidade de suas ações em diferentes

contextos da atualidade. Assegurando visibilidade às numerosas formas de

pensamento e ações das crianças, os pesquisadores atentam para falar com as

crianças e não falar por elas. Isto significa considerá-las atores sociais plenos,

constituindo um desafio teórico-metodológico para os estudiosos da infância.

Constitui uma perspectiva sociológica que considera não só as adaptações e

internalizações dos processos de socialização, mas também “os processos de

apropriação, reinvenção e reprodução realizadas pela criança” (DELGADO e

MÜLLER, 2005).

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Nas suas pesquisas, os sociólogos da infância assumem o lugar de

aprendizes deixando-se levar pelas mãos e pelas vozes das próprias crianças e é

assim que conduzimos a presente investigação. Sarmento (2007) postula que:

a infância tem sofrido um processo de ocultação. Esse processo decorre das concepções historicamente construídas sobre as crianças e dos modos como elas foram inscritas em imagens sociais que tanto esclarecem sobre os seus produtores (o conjunto de sistemas estruturados de crenças, teorias e idéias, em diversas épocas históricas) quanto ocultam a realidade dos mundos sociais e culturais das crianças, na complexidade da sua existência social.

Mais uma vez reforçamos que a condução da nossa pesquisa com crianças

é contextualizando-as socialmente, atribuindo importância a sua participação.

O interesse histórico pela infância é relativamente recente. A referência

histórica à infância aparece tardiamente e essa é, aliás, uma das razões que

levaram Áries (1981) a afirmar a “ausência da consciência da idéia da infância” até o

início da modernidade.

Os estudos dos sociólogos da infância atuam em dois campos:

− Estrutura e ação: substitui o reducionismo biológico pelo reducionismo

sociológico.

− Ser em devir: considerar que a criança é um “vir a ser” é esquecer que

caráter inacabado da vida dos adultos é tão evidente quanto o das

crianças.

A historiografia mais recente sobre a infância tem considerado que:

mais do que ausência da consciência da infância, na Idade Média e na pré-modernidade existiam concepções que foram profundamente alteradas pela emergência do capitalismo, pela criação da escola pública e pela vasta renovação das idéias com a crise do pensamento teocêntrico e o advento do racionalismo. Os séculos XVII e XVIII, que assistem a essas mudanças profundas na sociedade, constituem o período histórico em que a moderna idéia da infância se cristaliza definitivamente, assumindo um carácter distintivo e constituindo-se como referenciadora de um grupo humano que não se caracteriza pela imperfeição, incompletude ou miniaturização do adulto, mas por uma fase própria do desenvolvimento humano (SARMENTO, 2007).

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Expomos, em seguida, as concepções apresentadas por Sarmento (2007)

sobre as imagens sociais da infância, frisando que a criação de sucessivas

representações das crianças ao longo da história produziu um efeito de

invisibilização da realidade social da infância.

Baseando-se nos estudos de Jenks & Prout, o autor citado anteriormente

destaca dois períodos quanto à construção da imagem da criança: a pré-sociológica

e a sociológica. Segue uma suscinta explanação de cada uma delas.

1. Imagens da criança pré-sociológica:

− A criança má (the evil child) – baseada na idéia do "pecado original", a

imagem da criança má está associada a toda uma conceitualização do

corpo e da natureza como realidades que necessitam de serem

controladas; é a teoria de Hobbes sobre a exigência de controle dos

"excessos".

− A criança inocente – contrapondo-se à criança má, essa concepção

fundamenta-se no mito romântico da infância como a idade da

inocência.

− A criança imanente – essa imagem considera a idéia de um potencial

de desenvolvimento da criança, não a partir de uma natureza

intrinsecamente boa, mas da possibilidade de aquisição da razão e da

experiência, a qual aparece na formulação filosófica da teoria da

sociedade de John Locke.

− A criança naturalmente desenvolvida – a psicologia do

desenvolvimento, a partir, especialmente, dos trabalhos de Piaget,

constitui-se como o principal referencial de entendimento e

interpretação da criança no século XX, com profunda influência na

pedagogia, nos cuidados médicos e sociais, nas políticas públicas e na

relação cotidiana dos adultos com as crianças.

2. Imagens da criança sociológica

A criança inconsciente – essa imagem social tem Freud como figura de

referência, e atribui ao inconsciente o desenvolvimento do comportamento humano,

com incidência no conflito relacional na idade infantil, ocorrendo na relação com as

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figuras materna e paterna. A criança é vista como um preditor do adulto, mais do

que como um ser humano completo e um ator social com sua especificidade, de

modo que a psicanálise introduziu um viés interpretativo que impede a análise da

criança a partir do seu próprio campo. Acresce ainda o determininismo que leva,

frequentemente, a atribuir comportamentos desviantes a vivências infantis, o que

não deixa de ser uma derivação da imagem da “criança má”, que se revela quando

adulta...”

As distintas representações da infância se caracterizam singularmente pelos

traços de negatividade, mais do que pela definição de conteúdos (biológicos ou

simbólicos) específicos. A criança é considerada como o não-adulto e este aspecto

nega as características de um ser humano completo. A infância como a idade do

“não”, localiza-se desde o significado dessa fase em latim, ou seja, infans: o que não

fala.

Na segunda metade do século XIX, desenvolveu-se e consagrou-se a

infância como a idade da não-razão, em torno da qual, se institucionalizou a escola e

se “inventou” o aluno.

Com a Revolução Industrial e a consequente necessidade de especialização

de mão-de-obra, as crianças foram exploradas em múltiplas atividades produtivas.

Nesse período, o sentimento de infância está vinculado a um ideal abstrato, fundado

nas noções de inocência e moralização.

Assim, produz-se uma idéia de criança abstrata, frágil, inocente, indefesa, incapaz, incompleta, que precisa sofrer processos de socialização, mediante formação em instituições escolares, para poder tornar-se, no futuro, uma pessoa capaz de atuar na sociedade (DIAS, 2009).

No período entre as duas guerras mundiais (1918 a 1939), as crianças foram

retiradas das fábricas (mas, sobretudo nos países centrais da Europa e da América

do Norte), e foram consideradas como seres afastados da produção e do consumo,

sendo a infância investida da natureza da idade do não-trabalho.

Hoje em dia as formas específicas de trabalho das crianças – a

aprendizagem escolar, ajuda familiar, algumas atividades sazonais, por exemplo –

tornaram-se ocultas na análise da divisão social de trabalho e produziram essa idéia

generalizante, afinal ilusória, de que as crianças não trabalham (SARMENTO, 2007).

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Nos dias atuais, mais e mais se afirma uma indústria cultural para as

crianças, frequentemente dominada pela comunicação da violência, pela erotização

induzida, pela difusão de modelos de referência transmitidos pelos meios de

comunicação. De uma forma geral, cresce a complexificação das condições de vida

das crianças, “com estruturação dos seus cotidianos segundo dinâmicas indutoras

de comportamentos agressivos, competitivos e agonísticos” (SARMENTO, 2007).

Assim referem dados, tem se produzido a ideia que as crianças atuais vivem,

definitivamente, um processo de adultização precoce e irreversível, e, por

consequência, habitam a idade da não-infância.

Com efeito, a infância deve a sua diferença não à ausência de

características (presumidamente) próprias do ser humano adulto, mas à presença de

outras características distintivas que permitem que todas as crianças do mundo

tenham algo em comum, nas áreas física, mental, psicológica e social. Tal distinção

vai além de todas as outras operadas pelo fato de pertencerem a diferentes classes

sociais, ao gênero masculino ou feminino, ou seja qual for o espaço geográfico onde

residem, à cultura de origem e etnia.

A infância não é a idade da não-fala. Todas as crianças, desde bebês, têm

múltiplas linguagens, porque se expressam. A infância não é a idade da não-razão.

Para além da racionalidade técnico-instrumental, hegemônica na sociedade

industrial, outras racionalidades se constroem, designadamente nas interações de

crianças, com a incorporação de afetos, da fantasia e da vinculação ao real. A

infância não é a idade do não-trabalho. Todas as crianças trabalham nas múltiplas

tarefas que preenchem os seus cotidianos.

A infância é, simultaneamente, uma categoria social, do tipo geracional, e

um grupo social de sujeitos ativos, que interpretam e agem no mundo, construindo e

desconstruindo seus pressupostos através das culturas infantis.

Sarmento (2007) ainda nos fala da invisibilidade cívica da criança,

decorrente do afastamento do mundo da infância do mundo dos adultos, da

separação de áreas de atividade, reservadas para a ação exclusiva dos adultos e

inacessíveis, por consequência, à ação das crianças. A invisibilidade cívica também

decorre da colocação, sob forma direta (especialmente no espaço familiar) ou sob

forma institucional (especialmente no caso da escola), das crianças sob proteção

adulta. O confinamento da infância a um espaço social condicionado e controlado

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pelos adultos produziu, como consequência, o entendimento generalizado de que as

crianças estão “naturalmente” privadas do exercício de direitos políticos, por

exemplo votar para eleger os dirigentes.

A restrição de direitos políticos à infância, característica da modernidade

ocidental, não tem, todavia, um caráter universal. Sociedades e comunidades

radicadas no Oriente e no hemisfério sul, ou mesmo grupos étnicos minoritários na

Europa, não se caracterizam pela exclusão das crianças da vida coletiva e, inclusive,

integram as crianças nas assembléias e espaços de decisão coletiva, com efetiva

participação cívica.

Entrementes, a participação política não se restringe ao poder de voto. O

que importa aqui, é acentuarmos o fato de que as crianças privadas de direitos

políticos diretos tendem a ser, em consequência da sua ausência forçada da cena

política representativa (governo, parlamento, câmaras municipais etc.),

invisibilizadas como atores políticos concretos. Por conseguinte, não é de ausência

de ação política que se trata, mas de invisibilização na cena pública.

Não votando nem sendo eleitas, as crianças são tematizadas fora do quadro

do referencial de destinatários políticos, os designam como “cidadãos”,

“contribuintes”, “patrícios” ou mesmo “povo”. A invisibilidade é, no caso, homóloga

da exclusão: as crianças são o grupo geracional mais afetado pela pobreza, pelas

desigualdades sociais e pelas carências das políticas públicas. Para a recusa da

compreensão das crianças como atores sociais com competências políticas concorre

um conjunto de fatores.

Em primeiro lugar, a noção moderna de cidadania. O estatuto de membro da

comunidade impõe, ao mesmo tempo, obrigações e deveres do cidadão para com a

comunidade, todavia, a concepção clássica de cidadania recusa o estatuto político

às crianças.

Em segundo lugar, a escola foi sendo historicamente tematizada pela

modernidade como o lugar da formação de jovens cidadãos, plenos de direitos,

capacidade e competência, para competirem e/ou se solidarizarem numa sociedade

com igualdade de oportunidades. A escola corresponde à institucionalização

histórica de processos de disciplinação da infância, que são inerentes à criação da

ordem social dominante. Contudo, a escola permanece como um palco conflitual de

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projetos políticos e pedagógicos que tanto orienta-se para uma efetiva ampliação

dos direitos das crianças, quanto sustentar-se em lógicas de ação que perpetuam a

inscrição histórica da dominação.

Ao mesmo tempo em que a modernidade introduziu a escola como condição

de acesso à cidadania, realizou um trabalho de separação das crianças do espaço

público. As crianças são vistas como os cidadãos do futuro; no presente, encontram-

se afastadas do convívio social amplo, salvo no contexto escolar, e resguardados

pelas famílias da presença plena na vida da sociedade dos “adultos”.

A imagem da criança com um cotidiano superpreenchido, ilustra bem uma atividade dependente e vigiada sob controle adulto, numa extensão custodional do poder familiar, agora alargado às múltiplas agências de ocupação infantil (SARMENTO, 2007).

Sarmento (2007) ainda nos fala sobre a (In)visibilidade científica, que o

construtivismo psicológico coloca sob suspeita o pensamento infantil, porque

pressupõe a sua incompletude e imperfeição. É mais de uma falha do que de uma

realização que se trata, sempre que se ouve o significado que as crianças dão aos

seus gestos ou experiências. “Escutar a voz das crianças consiste, em última

análise, em escutar a voz do adulto que se revela num discurso previamente

interpretado”.

De modo semelhante, se as teorias dominantes da socialização rasuraram a

ação interpretativa das crianças, não deixaram de criticamente enunciar,

pertinentemente, muitos dos processos mais ou menos ostensivos ou mais ou

menos sutis de dominação, de inculcação normativa e comportamental e de

exercício da violência simbólica.

Até hoje, a fixação de imagens sociais das crianças contribuiu para que se

regulassem a vida das crianças, se fixassem pontos de referência para a

interpretação da mesma, se padronizassem as relações entre crianças e adultos, se

definissem os programas institucionais e os procedimentos, prescrições e interdições

face à ação das crianças.

Um campo científico interdisciplinar – os estudos da infância – não pode

abdicar da “imaginação metodológica”, que faça da voz das crianças não o outro da

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voz dos adultos, mas a expressão de uma autoria que faz a diferença com os

adultos.

As concepções de outros estudiosos da sociologia da infância, que

apresentamos alguns deles logo a seguir corroboram a idéia de Sarmento (2007),

reafirmando que a construção do ser social, ocorre por meio de múltiplas

negociações com seus próximos, e na identidade do sujeito. Essa noção estimula a

compreensão das crianças como atores sociais capazes de criar e modificar

culturas, embora inseridas no mundo adulto. Para consolidar um campo de estudo

que defende a escuta, enfocando a infância e a cultura infantis, os estudiosos da

infância utilizam, em suas pesquisas, referenciais teóricos-metodológicos

desafiadores. O nosso trabalho se insere tanto teórica como metodologicamente

neste campo de estudo.

Podemos citar Javeau (2005), que estudou em que dimensões se designa o

conceito de infância. Para esse autor, se conceito de infância é reduzido ao termo

“criança”, entra-se no campo psicológico; se é reduzido ao termo “infância”, entra-se

nos campos demográfico e econômico; e se se fala de “crianças”, entra-se no campo

antropológico ou socioantropológico.

Mollo-Bouvier (2005) também questiona a delimitação das concepções de

infância, enfatizando a socialização da criança na qualidade de sujeito social que

participa de sua própria socialização, mas também da reprodução e da

transformação da sociedade.

Indagando a respeito de qual o lugar que pode ocupar a questão da

“deficiência” no quadro da sociologia da infância, Plaisance (2005) analisa, ao

mesmo tempo, a história da infância dita “deficiente” e as evoluções recentes, a

partir de 1975, em matéria de escolarização. O autor levanta as hipóteses de que a

representação da criança portadora de deficiência é dominada pela representação

da deficiência, mais do que a representação da criança, como criança e que a

alteridade da criança com relação ao adulto é redobrada no caso da criança

deficiente.

Outros autores também se articulam teoricamente à sociologia da infância. É

o caso de Alderson (2005) que faz uma revisão da literatura internacional

considerando: as etapas do processo de pesquisa, nas quais as crianças podem

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estar envolvidas; os níveis de participação das crianças e o uso de métodos que

podem aumentar o envolvimento delas na pesquisa, respeitando seus direitos.

Também Corsaro (2005) relata pesquisas etnográficas comparativas com

crianças de pré-escola nos Estados Unidos e na Itália. O autor deu enfoque à

entrada no campo, ao estabelecimento do status de participante e à coleta de dados.

Ele ainda discute como passou a fazer “pesquisa com, e não mais sobre crianças”.

Montandon (2005) nos apresenta em seu artigo, que não basta examinar as

práticas educativas de seus educadores, mas que é necessário compreender as

perspectivas das crianças. Isto quer dizer que é preciso analisar não apenas o que

os educadores fazem com as crianças, como também o que estas fazem com o que

se faz com elas.

Gullestad (2005) trata em seu artigo das “infâncias imaginadas”, que são

lembranças da infância trazidas pelo adulto e que compõem uma parte central e

natural da representação da pessoa adulta. As histórias de vida, as análises da

relação entre a narratividade e o social, o trabalho de memória e de textualização

são fontes que se tornam essenciais para a compreensão das experiências infantis

e, em particular, para entender o ponto de vista das crianças.

Rayou (2005), com a preocupação de escapar do adultocentrismo, discute

as estratégias metodológicas que utilizou durante doze anos em pesquisas sobre

socialização das crianças e dos jovens com diferentes níveis de escolarização.

Os estudos dos sociólogos da infância citados nesta sessão, nos fazem

perceber seu empenho em seguir a concepção de que a infância é um conceito

constituído sócio-historicamente e que criança participa ativamente dessa

construção.

Sob este ponto de vida, buscar conhecer as crianças além das imagens e

idéias construídas socialmente ao longo da história, torna-se um movimento de

desconstrução dos fundamentos e concepções existente, e, como anteriormente

falamos, conduzimos nossa investigação teórica e metodologicamente nessa intenção.

A televisão é um dos meios de comunicação de maior acesso dos

indivíduos, fazendo parte, com frequência, de seu contexto social. No segundo

capítulo: Cultura Infantil e Desenho Animado, discutimos como se dá a relação entre

a TV e o Telespectador.

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2 CULTURA INFANTIL E DESENHO ANIMADO

2.1 A Televisão e o Telespectador

Debates e discussões a respeito do papel e influência da televisão, têm

ocorrido no mundo todo, por ser ela, um dos meios de comunicação mais utilizados

por significativa parcela da população. Às vezes é considerada responsável por

males que afligem a sociedade como violência, apatia e consumo. Sua programação

é vista como instrumento de alienação e transmissora da ideologia dominante.

Porém, esta é apenas uma das formas de perceber o papel da televisão no contexto

atual (MESQUITA e SOARES, 2008).

Primeiramente, temos que concordar que a televisão faz parte da vida diária

de milhões de pessoas nos mais diferentes locais e nas mais variadas culturas e

que, também, na vida das crianças atua como presença marcante. A mídia

televisiva, por exemplo, individualiza seus consumidores, pois estuda seus hábitos e

gostos de consumo para assegurar uma vendagem rápida e direcionada os meios

de comunicação podem levar os indivíduos a se modificarem, influenciando na sua

maneira de pensar e agir. Eles utilizam a linguagem como instrumento. São as

palavras, gestos e imagens, que levam os indivíduos a se modificarem. A linguagem

em geral, portanto, além de ser um conjunto de estímulos (sinais) visuais (como

cores, sons, formas, movimentos, materiais, etc.) compreende ainda, o modo como

as pessoas se organizam. Daí, constatamos que a “leitura” de elementos idênticos

ou semelhantes pode ter muitas possibilidades.

A televisão surge como um meio de comunicação que veicula informações,

com intenção de informar e também convencer os telespectadores. Como a

televisão utiliza a linguagem, ela comunica, mas também através da palavra a

televisão argumenta, relata, discute, entra em relação com as pessoas que

aprendem, ensinam, amam, odeiam, etc. Em geral, quando “se toma” a palavra não

se quer apenas comunicar alguma coisa, se quer também persuadir o outro,

convencendo-o de que suas razões são as melhores. Nesse aspecto, interfere na

ação do outro, “vendendo-lhe” uma ideia, uma imagem, um estilo de vida. Aqui se vê

a palavra como mercadoria e que, para tanto, é transmitida de diferentes maneiras

com o objetivo de sempre vender mais. As ideias explicam a realidade das coisas

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como se fosse sua essência, mas é a sua aparência. Somente a capacidade de

discernimento do receptor fará com que ele perceba a diferença entre aparência e

essência, entre causa e efeito.

Atualmente, somos bombardeados pelo discurso persuasivo na política, na

propaganda, nos meios econômicos, nas telenovelas, nos filmes importados da TV.

Essas produções desejam mostrar produtos, expor conceitos ou apresentar

histórias, bem como expor idéias e modos de viver. Tentando alcançar as pessoas

em sua vontade e ação, elas não são apenas convencidas pelos conteúdos

televisivos a acreditar; passam a considerar que essas idéias são verdadeiras e

únicas. É bem comum ouvir alguém dizer: “É verdade, eu vi na televisão”.

A TV exerce uma ação de sedução e condicionamento sobre as pessoas de

todas as idades, a ponto de se transformar numa necessidade fundamental como

alimentar-se ou divertir-se. No entanto, a esse respeito Freitag (2006) nos alerta que

crianças e adolescentes expostos aos conteúdos televisivos agem e reagem aos

estímulos expostos, fazendo uma seleção do que lhes interessa ou não, daquilo que

lhes parece procedente ou improcedente o que embasa nossa tese de que as

crianças produzem sentido ao assistirem TV.

As crianças e adolescentes não podem ser encaradas como massa informe, amorfa, que podem ser modeladas à revelia de sua vontade e independentemente de sua consciência, nem devem ser encarados como “passivos”. Eles agem e reagem aos estímulos de diferentes maneiras e de acordo com o seu nível de compreensão da situação. Não se prestam a um treinamento de “estímulo e resposta” preconcebida ou intencionada. São seres criativos capazes de aprendizagem de julgamento próprio, resguardadas as etapas de sua formação ou gênese intelectual e moral. Mas, também, não podem ser tratadas, antes do tempo, como adultos que já poderiam ou deveriam ter atingido maturidade biológica, linguística, moral, cognitiva, em suma: a autonomia moral (FREITAG, 2006)

Corroborando as ideias da autora anteriormente citada, também Molina e

Prados (2009), afirmam que a televisão, por ser um fenômeno básico da civilização

dos meios de comunicação de massa, é necessário estudá-la em suas

manifestações. Apesar dela não exerce um papel determinante na formação do

sujeito como veículo de informação e comunicação, mas pode influenciar no

processo educacional pelos seus conteúdos. Porém, ela, a TV, não exerce sozinha

esse papel. Muitos outros fatores sociais e culturais estão criando condições para

mudar o ambiente da infância na atualidade. Os modos de circulação da informação

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atualmente são muitos e variados formando um complexo multimídia do qual

participam a própria TV, agora com canais a cabo, diferentes revistas, jornais, CD-

rooms, vídeo-games, computadores, etc. (FERNANDES, 2003). A TV não é a única

fonte de informação, mas é a mais acessível e a mais reconhecida publicamente, e

isto é consenso entre os pesquisadores. Quando a TV é criticada negativamente, ela

é considerada estimuladora da violência, apatia e consumo. Citamos algumas

pesquisas que demonstram essa influência negativa da TV.

Durante os programas e nos intervalos comerciais estímulos intencionais,

porém, velados, são apresentados com o objetivo de maior consumo de produtos. O

próprio nome (intervalo comercial) já indica a intenção, lembrando que são esses

produtos que patrocinam os programas. Decorre uma espécie de cópia dos padrões

consagrados pela televisão. Desde chaveiros a material escolar, roupas e calçados,

até garotos que falam gírias ou garotas que tentam imitar a cantora adolescente,

seguem um padrão televisivo. São as chamadas “febres” e “manias”.

Devido à excessiva exposição de crianças e adolescentes que veem

televisão até oito horas diárias estes grupos podem agir de forma semelhante ao

que assistem. Essas pessoas compartilham de uma rede de significados transmitida

pela TV, e, portanto, tendem a repetir comportamentos de pessoas e personagens

apresentados (HAMBURGER, 2003).

As pessoas costumam, ainda, incorporar a seu vocabulário palavras de

origem inglesa equivalente em nosso idioma: chamam de bike a bicicleta, de fashion

a moda, de bus o ônibus. São os meios de comunicação de massa e,

principalmente, a televisão que homogeniza. Os padrões mundiais se tornam os

padrões que ela mostra. A verdade do mundo passa a ser aquela exibida pela TV, e

todo mundo, de uma forma global, cabe dentro da tela do aparelho receptor de

televisão. As pessoas copiam porque, aquilo que é mostrado na tela aparece como

algo socialmente consagrado, como um caminho para o reconhecimento e para o

sucesso. A situação da cultura, tal como ela é colocada pela mídia, não premia a

originalidade, mas a cópia e por isso vemos programas semelhantes e grupos

musicais idênticos (CARVALHO, 2007).

Através da televisão, a mídia pode utilizar mensagens subliminares para

vender produtos e ideologias. Seja de forma clara ou não, alguns programas de

auditório, telenovelas e também desenhos animados apresentam produtos que

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serão inconscientemente percebidos com probabilidades de aumentar seu consumo.

O experimento de Jim Vicary (1956) demonstra muito bem esse fenômeno. Tal

experimento consistia em colocar em um cinema de New Jersey (EUA) durante a

exibição dos filmes, propaganda taquicoscópica, ou seja, diretamente nos filmes

exibidos, eram embutidos legendas estimulando o consumo de determinados

produtos. Essas legendas eram exibidas de maneira tão rápida, que só se poderia

percebê-las inconscientemente (ou subliminarmente). O resultado é que o consumo

de tais produtos, nos intervalos dos filmes, aumentou em 60%. Outro exemplo, é o

do desenho Popaye que ajudou ao governo americano a acelerar o consumo de

uma supersafra de espinafre. Algumas crianças, apesar de não gostarem muito de

verduras em geral, passaram a acreditar que ficariam fortes como o Popaye, se

consumissem espinafre (1929).

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 1 – D. A. Popaye

Outros dois episódios também demonstram o efeito dos meios de

comunicação sobre indivíduos ou sobre as massas: o pânico Pockemon e a

transmissão radiofônica da guerra dos mundos em 1938.

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Fonte: http://images.google.com.br

Figura 2 – D. A. Pockemon

O pânico Pockemon (1997) ocorreu no Japão, precisamente em 16 de

dezembro de 1997, quando um desenho animado, do mesmo nome, após ser

transmitido, várias crianças foram vítimas de convulsão. Isto ocorreu devido à rápida

mudança de cores, em uma velocidade taquicoscópica, e o cérebro da criança não

foi capaz de assimilar, provocando assim a convulsão.

A guerra dos mundos ocorreu em 1938, quando o ator/diretor Orson Wells

(EUA), aterrorizou milhares de estadunidenses relatando uma invasão fictícia de

marcianos, através do rádio. O episódio acarretou o êxodo das pessoas fugindo de

extra-terrestres num verdadeiro terror coletivo.

Cada um desses eventos mostra o poder que têm os meios de comunicação

de massa de influenciar diretamente na vida das pessoas.

As horas dedicadas à TV não são devidas ao fato desta oferecer às crianças

programas que muito apreciam, mas também porque os pais não incentivam os

filhos para outras atividades. O excesso de obrigações dos mesmos é um dos

motivos, como também, o desinteresse dos pais por “coisas de criança”, ou seja, o

não reconhecimento dos adultos do seu papel como mediador entre a mídia

televisiva e os telespectadores crianças (FERNANDES e OSWALD, 2005). O

resultado pode ser um tanto alarmante como, por exemplo, atrasar o

desenvolvimento físico motor das crianças. A Academia Norte Americana de

Pediatria divulgou que a TV pode afetar a saúde física e social dos jovens. De

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acordo com o estudo, a TV não é indicada para os bebês, pois é uma atividade na

qual há pouca interatividade com os pais e com outras pessoas (1999).

Autores como Armand Mattelart e Ariel Dorfman (1980) escreveram no

período Allende, no Chile, o livro: Para ler o Pato Donald – Comunicação de Massa

e Colonialismo. O livro é fruto da pesquisa dos autores sobre a influência exercida

pelos produtos Disney na Educação e no relacionamento social de crianças de todo

mundo. É uma crítica bem forte ao imperialismo norte-americano, defendendo a tese

de que a leitura das histórias em quadrinhos não era tão inocente assim como se

pensava. O que os autores mostram é que, através desse produto cultural,

pode-se enviar mensagens ideológicas que est imulam a dependência

cultural e reforçam valores típicos da economia capitalista. Eles denunciam a

ideologia subjacente aos quadrinhos, à medida que confirmam os valores da classe

dominante, deformam a visão do trabalho, encobrem conflitos e levam à passividade

política. Na década de 1990, esses autores relativizaram parte de suas

conclusões.

No Brasil, um grupo de professores da Universidade Federal de Santa

Catarina, formou o Ateliê da Aurora (2007), que se destaca desde 2000 com teses,

dissertações, resenhas e artigos orientados para o tema: Criança, media e

imaginação. Um deles, já publicado em livro, trata da representação social da

criança e reprodução da ideologia dominante, organizado pela professora Elza Dias

Pacheco e se intitula: “Televisão, criança, imaginário e educação: dilemas e

diálogos”. Neste livro os vários textos enfatizam a influência dos desenhos animados

na forma como as crianças reagem socialmente, escolhem seus heróis, refletem

sobre seu futuro, ou seja, constroem seu pensamento. Nesse mesmo livro, a autora

escreveu o capítulo: As metáforas do Pica-Pau: efeitos da ideologia dos desenhos

animados nas crianças que, em outro momento, transformou em livro após pesquisa

aprofundada. O livro se intitulou: “O Pica-pau: herói ou vilão? Representação social

da criança e reprodução da ideologia dominante”.

Finalizamos esse capítulo apresentando dez teses ou proposições sobre as

crianças e a TV, de Bob Yodge e David Tripp (1986), publicadas na Inglaterra sob o

título: “Children and Television: a Semiotic Approach” (Crianças e televisão: uma

abordagem semiótica). Essas proposições já viraram clássicas na língua inglesa de

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tanto serem citadas na bibliografia da área e resumem a nossa visão sobre a relação

TV e telespectador infantil:

1. A criança é capaz de decodificar a TV de forma ativa e poderosa; mas

nem todos os programas e modos de assisti-los trazem o mesmo

benefício;

2. As respostas e a interpretações das crianças mudam conforme a idade

3. A TV para crianças contém formas ideológicas dominantes, mas

também algumas alternativas a elas.

4. A habilidade de julgar o que é realidade na TV só pode ser adquirida

pela própria experiência com o meio.

5. As crianças têm necessidade tanto de programas com fantasia como de

programas com a realidade.

6. A violência nas mídias é qualitativamente diferente da violência real.

7. As crianças reformulam os significados adquiridos por meio da TV.

8. As formas ideológicas têm um efeito determinante na interpretação da

televisão.

9. A família é uma instância ativa na determinação dos significados da TV.

10. A escola é um lugar onde a televisão deveria ser compreendida e

incorporada.

A nossa investigação contribui para a afirmação dessas proposições acima

citadas. O meio que escolhemos para analisar a relação mídia televisiva e formação

da subjetividade infantil é o desenho animado Bob Esponja.

A sessão seguinte é dedicada a descrever o conceito, um pouco da história

e a relação dos desenhos animados com a criança, a descrição de alguns desenhos

animados veiculados pela televisão brasileira, dentre eles, Bob Esponja Calça

Quadrada.

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2.2 Desenhos Animados

2.2.1 Um pouco da história

A criança não faz sua interpretação do mundo apenas através da família e da

escola, ela o faz, também através do seu ambiente, dos grupos de mesma idade e,

com certeza, dos “media” que estão presentes nas suas horas livres, em suas ações

e representações infantis cotidianas.

Os desenhos animados fazem parte da vida das crianças desde muito cedo.

Eles podem ser definidos como “todo o conteúdo de animação, desenvolvido sem a

utilização constante e predominante de personagens representados por atores

humanos (Classificação Indicativa, 2006, p. 217). Na classificação geral da televisão,

os Desenhos Animados compõem um gênero que engloba a categoria de

entretenimento. É uma sequência de desenhos, cada qual ligeiramente diferente do

seguinte, dispostos de tal maneira que, uma vez filmados e projetados sobre a tela,

são vistos como se estivessem em movimento. Expressam em sua maioria, os

movimentos das coisas, seres, ações, de uma forma exagerada, caricaturada,

sobretudo quando se trata de desenhos humorísticos, são os chamados “cartoons”.

O animador de desenhos animados deve ter a habilidade do cartunista para criar

seus personagens em movimento, a habilidade de expressão dramática e rítmica

numa perfeita sincronização de imagens móveis e sons (FUSARI, 1985, p. 33).

Desde o seu inventor, Émile Reynaud, em primeiro de dezembro de 1888, o

desenho animado foi idealizado para crianças, mas, nos últimos tempos sofreram

alterações de linguagem e conteúdo para conquistar o público de outras faixas

etárias. Hoje, os desenhos animados também são empregados em charges que

tratam, com humor, de questões políticas e de assuntos de interesse público.

A arte da animação consiste em conhecer a fundo o movimento natural dos

seres e interpretá-lo de forma criativa. Na maioria dos filmes de animação realizados

nos Estados Unidos da América, as cabeças dos personagens têm proporção maior

que a realidade e, dentro delas, os olhos dos personagens também são

aumentados, facilitando detalhes de expressão.

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Os desenhos animados estão vinculados, como técnica e expressão:

• Ao desenho de imagens – registro de movimentos e sons.

• À fotografia – “escrita da luz”

• À cinematografia – “escrita do movimento”

• À televisão – recebe e transmite imagens e sons mediante sinais

eletromagnéticos.

O outro termo vinculado ao desenho animado é anime, que provem de

mangá. O mangá, no Japão, é uma ilustração de uma história ou conto que pode ir

para TV em forma de “anime”. Assim, as historinhas saem da revistas e chegam à

TV em forma de desenhos animados.

O movimento inverso também ocorreu, quando um desenho animado, na

década de 1930, nos EUA, passou depois para as revistas de quadrinhos. Estamos

nos referindo ao Mickey Mouse, o ratinho que deu origem ao império Disney e a

inúmeros outros personagens como o Pato Donald, Tio Patinhas, Margarida, Zé

Carioca, Minie, João Bafodeonça e outros tantos mais.

Fonte: http://images.google.com.br

Figuras 3 – Desenhos Animados Disney

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Disney, na produção de desenho animado, levou às telas alguns contos de

fadas, até então, conhecidos somente através de livros. Contos como Cinderela e

Branca de Neve, hoje são conhecidos mais pelos desenhos animados do que pelos

livros (BIBE – LUYTEN, 1985).

Fonte: http://images.google.com.br

Figuras 4 – Contos de Fadas

Quanto ao Brasil, a experiência em cinema de animação, tem mostrado,

sobretudo, a existência de tentativas isoladas e as enormes dificuldades de

produção e distribuição. Quem tem se destacado nessa área é Maurício de Sousa

que, iniciando com histórias em quadrinhos em 1959, com os personagens Bidu e

Franjinha, realizou trabalhos de cinema de animação na década de 1970, os quais

continua até hoje. Nessa época ele criou a personagem Mônica e outros como

Magali, Cebolinha, Cascão, Tina, etc. (FUSARI, 1985), representando crianças e

suas histórias. Recentemente, em 2008, Maurício de Sousa conta a história dessas

mesmas crianças na adolescência, para atingir o público adolescente que na

infância acompanhou os personagens como crianças.

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 5 – Maurício de Sousa e seus personagens

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2.2.2 Os desenhos animados e a criança

Neste item, descrevemos a relação dos desenhos animados e a criança

quanto aos conteúdos por eles abordados.

Nos últimos 25 anos, a quantidade de desenhos infantis aumentou,

consideravelmente, pois também aumentou o número de canais que oferecem

múltiplas opções durante 24 horas, ininterruptas, na TV, a cabo, somando-se

àqueles exibidos nos canais abertos. Poucos pais e mães conhecem a variedade e

quantidade de desenhos infantis, ficando à margem desse mundo dos filhos. As

dificuldades também se dão quanto ao conteúdo dos desenhos animados, que antes

apresentavam a luta entre o bem e o mal, dos vilões e heróis de forma linear com

começo, meio e fim. Hoje os desenhos não terminam num mesmo capítulo e os

vilões e heróis são “mutantes”. Eles se modificam, se transformam em personagens

com características mais resistentes, constituindo o que chama-se de evolução.

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 6 – D. A. Pockemon

A antropóloga e professora da Universidade de São Paulo – USP, Esther

Hamburger (2003), afirma que “a lógica da mutação é uma das novidades dos

desenhos de hoje”. Em outras palavras, os personagens contemporâneos não

morrem, eles se transformam. É preciso que os adultos e crianças compreendam as

subdivisões, micro-evoluções e ″digivoluções″ desses personagens. São desenhos

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de argumento complicado, que invadiram o país com sua complexidade oriental,

mais precisamente japonesa.

Os estados psicológicos tais como expectativa, excitação, medo, fascínio e

outros, são apresentados pelas pessoas desde muito cedo. São estados que fazem

parte da relação dos indivíduos com o mundo, inclusive, com a televisão que

constitui uma boa parte do universo existencial das pessoas. É também através da

televisão que as crianças começam a perceber o mundo que as rodeia. São as

experiências sensoriais na infância tão importantes e marcantes, que tais

impressões são as últimas a sobreviverem, quando o cérebro se desorganiza por

senilidade, traumatismos físicos e mentais etc. São também as primeiras a voltarem

à recordação, após o período de amnésia. Concordamos, assim, quão fortes e

persistentes são as imagens e impressões vivenciados e presenciados na infância.

As crianças, ao assistirem desenhos animados, ficam atentas quando eles

são atraentes o suficiente para tanto. Muitas vezes, alimentam-se assistindo TV,

realizam as tarefas escolares e outras atividades.

Os adultos sentem dificuldade em se comunicar com as crianças nessas

ocasiões. Parecem “hipnotizadas” pelas mensagens televisivas, mergulhadas no

mundo da fantasia.

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 7 – Criança assistindo televisão

Os desenhos animados apresentam cada vez mais semelhanças com a

realidade. Isto pode se constatar quando observamos os heróis dos desenhos

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animados de décadas anteriores, e os de hoje em dia. Hoje, temos como heróis,

crianças com superpoderes como é o caso das Meninas Superpoderosas e de

Goku, em Dragon Ball; pequenos gênios como Dexter e Jimmy Neutron; meninos e

meninas astutas, que desafiam o medo e enfrentam qualquer

Fonte: http://images.google.com.br

Figuras 8 – Heróis de desenhos antigos

obstáculo com sua sabedoria e estratégias. Os super-heróis do passado como

Batmam, Superman e Mulher Maravilha eram heróis adultos (imagens cima). Os

heróis-mirins de hoje vão à escola, recebem bronca dos pais, ficam de castigo,

desobedecem, reclamam por carinho e atenção, burlam as leis dos adultos e são

capazes de grandes feitos. Os heróis-mirins realizam feitos impossíveis para os

adultos como salvar a cidade de inimigos poderosos, criar maquinarias e aparatos

eletrônicos que permitem comunicações interplanetárias, manipular com destreza os

segredos do mundo virtual e isso tudo e muito mais sem o suporte dos adultos.

Nesta correlação, essa aproximação de realidade e fantasia, tendo como centro as

crianças como heróis, faz com que os desenhos animados tenham uma estreita

relação com o imaginário infantil. É bom ressaltar que a autonomia e independência

desses heróis-mirins despertam os mesmos desejos nas crianças que os assistem.

Quando os desenhos são violentos a criança poderá considerar que o “mais forte é

quem tem razão” e que se obtém o que se pretende quando se detém o “poder”. A

quantidade de violência presente nos desenhos animados principalmente de ação e

aventura chega a ser mais elevada do que nos programas destinados a adultos em

horário de grande audiência (CARVALHO, 2007).

Os desenhos animados são objeto de estudo nas mais diversas áreas, ou

seja, na educação, na psicologia, na política, em ciências da comunicação, na

sociologia etc. Citamos alguns desses trabalhos dentre os muitos existentes.

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Mesquita e Soares (2008) investigaram, com base em alguns episódios dos

desenhos Jimmy Nêutron e o laboratório de Dexter, quais as visões de ciência são

veiculadas por meio desses episódios. Para os autores, é importante compreender

como se desenvolveu e tem desenvolvido o pensamento científico em nossa

sociedade. Eles sugerem o uso de desenhos animados como alternativa para

motivar debates que privilegiem a construção do conhecimento científico.

Molina e Prados (2009) estudaram a informação e os sentidos dos discursos

manifestados no desenho animado veiculado na televisão. Segundo a metodologia

semiótica, o desenho pode ser visto como um texto, em que se pressupõe um

processo de enunciação e que analisado, possibilita uma discussão sobre a

educação e a cultura. O desenho animado utilizado nessa pesquisa é Cyberchase, a

corrida do espaço – que faz parte do mercado cultural infantil exibido pela TV

Cultura de São Paulo – Brasil.

Ricon (2009), por sua vez, procurou identificar e analisar as representações

sociais contidas na figura dos cientistas, expressas nos discursos e produções de

um grupo de crianças em articulação com personagens apresentadas como

cientistas em desenhos animados de grande audiência. Ele possibilitou, em sua

análise, estudar questões relevantes e decisivas para a compreensão da “geração

mídia” (media generation).

Santiago (2009) objetivou estudar a intencionalidade de conteúdos dos

desenhos animados dos estúdios Disney, entre 1938 e 1940, cujas temáticas

abordavam insultos e desprezo político dos Estados Unidos da América para com as

potências do eixo europeu – Itália, Alemanha e Japão. O objetivo era aproximar e

alinhar as outras nações no esforço de guerra. Os motivos que levaram o

pesquisador a organizar esse texto foi reconhecer o papel ideológico, veiculado nos

enredos dos filmes de desenhos animados, exibidos diariamente nos principais

canais de televisão da época.

As pesquisadoras Silva e Gomes (2009) corroboram as ideias acima citadas

ao analisar representações artísticas e ideológicas presentes em desenhos

animados, em especial nas produções do estúdio Disney, que demonstram

situações do cotidiano como diversidade, comportamento e relacionamento

interpessoal. As autoras afirmam que os desenhos animados são importantes para a

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formação da identidade do indivíduo já que a imagem transmite objetividades, além

de subjetividades.

A produção de sentidos da criança sobre os desenhos animados é o artigo

escrito por Fernandes (2003). Nele, a autora parte do pressuposto de que a criança

é um sujeito ativo, produtor de significados na sua relação com a cultura televisiva.

Em procedimento, busca investigar como as crianças dão significados e se

apropriam do que veem na telinha, não esquecendo de que a televisão não exerce

influência sozinha. Muitos outros fatores sociais e culturais estão criando condição

para mudar o ambiente da infância, na atualidade.

Fernandes e Oswald (2005) estudaram as relações adultas e infantis na

contemporaneidade, focalizando a recepção dos desenhos animados. Os autores

recusam a idéia de passividade das crianças diante da TV. Afirmam que elas são

produtoras de cultura e que, de acordo com as mediações, a recepção é

influenciada assim como a produção de sentidos sobre o que assistem. O artigo

analisa os depoimentos de crianças na faixa etária dos 9, 10 anos, de duas escolas

(pública e privada), relativos aos desenhos animados, apontando as mediações que

determinam desencontros e encontros entre crianças e adultos.

Os artigos aqui descritos não se esgotam. A nossa intenção é demonstrar o

interesse pelo estudo dos desenhos animados nas mais diversas áreas como

também compartilhar com as idéias apresentadas pelos autores.

O item a seguir apresenta informações sobre alguns desenhos animados

difundidos na televisão brasileira, os quais vamos utilizar como instrumentos com as

crianças participantes da pesquisa.

2.2.3 Se liga nessa!

Os desenhos animados, além das funções de entretenimento e lazer, tem

também as funções mítica e fabuladora, características das obras de ficção. Eles

constituem os líderes de preferência entre crianças de diferentes faixas etárias.

Todavia, os desenhos animados estão conquistando adolescentes e adultos

dependendo dos conteúdos abordados.

Periodicamente, os produtores lançam desenhos animados com novos

personagens e enredos. Os de maior sucesso ganham versão para cinema e vídeo

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e passam a ilustrar uma série de outros produtos: capas de caderno, mochilas,

chaveiros, camisetas e bonés. Os personagens principais do desenho tornam-se

Fonte: http://images.google.com.br

Figuras 9 – Produtos com ilustrações de desenhos animados

ainda bonecos. Trazendo embutidos padrões culturais e de consumo, os desenhos

animados fazem parte do quadro pertinente a um contexto cultural que prega a

globalização que, na maioria das vezes, não considera as diferenças e

particularidades de cada ser humano; pelo contrário, estimula a massificação, a

mecanização e a automatização. Quanto à sociedade, esta é representada como

una, estática, harmônica, sem antagonismo de classes, e a “ordem natural” do

mundo é quebrada apenas pelos vilões que, encarnando o mal, atentam geralmente

contra o patrimônio. Os “bons” defendem a si mesmos e aos outros, derrotando os

“maus”. Essa é uma forma simplista que reduz todo conflito à luta entre o bem e o

mal, sem considerar quaisquer opiniões e interesses divergentes das pessoas. Pelo

exposto, o conflito é reduzido ao nível individual como se tudo fosse resultante de

problemas morais e não, também, de problemas políticos e sociais.

A assistência televisiva torna possíveis vários fenômenos como a imitação

individual, e depois, coletiva. A ação televisiva sobre o imaginário infantil aparece

nos jogos, nas atitudes, nas produções de textos e desenhos. Sob um aspecto

lógico, os adultos têm-se inquietado cada vez mais com a influência da televisão

sobre as crianças.

Apresentamos algumas informações referentes a desenhos animados que

são difundidas na televisão brasileira. Eles podem ser vistos em diferentes canais,

ou através da televisão a cabo – sinal captado mediante um pagamento de uma

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assinatura, ou da televisão aberta – sinal que pode ser sintonizado por qualquer

aparelho de TV. Alguns desenhos animados são exibidos em ambos os canais.

A televisão brasileira exige desenhos animados classificados como

educativos e outros classificados como desenhos animados para entretenimento. Os

canais educativos mais populares no Rio de Janeiro são a TV Futura e Multirio.

A emissora educativa do Estado de São Paulo, a TV Cultura, criou nos anos

90, o Castelo Rá-Tim-Bum. Apesar de hoje em dia não serem transmitidos mais

episódios inéditos, é ainda muito elogiado pelos pais e considerado um programa

educativo de qualidade.

As emissoras brasileiras que transmitem desenhos animados em circuito

aberto são o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), Rede Globo de Televisão (TV

Globo), Rede Bandeirantes de Televisão (BAND), e Rede Record e Rede TV.

Os canais das TVs pagas nos lares brasileiros já não são tão raros. Dentre

eles, podemos citar aqueles que exclusivamente transmitem programas infanto-

juvenis, inclusive desenhos animados: Disney Channel, Fox, Discovery Kids,

Nickelodeon, Jetix, Cartoon Netword e outros.

Segue-se uma breve descrição de alguns desenhos animados exibidos nos

canais brasileiros, utilizados na construção de dados com o objetivo de detectar o

reconhecimento dos mesmos pelas crianças.

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 10 – D. A. As meninas super poderosas

As Meninas Superpoderosas – Essas mini-heroínas são barulhentas,

bravas e lutam como gente grande. Lindinha, Florzinha e Docinho são três garotas

especiais, que moram na pacata Townsville, com seu criador, Professor Utônio. Elas

frequentam o jardim-da-infância local e, nas horas vagas, protegem a cidade contra

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o malvado Macaco Loco, que tem o cérebro aparente (Cartoon Network e TV

Globo).

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 11 – D. A. O Laboratório de Dexter

O Laboratório de Dexter – Dexter é um menino prodígio que, de dentro de

seu laboratório, elabora mil planos e máquinas para salvar o mundo ou enfrentar

valentões na escola. Seu lema é: Todo dia é um grande dia para a ciência! Quem

não dá folga para o geniozinho e adora sabotar as invenções dele é a saltitante

bailarina Dee Dee, sua irmã mais velha (Cartoon Network).

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 12 – D. A. Dragon Ball-Z

DragonBall-Z – As Dragon Balls são sete esferas de cristal que, juntas,

invocam o poderoso Dragão. Quem conseguir uni-las tem um desejo concedido. O

herói Goku, com a ajuda de outros guerreiros terrestres e do filho Gohan, tenta

manter as Dragon Balls longe de mãos erradas. Ao todo, são 22 personagens no

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desenho, que também tem outra versão com oito a menos, a DragonBall GT. Nesta,

o guerreiro Goku volta a ser criança por causa de um feitiço inimigo. (TV Globo e no

Cartoon Network).

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 13 – D. A. Pica-Pau

Pica-Pau – Esse desenho animado foi criado em 1940 e estrelou vários

curta-metragens de animação e só na década de 1950 passou a ser exibido na

televisão. O Pica-Pau tem voz e risada inconfundíveis. No início o Pica-Pau

representava um personagem violento. Depois ele ganhou uma personalidade mais

tranquila e menos agressiva, porém é provocador e faz deboche dos outros

personagens (TV Record).

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 14 – D. A. Jimmy Nêutron

Jimmy Nêutron – É um garoto gênio, mas que tem problemas para se

adaptar com os colegas de sala e, por isso, conta com a ajuda de seus amigos Caio

e Sheen. Jimmy inventa um monte de coisas, e quando acham que ele está

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dormindo, na verdade está voando por aí e inventando novas coisas para tornar a

vida mais fácil. Sempre que tem uma idéia genial fala: “Idéias a mil!. “Seu laboratório

secreto fica no subsolo do quintal de sua casa (NicKelodeon)

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 15 – D. A. Tom e Jerry

Tom e Jerry – A trama desse desenho animado se baseia geralmente em

tentativas frustradas do gato Tom de capturar o rato Jerry. Por causa das

habilidades do engenhoso ratinho e por ser menos esperto, Tom não consegue

pegar Jerry em nenhum episódio. Também são utilizadas diversas armadilhas e

truques que, no final, não dão resultado satisfatório e sempre se seguem o caos e a

destruição. Alguns episódios deixaram de ser exibidos, pois foram considerados

racistas (Boomerang).

Esses desenhos animados, descritos anteriormente, nos revelam um

panorama recente daqueles exibidos pela TV brasileira, pois os criadores renovam

seu acervo ou ainda surgem novos criadores de desenho animados.

O meio pelo qual estudamos a mídia televisiva é o desenho animado.

Escolhemos dentre muitos aqui descritos ou não, o desenho animado Bob Esponja,

Calça Quadrada, o qual descrevemos com detalhes no item a seguir.

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2.2.4 Bob Esponja Calça Quadrada

Fonte: http://images.google.com.br

Figuras 16 – D. A. Bob Esponja Calça Quadrada

Temos como objetivo neste item, descrever o desenho animado que serviu

de objeto de estudo em nossa investigação. Tratamos aqui, de sua origem,

personagens principais e dinâmica dos conteúdos.

Bob Esponja Calça Quadrada, atualmente é exibido pelo canal Nickelodeon

(TV a cabo), de segunda a sexta-feira, em horários variados. Na TV aberta, também,

de segunda a sexta-feira pela manhã, é exibido no programa TV Globinho da Rede

Globo.

Bob Esponja foi criado em 1999, por Stephen Hillenburg, nos Estados

Unidos e já foi traduzido para 25 idiomas chegando a 170 países. Dentre estes, o

Brasil é um dos países com maior índice de audiência do desenho (Pillar, 2009).

Hillenburg é ex-professor de Biologia marinha e tem estudos na área de Recursos

Marinhos. Seu objetivo em criar Bob Esponja Calça Quadrada é combinar seu

conhecimento em Biologia marinha, com seu amor pela animação. A vida de seus

personagens se passa no fundo do mar, no lugar chamado Fenda do Biquíni, logo

abaixo de uma pequena ilha no oceano Pacífico, pertencente ao Atol de Biquíni, que

aparece no início de cada episódio do desenho.

Os personagens do Bob Esponja não são heróis com superpoderes como

Superman e Batman. Eles são seres com vida normal, que trabalham, se divertem,

brincam, vão à escola etc. Os animais não nadam, mas caminham sobre o solo;

cozinham com fogo, há velas acesas em bolos de aniversário, há neve no inverno e

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vão à praia no verão apesar de estarem submersos. É o mundo da fantasia

representando o mundo real.

Bob é uma esponja do mar, embora possua a mesma forma quadrada das

esponjas industriais. Diferente da esponja natural que fica enraizada ao solo

marinho, Bob “caminha” e tem cor amarela. Usa calças marrons, camisa de mangas

curtas branca, gravata vermelha, meias brancas até a altura do joelho e sapatos

pretos; tem grandes olhos azuis e boca enorme. Está sempre sorrindo

demonstrando personalidade alegre.

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 17 – D. A. Bob Esponja

Sua casa tem formato de abacaxi. Possui um bichinho de estimação,

chamado Gary, que é um caramujo marinho. Gary não fala, mas é capaz de se

fazer compreender por Bob. Bob Esponja trabalha como cozinheiro na lanchonete

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 18 – Morada de Bob Esponja

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“Siri Cascudo” e adora seu trabalho. Também brincar com seu melhor amigo

Patrick Estrela é a atividade favorita dele. Eles sempre estão se metendo em

encrencas. Sua personalidade é marcada pelo otimismo. Ele acredita que vive num

mundo bom e com a sua ingenuidade, às vezes é ludibriado. Parte do pressuposto

que todos são bons. Ele é simpático, tolerante e bem-humorado. Repete sempre:

“Estou pronto!” seja para trabalhar ou para brincar. Está envolvido, em quase todos

os episódios, em confusões, mas tudo dá sempre certo no final (BOUTIN, 2006).

O grande amigo de Bob Esponja, Patrick, é uma estrela do mar que não

consegue fazer nada direito e para todos é na verdade, um fracassado. Ele vive à

sombra de seu amigo Bob Esponja. Não vai à escola nem trabalha. Há um episódio

intitulado: “O grande fracassado cor-de-rosa (Brincando com Bob Esponja, 2003),

que com sua falta de habilidade, provoca o riso dos personagens e telespectadores.

Ele está sempre querendo resolver os conflitos, mas, acaba dando conselhos e

opiniões que não são as mais acertadas, na concepção da maioria dos adultos.

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 19 – Patrick

Ele não consegue trabalhar e espera Bob Esponja sair do serviço para brincarem

juntos. Seus pais aparecem num episódio – Sou pelos idiotas (Bob Esponja 2ª

temporada, 2001), no qual Patrick confidencia a Bob que até seus pais o consideram

um idiota. Patrick veste-se com uma bermuda colorida (verde de flores roxas) como

as bermudas usadas pelos surfistas, e tem o corpo todo cor-de-rosa. Ele mora

embaixo de uma pedra, próximo à casa de Bob Esponja.

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Lula Molusco é uma lula (animal marinho) azul. Enquanto Bob Esponja é um

empregado ideal, nunca reclama do salário e considera o patrão um bom líder, até

arriscando sua vida por ele, Lula Molusco vive reclamando de tudo. Ele não trabalha

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 20 – Lula Molusco

nada além do estritamente necessário e faz tudo para viver longe de Bob Esponja e

Patrick. Toca clarineta, mas muito mal, sempre emitindo acordes desafinados. Ele

não chega a ser um vilão, mas é o oposto de Bob Esponja. O antagonismo entre as

personagens está presente em todos os episódios. Ele é o personagem mal-

humorado do desenho. Nada está bom pra ele, ficando resmungando pelos cantos,

reclamando do trabalho, de Bob, de Patrick e das brincadeiras. Bob e Patrick só

pioram seu mau-humor, pedindo desculpas pelas grosserias que o próprio Lula

comete. Lula Molusco não é realizado profissionalmente, pois ele se considera um

artista, porém, sobrevive trabalhando como caixa na lanchonete “Siri Cascudo”.

Adora tocar clarineta, mas, só o Bob tem paciência para ouvi-lo. Ele até gostaria de

brincar com Bob e Patrick, pois observa-os de longe de sua janela. Apesar de ser

convidado, não vai brincar. Prefere manter uma postura distante e desinteressada.

Seu Siriguejo é um siri de corpo e olhos vermelhos que usa calças e camisa

azuis. Ele é dono da lanchonete Siri Cascudo, portanto patrão de Bob Esponja,

Patrick e Lula Molusco. Ex-militar, busca ter um comportamento exemplar, entretanto

age mal quando o assunto é dinheiro, pois é extremamente avarento. Sua

lanchonete vende o famoso hambúrguer de siri. Este sanduíche tem um ingrediente

secreto e o seu sabor delicioso atrai muitos clientes. Plâncton é dono de um

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restaurante, o “Balde de Lixo” e o único concorrente de seu Siriguejo. Ele quer

roubar a receita secreta do hambúrguer de Siri.

Seu Siriguejo tem temperamento agitado, fica todo tempo dando ordens aos

funcionários e contando dinheiro. A exploração a que submete seus empregados

faz do Sr. Siriguejo um homem rico, não se importando com eles. Faz com que seus

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 21 – Sr. Siriguejo

subalternos trabalhem muito e paga pouco. As histórias de Hillenburg nos passam,

ainda, a idéia que o Sr. Siriguejo lutou muito para chegar onde chegou, superando

obstáculos. É o mito capitalista da superação de si mesmo, onde o homem nasce

pobre e pode enriquecer por seus esforços e merecimento. É o self-made man

citado por Dorfman e Mattelart (1980).

Fonte: http://images.google.com.br

Figura 22 – Sandy

Em Bob Esponja, o filme (2004), o Sr. Siriguejo é entrevistado quando

inaugura uma nova lanchonete. Suas primeiras palavras são: ”Olá, eu gosto de

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dinheiro”. Guarda também como amuleto sua primeira moeda. Ele é viúvo,

apaixonado por uma personagem chamada Srª. Puff, que é professora de Bob

Esponja na escola de pilotagem. Tem uma filha chamada Pérola, uma baleia que

raramente aparece nos episódios porque está sempre passeando com os amigos.

Outra personagem do desenho animado Bob Esponja é Sandy Bochechas.

Ela é uma esquilo fêmea que vive no mar e para sobreviver usa uma roupa especial.

Ela está sempre à procura de aventuras e Bob gosta muito de brincar com ela.

Outros personagens como os super-heróis da TV da Fenda do Biquíni – o Homem-

sereia e seu ajudante Mexilhãozinho – e mais alguns participam dos episódios de

vez em quando para dar maior dinamismo ao desenho.

Para concluir este item sobre o desenho animado Bob Esponja Calça

Quadrada, podemos dizer que a Fenda do Biquíni funciona como uma sociedade,

onde homens organizados trabalham para garantir sua subsistência. Pode-se

concluir que é uma cidade localizada nos Estados Unidos da América, cuja língua

falada é o inglês e a moeda corrente é o dólar, tendo o trabalho como valor, em

função de um mercado.

Também concluímos que, entre Lula Molusco, Patrick e Bob Esponja, fica

evidente que o personagem ideal é Bob com o qual o autor quer que as crianças se

identifiquem. Embora o Lula cumpra suas obrigações, não o faz com prazer como o

Bob, contudo, ambos trabalham em função de um mercado. Lula Molusco raramente

demonstra algum tipo de sentimento positivo por qualquer coisa e faz sempre

questão de deixar em evidência seu desprezo por Bob Esponja. Este, ao contrário, é

um empregado que não se importa de receber salários. Seu prazer é o trabalho e a

ele estaria dedicado 24 horas se fosse necessário. No episódio: Siriguejo nasce de

novo (Histórias... 2003) Bob Esponja diz: “Hora de fechar (o restaurante), a hora

mais triste do dia” ou no episódio: Como na TV (O Natal... 2002) ao acordar: “Hora

de fazer minha coisa predileta no meu local predileto”, ou seja, iniciar o dia

trabalhando no restaurante.

Até julho de 2009 o autor do desenho havia concluído 152 episódios. Para

comemorar os dez anos de sua criação, aos telespectadores foram apresentados

100 (cem) episódios, durante 48 horas, sem interrupção pelo canal Nickelodeon (TV

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a cabo). O desenho animado Bob Esponja Calça Quadra será retomado para análise

como instrumento utilizado na metodologia desta pesquisa.

O conteúdo do capítulo seguinte constitui os elementos conceituais da

pesquisa e se intitula Subjetividade e Desenvolvimento Infantil.

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3 SUBJETIVIDADE E DESENVOLVIMENTO INFANTIL

A Psicologia do Desenvolvimento e o estudo da Mídia devem andar de mãos

dadas. Isto porque as teorias do desenvolvimento vão além de simplesmente

analisar o conteúdo apresentado pela mídia, incluindo também a natureza única da

criança como a idade dela, quantidade de tempo gasto com cada mídia e o conteúdo

ao qual ela foi exposta. Essas teorias podem identificar os mecanismos potenciais

que explicam por que os efeitos das mídias ocorrem e orientam as previsões sobre

qual faixa etária há mais riscos para alguns efeitos específicos. As teorias da

psicologia do desenvolvimento também ajudam a explicar como as crianças

percebem o conteúdo da mídia e como a sua compreensão se modifica com a idade.

As teorias desenvolvimentistas podem ser organizadas em categorias

(SCHEIBE, 2009), ou seja, de acordo com o que enfatizam:

a) comportamentos adquiridos;

b) cognição (atenção, aprendizagem, memória, compreensão e

julgamento);

c) personalidade e emoções;

d) funcionamento e respostas do cérebro;

e) ambientes múltiplos e interativos.

f) Influências inatas, biológicas ou inconscientes;

g) Influências ambientais.

Scheibe (2009) afirma que existem quatro maneiras básicas pelas quais

uma criança pode aprender:

1. Experiência direta, que é a aprendizagem por meio do condicionamento

operante, ou seja, a criança será recompensada ou punida de acordo

com o comportamento apresentado;

2. Aprendizagem pela observação, isto é, envolve o aprendizado ao assistir

alguém executar o comportamento e então imitá-lo, ou não, dependendo

das consequências do comportamento da pessoa observada;

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3. Aprendizagem simbólica, que envolve a aprendizagem de crianças mais

velhas, adolescentes e adultos através da linguagem escrita ou falada;

4. Aprendizagem cognitiva, onde o aprendizado se baseia nas

informações que as crianças já possuem e na sua compreensão

global das questões envolvidas.

As quatro formas pelas quais a criança aprende, acima citadas se

aplicam especificamente com relação ao uso da mídia para adquirir informações,

para interpretar mensagens e para compreender a mídia em geral.

No presente estudo, as teorias de desenvolvimento aprofundam o

paradigma construtivista-interacional de Jean Piaget (1978) e o paradigma

sócio-cultural de Lev. Vigotsky (2007), ambas consideradas teorias cognitivas,

visando sedimentar a compreensão da construção do pensamento da criança.

3.1 Construção, Interação, Cognição – Jean Piaget: Um olhar

Iniciamos nossa exposição teórica com a proposta criada por Jean Piaget

(1978), que nos favorece o estudo da compreensão da mídia pelas crianças,

discutindo o processo cognitivo de representação simbólica. Inicialmente, fazemos

uma breve síntese da teoria piagetiana.

Piaget observou, passo a passo, a evolução do comportamento da criança

desde o dia do nascimento até a idade de 2 anos. De início, com seus filhos e,

depois, ele e seus colaboradores observaram crianças do mundo inteiro. Os

primeiros resultados dessas observações, Piaget publicou no livro “O nascimento

da inteligência na criança ”, em 1936, a qual mais tarde completou com as obras:

“A formação do símbolo na criança ” e “A Construção do Real na Criança ”. A

essas publicações se somam muitas outras, pois Piaget se destaca como um dos

autores que mais escreveu e publicou suas pesquisas.

A teoria de Piaget (1978) formalizou o funcionamento cerebral humano

identificando as operações básicas de classificação, seriação ou ordenação, ligados

entre si pela implicação. O segundo aspecto de sua teoria foi demonstrar a

ontogênese desse funcionamento por intermédio de uma embriologia mental,

popularmente conhecida como “estágios do desenvolvimento da inteligência”

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(CHIAROTTINO, 2005). Estudando esses estágios, Piaget objetivou captar os

indícios de transformações sucessivas na construção do funcionamento das

estruturas mentais, ou seja, como essas transformações se refletem nas ações dos

indivíduos, seja criança, adolescente ou adulto.

Piaget (1978) afirma também, que as crianças constroem ativamente a sua

compreensão do mundo por meio de processos contínuos de assimilação

(incorporando novas informações ao conhecimento já existente) e acomodação,

(reorganizando as formas de entendimento para levar em conta as informações

novas), passando de um estágio a outro através de mudanças qualitativas e

quantitativas do pensamento.

O autor enfatiza o papel da própria criança no desenvolvimento dos

esquemas cognitivos, não acreditando que o mesmo ocorra geneticamente numa

linha de tempo predeterminada e conectada ao cérebro humano. Ao se desenvolver,

a compreensão do mundo pela criança não apenas se amplia gradualmente como é

qualitativamente diferente nas diferentes idades.

De acordo com a teoria piagetiana, a formação dos símbolos mentais se dá

a partir da imitação. Inicialmente, a criança imita determinados comportamentos de

forma tateante e sem interiorização. Estas primeiras ações imitativas são imprecisas

e rudimentares, mas, pouco a pouco, a criança vai aperfeiçoando seus movimentos,

até ser capaz de reproduzir internamente tais ações. A função simbólica percorre

desde as formas iniciais de representação, da imitação e do símbolo lúdico

onírico até o esquema verbal e as estruturas pré-conceptuais elementares. Como

afirma Piaget (1978) o termo “representação” é empregado em dois sentidos muito

diferentes.

No sentido amplo:

... a representação confunde-se com o pensamento, isto é, com toda a inteligência que já não se apóia simplesmente nas percepções e movimentos (inteligência sensóriomotora) e sim num sistema de conceitos ou esquemas mentais (p. 87).

No sentido restrito:

... a representação reduz-se à imagem mental ou à recordação – imagem, isto é, à evocação simbólica das realidades ausentes ... poder-se-á admitir que todo pensamento se faz acompanhar de imagens, portanto, se pensar consiste em interligar significações, a imagem será um “significante” e o conceito um “significado” (p. 87).

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Concordamos com as reflexões teóricas piagetianas admitindo que, falar de

representação simbólica significa ir além do que se vê superficialmente, é

compreender o que está no pensamento humano, conhecer sua essência, sua

historicidade, sua lógica, ou seja, conhecer sua subjetividade . Através das

representações, o conhecimento é construído na interação dos sujeitos com a

realidade implicando construção de sentidos.

As representações infantis são construídas nas relações sociais e culturais

que a criança estabelece, onde exerce o papel de ator e, outras vezes, de

espectador: Cotidianamente, enfrentamos novas situações que demandam

comportamentos únicos e pessoais, que dependem principalmente da nossa relação

com o meio social ao qual pertencemos. As representações estão presentes em

todas as vivências do ser humano como conversas familiares e sociais, brincadeiras,

programas televisivos, etc. Conhecemos e codificamos o mundo através de imagens

que se transformam em representações. Tais representações são diferentes para

cada indivíduo e ele reage aos acontecimentos sociais, levando em conta sua

história de vida, portanto as representações são dinâmicas e abrangentes.

Piaget (1978) destaca que, quando a criança associa a representação ao

representado ela está construindo um sistema de relações recíprocas entre o

significado e o significante. A capacidade de simbolizar supõe, por conseguinte, a

distinção e a complementação no estabelecimento dessas relações.

Para a criança, é importante ter condições de atribuir significação ao mundo,

condições para se perceber como significativa para esse mundo, levando-a a buscar

interação e estrutura sociais.

Para compreendermos como as representações se configuram no

desenvolvimento cognitivo, apresentamos em seguida, as fases desse

desenvolvimento através da teoria piagetiana.

O autor em referência se dedicou a estudar os estágios do desenvolvimento

da criança em termos de compreensão do mundo físico, entrementes, sua teoria

também pode ser aplicada à compreensão das informações sociais fornecidas pela

mídia e as diferenças de interpretação do conteúdo da mesma que as crianças

constroem com o passar dos anos.

Quanto às etapas do desenvolvimento cognitivo, Piaget (1978) argumenta

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que o objetivo da criança é adquirir a capacidade de reversibilidade, ou seja, a

possibilidade da operação inversa, onde se percebe, no âmbito do mundo físico, a

ida e a volta como dois aspectos da mesma ação, a possibilidade de fazer e

desfazer, que permitirá, no futuro, compreender, ao lado dos fenômenos reversíveis,

aqueles que são irreversíveis como condição da aquisição da responsabilidade

referente às suas ações em relação ao outro.

São quatro os estágios do desenvolvimento cognitivo que sempre ocorrem

na mesma sequência, embora possa variar a idade na qual as crianças avançam de

um estágio para o seguinte:

1. Estágio sensório-motor (do nascimento aos dois anos), no curso do qual

se constituem os sistemas de esquemas que prefiguram operações, mas sem

nenhuma reversibilidade operatória. Com 2 anos, as crianças já desenvolveram uma

representação interna de esquemas que inclui a capacidade de imitação adiada,

uma compreensão da permanência do objeto, uma compreensão básica de causa e

efeito, o início da linguagem e a consciência de si mesma.

2. Estágio pré-operacional (dos 2 aos 7 anos). É também chamado de

período do pensamento intuitivo, onde as ações sensório-motoras implicam em

representação, imagem mental e já se nota a presença de regulações semi-

reversíveis. Aqui, a compreensão e o pensamento simbólico são reorganizados,

porém, é ilógico e utiliza uma abordagem não-sistemática na solução de problemas.

Durante o início desse estágio, o pensamento da criança é geralmente egocêntrico

(incapaz de considerar outras perspectivas que não sejam as suas) e animista

(atribuindo motivação e características humanas a objetos inanimados e aos

animais). O julgamento da criança, nesse estágio, reflete centralização, isto é,

focaliza uma característica central de um objeto ou pessoa, com exclusão de outras.

Ainda é característica do estágio pré-operacional, a dificuldade da criança para

distinguir entre fantasia e realidade e, essencialmente, baseia suas conclusões no

pensamento intuitivo.

Os sujeitos da pesquisa em questão, são crianças de 3 a 5 anos,

consequentemente pertencentes ao estágio descrito anteriormente. No sistema

educacional brasileiro, são crianças que devem estar frequentando a Educação

Infantil, nas séries do Jardim I e II. A escolha por essa faixa etária se deve por

possuir características do pensamento que favorecem a análise sobre o alcance da

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mídia, ou seja, como ocorre a aquisição da função simbólica ou de representação.

Este período é marcado pelo interesse pelas causas dos fenômenos (idade dos

porquês), começam a distinguir a fantasia da realidade, são capazes de reproduzir

situações vividas e assistidas e transformam o mundo através das fantasia para

satisfazer seus desejos.

A maioria das pesquisas sobre mídia que utilizam a teoria piagetiana é

focalizada nas limitações cognitivas do pensamento pré-operacional, pois as

crianças que se encontram nesse estágio têm dificuldades para compreender

integralmente a natureza da televisão e seu conteúdo. Um estudo mostrou que

crianças de 2 e 3 anos geralmente acreditam que os personagens vivem dentro do

aparelho de TV (NOBLE, 1975 apud SCHEIBE, 2009). Isto ocorre, porque embora

elas saibam brincar de "faz de conta", se confundem quanto a uma coisa ser real ou

apenas ficção na televisão. Este aspecto foi estudado por outros pesquisadores,

interessados no comportamento do consumidor infantil. No impacto da violência na

mídia, reações de medo das crianças a cenas de monstros e bruxas, etc.

Outras limitações pré-operacionais são pesquisadas em estudos sobre a

compreensão que as crianças desse estágio têm dos processos mentais de outras

pessoas. A criança, nessa fase, acredita que os adultos sabem o que ela sabe, tem

dificuldade para compreender conceitos como falsas crenças e sonhos, como

também distinguir entre aparência e realidade. Quanto aos conceitos abordados nos

desenhos animados, é evidente que a criança, desse período, conquista o

entendimento dos mesmos, no entanto, adotando, em momentos que se alternam o

pensamento lógico e ilógico. É o momento do conflito o qual Piaget considera o

momento que a criança cresce cognitivamente, atingindo a equilibração. “Em

consequência da equilibração, a criança, independente de qualquer outra

experiência, tende a reorganizar suas crenças num sistema coerente, harmonioso e

equilibrado” (BALDWIN, 1973, p. 279).

Para Piaget (1976), há três tipos de equilibração. Levando em consideração

a interação entre o sujeito e os objetos, primeiramente ocorre a assimilação dos

objetos a esquemas e ações e a acomodação do sujeito aos objetos. Há, em

segundo lugar, uma equilibração que assegura as interações entre os subsistemas,

isto é, decorrentes dos desequilíbrios, que ocorrem progressivamente em

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velocidades diferentes, mais ou menos importantes. Por último, há o tipo de

equilibração, em que ocorre o equilíbrio progressivo da diferenciação e da

integração, ou seja, a hierarquização das relações que unem subsistemas a uma

totalidade que os engloba.

Esses três tipos de equilibração apresentam em comum o duplo aspecto de

serem todas relativas ao equilíbrio entre a assimilação e a acomodação, e de

conduzir os caracteres positivos pertencentes aos esquemas, subsistemas ou

totalidade em jogo (PIAGET, 1976, p. 16). É necessário lembrar que a equilibração

de cada uma das estruturas consideradas tem uma correspondência, a partir da

qual se determinará a natureza das afirmações e das negações ou os caracteres

positivos e negativos das mesmas.

Essas considerações nos levam a pensar: Qual a razão por que ocorrem os

desequilíbrios? Piaget nos afirma no seu livro “A Equilibração das Estruturas

Cognitivas” (1976, p. 18):

Está realmente claro que numa perspectiva de equilibração, uma das fontes de progresso no desenvolvimento dos conhecimentos deve ser procurado nos desequilíbrios como tais, que por si só obrigam um sujeito a ultrapassar seu estado atual e a procurar o que quer que seja em direções novas. Contudo, não é menos evidente que, se os desequilíbrios constituem um fator essencial, mas em primeiro lugar motivacional, não poderiam todos representar o mesmo papel formador e não o conseguiriam senão com a condição de dar ocasião a avanços, próximos de serem superados e de chegarem assim a reequilibração específica.

Em conformidade com o exposto, constatamos que a teoria piagetiana

considera que sem os desequilíbrios, o conhecimento permaneceria estático. A

seguir, serão descritas as duas últimas etapas do desenvolvimento cognitivo

propostas por Piaget (1978).

3. Estágio das operações concretas (dos 7 aos 12 anos). É o estágio em

que as crianças demonstram habilidade para manipular mentalmente objetos e

aqueles que se pode perceber. O pensamento ainda não pode raciocinar apenas por

operações verbais e necessita da manipulação. As operações permanecem ligadas

à ação, daí a sua denominação de operações concretas.

4. Estágio das operações formais (dos 12 anos em diante). Nesse estágio, a

maioria dos adolescentes consegue demonstrar um pensamento abstrato. A partir

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de então, pode-se prescindir da ação e refletir sobre operações. É o pensamento

desligado da ação, quer dizer, é a área da lógica e da dedução matemática.

Tecendo ainda alguns comentários sobre o paradigma construtivista

interacionista, seu princípio é que o pensamento, como progresso cognitivo, é a

expressão da interação do homem com o meio e com ele mesmo.

O ser humano age sobre o meio, donde recolhe os dados iniciais que lhe permitirão conhecê-lo. A partir dos dados iniciais, percorre um caminho de análises e de sínteses através de um conjunto de operações, que se constroem gradualmente, obtém uma representação desse mundo, pode atuar sobre ele, modificando-o, a reiniciar o caminho ante cada mudança (SANTOS, 1977, p. 33).

A investigação sobre mídia e subjetividade em crianças de 3 a 5 anos, nos

leva ainda a buscar subsídios na teoria piagetiana sobre a natureza individual ou

social da lógica. Baseando-se em Durkheim, o qual afirmava que o pensamento

individual era formado pelo grupo devido à linguagem e às coações de cada geração

sobre as seguintes; Piaget (1973) expõe suas considerações que complementam

esse postulado. Ele assegura que: "... um todo coletivo não é idêntico à soma dos

indivíduos que o compõem, pois este todo exerce sobre as consciências coações

que as modificam..." (p. 166).

Existem, todavia, três interpretações possíveis sobre a natureza da lógica.

Primeiramente ordem, se não houvesse sociedade, existiria o individualismo

atomístico, ou seja, o todo é a simples resultante das atividades individuais. Existe,

em segundo lugar, a interpretação do realismo totalitário onde o todo impõe sua

lógica e modifica os indivíduos. Pode-se conceber em terceiro lugar, que a lógica

social advém não da soma dos indivíduos, mas da soma das relações entre os

indivíduos. Cada relação ou interação constituiria um todo, já a partir de dois

indivíduos, e a sociedade seria a expressão do conjunto destas interações entre

indivíduos.

No presente estudo consideramos os pressupostos piagetianos discutidos

logo acima, importantes para observarmos a interrelação mídia televisiva e

subjetividade infantil. Como estamos falando de relações interindividuais, queremos

dar destaque às que são dos tipos das mesmas que irão determinar as relações

sociais. Existem as relações coercitivas que implicam uma autoridade e uma

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submissão as quais conduzem à heteronomia, e existem as relações de

cooperação que implicam a igualdade de direito ou autonomia, e a reciprocidade

entre personalidades diferenciadas.

Ao descrever a ação coercitiva sobre os indivíduos que integram o estágio

pré-operacional e cujo pensamento é egocêntrico, Piaget revela que a coerção

exerce influência negativa considerável no sujeito que busca a equilibração. Isto

ocorre, pois o sujeito pré-operacional não é capaz ainda da propriedade da

reversibilidade completa que supõe o simbolismo, ou seja, "porque só é por uma

referência à evocação possível dos objetos ausentes que a assimilação das coisas

dos esquemas da ação e a acomodação dos esquemas às causas atingem

equilíbrio permanente e constituem, assim, um mecanismo reversível" (PIAGET,

1973, p. 195).

No item seguinte prosseguimos aprofundando como ocorre a construção do

pensamento da criança à luz do paradigma sócio-cultural de Vygotsky (2007).

3.2 Construção, Interação, Cultura – Lev Vygotsky: Outro olhar

O psicólogo russo Lev Vygotsky (1896 – 1934) morreu precocemente vítima

de tuberculose aos 37 anos, mas sua obra muito tem ainda a ser descoberta e

debatida em várias partes do mundo, inclusive no Brasil.

Vygotsky procurou superar tanto um idealismo cego a condições históricas

de constituição do sujeito quanto um materialismo mecanicista, que reduz a psique

a determinações empíricas. Para ele, a consciência não é simples reflexo da

história, pois a própria materialidade histórica é formada pela ação das consciências

envolvidas em processos de interação social.

A abordagem sociocultural cognitiva proposta por Vygotsky almeja integrar,

numa mesma perspectiva, o ser humano como corpo e mente, como ser biológico e

cultural, como membro de uma espécie animal e participante de um processo

histórico.

Ele defende a idéia de contínua interação entre as mutáveis condições

sociais e a base biológica do comportamento humano. A partir de estruturas

orgânicas elementares, determinadas basicamente pela maturação, novas e mais

complexas funções mentais se formam, dependendo da natureza das experiências

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sociais a que as crianças estão expostas.

Para Vygotsky (2007), o fundamento do funcionamento psicológico humano

é cultural e, portanto, histórico. Nessa teoria, é dada importância às possibilidades

que o indivíduo dispõe no ambiente em que vive e que acesso tem a instrumentos

físicos como a enxada, faca, mesa e a instrumentos simbólicos, como a cultura,

valores, crenças, costumes, tradições, conhecimentos, desenvolvidos por outros

indivíduos no passado ou no presente nas relações interpessoais.

Os sistemas simbólicos e, particularmente, a língua exercem um papel

fundamental na comunicação entre os sujeitos e no estabelecimento de

significados compartilhados que permitem interpretações dos objetos, eventos e

situações do mundo real (OLIVEIRA, 2005).

Vygotsky (2007) atribui o surgimento da linguagem à necessidade de

intercâmbio dos indivíduos durante o trabalho, atividade especificamente humana.

Como filiado marxista, vem daí a importância que ele dá ao trabalho na história da

espécie humana. É o trabalho que, pela ação transformadora do homem sobre a

natureza, une homem e natureza e cria a cultura e a história humanas. As relações

sociais ocorrem na atividade coletiva do trabalho como também ocorrem a criação

e utilização de instrumentos, ampliando as possibilidades de transformação da

natureza. É através do trabalho que os indivíduos planejam e agem, isto é, utilizam

a comunicação e troca de informações precisas e compartilhamento de

significações. Nessa inter e autocomunicação dos indivíduos surge a consciência

que, por conseguinte não é um estado interior preexistente, mas uma construção

de natureza histórico-cultural, intimamente relacionada ao processo compartilhado

de construção de signos e significações.

O sujeito humano é constituído por aquilo que é herdado fisicamente e pela experiência individual, mas sua vida, seu trabalho, seu comportamento também se baseiam claramente na experiência histórica e social, isto é, aquilo que não foi vivenciada pessoalmente pelo sujeito, mas está na experiência dos outros e nas conquistas acumuladas pelas gerações que o precederam (OLIVEIRA, 2005).

Assim, podemos considerar que a teoria vygotskyana têm aplicações

no estudo da mídia em geral. Tratando-se da mídia televisiva, o conhecimento

que os indivíduos adquirem poderá advir da mesma, onde anúncios, histórias

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de ficção, desenhos animados e outros programas se "incorporam" aos

conhecimentos anteriores ou os transformam.

Vygotsky, no entanto, não teve intenção de colocar uma possível

interpretação determinista da abordagem histórico-cultural. Em contraponto a

isto, ele postula a existência de um mundo interior em constante movimento, e

de uma margem de controle do próprio sujeito sobre sua vida psicológica,

sendo esta a sua autonomia enquanto sujeito.

Esta última conclusão vygotskyana é importante, pois nos faz constatar

que é impossível controlar o fluxo da produção psicológica, ou seja, o mundo

interior do sujeito. Como humano e, mergulhado na cultura e na história,

através do compartilhamento de signos e significados com seus interlocutores,

o indivíduo estará sempre imbuído de consciência.

É importante, aqui, também, a organização dinâmica da consciência: a mudança nas inter-relações entre as funções psicológicas superiores, mais do que o aperfeiçoamento das funções isoladas, é o principal responsável pelo desenvolvimento da consciência (OLIVEIRA, 2005).

Quanto aos instrumentos e signos no desenvolvimento psicológico,

Vygotsky (2007) enfatiza a importância dos chamados meios artificiais para o

controle de processos psicológicos. Esses meios artificiais são produto do

desenvolvimento histórico e reorganizam, no interior da cultura, as funções

psicológicas humanas, modificando-as ou não.

Os processos educacionais são mecanismos culturais de desenvolvimento,

que introduzem novas funções, alterando o curso dos processos naturais. Tais

processos culturais podem se apresentar com uma intencionalidade educativa, como

na relação pedagógica na escola, ou em contextos onde não se percebe essa

intencionalidade, por exemplo, através dos meios de comunicação de massa

(televisão, rádio, internet, etc.). Qualquer que seja a relação, se promove o re-

equipamento do sujeito cultural, pela introdução de meios artificiais em seus

processos psicológicos. A mídia televisiva pode ou não expressar sua

intencionalidade. Porém consideramos que como citação exposta pelo ex-comissário

Nicholas Johnson: "Toda a televisão é uma televisão educativa. A questão é: o que

está ensinando?" (Citações sobre a Televisão, 2006, apud MAZZARELLA, 2009).

Após essa visão geral do paradigma sociocultural de Vygotsky,

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apresentamos como o psicólogo russo explica a interiorização progressiva das

orientações advindas do meio social.

Como já foi comentado, a teoria vygotskyana não é marcada por um

determinismo social sobre o individual. Ao contrário, a criança se apropria do social

de uma forma muito particular, de maneira que interiorização e transformação

interagem constantemente. Ela, a criança, é capaz de se integrar ao social e ao

mesmo tempo também posicionar-se frente ao mesmo, ser seu crítico e seu agente

transformador.

Ao internalizar instruções, as crianças modificam suas funções psicológicas: percepção, atenção, memória, capacidade para solucionar problemas. É dessa maneira que formas historicamente determinadas e socialmente organizadas de operar com informação influenciam o conhecimento individual, a consciência de si e do mundo (DAVIS e OLIVEIRA, 1994).

A título de exemplo, podemos citar como em diferentes épocas a

sociedade apresenta sua visão e forma de interagir com as crianças. A concepção

de crianças dos séculos XV a XVIII, difere profundamente da concepção das

crianças do mundo moderno, fortemente influenciadas pelos meios de comunicação

de massa. Estamos nos referindo a crianças que apresentam formas diferentes de

organizar, planejar e atuar sobre a realidade. Tal visão contemporânea encontra-se

respaldada pela teoria vygotskiana, quando ele postula que as funções mentais

superiores aparecem primeiramente no plano social e depois surgem no plano

psicológico. A construção do real pela criança, isto é, a apropriação que ela faz da

experiência social, parte do social – da interação com os outros – e paulatinamente,

é internalizada por ela.

Para Vygotsky (2007) a aquisição de um sistema linguístico reorganiza os

processos mentais infantis. Através da palavra atribuída a um objeto, a criança·

especifica as principais características desse objeto, as generaliza e relaciona-as em

determinadas categorias. Daí a importância da linguagem para o pensamento: ela

sistematiza a experiência direta da criança e serve para orientar o seu

comportamento.

A fala externa, acompanha frequentemente o comportamento infantil até

cerca de três anos de idade. A partir dessa idade, é comum se observar que a fala

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precede a ação, ou seja, a criança anuncia o que irá fazer a seguir. Essa é a função

de planejar a ação, de guiar as atividades da criança, que faz parte do pensamento

complexo. Após a idade de seis anos, pouco se ouve a criança falar para si em voz

alta, porém, quando há confronto com situações – problemas de difícil solução, a

fala externa volta a aparecer, auxiliando a atividade cognitiva. Para o referido autor,

pensamento e linguagem se interligam e utiliza a expressão "pensamento verbal"

para designar a interseção entre eles.

Divergindo de Piaget (1978), Vygotsky (2007) não aceita a possibilidade de

existir uma sequência universal de estágios cognitivos. Para ele, os fatores

biológicos preponderam sobre os sociais, apenas no início da vida das crianças. As

condições e as interações humanas é que afetam grandemente o pensamento e o

raciocínio nas múltiplas oportunidades que se abrem para cada criança no

transcorrer da infância.

Para Vygotsky (2007), o processo de formação de pensamento é

despertado e acentuado pela vida social e pela constante comunicação que se

estabelece entre crianças e adultos, as quais permitem a assimilação da

experiência de muitas gerações. Como já foi dito, na interação social ocorrem

situações de aprendizagem, das quais as crianças se apropriam e podem passar a

usá-las de modo independente. Nessa apropriação, elas utilizam a inteligência que,

para Vygotsky (2007), é uma habilidade do homem de entender e utilizar a

linguagem, e não como outras concepções de que a inteligência é resultante de

aprendizagens prévias.

A teoria vygotskyana ainda apresenta o conceito de "zona de

desenvolvimento potencial" para se referir à distância entre o nível de

desenvolvimento atual e o nível potencial de desenvolvimento. O primeiro, diz

respeito ao que sujeito é capaz de realizar sem ajuda, e o segundo é medido através

da solução de problemas sob a orientação ou em colaboração com as crianças mais

experientes.

Nessa concepção, é possível afirmar que a diferença entre as crianças

deve-se, em grande parte, à diferença qualitativa em seu ambiente social, ou seja,

as diferentes formas de se relacionarem com as pessoas em seus ambientes.

As diferenças encontradas nos diferentes ambientes sociais das crianças

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promovem aprendizagens diversas que podem ativar processos de desenvolvimento

também diversos. "Assim, a aprendizagem precederia o desenvolvimento intelectual

ao invés de segui-lo ou de ser com ele coincidente" (DAVIS e OLIVEIRA, 1994).

Para a investigação sobre mídia televisiva e subjetividade, a teoria

vygotskyana ajuda a explicar como realmente a qualidade das trocas provindas dos

conteúdos cognitivos influencia decisivamente na forma como as crianças tornam

mais complexo o seu pensamento e processam novas informações.

A atividade favorita de toda criança é brincar que, para Vygotsky (2007), tem

como uma das· funções permitir que a criança aprenda a elaborar e resolver

situações conflitantes do seu cotidiano, através de capacidades como observação,

imitação e imaginação. Quando a criança assiste aos desenhos animados, para ela

é lazer, é brincadeira.

É na brincadeira que a criança reproduz sua própria vida. No jogo de “faz de

conta”, ela dirige seu comportamento pelo mundo imaginário, assim, o pensamento

está separado dos objetos e a ação surge das idéias. Para Vygotsky (2007), a

imitação e o “faz de conta” permitem à criança alcançar a internalização que é o

processo onde ocorre a reconstrução interna daquilo que é observado

externamente.

Ao assistir desenhos animados que fazem parte do cotidiano da maioria das

crianças, elas criam para si um universo fantástico que mistura o sonho, ficção e

aventura com a realidade. Elas assumem o papel do herói ou da heroína, acreditam

poder realizar todas as peripécias do personagem, inclusive salvar a humanidade.

O processo de desenvolvimento é, então, a apropriação ativa do

conhecimento disponível na sociedade em que a criança se encontra. Ela aprende e

integra à sua forma de pensar o conhecimento da sua cultura.

Necessário se faz, diante do presente estudo, nos determos na concepção

vygotskyana da natureza cultural do desenvolvimento humano.

Duas importantes premissas são extraídas de seus estudos. Primeiro: a

cultura é uma produção humana e, segundo, essa produção humana tem duas

fontes simultâneas: a vida social e a atividade social do homem. Isto quer dizer que,

para Vygotsky (2007), a cultura é o conjunto das obras humanas dotadas de

significado e que, entre ela e a natureza, existe uma linha divisória que, ao mesmo

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tempo, as separa e as une, pois essa linha passa pelo homem, que é,

simultaneamente, obra da natureza e agente de sua transformação.

Ao dizer que o desenvolvimento humano (psicológico) é de natureza

cultural, Vygosky (1993) está teorizando que as funções psicológicas superiores,

que têm sua origem no plano social, e não no plano biológico, têm que se constituir

no plano pessoal. Como afirma Pino (2005): "o desenvolvimento cultural do

indivíduo supõe, portanto, uma transposição de planos, permanecendo o objeto

dessa transformação no plano de origem".

Para que essa transposição de planos se processe, ocorre a

internalização, que corresponde ao trajeto que vai do exterior para o interior do

indivíduo, ou como Vygotsky (2007) coloca: "é a reconstrução interna de uma

operação externa".

Na tentativa de maior esclarecimento, sabemos que o que ele denominou de

internalização é um processo de natureza semiótica, ou seja, está sob a ordem

abstrata da significação. Entender esse processo é muito importante para se

entender como ocorre a constituição cultural do ser humano. O campo da

significação não é algo homogêneo, todos pensam ou tendem a pensar de forma

igual. O que ocorre no campo da significação é o delineamento de áreas de maior

estabilidade e unidade como os significados socialmente instituídos, e áreas de

maior instabilidade e diversidade, que é o caso do sentido que os significados

culturais instituídos têm para indivíduos e grupos diferentes. Resumindo, podemos

dizer que a constituição cultural do ser humano se dá quando ele converge os

significados culturais da sociedade em significados próprios, não como simples

reprodução, mas como interpretação por parte do sujeito que pode atribuir aos

significados culturais um sentido próprio.

Ainda, necessário se faz ressaltarmos na teoria histórico-cultural do

desenvolvimento humano dois pontos importantes. Primeiro, Vygotsky apresenta

em seus escritos, que no ser humano existe ao mesmo tempo, continuidade e

ruptura entre o biológico e o cultural. "Continuidade porque o cultural supõe o

biológico para poder constituir-se; ruptura porque o biológico é transformado sob a

ação do cultural" (PINO, 2005). Segundo, que Vygostky, embora considere as

significações culturais (aquelas atribuídas pelos homens às suas obras) a matéria-

prima do psiquismo humano, decorre disto que os homens de todos os tempos têm

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em comum aquilo que define como humano sua natureza. Ele, por outro lado,

também afirma que os homens são todos diferentes, pois cada um deles é uma

versão singular da natureza cultural dos homens. Só para reafirmar: a

internalização das significações culturais passa pela interpretação que cada

indivíduo apresenta em relação a essas significações.

Podemos assim afirmar que a subjetividade fica salvaguardada, não fica

comprometida. Isto ocorre como Vygotsky assevera, pois a conversão das

significações culturais em significações pessoais garantem a subjetividade e a

identidade pessoal de cada indivíduo.

Toda a função aparece duas vezes, em dois níveis, ao longo do desenvolvimento cultural da criança; primeiramente entre pessoas, como categoria interpsicológica e depois dentro da criança, como categoria intrapsicológica (VYGOTSKY, 2007).

Tal concepção da constituição humana nos liberta da temerosa

coletivização do psiquismo e da ameaça de destruição da subjetividade.

Acrescentando a essa concepção, reforçando e/ou contrapondo, nos

próximos itens, desenvolvemos os temas da análise da cultura na Teoria Crítica,

abordando globalização, indústria cultural e consumo. O desenvolvimento desse

item se faz necessário pela investigação sobre mídia televisiva e formação da

subjetividade por estarem intrinsecamente ligadas aos referidos conteúdos.

3.3 Globalização, Indústria Cultural e Consumo

Vivenciamos, em pleno século XXI, a era da imagem que, produzida por

especialistas, torna-se impactante. No caso dos desenhos animados, os grandes

especialistas são os Estados Unidos da América, a França e o Japão, que exibem

suas criações em seus países de origem, e também exportam para tantos outros

através das TVs abertas e por assinatura.

Ao optarmos pelo título acima citado – globalização, indústria cultural e

consumo – deparamo-nos com um dilema, pois surgiu a questão: “Qual a ordem em

que devemos discutir os termos? A conclusão a que chegamos é que os termos

referem-se a fenômenos sociais inerentes à vida de qualquer indivíduo, com uma

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relação intrínseca de retroalimentação em que cada um ocorre numa

interdependência contínua, num movimento perene de ida e de volta, não

importando a ordem de apresentação dos mesmos.

Introduzimos nossa discussão, apresentando o termo globalização para

designar determinados fenômenos sociais, econômicos e culturais ocorridos na

contemporaneidade. Para Scocuglia (2006), a nomenclatura deveria ser

mundialização, dado o seu aspecto histórico, porém, como a literatura consagrou o

termo globalização como definição do processo, o autor o adota.

A globalização é um fenômeno complexo que mobiliza um conjunto de

fatores multidirecionais de ordem econômica, política e cultural, cujos efeitos

também são problemáticos. No entanto, a globalização tem reestruturado a

arquitetura do Estado, das sociedades, das organizações e dos indivíduos, e sua

influência afeta e modela as reformas sociais, dentre elas, as políticas e práticas em

educação. Essa influência da globalização sobre a educação e a cultura ocorre de

forma dupla: dando oportunidades de reajustamento face às exigências do mercado

e, também, oportunidades de resistência ou de mobilização.

Esses conceitos aqui são apresentados, pois nossa pesquisa investiga a

relação entre subjetividade e conteúdos dos desenhos animados que fazem parte da

mídia televisiva e que, por sua vez, participam dos processos de globalização.

Feitas estas considerações mais gerais, vamos nos deter nas interrelações

do processo de globalização nos campos da cultura e da educação. Vários

estudiosos utilizam esse tema como objeto de estudo. Apresentamos um dos mais

significativos, disseminado e traduzido em vários países, inclusive no Brasil,

realizado por Dale (2004) o qual examina a relação globalização – educação –

considerando duas abordagens teóricas. A primeira denominada “Cultura

Educacional Mundial Comum” (CEMC) foi elaborada por John Meyer e seus colegas

da Universidade de Stanford (Califórnia) e a segunda, desenvolvida pelo próprio

Dale (2004), é designada como “Agenda Globalmente Estruturada para Educação”

(AGEE).

A abordagem CEMC defende que o desenvolvimento dos sistemas

educativos nacionais e das categorias curriculares, ocorrem através de modelos

universais de educação, de estado e de sociedade, mais do que através de fatores

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nacionais distintivos. O argumento central é de que as instituições do estado –

nação e o próprio estado são moldados através da ideologia do mundo dominante

(ou Ocidente) e não como criações nacionais autônomas e únicas (DALE, 2004). O

estado seguindo a uma ideologia dominante, submete as normas, a cultura e as

categorias curriculares a uma homogeneidade.

Para a CEMC a educação e o currículo das escolas estão ligados aos

modelos ditados pela sociedade que se tornaram padronizados a nível mundial.

As pretensões da CEMC são fundamentalmente a respeito da existência e da natureza de um conjunto universal de normas, idéias e valores que independentemente de qualquer delas informam e modelam a própria natureza dos estados, assim como das suas políticas (DALE, 2004).

A outra abordagem, essa desenvolvida pelo próprio Dale (2004), designada

Agenda Globalmente Estruturada para a Educação (AGEE), considera a mudança

de natureza da economia capitalista mundial, como a força diretora da globalização

e ainda procura estabelecer os seus efeitos sobre os sistemas educativos. Na

abordagem AGEE, a globalização é construída através de atividades econômicas,

políticas e culturais, relacionadas entre si, que podem ser caracterizadas como

hiper-liberalismo, governação sem governo e mercadorização e consumismo,

respectivamente. Para AGEE, a educação não é um reflexo da economia, ou sua

consequência como postula a primeira abordagem, Dale (2004) considera que é

necessário uma análise das relações da educação com a desigualdade social em

nível global como nacional, e alerta para a não neutralidade da prática curricular. O

currículo é o processo de determinar o conteúdo desejável para a educação; e as

metodologias são ditadas pelo sistema educativo como parte de um quadro nacional

regulador mais amplo. Nesse ponto, ele reafirma que “as variações nacionais

continuam fortes, que a cultura mundial está longe de ser homogênea e que a

incorporação do modelo pode acontecer a um nível meramente ritual”.

Resumindo a relação da globalização com a educação da CEMC e da

AGEE, Dale (2004) afirma que as pretensões das duas abordagens são muito

diferentes. Ele considera que a CEMC:

... (trata) fundamentalmente a respeito da existência e da natureza de um conjunto universal de normas, idéias e valores que independentemente de

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qualquer delas informam e modelam a própria natureza dos estados, assim como das suas políticas (...)

E que a AGEE, por sua vez, pretende:

... ter identificado uma mudança de paradigma, um nível novo e qualitativamente sem precedentes de globalização que tem mudado o papel do estado tanto nacional como internacionalmente. Esta mudança afetou diretamente, mas de uma forma mais significativa, indiretamente, através do impacto da globalização sobre o estado, os sistemas e políticas educativas usando mecanismos que podem ser espeficiados e seguidos (...)

Como vimos, ambas as proposições muito tem a contribuir para a

compreensão de como a globalização afeta a educação

Podemos acrescentar, ainda sobre o fenômeno da globalização, que o

mesmo contém aspectos contraditórios (positivos e negativos). É bom lembrar que a

globalização é um processo que vem se desenvolvendo nas sociedades há muitos

anos com mudanças significativas.

Pela própria evolução do capitalismo, ao longo de vários séculos, diversos aspectos vem se alterando: o ritmo, a intensidade, a velocidade, o próprio alcance graças às recentes e incessantes conquistas científico-tecnológicas, graças ao processo de reestruturação produtiva e à reorganização dos processos de trabalho, o fenômeno se tem complexificado sobremaneira, ao longo das últimas décadas (CALADO, 2003).

Quanto ao aspecto contraditório do processo de globalização, nos referimos

à positividade e à negatividade que ela acarreta ao mesmo tempo. No âmbito

mundial, podemos assistir a sinais promissores de mudança qualitativa de vida e

situações humanísticas protagonizadas pela globalização. Da mesma forma, a

globalização pode promover um mundo economicamente injusto, politicamente

desigual e culturalmente opressor. Quanto a essa contradição, Calado (2003) afirma

que o que se deve combater é a natureza perniciosa que o capitalismo vem

imprimindo às relações sociais, em escala mundial. Quanto à globalização, devemos

nos empenhar em nos tornarmos protagonistas de um processo alternativo de

globalização . O autor apresenta alguns pontos – desafio como propostas, mas

adverte que não servem como “receita”. São caminhos e atitudes alternativas seja

no âmbito pessoal, seja no âmbito dos movimentos sociais e organizações de base.

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No âmbito pessoal o autor sugere como valores alternativos dentre outros: a vida

(humana e do planeta), relações horizontais e coletivas, cooperação como chave

para o sucesso de todas, trabalho como auto-realização e, este, deve ser realizado

com a mente e com as mãos, etc.

No âmbito dos movimentos sociais e de organizações de base o autor

elenca vários pontos – desafio tais como: conscientização das raízes estruturais,

mais do que simplesmente conjunturais, não se deixar vencer pela sedução dos

caminhos fáceis; fazer incessante leitura crítica da realidade social, etc. (CALADO,

2003).

Esses e outros caminhos são apresentados e debatidos quando tratamos de

pedagogia crítica e resistência. Passemos a analisar o segundo termo proposto – a

indústria cultural.

A expressão indústria cultural foi utilizada pela primeira vez em 1947, por

Adorno e Horkheimer, dois sociólogos do Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt,

quando publicaram o livro Dialética do Esclarecimento.

A evolução do programa de pesquisas do Instituto de Pesquisa Social de

Frankfurt pode ser dividida em três fases distintas: a fase do “materialismo

interdisciplinar” (1932 – 37), a abordagem da “teoria crítica” (1937 – 1940) e a

“crítica da razão instrumental” (1940 – 1945) (BENHABIB, 1996). Durante essa

trajetória, o objetivo foi sempre elaborar um programa de pesquisa social

interdisciplinar para dar base a uma teoria crítica da sociedade. Nos anos 60, já com

alguns membros do grupo radicalizados nos Estados Unidos, a esses teóricos e seu

conjunto de idéias possibilitou-se falar na Escola de Frankfurt.

Adorno e Horkheimer pretendiam estigmatizar a reprodução em série dos

bens culturais, que eles consideravam colocar em perigo a criação artística. O termo

indústria cultural para eles visava substituir a expressão “cultura de massa”, pois a

mesma induz ao engodo que satisfaz aos interesses dos detentores dos veículos de

comunicação de massa. Estes últimos querem dar a entender que cultura de

massas é como uma cultura surgindo espontaneamente das próprias massas. Para

Adorno, tal não ocorre, pois afirma ele que a indústria cultural é quem adapta seus

produtos ao consumo das massas e determina o próprio produto.

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Adorno e Horkheimer (1985) expõem de modo bem claro que a cultura se

converteu em mercadoria. A proposição advém da expressão desenvolvida por eles

de indústria cultural, a qual refere-se às indústrias interessadas na produção em

massa de bens culturais, ressaltando que a expressão não diz respeito às empresas

produtoras nem às técnicas de difusão de bens culturais, e sim a um movimento

histórico-universal. Para melhor entendermos esse movimento podemos dizer que,

com a civilização, os indivíduos foram retirados do barbarismo, pois ela (a

civilização) é geradora de avanços, porém, ao mesmo tempo, é geradora de “novas

sujeições e dependências responsáveis pelo aparecimento de sintomas regressivos

na cultura e de uma silenciosa coisificação da humanidade” (RÜDIGER, 1999).

De formal geral, a Escola de Frankfurt destacava os aspectos negativos da

modernidade industrial, considerando-a incapaz de transmitir uma cultura que

atingisse os sujeitos em sua profundidade, reduzida à padronização superficial. A

Teoria Crítica realçava a necessidade de valorização do sujeito em seus desejos e

opiniões, a despeito do que denominou racionalidade instrumental.

Esse fenômeno ganhou status de paradigma da sobrevivência e passou a

dominar todas as esferas da sociedade, principalmente na passagem do século XIX

para o XX. O capitalismo passou, então, do estágio da livre iniciativa para o da

competição corporativa, tendo o Estado como interventor. Tudo concorria para que

os novos burgueses fossem abalados por um processo de massificação, pois os

fatos sociais passariam a ter como explicações idéias padronizadas. Daí, a

necessidade da crítica da economia política ser suplantada por uma crítica da

indústria cultural.

A cultura como mercadoria favorece a idéia de que é possível fazer-se

sujeito por meio da compra de bens de consumo. Quanto mais se consome, mas a

indústria tem que produzir ou vice-versa, criando um círculo vicioso cada vez mais

abrangente, compondo o princípio do “consumo estético massificado”. Já não se

detecta um único produto, mas uma produção em série. Não se diferencia mais

entre criação ficcional e prática de mercado. Nas obras de ficção se encaixam os

produtos a serem vendidos, o que se denomina merchandising ou estratégias de

mercado.

No desenho animado vários elementos que o compõem são pensados e

produzidos para encantar, porém, também fazem parte de “uma estratégia comercial

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e discursiva que a emissora chama de entretenimento” (PIROLA, 2006). Os

elementos a que nos referimos dizem respeito à plástica corporal, loccus

frequentado, características de personalidade dos personagens centrais, vilões ou

heróis dos desenhos. São sujeitos padronizados que só mudam na imagem, mas

que se repetem em quase todo desenho animado. As pesquisas de mercado

identificam os valores e expectativas do “leitor modelo”, seja ele criança, jovem ou

adulto. Usam técnicas de captura, de aproximação e de identificação do

telespectador com o desenho. Esse telespectador, do outro lado da telinha, migra

para dentro da trama porque se identifica com os valores ali colocados (está no seu

imaginário). Além do mais, esse encantamento está revestido de valores positivos.

Em se tratando do desenho animado, a imagem é um espetáculo recheado de

cores, brilho, formas, figuras, embaladas pelo som e movimento. A imagem é ainda

um entretenimento, e esse aspecto lúdico advém do fato de ser simplesmente uma

imagem. Os recursos tecnológicos estão cada vez mais refinados, a exemplo da

perolização dos corpos em computação gráfica, a linha transparente e brilhosa que

circunda os desenhos em três dimensões e o contraste das cores.

Resumindo, as mercadorias culturais são criações artísticas e literárias, que

englobam, a partir de então, a ordem econômica. Os meios de comunicação

cumprem um papel determinante nessa dinâmica, quando promovem publicamente

os artigos que “devem” ser consumidos como veículos de determinados valores

comuns. Os produtos da indústria passam a ser produzidos e vendidos como bens

simbólicos e, pouco a pouco, assumem o caráter de mercadorias culturais

tecnológicas. As propagandas de automóveis, veiculadas pela televisão, por

exemplo, transmitem imagens belíssimas de pessoas alegres, bem sucedidas,

saudáveis e que “sabem” o que querem, pois fizeram uma boa escolha, ao

comprarem aquele carro. Assim se procede com todas as mercadorias sejam

produções tecnológicas ou culturais.

Essa última situação percebemos quando se aproxima a exibição de um

novo programa televisivo. A televisão utiliza anúncios insistentes e chamativos (daí o

nome técnico de chamada) que o telespectador se sente impelido a assistir, ficando

impossível de se distinguir o que é arte e o que é anúncio. Esse processo é o que

denominamos indústria cultural, ou seja, “o conjunto de práticas através das quais se

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expressam as relações sociais que os homens entretém com a cultura no

capitalismo avançado” (RÜDIGER, 1999).

Em última instância, constatamos que é, cada vez mais difícil, distinguir se

estamos cantarolando uma música da moda porque gostamos de sua melodia ou

porque insistentemente a campanha publicitária “nos convenceu a gostar”. Embora

concordando com essa idéia, lembramos que o capitalismo criou um mercado de

bens culturais que permitiu aos artistas e intelectuais libertarem-se das autoridades

políticas e religiosas e passaram, como puderam, a viver por conta de sua atividade

criadora. Pode surgir, ainda, o fato de o artista conquistar espaço por meios

inescrupulosos, como assinar obras que não são suas. O mercado da cultura

sempre foi ambivalente na medida em que permitiu a liberdade de criação dos bens

culturais, mas, por outro lado, suscitou a necessidade de esses bens darem lucro

para os que com eles negociavam, levando à sua adaptação o padrão de gosto dos

compradores. O homem torna-se vítima, quando considerado que se instauraria o

seu poder sobre a ciência e sobre a técnica; vê-se dominado por elas, mesmo que

ele não permita essa dominação.

Nas palavras de Adorno (2002) “a indústria cultural impede a formação de

indivíduos autônomos, independentes, capazes de julgar e de decidir

conscientemente“. Até mesmo fora do ambiente de trabalho, na diversão e no lazer,

a indústria cultural utiliza esse espaço com o fim de mecanizar o indivíduo. Ele

“absorve” o conteúdo como um prolongamento do trabalho, isto é, tudo ocorre numa

lógica contínua de: preciso do lazer, preciso do trabalho. Nessa concepção, para

Adorno “a diversão é buscada pelos que desejam esquivar-se ao processo de

trabalho mecanizado para colocar-se, novamente, em condições de se submeterem

a ele”. Exemplificando, podemos lembrar dos conteúdos temáticos dos programas

televisivos, das peças de teatro, dos filmes, ou de atividades físicas de lazer. Todos

são fabricados como cópias ou reproduções do trabalho. O suposto conteúdo é uma

simples fachada: o que lhe é dado é regulado. Parece sinistro e aterrorizante

perceber que sempre haverá uma idéia subjacente nos produtos culturais e que o

homem está sob o poder da mecanização até no seu tempo livre. Para Adorno,

(2002), “só se pode escapar ao processo de trabalho na fábrica e na oficina,

adequando a ele o ócio.”

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A indústria cultural cria condições para a implantação de um comércio, no

qual os consumidores podem ser continuamente enganados em relação ao que lhes

é prometido, mas não é cumprido. A exemplo disso, podemos voltar a propaganda

do automóvel. Ela anuncia que: “algumas pessoas já nascem sabendo o que

querem” e apresentam um bebê dormindo muito confortavelmente no interior do

carro. Porém, a situação demonstra a atitude dos pais para expressarem seu desejo

de “ter” o automóvel e de fazerem calar o choro do filho. O bebê irá continuar a não

saber o que quer, e os pais a se dobrarem pela ilusão de o “ter” ser sinônimo de

“poder”.

Criando “necessidades” ao consumidor, a indústria cultural organiza-se para

que ele compreenda sua condição de mero consumidor, instaurando-se a

dominação natural e ideológica. Essa dominação está intimamente ligada ao desejo

de posse, constantemente renovado pelo progresso técnico e científico e controlado

eficazmente pela indústria cultural. Diante desse contexto, o universo social é um

universo de “coisas” e o homem estaria fascinado com os mistérios do valor e o

poder do dinheiro dessas “coisas”. É o caráter alienado da produção, reflexo

subjetivo da separação entre a capacidade de trabalho do homem e a maneira de

ele se apropriar dos seus resultados na sociedade capitalista.

De acordo com Adorno, o movimento da indústria cultural coincide com o da

publicidade: “a publicidade é o exibir da vida da indústria cultural” (apud RÜDIGER,

1999). Com isso, as pessoas atribuem um valor muito maior às obras de arte, do

que essas obras possuem, pois o que elas estão consumindo é a imagem social que

lhe deu a máquina da propaganda.

Observando as pessoas nos grandes magazines ou “shoppings centers”,

pode-se detectar um prazer no ato de comprar, onde são desprendidas muitas

horas, e não se percebe o tempo passar. Essas pessoas se confundem com os bens

simbólicos, pois esses bens, através da indústria cultural, se assemelham a eles

mesmos. As necessidades passam a coincidir com o exercício, direto ou indireto do

poder de compra. Os valores culturais passam a ser gerados pelo próprio mercado

através dos mecanismos de oferta e procura e a ação da publicidade.

Todos os hábitos de consumo do homem moderno encontram-se

precondicionados pelos esquemas da cultura mercadológica. Todos nós já nos

tornamos, hoje, “filhos” da indústria cultural.

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Por fim, vamos falar sobre consumo que, por sinal, intrinsecamente já foi

abordado quando falamos de globalização e de indústria cultural.

Olmos (2006) nos alerta que a criança nos dias atuais é educada para o

consumo, pois quando assiste televisão é submetida às estratégias de

entretenimento e aceitação de produtos veiculados pela mídia no interior da

programação televisiva, ou apresentados em banners, outdoors, etc.

Esse processo educando para o consumo, permite a construção de valores a partir de modelos que lhe são apresentados por uma sociedade que só reconhece quem tem poder de compra e exclui quem não pode ter acesso aos bens de consumo (OLMOS, 2006, p. 173).

Baseados neste conceito, desde cedo, a criança é tratada como um

consumidor e existe um mercado poderoso destinado a ela. Os estímulos dos meios

de comunicação bombardeiam as pessoas, criando-lhes uma necessidade imperiosa

de consumir.

O mercado contempla a todos, pois oferece uma resposta para cada

ansiedade seja qual for, desde aqueles que seguem o padrão “novela das oito”, que

corresponde à grande massa, até àqueles que contestam esses modelos e não se

identificam com os personagens. O mercado tenta satisfazer a todos diversificando

suas produções.

A oferta do mercado é não somente algo externo, que atua de fora para

dentro, mas também uma representação interna no mundo mental das pessoas.

Quando eles não conseguem comprar um determinado produto que comporia a

imagem ideal, sentem-se excluídos do grupo de “pertença”. Essa é uma estratégia

de indução ao consumo onde griffes 1 se confundem com identidades. A experiência

de não ser adequado(a) é devastadora, e o mercado oferece o objeto que produz a

adequação. Nessa abordagem, os objetos adquirem características humanas e seu

consumo preenche desejos, vazios, carências, sensação de abandono.

A imagem, que está ligada ao produto, é central, nesse mecanismo de colocar um objeto no lugar da carência, de adicionar prazer a sensação de vazio, de trazer alívio ao sentimento de desamparo, de sentir euforia no lugar da dor mental (OLMOS, 2006, p. 179).

1 Griffe S. M. Marca de certos artigos de luxo, em especial dos de vestuário, por via de regra com a

assinatura do fabricante. Fonte: FERREIRA, A. B. H. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

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Se relembrarmos o que foi colocado no capítulo 2, do Embasamento teórico,

vemos o posicionamento teórico de Jean Piaget sobre o desenvolvimento cognitivo

infantil: a criança é um ser em processo de desenvolvimento, com necessidades

próprias em cada faixa etária, e o meio ambiente deve proporcionar estímulos para

que esse desenvolvimento seja integral. O mercado, no entanto, procura estratégias

mais eficientes para conduzir essa criança ao consumo, estimulando-a a não

pensar.

Enquanto Piaget queria alimentá-la com estímulos que potencializassem sua própria capacidade de pensar, o mercado conta com o inverso, a sua atitude passiva de não pensar: “STOP THINKING: DRINK COCA-COLA” ou “NIKE: DO I’T!” (OLMOS, 2006, p. 180).

Os meios de comunicação concorrem grandemente na condução ao

consumo, gerando modelos de identificação de atitudes, valores, procedimentos,

costumes, música, comportamento, ritmo, cotidiano. Quando se publica a

propaganda de um produto, ela só é lícita se o consumidor puder identificá-la de

forma imediata. Com a criança telespectadora, na maioria das vezes, essa

identificação não ocorre, pois ela não distingue o programa da mensagem comercial,

nem reconhece o caráter persuasivo da publicidade. É um crime invisível, porém,

muito poderoso, pois a criança não pode se defender da publicidade diluída no

entretenimento.

Nos episódios do desenho animado Bob Esponja, ele trabalha para a

lanchonete Siri Cascudo, fazendo hamburguer de siri, cuja fórmula só o seu patrão,

o Sr. Siriguejo, sabe e a guarda como um tesouro, pois dela depende seu lucro na

lanchonete. A mensagem comercial embutida nos conteúdos, pode incentivar as

crianças a frequentar lanchonetes de fast-food onde, além dos sanduíches, são

vendidos brindes que formam um kit (McLanche Feliz, por exemplo). Esse

acompanhamento de sanduíche e brinde com o boneco Bob Esponja vestido como

caipira, lembrando as festas juninas comemoradas principalmente no nordeste do

Brasil, fez parte das vendas da lanchonete Burger King entre os meses de maio e

junho de 2009, em todo o Brasil (fotos 1 e 2). A idéia tende a produzir a ligação do

personagem Bob Esponja com o caipira reverenciado pela cultural local.

Consideramos que é uma estratégia de mercado eficaz, pois os indivíduos

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consumidores podem não perceber quando a publicidade está imbuída no produto,

como também a propaganda reveste-se da cultura local como atrativo.

Fonte: Acervo de fotos da pesquisadora

Fotos 1 – Brindes da lanchonete Burger King

Essa propaganda compõe a campanha publicitária elaborada pelo criador e

pelos produtores para a comemoração dos 10 anos de criação do desenho Bob

Esponja. O personagem das aventuras marinhas, tornou-se presente em muitos

produtos destinados ao publico infantil. O personagem do desenho animado Bob

Esponja, tornou-se marca de DVDs, roupas, shampoos, cremes para bebês, e

também em alimentos como sucrilhos, leite fermentado com lactobacilos, iogurte etc.

Dessa forma, torna-se um ciclo vicioso, onde o assistir ao desenho animado leva a

criançada a comprar produtos ligados ao desenho e vice versa.

Fonte: Imagens retiradas de panfletos publicitários de lojas e supermercados

Figuras 23 – Produtos com ilustrações de Bob Esponja

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Quanto à venda de lanche e brinde, o Instituto de Defesa do Consumidor

(IDEC) no ano de 2008 serviu de referência para o projeto lei nº 4815/09, em

tramitação na Câmara dos Deputados aqui no Brasil, proibindo a venda de lanches

ou refeições em conjunto com brinquedos ou brindes. De autoria do Dr. Nechar (PV

– SP) essa prática atinge diretamente o publico infantil, induzindo-o ao consumo e

violando o Código de Defesa do Consumidor (CDC) que proíbe: “o uso profissional e

calculado da fraqueza ou da ignorância do consumidor infantil” (JORNAL CORREIO

DA PARAÍBA – 24/05/2009, p. E6).

É interessante observamos os motivos pelos quais se justificou a criação do

projeto de lei: “... fraqueza e ignorância do consumidor infantil”. Tal justificativa

condiz com uma concepção exclusivista e arcaica sobre as crianças, que

fundamenta o seu não conhecimento do mundo e consequente fragilidade.

O uso gradual da cultura infantil para vender produtos diretamente para as

crianças é uma tendência que se desenvolveu desde o início da era industrial.

Antes, os brinquedos e jogos industrializados direcionavam-se para os pais como mercado, mas do que para as próprias crianças... com o passar dos anos, as companhias desenvolveram linhas de brinquedos que eram criadas para se transformarem em programas de televisão (McALLISTER, 2009).

Na contemporaneidade, a cultura infantil está cada vez mais mercantilizada.

Um fator que acentua esse fenômeno é a utilização de novas tecnologias de mídia,

como a internet, os sistemas de videogames, os DVDs, as mídias móveis, como os

tocadores de mp3, mp4, mp5..., e os telefones celulares com opções de mídia para

download 2. Todas essas técnicas podem ser usadas para transmitir comerciais de

produtos, gerando lucros indiretos por meio da propaganda possibilitando, inclusive,

a mercantilização da cultura infantil.

Nos países que possuem legislação de proteção à infância quanto à

programação televisiva, o tempo da propaganda e o merchandising dirigido às

2 Download – Transferência de arquivo de um determinado servidor para o computador do usuário.

Copiar arquivo. Baixar da internet. Fonte: http://www.cebinet.com.br/pessoais/escada/frcuriosidades01.htm

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crianças é regulamentado. No Brasil, os programas infantis são repletos de

inserções publicitárias (TV Globinho, TV Xuxa e outros).

O Ministério da Justiça no Brasil entre 2005 e 2008, promoveu vários

debates sobre aspectos relacionados, direta ou indiretamente, ao dever

constitucional de exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas

e programas de rádio e televisão. Duas publicações de livros foram realizadas sobre

esses debates, tratando da necessidade de uma nova Classificação Indicativa:

material imprescindível para os profissionais que lidam “com a complexa relação

entre liberdades e responsabilidades no universo da comunicação e da cultura

(ROMÃO, J. E. E. et al., 2006).

Tratamos até aqui da Globalização, Indústria Cultural e Consumo. Um dos

produtos que serve ao mercado da cultura é a fantasia. É sobre a mercantilização da

fantasia que tratamos em seguida.

Os desenhos animados, além da função de entretenimento e lazer, têm

ainda a função mítica e fabuladora, características das obras de ficção. Eles

constituem os líderes de preferência entre crianças de diferentes faixas etárias.

Como os desenhos animados veiculam imagens de violência, expressão de poder,

de assuntos os mais variados, eles estão conquistando um público que inclui,

também, adolescentes e adultos.

Seguindo a lógica da indústria cultural que produz, periodicamente, os filmes

de desenhos animados, novos personagens e enredos são lançados. Muitos desses

filmes transmitidos como episódios pela TV, passam a ilustrar uma série de outros

produtos como capas de caderno, mochilas, chaveiros, camisetas, bonés, etc. Os

personagens principais do desenho tornam-se bonecos vendidos nos grandes

magazines ou distribuídos como “brindes” nas lanchonetes fast-food3. Os desenhos

animados trazem embutidos padrões culturais e de consumo, e fazem parte do

quadro pertinente a um contexto cultural que prega a globalização. Com o desenho

animado Bob Esponja ocorre o mesmo, inclusive quando se produz caracterização

do desenho, levando-se em conta a cultura local. (Veja item anterior). Podemos,

assim, denominar a estratégia econômica como mercantilização da fantasia.

3 Fast-food – Tipo de alimentação, preparada de modo padronizado e para rápido atendimento,

servida em lanchonetes e restaurantes. Fonte: Dicionário Aurélio Eletrônico.

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Alguns produtores dos filmes de desenhos animados trabalham para

grandes empresas da mídia como a Disney, que constitui uma corporação

multinacional. Ela, dentre outras empresas, representa a força motriz por trás da

cultura da mídia, tornando cada vez mais difícil manter o que a indústria do

entretenimento se propõe que é proporcionar os momentos de prazer e de fuga que

as pessoas desejam. Dessa forma a cultura empresarial está reescrevendo a

natureza da cultura infantil. A indústria cultural, com as múltiplas formas de mídia e

tecnologias, transformaram a cultura em uma força fundamental a ponto de “moldar

o significado e o comportamento humanos e regular nossas práticas sociais a todo

momento” (HALL, 1995).

O que nos resta fazer diante dessas máquinas de ensinar, tamanho é seu

impacto e alcance, é promover oportunidades às crianças e adolescentes de uma

leitura crítica das mensagens (GIROUX, 2003, p. 126).

Imagens massificadas preenchem nossas vidas cotidianas e condicionam

nossos mais íntimos desejos e percepções. O que está em questão para os pais,

educadores e outras pessoas, é a maneira como a cultura, particularmente a cultura

da mídia, tornou-se uma força educacional substancial, senão a principal, na

regulação de significados, de valores e de gostos, que estabelecem as normas e as

convenções que oferecem e legitimam determinadas posições de sujeito. O que

poderia estar em questão é como a escola vem se apropriando da cultura sem,

contudo, deixar-se conduzir pela cultura midiática.

Crianças do mundo inteiro têm acesso às produções midiáticas sabendo-se,

no entanto, que, estatisticamente, a distribuição é de forma bastante desigual. Em

muitos países europeus e na América do Norte, no Japão e na Austrália, é bastante

comum as crianças terem todas as formas possíveis e imagináveis de tecnologia de

mídia em suas casas. Em outros países, no entanto, a mídia é bem menos difundida

como nas áreas rurais da África, da Ásia e da América Latina.

Nos lares brasileiros temos constatado a preferência pela televisão dentre

outras tecnologias de mídia. Nas pesquisas sobre crianças e mídia, foram

detectadas influências benéficas como a intensificação do aprendizado, das

capacidades percepto-motoras, da competência social e da tolerância. As

pesquisas, porém, concentram seus estudos sobre as influências nocivas

principalmente no tópico: violência e mídia. Outras influências porém, também são

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investigadas, por exemplo quais concepções são passadas às crianças sobre os

papéis dos gêneros, idosos, famílias, etc. e se seus conteúdos levam ao isolamento,

negligência das tarefas escolares e das atividades ao ar livre, a distúrbios

alimentares e ao consumismo (BUCHT e FEILITZEN, 2002).

Giroux (2003) nos alerta quanto ao consumismo que as mensagens

pedagógicas transmitidas pela programação televisiva, que visam ensinar aos

jovens a serem consumidores. Através da televisão, a mídia utiliza-se de mensagens

sublimares para vender produtos e ideologias. Seja de forma clara ou não alguns

programas de auditório, telenovelas e também desenhos animados apresentam

produtos que são inconscientemente percebidos com probabilidades de aumentar

seu consumo.

A Disney, por exemplo, constitui uma megacorporação produtora de filmes

infantis e de desenhos animados, como também é produtora de correlatos da

indústria da propaganda. Nesse cenário, a Disney, transforma os sonhos de uma

criança em lucros potenciais. A Disney Corporation controla 20 estações de

televisão, 21 estações de rádio, possui canais de televisão, TV a cabo, editora de

livros, parques temáticos, companhias de seguro, revistas, etc. Crianças, jovens e

adultos do mundo todo gostariam de conhecer a Disney World. Portanto, bem mais

que, mercantilizar os sonhos das crianças, também explora o adulto, evocando a

criança que existe em cada indivíduo, levando-os ao consumo uniformizado e

alienante.

Entretanto, alguns estudiosos relativizam esse ponto de vista, como Warnier

(2003) que apresenta três argumentos embasando seu posicionamento:

− primeiramente, afirma que as generalizações sobre o caráter

uniformizado e alienante do consumo de massa não eram baseados em pesquisa de

campo. Através de algumas outras pesquisas, o autor observa que os elementos

culturais globalizados são singularizados e contextualizados de acordo com a

tradição local. As pessoas dão uma “roupagem” diferente aos elementos culturais

globalizados.

− em segundo lugar, apesar de aqueles que apóiam os teóricos da Escola

de Frankfurt subestimarem a capacidade de criação, de inovação e de imaginação

dos sujeitos, esses mesmos sujeitos são motivados por desejos que lhe dão

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imagens, social e culturalmente construídas do objeto desejável. Como assegura

Castoriadis (1982), o imaginário socializado produz criação e diversificação culturais.

E, esse imaginário varia consideravelmente de uma comunidade para outra e se

apóia sobre o que falta na sociedade. Sendo assim, ele produz criando e

diversificando e não apenas reproduzindo.

− o terceiro argumento apresentado por Warnier (2003) contra a premissa

de que a padronização da produção leva a homogeneização do consumo é de que a

indústria coloca no mercado produtos cada vez mais numerosos, porém cada vez

mais diversificados, conforme pequenos grupos ou mercados de “nichos”. A

concorrência leva as empresas a explorar mercados estreitos gerando “uma

fragmentação e dispersão das referências culturais mais do que a homogeneização

destas referências” (WARNIER, 2003).

Concordamos em parte com os posicionamentos, pois, o mercado da

fantasia leva ou não ao consumo uniformizado e alienante. Consideramos que as

estratégias de mercado sempre existiram e não vão deixar de existir, entanto, a

percepção das mesmas pelo consumidor e sua opção em aderir ou não, constitui

tema a ser estudado, impreterivelmente, pelos teóricos da educação. Abordamos,

portanto no próximo item, Os olhares que se cruzam sobre a pedagogia crítica e

outras considerações.

3.4 Construção, Interação, Cultura, Resistência – Henry Giroux: Olhares que

se cruzam

Anteriormente, abordamos no embasamento teórico, mais precisamente nos

capítulos 2 e 3, a construção da compreensão do mundo pelas crianças à luz das

teorias piagetiana e vygotskyana. A primeira descreve que o desenvolvimento infantil

ocorre em uma série de estágios, com mudanças qualitativas e quantitativas do

pensamento da criança. Ela própria, interagindo com o meio em que vive,

desenvolve-se ampliando gradual e qualitativamente sua compreensão do mundo.

Por sua vez, a teoria vygotskyana pontua que, dependendo das experiências sociais

a que as crianças estão expostas, novas e mais complexas funções mentais se

formam. Para ele, o fundamento psicológico humano é cultural e, portanto, histórico.

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Diante de tal afirmação, a consciência humana é uma construção de natureza

histórico-cultural, intimamente relacionada ao processo compartilhado de construção

de signos e significações. À interação piagetiana, Vygotsky (2007) acrescentamos a

internalização da cultura, por isso, dissemos para teoria piagetiana – Um olhar –, e

para a teoria vygotskyana – Outro olhar.

No presente estudo sobre mídia televisiva e subjetividade, outros olhares se

voltam na tentativa de aprofundar o conhecimento. Para tanto abordamos:

Globalização, Indústria Cultural e Consumo. Decorrente da abordagem desses

temas, no presente item apresentamos os olhares que se cruzam. Todos os

conceitos até agora debatidos são usados na compreensão teórica de Henry Giroux

(1986) que nos apresenta considerações sobre cultura, política e práticas

educativas. O estudo da mídia televisiva, através dos desenhos animados, e

subjetividade não poderia deixar de tratar de tais conceitos.

Henry Giroux (1986) coloca como necessária a prática de uma pedagogia

radical, que deve agir de forma aversiva contra todos os tipos de dominação. Para

ele, também é mister desenvolver críticas que proporcionem uma ação social e uma

transformação emancipatória. Essas proposições nos fazem lembrar Paulo Freire4

que afirma: “estar no mundo e com o mundo significa exatamente experienciar

continuamente a dialética entre subjetividade e objetividade”. Ele vai mais além e

nos alerta que jamais devemos “sobreestimar” a subjetividade em detrimento da

objetividade e vice-versa.

Oposta à pedagogia radical, encontra-se a pedagogia tradicional que, na sua

práxis, desconhece conceitos como subjetividade, mediação, classe, luta e

emancipação. Giroux (1986) em defesa de uma teoria crítica da educação, busca

bases teóricas desenvolvidas pela Escola de Frankfurt, cujos representantes:

Adorno, Horkheimer, Marcuse e outros revelam e rompem com as estruturas de

dominação existentes. Para eles, as contradições da sociedade são fonte de análise

que proporcionam distinguir entre o que é e o que deveria ser, portanto, posicionam-

se contra a supressão da subjetividade, da cultura e da consciência na história.

4 Tal citação foi retirada do prefácio elaborado por Paulo Freire do livro: Teoria Crítica e Resistência

em Educação de Henry Giroux (1986).

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A Teoria Crítica da Sociedade nos traz elementos valiosos para a análise de

como a subjetividade é constituída, e de que maneira a cultura e a vida cotidiana

podem representar um novo terreno de dominação.

De início, Adorno e Horkheimer em “Dialética do Esclarecimento” expressam

uma forte crítica quanto “a fé inabalável do modernismo na promessa da

racionalidade iluminista de salvar o mundo dos grilhões da superstição, da

ignorância e do sofrimento” (apud GIROUX, 1986, p. 26). Para esses autores, o

Iluminismo sempre teve como objetivo libertar os homens do medo e proclamar sua

soberania, baseando-se na racionalidade, o que a fez tornar-se presente em todos

os âmbitos desde o século dezessete, penetrando em todos os aspectos da vida

cotidiana, seja nos meios de comunicação de massa, na escola ou no trabalho.

De acordo com a Escola de Frankfurt, a razão contém várias dimensões.

Marcuse, por exemplo, acredita que a razão possui um elemento crítico que é ainda

capaz de reconstruir a história. Já Adorno considera que a razão, para demonstrar

poderes, tem que ser crítica e negativa. Quando ela perde sua faculdade crítica, na

busca de uma harmonia social, torna-se um instrumento da sociedade e entra em

crise.

Para a Escola de Frankfurt a crise da razão se refere a dois aspectos:

− a necessidade em desenvolver uma noção mais autoconsciente de

razão, que contenha elementos de crítica como de vontade humana e de

ação transformativa e,

− atribuição à Teoria a tarefa de resgatar a razão à lógica do positivismo. O

resultado da racionalidade positivista e sua concepção tecnocrítica da

ciência representam uma ameaça à noção de subjetividade e ao

pensamento crítico. Na racionalidade positivista, não se reconhece

fatores por trás do “fato”, os seres humanos e a história são ignoradas.

Assim, em nome da neutralidade, o conhecimento científico e toda Teoria

se tornam racionais e desconhecem categorias fundamentais bem como

sua dicotocomia: consciência e autoconsciência, subjetividade e

objetividade, aparência e essência.

Giroux (1986), ao apresentar a análise da cultura na Escola de Frankfurt,

afirma que a mesma rejeitou a noção sociológica central de que a cultura existia na

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forma autônoma, sem relação com os processos vitais políticos e econômicos da

sociedade. A visão frakfurtiana é de que a cultura assume um papel – chave na

criação da experiência histórica e na vida cotidiana. Adorno e Horkheimer (1985)

argumentaram que a dominação vinha assumindo uma nova forma:

Ao invés de ser exercida primariamente através do uso da força física (o exército e a polícia), o poder das classes governantes era agora reproduzido através de uma forma de hegemonia ideológica; isto é, era estabelecida primariamente através do consentimento e mediada via instituições culturais como as escolas, a família, os meios de comunicação de massa, as igrejas, etc.

De acordo com a Escola de Frankfurt, a cultura como tudo o mais na

sociedade capitalista, havia se transformado em um objeto. Ela, a cultura, havia se

convertido numa outra indústria, que não somente produz bens, senão que também

legitima a lógica do capital e suas instituições. O termo “indústria cultural ” foi

adotado então como resposta à reificação da cultura, para por fim à ideia de que a

cultura surge espontaneamente das massas, e atribuí-la à concentração econômica

e aos determinantes políticos que controlam a esfera cultural em favor da dominação

social e política.

Adorno e Horkheimer (1985) criticam a arte como expressão cultural, quando

esta exclui os princípios de resistência e oposição, ao invés de enfatizar a distinção

entre a realidade e a possibilidade de uma verdade superior ou de um mundo

melhor.

As mensagens e os discursos da indústria cultural são moldados pelas

técnicas e formas advindas da racionalidade positivista e da mutilação dos poderes

da imaginação. Impera a padronização, seja através de excesso de enredos, piadas

e histórias. A mensagem é o conformismo, e o meio para obtê-la é a diversão já

completamente despojada do senso crítico. Há uma redução da cultura à diversão

como também uma consequente divisão estrutural entre trabalho e brincadeira .

Dessa forma, o trabalho se torna enfadonho, tedioso e sem poder aos olhos da

maioria das pessoas, e a cultura se torna o caminho através do qual se escapa do

trabalho. Para Adorno e Horkheimer (1985): o que ocorre é que os indivíduos, na

tentativa de escapar de um processo de trabalho mecanizado, buscam a diversão,

no entanto, no capitalismo moderno, a diversão é extensão do trabalho .

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Adorno (2002), ao discutir a questão do tempo livre e o que as pessoas

fazem com ele, afirma que o tempo livre é acorrentando ao seu oposto, ou seja,

aquele que é preenchido pelo trabalho. Na sua análise, o autor afirma que não

deveria ser assim. O tempo livre não pode ser sinônimo de liberdade organizada,

pois seria coercitivo ter um hobby como obrigação. É fugir da iminência do tédio

que, no entanto, “só existe em função da vida sob a coação do trabalho e sob a

rigorosa divisão do trabalho” (ADORNO, 2002). O tédio está intimamente

relacionado ao sentimento de impotência (não poder fazer) e, também, à falta e ao

atrofiamento da fantasia o que decorre em deixar as pessoas desamparadas em seu

tempo livre. Aqui se faz conveniente lembrar um episódio do desenho animado Bob

Esponja, intitulado: Férias Desastrosas (2007), onde relata que Bob Esponja nunca

tirou férias do trabalho. Para evitar ser multado, o Sr. Siriguejo, seu patrão, o obriga

a tirar folga. Todo o enredo do episódio transcorre na descrição do desespero do

Bob Esponja em não saber o que significa férias e o que ele irá fazer com seu tempo

livre. O episódio demonstra claramente o que Adorno afirma: é a ideologia que

domina e controla, de fato, a consciência e a inconsciência daqueles aos quais se

dirige. No caso do desenho animado referido, a ideologia capitalista prega que só

vale aquele que produz, aquele que trabalha. Tempo livre é desperdício para muitos,

e para outros uma espécie de “esmola”. Alguns indivíduos não percebem como

estão acorrentados ao trabalho e ao sistema, que seguem dessa forma sem

perceber que já não necessitaria desse trabalho. Ainda no episódio Férias

Desastrosas (2007), o autor apresenta Bob Esponja preocupado com a produção de

sanduíches da lanchonete em que ele trabalha. Ele considera que só ele poderá

fazer sanduíches saborosos. Esse é um dos mitos do capitalismo, que faz o

empregado se sentir insubstituível dedicando-se integralmente à empresa, inclusive

defendendo-a como a melhor. Esse mecanismo, tão popularmente conhecido como

“vestir a camisa da empresa” concorre para que alguns empregados negociem suas

férias com a empresa, durante vários anos. Mas não é só isso: negocia-se também

porque se ganha pouco e se quer consumir muito, num intricado jogo simbólico que

é o capitalismo.

Até o momento, falamos nesse capítulo sobre as considerações teóricas

frankfurtianas, apresentadas por Giroux, a respeito da dinâmica social, onde a

cultura existe como resultado da relação entre os processos vitais políticos e

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econômicos da sociedade. Como proposta, Giroux (1986) vai além, apresentando

uma visão radical da Educação. É sobre essas práticas educativas que tratamos a

seguir, o que nos proporciona uma forma alternativa de percebermos a realidade.

Giroux (1986) ao analisar as práticas sociais nas escolas, ressalta que é

imprescindível explicar como o poder e a ação humana interagem nessas práticas.

De início, ele argumenta que:

... sempre houve um compromisso poderoso e profundo para com uma visão da escola e da pedagogia de sala de aula em termos que separam o poder do conhecimento, enquanto simultaneamente abstraem a cultura da política (p. 103).

Para ele, a teoria educacional, seja na versão conservadora como na liberal,

sempre se refugiou na lógica da necessidade e da eficiência, apresentando um

discurso político de integração e consenso. Como consequência dessa atitude, a

teoria educacional tradicional elimina a perspectiva histórica, não oferece bases

reais para a compreensão da relação entre problemas, tais como ideologia ,

conhecimento e poder , pois a preocupação é pelo controle, produção e

observação. Nessa perspectiva, o que as escolas definem como “verdadeiro”

conhecimento não reflete o desenvolvimento histórico desse conhecimento, nem

como foi selecionado, usado e legitimado. É preocupante sabermos que é ignorado

o modo pelo qual o poder distribui funções na sociedade. Geralmente, o poder é

distribuído em função do interesse de ideologias e formas de conhecimento

específicos a fim de apoiar grupos e classes nas suas preocupações econômicas e

políticas.

A teoria educacional tradicional, como parte da sociedade em geral, trata a

cultura como uma categoria neutra das ciências sociais. Em contrapartida, a teoria

crítica da educação enfatiza que a cultura se refere a processos específicos que

envolvem relações antagônicas vivenciadas entre diferentes grupos

socioeconômicos. Os referidos grupos têm acesso desigual aos meios de poder e,

como resultado, uma desigual habilidade de produzir, distribuir e legitimar seus

princípios e suas experiências. Essa discussão nos leva a tentar entender como as

escolas produzem subjetividades e significado, e qual a sua relação com o poder e o

controle. A chamada “nova sociologia da educação” (GIROUX, 1986) não separa

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conhecimento de poder e argumentam que todo e qualquer conhecimento em

qualquer meio social, constitui relações específicas de poder. Este posicionamento

levou os estudiosos a se preocuparem não com o que determinava a consciência

dos professores, mas com as estruturas políticas e econômicas da sociedade maior.

Por isso, essa perspectiva ajudou a reproduzir os próprios mecanismos de

dominação que contestavam, como também ignoraram os espaços ideológicos e

culturais que falam de resistência e de promessa de uma pedagogia crítica

transformativa .

Giroux (1986), criticando as tentativas da nova sociologia da educação em

superar posições estruturalistas e culturalistas anteriores, denominou-as de teorias

da reprodução.

As teorias de reprodução tomam como sua preocupação central a questão de como as escolas funcionam no interesse da sociedade dominante... focalizam como o poder é utilizado para mediar entre as escolas os interesses do capital, ... como as escolas utilizam seus recursos materiais e ideológicos para reproduzir as relações sociais e atitudes necessárias para manter as divisões sociais de trabalho, essenciais às relações de produção existentes (GIROUX, 1986, p. 107).

No presente trabalho não nos detemos nos posicionamentos de Giroux

sobre as teorias de reprodução social que ele toma como exemplo, nem nos

trabalhos de Althusser (1969, 1971), de Bowles e Gintis (1976 e 1980) nem nas

teorias de reprodução cultural com o foco nos trabalhos de Bourdieu e seus

contemporâneos (1977) e de Basil Bernstein (1971, 1981). O nosso enfoque será

em suas críticas a essas teorias de reprodução social e cultural, onde ele ressalta a

importância da resistência , designando-a como um conjunto de elementos de

oposição parcialmente conscientes, que impede a reprodução e, como construto

teórico e ideológico, fornece um foco importante para se analisar as relações entre a

escola e a sociedade maior. É através do estudo sobre resistência, que podemos

avaliar o fracasso educacional experimentado pelos grupos subordinados, e também

nos possibilita pensar e reestruturar as formas de pedagogia crítica.

É necessário precisão acerca do que é e do que não é resistência. A mesma

redefine as causas e o significado da conduta de oposição ao argumentar que tem

pouco a ver com desvio, patologia ou aprendizagem deficiente. Tem muito a ver com

a lógica da moral e da indignação política.

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Giroux (1986) afirma que, para compreender as complexas relações entre

escolarização e sociedade dominante, é imprescindível buscar redefinir a

importância de poder, ideologia e cultura como construções centrais e tomar como

pontos de partida para análise, os conceitos de conflito e resistência.

A noção de resistência indica a necessidade de se entender mais completamente as maneiras complexas pelas quais as pessoas medeiam e respondem à intersecção de suas próprias experiências de vida com as estruturas de dominação e coerção (GIROUX, 1986).

São categorias centrais que emergem da problemática da resistência:

intencionalidade, consciência, o significado do sentido comum e a natureza e valor

do comportamento não discursivo.

A resistência amplia a noção de poder, considerando-o multidimensional, ou

seja, ele não só é exercido como um modo de dominação, mas também como um

ato de resistência ou ainda como produção cultural e social criativa.

Na base da noção da resistência deve existir sempre uma esperança

expressa como um elemento de transcendência para uma transformação radical. Ela

tem que se situar numa perspectiva que adote a noção de emancipação como seu

importante guia. A resistência deve ter uma função reveladora, que apresente uma

crítica à dominação, ofereça as oportunidades teóricas para a auto-reflexão e lute

pela emancipação.

Comportamentos de oposição podem ser usados para melhorar a vida

humana ou para a sua destruição e desvalorização. Não podemos permitir que o

conceito de resistência se torne uma categoria indiscriminada. Pelo contrário,

resistência deve reunir o sentido crítico e o interesse no aumento de consciência

radical e na ação crítica coletiva.

Todo comportamento de oposição deve ser analisado se constitui ou não

resistência. Também é importante lembrar que todo comportamento de oposição

representa uma base para o diálogo e para a análise crítica.

A resistência tem ainda valor como princípio educacional que reside em

definir as noções de estrutura e ação humanas, bem como os conceitos de cultura e

de autoformação em uma nova problemática.

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O conhecimento educacional, os valores e as relações sociais estão agora colocados dentro do contexto de relações antagônicas vividas, e precisam ser examinados conforme são expressas dentro das culturas dominantes e subordinadas que caracterizam a vida escolar (GIROUX, 1986, p. 151).

O estudo sobre resistência proporciona, ainda, dar voz aos alunos e escutá-

los para que mantenham e estendam as dimensões positivas de suas próprias

culturas e histórias, bem como, chama atenção para modos de pedagogia que

revelam os interesses subjacentes nos vários sistemas de mensagens da escola,

particularmente no currículo, metodologia e procedimentos de avaliação.

Educação e emancipação humana estão ou deveriam estar em íntima

relação. “O maior objetivo da educação é formar pessoas capazes de tomar parte

em sua própria liberação” (CONNELL et alli, 1982, apud GIROUX, 1986).

Concordando com essa premissa, é conveniente, portanto, tratarmos de resistência

e pedagogia crítica como categorias intrínsecas e valiosas para o nosso estudo.

Concluindo os comentários sobre resistência, falemos sobre pedagogia crítica

enfatizando, a priori, a conexão entre esses dois construtos teóricos.

Concordando com Giroux (1986), consideramos fundamental entendermos

que as escolas não são apenas locais de reprodução sócio-cultural, são também

lugares envolvidos em contestação e luta. Como esta referência, constatamos ser

imprescindível sabermos como atuar dentro e fora das escolas, promovendo

condições para que os agentes sociais (pais, educadores, crianças, etc.)

compreendam a si próprios, sua situação sócio-histórica e conheçam suas

possibilidades de ação.

As escolas e a pedagogia crítica deveriam se basear em pressupostos

importantes. O primeiro deles é a necessidade de um discurso crítico que mostre

seres humanos oriundos de diferentes classes sociais, reagindo ou não às

dificuldades.

O segundo pressuposto é que as escolas devem ser vistas como locais

sociais contraditórios, e não locais de pura acomodação, mas sim ambiente de luta

propiciando ensino, conhecimento e práticas emancipatórias. Uma escola é lugar de

pluralidades contraditórias que geram possibilidades tanto para a mediação quanto

para a contestação das ideologias e práticas dominantes.

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Um terceiro requisito é que a finalidade da escolarização e da pedagogia

crítica é promover a capacitação das pessoas das classes oprimidas a reivindicar

suas próprias vozes e, com isso, suscitar o interesse coletivo para a reconstituição

de uma sociedade maior.

Realizadas as considerações sobre resistência e pedagogia crítica,

finalizamos o percurso teórico da pesquisa. Passamos a descrever a metodologia da

mesma de forma pormenorizada, visualizando os diversos passos do processo.

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4 ORGANIZAÇÃO DOS DADOS DA PESQUISA

4.1 Natureza e Locus da Pesquisa

Trata-se de uma pesquisa de caráter etnográfico, realizada na Escola de

Educação Básica da Universidade Federal da Paraíba (EEB – UFPB) – Campus I –

João Pessoa, que atende crianças de 02 (dois) a 08 (oito) anos de idade. A situação

sócio-econômica varia, pois há alunos filhos de professores, funcionários, de alunos

dessa instituição e também aqueles residentes nos bairros próximos a ela. A

situação sócio-econômica varia então desde alunos filhos de classe média, até

alunos oriundos de famílias com menor poder aquisitivo.

Como abordagem qualitativa, a pesquisa etnográfica busca os dados

diretamente na fonte e tem o pesquisador como seu principal instrumento “... a

pesquisa qualitativa supõe o contato direto e prolongado do pesquisador com o

ambiente e a situação que está sendo investigada, via de regra através do trabalho

intensivo de campo” (LÜDKE e ANDRÉ, 1986).

Na coleta de dados o pesquisador deve estar atento ao maior número

possível de elementos, pois um aspecto que lhe pareça trivial, poderá ser essencial

para a melhor compreensão do problema que está estudando. Sua preocupação

deve ser maior com o desenvolvimento processual da pesquisa do que com os

resultados, interessando-se em verificar como o problema se manifesta nas

atividades, nos procedimentos e nas interações cotidianas.

Na pesquisa etnográfica há sempre o cuidado de se considerar os diferentes

pontos de vista dos participantes, e a análise dos dados tende a seguir um processo

indutivo, ou seja, não há uma definição rígida e a priori de hipóteses. Não implica, no

entanto, que não haja um planejamento e um embasamento teórico, apenas o

propósito de não tomar uma atitude inflexível diante do problema investigado.

Coletamos pessoalmente os dados, para que se garanta “a riqueza do contato

íntimo e pessoal com a realidade estudada” (p. 14).

A abordagem etnográfica nos permite combinar vários métodos de coleta. A

presente pesquisa utilizou a observação direta das crianças, entrevistas, conversas

em grupos, videoteipes dessas conversas e outros métodos que colaboraram para

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fornecer um quadro completo da situação estudada, ou seja, a análise da opinião

das crianças sobre um episódio do desenho animado Bob Esponja.

Os dados coletados apresentam material produzido pelos pesquisados,

sendo, histórias, frases tiradas das entrevistas, desenhos e outros que ilustrem a

perspectiva dos participantes, valorizando a voz infantil. Nessa pesquisa,

priorizamos a concepção da criança capaz, produtora de cultura, abandonando o

ponto de vista consolidado ao longo do tempo que repudiava ou desconfiava das

capacidades infantis e de sua maturidade para opinar sobre suas vidas.

O pressuposto teórico para a escolha da abordagem etnográfica

fundamentamos na perspectiva de compreensão do comportamento humano,

tentando entender o quadro referencial onde ocorre tal comportamento. Nessa

abordagem o pesquisador precisa fazer um mergulho no contexto cultural dos

sujeitos pesquisados. A investigação etnográfica desenvolve-se em três etapas:

exploração, decisão e descoberta (LÜDKE e ANDRÉ, 1986).

Na fase de exploração definimos o problema a ser estudado, a escolha do

local onde foi realizado o estudo e estabelecimento dos contatos. Também nessa

fase foram realizadas as primeiras observações.

Para o local da pesquisa foi escolhida uma escola, pois é de interesse

observar crianças em grupo e promover conversas sobre o desenho animado

assistido. Entendemos que a escola revela valores sociais e culturais que compõem

a socialização dos seus educandos, porém, em se tratando da educação infantil,

somente conhecendo muito bem a escola é que o pesquisador identificará a

identidade dessa escola. Portanto, fazemos parte do quadro efetivo de professores

dessa instituição e também já realizamos acompanhamento pedagógico de alunos

de estágio do curso de Pedagogia na EEB – UFPB.

O quadro de pessoal da Escola de Educação Básica da UFPB, durante a

pesquisa (2009), é composto por 11 professores efetivos, 13 professores bolsistas,

01 pedagoga, 02 assistentes sociais, 02 nutricionistas, 01 enfermeira, 02 auxiliares

de enfermagem, 01 copeira, 01 cozinheira, 02 recreacionistas e 03 funcionários

administrativos.

A Escola de Educação Básica se localiza na Cidade Universitária de João

Pessoa, que situa-se entre os bairros Bancários e Castelo Branco. Configura-se

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como campo de ensino no desenvolvimento de suas práticas educativas,

contribuindo para o processo de produção do conhecimento na graduação e pós-

graduação e efetivação do compromisso social da Universidade.

A Escola passou por uma reforma em 2008 em sua estrutura física,

ampliando o pátio principal, criando duas áreas de convivência e a construção de

mais duas salas de aula, perfazendo atualmente um total de sete. Conta ainda com

o espaço lúdico composto pela brinquedoteca, sala de jogos, sala de leitura e sala

de TV. Na área externa, os brinquedos foram deslocados para o pátio e há previsão

para construção de quadra de esportes, e um novo prédio ao lado do atual onde

funcionará o Ensino Fundamental.

4.2 Procedimentos na Construção e Análise dos Dado s

Escolhemos a análise de conteúdo para efetuar o tratamento dos dados,

pela natureza intrínseca dessa técnica, a manipulação de mensagens (conteúdo e

expressão desse conteúdo), para dar evidência dos indicadores que propiciam inferir

sobre uma outra realidade que não a da mensagem.

A presente pesquisa trata da produção de sentido frente ao D.A. Bob

Esponja. Achamos conveniente compreendermos sua conexão no desenrolar do

procedimento através da análise de conteúdo.

A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das

comunicações e se organiza em três fases: pré-análise, exploração do material e,

por último, a fase do tratamento dos resultados, ou seja, a inferência e a

interpretação (BARDIN, 1977).

A pré-análise é a fase da organização propriamente dita, onde escolhemos

os documentos a serem analisados, formulamos a(s) hipótese(s) e os objetivos. A

leitura flutuante dos primeiros dados coletados só foi possível após os contatos com

os indivíduos a serem pesquisados através de observação direta no parque da

escola e em sala de aula, em conversas informais com professores e demais

profissionais da escola que nos acolheram com receptividade nos dois turnos. Pouco

a pouco, a tese da investigação foi se delineando:

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O desenho animado Bob Esponja com seus conteúdos ao mesmo tempo que diverte, ele interfere na formação da subjetividade de crianças de 3 a 5 anos de idade e que, por sua vez, constroem sentido para o que assistem mediante o contexto social em que estão inseridas.

Concomitantemente, os objetivos da pesquisa foram definidos, como já

apresentamos anteriormente.

a) Investigar como ocorre o processo de construção de sentidos em

crianças de 3 a 5 anos de idade ao assistirem o desenho animado Bob

Esponja e como ele influencia em suas subjetividades.

b) Verificar qual a frequência com que as crianças de 3 a 5 anos assistem

ao desenho animado Bob Esponja e a preferência em relação ao mesmo.

c) Atribuir à criança a condição de receber e participar como autora das

produções culturais.

d) Incentivar educadores a desenvolverem o hábito de relacionar-se

criticamente diante da mídia televisiva, especialmente diante dos

desenhos animados.

À medida que transcorriam a interação com o locus e com os sujeitos, com

os documentos ou fontes para análise, foi sendo construído o corpus da pesquisa:

entrevistas, desenhos e falas da roda de conversa. Esse corpus, submetido aos

procedimentos analíticos, gerou indicadores para a codificação e subsequente

categorização, no intuito de alcançar os objetivos.

Para a categorização consideramos grupos de elementos constitutivos de

um conjunto previamente designado. Escolhemos as categorias empregando o

processo designado de procedimento por “caixas – aplicável no caso da organização

do material decorrer directamente dos funcionamentos teóricos hipotéticos”

(BARDIN, 1977). As categorias corresponderam aos conceitos teóricos do nosso

embasamento: representação – Piaget, internalização – Vygotsky e resistência –

Giroux.

Descrevemos, em seguida, os procedimentos adotados em campo, os quais

são divididos em primeira e segunda fases. Na primeira fase tratamos como

definimos os sujeitos participantes que teriam que ter conhecimento prévio do

desenho animado Bob Esponja Calça Quadrada. Denominamos essa fase de

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Aproximação e Busca e coletamos dados sobre o reconhecimento do referido

desenho entre outros e de seus personagens.

Na segunda fase da pesquisa, nós a denominamos de Interação e

Registro . Nela descrevemos o processo de escolha do episódio a ser assistido, as

falas das crianças na roda de conversa e seus desenhos. Simultaneamente a cada

apresentação dos dados realizamos a análise de conteúdo.

4.3 Descrição e Análise da Primeira Fase da Pesqui sa – Aproximação e Busca

Foram escolhidos dentre o universo total de alunos da escola, os sujeitos de

3 a 5 anos de idade, que já tinham conhecimento prévio sobre o desenho animado

Bob Esponja.

Quadro 1 – Nº total de alunos de 3 a 5 anos (2009)

IDADE

TURNO

3 ANOS

4 ANOS

5 ANOS

MANHÃ 12 A = 11 / B = 10 11

TARDE 13 A = 12 / B = 12 14

TOTAL 25 45 25

TOTAL GERAL 95

Fonte: Secretaria da EEB – UFPB

Nos primeiros contatos da pesquisa, objetivamos o conhecimento e

aproximação do ambiente físico, da equipe administrativa, da dinâmica de

funcionamento da escola e das crianças que constituir iam os sujeitos

participantes.

O consentimento da direção da Instituição (Termo de Anuência) e dos pais

das crianças participantes da pesquisa foram providenciados previamente (Termo de

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Consentimento – Apêndice 1). Às crianças também foi indagado, oralmente, se elas

se dispunham a participar da pesquisa, e se os desenhos sobre o vídeo poderiam

ficar com a pesquisadora. Com o objetivo de detectar se as crianças de 3 a 5 anos

reconhecem os personagens principais do desenho animado Bob Esponja,

utilizamos um boneco de pelúcia Bob Esponja e dois bonecos de borracha

representando Bob Esponja e Patrick, o melhor amigo de Bob Esponja. Quando os

personagens foram “apresentados” às crianças os questionamos: “Quem é esse?

Qual é o desenho animado que ele participa?

Como previamente tínhamos perguntado e escrito o nome de cada aluno, ao

se pronunciarem quando questionados, anotações ao lado dos nomes das crianças

eram realizadas. Para elas, as respostas foram dirigidas aos bonecos e não à

pesquisadora. Após os questionamentos, cada criança ficou um “pouquinho” com os

bonecos, abraçando-os, conversando com eles ou brincando com os colegas.

Participaram dessa dinâmica os alunos que estavam presentes na escola no

momento de sua realização como descrito no Quadro 2.

Quadro 2 – Número de meninos e meninas pesquisados quanto ao reconhecimento do desenho animado Bob Esponja, seus personagens e sua preferência por eles.

Idade e Sexo

Turno

MANHÃ

3 anos

M = 3 F = 7

4 anos

Turma A M = 6 F = 5

Turma B M = 2 F = 7

5 anos

M = 3

F = 5

TARDE

M = 6 F = 3

Turma A M = 3 F = 5 Turma B M = 6 F = 5

M = 8

F = 3

TOTAL 19 38 19

TOTAL GERAL 76

Fonte: Dados da pesquisadora

Quanto ao reconhecimento do desenho animado Bob Esponja, dentre

outros, utilizamos gravuras de vários personagens de desenhos animados e

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apontando perguntávamos: Quem é esse? Qual é o desenho animado que ele

participa? (Figuras 24).

Fonte: http://images.google.com.br

Fonte: http://images.google.com.br

Fonte: http://images.google.com.br

Figuras 24 – Ilustrações de vários desenhos animados.

O Bob Esponja foi apresentado dentre outros personagens que também

fazem parte do desenho, e a cada criança solicitamos relacionar as gravuras com a

história do mesmo (Figuras 25) perguntando: “Quem é esse personagem? O que ele

faz no desenho?

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Fonte: http://images.google.com.br

Figuras 25 – Ilustrações referentes ao desenho animado Bob Esponja

Na obtenção dos dados até agora descritos foram necessários vários

encontros até que todas as turmas fossem pesquisadas.

Para que a pesquisa prosseguisse, necessitávamos do consentimento

esclarecido dos pais. Durante essa “espera”, de aproximadamente um mês, fizemos

contato direto e efetivo com as crianças e professoras. Participamos, por exemplo,

por convite das próprias crianças e professores, do Dia da Família e de atividades

recreacionais na escola.

O quadro 3 apresenta os dados obtidos nessa primeira fase da pesquisa.

Constatamos que apesar de todas as crianças reconhecerem os personagens do

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referido desenho em todas as turmas, a preferência ficou abaixo de 50%,

aproximando-se apenas nas turmas de 3 e 5 anos.

Quadro 3 – Caracterização das crianças em função do reconhecimento do desenho

animado Bob Esponja e sua preferência.

Crianças por turma Reconhecem o d.a. Bob Esponja

Tem preferência pelo d.a. Bob Esponja dentre

outros

3 anos (Total 19)

100% 42,10%

4 anos (Total 38)

100% 39,47%

5 anos (Total 19)

100% 47,36%

Fonte: Dados da pesquisadora

O reconhecimento unânime, pelas crianças, do desenho animado Bob

Esponja e dos outros a elas apresentados comprovam que a televisão, penetra

todas as esferas da vida social moderna.

Quanto ao personagem Bob Esponja, as crianças, não o percebem somente

através do desenho animado. Como apresentamos no capítulo 5, na Globalização,

Industrial Cultural e Consumo , como estratégia de maior consumo, Bob Esponja

tornou-se marca de DVDs, roupas, shampoos, creme para bebês e também

alimentos como leite fermentado, sucrilhos, etc.

Outro registro que fizemos diz respeito à observação de uma garota da

turma de 4 anos. Na primeira fase da pesquisa, a fase de aproximação e busca, ao

falarmos na lanchonete em que Bob Esponja trabalha, a criança prontamente

relacionou: Profª., esse final de semana eu vou lanchar na McLa nche Feliz! Esse

é o contexto social e cultural ao qual ela está inserida e nada mais coerente reagir

dessa forma. O fenômeno da globalização favorece a indústria cultural que, através

do consumo, ambos regulam nossas práticas sociais. “As corporações

multinacionais da indústria do entretenimento se propõem a proporcionar os

momentos de prazer e de fuga que as pessoas desejam. Segundo o exposto, a

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cultura empresarial está reescrevendo a natureza da cultura infantil” (OLMOS,

2006).

Alguns fatores podem justificar o percentual de preferência do D.A. Bob

Esponja como o horário em que o desenho animado é transmitido pela TV aberta,

ser o mesmo que a turminha da manhã frequenta a escola; a preferência das

crianças pelos outros desenhos animados apresentados: Meninas Superpoderosas,

Dragon Ball, Dexter, Jimmy Nêutron, Pica-pau e Tom e Jerry caracterizados como

desenhos animados nos quais os personagens se dividem em dois grupos, ou seja,

o do bem e o do mal, que competem entre si e que conquistam o interesse das

crianças dessa faixa etária. Todo o desenrolar das histórias descreve um grupo

tentando vencer o outro. Geralmente, o grupo do bem, após passar por penosas

provas, vence o mal.

No artigo: Ensinando a dividir o mundo; as perversas lições de um programa

de televisão, Costa (2002) apresenta a televisão “como um dispositivo que integra o

aparato pedagógico das sociedades governamentais modernas, ensinando muitas

coisas, entre elas um conjunto de verdades que compõe o currículo cultural no qual

se aprende a dividir o mundo”. A autora analisou o programa Bambuluá, exibido pela

Rede Globo de Televisão (Brasil), direcionado à crianças e adolescentes. A análise

mostra como todos os elementos da vida são arbitrariamente dispostos de um ou de

outro lado na trama do programa, numa estratégia política cultural de dividir o

mundo. O artigo discute ainda que a educação deve contribuir para o entendimento

das diferenças e não para ensinar as divisões. O que constatamos ainda é que os

referidos desenhos animados, além de apresentar um mundo dividido, apresentam

estratégias utilizadas pelos heróis do bem para conseguirem vencer tão perversas e

desrespeitosas quanto às dos vilões do mal. É preocupante perceber a preferência

das crianças de 3 a 5 anos por esses desenhos animados. O D.A. Bob Esponja

encontra-se também nesta categoria.

As crianças de 3 anos, em sua maioria por não ter desenvolvido ainda a

articulação correta de alguns fonemas, pronunciavam “Bogui Ponga” (Bob Esponja);

“Tasa” (Casa) etc., o que não as impediam de conversar sobre Bob Esponja e os

outros personagens do desenho animado

Nas turmas de 4 anos, ao falarem sobre o desenho animado Bob Esponja,

três alunos da turma B da manhã e três alunos da turma B à tarde, descreveram

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com detalhes características e episódios do referido desenho. Transcrevemos

algumas frases e os analisamos em seu conjunto mais adiante neste trabalho.

− “Bob Esponja tem um bichinho que fala”

− “O bichinho de Bob Esponja é como um cachorro”

– “Bob Esponja mora no fundo do mar. Trabalha na lanchonete Siri

Cascudo”.

− “O melhor amigo de Bob é Patrick”

− “Patrick é muito lindo!”

− Eu amo Bob, mas eu amo mais ainda Power Rangers.

− Esse final de semana, vou lanchar no McLanche Feliz.

As crianças de cinco anos, se posicionaram criticamente diante do Bob

Esponja, colocando livremente sua opinião, como por exemplo:

– “Bob esponja trabalha na lanchonete que é do Sr. Siriguejo, um homem

chato que gosta muito de dinheiro. Ele só fala em dinheiro”.

– “Eu gosto mais de Power Rangers porque é (filme) de menino”.

– “Eu gosto de Meninas Superpoderosas porque é pra menina”.

– “Tia, você sabe que tem um jogo de computador do Bob Esponja? Eu jogo”

– “Qual é o site” (Após a fala anterior)

4.4 Descrição e Análise da Segunda Fase da Pesquis a – Interação e Registro

4.4.1 Escolha do Episódio

Tendo em mãos o consentimento dos pais das crianças, partimos para a

escolha do episódio do desenho animado Bob Esponja, que seria assistido pelas

crianças. Para tanto, levamos vários exemplares para as salas de aula e deixamos

que elas, livremente, escolhessem qual seria o episódio que assistiram

conjuntamente. Apresentamos DVDs do Bob Esponja de 2004 e 2007.

− Bob Esponja (O Filme) (2004)

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− A terceira temporada completa (Discos 1 e 2) (2007)

− Bob Esponja e seus amigos em confusões aquáticas (2004)

Dentre os títulos apresentados, Bob Esponja e seus amigos em

Confusões Aquáticas (2002), foi escolhido por aclamação. Esse vídeo é composto

por vários episódios e os participantes da pesquisa escolheram: Calça Rasgada

como aquele que iria ser assistido.

No período que antecedeu a sessão do vídeo, algumas crianças vinham nos

perguntar sobre Bob Esponja: se ele estava bem, mandavam beijinhos para ele e

com insistência perguntavam qual seria o dia deles assistirem ao vídeo do episódio.

Nesse episódio, Bob Esponja tenta impressionar Sandy (Esquila) na praia,

esforçando-se para imitar outros personagens como o Lula Molusco. Porém, a

Lagosta, que é atleta, começa a dar um show levantando objetos pesados e todos

ficam admirados. Bob Esponja também levanta alguns objetos leves e não convence

a platéia de que é forte. Acidentalmente, ao se esforçar, rasga suas calças. Ele fica

com vergonha enquanto todos riem dele, julgando que foi de propósito. Bob vê que o

rasgo foi um sucesso. Passa a repetir, então, a façanha em muitos momentos, agora

de propósito. Chega a fingir que está se afogando e quando o salva-vidas o retira do

mar ele diz: “Quero um alfaiate, porque minhas calças estão rasgadas”! Nessa

ocasião todos se afastam dele e a Sandy diz: “Bob Esponja, você passou dos

limites”. Os amigos não mais acharam graça naquela brincadeira e o evitam com

raiva. Nesse momento, o episódio focaliza outros fracassados como a peixinha que

não passou protetor solar e ficou muito vermelha, a baleia que se enterrou na areia e

esqueceu de sair de lá, e o tubarão que encheu seus sanduíches de areia. Eles se

unem, choram, se lamentam e pensam num modo diferente de agradar os amigos.

Resolvem, então, formar uma banda onde cantam e tocam instrumentos. A letra que

compõem, fala de amizade e pedidos de desculpas. Os amigos ao assistirem a

apresentação do grupo, aplaudem e vibram com o novo quarteto. Alguns pedem

autógrafos a Bob Esponja, que sorri feliz com o que causou, recebem aplausos em

sinal de aprovação.

Constatamos que o episódio trata de atitudes positivas e negativas dos

personagens, na tentativa de conviver com os amigos e de agradá-los. Observamos

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atitudes praticadas com o intuito de chamar a atenção e de ser o melhor. Vejamos

as atitudes predominantes no conteúdo desse episódio:

1) Exibição:

− Bob Esponja faz Sandy sorrir imitando outros personagens.

− Bob Esponja tenta levantar pesos, para ser admirado pelos amigos

quanto a Lagosta atleta.

− A Lagosta se orgulha de ser capaz de levantar pesos maiores do que

aqueles que Bob Esponja levanta.

2) Fingimento buscando atenção:

− Bob Esponja finge rasgar as calças para provocar risos e ser o centro

das atenções.

3) Intolerância:

− Os amigos de Bob Esponja demonstram intolerância com a atitude dele

de fingimento, impondo-lhe um limite.

4) Aceitação da regra do grupo:

− Bob Esponja volta a ser verdadeiro e pede desculpas a todos.

5) Retorno ao grupo (Reinclusão)

− O grupo reinclui Bob Esponja com aceitação de suas desculpas e

aprovação de sua nova atitude, ou seja, ser verdadeiro.

4.4.2 Assistindo ao episódio

O episódio Calça Rasgada foi assistido pelas turmas, em dia e horário

agendados, conjuntamente com as professoras das turmas e a pesquisadora. Os

alunos que assistiram ao vídeo foram aqueles que estavam presentes na escola na

ocasião (outubro/2009), ou seja, 62 distribuídos da seguinte forma.

Quadro 4 – Número de alunos por turma e turno que participaram da segunda fase da pesquisa:

TURMA TURNO

Manhã Tarde Total

3 anos 7 9 16 4 anos Turma A 9 4 13 4 anos Turma B 6 10 16 5 anos 8 9 17 Total 30 32 62 Fonte: Dados da pesquisadora

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As professoras acompanhavam participando, sem interferir com comentários

interpretativos. Sua presença foi importante na medida em que as crianças se

sentiam “acompanhadas”.

Os encontros foram registrados através de filmagens e fotografias. Nenhuma

criança recusou ao convite e todas permaneceram assistindo até ao final do vídeo.

Fizemos comentários pontuais que iriam gerar subsídios para refletirmos na

roda de conversa, em relação à sequência de fatos do episódio. Essas observações

verbais constituem um elo para a codificação dos dados brutos do texto que as

crianças elaboraram na roda de conversa.

1. “Bob Esponja rasgou a calça!”

2. “Ela está rasgando a calça novamente.”

3. “Olha como os amigos de Bob reagiram!”

4. O que “será que Bob Esponja vai fazer agora”?

4.4.3 Roda de conversa e confecção dos desenhos

Em cada turma fizemos a roda de conversa sobre o episódio que assistimos

enquanto as crianças desenhavam, atendendo ao nosso convite: Vamos desenhar o

que assistimos? Também perguntamos: Vocês me dão de presente esse desenho?

Quase todos responderam que sim e alguns questionaram: “Por que tia?

Respondemos: “Vou precisar colocar na minha pesquisa.” A criança ficava satisfeita

com essa explicação e concordava.

Como afirma Vygotsky (2007) a linguagem das crianças de 3 a 5 anos de

idade acompanha o movimento. Dessa forma, todas as crianças, enquanto

desenhavam, falavam sobre o episódio, perguntavam e opinavam livremente.

Algumas anotações in loco foram realizadas sobre os comentários das crianças,

porém, ficava difícil registrar tantos detalhes, além de correr o risco de selecionar

umas e não outras anotações. Mais adiante, os desenhos são apresentados e

comentados. Sendo assim, recorremos à filmadora e à máquina fotográfica digital,

“instrumentos tecnológicos que visam minimizar a intervenção do pesquisador no

processo de captação e registro das falas e ações das crianças (LEITE, 2008).

Recorremos, ainda, ao apoio de uma estagiária em Pedagogia, que atua na escola,

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apresentando a vantagem de estar inserida no contexto da pesquisa. A mesma

realizou filmagens e fotografias das crianças ao assistirem ao vídeo. As crianças

aceitaram a presença da estagiária sem estranheza e não se incomodaram com a

máquina fotográfica e filmadora.

Chamamos “roda de conversa”, pois é através da relação dialógica entre

pesquisadora e a criança, que a mesma torna-se também pesquisadora, onde pode

perguntar e se colocar e, conjuntamente constroem o corpus da pesquisa (Apêndice

2).

Cada turma se posicionou diferentemente nesse momento e nós nos

envolvemos com as crianças numa atitude de observação participativa,

proporcionando-nos uma experiência de construção conjunta de significados e não

meramente uma representação da realidade.

Iniciados os desenhos, sentamos ao lado de cada criança para

“conversamos”. As turmas de 3 anos exigiam a presença, enquanto faziam o

desenho, precisando de supervisão. As turmas de 4 anos e as de 5 anos elaboraram

o desenho e esperavam que sentássemos ao lado para comentar sobre o mesmo. A

pergunta inicial para todos foi:

− Você gostaria de ser Bob Esponja? Por quê?

Em seguida, íamos conversando sem um roteiro rígido de perguntas e as

crianças conduziam a conversa. A nossa expectativa é que elas se expressassem

sobre o episódio quanto:

− Que foi que aconteceu com Bob Esponja no episódio?

− Como os amigos deles reagiram? Por quê?

− Que fez Bob Esponja para que os amigos deles ficassem novamente

alegres?

Pedimos que escrevessem seus nomes para identificar os desenhos. Para

aqueles que ainda não escrevem fizemos a tarefa por eles.

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4.4.4 Você quer ser Bob Esponja? “Falas” das crianças

A transcrição das filmagens de cada turma nos possibilitou organizar e

analisar os dados dando-lhes significados. Na primeira etapa, estamos

sistematizando e analisando as primeiras “falas” das crianças relativas à roda de

conversa.

A atividade iniciou-se com a distribuição de papel e lápis para o desenho, o

qual acompanhamos promovendo um diálogo com perguntas provocadoras de

sentido. A primeira delas, ou seja, “Você gostaria de ser Bob Esponja? Por que ?” foi

respondida pela maioria dos sujeitos com respostas que nos permitiram categorizá-

las em 4 modalidades Sim / Não / Talvez / Não expressaram opinião. O número de

crianças correspondem àquelas que participaram dessa atividade nos dois turnos.

Do total de 16 crianças de 3 anos de idade, 43% responderam que

gostariam de ser Bob Esponja, 38% disseram que não gostaria, 13% expressaram

um talvez e 6% não expressaram sua opinião.

O maior percentual afirmativo são dados que vem corroborar as pesquisas

de Piaget (1976) e Scheibe (2009), que afirmam que crianças menores de 5 anos

tendem a avaliar as mensagens televisivas como parte de sua estrutura,

incorporando inclusive personagens e embora saibam brincar de “faz de conta”,

elas se confundem quanto a uma coisa ser real ou apenas ficção na televisão.

As crianças de 3 anos realçaram aspectos como “gosto dele”, “adoro ele”,

“Ele é engraçado” ou apenas afirmam “Porque sim” para justificar porque querem ser

Bob Esponja. Para dizer que não querem ser Bob Esponja escolhem razões como:

“Ele rasgou as calças” e “Porque quero ser os amigos dele”.

As crianças da turma de 4 anos, no total de 29, apresentaram 27%

afirmando querer ser Bob Esponja, 17% expressando não querer, 3% disseram

talvez e mais da metade, ou seja 53% não colocaram sua opinião. Para as crianças

de 4 anos, a afirmação: “Ele é engraçado”, justifica querer ser Bob Esponja e

“Porque ele morreu” e “Porque quero ser Sandy” explicam não querer ser Bob

Esponja.

Com a turma de 5 anos (17 crianças) os percentuais entre o “sim” – 6%

(querer ser Bob Esponja) o “não” – 36% (não querer ser Bob Esponja) foram

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expressivos. Com esta turma também mais da metade não expressaram sua opinião

ou seja, 59% e nenhuma criança se posicionou com dúvidas (talvez).

As crianças de 5 anos buscaram aspectos relativos a aparência como “Ele é

uma esponja” e “Ele é amarelo” ao afirmar que não querem ser Bob Esponja e, “Ele

tem amigos”, “Ele é legal” para justificar que sim.

4.4.5 Fazendo arte – fantasia e realidade

Continuando a pesquisa, sistematizamos e analisamos o conteúdo das falas

em cada turma, colhidas da transcrição das filmagens no momento da confecção

dos desenhos referentes a cada criança.

Como falamos anteriormente, os desenhos das crianças foram solicitados

como meio de expressão, pois consideramos o desenho como linguagem e um

recurso auxiliar no entendimento infantil e também para facilitar a interação entre a

pesquisadora e as crianças e entre elas mesmas.

Reservamos esse espaço para a apresentação da produção da criança com

o objetivo de valorização dessa produção como algo de relevância cultural, marco de

um contexto e expressão real da subjetividade infantil. Apresentamos os desenhos e

alguns comentários por turma de idade dos dois turnos (manhã e tarde) e para

preservar identidade das crianças usamos letras em lugar dos nomes e o número

refere-se à idade. Anotamos ainda o sexo da criança ao lado do número, sendo “M”

para o masculino e “F” para o feminino.

Muitas crianças desenharam na frente e no verso da folha. A medida que

iam desenhando falavam sobre o vídeo que assistiram, sobre si mesmo, sobre sua

vida na escola ou fora dela. As observações por escrito foram realizadas quando

conversamos, individualmente, com cada uma das crianças.

As frases que apresentamos são colocações da criança no momento de

conversa com a pesquisadora e com as outras crianças.

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“Os menorzinhos” – 3 anos 5

Participaram desse momento da pesquisa 16 crianças, sendo 7 do turno da

manhã e 9 do turno da tarde

3M(A) – À medida que desenhava, falava sobre os personagens do desenho Bob

Esponja. Ele simulava estar escrevendo as palavras além de desenhar os

personagens expressando-se claramente, reforçando a concepção de que o

desenho é linguagem. “Tem Fenda do Biquíni, tem Patrick, tem Bob

Esponja”.

3M(A)

3F(B) – Expressou seu conhecimento sobre o desenho animado Bob Esponja

falando sobre o Patrick e que Bob trabalha na lanchonete. Sua fala

demonstra conhecer bem sobre o desenho.

“Bob Esponja e Patrick trabalhando na lanchonete, foi o que me lembrei”.

3F(B)

5 A ortografia correta seria menorezinhos, porém, usamos o termo menorzinhos registrando a forma

popular comumente veiculada.

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3F(C) – A criança desenhou ocupando todo o espaço da página, falando sem parar

sobre os personagens do desenho “escrevendo” sobre eles.

“Bob Esponja é engraçado. Patrick é seu amigo”

3F(C)

3M(D) – Esse garoto representou Bob Esponja de tamanho grande e tomou quase

toda a folha de papel. “Eu quero ser Bob Esponja, mas só às vezes”. P.

Por que? A criança não responde.

3M(D)

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3F(E) – Com detalhes a criança desenhou o Bob Esponja, disse sua cor, seu amigo

e como gostava dele. “Todo mundo quer ser Bob Esponja. Eu também. Eu

adoro ele”.

3F(E)

3M(F) – Bob Esponja foi representado como figura central do desenho e colocado no

mar onde ele mora. “Desenhei Bob Esponja. Gosto dele.

3M(F)

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3M(G) – Esse garoto desenhou com detalhes tudo que se relacionou ao Bob

Esponja: “que ele faz sanduíche de presunto, seu amigo Patrick e onde eles

moram”. Ele falava e desenhava entusiasmado.

“Assisto Bob Esponja todos os dias. É legal. Assisto ele fazendo

sanduíches de presunto com Patrick. Eu quero ser ele porque ele é engraçado”.

(Esse garoto foi o que mais queria assistir ao episódio).

3M(G)

3F(H) – Desenhou Bob Esponja e disse que quer ser os amigos de Bob Esponja. O

desenho retrata um ser humano. Ao entregar fez formato de envelope,

dobrando a folha de papel. “Não quero ser Bob Esponja. Quero ser os

amigos dele”.

3F(H)

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3M(I) – Primeiro desenhou apenas com lápis preto formas variadas. Virou a folha, e

desenhou Bob Esponja e apontou seu “vestido”.

“Olha o meu. Eu fiz o vestido de Bob Esponja.”

3M(I) 1º

3M(I) 2º

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3M(J) – Perguntou se podia fazer uma casa. Desenhou o sol, Bob Esponja,

passarinho e o mar. Integrou outros elementos ao desenho, referente ao seu

conhecimento em geral.

“Pode fazer uma tasa (casa)?

P. Sim, pode. Então, o que Bob Esponja fez?

“Cantou para os amigos voltarem. Tia, fiz um passarinho e o sol”.

3M(J)

3F(K) – Essa garota desenhou na frente e no verso da folha contando o episódio

que assistiu.

“Os amiguinhos bateram as mãos (palmas) para Bob Esponja. Ele rasgou a

cueca e a calça também”.

3F(K) 1º

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3F(K) 2º

3M(L) – O desenho retrata Bob Esponja com as calças rasgadas como a historinha

do episódio. O garoto descreveu seu desenho, mas a figura não é facilmente

identificada.

“Ele rasgou a cueca e os amigos não gostaram. Depois ele cantou a

música”.

3M(L)

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3F(M) – Dizendo que quer ser Bob Esponja, a garota desenhou Bob Esponja e

contou os fatos principais do episódio. Escreveu letras no verso da folha,

dizendo ser seu nome.

“Eu quero ser Bob Esponja. Adoro ele”.

3F(M) 1º

3F(M) 2º

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3F(N) – Essa criança também desenhou na frente e no verso da folha,

Primeiramente colocou elementos como: montanha, banana, passarinho,

nuvem, lago e o “coisa”. Depois desenhou Bob Esponja de tamanho grande

que tomou toda a folha, dizendo adorar Bob Esponja. Seu desenho não se

identifica com a realidade do episódio.

“Eu também quero”.

3F(N) 1°

3F(N) 2°

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3M(O) – Esse garoto pediu ajuda a professora de sala. Ele diz que quer ser Bob

Esponja. Pinta o que a professora desenhou e desenha outros elementos,

frente e verso. Obs.: Não se pronunciou na roda de conversa.

3M(O) 1º

3M(O) 2º

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3M(P) – A criança desenha vários círculos concêntricos e se levanta. Volta e

desenha algo parecido com pernas e pés, saindo dos círculos.

“Eu não quero ser Bob Esponja. Porque ele rasgou as calças”.

3M(P) 1º

3M(P) 2º

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Os desenhos das crianças de 3 anos da EEBUFPB são expressões com

intenção, apesar de elas não terem a idéia acabada do aspecto que terá o desenho

ao ser finalizado. É um rabisco ordenado que se converte em um meio de

comunicação consciente da criança com seu ambiente. As cores não são

importantes nessa fase (GRIFFA & MORENO, 2001). Os desenhos, embora

apresentem-se em sua maioria formas pouco reconhecíveis, conforme os traços das

crianças dessa idade, são configurações representativas daquilo que a criança

deseja desenhar.

Durante nossas entrevistas – conversas, as crianças de 3 anos

demonstraram representar, simbolicamente, os conteúdos transmitidos pelo episódio

Calça Rasgada como elementos sobre a morada do personagem (3M(A), 3M(J) seus

amigos 3M(A), 3F(B), 3F(C), 3F(H)) onde ele trabalha (3F(B), 3M(G)). O conteúdo

pormenorizado do episódio não é demonstrado em suas falas, porém, observações

curtas, mas que com sentido garantem a sua compreensão, (3M(J), 3F(K), 3M(L),

3M(P)). As colocações relevam ainda a preocupação em agradar ao grupo como foi

a atitude de Bob Esponja no episódio. A interação entre as crianças da Escola de

Educação Básica da UFPB demonstra bem esse fenômeno social. Um dos grupos –

Turma de 3 anos, do turno vespertino, iniciou a “roda de conversa” falando sobre

saber dizer “obrigado”, “com licença”, “por favor”. São atitudes que regulam a

convivência e que elas, as crianças, se esforçam nessa intenção, através da

imitação como afirma Piaget (1978) recorrendo aos processos de assimilação e

acomodação. Nesta fase da pesquisa nós intencionamos captar os conteúdos do

episódio que haviam sido assimilados.

Toda essa busca ou interesse está relacionada à equilibração das estruturas

cognitivas, onde o sujeito avança procurando uma solução para o problema,

ultrapassando seu estágio atual. A escola participa desse processo na medida que

estimula os indivíduos a novas experiências e a refletir sobre elas.

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Os do meio – 4 anos

O maior número de crianças que participaram da pesquisa faz parte do

grupo de 4 anos, pois, como já vimos, a escola possui duas turmas por turno com

essa idade. O número total é de 29 crianças, sendo 15 crianças do turno da manhã

e 14 do turno da tarde.

4M(A) – Essa criança desenhou na frente e no verso da folha de papel. Por ser

portadora da Síndrome de Down precisou de supervisão durante a

elaboração do desenho. Mostrou interesse em realizá-lo correspondendo

prontamente com o que era proposto.

Obs.: Ficava interagindo com seu olhar, observando, escutando e

desenhando.

4M(A) 1º

4M(A) 2º

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4M(B) – Desenhou Bob Esponja e sua amiga Sandy. Ele disse que preferia o

desenho animado Pica-pau. Esteve todo tempo falando sobre si mesmo, seu

colega do lado e sobre o vídeo assistido.

“Eu fui na casa dele e vi que ele tem bolsa de Bob Esponja. Eu não gostaria

de ser Bob Esponja. O meu mais preferido do Brasil é o Pica-Pau”.

4M(B)

4M(C) – A criança representou o que assistiu no vídeo, delimitou os espaços

contornando-os de cores diferentes. Fala ainda sobre o personagem

principal.

“Eu assisto Bob Esponja. Eu até tenho bolsa e lancheira de Bob Esponja”.

4M(C)

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4F(D) – Essa criança é muito observadora, faz comentários sobre o desenho

animado que assistiu, desenha os personagens e os coloca no contexto

espacial delimitado. Ainda comenta com colegas e a professora sobre tudo

que faz .

“Eu assisto na televisão e no DVD. Eu quero ser Bob Esponja...”

4F(D)

4M(E) – Bem posicionado, o autor do desenho, configurou apenas o personagem

principal e o “mar”, ou seja, onde se passava o episódio.

“Eu quero ser Bob Esponja. Eu acho muito engraçado...”

4M(E)

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4F(F) – A criança desenhou usando várias cores, tomando todo o espaço da folha

de papel e colocando personagens e elementos – chave do episódio.

“Eu quero ser Bob Esponja...”

4F(F)

4F(G) – Essa garota demorou a iniciar o desenho, pois teve uma discussão com

outra criança que a deixou chorando. Quando desenhou, fez Bob Esponja e

Sandy dizendo ser sobre o desenho animado que assistiu.

“Eu quero ser Bob Esponja porque ele é engraçado. Eu também fiz Sandy

também”.

4F(G)

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4M(H) – A criança desenhou usando uma só cor. Representou Bob Esponja, Sandy,

o mar e as algas marinhas. Identificamos com clareza o que quis desenhar.

Pedia sempre para vermos o que ele desenhou.

“Venha ver o que desenhei: Bob Esponja, seu amigo... Eu quero ser ele

porque ele é engraçado.

4M(H)

4M(I) – O garoto representou Bob Esponja com tamanho bem maior (personagem

principal) que o outro personagem. Colocou o mar como local do ocorrido na

historinha.

Obs.: Não se pronunciou na roda de conversa.

4M(I)

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4F(J) – A criança é portadora de Síndrome de Down e também precisou de

supervisão ao fazer o desenho.

4F(J)

4F(K) – Detalhista e observadora desenhou os personagens principais. Diz que

Sandy tem lacinho na cabeça.

“Eu queria ser Sandy, aquela que tem lacinho na cabeça”.

4F(K)

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4F(L) – Seu desenho ainda representa formas indistintas mas fala todo o tempo e

chama a atenção para si mesma.

“Assisto todo dia na televisão”.

4F(L) 1º

4F(L) 2º

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4F(M) – Dividiu a folha de papel em duas através de um traço. De um lado colocou

uma casa, uma porta e do outro lado colocou Bob Esponja.

“Eu fiz a casa de Bob”

4F(M)

4F(N) – Desenhou Bob Esponja e a casa dele. Seu desenho tem formas pequenas,

porém facilmente identificáveis.

“A essa é a casa dele”

4F(N)

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4F(O) – Essa garota fez seu desenho muito parecido com o de sua colega 4F(M).

Elas estavam sentadas lado a lado.

“Fiz a casa dele...”

4F(O) 1º

4F(O) 2º

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4F(P) – Quando essa garota decidiu desenhar, primeiramente pintou a folha de

papel de várias cores. Depois inseriu alguns desenhos representando

personagens e elementos do desenho animado Bob Esponja. Pediu para

rasgarmos o desenho depois.

“Bob Esponja é um homem. Eu quero ser a amiguinha dele”.

4F(P)

4M(Q) – Desenhou o personagem Bob Esponja, sua casa e a arena na praia, onde

ocorreu o campeonato de levantamento de peso. Constatamos que lembra

do que se passou no episódio.

“Bob Esponja levantando peso”

4M(Q)

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4F(R) – Essa garota desenhou os elementos do desenho animado que assistiu e

acrescentou outros de sua imaginação.

“Eu gosto de Bob Esponja, quer dizer não gosto. Não, não. Eu gosto.”

4F(R)

4F(S) – A criança pintou com várias cores a folha, dizendo ser o mar colorido onde

Bob Esponja morreu. Desenhou ainda sorvetes de morango e chocolate.

“Estou desenhando sorvete de morango e chocolate e o mar onde Bob

Esponja morreu. Quero ser Bob Esponja porque gosto dele”

4F(S)

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4F(T) – Essa garota passou muito tempo sem desenhar. Quando o fez desenhou

Bob Esponja e borboletinhas que disse gostar muito.

“Gosto de borboletinhas”

4F(T)

4F(U) – Essa criança fez um primeiro desenho e jogou fora. No segundo

representou Bob Esponja e outros personagens de forma identificável, com

expressões faciais diferentes e dentro de um espaço delimitado.

4F(U) 1º

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4F(U) 2º

4M(V) – A criança representou o que assistiu, com cores e formas variadas.

Identificamos os personagens quando ele apontou os desenhos.

“ ...ele cantou a música e os amigos gostaram’

4M(V)

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4F(W) – Seu desenho representa Bob Esponja, porém, não com formas precisas.

Contou a história do episódio rapidamente contendo começo, meio e fim,

demonstrando total compreensão dos conteúdos do mesmo.

“Ele rasgou as calças, ficou triste, cantou uma música e depois foi tomar

sorvete”.

4F(W)

4F(X) – Desenhou Bob Esponja sem olhos e boca, mas retratando seu aspecto de

esponja (cheio de furinhos).

“Eu quero ser Bob Esponja”

4F(X) 1º

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4F(X) 2º

4F(Y) – Desenhou Bob Esponja, um sol e nuvens. Não conversa pouco sobre o

desenho, mas percebemos que o compreendeu, pois seu desenho

demonstra isso.

“Rasgou as calças. Depois fez um som e todos ficaram alegres”

4F(Y)

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4F(Z) – A criança desenha Bob Esponja segurando os pesos como ocorreu no

episódio, desenha a areia, o mar e afirma que Bob morreu.

“Bob Esponja morreu...”

4F(Z)

4M(A1) – Esse garoto desenha Bob Esponja falando tudo sobre o episódio.

Demonstra saber bem mais que as outras crianças sobre Bob Esponja,

confirmando sua preferência.

“Ele rasgou as calças, dançou e/os amigos ficaram alegres...”

4M(A1)

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4M(B1) – Fez o desenho representando Bob Esponja levantando peso. As formas do

desenho não são bem definidas, mas demonstram que a criança

compreendeu o conteúdo do episódio. Desenhou na frente e no verso.

“Quero ser Bob Esponja porque ele é engraçado”

4M(B1) 1º

4M(B1) 2º

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4M(C1) – Representou vários personagens, dando destaque em cor diferente para

Bob Esponja localizados na areia e no mar. Também desenhou uma flor e

um sol.

Obs .: Quando pergunto onde está Bob Esponja ela aponta o desenho maior

e de cor diferente.

4M(C1)

Os desenhos das crianças de 4 anos que acabamos de descrever

apresentam, em sua maioria, configurações mais definidas. Também não solicitaram

ajuda dos adultos e não foram influenciados um pelo outro. Todos os desenhos têm

uma marca individual, isto é, diferem entre si. Outra característica dessa idade é a

contextualização e localização dos personagens. As crianças desenhavam os

personagens localizados no mar, ou na areia ou na casa. Essa atitude demonstra

preocupação em relacionar ele mesmo com os elementos do desenho.

Outras figuras foram desenhadas, que não fazem parte da historinha que

assistiram. Esse fato vem colaborar com o nosso posicionamento de que a criança

reproduz o que vê, mas também produz adicionando seu conhecimento anterior ao

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novo conhecimento e, com isso, imprime seu toque individual, sua identidade

(PIAGET, 1978; VYGOTSKY, 2007).

A televisão, através do desenho animado, tem seu papel socializador, na

medida em que interage socialmente com seus telespectadores. Em algumas “falas”,

percebemos a influência comercial da indústria cultural, quando uma criança (4M(C)

afirma possuir objetos que representam Bob Esponja (bolsa e lancheira) e outra

criança confirma 4M(B)).

O processo de representação simbólica (PIAGET, 1978) confirma-se em

todas as “falas” das crianças de 4 anos. Elas se identificam com o personagem

principal, escolhendo a característica do mesmo que mais lhe agrada (4M(C), 4M(E),

4M(A), 4M(B1) ou com outros personagens como Sandy, a esquila (4F(K), 4F(P)).

Na internalização proposta por Vygotsky (2007), percebemos quando as

crianças de 4 anos retiram da suas interações sociais, subsídios para suas funções

mentais. Observamos como a justificativa “engraçado”, por querer ser Bob Esponja,

é frequente nas respostas (4M(E), 4M(H)). Também os relatos do episódio focalizam

como Bob Esponja agiu para que seus amigos ficassem alegres com ele novamente,

ou seja, o que era exterior, conteúdo do desenho animado, torna-se interior,

conhecimento intrapsíquico, (4M(V), 4F(W), 4F(Y), 4M(A1)).

Os elementos do contexto social das crianças aparecem nas “falas”

enquanto desenham ou interagem com o grupo (4F(S), 4F(T)) colocando “sorvetes”,

“borboletinhas”, comentários sobre o sexo do personagem (4F(P)), e sua preferência

por outros desenhos animados (4M(B)), demonstrando a produção de sentido

construída de acordo com a subjetividade peculiar a cada criança.

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Os “maiorzinhos” 6 – 5 anos Os participantes de 5 anos na confecção do desenho foram 17 no total, sendo 8 crianças do turno da manhã e 9 do turno da tarde.

5F(A) – A criança desenhou os personagens principais: Bob Esponja, Sandy e os amigos de Bob Esponja. Também desenhou sol, lua, nuvens e estrelas configurando-os todos no “céu”. O desenho é rico em detalhes e cores.

“Quero ser Bob Esponja...”

5F(A)

5F(B) – O desenho apresenta figuras bem definidas e facilmente identificáveis. As cores de fundo são dispostas representando espaços diferentes sobre o desenho animado Bob Esponja. Um desses espaços representa o que ocorreu no episódio, os outros representam elementos a mais sobre Bob Esponja: seus amigos e seu bichinho de estimação. Ainda desenhou flores, sol, lua, nuvens com carinhas sorridentes. É evidente que a criança comunica-se através do desenho, tanto no que refere-se ao episódio como ao que se refere ao seu contexto social.

“Vou fazer os amigos de Bob Esponja, ele... Eles ficaram alegres quando Bob cantou”

5F(B)

6 Aqui também optamos pela forma de expressão popular “maiorzinhos”.

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5M(C) – Esse garoto desenhou Bob Esponja de acordo com o que ocorreu no

episódio; rasgou a cueca, rasgou o short e, por fim, cantou. Ainda desenhou

o “cachorrinho” de Bob Esponja, como ele se expressou (animal de

estimação).

“Desenhei o cachorrinho de Bob Esponja”

5M(C)

5M(D) – A criança desenhou Bob Esponja tocando guitarra, fato ocorrido no episódio

que ele assistiu com a turma.

“Ele está na terra. Ele tocou flauta. Não, tocou guitarra”

5M(D)

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5F(E) – O desenho apresenta Bob Esponja, sol, lua e estrelas. Observamos nesse

desenho, que o mesmo se identifica mais com um humano do que com Bob

Esponja e, ainda porque a cabeça não está ligada ao corpo.

Obs.: Não se pronunciou quanto ao episódio.

5F(E)

5F(F) – O desenho apresenta muitos elementos com riqueza de detalhes.

Demonstra se lembrar de todo o episódio. Resumiu numa frase o conteúdo

do episódio.

“Os amigos ... riu, riu, riu e depois não riu”

5F(F)

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5M(G) – O garoto desenhou figuras do vídeo assistido e outras como televisão, o

controle da televisão e a pizza de Bob Esponja.

Obs.: Aos conteúdos do episódio, o garoto os inseriu ao seu contexto físico e

social.

5M(G)

5M(H) – O desenho representa rabiscos desordenados. O autor do desenho possui

diagnóstico de autismo. A professora de sala de aula esteve motivando-o a

desenhar.

Obs.: Sempre com o olhar fixo num determinado ponto o garoto movia o

lápis no papel em várias direções.

5M(H)

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5F(I) – A garota preocupou-se em desenhar os personagens principais e, depois,

coloriu com muito zelo.

“Se ele não enganasse as pessoas eu queria ser ele”

5F(I)

5M(J) – Esse desenho foi estimulado pela professora, colocando Bob Esponja e

pedindo para a criança pintar. Essa criança tem diagnóstico de autismo.

Obs.: O Desenho foi colorido pelo garoto.

5M(J)

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5M(L) – A criança desenhou uma cena do episódio assistido com riqueza de

detalhes e cores; Bob Esponja e outros surfando, descendo no “tubo

d’água”. O mar é também representado.

“Vou pintar Bob Esponja descendo a onda”

5M(L)

5M (M) – Desenhou Bob Esponja no centro da folha de papel e coloriu. Expressou-

se verbalmente de forma eloquente sobre o episódio.

“Ele é legal... eu gosto dele, quero ser ele”

5M(M)

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5M(N) – Desenhou Bob Esponja de tamanho grande tomando quase toda a folha. A

figura é facilmente identificável.

“Eu não quero ser Bob Esponja. Porque ele é esponja, quadrado e tem

bolinhas”

5M(N)

5M(O) – A criança desenhou Bob Esponja e o coloriu com cores próprias do

desenho, p. ex. olhos azuis, calça marrom, etc.

“Não quero porque ele é amarelo, tem um monte de esponja”

5M(O)

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5F(P) – A garota desenhou os personagens principais e os coloriu com cores

vibrantes, mas que não correspondem àquelas do desenho. Bob Esponja

configura-se como o maior desenho, representando o personagem central.

“Ele resolveu cantar e os amigos ficaram contentes...’

5F(P)

5M(Q) – Esse garoto, antes de desenhar Bob Esponja, traçou margens, isto é,

delimitou o espaço.

“Eu não quero ser Bob Esponja ... Ele cantou para os amigos, mas eu não

quero’

5M(Q)

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5M(R) – O desenho apresenta vários elementos referentes ao desenho animado

Bob Esponja: casa, amigos e o próprio Bob Esponja. O mar é representado

como contexto, este é, onde ocorre todo o episódio.

“Não quero ser Bob Esponja. Gosto mais de Dragon Ball. Ele e os amigos

foram cantar, mas eu não quero”

5M(R)

As crianças da turma de 5 anos diferenciaram-se das outras turmas,

principalmente, pela definição precisa das figuras, pelo traço firme nos desenhos,

pela objetividade na apresentação do desenho como um todo. Podemos considerá-

los capazes de se expressar sinteticamente e com realismo (PIAGET, 1978), como

também a riqueza de detalhes é evidente (5F(A), 5F(B), 5F(F), 5M(L), 5F(P)).

Os desenhos das crianças de 5 anos focalizam o conteúdo do episódio

assistido colocando cenas representativas do mesmo (5F(B), 5F(F), 5M(L), 5M(R)) e

tecendo comentários sobre como Bob esponja reagiu para que os amigos voltassem

a ficar alegres com ele (5M(D), 5F(F), 5F(I), 5F(P), 5M(Q)); aspectos sobre a

aparência física de Bob Esponja (5M(N), 5M(O) e sobre a tentativa do personagem

de enganar seus amigos 5F(I).

São comentários relevantes que transparecem o desejo de identificação,

porém, imprimindo sua marca individual como afirma Vygotsky (2007).

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4.4.6 Na Pista dos Saberes

Nesse item, considerando os desenhos e comentários das crianças sobre o

desenho animado assistido, nós os analisamos não mais por turma de idade, mas,

de forma geral, de acordo com os eixos temáticos descritos em nosso suporte

teórico, Piaget, Vygotsky e Giroux.

Notadamente, algo presente nos diálogos sobre o desenho, foi como Bob

Esponja fez para que seus amigos voltassem a ficar alegres com ele. Observamos

que essa foi uma preocupação de cada grupo demonstrando a compreensão do

conteúdo do desenho animado e se identificando com o personagem na sua

necessidade de manter o bom relacionamento com os amigos. É importante lembrar

que essa preocupação social é registrada em maior número nas falas das crianças

de 5 anos. Tal fato não é subsidiado pela teoria piagetiana, quando teoriza que as

crianças no período pré-operacional, (de 2 a 7 anos) não adquiriram, ainda, a

capacidade da reversibilidade. Essa capacidade daria gradualmente à criança, a

responsabilidade referente às suas ações em relação ao outro. Pelo que

observamos as crianças de 5 anos e algumas de 4 anos compreenderam a relação

que causou intolerância nos amiguinhos de Bob Esponja e o que ele fez para

reverter a situação. Também foi registrado que os sujeitos pesquisados focalizaram

uma característica central da historinha em detrimento de outras como toda criança

nesse estágio cognitivo, ou seja, pré-operacional. Elas ainda apresentam

pensamentos lógico e ilógico, por exemplo: Quero ser Bob Esponja porque ele é

engraçado, tem amigos, é legal, mas outros dizem: Não quero ser Bob Esponja

porque ele é amarelo, porque morreu, etc. É bom lembrar que os parâmetros lógicos

levados em conta são da ótica do adulto; o que com certeza é lógico para uma

criança, poderá não ser lógico para um adulto.

Considerando a perspectiva histórico cultural de Vygotsky (2007), todo esse

interesse das crianças em querer ou não ser Bob Esponja e procurar saber como ele

resolveu a divergência com os amigos, deixa transparecer as capacidades de

observação, imitação e imaginação. Como Vygotsky (1993) explica, é na brincadeira

que a criança observa as informações e situações, utiliza a imaginação, separando o

pensamento dos objetos e fazendo surgir a ação das idéias. Essa ação poderá ser

imitação e, ou “faz de conta”, as quais permitem à criança alcançar a internalização

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que é o processo onde ocorre a reconstrução interna daquilo que é observado

externamente. Assistir ao vídeo do desenho animado, constituiu uma brincadeira,

sem contar que já faz parte do cotidiano infantil. Ao assistirem aos desenhos

animados, as crianças misturam sonho (desejo), ficção e aventura com realidade. Os

sujeitos pesquisados referiam-se ao personagem do desenho animado como uma

pessoa, mas faziam suas considerações levando em conta a realidade. Sendo

assim, algumas crianças disseram: “Não quero ser Bob Esponja porque ele é uma

esponja”, isto é, considerando que, na realidade, ela mesma não poderia contrariar

sua natureza de ser humano. No entanto, na sua maioria, as crianças atribuíram

qualidades e sentimentos humanos aos personagens do vídeo: engraçado, legal,

mentiroso, triste, alegre, etc.

Essa atitude vem subsidiar, assim, o processo da internalização que, como

postula Vygotsky, as funções mentais superiores aparecem primeiramente no plano

social e depois surgem no plano psicológico. Nesse processo de transposição de

planos, ou seja, do exterior (social) para o interior do indivíduo (intrapsíquico), dois

elementos são primordiais: a cultura e a natureza biológica do próprio indivíduo. Por

isso, apesar de os homens serem semelhantes, também são tão diferentes.

Detalhando melhor, podemos dizer, à luz da teoria de Vygotsky que, embora os

seres humanos tenham em comum as significações culturais, as quais os definem

como humanos, eles são todos diferentes, pois cada um deles tem sua versão

peculiar da natureza cultural dos homens.

Para Vygotsky (2007) a subjetividade estaria resguardada. As crianças que

assistiram ao desenho podem, então, identificar-se com os personagens, porém, ao

convergir a significação cultural em significação pessoal, imprimem a essa última,

sua marca pessoal. Isso ocorre porque o campo da significação não é algo

homogêneo. Os significados culturais são socialmente instituídos, no entanto, os

sentidos são significados culturais construídos pelos indivíduos.

Consideremos, nesse momento, a polêmica e sempre presente discussão

sobre a indústria cultural. Os desenhos animados, que fazem parte da mídia

televisiva, também são produtos culturais. O desenho animado Bob Esponja cumpre

seu papel de entretenimento e ao mesmo tempo, utiliza-se de estratégias

comerciais. Entre os sujeitos pesquisados, encontramos um deles que possui

objetos com a marca Bob Esponja. Todos, porém, reconheceram que existem

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inúmeros objetos dessa marca. Algumas crianças também se interessaram pelo site

do jogo Bob Esponja e por conhecer bonecos que representam os personagens.

Tais fatos corroboram com a visão frakfurtiana de que a cultura assume um papel-

chave na construção histórica e na vida cotidiana dos indivíduos. Entretanto,

podemos considerar que as pessoas não estão totalmente dominadas por essa

influência. Na presente pesquisa, observamos que as mensagens transmitidas pelo

vídeo interagem com as idéias das crianças, porém não as substituem. A forma de

pensar das crianças deixa transparecer a influência dos referidos conteúdos, porém,

também transparece seu jeito de tomar consciência da intencionalidade dos fatos;

isto constitui sua subjetividade. Com certeza, o fator social é marcante na vida das

crianças, principalmente, porque ainda são consideradas seres que não estão

prontos e que o adulto sabe mais que elas. Como resistir então? Como impedir a

reprodução cultural e social? Para Giroux (1986), primeiramente, é necessário

compreender as complexas relações de escolarização e sociedade dominantes e

analisar pormenorizadamente os conceitos de conflito e resistência. Para o referido

autor, resistência é um conjunto de oposições parcialmente conscientes, que

impedem a reprodução. Consideramos que a forma peculiar de pensar de cada

pessoa já constitui uma forma de resistência, que é reforçada por pais e professores

quando adotam condutas básicas de oposição, que são o diálogo e a análise crítica.

Como já foi comentado, os conteúdos do desenho animado Bob Esponja

constituem um verdadeiro “merchandising” do capitalismo, apresentando histórias

sobre competições onde o melhor ganha troféus, onde aqueles que não conseguem

atingir os melhores lugares são chamados de fracassados. Além do mais, o trabalho

é o eixo central da vida do personagem principal e seu patrão é explorador, adora

dinheiro e não valoriza o bom empregado pelo que ele é e sim pelo que ele produz

(LIRA, 2005).

Ao comentar com as crianças sobre os episódios do referido desenho

animado, nenhuma delas fez críticas como nos referimos anteriormente, porém,

apresentam comentários do tipo: “Bob Esponja trabalha na lanchonete que é do Sr.

Siriguejo, um homem chato que gosta muito de dinheiro. Ele só fala em dinheiro”

(criança de 5 anos), confirmando seu posicionamento crítico. Com certeza, não são

todas as crianças que apresentaram esses comentários, mas eles surgiram no

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grupo, criaram conflitos cognitivos, que podem gerar mudanças qualitativas na forma

de pensar.

Finalizando a descrição e análise dos desenhos e falas das crianças,

consideramos que esse instrumento constituiu peça fundamental na consecução do

objetivo da pesquisa, isto é, de considerar a criança sujeito ativo na construção das

relações sociais, oferecendo-lhe o espaço para expressar-se pelo desenho e ser

ouvida em suas opiniões.

Passemos as considerações finais onde expomos opiniões e sugestões

sobre a investigação realizada.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo em vista a relação dos conteúdos do desenho animado Bob Esponja

Calça Quadrada e o desenvolvimento da subjetividade de crianças de 3 a 5 anos,

podemos afirmar que se constitui uma interrelação. Constatamos que o desenho

animado, como toda mídia, é dotado de intencionalidade, contudo, o espectador em

geral, inclusive a criança, confere aos conteúdos um sentido próprio além daquele

correspondente ao do autor.

O nosso trabalho apresenta teóricos que dialogam sobre o processo

cognitivo e social de assimilação, ou seja, Piaget (1973, 1976, 1978), Vygotsky

(1993, 2007) e Giroux (1986, 2003). Outros teóricos apresentam a mídia como

processo institucionalizado onde diferentes atores se reúnem e se confrontam,

buscando alcançar uma síntese de significados. Para alguns as subjetividades dos

indivíduos são influenciadas sobremaneira pelos meios de comunicação de massa,

ou seja, a indústria cultural produz e os indivíduos consomem (ADORNO e

HORKHEIMER, 1985 e outros).

Para outros teóricos,

o receptor não é tido como alguém que apenas absorve passivamente o conteúdo do que é veiculado nas mídias, mas, ao contrário, como alguém que participa ativamente da produção de sentido, dentro de uma lógica cultural e que lida com as possibilidades que ela essa cultura lhe abre (ou limita) para construir significados (DUARTE, 2008 e outros).

Esse último posicionamento é comprovado através da pesquisa, todavia, um

dos nossos objetivos é, com esse trabalho, incentivar educadores a desenvolverem

o hábito de relacionar-se criticamente diante da mídia televisiva, especificamente,

diante dos desenhos animados.

Com esta proposição concordamos e reafirmamos que a educação para a

mídia , expressão utilizada por Belloni (2005) para designar um conjunto de

informações bastante útil para a problematização das características técnicas e

sociais da televisão, é o caminho a ser trilhado pelos educadores. Giroux (1986)

corrobora esta proposta, quando postula a necessidade da pedagogia crítica nas

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escolas, visando a possibilidade de resistência das crianças diante de conteúdos

homogeinizantes e não emancipatórios.

Consideramos ainda que o nosso objetivo em atribuir à criança a condição

de receber e participar como autora das produções culturais foi plenamente

alcançado na medida que as tornamos participantes e coautoras da investigação

através das falas e diálogos interessantes e argumentativos e também de seus

desenhos. Devemos promover na escola a educação para a mídia televisiva com

dupla intenção: de torná-la instrumento pedagógico e de ser objeto de estudo de

professores e alunos, favorecendo a ambos adquirir uma postura crítica diante dela

(CAMURRA e TERUYA, 2009). Queremos lembrar que a postura crítica que

almejamos, são constituídas com a ponderação, reflexão, seleção de estratégias ao

invés da inflexibilidade, rigidez e julgamento rápido. Existem diferentes modos de se

engajar na crítica social, uma delas é prestando atenção tanto ao processo como ao

produto do trabalho intelectual e valorizando igualmente o esforço individual e o

coletivo.

O desenho animado Bob Esponja Calça Quadrada é preferência entre os

outros apresentados e frequentemente assistido pelas crianças participantes da

pesquisa. Suas imagens expressivas, sua linguagem atrativa concorrem para

satisfazerem à criança e prenderem sua atenção. Alguns aspectos do

comportamento de Bob Esponja são questionáveis como não ir à escola, sua

obsessão pelo trabalho, sua ingenuidade excessiva acreditando em tudo e em

todos. Todavia, há alguns elementos positivos que podem servir de modelo como

seu otimismo, seu companheirismo com o amigo Patrick, a responsabilidade no

trabalho, a postura tolerante diante das provocações do Lula Molusco, o prazer de

brincar e o zelo com o seu animal de estimação Gary. Esses são elementos, dentre

outros, que poderão ser pesquisados em trabalhos futuros, sendo, portanto, umas

das nossas intenções após a conclusão do trabalho de tese.

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APÊNDICES

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Apêndice 1

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado (a) Senhor (a)

Esta pesquisa é sobre “Desenho animado e educação: calça quadrada, cabeça redonda?" e será desenvolvida por Margarida Sonia Marinho do Monte Silva, aluna do Curso de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal da Paraíba, sob a orientação da Profª. Dra. Adelaide Alves Dias.

Os objetivos do estudo são: analisar os conteúdos do desenho animado Bob Esponja através da fala das crianças da Escola de Ensino Básico da UFPB, que interferem na construção da subjetividade; verificar a frequência com que a criança da creche escola assiste ao desenho animado Bob Esponja.

A finalidade deste trabalho é contribuir para o debate sobre desenhos animados numa perspectiva emancipatória dos sujeitos, a partir de uma reflexão por parte de pais e educadores que trabalham com esta faixa etária, proporcionando uma visão critica sobre os conteúdos transmitidos por esses desenhos. Esta investigação presume o estudo da formação simbólica infantil, a internalização e a construção do conhecimento crítico.

Solicitamos a sua colaboração em conceder a participação das crianças desta escola nas entrevistas e no momento das observações, como também sua autorização para apresentar os resultados deste estudo em eventos da área de educação e publicar em revista científica. Por ocasião da publicação dos resultados, seu nome será mantido em sigilo. Informamos que esta pesquisa não oferece riscos previsíveis para o desempenho e o desenvolvimento das atividades das crianças.

Esclarecemos que a participação das crianças no estudo é voluntária e, portanto, o(a) senhor(a) não é obrigado(a) a fornecer as informações e/ou colaborar com as atividades solicitadas pela Pesquisadora. Caso decida pela não participação da criança no estudo, ou resolva desistir da mesma, a criança não sofrerá nenhum dano, nem haverá modificação na assistência que vem recebendo nesta Instituição.

A pesquisadora estará a sua disposição para possíveis esclarecimentos que considere necessários em qualquer etapa da pesquisa.

Diante do exposto, declaro que fui devidamente esclarecido(a) e dou o meu consentimento para a criança participar da pesquisa e para publicação dos resultados.

_________________________________________ Assinatura do Participante da Pesquisa

ou Responsável Legal

Contato com a Pesquisadora Responsável: Margarida Sonia Marinho do Monte Silva Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para a pesquisadora Endereço (Setor de Trabalho): Centro de Educação – Departamento de Fundamentação da Educação da UFPB – Campus I Telefone: (83) 3216-7447 Atenciosamente,

___________________________________________ Assinatura da Pesquisadora Responsável

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Apêndice 2

RODA DE CONVERSA

TURMA: 3 anos TURNO: MANHÃ Nº DE CRIANÇAS: 7 DATA: 04/11/09

Quando as crianças voltaram para a sala de aula a professora ajudou a

distribuir as folhas de papel. As crianças escolheram os lápis para desenhar.

P. Vocês vão desenhar o que assistiram no episódio Bob Esponja, calça rasgada.

Eu vou ficar observando e conversando com cada um.

3M(A): (Fez um desenho cheio de símbolos e a medida que desenhava contava o

episódio – Tem fenda do Biquíni, tem Patrick, tem Bob Esponja. (Ele simulava

escrever as palavras)

3F(B): Bob Esponja e Patrick, foi o que me lembrei.

3F(C): Desenha sem parar de falar – Bob Esponja é engraçado. Patrick é seu

amigo.

3M(D): Eu quero ser Bob Esponja, mas só às vezes.

P. Por que?

3M(D): (não responde)

3F(E): Todo mundo quer ser Bob Esponja. Eu também. Eu adoro ele.

3M(F): Desenhei Bob Esponja. Gosto dele.

3M(G): Assisto Bob Esponja todos os dias. É legal. Assisto ele fazendo sanduíches

de presunto com Patrick. Eu quero ser ele porque ele é engraçado. (Esse garoto foi

o que mais queria assistir ao vídeo).

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RODA DE CONVERSA

TURMA: 4 anos A TURNO: MANHÃ Nº DE CRIANÇAS: 9 DATA: 10/11/09

P. Distribuindo folhas. Duas crianças estão chorando.

4F(G): Você me deu um murro

4F(F): Eu já pedi desculpas Profª: Já sabem o que é para fazer, Mateus? Natan já sabe o que é pra fazer? P. Sim, agora vocês vão desenhar o episódio calça rasgada que assistiram sobre Bob Esponja. Todos estão empenhados em desenhar Sento junto de Mariana. Ela diz está desenhando a cabeça de Bob Esponja.

4M(I): Eu também, vou pegar o amarelo (pega o lápis) (Profª sempre interfere). Cada um faz o seu!! P. Você assiste Bob Esponja?

4F(F): Assisto não. Só às vezes.

4M(I): Eu assisto Bob Esponja, Eu tenho até alguma coisa dele. Bolsa, lancheira.

4M(B). Eu já fui na casa dele e vi que ele tem bolsa de Bob Esponja. P. Você gostaria de ser Bob Esponja.

4M(B): Eu não. Tia, o mais preferido meu do Brasil é o Pica-pau.

4M(H). Eu também tia o meu preferido é o Pica-pau. P. Eu vou para juntinho de você conversar. Você assiste o desenho Bob Esponja na televisão?

4F(C): Sim, mas assisto também no DVD. (Fez desenho com Bob Esponja na praia / P. Vocês dão esse desenho de presente para mim? Cada um diz: Eu dou. Eu dou, tia. Eu dou.... (todos respondem sim) P. Você quer ser Bob Esponja?

4F(C): Quero porque ele é engraçado. P. (Mariana entrega) Oba, Mariana já entregou! P. Natan, você quer ser Bob Esponja?

4M(I): Sim porque ele é engraçado. Fiz também Sandy.

4F(G): Quero ser Bob Esponja as vezes (a menina que brigou com Mariana vai entregar o desenho. Eu aproveito e pergunto o que aconteceu, referindo-me a discussão. Elas explicam-se falando ao mesmo tempo. Mariana me entrega o desenho.

4M(H): Oh tia o que eu faço! Estou fazendo a Sandy. Tiaaa! Olha o meu desenho. (converso com ele um pouco). Nessa ocasião uma das crianças que brigou, arruma o cabelo da outra.

4M(E): Conversa baixinho (Natan interrompe. Volto para Felipe. Ele é tímido e responde muito baixinho. 4M(D): Eu assisto na televisão e no DVD. Eu quero ser Bob Esponja.

A criança 4M(A) não se pronunciou na roda de conversa apresentando no entanto, seu desenho.

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RODA DE CONVERSA

TURMA: 4 anos B TURNO: MANHÃ Nº DE CRIANÇAS: 9 DATA: 06/11/09

P. Desenhar o episódio Bob Esponja, calça rasgada do jeito que vocês quiserem. Bem bonito.

4F(M): Tia vou fazer um coração.

4F(N). Eu não sei fazer. P. Não sabe? Vamos tentar! O que você se lembra do episódio?

4F(N). De Bob Esponja, de Patrick. P. Patrick não apareceu hoje no episódio. Apareceu aquela outra amiguinha dele, a Sandy.

4F(M). Por que ele não apareceu? P. Foi só nesse episódio. Vamos ver seu desenho. Isso aí é o que? A casa?

4F(M). É, a casa. P. Todo mundo desenhando. Que bom!

4F(O). Que coisa linda! A casa de Bob Esponja. P. Quando terminarem coloquem o nome. Quem é que assiste Bob Esponja?

4F(L). Assisto todo dia na televisão. P. Você gosta? Queria ser Bob Esponja?

4F(L). Queria ser Patrick.

4F(K). Eu queira ser Sandy. Aquela que tem um lacinho no cabeço.

4F(L). Bob Esponja é homem. Eu quero ser a amiguinha dele.

4F(O): Eu também. P. Como foi que ele fez para as pessoas gostarem dele?

4F(O) – Foi buscar um violão. Oh. Tia eu sei escrever meu nome, olhe! P. Vocês me dão esse desenho de presente?

4F(O): Sim, claro. (outros dizem sim, sim!) P. Vou ficar de lembrança dessa turma!

Obs.: A criança 4M(J) não se pronunciou na roda de conversa apresentando, no entanto, seu desenho.

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RODA DE CONVERSA

TURMA: 5 anos TURNO: MANHÃ Nº DE CRIANÇAS: 8 DATA: 13/11/09

P. Vocês sabem o que vão fazer?

Profª.: Prestem atenção. Vocês vão desenhar o que assistirem. Façam direitinho (ela fica tomando conta da criança autista) P. Vocês me dão de presente esse desenho? (alguns respondem sim)

5M(D): Tia cadê a folha de Heitor ? P. Vou pegar. Vou sentar ao lado de cada um para conversar. (autista: risca muito)

5M(C). Bob Esponja tem cabelo?

5M(D). Bob Esponja não tem cabelo.

5M(C). Escrevo só o 1º nome? Quero ser Bob Esponja! P. Quem assiste sempre Bob Esponja?

5F(E): Bob Esponja na terra... P. Gosta de Bob Esponja? (Maria Eduarda baixa a cabeça) (converso com Pedro . Ele explica o desenho) P. Que aconteceu com Bob Esponja?

5M(G): Rasgou as calças (vou para outra criança)

5M(D). Terminei! P. Coloque seu nome.

5F(B). Não sei o que desenhar: P. Que aconteceu no episódio?

5F(B). Vou fazer a Sandy e depois o Patrick. P. Certo, legal. Dirigindo-se a Heitor: Você desenhou o que?

5M(C): O cachorrinho de Bob Esponja. P. Legal: Ele desenhou o cachorrinho, o animal de estimação de Bob. (Uma das gêmeas desenha e a irmã copia o que ela desenhou).

5F(A). Eu quero fazer o nome de Sandy. (Ela olha para quem está filmando) Lucas Gabriel continua sem desenhar. A professora o incentiva, mas ele só olha fixo para frente.

5F(E). Vou buscar meu estojo P. Que foi que Bob Esponja fez pra seus amigos dele ficarem alegres de novo.

5F(B): Tocou flauta. Não, tocou guitarra.

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5F(B). Eu posso beber água? Eu quero ver o DVD Bob Esponja. (Olha para capa e tenta desenhar. Aqui, todos se interessam para ver). As crianças trocam os desenhos conversando sobre eles

(5F(B) demora muito desenhando detalhes)

(5M(C): mostra o desenho para a filmadora e faz um V com os dedos)

(5M(D): explica o desenho. Três garotas pintam com esmero)

Desenham o bichinho de Bob Esponja

Gêmea explica o desenho: lua, estrelas (escreve tudo que me dizem)

Duas crianças ficaram pintando enquanto as outras saem. São cuidadosas e trocam os lápis entre si.

5F(F) – Os amigos ... riu, riu e depois não riu.

Obs.: A criança 5M(H) não se pronunciou na roda de conversa apresentando no entanto, seu desenho.

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RODA DE CONVERSA

TURMA: 3 anos TURNO: TARDE Nº DE CRIANÇAS: 9 DATA: 27/11/09

Vamos desenhar o episódio que vocês assistiram sobre Bob Esponja

3F(H). Eu sei dizer obrigado, por favor, com licença

P. Vou conversar com cada um de vocês enquanto vocês desenham. Podem começar a desenhar nessa folhinha! (Continuam conversando sobre quem pede desculpas, diz obrigado etc.)

3F(H): Tia Margarida, olha o meu!

P. (Pedro levanta. Não quer desenhar). Carol, você quer ser Bob Esponja?

3F(H): Não. Quero ser os amigos.

P. O que Bob Esponja fez para os amiguinhos ficaram alegres novamente (Ninguém responde, falam outras coisas.

3M(J): Pode fazer uma casa (tasa) P. Sim, pode. Então, o que Bob Esponja fez?

3M(J): Cantou para os amigos voltarem. Tia, fiz um passarinho e o sol. P. Jéssica, o que foi que aconteceu no episódio?

3F(M): Ele rasgou a cueca. Os amigos não gostaram. Depois ele cantou a música. P. Você quer ser Bob Esponja?

3F(M): Quero. Eu gosto dele.

3M(I): Olha o meu. Eu fiz o vestido de Bob Esponja. P. Ta certo! Você quer ser Bob Esponja.

3M(I): (não responde)

3F(K): Os amiguinhos bateram as mãos (palmas) para Bob Esponja. Ele rasgou a cueca e a calça também.

3M(L): Eu não quero ser Bob Esponja. Porque ele rasgou as calças.

3F(N): Eu quero ser Bob Esponja. Adoro ele 3M(O): Eu também quero. P. Por que?

3M(O): Porque sim. P. 3M(P) (irmão de Isabel) desenha círculos e levanta várias vezes. Não participa da conversa. A professora pede para ele sentar. Ele senta e torna a levantar.

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RODA DE CONVERSA

TURMA: 4 anos A TURNO: TARDE Nº DE CRIANÇAS: 4 DATA: 20/11/09

P. Vamos desenhar o que Bob Esponja fez no episódio, como ele rasgou as calças...

4M(Q): Vem Tia sentar aqui. Eu não sei fazer. P. Comece que eu vou já, já (sento junto de 2 crianças). A professora diz: Faz 4F(P)!

4F(5). Bob Esponja levantando peso. P. Como foi a história de Bob Esponja,

4F(P): Eu vou pintar. (E pinta toda a folha de diversas cores) (A profª. Ficou sugerindo: o mar, os amigos...) (Levanto e vou para junto de outros 2 alunos) (Fico observando 4F(P) e 4F(S) desenharem) 4M(Q) levanta e vai buscar o nome na ficha para copiar = 4M(Q) P. Vocês me dão esse desenho de presente para mim?

4M(Q) – Eu dou. Outros: Eu dou, eu dou!

4F(P) – Dou não. Eu não sei fazer. P. Você diz que não sabe, mas você sabe!

4F(X): Eu tenho DVD de Bob Esponja

4M(Q) – eu não tenho

4F(S): Olha! (Aluna mostra que terminou o desenho. (Veio pra junto) (A profª continua sugerindo o que desenhar, mas as crianças não seguem o que ela diz). Fico conversando sobre os desenhos das 2 meninas 4F(S) e 4F(R) P. Você fez ótimo. Está ótimo seu Bob Esponja. Você assiste?

4F(S): Desenhei o mar colorido onde Bob Esponja morreu e sorvetes de morango e chocolate. Eu quero ser Bob Esponja porque gosto dele.

4F(R): Assisto todo dia , todo dia. Gosto dele.

P. Beijão 4F(R) 4F(P) não queria dá o desenho, mas no final levanta-se e coloca o seu desenho entre os outros desenhos. Não quis conversar e no seu desenho aparece Bob Esponja por entre as cores que pintou. Eu aponto e ela diz os nomes: Bob Esponja, Patrick...

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RODA DE CONVERSA

TURMA: 4 anos B TURNO: TARDE Nº DE CRIANÇAS: 10 DATA: 17/11/09

Sentam-se e escolhem os lápis. Inquietos perguntam o que vão fazer P.: Eu explico. Vão desenhar o que vocês viram no vídeo. Vou sentar junto de vocês depois para conversar. P. O que foi que aconteceu no episódio?

4F(U). Bob Esponja rasgou a calça!

4F(T): Tia me dá a borracha. (Dirigindo-se a profª.) 4x

4M(V): Estou fazendo Bob Esponja. Ele cantou uma música e os amigos gostaram. P. Muito bem. Eu não disse que você sabia! (Turma inquieta. A professora não está. Está a substituta. Ela oferece outros lápis. A menina da borracha ainda continua pedindo).

4F(W): Quero marrom, marrom.

4F(T): Cadê a borracha? Vou fazer a borboletinha! (vou junto) P. O que Bob Esponja fez para os amiguinhos ficarem alegres?

4M(B1): Bob Esponja, levantando peso. Eu quero ser Bob Esponja – Ele é engraçado.

Elisa : Bob Esponja morreu. Não quero ver ser ele.

4F(W): Me dá o laranja. Tia (profª) ela não quer me dá o laranja (e dirigindo-se a mim). Bob Esponja rasgou as calças. Ele ficou triste, mas cantou uma música, ficou alegre e foi tomar sorvete. (Eles conversam sobre cores) Garota cochicha com outra. A menina da borracha desenha pouco. Vou junto dela)

P.: Você me dá esse desenho de presente? Vocês me dão de presente? Vou junto das que cochichavam. 4M(B1) continua pintando. Converso com ele. Todos agora querem falar se assistem ou não Bob Esponja. Dois alunos dizem que querem ser Bob Esponja.

4F(T): Ele cantou uma música bonita.

4F(U): Bob Esponja é engraçado (4M(A1) e 4M(C1) desenham vários Bob Esponja)

4M(A1): Os amigos de Bob Esponja não ficaram contentes

4F(Y) – Rasgou as calças. Depois fez um som e todos ficaram alegres.

4F(Z) – Ele rasgou as calças, dançou e os amigos ficaram alegres.

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RODA DE CONVERSA

TURMA: 5 anos TURNO: TARDE Nº DE CRIANÇAS: 9 DATA: 24/11/09

Todos se preparando para desenhar P. Desenhem o que vocês assistiram no vídeo Começam a falar a idade Eu tenho 20 anos, tenho 10 anos, tenho 1000 anos P. Quem já disse a idade, escreva o nome na folhinha. Vocês me dão de presente esse desenho?

Todos : Sim, sim, sim!

5M(L): Vou pintar Bob Esponja descendo a onda

Profª .: João, senta!

5M(M). Olha o que fiz! Levanta e mostra

5M(N): Eu não queria ser Bob Esponja. Ele é uma esponja. Ele é quadrado. P. O que foi que Bob Esponja fez para os amiguinhos

5M(N): Ele fez um show Gêmeo vem entregar e pede para conversar ou explicar o desenho 7Todos se mostram interessados em desenhar

5M(O): Eu não quero ser Bob Esponja. Ele é amarelo e tem um monte de esponja

5M(M): Eu quero ser Bob Esponja porque ele é legal e bom demais, Ele foi cantar com o violão

5F(I): Não quero ser Bob Esponja. Só se ele não excluir as pessoas é que eu queria ser ele. (Ela faz em forma de carta para me entregar) P. Excluir?

5F(I): Sim, quando ele ficava rasgando a calça de propósito P. Você quer dizer enganando as pessoas?

5F(I): Sim. Depois ele cantou para os amigos e eles ficaram contentes

5F(P): Não quero ser Bob Esponja porque ele é uma esponja

FM(R): Não quero ser Bob Esponja, gosto mais de Dragon Ball

5M(Q): Não, não quero ser Bob Esponja. Ele cantou para os amigos, mas eu não quero. Recolho o material e agradeço. Obs.: A criança 5M(J) não se pronunciou na roda de conversa

apresentando, no entanto, seu desenho.