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PUBLICAÇÃO OFICIAL DA MARINHA • Nº 464 • ANO XLI JUNHO 2012 • MENSAL • € 1,50 DIA DA MARINHA ALMADA

DIA DA MARINHA · China e Japão, deixando-nos um relato de todas estas viagens e aventuras a que chamou Peregrinação, descrevendo-nos essa fase da sua vida como uma busca do sagrado

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PUBLICAÇÃO OFICIAL DA MARINHA • Nº 464 • ANO XLI JUNHO 2012 • MENSAL • € 1,50

DIA DA MARINHAALMADA

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FERNÃO MENDES PINTO

Fernão Mendes Pinto nasceu em Montemor-o-Velho por perto de 1510, oriundo de uma família modesta que alguns dizem, sem grande propriedade, ter sido de cristãos novos. Sabemos que veio para Lisboa em 1521, chegando na altura das exéquias do rei D. Manuel, falecido a 13 de

Dezembro. Por infelicidade ou por espírito de aventura, abandona a protecção familiar e embarca num navio que parte para o sul. É ele próprio que nos conta como foi atacado e preso por piratas franceses, dispostos a vendê-lo como escravo em Larache, mudando de ideias quando deitaram a mão a outro navio, vindo de S. Tomé, com melhores riquezas. Largaram-no, com os seus companhei-ros, na praia de Melides, de onde passou a Santiago do Cacém e a Setúbal. Serviu depois em casa de um fidalgo, de nome Francisco Faria, mas os sonhos de uma vida diferente, certamente preenchida com riquezas que não tinha nem poderia ter na pacatez de um serviço doméstico, não deixaram de o atormentar. Em Março de 1537 partiu para a Índia, na armada de D. Pedro da Silva da Gama, al-cançando a barra de Diu em Setembro desse mesmo ano. Poucos dias depois ia a caminho do Mar Vermelho, dando início a um percurso épico e atribulado, espelho do que foi a vida de muita gente lusa, deambulando pelas sinuosas vielas do Mundo Oriental do século XVI. Um mundo onde nada era seguro e definitivo, e as fronteiras que separavam a riqueza e a glória do sofrimento ou da morte eram tão ténues e súbitas como o aparecimento de um tufão ou o estalar dos dedos de um qualquer mandarim ambicioso, que tanto acolhia e agasalhava como mandava matar.

A China da primeira metade do século XVI era uma enorme potência consumidora que comprava todo o tipo de mercadorias. Por isso os navios acorriam a vários pontos da sua costa, dando corpo a um movimento comercial de enorme dimensão, a que se dedicaram muitos portugueses, nalguns ca-sos enriquecendo, noutros perdendo a vida ou arrastando-a cruelmente pelos cárceres chineses. Fernão Mendes Pinto é um exemplo dessa diáspora lusa, sempre no fio da navalha, navegando daqui para ali, comprando e vendendo o que havia e sonhando com o regresso à sua terra com a bolsa cheia. Por mais de vinte anos percorreu os mares do Oriente, passando pelo Pegu, Sião, Malaca, Samatra, Java, China e Japão, deixando-nos um relato de todas estas viagens e aventuras a que chamou Peregrinação, descrevendo-nos essa fase da sua vida como uma busca do sagrado e de uma purificação pessoal, que obtém com o regresso a casa e ao remanso de uma quinta que comprou no Pragal, no termo de Almada.

O texto da obra tem sido alvo de considerações e críticas diversas, contestando os factos descritos e acusando-o de efabulação. A Peregrinação não é um livro de História, mas de aventuras. E todos nós sabemos o que são as “aventuras de marinheiros”. Todos ouvimos o que nos contou a geração an-terior, e rimos se nos falam de “sudoeste rijo”, porque outros nos falaram desse vento como se nou-tros tempos ele fosse diferente do que é hoje, ou como se as novas gerações nunca pudessem com-preender como eram valentes e fortes os homens de então. Fernão Mendes Pinto é essencialmente um velho marinheiro a contar-nos como eram terríveis os temporais do tempo dele – piores do que quaisquer outros –, como os piratas do Mar da China eram tantos como já não há e tão cruéis como nunca se viu. Mas, a par destes exageros, que compreendemos, a Peregrinação é um testemunho da vida nos mares do Oriente, no século XVI: as noites de chuva, o vento que rasga as velas, as amar-ras que partem, as vagas que varrem o convés, o sono, o cansaço, a fome, o medo, são elementos le-gítimos e verdadeiros da narrativa, tão intensos como a própria realidade. Escreveu este magnífico texto quando já vivia na sua Quinta do Pragal, onde passou os últimos 25 anos da sua vida e onde se supõe ter falecido a 8 de Julho de 1583.

J. Semedo de MatosCFR FZ

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Publicação Oficial da Marinha

Periodicidade mensalNº 464 • Ano XLI

Junho 2012

DiretorCALM EMQ

Luís Augusto Roque Martins

Chefe de RedaçãoCMG Joaquim Manuel de S. Vaz Ferreira

Redação1TEN TSN Ana Alexandra Gago de Brito

Secretário de RedaçãoSAJ L Mário Jorge Almeida de Carvalho

Colaboradores PermanentesCFR Jorge Manuel Patrício Gorjão

CFR FZ Luís Jorge R. Semedo de MatosCFR SEG Abel Ivo de Melo e Sousa1TEN Dr. Rui M. Ramalho Ortigão Neves

Administração, Redação e PublicidadeRevista da Armada

Edifício das InstalaçõesCentrais da Marinha

Rua do Arsenal1149-001 Lisboa - Portugal

Telef: 21 321 76 50Fax: 21 347 36 24

Endereço da Marinha na Internet http://www.marinha.pt

e-mail da Revista da Armada [email protected]

Paginação eletrónica e produçãoPágina Ímpar, Lda

Tiragem média mensal:4500 exemplares

Preço de venda avulso: € 1,50Revista anotada na ERC

Depósito Legal nº 55737/92ISSN 0870-9343

SUMÁRIO

ANUNCIANTES: LISSA - AGÊNCIA DE DESPACHOS E TRÂNSITOS, Lda.; ROHDE & SCHWARZ, Lda.

FERNÃO MENDES PINTO 2COMEMORAÇÕES DO DIA DA MARINHA. DISCURSO DO SECRETÁRIO DE ESTADO ADJUNTO E DA DEFESA NACIONAL 4VISITA DO MINISTRO DA DEFESA NACIONAL À ESCOLA DE TECNOLOGIAS NAVAIS 8NRP CORTE-REAL NA OPERAÇÃO ATALANTA 9A CAPACIDADE DE RESPOSTA DA MARINHA 10REFLEXÃO ESTRATÉGICA 3 1194º ANIVERSÁRIO DA BATALHA DE LA LYS E 76ª ROMAGEM AO TÚMULO DO SOLDADO DESCONHECIDO / ALOCUÇÃO DO ALMIRANTE NUNO VIEIRA MATIAS 14A MARINHA DE D. SEBASTIÃO (31) 16A TRAVESSIA AÉREA 25ENCONTRO NACIONAL DE COMBATENTES 27“VIA SIBÉRIA” 28HIERARQUIA DA MARINHA 17 / VIGIA DA HISTÓRIA 44 29NOVAS HISTÓRIAS DA BOTICA (14) 3037º ANIVERSÁRIO DO CLUBE DO SARGENTO DA ARMADA 31QUARTO DE FOLGA / CONVÍVIOS 33NOTÍCIAS PESSOAIS / CONVÍVIOS 34NAVIOS HIDROGRÁFICOS CONTRACAPA

REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 3

Foto 1SAR FZ Pereira.

8Visita do Primeiro-Ministro à Marinha.

2290º Aniversário da Travessia Aérea do Atlântico Sul.

17Dia da Marinha 2012.

Almada

A Sagres visitou a Figueira da Foz.

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Dia da Marinha. Alocução do Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada.5

PUBLICAÇÃO OFICIAL DA MARINHA • Nº 464 • ANO XLI JUNHO 2012 • MENSAL • € 1,50

DIA DA MARINHAALMADA

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4 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

Comemorações do Dia da Marinha

É com enorme honra que presido, em nome de Sua Excelência o Senhor Ministro da Defesa Nacional, à Cerimónia Militar co-

memorativa do Dia da Marinha.No dia da Nossa Marinha, a minha primeira

palavra é para os milhares de homens e mulhe-res, militares, militarizados ou civis, que servem na Marinha Portuguesa.

Uma palavra para todos estes homens e mu-lheres que, com o seu sentido de lealdade e de disponibilidade, com a sua competência e experiência, com a sua determinação e cora-gem, permitem o cumprimento das missões da Marinha Portuguesa.

Hoje, falamos de Portugal.E como em poucos casos, a história do

País é, inevitavelmente, a história da sua Marinha. E a história da sua Marinha, a his-tória do País. Raramente, o legado histórico é de tal forma evidente que não invejo as mulheres e os homens que, nos dias de hoje, o têm de honrar.

E é por isso que o sentido histórico deste dia não assinala, apenas, uma ideia ou pre-tensão. Hoje assinalamos a vossa determina-ção, o trabalho que desenvolvem, todos os dias, no combate à pirataria no Índico, nas acções de busca e salvamento no Oceano Atlântico, no combate ao tráfico de droga, nas missões de vigilância e fiscalização ou no âmbito da investigação científica.

A vossa ação no mar, seja em missões de caráter militar ou de serviço público, é um contributo basilar, para o Estado português e para seus cidadãos, mas também para a paz e estabilidade internacionais.

Como Secretário de Estado Adjunto e da De-fesa Nacional, mas sobretudo como cidadão, quero deixar-vos uma palavra de justo reconhe-cimento e de sentido agradecimento.

Saúdo, também, os cidadãos de Almada, ci-dade escolhida para receber, em 2012, esta ini-ciativa, pelo apoio que têm dado à nossa Mari-nha e pelo acolhimento que têm prestado à sua principal base naval – a Base Naval do Alfeite.

Senhor Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada

Minhas Senhoras e meus SenhoresHoje é o Dia da Marinha Portuguesa.O sentido histórico deste dia 20 de maio não

se esgota, apenas, na evocação de uma data ou de uma tradição.

É verdade que este é o dia em que, no ano de 1498, Vasco da Gama chegou a Calecute, e que a Marinha passou a celebrar, por tradição, como o seu Dia.

Mas é verdade, também, que neste dia assi-nalamos o cumprimento daquele que foi, na época, um objetivo nacional.

Época em que foi possível mobilizar e multi-plicar vontades e capacidades, que alavancaram o poder marítimo e o poder nacional.

Num processo com raro sentido estratégico e enorme esforço, mesmo dispondo de recur-sos limitados.

Por isso, assinalamos hoje, também, a chega-da a um porto de destino.

O cumprimento de uma missão.E a relevância da ação perseverante, deter-

minada por objetivos, seguramente difíceis, mas sólidos e coerentes na defesa do interes-se nacional.

Portugal é mar. Temos uma das maiores zo-nas económicas exclusivas do mundo, 15 vezes superior à dimensão do território continental. É pelo mar que nos chega a totalidade do petró-leo e 2/3 do gás natural que consumimos. Pelas nossas águas enviamos mais de 70% das nos-sas exportações e 53% do comércio externo da União Europeia passa por aqui.

A extensão da plataforma continental fará com que o território marítimo português seja um dos dez maiores do Mundo.

Num país que tantas vezes lamenta a falta de destino e de futuro, o amanhã esteve sem-pre aqui.

No mar.Temos as bases. Temos a formação. Temos a

vocação. Temos o conhecimento. Está no nos-so ADN. E quando ainda discutimos a riqueza das nações, deixem-me recordar o que devia ser evidente: o mar faz parte do nosso código ge-nético. Talvez mais do que em qualquer outro país do Mundo.

Sejamos claros: é o trabalho que o Instituto Hidrográfico desenvolve que cria as bases para as ambições portuguesas de expandir a nossa plataforma continental.

Deixem-me pois fazer uma pergunta: haverá melhor investimento do que este?

E é o trabalho combinado da Marinha Por-tuguesa e da Força Aérea Portuguesa que tem impedido que toneladas de droga cheguem dia-riamente à União Europeia.

Ou que milhares de vidas sejam perdidas no Oceano Atlântico.

Deixem-me que volte a perguntar: haverá melhor investimento do que este?

Não compreendo, pois, como é possível alguns virem agora questionar a utilidade das Forças Armadas. Atitude reveladora da falta de visão estratégica que os nossos antepassados tiveram e que condiciona o amanhã. Esse amanhã que temos aqui, hoje, à nossa frente.

A utilidade da Marinha decorre das suas missões e assenta num modelo conceptual de duplo uso.

Que a faz presente na satisfação dos com-promissos internacionais.

Pronta na defesa e proteção dos interesses nacionais, em especial dos cidadãos, das po-pulações e dos seus bens.

É essa presença que garante a segurança e proteção no nosso mar e dos nossos recursos.

A utilidade da Marinha está, também, nas estruturas e meios que estão ao serviço da cidadania, disponibilizando capacidades,

competências e recursos que outros departa-mentos do Estado podem e devem aproveitar, sempre, mas sobretudo em tempos como aque-les que vivemos.

Em que são requeridas soluções realistas e sustentáveis, cuja implementação não garan-te efeitos imediatos ou visíveis no curto prazo.

Conheço as dificuldades com que a Marinha se defronta.

Conheço os imensos desafios da transforma-ção em curso na Marinha.

Conheço os legítimos anseios dos seus m ilitares.

E é por reconhecer essas dificuldades, que tra-balhamos todos os dias no Ministério da Defesa Nacional tentando encontrar o equilíbrio entre os recursos disponíveis e as necessidades das Forças Armadas.

Esta circunstância torna mais premente o quadro de reformas estruturais que permita libertar recursos onde eles são menos necessá-rios, para os alocar onde realmente fazem falta.

Garantindo o devido equilíbrio entre as neces-sidades de capacitação das Forças Armadas e as atuais possibilidades de investimento nacionais.

Discurso do Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional

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REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 5

Acreditamos que só assim será possível ter umas Forças Armadas ainda mais opera-cionais e concentradas nas suas missões pri-mordiais.

Senhor Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada

Minhas Senhoras e Meus Senhores,Conforme foi recentemente afirmado por

Sua Excelência o Senhor Primeiro-Ministro, “o mar assume quatro dimensões específicas mas interligadas: uma dimensão política, uma di-mensão económica, uma dimensão cultural e uma dimensão de segurança”, sendo que “em cada uma delas, a Marinha tem um contributo decisivo a dar”.

Todos conhecemos a situação financeira do país. Todos conhecemos as restrições que t emos de enfrentar e que nos estabelecem o bjetivos dos quais não nos podemos desviar.

Ainda assim e para que aquele contributo possa ser efetivo, terá a Marinha que dispor dos meios operacionais indispensáveis.

Estou hoje em condições de garantir que tudo faremos para que, a muito curto prazo, possamos retomar o programa de conclusão e apetrechamento dos dois navios-patrulha oceânicos, em desenvolvimento nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

Todos sabemos que esta é uma decisão to-mada num momento particularmente difícil. Mas sabemos, também, que este é um inves-timento reprodutivo, pelo aumento da efici-ência que induz e pela redução de custos de operação que lhe está associada.

Estou certo que, independentemente dos meios, a Marinha continuará empenhada em colaborar e contribuir com soluções que me-lhor sirvam Portugal e os Portugueses.

A Marinha é, e será sempre, um parceiro indispensável para a ação do Estado no mar.

Um parceiro capaz, como poucos, de inte-grar as tradições e o legado histórico com um sentido de modernidade e de abertura a novas áreas do saber científico e tecnológico.

A exemplaridade do serviço prestado traz--nos a certeza de que, no final de um período tão difícil como o que vivemos, teremos uma Marinha mais forte e umas Forças Armadas ainda mais capazes.

O País confia na sua Marinha.Uma Marinha firme na defesa dos interes-

ses nacionais, empenhada na segurança dos nossos espaços marítimos e parceira em ini-ciativas de desenvolvimento centradas no mar.

Termino, por isso, lembrando o que escre-veu Agostinho da Silva, “como tudo é possível, ousemos fazer rumo ao impossível”.

Dr. Paulo Braga Lino

Comemorações do Dia da Marinha

Ao iniciar estas breves palavras, no dia em que se comemora a

chegada de Vasco da Gama a Calecut, no longínquo ano de 1498, permitam-me que me dirija, em primeiro lugar, aos homens e às mulheres que hoje, tal como no passado, as-seguram o cumprimento da missão da Marinha, presti-giando Portugal no mundo, protegendo e salvaguardan-do a vida e os bens daqueles que usam o mar para as suas atividades.

Militares, militarizados e civis da Marinha,

A nossa instituição nasceu com o país, cresceu ao seu serviço, vive a pensar nos portugueses e é, por todos nós, mantida ao serviço de Portugal. Por isso, é com o maior orgulho e satisfação que vos saúdo, e vos trans-mito publicamente o meu reconhecimento pela vossa dedicação, abnegação e vontade de bem servir Portugal na Marinha.

Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional,

Na ausência de Sua Ex.ª o MDN, gos-taria de agradecer-lhe a disponibilidade para presidir a esta cerimónia, o que mui-to nos honra.

Logo no início do meu mandato, esta-beleci que a «abertura da Marinha ao ex-terior» deveria ser um dos objetivos es-tratégicos da nossa instituição. Não com o intuito de publicitar o que fazemos, mas, antes, com o propósito de promover uma maior aproximação entre a Marinha e aqueles que servimos: os portugueses.

Neste contexto, a celebração do Dia da Ma-rinha constitui uma oportunidade ímpar, pois trata-se de uma ocasião onde se concentram, num mesmo local e num curto período de tempo, um conjunto significativo de inicia-tivas que mostram a Marinha à comunida-de. Assim, foi com o maior gosto que recebi o amável convite formulado pela Sra. Presi-dente da Câmara Municipal de Almada para aqui festejarmos o dia da Marinha, terra que há décadas nos acolhe em permanência, e com a qual partilhamos uma longa memória.

Exma. Senhora Presidente da Câmara Municipal de Almada,

É em nome do abrigo que a sua magnífi-ca cidade nos concede, das lembranças e da partilha de um destino que nos une, que aqui estamos hoje a comemorar o dia da Marinha. Abrigo, porque é este o concelho que recebe a nossa Base Naval, porto a que todos os ma-rinheiros sempre desejam voltar, pois ele sig-nifica o regresso a casa. Abrigo, porque nele residem muitos dos militares, militarizados e civis que servem o país na Marinha. Abri-go, porque aqui nos sentimos acarinhados por toda a população desta cidade.

Mas Almada é, também, lembrança e partilha.

Almada é lembrança de tempos em que a cidade crescia para nos acolher. Lembrança de tempos em que o sucesso das missões no mar se devia ao trabalho árduo de muitos almadenses, em especial daqueles que la-boravam na indústria da construção e re-paração naval.

Almada é partilha de um destino comum, que é o mar. Partilha dos valores que a vivên-cia do mar induz. Valores como a solidarie-dade, gizada pela interdependência do esfor-ço tanto nos sucessos como nos insucessos. Valores como a coragem, que nos motiva a superar dificuldades e que, como diz o poe-ta, “nos ensina a nunca desistir de chegar”.

Alocução do Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada

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A forma como Almada e a Marinha sou-beram encontrar uma solução para, com a devida dignidade, acolher um ex-libris da história de Portugal, a Fragata Dom Fer-nando II e Glória, é público testemunho de fortes lembranças e partilhas. Também a integração do submarino Barracuda no núcleo museológico do Museu de Marinha em Almada é reveladora do forte acolhi-mento que esta cidade dispensa à Marinha.

Bem-haja, pois, senhora Presidente da Câ-mara Municipal de Almada, e aceite os meus sinceros agradecimentos por todo o apoio que a edilidade tem prestado à Marinha.

Fala-se, hoje, muito do mar como de-sígnio nacional. Mas Portugal é, e sempre foi, um país marítimo, pela sua geografia e história, e pelos hábitos, valores, cultura e caráter do nosso povo.

Tornar o mar num desígnio nacional não consiste, pois, na descoberta de uma nova realidade. Consiste, antes, em dar expressão e subs-tância a um importante objetivo estratégico que, embora largamente reco-nhecido, tem vindo a ser reiteradamente adiado. Refiro-me à necessidade de tornar o mar um vetor essencial do desenvolvi-mento de Portugal.

Este objetivo é essencial e possível. No entanto, não devemos esquecer que o nosso mar é bastante vas-to. No global, atinge uma dimensão que equivale a sessenta e três vezes a área do território nacional. Para além disso, o nosso mar e o seu subsolo possuem uma grande riqueza, como os estudos relaciona-dos com a extensão dos limites da Platafor-ma Continental estão a evidenciar.

Por isso, agora, mais do que nunca, é le-gítimo interrogarmo-nos sobre se a Mari-nha está preparada para responder ao ob-jetivo de tornar o mar um vetor essencial do desenvolvimento de Portugal?

A resposta a esta questão encontra fun-damento nas capacidades que a Marinha possui, traduzidas no saber acumulado, na experiência adquirida e nos meios dis-poníveis para pensar e atuar no mar. To-dos sabem as dificuldades que o país atra-vessa e todos estamos empenhados para que a Marinha continue a desenvolver as ações que o país necessita e reclama. As-sim continuará a ser porque todos temos consciência que o saber, a experiência e os meios da Marinha são determinantes para o sucesso das iniciativas ligadas ao mar, incluindo as de outras entidades públicas e da sociedade civil.

Neste âmbito, importa realçar que a Ma-rinha tem contribuído sustentadamente para a realização dos trabalhos necessários à apresentação nas Nações Unidas das pre-

tensões portuguesas à extensão dos limi-tes da Plataforma Continental. Este projeto envolveu os navios hidrográficos da Ma-rinha, que conduziram, ao longo de seis anos, uma campanha com mais de mil dias de missão para cobrir uma área de um mi-lhão e setecentos mil quilómetros quadra-dos, mais de dezoito vezes a área do terri-tório nacional. Envolveu, ainda, peritos e técnicos da Marinha, cujas qualificações e saber se encontram ao nível mais alto da comunidade científica.

Retomando o objetivo de tornar o mar num desígnio de Portugal, desejo salien-tar que isso requer, em primeiro lugar, um exercício eficaz da autoridade do Estado no mar. A Marinha assume, neste contex-to, um papel muito relevante, quer no âm-bito da vigilância e serviço da soberania nos espaços marítimos nacionais, quer na prevenção e contenção da poluição marí-

tima. Recordo, a este propósito, que a Ma-rinha executa em média, por ano, cerca de dezoito mil vistorias a embarcações e cer-ca de trinta ações de combate à poluição.

Como contributo para o fomento da eco-nomia do mar, a Marinha deve ser vista, primariamente, como um “produtor de segurança”, pois sem segurança não há de-senvolvimento. Porém, apostar no desen-volvimento da economia do mar obriga a ter pessoas e meios empenhados nas ativi-dades marítimas. Mas como o mar é, mui-tas vezes, um espaço adverso, importa ga-rantir-lhes a segurança necessária para que não tenham que se questionar permanen-temente sobre a sua própria sobrevivência.

Neste particular, a prontidão de resposta do Serviço de Busca e Salvamento Maríti-mo, que funciona no âmbito da Marinha e é por mim dirigido, com as competências de Chefe do Estado-Maior da Armada e as de, por inerência, Autoridade Marítima Nacio-nal, tem-nos guindado para níveis de exce-lência que nos colocam entre os melhores. Este serviço, que é assegurado diariamente pelas unidades do Comando Naval e pelos meios das 28 Capitanias dos Portos espalha-

dos por todo o continente e regiões autóno-mas, traduz-se numa média anual que ex-cede as mil e quinhentas vidas salvas. Estes resultados são, para nós, motivo de grande orgulho e uma evidência da importância de assegurar a salvaguarda da vida de todos aqueles que trabalham e usam o mar.

Ainda como contributo para o fomento da economia do mar, realço que a Marinha é um cliente permanente das indústrias de construção e de reparação naval, e uma montra para o exterior das indústrias de defesa portuguesas, que desenvolvem tec-nologia e produzem sistemas de material naval. No passado recente, a qualidade dos produtos tecnológicos desenvolvidos em Portugal e utilizados nos nossos navios permitiu a sua exportação para diversos paí ses. Estamos certos que tal poderá ser in-crementado no futuro se a construção naval nacional, necessária à modernização da es-

quadra, for impulsionada.Relativamente ao con-

tributo da Marinha para a promoção da segurança internacional, destaco a nossa capacidade de par-ticipar, de forma ativa, na manutenção da paz mun-dial. Como é sabido, a Ma-rinha tem estado presente, quer no Afeganistão, inte-grando a Força Internacio-nal de Assistência à Segu-rança daquele país, quer no mar da Somália, inte-grando missões de com-bate à pirataria.

Estes empenhamentos dos meios da Marinha, na sequência de muitas outras realizações semelhantes,

realizadas na última década, permitiram--nos granjear um elevado prestígio externo, fundado na credibilidade das nossas ações, na capacidade dos nossos meios e na com-petência do nosso pessoal.

Não obstante o envolvimento da Mari-nha em compromissos internacionais, de-monstrámos, recentemente, uma notável capacidade de resposta à decisão política de conduzir uma missão destinada a eva-cuar os nossos concidadãos residentes na República da Guiné-Bissau, caso a situação de insegurança o justificasse. Empenhámos, nesta ação, quatro navios no mar e mobili-zámos muitas dezenas de efetivos em ter-ra. A imprevisibilidade dos problemas po-líticos internacionais demonstra, por si só e de forma clara, a importância de um Estado dispor, permanentemente, de uma capaci-dade de intervenção autónoma em teatros de operações internacionais, sempre que o interesse nacional assim o exija.

Esta capacidade de atuação da Marinha, para afirmar os interesses nacionais, assu-mir compromissos internacionais e fazer cumprir a lei nos espaços marítimos onde Portugal exerce soberania ou jurisdição, é

6 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

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um ativo essencial para um país de recur-sos escassos e responsabilidades marítimas consideráveis, como é Portugal.

Por isso, a Marinha, tendo presente as suas competências, está permanentemen-te empenhada no apoio a diversas enti-dades públicas com responsabilidades no mar, assumindo uma atitude cooperativa e, também, solidária com a atual conjun-tura financeira restritiva.

É por isso que a Marinha está disponível, e acredito ter a capacidade, para assumir as parcerias e as responsabilidades acres-cidas que lhe sejam solicitadas, na promo-ção da segurança e do desenvolvimento de Portugal no mar.

Assim, atribuo especial importância à partilha de responsabilidades com outras entidades públicas que dispõem de compe-tências para atuar no mar, ou, ainda, com entidades privadas que desenvolvem ati-vidades ou têm interesses no mar.

Mas os tempos são de mudança. E a mudança, sendo uma oportunida-de, engloba também ris-cos. Gerir o risco, significa pois, gerir a mudança. Para o efeito, a Marinha tem vindo a desenvolver um processo de transforma-ção, que se sustenta numa conceção doutrinária ino-vadora, na utilização de modernas metodologias de gestão e no emprego in-tensivo da tecnologia.

Assim, e no sentido de gerir os projetos interse-toriais, que decorrem das suas atribuições e compe-tências, a Marinha decidiu implementar uma ferramenta de gestão estratégica ino-vadora, cujo sucesso permitiu já a sua apli-cação prática no aprontamento do coman-do português da força naval empenhada, recentemente, na operação de combate à pirataria no oceano Índico.

No entanto, a transformação precisa de tempo. Tempo, para que determinadas medidas, especialmente as de natureza estrutural, e as que impelem alterações na cultura da organização, possam fruti-ficar. São estas medidas que vão permitir reequilibrar os orçamentos, possibilitan-do uma melhor redistribuição das verbas atribuídas ao pessoal, aos custos fixos de funcionamento e à atividade operacional.

Nesta vertente, refiro que a Marinha se defronta com problemas reais, tendo limi-tado a sua atividade ao mínimo essencial para cumprir a missão. Os níveis de treino tiveram de ser reduzidos aos valores de há vinte anos, situação que me causa grande preocupação, pois afeta não só a profi-ciência das guarnições, mas também os seus níveis de confiança e de segurança. Se adicionarmos a esta realidade o progressi-

vo envelhecimento da esquadra, e a redu-ção das ações de manutenção dos navios, estamos perante um problema que pode vir a assumir proporções muito graves no futuro, com consequências imprevisíveis.

Embora a Marinha continue a garantir a vigilância e o exercício da Autoridade do Estado no Mar das áreas marítimas sob soberania ou jurisdição nacional, a idade avançada dos navios, que constituem o dispositivo diário, leva a que essa garan-tia não possa ser totalmente assegurada num futuro que se adivinha relativamente próximo. Por isso, urge que o necessário investimento em novos meios seja feito no imediato. Refiro-me, naturalmente, à cons-trução de seis Patrulhas Oceânicos e oito Lanchas de Fiscalização Costeiras, cujo montante total necessário para o efeito é inferior ao orçamento anual da Marinha. Sem este investimento Portugal corre o

risco de ficar sem meios navais, de média e pequena tonelagem, indispensáveis às missões nas zonas oceânicas e sobretudo nas zonas marítimas costeiras do continen-te e da Madeira.

Mas o investimento, só por si, não garan-te a operacionalidade dos meios necessários ao cumprimento da missão da Marinha. Considero, por isso, fundamental a Mari-nha dispor de uma capacidade de manu-tenção e reparação adequada à especifici-dade e características dos meios que opera, complementada pelas valências técnicas do Arsenal do Alfeite, pela sua localização e pela tradição e competência na reparação naval militar, que considero insubstituível. Na verdade, e neste caso muito concreto, a decisão sobre que estaleiros navais o país deverá ter, não pode, nem deve, ser ape-nas tomada numa perspetiva economicis-ta de mercado.

Existem valências e capacidades de re-paração que importa assegurar continua-damente, sob o risco de a sua inexistência tornar os navios inoperantes, ou mesmo levar o país a uma situação de dependên-cia estratégica do exterior.

Todavia, mudança afeta sobretudo as pessoas. Não é possível garantir a moti-vação e um desempenho adequado se não existirem mecanismos que apoiem quem está longe ou afastado da sua família du-rante prolongados períodos de tempo.

A preocupação com o apoio aos militares e aos seus familiares constitui, assim, um de-ver indeclinável de quem comanda a Mari-nha. Por isso, as mudanças na área da saúde militar e no apoio social estão a ser conside-radas com a maior atenção, pesando cuida-dosamente todas as consequências. Trata-se de assuntos em que a gestão da mudança, mantendo o enfoque nas pessoas, é essencial.

Também outras matérias como as promo-ções, as carreiras e o reconhecimento sobre a especificidade da condição de militar, têm merecido um acompanhamento e pondera-ção muito cuidada. Saúdo, por isso, os re-centes desenvolvimentos em sede legislati-

va, que aguardamos com expetativa, pois permitirão resolver, ainda que parcial-mente, um problema de grave disfunção organiza-cional numa instituição ba-seada na hierarquia.

Estamos, como referi, em tempos de mudança. E a mudança traz oportuni-dades. Oportunidades que devem ser aproveitadas para que possamos encarar o futuro com esperança. Ul-trapassar as dificuldades de hoje é construir um futuro melhor amanhã. Por isso, esta é a postura da Marinha e a atitude que se impõe a todos os que nela servem.

Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional

Ilustres autoridades, Minhas Senhoras e meus Senhores,

A Marinha, enquanto instituição secular, sabe, e sempre saberá, reagir às diferentes situações conjunturais e adaptar-se às ne-cessidades e exigências de Portugal. Por isso, procura sempre as melhores soluções para os diferentes desafios que tem no ho-rizonte, sem nunca esquecer os melhores ativos de que dispõe, que são os seus ho-mens e mulheres.

É por isso que afirmo, sem qualquer hesi-tação, que a Marinha, pela qualidade, dedi-cação e coragem dos seus militares, milita-rizados e civis, está, e estará sempre, pronta para continuar a servir Portugal no mar.

Estando conscientes das dificuldades do presente, trabalhamos diariamente para uma Marinha moderna e preparada para enfrentar os desafios do futuro.

José Carlos Saldanha LopesAlmirante

Fotos 1SAR FZ Pereira

REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 7

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No passado dia 14 de maio, o Primeiro--ministro, Dr. Pedro Passos Coelho, efe-tuou uma visita à Marinha, a primeira

na presente legislatura.O Primeiro-ministro foi recebido na Doca

da Marinha com honras militares pelo Almi-rante Chefe do Estado-Maior da Armada e Au-toridade Marítima Nacional (CEMA / AMN), Almirante Saldanha Lopes, tendo-se dirigido à Base Naval de Lisboa a bordo da UAM Alva, acompanhado pelo ministro da Defesa Na-cional e pelo ALM CEMA. Durante a manhã visitou o NRP Francisco de Almeida, onde foi feita uma apresentação pelo Subchefe do Es-tado-Maior da Armada. Esta palestra incidiu sobre os desafios de Portugal no mar e sobre como a Marinha se organiza e contribui para os ultrapassar.

Na ocasião, o Comandante do na-vio fez também um breve resumo da participação do navio na Operação Ocean Shield, colocando o enfâse no contributo de Portugal, e no papel da Marinha, para a manutenção da segu-rança marítima no plano da comuni-dade internacional.

No decurso da visita, pretendeu-se, ainda, demonstrar a capacidade de um navio do tipo fragata apoiar uma população em situação de desastre natural, para o qual foi preparado um exercício do tipo Disaster Re-lief (DISTEX). O Primeiro-ministro assistiu as-

sim a um briefing no Centro de Operações do navio, após o que se deslocou para terra onde acompanhou o desenvolvimento das ações de salvamento, e pôde constatar a coordenação

conseguida entre o local da ação e o centro de comando a bordo. Durante a tarde, assistiu na Esquadrilha de Submarinos a uma apresenta-ção sobre os submarinos da classe Tridente, e visitou a primeira unidade daquela classe.

Nos trajetos entre os diferentes locais em que se realizaram as apresentações, houve ainda oportunidade para dar a conhecer algumas das capacidades, quer dos fuzileiros, quer dos mergulhadores, através de exposições estáticas especialmente montadas para o efeito.

O Primeiro-ministro mostrou-se sempre bas-tante interessado pela informação que lhe foi prestada, tendo colocado diversas questões e referido o seu agrado pelo papel da Marinha

em prol do País, reconhecendo, em particular, a capacidade de resposta demonstrada na “Operação Mana-tim” e o contributo da instituição “para inaugurar uma nova era de abertura do mar e de abertura ao mar”.

No final da visita, o Dr. Passos Coe-lho deixou no Livro de Honra da Ma-rinha a seguinte mensagem: “Os portu-gueses sabem que podem contar com a sua Marinha e que ela estará sempre presente, particularmente nos momen-tos de maior perigo ou dificuldade. É

do vosso espírito de serviço que nasce a no-breza dos vossos atos”.

Colaboração do ESTADO-MAIOR DA ARMADA

8 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

A Escola de Tecnologias Navais (ETNA) recebeu, no passado dia 3 de maio, o Ministro da Defesa Nacional, Dr. José

Pedro Aguiar-Branco, no âmbito do designado “Roteiro da Modernidade”. Recebido pelo Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada, Superintendente dos Servi-ços de Pessoal e pelo Comandante da ETNA, o Ministro da Defesa Nacional iniciou a visita entrando pelo antigo portão do Grupo N.º 1 de Escolas da Ar-mada, o que permitiu associar um certo simbolismo da necessária ligação entre o passado e o presente desta escola.

Após uma breve apresentação so-bre a estrutura, organização e desafios do Sistema de Formação Profissional da Marinha (SFPM) e da realidade da ETNA, efetuadas pelo Diretor do Ser-viço de Formação e pelo Comandante da Escola respetivamente, o Ministro da Defesa Nacional dirigiu-se aos presentes, salientando, ante o atual momento de grandes dificuldades económicas que o país atravessa, o qual exige por parte dos gestores e chefes rigor e inova-ção, estar seguro que as Forças Armadas serão

um exemplo para todos, pela excelência, rigor e fiabilidade que garantem, decorrentes da for-mação, treino e trabalho preparatório que têm subjacente ao emprego e utilização dos seus

meios. Terminada esta breve mas significativa intervenção, a visita prosseguiu nas instalações dos Departamentos de Propulsão e Energia e de Administração e Logística, onde foi possí-vel observar in loco as capacidades formati-vas ali existentes, em equipamentos e meios

didáticos, e trocar algumas impressões com formandos e formadores.

Continuando o programa previsto, a comitiva fez um breve percurso em autocarro de forma

a possibilitar uma imagem genérica das instalações e meios existentes, efetuan-do uma pausa mais alargada no Cen-tro de Recursos da Escola, espaço este dedicado ao apoio académico e social dos formandos, que alberga a Bibliote-ca e com acesso facilitado à internet e intranet, onde foi realizado o ponto de imprensa com a comunicação social.

A visita terminou no Salão Nobre, onde o Ministro da Defesa Nacional assinou o Livro de Honra da Escola e agradeceu a visita proporcionada.

Com esta visita o Ministro da Defesa Nacional honrou e prestigiou a Mari-nha com o reconhecimento do esfor-

ço que tem sido realizado para assegurar uma formação de qualidade, adequada e ajustada ao exercício das funções dos militares nos mais diversos contextos de emprego.

Colaboração do COMANDO DA ETNA

Visita do Primeiro-Ministro à Marinha

Visita do Ministro da Defesa Nacional à Escola de Tecnologias Navais

Visita do Primeiro-Ministro à Marinha

Visita do Ministro da Defesa Nacional à Escola de Tecnologias Navais

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Uma semana após o último reabastecimento, tornou-se novamente necessário atestar

os tanques de combustível da Corte--Real. Desta vez, foi o recém-chega-do reabastecedor francês FS Marne, navio que rendeu o SPS Patiño como navio-almirante da EUNAVFOR, que forneceu o combustível. Assim, no dia 10 de abril, aproveitando-se a proximidade entre navios ineren-te às operações de reabastecimen-to no mar, o comandante da Corte--Real realizou uma visita a bordo do novo navio-almirante da força, tendo prestado cumprimentos ao atual co-mandante da EUNAVFOR, o contra--almirante da Marine Nationale Jean--Baptiste Dupuis.

Nos dias que se seguiram, o navio continuou a rumar para sul, assegu-rando o patrulhamento e a segurança da bacia da Somália. Efetuou ações de vistoria em algumas embarcações, aproveitando simultaneamente para procurar eventuais indicadores de pi-rataria e para divulgar o trabalho dos navios da EUNAVFOR junto da co-munidade marítima local.

Na noite de 14 de abril, a Corte--Real transitou do hemisfério norte para o hemisfério sul. Como manda a tradição, o militar mais moderno de bordo foi para a proa do navio, assumindo o importantíssimo papel de cortar a linha do Equador. Para os marinheiros, esta linha tem uma importância acrescida, distinguin-do quem a cruzou de quem ainda a vai cruzar.

Após quase três semanas a patru-lhar o Oceano Índico, o navio atra-cou em Mombaça, no Quénia, no dia 16 de abril. Proporcionar des-canso à guarnição e preparar o navio para a tirada seguinte foi o objetivo desta escala logística. No Quénia, há que aproveitar a beleza natural do país, os seus vestígios de cultura portuguesa e a diversidade de fauna e flora existentes. Alguns elemen-tos da guarnição aproveitaram para conhecer as paisagens e os animais que caracterizam os parques natu-rais do país, recorrendo aos diversos programas disponíveis. Outros apro-veitaram para se reencontrar com Portugal em alguns dos monumen-tos existentes em Mombaça. Aliás, esta cidade esteve sob ocupação portuguesa durante cerca de 105 anos, tendo sido Vasco da Gama o pri-meiro europeu a visitá-la.

No dia 19 de abril, pela manhã, a Corte- Real largou de Mombaça, rumo a norte, tendo-se

dirigido para o Golfo de Áden. À medida que percorria a costa leste do continente africano, o navio contribuiu para assegurar o patrulhamento da bacia da Somália e garantir a sua segurança. Voltaram então a efetuar-se ações de vistoria a embarcações suspeitas de pirataria.

No dia 21 de abril, tirando provei-to da proximidade do navio da mari-nha alemã FGS Berlin, reabasteceu-se de água e combustível, garantindo--se a sustentabilidade para os pró-ximos dias.

Entre os dias 25 e 26 de abril, a Corte-Real realizou uma das tarefas mais importantes que a Operação ATALANTA comporta – proteger os navios que transportam e fazem chegar ajuda humanitária ao povo da Somália. Assim, foram escolta-dos os navios mercantes Roba Star e Mary Ann Hudson entre Berbera e Bossas o, na costa norte da Somália, tendo sido garantida a sua segurança durante o trânsito nas perigosas águas do Golfo de Áden. Até ao dia de hoje, todas as escoltas providenciadas pela E UNAVFOR foram um êxito; ne-nhum navio escoltado foi pirateado!

No dia 28 de abril, houve nova-mente necessidade de reabastecer. Este reabastecimento foi diferente dos anteriores uma vez que, para além de combustível, foram também forne-cidos sobressalentes recorrendo ao método Light Jackstay.

Nos dias seguintes, devido a uma avaria num dos motores do helicópte-ro orgânico “Fénix”, rumou-se para o Djibouti, porto onde se iriam receber as peças indispensáveis para a sua re-paração e embarcar um engenheiro da Esquadrilha de Helicópteros para a supervisionar.

Em 30 de abril, a Corte-Real largou ferro no fundeadouro do Djibouti e iniciou a receção, por semi-rígida, dos sobressalentes e do apoio técnico ne-cessários para dar início à reparação do “Fénix”, tendo atracado no dia se-guinte para prosseguir as reparações. Na noite do dia seguinte, já com os trabalhos concluídos, o navio largou para o mar para iniciar uma bateria de testes previstos nestas situações a fim de garantir a operacionalidade do helicóptero. Após vários voos de teste, o “Fénix” ficou novamente disponível para voar e contribuir para o sucesso da missão. Esta reparação tornou-se um marco histórico na Marinha Portu-guesa, tratando-se dum procedimento inédito a nível internacional uma vez que, até à data, só tinha sido executa-do em oficinas da Rolls‑Royce.

A fragata Corte-Real encontra-se neste mo-mento em patrulha no Oceano Índico, empe-nhada em garantir a segurança da navegação mercante e no combate à pirataria.

Colaboração do COMANDO DO NRP CORTE-REAL

NRP CORTE-REAL NA OPERAÇÃO ATALANTANRP CORTE-REAL NA OPERAÇÃO ATALANTA

2ª PARTE

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10 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

A CAPACIDADE DE RESPOSTA DA MARINHAPRONTIDÃO, FLEXIBILIDADE E MOBILIDADE

A CAPACIDADE DE RESPOSTA DA MARINHA

Em 14 de abril largaram da BNL, para uma missão de evacuação de cidadãos nacio-nais na República da Guiné-Bissau, os

NRP Vasco da Gama, NRP Baptista de Andra-de e NRP Bérrio. A bordo, além das guarnições, seguiram uma Força de Fuzileiros de Escalão Companhia (com elementos de comando, ma-nobra, apoio de combate, apoio de serviços, assalto anfíbio e ações especiais), equipas de mergulhadores, equipa médica e, dois helicóp-teros Lynx. Dois dias mais tarde, juntou-se-lhes ainda o NRP Bartolomeu Dias, onde embarca-ram o comandante e estado-maior da Força de Reação Imediata. A força naval assim constituída reuniu um total aproxima-do de 800 militares da Marinha.

O envio desta força constituiu a pronta resposta de Portugal à situação que se vivia naquele país africano, obri-gação que decorre das responsabilida-des do Estado expressas na Lei da De-fesa Nacional. Mas esta missão pode também ser entendida num propósito mais abrangente, por permitir a Portu-gal afirmar-se numa área de incontes-tável interesse estratégico, onde, um passado comum, uma diplomacia ati-va, e ações de cooperação conduzidas de forma permanente, permitiram ge-rar laços de confiança mútua, que hoje facilitam a aceitação do nosso país na mediação de crises e/ou de conflitos.

Aceitando como bons tais argu-mentos, terá sido o emprego de meios e unidades da Marinha, a opção mais adequada?

Para responder a esta pergunta, im-porta recordar que a natureza imprevi-sível, no espaço e no tempo, dos fatores que podem perturbar a segurança e a estabilidade internacionais, só pode ser devidamente combatida se se dispuser de uma capacidade de resposta pronta. As características intrínsecas do Poder Naval permitem que as Marinhas, através das suas forças, mantenham um elevado grau de prontidão, i.e., disponibilidade de meios hu-manos e materiais, para empregar num curto espaço de tempo, e em teatros de operações diversificados e longínquos.

A este propósito, interessa não esquecer, que no mundo globalizado de hoje, a localização geográfica de uma ocorrência não lhe confere, necessariamente, um cariz regional. A interde-pendência dos fenómenos, seja nas causas ou nas consequências, induz nos estados a respon-sabilidade, moral e ética, de participarem em so-luções internacionais de natureza cooperativa, pois mesmo quando não estão diretamente en-volvidos numa determinada situação, poderão vir a ser afetados por ela. Intervir, em espaços geográficos distantes, passou assim a constituir um requisito da ação dos estados, e a mobili-

dade, consubstanciada na liberdade de uso dos mares, e também uma característica própria das forças navais, torna-as particularmente úteis em tais quadros de atuação.

Por outro lado, é inerente às forças navais, a possibilidade dos meios e unidades poderem atender a diferentes desafios, adaptando as suas valências e reconfigurando os seus perfis de atua ção, para dar a melhor resposta a cada novo quesito operacional. Esta flexibilidade de uso é uma solução essencial para o caráter in-certo, quanto à forma, das ameaças, relevan-do a importância das Marinhas neste contexto.

No caso em apreço, a rapidez na resposta, e a configuração modular da força, materializam, simultaneamente, os requisitos de prontidão, que respondem à imprevisibilidade, e de flexi-bilidade, que respondem à incerteza. A inclusão do reabastecedor de esquadra (AOR) garantiu a sustentação, logo a mobilidade, terceiro fator fundamental para a projeção de poder. De facto, para períodos prolongados de permanência no mar, a satisfação das necessidades logísticas de uma força naval1 só pode ser assegurada com uma escala num porto da área de operações, logo dependendo do apoio de terceiros, ou pela presença de um AOR. Nesta ótica, o reabastece-dor confere a uma força independência logística relativamente a apoios externos, o que reflete a capacidade do Estado atuar de forma autónoma.

Esta missão, à semelhança de outras que ocorreram num passado recente, é bem ilustra-

tiva da capacidade de resposta da Marinha. No entanto, caso venham a descurar-se determina-dos aspetos fundamentais, a prontidão, flexibili-dade e mobilidade ora demonstradas, poderão não se manter no futuro.

A questão da prontidão coloca-se, principal-mente, em termos da disponibilidade e do estado do material2, e da existência de pessoal treinado e motivado. Só garantindo todos os requisitos an-teriores se conseguirão promover níveis de con-fiança e as perícias adequadas para assegurar um desempenho seguro e eficaz. A flexibilidade está associada à versatilidade e, logo, aos padrões de

prontidão, que são a base da organi-zação interna das unidades. A flexibi-lidade depende dos mecanismos de decisão, da gestão dos processos inter-nos, e da apreensão destes pelas guar-nições. Para isso é fundamental muito treino! A mobilidade está relacionada com meios, logo com o processo de planeamento e edificação de forças. Mas depende, em igual medida, da mestria das guarnições, logo do trei-no individual e de força. A indisponi-bilidade de um AOR condiciona os movimentos, a sustentação e a capa-cidade de emprego das forças navais. Mesmo que os navios tenham atingi-do elevados padrões de desempenho ao nível do RAS3 tal de nada servirá se não existir um reabastecedor. E caso este exista, de nada servirá à força se esta não estiver proficiente em RAS.

A exigência ao nível do treino, e a necessidade de se manterem eleva-dos padrões, ao nível da disponibi-lidade e do estado do material, rele-vam como denominadores comuns à capacidade de resposta da Marinha. Estes desígnios não podem ser negli-genciados, devendo, por isso, supe-rintender às opções de gestão e de-terminar a consonância de esforços.

Na realidade, só a noção de propósito e a unidade no esforço poderão gerar a força que a Marinha necessita, para estar pronta, quando e onde Portugal dela necessitar, continuando a merecer o reconhecimento dos mais elevados responsáveis de Portugal:

“Reconheço e agradeço a todos os militares envolvidos o relevante serviço que prestaram a Portugal e aos portugueses” (mensagem do Pri-meiro-ministro, por ocasião da chegada da FRI).

CMG L. Sousa PereiraCTEN P. Gonçalves Simões

Notas1 Em particular o reabastecimento de combustível, o

completamento das dotações de mísseis, torpedos e mu-nições, e o fornecimento de determinados sobressalentes.

2 Em resultado das ações de manutenção planeada ou corretiva.

3 Replenishment at Sea (reabastecimento no mar).

NRP BARTOLOMEU DIAS

NRP VASCO DA GAMA

NRP BAPTISTA DE ANDRADE

NRP BÉRRIO

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REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 11

Mahan e a necessidade das ArmadasO trabalho mais famoso de Alfred T.

Mahan, The Influence of Sea Power Upon History, 1660-1783, revela

claramente que, no essencial, o seu pensa-mento assenta em quatro ideias estratégicas, encadeadas de forma lógica e interdepen-dente, direccionadas para sustentar a neces-sidade das armadas.

Na primeira ideia estratégica, Mahan assu-me que, para o Estado aumentar a sua pros-peridade e se afirmar internacionalmente, necessita de fortalecer o poder marítimo.

Esta ideia estratégica confere primazia ao poder marítimo e aos seus factores básicos, relativamente aos restantes elementos do poder nacional. Por isso, Mahan dá tanta importância à posição geográfica, à configuração física e à extensão do ter-ritório, à dimensão populacional e ao carácter do povo, e à determinação e ao génio do governo. A posição geográfica dos Estados reflec-te a sua localização em relação às rotas marítimas e ao terri-tório de outros Esta-dos. A configuração física e a extensão do território nacio-nal condicionam a forma como o povo se posiciona relativamente à busca e à con-secução do poder marítimo. A dimensão po-pulacional e o carácter do povo referem-se à sua propensão para os assuntos marítimos. A determinação e o génio do governo signifi-cam o seu empenhamento e a sua habilida-de na formulação e operacionalização das políticas públicas destinadas à preparação e ao emprego do poder marítimo.

Na segunda ideia estratégica, para o Es-tado fortalecer o poder marítimo, Mahan considera essencial dispor de armadas que garantam o comando do mar.

Esta ideia estratégica foi desenvolvida com base em análises ao comportamento da Grã--Bretanha durante os séculos XVII e XVIII, nas disputas que manteve, em especial com a França. Neste contexto, Mahan afirma que o Estado deve dispor de uma armada capaz de garantir o uso do mar. Isso significa anular ou condicionar as forças navais que amea-cem o comércio marítimo, e que, por essa via, possam prejudicar o aumento da pros-peridade e a afirmação internacional do Esta-

do. Como factor determinante para alcançar o comando do mar, Mahan identifica o con-ceito do controlo do mar, cuja intensidade pode variar entre a destruição e a neutrali-zação da força naval inimiga.

Na terceira ideia estratégica, para o Es-tado garantir o comando do mar, Mahan, inspirado em Jomini, elege a concentração da força como o princípio determinante da operação da força naval.

Esta ideia estratégica confere primazia ao princípio da concentração da força naval. Todavia, ocupar uma posição central em relação à força naval inimiga, operar a par-

tir de linhas interiores, e dispor de boas li-nhas de comunicação marítima, são os três princípios estratégicos coadjuvantes, des-tinados a favorecer a maior concentração possível de força naval no ponto decisivo. Neste contexto, Mahan preconiza que o sucesso na guerra naval é determinado pe-los navios de linha ou couraçados que inte-gram a força naval combatente. Por isso, os navios de apoio de combate, sejam escolta-dores ou avisos, só devem ser considerados nos planos destinados à edificação da força naval, se não prejudicarem a obtenção dos navios de linha. Mahan também aconselha que os couraçados sejam integrados num único corpo empenhado na busca da força naval inimiga, que deve ser destruída numa batalha decisiva. O bloqueio próximo e o bloqueio distante são consideradas modali-dades de acção válidas para manter a força naval concentrada, enquanto se aguarda a saída da força naval inimiga, dos seus portos de abrigo, para travar uma batalha decisiva.

Na quarta ideia estratégica, para o Estado

operar a força naval, Mahan reconhec e a necessidade de obter bases, onde os n avios se possam abrigar, ser reparados e reabas-tecidos.

Esta ideia estratégica atende ao facto de, no inverno, o estado do mar dificultar bas-tante a perseguição e o combate à força na-val inimiga. Para além disso, contempla a necessidade dos navios serem submetidos a reparações que mantenham o seu potencial de combate. Considera, ainda, que algumas áreas de operação podem ficar muito longe dos portos de armamento, e que os navios precisam de se reabastecer de combustível

e de víveres. Na opi-nião de Mahan, a conjugação destes factores implica o estabelecimento de bases em locais que permitam um tempo de operação da for-ça naval tão exten-so quanto possível. Afirma Mahan que, como a concessão dessas bases por outros governos é pouco confiável, os Estados devem esta-belecer colónias ou, pelo menos, bases navais autosusten-táveis, nas regiões que consideram es-trategicamente rele-vantes.

As quatro ideias estratégicas que sustentam a conceptuali-zação de Mahan sobre a necessidade das armadas, foram exploradas, entre outros, por Theo dore Roosevelt, Henry Cabot Lodg e, Elihu Root, Henry Adams e Franklin D. Roo-sevelt, para justificarem os avultados inves-timentos, na preparação e no emprego da armada dos EUA. É certo que, tais inves-timentos, naquela época pareceram des-propositados e impuseram sacrifícios aos americanos. Contudo, verificou-se, pouco depois, que foram determinantes para aque-le país alcançar rapidamente o estatuto de primeira potência mundial, que actualmen-te mantém. Em consequência disso, Alfred T. Mahan, cuja carreira naval tinha sido vulgar e estava na sua fase final, obteve subitamen-te a consagração como o grande estrategista naval do século XX.

António Silva RibeiroCALM

N.R.O autor não adota o novo acordo ortográfico.

Mahan e a necessidade das ArmadasREFLEXÃO ESTRATÉGICA 3

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12 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

No âmbito das comemorações do cin-quentenário da Sagres sob Bandeira Portuguesa e do ciclo de conferên-

cias “Re…Descobrir o Mar - Rotas do Futu-ro” que decorreu no Casino da Figueira da Foz (designadamente de uma conferência sobre o navio, programada para o dia 2 de abril), a Sagres visitou o porto da Figueira da Foz entre 1 e 3 de abril de 2012, tendo para o efeito proporcionado a uma centena de jovens figueirenses a oportunidade úni-ca de viajarem neste emblemático navio p ortuguês.

No dia 31 de março, pelas 13h30, chegaram ao navio os primeiros 50 alunos figueirenses, acompanhados por 4 professores, que efetua-ram o trânsito entre Lis-boa e a Figueira da Foz. Com um misto de entu-siasmo e excitação, os jovens com idades en-tre os 13 e os 16 anos, ouviram atentamente o briefing de segurança, ministrado no poço do navio, poucos minutos antes da largada. Pouco tempo depois, come-çou a azáfama, prece-dida pela característica panóplia de apitos, e a Sagres largou da Base Naval de Lisboa. Logo após a saída da barra do porto de Lisboa, os convidados embarca-dos puderam presen-ciar a realização de dois exercícios de ho-mem ao mar.

Nas aproximações à Figueira da Foz, a Sa-gres foi surpreendida por dezenas de em-barcações que foram surgindo por detrás da neblina matinal e que acompanharam o navio durante a entra-da no porto. Ao longo dos molhes e cais, centenas de pessoas marcaram também presença, homenageando este símbolo na-cional que pela segunda vez em 50 anos visitava a cidade. No cais aguardavam pela Sagres o Presidente da Câmara Muni-cipal da Figueira da Foz, o administrador do Casino da Figueira da Foz e o Capitão do Porto, acompanhados pela Fanfarra dos Bombeiros Voluntários locais e pela Ban-da Filarmónica da Sociedade Filarmónica Paionense.

Pouco depois de chegar, já o navio abria a visitas, acolhendo um autêntico mar de

gente que aguardava no cais pela oportu-nidade de pisar o convés da Sagres. Ainda nessa tarde, o Casino da Figueira da Foz inaugurou uma exposição de fotografias, tiradas pelos conceituados fotógrafos Guta de Carvalho, Magalhães de Castro e Ro-berto Santandreu, que apresentaram três visões diferentes da Sagres. A exposição, intitulada “Rotas dos Mares”, foi inaugura-da pelo Dr. Domingos Silva, administrador do Casino da Figueira da Foz, na presen-ça do embaixador do Chile e do contra-

-almirante Tavares de Almeida (em repre-sentação do almirante CEMA), entre outras personalidades. Estiveram ainda presentes o comandante e alguns membros da guar-nição da Sagres.

No dia 2 de abril realizou-se a bordo um almoço presidido pelo vice-almirante Co-mandante Naval, que contou com a presen-ça do Presidente da Câmara da Figueira da Foz, de outros representantes do poder local e de entidades de alguma forma associadas à visita da Sagres a esta cidade e à organi-zação do ciclo de conferências “Re…Des-cobrir o Mar - Rotas do Futuro”.

Ainda nesse dia, no âmbito do ciclo aci-

ma referido, realizou-se no Casino da Fi-gueira da Foz uma conferência subordina-da ao tema “Navio Escola Sagres: Escola de Mar e Embaixador de Portugal”. Com mo-deração do jornalista António José Teixeira, a conferência contou com a participação do embaixador António Monteiro, como orador principal, e do comandante do na-vio, capitão-de-fragata Sardinha Monteiro.

Tendo por pano de fundo uma vela do navio, com a Cruz de Cristo bem visível, o embaixador António Monteiro come-

çou por falar da im-portância do mar no nosso passado, nomea-damente para a ob-tenção e a consolida-ção da independência nacional e durante o período da expansão marítima. Além disso, acentuou o papel do navio na diplomacia, ilustrando as suas inter-venções com a descri-ção de situações por si testemunhadas, nas vá-rias vezes em que o seu trajecto profissional se cruzou com a Sagres.

Interpelado pelo mo-derador, o comandan-te Sardinha Monteiro começou por contar a história do navio e enumerar as suas prin-cipais características. Numa das interven-ções, explicou tam-bém as principais fun-ções da Sagres: como escola de mar, como embaixador itineran-te e como promotor da maritimidade. O comandante Sardinha Monteiro aproveitou, ainda, para agradecer a forma calorosa como o navio foi recebido e

o interesse manifestado pela população figueirense, que afluiu em massa a visi-tar o navio.

Na plateia estiveram cerca de uma cen-tena de pessoas, destacando-se o presiden-te da Câmara Municipal da Figueira da Foz, que, na altura do debate, tomou da palavra para agradecer publicamente à Marinha pelo envio do seu navio-escola à cidade. Também intervieram no debate o coman-dante da Escola Naval, contra-almirante Seabra de Melo, e o anterior comandante do navio, capitão de mar e guerra Proença Mendes, que contou algumas das estórias vividas durante a Volta ao Mundo efetuada

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REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 13

pela Sagres, em 2010, sob o seu comando. Destaque ainda para uma intervenção da plateia, protagonizada por uma das professo-ras que embarcara en-tre Lisboa e a Figueira. Em tom emocionado, a professora afirmou que aquele embarque tinha sido uma das experiên-cias mais marcantes da sua vida e que notara o mesmo sentimento nos alunos que acom-panhara, agradecendo à Marinha Portuguesa, de forma sentida, pela oportunidade propor-cionada.

No dia 3 de abril, pe-las 14h00, a Sagres lar-gou da Figueira, embar-cando outros 50 alunos figueirenses. No cais fi-caram centenas de pes-soas que não quiseram perder a oportunidade de ver o navio a nave-gar nas águas do Mon-dego com algum pano içado.

Após passar entre molhes, realizou-se um exercício de homem ao mar e um exercício de combate a um incên-dio. Logo de seguida apitou a faina geral de mastros e, com a participação dos jovens alunos embarcados, a Sagres içou e caçou todo o pano e navegou à vela, aproveitando o vento moderado de noroeste.

Refira-se ainda que os 100 alunos que

embarcaram nos dois trânsitos puderam participar em diversas atividades do navio, desde subir aos mastros, polir os amarelos e puxar cabos durante as “fainas gerais de mastros”, o que constituiu uma oportunida-de para ajudar a despertar o gene de ma-

rinheiro, que todos os portugueses recebem na sua herança gené-tica. Para além disso, o contacto destes jovens com o “talent de bien faire”, com a discipli-na e com o rigor, apa-nágio dos militares da Marinha, terá também contribuído para a for-mação do caráter des-tes jovens figueirenses, conforme os próprios tiveram, aliás, oportu-nidade de testemunhar em diversas entrevistas a órgãos de comunica-ção social.

Como marco princi-pal desta estadia, fica o acolhimento calo-roso prestado ao navio e traduzido, entre ou-tros aspetos, nos mais de 12 000 figueirenses que visitaram a Sagres em apenas dois dias. Para se ter uma noção da grandeza deste nú-mero, importa referir que ele corresponde a cerca de um sexto da população do conce-lho da Figueira da Foz!

O carinho e o orgu-lho das “gentes da Fi-gueira” comoveram a

guarnição do navio, que saiu da cidade com a certeza do reconhecimento da população local relativamente ao papel do navio em prol da portugalidade e da maritimidade.

Colaboração do COMANDO DO NRP SAGRES

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No passado dia 9 de abril, realizou-se a bordo do NRP Sa-gres uma apresentação de produtos de agricultura bioló-gica à Ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do

Ordenamento do Território, Dr.ª Assunção Cristas.A Ministra foi recebida a bordo pelo vice-almirante Coman-

dante Naval e pelo comandante do navio, que a acompanharam durante todo o evento. Esta apresentação foi promovida pela As-sociação Regional de Agricultores Biológicos da Beira Interior e integrou-se no âmbito das propostas de alteração às regras da Po-lítica Agrícola Comum (PAC). A mostra contou com a presença de alguns produtores nacionais de agricultura biológica, que tive-ram oportunidade de apresentar os seus produtos à Ministra, bem como a diversos deputados da Comissão de Agricultura e Mar da Assembleia da República.

No final do evento a Ministra foi convidada a visitar a Cama-rinha do Comandante, onde assinou o Livro de Honra do navio.

Apresentação de produtos biológicos no NRP Sagres

Apresentação de produtos biológicos no NRP Sagres

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14 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

Comemorou-se no dia 14 de abril o Dia do Combatente, o 94º Aniversário da Batalha de La Lys e a 76ª Romagem

ao Túmulo do Soldado Desconhecido. As comemorações tiveram lugar no Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha, ten-do sido presididas pelo Ministro da Defe-sa Nacional (MDN), Dr. José Pedro Aguiar--Branco. Estiveram também presentes o Presidente da CM da Batalha, o General CEMGFA, o Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional, o General CEMFA, o General CEME, o Vice-chefe do Estado--maior da Armada, o Diretor Nacional da PSP, o representante do Comandante-geral da GNR e representantes de Associações de Combatentes, de Militares e numerosos Nú-cleos da Liga dos Combatentes.

As cerimónias tiveram início com uma Missa de Sufrágio pelos Combatentes fale-cidos, na Igreja do Mosteiro, perante uma numeros a assembleia de Combatentes, suas famílias e demais entidades, tendo sido ce-lebrante S. Ex.ª Reverendíssima o Bispo Castrense, D. Januário Torgal Mendes Fer-reira, cuja homilia alusiva à efeméride se revestiu de profundo significado. Os cân-ticos religiosos foram entoados pelo Coro da Cruz Vermelha Portuguesa.

De seguida, em Cerimónia Militar, após

terem sido prestadas honras à Alta Entida-de que presidiu, o Presidente da Direção Central da Liga dos Combatentes, General Chito Rodrigues, como representante da or-ganização anfitriã, dirigiu cumprimentos às entidades convidadas e a todos os demais presentes, tendo feito uma intervenção, alusiva à defesa dos valores e do espírito de sacrifício do Combatente Português, destacando, por outro lado, a importância das Forças Armadas, como instituição vi-tal para a defesa da independência nacio-nal cuja importância remonta à origem da nacionalidade e tem tido ao longa da nossa História uma presença indiscutível na luta pela sobrevivência da Nação.

Seguiu-se uma alocução do MDN, Dr. J. P. Aguiar-Branco, colocando ênfase na coragem dos Combatentes portugueses e na reestru-turação das Forças Armadas, para aumentar a sua capacidade de resposta, melhorando a formação e a sua operacionalidade. Após o desfile das Forças em Parada, constituídas por militares dos três Ramos, os convidados dirigiram-se ao Museu das Oferendas onde foi assinado o Livro de Honra pelo MDN.

Posteriormente, na Sala do Capítulo, o orador convidado, Almirante Nuno Viei-ra Matias, numa alocução muito emotiva, dissertou sobre o significado da homena-

gem ali prestada a todos os portugueses que, desde Guimarães a Ourique, passan-do pelas diversas Batalhas travadas há mais de nove séculos para engrandecer a Pátria portuguesa, lutaram e muitos morreram por ela. Convidando todos os presentes a curvarem-se em silêncio, “sentida e res-peitosamente perante a memória daqueles que um dia, quando ajoelharam e caíram, o fizeram apenas perante o Altar da Pátria”. Alocução esta que se transcreve na íntegra seguidamente.

Posteriormente, seguiu-se a Cerimónia de Homenagem aos Mortos pela Pátria, com a deposição de 24 coroas de flores jun-to ao Túmulo do Soldado Desconhecido, pelas entidades presentes e a prestação de honras por Força Militar. Este ato de pro-fundo significado patriótico terminou com a entoação do Hino Nacional, executado pela Banda da Armada e acompanhada pela assistência. Terminadas as cerimó-nias, houve lugar a um almoço de confra-ternização nas instalações do Regimento de Artilharia N.º 4, em Leiria. De salientar a grande participação de muitos Comba-tentes e seus familiares, bem como de vá-rias Associações que, com a sua presença, quiseram, mais uma vez, associar-se a es-tas cerimónias.

94º Aniversário da B atalha de La Lys e 76ª R omagem ao Túmulo do Soldado Desconhecido

94º Aniversário da B atalha de La Lys e 76ª R omagem ao Túmulo do Soldado Desconhecido

D. Januário Torgal Ferreira.Bispo Castrense.

General Chito Rodrigues.Presidente da Liga dos Combatentes.

Dr. J. P. Aguiar-Branco.Ministro da Defesa Nacional.

Viemos hoje a esta Sala do Capítulo do Mosteiro de Santa Maria da Vic-tória em acto de recolhida reflexão

por razões várias, que merecem ser ponde-radas, também em motivo do tempo e do local em que se realiza.

Estamos aqui, sobretudo, em romagem a este simbólico altar da nossa Pátria para homenagear todos os que, ao longo dos quase nove séculos da história de Portugal,

combateram por ele e, aos que, caindo no campo da honra, levantaram o seu nome sempre bem alto.

O nosso pensamento mais directo vai para os Soldados Desconhecidos, simbolicamente representados pelas cinzas de dois combaten-tes que jazem sob estas simples lousas, um morto na Flandres, em 9 de Abril de 1918, e outro caído, por essa altura, numa fronteira africana de um território então português.

Só esta diversidade das origens dos com-bates, europeia e africana, é suficiente para indiciar a abrangência da homenagem per-manente que se presta nesta Sala do Capí-tulo, e em que o 9 de Abril, Dia do Comba-tente, constitui apenas um marco. Trata-se de uma referência a um sacrifício brutal dos nossos soldados e não a celebração de uma vitória porque, na verdade, a Batalha de La Lys, vista isoladamente, até se traduziu

Colaboração da LIGA DOS COMBATENTES

Alocução do Almirante Nuno Vieira MatiasAlocução do Almirante Nuno Vieira Matias

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REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 15

numa derrota militar, onde perdemos cer-ca de 7.500 homens, entre mortos, feridos e desaparecidos. Foi uma pesada dor a dessas baixas que, em sublime acto de amor, de-ram as suas vidas pela Pátria, na linha do que tantos dos nossos antepassados tinham feito antes e como muitos outros milhares o viriam a fazer, depois, até aos nossos dias.

Há, assim, nesta nossa romagem um sentido tão amplo quanto os tão diversos tempos e lugares em que portugueses de-ram a vida por Portugal. De Guimarães a Ourique, da Batalha Real, tra-vada aqui a uns passos, em São Jorge, às Batalhas da Res-tauração, ou então das Linhas de Torres às linhas do mun-do inteiro, nas terras de qua-tro continentes e nos mares de três oceanos, foram quase nove os séculos e os mais va-riados os lugares em que, para engrandecer a Pátria portu-guesa, lutámos e muitos mor-reram por ela.

Todos esses portugueses, soldados, marinheiros e avia-dores, são aqui homenageados permanentemente, mas hoje com especial ênfase pela força desta iniciativa da Liga dos Combatentes.

Trata-se, pois, de expressar um senti-mento de gratidão muito próprio do nosso Povo, muito português, mas também com raízes na civilização ocidental, de que so-mos parte, de base cultural grega, romana e cristã. De facto, já os Gregos, pelo menos há 2500 anos, em Atenas, homenageavam publicamente os seus heróis. A oração de Péricles de elogio aos mortos e ao poder demo-crático, tão viva e pormenori-zadamente relatada por Tucí-dides, dá disso testemunho, assim como as celebrações ca-tólicas em memória dos fale-cidos, desde há 2000 anos, são disso exemplo.

Procuramos, assim, honrar os nossos heróis e mártires, uns conhecidos com nomes que a nossa memória colecti-va imortalizou e, outros, des-conhecidos de quem sabemos apenas que tombaram nos campos e mares de batalha, por nós, para que tenhamos di-reito a ter uma pátria honrada e respeitada, a Pátria portuguesa.

Contudo, o sacrifício de todos eles para não ser em vão impõe-nos uma obrigação firme, um compromisso solene, a assumir perante a sua memória e que é o de con-tinuarmos a lutar por Portugal e pela sua identidade e independência.

É que, na verdade, talvez nunca tenha sido tão importante afirmar e manter a nossa identidade, a nossa cultura, a nossa

maneira de ser, como o é agora em que a integração numa grande comunidade in-ternacional, como a União Europeia, nos pode reduzir à simples qualidade de pe-queno número sem expressão, sem rele-vância. Acresce ainda, que a independên-cia que o poder económico nos retirou é vital que seja recuperada, através de uma vontade firme e de uma capacidade de sa-crifício e de amor à Pátria que o exemplo dos nossos homenageados nos pode aju-dar a conseguir.

Tal como em 1 de Dezembro de 1640, te-mos de ser outra vez nós mesmos, o povo que não aceita jugos, o povo que foi capaz de não se perder nos mares do mundo, o povo que quer outra vez demonstrar que tem direito a continuar a ter a Pátria hon-rada que construiu em quase nove séculos de história. Precisamos de fazer outro pri-meiro de Dezembro, também com a mes-ma força da vontade, da determinação,

como naquele de 1640, mas agora usando outras armas, as armas do trabalho, da in-teligência e da honestidade.

Muito do nosso Povo já não conheceu o que foi o sacrifício dos nossos soldados, ma-rinheiros e aviadores que combateram em África e na Índia, mas alguns terão ainda na mente e no corpo as marcas dessas lu-tas. Os corações de algumas mães recorda-rão os gritos que não ouviram, a milhares de quilómetros, dos filhos agonizantes e os combatentes vivos também não esquecem, noite e dia, os brados de dor dos compa-

nheiros de corpos esfrangalhados, chaman-do pelos entes queridos que não voltariam a ver. É duro recordar publicamente aquilo que alguns de nós vivemos, mas é impor-tante fazê-lo para que todos procuremos ser dignos desse passado, construindo um futuro melhor, mais nobre e independente para Portugal, Pátria de tantos heróis e de tantos Soldados e Marinheiros Desconhe-cidos, mas nobres e valentes.

Esta evocação assume aqui especial significado, por ter lugar no chão glorio-

so da Batalha, junto ao Cam-po de São Jorge, onde ainda ecoa a voz de um Povo que quis continuar independente e que, em 1383/1385, lutou con-tra o mais forte, na defesa do que era seu havia já 240 anos. Lutou e venceu. Não éramos muitos, éramos até poucos, mas estávamos unidos e com vontade férrea e, por isso, fo-mos os suficientes.

Depois, a seguir, apertados entre as fortes espadas tole-danas e a parede do mar, os Portugueses tiveram a inteli-

gência, o saber e o arrojo para derrubar a parede, seguindo mar fora com a vontade de serem grandes. Foi uma vontade conse-guida de serem até os maiores desse tempo, realizando uma gesta que mudou o mundo.

Sinal emblemático da inteligência, des-sa determinação e dessa união dos portu-gueses foi o da construção desta abóbada que protege o túmulo dos nossos Soldados, como aqui referiu José Hermano Saraiva. A

abóbada é formada por pedras, as quais, isoladamente, cairiam sujeitas à lei da gravidade. Bem unidas não caíram. A abóbada não caiu, a abóbada não cai-rá, como disse o seu constru-tor, um subordinado de Nuno Álva res Pereira.

E se, tal como as pedras da abóbada, nós hoje soubermos estar unidos protegendo os nossos valores e o nosso Chão Sagrado, com uma visão inteli-gente de futuro, a Pátria conti-nuará imorredoura pelos tem-pos fora e os vindouros olharão

para nós com a consideração e o respeito semelhantes aos que temos pelos nossos antepassados.

Homenageemos, pois, neste momento único, todos os que sofreram, lutaram e caíram ao serviço de Portugal e, em silên-cio, curvemo-nos sentida e respeitosamen-te perante a memória daqueles que um dia, quando ajoelharam e caíram, o fizeram ape-nas perante o Altar da Pátria.

Sejamos dignos deles, Heróis do Mar, n obre Povo, Nação valente, imortal.

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16 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

A MARINHA DE D. SEBASTIÃO (31)

Paulo Dias de Novais e a fundação de S. Paulo da Assunção de LoandaPaulo Dias de Novais e a fundação de S. Paulo da Assunção de Loanda

Uma Relação da Costa de Guiné, de autor anónimo, datada de 1607, diz-nos que “O comércio de Angola se descobriu

desde o tempo de El-Rei Dom João o segundo, posto que com pouca frequência. E neste tempo o Rei de Angola era amigo e quase súbdito de Rei do Congo e lhe mandava cada ano seu tri-buto, em modo de presentes, e com sua licença iam os portugueses negociar à Ilha de Luanda [...] E tudo o que ali se resgatava se vinha des-pachar à Ilha de S. Tomé...” São palavras escri-tas alguns anos depois dos acontecimentos mais relevantes que marcaram o estabelecimento das relações de Portugal com o reino do Congo, mas revelam a forma como, paulatinamente, os na-vegadores lusos se foram aventurando mais a sul, nas imediações da actual cidade de Luan-da e da barra do Cuanza, onde procuravam escravos, cobre, marfim e muitas outras merca-dorias ricas. Recordemo-nos como Diogo Cão chegou ao rio Zaire, como o rei do Congo quis esta belecer fortes laços de amizade com o rei de Portugal, fazendo-se baptizar com o nome de D. João (do Congo) e deixando que no seu ter-ritório ficassem os sacerdotes necessários à con-versão dos seus súbditos. Um dos seus filhos – que viria a suceder-lhe no trono – foi também baptizado, recebendo o nome de D. Afonso (por ser esse o nome do herdeiro da coroa de Portu-gal), tornando-se cristão fervoroso que mante-ve uma vida assimilada aos padrões europeus até à sua morte em 1543. Entretanto, o comér-cio com o Congo manteve uma regularidade significativa, durante as primeiras décadas do século XVI, resgatando cobre, marfim e, sobre-tudo, escravos, que seguiam para S. Tomé onde eram redistribuídos para Lisboa, para o Brasil ou para utilização local.

Sabemos também que as finanças portugue-sas foram sempre deficitárias ao longo de todo o século XVI – mesmo no auge do comércio rico da Índia – com uma endémica carência de mo-eda, devida à falta de metais nobres. E este facto levou a que se tomassem várias iniciativas no sentido de buscar esses metais por toda a parte. No Zaire havia cobre, mas chegavam ali notí-cias de que lá para o sul existiriam abundantes jazidas de prata, de que apareciam alguns vestí-gios. De forma que a tentação de explorar esses territórios era enorme, apesar da oposição de D. Afonso I, do Congo, que via nessas iniciativas uma concorrência nefasta para os seus interes-ses. A Relação anónima, acima citada, diz que os portugueses iam à ilha de Luanda procu-rar outros tratos, mas a documentação mostra que isso era de muito desagrado para o rei do Congo que sempre reclamou junto de D. João III para que não se fizessem essas v iagens. De facto, a postura da coroa foi sempre a de agra-

dar a D. Afonso e ao seu sucessor, D. Diogo, mas o comportamento dos capitães de S. Tomé contrariava estas determinações, assumindo pormenores de grande violência com os fun-cionários régios que, de algum modo, preten-diam fazer cumprir as normas emanadas de Lisboa. Eram as arbitrariedades dos tempos e do isolamento que permitiam que quem lá es-tava fizesse a sua própria lei, ao arrepio de uma política externa concertada que promovia uma relacionamento próprio com o primeiro reino convertido em África. Na base desta postu-ra dos comerciantes de S. Tomé estava o co-

mércio negreiro em ascensão, a requerer cada vez mais escravos para o Brasil, que o Congo já não conseguia alimentar. Contudo, há ou-tras c omponentes importantes deste comple-xo sistema que mostram uma decadência do poder de D. Diogo no contexto africano, uma sequente ascensão do rei de Angola (o Ngola) e uma convicção portuguesa de que nas suas terras se encontrariam outros metais preciosos de que carecia a moeda nacional.

O nome deste reino está na origem do que foi a colónia e a província portuguesa, e do que é hoje a República de Angola, mas era, no século XVI, apenas um estreito território entre os rios Dande e Cuanza, estendendo-se para o inte-rior até ao rio Lucala ou à região de Malange. No final da década de quarenta do século XVI, o Ngola enviou uma embaixada a D. João III, pedindo-lhe missionários e outros apoios para o seu reino, mas os seus emissários ficaram re-tidos em S. Tomé durante 9 anos só chegando a Lisboa em 1558. Nessa altura, porém, Dª Catari-na preparou a ida de uma missão diplomática, para a chefia da qual foi nomeado Paulo Dias

de Novais, um neto do navegador Bartolomeu Dias. Partiram de Lisboa a 22 de Dezembro de 1559, passaram por Cabo Verde e S. Tomé, ti-veram grande dificuldade em vencer a foz do Zaire, por causa da corrente, e aportaram em Mpinda (S. António do Zaire), onde fizeram aguada e embarcaram lenha. Chegaram à bar-ra do Cuanza em 3 de Maio de 1560, ficando fundeados ao largo, numa posição muito fra-gilizada pelas condições do mar. Paulo Dias esperou 6 meses até se decidir a ir ao encontro do Ngola, que já não era o mesmo que enviara a embaixada a Lisboa dez anos antes. O processo que se seguiu não é muito claro, sabendo-se que o rei os recebeu muito bem e os agasalhou du-rante algum tempo, mas, subitamente, mudou de comportamento: mandou executar todos os elementos da embaixada que seu pai enviara a Lisboa e que agora regressavam com os portu-gueses, mantendo estes presos em condições que os relatos dizem ter sido precárias e sem-pre em perigo de vida. E, se pouco se sabe dos pormenores deste cativeiro, o mesmo acontece com as circunstâncias em que Dias de Novais foi libertado em 1565, conseguindo chegar a Lis-boa em 1567, onde tudo relatou a D. Sebastião. Aparentemente, o Ngola pedia ao rei de Portu-gal que o ajudasse numa guerra difícil com um seu rival, mas os documentos são muito escas-sos e pouco explícitos. A verdade é que voltaria à costa angolana em 1575, dotado de uma carta de doação concedida pela coroa, com o cargo de capitão e governador e com o objectivo claro de sujeitar e conquistar o reino de Angola, “para se nele haver de celebrar o culto e ofícios divinos” e “pelo muito proveito” para o rei de Portugal e para os seus naturais. Partiram de Lisboa no final do ano de 1574 e alcançaram a baía de Luanda, da parte de dentro da ilha, no mês de Fevereiro do ano seguinte. O local era bastante mais aprazível e próprio para uma invernada do que a barra do Cuanza, registando-se que já ali viviam alguns portugueses. Em 1576 Pau-lo Dias de Novais decidiu fixar-se em terra, no morro onde veio a ser construída a fortaleza de S. Miguel, e onde foi criada a vila de S. Paulo da Assunção de Loanda, núcleo primitivo da cida-de que ainda hoje existe. A presença portugue-sa não foi, de todo, pacífica, sobretudo porque pressupunha um esforço de conquista, mas foi definitiva. Paulo Dias de Novais viria a falecer a 9 de Maio de 1589, em Massangano, onde fun-dara uma pequena povoação e implantara a igreja que lhe viria a servir de sepultura.

J. Semedo de MatosCFR FZ

N.R.O autor não adota o novo acordo ortográfico.

Paulo Dias de Novais, segundo a efígie das antigas notas de dois angolares e meio, da Junta da Moeda de Angola.

Imagem cedida pela Biblioteca Municipal de Almada

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REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 17

A festa do Dia da Marinha deste ano teve como palco a cidade de Almada, um concelho onde há décadas atrás

se estabeleceu a Base Naval, o Arsenal da Marinha e a Escola Naval, que constituem o núcleo central da nossa Armada e por onde já passaram quase todos os marinheiros. Foi a primeira vez que esta comemoração aqui teve lugar, apesar da proximidade do dia-a--dia, e da quantidade de residentes e filhos desta terra que prestam ou prestaram serviço nas nossas fileiras. A cidade, contudo, teve sempre uma ligação muito próxima com o mar e com as actividades marítimas, in-tegrando o vasto complexo dos elementos que circundam a capital, e que foram su-porte directo da epopeia da Expansão Ma-rítima, desde o século XV. É verdade que encontramos navegadores em toda a parte do país, desde Bragança a Lagos, passando pelas terras do interior ou pelas póvoas marí-timas, mas o centro da actividade marinhei-ra que impeliu os portugueses para a explo-ração dos oceanos foi a cidade de Lisboa, sustentada por um multifacetado e coerente sistema de apoios diversos que envolveram todo o estuário do Tejo. Nos seus recantos e múltiplos esteiros cresceram estaleiros de construção e reparação, nasceram dezenas de moinhos de maré, foram exploradas sa-linas, fabricou-se o biscoito das naus, pro-duziram-se artefactos e bens alimentícios, e tudo isto envolvendo um tecido social alar-gado, num processo que só foi viável por-que se desenvolveu à volta do rio. E Almada foi o principal núcleo da ampla região que ficou conhecida como a “Outra Margem”, aquele que mais perto fica da capital e que a ela ficou mais ligado, por razões de defesa militar e de suporte logístico.

É profunda a relação da margem sul com o destino português no mar, e foi decisivo o papel deste município onde hoje a Marinha tem a maior parte do seu dispositivo opera-cional. Encontramos vestígios desta remota ligação nas ruínas romanas de Cacilhas e nas descrições da conquista de Lisboa aos mou-ros, em 1147, quando Portugal construía a sua identidade e independência. Nesses tempos, contudo, toda a península de Setú-bal vivia a instabilidade da Reconquista, e só a consolidação da presença portuguesa a sul do Tejo, no século XIII, permitiu que a

paz chegasse ao estuário, deixando que Alma-da desenvolvesse a sua vocação. No tempo de D. João II e D. Manuel I, o seu papel já era evi-dente nesta região alargada, em torno da cida-de mercantil de uma Lisboa a despontar para a aventura ultramarina quinhentista: nas mar-gens dos esteiros cresciam inúmeros estaleiros de construção e reparação naval que vinham até à praia de Cacilhas e ao Ginjal, protegidos que estavam das intrusões pelo rio; e em toda a planície que se estende para sul, resguarda-da pelo morro do castelo e pela falésia, des-pontava a produção de trigo, azeite e vinho; e nas muitas caldeiras interiores proliferavam os moinhos de maré, cuja farinha era levada à capital ou às fábricas de biscoito pelo formi-gueiro de embarcações que circulava no rio.

Deve dizer-se, porém, que o maior desenvol-vimento de Almada, que acentua a sua relação com a vida marítima nacional, tem lugar no século XIX e XX, com o processo de industria-lização que trouxe à margem sul, e a Almada em particular, as indústrias corticeiras, as moa-gens, as indústrias químicas, os têxteis, a pesca e, finalmente, a construção naval em aço, já no final do século XIX. O Arsenal da Marinha inscreveu o seu nome nesta história quando, em 1852, contratou o oficial caldeireiro inglês Hugh Parry, numa fase em que pretendeu re-novar o seu sistema produtivo e adaptar-se às novas tecnologias. Parry trabalhou ali durante dois anos, cumpriu o seu contrato, e saiu para fundar um estaleiro privado na Boa Vista, en-tre o Cais do Sodré e Santos. Criou a firma H. Parry & Son que começou a construir vapores de pequena dimensão para clientes privados e para a própria Marinha. Mas a construção do aterro onde hoje circula o comboio inviabili-zou o estaleiro e, em 1890, Parry passou para a Outra Margem, ocupando um pequeno es-paço do Ginjal. Foi ali que foi construída a canhoneira Chaimite, patrocinada pela subs-crição nacional decorrente do ultimatum bri-tânico. Mais tarde comprou outros estaleiros que existiam na praia da Margueira, junto ao pontal de Cacilhas, onde cresceu a empresa extraordinária de construção e reparação na-val que veio até 1986. É numa das suas docas que está hoje a fragata D. Fernando II e Gló-ria, e será numa outra que vai ficar o subma-rino Barracuda, associando-se ao núcleo vivo do Museu Naval de Almada. Este museu, que recebeu uma parte do espólio da Companhia

Dia da Marinha 2012Dia da Marinha 2012

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18 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

Portuguesa de Pesca, dispõe de um importante acervo dedicado à construção naval em ma-deira e em aço e integra o legendário Farol de Cacilhas, formando um conjunto harmonioso com os nossos navios, numa homenagem aos portugueses marinheiros de todos os tempos.

A CONCESSÃO DA MEDALHA DE OURO DA CIDADE DE ALMADA

A Marinha instalou-se em Almada a partir da década de trinta do século passado e, a pouco e pouco, ali foi colocando os elementos funda-mentais que hoje constituem a parte mais signi-ficativa do seu dispositivo operacional. E alguns deles tiveram um papel estruturante do tecido social do concelho, como é o caso do Arse-nal da Marinha: verdadeira escola profissional prática numa terra em franco desenvolvimen-to industrial muito virado para a construção e a reparação naval. O município reconhece-o de forma clara e manifestou-o recentemente quando se associou às comemorações do 75º aniversário da passagem da Escola Naval para a margem sul. Este relacionamento fortaleceu--se com o tempo e a cidade sabe o que dá e o que recebe da Marinha, sobretudo porque os milhares de homens e mulheres que todos os dias se dirigem à Base Naval vivem no con-celho, ali têm os seus vizinhos e amigos e ali educam os seus filhos. Por tudo isto, a Câma-ra decidiu aproveitar a comemoração do Dia da Marinha 2012 para conceder à Marinha Portuguesa a medalha de ouro da cidade de Almada, que foi entregue pela Presidente da Câmara, D. Maria Emília Neto de Sousa, ao Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada, no intervalo do concerto que teve lugar no Te-atro Municipal de Almada, no dia 19 de Maio. Esta distinção municipal, que a todos nos hon-ra, foi concedida por unanimidade de sessão de Câmara, em “reconhecimento inequívoco da importância e significado que a intervenção quotidiana da Marinha assume em particular no tecido social, cultural e económico do nos-so Concelho” – como teve ocasião de expres-sar a sua presidente, na cerimónia de entrega do galardão ao Almirante Saldanha Lopes.

AS COMEMORAÇÕES DO DIA DA MARINHA

As actividades de comemoração do Dia da Marinha 2012 começaram com algum tempo de antecedência, através da realização de vá-rias iniciativas. Uma das mais importantes foi a inauguração da exposição de actividades da Marinha, efectuada pelo Director da Comissão Cultural da Marinha e pelo Presidente da As-

sembleia Municipal de Almada. Nesse dia, a Marinha abriu as portas à população do concelho, apresentando as suas actividades no Fórum Municipal Romeu Correia e na Ofi-cina de Cultura de Almada. Esta exposição funcionou até domingo, dia 20 de Maio, em simultâneo com a possibilidade de participa-ção controlada em actividades físicas radicais de todos os voluntários, entre as 10h00 e as 20h00, no espaço do parque Comandante Júlio Ferraz. Com o mesmo horário, a Base esteve aberta a visitas, dispondo de uma ex-posição estática montada junto ao cais de honra e abrindo ao público alguns dos navios atracados. Cerca de 11000 pessoas estiveram na Estação Naval e quase 8000 visitaram a Sa-gres e a D. Francisco de Almeida, com muita gente a querer fazer o seu baptismo de mar, para o que tinham disponíveis os NRP’s Pe-gaso, Orion e Argos. Esta foi, talvez, a forma mais interessante de abrir a Marinha e a sua actividade operacional ao público do conce-lho: gente que vê passar os navios no pontal de Cacilhas, mas que não conhecia em por-menor a Base, nem tinha visto de perto como vivem os seus marinheiros.

No sábado, dia 12 de Maio, teve lugar no Campo de Futebol do CEFA um tattoo mili-tar, em que participou a Banda da Armada e Fanfarra, e uma unidade auto comandada do Corpo de Fuzileiros. Mas, durante a semana decorreram actividades e competições des-portivas diversas. Logo no domingo, dia 13, realizou-se no Parque da Paz, na cidade de Almada, uma prova de orientação e, no dia 16, foi organizado pelo Clube de Praças da Armada um Torneio de Tiro. Esta última prova contou com a participação de equipas mas-culinas e femininas dos outros ramos das For-ças Armadas e das Forças de Segurança, bem como de uma representação da Sociedade de Tiro 2, o mais antigo clube português de tiro desportivo. As provas decorreram nas insta-lações do CEFA, e nela participaram os mais qualificados atiradores portugueses. Realço, sobretudo, a presença da atleta Isabel Joglar, que foi a representante de Portugal nos jogos Olímpicos de 1984, e da vencedora da prova feminina, a jovem atiradora Joana Castelão, que representará as cores nacionais nos jogos olímpicos de Londres.

Ainda no âmbito destas comemorações, tiveram lugar diversas regatas e outras com-petições desportivas organizadas pelo CNO-CA e com a colaboração de outros clubes, de que se dará notícia desenvolvida numa próxima Revista da Armada.

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OS CONCERTOS DA BANDAUm dos momentos mais significativos

das comemorações do Dia da Marinha é sempre a actuação da Banda da Armada que se tem feito sempre em dois concertos com características diferentes. Este ano não foi excepção e a Banda fez a sua primeira apresentação no dia 18, num concerto diri-gido pelo maestro 1TEN MUS Délio Coelho Gonçalves, realizado ao ar livre e oferecido à população de Almada, na Praça S. João Baptista. O programa era simples mas mui-to agradável e equilibrado, com duas partes em que foram apresentadas oito peças mu-sicais, terminando com um encore muito popular da autoria do malogrado composi-tor português João Aguardela. O Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada assistiu ao concerto, na companhia da Presidente da Câmara Municipal de Almada e, apesar das péssimas condições atmosféricas para um espectáculo ao ar livre, o público acor-reu em grande número. Mais de um milhar de pessoas foram-se abrigando, como po-diam, pelas esplanadas circundantes sem arredarem pé, e a assistência correspon-deu sobretudo à interpretação do encore “Esta vida de marinheiro”, com arranjo de Jorge Salgueiro.

No dia 19 de Maio, pelas 22h00, teve lu-gar no Teatro Municipal de Almada o habi-tual concerto de gala do Dia da Marinha, a que assistiu o Almirante Saldanha Lopes, a D. Maria Emília Neto de Sousa e numero-sas entidades, civis e militares, convidadas. O programa foi organizado em duas partes, com três interpretações na primeira e cinco na segunda, contando com a participação da Companhia de Dança de Almada, com coreografias de Nuno Gomes e ensaios de Maria João Lopes. Abriu o espectáculo a interpretação de Azerbaijan Capriccio, do compositor azerbaijano Fikret Amirov. Os capriccio (ou capricci) são peças musicais de absoluta liberdade estrutural, que permi-tem a demonstração de virtuosismos execu-tórios específicos, e este não foge à regra, muito intenso e forte, foi uma excelente abertura para o nosso concerto. Seguiu-se o delírio de emoções da Dance Funabules-que, de Jules Strens, e Maré Negra do com-positor galego Antón Alcalde Rodriguez. A última obra foi elaborada na sequência do naufrágio do navio Prestige e do derrame petrolífero que provocou a maré negra nas Rías Baixas. Os seus quatro andamentos são quatro momentos sucessivos da tragédia

que se abateu na costa galega, começando com alegre despertar das Rias, seguido pela aflição do navio que se perde entre as vagas alterosas da procela, da visão fantasmagórica do crude a dar à praia, e do esforço conjunto para limpar as praias e repor o equilíbrio eco-lógico. Seguir-se-ia um breve intervalo, antes da supra referenciada entrega formal da me-dalha de ouro da cidade de Almada à Mari-nha Portuguesa, representada na pessoa do Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada.

A segunda parte começou com Sabic Sym-phonic March do compositor belga Bert Apper-mont, a que se seguiu Incantation and Dance, de John Barnes Chance, que contou com a apresentação da Companhia de Dança de Al-mada, numa iniciativa que se revelou extraor-dinária. E a simbiose da Banda com o bailado culminou com a apresentação da peça, Here’s looking at you, da autoria de Ernie. A arte do saxofonista 1SAR B Vítor Manuel e da baila-rina Beatriz Rousseau levou-nos por mundo onírico de um encantador de serpentes, onde a delícia de cada instante só é perturbada pelo receio de que chegue o fim. Foi um momento raro de beleza, conseguido durante o Concer-to do Dia da Marinha. Seguiu-se Bulgariscer Tanz do compositor búlgaro Zbysek Bittmar e, finalmente, o clássico de Leonard Bernstein bem conhecido de todos. Quatro momentos de West Side Story foram adaptados para a banda pelo maestro 1TEN MUS Délio Gon-çalves, interpretados com uma coreografia de Nuno Gomes. Bernstein foi o mágico dos má-gicos, aquele que nos ensinou a ouvir música, dizendo-nos com a simplicidade dos mestres que ela tinha uma linguagem inteligível. E West Side Story é a obra magna de um magno com-positor, aqui adaptada pelo talento do nosso maestro. A Banda terminava a sua actuação de forma exuberante, mas o público queria mais. Faltava um encore ao nível do resto do espectáculo e ele veio com Conga del Fuego de Arturo Marquez. O espectáculo terminou com a Marcha dos Marinheiros.

O DIA 20 DE MAIOAs festividades do Dia da Marinha 2012 ti-

veram o seu momento mais alto no domingo, dia 20 de Maio, data em que, no longínquo século XV, os navios de Vasco da Gama, pela primeira vez, contactaram com as gentes de Calecut. E, como tem sido habitual, o dia co-meça com a missa de sufrágio pelos militares, militarizados e civis da Marinha já falecidos. A celebração teve lugar, pelas 10h00, na igreja paroquial de Nossa Senhora da Assunção, em

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Almada, presidida por D. Januário Torgal Ferrei-ra, bispo das Forças Armadas e de Segurança, acolitado pelo Vigário Geral Castrense, padre Manuel Amorim, o Capelão Chefe da Mari-nha, padre Ilídio da Costa, o Capelão da Escola Naval, padre Nazaré Domingos e o pároco de Almada, padre Fernando Belo. Durante a mis-sa foi possível ouvir um coro de elementos da Marinha, constituído por alguns membros da Banda da Armada e cadetes da Escola Naval, dirigidos pelo 1SAR B Nuno Batalha.

Seguir-se-ia a cerimónia militar que teve lu-gar em Cacilhas, em frente à doca onde está a Fragata D. Fernando II e Glória e da baía da Margueira, presidida pelo Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional, Dr. Paulo Braga Lino, em representação do Ministro da Defesa Nacional. Estiveram presentes a Presidente da Câmara Municipal de Almada, uma delegação de deputados da Assembleia da República in-cluindo o vice-presidente da Comissão de De-fesa Nacional, o bispo das Forças Armadas e de Segurança, antigos Chefes do Estado-Maior da Armada e diversas outras entidades civis e mili-tares. Apesar das condições meteorológicas ad-versas, com aguaceiros violentos e frequentes, a população de Almada acorreu ao local para homenagear a sua Marinha neste dia de festa.

As Forças em Parada, comandadas pelo CMG Proença Mendes, eram constituídas pela Banda e Fanfarra da Armada, por um bloco de 15 estandartes nacionais pertencentes a unida-des da Marinha, uma companhia de cadetes da Escola Naval e três batalhões organizados a duas companhias, comandados, respectiva-mente, pelos CFR Cornélio da Silva, CFR Lo-pes Carrilho e CFR Mariano Alves. Ao largo, na baía da Margueira – imponente – estava fundeado o NRP Sagres.

O Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional aproximou-se da tribuna de honra cerca das 11h30, onde era esperado pelo Al-mirante CEMA, e recebeu as honras militares que lhe são devidas. Deu-se início à cerimónia com a atribuição de condecorações a militares e civis que se distinguiram em serviço da Mari-nha ou por acções por ela reconhecidas como relevantes. Destaco a atribuição da Medalha da Cruz Naval de 1ª classe ao Professor Doutor António Manuel da Cruz Serra, actual reitor da Universidade Técnica de Lisboa e professor da Escola Naval há quase vinte anos.

Terminadas as condecorações, foi feita a homenagem aos militares, militarizados e ci-vis da Marinha já falecidos, a que se seguiu uma alocução proferida pelo CEMA, Almiran-te Saldanha Lopes. As suas primeiras palavras

foram de saudação para todos os que pres-tam serviço na Marinha, relembrando-lhes como a “nossa instituição nasceu com o país, cresceu ao seu serviço e vive a pen-sar nos portugueses”. Dirigiu-se também ao município de Almada e à sua Presidente da Câmara, agradecendo-lhe a disponibilidade para aquela comemoração. A abertura da Marinha ao exterior foi um desígnio seu, a que as presentes comemorações dão ex-pressão plena, sobretudo porque têm lugar na “magnífica cidade” que acolhe os mari-nheiros e com eles “partilha um destino co-mum, que é o mar”. E acrescentou que “A forma como Almada e a Marinha souberam encontrar uma solução para, com a devida dignidade, acolher a Fragata D. Fernando II e Glória” e receber, num futuro próximo o submarino Barracuda, integrando o núcleo museológico do Museu de Marinha em A lmada. O mar hoje é encarado como de-sígnio nacional – continuou o CEMA – mas isso não é a “descoberta de uma nova rea-lidade.” Trata-se de “dar expressão e subs-tância a um importante objectivo estratégi-co que, embora largamente reconhecido, tem vindo a ser reiteradamente adiado.” A prossecução deste objectivo – disse – “re-quer um exercício eficaz da autoridade do Estado no mar”, assumindo a Marinha um papel muito relevante “quer no âmbito da vigilância e serviço de soberania, quer na prevenção e contenção da poluição ma-rítima.” Portugal é um país de “recursos escassos e responsabilidades marítimas consideráveis” sendo fundamental a nossa capacidade “para afirmar os interesses na-cionais, assumir compromissos internacio-nais e fazer cumprir a lei nos espaços marí-timos.” A instituição defronta-se hoje com problemas reais – “os níveis de treino tive-ram de ser reduzidos aos valores de há vinte anos” – mas os meios necessários ao cum-primento deste “desígnio” são urgentes. E recordou a necessidade de construção dos seis Patrulhas Oceânicos e oito Lanchas de Fiscalização Costeiras, sem os quais “Por-tugal corre o risco de ficar sem meios na-vais de média e pequena tonelagem, indis-pensáveis às missões nas zonas oceânicas e sobretudo nas zonas marítimas costeiras do continente e da Madeira.” Terminou a sua alocução realçando a consciên cia “das dificuldades do presente” reafirmando que “trabalhamos diariamente para uma Mari-nha moderna e preparada para enfrentar os desafios do futuro.”

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De seguida usou da palavra o Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional. O Dr. Paulo Braga Lino começou por dirigir--se a “todos estes homens e mulheres que, com o seu sentido de lealdade e de dispo-nibilidade,... competência e experiência,... determinação e coragem, permitem o cum-primento das missões da Marinha Portugue-sa”. “Como em poucos casos” – disse – “a história do País é, inevitavelmente, a história da sua Marinha”, por isso as comemorações decorrentes assinalam a determinação e o trabalho dos marinheiros, “seja em missões de carácter militar ou de serviço público.” No dia 20 a Marinha assinalava a chega-da de Vasco da Gama a Calecut, mas essa efeméride tem, sobretudo, o significado de uma missão bem cumprida, na prosse-cução do “que foi, à época, um objectivo nacional” capaz de “mobilizar e multipli-car vontades e capacidades, que alavanca-ram o poder marítimo e o poder nacional.” “Portugal é mar”, salientou o Secretário de Estado, realçando a relação económica do país com este meio específico, acentuando as potencialidades levantadas pela exten-são da plataforma continental. “Num país que tantas vezes lamenta a falta de destino e de futuro, o amanhã esteve sempre aqui.” Não deixou de dizer que conhece as difi-culdades com que a Marinha se defronta e os desafios da transformação em curso. “To-dos conhecemos as restrições que temos de enfrentar”, contudo, para que o contributo da Marinha no momento presente possa ser efectivo, terá de dispor dos meios opera-cionais indispensáveis. Tudo será feito para retomar o “programa de conclusão e ape-trechamento dos dois navios-patrulha oce-ânicos”, sabendo que este “investimento será reprodutivo, pelo aumento da eficiên-cia que induz e pela redução de custos de operação que lhe está associada.”

Terminado o discurso do Secretário de Es-tado, seguiu-se o desfile das Forças em Pa-rada, após o qual os convidados e a nume-rosa população que se deslocou a Cacilhas para assistir à cerimónia, foram convidados a deslocar-se até à beira da muralha, junto ao rio, para observarem uma demonstração de capacidades operacionais, coordenada pelo comandante da Força Naval Portugue-sa (POTG), CMG Novo Palma.

Nesta altura, para além do NRP Sagres, já estava na baía da Margueira o NRP Baca-marte (Lancha de Desembarque Grande) e aproximou-se o NRP Orion que participou

na primeira demonstração. Simulando tratar--se de um navio suspeito, aproximou-se um helicóptero Linx, com uma equipa do Desta-camento de Acções Especiais (DAE) que em-barcou usando a técnica de Fast Rope, sob a protecção e vigilância de outra embarcação. Seguiu-se o desembarque de dois veículos anfíbios LARC 5, saídos da Bacamarte, que se dirigiram à praia simulando um transporte de carga. E, enquanto decorria este movimen-to dos LARC’s, preparava-se a simulação de um assalto anfíbio, com uma equipa de mer-gulhadores a proceder ao reconhecimento, limpeza e marcação de um canal de acesso à praia, seguido de duas vagas de assalto: a primeira em botes com fuzileiros, e a segun-da, dos LARC’s, com suporte logístico à Força de Desembarque. Estes veículos regressaram depois ao NRP Bacamarte, onde reembarca-ram e regressaram à Base. Veio depois uma demonstração de capacidades da Polícia Ma-rítima, nomeadamente, do seu Grupo de Ac-ções Táctico-Policiais. Aproximava-se uma embarcação UAM, simulando ser suspeita e suscitando a actuação de um grupo opera-cional, transportado numa lancha rápida, que procedeu ao controlo e abordagem. Aprovei-tando este exercício, surge um aviso de “ho-mem ao mar” que, rapidamente, mobilizou um meio de salvamento, com uma mota de água para recolher o náufrago. A demonstra-ção de capacidades terminou com a actua-ção de um helicóptero Linx, executando um conjunto de manobras que mostram as suas capacidades operacionais e destrezas dos pi-lotos da Marinha, saudando, no final, todos os presentes.

Mas o Dia da Marinha não terminaria sem a simpática e significativa homenagem da Marinha do Tejo, um pólo vivo do Museu de Marinha constituído por embarcações típicas da vida do rio. Foram estas embarcações que, desde tempos remotos, deram corpo ao movi-mento do estuário que sustentou o complexo económico de suporte da cidade de Lisboa, referido acima. E as pessoas que, com grande dedicação e esforço, têm mantido esta tradição peculiar, não quiseram deixar de homenagear a Marinha Portuguesa, desfilando em frente à zona da cerimónia militar, vindas da Base Na-val para o Pontal de Cacilhas.

J. Semedo de MatosCFR FZ

Fotos: 1SAR FZ Pereira

N.R.O autor não adota o novo acordo ortográfico.

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22 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

Trinta de março de 1922, Lisboa, estuário do Tejo, frente à Torre de Belém – partida do hidroavião Lusitânia. 17 de junho do

mesmo ano, Rio de Janeiro, baía de Guanabara, frente ao ilhéu das Enxadas – chegada do hidro­avião Santa Cruz. Durante setenta e nove dias teve lugar aquela foi, certamente, uma das mais relevantes empresas dos Portu­gueses no século XX. Os protagonistas foram dois oficiais de Marinha: o Capi­tão de mar e guerra Gago Coutinho e o Capitão-tenente Sacadura Cabral. Em cerca de sessenta e duas horas e meia percorreram 4 527 milhas a uma velo­cidade média de 72,5 nós.

Para evocar esta efeméride, a Marinha promoveu diversas iniciativas, algumas da quais em conjunto com a Força Aérea.

No dia 22 de abril a Banda da Arma­da realizou um concerto junto ao mo­numento evocativo da Travessia Aérea, localizado próximo da Torre de Belém. No dia seguinte, 23 de abril, por inicia­tiva conjunta da Marinha e da Força Aérea, ocorreu uma cerimónia militar no mesmo local, singela, mas plena de significado, pela importância do feito que se evocava. Com guarda de honra e fanfarra, foram executados os toques de silêncio, homenagem aos mortos e de alvorada. O Almirante CEMA e o General CEMFA depositaram coroas de flores junto ao monumento. Esti­veram presentes diversas individua­lidades, militares e civis, bem como diversos membros da família Sacadura Cabral, nomea damente a Dr.ª Helena Saca dura Cabral, sobrinha do aviador, acompanhada pelo filho Dr. Paulo S acadura Cabral Portas, Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Após a cerimónia militar, a celebra­ção da efeméride prosseguiu no Pavi­lhão das Galeotas do Museu de Mari­nha. Seguiu-se um conjunto de eventos singulares: a evocação da viagem e seus protagonistas, a entrega à Biblio­teca Central da Marinha de uma placa que assinala a inclusão dos Relatórios de Gago Coutinho e Sacadura Cabral, relativos à Travessia Aérea do Atlântico Sul de 1922, no Registo Internacional da “Me­mória do Mundo” da UNESCO, a apresentação da obra Álbum de Memórias – Aviação Naval 1917-1952 e, por fim, a visita a uma mostra documental e iconográfica referente a aspetos específicos da Travessia e complementar do acervo patrimonial já exibido, em permanên­cia, no Museu de Marinha e relacionado com os primórdios da aviação militar em Portugal e com a realização de 1922. A Banda da Armada marcou também presença, através do seu quin­teto clássico que interpretou algumas peças.

Numa alocução introdutória, o diretor da Co­missão Cultural da Marinha, Vice-almirante Vi­las Boas Tavares, lembrou a relevância do feito de 1922 e daqueles que o concretizaram e ex­plicou a razão de ser de cada um dos eventos acima indicados. Ao fazê­lo, indicou a intenção

de, na oportunidade, se homenagear igualmen­te todos quantos integraram a Aviação Naval, extinta há precisamente 60 anos, pois, nas suas palavras, “para além das motivações de ordem técnico-científica, a Travessia não poderá deixar de ser vista num quadro da clara vontade de en­tão afirmar a componente aérea da Marinha e, também, num contexto analítico da época so­bre a sua utilidade e missão”.

A evocação da efeméride e seus protago­nistas foi levada a cabo pelo Capitão de mar e guerra Cyrne de Castro. Tendo ingressado na Es­

cola Naval em 1949, o Comandante Cyrne de Castro conheceu a realidade da Aviação Naval e, habilitado com o brevet de piloto­aviador, re­alizou diversas missões de voo, inclusivamente após o desaparecimento da componente aérea da Marinha. Dessas missões, merece destaque

o sobrevoo do Vulcão dos Capelinhos, na Ilha do Faial, aquando da erupção do mesmo em 1957. As suas palavras estão transcritas, na íntegra, noutro local deste número da Revista.

A VIAGEMApesar deste feito dos dois aviadores

ter já constituído tema de inúmeros es­tudos e notícias, vale a pena apresen­tar aqui alguns aspetos relevantes da viagem. Para se compreender melhor o contexto, importa começar por apre­sentar os protagonistas.

Carlos Viegas de Gago Coutinho. Nascido em Lisboa, Belém, em 17 de fevereiro de 1869, veio a falecer na mes­ma cidade no dia seguinte a ter com­pletado noventa anos, 18 de fevereiro de 1959. Ingressou na Escola Naval em 1888, embarcando em diversos navios após conclusão do curso de Marinha. Em 1898 foi designado para uma mis­são de levantamentos geodésicos em Ti­mor. A partir daí, e durante mais de vinte anos, a sua atividade desenvolveu­se es­sencialmente nesta área, tendo sido in­terrompida pontualmente para exercer o comando de dois navios, por períodos curtos. Um desses navios foi a canho­neira Pátria, que em Timor participou na repressão da revolta do Manufai. Come­mora­se exatamente este ano o primeiro centenário dessa presença da Pátria em Timor, sob comando de Gago Coutinho.

A sua ligação aos trabalhos de levan­tamentos geodésicos prolongou­se para além dos trabalhos de campo que rea­lizou, em praticamente todos os territó­rios ultramarinos sob dominação portu­guesa. Fez parte do quadro da Comissão de Cartografia, entidade que coordena­va todos os trabalhos de levantamentos realizados no Ultramar. Substitui o Al­mirante Ernesto de Vasconcelos na pre­

sidência desta comissão.O seu relacionamento com Sacadura Cabral

iniciou-se numa dessas missões geodésicas, em Moçambique, 1907. Trabalharam juntos nesta área durante cerca de três anos. Nesse período em que estiveram juntos, Sacadura percebeu as enormes capacidades de Gago Coutinho para resolver problemas de posicionamento e a sua elevada competência no manuseamento de instrumentos de observação astronómica. Estes fatores foram fundamentais para o convite que Sacadura lhe dirigiu, no sentido de o ajudar a

90º Aniversário da Travessia Aérea do Atlântico Sul

90º Aniversário da Travessia Aérea do Atlântico Sul

As coroas de flores da Marinha e da Força Aérea junto ao m onumento.

Os Chefes dos Estados-Maiores da Armada e da Força Aérea p residindo à cerimónia.

Os Chefes dos Estados-Maiores da Armada e da Força Aérea c umprimentam os familiares de Sacadura Cabral.

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resolver o problema da navegação na Travessia Aérea. Como reconhecimento do seu contribu­to para a viagem, Gago Coutinho foi promovi­do ao posto de Contra-almirante logo após a viagem. Em 1958 e por decreto da Assembleia Nacional, foi promovido a Almirante.

Artur de Sacadura Freire Cabral nasceu em Ce­lorico da Beira, no dia 23 de maio de 1881, tendo falecido num acidente aéreo no Mar do Norte, quando o avião que pilotava desapareceu, em 15 de novembro de 1924. Tendo ingressado na Escola Naval em 1897, veio a atingir o posto de Capitão-de-fragata, ao qual foi promovi­do por distinção pela sua participação na Travessia Aérea.

Após uma carreira normal de oficial de Marinha, embarcado e participando em missões geodésicas no Ultramar, foi para França frequentar o curso de piloto­­aviador. Em 1915 encontrava­se na Es­cola Militar de Chartres, fazendo parte do primeiro grupo de militares a obter quali­ficação nesta especialidade. Regressado a Portugal no ano seguinte, participou na criação da primeira escola militar de aviação, em Vila Nova da Rainha, onde foi instrutor. Foi ainda incumbido de or­ganizar a Aviação Naval.

Sacadura Cabral foi o grande obreiro do projeto da Travessia Aérea do Atlân­tico Sul. A ideia teria surgido em 1919, ano em que se realizaram algumas via­gens aéreas no Atlântico Norte. Ao tomar conhecimento das mesmas, ocorreu­lhe a ideia de ligar Lisboa e o Rio de Janei­ro por via aérea, no contexto das come­morações do primeiro centenário da independência do país irmão. Sacadu­ra preocupou­se com todos os detalhes para que a viagem fosse bem­sucedida. Viajou por França e Inglaterra, para esco­lher uma aeronave que correspondesse às necessidades da viagem. Tendo perce­bido que não era possível fazer a ligação direta de África para o continente ame­ricano, decidiu que o hidroavião teria que ser reabastecido antes de chegar à costa brasileira. Precisava de um ponto para se encontrar com o navio que faria o reabastecimento. Foi escolhida a Ilha de Fernando de Noronha. Durante a primeira parte da viagem, percebeu­se que nem sequer esta tirada seria viável, dado o consumo elevado de combustí­vel. Optou­se então por voar até aos Pe­nedos de São Pedro e São Paulo, onde estaria o navio de reabastecimento. A etapa até estes mi­núsculos pontos no meio do oceano apenas foi possível graças à fiabilidade do método de na­vegação, que foi desenvolvido com o apoio de Gago Coutinho. Todo o processo foi testado em 1921, numa viagem aérea até ao Funchal.

A viagem de 1922 representou um elevado esforço de apoio logístico. Foram mobilizados três navios: os cruzadores República e Cinco de Outubro e a canhoneira Bengo que prestariam apoio nos pontos de escala. A primeira tirada, da ordem de setecentas milhas, ligou Lisboa a Las Palmas, nas Canárias. Ainda neste arquipélago

deslocaram­se para Gando, dadas as melhores características deste local para descolar. A segun­da grande etapa ligou as Canárias ao arquipélago de Cabo Verde, num percurso de cerca de oito­centas e cinquenta milhas. Também neste arqui­pélago mudaram de ilha, tendo feito um pequeno trânsito entre São Vicente e Santiago. A partir da­qui voaram para os Penedos de São Pedro e São Paulo. Após mais de novecentas milhas e com o combustível praticamente esgotado, amararam junto aos rochedos, onde o República esperava por eles. Na manobra de amarar partiu­se um

dos flutuadores, devido ao mau estado do mar. O avião afundou­se, mas foi possível salvar os avia­dores e praticamente todos os materiais que esta­vam a bordo, dada a proximidade do cruzador.

Seguiu novo avião de Lisboa, a bordo do navio brasileiro Bagé. Recomeçara, a viagem em Fer­nando de Noronha, tendo voado até ao Penedos, para retomarem no ar o voo no local onde an­tes tinham chegado. O novo hidroavião, batiza­do Pátria, sofreu uma avaria. Após amararem, o avião começou a meter água por um flutuador, afundando lentamente. Foram recolhidos pelo navio inglês Paris-City. Finalmente, foi enviado um terceiro hidroavião, o Lusitânia, com o qual

completaram a travessia, tendo tocado vários portos brasileiros até chegarem ao Rio de Janeiro.

O esforço foi gigantesco, para conseguir atin­gir o Brasil. Mas valeu a pena! Pela primeira vez, na história da aviação, foi feita uma viagem com etapas de várias centenas de milhas, nas quais se usou um método de navegação eficaz. E este método foi desenvolvido pelos protagonistas. Adaptaram o sextante marítimo para a nave­gação aérea. Construíram um instrumento, o corretor de rumos, para cálculo rápido do aba­timento do avião. Desenvolveram um processo

de cálculo expedito da posição a partir das observações astronómicas. Este pro­cesso de cálculo serviu de base aos que posteriormente foram adotados pela na­vegação aérea. A adaptação de horizonte artificial que Gago Coutinho aplicou ao sextante veio a ser usada pela famosa fá­brica alemã C. Plath.

RELATÓRIOS DA VIAGEM I NSCRITOS NA “MEMÓRIA DO MUNDO” DA UNESCO

Os originais dos relatórios de Sacadura Cabral e de Gago Coutinho, referentes à Travessia Aérea e ao método de navega­ção usado na mesma, encontram­se na Biblioteca Central da Marinha (BCM) – Arquivo Histórico. A Marinha, através da BCM, apresentou a candidatura à inscrição dos relatórios na “Memória do Mundo” da UNESCO, a qual mereceu decisão favorável no ano passado. Na cerimónia que é relatada neste artigo foi entregue uma placa evocativa do facto ao diretor da Biblioteca Central da Mari­nha, Capitão de mar e guerra Rocha de Freitas. A placa foi entregue pelo Almi­rante Chefe do Estado-Maior da Arma­da, Almirante José Carlos Saldanha Lo­pes, acompanhado de Sua Excelência o Presidente da Comissão Nacional da UNESCO em Portugal, Embaixador An­tónio Almeida Ribeiro.

A UNESCO é a Organização das Na­ções Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (United Nations Educational, Scientific, and Cultural Organization). Uma das suas principais vertentes de atuação centra­se na preservação do Pa­trimónio Mundial, nas suas diferentes manifestações: nomeadamente Natural, Cultural, Edificado, Material e Imaterial.

Portugal tem diversos locais inscritos na lista de património da UNESCO, nas suas diferentes va­riantes. A título de exemplo pode apontar­se a Floresta Laurisilva na Madeira, a Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico, o Centro His­tórico de Évora ou o Convento de Cristo em To­mar, entre outros. O próprio complexo onde se enquadra o Museu de Marinha e o seu Pavilhão das Galeotas encontra­se inscrito como Patrimó­nio da UNESCO, como «Mosteiro dos Jerónimos e Torre de Belém em Lisboa». Recentemente, Por­tugal viu o Fado ser inscrito na lista de Patrimó­nio Mundial Imaterial, a qual passou a integrar.

Existe ainda um outro tipo de património, o

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Placa referente à inscrição dos Relatórios na “Memória do Mundo”.

Alocução do Diretor da Comissão Cultural da Marinha.

Álbum de Memórias – Aviação Naval, 1917-1952.

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24 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

Património Documental, que a UNESCO pre­tende ajudar a preservar e a divulgar, através de um programa designado de “Memória do Mun­do”. O registo de um documento ou conjunto de documentos na “Memória do Mundo” “reflete o seu valor excecional e significa que deve ser protegido em benefício de toda a humanidade” e “oferece uma excelente oportunidade para cha­mar a atenção para a importância da memória coletiva e da sua salvaguarda”.

Da ”Memória do Mundo” constam documen­tos de diversos tipos, como sejam textos escri­tos, partituras musicais ou mapas. Entre outros podemos citar a Magna Carta, a partitura da Nona Sinfonia de Beethoven, o Diário de Anne Frank, por exemplo.

Alguns documentos existentes nos arquivos nacionais encontram­se já ins­critos na “Memória do Mundo”. O pri­meiro, inscrito em 2005, foi a Carta de Pero Vaz de Caminha, na qual é dada, a D. Manuel I, a notícia da descoberta do Brasil, pela armada de Pedro Álvares Ca­bral. Um outro documento inscrito, por iniciativa conjunta de Espanha e Portu­gal, é o Tratado de Tordesilhas.

ÁLBUM DE MEMÓRIAS – AVIAÇÃO NAVAL

A apresentação do Álbum de Memó-rias – Aviação Naval 1917-1952 esteve a cargo do Segundo-tenente Gonçalves Neves, coordenador da obra. Como dei­xou claro nas suas palavras, o objetivo do álbum não é fazer a história da Avia­ção Naval, pois essa já existe. Pretende­­se, acima de tudo, disponibilizar para o grande público imagens do riquíssimo espólio fotográfico da Marinha. Assim, o álbum é constituído essencialmente por imagens do acervo fotográfico do Museu de Marinha e do Arquivo Histórico da Marinha, complementadas com outros registos fotográficos, concretamente da coleção particular do Contra-almirante Leiria Pinto e do Arquivo Histórico da Força Aérea. Na sua intervenção, no início da cerimónia, o diretor da Comis­são Cultural da Marinha aludiu, precisa­mente, ao objetivo em que se enquadra o lançamento deste novo livro das Edi­ções Culturais de Marinha, de melhorar a acessibilidade pública ao património da Marinha, acompanhado também do propósito específico de “recordar os pri­meiros 35 anos da aeronáutica na Marinha e, si­multaneamente, prestar­se homenagem àqueles que, então, porventura melhor consubstancia­ram o entusiasmo e o cometimento da Marinha no desenvolvimento da sua componente aérea, ao serviço das Forças Armadas e de Portugal”.

O álbum encontra­se dividido em quatro par­tes. A primeira é dedicada aos Centros da Avia­ção Naval. O primeiro foi o do Bom Sucesso em Lisboa, e está na génese da Aviação Naval em Portugal, sendo nele que em 1917 se iniciou a atividade operacional da Marinha em termos ae­ronáuticos. Durante a Primeira Guerra Mundial foi criado o Centro de Aviação Naval dos Açores

e logo após o conflito foi criado o de Aveiro, nas instalações usadas pela Aviação Naval francesa durante a guerra. Também no Oriente se fez sen­tir a presença da Aviação Naval, com a criação em 1928 do Centro de Aviação Naval de Macau.

A segunda parte debruça­se sobre os raids aé­reos de 1921 e de 1922, ou seja, sobre a viagem abordada neste artigo e sobre aquela que serviu de teste para o método de navegação.

Segue-se uma parte dedicada à formação dos pilotos. Os primeiros pilotos foram formados no estrangeiro. Em 1925 foi criada a Escola de

Aviação Naval “Gago Coutinho”, que começou por funcionar no Bom Sucesso. Em 1934 passou para Aveiro, onde se manteve até à extinção da Aviação Naval.

Finalmente, a última parte apresenta os dife­rentes modelos de aeronaves que prestaram ser­viço na Aviação Naval.

“São estes os principais temas patentes nes­ta obra, registados ao longo de uma centena de imagens. Contudo, a dimensão humana está sempre presente em cada um deles: pilotos, mecânicos, artífices e todos aqueles que ser­viram e deram corpo, alguns a própria vida, à Aviação Naval.”

A MOSTRA EM EXIBIÇÃOA mostra documental e iconográfica procura

contar a história deste feito ocorrido há noventa anos. Um conjunto de painéis, ilustrados com imagens da época, apresentam o antes, o duran­te e o depois da viagem. Começam por abordar os problemas do planeamento e da preparação da viagem, sendo dado realce à busca de solu­ções para os problemas mais prementes, nome­adamente a busca de um método de navegação adequado para uma viagem que deveria atraves­sar um oceano. Segue-se o desenrolar da própria

viagem, com as peripécias associadas à perda de duas das aeronaves utilizadas. Finalmente, é apresentado o ambiente que se seguiu à travessia aérea. As ma­nifestações de júbilo foram inúmeras, especialmente no Brasil e em Portugal.

Além dos painéis é também exibida documentação relativa à viagem, com­plementada com a exibição de objetos. Os documentos seguem também uma lógica que procura cobrir a cronologia representada nos painéis. Assim, come­çamos por encontrar documentos sobre a preparação da viagem, relatórios de Sacadura Cabral relativos à aquisição do hidroavião e textos sobre os estudos referentes às técnicas de navegação aé­rea, entre outros.

Entre os objetos expostos podemos considerar diversas categorias. Destes merecem destaque vários objetos pes­soais dos aviadores, como é o caso de um relógio de Gago Coutinho, ou o seu ca­pacete de voo. Exibem­se alguns géneros alimentares que os aviadores levavam, nomeadamente um pequeno chocolate e um pão, assim como uma garrafa de vinho do Porto que nunca chegou a ser aberta. Existe uma vitrina dedicada à na­vegação aérea, contendo, entre outros, o corretor de rumos, o sextante usado na viagem e algumas das cartas onde foram registando a posição. Ainda em termos de objetos exibidos, vale a pena realçar alguns ovos de cagarra recolhidos nos Penedos de São Pedro e São Paulo e que foram assinados pelos aviadores. O ori­ginal dos relatórios encontra­se também em exibição, assim como o diploma atri­buído pela UNESCO.

Relevo também para duas peças que se encontram à guarda do Museu do Ar e que foram cedidas para exibição. Tra­

ta­se de uma fosforeira e uma cigarreira, ofereci­das ao Comandante Tamlyn, do Paris-City, que recolheu os aviadores quando o segundo hidro­avião se perdeu.

A exposição termina com documentos rela­cionados com a evocação do feito. Foram pro­duzidos imensos postais, diplomas e notícias. Chegaram telegramas de felicitações de todo o mundo. Foram compostas peças musicais e re­digidos poemas. São exibidos alguns exempla­res dos inúmeros existentes no espólio do Museu de Marinha e da Biblioteca Central da Marinha.

Colaboração da COMISSÃO CULTURAL DA MARINHA

Documentos referentes à Travessia Aérea.

CMG J. Cyrne de Castro na sua alocução.

Aspeto da exposição.

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Nos princípios de 1918, o Serviço de Aviação da Armada passou a designar--se “Serviço de Aeronáutica Naval” e

nomeado seu Director o CTEN Sacadura Ca-bral, o mais antigo aviador da Armada, breve-tado em França (MAR 1916), dois anos antes, com a nota de “très bon pilote”.

A travessia do Atlântico Norte (MAIO 1919) foi tentada pela Aviação Naval Americana, com 3 hidroaviões quadrimotores, mas só um deles (NC4) conseguiu chegar ao fim; muito embora houvesse navegadores qua-lificados em navegação ma-rítima, nenhum processo es-pecial de posicionamento foi, contudo, utilizado.

Na navegação aérea per-sistia a falta de precisão.

Há quem admita que Sa-cadura Cabral, no seu voo, de hidroavião, de Calshot para Lisboa (1920), se terá convencido da possibilida-de de se voar, com precisão, sobre o mar, usando os prin-cípios da navegação maríti-ma, mas com adaptações à velocidade do avião e ao vento.

Daí, ter interessado o Comandante Gago Cou-tinho – seu antigo chefe nas missões geodésicas em África – a estudar o assunto, pois sabia-o um excelente observador astronómico e, além disso, envolvido em experiências com o horizonte arti-ficial de bolha de ar.

O projecto da viagem aérea Lisboa-Rio de Janeiro previa a colaboração do Governo Bra-sileiro e foi apresentado, por Sacadura Cabral (26 MAIO 1919), ao Ministro da Mari-nha de então, Dr. Vítor Ma-cedo Pinto.

Sacadura Cabral, designa-do para estudar a ideia, come-çou a preparar a viagem, pro-cedendo a diversos ensaios em terra e em pequenos voos com Gago Coutinho.

Sabia bem que o sucesso dependia, em grande parte, duma cuidadosa preparação de todos os aspectos do voo.

Entretanto, o Presidente Português fora convidado pelo Presidente Eleito do Brasil a visitar aquele país, por ocasião das celebrações do 1º centenário da independência do Brasil (1822-1922) e Sa-cadura Cabral pensava aproveitar esta circuns-tância para realizar o voo ao Rio de Janeiro, pois tal travessia aérea poderia contribuir para uma melhoria nas relações entre os dois países.

Em Portugal saíra, entretanto, um decreto ins-tituindo um prémio de 20 contos para a aviação militar – portuguesa ou brasileira – que fizesse a 1ª. travessia aérea Lisboa – Rio de Janeiro.

Como Santos Dumont tivesse emitido uma opinião pouco favorável sobre o projeto, os brasileiros desinteressaram-se de participar e os portugueses ficaram, assim, sozinhos peran-te o desafio.

Anteriormente, em 1920, a tentativa de Brito Pais e Sarmento Beires (18 Outubro 1920) em voar de Lisboa ao Funchal falhara, precisamente por falta de um processo exacto de navegação.

O raid da nossa Aviação Naval, de Lisboa ao Funchal (22 Março 1921), realizado, proposi-

tadamente de dia e sem alarido, por Sacadura Cabral, Gago Coutinho, Ortins de Bettencourt e Roger Soubiran, num hidroavião bimotor (Short F3), provou, consistentemente, que o sistema in-tegral de navegação aérea científica era fiável e suficiente para, com segurança, conduzir uma aeronave sobre a imensidão do oceano.

A distância à Madeira foi voada sem qual-quer dificuldade e, pela primeira vez, uma ae-

ronave chegou àquela ilha.Gago Coutinho preparara um algoritmo expe-

dito que reduzia o tempo do cálculo e traçado duma Recta de Altura e tivera a ideia de adaptar ao sextante normal um nível de bolha de ar por si concebido, em que a altura dum astro não se alterava com as oscilações do avião.

A estes trabalhos juntaram-se as dificuldades provenientes da instabilidade dos governos em Lisboa e da iminência de uma bancarrota nacio-

nal, o que se reflectia negativamente nas verbas disponíveis para a viagem.

Os dois oficiais da Armada completavam-se um ao outro, pois – as tarefas de organização e conduta da travessia eram da responsabili-dade de Sacadura Cabral enquanto que, as de preparação/execução da navegação cabiam a Gago Coutinho.

Tornava-se necessário dispor, agora, de um avião adaptado à travessia transatlântica e que desse garantias mínimas de sucesso.

No planeamento da via-gem, o troço mais difícil e problemático era o de Cabo Verde ao Brasil e foi escolhi-da a ilha de Fernando No-ronha para fim dessa etapa.

Contudo, não havendo nela local para pousar um avião, Sacadura Cabral teve de optar por um hidroavião, pois – dizia ele – sempre po-dia pousar no mar em caso de avaria; acrescente-se a isto, que a verba governamental disponível só permitia a aqui-sição de um monomotor.

Foi escolhido um motor Rolls Royce, em virtu-de das boas provas já dadas noutras viagens aé-reas e, quanto ao hidroavião com flutuadores, foi seleccionada a Casa Fairey por ter apresentado o preço mais baixo e ter experiência no assunto.

30 MARÇO 1922O Ministro da Marinha tinha tomado posse

há cerca de 2 meses – o CFR Azevedo Coutinho.São 06.30h da manhãDa Doca do Bom Sucesso

sai o Fairey (nº. 40) e dirige--se para o espelho de água do Tejo.

Sacadura Cabral diz en-tão: “Alea jacta est”!

Às 07.00h descolamA bordo dois oficiais da

Armada-aviadores:Piloto – CTEN Sacadura

Cabral, 41 anos, solteiro, um vulcão de personalidade, au-tor da ideia da viagem.

Navegador – CMG Gago Coutinho, 53 anos, igual-mente solteiro, mentor do sistema integral de navega-ção aérea científica.

Levam o material essencial, reduzido ao mí-nimo dos mínimos, para ser possível transportar o máximo de gasolina e óleo.

A bordo há, ainda, uma garrafa de vinho do Porto, um exemplar dos Lusíadas, para ser ofe-recido ao Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, e uma carta do Presidente Português para o Presidente Brasileiro – Dr. Epitácio Pessoa.

Teriam consciência que estavam a iniciar o mais notável feito português do século XX?

Os dois heróis.

Largada de Lisboa – 30 Março 1922.

A TRAVESSIA AÉREAA TRAVESSIA AÉREA

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Ao chegarem a Las Palmas tinham batido o record da Aviação Portuguesa que eram as 530 milhas de Lisboa à Madeira e durante o voo, o óleo da descarga do motor tinha invadido as asas, a fuselagem e o pára-brisas – “muito óleo e muita porcaria” – como anotaria Gago Cou-tinho no seu “caderno de navegação” e os flu-tuadores continuavam a dar problemas.

O voo de Gando a São Vicente fez-se sem problemas de maior com as observações astro-nómicas do Sol a confirmar o rigor da navega-ção, muito embora Sacadura Cabral tivesse no-tado – com apreensão – o consumo exagera do do motor o que lhe acarretou perplexidades so-bre o voo para os Penedos de S. Pedro e S. Paulo.

Em S. Vicente, o Fairey (nº. 40) por decreto de Lisboa foi baptizado “LUSITÂNIA”.

Aproximava-se, contudo, o momento crucial e decisi-vo de toda aquela viagem: a etapa seguinte.

O voo de S. Tiago (Praia) até aos Penedos era de 900 milhas e os Penedos ocu-pavam cerca de 200m, no Atlântico Sul 1°, a Norte do Equador, e neles o “Repúbli-ca” deveria pairar para asse-gurar o apoio geral e garantir o abastecimento de gasolina e óleo.

Um voo de cerca de 11 horas, sobre o ocea-no, tendo por um único apoio à navegação, o Sol, se fosse visível.

Como diria, mais tarde Sacadura Cabral, no seu relatório: “foi este o bocado mais amargo da viagem, pela incerteza de ter ou não gasoli-na para chegar aos Penedos”.

Esgotada que foi a gasolina dos flutuadores, a existente nos tanques só dava para 10 horas de voo e o consumo do motor manteve-se acima do previsto.

Mesmo assim, embora com alguma ansiedade, os dois oficiais decidiram pros-seguir, pois como Sacadura Cabral diz:

“…desde a partida de Lis-boa tinham metido a vida em despesa”.

A navegação astronómica continuou impecável e daí que, chegar ou não aos Pe-nedos, não era uma questão de Direcção, mas sim unica-mente uma questão da gaso-lina chegar ou não.

Os Penedos foram avista-dos quase na proa e perto deles o “República”, do comando do CTEN Oliveira Muzanty.

Amararam a cerca de 150m do navio, que já tinha um escaler na água, pronto para a faina.

Não haveria, no avião, mais do que 2 ou 3 litros de gasolina!

A FORTUNA FAVORECE OS AUDAZES !A calema levou o flutuador de BB e o avião

afundou-se e, tudo o que pode ser salvo, passou para bordo do escaler.

Tinham percorrido 900 milhas, em 11horas

de voo, entre mar e céu, sem ver terra e che-gado aos Penedos, no meio do Atlântico Sul, com toda a precisão.

Ambos granjearam o altíssimo galardão da Grã-Cruz da Torre e Espada. Pelo navio bra-sileiro “Bagé”, na altura em Lisboa, o Minis-tro Azevedo Coutinho diligenciou o envio de outro Fairey (nº.16 – “Portugal”) para Fernan-do Noronha, a fim de prosseguir a travessia aérea. No voo Fernando Noronha – Penedos, este novo avião teve uma avaria no motor e tiveram de amarar em pleno oceano, onde es-tiveram à deriva cerca de 9horas, tendo sido lançado um alerta geral à navegação pelo “República”.

Sacadura Cabral confessou, mais tarde, que o pior para ele tinha sido…ficar sem cigarros.

O hidroavião acabou por se afundar, tendo--se conseguido retirar o motor da fuselagem, mesmo assim, numa faina que durou 15horas.

Foi enviado, então, o último Fairey da Avia-ção Marítima (Nº 17) a bordo do “Carvalho de Araújo” do comando do Cmte Cisneiros de Fa-ria, do mesmo curso da Escola Naval que Sa-cadura Cabral e seu velho amigo.

É com este hidroavião – que no Rio de Ja-

neiro seria baptizado “S. Cruz” pela esposa do Presidente Epitácio Pessoa – que os nossos dois marinheiros-aviadores, em 17 Junho de 1922, às 14.32 locais, amararam na baía de Guana-bara, no Rio de Janeiro:

- Sacadura Cabral, içando a bandeira bra-sileira;

- Gago Coutinho, salvando com 21 tiros de very-lights.

Estava completada a travessia aérea Lisboa/Rio de Janeiro. Sacadura Cabral tinha previs-

to, em Lisboa, um total de 60horas para toda a viagem.

Foram 60horas + 14m – em quase 4400 mi-lhas tinham errado 14minutos. Sacadura Ca-bral era genial!

Os povos, português e brasileiro, fizeram verdadeiras apoteoses aos 2 aviadores, pois as vicissitudes deste voo transatlântico a todos ti-nha tocado.

Os reflexos desta viagem vieram a refletir--se nas mais diversas áreas: científico-cultural, político-económica, para não falar nas da mo-numentalidade e lapidaria, toponímia, numis-mática e medalhística, música, filatelia, pintu-ra e literatura.

As relações entre as 2 pá-trias que era, aliás, um dos propósitos de Sacadura Ca-bral para a realização da viagem, beneficiaram de um ambiente muitíssimo mais amigável.

No regresso a Lisboa fo-ram promovidos ao posto imediato.

Com o decorrer dos anos foi-se desvanecendo, no es-trangeiro o interesse pela via-gem, e, em Portugal, pouco talvez se tem feito para a va-

lorizar devidamente no campo científico e man-ter viva a sua memória.

A Armada e os meios aeronáuticos não des-curaram, contudo, todo o seu real significado e associaram-no – e bem – à travessia noctur-na do Atlântico Sul, pelo hidroavião bimotor ARGOS, realizado por Jorge Castilho e outros (16/17 MAR 1927 Sarmento de Beires, Duval-le Portugal, Manuel Gouveia), com métodos e processos já usados anteriormente no voo Lis-boa – Rio de Janeiro.

Ao chegarem à costa brasi-leira, Castilho e os seus com-panheiros tiveram um único telegrama de felicitações – o de Gago Coutinho, pois Sa-cadura Cabral já tinha fale-cido. Do Governo – silêncio.

Fomos nós, os portugue-ses, os primeiros europeus a atravessar o Atlântico Sul, por mar, no século XVI, uti-lizando a navegação astro-nómica.

Fomos também nós, os portugueses, os primeiros a voar através do Atlântico Sul – de dia e de noite – com

novos processos astronómicos por nós criados.Os sextantes de bolha mantiveram-se em ac-

tividade durante cerca de 40 anos, mas com o advento da era electrónica, foram relegados para um passado histórico.

Sacadura Cabral e o seu mecânico desa-pareceram, sem sepultura, no Mar do Norte (15NOV1924) quando traziam, da Holanda, um avião Fokker para Portugal.

Sacadura Cabral tinha 43,5 anos e preparava uma viagem aérea de circum-navegação.

26 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

A chegada à baía de Guanabara – Rio de Janeiro 17 junho 1922.

O Cruzador República junto dos Penedos de S. Pedro.

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A Comissão Executiva do Encontro Nacional de Combatentes 2012 promove no próxi-mo dia 10 de junho, junto ao Monumento

aos Combatentes do Ultramar, em Belém, Lisboa, o seu Encontro Nacional de Combatentes 2012.

As cerimónias que ali terão lugar têm por objeti-vos comemorar o Dia de Portugal e prestar home-nagem a todos aqueles que tombaram em defesa dos valores e da perenidade da Nação Portugues a. Por esta razão, ali se reúne sempre um tão grande número de Portugueses,

não só os que foram combatentes no ex-Ultramar e os que mais recentemente serviram em missões de paz no estrangeiro, mas também todos aqueles que, amantes da nossa História e envolvidos na construção de um futuro mais próspero para a so-ciedade portuguesa, querem ser participantes ativos nesta homenagem. Esta Comissão promove ainda, no dia 11 de junh o, uma conferência subordinada ao tema “Os combates por Portugal – pas sado re-

cente e futuro”, a realizar na Fundação C alouste Gulbenkian.

PROGRAMADia 10 10H30 – Missa campal junto ao Monumento; 11H30 – Concentração para a cerimónia; 12H00 – Abertura pelo Presidente da Comissão; 12H05 – Cerimónia inter-religiosa (católica e muçulmana); 12H10 – Discurso de homenagem aos Combatentes, pelo

Prof. Dr. Manuel Antunes; 12H20 – Homenagem aos combatentes mortos e deposição

de flores;

12H40 – Hino Nacional (salva protocolar por navio da M arinha);

12H45 – Passagem de aeronaves da Força Aérea; 12H50 – Passagem final pelas lápides; 13H10 – Salto de pára-quedistas do Exército; 13H20 – Almoço-convívio;Dia 11 14H00 – Sessão de abertura da Conferência; 17H00 – Encerramento.

REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 27

Foi um rude golpe para o País e para a Aviação Naval, que dificilmente se re-compôs da perda deste seu mentor.

Dizia o Cmte. Cisneiros de Faria, no Bom Sucesso:

“Sacadura Cabral em terras meridio-nais, um homem de sorte; nos climas frios, um homem superior”.

Gago Coutinho, galardoado pela Avia-ção Naval com asas especiais, dedicou-se depois principalmente a estudos ligados à náutica dos Descobrimentos.

Sobreviveu 35 anos a Sacadura Cabral, pois faleceu em 1959, no dia seguinte a ter completado 90 anos.

No ano anterior (1958) fora promovido a Almirante em consagração dos extraor-dinários serviços prestados.

Na nossa gratidão aos 2 marinheiros--aviadores, recordemos os Oficiais, Sargen-tos, Praças e Civis que, a bordo do “5 de Outubro”, “República”, “Carvalho Araújo”, “Bengo” e “Bagé”, colaboraram nos diver-sos apoios aos dois oficiais-aviadores e vi-veram com ansiedade, através da impren-sa, todas as vicissitudes deste voo.

- Aos familiares do Cmte. Sacadura Ca-bral, os meus cumprimentos e calorosas felicitações por tão ilustre familiar.

- Recordo, ainda, o adjunto do Serviço de Navegação do “República” – o GM Sar-mento – futuro VALM Sarmento Rodrigues, aqui representado pelos filhos Ana Maria Cavaleiro de Ferreira e marido e o VALM Artur Sarmento.

Relembremos os 3 Ministros da Marinha que apoiaram o projecto de Sacadura Cabral, sendo justo salientar, entre eles, o CFR Azeve-do Coutinho.

Os meus parabéns,

- ao CALM Rui Abreu, em cuja presidência da CCM arrancou a candidatura que hoje celebra-mos e à sua equipa, que suscitou o processo e o levou a bom termo, com a selecção e prepa-ração da documentação exigida pela UNESCO;

- ao actual presidente da CCM, VALM Vilas Boas Tavares, as minhas felicitações, por neste seu mandato ver todo este sonho concretizado;

e, ainda, os meus públicos agradecimen-tos pelo convite com que me honrou em – como antigo piloto das Forças Aerona-vais – participar na cerimónia de hoje.

Quanto à Esquadrilha de Helicópteros da Marinha, cujo oficial que primeiro a co-mandou é hoje o ALM CEMA, exorto a sua guarnição a que, num espírito de solidarie-dade entre gerações, não deixe desaparecer as suas raízes históricas e enfrente o FUTU-RO... confiante ... e sem desfalecimentos.

- Senhor General Chefe do Estado--Maior General das Forças Armadas

- Senhor Almirante Chefe do Estado--Maior da Armada

- Senhor General Chefe do Estado--Maior da Força Aérea

Daqui a 10 anos, cumprem-se 100 anos sobre a data da 1ª Travessia Aérea diurna do Atlântico Sul.

Seria muito desejável – para não dizer imperativo – que o nosso País, em cola-boração com as autoridades brasileiras, cabo-verdeanas e espanholas, preparasse comemorações adequadas desta efeméri-de, efeméride esta que agora está aureo-lada de indiscutível prestígio internacio-nal, pertence à MEMÓRIA DO MUNDO e é PATRIMÓNIO DA HUMANIDADE.

O “Santa Cruz” – ali presente –, uma relíquia nacional, assim o espera.

NÃO O DESILUDEMOS!

J. Cyrne de CastroCMG

N.R.O autor não adota o novo acordo ortográfico.

Encontro Nacional de Combatentes10 de junho de 2012

Encontro Nacional de Combatentes

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28 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

Com a presença do Embaixador do Japão, foi inaugurada no Pavi-lhão das Galeotas do Museu de

Marinha, no dia 17 de Abril, a exposi-ção “Via Sibéria”. Trata-se de uma mos-tra de 140 postais enviados por Wen-ceslau de Moraes entre 1905 e 1917 do Japão para Lisboa, a maioria dirigidos a sua irmã Francisca. A colecção é pro-priedade da senhora embaixatriz Ingrid Bloser Martins, viúva de Armando Mar-tins Janeira, o grande divulgador da fi-gura e da obra de Wenceslau, quer no Japão quer em Portugal.

O desafio de expor os pequenos rec-tângulos de cartolina num espaço com aquela dimensão e ao lado de peças de grande volumetria foi vencido pelo pro-jecto da museóloga Margarida Jardim que, usando painéis de grande tama-nho e com cores quentes “reflectindo” os cascos das galeotas, faz ver desde a entrada no pavilhão que ali ao fundo há algo de diferente para ser visto. Depois, começa a aparecer o título “Via Sibé-ria” no cursivo manuscrito de Moraes, reproduzido do verso dos postais e la-deado de carimbos e selos japoneses. Aproximando-nos mais, vão-se recor-tando dos fundos, que variam do car-mim ao chocolate, os rectângulos dos postais agrupados por temas, com os versos reproduzidos ao lado das fren-tes e a grande maioria com a versão dactilografada dos textos do remetente acrescidos de algumas notas que elu-

cidam sobre os conteúdos. Abaixo da altura útil para a cómoda visualização das ilustrações e da escrita, em rodapé de cor cinza e em corpo de letra maior, frases retiradas dos diferentes livros do autor, referenciados pelas suas mara-vilhosas capas que ajudam a melhor compreender as pequenas mensagens contidas em cada envio.

A leitura destas pequenas missivas do Japão ajuda-nos a entrar melhor na emotividade diária de Wenceslau de Moraes, afastando-o do indivíduo isolado, deprimido, revoltado, viven-do a cada momento a angústia de um exílio forçado. Vemos um Wenceslau encantado com a terra e o povo que escolheu e que o rodeia, a sua arte, os seus costumes, a sua educação, as suas paisagens que quer, com o máximo de abundância, mostrar e explicar a cada pessoa a quem manda os postais. Nos textos seleccionados ressuma também o humor do seu autor, contrariando com o azedo e sofredor temperamento sempre propagan deado e o seu sentido prático de fazer negócios em parceria com a sua irmã Francisca, a quem por vezes chamava preguiçosa por passar demasiado tempo a admirar e não pas-sar logo à fase de costurar as peças de seda que lhe enviava para as tornar co-merciáveis.

“Via Sibéria” foi o nome escolhido para esta exposição de postais por mos-trar o longo caminho que eles percor-

reram desde que Moraes os depositava na estação do correio, até chegar ao seu destino.

Esta alternativa à tricentenária via marítima só foi possível após a inaugu-ração da linha de comboio transiberia-na, que ligava São Petersburgo a Vladi-vostok, encurtando de mais de um mês a viagem para o extremo oriente. Aque-le porto de mar ficava, por sua vez, a menos de um dia de barco de Fushiki, na costa oeste do Japão.

Esta ligação custou à Rússia 1,455 mil milhões de rublos, despesa só ultra-passada quase duas décadas mais tarde pela primeira guerra mundial. Embora marinheiro durante mais de vinte anos e apaixonado pelo mar e pela arte de o navegar, Wenceslau de Moraes foi um extraordinário utilizador desta via terrestre de comunicação que encurta-va, mais que a marítima, o tempo e a distância entre o seu Portugal e o seu Japão.

Num dos seus postais expostos, po-demos ler:

“…tenho recebido 2 postais teus am-bos não vindo por via Sibéria e levan-do mais do dobro do que levariam se seguissem por aquela via!...coisas dos Correios! Paciência.”

Dr. Pedro BarreirosMembro da Associação Wenceslau de Moraes

N.R.O autor não adota o novo acordo ortográfico.

“Via Sibéria”Exposição de postais de Wenceslau de Moraes no Museu de Marinha

“Via Sibéria”

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HIERARQUIA DA MARINHA 17

Por determinação legal estatuída no Decreto Regulamentar n.º 26/94, de 1 de Setembro, o Conselho do

Almirantado tem de emitir parecer, entre outros aspectos, sobre a não satisfação de parte das condições gerais de promoção dos militares da Marinha, e sobre a apro-vação dos quadros especiais de oficiais, sargentos e praças dos quadros perma-nentes na Marinha.

As condições gerais de promoção dos militares encontram-se estabelecidas no art.º 56º do Estatuto dos Militares das For-ças Armadas, aprovado pelo Decreto-lei n.º 236/99, de 25 de Junho. Os quadros especiais do pessoal são fixados com base no Decreto-lei n.º 261/2009, de 28 de Se-tembro, e nas rectificações subsequentes. A génese dos processos regulamentados por estes dois diplomas, encontra-se nas reformas militares desencadeadas pelo Marquês de Pombal e desenvolvidas por Martinho de Melo e Castro e por D. Ro-drigo de Sousa Coutinho.

A Resolução Régia de 20 de Outubro de 1796, estabeleceu as seguintes condi-

ções gerais de promoções: «…Tendo sido presente a Sua Magestade quanto importa do seu Real Serviço, que o Commando das suas Embarcações de Guerra seja confiado a Offi-ciaes, cujo prestimo, e merecimento nos seus anteriores Póstos os tenhão habilitado para tão alta confiança: Ordena a Mesma Senhora ao Seu Conselho do Almirantado, que nas Pro-moções de Póstos Superiores aos de Capitão de Fragata se não considere de modo algum a antiguidade como título para augmento de Posto cuja Graça sómente servirá de prémio ao merecimento e capacidade». A Resolução Régia de 5 de Novembro de 1796, acres-centou que: «Tendo Sua Magestade em con-sideração o muito que importa ao seu Real Serviço, que no Corpo da Sua Real Armada haja Officiaes, cujos Estudos Mathematicos na Universidade de Coimbra, ou nas Aulas de Marinha, os façaõ distinctos para a sua Real Comtemplação: Ordena que daqui por diante sejão preferidos nas Promoções aquelles Offi-ciaes, que em igualdade de merecimentos, e embarques tiverem mais profundos conheci-mentos Theoricos adquiridos nas sobreditas Aulas e Universidade.».

Na Resolução Régia de 9 de Outubro de 1796, D. Maria I fixou os seguintes qua-dros especiais dos oficiais dos diferentes postos: «Foi Sua Magestade servida Ordenar, que em quanto se não augmentar mais o nú-mero dos seus Navios de Guerra, e se não for-mar o Corpo de Artilheiros Marinheiros, seja fixo o dos Officiaes da sua Real Armada em cada huma das suas Classes, á excepção dos Vice-almirantes, e Tenentes Generaes, que a sua Real Grandeza não limita, em prémio de mais relevantes serviços; e tudo do modo se-guinte: Chefes de Esquadra, 4; Chefes de Divi-são, 8; Capitães de Mar e Guerra, 30; Capitães de Fragata, 30; Capitães Tenentes, 70; Primei-ros Tenentes, 140; Segundos T enentes, 140».

Estas três resoluções régias foram to-madas por D. Maria I, na sequência de consultas do Conselho do Almirantado, e o seu conteúdo reflecte o espírito or-ganizativo e o saber do almirante Ber-nardo Ramires Esquível, o seu primeiro subscritor.

António Silva RibeiroCALM

CONDIÇÕES DE PROMOÇÃO E QUADROS ESPECIAIS

CONDIÇÕES DE PROMOÇÃO E QUADROS ESPECIAIS

VIGIA DA HISTÓRIA 44

Lembrei-me desta expressão quando, bem recentemente, me deparei com um curioso diploma legislativo de

1829 embora, verdade seja dita, não fosse esta a primeira vez que, num diploma le-gal, expressamente elaborado para a reso-lução de um determinado aspecto da vida nacional, se verifique que afinal tal diplo-ma pretende resolver alguns outros pro-blemas que nada estão relacionados com o propósito inicial.

Em 11 de Dezembro de 1829 foi promul-gado um alvará em cujo preambulo se in-dicava ter como objectivo proceder à har-monização dos Conselhos de Guerra da Armada Real com os do Exército, cuja ex-periência, de mais de 13 anos de aplicação, se encontrava adequadamente testada.

Reconhecia-se, igualmente, a necessi-dade de regulação urgente especial para a Marinha por forma à “recta administra-ção da justiça”.

O diploma em causa é constituído por 20 art., entre os quais o art. 9 estabelecia a obrigatoriedade de registo, nos diários

náuticos, aquando do avistamento de ter-ra, de baixos ou de qualquer navio, da res-pectiva distância ao objecto avistado e o rumo (entenda-se azimute) em que se en-contrava devendo tais registos ser repeti-dos de 2 em 2 horas ou, no caso de se tra-tar de um navio suspeito, de hora a hora.

No art. 10 estabelecia-se que, tratando--se de navio suspeito, deveriam ser efec-tuados os sinais de reconhecimento parti-cular anotando-se, no diário, qual a hora a que se haviam feito os sinais e qual a res-pectiva resposta. Acrescentava ainda que idêntico procedimento deveria ser seguido relativamente a qualquer comunicação ou correspondência efectuada, de viva voz ou por sinais, com navios ou com terra.

Já o art. 11 estendia o procedimento esta-belecido no art. anterior aquando do avis-tamento de vários navios devendo, neste caso, os registos iniciarem-se pelo navio que estivesse mais próximo.

O art. 12, por outro lado, estabelecia que, quando se navegasse ao longo de terra, de-veria ser preferida, sempre que possível,

a marcação a dois pontos em terra, prefe-rencialmente ao método de marcação a um ponto e avaliação da distância respectiva definindo ainda que o resultado dessas marcações deveria ser efectuado, impre-terivelmente, de 2 em 2 horas.

Finalmente o art. 16 fixava que a obri-gatoriedade dos registos atrás citados não invalidavam a obrigatoriedade de manter os registos estabelecidos em vigor quanto às milhas, às proas, aos ventos, ao pano, ao abatimento e à diferença da variação (enten-da-se desvio) entre a agulha da bitácula e a utilizada para as marcações estabelecidas.

É bem possível que o autor do diploma não tivesse uma adequada cultura legislativa mas o que parece certo é que o mesmo não se deveria passar com a sua cultura marinheira.

Com. E. Gomes

Fonte: Documentos para a História das Cortes Ge-rais da Nação Portuguesa Tomo nV.

N.R.O autor não adota o novo acordo ortográfico.

MISTURAR ALHOS COM BUGALHOSMISTURAR ALHOS COM BUGALHOS

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30 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

A “Volvo Ocean Race” – uma competi-ção de vela ao mais alto nível mundial – tem sido anunciada por toda a grande

comunicação social de uma forma consisten-te e rigorosa. Os anúncios, em tom sério, atri-buem àquela competição os epítetos seguintes:

- A maior aventura à face da terra. - Uma viagem cheia de perigos: dia e noit e

consecutivamente no mar…ou - Velejar nas ondas e ventos perigosos: a

ú nica volta ao mundo que ainda resta…Ao ouvir estas palavras surgiu-me na mente

inquieta a seguinte frase - “Olha! Estão a falar da vida de Marinha”. Na verdade, se medi-tarmos, todas aquelas qualidades podem ser atribuídas à comum vida de Marinha. Senão vejamos, em muitas circunstâncias é uma vida de aventura – ao nível pessoal muitas vezes dei conta disso nestas histórias – temperada pelo ímpeto de bem servir. A vida do mar, mesmo no mais moderno dos navios, está repleta de perigos e alguns sofrimentos (como por exem-plo a separação familiar prolongada, ou a in-capacidade pronta de socorro em alto-mar). Finalmente, cada marinheiro da atualidade fez a sua própria volta ao mundo. Que pode ter começado em Portimão, passar por Ponta Delgada e acabar num qualquer ponto de Áfri-ca, ou das Américas…

Viajar por mar – como o anúncio faz suben-tender – é sempre diferente de viajar por terra. Marca as pessoas de forma distinta. Traz emo-ções diferentes. É outra poesia. É mesmo, estou seguro, uma escola de vida e para a vida… A na-vegar dependemos todos uns dos outros, perde-mos, em grande parte, o nosso conforto (a nossa privacidade) egoísta. Sentimos o mundo e todos os seus seres de forma diferente. Após algum tempo, sentimos o navio como a nossa casa – o lugar de emoções onde nos encontramos…

Não fui o primeiro a ter estas noções. Admi-to que todos os que já estiveram no mar assim pensam de forma mais ou menos consciente… Alguns povos de cultura anglo-saxónica chega-ram mesmo a formar navios-escola para civis, com um currículo semelhante aquele que se ministrava em terra. Constituíam uma espécie de colégios internos em que o mar e a vida a bordo eram um componente fundamental.

A Marinha é a herdeira das tradições de uma vida empreendedora e aventurosa de toda uma gesta de portugueses, que nem o atual cinzen-tismo consegue facilmente apagar. Se a Insti-tuição tem essa herança, significa que nós, os marinheiros vivos, somos os herdeiros dessa tradição. É uma tradição que se deve ostentar com orgulho…

Na verdade, só passado alguns anos percebi que, apesar de todas as dificuldades, a marinha

se torna parte de nós, um pouco como o lugar em que nascemos e crescemos… O lugar em que nos tornamos melhores pessoas… Então, na loucura contida que caracteriza estes escri-tos, admiti que a Marinha poderia fazer, por contraponto, os seguintes anúncios:

- Venha para a Marinha. Faça da sua vida uma aventura…

- Aprenda a conviver com os perigos, dia e noite no mar e no quotidiano da vida…

- Abrace no seu ser toda a globalidade do mundo. Torne a sua vida multicolor dentro da farda azul marinha. Sinta a poesia do mar…

É claro, cada um dos pacientes leitores que até aqui me toleraram pode acrescentar anún-cios próprios, matizados pela sua experiência pessoal – pois a experiência naval é, sempre e em todas as experiências, pessoal e intrans-missível… E se a família acarreta algum do peso da vida naval, também ganha com gran-de parte das experiências a que o Marinheiro anónimo está sujeito…

Deixo assim este conselho: vamos ver a “Volvo Ocean Race” sem esquecer a nossa própria “Marinha Ocean Race”. Afinal, não navegamos por um troféu ou por uma marca automóvel, navegamos por Portugal… é uma corrida que não podemos deixar de vencer…

Doc

NOVAS HISTÓRIAS DA BOTICA (14)

A “Volvo Ocean Race”… …e a escola da vida A “Volvo Ocean Race”… …e a escola da vida

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REVISTA DA ARMADA • JANEIRO 2003 11REVISTA DA ARMADA • FEVEREIRO 2012 31

37º Aniversário do Clube do Sargento da Armada

37º Aniversário do Clube do Sargento da Armada

No dia 22 de fevereiro, ocorreu na Sede Social do Clube do Sargen-

to da Armada a Sessão Sole-ne Comemorativa do seu 37º Aniversário.

Comemorar mais um ani-versário é sempre um ato de grande simbolismo em qual-quer coletividade; o deste ano fará parte das datas marcantes do Clube, pois pela primeira vez tivemos entre nós o Chefe do Estado-Maior da Armada, que nos deu a honra de presi-dir aos trabalhos.

A mesa de honra foi constituí-da pelo Chefe do Estado-Maior da Armada, o Presidente da Dire-ção e o Presidente da Mesa da Assembleia Geral.

Numa plateia onde não faltaram os associados e suas famílias, estiveram também presentes representantes de clubes e associa-ções de âmbito civil e militar, assim como o Presidente da Junta de Freguesia de S. Vicente de Fora, Vítor Agostinho.

Aos sócios que em 2011 completaram 25 anos de filiação, foram entregues os tradicionais emblemas de prata.

Das intervenções do Presi-dente da Direção, Albano Gin-ja, e do Chefe do Estado-Maior da Armada, ALM Saldanha Lo-pes, destacam-se os fortes laços de amizade e cooperação entre a Marinha e o Clube do Sargen-to da Armada, que se pretende ver reforçados no futuro.

O Almirante CEMA fez ain-da um périplo pelas instalações da Sede Social, tendo visi tado uma exposição do nosso sócio e pintor Arlindo Mateus, bem como os novos espaços inaugu-rados no passado mês de Outu-bro, como sejam a Residencial,

a Sala de Troféus e o Museu do CSA.Houve ainda tempo para um momento cultural, com a apre-

sentação de um pequeno concerto pelo nosso Coro Polifónico, superiormente dirigido pelo ilustre Maestro Euclides Pio.

No final, em ambiente de grande convívio, foi servido um be-berete aos convidados, associados e suas famílias, partiu-se o bolo de aniversário e cantaram-se os parabéns pelos 37 anos passados.

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REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 33

QUARTO DE FOLGA

JOGUEMOS O BRIDGEJOGUEMOS O BRIDGEProblema Nº 152

N-S vuln. Após uma abertura de E em 2♥ fracas, a qual no sistema que utilizam mostra uma mão com 6 cartas limitada a 10 pts mal feitos, S marcou o contrato de 6♠, talvez um pouco agressivamente, num leilão baseado no seu naipe independente e em que soube: - ter um apoio retardado (apenas de 2 cartas); - não correr o risco de perder 2 vazas em ♥ à cabeça; - da existência de 2 Ases na mão do parceiro e um naipe comprido em ♣. Como deverá S jogar para tentar cumprir o seu contrato, tendo recebido a saída a ♥2?.

SOLUÇÕES: PROBLEMA Nº 152Tendo em conta a abertura em 2 fraco de E, S sabe que a saída é carta seca e que o A de ♦ deverá estar em W, face ao teor do naipe de abertura, pelo que a sua linha de jogo terá de seguir estas 2 informações de elevada probabilidade. Vejamos pois o seu desenvolvimento: faz de A; joga AR de ♣ para baldar RD de ♦ (jogada chave) e outro para cortar, tendo a boa notícia que estavam 3-3; destrunfa e joga ♦5 para ter assim uma entrada no morto e baldar as ♥ perdentes nos ♦ apurados. Parabéns se aproveitou as informações da abertura e saída de W, encontrando a jogada chave para conseguir resolver o problema sem dar uma olhadela para os jogos tapados.

Nunes MarquesCALM AN

Oeste (W):864

2

A109876

V54

Este (E):53

RDV1097

43

D32

Norte (N):72

A8

V2

AR109876

ARDV109

Sul (S):6543

RD5

-

HORIZONTAIS: 1- O mesmo que azinhave; é quase cara. 2-Andar; gracejavas; po-nha abas em. 3-Engaste de pedra preciosa; sove na confusão. 4- Panela; lemos na confusão. 5-Submeta à acção de gases; cidade da Jugoslávia, à beira do rio Savo. 6-Entalhe; 7-Metal raro, de cor acizentada; ralo na barafunda. 8-Cinco letras de lanígero; senhores. 9-Pequeno quarto de dormir; mostrar pelo aspecto, que se está escandalizado ou mal disposto (fem). 10- Discursa: rio de Portugal (Faro); aquilo que se respira. 11-Pedido de socorro; raínha de Palmira, mulher de Odenato, ven-cida e reduzida ao cativeiro por Aureliano em 273.

VERTICAIS: 1- Relativo à zimogenia. 2-Graceja (inv); que tem lã ou lanugem. 3- O domingo imediato ao da Páscoa (pl). 4-Lavra; falta uma para ser seabra. 5-mau humor (fig); apetite sexual dos animais; esquadrão. 6-Rio Suiço (inv); metade de Zão-Zão, indicativa de um tempo no espaço, no tempo, nas acções. 7-És; o tio americano; antiga cidade da Arábia Petreia capital do reino dos Amonitas. 8-Sulcos feitos pelo arado (inv); espécie de boi selvagem. 9-Que tem cavernas. 10- Aquarte-lar (soldados) em casas particulares. 11- Tornar a embolsar.

SOLUÇÕES: PALAVRAS CRUZADAS Nº 434HORIZONTAIS: 1-Zinabre, car. 2-Ir; rias, abe. 3-Pala; svoe. 4-Ola; soelm. 5-Gase; zagreb. 6-En casamento. 7-Niobio; Roal. 8-Igero; srs. 9-Cela; amua. 10-Ora; ator; ar. 11-SOS; s. ze-nobia.

VERTICAIS: 1-Zimo genicos. 2-Ir; lanigero. 3-Pascoelas. 4-Ara; eabra. 5-Bile; sio az. 6-Raa; zao; ate. 7-Es; sam; amon. 8-Soger; uro. 9-Cavernosa. 10-Aboletar; ai. 11-Reem-bolsara.

Carmo Pinto1TEN REF

PALAVRAS CRUZADASProblema Nº 434

PALAVRAS CRUZADAS

123456789

1011

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11

CONVÍVIOS

l Procuram-se todos os “Filhos da Escola” que fizeram parte da Incorporação de Setembro de 1962 na Marinha de Guerra Portugue-sa, que nunca foram contactados pela Organização das Confraterni-zações Anuais, para que possam ser informados do Programa das Comemorações do 50º Aniversário da nossa Incorporação que este ano se realizam. Os interessados deverão contactar: Arnaldo Duarte – TM: 965 758 340 ou e-mail: [email protected].

l Realiza-se no dia 30 de junho, em Mértola, no restaurante ”Monte do Guiro”, o almoço-convívio dos ”Filhos da Escola” de junho de 1967. Os interessados devem contactar: Saruga ou Palma Telef. 212249183 TM: 914610492 TM: 919948142.

INCORPORAÇÃO DE SETEMBRO DE 1962

“FILHOS DA ESCOLA” – JUNHO DE 1967

“FILHOS DA ESCOLA” – 10ª COMPANHIA DA 1ª INCORPORAÇÃO DE 1984

l Decorreu no passado dia 10 de março o encontro comemorativo do 28º aniversário da 10ª Companhia. O programa constou de uma visita ao Farol de Aveiro, à Fábrica dos ovos moles, um passeio na Ria de Aveiro e um magnifico repasto na “Taberna do Canal”. O encontro decorreu num ambiente de grande espírito de amizade e sã camaradagem que, para além dos “Filhos da Escola”, teve a presença dos Faroleiros que

nos guiaram numa vi-sita ao Farol, e nos pro-porcionaram um senti-mento fraterno, à nossa querida MARINHA!

www.eam10compa-nhia.com

TAPE OS JOGOS DE E-W PARA TENTAR RESOLVER A 2 MÃOS.

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34 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA

NOTÍCIAS PESSOAIS

FALECIDOS

SCH TEA José Manuel Santos Batista SAJ TF REF Eurico Monteiro 1SAR R REF Júlio Gonçalves Pereira Leite 2SAR A REF Virgílio José Fernandes de Oliveira CAB T REF Ma-nuel Ramos Lopes CAB FZ Hugo Alexandre Paixão Ribeiro 1MAR AP Manuel do Nascimento Araújo Subchefe OPMM Raúl Afonso da Silva.

COMANDOS E CARGOSNOMEAÇÕES

CFR Carlos Alberto Pereira Simões nomeado para Diretor do Centro de Comunicações e Cifra da Marinha CTEN FZ An-tónio Paulo da Costa Frescata nomeado para Comandante da Companhia de Proteção no âmbito do 4º. Contingente Nacional para a Força Internacional de Apoio à Segurança no Afeganistão.

CFR ECN José Manuel Mendes Henriques CTEN SEP João Manuel Alegria de Sousa.

RESERVA

REFORMA

CFR EMQ Fernando de Oliveira Josué CFR José Manuel

CONVÍVIOS

RECRUTAMENTOS DE SETEMBRO 1959 / MARÇO 1960

Realizou-se no passado dia 21 de abril, em Alfeizeirão, o almoço--convívio dos “Filhos da Escola” dos recrutamentos de Setembro 1959 / Março 1960. O encontro decorreu num ambiente de sã ca-maradagem, tendo sido recordados os tempos passados na Mari-nha e lembrados os camaradas já falecidos.

Santo s Carvalho CFR EMA Clélio Dinis Ferreira Leite SMOR M Joaquim Manuel Carvão Velhinho SMOR FZ Avelino Men-des Pereira SCH ETC António José Barroso Ferreira SAJ TF Tomé Carlos Freitas Proença SAJ L José Manuel Pereira Nunes SAJ L Cariolano Augusto Pedro SAJ FZ José Santos Marques 1SAR C Júlio da Cruz Barroso CAB M António dos Santos Rodrigues CAB M Carlos Alexandre Pereira de Sousa Pinto CAB T António Nogueira da Silva.

NÚCLEO DE FUZILEIROS DOS TEMPLÁRIOS No passado dia 29 de abril os Fuzileiros de Tomar pro-moveram o seu XVI Almoço-Convívio que se realizou na Quinta de Gracinda Mateus em Valdonas.

Estiveram presentes, entre os convidados, o 2º Coman-dante do Corpo de Fuzileiros em representação do

r espetivo Comandante, o Comandante da Escola de Fuzileiros e um representante da Associação de Fuzileiros.

Este tradicional encontro anual, que reuniu cerca de meia centena de Fuzileiros acompanhados dos seus familiares, constituiu uma prova de que o “espírito de fuzileiro” continua a perdurar em terras tomarenses.

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Navios HidrográficosNavios Hidrográficos

17. O NaviO HidrOgráficO Salvador Correia iiConstruído em 1942 nos estaleiros Goole S. B. & Re-

pair, na Escócia, para a Marinha do Reino Unido, com o nome de HMS Saltarelo, foi adquirido pelo Gover-no Português em 1948 e batizado de Salvador Correia.

O primeiro navio Salvador Correia tinha sido um transporte que inicialmente cumpriu missões em An-gola e na Guiné e, a partir de 1929, abatido ao Efecti-vo dos Navios da Armada, foi entregue ao Governo de Angola, onde serviu na Missão Hidrográfica do Zaire. Ainda em 1942, foi compra-do o navio oce-anográfico Bal-daque da Silva , que apresentava idênticas carac-terísticas, tendo o Salvador Correia dado o nome à classe.

O navio possuí a as seguintes características:Deslocamento máximo ......................... 780 toneladasComprimento (fora a fora) ................. 45,57 metrosBoca ......................................................... 8,5 “Calado máximo .................................... 4,57 “Velocidade ............................................. 9,5 nósPropulsionado por uma máquina de tríplice expan-

são com uma potência de 850 cavalos, a sua guarnição inicial era de 36 homens.

Classificado como navio-patrulha, em Agosto de 1948, rumou para Angola onde foi incorporado na respetiva Marinha Privativa, tendo ali prestado ser-viço até 3 de novembro de 1953, data em que abatido ao efetivo daquela Marinha passou ao serviço exclu-sivo da Armada.

Convertido em navio oceanográfico e mantendo a mesma denominação foi, em 1954, atribuído à Mis-são Hidrográfica de Angola e S. Tomé, cuja área de intervenção tinha, no ano anterior, passado a incluir as águas de S. Tomé.

Coube ao N.O. Salvador Correia, entre 1954 e 1955, prestar apoio ao trabalho da referida Missão Hidro-gráfica no estudo que efetuou relativamente ao regi-me fisiográfico e hidrográfico das baías de Luanda e do Lobito que possibilitaram as obras de defesa das restingas e a localização das instalações petrolíferas do porto de Luanda e os estudos do projeto de bali-zagem luminosa do rio Zaire e os topo-hidrográficos da baía dos Tigres. Durante este período, a Missão Hi-drográfica de Angola e S. Tomé passou a contar com o apoio simultâneo do N.H. Carvalho Araújo, o primei-

ro com esta denominação, a fim de intensificar os es-tudos com vista à navegabilidade dos rios Cubango, Luando e Quanza.

Refira-se que os estudos empreendidos no rio Cubang o incluíram o levantamento hidrográfico de 600 km navegáveis, iniciando assim o desbravar de um v asto território até então apelidado de “terras do fim do mundo”, o que veio a dar lugar, em 22 de abril de

1960, à inaugura-ção das carreiras de comboios flu-viais no Cuban-go, a qual teve grande repercus-são na comunica-ção social. Na oca-sião, transcreveu o jornal “O Co-mércio”, de 28 de abril, as seguin-tes palavras do Comandante Lu-

ciano Bastos: A Missão Hidrográfica de Angola e S. Tomé acaba de entregar à D.P. dos Serviços de Marinha de Ango-la a Delegação Fluvial do Cubango e a direção e explo ração das carreiras de navegação do Cubango. Com este acto dá a M.H. por c oncluído um serviço que lhe foi determinado por despacho de 14-1-956 do sr. Subsecretário de Estado do Ul-tramar, engº Carlos Abecassis.

Conforme então mencionava em título o referido jornal: A mais de mil quilómetros do mar, como remate de trabalhos de grande envergadura estão abertos, agora, no-vos caminhos para o maior desenvolvimento de uma vasta região do sudeste da nossa província com superfície maior que a da Metrópole.

Entretanto, em 1958, N.O. Salvador Correia foi atribuí-do à Brigada Hidrográfica do Continente, facto que trouxe uma melhoria das capacidades de trabalho des-ta equipa que mais tarde veio a conhecer um novo e importante impulso, não só com a criação do Institu-to Hidrográfico, ao ser elevada à categoria de Missão Hidrográfica como também apetrechada de moder-nos e mais eficazes equipamentos eletrónicos como o Raydist, que possibilitavam determinar com rigor a posição em trabalhos de sondagem hidrográfica.

Apesar de, desde 1954, ter sido utilizado, exclusiva-mente, em trabalhos hidrográficos, só em abril de 1959 foi classificado como navio hidrográfico, assim perma-necendo até 1961, quando passou a chamar-se Balda-que da Silva, mas nunca mais navegou. Foi abatido ao Efetivo dos Navios da Armada em 12 de maio de 1961.

Colaboração do INSTITUTO HIDROGRÁFICO

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14 JANEIRO 2003 • REVISTA DA ARMADA

Navios HidrográficosNavios Hidrográficos

17. O NaviO HidrOgráficO Salvador Correia ii