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UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM LINGUÍSTICA DIFERENTES ETHÉ, UM MESMO OBJETIVO: OS CAMINHOS DAS LEIS DE DIRETRIZES E BASES ÉRIKA MISKOLCI DE ALCANTARA Orientadora: Profª. Drª. Magali Elisabete Sparano Dissertação apresentada ao Mestrado em Linguística, da Universidade Cruzeiro do Sul, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Linguística. SÃO PAULO 2013

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UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

MESTRADO EM LINGUÍSTICA

DIFERENTES ETHÉ, UM MESMO OBJETIVO:

OS CAMINHOS DAS LEIS DE DIRETRIZES E BASES

ÉRIKA MISKOLCI DE ALCANTARA

Orientadora: Profª. Drª. Magali Elisabete Sparano

Dissertação apresentada ao Mestrado em Linguística, da Universidade Cruzeiro do Sul, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Linguística.

SÃO PAULO

2013

AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA

UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL

A318d

Alcantara, Érika Miskolci de. Diferentes ethé, um mesmo objetivo: os caminhos das leis de

diretrizes e bases / Érika Miskolci de Alcantara. -- São Paulo; SP: [s.n], 2013.

148 p. : il. ; 30 cm. Orientadora: Magali Elisabete Sparano. Dissertação (mestrado) - Programa de Pós-Graduação em

Linguística, Universidade Cruzeiro do Sul. 1. Análise do discurso 2. Leis de diretrizes e bases da educação

nacional (LDB) 3. Gênero textual 4. Lei 5692/71 5. Lei 9394/96 6. Ethos I. Sparano, Magali Elisabete. II. Universidade Cruzeiro do Sul. Programa de Pós-Graduação em Linguística. III. Título.

CDU: 81’42(043.3)

UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

DIFERENTES ETHÉ, UM MESMO OBJETIVO:

OS CAMINHOS DAS LEIS DE DIRETRIZES E BASES

Érika Miskolci de Alcantara

Dissertação de mestrado defendida e aprovada

pela Banca Examinadora em 25/02/2013.

BANCA EXAMINADORA:

Profª. Drª. Magali Elisabete Sparano

Universidade Cruzeiro do Sul

Presidente

Pre Profª. Drª. Patrícia Silvestre Leite Di Iório

Universidade Cruzeiro do Sul

Profª. Drª. Nancy dos Santos Casagrande

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

DEDICATÓRIA

Ao meu esposo, Paulo Abreu, pelo incentivo e

compreensão nos momentos de ausência, e à

minha mãe, Conceição Miskolci, mulher que é a

minha verdadeira fonte de inspiração.

AGRADECIMENTOS

A Deus, que comigo teceu a redação desta pesquisa.

À Professora Magali Elisabete Sparano, pela orientação e compreensão

dispensadas ao desenvolvimento deste trabalho.

Aos professores do Programa de Mestrado em Linguística da Universidade

Cruzeiro do Sul, que muito contribuíram para o meu crescimento intelectual.

À Secretária Municipal de Educação, Profª Rute Maria Pozzi Casati, por

incentivar o nosso acesso ao mestrado.

Aos meus familiares, pelo apoio e compreensão, de modo particular à minha

irmã, Andréia Miskolci, pessoa sempre presente em todos os momentos importantes

da minha vida.

“Não é a terra que constitui a riqueza das

nações, e ninguém se convence de que a

educação não tem preço." (Rui Barbosa)

ALCANTARA, E. M. Diferentes ethé, um mesmo objetivo: os caminhos das leis de diretrizes e bases. 2013. 148 f. Dissertação (Mestrado em Linguística)–Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2013.

RESUMO

Esta dissertação tem por objetivo analisar as escolhas linguísticas e seus

consequentes efeitos de sentido presentes nas Leis de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (LDB), 5692/71 e 9394/96, seguindo o eixo teórico da Estilística

e da Análise do Discurso. O trabalho está organizado em três capítulos, além da

introdução e das considerações finais. No capítulo I, apresenta-se um percurso

histórico, com a perspectiva de contextualizar os diferentes períodos sócio-históricos

em que essas Leis foram promulgadas. Em seguida, no capítulo II, discorre-se sobre

as características do gênero textual, traçando um paralelo entre a lei e outros atos

que compõem o domínio jurídico. Do capítulo III, consta a análise comparativo-

contrastiva das escolhas linguísticas de alguns artigos das duas LDBs que serão

agrupados por assunto, possibilitando que se percebam as convergências e

divergências existentes entre eles. Por fim, no capítulo conclusivo, em posse dos

dados linguísticos, discute-se a constituição dos diferentes ethé dos enunciadores

legisladores dos ordenamentos jurídicos, que se revelam coerentes aos contextos

sócio-políticos em que estão inseridos.

Palavras-chave: Ethos, Estilística textual, LDB.

ALCANTARA, E. M. Ethe different, the same goal: the paths of law guidelines and bases. 2013. 148 f. Dissertação (Mestrado em Linguística)–Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2013.

ABSTRACT

This thesis aims to analyze the linguistic choices and its consequential meaning

effects in the National Education Bases and Guidelines Laws (LDB), 5692/71 and

9394/96, following the theoretical axis of Stylistics, Discourse Analysis. The work is

organized in three chapters, in addition to the introduction and the final

considerations. In chapter I, a historic trajectory is presented, with the perspective of

contextualizing the different social and historical periods in which the Laws were

enacted. Then, in chapter II, the textual genre characteristics are discussed, drawing

a parallel between the law and other legal acts that make up the legal domain. In

chapter III, a comparative-contrastive analysis is made of the linguistic choices of

some articles of both LDBs, and which are grouped by subject, allowing realizing the

convergences and divergences between them. Finally, in the conclusive chapter, in

the possession of the linguistic data, the creation of the different ethos of the legal

ordainments of the enunciators legislators is discussed, which are revealed

consistent with the socio-political contexts in which they are inserted.

Keywords: Ethos, Textual stylistic, LDB.

LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 - O ESCOPO DAS LEIS ........................................................................ 50

QUADRO 2 - DO OBJETIVO DA LEI ....................................................................... 55

QUADRO 3 - O IDIOMA OFICIAL NAS REDES DE ENSINO .................................. 65

QUADRO 4 - CURRÍCULO: ASPECTOS GERAIS .................................................. 68

QUADRO 5 - LÍNGUA PORTUGUESA .................................................................... 74

QUADRO 6 - PERÍODO LETIVO .............................................................................. 76

QUADRO 7 - HABILITAÇÃO PROFISSIONAL ........................................................ 79

QUADRO 8 - EDUCAÇÃO ESPECIAL ..................................................................... 81

QUADRO 9 - ESTUDOS DE RECUPERAÇÃO PARALELA. ................................... 86

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11

CAPÍTULO I

HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: PREPRANDO O CAMINHO PARA AS

LEIS DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL .............................. 13

CAPÍTULO II

A LEI COMO UM GÊNERO TEXTUAL .................................................................... 26

CAPÍTULO III

AS LEIS DE DIRETRIZES E BASES: COMPARAÇÃO E CONTRASTE ................ 48

À GUISA DE UMA CONCLUSÃO: A CONSTITUIÇÃO DE DIFERENTES ETHÉ

NAS LEIS DE DIRETRIZES E BASES ..................................................................... 90

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 102

ANEXOS

ANEXO A - LEI DE DIRETRIZES E BASES 5692/71. ........................................... 105

ANEXO B - LEI DE DIRETRIZES E BASES 9394/96. ........................................... 117

ANEXO C - QUADROS COMPARATIVOS ............................................................ 140

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INTRODUÇÃO

A garantia da boa convivência entre as pessoas em uma mesma sociedade

é, via de regra, assegurada por meio de normas jurídicas que visam à harmonia, à

paz e ao equilíbrio entre elas, assegurando-lhes direitos e deveres, definindo ações

e condutas que, se descumpridas, podem acarretar uma ou mais sanções.

Dentro dessa perspectiva e buscando estabelecer diretrizes que instituíssem

o alicerce da educação no país, o governo brasileiro promulgou, em períodos

diferentes da nossa História, três Leis de Diretrizes e Bases que vigoraram em todo

o território nacional.

Dessas três Leis, duas foram escolhidas como corpus desta pesquisa, ou

seja, as Leis 5692/71 e 9394/96, legislações exemplares de diferentes fases da

História do Brasil, a primeira, advinda de um regime ditatorial e a segunda, ainda em

vigor, de um regime democrático, que serão estudadas com vistas ao objetivo desta

dissertação, que é analisar as escolhas linguísticas presentes no corpus e os

consequentes efeitos de sentido que demonstram os interesses políticos em

diferentes contextos sócio-históricos, desvelando os ethé dos seus enunciadores.

Para tanto, será observada a forma estrutural do gênero lei, seguindo-se

pelo cotejo dos dois ordenamentos jurídicos que constituem o corpus desta

pesquisa, analisando-se, com vistas ao objetivo deste estudo, as semelhanças e

diferenças presentes nas formas estruturais e na microestrutura desses enunciados.

Dessa forma, considerando-se os objetivos da presente pesquisa, este

trabalho segue embasamento teórico da Estilística e da Análise do Discurso, com

amparo nos estudos desenvolvidos por: Marcuschi (2008), que trata sobre o domínio

discursivo e a tipologia comum aos gêneros, tendo em vista as relações

interpessoais que variam conforme a utilização dada a esses gêneros no âmbito

social; Benveniste (1989), pela relevância do ato da enunciação, ou seja, do

momento em que ele acontece, e à relação que surge entre enunciador e

coenunciador nos dois diferentes cenários da nossa História; Martins (2000), que

discute, entre outros, o valor das escolhas lexicais diante do contexto no qual o

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enunciado se insere; Maingueneau (2011) e Amossy (2008), frente aos estudos

voltados para o ethos dos enunciadores e o ethos institucional, respectivamente.

Diante disso, o trabalho foi dividido em quatro capítulos, sendo que no

primeiro será apresentado o percurso histórico, de forma resumida, para o

estabelecimento das leis que regulam a educação, bem como os diferentes

contextos sócio-históricos, palco das Leis de Diretrizes e Bases da Educação, foco

deste estudo.

No segundo capítulo, conforme Koch, Bentes e Cavalcante (2007), discute-

se a estrutura do gênero textual lei e a intergenericidade inerente ao domínio

jurídico, uma vez que, neste estudo, analisa-se a aproximação e a divergência de

alguns artigos das duas últimas Leis de Diretrizes e Bases da Educação.

Já no terceiro capítulo, as análises voltam-se para a microestrutura das Leis,

buscando-se observar as semelhanças e diferenças existentes entre as normas

jurídicas, por meio da análise das escolhas linguísticas e os efeitos de sentido que

caracterizam os contextos históricos diferentes e desvelam os ethé de seus

enunciadores.

Por fim, sem a pretensão de esgotar a análise do corpus escolhido, tendo-se

em vista sua extensão, o último capítulo, à guisa de uma conclusão, versará sobre a

constituição dos ethé dos enunciadores das duas Leis.

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CAPÍTULO I - HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: PREPRANDO

O CAMINHO PARA AS LEIS DE DIRETRIZES E BASES DA

EDUCAÇÃO NACIONAL

O objetivo da história é iluminar o passado para entender o presente e construir o futuro. Uma sociedade inculta, incapaz de estudar e analisar sua história, não consegue entender a si própria. E, nesse caso, não está apta a construir o futuro de forma estruturada. Uma visão de curto prazo, que não leva em conta as lições do passado, conduz a soluções igualmente imediatistas. Nossos problemas têm raízes profundas, que às vezes remontam a duzentos ou trezentos anos atrás. Isso não significa que o Brasil esteja eternamente condenado à corrupção ou a repetir os vícios do passado. Um país pode evoluir e melhorar, mas antes é preciso entender a origem desses problemas. Nesse quadro, investir em educação é absolutamente fundamental. Só uma sociedade culta e bem educada consegue entender a própria história - com seus defeitos e suas virtudes. (Laurentino Gomes)

Antes de iniciar a análise dos artigos que comporão o objeto do presente

estudo, julga-se necessário realizar um breve percurso histórico da educação

brasileira, buscando com isso compreender os motivos que levaram o governo a

criar normas voltadas exclusivamente para a educação, sem se ater, porém, a

detalhes minuciosos a respeito do assunto, mesmo porque eles não correspondem

ao foco central do presente trabalho.

Dessa forma, os registros referentes à História da Educação no Brasil

começam com a chegada dos portugueses e com a divisão, pelo monarca, do

território em capitanias hereditárias, objetivando com isso, o aumento populacional

que serviria para defender as novas terras dos que buscavam fazer uso de suas

riquezas.

No entanto, essa iniciativa não logrou êxito, pois das catorze capitanias aqui

constituídas, somente duas atingiram os objetivos proposto. Por isso, preocupado

com a exploração da região por navios que pertenciam a outros países e que aqui

atracavam, Portugal criou o Governo Geral, visando a garantir na colônia os

interesses da metrópole.

Nesse período, por volta de 1549, vieram para o Brasil padres jesuítas que

compunham a Companhia de Jesus, a quem foram atribuídos, pelo governo

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português, a instrução e o ensino dos filhos dos nativos e colonos, perdurando isso

por mais de duzentos anos sem qualquer intervenção da coroa no ensino por eles

ministrado.

Quando D. José I subiu ao trono, no ano de 1750, Portugal já se encontrava

em sérias dificuldades econômicas. Seu objetivo era, a exemplo da Inglaterra,

superar a condição mercantilista para tornar-se um país industrializado e, dessa

forma, às colônias que lhe pertenciam cumpria subsidiar a metrópole com as

riquezas e pedras preciosas que possuíam.

Com isso, no ano de 1759, o rei nomeia Sebastião José de Carvalho e Melo,

o Marquês de Pombal, como Primeiro Ministro de Portugal, pessoa a quem competia

de fato o comando do país, o que se manteve até a morte do monarca, com a subida

ao trono de D. Maria I.

Objetivando modificar o quadro econômico no qual Portugal se encontrava, o

Marquês de Pombal fixou reformas que mexeram também na organização das

colônias, dentre elas, a expulsão dos padres jesuítas da região, com o intuito de

viabilizar o crescimento da população, por meio da união entre pessoas de

diferentes raças, o que acarretaria um maior controle das fronteiras, bem como de

todo o território brasileiro, passando com isso o poder econômico e político das

regiões administradas para o domínio da coroa.

Em meio a todo esse contexto, uma reforma educacional fez-se necessária,

passando esta a pautar-se nas ideias iluministas que estabeleciam o primado da

razão, voltando-se não mais para os interesses da igreja, mas para os do Estado,

sem diminuir, porém, a força coercitiva do regime absolutista e autoritário imposto

pelo Primeiro Ministro, o que marcou a vida das pessoas, quer na colônia, quer na

metrópole.

Essa reforma dera início ao ensino público e laico aplicado por professor

concursado e, portanto, pago pelo Estado. Sua função era a de ministrar uma única

disciplina, por meio de aulas régias, ou seja, avulsas, competindo ao aluno deslocar-

se entre uma e outra aula, o que lhe requeria andar grandes distâncias.

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Com isso é possível entrever que, se a implantação desse sistema na

metrópole não foi algo muito simples, muitos foram os problemas que isso acarretou

ao ensino proposto no Brasil Colônia, ainda detentor de parcos recursos, mantendo,

por isso, os professores com formação jesuítica em efetivo exercício da profissão.

De Portugal foram enviados inúmeros alvarás e cartas régias, com o intuito

de fazer acontecer no Brasil um ensino pautado nas exigências da metrópole,

contudo, por longo período, o que de fato ocorreu é que o ensino regrediu no país,

competindo a quem tivesse interesse e condições econômicas deslocar-se para

Portugal para lá dar continuidade aos estudos.

Foi somente em 1808, com a invasão de Portugal pela França e, por isso, a

busca de refúgio da Família Real no Brasil, que a colônia experiência reais

mudanças na estrutura educacional, tendo em vista os recursos que passaram a ser

investidos no ensino técnico, buscando aprimorar a mão de obra, bem como o

aumento no número de escolas voltadas para o ensino superior, o que não ocorreu

nos demais níveis educacionais à época.

Em contrapartida, o povo que se manteve em Portugal encontrava-se infeliz

com a ausência do rei, Dom João VI, e à mercê da Inglaterra, a quem coube a

expulsão dos franceses de suas terras. Por isso, em 1820, é deflagrada a Revolução

Constitucionalista na metrópole, obrigando o regresso do rei à terra natal, sem

impedir, contudo, a queda do regime monárquico.

Por isso e por questões de ordem política, em 1822, o Brasil deixa de ser

colônia de Portugal por meio da Proclamação da Independência realizada pelo então

Príncipe Regente Dom Pedro I, que permaneceu aqui no país por ocasião do

regresso de Dom João VI à corte.

Frente ao novo sistema de governo que se instalou no Brasil, fez-se

necessária a criação de uma Constituição Nacional, a primeira, datada de 25 de

março de 1824, na qual se estabeleceu pela primeira vez, conforme art. 179, a

gratuidade do ensino primário a todos:

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira

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seguinte. [...] XXXII. A Instrucção primaria, e gratuita a todos os Cidadãos. (BRASIL, 1824).

Contudo, a expressão “todos”, trazida pelo ordenamento jurídico,

apresentava cunho restritivo, tendo em vista não estarem todos realmente inclusos

sob a tutela da Lei, pois, segundo a perspectiva da época, a expressão “Cidadãos”

excluía os escravos e as mulheres, destinando-se, portanto, somente aos homens

livres.

Assim, como se sabe, durante todo esse período, o Brasil esteve sob o

regime monárquico, porém, frente a problemas como, por exemplo, o crescente

movimento abolicionista, que culminou no fim da escravatura; os problemas quanto à

mão de obra nas terras dos barões do café e a organização do Partido Republicano:

um golpe militar acabou acontecendo no ano de 1870, o que ocasionou a

Proclamação da República, pelo Marechal Deodoro da Fonseca e com isso, no dia

15 de novembro de 1889, houve a queda do antigo regime.

Diante disso, uma outra Constituição foi promulgada em 1891. Nela a

responsabilidade pela educação é passada para o estado, observando-se, porém,

pouca melhoria efetiva na educação, principalmente no que diz respeito ao ensino

primário e às oportunidades de continuação dos estudos após o ensino secundário.

Isso se comprova, ao observar os estudos realizados por Ribeiro (1992, p.

74), nos quais asseguram que em 1900 a população brasileira era composta por

aproximadamente 17,388 milhões de pessoas e destas 12,940 milhões não sabiam

ler ou escrever, o que equivalia a 75% da população brasileira. Dentre estes,

aqueles que possuíam idade igual ou superior a quinze anos computavam um total

de 9,752 milhões, sendo que 65% eram analfabetos, correspondendo a um total de

6,348 milhões de pessoas.

Essa discrepância amplia-se ainda mais ao observar-se que o ensino

aplicado não era igualitário, pois de um lado estavam os mais abastados, de outro

encontravam-se os menos favorecidos. É o que nos assegura Carneiro (2004, p. 18

e 19), ao afirmar que:

[...] a maioria das Escolas Secundárias abrigava-se em mãos de particulares, o que por si só representava uma elitização da escola, dado que somente famílias de posse poderiam custear os estudos de seus filhos.

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O que parecia na Constituição imperial uma incursão descentralizadora no formato organizacional do ensino, representava, na verdade, um despiste legal, uma vez que os avanços aparentes dos dispositivos constitucionais eram contidos por uma mística organizacional cimentada no princípio da ação hegemônica da Igreja e da Família sobre a Educação.

Em 1930, Getúlio Vargas assume o governo federal de forma provisória e

decide, dentre outras ações: dissolver o Congresso Nacional, instituir o Ministério da

Educação e Saúde e, com ele, um ano depois, reformar o ensino secundário e

superior, sendo a primeira com cunho educativo e a segunda com foco na

organização do sistema universitário.

Em 1932, é publicado o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, tendo

em vista as influências que as ideias do filósofo norte americano John Dewey

vinham exercendo sobre a educação no Brasil. Dessa forma, a Escola Nova, como

era chamada, renovou a educação e sua prática, concentrando o ensino nas ações

dos alunos sobre o objeto a ser apreendido, ao invés de centrar-se no discurso do

professor, muito comum no ensino tradicional, fazendo com que o estudante

buscasse soluções e respostas a uma situação concreta de ensino:

O que distingue da escola tradicional a escola nova não é, de fato, a predominância dos trabalhos de base manual e corporal, mas a presença, em todas suas atividades, do fator psicobiológico do interesse, que é a primeira condição de uma atividade espontânea e o estímulo constante ao educando (criança, adolescente ou jovem) a buscar todos os recursos ao seu alcance, “graças à força de atração das necessidades profundamente sentidas”. É certo que, deslocando-se, por esta forma, para a criança e para seus interesses, móveis e transitórios, a fonte de inspiração das atividades escolares, quebra-se a ordem que apresentavam os programas tradicionais do ponto de vista da lógica formal dos adultos, para os pôr de acordo com a “lógica psicológica”, isto é, com a lógica que se baseia na natureza e no funcionamento do espírito infantil. (AZEREDO, 2010, p. 49-50)

Com a Constituição de 1934, um capítulo inteiro foi dedicado ao ensino,

assegurando, dentre outras coisas, a educação como direito de todos, devendo esta

ser promovida pelo poder público e pela família:

Art 149 - A educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela família e pelos Poderes Públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no País, de modo que possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação, e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana. (BRASIL, 1934).

À União competia a criação de diretrizes educacionais que envolvessem

todo o território nacional, enquanto aos Estados a autonomia foi ampliada para

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articular a organização dos seus sistemas de ensino, coligando-os às determinações

apresentadas pela União.

Em 1937, apoiado pelos militares e alegando estar o Brasil em vias de ser

tomado pelos comunistas, Getúlio instaura a ditadura no país e promulga uma nova

Carta Magna.

Dentre as várias regulamentações trazidas por ela, o direito ao ensino

primário e gratuito é mantido, mas a educação deixa de ter o enfoque que detinha

anteriormente, pois as discussões sobre o assunto cessam, passando a ser

considerada como fase que visava a uma preparação para a mão de obra,

objetivando o atendimento às necessidades do mercado.

O judiciário e o legislativo, com a nova constituição, veem seus poderes

diminuídos, pois começam a ser controlados pelo executivo. Surge então o Estado

Novo e, com ele, inicia-se um período em que o autoritarismo de Getúlio se

estabelece, mantendo-se assim até o ano de 1945, quando os militares tiram-no do

governo, dando vazão à Nova República e à redemocratização da educação no

Brasil.

Para tanto, uma quinta Constituição é sancionada em 1946, na qual é

possível observar um retrocesso no que diz respeito à gratuidade do ensino que

passa a ser restrita ao ensino primário, enquanto que ao secundário essa

prerrogativa dar-se-ia somente àqueles que não detivessem condições pecuniárias

para fazê-lo. É o que se pode observar no art. 168, II: “o ensino primário oficial é

gratuito para todos; o ensino oficial ulterior ao primário sê-lo-á para quantos

provarem falta ou insuficiência de recursos” (BRASIL, 1946).

Contudo, a nova Constituição trouxe uma inovação, pois atribuiu às

empresas que detinham um número superior a cem funcionários a prestação de

serviços educativos aos seus empregados, bem como a seus filhos, objetivando

minimizar o número de brasileiros iletrados. É o que garantia o art. 168, inciso III, da

Carta Magna: “as empresas industriais, comerciais e agrícolas, em que trabalhem

mais de cem pessoas, são obrigadas a manter ensino primário gratuito para os seus

servidores e os filhos destes.” (BRASIL, 1946).

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Nesse período, no ano de 1947, a alfabetização continuava sendo uma

preocupação no país, o que deu margem ao surgimento de Campanhas Nacionais

com o fim de resolver essa questão.

Em 1948, um conjunto de esforços foi empregado com o intuito de aprovar a

primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação, já prevista pela Constituição, em

seu art. 5º, inciso XIV, no qual constava: “Compete privativamente à União: traçar as

diretrizes da educação nacional” (BRASIL, 1934), o que efetivamente aconteceu

somente no dia 20 de dezembro de 1961, ou seja, treze anos mais tarde, com a

promulgação da Lei 4024.

Nela se verifica um direito que passa a ser atenuado no próprio

ordenamento jurídico, o que é possível observar ao traçar um paralelo entre a

obrigatoriedade expressa no art. 27 e a escusa permitida pela própria Lei no art. 30,

que reconhece casos de exceção, consideravelmente fáceis de serem acessados,

enfraquecendo a norma principal.

Art. 27 - O ensino primário é obrigatório a partir dos sete anos e só será ministrado na língua nacional. Para os que o iniciarem depois dessa idade poderão ser formadas classes especiais ou cursos supletivos correspondentes ao seu nível de desenvolvimento. (BRASIL, 1961).

e

Art. 30. Não poderá exercer função pública, nem ocupar emprego em sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público o pai de família ou responsável por criança em idade escolar sem fazer prova de matrícula desta, em estabelecimento de ensino, ou de que lhe está sendo ministrada educação no lar.

Parágrafo único. Constituem casos de isenção, além de outros previstos em lei:

a) comprovado estado de pobreza do pai ou responsável;

b) insuficiência de escolas;

c) matrícula encerrada;

d) doença ou anomalia grave da criança. (BRASIL, 1961).

No dia 31 de janeiro de 1961, Jânio Quadros toma posse como Presidente

da República, mas renuncia seis meses depois, ficando em seu lugar Pascoal

Ranieri Mazzilli, Presidente da Câmara dos Deputados, apoiado pelos militares,

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tendo em vista o pouco interesse que eles apresentavam em empossar o vice-

presidente João Goulart que, à ocasião, encontrava-se em viagem à China.

Isso gerou uma crise política no país, somente solucionada após a

aprovação da Emenda Constitucional nº 4, datada de 2 de setembro de 1961, que

garantia a Goulart o direito de ocupar o cargo de Presidente do Brasil, sem, contudo,

deter todos os direitos comuns a um presidente, pois a própria Emenda instituiu o

parlamentarismo como sistema de governo. Somente após a realização de um

plebiscito, o que ocorreu no ano de 1965, o Brasil volta a ser presidencialista,

devolvendo ao executivo, os plenos poderes para governar.

Porém, nesse período, Estados Unidos e União Soviética encontravam-se

em conflito, pois objetivavam exercer autoridade soberana no mundo, o que deu

início à “Guerra Fria”, cujo caráter era puramente ideológico, pois ambos detinham

grande quantidade de material bélico que, se colocado a termo, comprometeria a

vida no planeta.

É em meio a esse contexto e à preocupação de que o Brasil, a exemplo de

Cuba, se tornasse comunista, que o então presidente João Goulart, ao tomar

iniciativas como, por exemplo, a reforma agrária nas terras pertencentes ao governo,

tem suas ações interpretadas como tendenciosas, o que deu vazão a um golpe

militar, período em que, apoiados pelos Estados Unidos, os militares tomam o

governo e instauram a ditadura no país.

Por essa ocasião, são criados Atos Institucionais que permitiram a

realização de prisões, sem qualquer margem à defesa, bem como a cassação de

direitos políticos, sem prévio aviso e a obtenção de “confissões” por meio de

torturas, visando a garantir a desarticulação das iniciativas que viessem de encontro

às determinações impostas.

Nesse período, ainda no ano de 1964, surgem o Plano Nacional de

Educação e o Programa Nacional de Alfabetização, inspirados nos métodos de

Paulo Freire, cujo intuito era alfabetizar adultos, analfabetos funcionais e os que não

detinham qualquer conhecimento de leitura e de escrita, buscando com isso pautar-

se na realidade em que viviam e torná-los cidadãos capazes de se conscientizar a

respeito das questões sociais nas quais estavam inseridos.

21

No entanto, por ser um período em que se deflagrou o golpe militar, a

iniciativa foi sufocada, alegando-se tratar de uma proposta agitadora e, portanto,

uma ameaça à ordem pública. Por isso, no dia 15 de dezembro de 1967, o governo

institui o Movimento Brasileiro de Alfabetização, o Mobral1, com o objetivo de

substituir essa proposta, contendo cunho ideológico muito diferente, ou seja, a

aprendizagem da leitura e da escrita, bem como o ensino de cálculos, sem valer-se

de uma formação reflexiva a respeito das questões sociais que permeavam o país.

No mesmo ano em que houve o surgimento do Mobral, uma nova

Constituição Federal foi sancionada. Nela a União manteve sob sua

responsabilidade a centralização de todas as questões de cunho político, tendo

como diferencial a atribuição dada aos Estados de intervir junto aos Municípios

quando o assunto se relacionasse à aplicação de verbas no ensino primário. Além

disso, não se observam nesse Diploma Legal mudanças substanciais relacionadas

ao ensino.

Com a promulgação da Lei 5540/68, que assegurava a organização das

universidades, o ensino superior ganha autonomia didática, científica, administrativa

e financeira, apesar de seu intuito estar centrado também no controle da

comunidade estudantil que detinha, à ocasião, interesses que não se coadunavam

com os do regime imposto.

No período em que o país foi governado pelo General Emílio Garrastazu

Medici, o Brasil chegou ao auge da repressão, sendo considerado como os “anos de

chumbo”, frente à censura imposta aos meios de comunicação e o surgimento do

1 Segundo Romanelli (1986, p. 75), os índices de analfabetismo, em 1970, da população brasileira com idade acima de 15 anos, era de 33,01%, o que equivalia a mais de 17.936.887 pessoas. Em 1972, o número dessa mesma população correspondia a 16.406.000, o que representava uma taxa de 28,51%:

[...] segundo dados oficiais, nos últimos anos o Movimento Brasileiro para Alfabetização (MOBRAL) conseguiu progressos notáveis, embora se possa computar, no seu passivo, um rendimento escolar ainda bastante baixo. É isso, pelo menos, o que se nota, a julgar pelos índices apresentados pelo órgão, que conseguiu, entre 1970 e 1972, um número elevado de alfabetizados, isto é, 3.338.477. Mas, se se considerar que o número de inscritos nesse período foi de 7.138.253, verifica-se que o rendimento foi apenas de 47%.”

22

Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa

Interna, o DOI-Codi, cuja função era servir como centro de repressão e investigação

do governo.

Nessa ocasião, a Constituição Federal de 1967 é modificada pela Emenda

Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969, que dentre outras questões aumenta

para cinco anos o mandato do presidente e institui as eleições indiretas para o

Governo Estadual.

Em 1971, surge a nova Lei de Diretrizes e Bases, a 5692 (Anexo A), que

veio preencher a lacuna deixada pela Lei 5540/68, trazendo, dentre outras questões,

a garantia do ensino obrigatório às crianças e jovens com idade entre sete e

quatorze anos, bem como o estabelecimento da criação de um currículo comum

para o primeiro e segundo graus, abrindo margem para que a diversidade cultural

brasileira fosse contemplada dentro das escolas e em todo o território brasileiro.

Foi certamente uma fase em que o governo assegurou um período de

equilíbrio econômico no país, tendo em vista o aumento dos investimentos e

empréstimos vindos do exterior, porém, em função da recessão pela qual o mundo

passou, bem como a crise do petróleo, o Brasil começou a apresentar sérios

problemas de ordem econômica, o que gerou uma enorme insatisfação social e, por

isso, inicia-se em 1974, no governo do General Ernesto Geisel, um processo lento

de redemocratização no país.

Em 1979, o General João Baptista Figueiredo assume o comando do Brasil,

decretando a Lei da Anistia e o reestabelecimento do pluralismo partidário. Seu

governo é marcado pela alta inflação, pela dívida externa, bem como pela

dificuldade em diminuir a dívida pública do governo, que superava a arrecadação.

A educação profissional, com base na Lei nº 5692/71, foi universalizada no

2º grau e colocada no mesmo nível do ensino secundário, tendo em vista a

necessidade de diminuir a demanda de interessados em ingressar no ensino

superior. Com isso, surge um número elevado de cursos profissionalizantes, que não

davam acesso ao ensino que hoje se chama de 3º grau, necessitando para tanto

que o candidato voltasse ao ensino clássico ou científico, que correspondiam ao

ensino de 2º grau, mediante adaptação, o que aumentou ainda mais a diferença

23

social entre os mais abastados e os menos favorecidos, tendo em vista o não

acesso imediato destes últimos à universidade, frente às necessidades pecuniárias

que os obrigava a entrar logo no mercado de trabalho.

O fato é que o ensino secundário ficou descaracterizado pelo acréscimo

curricular do ensino profissionalizante e pela necessidade que detinha de fornecer

informações específicas à área e à função profissional em que o estudante poderia

atuar. Dessa forma, para resolver tal questão, foi promulgada a Lei 7044/82, que

tornou o ensino profissionalizante no 2º grau facultativo, fortalecendo, com isso, o

ensino secundário que deixou de agregar o ensino profissionalizante, ficando este

voltado para as instituições especializadas.

Com isso, o novo Diploma Legal, ou seja, a Lei 7044/82, substitui, dentre

outras, a expressão “qualificação para o trabalho” por “preparação para o trabalho”,

conforme constava no:

Art. 1º O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania. (BRASIL, 1971, grifo nosso).

passando a vigorar com a seguinte redação:

Art. 1º - O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, preparação para o trabalho e para o exercício consciente da cidadania. (BRASIL, 1982, grifo nosso).

No campo político, por volta de 1985, a sociedade, descontente com a

situação do país e com o governo militar, organiza campanhas para a realização de

eleições diretas, mas nesse momento o que de fato acontece é a eleição por meio

do voto indireto entre os candidatos Tancredo Neves e Paulo Maluf, sendo este

vencido por Tancredo, que não consegue assumir o governo, tendo em vista os

graves problemas de saúde que o levaram à morte nesse mesmo ano, assumindo

em seu lugar o vice-presidente José Sarney.

Isso marca o fim da ditadura militar que se impôs por mais de vinte anos em

nosso país, fazendo-se necessária a promulgação de uma nova Constituição, pois a

anterior não mais correspondia aos interesses do governo emergente.

24

Diante disso, e tendo em vista a preocupação em garantir o distanciamento

de tudo o que o país havia vivido no período ditatorial, a Assembleia Constituinte

promulgou, em 1988, a nova Carta Magna, apoiada nos princípios de liberdade,

igualdade e fraternidade que respaldaram a Revolução Francesa, amparada, à

ocasião, pelas ideias Iluministas que versavam pela conquista do direito e da

liberdade dos povos.

Tais ideias serviram de base e amparo, não só para a criação de uma nova

Constituição no Brasil, mas também respaldaram as Leis Básicas dos diversos

países que detêm como regime político a democracia.

Dessa forma, a Constituição Nacional apresenta características ideológicas

dessa Revolução, o que garantiu um novo direcionamento à educação que passou a

primar, não mais pelos objetivos de outrora, ou seja, atender aos interesses da

ditadura, mas resguardar o direito e a democracia assegurados pela nova

Constituição.

Assim, após oito anos de muitas discussões, emendas, tramitação no

Congresso, alegações de inconstitucionalidade, o primeiro projeto foi substituído

pela proposta do então deputado Darcy Ribeiro que, aprovada, entra em vigor no dia

20 de dezembro de 1996, a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a

Lei nº 9394 (Anexo B), que, em função do seu cunho democrático, apresenta, no

decorrer dos anos, modificações sensíveis em seu enunciado.

Com isso, pode-se depreender que a educação no Brasil sempre foi um

assunto que caminhou lado a lado com os interesses políticos no decorrer da nossa

História, iniciando com a colonização e caminhando até os nossos dias com

intervenções voltadas para os mais variados níveis educacionais.

Ao mesmo tempo, observa-se a perpetuação da falta de oportunidades de

um ensino igualitário para todos, o que assegurou a discrepância entre as pessoas

de níveis econômicos diferentes, dificultando o acesso dos mais pobres a uma

educação de qualidade, bem como a uma formação acadêmica de nível

reconhecido, o que contribui para o aumento do abismo entre essas camadas

sociais.

25

Isso se revelou já no início da colonização - por questões que envolviam as

dificuldades comuns à época. Muitos ficaram à margem do ensino ministrado no

Brasil, ampliando com isso o número de analfabetos e analfabetos funcionais já no

início da nossa História, o que se manteve por longos anos, mesmo porque muitas

das intervenções políticas que foram apresentadas no decorrer dos séculos não

priorizaram o ensino como algo fundamental, mas sim como objeto de interesses

para o atendimento das necessidades mais emergentes da sociedade.

Diante disso, não são poucos os problemas que a educação no Brasil

enfrentou e continua a enfrentar pois é fruto de interesses pouco lineares, o que se

observa inclusive nas leis promulgadas no decorrer de nossa História.

26

CAPÍTULO II - A LEI COMO UM GÊNERO TEXTUAL

“Quando dominamos um gênero textual, não dominamos uma forma linguística e sim uma forma de realizar linguisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares. Esta ideia foi defendida de maneira similar também por Carolyn Miller (1984). Como afirmou Bronckart (1999:103), “a apropriação dos gêneros é um mecanismo fundamental de socialização, de inserção prática nas atividades comunicativas humanas”, o que permite dizer que os gêneros textuais operam em certos contextos, como formas de legitimação discursiva, já que se situam numa relação sócio-histórica com fontes de produção que lhes dão sustentação além da justificativa individual.” (MARCUSCHI, 2008, p. 154)

Neste capítulo, discute-se gênero textual segundo Marcuschi (2008),

analisando-se as características do gênero lei, tais como forma estrutural, sequência

tipológica predominante e organização discursiva.

Destaque-se que, ao se apresentar a forma estrutural do gênero, propôs-se

o método da comparação e do contraste entre o gênero textual lei e alguns outros

gêneros do domínio discursivo jurídico, buscando-se demonstrar seus limites,

fronteiras e pontos comuns, mesmo porque, pensando-se em enunciado, é de

conhecimento geral que a sua materialização, que pode ocorrer de forma oral ou

escrita, emerge da necessidade de se estabelecer uma relação dialogal entre as

pessoas que compõem um mesmo grupo social e, portanto, as semelhanças e

diferenças surgem para facilitar o processo de comunicação.

Para tanto, o enunciador realiza escolhas pautadas em parâmetros pré-

determinados por meio dos quais faz uso de uma estrutura não aleatória,

obedecendo a uma convenção firmada entre os pares.

Segundo Marcuschi (2008, p. 155):

Os gêneros textuais são os textos que encontramos em nossa vida diária e que apresentam padrões sociocomunicativos característicos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas. [...] os gêneros são formas textuais escritas ou orais bastante estáveis, histórica e socialmente situadas.

Para Koch, (2011, p. 26):

[...] podemos dizer, numa primeira aproximação, que textos são resultados da atividade verbal de indivíduos socialmente atuantes, na qual estes coordenam suas ações no intuito de alcançar um fim social, de

27

conformidade com as condições sob as quais a atividade verbal se realiza. (KOCH, 2011, p. 26)

Esses gêneros se estabelecem mediante as suas respectivas formas de

comunicação, organizando-se em domínios discursivos cuja funcionalidade é

permeada pela relação entre enunciador e coenunciador e o uso que fazem desses

gêneros.

É o que afirma Maingueneau (1997, p. 30): “[...] um sujeito ao enunciar

presume uma espécie de 'ritual social da linguagem’, implícito, partilhado pelos

interlocutores.” (grifo do autor)

Assim, essa organização é uma convenção que se transmite de forma

empírica, assegurando com isso certa estabilidade e ordem a esses gêneros, pois

de acordo com Marcuschi (2008, p. 194):

[...] os domínios discursivos produzem modelos de ação comunicativa que se estabilizam e se transmitem de geração para geração com propósitos e efeitos definidos e claros. Além disso, acarretam formas de ação, reflexão e avaliação social que determinam formatos textuais que em última instância desembocam na estabilização de gêneros textuais.

Dessa forma, a lei, gênero escolhido para análise, está diretamente atrelada

ao domínio jurídico e tem por função a normatização de regras de conduta,

buscando com isso, regular as relações humanas e assegurar a paz no meio social.

Porém, mesmo sendo essa uma característica da lei, é certo que ao traçar

um paralelo entre ela e os diferentes gêneros que compõem o domínio jurídico, é

fácil observar que entre eles há semelhanças que poderiam comprometer o uso

adequado dos gêneros em contextos específicos de uso. Por isso, pensando no

corpus que comporá o objeto de análise e estudos do presente trabalho, fez-se

necessário encontrar ferramenta voltada para a área da educação que viabilizasse

uma percepção mais pormenorizada quanto ao emprego desses gêneros.

Dessa forma, conforme consta na Portaria nº 1042, datada de 17 de agosto

de 2012, o Ministério da Educação e Cultura (MEC), aprovou o “Manual de Gestão

de Documentos” com o intuito de “criar bases para a implantação de sistemas

informatizados unificados, bem como otimizar as rotinas administrativas e os

serviços de protocolo” que circulam no âmbito do Ministério. (BRASIL, 2012).

28

Essa Portaria vem ao encontro do que ora se trata, pois nela estão inseridos

diferentes gêneros que, em comparação com a lei, compõem o domínio jurídico, o

que nos possibilitará traçar um paralelo entre esses gêneros, observando as

semelhanças e diferenças neles existentes.

Para tanto, os documentos quanto à espécie, são considerados como:

Atos normativos: Expedidos por autoridades administrativas, com a finalidade de dispor e deliberar sobre matérias específicas. Ex.: medida provisória, decreto, estatuto, regimento, regulamento, resolução, portaria, instrução normativa, ordem de serviço, decisão, acórdão, despacho decisório e lei;

Atos enunciativos: São os opinativos, que esclarecem os assuntos, visando fundamentar uma solução. Ex.: parecer, relatório, voto e despacho interlocutório;

Atos de assentamento: São os configurados por registros, consubstanciando assentamento sobre fatos ou ocorrências. Ex.: apostila, ata, termo e auto de infração;

Atos comprobatórios: São os que comprovam assentamentos, decisões, etc. Ex.: traslado, certidão, atestado, cópia autêntica ou idêntica;

Atos de ajuste: São representados por acordos em que a Administração Pública Federal, Estadual ou Municipal é parte. Ex.: tratado, convênio, contrato, termos (transação, ajuste etc.); e

Atos de correspondência: Objetivam a execução dos atos normativos, em sentido amplo. Ex.: aviso, ofício, carta, memorando, mensagem, edital, intimação, exposição de motivos, notificação, telegrama, fax, alvará e circular. (BRASIL, 2012).

Sob essa perspectiva, compreendem-se os “atos normativos” como aqueles

executados pela Administração Pública a quem é atribuído poder, por meio da

norma jurídica, de criar regras abrangentes às ações e condutas, sem deixar

margem para equívocos àqueles que deverão se sujeitar a essas determinações em

contextos preestabelecidos por esses atos.

Segundo Branchier e Tesolin (2006, p. 62), o ato normativo corresponde a

ato administrativo que, de sua parte, “explicita o mandamento abstrato da lei que

deve ser observado pela Administração e pelos administrados.”

Já os “atos enunciativos”: “São todos aqueles em que a Administração se

limita a certificar ou atestar um fato ou emitir uma opinião sobre determinados

assuntos.” (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p. 61), não lhe competindo assegurar,

porém, o mérito de questões, nem mesmo a garantia de um direito.

29

Os “atos de assentamento”, além de se pautarem no registro por escrito de

certo evento, o que permite rememorar o ocorrido em outras circunstâncias,

viabilizam a junção em um mesmo documento de direito adquirido por meio legal.

No que diz respeito aos “atos comprobatórios”, eles asseguram a veracidade

dos registros que circulam pela esfera Administrativa.

Já os “atos de ajuste” estão relacionados aos acordos formais que a

Administração Pública realiza, mediante pacto ou convenção na qual ela está

diretamente inserida.

Por fim, os “atos de correspondência” estabelecem a relação de

comunicação entre a Administração e os que lhe são subordinados, determinando-

lhes o que devem ou não fazer, segundo os interesses da própria Administração.

Frente ao exposto, é possível traçar um paralelo entre os gêneros que

compõem os documentos que circulam por essa esfera, tomando a lei como a

estrutura basilar para essa comparação, fazendo uso de uma tabela2, a título de

exemplificação, na qual será possível demonstrar as semelhanças e diferenças

existentes entre eles.

Vale ressaltar que, mediante os conteúdos a serem tratados e as

necessidades específicas nos quais cada um desses Atos Administrativos são é

utilizado, é possível encontrar variações em suas estruturas, o que não

descaracteriza o gênero, competindo ao enunciador fazer uso, para mais ou para

menos, dos itens elencados horizontalmente na tabela.

Outra questão importante a ser salientada é que o presente trabalho está

diretamente atrelado ao estudo linguístico. Apesar disso, para a presente análise, o

respaldo dar-se-á de forma predominante em critérios jurídicos que

morfologicamente têm a mesma base etimológica, viabilizando com isso um diálogo

entre os vocábulos, tendo em vista estarem ligados ao ato de fala.

2 Uma tabela comparativa mais completa a respeito dos atos elencados pelo Manual de Gestão de

Documentos do Ministério da Educação encontra-se no Anexo “C”.

30

Qu

an

to à

esp

écie

Gênero Textual

Definição Competência

Parte Preliminar

Parte Normativa Parte Final

Fech

o

Iden

tifi

caç

ão

do

Sig

natá

rio

Refe

ren

da

Ep

ígra

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bu

lo

En

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Su

bseçõ

es

Art

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Alín

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Iten

s

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siç

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ran

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as

Clá

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igên

cia

Clá

usu

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evo

ga

ção

Gera

l

Pará

gra

fos

Incis

os

3 Segundo a Lei Complementar nº 95/98, que dispõe, dentre outras coisas, sobre a redação das leis, em seu art. 1º, parágrafo único, é possível lermos: “As disposições desta

Lei Complementar aplicam-se, ainda, às medidas provisórias e demais atos normativos referidos no art. 59 da Constituição Federal, bem como, no que couber, aos decretos

e aos demais atos de regulamentação expedidos por órgãos do Poder Executivo.” (BRASIL, 1998, gripo nosso). Dessa forma, nem todos os atos normativos apresentam

“Parte Geral e Específica”, Livros”, dentre outros, mesmo porque, como dito anteriormente a organização interna do ato dependerá da extensão do documento que está

sendo elaborado.

Ato

s N

orm

ativos

3

Lei

Norma escrita, elaborada por órgão competente, com forma estabelecida, pela qual as regras jurídicas são criadas, modificadas ou extintas. (GUIMARÃES, 2012, p. 159)

Poder legislativo x x x x x

x

x x X x x x

x x x

x x x x x x

x x x

Medida Provisória

Instrumento legislativo disponível ao chefe do Executivo exclusivamente para casos de urgência e relevância. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.105)

Editadas pelo Presidente da

República x x x x

x

x x x

x x x x x x

x x

31

Qu

an

to à

esp

écie

Gênero Textual

Definição Competência

Parte Preliminar

Parte Normativa Parte Final

Fech

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Iden

tifi

caç

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Sig

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rio

Refe

ren

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siç

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ran

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Clá

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ga

ção

Gera

l

Pará

gra

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Incis

os

Ato

enu

ncia

tivo:

Parecer

É a fórmula segundo a qual certo órgão ou agente consultivo expede opinião técnica sobre matéria submetida à sua apreciação. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p. 62)

Órgãos consultivos da Administração.

x x

x

Ato

s d

e A

ssen

tam

ento

Apostila

Aditamento a ato enunciativo ou declaratório de uma situação anterior criada por lei. É utilizado, também nos casos de retificação e atualização de dados funcionais, averbando abaixo dos textos ou no verso de decretos e portarias pessoais [...]

Autoridade ou Chefia

Administrativa x

x

32

Qu

an

to à

esp

écie

Gênero Textual

Definição Competência

Parte Preliminar

Parte Normativa Parte Final

Fech

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Iden

tifi

caç

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Sig

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rio

Refe

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Clá

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ção

Gera

l

Pará

gra

fos

Incis

os

Ato

de A

ssenta

men

to

Ata Resumo dos acontecimentos de uma reunião para efeito de documentação. (GUIMARÃES, 2012, p. 52).

Autoridade administrativa e

secretário da administração e,

se for o caso, todos os

presentes no momento do

ato.

x

x x x

Ato

co

mpro

bató

rio

Traslado Nome dado à cópia do que está escrito no livro de notas. (GUIMARÃES, 2012, p. 249).

Tabelião

x

33

Qu

an

to à

esp

écie

Gênero Textual

Definição Competência

Parte Preliminar

Parte Normativa Parte Final

Fech

o

Iden

tifi

caç

ão

do

Sig

natá

rio

Refe

ren

da

Ep

ígra

fe

Em

en

ta

Pre

âm

bu

lo

En

un

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do

do

ob

jeto

Part

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Liv

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Tít

ulo

s

Cap

ítu

los

Seçõ

es

Su

bseçõ

es

Art

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Incis

os

Alín

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s

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ran

sit

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as

Clá

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la d

e v

igên

cia

Clá

usu

la d

e r

evo

ga

ção

Gera

l

Pará

gra

fos

Incis

os

Ato

de A

juste

Contrato

É a convenção estabelecida entre duas ou mais pessoas para constituir, regular ou extinguir entre elas uma relação jurídica. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.66)

Autoridade administrativa e

outra(s) entidade(s)

x

x

x x x

x

Ato

s d

e

Corr

espondência

Aviso Comunicação ao público sobre assunto do seu interesse.

Titulares de órgãos e

entidades. x x x x x

Circular

É a fórmula mediante a qual os superiores transmitem ordens uniformes aos respectivos subordinados sobre certo serviço. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.62)

Determinados Funcionários

x x x x

Fonte: Autoria própria

34

Todo o paralelo desenvolvido anteriormente nos mostra que há documentos

com uma forma estrutural muito semelhante ao gênero lei, como é o caso dos atos

normativos, mas de modo algum são totalmente iguais, quer pela competência de

quem subscreve o ato, quer pela funcionalidade atribuída ao gênero.

Além disso, os registros realizados na tabela, apesar de convencionais aos

gêneros ali descritos, podem sofrer alterações, mesmo porque sujeitos às situações

reais, que trazem características únicas das quais o enunciador deverá valer-se com

bom senso ao utilizar-se dessas ferramentas dadas pela língua na articulação do

gênero.

Com isso, a mobilidade típica das relações que se estabelecem entre o

enunciador e a língua pode trazer entre um documento e outro do mesmo gênero

variações, o que não compromete a redação, nem mesmo as características que

diferem um gênero do outro, mesmo porque, cada um tem uma especificidade

dentro do contexto de uso.

Outra questão que vale ressaltar está atrelada ao uso da nomenclatura

atribuída às partes que compõem toda organização estrutural dos atos

administrativos tratados neste capítulo.

Como a lei serviu de base para a observação dos gêneros elencados, optou-

se por desenvolver uma aproximação entre ela e os demais gêneros, pautando-se

nas semelhanças e diferenças presentes entre cada um deles, sem se ater, de forma

plena, no que diz respeito ao nome atribuído para os elementos que compõem os

demais gêneros, que não a lei.

A título de exemplificação quanto ao gênero textual aviso, pode-se observar

que, em sua estrutura, ementa recebe o nome de objeto, apesar de ambas as

expressões estarem relacionadas ao resumo do assunto, e o que poderia parecer

artigos assemelha-se mais a itens, pois estariam relacionados a uma lista que

serviria para elencar assuntos relevantes entre o enunciador e o coenunciador.

Apesar das diferenças que podem existir entre uma e outra expressão, como

foi dito anteriormente, a lei é o objeto dos estudos aqui desenvolvidos, por isso

priorizaram-se as suas especificidades em detrimento das especificidades dos

demais gêneros.

35

Partindo-se desse pressuposto, a norma jurídica apresenta uma estrutura

regulamentada pela Lei Complementar Federal (LC) nº 95/98.

Nela, a parte preliminar é composta pela: epígrafe, ementa, preâmbulo,

enunciado do objeto e indicação do âmbito de aplicação das disposições normativas.

A epígrafe é uma das características da lei, assegurando a identidade da

norma por meio de um número não aleatório que a define, seguido pela data de sua

publicação, devendo ser escrita com letras maiúsculas, pois, conforme o art. 4º, da

LC nº 95/98: “A epígrafe, grafada em caracteres maiúsculos, propiciará identificação

numérica singular à lei e será formada pelo título designativo da espécie normativa,

pelo número respectivo e pelo ano de promulgação.” No caso das Leis em estudos,

ela se apresenta da seguinte forma:

LEI Nº 5.692, DE 11 DE AGOSTO DE 1971.

Epígrafe

LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996.

A ementa, escrita logo após a epígrafe, traz um resumo sucinto do assunto e

tem por fim facilitar a identificação da lei pelos profissionais da área do direito, bem

como àqueles que desejam consultar o assunto por ela tratado, devendo ser escrita

com caracteres que a evidenciem entre as demais informações:

Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus, e dá outras providências. (BRASIL, 1971)

Ementa

Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. (BRASIL, 1996)

No preâmbulo é apresentado o órgão ou instituição a quem compete realizar

o ato, seguido da base legal que garante essa prerrogativa. É o que se pode

36

observar nas duas Leis que mantiveram a mesma estrutura redacional em seus

preâmbulos:

Preâmbulo

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: (BRASIL, 1971 e 1996).

A organização interna da lei varia conforme a quantidade de conteúdos que

normatizará a respeito de um mesmo assunto, pois numa norma jurídica na qual há

muito em que se tratar, esses conteúdos se subdividem em partes, compondo

blocos temáticos.

Guimarães (2012, p. 49), ao definir a expressão artigo, revela-nos quais

seriam esses blocos:

Artigo - Elemento estrutural básico da lei. Esta, quando volumosa, divide-se assim: Livros, Títulos, Capítulos, Seções, Subseções, e estas, em artigos, que, por sua vez, compreendem, conforme o caso, parágrafos, incisos e alíneas. (GUIMARÃES, 2012, p. 49)

Nas leis, essa subdivisão acontece no decorrer de sua estrutura,

aparecendo pela primeira vez logo abaixo do preâmbulo como sendo o “enunciado

do objeto” (BRASIL, 1998):

Enunciado do objeto

CAPÍTULO I

Do Ensino de 1º e 2º graus

(BRASIL, 1971)

TÍTULO I

DA EDUCAÇÃO

(BRASIL, 1996)

Sob esse aspecto, a Lei nº 5692/71 difere da 9394/96, tendo em vista ser

organizada em oito capítulos, enquanto que nesta última o enunciador/legislador

optou por estruturá-la em nove títulos, sendo que no Título V, que trata “Dos níveis e

das modalidades de educação e ensino”, há cinco capítulos e no segundo capítulo,

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cinco seções. Ao todo, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) foi constituída por oitenta e

oito artigos e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN)4, noventa

e dois. Vale lembrar que tanto uma Lei quanto a outra sofreram modificações em

seus artigos no decorrer do período de vigência, o que é possível ainda acontecer

na Lei que se encontra em vigor.

Outra questão trazida pela LC nº 95/98, em seu art. 7º é que no primeiro

artigo deve constar o foco central do ordenamento jurídico, bem como o âmbito no

qual ele se aplicará, valendo-se para tanto dos seguintes princípios:

I - excetuadas as codificações, cada lei tratará de um único objeto;

II - a lei não conterá matéria estranha a seu objeto ou a este não vinculada por afinidade, pertinência ou conexão;

III - o âmbito de aplicação da lei será estabelecido de forma tão específica quanto o possibilite o conhecimento técnico ou científico da área respectiva;

IV - o mesmo assunto não poderá ser disciplinado por mais de uma lei, exceto quando a subseqüente se destine a complementar lei considerada básica, vinculando-se a esta por remissão expressa.

Dessa forma, no art. 1º da LDB, é possível ler:

Art. 1º O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania. (BRASIL, 1971),

enquanto que na LDBEN, observa-se que essa questão aparece no § 1º e não no

caput, onde é possível ler: “Art. 1º, § 1º: Esta Lei disciplina a educação escolar, que

se desenvolve, predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias.”

(BRASIL, 1996).

Outra característica dessa unidade básica, conforme art. 10 da LC nº. 95/98

e seus incisos, é que no texto legal, ela deverá ser abreviada da seguinte forma:

“Art.”, e representada por números que seguem a ordem dos ordinais até o nono,

quando passa a ser lida na forma cardinal. Além disso, por vezes são sucedidas por

um ou mais parágrafos, cuja função é especificar ou esclarecer aquilo que consta no

4 Tanto a Lei 5692/71 quanto a 9394/96, como já dito anteriormente, foram Leis que tinham como foco central a normatização das Diretrizes e Bases da Educação no Brasil. Apesar de não ser pacífico o uso de siglas diferentes para especificá-las, no presente trabalho, relacionaremos LDB para especificar a Lei 5692/71 e LDBEN quando tratarmos da 9394/96, o que permitirá a diminuição na repetição dos termos.

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caput. Quando se faz necessário apenas um parágrafo para garantir a

regulamentação do assunto tratado, ele é denominado como parágrafo único.

Havendo mais de um, eles são representados pelo sinal gráfico “§”, atribuindo-lhes

um número cuja leitura segue a mesma regra dos artigos.

Os incisos podem ser utilizados tanto para detalhar as questões referentes

ao conteúdo do artigo, quanto ao conteúdo trazido no parágrafo, e sua

representação dá-se por meio de números em algarismo romano.

As alíneas são sinalizadas por letras minúsculas e vêm logo em seguida ao

inciso, tratando de questões que dizem respeito a este último, dando continuidade

ao assunto ali discorrido.

Já os itens são representados por números cardinais e seguem logo após as

alíneas.

A norma jurídica traz, ainda, via de regra, a “Parte Final”, composta por

“Disposições transitórias, Cláusula de vigência e Cláusula de revogação”, conforme

art. 3º, inciso III, da LC nº. 95/98.

As “Disposições transitórias” referem-se aos assuntos especiais

relacionados à nova lei, com foco na aplicação do direito. Nas Leis em estudo, elas

se apresentam da seguinte forma:

CAPÍTULO VIII

Das Disposições Transitórias

Art. 71. Os Conselhos Estaduais de Educação poderão delegar parte de suas atribuições a Conselhos de Educação que se organizem nos Municípios onde haja condições para tanto. [...] (BRASIL, 1971)

Disposições transitórias

TÍTULO IX

DAS DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Art. 87. É instituída a Década da Educação, a iniciar-se um ano a partir da publicação desta Lei. [...] (BRASIL, 1996)

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As “Cláusulas de vigência” estipulam o prazo para que a lei entre em vigor,

garantindo, por vezes, a quem de direito, um período no qual ela possa ser

compreendida e divulgada. Em sua elaboração, é importante que se tome por base

o que consta no art. 8º da LC 95/98, que recebeu em seus parágrafos nova redação

por meio da LC nº 107, de 26 de abril de 2001:

Art. 8o A vigência da lei será indicada de forma expressa e de modo a

contemplar prazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, reservada a cláusula "entra em vigor na data de sua publicação" para as leis de pequena repercussão.

§ 1o A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam

período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subseqüente à sua consumação integral.

§ 2o As leis que estabeleçam período de vacância deverão utilizar a cláusula

‘esta lei entra em vigor após decorridos (o número de) dias de sua publicação oficial’ ". (NR)

CCláusulas de vigência

Art. 88. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação. (BRASIL, 1971)

Art. 91. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. (BRASIL, 1996)

A Cláusula de Revogação, que deve vir separada da Cláusula de Vigência,

tem por fim declarar sem efeito a norma anterior, quer total, quer parcialmente,

devendo conter os motivos que ocasionaram a substituição da norma, sem poder

fazer uso de expressões genéricas como: “Ficam revogadas as disposições em

contrário”.

Art. 87. Ficam revogados os artigos de números 18, 21, 23 a 29, 31 a 65, 92 a 95, 97 a 99, 101 a 103, 105, 109, 110, 113 e 116 da Lei n. 4.024, de 20 de dezembro de 1961, bem como as disposições de leis gerais e especiais que regulem em contrário ou de forma diversa a matéria contida na presente Lei. (BRASIL, 1971)

Cláusula de revogação

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Art. 92. Revogam-se as disposições das Leis nºs 4.024, de 20 de dezembro de 1961, e 5.540, de 28 de novembro de 1968, não alteradas pelas Leis nºs 9.131, de 24 de novembro de 1995 e 9.192, de 21 de dezembro de 1995 e, ainda, as Leis nºs 5.692, de 11 de agosto de 1971 e 7.044, de 18 de outubro de 1982, e as demais leis e decretos-lei que as modificaram e quaisquer outras disposições em contrário. (BRASIL, 1996)

A conclusão da redação da lei dá-se por meio do fecho, da assinatura e da

referenda que, apesar de não serem mencionados na CF nº 95/98, fazem parte de

todo ordenamento jurídico.

Vale ressaltar que, segundo o manual de redação da Presidência da

República (BRASIL, 2002, p. 94), o fecho na lei deve conter referência à Declaração

da Independência e Proclamação da República, o que não foi contemplado na Lei

5692/71.

Fecho Brasília, 20 de dezembro de 1996; 175º da Independência e 108º da República. (BRASIL, 1996)

A assinatura da autoridade competente é posta ao final da norma e tem por

objetivo torná-la válida, sendo acompanhada logo abaixo pela referênda que,

segundo art. 87 da Constituição Federal, em seu § 1º e inciso I, deve estar assinado

pelo Ministro do Estado, e corresponde à aceitação de corresponsabilidade pela

execução do que consta no ordenamento jurídico.

Assinatura

EMÍLIO G. MÉDICI (BRASIL, 1971)

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO (BRASIL, 1996)

Referenda

Jarbas G.Passarinho Júlio Barata

(BRASIL, 1971)

Paulo Renato Souza (BRASIL, 1996)

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Por fim, a lei é publicada em veículos oficiais, que possibilitam a ciência de

todos, não viabilizando a ninguém a prerrogativa de eximir-se da culpa por meio da

alegação de desconhecimento de sua vigência, pois a cada um é atribuída a

responsabilidade de inteirar-se das regras que são exigidas dentro daquele território

no qual se encontre.

Sobre essa questão, vale lembrar a importância da publicação da lei,

considerando que a apresentação desse tipo de enunciado garante-lhe credibilidade

e viabiliza uma ação responsiva naquele que dela deve fazer uso, pois tem o fim,

como dito anteriormente, de estabelecer uma relação de ordem e submissão ao

coenunciador.

Dentro desse contexto, um ordenamento jurídico que é publicado num

romance literário, por exemplo, não teria a mesma confiabilidade garantida pela

imprensa oficial, mesmo porque, segundo Maingueneau (2011, p. 21), as “condições

materiais de apresentação” do enunciado, desempenham um papel essencial para

que ele apresente credibilidade perante o coenunciador. Diante disso, a lei não será

digna de fé, caso sua divulgação esteja em um portador diferente daquele

estabelecido pelo meio, ou seja, a imprensa oficial, afinal:

Não basta identificar esse enunciado como uma proibição regulamentar; é preciso, também, presumir que ele é “sério”, que a instância que o comunica tem realmente a intenção de significar o que ele significa, de agir de uma determinada maneira sobre o destinatário. (MAINGUENEAU, 2011, p. 22)

Diante disso, é certo que as Leis ora em estudo, apresentam como

característica também esse cunho autoritário, comum ao gênero, associando-se ao

contexto da época, coadunando-se com o regime político específico de cada período

em que entraram e se mantiveram em vigor, qual seja: o período ditatorial, a Lei

5692/71, e o período democrático, a Lei 9394/96, interferindo diretamente, como é

previsto, no próprio discurso da norma.

Nessa perspectiva, a conotação autoritária da lei mescla-se com a

característica do regime que vigorou no período de 1971 até o advento da nova Lei,

em 1996, mesmo porque a ditadura tem por princípio ser um governo autoritário, que

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restringe, e até mesmo suprime, os direitos individuais por deter a supremacia do

poder centralizador.

Na norma atual, é possível depreender que a característica autoritária da lei

mantenha-se, apesar de o regime ser o democrático, mesmo porque essa é uma

característica comum nos ordenamentos jurídicos.

Essa característica é o que Orlandi (1996, p. 157) intitula como "tipo

autoritário”, devido ao seu caráter impositivo, amparado na obediência, no respeito e

na submissão do coenunciador, sem que ele possa manifestar sua opinião,

competindo-lhe aceitação e plena adesão ao que é estabelecido. Com isso, o

discurso que tem como característica ser um ato de linguagem, de estabelecer uma

relação entre os interlocutores, perde de certa forma, essa especificidade, pois:

O que acontece é que - sob a égide do Discurso Autoritário – se desarticula o característico da interlocução que é a articulação locutor-ouvinte, assim como se rompem as outras articulações que daí decorrem e que se organizam sob a forma de dicotomias. No interior dessas dicotomias, se passa a olhar através de um de seus pólos [...] colocando-o como fundamental. Primeiro se dicotomiza e depois se iguala tudo através de um dos lados. Dessa forma, o parcial se absolutiza. E a forma do discurso autoritário passa a ser a forma da linguagem em geral [...].

Sob essa perspectiva, a lei é um discurso autoritário por excelência, pois

nela se encontra aquele a quem compete a sujeição à norma legal,

independentemente dos interesses e discordâncias que possa apresentar perante o

conteúdo nela impresso.

Dessa forma, pode-se observar que tanto a 5692/71 quanto a 9394/96, por

se tratarem de normas jurídicas, mantiveram essa característica autoritária no

interior de seu texto e um exemplo disso é como essas normas tratam a gratuidade

do ensino que antecede a graduação.

Para a Lei 5692/71, o ensino gratuito, independente do nível socioeconômico

no qual o estudante se encontrasse, restringia-se à faixa etária de 7 a 14 anos, não

se estendendo àqueles que, com maior idade, desejassem continuar os estudos,

matriculando-se no Ensino de 2º grau, salvo se provassem a falta de condições

econômicas e que, além disso, apresentassem certas especificidades estabelecidas

pelo próprio ordenamento jurídico. É o que se pode constatar no art. 44, da Lei:

Nos estabelecimentos oficiais, o ensino de 1º grau é gratuito dos 7 aos 14 anos, e o de níveis ulteriores sê-lo-á para quantos provarem falta ou

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insuficiência de recursos e não tenham repetido mais de um ano letivo ou estudos correspondentes no regime de matrícula por disciplinas. (BRASIL, 1971)

Já na Lei 9394/96, em sua redação original, determinava-se a ampliação

gradativa da gratuidade do ensino para esse mesmo nível de escolaridade,

conforme é possível depreender ao ler o art. 4, inciso II, no qual constava: “O dever

do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: II -

progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;” (BRASIL,

1996), uma conquista que somente se efetivou a partir de 28 de outubro de 2009,

com a publicação da Lei 12061, que passou a assegurar a gratuidade do ensino

médio, conforme pode ser constatado na nova redação dada ao art. 4, em seu inciso

II: “universalização do ensino médio gratuito;” (BRASIL, 2009).

Com isso, somente depois de trinta e sete anos os alunos ganharam a

possibilidade de continuar os estudos sem qualquer ônus ou prova, prerrogativa que

não foi dada àqueles que poderiam continuar os estudos entre os anos de 1971 e

2008, o que evidencia o autoritarismo advindos das normas jurídicas em tela.

Outra característica típica da lei é a necessidade que ela tem de ser

abrangente e, portanto, capaz de atingir a todos, sem se ater aos pormenores

comuns das relações interpessoais, competindo nesse caso, aos profissionais da

área a interpretação e o melhor encaminhamento nas situações pontuais que estão

sob a égide do referido ordenamento jurídico.

Vale ressaltar que a lei é, como assegura Lima (1977, p. 43): “[...] a forma

por excelência pela qual se revela o direito objetivo5 é a fonte principal do direito.”, e

dentro dessa perspectiva o que se pode salientar é que ela nasce da necessidade

social de regulamentação das condutas, como afirma Bevilaqua (1976, p. 17-18):

O direito, regra social obrigatória, é o que se costuma chamar direito objetivo, expressão das necessidades dos grupos sociais, sob a forma de preceitos coativos. Esta regulamentação dos interesses humanos, segundo a ideia de justiça dominante no momento, constitui, quando considerada em seu conjunto, uma sistematização das energias sociais, que os juristas alemães, com muita propriedade, denominam ordem jurídica, o que importa dizer: vida em comum, pela proporcionada satisfação das necessidades e pela orientação cultural dos impulsos (grifo do autor).

5 Por direito objetivo, compreendemos como sendo as normas de conduta impostas a todos, dentro da esfera

jurídica, visando regrar as relações humanas, tendo em vista a relevância que essas regras apresentam para

uma determinada sociedade.

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Com isso o que se observa é a necessidade do meio social em deter regras

abrangentes, de tal forma que atinja a todo e qualquer membro da sociedade,

estendendo-se inclusive àqueles que não residem no local onde ela vigora, o que

garante a validação da lei, sem a qual ficaria comprometida e, com ela, toda a ordem

social.

Dessa forma, a sanção vem servir como respaldo à ação coercitiva da

norma, buscando coibir, por meio da punição, aqueles que não cumprirem a

determinação nela prevista, o que só é possível por ser a lei emanada de uma

autoridade reconhecida que a legitima, e, sem a qual, o ordenamento não teria força

para empreender esse caráter coercitivo que subjuga os membros da sociedade de

modo a fazer ou deixar de fazer as determinações estipuladas pela norma jurídica. É

o que nos assegura Lima (1977, p. 46), ao afirmar que:

A lei é obrigatória; emana da autoridade pública; é sancionada pela força e estabelecida permanentemente e com caráter geral.

a) A lei é obrigatória. A obrigatoriedade é o máximo efeito da lei. Consiste no poder de regrar a vontade humana, de modo que o homem tem que agir sob a coação de uma vontade superior à sua.

A obrigatoriedade supõe, portanto, uma vontade superior que manda e uma vontade inferior que obedece.

b) [...]

c) A lei é sancionada pelo poder público. Sanção, neste caso é a pena imposta ao transgressor.

A lei é sempre acompanhada de uma sanção (pena) para assegurar-lhe o respeito e a observância. Não pode haver, portanto, lei sem sanção (grifo do autor).

Os ordenamentos jurídicos que, segundo Dolz (2010, p. 52), estão

diretamente inseridos nos domínios sociais de comunicação, têm a instrução e a

prescrição como características típicas do gênero, tendo em vista determinar

padrões de conduta que regulam o comportamento humano, sob a supervisão dos

próprios pares. Isso nos leva a crer que, enquanto em estudos, e no período de

tramitação, a lei com características democráticas assim se mantém, deixando de

sê-las após a promulgação, quando passa a ser obrigatória.

Assim, os tempos verbais utilizados na norma jurídica são, segundo LC nº

95/98, em seu art. 11, inciso I, alínea “d”, preferencialmente, o presente ou o futuro

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do presente, no modo indicativo, o que assegura a uniformidade e a ordem direta

indispensável na construção das orações.

É no caso dos artigos 15, da 5692/71 e 24, inciso III, da Lei 9394/92, tratam

a respeito da dependência, ou seja, da possibilidade dada ao aluno, retido

parcialmente naquele ano letivo em uma ou outra disciplina, bem como ao estudante

que foi transferido de outra instituição na qual a matéria não havia sido contemplada,

possibilitando a esse aluno seguir para o ano subsequente sem refazer as matérias

nas quais conseguiu êxito. Para tanto, em sua redação o enunciador/legislador

emprega o verbo “poder”, conjugando-o, em uma Lei, no futuro do presente e, na

outra, no presente do indicativo, pois essas são estruturas atemporais que

estabelecem relação de hipótese, ou de previsão

Art. 15 – O regimento escolar poderá admitir que no regime seriado, a partir da 7.ª série, o aluno seja matriculado com dependência de uma ou duas disciplinas, áreas de estudo ou atividades de série anterior, desde que preservada a seqüência do currículo. (BRASIL, 1971, grifo nosso)

e

Art. 24, Inciso III – nos estabelecimentos que adotam a progressão regular por série, o regimento escolar pode admitir formas de progressão parcial, desde que preservada a sequencia do currículo, observadas as normas do respectivo sistema de ensino; (BRASIL, 1971, grifo nosso)

Vale ressaltar que de fato a prerrogativa da dependência ou progressão

parcial, como é tratada na nova legislação, é comum ser observada somente em

nível de graduação, tendo em vista a dificuldade que isso acarretaria no ensino

regular e na logística dessa proposta nas unidades escolares, reservando ao

estudante do ensino fundamental e médio a reprovação total do ano letivo ou o

recurso da promoção pelo consentimento do Conselho de Escola que, por sua vez,

tem poder deliberativo sobre essa questão.

Além do todo exposto, como demonstrado no quadro comparativo,

representado no início do presente capítulo, a lei detém uma forma estrutural que se

materializa por meio de uma organização interna semelhante à de outros gêneros do

domínio jurídico, diferenciando-se quer pela função que cada um desses gêneros

tem em sua aplicação efetiva, quer pela função pública de quem detém o direito de

lançar mão e fazer uso deles.

46

Dessa forma, para os gêneros cumprirem a função social a que se destinam,

eles são compostos por um ou mais tipos textuais que viabilizam a organização

discursiva presente no interior do enunciado. Assim, é possível encontrar leis que

revelam em seus artigos estruturas tipológicas ora argumentativas, ora descritivas

ou, por vezes, uma mescla delas.

Sob essa perspectiva, as leis, que geralmente apresentam o predomínio da

objetividade em sua essência, não raro são voltadas para o convencimento do

coenunciador, ao optarem por escolhas lexicais nas quais a argumentação é o foco

central do enunciador, preocupando-se em demonstrar o quê e o porquê de sua

regulamentação, visando a persuadir aqueles a quem a elas se submeterão.

Por outro lado, as normas podem apresentar-se mais descritivas,

organizando-se com o cunho de esmiuçar as diferentes especificidades da lei,

determinando passo a passo as ações que deverão ser observadas por aqueles que

lhes são sujeitos.

Isso não impede a possibilidade de elas se pautarem, ora em um aspecto

tipológico, ora em outro, no decorrer do enunciado legal, valendo, nesse caso, da

intencionalidade do enunciador/legislador.

A título de exemplificação, é possível observar que a Lei 5692/71 apresenta

maior objetividade, se comparada à 9394/96, revelando-se menos descritiva e

valendo-se de pouca argumentação em alguns de seus artigos, que se apresentam,

por isso, mais concisos, se comparados àquela que ainda se encontra em vigor. É o

caso dos artigos relacionados aos alunos que apresentam alguma necessidade

educacional especial:

Art. 9.º - Os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se encontrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados deverão receber tratamento especial de acordo com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação. (BRASIL, 1971).

e

Art. 58 – Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para educandos portadores de necessidades especiais.

Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais:

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I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades;

II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;

III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;

IV - educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;

V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.

Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder Público.

Parágrafo único. O Poder Público adotará, como alternativa preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições previstas neste artigo. (BRASIL, 1996).

Os artigos anteriormente transcritos não deixam dúvidas a respeito do

tratamento dado pelos dois ordenamentos jurídicos para aqueles que necessitam de

atendimento especial nas unidades escolares. Enquanto a Lei 5692/71 revela a

preocupação do enunciador/legislador em garantir acesso aos alunos portadores de

necessidades educacionais especiais, por meio de normas a serem estabelecidas

pelos órgãos competentes, a 9394/96 reserva um Capítulo inteiro para isso, o que

demonstra a preocupação em detalhar, prontamente, o que se espera na Federação

das unidades escolares para esses mesmos alunos, demonstrando ser esta Lei mais

descritiva, se comparada à anterior.

Dessa forma, é possível observar que o gênero textual lei apresenta uma

estrutura que se assemelha a outros gêneros do discurso jurídico e que essa

estrutura varia conforme a necessidade do enunciador/legislador.

Com isso, passar-se-á ao estudo das estruturas linguísticas inerentes ao

gênero.

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CAPÍTULO III - AS LEIS DE DIRETRIZES E BASES: COMPARAÇÃO

E CONTRASTE

Sem qualquer pretensão de esgotar as possibilidades de leitura e análise

das Leis ora em estudo, no presente capítulo observar-se-á a forma estrutural e a

microestrutura dessas normas, valendo-se assim de artigos6 que trazem pontos de

convergência entre si, apesar de apresentarem também divergências que se

amparam no contexto e na escolha das expressões realizada pelo

enunciador/legislador.

Assim, utilizar-se-á da Estilística, um dos ramos de estudo da Linguística,

que tem como fim a análise da língua por meio das opções daquele que se apropria

dessa ferramenta para a produção do enunciado.

Segundo Martins (2000, p. 22-23) a Estilística:

[...] advém do seu objetivo de explicar os usos da linguagem que ultrapassam a função puramente denotativa, com a maior exatidão e sem o propósito normativo que caracterizou a Retórica. Contudo, não se logrou ainda um método rigoroso que assegure sua condição de ciência e o seu objeto não está satisfatoriamente delimitado.

O estudo que ora apresentamos trata da expressividade da Língua Portuguesa, isto é, os meios que ela oferece aos que falam ou escrevem para manifestarem estados emotivos e julgamento de valor, de modo a despertarem em quem ouve ou lê uma reação também de ordem afetiva.

Para Cardoso (2009, p. 68):

Um dos objetivos da Estilística é justamente analisar a escolha feita pelo enunciador, dentre os elementos linguísticos disponíveis, verificando-se de que maneira se consegue com ela efeitos estéticos e expressividade, sobretudo, tentando se chegar à intenção do enunciador por meio do estilo encontrado em seu texto.

O Dicionário Houaiss (2009) retrata a Estilística como o “ramo da linguística

que estuda a língua na sua função expressiva, analisando o uso dos processos

fônicos, sintáticos e de criação de significados que individualizam estilos”.

De fato, é ela um meio do qual o linguista pode lançar mão para desenvolver

a análise de um enunciado, o que viabiliza a observação das escolhas realizadas

6 A proposta de exposição de nove quadros, apesar de aparentemente longos, representa apenas

cinco por cento do material referente aos artigos.

49

pelo enunciador que podem variar conforme o gênero, o público a quem é dirigido,

bem como a situação que permeia a enunciação.

Para tanto, o especialista pode perceber como o enunciado se desenvolve,

como são empregados os períodos, as opções lexicais e, portanto, os efeitos de

sentido que ocasionam as expressões empregadas, bem como os valores que lhe

são atribuídos, pois atenta-se aos aspectos morfológicos da língua que, por sua vez,

volve-se para a expressividade no decorrer do discurso.

Essa escolha pode estabelecer a relação dialogal entre os interlocutores,

competindo ao enunciador colocar diante de si o coenunciador, ou seja, a pessoa a

quem se dirige, pois como assegura Benveniste (1989, p. 84):

O locutor se apropria do aparelho formal da língua e enuncia sua posição de locutor por meio de índices específicos [...]. Mas, imediatamente, assim que se declara locutor e assume sua língua, ele introduz o outro diante de si, qualquer que seja o grau de presença que atribua ao outro. Toda enunciação, explícita ou implícita, é uma alocução, ela postula um alocutário.

Com isso, o enunciador, de posse do instrumento linguístico, passa a

produzir um enunciado que está centrado no contexto da comunicação. É nesse

instante que o momento da enunciação acontece, pois o tempo, o local e as

condições da enunciação são os amálgamas para a realização desse propósito, que

jamais se repete, pois logo o momento presente se esvai e com ele, um novo

instante se inicia. É o que afirma Maingueneau (2011, p. 56): “enunciado se opõe a

enunciação da mesma forma que o produto se opõe ao ato de produzir” (grifos do

autor).

Partindo desse pressuposto, observar-se-ão artigos das Leis, trazendo em

relevo as relações que são estabelecidas entre eles, suas semelhanças e as

diferenças, valendo-se para tanto de um quadro comparativo, começando com a

ementa das duas normas jurídicas que servirão de objeto de estudo:

Lei 5692/71

Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus, e dá

outras providências.

50

Lei 9394/96

Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.

Quadro 01 - O Escopo das Leis

Como é comum, a exemplo dos demais ordenamentos jurídicos, tanto a Lei

5692/71 quanto a 9394/96 trazem no início de seus textos uma ementa a respeito

daquilo que comporá o assunto ali discorrido, viabilizando com essa breve

transcrição nortear o leitor, evitando com isso que precise ler a lei para cientificar-se

a respeito do seu conteúdo.

Nessas ementas é possível observar que o enunciador opta pelo emprego

de dois verbos: “fixar” e “estabelecer”, que se encontram conjugados na terceira

pessoa do singular, no presente do indicativo, tempo verbal comum na redação de

leis, designando uma ação atemporal e, portanto, que se perpetua no tempo,

remetendo-se à ideia de duração e prolongamento, sendo introduzida prontamente

no momento em que é pronunciada.

Ao comparar esses dois verbos, é possível observar que a LDB utiliza o

termo “fixa” remetendo a uma determinação impositiva que, se comum às leis, mais

ainda quando se reporta aos aspectos históricos que ampararam a constituição

dessa norma. Diferentemente da expressão empregada pela LDBEN que, em

sentido literal, determina estar o ordenamento jurídico em vigor e, portanto,

instituído, firmado, revelando outra interpretação: a de assegurar o início, o ajuste e,

portanto, o pacto não unilateral.

Com isso, o enunciador busca atenuar a imposição típica do gênero, diluindo

o sentido da norma posta e indicando uma construção estabelecida pelas partes.

Outra questão que é possível salientar refere-se às expressões “diretrizes e

bases”, que demonstram a preocupação do enunciador/legislador de estabelecer

nas Leis o caminho a ser percorrido para atingir o intento, valendo-se assim de um

sustentáculo que serviria de apoio e, por meio do qual, toda a estrutura se ergueria.

Com isso, é possível perceber que o termo “diretrizes” refere-se ao “esboço”,

à “diretiva” (HOUAISS, 2009), à “linha reguladora de um caminho ou estrada, de um

plano, um negócio, ou de procedimentos” (FERREIRA, 1999) que garante as noções

gerais capazes de delinear o percurso a ser trilhado; enquanto a expressão “bases”,

51

nos reporta à “parte inferior de alguma coisa, considerada como seu suporte”, “o

aspecto essencial [...]; princípio, origem” (HOUAISS, 2009), bem com “Tudo aquilo

que serve de fundamento ou apoio [...]” (FERREIRA, 1999).

É o que reitera o Parecer nº 15/98:

“Diretriz” refere-se tanto a direções físicas quanto a indicações para a ação. Linha reguladora do traçado de um caminho ou de uma estrada, no primeiro caso, conjunto de instruções ou indicações para se tratar e levar a termo um plano, uma ação, um negócio, etc., no segundo caso. Enquanto linha que dirige o traçado da estrada a diretriz é mais perene. Enquanto indicação para a ação ela é objeto de um trato ou acordo entre as partes e está sujeita a revisões mais frequentes.

Utilizando a analogia, pode-se dizer que as diretrizes da educação nacional e de seus currículos, estabelecidas na LDB

7, correspondem à linha

reguladora do traçado que indica a direção, e devem ser mais duradouras. Sua revisão, ainda que possível, exige a convocação de toda a sociedade, representada no Congresso Nacional. Por tudo isso são mais gerais, refletindo a concepção prevalecente na Constituição sobre o papel do Estado Nacional na educação. As diretrizes deliberadas pelo CNE estarão mais próximas da ação pedagógica, são indicações para um acordo de ações e requerem revisão mais frequente.

A expressão “diretrizes e bases” foi objeto de várias interpretações ao longo da evolução da educação nacional. Segundo Horta, a interpretação dos educadores liberais para a expressão “diretrizes e bases”, durante os embates da década de 40, contrapunha -se à ideia autoritária e centralizadora de que a União deveria traçar valores universais e “preceitos diretores”, na expressão de Gustavo Capanema. Segundo o autor, para os liberais: “Diretriz” é a linha de orientação, norma de conduta. “Base” é superfície de apoio, fundamento. Aquela indica a direção geral a seguir, não as minudências do caminho. Esta significa o alicerce do edifício, não o próprio edifício que sobre o alicerce será construído. Assim entendidos os termos, a Lei de Diretrizes e Bases conterá tão-só preceitos genéricos e fundamentais (BRASIL, 1998, grifo do autor).

Sob essa perspectiva, as Leis comungam da ideia de que a vida escolar

deve ser orientada por noções basilares que assegurarão um caminho comum no

trabalho a ser desenvolvido junto aos alunos em todo o território nacional.

Outra questão que é possível observar está atrelada às Leis trazerem essas

duas expressões escritas em um formato que as diferem, ou seja, na Lei 5692/71, há

o emprego de letra maiúscula, enquanto que na 9394/96 o enunciador/legislador a

transcreveu em minúscula.

Partindo do pressuposto que a LDB foi promulgada num período ditatorial no

qual a liberdade de pensamento era tolhida e o padrão de conduta imposto pelo

7 O Parecer refere-se à Lei 9394/96.

52

governo, essa forma de registrar as palavras: “Diretrizes e Bases”, ou seja, fazendo

uso de letras maiúsculas, transformam as expressões em substantivo próprio,

reforçando a importância a elas atribuída, pois, como afirma Cegalla (2008, p. 64 e

130), "Escrevem-se com letra inicial maiúscula os: [...] b) substantivos próprios [...]",

sendo que eles: "[...] se aplicam a um ser em particular", e portanto, não comum,

mas detentor de peculiaridades, diferenciando-as das demais que, registradas em

letra minúscula, reforçam o destaque, a importância e o relevo dado pelo legislador

aos termos.

Paralelamente, a LDBEN faz uso do artigo definido “as”, que poderia ser

omitido, mas que, ao ser empregado, revela a nova Lei como algo conhecido,

familiar no meio social, o que é confirmado pela substituição que esta faz à Lei já

existente, diferindo-se dela ao ser escrita com letra minúscula, pois revela um

governo que caminha ao lado, pondo-se junto, o que caracteriza mais uma vez o

aspecto democrático da norma.

Em seguida, as Leis fazem uso das expressões “ensino” e “educação” que,

no decorrer de seus artigos, são retomadas. No entanto, o uso dessas expressões

na ementa e no primeiro enunciado do objeto, ou seja, no Título I, da Lei 5692/71,

onde se lê “Do Ensino de 1º e 2º Graus”, e no Capítulo I, na Lei 9394/96, no qual se

encontra: “Da Educação”, essas expressões são empregadas de formas distintas,

atribuindo-lhes denotações diferentes, mesmo se, não raro, elas são utilizadas como

pertencentes a um mesmo significado.

Prova disso é o que se pode depreender da afirmação de Cardoso (2009, p.

70) a respeito do contexto que não raro atribui novo sentido ao enunciado pelas

“associações que despertam” e o “efeito de sentido que criam”.

Segundo o dicionário Houaiss (2009), “ensino” pode ser definido, dentre

outros significados, da seguinte forma:

Substantivo masculino; o ato, processo ou efeito de ensinar; ensinamento, ensinança; transferência de conhecimento, de informação; instrução; o sistema (e os métodos) adequado a essa transferência; o exercício do professorado; magistério; transmissão de princípios que regulam a conduta humana e a vida em sociedade; educação.

Já “educação”:

53

Substantivo feminino; ato ou processo de educa(-se); qualquer estágio desse processo; aplicação dos métodos próprios para assegurar a formação e o desenvolvimento físico, intelectual e moral de um ser humano; pedagogia, didática, ensino; o conjunto desses métodos; pedagogia, instrução, ensino; desenvolvimento metódico de uma faculdade, de um sentido, de um órgão; conhecimento e observação dos costumes da vida social; civilidade, delicadeza, polidez, cortesia.

O dicionário Ferreira (1999) traz o verbete “ensino” como sendo: “A

transmissão de conhecimentos, informações ou esclarecimentos úteis ou

indispensáveis à educação (2) ou a um fim determinado; instrução. Os métodos

empregados para se ministrar o ensino (1)” e o termo “educação” como “Ato ou

efeito de educar(-se). Processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual

e moral do ser humano. Civilidade, polidez”.

No que tange à origem de cada uma dessas expressões, segundo Ávila

(1978), é possível observar que a expressão “ensino” está relacionada ao baixo

latim, significando a junção de “in” mais “signare”, ou seja, “in” relativo a: na direção

ou na intenção de, e “signare”, referente a assinalar, marcar, originário de “signum”

relativo a sinal. Já a expressão “educação”, proveniente também do latim, significa

“editor”, isto é, aquele que produz, “edere” (“ex” + “dare”), ou seja, dá de si, que é o

autor de, aquele que cria, gera.

Já no Dicionário Prático de Pedagogia (QUEIROZ, 2011, p. 112), por

“ensino” compreende-se:

Ação na qual um indivíduo mais experiente transmite os conhecimentos, gerais ou específicos, para que outro indivíduo possa compreender e assimilar. Desenvolvimento das faculdades físicas, intelectuais e morais do ser humano; Diversas técnicas, métodos ou níveis elaborados com a finalidade de facilitar a aprendizagem. Ex.: ensino fundamental, ensino médio, ensino superior, educação infantil, ensino por correspondência, ensino público, ensino particular etc.

Por “educação”, o mesmo dicionário (2011, p. 107) assegura que:

É a ação exercida por meio de métodos particulares, com o objetivo de desenvolvimento ou preparação social, intelectual, moral, física e afetiva de uma criança ou jovem; A transmissão da cultura de uma geração para a outra; Civilidade, nível ou tipo de ensino.

Diante do exposto, é certo que, se de um lado essas expressões podem ser

consideradas como sinônimas, de outro é possível evidenciar que por muito tempo a

expressão “ensino” foi tida como proposta de formação ministrada por um professor

que, por meio da articulação de exercícios, orientados pela concatenação

metodológica, transmitia conhecimentos ao alunado, direcionando-o para

54

determinado fim, enquanto a expressão “educação” é mais ampla, abarcando a

expressão “ensino”, bem como a formação da pessoa como um todo, ou seja, em

seu aspecto integral.

Além disso, independente das duas expressões poderem ser empregadas

de forma semelhante, é certo que não existem sinônimos perfeitos, pois cada

expressão pode apresentar uma conotação diferente dentro dos contextos nos quais

são utilizadas, mudando com isso o sentido a elas atribuído.

Reportando-se à redação da Lei 9394/96, é possível observar que a própria

norma diferencia essas duas expressões no caput do artigo primeiro8, ao atribuir à

expressão “educação” uma amplitude maior, não só de transmissão de

conhecimento, mas de formação da pessoa, que se dá por meio de um número

muito maior de situações, nas quais a escola, e, portanto o “ensino”, estão inseridos.

É o que nos assegura Brandão (2010, p. 18), ao escrever que o:

[...] conceito de Educação é entendido como sendo todos os processos formativos que ocorrem de diversas maneiras, nas mais variadas instâncias da sociedade (família, escola, trabalho, movimentos sociais, manifestações culturais etc.).

Outro ponto que pode ser extraído para análise refere-se ao assunto

normatizado por esses dois ordenamentos jurídicos, ou seja, o “Ensino de 1º e 2º

Graus” e a “Educação Nacional”.

Nesse sentido, o próprio texto introdutório evidencia que a Lei 5692/71

detinha como foco a regulamentação dos dois primeiros graus de ensino, mesmo

porque na ocasião já havia sido promulgada a Lei 5540/68 que cuidava da

normatização do ensino superior.

No que diz respeito à 9394/96, ela centra em si todos os níveis

educacionais, abarcando desde a educação de crianças em tenra idade até aqueles

que, independente da faixa etária, estejam ainda em formação. Por isso, ao

empregar a expressão “Educação Nacional", a Lei confirma de forma explícita essa

questão, ou seja, a de abranger todas as subdivisões do ensino escolar brasileiro e

em todo território nacional.

8 Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais. (BRASIL, 1996).

55

Com isso, é possível observar que as Leis em suas ementas apresentam

características que as aproximam, porém, diante da análise feita, muitas são as

questões que as diferenciam, independente de terem sido criadas com o intuito de

organizar a educação no Brasil, revelando em suas entrelinhas o contexto histórico

em que foram promulgadas, valendo-se de expressões linguísticas que atribuem

sentido específico a essas ementas, distanciando-as.

Lei 5692/71

Art. 1º - O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral

proporcionar ao educando a formação necessária ao

desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de

auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o

exercício consciente da cidadania.

Nova redação segundo a Lei 7044, de 18

de outubro de 1982, que

alterou o Art. 1º da Lei 5692/71.

Art. 1º - O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral

proporcionar ao educando a formação necessária ao

desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de

auto-realização, preparação para o trabalho e para o exercício

consciente da cidadania.

Lei 9394/96

Art. 22 - A educação básica tem por finalidades desenvolver o

educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável

para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para

progredir no trabalho e em estudos posteriores.

Quadro 02 - Do Objetivo da Lei

No que se refere aos pontos de contato existentes entre esses dois artigos,

é possível observar que ambos trazem como foco central a preocupação em atender

aos alunos, formando-os para a cidadania e o trabalho. Contudo, verifica-se que eles

apresentam questões antagônicas, tendo em vista o uso do léxico pelo

enunciador/legislador no texto legal.

Partindo desse pressuposto, na Lei 5692/71, o Ensino de 1º e 2º graus é

apresentado logo no primeiro artigo do Capítulo I. Já na Lei 9394/96, esse assunto

somente será tratado no Título V, Capítulo II, mais precisamente no art. 22.

56

Tal estrutura das normas nos revela que as mesmas apresentam focos

diferentes centrados nos interesses e necessidades presentes na época em que

foram criadas.

No caso da LDB, a preocupação estava em revelar a norma de maneira

objetiva, sem se ater a detalhes, se não o de fixar a organização do ensino que

deveria ser cumprida pela sociedade. Portanto, o enunciador/legislador não se

preocupou em criar preâmbulos norteadores que focassem os princípios a serem

regidos pela Lei, mas se ateve ao foco central, fazendo-o de forma concisa, valendo-

se da prerrogativa típica do ordenamento jurídico de corresponder a um gênero com

características impositivas, que independem da vontade dos coenunciadores

subordinados a ela, o que se reforça frente aos interesses e ao tipo de governo

existente naquele período.

Ao especificar "1º e 2º graus", o dispositivo legal trata do ensino a ser

ministrado a crianças e pré-adolescentes, excluindo, nesse momento, os menores

de sete anos que somente serão citados, e de forma superficial, no art. 19, § 2º da

Lei, que delega ao sistema de ensino a responsabilidade de velar por essas

crianças.9

Já a LDBEN opta pela expressão “educação básica” que, conforme art. 21,

inciso I10, da Lei, abrange a educação infantil, o ensino fundamental e médio,

incluindo dessa forma as crianças menores, esclarecendo-se que a educação infantil

abrange as creches - ou entidades equivalentes - voltadas para atender a crianças

de zero a três anos de idade, bem como as pré-escolas, destinadas a alunos de

quatro a cinco anos. Já o Ensino Fundamental, hoje com duração de nove anos,

inicia-se no primeiro ano11, com a matrícula de crianças de 6 anos de idade,

terminando no nono ano (a partir do governo Lula). O Ensino Médio equivale

9 Art. 19, § 2º Os sistemas de ensino velarão para que as crianças de idade inferior a sete anos recebam

conveniente educação em escolas maternais, jardins de infância e instituições equivalentes.

10

Art. 21, I - educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio; 11

Segundo as Orientações Gerais sobre o Ensino Fundamental de Nove Anos, emitidas pelo MEC, a nomenclatura referente à organização desse nível de ensino, deve estar em conformidade com o art. 23 da Lei 9394/96. Contudo, o próprio documento sugere que no Ensino Fundamental seja mencionado “ano”, o que substituiria a expressão “série”, termo previsto nas Leis. Assim, o 1º ano, por muitos chamados de “Classe de Alfabetização”, está relacionado com o último ano da pré-escola; o 2º ano com a antiga 1ª série; e assim sucessivamente.

57

atualmente ao antigo 2º grau, correspondendo à finalização da educação básica,

com duração mínima de três anos.

Diante disso, o que se observa é que, sob esse aspecto, a LDBEN, após a

promulgação da Lei 11274/200612, passou a apresentar uma redação mais

abrangente, ampliando as oportunidades de estudo a um maior número de crianças,

tendo em vista a possibilidade de matrícula de alunos com idade menor do que sete

anos no ensino obrigatório, quando outrora era uma prerrogativa de escolha dos

genitores que poderiam fazê-lo, ou não, na educação infantil.

Em sequência, a Lei 5692/71, acrescenta em seu texto a expressão "graus",

que merece uma observação particular, tendo em vista a LDBEN não mencioná-la,

optando pela expressão “básica” que também servirá como objeto de análise.

Pensando no contexto sócio-histórico, fazia todo sentido nos idos de 1971

articular o ensino em "graus", pois era de interesse que as pessoas passassem a ser

organizadas em estágios escalonados de processo de aprendizagem, garantindo

com isso, uma ordem classificatória que determinaria a promoção para um grau

superior ao ensino que o antecedeu.

Dentro desse contexto, os alunos eram matriculados em séries que, como foi

comentado anteriormente, iniciavam com a primeira e eram concluídas na oitava,

podendo então seguir para o 2º Grau. Nesse período, a escola deveria abarcar o

maior número de alunos, visando à industrialização almejada no Brasil, por isso, há

uma relação muito tênue entre linha de produção e o escalonamento em graus e

séries estabelecido na época, detendo, portanto, uma perspectiva de agrupamento

por nível de aprendizagem, com foco na homogeneidade, que se ampliaria numa

escala ascendente.

Por outro lado, a Lei 9394/96 optou pela expressão "básica", adjetivo que

assegura uma base sobre a qual se edificariam todos os demais conhecimentos,

dando-lhe uma importância primordial, que comporia a essência da educação,

12 Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão [...]. (BRASIL, 2006).

58

assegurando-lhe os aspectos mais importantes sob os quais se fundamentaria toda

a educação no Brasil.

Em seguida, as normas trazem os substantivos: "objetivo" e "finalidades",

expressões que também se aproximam em seu significado, mas apresentam certa

diferença.

Por "objetivo", Queiroz (2011, p. 215) compreende como a “Meta a ser

alcançada”; “Aquilo que é imparcial, que não leva em conta sentimentos ou gostos

pessoais”. Já por “finalidade” a mesma autora afirma como sendo o: “Resultado; o

caminho, as ações, as metodologias que levam para o fim desejado. A finalidade da

educação ministrada varia de acordo com os ideais e os valores existentes na

sociedade em que está inserida.”. (QUEIROZ, 2011, p. 135)

É interessante observar como o dicionário pedagógico interpreta um e outro

vocábulo, pois vem ao encontro das características típicas do contexto histórico,

confirmando a postura ditatorial e democrática explícita nas próprias normas, mesmo

se, num primeiro momento, se pudesse sugerir uma certa aproximação nos

significados nessas duas expressões que poderiam ser tidas como sinônimas.

Contudo, partindo do pressuposto de que ambas foram tecidas em períodos

muito diferentes no contexto histórico brasileiro, a manifestação do interesse em se

atingir o propósito desejado aqui se configura de forma muito explícita com o uso da

expressão “objetivo”, enquanto “finalidade” evidencia o processo para se atingir esse

fim.

Além disso, o substantivo “objetivo” vem sucedido pelo adjetivo “geral”,

dando a ideia de expressão cristalizada, esvaziando o sentido.

Outra questão que distancia os artigos em análise refere-se ao uso das

expressões “proporcionar” e “desenvolver” nas normas jurídicas.

O verbo “proporcionar” está atrelado à oportunidade que o governo deveria

oferecer ao aluno de estudar, competindo a ele, e somente a ele, a aprendizagem

que lhe seria ministrada pelo docente, pois naquele período, a abordagem

pedagógica adotada baseava-se na organização do processo educativo, de tal forma

que se mostrasse eficiente e produtiva, primando-se pela especialização e a

transmissão de conteúdos por parte do professor, competindo ao aluno o papel de

59

mero receptáculo desse conhecimento, vindo ao encontro do que Paulo Freire

(1987, p. 33) intitulava como “visão bancária da educação”:

Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunicados” e depósitos que os educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los. Margem para serem colecionadores ou fichadores da coisa que arquivam. No fundo, porém, os grandes arquivados são os homens, nesta (na melhor das hipóteses) equivocada concepção “bancária” da educação. Arquivados, porque fora da busca, fora da práxis, os homens não podem ser. Educador e educandos se arquivam na medida em que, nesta destorcida visão da educação, não há criatividade, não há transformação, não há saber. [...]

Isso se reforça quando Saviani (1980) (apud RIBEIRO, 1992, p. 170), ao

citar os objetivos da Lei 5692/71, assegurou estarem voltados ao modelo tecnicista13

de ensino:

Revela-se assim a ênfase na quantidade e não na qualidade, nos métodos (técnicas) e não nos fins (ideias), na adaptação e não na autonomia, nas necessidades sociais e não nas aspirações individuais, na formação profissional em detrimento da cultura geral.

Dentro dessa panorâmica, aqueles que, por qualquer motivo, conseguiam

aderir à continuação dos estudos eram nivelados por igual, competindo-lhes uma

aprendizagem que não levava em consideração as diferenças individuais, mas se

centrava em estímulos que deveriam culminar em uma resposta satisfatória, o que

sinalizava, à época, uma boa aprendizagem.

Já na LDBEN o termo utilizado foi “desenvolver”, que nos remete ao sentido

de fazer crescer, ou seja, nessa Lei o Estado assume o papel de copartícipe dessa

formação, não mais oportunizando, mas caminhando ao lado, acompanhando esse

crescimento, comprometendo-se em “fazer aumentar a capacidade ou possibilidade”

[...] (HOUAISS, 2009) do aluno progredir em sua formação.

Na Lei 9394/96, o que se observa é a preocupação em assegurar a garantia

do direito do estudante de ir à escola, colocando a família como responsável,

juntamente com o Estado que, por sua vez, pode fazer uso de seu poder coersitivo

13

No modelo tecnicista a aprendizagem dá-se mediante a transmissão de conhecimento do professor para o aluno, por meio de estímulos e respostas que devem ser regulados pelo professor de tal forma a atingir os objetivos propostos para o ensino.

60

sobre os responsáveis do estudante quando não cumprem com o seu papel de zelar

pela frequência escolar do aluno.14

Dessa forma, a Lei atual foca seu olhar em garantir que o aluno tenha a

possibilidade de não ver cerceado seu direito de frequentar os bancos escolares,

mesmo porque, por anos, muitas crianças em tenra idade, buscando auxiliar a

família, assumiam um trabalho, o que ainda é um problema que se mantém nos dias

atuais, apesar dos avançados, de lá para cá, no que diz respeito a essa questão.

Um exemplo disso é a responsabilidade delegada à escola de informar ao

Conselho Tutelar as faltas ininterruptas e intermitentes dos alunos que não

comparecem às aulas, fazendo-o sem um motivo justificável e comprovado pela

família.

Com isso, a LDBEN busca estabelecer também a ampliação do potencial do

aluno, fazendo-o progredir em sua aprendizagem, quer pelo motivo de não mais se

ausentar da escola, quer porque dá autonomia a ela de elaborar sua proposta

pedagógica15, o que lhe possibilita voltar-se para as necessidades específicas dos

alunos frente aos conhecimentos a serem aprendidos, diferentemente do que ocorria

no período em que vigorou a antiga LDB.

Dessa forma, se anteriormente à atual legislação o que vigorava era a

tendência pedagógica tecnicista, o que se observou ao final do século XX foram as

crescentes contribuições dos estudos na área da Psicologia que trouxe como

contribuição para a Pedagogia a preocupação a respeito de como o estudante

aprende, destacando-se os estudos realizados pelos Psicólogos Jean Piaget,

Vygotsky e Wallon que muito contribuíram para uma reflexão a respeito da didática a

ser desenvolvida junto à clientela.

Dentro dessa perspectiva, a figura do professor ganha outro papel, pois

deixa de ser o transmissor de conteúdos para ser aquele a quem compete contribuir

para a ampliação e aprimoramento dos conhecimentos do estudante partindo do que

14 Lei 9394/96 - Art. 5º, § 1º Compete aos Estados e aos Municípios, em regime de colaboração, e

com a assistência da União: III - zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola.

15 Lei 9394/96 - Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu

sistema de ensino, terão a incumbência de: I - elaborar e executar sua proposta pedagógica [...].

61

ele já sabe e fazendo uso, por meio da didática, de abordagens e metodologias mais

adequadas para esse fim. Com isso, estabelece-se outro processo pedagógico, o de

ensino/aprendizagem, caracterizado pela consciência de que enquanto se ensina,

também se aprende.

A LDBEN faz uso, ainda, em seu texto legal da expressão “assegurar” que,

mesmo apresentando correlação com a expressão “proporcionar”, transcrita na LDB,

está também atrelada ao sentido de “garantir”, ou seja, quem garante assume a

corresponsabilidade, o que reforça a nossa afirmação anterior relativa ao papel do

Estado de não somente dar a oportunidade, pelo oferecimento dos estudos, mas

caminhar lado a lado para que essa formação aconteça.

Para tanto, o enunciador/legislador utiliza dos termos “necessária” e

“comum” para estabelecer como deveria ser essa formação.

Segundo o dicionário Houaiss (2009), a expressão utilizada pela LDB

mantém relação com aquilo que é “preciso; essencial; indispensável” e, ainda, “que

se não pode evitar”, que é “forçoso” e, portanto, “que deve ser cumprido”.

Frente ao contexto histórico, é certo que a preocupação do governo era a de

formar mão de obra para satisfazer a necessidade da industrialização crescente à

ocasião. Consequentemente, é fácil depreender que o emprego da expressão

“necessária” está atrelado à intenção de formar o estudante para atender a esse fim,

pautando-se no “indispensável” para que as indústrias pudessem receber mão de

obra qualificada.

Paralelamente, é certo afirmar que a escola sempre caminhou lado a lado

com as necessidades mais prementes do meio social, sendo um reflexo dele, o que

não foi diferente na LDBEN, que buscou assegurar o direito do aluno a uma

formação basilar e, portanto, “comum”, indispensável para o pleno desenvolvimento

desse estudante, prevendo a igualdade e o acesso ao conhecimento por todos os

que frequentam os bancos escolares, independente de sua classe social, buscando

coibir, assim, as desigualdades presentes em nosso país, uma característica da

democracia.

Na sequência, a LDB traz em seu artigo a expressão: “desenvolvimento de

suas potencialidades”.

62

A expressão “potencialidades” nos reporta ao que é “possível”, porém,

“virtual”, “suscetível de existir ou acontecer” e, partindo desse pressuposto, a Lei

5692/71 já previa que o conhecimento dar-se-ia por meio daquilo que o estudante é

capaz de aprender, quase que se eximindo da responsabilidade pela formação

desse aluno.

Diante disso, a própria norma jurídica assegurava, de pronto, que muitos não

seriam atingidos pelos conhecimentos apresentados pela escola, o que se confirma,

ao levar em consideração outra definição do vocábulo encontrada no dicionário

(Houaiss, 2009), porém, sob a ótica filosófica, ou seja, que as "potencialidades"

estão relacionadas àquele “que ainda não desenvolveu plenamente suas tendências

inatas ou intrínsecas; que ainda não atingiu a plenitude de sua forma final”.

Além do mais, muitos dos que acreditavam ser a “auto-realização” centrada

na continuidade dos estudos viram a Lei transformar-se em “letra-morta”, pois não

mais bastariam a determinação e esforços próprios para atingirem esse intento,

afinal muitos esbarraram na vontade política de tornar tal questão viável, pois a

própria história evidencia que poucos conseguiram adentrar às universidades.

Esse é um problema que se manteve durante muitos anos na vigência

inclusive da Lei 9394/96. Apesar disso, o texto legal evidencia a possibilidade de

avanço, mesmo se essa questão ainda não está completamente resolvida.

Outra questão que merece nossa especial atenção está no uso da

expressão “cidadania” em ambos os artigos.

Como se sabe, ser cidadão é deter a capacidade de fazer uso dos direitos

políticos e civis e, ao mesmo tempo, desempenhar os deveres que lhe são

atribuídos.

Contudo, ser cidadão num contexto histórico democrático não é o mesmo

que ser cidadão num período ditatorial, pois, como afirma Maingueneau (2011, p.

54):

Não diremos que o discurso intervém em um contexto, como se o contexto fosse somente uma moldura, um cenário; na realidade, não existe discurso se não contextualizado. Sabemos que não se pode verdadeiramente atribuir um sentido a um enunciado fora do contexto; o ‘mesmo’ enunciado em dois lugares distintos corresponde a dois discursos distintos. Além disso, o

63

discurso contribui para definir seu contexto, podendo modificá-lo no curso da enunciação. (grifo do autor).

Na LDB, o termo é empregado ao final do artigo, mais precisamente, na

última expressão, portanto, a preocupação para a formação de mão de obra já se

estabelecia inclusive no texto da Lei. Diferentemente do que se pode observar na

LDBEN, pois a expressão é anteposta a “progredir no trabalho e em estudos

posteriores”, o que nos faz entrever a evidência dada ao termo e a preocupação em

formar pessoas conscientes de seus direitos e deveres antes mesmo de estarem

preparadas para enfrentar o mercado de trabalho.

A Lei 5692/71, mais uma vez, deixa transparecer a preocupação central do

governo relacionada à industrialização e preparo de mão de obra para o exercício de

operar e consertar máquinas, sem se ater a uma formação para a reflexão crítica da

realidade, trazendo ao contrário uma relação muito tênue com o chavão o “trabalho

dignifica o homem”.

Além disso, nesse período o exercício da cidadania era restrito e reprimido

pelo governo. Os que se opunham a ele eram torturados, castigados de forma cruel,

desumana e degradante. Com isso, é certo que a cidadania instituída hoje no

ordenamento jurídico não coadunava com o sentido que lhe é atribuído à época,

pois às pessoas comuns não era dado o direito de participar da vida política e os

que se atreviam a fazê-lo, não raro, tinham a liberdade cerceada, eram exilados ou,

quando não, mortos por meio de tortura.

Outra questão que pode ser trazida para a análise e que, ao serem

comparadas as duas Leis, mostram aspectos antagônicos, diz respeito à

“qualificação para o trabalho”, presente na LDB e “progredir no trabalho”, transcrito

na LDBEN.

Segundo a Lei 7044/82, a expressão “qualificação” foi suprimida do art. 1º,

recebendo, em função disso, nova redação: “[...] preparação para o trabalho e para o

exercício consciente da cidadania.”. (BRASIL, 1982).

De qualquer modo, a Lei 5692/71, em sua origem, comprometia-se em

qualificar o aluno para o trabalho, garantindo a aquisição de uma gama de atributos

que habilitassem o indivíduo ao exercício de determinada função, enquanto na Lei

9394/96, a norma relaciona a educação como articuladora da formação que poderá

64

viabilizar a “progressão no trabalho” e nos “estudos posteriores”, o que era garantido

pelo Estado, tendo em vista o emprego do verbo “fornecer” que, segundo o

dicionário Houaiss (2009), está relacionado com o “pôr ao alcance; proporcionar,

facilitar” o acesso.

Dessa forma, mais uma vez a Lei 9394/96 coloca-se como a articuladora

que não só oportuniza, mas caminha lado a lado com o estudante, para que ele

atinja o seu pleno desenvolvimento.

Essa prerrogativa, atribuída pela Lei, demonstra o aspecto democrático do

qual estava imbuída e por meio da qual a pessoa, detentora de direitos, é posta em

evidência. A preocupação em garantir a satisfação das necessidades comuns no

meio social se mantém, mas não se impõe em detrimento da vontade individual.

Com isso, pode-se observar que, se em ambos os artigos há expressões

comuns, que se repetem, é fato que as mesmas expressões retratam

posicionamentos diferentes frente ao contexto em que foram empregadas, o que

reforça as marcas dos regimes políticos nos quais cada uma das Leis em estudo foi

impressa.

Lei 5692/71

Art. 1º, § 2° - O ensino de 1° e 2º graus será ministrado

obrigatòriamente na língua nacional. [sic]

Nova redação

segundo a Lei 7044, de

18 de outubro de 1982, que

alterou o Art. 1º da Lei 5692/71.

Art. 1º, § 2º - O ensino de 1º e 2º graus será ministrado

obrigatoriamente na língua nacional.

Lei 9394/96

Art. 32, § 3º - O ensino fundamental regular será ministrado em

língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas a

utilização de suas línguas maternas e processos próprios de

65

aprendizagem.

Quadro 03 - O Idioma Oficial nas Redes de Ensino

O ponto de contato entre esses dois artigos está na exigência das duas Leis

em determinar qual deveria ser o idioma oficial a ser utilizado dentro das unidades

escolares, ou seja, a Língua Portuguesa.

A Lei 5692/71 faz uso da expressão “língua nacional”, buscando assegurar,

com isso, a garantia da unidade em todo o país pelo uso do idioma trazido pelos

colonizadores, sem se ater às diferenças sociais e culturais aqui existentes. Já a Lei

9394/96 transcreve de forma explícita a obrigatoriedade da Língua Portuguesa,

mantendo-a como patrimônio da nação.

Essa questão contemplada pelos dois ordenamentos jurídicos está muito

atrelada ao cunho político neles implícitos. Contudo, a fidedignidade a essa unidade

nacional é cerceada pela Lei 5692/71 e tangenciada pela Lei 9394/96 que, abrindo

precedente a indígenas para fazerem uso da língua materna da tribo na

aprendizagem do currículo que deverá ser ministrado em todo o território nacional,

poderia resguardar a cultura desses povos, como afirma Brandão (2010, p. 88):

A possibilidade de as crianças das diversas comunidades indígenas que ainda habitam o território brasileiro terem acesso a todos os conhecimentos ministrados no ensino fundamental, através de “processos próprios de aprendizagem”, utilizando-se, para sua efetivação, das “línguas maternas” de cada comunidade indígena constitui, sem sombra de dúvida, um avanço da legislação educacional brasileira, na medida em que pode vir a contribuir para a preservação dessas “línguas maternas” indígenas (grifo do autor).

Isso se reforçaria pelo fato de o enunciador/legislador fazer uso do conectivo

“e” entre: “utilização de suas línguas maternas” e “processos próprios de

aprendizagem”, cuja função seria garantir as duas prerrogativas, aos próprios índios,

pois, como nos afirma Ducrot (1980b apud CABRAL, 2011, p. 86):

Os conectores sempre foram vistos como elementos que estabelecem relações lógicas. Ducrot desenvolveu sua teoria a partir dos estudos dos conectores e propôs uma nova definição para conector a qual adotamos. Deixamos de defini-lo em termos de elemento de ligação, como acontecia nas gramáticas tradicionais e passamos a encará-lo como uma expressão de ligação e de orientação, isto é, que articula as informações e os argumentos de um texto. Entendemos que o elemento de conexão põe a informação do texto a serviço da intenção argumentativa.

66

Contudo, vale observar que o enunciador/legislador reconhece na norma

jurídica a importância em se assegurar o uso da língua materna nas tribos indígenas,

mas formaliza a Língua Portuguesa como a língua oficial nas instituições escolares.

É o que nos afirma Brandão (2010, p. 89) ao mencionar que a lei traz o:

[...] “acobertamento” de uma possível intenção de que a Educação Escolar venha a ajudar no processo de aculturação das comunidades indígenas por meio do acesso aos conhecimentos do “homem branco ocidental”. Esse processo de aculturação torna-se visível ao analisarmos que, provavelmente, o maior problema para que o ensino fundamental tradicional (ou seja, o do “homem branco ocidental”) seja ministrado nas “línguas maternas” das diferentes comunidades indígenas e com “processos próprios de aprendizagem”, seja a “capacitação dos professores” dessas comunidades para exercer tal função. (grifo do autor).

Diante disso, resta depreender-se que a norma não viabiliza essa

prerrogativa às tribos por atribuir ao índio reconhecimento e valor, mas ao invés

disso revela em suas entrelinhas o possível interesse de dominação, que se

manteria nos dias atuais por parte do homem tido como civilizado em detrimento da

cultura de diferentes povos que aqui habitam antes mesmo de as terras serem

conhecidas pelos países europeus.

Além do mais, tal prerrogativa não foi atribuída às demais comunidades de

imigração existentes no país, como é o caso dos japoneses, alemães, italianos,

dentre outras, tendo em vista a origem que não se coaduna com a do território

brasileiro.

Porém, fazia-se necessário regular tal questão, tendo em vista a

organização desses imigrantes em colônias que, fazendo uso da língua de origem

na comunicação, faziam-no também em outras instâncias sociais. Por isso então a

importância da obrigatoriedade imposta pela Lei.

Quanto às escolhas lexicais realizadas pelo enunciador/legislador ao redigir

as Leis, a LDB reitera a utilização da expressão “1º e 2º Graus”, enquanto que a

LDBEN faz uso de “ensino fundamental”, ou seja, aquele voltado para crianças, bem

como aos jovens e adultos que, por qualquer motivo, não puderam concluir os

estudos referentes ao antigo 1º Grau.

É interessante observar que a Lei 9394/96, no artigo em análise, não faz

menção ao Ensino Médio, mas assegura a Língua Portuguesa como matéria que

67

deverá constar no currículo em seu art. 2616, confirmando-a como “instrumento de

comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania”, no art. 3617, o que

demonstra o valor atribuído e reiterado pela norma à Língua Portuguesa.

À expressão “fundamental” no dicionário Houaiss (2009) consta como

sentido figurado “o caráter essencial e determinante; básico, indispensável” que

ampara o ensino regular.

Segundo Queiroz (2011, p. 141), trata-se do “[...] estágio de ensino que

serve como base para a construção de novos saberes.”

Sob essa perspectiva, o enunciador levou em consideração que o ensino

nesse período escolar deveria ser pautado por aquilo que é indispensável e vital

para a formação do estudante, formação essa que se espera ver ampliada à medida

que o aluno avança de um ano a outro em seus estudos.

A análise da redação dos artigos nos possibilita ainda observar que em

ambos há a transcrição da expressão “será ministrado”, utilizado com o cunho de

modalizar a força do imperativo do verbo conjugado no futuro do presente

transformando-o em voz passiva, não perdendo, apesar disso, o caráter imperativo

da norma.

No entanto, os artigos deixam de manter uma linha tênue entre si, ao

empregar a expressão “obrigatoriamente”, como condição na LDB, evidenciando o

cunho impositivo, que se reforça pelo gênero em estudo, mas também, sendo um

advérbio de modo, apresenta-se de forma modalizada, sem deixar de marcar com

transparência a ação que se espera daqueles sujeitos à Lei, devendo eles aderir à

língua nacional, reforçando o que já foi tratado a respeito do uso dela entre os

imigrantes que aqui se estabeleceram formando colônias. 16

Art. 26. Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser

complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela. § 1º Os currículos a que se refere o caput devem abranger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política, especialmente do Brasil. (BRASIL, 1996).

17 Art. 36. O currículo do ensino médio observará o disposto na Seção I deste Capítulo e as seguintes

diretrizes: I - destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da cultura; a língua portuguesa como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania [...]. (BRASIL, 1996).

68

Além disso, frente aos investimentos que o Brasil recebeu dos Estados

Unidos, por meio da Associação Internacional de Desenvolvimento (AID), com foco

na realização de pesquisas educacionais no Brasil, a língua serviria de instrumento

para garantir a identidade brasileira, mesmo se a identificação ideológica na esfera

da educação estivesse voltada para a norte-americana.

Quadro 04 - Currículo: Aspectos Gerais

O aspecto convergente entre esses artigos está diretamente relacionado

com a organização geral do “currículo”, voltado para as instituições escolares com

foco no ensino que antecede o superior e sucede o infantil. Além disso, eles trazem

questões que se assemelham, no que tange ao emprego das expressões, mas em

vista do contexto de criação das Leis, o sentido atribuído aos artigos é

ressignificado, dando-lhe uma nova conotação.

A Lei 5692/71 determina que os currículos “terão um núcleo comum”,

enquanto a Lei 9394/96 estabelece que “devem ter uma base nacional comum”.

O uso pelo enunciador/legislador de “devem ter”, na redação da LDBEN

revela-nos prontamente uma forma mais abrandada e, portanto, menos autoritária de

determinar o que é estabelecido pela norma, diferente do que acontece no artigo da

LDB no qual as expressões escolhidas revelam imposição categórica e irremediável.

Lei 5692/71

Art. 4º - Os currículos do ensino de 1º e 2º graus terão um

núcleo comum, obrigatório em âmbito nacional, e uma parte

diversificada para atender, conforme as necessidades e

possibilidades concretas, às peculiaridades locais, aos planos

dos estabelecimentos e às diferenças individuais dos alunos.

Lei 9394/96

Art. 26 - Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter

uma base nacional comum, a ser complementada, em cada

sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte

diversificada, exigida pelas características regionais e locais da

sociedade, da cultura, da economia e da clientela.

69

O enunciador, na LDB, ao fazer uso do verbo “ter”, empregando-o no futuro

do presente, fixa uma determinação que não poderá ser remediada, utilizando em

seguida a expressão “núcleo”, que assegura a posição central na estrutura do

currículo, de onde tudo deve emanar, compondo a parte principal, a essência de

todo o programa, concluindo em seguida com a expressão “comum”, que define a

unicidade desse currículo.

A palavra “núcleo” faz transparecer um tom autoritário, rígido, enquanto

“base nacional”, demonstra certa flexibilidade, certo abrandamento, garantindo esse

tom democrático por vezes comum na norma 9394/96.

Com a junção das expressões “núcleo” e “comum”, sem considerar a

questão do gênero que por si já é impositivo, o tom autoritário distancia o enunciador

do coenunciador, fazendo-o ocupar uma posição de espectador, de alguém que

juntamente com os demais, deverá submeter-se ao que lhe é oferecido, o que é

agravado com a expressão “obrigatório”, determinando a imposição da Lei, não

podendo, portanto, ser refutada.

Além disso, vale lembrar que o “núcleo comum” deveria ser estabelecido

pelo Conselho Federal de Educação (CFE)18, a quem era dado poder para legislar.

Este, por sua vez, tomou como primeira medida, a regulamentação da Lei 5692/71

para que entrasse em vigor atendendo aos interesses governamentais. Com isso, ao

próprio CFE é dado o poder de ser o centralizador na organização do ensino,

delegado pelo próprio ordenamento jurídico, com o cunho de manter a unidade

nacional, reiterada pelo artigo ao valer-se da expressão “em âmbito nacional”.

Já a Lei 9394/96, utiliza “base nacional comum”, criada pela União em

parceria com os Estados, Distrito Federal e Municípios, o que transparece a

preocupação do enunciador/legislador em corresponder aos anseios sociais de

estabelecer um Estado Democrático de Direito19.

18

Art. 4º, § 1º, I O Conselho Federal de Educação fixará para cada grau as matérias relativas ao

núcleo comum, definindo-lhes os objetivos e a amplitude. (BRASIL, 1971).

19 Art. 9º A União incumbir-se-á de: IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito

Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum; [...] (BRASIL, 1996)

70

Além disso, o texto legal utiliza-se de “devem ter” antes de “base nacional

comum”, quase expressando uma possibilidade e não uma determinação taxativa,

comum ao gênero.

Nessa perspectiva, o verbo empregado no presente do indicativo, seguido

pelo verbo “ter”, faz perceber uma imposição mais tênue, acompanhada da

expressão “uma base”, que remete a um currículo amparado num suporte, que se

alicerça no essencial, sendo esse o princípio de tudo e sob a qual se construirão

todos os demais conhecimentos necessários para a formação do estudante.

A LDBEN traz em seguida a uma “base nacional comum” a expressão “a ser

complementada”, escrita entre vírgulas, servindo de explicação a respeito da

diversidade que o currículo deverá conter. Essas expressões confirmam o tom

menos autoritário, pela escolha lexical do enunciado, que opta pelo uso do verbo no

infinitivo, agregando a ele a modalização da expressão que o sucede, sem fazer uso

de uma estrutura impositiva que poderia ser formalizada pela conjugação do verbo.

Não obstante, a determinação da Lei faz-se presente, incumbindo a quem de direito,

colocá-la em prática, o que é, como já mencionado anteriormente, uma característica

da norma.

Outra questão que poderia parecer uma aproximação entre as Leis diz

respeito a “uma parte diversificada” prevista em ambas, cogitando que a Lei 9394/96

coaduna-se com algumas das concepções da Lei 5692/71, o que não é uma

verdade, pois como afirma Bobbio (1994, p. 177):

O fato de o novo ordenamento ser constituído em parte por normas do velho não ofende em nada o seu caráter de novidade: as normas comuns ao velho e ao novo ordenamento pertencem apenas materialmente ao primeiro; formalmente, são todas normas do novo, no sentido de que elas são válidas não mais com base na norma fundamental do velho ordenamento, mas com base na norma fundamental do novo. Nesse sentido falamos de recepção, e não pura e simplesmente de permanência do velho no novo. A recepção é um ato jurídico com o qual um ordenamento acolhe e torna suas as normas de outro ordenamento, onde tais normas permanecem materialmente iguais, mas não são mais as mesmas com respeito à forma.

A diferença crucial entre um artigo e outro, no que diz respeito à parte

diversificada, surge ao valer-se, na LDB, do “e” para assegurar que ao núcleo

comum ela se agregaria, dando a impressão de dois aspectos que se juntam para

formar o todo. Na LDBEN, porém, o enunciador escreve a expressão “a ser

complementada”, o que nos dá a ideia de integração, de composição, ampliando a

71

perspectiva curricular, apresentada no início como basilar, o que se reforça ao dar

autonomia ao “sistema de ensino e estabelecimento escolar” para a realização

desse complemento, marcando outra vez o cunho democrático que o

enunciador/legislador deseja imprimir na Lei.

Se em ambos os artigos é possível observar a preocupação de garantir que

o currículo não se afaste da realidade do aluno, na LDB há uma condição: contanto

que seja “conforme as necessidades e possibilidades concretas”. Com isso, o

enunciador/legislador abre uma brecha para que a determinação da Lei não seja

contemplada completamente. Já a LDBEN utiliza o verbo “exigir”, no particípio,

evocando a importância das especificidades “regionais” e que compõem a vida do

aluno e a unidade escolar como condição necessária na proposta de redação da

base nacional comum, ao valer-se de “características regionais e locais da

sociedade”, isto é, a sociedade na qual “a clientela” está inserida.

É certo que a Lei 5692/71 prende-se ao aluno como sendo parte vital no

processo de ensino, pois a ele cumpre ser dada a instrução, ao mesmo tempo em

que garante a possibilidade de nos currículos estarem presentes as “diferenças

individuais dos alunos”, entretanto tal questão não é de fato considerada, pois como

já mencionado anteriormente, a aprendizagem “bancária” e o foco na “técnica” eram

a mola motriz do trabalho pedagógico.

Sobre essa questão, o Parecer CFE nº 353/71, vem em socorro

assegurando que:

[...] a escolha dos conteúdos que irão formar cada currículo é feita, segundo a sistemática da lei, por aproximações sucessivas e em escala decrescente, numa intencional busca de autenticidade aos vários níveis de influência que se projetam ao ensino: o nível dos conhecimentos humanos; o nível nacional; o nível regional; o nível escolar; e o nível do próprio aluno. Este último, porém, em escassa medida se alcança numa determinação de estudos feita a priori, porém na variedade das opções oferecidas e na plasticidade dos métodos adotados (arts. 8°, 17 e 21 da lei), o que vale dizer, na concepção mesma do currículo já elaborado e na dinâmica de seu desenvolvimento. (BRASIL, 1971, grifo do autor).

Em contrapartida, a Lei nº 9394/96 traz no texto da norma a expressão

“clientela”, especificando qual realidade deverá compor o currículo, ou seja, a do

estudante, devendo estar inserido, não sob o prisma individual, mas agregando-o

aos pares, dando a ideia de grupo, inserindo-o no próprio contexto. Certamente,

toda a organização do currículo não se dá sem uma prévia determinação. Por isso,

72

no que diz respeito a 5692/71, o próprio art. 4º, em seu § 1º, inciso I20, determinava o

Conselho Federal de Educação, como aquele que detinha competência para definir

os conteúdos que comporia essa parte do currículo.

Quanto à “Base Nacional Comum”, estipulada pela Lei 9394/96, no Parecer

CNE/CEB nº. 05/97 é possível encontrar a seguinte consideração:

A lei trata de uma base comum nacional na composição dos currículos do ensino fundamental e do ensino médio. Caberá à Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação “deliberar sobre diretrizes curriculares”, a partir de propostas oferecidas pelo Ministério da Educação e do Desporto, nelas definidas, é claro, essa base comum nacional, por sua vez, a ser complementada com uma parte diversificada.

Isso demonstra o aspecto ditatorial presente na 5692/71, pois delega a

somente um órgão a decisão a respeito do assunto tratado enquanto na vigência da

Lei 9394/96 uma articulação dialogada entre o Ministério da Educação e a Câmara

de Educação Básica, firma-se para que a mesma questão seja resolvida.

De fato, a atuação do CFE, fazia-se presente em toda a organização

curricular, quer direta, quer indiretamente e, nesse caso, por meio do Conselho de

Educação, a quem competia supervisionar as ações dos estabelecimentos de

ensino.

Na Lei atual, esse controle estatal perdura, porém de modo menos

centralizador, de forma a organizar o currículo com o apoio de órgãos públicos da

esfera educacional que têm uma atuação conjunta, quer direta, quer indiretamente.

No que diz respeito à LDB, o Conselho de Educação de cada Sistema de

Ensino detinha o poder de elencar o que poderia ser considerado a parte

diversificada do currículo21, porém aos estabelecimentos de ensino22 era permitido

excluir matérias e acrescentar outras que atendessem às necessidades comuns

daquela unidade escolar, contudo, não sem a supervisão e aval conclusivo do

Conselho de Educação. Quanto à parte diversificada das habilitações profissionais,

mais uma vez é possível constatar o poder centralizador do Conselho Federal de

20

Art. 4º, 1º, I O conselho Federal de Educação fixará para cada grau as matérias relativas ao núcleo

comum, definindo-lhes os objetivos e a amplitude. (BRASIL, 1971).

21 Art. 4º, inciso II - Os Conselhos de Educação relacionarão, para os respectivos sistemas de ensino,

as matérias dentre as quais poderá cada estabelecimento escolher as que devam constituir a parte diversificada. 22

Art. 4º, inciso III - Com aprovação do competente Conselho de Educação, o estabelecimento poderá incluir estudos não decorrentes de materiais relacionadas de acordo com o inciso anterior.

73

Educação que, juntamente com os Estabelecimentos de Ensino e o

Conselho de Educação, a quem competia aprovação dos currículos por via

regimental, supervisionava toda a questão que envolvia o currículo. Diferentemente

na LDBEN, na qual o currículo é concluído sem o aval direto do Ministério da

Educação, já que o foco está na autonomia das instituições que se encontram no

âmbito de determinada cidade ou região, como ficou expresso no Parecer CNE/CEB

nº 06/2001, onde se lê:

[...] a proposta pedagógica permite ao estabelecimento, ao mesmo tempo, ser um eixo de criatividade e de controle. Se antes a maior parte da organização escolar, aí compreendida a grade curricular, provinha já definida dos órgãos normativos, agora, boa parte das decisões concernentes à constituição de conhecimentos, na relação ensino-aprendizagem, fica no âmbito do coletivo dos professores. Fica com eles também a responsabilidade pela adequação às diretrizes da lei e das normas.

Diante do que se pode observar, os artigos convergem nos aspectos

referentes ao currículo voltado aos alunos matriculados no ensino que sucede a

educação infantil e antecede o ensino superior, porém, a Lei 5692/71 centraliza a

decisão quanto ao conteúdo a ser trabalhado com o aluno no aval dado pelo CFE,

que, por sua vez, atribui, em certos casos, ao Conselho de Educação a ação de

supervisão e de dar o aval nas decisões das instituições escolares. Em

contrapartida, na LDBEN busca-se articular essa questão curricular à unidade

escolar, atribuindo-lhe o papel de protagonista nessa ação.

74

Quadro 05 - Língua Portuguesa

Nos parágrafos supracitados, o assunto central e convergente, está

relacionado ao estudo da língua no país e em ambos os artigos a questão é tratada

como sendo aquela que comporá os currículos como forma pré-estabelecida pelo

governo, ou seja, o estudo da língua estará presente no currículo como “núcleo

comum”/“base nacional comum”.

Apesar disso, o que se observa é que poucos são os pontos de

convergência entre esses dois parágrafos.

Na LDB, logo após citar em quais graus de ensino a língua será estudada, o

enunciador/legislador continua o texto legal empregando o verbo “dar”, na

conjugação pronominal reflexa, no futuro do presente, no modo indicativo.

Lei 5692/71

Art. 4º, 2º - No ensino de 1º e 2º graus dar-se-á especial relêvo ao

estudo da língua nacional, como instrumento de comunicação e

como expressão da cultura brasileira.

Nova redação

segundo a Lei 7044, de

18 de outubro de 1982, que alterou o Art. 4º § 2º, da

Lei 5692/71, trazendo o

assunto para o § 3º da

mesma Lei.

Art. 4º, § 3º - No ensino de 1º e 2º graus, dar-se-á especial relevo

ao estudo da língua nacional, como instrumento de comunicação e

como expressão da cultura brasileira.

Lei 9394/96

Art. 26, § 1º Os currículos a que se refere o caput devem abranger,

obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa [...].

75

É certo que uma das características das leis é o emprego do verbo no futuro

do presente, contudo, ao conjugar o verbo de forma pronominal reflexa, o

enunciador/legislador, reforça a importância do ensino pautar-se na “língua

nacional”, pois a ação recai sobre o sujeito da frase, que no caso é o “ensino de 1º e

2º graus”.

Isso se reforça no momento em que ao parágrafo acrescenta-se “especial

relevo”, destacando-se de forma mais evidente o emprego do estudo da língua em

todo o país.

A questão concernente à “identidade” que é impressa pelo

enunciador/legislador em outros artigos, mais precisamente no 1º, § 2º da 5692/71 e

art. 32, § 3º da 9394/96, é reiterada nesses parágrafos das Leis, reforçando a

relevância da língua como elo de fortalecimento dessa identidade que vem salientar

não tanto a essência e a verdade da História brasileira, pois, se assim o fosse, a

evidência recairia na língua indígena, mas o que sucedeu foi a valoração da cultura

europeia que na realidade formou-se após o Brasil ter se tornado conhecido pelo

antigo continente.

Segundo a LDB, a língua será apresentada como “instrumento de

comunicação” que deverá amparar os estudos nas demais disciplinas e também

servir como conteúdo a ser aprofundado, conhecido e dominado pelo aluno no

decorrer dos anos letivos que compuserem o ensino anterior à graduação.

Na LDBEN, o parágrafo põe em evidência a língua como conteúdo a ser

estudado, reforçando essa ideia por meio do uso da expressão “obrigatoriamente” e

“devem abranger”. Esta última, apesar de apresentar um tom mais brando na forma

de colocação do verbo “dever”, conjugado na terceira pessoa do plural, do presente

do indicativo, a expressão “obrigatoriamente” exclui qualquer dúvida que poderia

pairar, principalmente pelo uso dessa expressão entre vírgulas, servindo com isso de

reforço explicativo de como o ensino deverá firmar-se.

Além disso, o artigo definido “o”, antecedendo “estudo da língua

portuguesa”, identifica qual será o estudo a ser desenvolvido e que deverá constar

no currículo, ou seja, não é qualquer estudo, mas aquele específico, delimitado, que

se sobressai dentre os outros e, no caso, a língua portuguesa.

76

No mais, como comentado anteriormente, a Lei 9394/96 tem como

característica ser mais descritiva que a Lei 5692/71 e, por isso, no art. 26, § 1º, é

possível ler outras áreas do conhecimento, mas que, para a presente análise, será

mantida a observação exclusivamente na língua como componente curricular, tendo

em vista ser a base de nossa análise, por onde se ampara a escolha de nossas

análises.

Lei 5692/71

Art. 11. O ano e o semestre letivos, independentemente do ano civil, terão, no mínimo, 180 e 90 dias de trabalho escolar efetivo, respectivamente, excluído o tempo reservado às provas finais, caso estas sejam adotadas.

Lei 9394/96

Art. 24. I - a carga horária mínima anual será de oitocentas horas, distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver;

Quadro 06 - Período Letivo

As semelhanças entre esses dois artigos estão atreladas aos assuntos por

eles tratados, ou seja, a quantidade de dias que comporão o ano letivo e a exclusão,

nesse período, da realização dos exames finais, caso sejam necessários.

Na Lei 5692/71, consta a preocupação em dividir esses dias letivos com

equilíbrio quantitativo, “independentemente do ano civil”, o que não se verifica na

redação da Lei 9394/96.

Por “ano civil”, a Lei nº 810, de 6 de setembro de 1949, estabeleceu como o

período que compreende os 365 dias do ano, divididos em 12 meses, iniciando-se

no dia 1 de janeiro e concluindo no dia 31 de dezembro do mesmo ano23,

modificando-se de quatro em quatro anos, tendo em vista o ano bissexto.

23 Art. 1º Considera-se ano o período de doze meses contado do dia do início ao dia e mês

correspondentes do ano seguinte. (BRASIL, 1949).

77

Segundo essa mesma Lei, os dias que correspondem ao ano letivo eram de

180 dias, sendo 90 no primeiro semestre e mais 90 no segundo semestre. Já na Lei

atual, trata de 200 dias letivos, o que revela um acréscimo de vinte dias, se

comparado à Lei anterior.

Para a antiga legislação, 180 dias era tempo suficiente para a aprendizagem

efetivar-se e o aluno revelar completa compreensão dos assuntos discorridos

naquele período de aula, caso contrário a retenção seria uma saída para que esse

mesmo aluno conseguisse aprender o que não conseguira naquele ano. Isso nos

remete, mais uma vez, ao ensino proposto à ocasião, assunto já discorrido

anteriormente.

De certa forma, o aumento para 200 dias letivos na nova legislação nos leva

a crer que o enunciador/legislador atribui a melhoria do ensino ao aumento das

aulas a serem ministradas pelos professores, ou seja, permanecendo mais dias na

escola, há uma maior possibilidade de a aprendizagem efetivar-se. Não obstante,

com esse aumento, o país deixa de ser um dos que têm menor quantidade de dias

no calendário escolar.

Outra questão é que no texto da LDB encontra-se: “trabalho escolar efetivo”,

enquanto que na LDBEN as expressões trocam de posição, ficando a redação na

seguinte forma: “efetivo trabalho escolar”.

No período em que a Lei 5692/71 encontrava-se em vigor, observou-se uma

grande preocupação quanto às horas do recreio, se elas eram computadas ou não

dentro do “trabalho escolar efetivo”, ficando decidido que, frente à necessidade de o

aluno descansar e integrar-se com seus pares, o recreio estaria dentro da atividade

educativa.

Já no que diz respeito ao “efetivo trabalho escolar”, entende-se como

aquelas atividades planejadas e amparadas na proposta pedagógica da escola nas

quais estão presentes tanto o corpo docente quanto discente, na qual o registro de

ausências e presenças é realizado. (BRASIL, 2008).

Quanto ao sentido da expressão “efetivo”, segundo o dicionário Houaiss

(2009), ela está relacionada a ser “capaz de produzir um efeito real [...] que

78

realmente se exerce, se cumpriu ou produziu”, ou seja, que a proposta apresentada

pela escola não esteja isenta da transparência e que de fato seja realizada.

No que diz respeito à colocação do adjetivo na frase, observa-se que em

“efetivo trabalho escolar”, a expressão reforça a importância do trabalho a ser

desenvolvido, de forma a atender aos objetivos propostos, neste caso validando

inclusive as atividades externas e extraclasse. Já em “trabalho escolar efetivo”, o

que se prioriza é o trabalho escolar que deve acontecer de forma real, ou seja, de

forma literal.

Em seguida observa-se o uso das expressões “provas” e “exames”.

Segundo o dicionário Houaiss (2009), por “prova” entende-se como:

“trabalho escolar, geralmente composto de uma série de perguntas, que tem por

finalidade avaliar os conhecimentos do aluno; teste, exame.” Por “exame” no mesmo

dicionário consta: “ato ou efeito de examinar; análise, estudo, investigação,

observação minuciosa; prova destinada a avaliar a aptidão ou os conhecimentos de

um aluno ou candidato a algum cargo, função etc.; teste.”

Mais uma vez os vocábulos se aproximam revelando-se sinônimos, mas

apresentando distanciamento quando postos sob a ótica do contexto no qual foram

empregados. Para tanto, observar como a “prova” era concebida no período de

1971, reporta-nos a uma avaliação classificatória, revelando, a exemplo do que

consta no próprio dicionário, uma proposta que se pautava em perguntas e

respostas com o fim de observar se os conhecimentos foram alcançados pelo aluno.

Já a expressão “exame” está muito atrelada à investigação, ao mapeamento, à

observação por meio de estudo do que o aluno conseguiu adquirir como aptidão.

Em suma, os dois artigos apresentam não só valores quantitativos diferentes

no que diz respeito aos dias que comporão o ano letivo, mas também as concepções

de escola e de avaliação revelam-se discrepantes, não coadunando uma com a

outra, deixando transparecer as entrelinhas do contexto histórico no qual foram

criadas.

79

Lei 5692/71

Art. 6º As habilitações profissionais poderão ser realizadas em regime de cooperação com as empresas.

Nova redação

segundo a Lei 7044, de

18 de outubro de 1982, que

alterou o Art. 4º § 2º, da

Lei 5692/71, trazendo o

assunto para o § 3º da

mesma Lei.

Art. 6º As habilitações profissionais poderão ser realizadas em regime de cooperação com empresas e outras entidades públicas ou privadas.

Lei 9394/96 (Redação original)

Art. 36 § 4º A preparação geral para o trabalho e, facultativamente, a habilitação profissional, poderão ser desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de ensino médio ou em cooperação com instituições especializadas em educação profissional.

Número de artigo e

parágrafo alterados

pela Lei nº 11.741, de 16 de julho de 2008.

Art. 36-A. Parágrafo único. A preparação geral para o trabalho e, facultativamente, a habilitação profissional poderão ser desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de ensino médio ou em cooperação com instituições especializadas em educação profissional.

Quadro 07 - Habilitação Profissional

Os artigos em questão têm como ponto comum a relação das empresas com

a formação do estudante e a sua preparação para o trabalho.

No texto original da Lei 5692/71, as habilitações profissionais poderiam estar

vinculadas às empresas, possibilidade ampliada pela nova redação do artigo,

segundo a Lei 7044/82, que viabilizou a participação de “entidades públicas ou

privadas” nessa empreitada de tornar exequível a habilitação profissional do aluno

em formação.

Dessa forma, as “habilitações profissionais” apresentam-se com uma real

preocupação do enunciador/legislador que reitera no texto legal a possibilidade em

ampliar o acesso à especialização por parte do futuro profissional.

80

Na LDBEN os vocábulos “habilitações profissionais” são precedidos por

“facultativamente”, isto é, a Lei não estabelece isso como obrigatório, como uma

função estatal vinculada à transformação do aluno num profissional proficiente, o

que é confirmado com o que consta no início do parágrafo: “preparação geral para o

trabalho”, garantindo com isso, estabelecer condições para desenvolver atividade

profissional futuramente. Assim, quem prepara antecipa a formação, mas não a

conclui, assegurando somente a formação preliminar.

Outra questão está no uso do elemento de ligação “e” que é desarticulado

com o emprego de “facultativamente”, ou seja, a “preparação geral para o trabalho”

pode acontecer em conjunto com a habilitação profissional, mas é a instituição que

decide se este último de fato será viabilizado ou não.

Com isso, reitera-se no próprio artigo o aspecto democrático de atribuir

autonomia decisória a quem forma o estudante, mas tira dele a possibilidade de

pleitear, caso assim o desejasse, a formação necessária para enfrentar o mercado

de trabalho, com uma profissão em mãos.

No mais, tanto na Lei 5692/71, quanto na 9394/96, o verbo poder aparece

empregado no futuro do presente do modo indicativo, estabelecendo por isso, uma

possibilidade de cooperação das empresas, mas não a garantia dela, na formação

do aluno.

Apesar disso, é certo o interesse expresso na Lei 5692/71 de garantir que

isso se efetivasse por meio de estágio, pois, como afirma o art. 5º, 2º, alínea “a”, é

objetivo do 2º grau garantir no currículo, em sua parte especial, a habilitação

profissional24.

No mais, o art. 6º continua o texto legal com as expressões “realizadas”,

enquanto no art. 36, § 4º, o que consta é “ser desenvolvidas”. Com isso, a LDB leva

a crer que o aluno, ao se dirigir para o estágio, leva consigo a possibilidade de

colocar em prática os conhecimentos já adquiridos, executando-os. Diferentemente,

na expressão utilizada pela LDBEN que novamente traz a ideia de processo, de

24

Art. 5º, 2º, a) terá o objetivo de sondagem de aptidões e iniciação para o trabalho, no ensino de 1º

grau, e de habilitação profissional, no 2º grau. (BRASIL, 1971)

81

aprendizagem que se constrói, que apresenta possibilidade de avanço e melhoria,

de forma progressiva e, portanto “desenvolvendo” suas capacidades profissionais.

Por fim, o art. 6º, em sua redação original conclui: “em regime de

cooperação com as empresas”, enquanto na Lei 9394/96 lê-se: “em cooperação com

instituições especializadas em educação profissional.

Lei 5692/71

Art. 9.º - Os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se encontrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados deverão receber tratamento especial de acordo com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação.

Lei 9394/96

Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades; II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns; IV - educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora; V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.

Quadro 08 - Educação Especial

Os artigos propostos para análise no presente quadro tratam da educação a

ser ministrada aos alunos que apresentam especificidades que os diferem dos

alunos tidos como comuns. Na primeira Lei, eles são tratados como “deficientes”,

com “atraso considerável” e “superdotados”, na segunda como “educando com

necessidades especiais”.

82

É certo que o distanciamento e a impessoalidade são características típicas

do gênero, contudo, independente disso, o enunciador/legislador mostra-se muito

mais distante do coenunciador na primeira Lei, quando é comparada com a

segunda.

Apesar disso, com o advento da 5692/71, uma mudança considerável na

legislação aconteceu em favor desses alunos, pois passou-se a reconhecer no Brasil

o direito do deficiente ao conhecimento apresentado pela escola, com foco na sua

integração social e, caso isso não fosse possível, tendo em vista o grau de

deficiência, o direito a uma educação especial assegurada pela norma.

Contudo, frente aos problemas enfrentados pela educação regular, como

analfabetismo, o ensino que se revela decadente nas escolas, as condições

deficitárias de trabalho para o professor, são comprometidas também as questões

que envolvem a escolarização desse aluno segregado a uma certa altura do meio

educacional regular.

Por fim, depois de passar por um processo de assistencialismo estatal e de

ambiguidade no que tange às políticas públicas voltadas para esses alunos, eles

passam a ganhar a prerrogativa de desenvolverem-se em suas especificidades nas

redes regulares, direito que começa a se delinear com a criação da Constituição

Federal de 1988 e com a publicação do Estatuto da Criança e adolescente que,

evocando a Carta Magna, confirma a importância de a família matricular o estudante

na escola.

Contudo, é em 10 de junho de 1994, com a redação da Declaração de

Salamanca, que a conscientização a respeito da inclusão do aluno nas escolas

começa a tomar forma mais definida em meio sociedade mundial. Apesar disso, as

dificuldades enfrentadas nos espaços de aprendizagem convencionais impedem que

a inclusão desse aluno aconteça de forma satisfatória, atingindo-se no máximo a

inserção dele na escola regular.

É certo que no Brasil outras legislações favoráveis à inclusão surgiram, da

mesma forma que ainda perdura o desafio de fazer da inclusão algo que favoreça o

crescimento e avanço desses alunos em suas especificidades com o trabalho na

sala e fora dela, ultrapassando a mera aceitação e integração desses alunos entre

seus pares, garantindo, assim, uma educação pautada em parâmetros pedagógicos

83

que alcancem esse aluno e viabilizem seu aprimoramento e crescimento como

pessoa integrante do meio social.

Expostas essas considerações preliminares e que nos fazem compreender

de forma muito breve a educação inclusiva no nosso país, o que se observa nas

duas Leis são olhares diferentes sobre o mesmo tema.

A LDB tangencia o assunto, assegurando que serão fixadas normas pelo

Conselho de Educação para regulamentar o “tratamento especial” desses alunos.

Em contrapartida, a LDBEN é mais descritiva, explicando no âmbito do próprio artigo

o que será assegurado a esses alunos no espaço escolar.

Dessa forma, analisando as expressões lexicais que, em tese, convergem

nos dois enunciados, é possível observar que no art. 9º, há emprego da expressão

“aluno” em contraposição a “educando” pelo art. 59, da 9394/96.

Segundo o dicionário Ferreira (1999), o substantivo “aluno” significa:

“Pessoa que recebe instrução e/ou educação de algum mestre, ou mestres, em

estabelecimento de ensino ou particularmente; estudante, educando, discípulo;

Aquele que tem escassos conhecimentos em certa matéria, ciência ou arte;

aprendiz.”, enquanto “educando”: “Aquele que recebe educação, que está sendo

educado; aluno.”

Apesar de o dicionário trazer esses termos de forma muito próxima, “aluno”

apresenta uma conotação dentro da esfera pedagógica que comprometeria a

compreensão da expressão como a possibilidade de o estudante ser o articulador de

seus próprios conhecimentos. Sob essa questão, Luckesi (2004), afirma que a

expressão “aluno”, deveria ser substituída por estudante ou educando, tendo em

vista a expressão estar atrelada a um conceito filosófico que torna o aluno receptor

de aprendizagem:

[...] vamos substituir o nome “aluno” por estudante ou educando. O termo aluno, segundo os filólogos, vem do verbo alere, do latim, que significa alimentar; porém, existe uma forma de leitura desse termo mais popular e semântica do que filológica que diz que “aluno” significa “aquele que não tem luz” e que teria sua origem também no latim, da seguinte forma: prefixo “a” (=negação) e “lummen” (=luz). Gosto dessa segunda versão, certamente, não correta do ponto de vista filológico, mas verdadeira do ponto de vista da prática cotidiana de ensinar. Nesse contexto de entendimento, agindo com nossos educandos como seres “sem luz”, só poderemos praticar uma pedagogia depositária, bancária..., como sinalizou o prof. Paulo Freire. Nunca uma pedagogia construtiva. Dai também,

84

dificilmente, conseguiremos praticar avaliação, pois que esta está voltada para o futuro, para a construção permanente daquilo que é inacabado.

Com isso, pode-se destacar a ideia que permeia todo o contexto educativo

das épocas em que as duas legislações, ora em estudo, foram criadas, mesmo se,

num primeiro momento, ambas tratam dessas expressões como sinônimas.

Na Lei 5692/71, o enunciador/legislador valeu-se da expressão “deficiências

físicas ou mentais”, para se referir ao aluno que, por um desses motivos, não

acompanha os estudos na escola regular.

Por “deficiências”, o dicionário Houaiss (2009) atesta ser a: “insuficiência ou

ausência de funcionamento de um órgão; [...] de uma função psíquica ou intelectual

[...]” que, segundo o artigo da norma, está diretamente relacionada com a

interpretação dada pelo dicionário, pois como complemento do ordenamento se

encontra a expressão “físicas”, ou seja, corporal e “mental”, que significa “relativo a

ou afetado por desordem ou desequilíbrio da mente”.

Se na Lei revogada essas eram as expressões utilizadas para definir quem

seriam esses alunos abarcados pela norma, na atualidade o que se observa é que

dessas expressões ainda é comum observar em uso o termo deficiência física (D.F.),

somado a outros que revelam certo avanço nos estudos dentro dessa área. Tratam-

se das expressões: deficiência intelectual (D.I.), deficiência auditiva (D.A.),

deficiência visual (D.V.), deficiências múltiplas (D.M.) e o Transtorno Evasivo do

Desenvolvimento (T.E.D.), no qual englobam-se, por exemplo, os autistas.

Contudo, a LDBEN traz outra expressão, para designar a educação especial,

ou seja, “necessidades especiais”.

Segundo a expressão “necessidade”, entende-se como: “qualidade do que é

necessário; o que não se pode evitar; inevitável; o que é imprescindível”, trazendo,

ao final, a expressão “especiais”, cuja relação está naquilo “que não é geral, que diz

respeito a uma coisa ou pessoa; individual, particular; próprio, peculiar, específico,

típico”.

Essas expressões voltadas para a esfera educacional levam a concluir que a

redação da Lei apresenta um foco mais específico para as especificidades do

estudante, mesmo porque, como os termos mesmos nos levam a crer, aquilo que é

necessário torna-se imprescindível para aqueles que, diferente dos demais,

85

precisam de um atendimento educacional que leve em consideração esse aluno,

partindo do que ele sabe, buscando avançar em seus conhecimentos.

Na atual conjuntura, constatou-se que a expressão “necessidades especiais”

veio em relevo pelo fato de abordar o assunto de forma respeitosa, tratando as

especificidades daqueles que apresentam limitações, sem, contudo, colocar em

evidência essa questão de forma pejorativa ou mesmo excludente.

No mais, a LDB traz ainda, no mesmo artigo, “os que se encontrem em

atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados”.

Reportando-se ao que de fato aconteceu à época em que essa Lei se

encontrava em vigor, é certo que ela não deu conta de viabilizar a esses alunos o

tratamento especial de que precisavam, direcionando-os a escolas ou classes que

desenvolviam um trabalho com esses alunos, segregando-os dos demais.

Em continuidade, a frase traz a expressão “atraso” como sendo aquele que

foi privado de suas faculdades normais, pois faltar-lhes-iam consonância entre a

idade cronológica e a idade mental. Já quanto à expressão “superdotados”: são

aqueles que possuem “inteligência superior à média”.

A esses a Lei favoreceria com um tratamento especial que deveria ser

estabelecido pelos Conselhos de Educação, o que, como já dito anteriormente, de

fato não ocorreu.

Diante do que ora se apresentou, resta ainda comentar que a Lei 9394/96

demonstrou ser mais descritiva que a 5692/71, pois agregou ao seu ato normativo

um capítulo inteiro dedicado à articulação na formação desses alunos,

diferentemente do que aconteceu na LDB, que se valeu somente de um artigo para

tratar de forma superficial o assunto, delegando aos Conselhos a prerrogativa de

normatizar o assunto.

Por certo, tanto o art. 9º, quanto o art. 59 convergem no que diz respeito à

competência de legitimar os direitos inerentes àqueles que apresentam diferenças

singulares, destacando-se este último frente à divisão em incisos que delineiam a

forma como essa atribuição ao sistema de ensino deverá estabelecer-se.

86

Dessa forma, sendo a base de nossa análise os artigos da Lei 5692/71 em

paralelo com as semelhanças e diferenças existentes entre essa Lei e a 9394/96,

dar-se-á continuidade à nossa análise, direcionando-a para o próximo quadro, tendo

em vista no art. 59 da Lei atual nada mais constar que se aproxime do que foi

tratado pelo art. 9º da LDB.

Lei 5692/71

Art. 11, § 1º. Os estabelecimentos de ensino de 1º e 2º graus

funcionarão entre os períodos letivos regulares para, além de

outras atividades, proporcionar estudos de recuperação aos

alunos de aproveitamento insuficiente e ministrar, em caráter

intensivo, disciplinas, áreas de estudo e atividades planejadas com

duração semestral, bem como desenvolver programas de

aperfeiçoamento de professores e realizar cursos especiais de

natureza supletiva.

Lei 9394/96

Art. 24. A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será

organizada de acordo com as seguintes regras comuns:

V - a verificação do rendimento escolar observará os seguintes

critérios:

e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência

paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento

escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em

seus regimentos;

Quadro 09 - Estudos de Recuperação Paralela.

Os artigos que compõem o presente quadro de análise tratam da

recuperação que deverá ser ofertada, fora do horário de aula, aos alunos que não

atingiram os objetivos propostos, uma inovação trazida pela LDB e, de certa forma,

reiterada na LDBEN.

Para tanto, o art. 11, § 1º, da Lei 5692/71, inicia da seguinte forma: “Os

estabelecimentos de ensino de 1º e 2º graus”, assegurando de quem será a

responsabilidade em articular a organização da recuperação para esses alunos,

enquanto que na Lei 9394/96 esse assunto é determinado ao final da alínea “e”,

87

onde é possível ler: “a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus

regimentos”.

Disso é possível observar que a Lei 5692/71 opta por iniciar o parágrafo com

um artigo definido que, antecedendo o substantivo, assegura não se tratar de

qualquer local, necessitando do complemento “de ensino de 1º e 2º graus” para

determinar o lugar exato em que se determina a realização da recuperação.

Segundo o dicionário Houaiss (2009), “estabelecimento” refere-se à

“instituição pública”, enquanto que “instituição” refere-se ao “estabelecimento

destinado ao ensino, à educação; instituto”.

A diferença que poderia ser observada está na abrangência que a expressão

“estabelecimento” abarca, pois, tratando-se de uma instituição pública, a escola é

colocada no mesmo nível das demais instituições pertencentes ao governo, o que

reforça a centralização comum à época pelo poder militar.

Diversamente, é possível depreender da expressão “instituição” o seu

sentido denotativo ao especificar de qual estabelecimento está-se tratando, ou seja,

aquele “destinado ao ensino, à educação”.

É certo que o enunciador/legislador não deixou qualquer margem para

eventuais dúvidas quanto à questão aqui tratada, mas como já dito anteriormente,

há um limite entre um sinônimo e outro, tênue, é certo, mas que os diferencia.

O dicionário ainda se refere à “instituição” como sendo um “organismo

público ou privado”. Partindo disso, a própria expressão apresenta-se como sendo

um sistema com estrutura organizada, que não está atrelada a uma só instituição,

mas abarca outras que vão além da esfera pública.

A LDB utiliza mais uma vez a expressão “proporcionar” que, como

comentado em análise anterior (vide Quadro 02), está diretamente relacionada com

o que Paulo Freire intitulava de “educação bancária”, comum à época, bem como, o

vínculo que se estabelece, na prática, entre o “proporcionar” e a real imposição

dessa frequência por parte do aluno.

Já a LDBEN antes de estabelecer em seu texto legal os “estudos de

recuperação” utilizou da expressão “obrigatoriedade”, o que determina o cunho

88

impositivo da norma que atrela o estudante com baixo rendimento a fazer jus do

direito, competindo não somente à escola viabilizar o acesso, mas também garantia

a frequência desses alunos no horário paralelo ao ensino regular.

É certo que entre “o real e o ideal”, de fato há muito a se consolidar, porém,

essa é uma determinação da norma hoje em vigor.

Pensando no art. 14, 2º, da Lei 5692/71, no qual consta: “O aluno de

aproveitamento insuficiente poderá obter aprovação mediante estudos de

recuperação proporcionados obrigatoriamente pelo estabelecimento”, pode-se

depreender que para a LDB, a recuperação não estava centrada na realização de

uma aprendizagem real, mas na promoção para o ano subsequente.

Outra questão que poderia servir de comparação e contraste, está em

“aproveitamento”, previsto na redação da 5692/71 e “rendimento”, escrito na Lei

9394/96. O primeiro vocábulo, segundo o dicionário Houaiss (2009), significa “fazer

progresso”, já a expressão “rendimento” significa “eficiência relativa no desempenho

de uma tarefa”.

Assim, vê-se de um lado o “aproveitamento” que está atrelado ao progresso,

mas também ao ato de aproveitar, ou seja, de fazer bom uso, o que faz sentido

presumir que esse “aproveitamento” estava atrelado ao ato de o aluno ir ao encontro

do conhecimento ofertado pela instituição escolar, não tendo ela a preocupação

senão a de “proporcionar os estudos de recuperação”.

Já por “rendimento”, compreende-se como a garantia da “eficiência”, ou

ainda, da “virtude”, oportunizando adquirir a “característica de [...] ser competente,

produtivo, de conseguir o melhor rendimento com o mínimo de erros [...]” (Houaiss,

2009).

Contudo, sem se furtar à análise do texto legal, é certo que ele trata da

necessidade de recuperação exatamente porque ausentes esses quesitos, por isso,

tomando o contexto lexical, no qual as expressões estão implícitas, o que se observa

na Lei 5692/71 é a recuperação que deverá ser dada ao aluno que não apresentou o

progresso esperado para aquela série na qual estava matriculado de tal forma que o

aluno “passe de ano”, pois essa recuperação deverá acontecer “em caráter

intensivo”.

89

Já na 9394/95, o “baixo rendimento”, está atrelado ao sentido de ficar aquém

da eficiência esperada, devendo ser “disciplinados pelas instituições de ensino em

seus regimentos”, garantindo assim autonomia a essas instituições.

Dessa forma, é possível perceber que há uma diferença substancial quanto

à recuperação proposta nas duas Leis.

90

À GUISA DE UMA CONCLUSÃO: A CONSTITUIÇÃO DE

DIFERENTES ETHÉ NAS LEIS DE DIRETRIZES E BASES

Conforme a proposta inicial deste trabalho, foi possível observar, num

primeiro momento e de forma resumida, o percurso histórico que a educação no

Brasil percorreu até o advento das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,

possibilitando compreender o porquê da criação de normas com foco específico na

organização e articulação da educação no país.

Diante disso, o corpus que apoiou o desenvolvimento do presente trabalho,

e que versa sobre a educação no Brasil, é composto por duas Leis que surgiram em

períodos diferentes da nossa história, períodos nos quais os regimes políticos que

vigoraram em nada se assemelham. Tratam-se das Leis 5692/71, criada na ditadura

e 9394/96, que surgiu em meio à democracia.

Contudo, para que haja uma comunicação adequada entre aqueles que

fazem parte do meio social, as leis são reguladas por regras que, a exemplo dos

demais gêneros, apresentam características estruturais específicas, diferenciando-

as de todos os outros, mesmo se, em alguns aspectos, há uma proximidade sensível

entre eles.

Postas em análise, é possível depreender que as duas Leis apresentam

semelhanças e diferenças que perpassam pelos interesses políticos do período em

que foram sancionadas, o que se evidencia pelo uso e escolhas linguísticas, bem

como, os efeitos de sentido presentes nos artigos que tratam do mesmo assunto em

ambas as Leis.

Assim, partindo da análise das escolhas realizadas pelos enunciadores

dessas Leis, pode-se depreender nos artigos apresentados no Capítulo II do

presente trabalho, dentre outras, a utilização de verbos que seguem, via de regra, a

conjugação no tempo presente e futuro do presente do indicativo, o que assegura à

Lei uma continuidade.

Apesar de muitos desses verbos trazerem uma correlação, foi possível

observar que não há uma semelhança entre eles, pois cada termo utilizado

91

apresenta uma peculiaridade que se materializa em meio ao contexto, confirmando

que de fato, não existem sinônimos perfeitos.

Isso também se evidencia quando a análise acontece por meio da

observação do ethos que se depreende do discurso, pois é através do enunciado

que se possibilita estabelecer uma relação dialogal, viabilizando, assim, a criação da

imagem do enunciador perante o coenunciador.

Com isso, encontra-se nas normas jurídicas a figura do legislador que atua

no enunciado representando a vontade da instituição que o legitima. Dessa forma,

num primeiro momento, é possível perceber um ethos distante do coenunciador,

indiferente às suas reais necessidades, tendo em vista o poder que lhe é atribuído

para determinar a ação a ser obedecida pelo coenunciador, pessoa que deve

sujeitar-se à norma posta.

Paralelamente, há também a possibilidade de conferir-se ao

enunciador/legislador um ethos pré-discursivo pautado na vontade e nos interesses

dos coenunciadores que, na atual conjuntura, não raro são aqueles que lhe

outorgaram tal prerrogativa por meio do voto direto.

Apesar disso, não se pode deixar de salientar que é em meio ao discurso

que esse ethos se desvela, mesmo porque, se entrelaça no enunciado, podendo ser

percebido no decorrer da escrita textual, levando-se em consideração, para tanto, a

observação das realidades sociais e, ainda, das relações institucionais estabelecidas

(AMOSSY, 2008).

Partindo desse pressuposto, as Leis apresentam expressões que não

descaracterizam o discurso autoritário típico do gênero, mas fazem entrever os

diferentes ethé presentes nos ordenamentos jurídicos.

Isso se reflete já no início de cada uma das normas, que nos apresentam em

suas ementas diferenças que se materializaram no decorrer de seus artigos, como é

o caso dos verbos “fixar” e “estabelecer”, que remetem ao tom autoritário das

normas, reforçado principalmente pelo uso do verbo fixar, dando-se uma impressão

de imposição irrestrita, de uma determinação imposta pelo enunciador/legislador,

reportando-nos ao ethos de alguém que se distancia do coenunciador, ordenando a

sujeição à Lei.

92

Por outro lado, o verbo “estabelecer” nos apresenta o ethos de um

enunciador mais próximo ao coenunciador, mas não dilui o tom impositivo da norma,

sem porém descaracterizá-la, dando-se a ideia de introdução do assunto que será

tratado, firmando um ajuste nessa relação entre enunciador/legislador e

coenunciador, o que transparece o ethos de alguém mais próximo daquele que

deverá subordinar-se aos ditames da Lei.

Isso é reforçado com o emprego do artigo definido “as”, expressando certa

familiaridade, aproximando, portanto a norma em questão das pessoas que fazem

parte daquele meio social. Além disso, as expressões “diretrizes e bases” e

“educação nacional”, empregadas na forma como foram no texto legal, estabelecem

uma revelação de pertencimento da primeira para com a segunda, como que se

colocando a serviço da educação no país, o que provoca o coenunciador a aderir ao

que nela consta.

Paralelamente, na Lei 5692/71, o enunciador/legislador redige “Diretrizes e

Bases” sem o artigo e emprega letras maiúsculas nesses termos, tornando-os

singulares, o que distancia o coenunciador, inibindo-o de se sentir integrado mas

sujeito à norma, o que demonstra o ethos de um enunciador que quer se manter

distante, despreocupado com a adesão ou não do coenunciador.

Ao mesmo tempo, a expressão “educação”, empregada pela Lei 9394/96,

demonstra ser mais abrangente quando comparada a “ensino”, apresentando-nos o

ethos de alguém que se preocupa com a pessoa como um todo, capaz de aprender

em diferentes contextos, nos quais o “ensino” é uma das ferramentas sociais, em

meio a tantas outras, que colaboram para o aprimoramento dos conhecimentos do

estudante.

Ao compartimentar a formação do aluno, atribuindo à escola a transmissão

do conhecimento por meio do ensino, sem levar em consideração as demais

aprendizagens que se apresentam no convívio com o meio, a Lei 5692/71, organizou

a escola em “graus” escalonando-a por séries, e organizando turmas o mais

homogêneas possível, garantindo assim a transmissão do conhecimento de foram

igualitária para todos, competindo a estes a aprendizagem dos conteúdos propostos.

Pensando ser a linha de produção e, portanto, a mão de obra para o

trabalho nas indústrias a preocupação central do governo à época, o que fica

93

patente é a figura de um ethos que se coaduna com os interesses institucionais,

preocupado com uma formação em massa, mais uma vez, distante do coenunciador

que é de fato um sujeito diferente dos demais e, portanto, com aprendizagens,

necessidades e anseios que se distanciam, por vezes, dos interesses ditatoriais.

Esse ethos distante do coenunciador, mas atento aos interesses estatais,

manifesta-se também no momento em que o estágio é estabelecido como forma de

preparo para o mercado de trabalho, pois, como o visto em nossa análise na Lei

5692/71, o mesmo se dava dentro das empresas, enquanto na 9394/96, esse

aprimoramento deve acontecer nas próprias escolas ou instituições especializadas,

o que possibilita o trabalho conjunto para o aprimoramento do estudante visando a

sua preparação para enfrentar o mercado.

No mais, esse ethos confirma-se quando o ordenamento jurídico acrescenta

em seu artigo expressões como “objetivo geral”, ou seja, o desejo de se atingir

determinado propósito com todos, no conjunto e de maneira uniforme, bem como,

“cidadania” transcrita ao final do dispositivo legal, o que demonstra a ausência de

interesse em de fato formar pessoas cidadãs, pois se assim não fosse a expressão

não estaria posicionada ao final do artigo.

Ao mesmo tempo, quem “proporciona” um ensino para a massa, sem deter o

foco na individualidade, não revela envolvimento com a pessoa, mas com o fim, com

o “objetivo” proposto para a sua ação de ensinar, distante de se ater ao processo

que conduz a esse fim, como é o caso da Lei 9394/96, que opta por expressões

como “finalidade” e “desenvolvimento”, da capacidade do estudante em aprender.

Com isso, é possível conceber o ethos presente no art. 22 como aquele que

se envolve com processo de aprendizagem, mesmo porque o próprio ordenamento

acrescenta expressões como “assegurar” a “formação comum” para o “exercício da

cidadania”, com o cunho de “fornecer” meios para “progredir no trabalho ‘e’ em

estudos posteriores”.

Isso é reforçado frente aos estudos que surgiram na área da psicologia e

que vieram colaborar com as reflexões a respeito da concepção de aprendizagem,

colocando o estudante como o foco central de todo o trabalho pedagógico,

assumindo assim a corresponsabilidade ao assegurar uma formação que visa ao

“processo” e com ele o “fim”. Dessa forma, o ethos presente instaura-se como

94

copartícipe de todo o percurso de aprendizagem, revelando-se próximo ao

coenunciador.

Frente ao que se está discorrendo, é possível que em alguns casos uma das

interpretações quanto aos ethé presentes nos dois ordenamentos jurídicos estejam

apresentados de forma explícita, mas é certo que ao realizar uma leitura dos artigos

das Leis, nem sempre isso é possível de se observar de forma tão evidente. Basta

pensar no trato que as duas Leis deram para a questão da língua no Brasil.

Num primeiro momento dessa nossa análise, a Lei 5692/71 ratifica o que foi

determinado pela coroa portuguesa quanto ao emprego do idioma, ampliando a

questão para que nas escolas fosse feito uso dela e não de outra para transmitir os

conhecimentos à clientela, o que se confirma com o uso da expressão

“obrigatoriamente” no corpo do artigo, inibindo eventuais dúvidas a respeito.

Isso demonstra um ethos nacionalista, que visa a garantir os valores

nacionais, salvaguardando-os por meio da nova geração a quem deveria se

perpetuar esse vínculo, por meio da escola e do ensino que ali se daria pela língua.

Esse ethos é mantido pela nova Lei, reforçado, por um lado, ao estabelecer

a Língua Portuguesa não só como a língua nacional, utilizada portanto em todo

território, mas por outro, como a língua oficial da nação, garantindo com isso a

herança recebida por ocasião da colonização portuguesa aqui no Brasil.

Tal questão é reiterada quando as leis asseguram não só o uso da língua

como objeto de comunicação, mas também como matéria curricular, mediante os

estudos que deverão ser desenvolvidos sobre o uso da língua, quer porque deverão

dar “especial relevo”, conforme art. 4º, 2º, da Lei 5692/71, quer porque “devem

abranger, obrigatoriamente” o estudo dela, conforme art. 26, § 1º da Lei 9394/96.

Ao mesmo tempo, a Lei traz uma ressalva, assegurando às comunidades

indígenas o uso da língua típica da tribo, bem como seus processos específicos de

aprendizagem, preocupando-se, porém, com a inculturação nesses locais da

hegemonia do homem branco, apresentando, assim, um ethos nacionalista que se

distancia daquele apresentado pela Lei 5692/71.

Por outro lado, a Lei 9394/96, apresenta por vezes um ethos flexível em

oposição à rigidez da Lei 5692/71, quando faz uso de expressões como “devem ter”,

95

“base nacional comum”, “a ser complementada” em oposição a “terão”, núcleo

comum”, “obrigatório”, expressões que, no primeiro caso, apazigua o sentido da

norma posta, apresentando uma forma mais amena de expressar o que será de

incumbência e de efetivo exercício atribuído ao coenunciador e, no segundo caso,

em que se mantém o ethos impositivo, ditatorial e distante do coenunciador, que

pouco se preocupa de fato com as “diferenças individuais”, tendo em vista as

“possibilidades concretas” que, em sua ausência, como se mostrou de fato ser,

eximia de serem levadas em consideração essas diferenças.

No mais, o aumento dos dias letivos pela LDBEN, revela-nos um ethos

preocupado com o aluno, envolvido na aprendizagem que deveria ocorrer para o seu

pleno desenvolvimento, que se mantém pelo uso da expressão “exame”, tendo em

vista a preocupação atrelada ao efeito de avaliar para investigar e mapear os

conhecimentos adquiridos.

O ethos distante, preocupado com o resultado e não com o processo, é

reiterado no momento em que a Lei 5692/71 opta pelo emprego da expressão

“prova” cuja função específica era a de classificar e, portanto, aferir os

conhecimentos adquiridos pelo aluno no processo de ensino que, quando não

atingido, deveria ser proporcionado nos estabelecimentos de ensino, por

recuperação intensiva, para que a promoção fosse possível e, quando não,

culminando na reprovação e na evasão escolar de muitos alunos.

Já na LDBEN, o baixo rendimento é atendido com uma proposta de

recuperação obrigatória, competindo à escola também o acompanhamento desses

alunos quanto à presença na recuperação, revelando, mais uma vez o ethos

passível em envolver-se com a realidade do estudante em sua singularidade e

aprimoramento pedagógico.

Depois, o aspecto humano, comum quando o assunto é educação especial,

nos desvela na Lei 5692/71 o ethos envolvido com as questões mundiais a respeito

do assunto, e por isso cita essa questão na norma, delegando o assunto, sem tecer

comentários pormenorizados a respeito. Isso de certa forma apresenta mais uma

vez um ethos distanciado, pouco envolvido, diferentemente do que se verifica ao

comparar a Lei 9394/96, que prontamente desenvolve um capítulo inteiro sobre o

assunto, discorrendo já na Lei quais seriam esses direitos assegurados aos alunos

96

com “necessidades educacionais especiais”, termo empregado que evidencia um

ethos mais humano, voltado para a não estigmatização, mas ciente de que é

passível de serem atendidos em suas especificidades na rede regular de ensino.

Diante do que se tratou até aqui, é possível observar que em ambas as

normas os ethé que se apresentam não são os mesmos entre um e outro

ordenamento jurídico, mesmo se, a princípio, ambos tratam do mesmo assunto em

seu aspecto geral.

De fato, uma norma criada num período, comparada a outra estabelecida

posteriormente, e que versam sob o mesmo assunto, não trazem características

semelhantes e, consequentemente, a imagem dos ethé se distanciam.

Apesar disso, é possível considerar que tanto em uma Lei quanto em outra,

o ethos que se apresenta é impositivo, detentor de autoridade, que pode obrigar o

coenunciador a acatar a determinação imperativa que ali se estabelece, tendo em

vista a função assegurada pelo gênero, reconhecida pelo meio social.

Ao mesmo tempo, mediante nossas análises, a Lei 5692/71 emerge como

aquela que apresenta um ethos que se coaduna com a do poder vigente, cerceando

prerrogativas e atribuindo direitos que vêm ao encontro dos anseios não

democráticos comuns e que imperavam naquele período de ditadura, tratando-se,

neste caso, do ethos institucional, que se revelou mediante a articulação lingüística,

estabelecendo e determinando, em nome do bem comum, a ação que todos

deveriam ter para que a nação se expandisse e alcançasse a tão almejada

industrialização estabelecida de forma mais incisiva, nesse período no Brasil.

Isso revela o ethos de um enunciador pouco preocupado com a pessoa do

aluno, mas atento às possibilidades de que o contato com a educação sistematizada

poderia proporcionar-lhe, detendo como fim, a formação de mão de obra competente

e a diminuição do fluxo de alunos às universidades, que se mantiveram por muitos

anos em número insuficiente para atender a demanda.

Isso, diferentemente do que se verifica na atual legislação, que nos reporta

ao ethos de alguém atento às especificidades da população, que também vem ao

encontro das especificidades do poder vigente, buscando garantir uma educação

97

pautada no processo que visa a um fim, mediante o acompanhamento do sistema de

ensino.

Em outro momento, mais precisamente, no art. 1º da LDB, a figura do ethos

institucional se reforça, ao determinar o objetivo geral da norma, ou seja, o de ensino

que se estabelecia em graus de dificuldade, criando-se assim etapas de ensino,

nivelando e avaliando os alunos de forma homogênea, classificando-os, o que por

muito tempo ocasionou a evasão e repetência, segregando muitos da possibilidade

de aprender na idade correta, sem revelar qualquer mobilização governamental para

resolver ou mesmo minimizar tal questão.

Além disso, o uso de expressões como: "objetivo geral", que visava ao fim

sem se preocupar com o processo; "proporcionada" e "desenvolvimento de suas

potencialidades", cuja ideia estava em ver o aluno como um receptor de

conhecimentos, reforçam a imagem de um ethos ditatorial centralizador, que não se

atém às diferenças e necessidades individuais, mas à massa como um todo, ou seja,

a qualificação para o trabalho, sem a garantia da cidadania apregoada em um dos

artigos pelo próprio ordenamento jurídico.

Como isso, é possível observar a impossibilidade de dissociar o ethos

discursivo do institucional, pois nesse contexto enunciativo, ambos se completam,

fundindo-se.

Isso também pode ser observado ao analisar a Lei 9394/96, pois nela

transparece um ethos que se aproxima, vindo ao encontro das expectativas sociais

que visam a distanciar-se do período ditatorial, trazendo para si o liame entre esse

desejo social de democracia e as regras estipuladas pela Lei, buscando esquivar-se

a todo custo de uma eventual imposição unilateral, advinda do poder, capaz de

retirar das mãos do povo a liberdade que, na ocasião, havia sido recentemente

resgatada.

Diante disso, é possível constatar que as Leis em análise têm em comum a

forma autoritária e impositiva em sua estrutura redacional, típica do gênero,

revelando o ethos institucional nelas implícitos. Contudo, na Lei 5692/71 o ethos é

mais distante, pouco atento aos coenunciadores, mesmo porque, ditatorial. Já na Lei

9394/96, apresenta-se mais próximo, como se dele emanasse uma participação

conjunta, um caminhar ao lado desse coenunciador.

98

Por fim, é certo que, frente às análises e observações das formas estruturais

e das microestruturas presentes nas Leis de Diretrizes e Bases, muito há que

poderia ser analisado, buscando traçar esse paralelo entre uma e outra na

perspectiva de se observar os diferentes ethé presentes nas normas jurídicas.

Contudo, não é nossa intenção esgotar o assunto aqui tratado, mas buscar traçar

um paralelo que viabilizasse a observação desses diferentes ethé.

Assim, o presente trabalho traz como contribuição demonstrar que com a

mudança da sociedade, as perspectivas legais também mudam, mesmo porque a

legislação é tão dinâmica quanto a sociedade e os interesses que dela emergem.

99

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100

ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11274.htm>. Acesso em: 26 set. 2012.

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ANEXO A - Lei de Diretrizes e Bases 5692/71.

Presidência da República

Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI No 5.692, DE 11 DE AGOSTO DE 1971.

Revogada pela Lei nº 9.394, de 20.12.1996 Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a

seguinte Lei:

CAPÍTULO I

Do Ensino de 1º e 2º graus

Art. 1º O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao

desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e

preparo para o exercício consciente da cidadania.

1º Para efeito do que dispõe os artigos 176 e 178 da Constituição, entende-se por ensino primário a

educação correspondente ao ensino de primeiro grau e por ensino médio, o de segundo grau.

2° O ensino de 1° e 2º graus será ministrado obrigatòriamente na língua nacional.

Art. 2° O ensino de 1º e 2º graus será ministrado em estabelecimentos criados ou reorganizados sob critérios

que assegurem a plena utilização dos seus recursos materiais e humanos, sem duplicação de meios para fins

idênticos ou equivalentes.

Parágrafo único. A organização administrativa, didática e disciplinar de cada estabelecimento do ensino

será regulada no respectivo regimento, a ser aprovado pelo órgão próprio do sistema, com observância de

normas fixadas pelo respectivo Conselho de Educação.

Art. 3° Sem prejuízo de outras soluções que venham a ser adotadas, os sistemas de ensino estimularão, no

mesmo estabelecimento, a oferta de modalidades diferentes de estudos integrados, por uma base comum e, na

mesma localidade:

a) a reunião de pequenos estabelecimentos em unidades mais amplas;

b) a entrosagem e a intercomplementariedade dos estabelecimentos de ensino entre si ou com outras

instituições sociais, a fim de aproveitar a capacidade ociosa de uns para suprir deficiências de outros;

c) a organização de centros interescolares que reunam serviços e disciplinas ou áreas de estudo comuns a

vários estabelecimentos.

Art. 4º Os currículos do ensino de 1º e 2º graus terão um núcleo comum, obrigatório em âmbito nacional, e

uma parte diversificada para atender, conforme as necessidades e possibilidades concretas, às peculiaridades

locais, aos planos dos estabelecimentos e às diferenças individuais dos alunos.

1º Observar-se-ão as seguintes prescrições na definição dos conteúdos curriculares:

I - O Conselho Federal de Educação fixará para cada grau as matérias relativas ao núcleo comum,

definindo-lhes os objetivos e a amplitude.

106

II - Os Conselhos de Educação relacionarão, para os respectivos sistemas de ensino, as matérias dentre as

quais poderá cada estabelecimento escolher as que devam constituir a parte diversificada.

III - Com aprovação do competente Conselho de Educação, o estabelecimento poderá incluir estudos não

decorrentes de materiais relacionadas de acôrdo com o inciso anterior.

2º No ensino de 1º e 2º graus dar-se-á especial relêvo ao estudo da língua nacional, como instrumento de

comunicação e como expressão da cultura brasileira.

3º Para o ensino de 2º grau, o Conselho Federal de Educação fixará, além do núcleo comum, o mínimo a ser

exigido em cada habilitação profissional ou conjunto de habilitações afins.

4º Mediante aprovação do Conselho Federal de Educação, os estabelecimentos de ensino poderão oferecer

outras habilitações profissionais para as quais não haja mínimos de currículo prèviamente estabelecidos por

aquêle órgão, assegurada a validade nacional dos respectivos estudos.

Art. 5º As disciplinas, áreas de estudo e atividades que resultem das matérias fixadas na forma do artigo

anterior, com as disposições necessárias ao seu relacionamento, ordenação e seqüência, constituirão para cada

grau o currículo pleno do estabelecimento.

1º Observadas as normas de cada sistema de ensino, o currículo pleno terá uma parte de educação geral e

outra de formação especial, sendo organizado de modo que:

a) no ensino de primeiro grau, a parte de educação geral seja exclusiva nas séries iniciais e predominantes

nas finais;

b) no ensino de segundo grau, predomine a parte de formação especial.

2º A parte de formação especial de currículo:

a) terá o objetivo de sondagem de aptidões e iniciação para o trabalho, no ensino de 1º grau, e de habilitação

profissional, no ensino de 2º grau;

b) será fixada, quando se destina a iniciação e habilitação profissional, em consonância com as necessidades

do mercado de trabalho local ou regional, à vista de levantamentos periòdicamente renovados.

3º Excepcionalmente, a parte especial do currículo poderá assumir, no ensino de 2º grau, o caráter de

aprofundamento em determinada ordem de estudos gerais, para atender a aptidão específica do estudante, por

indicação de professôres e orientadores.

Art. 6º As habilitações profissionais poderão ser realizadas em regime de cooperação com as emprêsas.

Parágrafo único. O estágio não acarretará para as emprêsas nenhum vínculo de emprêgo, mesmo que se

remunere o aluno estagiário, e suas obrigações serão apenas as especificadas no convênio feito com o

estabelecimento.

Art. 7º Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e

Programas de Saúde nos currículos plenos dos estabelecimentos de lº e 2º graus, observado quanto à primeira o

disposto no Decreto-Lei n. 369, de 12 de setembro de 1969.

Parágrafo único. O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais dos

estabelecimentos oficiais de 1º e 2º graus.

Art. 8º A ordenação do currículo será feita por séries anuais de disciplinas ou áreas de estudo organizadas

de forma a permitir, conforme o plano e as possibilidades do estabelecimento, a inclusão de opções que atendam

às diferenças individuais dos alunos e, no ensino de 2º grau, ensejem variedade de habilitações.

107

1º Admitir-se-á a organização semestral no ensino de 1º e 2º graus e, no de 2º grau, a matrícula por

disciplina sob condições que assegurem o relacionamento, a ordenação e a seqüência dos estudos.

2º Em qualquer grau, poderão organizar-se classes que reunam alunos de diferentes séries e de equivalentes

níveis de adiantamento, para o ensino de línguas estrangeiras e outras disciplinas, áreas de estudo e atividades

em que tal solução se aconselhe.

Art. 9º OS alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se encontrem em atraso

considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados deverão receber tratamento especial, de

acôrdo com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação.

Art. 10. Será instituída obrigatòriamente a Orientação Educacional, incluindo aconselhamento vocacional,

em cooperação com os professôres, a família e a comunidade.

Art. 11. O ano e o semestre letivos, independentemente do ano civil, terão, no mínimo, 180 e 90 dias de

trabalho escolar efetivo, respectivamente, excluído o tempo reservado às provas finais, caso estas sejam

adotadas.

1° Os estabelecimentos de ensino de 1º e 2º graus funcionarão entre os períodos letivos regulares para, além

de outras atividades, proporcionar estudos de recuperação aos alunos de aproveitamento insuficiente e ministrar,

em caráter intensivo, disciplinas, áreas de estudo e atividades planejadas com duração semestral, bem como

desenvolver programas de aperfeiçoamento de professôres e realizar cursos especiais de natureza supletiva.

2º Na zona rural, o estabelecimento poderá organizar os períodos letivos, com prescrição de férias nas

épocas do plantio e colheita de safras, conforme plano aprovado pela competente autoridade de ensino.

Art. 12. O regimento escolar regulará a substituição de uma disciplina, área de estudo ou atividade por outra

a que se atribua idêntico ou equivalente valor formativo, excluídas as que resultem do núcleo comum e dos

mínimos fixados para as habilitações profissionais.

Parágrafo único. Caberá aos Conselhos de Educação fixar, para os estabelecimentos situados nas

respectivas jurisdições, os critérios gerais que deverão presidir ao aproveitamento de estudos definido neste

artigo.

Art. 13. A transferência do aluno de um para outro estabelecimento far-se-á pelo núcleo comum fixado em

âmbito nacional e, quando fôr o caso, pelos mínimos estabelecidos para as habilitações profissionais, conforme

normas baixadas pelos competentes Conselhos de Educação.

Art. 14. A verificação do rendimento escolar ficará, na forma regimental, a cargo dos estabelecimentos,

compreendendo a avaliação do aproveitamento e a apuração da assiduidade.

1º Na avaliação do aproveitamento, a ser expressa em notas ou menções, preponderarão os aspectos

qualitativos sôbre os quantitativos e os resultados obtidos durante o período letivo sôbre os da prova final, caso

esta seja exigida.

2º O aluno de aproveitamento insuficiente poderá obter aprovação mediante estudos de recuperação

proporcionados obrigatòriamente pelo estabelecimento.

3º Ter-se-á como aprovado quanto à assiduidade:

a) o aluno de freqüência igual ou superior a 75% na respectiva disciplina, área de estudo ou atividade;

b) o aluno de freqüência inferior a 75% que tenha tido aproveitamento superior a 80% da escala de notas ou

menções adotadas pelo estabelecimento;

c) o aluno que não se encontre na hipótese da alínea anterior, mas com freqüência igual ou superior, ao

mínimo estabelecido em cada sistema de ensino pelo respectivo Conselho de Educação, e que demonstre

melhoria de aproveitamento após estudos a título de recuperação.

108

4º Verificadas as necessárias condições, os sistemas de ensino poderão admitir a adoção de critérios que

permitam avanços progressivos dos alunos pela conjugação dos elementos de idade e aproveitamento.

Art. 15. O regimento escolar poderá admitir que no regime seriado, a partir da 7ª série, o aluno seja

matriculado com dependência de uma ou duas disciplinas, áreas de estudo ou atividade de série anterior, desde

que preservada a seqüência do currículo.

Art. 16. Caberá aos estabelecimentos expedir os certificados de conclusão de série, conjunto de disciplinas

ou grau escolar e os diplomas ou certificados correspondentes às habilitações profissionais de todo o ensino de 2º

grau, ou de parte dêste.

Parágrafo único. Para que tenham validade nacional, os diplomas e certificados relativos às habilitações

profissionais deverão ser registrados em órgão local do Ministério da Educação e Cultura.

CAPÍTULO II

Do Ensino de 1º Grau

Art. 17. O ensino de 1º grau destina-se à formação da criança e do pré-adolescente, variando em conteúdo e

métodos segundo as fases de desenvolvimento dos alunos.

Art. 18. O ensino de 1º grau terá a duração de oito anos letivos e compreenderá, anualmente, pelo menos

720 horas de atividades.

Art. 19. Para o ingresso no ensino de 1º grau, deverá o aluno ter a idade mínima de sete anos.

§ 1º As normas de cada sistema disporão sôbre a possibilidade de ingresso no ensino de primeiro grau de

alunos com menos de sete anos de idade.

§ 2º Os sistemas de ensino velarão para que as crianças de idade inferior a sete anos recebam conveniente

educação em escolas maternais, jardins de infância e instituições equivalentes.

Art. 20. O ensino de 1º grau será obrigatório dos 7 aos 14 anos, cabendo aos Municípios promover,

anualmente, o levantamento da população que alcance a idade escolar e proceder à sua chamada para matrícula.

Parágrafo único. Nos Estados, no Distrito Federal, nos Territórios e nos Municípios, deverá a administração

do ensino fiscalizar o cumprimento da obrigatoriedade escolar e incentivar a freqüência dos alunos.

CAPÍTULO III

Do Ensino de 2º Grau

Art. 21. O ensino de 2º grau destina-se à formação integral do adolescente.

Parágrafo único. Para ingresso no ensino de 2º grau, exigir-se-á a conclusão do ensino de 1º grau ou de

estudos equivalentes.

Art. 22. O ensino de 2º grau terá três ou quatro séries anuais, conforme previsto para cada habilitação,

compreendendo, pelo menos, 2.200 ou 2.900 horas de trabalho escolar efetivo, respectivamente.

Parágrafo único. Mediante aprovação dos respectivos Conselhos de Educação, os sistemas de ensino

poderão admitir que, no regime de matrícula por disciplina, o aluno possa concluir em dois anos no mínimo, e

cinco no máximo, os estudos correspondentes a três séries da escola de 2º grau.

Art. 23. Observado o que sôbre o assunto conste da legislação própria:

109

a) a conclusão da 3ª série do ensino de 2º grau, ou do correspondente no regime de matrícula por

disciplinas, habilitará ao prosseguimento de estudos em grau superior;

b) os estudos correspondentes à 4ª série do ensino de 2° grau poderão, quando equivalentes, ser

aproveitados em curso superior da mesma área ou de áreas afins.

CAPÍTULO IV

Do Ensino Supletivo

Art. 24. O ensino supletivo terá por finalidade:

a) suprir a escolarização regular para os adolescentes e adultos que não a tenham seguido ou concluído na

idade própria;

b) proporcionar, mediante repetida volta à escola, estudos de aperfeiçoamento ou atualização para os que

tenham seguido o ensino regular no todo ou em parte.

Parágrafo único. O ensino supletivo abrangerá cursos e exames a serem organizados nos vários sistemas de

acôrdo com as normas baixadas pelos respectivos Conselhos de Educação.

Art. 25. O ensino supletivo abrangerá, conforme as necessidades a atender, desde a iniciação no ensino de

ler, escrever e contar e a formação profissional definida em lei específica até o estudo intensivo de disciplinas do

ensino regular e a atualização de conhecimentos.

§ 1º Os cursos supletivos terão estrutura, duração e regime escolar que se ajustem às suas finalidades

próprias e ao tipo especial de aluno a que se destinam.

§ 2º Os cursos supletivos serão ministrados em classes ou mediante a utilização de rádios, televisão,

correspondência e outros meios de comunicação que permitam alcançar o maior número de alunos.

Art. 26. Os exames supletivos compreenderão a parte do currículo resultante do núcleo comum, fixado pelo

Conselho Federal de Educação, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular, e poderão, quando

realizadas para o exclusivo efeito de habilitação profissional de 2º grau, abranger sòmente o mínimo estabelecido

pelo mesmo Conselho.

§ 1º Os exames a que se refere êste artigo deverão realizar-se:

a) ao nível de conclusão do ensino de 1º grau, para os maiores de 18 anos;

b) ao nível de conclusão do ensino de 2º grau, para os maiores de 21 anos.

§ 2º Os exames supletivos ficarão a cargo de estabelecimentos oficiais ou reconhecidos indicados nos vários

sistemas, anualmente, pelos respectivos Conselhos de Educação.

§ 3º Os exames supletivos poderão ser unificados na jurisdição de todo um sistema de ensino, ou parte

dêste, de acôrdo com normas especiais baixadas pelo respectivo Conselho de Educação.

Art. 27. Desenvolver-se-ão, ao nível de uma ou mais das quatro últimas séries do ensino de 1º grau, cursos

de aprendizagem, ministrados a alunos de 14 a 18 anos, em complementação da escolarização regular, e, a êsse

nível ou ao de 2º grau, cursos intensivos de qualificação profissional.

Parágrafo único. Os cursos de aprendizagem e os de qualificação darão direito a prosseguimento de estudos

quando incluírem disciplinas, áreas de estudo e atividades que os tornem equivalentes ao ensino regular

conforme estabeleçam as normas dos vários sistemas.

Art. 28. Os certificados de aprovação em exames supletivos e os relativos à conclusão de cursos de

aprendizagem e qualificação serão expedidos pelas instituições que os mantenham.

110

CAPÍTULO V

Dos Professôres e Especialistas

Art. 29. A formação de professôres e especialistas para o ensino de 1º e 2º graus será feita em níveis que se

elevem progressivamente, ajustando-se às diferenças culturais de cada região do País, e com orientação que

atenda aos objetivos específicos de cada grau, às características das disciplinas, áreas de estudo ou atividades e

às fases de desenvolvimento dos educandos.

Art. 30. Exigir-se-á como formação mínima para o exercício do magistério:

a) no ensino de 1º grau, da 1ª à 4ª séries, habilitação específica de 2º grau;

b) no ensino de 1º grau, da 1ª à 8ª séries, habilitação específica de grau superior, ao nível de graduação,

representada por licenciatura de 1º grau obtida em curso de curta duração;

c) em todo o ensino de 1º e 2º graus, habilitação específica obtida em curso superior de graduação

correspondente a licenciatura plena.

§ 1º Os professôres a que se refere a letra a poderão lecionar na 5ª e 6ª séries do ensino de 1º grau se a sua

habilitação houver sido obtida em quatro séries ou, quando em três mediante estudos adicionais correspondentes

a um ano letivo que incluirão, quando fôr o caso, formação pedagógica.

§ 2º Os professôres a que se refere a letra b poderão alcançar, no exercício do magistério, a 2ª série do

ensino de 2º grau mediante estudos adicionais correspondentes no mínimo a um ano letivo.

§ 3° Os estudos adicionais referidos nos parágrafos anteriores poderão ser objeto de aproveitamento em

cursos ulteriores.

Art. 31. As licenciaturas de 1º grau e os estudos adicionais referidos no § 2º do artigo anterior serão

ministrados nas universidades e demais instituições que mantenham cursos de duração plena.

Parágrafo único. As licenciaturas de 1º grau e os estudos adicionais, de preferência nas comunidades

menores, poderão também ser ministradas em faculdades, centros, escolas, institutos e outros tipos de

estabelecimentos criados ou adaptados para êsse fim, com autorização e reconhecimento na forma da lei.

Art. 32. O pessoal docente do ensino supletivo terá preparo adequado às características especiais dêsse tipo

de ensino, de acôrdo com as normas estabelecidas pelos Conselhos de Educação.

Art. 33. A formação de administradores, planejadores, orientadores, inspetores, supervisores e demais

especialistas de educação será feita em curso superior de graduação, com duração plena ou curta, ou de pós-

graduação.

Art. 34. A admissão de professôres e especialistas no ensino oficial de 1º e 2º graus far-se-á por concurso

público de provas e títulos, obedecidas para inscrição as exigências de formação constantes desta Lei.

Art. 35. Não haverá qualquer distinção, para efeitos didáticos e técnicos, entre os professôres e especialistas

subordinados ao regime das leis do trabalho e os admitidos no regime do serviço público.

Art. 36. Em cada sistema de ensino, haverá um estatuto que estruture a carreira de magistério de 1º e 2º

graus, com acessos graduais e sucessivos, regulamentando as disposições específicas da presente Lei e

complementando-as no quatro da organização própria do sistema.

Art. 37. A admissão e a carreira de professôres e especialistas, nos estabelecimentos particulares de ensino

de 1º e 2º graus, obedecerão às disposições específicas desta Lei, às normas constantes obrigatòriamente dos

respectivos regimentos e ao regime das Leis do Trabalho.

111

Art. 38. Os sistemas de ensino estimularão, mediante planejamento apropriado, o aperfeiçoamento e

atualização constantes dos seus professôres e especialistas de Educação.

Art. 39. Os sistemas de ensino devem fixar a remuneração dos professôres e especialistas de ensino de 1º e

2º graus, tendo em vista a maior qualificação em cursos e estágios de formação, aperfeiçoamento ou

especialização, sem distinção de graus escolares em que atuem.

Art. 40. Será condição para exercício de magistério ou especialidade pedagógica o registro profissional, em

órgão do Ministério da Educação e Cultura, dos titulares sujeitos à formação de grau superior.

CAPÍTULO VI

Do Financiamento

Art. 41. A educação constitui dever da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios, dos

Municípios, das emprêsas, da família e da comunidade em geral, que entrosarão recursos e esforços para

promovê-la e incentivá-la.

Parágrafo único. Respondem, na forma da lei, solidàriamente com o Poder Público, pelo cumprimento do

preceito constitucional da obrigatoriedade escolar, os pais ou responsáveis e os empregadores de tôda natureza

de que os mesmos sejam dependentes.

Art. 42. O ensino nos diferentes graus será ministrado pelos podêres públicos e, respeitadas as leis que o

regulam, é livre à iniciativa particular.

Art. 43. Os recursos públicos destinados à educação serão aplicados preferencialmente na manutenção e

desenvolvimento do ensino oficial, de modo que se assegurem:

a) maior número possível de oportunidades educacionais;

b) a melhoria progressiva do ensino, o aperfeiçoamento e a assistência ao magistério e aos serviços de

educação;

c) o desenvolvimento científico e tecnológico.

Art. 44. Nos estabelecimentos oficiais, o ensino de 1º grau é gratuito dos 7 aos 14 anos, e o de níveis

ulteriores sê-lo-á para quantos provarem falta ou insuficiência de recursos e não tenham repetido mais de um ano

letivo ou estudos correspondentes no regime de matrícula por disciplinas.

Art. 45. As instituições de ensino mantidas pela iniciativa particular merecerão amparo técnico e financeiro

do Poder Público, quando suas condições de funcionamento forem julgadas satisfatórias pelos órgãos de

fiscalização, e a suplementação de seus recursos se revelar mais econômica para o atendimento do objetivo.

Parágrafo único. O valor dos auxílios concedidos nos têrmos dêste artigo será calculado com base no

número de matrículas gratuitas e na modalidade dos respectivos cursos, obedecidos padrões mínimos de

eficiência escolar prèviamente estabelecidos e tendo em vista o seu aprimoramento.

Art. 46. O amparo do Poder Público a quantos demonstrarem aproveitamento e provarem falta ou

insuficiência de recursos far-se-á sob forma de concessão de bôlsas de estudo.

Parágrafo único. Sòmente serão concedidas bôlsas de estudo gratuitas no ensino de 1º grau quando não

houver vaga em estabelecimento oficial que o aluno possa freqüentar com assiduidade.

Art. 47. As emprêsas comerciais, industriais e agrícolas são obrigadas a manter o ensino de 1º grau gratuito

para seus empregados e o ensino dos filhos dêstes entre os sete e os quatorze anos ou a concorrer para êsse fim

mediante a contribuição do salário-educação, na forma estabelecida por lei.

112

Art. 48. O salário-educação instituído pela Lei n. 4.440, de 27 de outubro de 1964, será devido por tôdas as

emprêsas e demais entidades públicas ou privadas, vinculadas à Previdência Social, ressalvadas as exceções

previstas na legislação específica.

Art. 49. As emprêsas e os proprietários rurais, que não puderem manter em suas glebas ensino para os seus

empregados e os filhos dêstes, são obrigados, sem prejuízo do disposto no artigo 47, a facilitar-lhes a freqüência

à escola mais próxima ou a propiciar a instalação e o funcionamento de escolas gratuitas em suas propriedades.

Art. 50. As emprêsas comerciais e industriais são ainda obrigadas a assegurar, em cooperação, condições de

aprendizagem aos seus trabalhadores menores e a promover o preparo de seu pessoal qualificado.

Art. 51. Os sistemas de ensino atuarão junto às emprêsas de qualquer natureza, urbanas ou agrícolas, que

tenham empregados residentes em suas dependências, no sentido de que instalem e mantenham, conforme

dispuser o respectivo sistema e dentro das peculiaridades locais, receptores de rádio e televisão educativos para o

seu pessoal.

Parágrafo único. As entidades particulares que recebam subvenções ou auxílios do Poder Público deverão

colaborar, mediante solicitação dêste, no ensino supletivo de adolescentes e adultos, ou na promoção de cursos e

outras atividades com finalidade educativo-cultural, instalando postos de rádio ou televisão educativos.

Art. 52. A União prestará assistência financeira aos Estados e ao Distrito Federal para o desenvolvimento de

seus sistemas de ensino e organizará o sistema federal, que terá caráter supletivo e se estenderá por todo o País,

nos estritos limites das deficiências locais.

Art. 53. O Governo Federal estabelecerá e executará planos nacionais de educação que, nos têrmos do

artigo 52, abrangerão os programas de iniciativa própria e os de concessão de auxílios.

Parágrafo único. O planejamento setorial da educação deverá atender às diretrizes e normas do Plano-Geral

do Govêrno, de modo que a programação a cargo dos órgãos da direção superior do Ministério da Educação e

Cultura se integre harmônicamente nesse Plano-Geral.

Art. 54. Para efeito de concessão de auxílios, os planos dos sistemas de ensino deverão ter a duração de

quatro anos, ser aprovados pelo respectivo Conselho de Educação e estar em consonância com as normas e

critérios do planejamento nacional da educação.

§ 1º A concessão de auxílio federal aos sistemas estaduais de ensino e ao sistema do Distrito Federal visará

a corrigir as diferenças regionais de desenvolvimento sócio-econômico, tendo em vista renda "per capita" e

população a ser escolarizada, o respectivo estatuto do magistério, bem como a remuneração condigna e pontual

dos professôres e o progresso quantitativo e qualitativo dos serviços de ensino verificado no biênio anterior.

§ 2º A concessão do auxílio financeiro aos sistemas estaduais e ao sistema do Distrito Federal far-se-á

mediante convênio, com base em planos e projetos apresentados pelas respectivas administrações e aprovados

pelos Conselhos de Educação.

§ 3º A concessão de auxílio financeiro aos programas de educação dos Municípios, integrados nos planos

estaduais, far-se-á mediante convênio, com base em planos e projetos apresentados pelas respectivas

administrações e aprovados pelos Conselhos de Educação.

Art. 55. Cabe à União organizar e financiar os sistemas de ensino dos Territórios, segundo o planejamento

setorial da educação.

Art. 56. Cabe à União destinar recursos para a concessão de bôlsas de estudo.

§ 1º Aos recursos federais, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios acrescerão recursos próprios para

o mesmo fim.

§ 2º As normas que disciplinam a concessão de bôlsas de estudo decorrentes dos recursos federais, seguirão

as diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Educação e Cultura, que poderá delegar a entidades municipais de

assistência educacional, de que trata o § 2º do artigo 62, a adjudicação dos auxílios.

113

§ 3º O Programa Especial de Bôlsas de Estudo (PEBE) reger-se-á por normas estabelecidas pelo Ministério

do Trabalho e Previdência Social.

Art. 57. A assistência técnica da União aos sistemas estaduais de ensino e do Distrito Federal será prestada

pelos órgãos da administração do Ministério da Educação e Cultura e pelo Conselho Federal de Educação.

Parágrafo único. A assistência técnica incluirá colaboração e suprimento de recursos financeiros para

preparação, acompanhamento e avaliação dos planos e projetos educacionais que objetivam o atendimento das

prescrições do plano setorial de educação da União.

Art. 58. A legislação estadual supletiva, observado o disposto no artigo 15 da Constituição Federal,

estabelecerá as responsabilidades do próprio Estado e dos seus Municípios no desenvolvimento dos diferentes

graus de ensino e disporá sôbre medidas que visem a tornar mais eficiente a aplicação dos recursos públicos

destinados à educação.

Parágrafo único. As providências de que trata êste artigo visarão à progressiva passagem para a

responsabilidade municipal de encargo e serviços de educação, especialmente de 1º grau, que pela sua natureza

possam ser realizados mais satisfatòriamente pelas administrações locais.

Art. 59. Aos municípios que não aplicarem, em cada ano, pelo menos 20% da receita tributária municipal

no ensino de 1º grau aplicar-se-á o disposto no artigo 15, 3º, alínea f , da Constituição.

Parágrafo único. Os municípios destinarão ao ensino de 1º grau pelo menos 20% das transferências que lhes

couberem no Fundo de Participação.

Art. 60. É vedado ao Poder Público e aos respectivos órgãos da administração indireta criar ou auxiliar

financeiramente estabelecimentos ou serviços de ensino que constituam duplicação desnecessária ou dispersão

prejudicial de recursos humanos, a juízo do competente Conselho de Educação.

Art. 61. Os sistemas de ensino estimularão as emprêsas que tenham em seus serviços mães de menores de

sete anos a organizar e manter, diretamente ou em cooperação, inclusive com o Poder Público, educação que

preceda o ensino de 1º grau.

Art. 62. Cada sistema de ensino compreenderá obrigatòriamente, além de serviços de assistência

educacional que assegurem aos alunos necessitados condições de eficiência escolar entidades que congreguem

professôres e pais de alunos, com o objetivo de colaborar para o eficiente funcionamento dos estabelecimentos

de ensino.

1º Os serviços de assistência educacional de que trata êste artigo destinar-se-ão, de preferência, a garantir o

cumprimento da obrigatoriedade escolar e incluirão auxílios para a aquisição de material escolar, transporte,

vestuário, alimentação, tratamento médico e dentário e outras formas de assistência familiar.

2º O Poder Público estimulará a organização de entidades locais de assistência educacional, constituídas de

pessoas de comprovada idoneidade, devotadas aos problemas sócio-educacionais que, em colaboração com a

comunidade, possam incumbir-se da execução total ou parcial dos serviços de que trata êste artigo, assim como

da adjudicação de bôlsas de estudo.

Art. 63. A gratuidade da escola oficial e as bôlsas de estudo oferecidas pelo Poder Público serão

progressivamente substituídas, no ensino de 2º grau, pela concessão de bôlsas sujeitas à restituição.

Parágrafo único. A restituição de que trata êste artigo poderá fazer-se em espécie ou em serviços

profissionais, na forma de que a lei determinar.

CAPÍTULO VII

Das Disposições Gerais

114

Art. 64. Os Conselhos de Educação poderão autorizar experiências pedagógicas, com regimes diversos dos

prescritos na presente Lei, assegurando a validade dos estudos assim realizados.

Art. 65. Para efeito de registro e exercício profissional, o Conselho Federal de Educação fixará as normas

de revalidação dos diplomas e certificados das habilitações, correspondentes ao ensino de 2º grau, expedidos por

instituições estrangeiras.

Art. 66. Ficam automàticamente reajustadas, quanto à nomenclatura, as disposições da legislação anterior

que permaneçam em vigor após a vigência da presente Lei.

Art 67. Fica mantido o regime especial para os alunos de que trata o Decreto-Lei n. 1.044, de 21 de outubro

de 1969.

Art. 68. O ensino ministrado nos estabelecimentos militares é regulado por legislação específica.

Art. 69. O Colégio Pedro II, integrará o sistema federal de ensino.

Art. 70. As administrações dos sistemas de ensino e as pessoas jurídicas de direito privado poderão instituir

para alguns ou todos os estabelecimentos de 1º e 2º graus por elas mantidos, um regimento comum que,

assegurando a unidade básica estrutural e funcional da rêde, preserve a necessária flexibilidade didática de cada

escola.

CAPÍTULO VIII

Das Disposições Transitórias

Art. 71. Os Conselhos Estaduais de Educação poderão delegar parte de suas atribuições a Conselhos de

Educação que se organizem nos Municípios onde haja condições para tanto.

Art. 72. A implantação do regime instituído na presente Lei far-se-á progressivamente, segundo as

peculiaridades, possibilidades e legislação de cada sistema de ensino, com observância do Plano Estadual de

Implantação que deverá seguir-se a um planejamento prévio elaborado para fixar as linhas gerais daquele, e

disciplinar o que deva ter execução imediata.

Parágrafo único. O planejamento prévio e o Plano Estadual de Implantação, referidos neste artigo, deverão

ser elaborados pelos órgãos próprios do respectivo sistema de ensino, dentro de 60 dias o primeiro e 210 o

segundo, a partir da vigência desta Lei.

Art. 73. O Ministro da Educação e Cultura, ouvido o Conselho Federal de Educação, decidirá das questões

suscitadas pela transição do regime anterior, para o que se institui na presente Lei, baixando os atos que a tanto

se façam necessários.

Art. 74. Ficam integrados nos respectivos sistemas estaduais os estabelecimentos particulares de ensino

médio até agora vinculados ao sistema federal.

Art. 75. Na implantação do regime instituído pela presente Lei, observar-se-ão as seguintes prescrições em

relação a estabelecimentos oficiais e particulares de 1º grau:

I - as atuais escolas primárias deverão instituir, progressivamente, as séries que lhes faltam para alcançar o

ensino completo de 1º grau;

II - os atuais estabelecimentos que mantenham ensino ginasial poderão continuar a ministrar apenas as

séries que lhes correspondem, redefinidas quanto à ordenação e à composição curricular, até que alcancem as

oito da escola completa de 1º grau;

III - os novos estabelecimentos deverão, para fins de autorização, indicar nos planos respectivos a forma

pela qual pretendem desenvolver, imediata ou progressivamente, o ensino completo de 1º grau.

115

Art. 76. A iniciação para o trabalho e a habilitação profissional poderão ser antecipadas:

a) ao nível da série realmente alcançada pela gratuidade escolar em cada sistema, quando inferior à oitava;

b) para a adequação às condições individuais, inclinações e idade dos alunos.

Art. 77. Quando a oferta de professôres, legalmente habilitados, não bastar para atender às necessidades do

ensino, permitir-se-á que lecionem, em caráter suplementar e a título precário:

a) no ensino de 1º grau, até a 8ª série, os diplomados com habilitação para o magistério ao nível da 4ª série

de 2º grau;

b) no ensino de 1º grau, até a 6ª série, os diplomados com habilitação para o magistério ao nível da 3ª série

de 2º grau;

c) no ensino de 2º grau, até a série final, os portadores de diploma relativo à licenciatura de 1º grau.

Parágrafo único. Onde e quando persistir a falta real de professôres, após a aplicação dos critérios

estabelecidos neste artigo, poderão ainda lecionar:

a) no ensino de 1º grau, até a 6ª série, candidatos que hajam concluído a 8ª série e venham a ser preparados

em cursos intensivos;

b) no ensino de 1º grau, até a 5ª série, candidatos habilitados em exames de capacitação regulados, nos

vários sistemas, pelos respectivos Conselhos de Educação;

c) nas demais séries do ensino de 1º grau e no de 2º grau, candidatos habilitados em exames de suficiência

regulados pelo Conselho Federal de Educação e realizados em instituições oficiais de ensino superior indicados

pelo mesmo Conselho.

Art. 78. Quando a oferta de professôres licenciados não bastar para atender às necessidades do ensino, os

profissionais diplomados em outros cursos de nível superior poderão ser registrados no Ministério da Educação e

Cultura, mediante complementação de seus estudos, na mesma área ou em áreas afins, onde se inclua a formação

pedagógica, observados os critérios estabelecidos pelo Conselho Federal de Educação.

Art. 79. Quando a oferta de profissionais legalmente habilitados para o exercício das funções de direção dos

estabelecimentos de um sistema, ou parte dêste, não bastar para atender as suas necessidades, permitir-se-á que

as respectivas funções sejam exercidas por professôres habilitados para o mesmo grau escolar, com experiência

de magistério.

Art. 80. Os sistemas de ensino deverão desenvolver programas especiais de recuperação para os professôres

sem a formação prescrita no artigo 29 desta Lei, a fim de que possam atingir gradualmente a qualificação

exigida.

Art. 81. Os sistemas de ensino estabelecerão prazos, a contar da aprovação do Plano Estadual referido no

artigo 72, dentro dos quais deverão os estabelecimentos de sua jurisdição apresentar os respectivos regimentos

adaptados à presente Lei.

Parágrafo único. Nos três primeiros anos de vigência desta Lei, os estabelecimentos oficiais de 1º grau, que

não tenham regimento próprio, regularmente aprovado, deverão reger-se por normas expedidas pela

administração dos sistemas.

Art. 82. Os atuais inspetores federais de ensino poderão ser postos à disposição dos sistemas que necessitem

de sua colaboração, preferencialmente daquele em cuja jurisdição estejam lotados.

Art. 83. Os concursos para cargos do magistério, em estabelecimentos oficiais, cujas inscrições foram

encerradas até a data da publicação desta Lei, serão regidos pela legislação citada nos respectivos editais.

116

Art. 84. Ficam ressalvados os direitos dos atuais diretores, inspetores, orientadores e administradores de

estabelecimentos de ensino, estáveis no serviço público, antes da vigência da presente Lei.

Art 85. Permanecem, para todo o corrente ano, as exigências de idade e os critérios de exame supletivo

constantes da legislação vigente, na data da promulgação desta Lei.

Art. 86. Ficam assegurados os direitos dos atuais professôres, com registro definitivo no Ministério da

Educação, antes da vigência desta Lei.

Art. 87. Ficam revogados os artigos de números 18, 21, 23 a 29, 31 a 65, 92 a 95, 97 a 99, 101 a 103, 105,

109, 110, 113 e 116 da Lei n. 4.024, de 20 de dezembro de 1961, bem como as disposições de leis gerais e

especiais que regulem em contrário ou de forma diversa a matéria contida na presente Lei.

Art. 88. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.

EMÍLIO G.MÉDICI

Jarbas G.Passarinho Júlio Barata

117

ANEXO B - LEI DE DIRETRIZES E BASES 9394/96.

Presidência da República

Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996.

Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

TÍTULO I

DA EDUCAÇÃO

Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.

§ 1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve, predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias.

§ 2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e a prática social.

TÍTULO II

DOS PRINCÍPIOS E FINS DA EDUCAÇÃO NACIONAL

Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber;

III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas;

IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância;

V - coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

118

VII - valorização do profissional da educação escolar;

VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;

IX - garantia de padrão de qualidade;

X - valorização da experiência extra-escolar;

XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.

TÍTULO III

DO DIREITO À EDUCAÇÃO E DO DEVER DE EDUCAR

Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:

I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;

II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;

III - atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV - atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade;

V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;

VII - oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola;

VIII - atendimento ao educando, no ensino fundamental público, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde;

IX - padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem.

Art. 5º O acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o Poder Público para exigi-lo.

§ 1º Compete aos Estados e aos Municípios, em regime de colaboração, e com a assistência da União:

I - recensear a população em idade escolar para o ensino fundamental, e os jovens e adultos que a ele não tiveram acesso;

II - fazer-lhes a chamada pública;

III - zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência a escola.

119

§ 2º Em todas as esferas administrativas, o Poder Público assegurará em primeiro lugar o acesso ao ensino obrigatório, nos termos deste artigo, contemplando em seguida os demais níveis e modalidades de ensino, conforme as prioridades constitucionais e legais.

§ 3º Qualquer das partes mencionadas no caput deste artigo tem legitimidade para peticionar no Poder Judiciário, na hipótese do § 2º do art. 208 da Constituição Federal, sendo gratuita e de rito sumário a ação judicial correspondente.

§ 4º Comprovada a negligência da autoridade competente para garantir o oferecimento do ensino obrigatório, poderá ela ser imputada por crime de responsabilidade.

§ 5º Para garantir o cumprimento da obrigatoriedade de ensino, o Poder Público criará formas alternativas de acesso aos diferentes níveis de ensino, independentemente da escolarização anterior.

Art. 6º É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir dos sete anos de idade, no ensino fundamental.

Art. 7º O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I - cumprimento das normas gerais da educação nacional e do respectivo sistema de ensino;

II - autorização de funcionamento e avaliação de qualidade pelo Poder Público;

III - capacidade de autofinanciamento, ressalvado o previsto no art. 213 da Constituição Federal.

TÍTULO IV

DA ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NACIONAL

Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.

§ 1º Caberá à União a coordenação da política nacional de educação, articulando os diferentes níveis e sistemas e exercendo função normativa, redistributiva e supletiva em relação as demais instâncias educacionais.

§ 2º Os sistemas de ensino terão liberdade de organização nos termos desta Lei.

Art. 9º A União incumbir-se-á de:

I - elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

II - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais do sistema federal de ensino e o dos Territórios;

III - prestar assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento prioritário à escolaridade obrigatória, exercendo sua função redistributiva e supletiva;

IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum;

V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação;

120

VI - assegurar processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino;

VII - baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação;

VIII - assegurar processo nacional de avaliação das instituições de educação superior, com a cooperação dos sistemas que tiverem responsabilidade sobre este nível de ensino;

IX - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino.

§ 1º Na estrutura educacional, haverá um Conselho Nacional de Educação, com funções normativas e de supervisão e atividade permanente, criado por lei.

§ 2º Para o cumprimento do disposto nos incisos V a IX, a União terá acesso a todos os dados e informações necessários de todos os estabelecimentos e órgãos educacionais.

§ 3º As atribuições constantes do inciso IX poderão ser delegadas aos Estados e ao Distrito Federal, desde que mantenham instituições de educação superior.

Art. 10. Os Estados incumbir-se-ão de:

I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino;

II - definir, com os Municípios, formas de colaboração na oferta do ensino fundamental, as quais devem assegurar a distribuição proporcional das responsabilidades, de acordo com a população a ser atendida e os recursos financeiros disponíveis em cada uma dessas esferas do Poder Público;

III - elaborar e executar políticas e planos educacionais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais de educação, integrando e coordenando as suas ações e as dos seus Municípios;

IV - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino;

V - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;

VI - assegurar o ensino fundamental e oferecer, com prioridade, o ensino médio.

Parágrafo único. Ao Distrito Federal aplicar-se-ão as competências referentes aos Estados e aos Municípios.

Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:

I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;

II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas;

III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;

IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino;

V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.

121

Parágrafo único. Os Municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica.

Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:

I - elaborar e executar sua proposta pedagógica;

II - administrar seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros;

III - assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aula estabelecidas;

IV - velar pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente;

V - prover meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento;

VI - articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola;

VII - informar os pais e responsáveis sobre a freqüência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta pedagógica.

Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:

I - participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;

II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;

III - zelar pela aprendizagem dos alunos;

IV - estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento;

V - ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional;

VI - colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade.

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:

I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;

II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.

Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público.

Art. 16. O sistema federal de ensino compreende:

I - as instituições de ensino mantidas pela União;

II - as instituições de educação superior criadas e mantidas pela iniciativa privada;

III - os órgãos federais de educação.

122

Art. 17. Os sistemas de ensino dos Estados e do Distrito Federal compreendem:

I - as instituições de ensino mantidas, respectivamente, pelo Poder Público estadual e pelo Distrito Federal;

II - as instituições de educação superior mantidas pelo Poder Público municipal;

III - as instituições de ensino fundamental e médio criadas e mantidas pela iniciativa privada;

IV - os órgãos de educação estaduais e do Distrito Federal, respectivamente.

Parágrafo único. No Distrito Federal, as instituições de educação infantil, criadas e mantidas pela iniciativa privada, integram seu sistema de ensino.

Art. 18. Os sistemas municipais de ensino compreendem:

I - as instituições do ensino fundamental, médio e de educação infantil mantidas pelo Poder Público municipal;

II - as instituições de educação infantil criadas e mantidas pela iniciativa privada;

III - os órgãos municipais de educação.

Art. 19. As instituições de ensino dos diferentes níveis classificam-se nas seguintes categorias administrativas:

I - públicas, assim entendidas as criadas ou incorporadas, mantidas e administradas pelo Poder Público;

II - privadas, assim entendidas as mantidas e administradas por pessoas físicas ou jurídicas de direito privado.

Art. 20. As instituições privadas de ensino se enquadrarão nas seguintes categorias:

I - particulares em sentido estrito, assim entendidas as que são instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado que não apresentem as características dos incisos abaixo;

II - comunitárias, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas, inclusive cooperativas de professores e alunos que incluam na sua entidade mantenedora representantes da comunidade;

III - confessionais, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e ideologia específicas e ao disposto no inciso anterior;

IV - filantrópicas, na forma da lei.

TÍTULO V

DOS NÍVEIS E DAS MODALIDADES DE EDUCAÇÃO E ENSINO

CAPÍTULO I

DA COMPOSIÇÃO DOS NÍVEIS ESCOLARES

123

Art. 21. A educação escolar compõe-se de:

I - educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio;

II - educação superior.

CAPÍTULO II

DA EDUCAÇÃO BÁSICA

Seção I

Das Disposições Gerais

Art. 22. A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores.

Art. 23. A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar.

§ 1º A escola poderá reclassificar os alunos, inclusive quando se tratar de transferências entre estabelecimentos situados no País e no exterior, tendo como base as normas curriculares gerais.

§ 2º O calendário escolar deverá adequar-se às peculiaridades locais, inclusive climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino, sem com isso reduzir o número de horas letivas previsto nesta Lei.

Art. 24. A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organizada de acordo com as seguintes regras comuns:

I - a carga horária mínima anual será de oitocentas horas, distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver;

II - a classificação em qualquer série ou etapas exceto a primeira do ensino fundamental, pode ser feita:

a) por promoção, para alunos que cursaram, com aproveitamento, a série ou fase anterior, na própria escola;

b) por transferência, para candidatos procedentes de outras escolas;

c) independentemente de escolarização anterior, mediante avaliação feita pela escola, que defina o grau de desenvolvimento e experiência do candidato e permita sua inscrição na série ou etapa adequada, conforme regulamentação do respectivo sistema de ensino;

III - nos estabelecimentos que adotam a progressão regular por série, o regimento escolar pode admitir formas de progressão parcial, desde que preservada a seqüência do currículo, observadas as normas do respectivo sistema de ensino;

IV - poderão organizar-se classes, ou turmas, com alunos de séries distintas, com níveis equivalentes de adiantamento na matéria, para o ensino de línguas estrangeiras, artes, ou outros componentes curriculares;

124

V - a verificação do rendimento escolar observará os seguintes critérios:

a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais;

b) possibilidade de aceleração de estudos para alunos com atraso escolar;

c) possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação do aprendizado;

d) aproveitamento de estudos concluídos com êxito;

e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus regimentos;

VI - o controle de freqüência fica a cargo da escola, conforme o disposto no seu regimento e nas normas do respectivo sistema de ensino, exigida a freqüência mínima de setenta e cinco por cento do total de horas letivas para aprovação;

VII - cabe a cada instituição de ensino expedir históricos escolares, declarações de conclusão de série e diplomas ou certificados de conclusão de cursos, com as especificações cabíveis.

Art. 25. Será objetivo permanente das autoridades responsáveis alcançar relação adequada entre o número de alunos e o professor, a carga horária e as condições materiais do estabelecimento.

Parágrafo único. Cabe ao respectivo sistema de ensino, à vista das condições disponíveis e das características regionais e locais, estabelecer parâmetro para atendimento do disposto neste artigo.

Art. 26. Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela.

§ 1º Os currículos a que se refere o caput devem abranger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política, especialmente do Brasil.

§ 2º O ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos.

§ 3º A educação física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular da Educação Básica, ajustando-se às faixas etárias e as condições da população escolar, sendo facultativa nos cursos noturnos.

§ 4º O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e européia.

§ 5º Na parte diversificada do currículo será incluído, obrigatoriamente, a partir da quinta série, o ensino de pelo menos uma língua estrangeira moderna, cuja escolha ficará a cargo da comunidade escolar, dentro das possibilidades da instituição.

Art. 27. Os conteúdos curriculares da educação básica observarão, ainda, as seguintes diretrizes:

I - a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e a ordem democrática;

125

II - consideração das condições de escolaridade dos alunos em cada estabelecimento;

III - orientação para o trabalho;

IV - promoção do desporto educacional e apoio às práticas desportivas não-formais.

Art. 28. Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente:

I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural;

II - organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;

III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.

Seção II

Da Educação Infantil

Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.

Art. 30. A educação infantil será oferecida em:

I - creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade;

II - pré-escolas, para as crianças de quatro a seis anos de idade.

Art. 31. Na educação infantil a avaliação far-se-á mediante acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental.

Seção III

Do Ensino Fundamental

Art. 32. O ensino fundamental, com duração mínima de oito anos, obrigatório e gratuito na escola pública, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante:

I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;

II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;

III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores;

IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social.

§ 1º É facultado aos sistemas de ensino desdobrar o ensino fundamental em ciclos.

126

§ 2º Os estabelecimentos que utilizam progressão regular por série podem adotar no ensino fundamental o regime de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação do processo de ensino-aprendizagem, observadas as normas do respectivo sistema de ensino.

§ 3º O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem.

§ 4º O ensino fundamental será presencial, sendo o ensino a distância utilizado como complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais.

Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter:

I - confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas; ou

II - interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa.

Art. 34. A jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola.

§ 1º São ressalvados os casos do ensino noturno e das formas alternativas de organização autorizadas nesta Lei.

§ 2º O ensino fundamental será ministrado progressivamente em tempo integral, a critério dos sistemas de ensino.

Seção IV

Do Ensino Médio

Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de três anos, terá como finalidades:

I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;

II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores;

III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico;

IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.

Art. 36. O currículo do ensino médio observará o disposto na Seção I deste Capítulo e as seguintes diretrizes:

I - destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da cultura; a língua portuguesa como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania;

127

II - adotará metodologias de ensino e de avaliação que estimulem a iniciativa dos estudantes;

III - Será incluída uma língua estrangeira moderna, como disciplina obrigatória, escolhida pela comunidade escolar, e uma segunda, em caráter optativo, dentro das disponibilidades da instituição.

§ 1º Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão organizados de tal forma que ao final do ensino médio o educando demonstre:

I - domínio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a produção moderna;

II - conhecimento das formas contemporâneas de linguagem;

III - domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao exercício da cidadania.

§ 2º O ensino médio, atendida a formação geral do educando, poderá prepará-lo para o exercício de profissões técnicas.

§ 3º Os cursos do ensino médio terão equivalência legal e habilitarão ao prosseguimento de estudos.

§ 4º A preparação geral para o trabalho e, facultativamente, a habilitação profissional, poderão ser desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de ensino médio ou em cooperação com instituições especializadas em educação profissional.

Seção V

Da Educação de Jovens e Adultos

Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria.

§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames.

§ 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si.

Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular.

§ 1º Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão:

I - no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de quinze anos;

II - no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito anos.

§ 2º Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por meios informais serão aferidos e reconhecidos mediante exames.

CAPÍTULO III

DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL

128

Art. 39. A educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva.

Parágrafo único. O aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental, médio e superior, bem como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará com a possibilidade de acesso à educação profissional.

Art. 40. A educação profissional será desenvolvida em articulação com o ensino regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições especializadas ou no ambiente de trabalho.

Art. 41. O conhecimento adquirido na educação profissional, inclusive no trabalho, poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para prosseguimento ou conclusão de estudos.

Parágrafo único. Os diplomas de cursos de educação profissional de nível médio, quando registrados terão validade nacional.

Art. 42. As escolas técnicas e profissionais, além dos seus cursos regulares, oferecerão cursos especiais, abertos à comunidade, condicionada a matrícula à capacidade de aproveitamento e não necessariamente ao nível de escolaridade.

CAPÍTULO IV

DA EDUCAÇÃO SUPERIOR

Art. 43. A educação superior tem por finalidade:

I - estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo;

II - formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua;

III - incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando o desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão da cultura, e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que vive;

IV - promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação;

V - suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração;

VI - estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade;

VII - promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.

Art. 44. A educação superior abrangerá os seguintes cursos e programas:

I - cursos seqüenciais por campo de saber, de diferentes níveis de abrangência, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos pelas instituições de ensino;

129

II - de graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente e tenham sido classificados em processo seletivo;

III - de pós-graduação, compreendendo programas de mestrado e doutorado, cursos de especialização, aperfeiçoamento e outros, abertos a candidatos diplomados em cursos de graduação e que atendam às exigências das instituições de ensino;

IV - de extensão, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos em cada caso pelas instituições de ensino.

Art. 45. A educação superior será ministrada em instituições de ensino superior, públicas ou privadas, com variados graus de abrangência ou especialização.

Art. 46. A autorização e o reconhecimento de cursos, bem como o credenciamento de instituições de educação superior, terão prazos limitados, sendo renovados, periodicamente, após processo regular de avaliação.

§ 1º Após um prazo para saneamento de deficiências eventualmente identificadas pela avaliação a que se refere este artigo, haverá reavaliação, que poderá resultar, conforme o caso, em desativação de cursos e habilitações, em intervenção na instituição, em suspensão temporária de prerrogativas da autonomia, ou em descredenciamento.

§ 2º No caso de instituição pública, o Poder Executivo responsável por sua manutenção acompanhará o processo de saneamento e fornecerá recursos adicionais, se necessários, para a superação das deficiências.

Art. 47. Na educação superior, o ano letivo regular, independente do ano civil, tem, no mínimo, duzentos dias de trabalho acadêmico efetivo, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver.

§ 1º As instituições informarão aos interessados, antes de cada período letivo, os programas dos cursos e demais componentes curriculares, sua duração, requisitos, qualificação dos professores, recursos disponíveis e critérios de avaliação, obrigando-se a cumprir as respectivas condições.

§ 2º Os alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos, demonstrado por meio de provas e outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca examinadora especial, poderão ter abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino.

§ 3º É obrigatória a freqüência de alunos e professores, salvo nos programas de educação a distância.

§ 4º As instituições de educação superior oferecerão, no período noturno, cursos de graduação nos mesmos padrões de qualidade mantidos no período diurno, sendo obrigatória a oferta noturna nas instituições públicas, garantida a necessária previsão orçamentária.

Art. 48. Os diplomas de cursos superiores reconhecidos, quando registrados, terão validade nacional como prova da formação recebida por seu titular.

§ 1º Os diplomas expedidos pelas universidades serão por elas próprias registrados, e aqueles conferidos por instituições não-universitárias serão registrados em universidades indicadas pelo Conselho Nacional de Educação.

§ 2º Os diplomas de graduação expedidos por universidades estrangeiras serão revalidados por universidades públicas que tenham curso do mesmo nível e área ou equivalente, respeitando-se os acordos internacionais de reciprocidade ou equiparação.

§ 3º Os diplomas de Mestrado e de Doutorado expedidos por universidades estrangeiras só poderão ser reconhecidos por universidades que possuam cursos de pós-graduação reconhecidos e avaliados, na mesma área de conhecimento e em nível equivalente ou superior.

130

Art. 49. As instituições de educação superior aceitarão a transferência de alunos regulares, para cursos afins, na hipótese de existência de vagas, e mediante processo seletivo.

Parágrafo único. As transferências ex officio dar-se-ão na forma da lei.

Art. 50. As instituições de educação superior, quando da ocorrência de vagas, abrirão matrícula nas disciplinas de seus cursos a alunos não regulares que demonstrarem capacidade de cursá-las com proveito, mediante processo seletivo prévio.

Art. 51. As instituições de educação superior credenciadas como universidades, ao deliberar sobre critérios e normas de seleção e admissão de estudantes, levarão em conta os efeitos desses critérios sobre a orientação do ensino médio, articulando-se com os órgãos normativos dos sistemas de ensino.

Art. 52. As universidades são instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano, que se caracterizam por:

I - produção intelectual institucionalizada mediante o estudo sistemático dos temas e problemas mais relevantes, tanto do ponto de vista científico e cultural, quanto regional e nacional;

II - um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado;

III - um terço do corpo docente em regime de tempo integral.

Parágrafo único. É facultada a criação de universidades especializadas por campo do saber.

Art. 53. No exercício de sua autonomia, são asseguradas às universidades, sem prejuízo de outras, as seguintes atribuições:

I - criar, organizar e extinguir, em sua sede, cursos e programas de educação superior previstos nesta Lei, obedecendo às normas gerais da União e, quando for o caso, do respectivo sistema de ensino;

II - fixar os currículos dos seus cursos e programas, observadas as diretrizes gerais pertinentes;

III - estabelecer planos, programas e projetos de pesquisa científica, produção artística e atividades de extensão;

IV - fixar o número de vagas de acordo com a capacidade institucional e as exigências do seu meio;

V - elaborar e reformar os seus estatutos e regimentos em consonância com as normas gerais atinentes;

VI - conferir graus, diplomas e outros títulos;

VII - firmar contratos, acordos e convênios;

VIII - aprovar e executar planos, programas e projetos de investimentos referentes a obras, serviços e aquisições em geral, bem como administrar rendimentos conforme dispositivos institucionais;

IX - administrar os rendimentos e deles dispor na forma prevista no ato de constituição, nas leis e nos respectivos estatutos;

X - receber subvenções, doações, heranças, legados e cooperação financeira resultante de convênios com entidades públicas e privadas.

131

Parágrafo único. Para garantir a autonomia didático-científica das universidades, caberá aos seus colegiados de ensino e pesquisa decidir, dentro dos recursos orçamentários disponíveis, sobre:

I - criação, expansão, modificação e extinção de cursos;

II - ampliação e diminuição de vagas;

III - elaboração da programação dos cursos;

IV - programação das pesquisas e das atividades de extensão;

V - contratação e dispensa de professores;

VI - planos de carreira docente.

Art. 54. As universidades mantidas pelo Poder Público gozarão, na forma da lei, de estatuto jurídico especial para atender às peculiaridades de sua estrutura, organização e financiamento pelo Poder Público, assim como dos seus planos de carreira e do regime jurídico do seu pessoal.

§ 1º No exercício da sua autonomia, além das atribuições asseguradas pelo artigo anterior, as universidades públicas poderão:

I - propor o seu quadro de pessoal docente, técnico e administrativo, assim como um plano de cargos e salários, atendidas as normas gerais pertinentes e os recursos disponíveis;

II - elaborar o regulamento de seu pessoal em conformidade com as normas gerais concernentes;

III - aprovar e executar planos, programas e projetos de investimentos referentes a obras, serviços e aquisições em geral, de acordo com os recursos alocados pelo respectivo Poder mantenedor;

IV - elaborar seus orçamentos anuais e plurianuais;

V - adotar regime financeiro e contábil que atenda às suas peculiaridades de organização e funcionamento;

VI - realizar operações de crédito ou de financiamento, com aprovação do Poder competente, para aquisição de bens imóveis, instalações e equipamentos;

VII - efetuar transferências, quitações e tomar outras providências de ordem orçamentária, financeira e patrimonial necessárias ao seu bom desempenho.

§ 2º Atribuições de autonomia universitária poderão ser estendidas a instituições que comprovem alta qualificação para o ensino ou para a pesquisa, com base em avaliação realizada pelo Poder Público.

Art. 55. Caberá à União assegurar, anualmente, em seu Orçamento Geral, recursos suficientes para manutenção e desenvolvimento das instituições de educação superior por ela mantidas.

Art. 56. As instituições públicas de educação superior obedecerão ao princípio da gestão democrática, assegurada a existência de órgãos colegiados deliberativos, de que participarão os segmentos da comunidade institucional, local e regional.

Parágrafo único. Em qualquer caso, os docentes ocuparão setenta por cento dos assentos em cada órgão colegiado e comissão, inclusive nos que tratarem da elaboração e modificações estatutárias e regimentais, bem como da escolha de dirigentes.

132

Art. 57. Nas instituições públicas de educação superior, o professor ficará obrigado ao mínimo de oito horas semanais de aulas.

CAPÍTULO V

DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Art. 58 Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.

§ 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial.

§ 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular.

§ 3º A oferta de educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil.

Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais:

I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades;

II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;

III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;

IV - educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;

V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis Para o respectivo nível do ensino regular.

Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder Público.

Parágrafo único. O Poder Público adotará, como alternativa preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria rede pública regular de ensino, independentemente do apoio as instituições previstas neste artigo.

TÍTULO VI

DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO

133

Art. 61. A formação de profissionais da educação, de modo a atender aos objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e as características de cada fase do desenvolvimento do educando, terá como fundamentos:

I - a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação em serviço;

II - aproveitamento da formação e experiências anteriores em instituições de ensino e outras atividades.

Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.

Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:

I - cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o curso normal superior, destinado à formação de docentes para a educação infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental;

II - programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de educação superior que queiram se dedicar à educação básica;

III - programas de educação continuada para os profissionais de educação dos diversos níveis.

Art. 64. A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional.

Art. 65. A formação docente, exceto para a educação superior, incluirá prática de ensino de, no mínimo, trezentas horas.

Art. 66. A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.

Parágrafo único. O notório saber, reconhecido por universidade com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a existência de título acadêmico.

Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público:

I - ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos;

II - aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim;

III - piso salarial profissional;

IV - progressão funcional baseada na titulação ou habilitação, e na avaliação do desempenho;

V - período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho;

VI - condições adequadas de trabalho.

Parágrafo único. A experiência docente é pré-requisito para o exercício profissional de quaisquer outras funções de magistérios nos termos das normas de cada sistema de ensino.

134

TÍTULO VII

DOS RECURSOS FINANCEIROS

Art. 68. Serão recursos públicos destinados à educação os originários de:

I - receita de impostos próprios da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II - receita de transferências constitucionais e outras transferências;

III - receita do salário-educação e de outras contribuições sociais;

IV - receita de incentivos fiscais;

V - outros recursos previstos em lei.

Art. 69. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, vinte e cinco por cento, ou o que consta nas respectivas Constituições ou Leis Orgânicas, da receita resultante de impostos, compreendidas as transferências constitucionais, na manutenção e desenvolvimento do ensino público.

§ 1º A parcela da arrecadação de impostos transferida pela União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, ou pelos Estados aos respectivos Municípios, não será considerada, para efeito do cálculo previsto neste artigo, receita do governo que a transferir.

§ 2º Serão consideradas excluídas das receitas de impostos mencionadas neste artigo as operações de crédito por antecipação de receita orçamentária de impostos.

§ 3º Para fixação inicial dos valores correspondentes aos mínimos estatuídos neste artigo, será considerada a receita estimada na lei do orçamento anual, ajustada, quando for o caso, por lei que autorizar a abertura de créditos adicionais, com base no eventual excesso de arrecadação.

§ 4º As diferenças entre a receita e a despesa previstas e as efetivamente realizadas, que resultem no não atendimento dos percentuais mínimos obrigatórios, serão apuradas e corrigidas a cada trimestre do exercício financeiro.

§ 5º O repasse dos valores referidos neste artigo do caixa da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios ocorrerá imediatamente ao órgão responsável pela educação, observados os seguintes prazos:

I - recursos arrecadados do primeiro ao décimo dia de cada mês, até o vigésimo dia;

II - recursos arrecadados do décimo primeiro ao vigésimo dia de cada mês, até o trigésimo dia;

III - recursos arrecadados do vigésimo primeiro dia ao final de cada mês, até o décimo dia do mês subseqüente.

§ 6º O atraso da liberação sujeitará os recursos a correção monetária e à responsabilização civil e criminal das autoridades competentes.

Art. 70. Considerar-se-ão como de manutenção e desenvolvimento do ensino as despesas realizadas com vistas à consecução dos objetivos básicos das instituições educacionais de todos os níveis, compreendendo as que se destinam a:

I - remuneração e aperfeiçoamento do pessoal docente e demais profissionais da educação;

II - aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e equipamentos necessários ao ensino;

135

III - uso e manutenção de bens e serviços vinculados ao ensino;

IV - levantamentos estatísticos, estudos e pesquisas visando precipuamente ao aprimoramento da qualidade e à expansão do ensino;

V - realização de atividades-meio necessárias ao funcionamento dos sistemas de ensino;

VI - concessão de bolsas de estudo a alunos de escolas públicas e privadas,

VII - amortização e custeio de operações de crédito destinadas a atender ao disposto nos incisos deste artigo;

VIII - aquisição de material didático-escolar e manutenção de programas de transporte escolar.

Art. 71. Não constituirão despesas de manutenção e desenvolvimento do ensino aquelas realizadas com:

I - pesquisa, quando não vinculada às instituições de ensino, ou, quando efetivada fora dos sistemas de ensino, que não vise, precipuamente, ao aprimoramento de sua qualidade ou à sua expansão;

II - subvenção a instituições públicas ou privadas de caráter assistencial, desportivo ou cultural;

III - formação de quadros especiais para a administração pública, sejam militares ou civis, inclusive diplomáticos;

IV - programas suplementares de alimentação, assistência médico-odontológica, farmacêutica e psicológica, e outras formas de assistência social;

V - obras de infra-estrutura, ainda que realizadas para beneficiar direta ou indiretamente a rede escolar;

VI - pessoal docente e demais trabalhadores da educação, quando em desvio de função ou em atividade alheia à manutenção e desenvolvimento do ensino.

Art. 72. As receitas e despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino serão apuradas e publicadas nos balanços do Poder Público, assim como nos relatórios a que se refere o § 3º do art. 165 da Constituição Federal.

Art. 73. Os órgãos fiscalizadores examinarão, prioritariamente, na prestação de contas de recursos públicos, o cumprimento do disposto no art. 212 da Constituição Federal, no art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e na legislação concernente.

Art. 74. A União, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, estabelecerá padrão mínimo de oportunidades educacionais para o ensino fundamental baseado no cálculo do custo mínimo por aluno, capaz de assegurar ensino de qualidade.

Parágrafo único. O custo mínimo de que trata este artigo será calculado pela União ao final de cada ano, com validade para o ano subseqüente, considerando variações regionais no custo dos insumos e as diversas modalidades de ensino.

Art. 75. A ação supletiva e redistributiva da União e dos Estados será exercida de modo a corrigir, progressivamente, as disparidades de acesso e garantir o padrão mínimo de qualidade de ensino.

§ 1º A ação a que se refere este artigo obedecerá a fórmula de domínio público que inclua a capacidade de atendimento e a medida do esforço fiscal do respectivo Estado, do Distrito Federal ou do Município em favor da manutenção e do desenvolvimento do ensino.

136

§ 2º A capacidade de atendimento de cada governo será definida pela razão entre os recursos de uso constitucionalmente obrigatório na manutenção e desenvolvimento do ensino e o custo anual do aluno, relativo ao padrão mínimo de qualidade.

§ 3º Com base nos critérios estabelecidos nos §§ 1º e 2º, a União poderá fazer a transferência direta de recursos a cada estabelecimento de ensino, considerado o número de alunos que efetivamente freqüentam a escola.

§ 4º A ação supletiva e redistributiva não poderá ser exercida em favor do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios se estes oferecerem vagas, na área de ensino de sua responsabilidade, conforme o inciso VI do art. 10 e o inciso V do art. 11 desta Lei, em número inferior à sua capacidade de atendimento.

Art. 76. A ação supletiva e redistributiva prevista no artigo anterior ficará condicionada ao efetivo cumprimento pelos Estados, Distrito Federal e Municípios do disposto nesta Lei, sem prejuízo de outras prescrições legais.

Art. 77. Os recursos públicos serão destinados as escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas que:

I - comprovem finalidade não-lucrativa e não distribuam resultados, dividendos, bonificações, participações ou parcela de seu patrimônio sob nenhuma forma ou pretexto;

II - apliquem seus excedentes financeiros em educação;

III - assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades;

IV - prestem contas ao Poder Público dos recursos recebidos.

§ 1º Os recursos de que trata este artigo poderão ser destinados a bolsas de estudo para a educação básica, na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública de domicílio do educando, ficando o Poder Público obrigado a investir prioritariamente na expansão da sua rede local.

§ 2º As atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio financeiro do Poder Público, inclusive mediante bolsas de estudo.

TÍTULO VIII

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 78. O Sistema de Ensino da União, com a colaboração das agências federais de fomento à cultura e de assistência aos índios, desenvolverá programas integrados de ensino e pesquisa, para oferta de educação escolar bilíngüe e intercultural aos povos indígenas, com os seguintes objetivos:

I - proporcionar aos índios, suas comunidades e povos, a recuperação de suas memórias históricas; a reafirmação de suas identidades étnicas, a valorização de suas línguas e ciências;

II - garantir aos índios, suas comunidades e povos, o acesso às informações, conhecimentos técnicos e científicos da sociedade nacional e demais sociedades indígenas e não-índias.

Art. 79. A União apoiará técnica e financeiramente os sistemas de ensino no provimento da educação intercultural à comunidades indígenas, desenvolvendo programas integrados de ensino e pesquisa.

§ 1º Os programas serão planejados com audiência das comunidades indígenas.

137

§ 2º Os programas a que se refere este artigo, incluídos nos Planos Nacionais de Educação, terão os seguintes objetivos:

I - fortalecer as práticas sócio-culturais e a língua materna de cada comunidade indígena;

II - manter programas de formação de pessoal especializado, destinado à educação escolar nas comunidades indígenas;

III - desenvolver currículos e programas específicos, neles incluindo os conteúdos culturais correspondentes às respectivas comunidades;

IV - elaborar e publicar sistematicamente material didático específico e diferenciado.

Art. 80. O Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada.

§ 1º A educação a distância, organizada com abertura e regime especiais, será oferecida por instituições especificamente credenciadas pela União.

§ 2º A União regulamentará os requisitos para a realização de exames e registro de diploma relativos a cursos de educação a distância.

§ 3º As normas para produção, controle e avaliação de programas de educação a distância e a autorização para sua implementação, caberão aos respectivos sistemas de ensino, podendo haver cooperação e integração entre os diferentes sistemas.

§ 4º A educação a distância gozará de tratamento diferenciado, que incluirá:

I - custos de transmissão reduzidos em canais comerciais de radiodifusão sonora e de sons e imagens;

II - concessão de canais com finalidades exclusivamente educativas;

III - reserva de tempo mínimo, sem ônus para o Poder Público, pelos concessionários de canais comerciais.

Art. 81. É permitida a organização de cursos ou instituições de ensino experimentais, desde que obedecidas as disposições desta Lei.

Art. 82. Os sistemas de ensino estabelecerão as normas para realização dos estágios dos alunos regularmente matriculados no ensino médio ou superior em sua jurisdição.

Parágrafo único. O estágio realizado nas condições deste artigo não estabelecem vínculo empregatício, podendo o estagiário receber bolsa de estágio, estar segurado contra acidentes e ter a cobertura previdenciária prevista na legislação específica.

Art. 83. O ensino militar é regulado em lei específica, admitida a equivalência de estudos, de acordo com as normas fixadas pelos sistemas de ensino.

Art. 84. Os discentes da educação superior poderão ser aproveitados em tarefas de ensino e pesquisa pelas respectivas instituições, exercendo funções de monitoria, de acordo com seu rendimento e seu plano de estudos.

Art. 85. Qualquer cidadão habilitado com a titulação própria poderá exigir a abertura de concurso público de provas e títulos para cargo de docente de instituição pública de ensino que estiver sendo ocupado por professor não concursado, por mais de seis anos, ressalvados os direitos assegurados pelos arts. 41 da Constituição Federal e 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

138

Art. 86. As instituições de educação superior constituídas como universidades integrar-se-ão, também, na sua condição de instituições de pesquisa, ao Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia, nos termos da legislação específica.

TÍTULO IX

DAS DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Art. 87. É instituída a Década da Educação, a iniciar-se um ano a partir da publicação desta Lei.

§ 1º A União, no prazo de um ano a partir da publicação desta Lei, encaminhará, ao Congresso Nacional, o Plano Nacional de Educação, com diretrizes e metas para os dez anos seguintes, em sintonia com a Declaração Mundial sobre Educação para Todos.

§ 2º O Poder Público deverá recensear os educandos no ensino fundamental, com especial atenção para os grupos de sete a quatorze e de quinze a dezesseis anos de idade.

§ 3º Cada Município e, supletivamente, o Estado e a União, deverá:

I - matricular todos os educandos a partir dos sete anos de idade e, facultativamente, a partir dos seis anos, no ensino fundamental;

II - prover cursos presenciais ou a distância aos jovens e adultos insuficientemente escolarizados;

III - realizar programas de capacitação para todos os professores em exercício, utilizando também, para isto, os recursos da educação a distância;

IV - integrar todos os estabelecimentos de ensino fundamental do seu território ao sistema nacional de avaliação do rendimento escolar.

§ 4º Até o fim da Década da Educação somente serão admitidos professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em serviço.

§ 5º Serão conjugados todos os esforços objetivando a progressão das redes escolares públicas urbanas de ensino fundamental para o regime de escolas de tempo integral.

§ 6º A assistência financeira da União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a dos Estados aos seus Municípios, ficam condicionadas ao cumprimento do art. 212 da Constituição Federal e dispositivos legais pertinentes pelos governos beneficiados.

Art. 88. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios adaptarão sua legislação educacional e de ensino as disposições desta Lei no prazo máximo de um ano, a partir da data de sua publicação.

§ 1º As instituições educacionais adaptarão seus estatutos e regimentos aos dispositivos desta Lei e às normas dos respectivos sistemas de ensino, nos prazos por estes estabelecidos.

§ 2º O prazo para que as universidades cumpram o disposto nos incisos II e III do art. 52 é de oito anos.

Art. 89. As creches e pré-escolas existentes ou que venham a ser criadas deverão, no prazo de três anos, a contar da publicação desta Lei, integrar-se ao respectivo sistema de ensino.

Art. 90. As questões suscitadas na transição entre o regime anterior e o que se institui nesta Lei serão resolvidas pelo Conselho Nacional de Educação ou, mediante delegação deste, pelos órgãos normativos dos sistemas de ensino, preservada a autonomia universitária.

139

Art. 91. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 92. Revogam-se as disposições das Leis nºs 4.024, de 20 de dezembro de 1961, e 5.540, de 28 de novembro de 1968, não alteradas pelas Leis nºs 9.131, de 24 de novembro de 1995 e 9.192, de 21 de dezembro de 1995 e, ainda, as Leis nºs 5.692, de 11 de agosto de 1971 e 7.044, de 18 de outubro de 1982, e as demais leis e decretos-lei que as modificaram e quaisquer outras disposições em contrário.

Brasília, 20 de dezembro de 1996; 175º da Independência e 108º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Paulo Renato Souza

140

Ato

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Ato

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Lei

Norma escrita, elaborada por órgão competente, com forma estabelecida, pela qual as regras jurídicas são criadas, modificadas ou extintas. (GUIMARÃES, 2012, p. 159)

Poder legislativo x x x x x

x

x x x x x x

x x x

x x x x x x

x x x

Medida Provisória

Instrumento legislativo disponível ao chefe do Executivo exclusivamente para casos de urgência e relevância. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.105)

Editadas pelo Presidente da

República x x x x

x

x x x

x x x x x x

x x

25

Segundo a Lei Complementar nº 95/98, que dispõe, dentre outras coisas, sobre a redação das leis, em seu art. 1º, parágrafo único, é possível lermos: “As disposições desta

Lei Complementar aplicam-se, ainda, às medidas provisórias e demais atos normativos referidos no art. 59 da Constituição Federal, bem como, no que couber, aos decretos e

aos demais atos de regulamentação expedidos por órgãos do Poder Executivo.” (BRASIL, 1998, gripo nosso). Dessa forma, nem todos os atos normativos apresentam “Parte

Geral e Específica”, Livros”, dentre outros, mesmo porque, como dito anteriormente a organização interna do ato dependerá da extensão do documento que está sendo

elaborado. 25

Segundo a Lei Complementar nº 95/98, que dispõe, dentre outras coisas, sobre a redação das leis, em seu art. 1º, parágrafo único, é possível lermos: “As disposições desta

Lei Complementar aplicam-se, ainda, às medidas provisórias e demais atos normativos referidos no art. 59 da Constituição Federal, bem como, no que couber, aos decretos e

aos demais atos de regulamentação expedidos por órgãos do Poder Executivo.” (BRASIL, 1998, gripo nosso). Dessa forma, nem todos os atos normativos apresentam “Parte

Geral e Específica”, Livros”, dentre outros, mesmo porque, como dito anteriormente a organização interna do ato dependerá da extensão do documento que está sendo

elaborado.

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Ato

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Resolução

Expedida pelas altas autoridades do Executivo, pelos presidentes dos tribunais e pelas corporações legislativas com o intuito de disciplinar matéria de sua competência específica. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.62)

Autoridade pública

x x x x

x x x x

x x x

x x x x x x

x x

Portaria

É a fórmula pela qual a autoridade de qualquer escalão de comando expede orientações gerais ou especiais aos respectivos subordinados ou designam servidores para o

É ato expedido por Ministro de

Estado, Secretário de

Estado ou

x x x x x x x x x x x x

Ato

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Decreto

É ato de competência exclusiva do Executivo destinado a provar situações gerais ou individuais previstas de forma abstrata pela lei. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.62)

Chefe do Poder Executivo:

Presidente da República,

Governador e Prefeito

x x x

x

x x x

x x x x x

x x

Estatuto Lei Orgânica ou Regulamento [...]. (GUIMARÃES, 2012, p. 118)

Autoridade administrativa

x x x

x x x x x

x x x

x x x x x x

x x

Regimento

É ato de atuação interna, destinando-se a reger o funcionamento de órgãos colegiados e de corporações legislativas. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.62)

Autoridade administrativa

x x x x

x x x x x

x x x

x x x x x x

x x

Regulamento

Ato ou efeito de estabelecer normas, de regular; prescrição, norma, preceito, que tem como objetivo a regulamentação e aplicação de uma lei. (SANTOS, 2001, p. 214).

Chefe do Poder Executivo e

outros. x x x x

x x x x x

X x x

x x x x x x

X x

142

desempenho de certas funções. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.63)

dirigentes de órgãos e

entidades da Administração

Pública

x

Ato

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vo

s

Instrução

É a fórmula mediante a qual os superiores expedem normas gerais, de caráter interno, que prescrevem o modo de atuação dos subordinados em relação a certo serviço. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.62)

Autoridade administrativa

x x x x x

x x x

x x x

x x

Ordem de serviço

É o meio pelo qual os superiores transmitem a seus respectivos subordinados a maneira correta de ser conduzido determinado serviço, no que respeita aos aspectos administrativos e técnicos. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.63)

Autoridade administrativa

x x

x

x

Decisão

Vontade determinada, deliberação final, conclusiva, após madura reflexão e convicção formada e objetivo definido. Resultado de deliberação de uma ou mais pessoas. Solução dada por agente administrativo. [...] (GUIMARÃES, 1999, p. 238).

Autoridade administrativa

x x x

x

x x

Ato

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orm

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vo

s

Acórdão Decisão proferida em grau de recurso por tribunal coletivo e superior. (SANTOS, 2001, p. 30).

Órgão colegiado de um tribunal

x x

x

x x

Despacho decisório

É o meio pelo qual a autoridade administrativa manifesta decisões

Autoridade Pública

x x x x x

143

finais ou interlocutórias em processos submetidos à sua apreciação. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p. 63).

Ato

s e

nu

ncia

tivo

s:

Parecer

É a fórmula segundo a qual certo órgão ou agente consultivo expede opinião técnica sobre matéria submetida à sua apreciação. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p. 62)

Órgãos consultivos da Administração.

x x

x

Relatório

Descrição escrita e minuciosa das atividades administrativas de uma organização pública [...] (SANTOS, 2001, p. 215)

Autoridade administrativa/ subordinado

x

x x

Ato

s e

nu

ncia

tivo

s:

Voto

Meio pelo qual se manifesta uma vontade, em um julgamento ou deliberação coletiva. (GUIMARÃES, 2012, p. 263)

Autoridade administrativa

x x

x

Despacho interlocutó

rio

Aquele no qual o juiz não decide a ação judicial principal, mas somente questão de ponto incidente. (SANTOS, 2001, p. 76)

Autoridade administrativa

x

Ato

s d

e

Assen

tam

en

to

Apostila

Aditamento a ato enunciativo ou declaratório de uma situação anterior criada por lei. É utilizado, também nos casos de retificação e atualização de dados funcionais, averbando abaixo dos textos ou no verso de decretos e portarias pessoais [...]

Autoridade ou Chefia

Administrativa x

x

144

Ato

s d

e A

ssen

tam

en

to Ata

Resumo dos acontecimentos de uma reunião para efeito de documentação. (GUIMARÃES, 2012, p. 52).

Autoridade administrativa e

secretário da administração e,

se for o caso, todos os

presentes no momento do

ato.

x

x x x

Termo [...] redução à forma escrita de um ato jurídico. (GUIMARÃES, 2012, p. 244).

Servidor Público (em razão do

cargo ou função que ocupa)

x

Auto de Infração

Peça inicial do processo fiscal, no qual fica constatada a infração verificada pela autoridade. (SANTOS, 2001, p. 41)

Autoridade Administrativa

x

x

Ato

s c

om

pro

bató

rio

s

Traslado Nome dado à cópia do que está escrito no livro de notas. (GUIMARÃES, 2012, p. 249).

Tabelião

x

Certidão

São cópias autenticadas de atos ou fatos constantes de processo, livro ou documento que se encontrem nas repartições públicas. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.61)

Chefe imediato x x

x x x

Atestado

São atos pelos quais a Administração comprova um fato ou uma situação de que tinha conhecimento. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.61)

Servidor Público (em razão do

cargo ou função que ocupa)

x

x x

145

Cópia autêntica

ou idêntica

A que é conferida com o original e cuja exatidão é certificada pelo escrivão. (SANTOS, 2001, p. 220).

Servidor responsável

x

Ato

s d

e a

juste

Tratado

Acordo de Direito Internacional, celebrado entre Estados em forma escrita, que conste de instrumento único ou de dois ou mais instrumentos conexos, sem importar sua denominação específica. O instrumento desse acordo. . (GUIMARÃES, 2012, p. 249).

Pessoas envolvidas

x

Convênio

Contrato celebrado entre pessoas jurídicas de direito público, tendo como objetivo uma prestação de serviços mútuos. (GUIMARÃES, 2012, p. 88).

Autoridade administrativa e

outra(s) entidade(s)

x x

x

x x x

x

Contrato

É a convenção estabelecida entre duas ou mais pessoas para constituir, regular ou extinguir entre elas uma relação jurídica. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.66)

Autoridade administrativa e

outra(s) entidade(s)

x

x

x x x

x

Ato

de A

juste

Term

os

(exem

plo

s)

Tran-sação

Ato jurídico pelo qual as partes previnem ou extinguem obrigações litigiosas, mediante concessões mútuas. (GUIMARÃES, 2012, p. 248).

Autoridade administrativa

x x

x

Ajuste Acordo, trato, combinação; [...] (SANTOS, 2001, p. 32).

x x x

x x x

x

x

x x

146

Ato

s d

e

Co

rre

sp

on

dên

cia

Aviso

Comunicação ao público sobre assunto do seu interesse.

Titulares de órgãos e

entidades. x x x

x x

Ofício

É o meio pelo qual os agentes públicos procedem às necessárias comunicações de caráter administrativo ou social. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.63)

Administração Pública

x x

x x

Ato

s d

e C

orr

esp

on

dên

cia

Carta

Epístola, missiva, comunicação escrita, manuscrita, datilografada, acondicionada em envelope, lacrado ou não, selado, que se envia a uma ou mais pessoas. Documento ou escrito judicial, ou oficial, pelo qual se pede a execução de certos atos, fazem-se avisos, contratos, notificações, intimações, impõem-se obrigações se deveres e reconhecem-se direitos. [...] (GUIMARÃES, 2012, p. 65).

Autoridade administrativa

para o ato

x x

147

Ato

s d

e C

orr

esp

on

dên

cia

Memorando

Comunicado breve, por escrito, para esclarecer, orientar, informar. [...] (GUIMARÃES, 2012, p. 405).

Entre Unidade Administrativa de um mesmo

órgão.

x x x x

Mensagem

Comunicação oficial entre o Executivo e Legislativo, ou enviada por chefe de Estado ao Legislativo (HOUAISS, 2009)

Comunicação entre chefe dos

Poderes Públicos

x x x x

Edital

Ato escrito publicado em jornais de grande circulação e afixado em lugar público [...] (GUIMARÃES, 2012, p. 111).

Autoridade Administrativa

x x x x x

Intimação

Ordem dada por autoridade pública a alguém, para que faça ou deixe de fazer algo. (GUIMARÃES, 2012, p. 150).

Autoridade Administrativa

x x x x

Ato

de C

orr

esp

on

dên

cia

Exposição de motivos

Reflexão e esclarecimento de ordem doutrinária através da qual é esclarecido, justificado um ponto de vista sobre determinado assunto ou determinado projeto de lei ou de decreto. (SANTOS, 2001, p. 95).

Ministro para o Presidente.

x

x x

Notificação

Documento escrito, categórico ou não, pelo qual é feita determinada notificação ou comunicação a alguém de determinado fato ou intenção que configure implicação jurídica. (SANTOS, 2001, p. 169).

Autoridade

administrativa x

x

148

Telegrama

Comunicação transmitida ou recebida via telégrafo; impresso onde se escreve essa comunicação.

Autoridade competente ou pessoa a quem

foi delegado.

Não há padrão rígido, devendo-se seguir a forma e a estrutura dos formulários disponíveis nas agências dos Correios e em seu sítio na Internet. (página 26 do Manual de redação da presidência da república.

Ato

s d

e C

orr

esp

on

dên

cia

Fax Documento enviado pelo sistema Telefac-símele. (HOUAISS, 2009)

Autoridade competente

Toda documentação a ser enviada por fax mantém o formato do documento original, sendo conveniente acrescentar a esse documento uma folha de rosto na qual conste detalhes sobre a identificação do remetente e destinatário.

Alvará

É o ato administrativo vinculado por meio do qual a Administração Pública outorga a alguém que por isso se interesse o direito de realizar certa atividade material que sem ela lhe seria vedada, desde que satisfeitas as exigências legais. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.63)

Administração Pública

x

x x

Circular

É a fórmula mediante a qual os superiores transmitem ordens uniformes aos respectivos subordinados sobre certo serviço. (BRANCHIER; TESOLIN, 2006, p.62)

Determinados Funcionários

x x

x x

149