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Naomi Sugita Reis DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO ____________________________________________________________ O DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO O FENÔMENO DA GLOBALIZAÇÃO A globalização, como fenômeno é algo, segundo Boaventura de Souza Santos, “polifacético”, tendo várias faces, sejam elas econômicas, sociais, políticas, culturais, religiosas ou jurídicas, fazendo com que este seja um fenômeno — além de plural —, complexo, amplo e variado. A ideia de globalização também se liga a outros fenômenos, como as mudanças demográficas, a questão ambiental, a desigualdade social, dentre outros. Por conseguinte, a mera troca de informações, pura e simplesmente, não pode ser chamada de globalização. Anthony Giddens expressa a globalização como a “intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que os acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distancia e vice-versa”. CENÁRIO Existem, hoje, 193 países reconhecidos pela ONU. Ou seja, existem, hoje, no mínimo, 193 interpretações diferentes para problemas jurídicos. Cada um dos países ainda é baseado em sistemas jurídicos que se fundam em soberania e nacionalidade. Em decorrência disso, não há possibilidade de se considerar a existência de um Legislador universal. O cenário dos ordenamentos jurídicos, hoje, é assim: DIFERENTES SISTEMAS LEGAIS NO MUNDO O mundo está dividido entre Common Law, a qual é baseada em precedentes normativos firmados através de um caso específico e é regida através de acts e a Civil Law, a qual está fundada na subsunção do fato à norma, no contrato social e, portanto, na lei. 1

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Naomi Sugita Reis

DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO ____________________________________________________________

O DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

O FENÔMENO DA GLOBALIZAÇÃO

A globalização, como fenômeno é algo, segundo Boaventura de Souza Santos, “polifacético”, tendo várias faces, sejam elas econômicas, sociais, políticas, culturais, religiosas ou jurídicas, fazendo com que este seja um fenômeno — além de plural —, complexo, amplo e variado. A ideia de globalização também se liga a outros fenômenos, como as mudanças demográficas, a questão ambiental, a desigualdade social, dentre outros. Por conseguinte, a mera troca de informações, pura e simplesmente, não pode ser chamada de globalização.

Anthony Giddens expressa a globalização como a “intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que os acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distancia e vice-versa”.

CENÁRIO

Existem, hoje, 193 países reconhecidos pela ONU. Ou seja, existem, hoje, no mínimo, 193 interpretações diferentes para problemas jurídicos. Cada um dos países ainda é baseado em sistemas jurídicos que se fundam em soberania e nacionalidade. Em decorrência disso, não há possibilidade de se considerar a existência de um Legislador universal.

O cenário dos ordenamentos jurídicos, hoje, é assim:

DIFERENTES SISTEMAS LEGAIS NO MUNDO

O mundo está dividido entre Common Law, a qual é baseada em precedentes normativos firmados através de um caso específico e é regida através de acts e a Civil Law, a qual está fundada na subsunção do fato à norma, no contrato social e, portanto, na lei.

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Os sistemas não são, nos dias atuais, como eram antes, eis que estão cada vez mais sofrendo a influencia um do outro.

Ainda, existe o “Direito Islâmico”, que é fortemente influenciado pela religião; possui fontes distintas das ocidentais, como, por exemplo a Sharia {caminho, shiitas} e a Suna {lições dos Doutores, sunitas}. E uma coisa interessante, que o Alcorão não poderia ser decretado, nem alterado, mas revelado. Como ele é uma expressão religiosa, ele acaba sendo demasiado estático.

Tendo em vista o imenso numero de países no mundo, há de ser estabelecido como se dará a compatibilização entre as leis desses: resultando na resolução dada pelo próprio país, através de um exercício de soberania. Temos, como exemplo, o artigo 7º da LINDB:

Art. 7o  A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família.

Como o Direito Internacional funciona com a reciprocidade, os Estados são compelidos a elaborar leis nacionais de compatibilização que não prejudiquem as leis estrangeiras.

A pluralidade de Direitos que precisam coexistir é que faz nascer o Direito Internacional Privado. A coexistência se dá de forma não estática, vale dizer, as relações entre cidadãos dos diferentes Estados importam consequências jurídicas influenciadas por diversos sistemas jurídicos distintos:

• Qual Direito como sistema normativo será aplicado? A existência de diversidade de Estados propicia um “conflito de Direitos” em casos concretos — a fim de gerar coexistência entre as diferentes leis;

• E se o Direto a ser aplicado for de outro Estado? Possibilidade de aplicação de um Direito estrangeiro a um caso julgado internamente {efeito extraterritorial da lei}.

PAPEL DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

O Direito a ser aplicado sempre será o nacional {não necessariamente em âmbito interno, ou seja, pode ser que um juiz brasileiro tenha que aplicar o direito nacional sul africano e vice-versa}, mas o nome do instituto é Direito Internacional porque o conflito em si é entre dois Estados, ou seja, internacional e, com isso, vêm alguns objetivos, como: 1. Apresentar “soluções” ao conflito de “Direitos”; 2. Buscar a harmonização/uniformização dos “Direitos”; 3. Reconhecimento internacional de Direitos; 4. Definir nacionalidade; 5. Definir a condição jurídica do estrangeiro.

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Strenger e Rechsteiner entendem que o principal objetivo do Direito Internacional Privado é a determinação da “legislação” aplicável a determinados casos que envolvem pluralidade de sistemas jurídicos aplicáveis. Pela indicação da lei se estabelece a certeza na aplicação do Direito. Essa indicação resume-se na determinação da lei, negando-lhe solução a questão propriamente dita.

Existem duas ferramentas adotadas para que ocorra uma aproximação a um Direito único: harmonização e uniformização.

PROBLEMA DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

O problema padrão é a pluralidade de sistemas jurídicos, o que gera um conflito normativo e, consequentemente, traz a duvida de qual seria o Direito a ser aplicado. Existe um tratamento pendular entre centralização e fragmentação, baseado em critérios que resolvem uma premissa ou outra, que não estão pautados em justiça, mas sim na praticidade.

Exemplo: Cidadão romano casando com bárbara. Enquanto o Direito romano consagrava o dote, o Direito germânico instituía a doação do marido logo após a noite de núpcias {Morgengabe}. Qual seria o Direito aplicado?

TEORIA DOS ESTATUTOS

Em meados do século XIII, na Itália, existia uma forte construção política de autonomia entre as comunas. Autonomia, neste sentido, significa o reconhecimento do Direito dessas comunas, em específico. Sendo assim, a Teoria dos Estatutos vem com o objetivo de resolver conflito entre estatutos {direitos locais das comunas}. Inicialmente, quem cria os critérios são os glosares {estudiosos do Direito Romano Imperial os quais possuíam a intenção de glosá-lo}, que buscam estabelecer os critérios de aplicação de um ou outro Direito. Em seguida, justificam o motivo de aplicar o Direito estrangeiro e, mais recentemente, estudam como aplicar o Direito estrangeiro.

LINHAS TEÓRICAS

I. Escola Estatutária Italiana — Fundada por Bártolo {Século XIV}.

A. Estatutos permissivos {extraterritoriais, possibilidade de aplicar em outros lugares} e proibitivos {territoriais, ausência de tal possibilidade}.

B. Consagrava-se: 1. Locus regit actum {territorial} {art. 7º, §1º LINDB}; 2. Lex fori para processo {toda vez que se der um processo, será aplicada a ele o

Direito processual do país}{art. 13 CPC}; 3. Lei do local do contrato para obrigações {art. 9º, caput LINDB};

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4. Lei do local da execução para forma de execução das obrigações {art. 9º,§1º LINDB};

5. Lex rei sitae {art. 8º LINDB}.

II. Escola Francesa - Século XVI: a regra seria a territorialidade, os casos de extraterritorialidade se justificariam por uma questão de justiça.

III. Escola Holandesa – Século XVII: apenas por uma questão prática se aceitariam estatutos fora de sua área de origem.

IV. Escola Anglo-Americana – Século XIX: o Law seria eminentemente territorial, podendo ser aplicado fora do território por dever moral entre governos.

V. Escola Estatutária Alemã - Século XVIII ao Século XX

A. Estabelece precisamente os critérios:

1. Estatuto pessoal é o domicílio {art. 7º, caput, §4º; art. 8º, §1º e art. 10, caput LINDB};

2. Estatuto real é o da situação da coisa e onde celebrado o ato; 3. Estatuto regulador é o da celebração do ato; 4. Destaque: Savigny (Século XVIII) premissa de coexistência; 5. Vontade contratual como critério — importância da vontade para estabelecer

estatutos.

VI. Von Bar: a aplicação do Direito estrangeiro não dependeria de concessão do Estado, mas de dever jurídico. O estatuto pessoal seria a nacionalidade.

VII.Mancini - Século XIX: o Direito necessário é definido pela nacionalidade {estatuto pessoal}.

VIII.Pillet: o Estatuto pessoal é definido pela nacionalidade. O Direito estrangeiro deve ser respeitado em função de um dever internacional. Altamente criticado por entender o DIPRI como um conflito de soberania.

IX. Goldschmidt - Século XX: o juiz brasileiro, para aplicar uma norma estrangeira, pode lidar com a norma estrangeira como sendo estrangeira, pode lidar com ela como se ela fosse brasileira ou então poderá lidar com a norma estrangeira como se ela fosse um fato, dependendo de prova. O Direito privado voluntário é definido em exercício de autonomia da vontade. A aplicação pode ser exemplificada com a delação premiada; pelo primeiro critério seria utilizada ela como fora criada nos EUA, pelo segundo, seria a internalização pelo direito brasileiro e pela ultima, deveria ela ser provada {o que for provado pelas partes será aplicado}.

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A. Aplicar uma norma estrangeira como estrangeira: se colocar no lugar de um juiz estrangeiro com a finalidade de estudar a lei do outro local que deverá ser aplicada no caso concreto. Se colocar nos sapatos do juiz estrangeiro e agir como se ele fosse.

B. Teorias da incorporação: incorporação material — transformar o direito estrangeiro em nacional {pegar o CC francês e inseri-lo no ordenamento jurídico brasileiro}. A dificuldade, neste caso, seria a compatibilização.

C. Direito estrangeiro como fato a depender de “prova”: o juiz aplica aquilo que for provado. É a mais fácil e a mais aplicável de todas. O Judiciário brasileiro faz isso em função da interpretação dada pela LINDB.

APLICAÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

O que tem que ser feito ao analisar um caso é:

1. Entender o que ocorre; 2. Saber se o que está sendo pedido pode ser concedido; 3. Saber se existe jurisdição.

ATORES DE DIRIETO INTERNACIONAL PRIVADO

Existem alguns direitos que não são nacionais, são internacionais, mas eles não podem ser confundidos com direito estrangeiro, eis que eles serão nacionais de algum Estado. O Estado é apenas um dos atores do cenário internacional privado. Existem novos atores que passaram a ter grande proeminência, quais sejam: Organizações Internacionais, Fundações Internacionais, Empresas e investidores transnacionais.

O conceito de “governança formal” nasceu com a ocupação de espaços que, anteriormente, eram dos Estados. Quem vem ocupando cada vez mais tais espaços, hoje em dia, são instituições como o FMI. Um agente privado como esse pode até mesmo trazer medidas de austeridade para Estados. Sendo assim, um agente privado, frente à insuficiência apresentada pelos Estados, passa a ter grande influência.

Hoje em dia, no cenário internacional, cada ator internacional possui uma agenda e uma voz própria; o que acarreta em diversas discussões sobre assuntos diversos. Desses discursos, vão sendo pegadas coisas e, consequentemente, apropriadas pelos Estados em nível interno. Existem diversos atores portanto, que vão criando o Direito.

O Direito Internacional Privado é criado por diversos atores, e não apenas pelos Estados. Normalmente, a incompetência dos Estados é demonstrada pela sua soberania. O que deixa certos setores do poder judiciário espantados é a utilização da Soft Law no lugar da Hard Law. O espaço publico, neste caso, é horizontal.

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INSTRUMENTOS DE ATUAÇÃO NO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

I. Conferência da Haia: unificação do Direito Internacional Privado. Teve um papel muito importante para a construção de tratados internacionais, funcionando como uma assessoria técnica para a ONU. Hoje em dia, ele vem criando instrumentos de Soft Law {ela elabora o texto, que poderá ser adotado pelos Estados, fazendo com que esse texto vire um Tratado Internacional}.

II. UNCITRAL {United Nations Commission for International Trade Law}

A. Instituto Internacional de Unificação do Direito Privado, sediado em Roma, criado em 1926;

B. Foi responsável: Convenção de Haia de 1964 sobre a formação do contrato de compra e venda internacional de bens móveis; da Convenção de Bruxelas de 1970 sobre contrato de turismo; da Convenção de Washington de 1973 sobre testamento internacional; da Convenção de Genebra de 1983 sobre representação nas vendas internacionais e da Convenção de Ottawa de 1988 sobre leasing internacional;

C. Destaque: Princípios UNIDROIT relativos aos contratos comerciais internacionais no no de 2016.

III. UNIDROIT: papel dela é de unificação do direito internacional e do direito privado. Com o tempo, passou a migrar para mecanismos de Soft Law, que não precisam do envolvimento do Estado, podendo ser utilizado individualmente.

IV. CCI - Câmara de Comércio Internacional {1919}: possui diversos instrumentos de Soft Law.

A. “Delegação do Estado” para que possam ser feitos, em matéria técnica, documentos por parte de particulares;

B. Objetivos: representar todos os setores de atividade econômica internacional; contribuir para a harmonização e liberdade das relações comerciais no domínio jurídico e econômico e fornecer serviços especializados e pragmáticos à comunidade de negócios internacional.

C. Destaque: responsável pelos incoterms, pela UCP e por diversas cláusulas modelo.

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PROJEÇÃO Estaria sendo criado um espaço “público” transnacional fora do sistema internacional dos Estados.

✓ Qual(is) a(s) consequência(s) disso?

O enfraquecimento do poder Estatal, este cederia espaço de decisão a outros centros de poder.

Estes “novos centros de poder” obedeceriam a interesses próprios não necessariamente relacionados ao bem público.

COMO É CRIADO O DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

FONTES NACIONAIS

I. Atos unilaterais de um Estado: leis, decretos, julgados, etc.

A. Exemplo: decisão de um tribunal sobre determinado elemento de conexão sendo aplicável a um caso concreto;

B. Exemplo: LINDB; Jurisprudência do STF sobre ordem pública; Regimento Interno do STJ; legislação aduaneira, etc.

FONTES INTERNACIONAIS

I. Tratados {bilaterais ou plurilaterais}: A. Exemplo: Acordo de Marrakech {Institui a OMC}, CISG.

II. Costumes internacionais: A. Exemplo: Princípio da livre navegação

III. Acordos infraestatais

IV. Modelos de convenção/lei: A. Exemplo: Lei modelo de Arbitragem da UNCITRAL

V. Atos unilaterais de organizações internacionais: podem questionar a Soberania do Estado, ao questionar as suas leis internas. A. Exemplo: Resoluções da OIT, Sentença da CIDH.

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FONTES PRIVADAS

Baseadas nos esforços dos operadores do comércio internacional {empresários, câmaras, etc.}. Além das fontes tradicionais, acrescentam-se outras como o costume, cláusulas contratuais padrão, contratos modelo, estatutos arbitrais, decisões arbitrais.

Novos desafios:

(i) soft law; (ii) lex mercatoria.

I. Soft Law: normalmente aplicado a contratos.

A. O que? Soft law são padrões normativos não vinculantes {não legais}, mas que podem ser adotados pelas partes voluntariamente. Por exemplo: ISO9000, restatements, etc.

B. Por que? Certas áreas da técnica são tão precisas que não são alcançadas pelas regulamentação estatal.

C. Como? Tais padrões, corporativos, setoriais, etc. acabam, de alguma forma, se consolidando e se tornando de uso imperativo. Passam a não só influenciar a condução da conduta, mas a interpretação dos contratos e sua execução.

II. Lex Mercatoria: o conjunto das soft law configura a lex mercatoria.

A. O que? Lex mercatoria seria o Direito autônomo aplicável ao comércio internacional.

B. Por que? Defende-se que como estas transações não estão presas a nenhum país em especial, elas seriam autônomas e especializadas em relação aos seus ordenamentos. Além disso, precisariam de um Direito especializado.

C. Como? Tal direito seria buscado a partir de fontes próprias: costumes, contratos, laudos arbitrais, etc. Além disso, são criadas várias cláusulas padrão.

MÉTODOS DE APLICAÇÃO DA SOFT LAW E LEX MERCATORIA Internacionalização, harmonização e uniformização

I. Internacionalização do direito: é um método utilizado quando pensamos no Estado em seu interno, pensamos nele como criador de suas próprias normas, com emanação do seu direito para fora. Entretanto, com a internacionalização, a figura do Estado começa a ceder espaço para atores com interesses privados, os quais se utilizam de maneiras novas de importação de direito. O mecanismo privado não é o padrão para criar o direito; portanto, o Brasil começa a trazer o direito de fora. Sendo assim, a lex

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mercatoria passa a ser reconhecida em sua importância, assim como a influencia da franca importação {com espaço publico internacional sendo trazido para o direito brasileiro}.

A. O que? Diálogo entre fontes de Direito interno e internacional.

B. Por que? Resposta às necessidades econômicas e sociais, especialmente em razão da chamada “Globalização”.

C. Como? Troca de ferramentas jurídicas, desenvolvimento de estudos de Direito comparado, etc. {complementariedade – Borba Casella}.

II. Harmonização: aproximação normativa por meio da adequação da legislação interna dos diferentes países. Embora diferentes, as legislações nacionais são “parecidas” (guardam os mesmos elementos e princípios básicos).

A. Exemplo: a Lei modelo de arbitragem da UNCITRAL.

III. Uniformização: identidade normativa por meio da criação de instrumentos internacionais únicos que congreguem o maior número possível de Estados partes. As legislações nacionais são iguais.

A. Exemplo: Convenção de Viena de 1980 (CISG).

CONFLITO DE LEI E JURISDIÇÃO

O DIPRI é uma fundamentação para a aplicação de um direito específico no caso concreto. Estamos trabalhando com uma metodologia para a aplicação do direito e não com a solução em si, o que se espera é uma resposta para qual seria o direito aplicado ao conflito.

A jurisdição define qual será o foro competente para o caso concreto. Por seguinte, o DIPRI define qual seria a norma processual e material aplicadas. Lex fori me da processo e conflito {jurisdição e DIPRI} e lex causae é direito material. A lex fori é o direito interno enquanto lex causae depende da norma interna de DIPRI que o país possui.

O papel do DIPRI é o de percorrer um caminho que parte da jurisdição, vai para o próprio DIPRI e chega no lex causae. O DIPRI a ser estudado é o brasileiro, entretanto, esse fato não implica, necessariamente, na utilização da lex causae brasileira. Pode ser utilizado um DIPRI brasileiro sem ser aplicado o direito material de mesma origem.

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Para que possa ser atingido o direito material a ser aplicado, é necessário seguir um caminho:

I. Jurisdição — Juris dictio: aqui, vai ser definido quem tem a jurisdição. Quando trabalhamos com qualquer lei processual, nos deparamos com a lex fori, que é uma regra definida pelos italianos de que sempre a lei aplicada ao processo será a do foro, ou seja, de onde se dará a resolução do conflito {processo civil/ arbitragem}. Posso julgar? Tenho competência? Há jurisdição brasileira? Pode ter mais de uma jurisdição envolvida, em virtude da soberania.

1. Competência relativa: o artigo 21 e o artigo 22 definem a competência relativa da jurisdição brasileira, ou seja, é permitido o conflito de competência entre a jurisdição brasileira e a jurisdição estrangeira {desde que no outro Estado, essa matéria também seja de competência relativa — caso ela seja absoluta, não haverá conflito}. Nos casos destes artigos, podem existir duas sentenças. A homologação de sentença estrangeira vem a ocorrer quando existe competência relativa e, eventualmente, a sentença estrangeira pode ser eficaz territorialmente em território nacional {fora de seu país de origem}.

Art. 21. CPC Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que:

I - o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;

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1. Norma Processual {CPC}: QUEM

1.1 Competência relativa, 1.2 Competência absoluta, 1.3 Litispendência, 1.4 Clausula de eleição de foro, 1.5 Clausula arbitral, 1.6 Imunidade de jurisdição.

2. Norma Conflitual: COMO

2.1 Processo 2.2 Classificação 2.3 Qualificação 2.2.1 Lex Fori 2.2.2. Lex Causae 2.4 Objeto de Conexão + elemento de conexão

3. Norma de Mérito. O QUE

3.1 Confirmação da Qualificação 3.2 Identificação do Direito 3.3 Interpretação 3.4 Eficácia

3.4.1 Ordem Pública 3.4.2 Fraude à Lei 3.4.3 Questão Prévia 3.4.4 Reenvio 3.4.5 Benefício

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II - no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;III - o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.

Parágrafo único.Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal.

Art. 22. CPC Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações:

I - de alimentos, quando: a) o credor tiver domicílio ou residência no Brasil; b) o réu mantiver vínculos no Brasil, tais como posse ou propriedade de bens, recebimento de renda ou obtenção de benefícios econômicos; II - decorrentes de relações de consumo, quando o consumidor tiver domicílio ou residência no Brasil; III - em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional.

2. Competência absoluta: legislação brasileira, para respeitar a soberania dos outros Estados, não pode excluir a jurisdição desses. Sendo assim, ele vai estipular que, nos casos do art. 23 do CPC, a sentença estrangeira, caso seja proferida, não produzirá efeitos em território nacional — não são casos de cooperação e, portanto, não são casos em que pode ocorrer a homologação de sentença estrangeira.

Art. 23. CPC Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra:

I - conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil; II - em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular e ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional; III - em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional.

3. Litispendência: não existe litispendência em matéria internacional porque isso interferiria em soberania alheia. A litispendência vai de encontro à cooperação internacional. A definição de jurisdição é exercício de soberania e, em função disso, é impossível a ocorrência de litispendência internacional. Não pode escolher uma jurisdição que exclua a outra.

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A sentença que surtirá efeito no Brasil será aquela que transitar em julgado por primeiro {se estiver correndo um processo no Brasil e um processo correndo em outro país, caso a sentença estrangeira seja homologada no STJ antes do processo brasileiro transitar em julgado, é a sentença estrangeira que valerá sobre a nacional}.

Art. 24. CPC A ação proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não obsta que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em vigor no Brasil.

Parágrafo único.A pendência de causa perante a jurisdição brasileira não impede a homologação de sentença judicial estrangeira quando exigida para produzir efeitos no Brasil.

Competência da Justiça Federal:

Art. 109. CF Aos juízes federais compete processar e julgar: X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o "exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização;

Conflito negativo de competência: não tem como ocorrer o conflito negativo de competência em função o art. 5º, XXV da CF “XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. É a legislação interna que estabelece as situações nas quais o julgador deve agir. A definição da competência é ato vinculado ao exercício da soberania, fundado na possibilidade de cada Estado estabelecer sua jurisdição.

4. Cláusula de eleição de foro: é um raciocínio consolidado internacionalmente. Quase todos os países do Ocidente adotam essa regra. As hipóteses de competência relativa {art. 21 e 22} não são taxativas, ou seja, são exemplificativas. Em matéria contratual, há uma tradição de se entender que a escolha do foro é um exercício de liberdade dos contratantes. Ou seja, a cláusula de eleição de foro estabelece uma jurisdição relativa.

Art. 22. CPC Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações: III - em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional.

Art. 25. CPC Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da ação quando houver cláusula de eleição de

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foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, arguida pelo réu na contestação.

§ 1o Não se aplica o disposto no caput às hipóteses de competência internacional exclusiva previstas neste Capítulo. § 2o Aplica-se à hipótese do caput o art. 63, §§ 1o a 4o.

5. Cláusula arbitral: o juiz, conforme o art. 485, VII do CPC, irá extinguir, sem resolução do mérito, o processo. {art. 2º e 7º da Lei 9307/96}. Essa clausula poderá se sobressair à jurisdição do Judiciário nacional.

6. Imunidade de jurisdição: casos em que o Judiciário não pode apreciar por envolverem questão de soberania estrangeira.

a) Imunidade plena: Estado se comportando como Estado. Quando o Estado exerce soberania, ou seja jus imperi, ele pode usufruir da imunidade. Quando o Estado não da direito de defesa a alguém, quando ele nega o visto a alguém, quando ele condena alguém… como a imunidade pode ser renunciada, cabe citar o Estado estrangeiro.

b) Imunidade “relativa”: Estado se comportando como particular. Quando o Estado aluga um imóvel…

c) Constrição de bens:

(1) TST tem ambas as posições em relação a constrição de bens, a mais atual proíbe. Um Estado não pode tomar bens do outro.

(2) STF e doutrina: fere direito liquido e certo do Estado estrangeiro a incidência de medidas expropriatórias contra bens abertos à sua representação diplomática ou consular, mesmo diante do reconhecido caráter restritivo da imunidade de execução, na medida em que este privilegio tem lugar no que tange aos bens vinculados ao corpo diplomático.

d) Diplomatas e Organizações Internacionais: possuem imunidade absoluta.

II. Direito Internacional Privado — Lex fori: amplamente relacionada à lei do foro {lex fori} — definido qual juiz será o competente para o caso em concreto {etapa 1}, será possível saber quais são as normas processuais e quais serão as normas materiais utilizadas, posto que é a lei do foro eleito na primeira etapa que dirá essas normas.

A. Processo Civil - Lei do processo: a lei do foro é que determinará tanto a jurisdição {primeira etapa}, quanto a norma utilizada no processo. Portanto, no

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Brasil, temos o lex fori positivado no art 13 do CPC, ou seja, conforme o nosso DIPRI, caso o Brasil tenha jurisdição sobre o caso, as normas processuais utilizadas no processo, serão as normas processais brasileiras. Sendo assim, não pode correr um processo em território brasileiro sendo aplicada a lei processual alemão, por exemplo. Diz-se que o juiz do caso em concreto deve aplicar ao procedimento o direito que a lex fori determinar {a lei do foro}. Definido o juízo, há de se aplicar o DIPRI pra saber qual a norma a ser utilizada no caso concreto. É, apenas em terceiro lugar, que se aplica a legislação indicada, se aplicará o direito ao caso concreto {ao mérito}. Sendo assim, ao ser escolhido o Brasil como foro competente pra um determinado caso concreto, será a própria lei brasileira que definirá qual a lei {de qual país} é que será utilizada nesse procedimento:

Art. 13. A jurisdição civil será regida pelas normas processuais brasileiras, ressalvadas as disposições específicas previstas em tratados, convenções ou acordos internacionais de que o Brasil seja parte.

B. Normas conceituais {LINDB}: “para este caso, qual direito eu aplico? O alemão ou o brasileiro? O francês ou o brasileiro?” - os EUA, como possuem 50 Estados diversos, vai ter que aplicar um DIPRI interno. Essa aplicação nasce no Direito Internacional e acaba indo para o âmbito interno também. A matéria de DIPRI define qual o direito é que vai ser aplicado e qual “professor que vai ser procurado”: o Grisard brasileiro ou o Grisard argentino.

1. Papel do DIPRI: chegar à lex causae, ou seja, definir qual norma se aplica para a solução de um determinado caso em concreto.

2. Normas LINDB: será o DIPRI do Brasil. Para sair do Lex Fori e chegar no Lex Causae, precisamos nos utilizar, muitas vezes, das normas indiretas {que são dúplices, possuindo objeto e elemento de conexão}.

a) Ao classificar a norma jurídica, eu alcanço o objeto e o elemento de conexão. Para que possa ser classificada a norma jurídica, deve ser analisado qual é o caso concreto, se estamos falando de responsabilidade civil, se estamos falando de sucessão… ou seja, a classificação do caso nos permite achar o artigo na LINDB, achando o artigo pertinente, identificamos, dentro desse artigo, o seu objeto e então achamos o seu elemento de conexão, que estão presentes nas normas indiretas, ou seja, do art. 7º ao 11 da LINDB.

Art. 7o A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família.

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§ 1o Realizando-se o casamento no Brasil, será aplicada a lei brasileira quanto aos impedimentos dirimentes e às formalidades da celebração. § 2o O casamento de estrangeiros poderá celebrar-se perante autoridades diplomáticas ou consulares do país de ambos os nubentes. § 3o Tendo os nubentes domicílio diverso, regerá os casos de invalidade do matrimônio a lei do primeiro domicílio conjugal. § 4o O regime de bens, legal ou convencional, obedece à lei do país em que tiverem os nubentes domicílio, e, se este for diverso, a do primeiro domicílio conjugal. § 5o O estrangeiro casado, que se naturalizar brasileiro, pode, mediante expressa anuência de seu cônjuge, requerer ao juiz, no ato de entrega do decreto de naturalização, se apostile ao mesmo a adoção do regime de comunhão parcial de bens, respeitados os direitos de terceiros e dada esta adoção ao competente registro. § 6o O divórcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cônjuges forem brasileiros, só será reconhecido no Brasil depois de 1 (um) ano da data da sentença, salvo se houver sido antecedida de separação judicial por igual prazo, caso em que a homologação produzirá efeito imediato, obedecidas as condições estabelecidas para a eficácia das sentenças estrangeiras no país. O Superior Tribunal de Justiça, na forma de seu regimento interno, poderá reexaminar, a requerimento do interessado, decisões já proferidas em pedidos de homologação de sentenças estrangeiras de divórcio de brasileiros, a fim de que passem a produzir todos os efeitos legais. § 7o Salvo o caso de abandono, o domicílio do chefe da família estende-se ao outro cônjuge e aos filhos não emancipados, e o do tutor ou curador aos incapazes sob sua guarda. § 8o Quando a pessoa não tiver domicílio, considerar-se-á domiciliada no lugar de sua residência ou naquele em que se encontre.

Art. 8o Para qualificar os bens e regular as relações a eles concernentes, aplicar-se-á a lei do país em que estiverem situados.

§ 1o Aplicar-se-á a lei do país em que for domiciliado o proprietário, quanto aos bens moveis que ele trouxer ou se destinarem a transporte para outros lugares. § 2o O penhor regula-se pela lei do domicílio que tiver a pessoa, em cuja posse se encontre a coisa apenhada.

Art. 9o Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituirem. § 1o Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as

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peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato. § 2o A obrigação resultante do contrato reputa-se constituida no lugar em que residir o proponente.

Art. 10. A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens.

§ 1o A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus. § 2o A lei do domicílio do herdeiro ou legatário regula a capacidade para suceder.

Art. 11. As organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as sociedades e as fundações, obedecem à lei do Estado em que se constituirem.

§ 1o Não poderão, entretanto ter no Brasil filiais, agências ou estabelecimentos antes de serem os atos constitutivos aprovados pelo Governo brasileiro, ficando sujeitas à lei brasileira. § 2o Os Governos estrangeiros, bem como as organizações de qualquer natureza, que eles tenham constituído, dirijam ou hajam investido de funções públicas, não poderão adquirir no Brasil bens imóveis ou susceptíveis de desapropriação. § 3o Os Governos estrangeiros podem adquirir a propriedade dos prédios necessários à sede dos representantes diplomáticos ou dos agentes consulares.

Art. 12. É competente a autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação. § 1o Só à autoridade judiciária brasileira compete conhecer das ações relativas a imóveis situados no Brasil. § 2o A autoridade judiciária brasileira cumprirá, concedido o exequatur e segundo a forma estabelecida pele lei brasileira, as diligências deprecadas por autoridade estrangeira competente, observando a lei desta, quanto ao objeto das diligências.

Art. 13. A prova dos fatos ocorridos em país estrangeiro rege-se pela lei que nele vigorar, quanto ao ônus e aos meios de produzir-se, não admitindo os tribunais brasileiros provas que a lei brasileira desconheça.

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Art. 14. Não conhecendo a lei estrangeira, poderá o juiz exigir de quem a invoca prova do texto e da vigência.

b) Normas de DIPRI: as normas de DIPRI podem ser classificadas de acordo com seu conteúdo.

(1) Normas indiretas {LINDB}: são as principais normas de DIPRI, justamente porque determinam o direito aplicável ao caso em concreto. São normas indicativas, não se fala especificamente o que fazer, mas sim onde procurar e como {em que parte da lei e em que lei}. Um exemplo é o art 7º da LINDB, que fala “procure no local onde está domiciliada a pessoa”. Não são normas que dão a solução para o caso, não se diz o mérito, apenas o indica — diz onde procurar, seja no dentro do direito brasileiro, seja em um direito estrangeiro. Para saber a resposta para sua pergunta, vá para a lei “X”.

(a) As normas indiretas podem ser classificadas segundo sua função:

i) Normas unilaterais: quando determinam a aplicação do Direito nacional {art. 7o, §1o LINDB};

Art. 7o A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família. § 1o Realizando-se o casamento no Brasil, será aplicada a lei brasileira quanto aos impedimentos dirimentes e às formalidades da celebração.

ii) Normas bilaterais imperfeitas: quando determinam a aplicação do Direito estrangeiro, sem excluir a aplicação do Direito nacional {art. 10, §1o LINDB};

Art. 10. A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens. § 1o A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus.

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iii) Normas bilaterais perfeitas: quando determinam a aplicação da lei estrangeira, excluindo a possibilidade de lei interna.

(2) Toda norma indireta {ou indicativa} é composta de duas partes {art. 7º ao art. 11}, sendo assim, será necessário fazer a classificação dessas normas:

(a) Objeto de conexão - questão de direito que se refere a questão de direito com vinculação internacional: capacidade jurídica, nome, ato ilícito, etc. Surgido o conflito, o juiz enquadrará a situação fática ao objeto de conexão {tal processo denomina-se qualificação}.

(b) Elemento de conexão. Os elementos de conexão são, em resumo, a nacionalidade, o domicílio, lex rei, lex loci actus, lex loci delicti, autonomia da vontade e lex fori; indicados no próprio artigo. É também possível a existência de um elemento de conexão principal e um subsidiário. Por exemplo, art. 10o da LINDB.

c) Normas conceituais ou qualificadoras: em número mais restrito são aquelas normas que não designam o direito aplicável, mas definem como uma norma indireta deve ser interpretada e aplicada no caso em concreto. São basicamente aquelas que se referem a ordem pública, fraude à lei, elementos de conexão, etc.

Art. 17. As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.

d) Normas diretas: são aquelas que apresentam imediatamente a solução para a questão debatida. No direito internacional privado são basicamente aquelas que determinam a competência internacional dos tribunais nacionais e a condição jurídica do estrangeiro.

Dépeçage “despedaçamento”: pode acontecer, ainda, a chamada dépeçage quando diversos direitos são aplicados a um mesmo caso concreto, em diversas esferas. Por exemplo, H contrata com U. A LINDB diz que a lei aplicável ao caso é aquela do local onde foi celebrado o contrato {art. 9o}. Já a lei que determina a capacidade de H é aquela do local em que for domiciliado {art. 7o}. Pode ser que haja 5 direitos aplicados a um mesmo caso. Para saber a resposta certa para cada pergunta jurídica, devemos fazer o caminho.

3. Teoria das classificações: o DIPRI cuida de classificar a relação jurídica para, na sequência utilizar a regra de conexão. O fato jurídico de DIPRI pode ser classificado de maneira distinta pelas diferentes jurisdições. Os Estados podem

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possuir as mesmas regras de conflito de leis, mas também podem lhe atribuir diferentes significados.

4. Problemas de classificação:

a) Caso Bartholo: Casal se casa e fixa primeiro domicílio em Malta. O marido falece na Argélia sem herdeiros. Pela lei francesa a mulher não herdaria nada. Em Malta, a viúva teria direito a um quarto do patrimônio. Constatou-se: ✓que a viúva somente teria direito a 1⁄4 se isso decorresse do regime matrimonial, pois os bens dos cônjuges seriam regidos pela lei do primeiro domicílio. ✓se a pretensão decorrer de regime sucessório aplicar-se-ia a norma francesa.

b) Caso do testamento holandês: um holandês assina testamento particular na França. O Direito francês considerava a questão como de forma {aplicando a lei do local} — não haveria testamento. Já o Direito holandês considerava a como matéria de capacidade {aplicando a lei do nacional} — haveria testamento. Temos que ver se o problema em questão é de forma ou de capacidade. Dependendo da classificação feita, teremos um testamento válido ou inválido.

c) A doutrina traz três soluções de classificação:

(1) Qualificação pela lex fori: coerência com a norma processual e com a norma conflitual. O grande problema, entretanto, é que talvez não combine com o caso concreto. Quando a qualificação é desta maneira, já se define, de antemão, que o caso será resolvido pela lei de onde o processo ocorrer.

(a) Qualifica-se a relação jurídica pelo Direito do julgador.

(b) Os que defendem essa teoria argumentam que não seria lógico qualificar a questão por Direito diferente daquele que será utilizado para indicar a Direito aplicável.

(2) Qualificação pela lex causae: a grande vantagem é a coerência, mas o problema é a sequencia lógica, porque não se sabe ainda neste momento qual é a lex causae aplicada ao caso em concreto. Sendo assim, teria que ser presumida a lex causae.

(a) Dever-se-ia solicitar ao Direito estrangeiro eventualmente aplicável a qualificação da relação jurídica que constitui o objeto do litígio.

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(b) Crítica: a qualificação precede à escolha do Direito competente, não seria possível pretender remeter a outro sistema se não se sabe qual o Direito aplicável.

(3) Qualificação por critérios universais: Os defensores desta teoria entendiam que o juiz não deveria se ater a uma ou outra legislação, mas a conceitos universais.

(a) Por exemplo: o conceito universal de família, de contrato, de propriedade, etc.

O Direito brasileiro aplica, por regra, a qualificação da lex fori, como podemos perceber ao lermos os artigos 7º, 10 e 11 da LINDB; abrindo duas exceções, em que a lex causae é que seria a escolhida em matéria de bens {art. 8o LINDB} e em matérias obrigacionais {art. 9o LINDB}.

- Lex fori: Art. 7º, art. 10 e art. 11 LINDB.

Definitiva {não precisa ser confirmada na lex causae, terceira etapa}: quando se trata de estatuto pessoal, de relações entre pessoas {direito local, que varia muito}. Quando se refere à pessoa, utilizamos a lei local.

- Lex causae: Art. 8º, art. 9º LINDB.

Provisória {precisa ser confirmada na lex causae, terceira etapa}: quando se trata de direitos reais, se aplica o direito da solução. São matérias altamente uniformizadas, harmonizadas — um contrato é um contrato. No art. 9º, o mesmo direito classificará {qualificará} e regerá o assunto em questão.

Questão: José, de nacionalidade brasileira, era casado com Maria, de nacionalidade sueca, encontrando-se o casal domiciliado no Brasil. Durante a viagem de “lua de mel”, na França, Maria, após o jantar, veio a falecer, em razão de uma intoxicação alimentar. Maria, quando ainda era noiva de José, havia realizado testamento em Londres, dispondo sobre os seus bens, entre eles dois imóveis situados no Rio de Janeiro.

- O Brasil é que tem competência absoluta, sendo assim, a França pode até processar o caso, mas a sua sentença não poderá ser homologada no Brasil. Se houver discussão acerca da validade do testamento, no que diz respeito à observância das formalidades, deverá ser aplicada a legislação inglesa, local em que foi realizado o ato de disposição de última vontade de Maria.

C. Estatutos: conjunto de regras com as quais um critério é relacionado. São a forma de utilizar o objeto com determinado elemento. Com os estatutos, podemos analisar a lei de outros países e identificar do que se tratam os seus artigos. Ao classificar, eu acho o estatuto, ao achar o estatuto eu tenho o objeto de conexão.

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1. Pessoal: são os elementos de conexão que se referem à situação da pessoa. Podem relacionar-se com:

a) Domicílio:

(1) Da pessoa: art. 7º;

(2) Do defunto: art. 10.

b) Nacionalidade: art. 10, §1º. Trata-se de elemento de conexão mais adotado. Sua adoção pode se dar por diferentes espécies: legal aquele fixado pela lei independentemente da vontade do sujeito – filho não emancipado; administrativo e voluntário.

c) Sucessório.

2. Real: tentativa de unificar toda a legislação concernente ao direito real.

a) Bens imóveis: os bens se regem pela chamada lex rei sitae que é o lugar de situação da coisa — art. 8º da LINDB.

b) Bens móveis: o critério do mobília sequuntur personam — os móveis seguem as pessoas – art. 8º, §§1o e 2o da LINDB.

3. Formal: tentar regulamentar toda a formalidade de um ato jurídico. Conforme sua natureza e seu conteúdo os efeitos dos atos jurídicos obedecem à lei do local de celebração ou de sua constituição (locus regit actum). Algumas legislações admitem a aplicação de outra legislação, quando mais favorável ao ato — art.9o, §1o LINDB.

4. Delitual: tentar regulamentar todas as obrigações decorrentes de atos ilícitos. Referem-se às obrigações extracontratuais. Normalmente adota-se o critério do lex loci do delito. Algumas legislações adotam não o lugar do consentimento, mas o local das consequências. No Brasil acabaram sendo incorporados ao art. 7o e 9o da LINDB juntamente com outros temas obrigacionais (contratos, etc.).

5. Volitivo: o Brasil não faz, mas muitos países se utilizam dela. É um estatuto que se refere estritamente a contratos. Para o objeto contrato, o elemento seria vontade, escolha! No Brasil, usamos o artigo 9º para esse elemento.

III. Lex causae — qual direito material a ser aplicado no caso específico? — {direito civil francês, direito empresarial alemão, direito de família espanhol}. O direito material poderá ser, dependendo do elemento de conexão, ou brasileiro {lex fori} ou estrangeiro {lex causae}. Se a matéria for sucessória com o direito brasileiro aplicado, a lei que procuraremos será o CCB /02, a doutrina, a jurisprudência. A aplicação de

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uma lei estrangeira só se dará no Brasil quando o próprio direito brasileiro definir sua competência para julgar o caso e, em consequência, sua lei interna definir a aplicação de um direito estrangeiro através da LINDB — o juiz, nesses casos, deverá aplicar o direito estrangeiro, sob pena de negativa de vigência do próprio Direito nacional.

A. Confirmação da qualificação provisória presente no DIPRI: Dolinger e art. 8º e 9º da LINDB - direito qualificará e regerá. Analisa se é mesmo matéria real, obrigacional…

B. Identificação do direito: esse direito estrangeiro é identificável.

1. Como provar o direito? Normalmente, em um processo, o que é provado é o fato e não o Direito. A nossa legislação e a nossa doutrina usam o sentido equivocado — não se trata de prova do Direito, mas de IDENTIFICAÇÃO do Direito {porque o Direito é mutável, e construído a cada dia}. Não tem como provar que o direito é de determinada forma: porque isso é fato. Se Direito fosse um fato, qualquer tipo de máquina poderia substituir um jurista — seria algo revelado que nunca mais se alteraria {como verdade}. Devemos identificar dentro do ordenamento jurídico específico, o que será utilizado, para que seja aplicado especificamente {“fazer uma petição juntando leis, jurisprudência/ precedentes, doutrina, direito consuetudinário”}.

Art. 14. LINDB Não conhecendo a lei estrangeira, poderá o juiz exigir de quem a invoca prova do texto e da vigência.

Art. 376. CPC A parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o juiz determinar.

Art. 378. CPC Ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade.

2. De um modo geral a doutrina se posiciona em relação ao ônus da prova:

a) Pela obrigatoriedade da aplicação do Direito estrangeiro (quando indicado pela norma de DIPRI);

b) Cooperação — Convenção Interamericana sobre informação do Direito Estrangeiro, 1979:

Art. 3o A cooperação internacional na matéria de que trata esta Convenção será prestada por qualquer dos meios de prova idôneos previstos tanto na lei do Estado requerente como na do Estado requerido.

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Serão considerados meios idôneos para os efeitos desta Convenção, entre outros, os seguintes: a) a prova documental, consistente em copias autenticadas de textos legais com indicação de sua vigência, ou precedentes judiciais; b) a prova pericial, consistente em pareceres de advogados ou de técnicos na matéria; c) as informações do Estado requerido sobre o texto, vigência, sentido e alcance legal do seu direito acerca de aspectos determinados.

c) Impossibilidade de o Juiz alegar desconhecimento para se negar a julgar:

(1) Jurisprudencia do STJ

Direito estrangeiro. Prova. Sendo caso de aplicação de direito estrangeiro, consoante as normas do Direito Internacional Privado, caberá ao Juiz fazê-lo, ainda de ofício. Não se poderá, entretanto, carregar à parte o ônus de trazer a prova de seu teor e vigência, salvo quando por ela invocado. Não sendo viável produzir-se essa prova, como não pode o litígio ficar sem solução, o Juiz aplicará o direito nacional. REsp 254544 / MG – J. 18/05/2000

(2) Regimento do STJ

Art. 142. Em caso de impugnação, ou por determinação do relator, as partes deverão provar a fidelidade da transcrição de textos de leis e demais atos do poder público, bem como a vigência e o teor de normas pertinentes à causa, quando emanarem de Estado estrangeiro, de organismo internacional, ou, no Brasil, de Estados e Municípios.

d) Dever de o juiz aplicá-lo de ofício - Código de Bustamante {Decreto n° 18.871/1929}:

Art. 408. Os juizes e tribunaes de cada Estado contractante applicarão de officio, quando fôr o caso, as leis dos demais, sem prejuízo dos meios probatórios a que este capitulo se refere.

Art. 409. A parte que invoque a applicação do direito de qualquer Estado contractante em um dos outros, ou della divirja, poderá justificar o texto legal, sua vigencia e sentido mediante certidão, devidamente legalizada, de dois advogados em exercicio no paiz de cuja legislação se trate.

Art. 410. Na falta de prova ou se, por qualquer motivo, o juiz ou o tribunal a julgar insufficiente, um ou outro poderá solicitar de officio pela via diplomática, antes de decidir, que o Estado, de cuja legislação se trate,

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forneça um relatório sobre o texto, vigencia e sentido do direito applicavel.

Art. 411. Cada Estado contractante se obriga a ministrar aos outros, no mais breve prazo possivel, a informação a que o artigo anterior se refere e que deverá proceder de seu mais alto tribunal, ou de qualquer de suas camaras ou secções, ou da procuradoria geral ou da Secretaria ou Ministerio da justiça.

C. Interpretação: a solução material depende do direito aplicado e como que ele se interpreta dentro do país. O que se aplica não é o CCB/02, mas o direito brasileiro sucessório {CCB /02, a doutrina, a jurisprudência}, por exemplo. A escola de Goldschmidt explica que devemos lidar com a aplicação do direito estrangeiro:

• Aplicação da Norma. A norma não seria sequer incorporada, sendo aplicada como originariamente, ou seja, como o sistema jurídico estrangeiro. O juiz vai na origem para saber com será aplicado o direito estrangeiro.

1. Adaptação – trata-se de forma de aplicação do direito estrangeiro de forma a adaptá-lo às circunstâncias locais. Segundo Dolinger trata-se de interpretação construtiva aproveitando instituições semelhantes. P.or ex. Divórcio não existia, homologa-se sentenças estrangeiras como desquite.

2. Jacob Dolinger afirmava que a lei estrangeira deve ser aplicada como lei, sendo aplicada de ofício, independentemente de alegação da parte. Além disso, dispõe o art. 5o da LINDB que essa interpretação deve levar em consideração o fim comum, ou seja, “na aplicação da norma jurídica estrangeira dever-se-á atender às finalidades que inspiraram o legislador estrangeiro”. (Dolinger, p.241).

Art. 5o Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

O Brasil segue a regra do Código de Bustamante {art. 409}, por isso que devemos provar o conteúdo da norma estrangeira {art. 14 LINDB e 376 CPC}, no sentido de que a norma estrangeira deve ser aplicada da maneira que lhe dá o país de origem, respeitando-lhe a interpretação doutrinária e jurisprudencial desse país.

D. Eficácia do Direito estrangeiro ao caso concreto: identificada a lex causae, nega a sua eficácia, ou a limita. Não temos apenas a função de identificar o seu conteúdo e suas regras de aplicação, mas também sua eficácia.

1. Ordem pública: na aplicação, pode ocorrer uma contradição tão grave, que ferirá a ordem pública. O que aconteceria quando se aplica essa ordem pública: quando se aplica o direito estrangeiro, caso ele apresente perigo para o ordenamento jurídico brasileiro, ocorrerá uma inconstitucionalidade - sendo

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assim, esse caso seria contraditório em relação a todo o sistema, e lhe será negada a produção de efeitos no território brasileiro. A ordem pública serve como uma exceção à produção de efeitos do direito estrangeiro. Para que o caso não fique sem resposta, será feita uma presunção de que a lex causae será a lex fori, ou seja, o direito aplicado ao caso seria o brasileiro. A consequência da não aplicação é a adaptação. Aplicar a ordem pública e negar todos os efeitos pode ferir, por si mesmo, a ordem pública.

Art. 17. As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.

a) Características:

(1) Relatividade/Instabilidade.

(2) Contemporiedade.

(a) É conceito relativo e instável, variando no tempo e espaço.

(3) Exemplo: Antes da lei do divórcio - Lei 6515/1977 -, não se homologavam sentenças estrangeiras de divórcio. A partir da edição da lei admitiu-se a homologação para os casos anteriores.

b) Instituição desconhecida:

(1) Instituto jurídico totalmente desconhecido pela Lex causae. (a) Exemplos: a poligamia e a morte civil.

Atualmente podem ser confundidas com a noção de ordem pública. (b) Solução: utilização de instituição análoga da Lex causae de forma

adaptada: repúdio muçulmano como divórcio.

(2) Também pode ser utilizada em casos em que se dá efeitos a hipóteses que seriam vedadas pela ordem pública. (a) Exemplo: reconhecimento de uniões estáveis em casos de poligamia.

c) Exemplo: Mohamed, filho concebido fora do matrimônio, requereu, na justiça brasileira, pensão alimentícia do pai, Said, residente e domiciliado no Brasil. Said negou o requerido e não reconheceu Mohamed como filho, alegando que, perante a Tunísia, país no qual ambos nasceram, somente são reconhecidos como filhos os concebidos no curso do matrimônio.

(1) Jurisdição brasileira (2) Qualifica-se a relação como obrigacional então terá que ser aplicado o

direito da Tunisia

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(3) O problema de eficácia se encontra na ordem publica: se aplica o direito estrangeiro, mas se nega a eficácia NA PARTE CONTRADITÓRIA AO SISTEMA.

2. Fraude à lei: é um exercício abusivo de Direito.

a) Característica: Alteração, artificial, do elemento de conexão para burlar a aplicação de norma imperativa e cogente.

b) Efeito: desconsideração local de seus efeitos.

c) Exemplos: divórcio no exterior quando prática proibida internamente; mudança de domicílio; naturalização, escolha de foro sem relação com o contrato; constituição de sociedade em paraíso fiscal {evasão fiscal}.

3. Questão prévia {a rigor, estaria no objeto de conexão + elemento de conexão, mas inserimos aqui em função da doutrina brasileira}: o caso seria classificado entre normas acessórias e principais — essa questão previa seria a questão prejudicial para analisar a validade do contrato, a capacidade das partes, por exemplo. Sendo assim, a lex causae será harmonizada. Entretanto, o sistema brasileiro se utiliza da dépeçage {cada questão tem o seu direito}. Na questão principal, se altera a qualificação, garantindo ao final a harmonização da lex fori com a lex causae — pega a questão principal e harmoniza. O problema disso é que a qualificação é alterada pois faz de conta que a natureza da questão é a natureza da principal. Isso é uma tentativa de evitar as criticas das teorias na qualificação. “Para reger e qualificar” essa premissa no Brasil afasta a possibilidade de aplicação da questão prévia. Nos outros países que se utilizam desse instituto, é necessário analisar a norma principal e a acessória para que possa ser escolhido o direito aplicável.

a) Conceito: É a chamada questão prejudicial. O juiz não poderá julgar a questão principal sem antes resolver outra.

b) Exemplo: sucessão que depende da verificação anterior da existência de filiação (Dolinger e Rechsteiner).

c) Requisitos: (1) indicação de legislação estrangeira para dirimir a questão principal; (2) questão lateral da qual dependa a solução da principal; (3) direito aplicável à questão lateral é distinto daquele previsto para a

solução da questão principal; (4) a regra do foro para solução da questão prévia é diferente daquela que

seria aplicável pela questão principal.

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d) Soluções: (1) Solução 1: aplicar o mesmo Direito aplicável para a questão principal,

garantindo-se harmonia na solução. (2) Solução 2: a questão prévia deve ter Direito aplicável determinado assim

como o foi a da questão principal, garantindo harmonia da lex fori.

4. Reenvio {a rigor, estaria no objeto de conexão + elemento de conexão, mas inserimos aqui em função da doutrina brasileira}: alguns sistemas fazem reenvio, tal como Portugal. Mas o Brasil não o faz. O objetivo do DIPRI é alcançar o direito material e não alcançar a norma conflitual. A segunda etapa sempre indica a terceira e não a segunda. No Brasil, separamos as normas conflituais das normas materiais. Nos países que aplicam o reenvio, a segunda e a terceira etapa estão sempre previstas na mesma lei — sendo assim, a primeira etapa é um passo para DIPRI. Em Portugal é muito comum chegar, de uma norma indicativa, a outra norma indicativa. No Brasil, norma conflitual deve ser o caminho para atingir uma norma material. O reenvio, para o Brasil, serve para analisar se o caminho está certo {se realmente passou de uma norma conflitual para outra material}. Sabemos que fizemos certo quando saímos do item dois, com a norma indireta {que indica, procure tal norma} e chegamos ao item três, com uma norma direta {de mérito, faça isso}. O reenvio é: uma norma de DIPRI indicar outra norma de DIPRI, se utilizar de duas normas indicativas — no Brasil não pode. Reenvio pode ser de primeiro grau {Portugal INDICAR uma regra no sentido de “em caso de X, vá para a lei portuguesa Y”} ou então de segundo grau {Portugal INDICAR uma regra no sentido de “em caso de A, vá para a lei francesa B”}. No fim, esse reenvio somente reforça as leis de DIPRI. A lei conflitual brasileira é sempre lex fori porque não usamos a lex causae como norma conflitual {sempre será o direito brasileiro}.

a) No direito internacional privado entre os países A e B, configura-se hipótese de reenvio de primeiro grau quando o DIP do país A indica o direito do país B ou o direito do país A como o aplicável, e o DIP do país B, sob o seu ponto de vista, indica o direito do país B ou o direito do país A como o aplicável.

b) Partindo de uma norma de DIPRI {indireta}, nunca pegue outra norma de DIPRI {indireta}, mas de direito material {norma direta}!

Art. 16. Quando, nos termos dos artigos precedentes, se houver de aplicar a lei estrangeira, ter-se-á em vista a disposição desta, sem considerar-se qualquer remissão por ela feita a outra lei.

5. Norma mais benéfica: intuito protetivo, para dar proteção a vulneráveis. E isso se apresenta como uma exceção à eficácia do direito estrangeiro. Analisa a lei estrangeira supostamente aplicável em comparação com a lei brasileira, sendo assim, a mais benéfica {conforme LEI}, será aplicada.

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Page 28: Direito Internacional Privado 1 · 2019-01-17 · Naomi Sugita Reis Strenger e Rechsteiner entendem que o principal objetivo do Direito Internacional Privado é a determinação da

Naomi Sugita Reis

a) Exemplo:

Art. 10. A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens. § 1o A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus.

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