Direito, política, autoritarismo e democracia no Brasil: da Revolução de 30 à promulgação da Constituição da República de 1988

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    Araucaria. Revista Iberoamericana de Filosofa, Poltica y Humanidades, ao 13, n 26. Segundo semestre de2011. Pp. 146169.

    Direito, poltica, autoritarismo e democraciano Brasil: da Revoluo de 30 promulgaoda Constituio da Repblica de 1988

    Cristiano PaixoUniversidade de Braslia (Brasil)

    Resumo

    A histria poltica e jurdica do Brasil marcada pela alternncia entremodelos de constituio que refletem, em sua concretude, experincias auto-ritrias e democrticas. No presente artigo so descritos, com maior ateno,os perodos compreendidos entre 1930 e 1945 e entre 1964 e 1988. A histriaconstitucional apresentada a partir de uma determinada chave de leitura, a

    saber, a relao entre direito e poltica. So descritos e abordados os aspectosautoritrios da experincia poltica posterior Revoluo de 30, especialmentedurante o Estado Novo. Posteriormente, o artigo trata do regime militar brasi-leiro (1964-1985) sob uma perspectiva conceitual, com o objetivo de ressaltaros projetos de transio e constituio que estavam em disputa. As reflexesconclusivas propem uma avaliao dos riscos e perspectivas para o consti-tucionalismo brasileiro contemporneo, a partir da experincia constituinte de1987-1988.

    Palavras-chave: Histria constitucional; Regimes autoritrios; Conceitos

    de constituio; constitucionalismo democrtico.

    Abstract

    There were authoritarian and democratic constitutions in Brazilian politicand legal history. The focus of this essay will be on 1930-1945 and 1964-1988periods. Constitutional history is here produced emphasizing the relationshipbetween politics and law. The authoritarian experience post-1930 is stressed,particularly on the 1937-1945 years. In the following section, the essay intends

    to analyze the military dictatorship in Brazil (1964-1985) under a conceptualpoint of view. The conflicting projects at that time on the constitution andthe political transition are emphasized. In the conclusive remarks, the essayintends to demonstrate some risks and challenges for contemporary constitutio-nalism, especially under the 1987-1988 constitution-making process.

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    Keywords: Constitutional history; Authoritarian regimes; Constitution

    concepts; Democratic constitutionalism.

    1. Introduo

    Pode-se dizer que o Brasil, em pouco mais de cem anos de Repblica, pos-sui uma histria poltica, jurdica e constitucional permeada de alteraes deregime, transies, rupturas e permanncias. Alguns personagens se destacam,determinadas datas so particularmente significativas, certos eventos parecemadquirir uma relevncia decisiva. Porm, para o observador desse perodo, o

    que fica a complexidade das transformaes, a capacidade de manuteno, noregime novo, de componentes da ordem anterior e, acima de tudo, a impossibi-lidade de explicaes monocausais.

    Essa uma concluso, alis, que se aplica histria do Brasil desde a in-dependncia. Num percurso radicalmente diverso das ex-colnias espanholasna Amrica, o Brasil mantm-se com suas fronteiras praticamente inalteradasaps a separao em relao metrpole e, o que mais significativo, optapela manuteno da monarquia como forma de governo. Vrias razes, que se

    combinam, teriam contribudo para esse quadro, que gerou, como no poderiadeixar de ser, um extenso debate na historiografia brasileira1.Nos limites do presente artigo, no poderemos nos deter em cada uma das

    controvrsias acerca da formao do Brasil contemporneo. Nosso objetivo outro: compreender os perodos centrais enfocados no texto (1930-1945 e1964-1988) numa perspectiva mais abrangente. Em outras palavras: a anliseda experincia jurdica desses dois marcos temporais ter de pressupor, aindaque de modo breve, uma reconstruo histrica ampla, que se projete para almdos perodos determinados.

    E, para que essa narrativa seja coerente, algumas chaves de leitura serodeterminantes para a observao histrica: (i) as modificaes no regime po-ltico brasileiro ensejam processos de elaborao constitucional (constitution-making processes); (ii) a compreenso da vigncia do direito depende de umaadequada compreenso dessas transformaes constitucionais; (iii) essenciala observao da relao entre direito e poltica em cada uma das fases dosregimes estudados; (iv) a dinmica dos regimes bastante varivel, inclusiveem relao efetividade dos textos constitucionais, o que torna impossvel e

    desnecessrio eventual intento de extrair, da narrativa a ser construda, prin-cpios gerais aplicveis histria do direito brasileiro.

    Consideradas tais premissas, o artigo ser estruturado da seguinte forma:uma primeira parte dedicada ao perodo compreendido entre 1930 e 1945, desde

    1 Para uma adequada compreenso do perodo, e dos termos do debate, cf. Jos Murilo de Carvalho(2006, p. 13-91).

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    o declnio da Repblica Velha at o fim do Estado Novo; uma segunda parte

    voltada ao perodo situado entre 1964 e 1988, ou seja, a partir do golpe militarat a promulgao da Constituio da Repblica de 5 de outubro de 1988; eas consideraes finais, que tero o objetivo de propor uma reflexo acerca daexperincia jurdica contempornea, ou, em outras palavras, sobre o futuro da

    Constituio.

    2. Modernizao autoritria: da Revoluo de 30 ao EstadoNovo

    Uma gama de fatores internos e externos precipitou o fim da RepblicaVelha, num processo decisivo para a formao do povo e do Estado brasileiros.Aps a promulgao da Repblica em 1889, a aprovao e entrada em vigorda Constituio de 1891 (de orientao liberal e fortemente influenciada pelaexperincia federal norte-americana) e um incio poltico conturbado, com doispresidentes militares que enfrentaram rebelies e tentativas de golpe, houveuma certa estabilizao do regime, com a chamada poltica dos governadorese a prtica do coronelismo. Em rpida sntese, a Repblica Velha era coman-

    dada, nos centros urbanos, por setores oligrquicos (especialmente oriundos deSo Paulo e Minas Gerais), enquanto no interior do pas (a grande maioria dapopulao vivia no campo) a liderana dos coronis, que eram senhores po-lticos locais, impedia a participao expressiva dos cidados na poltica. Sejapor meio de fraudes eleitorais, que eram comuns, seja pelo elevado nmero deexigncias para que algum pudesse votar (critrios de renda, propriedade e al-fabetizao eram restritivos e usualmente praticados), os cargos polticos eramocupados, em sua grande maioria, por setores oligrquicos, o que perdurou, nosem vrias conturbaes trazidas por revoltas e greves, at 19302.

    Havia fatores externos decisivos: a crise de 1929, com a quebra da Bolsade Nova Iorque, afetou diretamente a economia brasileira, inteiramente depen-dente do modelo agrrio-exportador. Aumentou o desemprego e as presses desetores do mundo do trabalho atingidos pela crise se intensificaram. E tambmpodemos falar de fatores internos: a sucesso de revoltas por jovens tenentes doExrcito, ao longo da dcada de 1920, a crescente insatisfao de setores oligr-quicos afastados do centro de deciso poltico, o surgimento de um proletariadourbano, o constante recurso ao estado de stio durante a Repblica Velha3.

    A combinao entre esses fatores ensejou a Revoluo de 1930. Para efei-tos meramente didticos e descritivos, podemos dividir o perodo compreen-dido entre 1930 e 1945 em dois grandes grupos. O primeiro deles, intitulado

    2 Ver, para uma ampla descrio desses elementos conformadores da Repblica Velha, as obrasorganizadas por Boris Fausto (2006a e 2006b) e Jorge Ferreira e Lucilia Neves Delgado (2010).

    3 Para uma sntese adequada, cf. a obra de Adriana Lopez e Carlos Guilherme Mota (2008, p. 619-635).

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    Repblica Nova, vai de 1930 a 1937, e se ramifica em dois subgrupos: o

    Governo Provisrio, de 1930 a 1934, e o Governo Constitucional, de 1934 a1937. O segundo lapso de tempo, o Estado Novo, vai de 1937 a 1945. Em cadaum desses perodos, teremos uma inflexo diferente quanto relao entre di-reito e poltica.

    A Revoluo de 1930, conduzida por um grupo poltico diversificado emultifacetrio, demorou a se institucionalizar. A figura principal de todo esseprocesso e de toda a primeira metade do sculo XX foi Getlio Vargas, ga-cho da cidade fronteiria de So Borja, ex-Ministro da Fazenda do ltimo go-verno da Repblica Velha e ex-Presidente da Provncia do Rio Grande do Sul.

    Com inegvel talento para compreender as demandas de grupos to diversifi-cados (que incluam comunistas, integralistas, militares e uma pequena parcelada oligarquia), Vargas soube conservar um precrio equilbrio entre as forasque o apoiavam. Com isso, manteve-se no poder por quinze anos, sempre alter-nando, ao sabor da poltica, as afinidades ideolgicas: ao mesmo tempo em quepromovia reformas econmicas e sociais que agradavam ao proletariado e aocampesinato, afastava-se dos setores mais esquerda que estiveram originaria-mente ao seu lado na Revoluo. Impulsionava a concesso de direitos sociais,

    mas mantinha os sindicatos sob rgido controle4

    .Essas so apenas algumas das ambiguidades constitutivas da personalida-de e do estilo de Vargas. No seria diferente em relao ordem constitucional.

    Aps mais de trs anos de governo provisrio, com vrias intervenesnas unidades da Federao e um duro conflito militar com foras do Estado deSo Paulo (que se rebelou contra o governo federal), finalmente foram inicia-dos, em novembro de 1933, os trabalhos da Assemblia Constituinte. Tomandopor base o anteprojeto elaborado por um grupo de juristas indicados pelo go-verno, a Assemblia produziu a nova Constituio brasileira, promulgada em16 de julho de 1934.

    A Carta de 1934 inovadora em vrios aspectos. Sob forte influncia dasconstituies do Mxico (1917), da Alemanha (1919) e da Espanha (1931), aConstituio de 1934, ao prever uma srie de direitos na esfera econmica esocial e, ao mesmo tempo, manter o rol de direitos individuais, de naturezaliberal, insere-se no paradigma do Estado Social de Direito, de que exemploa Constituio de Weimar, que parece ter sido a principal inspirao. Ela repre-senta, portanto, uma faceta da modernizao da sociedade brasileira, aps o fim

    da Repblica Velha5.4 A estrutura sindical criada e aperfeioada entre 1930 e 1945 estava baseada na unicidade de

    representao (proibio de mais de uma entidade representativa da mesma categoria), na autorizaodo Estado para funcionamento do sindicato, por meio do Ministrio do Trabalho e no chamadoimposto sindical, que era uma contribuio compulsria paga por todos os trabalhadores. Para umaexcelente sntese dessa estrutura, ver Ricardo Loureno Filho (2011, p. 21-54).

    5 Acerca da Constituio de 1934, cf. as reflexes de Carlos Guilherme Mota (2010, p. 34-53) eRaul Machado Horta (1995, p. 34-35 e 58-59).

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    Ocorre, contudo, que a Constituio de 1934 teve uma vida breve e

    atribulada. As fortes divergncias na poltica interna e o crescente sentimen-to anticomunista tornavam instvel a persistncia de uma ordem constitucio-nal democrtica, baseada na tripartio de poderes. Mesmo antes do golpe deEstado de 1937, Getlio Vargas utilizou os arts. 161 e 175 da Constituiopara decretar o estado de stio e de guerra, suprimir garantias individuais eordenar a deteno de congressistas6.

    Uma tentativa de revoluo comunista foi desencadeada em novembro de1935, comandada por Luis Carlos Prestes, representante do tenentismo e ldercomunista. Levantes militares ocorreram em Natal, Recife e no Rio de Janeiro.

    A revolta foi rapidamente debelada, e o governo de Vargas reprimiu duramenteos lderes do movimento e seus manifestantes.

    Em setembro de 1937, foi descoberto e divulgado o contedo de umsuposto plano para instalao do comunismo no Brasil: o chamado PlanoCohen. Getlio ento decreta estado de guerra, suspende garantias constitucio-nais e desfecha, em novembro de 1937, um golpe de estado. Decreta o fecha-mento do Poder Legislativo, suspende as eleies presidenciais (que estavamprevistas para ocorrer em janeiro de 1938) e outorga uma nova Constituio.

    A Carta de 1937, apelidada como polaca, em face da influncia da cons-tituio polonesa redigida aps a ocupao nazista, fortemente centralizadorae concentra poderes nas mos do presidente da repblica. De toda forma, elasequer entrou em vigor, num sentido prprio do termo. Entre 1937 e 1945,Getlio Vargas governou sem nenhum tipo de controle ou superviso institu-cional. Foi uma ditadura aberta. No havia poder legislativo e as decises do

    judicirio eram frequentemente descumpridas. O presidente legislava por meiode decretos-leis. Foram fechados os partidos polticos e queimadas bandeirasdos estados em praa pblica7.

    Nesse estgio, encerra-se o primeiro ciclo da Revoluo de 1930. Apso Governo Provisrio (1930-1934) e o Governo Constitucional (1934-1937),estava constitudo o Estado Novo brasileiro.

    A partir de uma perspectiva histrica, como poderamos descrever essegrande perodo, entre 1930 e 1945, que representou uma profunda mudana nasociedade brasileira?

    Em primeiro lugar, importante registrar que as duas constituies pro-duzidas nesse intervalo de tempo tiveram problemas srios de efetividade. Em

    face da instabilidade do quadro poltico (interno e externo), o governo recorreuem diversas oportunidades (de modo formal ou informal) decretao de es-tados de exceo. Observe-se, alis, que essa era uma prtica bastante usual na

    6 Ver a profunda anlise empreendida por Raphael Peixoto de Paula Marques (2011, p. 22-95).7 Ver, quanto Constituio de 1937, Carlos Guilherme Mota (2010, p. 53-62) e Raul Machado

    Horta (1995, p. 34-35 e 59-60).

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    Repblica Velha8. Nos anos de 1930, a dinmica regra-exceo continuaria a

    ser ativada sempre que o governo (ou setores militares) detectassem algumaperspectiva de ameaa ordem poltica existente. No perodo anterior a no-vembro de 1937, eram comuns a censura poltica, o desrespeito s prerrogati-vas do Parlamento e a perseguio de opositores. Portanto, no cabe qualificarcomo democrticos os anos 1930-1937, para eventualmente diferenci-losdo autoritarismo de 1937-1945. Em toda a extenso de tempo, predomina-ram prticas autoritrias. Evidentemente, esse autoritarismo tomou, a partir doEstado Novo, uma forma mais organizada e institucionalizada, mas seria umexcesso qualificar o perodo anterior a ele como democrtico.

    Em segundo lugar, importante frisar que a democracia no era uma aspi-rao de muitos movimentos da poca, mesmo os de oposio. Como se sabe,a dcada de 1930 marcou a ascenso ao poder de vrios regimes autoritrios aAlemanha de Hitler, a Itlia de Mussolini, a Espanha de Franco, o Portugal deSalazar, alm do aprofundamento do stalinismo na ex-Unio Sovitica. Mesmono pensamento poltico e econmico daquele tempo no Brasil, a democracia,quando invocada, muitas vezes no era associada liberdade ou igualdade.Para tericos influentes como Francisco Campos (Ministro da Justia e autor

    do texto da Constituio de 1937), democracia significava um governo forte,um Estado profissionalizado, uma burocracia tcnica, enfim, no haveria con-tradio entre um governo democrtico nesta acepo e uma modernizaoautoritria que era o principal objetivo. Seria necessrio esperar o desfechoda segunda guerra mundial para que ficasse clara, no horizonte da poltica e dodireito, a importncia da democracia9.

    Em terceiro lugar, importante ressaltar a presena de prticas autorit-rias que retornariam, com razovel semelhana, no regime militar que seriadesencadeado em 1964. A tortura era sistematicamente utilizada como formade obteno de informao, especialmente quanto aos comunistas. Foi cria-do um Departamento de Imprensa e Propaganda, com o intuito de proceder censura dos meios de comunicao e permitir ao governo um extenso domniodas transmisses radiofnicas, que eram o principal veculo de mdia da po-ca. Havia uma forte propaganda nacionalista, com manifestaes culturais de

    8 Os presidentes da Primeira Repblica sempre recorriam ao estado de stio (ou a suspensesseletivas de direitos civis) em caso de sedio interna, revoltas no interior ou inquietao na caserna.Um bom exemplo o mandato do Presidente Rodrigues Alves, que em praticamente todo o seugoverno (1922-1926) manteve o estado de stio. Cf., para maiores informaes, as snteses propiciadasna obra de Adriana Lopez e Carlos Guilherme Mota (2008, p. 554-591) e no livro organizado porBoris Fausto (2006b, p. 432-455).

    9 Cf., sobre Campos, as incisivas anlises de Airton Seelaender e Alexander Castro (2010, p. 255-291), Helena Bomeny (2010, p. 263-315) e Rogrio Dultra dos Santos (2007, p. 281-323). Ver, ainda,obra central do prprio Francisco Campos (2001, esp. p. 71-106).

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    massa. O Poder Executivo se hipertrofiou, com uma enorme inflao legislativa

    totalmente concentrada nafi

    gura do Presidente da Repblica

    10

    .Em quarto lugar, houve a institucionalizao da exceo. Foi criado, em1935, o Tribunal de Segurana Nacional (TSN). Tratava-se de um rgo ex-terno estrutura do Poder Judicirio, dotado de atribuio para decidir sobrea prtica de crimes polticos. Muitos dos opositores do regime (antes e depoisda decretao do Estado Novo) foram julgados pelo TSN, que frequentementedeixava de observar as garantias individuais mnimas (aplicveis a qualquerlitigante) e utilizava parmetros de culpabilidade muito mais flexveis do queaqueles exigidos pelo sistema judicial11.

    Em quinto lugar: mesmo com todo o contexto contrrio defesa de direi-tos humanos e das garantias constitucionais, houve um personagem que em-preendeu uma importante resistncia aos atos arbitrrios praticados pela polciapoltica de Vargas. O advogado Herclito Fontoura Sobral Pinto no parecia,a princpio, destinado a este papel histrico relevante. Fortemente catlico, li-gado ala mais tradicionalista da Igreja, Sobral Pinto acabou por se tornar de-fensor dos principais lderes do levante comunista de 1935, tendo que superar,inclusive, a resistncia de seu principal cliente, Luis Carlos Prestes, que inicial-

    mente rejeitou a possibilidade de ser defendido por Sobral Pinto. Durante todoo cativeiro de Prestes, Sobral lutou por seus direitos. O advogado ainda seriaconhecido por outro episdio: a denncia e repdio s sucessivas torturas quevinham sendo cometidas contra outro preso poltico, Harry Berger. Na verdade,o prisioneiro se chamava Arthur Ewert. Era alemo de nascimento, integrantedo Komintern e veio ao Brasil para desencadear, com Prestes, a revoluo co-munista. Aps sua priso, Berger/Ewert foi severamente torturado pelo chefeda polcia poltica de Vargas, Filinto Mller. Em vrias oportunidades, SobralPinto denunciou a tortura e os maus-tratos a que Berger era submetido. Numade suas peties dirigidas ao Tribunal de Segurana Nacional, utilizou um re-curso extremo: requereu a aplicao, a Berger, de dispositivo da legislao deproteo dos animais, tendo, inclusive, invocado um precedente judicial.

    A alegao de Sobral merece ser aqui transcrita:

    A roupa que traz, cala e palet sobre a pele , ele no a muda desdemeses. Nela j no existe mais uma s supercie disponvel onde sepossam fxar novas sujeiras. A vista s deste vesturio, se que tais

    andrajos podem ser assim qualifcados , provoca nuseas incoercveis.Tal , Sr. Juiz, a priso que destinaram para Harry Berger. Tal , emi-nente Magistrado, o tratamento que lhe vem sendo dispensado.

    10 Ver Carlos Guilherme Mota (2010, p. 57-65).11 Cf. Raphael Peixoto de Paula Marques (2011, p. 136-164).

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    Semelhante desumanidade precisa de cessar, e de cessar imediatamente,sob pena de deslustre para o prestgio deste Tribunal de Segurana, que,para bem cumprir a sua rdua tarea necessita de pautar a sua ao pelasnormas inexveis da serenidade e da justia.Tanto mais obrigatoriamente inadivel se torna a interveno urgents-sima de V. Exa., Sr. Juiz, quanto somos um povo que no tolera a cruel-dade, nem mesmo para com os irracionais, como o demonstra o decreton 24.645, de 10 de julho de 1934, cujo artigo 1 dispe: Todos osanimais existentes no pas so tutelados do Estado.Para tornar efciente tal tutela, esse mesmo decreto estatui: Aquele

    que, em lugar pblico ou privado, aplicar ou fzer aplicar maus tratosaos animais, incorrer em multa de 20$000 a 500$000 e na pena depriso celular de 2 a 15 dias, quer o delinqente seja ou no o respectivoproprietrio, sem prejuzo da ao civil que possa caber (art. 2).E, para que ningum possa invocar o benecio da ignorncia nessa ma-tria, o art. 3 do decreto supra mencionado defne: Consideram-semaus tratos: ........; II Manter animais em lugares anti-higinicos ouque lhes impeam a respirao, o movimento ou o descanso, os privemde ar ou luz.

    Baseado nesta legislao um dos juzes de Curitiba, Estado do Paran,Dr. Antnio Leopoldo dos Santos, condenou Joo Mansur Karan penade 17 dias de priso celular, e multa de 520$000, por ter morto apancadas um cavalo de sua propriedade (doc. junto).Ora, num pas que se rege por uma tal legislao, que os Magistradostimbram em aplicar, para, deste modo, resguardarem os prprios ani-mais irracionais dos maus tratos at de seus donos, no possvel queHarry Berger permanea, como at agora, meses e meses a fo, com a

    anuncia do Tribunal de Segurana Nacional, dentro de um socavo deescada, privado de ar, de luz e de espao, envolto, alm do mais, emandrajos, que, pela sua imundcie, os prprios mendigos recusariam avestir12

    Alm de representar um marco que se tornou histrico na defesa dedireitos fundamentais numa situao extrema, o recurso de Sobral Pinto lei deproteo dos animais revela, antes de tudo, a brutalidade de um regime autori-trio que permitiu prticas efetivamente extremas de tortura, sem nenhum tipo

    de controle, por um extenso lapso de tempo (entre 1937 e 1945), e que marcou,de forma indelvel, o imaginrio e a histria poltica do Brasil.

    O perodo compreendido entre 1930 e 1945 foi de extrema acelerao dotempo histrico modernizao, urbanizao, industrializao. Com o fim da Re-pblica Velha, e a necessidade de substituir o arcaico modelo agrrio-exportador,

    12 Cf. Sobral Pinto (1979, p. 74-75).

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    o Brasil precisava escolher um modelo de modernizao. E esse modelo, que

    se insere com facilidade nas opes disponveis poca, caminhou para umacentralizao poltica aliada formao de uma burocracia estatal. Como nohavia uma sociedade civil fortalecida no Brasil, e como os movimentos sociaisde protesto (como os tenentes e o incipiente proletariado) eram pouco nume-rosos e no tinham grande capacidade de influncia, essa transformao noocorreu sob o signo de uma maior participao dos cidados na vida polticanacional. Houve, claro, incluso, caracterizada pela concesso de direitos liga-dos ao mundo do trabalho e previdncia social; mas no se materializou umaesfera pblica livre e ativa. Muito pelo contrrio: a imprensa era regularmente

    censurada e a cultura era tutelada pelo Estado13.A grande ausente era, portanto, a democracia. O que ocorreu no Brasil, nos

    anos 1930-1945, foi uma modernizao autoritria com alguns toques populis-tas, como atesta a grande receptividade de Getlio Vargas, intitulado o pai dospobres, entre as camadas mais humildes da populao.

    Com o fim do Estado Novo em 1945 e a promulgao da Constituiode 1946, houve um retorno (bastante acidentado) s prticas democrticas noplano poltico, mas o processo de modernizao prosseguiu nas bases anterior-

    mente fundadas. Houve um interregno entre 1945-1964, no qual se operou umaalternncia de partidos e lderes polticos no poder. Ocorreram, neste perodo,o suicdio de um presidente em pleno mandato (Getlio Vargas em 1954), a in-esperada renncia de um presidente eleito com grande votao (Jnio Quadrosem 1961) e uma experincia parlamentarista que era, na verdade, uma condioimposta por setores conservadores da sociedade para a posse, na Presidncia daRepblica, do vice-presidente eleito. O nico presidente civil que concluiu seumandato no perodo compreendido entre 1945-1964, Juscelino Kubitschek deOliveira, precisou de apoio de setores das Foras Armadas para tomar posse e,durante seu governo, enfrentou duas tentativas de golpe14.

    E, como se sabe, aps um gradativo processo de enfraquecimento do Pre-sidente Joo Goulart e das foras que com ele se alinhavam, movimento esseliderado por setores das Foras Armadas, polticos opositores ao regime e poruma expressiva parcela da classe mdia urbana, concretizou-se, em 31 de mar-o de 1964, um golpe militar contra o Presidente Goulart, que se exilou noUruguai aps o Presidente da Cmara dos Deputados haver declarado a vacn-cia do cargo de Presidente da Repblica (ainda com Goulart em territrio na-

    cional). Um marechal (Carlos Castelo Branco) foi alado Presidncia por um

    13 Acerca dessas ambiguidades do Estado Novo (e de todo o perodo compreendido entre 1930 e1945), ver a anlise de Carlos Guilherme Mota (2010, p. 53-62).

    14 Ver Carlos Guilherme Mota (2010, p. 72-73) e Boris Fausto (2007, p. 323-339). Para uma anlisede importantes crises do perodo 1946-1964, ver Jorge Ferreira (2010, p. 301-342).

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    Araucaria. Revista Iberoamericana de Filosofa, Poltica y Humanidades, ao 13, n 26. Segundo semestre de2011. Pp. 146169.

    comando supremo da Revoluo. No houve resistncia armada, tampouco

    mobilizao signifi

    cativa da sociedade civil

    15

    .O Brasil ingressava em um novo perodo autoritrio.

    3. Ditadura militar e seus desdobramentos: rumo democracia e a um novo constitucionalismo

    A construo de uma narrativa coerente sobre a histria do direito brasi-leiro, do regime autoritrio iniciado em 1964 at a elaborao da Constituiode 1988, hoje em vigor, exigir uma abordagem que tenha como pressuposto arelao entre poltica e direito.

    Da a importncia, num horizonte que aponta para o futuro, da recons-truo histrica dos debates que caracterizaram a lenta passagem da ditadu-ra militar democracia constitucional hoje vigente. A observao do perodocompreendido entre o final da dcada de 1960 e a promulgao da Constituioda Repblica de 5 de outubro de 1988 extremamente rica e promissora. Aliforam definidos os rumos que o Brasil tomaria aps o exaurimento do governodos generais. E, alm disso, surgiram os movimentos em prol da anistia e das

    eleies diretas. Ambas as demandas, que tiveram desdobramentos e resultadosdistintos, marcaram a experincia social brasileira e foram cruciais para o pro-cesso de elaborao da Constituio.

    A Assembleia Nacional Constituinte teve sua atividade limitada ao pe-rodo inserido entre os dias 1 de fevereiro de 1987 e 5 de outubro de 1988.Nesse lapso de tempo, entretanto, operou-se apenas a traduo institucionalde um movimento de ruptura e mudana que se iniciara muito antes. Pode-sedizer, ento, que, sob o signo da promulgao da Constituio, movimentam-sevrios tempos:

    (1) o ciclo de arbtrio do regime militar, que destruiu a ordem consti-tucional at ento vigente e estabeleceu um ordenamento baseado emmaniestaes de ora, como atos institucionais, atos complementarese perodos de proibio da atividade legislativa, com o echamento doCongresso Nacional, numa sucesso de decises autocrticas tomadase executadas inteiramente margem dos procedimentos usuais de mu-dana constitucional (1964-1985);

    (2) a resistncia a esse regime, que se desdobrou em muitas aes eeventos, mas que pode ter sua origem detectada nas primeiras mani-estaes de partidos polticos e lideranas na clandestinidade, em fnsda dcada de 1960, em prol de uma nova constituio, e que teve umantida acelerao entre 1976 e 1980, com a ecloso de reivindicaes

    15 Cf. Carlos Fico (2004, p. 13-67).

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    e greves em parques industriais localizados em centros urbanos e em1983-1984, com o movimento das Diretas J;(3) os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte, desde a sua con-vocao, iniciada em 1985, at a promulgao da Carta, em 5 de outu-bro de 1988; e(4) a construo da nova ordem constitucional, numa perspectiva queliga os trabalhos constituintes (1987-1988) ao presente e ao uturo daConstituio, por intermdio da modifcao, reconstruo e inclusode direitos, que a marca do constitucionalismo contemporneo.

    A partir da observao dessas quatro sries temporais suas regularida-des, desencontros, correlaes e possibilidades dever surgir um panoramaapto a permitir a observao da experincia histrica do direito brasileiro, des-de a deflagrao do movimento militar at a atualidade.

    J em fins dos anos de 1960, era possvel perceber as reivindicaes, pe-los setores de oposio, relativas interrupo do regime autoritrio, retornodas instituies normalidade e vigncia de uma constituio democrtica16.Trata-se de um processo poltico complexo, com inmeras variveis e chaves

    interpretativas, que no pode ser explorado, em sua integralidade, no espao deuma comunicao ou artigo. Porm, possvel e mesmo recomendvel es-tabelecer alguns parmetros para a compreenso do contexto social, poltico e

    jurdico anterior ao incio dos trabalhos da Constituinte de 1987-1988.Um caminho interessante para essa reconstruo envolve o conceito de

    constituio. importante, contudo, ressaltar que esse conceito (como qual-quer outra definio importante para a observao do direito moderno) nodeve ser compreendido apenas como um artefato intelectual, uma construoterica que permitiria, por sua prpria abstrao, um melhor conhecimento daexperincia constitucional. Na verdade, o conceito de constituio pressupe,durante a sua enunciao como conceito, uma prtica poltica que se traduz emideias, discursos e aes. O conceito no precede ou informa a atuao poltica.Ele pressuposto e construdo por essa mesma prtica17.

    Portanto, para a compreenso da gradativa enunciao e transformao do conceito de constituio, pode-se recorrer arqueologia das prticas dis-cursivas associadas ideia de constituio. Por meio de fragmentos de pro-nunciamentos de alguns atores polticos, poder surgir um fio condutor para

    a narrativa da mudana constitucional que se realizou na passagem do regimeditatorial de 1964-1985 ao constitucionalismo democrtico fundado na Assem-bleia de 1987-1988.

    16 Ver, em relao a esse tema, Paixo e Barbosa (2008a, p. 57-78).17 Cf. Paixo e Bigliazzi (2008, p. 11-17 e 149-172).

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    Em plena poca de suspenso da legalidade, com todo tipo de violncia

    praticada por um regime ditatorial, Ulysses Guimares lana sua anticandida-tura a Presidente da Repblica, tendo como companheiro de chapa BarbosaLima Sobrinho18. Num pronunciamento de 1973 do anticandidato Ulysses,percebe-se uma meno importante ao conceito de constituio:

    No o candidato que vai percorrer o pas. o anticandidato, para de-nunciar a antieleio, imposta pela anticonstituio que homizia o AI-5,submete o Legislativo e o Judicirio ao Executivo, possibilita prisesdesamparadas pelo habeas corpus e condenaes sem deesa, proana

    a indevassabilidade dos lares e das empresas pela escuta clandestina,torna inaudveis as vozes discordantes, porque ensurdece a nao pelacensura imprensa, ao rdio, televiso, ao teatro e ao cinema19.

    O aspecto distintivo dessa manifestao concentra-se na insero da ideiade anticonstituio. O que Ulysses Guimares procurou conotar com tal ex-presso? Por que recorrer a essa imagem num discurso de protesto?

    Vigorava, em termos formais, ao tempo do discurso aqui invocado, a

    Emenda Constitucional n 1, de 1969. Essa emenda era, na verdade, uma novaConstituio, de inspirao autoritria e outorgada por uma Junta Militar poca do endurecimento de um regime marcado pela rejeio democracia.Tratava-se, ento, de um arremate autoritrio a uma Carta que j era uma afron-ta prtica democrtica. E, alm da Emenda n 1/1969, tambm estavam emvigor diversos atos de exceo, a saber, os atos institucionais e atos comple-mentares que eram editados mediante simples manifestao de vontade doschefes militares, no sofriam nenhum processo de apreciao ou deliberaopelo Congresso Nacional e continham, em sua grande maioria, clusulas queos imunizavam do controle judicial20.

    Os atos institucionais so particularmente significativos em relao ati-tude do governo militar que se instalou em 1964. Em 9 de abril de 1964 erapublicado o primeiro deles, que no fora originariamente numerado. Depoisdisso, com o aprofundamento do arbtrio do regime, novos atos viriam, e esseprimeiro acabaria conhecido como AI-1. H aqui um dado importante: o AI-1

    18 As eleies para Presidente da Repblica eram indiretas. Um Colgio Eleitoral, formado pelos

    integrantes do Congresso Nacional e representantes dos Estados, escolhiam o titular do PoderExecutivo. Como o regime militar controlava os votos no Congresso e nas Assembleias estaduais, pormeio de seu partido oficial (a Arena), nunca foi eleito um candidato de oposio. Ulysses Guimares,do MDB (nico partido de oposio permitido) no tinha chances reais de vencer o pleito. Mas suaanticandidatura, em meio aos anos de chumbo do regime militar, foi um gesto de coragem e revelouo simulacro de legalidade preparado pelo regime.

    19 Ver Alves (2005, p. 217). A ntegra do discurso de Ulysses pode ser consultada no stio daFundao Ulysses Guimares, no endereo .

    20 Ver, a esse respeito, Paixo e Barbosa (2008b, p. 57-78).

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    teve seu prembulo redigido por Francisco Campos, o mesmo jurista que havia

    produzido o texto da Constituio de 1937. quando se manifesta, por meioda histria de um jurista, uma relao direta entre dois regimes autoritrios: oEstado Novo e a ditadura militar.

    importante notar que havia, inserido no discurso com que eram apre-sentados os atos institucionais, um projeto constitucional autoritrio, que podeser mapeado e identificado por meio da observao desses documentos comouma srie.

    Vale a pena, ento, examinar a narrativa proposta pela sucesso de atosinstitucionais.

    Uma das caractersticas do regime militar brasileiro foi a preocupaocom a elaborao de normas jurdicas que sustentassem as medidas de arbtrio.Muitas dessas normas eram precedidas por sofisticadas exposies de motivosque procuravam legitimar a adoo de medidas de exceo. Numa feliz classi-ficao, Anthony Pereira designa essa atitude do regime como uma legalidadeautoritria21.

    Entre 1964 e 1969, foram editados 17 Atos Institucionais. A anlise dessesdocumentos indica uma autoria. H um encadeamento entre os textos, que sur-

    ge da prtica de citao dos atos anteriores no ato ento editado.O que esse intertexto mostra? Uma narrativa que se apresenta como lgi-ca, coerente, ordenada e bem dividida. No AI-1, proclama-se que a revoluovitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma. Ela destitui ogoverno anterior e tem a capacidade de constituir o novo governo. Nela secontm a fora normativa, inerente ao Poder Constituinte. Ela edita normas

    jurdicas sem que nisto seja limitada pela normatividade anterior sua vitria.Observa-se, nesse documento editado logo aps o golpe, a preocupao coma titularidade do poder constituinte e com a fora normativa que emana darevoluo22.

    A narrativa ento prossegue. No AI-2, est escrito: No se disse que arevoluo foi, mas que e continuar. Assim o seu Poder Constituinte no seexauriu, tanto ele prprio do processo revolucionrio, que tem de ser dinmi-co para atingir os seus objetivos23. Nos textos dos dois atos, evidente a linhade raciocnio: por se tratar de um processo revolucionrio, o movimento demaro de 1964 teria a capacidade de moldar a forma constitucional.

    Com o aumento da resistncia e a crescente brutalizao do regime, novos

    atos foram necessrios. O mais emblemtico deles o AI-5, no qual se pode

    21 Cf. Pereira (2010, p. 31-77 e 237-295).22 Ato Institucional de 9 de abril de 1964. Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF, 9 abr. 1964, Seo

    1, p. 3.193.23 Ato Institucional n 2, de 27 de outubro de 1965. Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF, 27 out.

    1965, Seo 1, p. 11.017. Retificao publicada no Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF, 28 out. 1965,Seo 1, p. 11.353.

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    perceber uma passagem que revela como a revoluo deveria tratar o direi-

    to. No nico trecho em que a norma de fato se apresenta como exceo, diz oprembulo: atos nitidamente subversivos, oriundos dos mais distintos setorespolticos e culturais, comprovam que os instrumentos jurdicos, que a Revo-luo vitoriosa outorgou Nao para sua defesa, desenvolvimento e bem-estarde seu povo, esto servindo de meios para combat-la e destru-la24.

    Para o autor do texto do AI-5, as normas jurdicas no so suficientes, porsi s, para proteger a revoluo de seus opositores. O remdio, ento, oaprofundamento da exceo, a retirada de direitos, sob a forma da supresso doespao para o exerccio das liberdades pblicas, a possibilidade de fechamento

    do Legislativo, a interveno federal, a suspenso das garantias constitucionaisda magistratura e outras formas de arbtrio que o regime militar soube desen-volver com enorme criatividade.

    Esses atos eram, portanto, em sua acepo mais evidente, decises uni-laterais que se traduziam em pura violncia. Mas interessante notar que elesno tinham apenas a pretenso de oferecer roupagem jurdica a um regime di-tatorial. Eles procuraram vincular o futuro, vedando expressamente o controle

    judicial sobre eles prprios. Possuem clusulas de no-submisso ao Judicirio

    o AI-1, AI-2, AI-3 e o AI-5. Ao prever a impossibilidade de controle judicialdo teor dos atos institucionais, o regime militar impediu que se produzissemnovas narrativas sobre o conflito poltico, os direitos fundamentais e as aesdo regime25.

    E da decorre a importncia da (re)escrita da histria.Com tal contexto possvel compreender a aluso, no discurso do antican-

    didato Ulysses Guimares, noo de anticonstituio. Em sua manifestao uma prtica poltica que constri um conceito percebe-se uma constatao:no h democracia sem eleies livres. No h eleies livres num ordenamen-to jurdico que se apia em uma Constituio outorgada por um triunvirato dechefes militares que governam com a fora das armas. No h, nesse contexto,uma Constituio propriamente dita, mas antes um arsenal de atos que, sobvrias denominaes, constituem tradues da violncia que embasa o regimede dominao.

    Ainda na dcada de 1970, novas manifestaes por liberdade e democra-cia tomariam corpo em algumas cidades. Foram as greves desencadeadas emvrios setores da economia especialmente em fbricas e instalaes da in-

    dstria no ABC, mas com ramificaes em outros campos e outras localidades24 Ato Institucional n 5, de 13 de dezembro de 1968. Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF, 13 dez.

    1968, Seo 1, p. 10.801.25 Cite-se, a ttulo exemplificativo, a clusula de insindicabilidade do AI-2, que se projeta para

    o futuro e se estende em direo ao passado: Art. 19. Ficam excludos da apreciao judicial:I - os atos praticados pelo Comando Supremo da Revoluo e pelo Govrno Federal, com fundamentono Ato Institucional de 9 de abril de 1964, no presente Ato Institucional e nos atos complementaresdeste.

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    que modificaram o contexto poltico dos tempos da ditadura. A partir de 1976

    e com maior intensidade entre 1978-1980, novas prticas sindicais comea-ram a ganhar fora. Com o desafio frontal legalidade estabelecida pois agreve era to regulamentada que seu exerccio era praticamente impossvel ,as paralisaes macias nas portas das fbricas, sempre acompanhadas por pi-quetes, passeatas e grandes assembleias em estdios de futebol, exigiram umarepresso articulada pelo regime militar, inclusive com a utilizao da Lei deSegurana Nacional26.

    Ainda nesse contexto da segunda metade dos anos de 1970, retorna pautao tema da convocao de uma assembleia constituinte. Em agosto de 1977,

    Goffredo Teles Jnior e vrios outros acadmicos veiculavam a Carta aos Bra-sileiros, que conclamara a Nao a procurar a nica via legtima, com querestaurar as instituies democrticas despedaadas a convocao de umaAssemblia Nacional Constituinte27.

    Como se verifica pela movimentao desses setores, as condies de sus-tentao da ditadura estavam-se tornando cada vez mais frgeis, e a cpula doregime optou por proceder abertura gradual, buscando controlar as etapase formas de transio para a democracia. Comeava a ser preparado, assim,

    o caminho para a elaborao de uma nova constituio. Mas esse roteiro noseria inteiramente conduzido pelos titulares do regime de fora. Como seriapossvel constatar na dcada de 1980, no demorou muito para que o processode reconstruo democrtica fugisse ao controle dos militares e de suas lide-ranas polticas.

    Talvez o ltimo momento em que a ditadura obteve xito em sua estratgiade abertura tenha sido a instituio da anistia. O projeto foi todo concebidoe aprovado sob a perspectiva da superao, da virada de pgina ou, emoutras palavras, do esquecimento. Seu resultado, traduzido na Lei n6.683/79,significou o retorno ao Pas de lideranas polticas at ento exiladas e o fim domodelo bipartidrio. Permaneceu, contudo, o modelo que priorizou o esqueci-mento. Ao contrrio de outros regimes de fora da Amrica Latina, o Brasil nopassou por um processo de resgate da memria. Sob a perspectiva da anistiaampla, geral e irrestrita foi imposta uma vedao: no poderiam ser apuradasresponsabilidades, j que no poderia ocorrer o acionamento das Instituies

    26 Cf. a obra de Ricardo Antunes (1992). Ver tambm a interpretao de Cristiano Paixo e RicardoLoureno Filho (2010, p. 408-424).

    27 Consoante citado na obra organizada por Paes de Andrade e Paulo Bonavides (2002, p. 456).Dizia o documento: Sustentamos que um Estado ser tanto mais evoludo quanto mais a ordemreinante consagre e garanta o direito dos cidados de serem regidos por uma Constituio soberana,elaborada livremente pelos Representantes do Povo, numa Assemblia Nacional Constituinte. Antegra da Carta foi publicada pelo jornal Movimento, no Caderno Constituinte: Como? Por qu? Aquem serve? (p. 38-39). Entre os signatrios do documento estavam, alm de Goffredo Telles, DalmoDallari, Modesto Carvalhosa, Irineu Strenger, Antnio Candido, Jos Carlos Dias, Jos Afonso daSilva, Hermes Lima, Cludio Heleno Fragoso, Hlio Bicudo, Franco Montoro e Flvio Bierrenbach,entre outros.

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    do Judicirio e do Ministrio Pblico para investigaes que envolvessem ati-

    vidades repressivas desenvolvidas at a data da promulgao da lei.Como a histria demonstra, o chamado para o resgate da memria acabaocorrendo em todas as democracias, mais cedo ou mais tarde. No caso brasi-leiro, com atraso em relao aos vizinhos latino-americanos, esse momentoparece mais prximo, muito embora haja dvidas em relao efetividade des-se resgate. Pedidos de priso relacionados Operao Condor comeam a seracolhidos em processos criminais referentes a outras jurisdies, e algumas dasatividades rastreadas na investigao so posteriores promulgao da Lei deAnistia28. E, em 31 de julho de 2008, o Ministrio da Justia realizou audincia

    pblica, na qual foi abertamente discutida possivelmente pela primeira vezna histria institucional brasileira a possibilidade de abertura de processoscriminais que permitam a responsabilizao de militares, policiais e civis en-volvidos com torturas, desaparecimentos e homicdios29. Mas, logo aps essainiciativa, uma deciso do Supremo Tribunal Federal deixou expressa a im-possibilidade de punio a perpetradores, considerando a abrangncia da Leide Anistia30. Meses depois da deciso do STF, a recusa do Brasil em promoveruma justia de transio, com responsabilizao daqueles que violaram grave-

    mente direitos humanos (praticando tortura, desaparecimentos, execues) foipunida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)31. Como umaresposta deciso da CIDH, o Governo Federal brasileiro props a criao deuma Comisso Nacional da Verdade, com a finalidade de examinar e escla-recer as graves violaes de direitos humanos praticadas no perodo fixado noart. 8 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias, a fim de efetivar odireito memria e verdade histrica e promover a reconciliao nacional32.

    Aqui tem-se um exemplo da complexa temporalidade que marca a relaodo direito com a poltica: apenas 40 anos depois da brutalizao do regimemilitar e 20 anos depois da promulgao da Constituio que o suplantou, asociedade brasileira comea a ajustar as contas com a memria da opresso,num lento processo, recheado de marchas e contramarchas.

    Assim, no incio da dcada de 1980, com a presena em solo brasileirode lideranas polticas comprometidas com o processo democrtico, alm do

    28 Ver, em relao a esse tema, Paixo (2008a, p. 3).29 Acerca das repercusses dessa iniciativa, cf. Paixo (2008b, p. 15)30 STF, ADPF 153, Rel. Min. Eros Grau, deciso publicada no rgo oficial de imprensa em

    06.08.2010.31 Corte Interamericana de Direitos Humanos, Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do

    Araguaia) vs, Brasil. Sentena de 24 de novembro de 2010. Disponvel em http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf

    32 Ao tempo da concluso da redao do presente artigo, o Projeto de Lei estava em anlise peloPoder Legislativo. De toda forma, o art. 4, 4, do Projeto estipula que As atividades da ComissoNacional da Verdade no tero carter jurisdicional ou persecutrio, ficando claro, pela redaodo Projeto, que a ampla anistia concedida pela Lei n 6.683/79 no ser afetada pela atividade daComisso Nacional da Verdade.

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    fortalecimento da sociedade civil, comeou a tomar forma uma mobilizao

    importante para a compreenso do processo constituinte: o movimento das Di-retas J. A partir da apresentao, na Cmara dos Deputados, de uma emendaconstitucional redigida por um representante at ento inteiramente descon-hecido (Dante de Oliveira), foi ganhando flego a ideia de que o Presidenteda Repblica que sucederia o ltimo mandatrio do regime militar deveria sereleito pelo voto popular, em sufrgio democrtico e livre.

    Aps a realizao de macios comcios, marcados pela expressiva parti-cipao de setores da sociedade, a Emenda Dante de Oliveira foi rejeitada emprimeiro turno de votao na Cmara dos Deputados. A Cmara eleita em 1982,

    ainda com muitos representantes ligados ou cooptados pelo regime militar, noconseguiu alcanar o grau de amadurecimento que o momento exigia. A tran-sio teria que ocorrer pela via indireta.

    No entanto, com a liberao do potencial de reivindicao e participaoreprimido havia dcadas, o terreno para a elaborao de uma nova Consti-tuio estava suficientemente preparado. Com a marcante atuao dos movi-mentos sindicais e da Ordem dos Advogados do Brasil, foi desencadeado oprocesso de deliberao acerca da convocao de uma Assembleia Nacional

    Constituinte.J era possvel situar, nessa poca, os termos do debate sobre o sentido danova Constituio. Como ser possvel observar, essa controvrsia, sob novasroupagens, persiste at hoje, e bastante caracterstico da percepo que seconstri acerca da experincia constitucional brasileira.

    A discusso envolvia a seguinte pergunta: a nova constituio inauguraum novo tempo na vida poltica e social do Pas ou apenas um momento depassagem no regime que se iniciou em 1964? Em termos mais simplificadores:a nova constituio significa ruptura com o regime militar ou um documentode transio?

    A partir das respostas concedidas a essa cadeia de indagaes, vo se tor-nando claros os projetos nacionais e as vises de mundo dos vrios represen-tantes dos partidos e agrupamentos polticos, desde o perodo pr-constituinteat os nossos dias. E assim os conceitos vo tomando forma. Um deles crucialpara o tema aqui tratado o de constituio.

    Retomando a mesma linha do pronunciamento de Ulysses Guimares in-vocado acima, Raymundo Faorodiria, em 1985:

    Os precedentes das quatro constituintes demonstram que a devoluoe a recuperao, como expresses convergentes de uma conquista e deuma concesso, ocorreram em momentos em que no existia o PoderLegislativo. Hoje, a realidade outra e, em lugar do Executivo que absor-via as unes legislativas, a convocao pode nascer primariamente dopoder que est naturalmente habilitado a convoc-la. No, claro, para

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    se perpetuar como Poder Constituinte derivado, mas para se legitimar noPoder Constituinte puro, sem os subtergios e as alcias de um espaoexcepcional, dentro de seus condicionamentos, numa ampliao da re-orma e de suas limitaes. O que se espera que o Congresso, libertode sua tutela, se submeta, ele tambm, ao imprio do povo. Esta a suavez e a sua hora33

    Como todos sabem, a Assembleia Constituinte de que falava Faoro oco-rreu mas no estava claro para os seus atores que o resultado de seu produtoseria a ruptura. Na verdade, o pronunciamento que abriu os trabalhos da As-

    sembleia indicou o caminho oposto. No discurso proferido na sesso de in-augurao da Constituinte, o ento Presidente do Supremo Tribunal Federal,ministro Moreira Alves, afirmou que a instalao daquela Assembleia seria otermo final do perodo de transio com que, sem ruptura constitucional, e porvia de conciliao, se encerra o ciclo revolucionrio34.

    E essa no era uma posio isolada no debate poltico da poca, uma ma-nifestao que pudesse ser interpretada como um sentimento de nostalgia deum jurista que, possivelmente desconectado das transformaes de seu tempo,

    havia moldado sua viso de mundo nos anos de ditadura. No. Alguns polticospertencentes a partidos historicamente associados com a resistncia ao regime(como o antigo MDB) explicitaram anlises similares. Nesse sentido, a opiniodo ento Deputado Pimenta da Veiga:

    Acredito nesta Constituinte porque ela vem como o resultado de umatransio poltica. No ruto de uma ruptura, da qual o pas sai trau-matizado; vem num tempo de paz, onde no h vencidos nem vence-dores35.

    33 Faoro (1985,p. 96).34Dirio da Assemblia Nacional Constituinte, 2 fev. 1987, p. 5. O tema no era, contudo, pacfico

    muito embora os defensores da tese pudessem creditar nisso. O pronunciamento de Moreira Alvesteve repercusso e ensejou protestos. Na sesso seguinte, o Constituinte Haroldo Lima se manifestou:ontem, na Sesso de instalao, no se destacou a soberania da Constituinte. Nenhum Constituintepde ter a palavra, e isso no destaca a importncia de Constituintes que foram eleitos para participarde um Poder soberano. Instalamos a Constituinte, Sr. Presidente... O SR. PRESIDENTE (MoreiraAlves, interrompendo): V. Ex. se adstrinja questo de ordem. A sesso de ontem foi a sesso deontem. A sesso de ontem era uma sesso solene. V. Ex. se adstrinja questo de ordem, porque, se

    continuarmos desta forma, evidentemente no chegaremos a termo com discusses desta natureza.O SR. HAROLDO LIMA (retomando o debate): (...) Ontem, no falou nenhum Constituinte. Houveum Exrcito em prontido para uma guerra contra quem? Contra o povo que elegeu a Constituintesoberana? Ontem, no houve condies de fazermos um pronunciamento aqui... O SR. PRESIDENTE(Moreira Alves, novamente interrompendo): Solicito a V. Ex. se adstrinja questo de ordem, porqueV. Ex. no precisa defender soberania da Assemblia Constituinte valendo-se de argumentao dessaordem. Ningum aqui nega a soberania da Assemblia Constituinte.Dirio da Assemblia NacionalConstituinte, 3.2.1987, p. 12.

    35Dirio do Congresso Nacional, 28.11.1985, p. 2.506.

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    Ou, em termos bastante prximos, a avaliao do ento Deputado Walmor

    Giavarina:Teremos no uma Assemblia Nacional Constituinte originria, cls-sica, ao preo de semelhantes crises, mas uma Assemblia NacionalConstituinte instituda, vivel, possvel, que o bom senso nos impe arealizar (...) A ruptura no ser o trao desta nova poca36

    Essas expectativas comearam, contudo, a ceder lugar imprevisibilidadedos fatos. Por diversas razes entre as quais est a liberao de todo o poten-

    cial crtico e participativo que havia sido reprimido ao tempo da ditadura e frus-trado pela rejeio da Emenda Dante de Oliveira , o processo de elaboraoda nova constituio tomou um rumo indito na histria poltica brasileira: aoinvs de trabalhar com base num anteprojeto, a Constituinte decidiu construirseu texto de baixo para cima.

    A marca distintiva da Assembleia Nacional Constituinte (ANC) de1987/1988 foi a capacidade de construir uma histria diferente, em vrios pla-nos. O primeiro deles o procedimental: ao contrrio da maior parte das ex-

    perincias correlatas no mundo (e da prpria tradio brasileira), a ANC nopartiu de um texto previamente escrito e optou pela gradativa montagem, porblocos temticos, de um grande anteprojeto, o que foi possvel pela diviso daAssembleia em oito comisses temticas (cada uma delas fracionada em trssubcomisses). Isso garantiu uma maior democracia interna na Assembleia etornou o processo menos controlvel.

    O segundo aspecto a ser destacado a indita participao social: iniciati-vas como as emendas populares, a opo de realizao de audincias pblicas,o acompanhamento pela imprensa, tudo isso transformou a ANC num espaopermanentemente dinmico de construo de uma nova identidade. O terceiroponto a conscincia histrica. A sociedade brasileira, recm-sada da expe-rincia traumtica do regime ditatorial, detinha um potencial de criao e parti-cipao que estava evidentemente represado, e a ANC, de modo inclusive noprevisto pelas lideranas da poca, foi o local e o momento para a re-escriturada histria.

    Assim, o texto comeou a ser produzido num contexto de uma Assembleiadescentralizada e aberta, considerando o grande nmero de audincias pblicas

    realizadas em cada subcomisso, com o comparecimento macio dos setoresinteressados na redao do texto. Isso transcende, inclusive, a dimenso damera defesa de pautas corporativas (que tambm ocorreram), na medida emque as subcomisses temticas abriam suas portas para interlocutores diversos,

    36 Dirio do Congresso Nacional, 19.10.1985, p. 1.971.

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    e possibilitavam tambm o encontro de tendncias opostas, que se confronta-

    vam no debate.Esse mtodo foi muito bem sintetizado por Joo Gilberto Lucas Coelho,um dos principais observadores do processo constituinte, como se percebe pelaseguinte passagem:

    Talvez o mais rico momento da Constituinte tenha sido o das audin-cias. O Brasil apresentou-se nu e real, com problemas e sonhos, tensese divergncias. Centrais sindicais, lideranas empresariais, movimen-tos os mais diversos, especialistas e membros do governo depunham, a

    convite ou por iniciativa prpria37

    O procedimento tradicional foi atropelado pela grande fora popular jmobilizada no movimento das Diretas J, e que, diante da frustrao decorrenteda no aprovao da Emenda Dante de Oliveira e da morte do presidente eleitopelo Colgio Eleitoral como smbolo da transio para a democracia, exigiu aformulao de um novo procedimento que se iniciou com a coleta de sugestespopulares, ocasionando a abertura e a democratizao do processo constituinte. isso precisamente o que pode explicar o paradoxo de que uma das legisla-turas mais conservadoras j eleitas (contando inclusive com a participao, naconstituinte, de senadores no eleitos para tanto) tenha vindo a elaborar aConstituio mais progressista de nossa histria.

    Aps essa anlise, comeam a surgir, no horizonte histrico, alguns dosmovimentos que marcaram essa superao do regime autoritrio. Houve umtempo longo, lento, de transio, controlado pelo regime militar com uma im-pressionante capacidade de articulao uma lei de autoanistia, uma eleio

    indireta do primeiro presidente ps-ditadura. Porm, a partir de 1987, coma instalao da Assembleia Nacional Constituinte, esse tempo se acelera demodo imprevisto. H uma forte mobilizao da sociedade civil, a elaboraoda Constituio suplanta os limites do Congresso Nacional e das instituiespermanentes (Poderes Executivo e Judicirio) e o resultado a promulgaode uma Carta democrtica, inovadora e com claro destaque para os direitos

    fundamentais, a cidadania e a participao popular.

    4. Reflexes conclusivas

    Ao trmino da reconstruo histrica aqui proposta, parece adequado proce-der a um exerccio de reflexo em torno do futuro da ordem constitucional institu-da aps a ditadura militar que perdurou de 1964 a 1985. Algumas consideraes

    37 Coelho (1988, p. 16-17).

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    se impem acerca do tempo da Constituio: suas transformaes, sua mem-

    ria, seu futuro.Um primeiro olhar precisa ser dirigido ao fato de que a Carta de 5 deoutubro de 1988 sofreu muitas alteraes formais em seus vinte e trs anosde vigncia (67 emendas constitucionais e 6 emendas de reviso). Esse umfenmeno que precisa ser analisado sob uma perspectiva compatvel com asatuais exigncias postas a um texto constitucional. Na atualidade, nenhumaconstituio deve ser vista como uma espcie de livro sagrado, portador deuma carga semntica imutvel. As sociedades contemporneas so complexas,portanto a demanda por decises muito maior hoje do que ao tempo em que

    a constituio foi inventada como forma. claro que, do ponto de vista doprocesso legislativo, possvel criticar as opes explicitadas pelo constituintederivado, mas a quantidade de emendas no deve ser vista, por si s, como umproblema intrnseco ou um sinal de preocupao.

    Um outro aspecto relevante para a vigncia da Constituio, nesses lti-mos 23 anos, envolve a conscincia da historicidade do direito, que persegue opassado e se projeta para o futuro.

    Infelizmente, ainda h um enorme caminho a percorrer quanto memria

    do direito no Brasil. O recente episdio da tentativa de discusso da Lei deAnistia e a deciso proferida pelo STF na ADPF 153 (que manteve os efeitosdaquela lei), eventos aos quais se fez aluso neste artigo, mostram a dificuldadeda sociedade brasileira em estabelecer uma relao responsvel com a prpriamemria. Ter conscincia histrica e (re)construir a memria do direito so,antes de tudo, obrigaes ligadas ao campo da tica e da responsabilidade.

    E, por fim, retorna a pergunta: o que a Constituio projeta para o futuro?Isso depende de um dado que , por sua natureza, complexo e que faz

    com que a pergunta abra uma cadeia de vrias outras interrogaes. A questono se coloca apenas para a Constituio, assim como no se coloca para o go-verno ou a classe poltica (sejam eles quais forem). um problema que envolvea relao entre Constituio e sociedade, ou, em uma perspectiva abrangente,entre direito e poltica. A pergunta poderia ser traduzida da seguinte maneira:como opera a conexo entre as demandas da sociedade e a normatividade cons-titucional? Quem so os intermedirios dessa relao? Como a Constituioafeta o mundo? Sempre haver textos constitucionais escritos e sempre havergovernos e casas legislativas. Mas como eles se comportam reciprocamente?

    Construir respostas a essa cadeia de indagaes um importante desafio que seapresenta s prximas geraes.

    Aps a escritura do texto constitucional e sua consolidao institucional(ainda em curso), cabe ento apresentar novas perguntas: como manter os prin-cpios que informam o texto numa sociedade que se transforma a todo momen-to? Como ler os sinais de mudana a partir de uma perspectiva inclusiva?

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    Araucaria. Revista Iberoamericana de Filosofa, Poltica y Humanidades, ao 13, n 26. Segundo semestre de2011. Pp. 146169.

    verdade que as respostas a serem concedidas a essas indagaes so

    sempre abertas, em face da indeterminao e do risco inerentes sociedadecontempornea. Mas no menos verdade que a melhor forma de respeitara Constituio viv-la como um processo dinmico, de constante transfor-mao, com um pano de fundo baseado naquelas premissas que inspiraram aAssembleia de 1987/1988: democracia, liberdade, autonomia e participao.

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