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DIREITOS HUMANOS DO DEFICIENTE REALMENTE FUNCIONA? Débora Ribeiro dos Santos 1 Antonio Sales 2 Patrícia Alves Carvalho 3 RESUMO: O presente artigo tem como objetivo evidenciar as principais leis, que permitem que pessoas com deficiência tenham acesso igualitário a todas as oportunidades oferecidas na sociedade. É importante ressaltar a necessidade do cumprimento dessas leis, como forma de retificar a discriminação histórica vivenciada por essa parcela da população, principalmente no direito ao acesso a escolarização que atua como um dos veículos de inserção do individuo com deficiência na sociedade. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, a partir do levantamento de leis, decretos que abordam a deficiência e a tentativa de assegurar a efetivação dos seus direitos. Palavras-chave: Escolarização.Deficiência.Inclusão. 1 INTRODUÇÃO Apesar de parecer um tema muito explorado nos últimos anos, para essa parcela excluída da população, que até pouco tempo não tinha acesso a escolarização e tampouco frequentava lugares públicos, a consolidação de leis que protegem e garantem o seu acesso a uma vida plena em sociedade deve ser motivo de satisfação. Podemos analisar através da história que a condição humana de ser diferente, não se enquadrar no perfil da maioria da população, já foi justificativa para muitas atrocidades e desigualdades. Os deficientes já foram abandonados, exterminados, carregaram o estigma 1 Mestranda em Educação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul 2 Doutor em Educação do curso de pós-graduação Stricto Sensu em Educação da UEMS 3 Doutora em Educação do curso de pós-graduação Stricto Sensu em Educação da UEMS Anais do XIV Congresso Internacional de Direitos Humanos. Disponível em http://cidh.sites.ufms.br/mais-sobre-nos/anais/

DIREITOS HUMANOS DO DEFICIENTE REALMENTE … · A partir da visão dos direitos humanos e do conceito de ... que o governo assumiu publicamente o atendimento educacional dos deficientes,

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DIREITOS HUMANOS DO DEFICIENTE REALMENTE FUNCIONA?

Débora Ribeiro dos Santos1 Antonio Sales 2

Patrícia Alves Carvalho 3

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo evidenciar as principais leis, que permitem que

pessoas com deficiência tenham acesso igualitário a todas as oportunidades oferecidas na

sociedade. É importante ressaltar a necessidade do cumprimento dessas leis, como forma

de retificar a discriminação histórica vivenciada por essa parcela da população,

principalmente no direito ao acesso a escolarização que atua como um dos veículos de

inserção do individuo com deficiência na sociedade. Trata-se de uma pesquisa

bibliográfica, a partir do levantamento de leis, decretos que abordam a deficiência e a

tentativa de assegurar a efetivação dos seus direitos.

Palavras-chave: Escolarização.Deficiência.Inclusão.

1 INTRODUÇÃO

Apesar de parecer um tema muito explorado nos últimos anos, para essa parcela

excluída da população, que até pouco tempo não tinha acesso a escolarização e tampouco

frequentava lugares públicos, a consolidação de leis que protegem e garantem o seu acesso

a uma vida plena em sociedade deve ser motivo de satisfação.

Podemos analisar através da história que a condição humana de ser diferente, não

se enquadrar no perfil da maioria da população, já foi justificativa para muitas atrocidades

e desigualdades. Os deficientes já foram abandonados, exterminados, carregaram o estigma

1 Mestranda em Educação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul 2Doutor em Educação do curso de pós-graduação Stricto Sensu em Educação da UEMS 3Doutora em Educação do curso de pós-graduação Stricto Sensu em Educação da UEMS

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de serem pecadores e acreditavam que o pecado era evidenciado pela sua condição física

ou mental.

Para compreender melhor a condição do deficiente, é necessário um breve

histórico e como ele foi alocado em uma sociedade que até há pouco tempo entendia a

deficiência como uma condição imutável. Concebia-o como incapaz de melhorar a sua

condição ou até mesmo se adequar a vida em sociedade.

Por outro lado, observa-se um consenso social pessimista, fundamentado na idéia de que a condição de “incapacitado”, “deficiente”, “invalido” é uma condição imutável, levou à completa omissão da sociedade em relação à organização de serviços para atender às necessidades individuais específicas dessa população. (MAZZOTA,1982, p.3)

Essa condição de imutável, onde ocupar um corpo marcado por limitações físicas,

sensoriais e mentais era considerado uma situação sem alternativa, fez com que os estudos

no campo das Ciências Sociais e Humanas fossem realizados tardiamente. Diniz et al

(2009) aponta que esse fato gerou desigualdade, não somente no campo dos estudos, mas

também no campo jurídico. A garantia de direito e o acesso a uma vida digna foi

postergada.

Ao analisarmos os pressupostos do homem do século XX ainda nos deparamos

com um conceito de homem primitivo, que apesar de todo progresso da Ciência e da

tecnologia, da criação de leis, na verdade nunca deixou de ser primitivo ou rudimentar. O

fato de criar leis não assegura a todos à proteção e uma vida digna.

Constata-se situações de desigualdade, violência e intolerância. Pode-se tomar

como exemplo extremado de preconceito e desigualdade o que ocorreu durante a Segunda

Guerra Mundial, onde o nazismo exterminou milhares de pessoas por serem diferentes, por

não se enquadrarem em um padrão pré-estabelecido de normas e de funcionamento

corporal considerado adequado.

Já o reconhecimento das diferenças étnicas, religiosas e de gênero, de idade etc. Significa a discriminação e a exclusão e, no limite, a eliminação. O exemplo drástico do nazismo revela a face desumana de homens que eliminaram pessoas com dificuldades ou necessidades físicas e mentais, negros, judeus, ciganos, homossexuais, apenas por serem considerados diferentes de um padrão. (BAZILIO; KRAMER,2011, p.63)

Para que situações como essa não voltassem a acontecer, e para assegurar os

direitos desta nova sociedade do pós-guerra, em 10 de Dezembro de 1948 a ONU

(Organização das Nações Unidas), em Assembléia Geral proclamou a Declaração

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Universal dos Direitos Humanos. Na sua introdução faz menção às atrocidades cometidas

nos campos de extermínio:

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo,Considerando que o desprezo pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo e que todos gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum,Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei, para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão.(ONU,2009,p.2)

Embora atualmente existam muitos mecanismos e leis para assegurar os direitos

dos cidadãos, o Brasil, nota-se uma grande distancia entre a prática e as legislações

vigentes, não foram ainda incorporadas no dia-a-dia do cidadão, muitas pessoas ainda

desconhecem os seus direitos, ainda temos que recorrer na esfera jurídica para que esses

direitos sejam efetivados.

Portanto, assegurar direitos apenas no contexto jurídico não faz com que os

cidadãos tenham acesso e possam usufruir dessas prerrogativas. É necessária que seja uma

condição inerente à pessoa, não só ao deficiente, mas, aqueles que de algum modo são

vítimas de preconceito e desigualdade.

O objetivo deste artigo é analisar as políticas públicas praticadas para as pessoas

com deficiência, tendo como princípio a diminuição das desigualdades sociais e o acesso à

educação. Por meio de revisão bibliográfica abordaremos as principais leis, e a condição

que essas pessoas se encontram na sociedade. Iniciaremos com um breve histórico dos

deficientes e o seu acesso ao ensino comum, abordaremos os principais acontecimentos até

a lei 13.146/2015.

2 BREVE HISTÓRICO DA LUTA DO DEFICIENTE PELA ESCOLARIZAÇÃO

No documento da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da

Educação Inclusiva consta que:

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A partir da visão dos direitos humanos e do conceito de cidadania fundamentado no reconhecimento das diferenças e na participação dos sujeitos, decorre uma identificação dos mecanismos e processos de hierarquização que operam na regulação e produção das desigualdades. Essa problematização explicita os processos normativos de distinção dos estudantes em razão de características intelectuais, físicas, culturais, sociais e lingüísticas, entre outras, estruturantes do modelo tradicional de educação escolar.(BRASIL, 2014,p.1)

Historicamente as pessoas com deficiência sofrem com a falta de reconhecimento

de sua condição atípica. Na Antiguidade eram abandonados, perseguidos ou até mortos por

causa da sua condição vulnerável, pois, muitas vezes eram incapazes de prover o seu

próprio sustento e defesa, o que se tornava um empecilho para a comunidade.

De acordo com Neres e Corrêa (2008), na sociedade grega, em Esparta havia uma

supervalorização da condição física, de modo que aqueles indivíduos que não possuíam

atributos físicos ou apresentavam algum tipo de deformidade eram exterminados. Mas essa

prática não se limitava apenas a Esparta. Em Atenas, outra cidade-estado grega, a maior

virtude estava na capacidade intelectual que o indivíduo possuía: na erudição, filosofia e

contemplação. Só podiam sobreviver aqueles que apresentassem tais atributos. Dessa

forma o infanticídio e o extermínio de crianças com deficiência era uma prática comum.

Durante a Idade Média com o crescimento do cristianismo, as práticas de

abandono e extermínio dos deficientes passou a ser condenadas, uma vez que valores como

piedade, caridade e compaixão provocaram uma mudança nos hábitos da sociedade, se o

homem era a imagem e semelhança de Deus, então todos possuíam almas e eram

merecedoras de um tratamento digno.

Dessa forma, as pessoas com deficiência passaram a ser acolhidas em igrejas e

abrigos para crianças abandonadas e pobres, sem nenhum tipo de assistência ou cuidado,

apenas alimentação e abrigo. A pessoa com deficiência muitas vezes era vistas, segundo

Neres e Corrêa (2008, p.153 com quem “deveria receber dos homens tolerância e

aceitação, a deficiência, fruto da vontade divina, teria como objetivo chamar a atenção dos

homens para as mazelas do mundo, dando-lhes chance de reflexão e regeneração”.

Nesta perspectiva, o atendimento aos deficientes ocorria em lugares como asilos e

outras instituições nos quais eram segregados do convívio familiar e da vida em sociedade,

uma forma de manter a sociedade protegida, já que estes eram isolados, por apresentarem

comportamentos inadequados, desajustados e antissociais.

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Neste viés, o cuidado com a pessoa deficiente era alternado entre ocultismo e

misticismo. Não havia um cuidado médico ou pedagógico que orientasse o

desenvolvimento científico para tentar compreender esse indivíduo tão diferente dos

demais. Mazzotta (2011, p.16), aponta que o conceito de diferenças individuais não era

compreendido ou avaliado, uma vez que o indivíduo que não apresentasse um

comportamento condizente com os demais era retirado do convívio.

Na metade do século XVIII, com a Revolução Francesa, aconteceu um

enfraquecimento da igreja e a volta ao antropocentrismo. Apareceu um discurso de

inclusão, de cuidados com todos. É nessa sociedade pós-revolução, que surgiu a idéia de

uma educação laica, gratuita, pública e obrigatória, que tinha como finalidade promover o

controle dessa nova sociedade emergente.

Neres e Corrêa (2008) defendem que com a emergente necessidade de mão-de-

obra e a apologia ao trabalho, no centro da sociedade burguesa, aqueles que de algum

modo não podiam produzir eram rejeitados. Essas pessoas juntamente com os pobres,

desajustados e ociosos, se tornaram um fardo, uma ameaça ao novo sistema de produção.

Esses indivíduos que não se encaixavam nessa nova sociedade tinham como destino a

segregação, onde ficavam internados sob a proteção do Estado, sendo assim essa tarefa não

era mais delegada exclusivamente a igreja.

Neste sentido, se fez necessário repensar o papel dos deficientes/ anormais dentro

dessa nova sociedade. Para Januzzi (2012), dentro do conceito de anormalidade se

encaixava os que ameaçavam o poder da burguesia, e para acabar com essa ameaça foi

necessário um discurso de cuidado com a infância e a prevenção de doenças, na tentativa

de evitar o nascimento de novos anormais, promover a escolarização e dessa forma,

garantir mão-de-obra para a indústria.

No Brasil, a preocupação com o deficiente começou tardia até o século XVI em

sociedade predominantemente primitiva, a preocupação com o deficiente e sua

escolarização ainda era inexistente, mas pouco a pouco surgiram iniciativas de forma

isolada e descontínua, e que contavam com o respaldo de um governo de interesses.

Essas primeiras formas de cuidados e escolarização promoviam o ensino de

trabalhos manuais, uma maneira de garantir o sustento desse indivíduo, que não precisaria

da intervenção do Estado para sobreviver, isentando-o assim de qualquer responsabilidade.

Mazzota (2011) afirma que no século XIX, inspirados pelo progresso de algumas

iniciativas realizadas na Europa e nos Estados Unidos da América do Norte, alguns

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brasileiros organizaram serviços de atendimento a pessoas com deficiência. Durante um

século essas iniciativas eram oficiais e particulares, que ocorriam de forma isolada e

descontínua e que refletiam o interesse de alguns educadores no atendimento de pessoas

com deficiência

Durante século XX, houve um engajamento de toda sociedade civil em prol da

educação e dos direitos das pessoas deficientes foram criadas instituições e classes anexas

aos hospitais, asilos e escolas como forma de promover a escolarização dessas pessoas.

Mazzotta (2011) destaca a inclusão da educação dos deficientes na política

educacional brasileira, no final dos anos 1950 e início dos anos 1960. Nesse momento, em

que o governo assumiu publicamente o atendimento educacional dos deficientes, através de

campanhas especializadas para mobilização e sensibilização da sociedade. A LDB nº

4024/61 foi considerada um grande avanço na política educacional, uma vez que

preconizava a educação como um direito de todos e a educação especial integrada ao

Sistema Educacional Brasileiro.

Januzzi (2012) aponta que mesmo esse movimento de construção da educação

brasileira nos viés do capitalismo internacional, dentro das indústrias e do processo de

urbanização, no início do século XX, a educação do povo era defendida por personalidades

que ocupavam cargos nas secretárias de educação estaduais. A teoria da Escola Nova toma

vulto, e fomenta a legislação e a construção de escolas públicas.

É neste cenário que a educação especial se desenvolve dentro de uma perspectiva

diferenciada. Enquanto a educação do ensino comum procurava desenvolver as habilidades

de escolarização, como forma de impulsionar o saber, desenvolvendo um indivíduo

autônomo e economicamente ativo.

Para Januzzi (2012), a preocupação com a Educação Especial partia do

pensamento de que deveriam suprir as diferenças que faltava, para que pudessem perfazer

sua própria subsistência, de modo que priorizavam o desenvolvimento de habilidades

simples, essencial ao convívio social, até organizar algum conhecimento para sua inserção

no mundo do trabalho. Deste modo, considera-se uma possível preocupação com a

autonomia do deficiente, já que era considerado importante ao desenvolvimento

econômico do país nas décadas de 1950/1960.

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2.1 DIREITOS HUMANOS E DEFICIÊNCIA

A luta pela garantia dos direitos humanos vem muito antes de 1948, depois das

atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra mundial, e teve inicio quando o homem

deixou de ser nômade e passou a viver em sociedade. É neste momento, que surgiram as

diferenças de classes, a luta pelo acesso a educação é uma das reivindicações dos grupos

minoritários excluídos, dentre eles os deficientes.

Sandel (2017), tradicionalmente a escola pública tem sido uma instituição para a

formação da sociedade, transmitindo valores e muitas vezes, senão todas, a serviço da

disseminação da ideologia do Estado, de maneira a formar o pensamento das gerações

futuras.

Encontramos muitas escolas públicas em situações de precariedade, é esta escola

que abriga filhos de operários, da classe média, de diferentes etnias, raça e religião, e

mesmo assim ainda se constitui um espaço democrático e propicio para a convivência com

as diferentes.

As dificuldades que encontramos em relação a inclusão de pessoas com

deficiência no ensino comum remonta de séculos de exclusão, preconceito e discriminação.

Sandel (2017), uma sociedade democrática como a nossa podemos ter esperança de

cultivar a solidariedade e a responsabilidade que uma sociedade justa requer.

E a construção de uma sociedade justa, começa com a educação e admitir que essa

parcela da população demorou séculos para poder ter acesso a escolarização e o direito de

conviver com os seus pares, sendo vítimas de desigualdades, e devemos combater as

desigualdades, oportunizar a todos sem distinção da sua condição física, mental e sensorial

é um direito assegurado por lei. Bazílio e Kramer (p.68, 2011) corroboram dizendo “a

educação precisa lhes devolver o que fora expropriado historicamente, dar de volta o que

era seu direito”.

Embora sejam amparados pela Constituição Federal e outros inúmeros decretos

para garantir os direitos fundamentais das pessoas com deficiência, o Brasil ainda está

distante de cumprir o que está apregoado em lei. Segundo Bazílio e Kramer (2011), se por

um lado temos o pleno funcionamento das instituições, do outro temos a corrupção quanto

às violações cotidianas dos Direitos Humanos.

Estas Leis foram promulgadas para combater a desigualdade, os órgãos do Poder

Público responsável em garantir o cumprimento das leis, muitas vezes se tornam ausente

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da vida dos cidadãos. Bazílio e Kremer (p.98, 2011) “Também entre nós fala-se em

direitos quando menos existem direitos; fala-se em democracia quando mais ela nos falta, o

que verificamos é que existe um distanciamento entre o que propõe a lei e o seu real

cumprimento.

A vida nas sociedades democráticas é cheia de dicotomias entre o certo e o errado,

justiça e injustiça, como afirma Sandel (2017). A sociedade não está preparada para

conviver com as diferenças e a deficiência, ainda não conseguimos aceitar e reconhecer as

nossas diferenças, e é contra a injustiça e a desigualdade que marcam o nosso tempo que

devemos balizar nossas ações educacionais e culturais.

Bazílio e Kramer (2011) sinalizam que em tempos de violenta socialização urbana

como a que vivemos atualmente, é necessário garantir uma vida digna a todos,

independente de sua condição social e econômica.

Portanto, devemos priorizar as pessoas que estão em condições de

vulnerabilidade, aqueles que foram expropriados dos direitos humanos que tiveram a sua

dignidade anulada, vivendo a margem de uma sociedade excludente.

Se uma sociedade justa requer um forte sentimento de comunidade, ela precisa encontrar uma forma de incutir nos cidadãos uma preocupação com o todo, uma dedicação ao bem comum. Ela não pode ser indiferente às atitudes e disposições, aos “hábitos do coração” que os cidadãos levam para a vida pública, [...] cultivar a virtude cívica. (SANDEL, 2017, p.325)

A pessoa com deficiência necessita ter sua dignidade respeitada, para alcançar a

garantia de seus direitos fundamentais, podendo assim participar da sociedade em

condições iguais de oportunidades com os demais cidadãos.

Neste viés, o reconhecimento dos direitos dos deficientes por parte do Estado,

configura em mais segurança para as relações sociais, e garante o acesso ao ensino comum,

oportunizando sua permanência e avanço educacional.

A Constituição dos direitos do deficiente se delineou nas décadas finais do século

XX, e inicio do século XXI. Marcados pela exclusão, pelo abandono, pela falta de

oportunidades e até mesmos pelas tentativas de extermínio justificados apenas pelo

preconceito, por serem diferentes de um padrão estabelecidos pelos ditos normais.

É inaceitável que nos dias em que a difusão de informações, o avanço tecnológico

e cientifico ainda nos deparamos com situações de injustiça de discriminação. Foi

necessário constituir um conjunto de leis para garantir a apropriação do direito

fundamental de todo cidadão, o direito a vida, uma vida digna.

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2.1.1 O Brasil e a Educação Especial

Mas foi na década de 1970, que o Brasil demonstrou pela primeira vez

preocupação com a escolarização dos deficientes, com a aprovação da Lei 5.692/71 previa

em seu artigo 9º, segundo Mazzotta (2011) “tratamento especial aos excepcionais”, e na

redação do texto, que os alunos com deficiência deveriam ser inseridos no ensino comum

quando possível e quando não houvesse essa possibilidade seriam encaminhados para o

serviço especializado, devendo receber tratamento especial e prioritário.

Em 1973, o MEC criou o CENESP (Centro Nacional de Educação Especial) para

desenvolver ações educacionais voltadas às pessoas com deficiências e às pessoas com

superdotação, mas, com um caráter integracionista. Essas ações aconteceram de forma

isolada por parte do Estado, através de campanhas assistenciais. Ainda não se configura

neste período o acesso universal ao ensino público por parte dos deficientes.

Januzzi (2012) afirma que, mesmo com a modificação do termo anormalidade,

que naquele momento atendia as expectativas escolares ou sociais, a exclusão continuou,

uma vez que o aluno que não alcançasse o rendimento esperado ou não se comportava de

acordo com as normas era retirado do convívio dos demais, sendo conduzidos a classes

especiais.

Dessa forma não apenas o deficiente era excluído, mas todo aquele que por

algum motivo não se enquadrava no convívio social, seja por dificuldades na

aprendizagem, por questões disciplinares ou de conduta. Contudo, houve a ampliação da

exclusão, pois na tentativa de inserir o deficiente acabaram por excluir uma parcela de

estudantes considerados fora dos padrões desejados.

Mesmo com a integração do deficiente no ensino comum público, ainda

predominava o setor privado nos serviços de atendimento ao deficiente, o que dava a ideia

de educação para a elite. As reformas promovidas na educação especial procuravam educar

dentro dos padrões de excelência, e buscavam a normalização.

Segundo Januzzi (2012) a normalização que adentrou no final da década de 1970

e início dos anos 1980, ainda é hoje usado em relação ao deficiente mental. Olívia Pereira

(apud JANUZZI, 2012), esclarece que esse termo surgiu na Dinamarca, onde foi

incorporada a legislação desde 1959, e tinha por finalidade promover condições para que

uma pessoa retardada mental pudesse ter uma vida mais próxima possível do normal.

Por conseguinte, o indivíduo poderia aproveitar as oportunidades existentes na

sociedade onde vivia, desenvolvendo suas potencialidades. Não se trata segundo a autora,

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de procurar as deficiências nos homens, mas de diminuir as diferenças e aumentar as

similitudes. Entretanto, deve ocorrer a modificação do meio no qual está inserido o

deficiente, não cabe apenas ao deficiente realizar essa mudança. Esse método se

caracterizava pelo ensino individual e recomendava uma adaptação no currículo.

Depois de um sistema ditatorial que durou vinte anos, foi promulgada a sétima

Constituição Federal em 1988, que foi marcante para a sociedade brasileira. Essa nova

constituição veio garantir aos sujeitos, historicamente excluídos, o direito à educação

estabelecendo o princípio da igualdade e de condições de acesso e permanência na escola.

A década de 1980 foi marcada, segundo Saviani (2013) pela mobilização intensa

da sociedade civil, a criação de sindicatos, ampliação da produção acadêmica – cientifica.

Se por um lado houve progresso em vários setores econômicos e acadêmicos, na política

educacional da educação básica foi marcada pela ausência de medidas efetivas para suprir

os graves problemas educacionais.

O objetivo dessa nova Constituição era a promoção do bem comum e o

desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.(BRASIL, 1988).

A Constituição de 1988 garante a democracia. No seu art. 205 estabelece o acesso

a todos os brasileiros a educação tendo como objetivo o desenvolvimento pleno do

individuo, para a cidadania e a qualificação para o trabalho. Sendo dever do Estado, da

família e da sociedade, promover e garantir esse acesso. No seu art.206 estabelece

igualdade de acesso e permanência na escola, liberdade para aprender e ensinar, além da

gratuidade do ensino público nas entidades oficiais.

A Constituição traz em seu texto, no artigo 208, a obrigatoriedade do ensino

fundamental e o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,

preferencialmente na escola comum.

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

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I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; II - progressiva universalização do ensino médio gratuito; III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando; VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. § 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo. § 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente. (BRASIL, 1988)

De acordo com o artigo 227, da mesma Constituição a educação é prioridade

absoluta, é um direito da criança e do adolescente que deve ser assegurado pelo Estado,

família e sociedade. No seu parágrafo 1º, o Estado admite a participação de entidades não

governamentais, para incentivar programas de assistência integral á saúde da criança e do

adolescente.

Em seu 2º parágrafo dispõe de normas de construção com a finalidade de garantir

o acesso e a locomoção de pessoas portadoras de necessidades especiais, e a acessibilidade

como forma de assegurar a igualdade de direitos, eliminando as barreiras arquitetônicas,

urbanísticas promovendo a aprendizagem, respeitando a condição física e sensorial de cada

indivíduo.

Mazzotta (2011) esclarece que mesmo com essa política de amparo e seguridade

aos portadores de necessidades especiais, estabelecendo o ensino fundamental como

obrigatório e gratuito, sendo dever do Estado garantir programas que auxiliem no

atendimento a estudantes com necessidades educacionais especiais. Estabelece ainda que

essa oferta deve ocorrer preferencialmente no sistema comum de ensino e não apenas em

escolas especializadas como era apregoada anteriormente.

Percebemos uma tentativa de dar continuidade à escolarização do deficiente,

garantindo seu ingresso, permanência e a sua inclusão no sistema comum de ensino, mas

nos deparamos com outra questão importante, a iniciativa privada irá continuar a receber

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incentivos financeiros para dar assistência aos educandos com necessidades educacionais

especiais, enquanto que a escola pública ficará a disposição dos escassos recursos públicos.

Em 24 de Outubro de 1989, a Lei nº 7.853 no artigo 1º estabelece “normas gerais

para o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de

deficiência e sua efetiva integração social”, no seu artigo 2º estabelece o Poder Público e

seus órgãos para assegurar o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive educação

de qualidade e especial. Na área da Educação fica estabelecido

a) a inclusão, no sistema educacional, da Educação Especial como modalidade educativa que abranja a educação precoce, a pré-escolar, as de 1º e 2º graus, a supletiva, a habilitação e reabilitação profissionais, com currículos, etapas e exigências de diplomação próprios; b) o oferecimento obrigatório de programas de Educação Especial em estabelecimentos públicos de ensino; c) a oferta, obrigatória e gratuita, da Educação Especial em estabelecimentos públicos de ensino; d) o oferecimento obrigatório de programas de Educação Especial em nível pré-escolar e escolar, em unidades hospitalares e congêneres nas quais estejam internados, por prazo igual ou superior a um (um) ano, educandos portadores de deficiência; e) o acesso de alunos portadores de deficiência aos benefícios conferidos aos demais educandos, inclusive material escolar, merenda escolar e bolsa de estudo; f) a matrícula compulsória em cursos regulares de estabelecimentos públicos e particulares de pessoas portadoras de deficiência capazes de se integrarem ao sistema regular de ensino. (BRASIL, 1989)

A década de 1990 foi marcada pela implantação de políticas de educação

inclusiva, as instituições escolares passaram a exercer um papel fundamental na garantia de

direitos dos estudantes com deficiência. Neste mesmo ano o Brasil se torna signatário da

Conferência de Educação para Todos.

Em 9 março de 1990 aconteceu a Conferência Mundial sobre Educação para

Todos (Education for All) em Jontiem na Tailândia, que estabelece a educação como um

direito fundamental de todos,universalizando o seu acesso e diminuindo as desigualdades,

tendo como prioridade a melhoria da qualidade de ensino.

Além da preocupação com os altos índices de crianças, adolescentes e jovens sem

escolarização, a Declaração de Jontiem preconiza a educação como objetivo promover o

progresso pessoal e social das pessoas e as modificações necessárias nos sistemas de

ensino para assegurar o acesso e a permanência de todos sem distinção de sexo, raça ou

condição social na escola.

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A Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990, O Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA), segundo Mazzotta (2011) é o “conjunto dos direitos e deveres legalmente

estabelecidos para toda criança e adolescente, portador (a) de deficiência ou não.”

Inicialmente o Estatuto legisla a crianças de zero a 12 anos incompletas, adolescentes de

12 a 18 anos, e de maneira incomum, pessoas de 18 a 21 anos.

O artigo 11 do ECA/90, garante o acesso as ações e serviços para promoção,

proteção e recuperação da saúde, em seu parágrafo 1º e 2º prevê atendimento especializado

a crianças e adolescentes portadores de deficiência, garantindo recursos para o tratamento

gratuito, distribuição de medicamentos, próteses, habilitação e reabilitação.

Em relação à educação, o artigo 54 dispõe que é dever do Estado garantir o acesso

e o atendimento especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente no ensino

comum. No artigo 55 dispõe sobre a obrigatoriedade de pais ou responsáveis em matricular

seus filhos ou pupilos na rede comum de ensino.

Nesta perspectiva, Mazzotta (2011) aponta que o ECA/90 é um grande avanço

para as pessoas com deficiência, uma vez que consolida antigos direitos, mas, poucas vezes

aplicados por falta de mecanismos eficientes. O Estatuto foi uma inovação, pois não

apenas consolidou direitos, como também estabeleceu princípios para a melhoria da

condição de vida das crianças, dos jovens e adultos brasileiros com deficiência .

A Declaração de Salamanca, realizada pela UNESCO entre os dias 7 e 10 de

Junho de 1994, cuja finalidade era identificar os fatores de exclusão escolar a partir de

práticas educacionais que resultam na desigualdade ou exclusão social de diversos

segmentos, e estabelecem que as escolas comuns simbolizem o meio mais eficiente para

combater as práticas discriminatórias. Para que essa medida seja possível:

[...] escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos; além disso, tais escolas provêem uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional. (BRASIL, 1994, p.1)

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 20 de Dezembro de 1996,

LDBEN nº 9.394/96, versa no seu Capítulo V sobre a Educação Especial. Em seu artigo 58

define que a modalidade de Educação Especial deve assegurar o ensino preferencialmente

nas instituições regulares para os educandos com necessidades educacionais especiais, e

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assegura quando necessário serviço de apoio especializado para atendimento dos

estudantes que necessitem de cuidados especiais.

No artigo 59 preconiza que os sistemas de ensino devem assegurar aos estudantes

com necessidades especiais:

I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades; II – terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; III – professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns; IV – educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora. (BRASIL, 1996, p.19)

O Decreto nº 3.298, de 20 de Dezembro de 1999, que regulamenta a Lei nº

7.853/89, dispõem sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de

Deficiência, compreende um conjunto de orientações normativas para assegurar os direitos

individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiência, cabendo aos órgãos do Poder

Público assegurar o cumprimento das normativas visando o bem-estar social, físico e

econômico.

No Capítulo VII, na seção II estabelece o acesso a educação integral e gratuita aos

estudantes portadores de deficiência, equiparando aos demais estudantes e garantindo o seu

ingresso e permanência no ambiente escolar. Além de assegurar o ensino em todos os

níveis, prevê o atendimento especializado para dar apoio pedagógico na escola comum.

Neste mesmo ano, 1999 aconteceu a Convenção da Guatemala, que foi

promulgada no Brasil pelo Decreto nº 3.956/2001 e entrou em vigor em 13 de Junho de

2001, a Convenção Interamericana para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação

Contra as Pessoas com Deficiência, reafirma que as pessoas portadoras de deficiência têm

os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que outras pessoas, inclusive o

direito de não ser submetidas a nenhuma forma de discriminação com base na sua

deficiência.

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Este Decreto tem uma importante atuação no campo educacional, promovendo

uma reestruturação da educação especial, adotando iniciativas para a eliminação de

barreiras que impeçam o acesso a escolarização.

Com base na documentação da Política Nacional de Educação Especial na

Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2014) iremos fazer um breve histórico das leis

que regulam o acesso ao ensino dos portadores de necessidades educacionais especiais.

A Lei nº 10.436/02 reconhece a Língua Brasileira de Sinais – Libras como meio

legal de comunicação e expressão dos surdos, garantindo o seu acesso de forma

institucionalizada para sua propagação, assim como a sua inclusão como parte do currículo

nos cursos de formação de professores e de fonoaudiologia.

A Portaria nº 2.678/02 do MEC aprova as diretrizes e normas para o uso, o

ensino, a produção e a propagação do sistema Braille em todas as modalidades, etapas e

níveis de ensino, compreendendo o projeto da Grafia Braille para a Língua Portuguesa e a

recomendação do seu uso em todo o território nacional.

Em 2003, é implementado pelo MEC o Programa Educação Inclusiva: direito à

diversidade, com o objetivo de apoiar a mudança dos sistemas de ensino comum em

sistemas de ensino inclusivos, promovendo a formação de gestores e educadores em todo

território nacional, garantindo o direito de acesso de todos à escolarização, ao atendimento

educacional especializado e garantindo através desta ação a acessibilidade de todos.

O Acesso de Estudantes com Deficiência às Escolas e Classes Comuns é

publicado em 2004, pelo Ministério Público Federal com o objetivo de propagar os

conceitos e diretrizes mundiais para a inclusão, reafirmando o direito e os benefícios da

escolarização de estudantes com e sem deficiência nas turmas do ensino comum.

Neste viés, o Decreto nº 5.296/04 regulamentou as Leis nº 10.048/00 e nº

10.098/00, na qual estabelece critérios e normas para possiblitar a acessibilidade às pessoas

com deficiência ou com mobilidade reduzida.

O Decreto nº 5.626/05, que regulamenta a Lei nº 10.436/2002, visando o acesso à

escola aos estudantes surdos, inclui a Libras como disciplina curricular, bem como a

formação e a certificação de professor de Libras, instrutor e tradutor/intérprete de Libras, a

Língua Portuguesa como segunda língua para estudantes surdos e a organização da

educação bilíngüe no ensino comum.

Em 2005, com a implantação dos Núcleos de Atividades de Altas

Habilidades/Superdotação – NAAH/S em todos os estados da Federação e no Distrito

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Federal são organizados centros de referência na área das altas habilidades/superdotação

para o atendimento educacional especializado, para a formação continuada de professores e

a orientação às famílias desses estudantes.

Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, é lançado em 2007 tendo como

eixo principal a formação de professores para a educação especial, a criação de salas de

recursos multifuncionais, garantindo a acessibilidade arquitetônica dos prédios escolares,

acesso e a permanência das pessoas com deficiência na educação superior e o

monitoramento do acesso à escola dos favorecidos pelo Beneficio de Prestação Continuada

– BPC. 09).

O Decreto nº 6.094/2007, que estabelecem nas diretrizes do Compromisso Todos

pela Educação, a garantia do acesso e permanência no ensino comum e o atendimento aos

estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas

habilidades/superdotação, garantindo o seu acesso nas escolas públicas.

A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela ONU

em 2006 e legitmar com força de Emenda Constitucional por meio do Decreto Legislativo

n°186/2008 e do Decreto Executivo n°6949/2009, estabelecendo que os Estados devem

proporcionar um sistema de educação inclusiva em todas as modalidades de ensino, em

ambientes que estimulem o desenvolvimento acadêmico e social que seja conciliável com a

meta da plena participação e inclusão, adotando iniciativas para assegurar que:

a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino fundamental gratuito e compulsório, sob alegação de deficiência; b) As pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino fundamental inclusivo, de qualidade e gratuito, em igualdade de condições com as demais pessoas na comunidade em que vivem (Art.24). (BRASIL, 2014)

O Decreto n° 6571/2008, incorporado pelo Decreto n° 7611/2011, institui a

política pública de financiamento no âmbito do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento

da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB,

estabelecendo que estudantes com deficiência, transtorno global de desenvolvimento e

altas habilidades/superdotação possam ter dupla matrícula, deste modo possam freqüentar

o ensino comum e a rede especializada de ensino.

Este Decreto também define o atendimento educacional especializado para a

escolarização do estudante com deficiência e os demais serviços da Educação Especial,

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estabelecendo outras medidas para assegurar a inclusão escolar nos sistema público de

ensino. O Conselho Nacional de Educação – CNE publica a Resolução CNE/CEB,

04/2009, tendo como objetivo orientar a organização dos sistemas educacionais inclusivos,

constituindo as Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado –

AEE na Educação Básica.

A resolução CNE/CEB n°04/2010, que estabelece Diretrizes Curriculares

Nacionais da Educação Básica e recomenda em seu artigo 29, que os sistemas de ensino

público devem matricular os estudantes com deficiência, transtornos globais do

desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas salas do ensino comum e no

Atendimento Educacional Especializado - AEE, oferecendo em salas de recursos

multifuncionais ou em centros de AEE da rede pública ou de instituições comunitárias,

confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos o alicerce para a escolarização dos

estudantes com deficiência.

O Decreto n°7.084/2010, ao ordenar sobre os programas nacionais de materiais

didáticos, estabelece no artigo 28, que o Ministério da Educação adotará mecanismos para

promoção da acessibilidade nos programas de material didático designado aos estudantes

da educação especial e professores das escolas públicas de educação básica.

Decreto n°7.612/2011, o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência

– Viver sem Limite. A Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com

Transtorno do espectro Autista é criada pela Lei nº 12.764/2012.

Além de estabelecer um conjunto de direitos, esta lei em seu artigo 7º, obstrui a

recusa de matrícula à pessoas com qualquer tipo de deficiência e estipula ao gestor escolar

ou autoridade competente punição para quem realizar algum ato discriminatório.

A Lei nº 13.005/2014, que institui o Plano Nacional de Educação – PNE

estabelece que os Municípios, Estados e o Distrito Federal assegurem o atendimento as

necessidades específicas da Educação Especial, garantindo um sistema educacional

inclusivo em todas as modalidades, níveis e etapas de ensino.

A Lei 13.146 de 6 de Julho de 2015 foi baseada na Convenção da ONU sobre os

Direitos das Pessoas com Deficiência de 2007, e foi incorporada a Constituição Federal

com status de Emenda Constitucional, e ficou conhecida como Estatuto da Pessoa

Deficiente.

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O objetivo desta lei é assegurar e promover, em condições de igualdade, o

exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à

sua inclusão social e cidadania.

Apesar de todo amparo legal, ainda não consolidamos os direitos da pessoa com

deficiência, neste sentido Bazílio e Kramer (2011, p.13-14) afirmam que a sociedade

brasileira “vive a extrema contradição entre aquilo que é escrito e o que é vivido, falta

fruição de direitos, fazer valer alguns avanços legais, pois não adianta o texto escrito se

não está incorporada a vida.”

Neste sentido se faz necessário, repensarmos as ações desenvolvidas e

conscientizarmos a sociedade civil em prol dos direitos das pessoas com deficiência,

fazendo com que os direitos assegurados em lei sejam efetivamente cumpridos.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os deficientes historicamente viveram as margens da sociedade, muitas vezes

invisíveis, marginalizados por sua condição física, mental ou sensorial, tendo acesso a

escolarização somente no século XXI, constituído como um direito fundamental para todos

os cidadãos.

Embora seja um direito assegurado por leis e decretos, ainda se evidencia a falta

de efetivação ao acesso a escolarização, que pode ser explicada pelas Convenções,

Decretos e leis na tentativa de legitimar e assegurar esse direito.

Os direitos humanos vêm para garantir condições igualitárias e de promoção

social a todas as pessoas, uma maneira de proteger contra discriminação e o preconceito.

Onde todos possam viver em uma sociedade livre, tendo os seus direitos assegurados é

uma forma de promover o bem comum.

Oportunizar condições igualitárias de acesso ao trabalho, a saúde e a educação

constitui acesso a uma vida digna, diminui a desigualdade e garante a todos as pessoas

independentes de suas condições físicas, sociais e sua plena participação na vida em

sociedade.

Podemos vislumbrar a importância da proteção das pessoas com deficiência,

combater toda forma de exclusão e discriminação por causa da sua condição física, mental

e sensorial constitui em um retrocesso da sociedade.

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O maior desafio que se aponta neste contexto é fazer com que as leis que vigoram

nos meios jurídicos possam ser incorporadas ao cotidiano da população, fazendo com que

se promova o respeito e a erradicação de toda forma de discriminação.

Somente produzir e legislar não garante os direitos das pessoas com deficiência é

necessário educá-las para a compreensão dessas leis e o valor que cada uma delas tem em

poder promover o seu bem-estar. Sendo assim, ter leis sem a sua compreensão não valida o

que está escrito, uma vez que muitos desses direitos se perdem por falta de sua efetivação.

4 REFERÊNCIAS

BAZÍLIO, Luiz Cavalieri; KRAMER, Sonia. Infância, Educação e Direitos Humanos. 4. ED. SÃO PAULO: CORTEZ, 2011.

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