Dissertacao Campello Final

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A PROBLEMÁTICA DA POLUIÇÃO POR ESGOTOS DOMÉSTICOS NO SISTEMA ESTUARINO-LAGUNAR TRAMANDAÍ-ARMAZÉM (RS, BRASIL): FISICA E QUÍMICA DA ÁGUA E A RESPOSTA DOS MACROINVERTEBRADOSBENTÔNICOS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ECOLOGIA LABORATRIO DE ECOLOGIA DE INVERTEBRADOS BENTNICOS

A PROBLEMTICA DA POLUIO POR ESGOTOS DOMSTICOS NO SISTEMA ESTUARINO-LAGUNAR TRAMANDA-ARMAZM (RS, BRASIL): FISICA E QUMICA DA GUA E A RESPOSTA DOS MACROINVERTEBRADOS BENTNICOS

FERNANDO DANTAS CAMPELLO

ORIENTADORA: Dra. NORMA LUIZA WRDIG

BANCA EXAMINADORA: Dr. CARLOS EMLIO BEMVENUTI DOC/FURG Dra. MARIA TERESA RAYA RODRIGUEZ CENECO/UFRGS Dr. LUIZ EMLIO S BRITO DE ALMEIDA IPH/UFRGS

Dissertao apresentada como parte dos requisitos necessrios para obter o grau de Mestre em Ecologia.

PORTO ALEGRE, AGOSTO DE 2006

O esturio de Tramanda visto do Morro da Borssia, em Osrio.

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AGRADECIMENTOS Norma Wrdig, que desde o incio acreditou no meu potencial e aceitou a tarefa de me orientar, sempre dando liberdade para que eu desenvolvesse o estudo minha maneira. A toda a minha famlia, em especial aos meus pais, aos meus tios e minha av, que em muitas ocasies estiveram privados do meu convvio, enquanto eu elaborava e escrevia essa dissertao. Ao Lucas Barbosa Dantas, meu primo, companheiro de todas as sadas de campo e pea fundamental para a viabilidade desse trabalho. Candice Salerno Gonalves, minha namorada, pelas indispensveis ajudas nas sadas de campo, em meio ao esgoto, e por todo o carinho e compreenso sempre dispensados. Simone Caterina Kapusta, pela ajuda na identificao de diversos taxa, pela reviso da parte de bentos, pelas frutferas discusses sobre ecologia bentnica e pelo animado convvio no laboratrio. Ao Jos Feltrin, do Ceclimar, pela amizade e por topar a empreitada de uma semana acordando s cinco da manh para me ajudar a realizar as medies fsicas utilizadas na elaborao do estudo de caso sobre a hidrodinmica estuarina. Ao Osvaldo Machado, do Ceclimar, por ajudar nas coletas de bentos e na identificao dos pontos de esgoto no interior do esturio. Ivone Fausto, pelos emprstimos do fluxmetro e do instrumento de medio de temperatura, salinidade e oxignio dissolvido, alm da ajuda na identificao de alguns decpodos e pela amizade e disposio em me receber no Ceclimar. Ao Jorge Xavier da estao meteorolgica da Superintendncia de Portos e Hidrovias de Imb, por prontamente ceder os dados meteorolgicos e de nvel das guas do esturio. Fundao Estadual de Proteo Ambiental Henrique Luis Roessler (FEPAM), em especial Janine Haase, por fornecer os dados do Programa GERCO/RS. Suzana Freitas, pela ajuda na identificao dos Chironomidae, pelas discusses sobre bentos, pela amizade e pelo timo convvio no laboratrio. amiga Luciana Angonesi, que me ajudou na indentificao dos poliquetas dos gneros Boccardia e Sigambra. Ao Fbio Wiggers, do laboratrio de Malacologia da UFRGS, pela ajuda na identificao do gnero Tellina e por tentar identificar os bivalves jovens. Paula Oliveira, do Museu Oceanogrfico da FURG, pela tentativa de identificao dos bivalves jovens. Vera Souza (Verinha), pelas incontveis ajudas nos assuntos referentes ao laboratrio e pela agradvel convivncia. Ao professor Carlos Emliio Bemvenuti, pelas dicas na elaborao do projeto de mestrado, por disponibilizar a infraestrutura do laboratrio de inveterbrados bentnicos da FURG e pela ajuda na identificao dos amfpodas. Aos professores Nelson Machado e Maria Teresa Rodriguez, pela reviso do projeto de mestrado, dando valisosas dicas. Aos colegas de laboratrio Camila Freitas, Flvio Peixoto, Thiago Silveira, Luis Fernando Guterres e Cynthia Cenzano, por tornarem aquele ambiente de trabalho to agradvel. Aos amigos de Porto Alegre: Tatiana Pereira, Daniela Fuhro, Deize Vargas, Z Eloy, Mariana Viola, Alessandra Carvalho, Tomaz Vital, Ane Hahn, Paulo Bergonci, Tatiana Lucas, Vernica vila, Jorge Soledar, entre tantos outros, que tornaram mais agradvel a vivncia nessa cidade. Aos eternos amigos e amigas de Rio Grande que continuo encontrando, Joo Pedro Demore, Jeison Paiva, Scooby, Michel Gandra, Andr Colling, Mateus Barbosa, Luciano Hermans, Tatiana vila e todos os outros e outras que se espalharam por esse Brasil afora, por tudo o que representaram e continuam representando na minha vida. CAPES, pela bolsa de mestrado. Coordenao do Curso de Ps-Graduao em Ecologia e Silvana Barzotto, pela amizade e pela ateno prestada durante todo o curso. 3

PREFCIO Essa dissertao est dividida em quatro captulos. O primeiro captulo esclarece, de maneira introdutria, aspectos gerais do estudo cujo conhecimento necessrio para uma adequada compreenso dos captulos seguintes. Nesse sentido so apresentadas justificativas, o objetivo geral do trabalho e uma descrio da rea de estudo. O segundo captulo versa sobre as caractersticas hidrodinmicas do sistema estuarinolagunar de Tramanda. O terceiro apresenta a atual situao em que esse sistema se encontra no que se refere contaminao por esgotos de origem cloacal domstica. O quarto captulo relaciona essa contaminao comunidade de macroinvertebrados bentnicos que habita a regio, deduzindo como tais organismos estariam sendo afetados pelos esgotos. Embora o segundo, o terceiro e o quarto captulos possam ser lidos e compreendidos em separado, existe uma estreita relao entre eles que emerge do fato de que as variveis, sejam elas fsicas, qumicas ou biolgicas, apresentam uma interdependncia intrnseca. A ltima parte consiste de uma concluso geral, expondo de forma concisa as constataes sobre o problema da contaminao por esgotos domsticos no esturio de Tramanda.

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NDICE LISTA DE TABELAS .................................................................................................................................................7 LISTA DE FIGURAS .................................................................................................................................................9 RESUMO ................................................................................................................................................................14 ABSTRACT.............................................................................................................................................................15 CAPTULO 1: ASPECTOS GERAIS .......................................................................................................................16 1.1 INTRODUO GERAL .................................................................................................................................17 1.2 OBJETIVO GERAL .......................................................................................................................................20 1.3 REA DE ESTUDO.......................................................................................................................................20 CAPTULO 2: COMPORTAMENTO HIDRODINMICO DO SISTEMA ESTUARINO-LAGUNAR TRAMANDAARMAZM ..............................................................................................................................................................26 2.1 INTRODUO..............................................................................................................................................27 2.2 OBJETIVOS..................................................................................................................................................32 2.3 METODOLOGIA ...........................................................................................................................................32 2.4 RESULTADOS E DISCUSSO.....................................................................................................................40 2.4.1 Transformada Rpida de Fourier, anlise harmnica e filtragens .........................................................40 2.4.2 Estudo de caso: monitoramento do comportamento hidrodinmico no sistema estuarino-lagunar de Tramanda durante seis dias consecutivos.....................................................................................................46 2.4.2.1 Primeiro dia 08/03/2005 ..............................................................................................................50 2.4.2.2 Segundo dia 09/03/2005 .............................................................................................................52 2.4.2.3 Terceiro dia 10/03/2005 ..............................................................................................................55 2.4.2.4 Quarto dia 11/03/2005.................................................................................................................58 2.4.2.5 Quinto dia 12/03/2005 .................................................................................................................60 2.4.2.6 Sexto dia 13/03/2005 ..................................................................................................................62 2.4.3 Temperatura e salinidade......................................................................................................................62 2.5 CONCLUSES.............................................................................................................................................64 CAPTULO 3: SITUAO ATUAL DA CONTAMINAO POR ESGOTOS DOMSTICOS NO ESTURIO DE TRAMANDA ...........................................................................................................................................................67 3.1 INTRODUO..............................................................................................................................................68 3.2 OBJETIVOS..................................................................................................................................................74 3.3 METODOLOGIA ...........................................................................................................................................74 3.3.1 Dados cedidos pela FEPAM..................................................................................................................74 3.3.2 Dados levantados durante esse estudo..............................................................................................78 3.3.3 Anlise dos dados ..............................................................................................................................84 3.4 RESULTADOS E DISCUSSO.....................................................................................................................86 3.4.1 Dados cedidos pela FEPAM..................................................................................................................86 3.4.1.1 Condies mdias..........................................................................................................................86 3.4.1.2 Variao sazonal: vero - inverno..................................................................................................99 3.4.2 Dados levantados durante esse estudo............................................................................................112 3.4.2.1 Levantamento dos pontos de liberao de esgoto domstico...................................................112 3.4.2.2 Anlises qumicas .....................................................................................................................126 3.4.2.3 Vazo dos efluentes..................................................................................................................137 3.5 CONCLUSES...........................................................................................................................................139

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CAPTULO 4: RESPOSTA DA MACROFAUNA BENTNICA CONTAMINAO POR ESGOTOS DOMSTICOS NO SISTEMA ESTUARINO-LAGUNAR TRAMANDA-ARMAZM..............................................143 4.1 INTRODUO............................................................................................................................................144 4.2 OBJETIVOS................................................................................................................................................146 4.3 MATERIAL E MTODOS ............................................................................................................................146 4.3.1 Desenho amostral e mtodos de campo e de laboratrio ...................................................................146 4.3.2 Anlise dos dados ...............................................................................................................................150 4.4 RESULTADOS E DISCUSSO...................................................................................................................154 4.4.1 Caractersticas sedimentares dos pontos de amostragem...............................................................154 4.4.2 Demais variveis ambientais ............................................................................................................160 4.4.3 Macroinvertebrados bentnicos........................................................................................................162 4.5 CONCLUSO .............................................................................................................................................183 CONCLUSO GERAL ..........................................................................................................................................185 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS......................................................................................................................188

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LISTA DE TABELAS Tabela 2.1: Algumas das principais componentes da mar astronmica, seus smbolos e seus perodos.......... Tabela 2.2: Coordenadas geogrficas e profundidade media de cada ponto de amostragem............................. Tabela 2.3: Horrios em que cada medida foi tomada durante os cinco dias de amostragem............................. Tabela 2.4: Sntese dos resultados da anlise harmnica sobre a srie de nvel da gua medida no esturio de Tramanda entre 08/03/05 a 13/03/05, revelando as componentes obtidas, suas freqncias, amplitudes e fases.................................................................................................................................... Tabela 2.5: Coeficientes de correlao de Pearson para os valores de intensidade e direo da corrente medidos entre 08/03/05 a 12/03/05 nos cinco pontos de amostragem do esturio de Tramanda.......... Tabela 2.6: Valores mdios de intensidade da corrente (em mdulo) medidos entre 08/03/05 a 12/03/05 nos cinco pontos de amostragem do esturio de Tramanda.......................................................................... Tabela 3.1: Denominao, localizao e coordenadas geogrficas para os oito pontos de monitoramento da FEPAM includos nesse estudo................................................................................................................ Tabela 3.2: Critrios utilizados para a deteco da presena de esgoto domstico e para a classificao dos pontos de amostragem em cada uma das trs categorias....................................................................... Tabela 3.3: Metodologias, referncias e limites de deteco (LD) aplicados por cada laboratrio de anlises qumicas.................................................................................................................................................... Tabela 3.4: Datas em que foram efetuadas medidas de vazo nos diferentes pontos amostrados. O smbolo X indica que a medio foi realizada........................................................................................................ Tabela 3.5: Valores mdios, mximos, mnimos e desvios padro para as variveis monitoradas pela FEPAM entre 1993 e 2005, considerando o sistema estuarino-lagunar de Tramanda como um todo (incluindo todos os oito locais de amostragem)....................................................................................................... Tabela 3.6: Sistema de classificao de guas proposto por Smayda (1983), baseado nos valores de salinidade e adotado nesse estudo.......................................................................................................... Tabela 3.7: Matriz de correlaes de Pearson entre as variveis para os dados medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 em todos os pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda.............. Tabela 3.8: Autovalores e percentuais de variao explicados por cada componente (CP) para o conjunto de dados medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005...................................................................................... Tabela 3.9: Correlaes das variveis com o cinco primeiros componentes extrados na anlise de componentes principais sobre os dados medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005................................. Tabela 3.10: Resultados da anlise de varincia para cada uma das variveis medidas pela FEPAM no esturio de Tramanda entre 1993 e 2005, considerando os grupos inverno e vero. .................................................................................................................................................................. Tabela 3.11: Valores mdios de salinidade, nos perodos de inverno (I) e vero (V), para cada ponto de amostragem da FEPAM no esturio de Tramanda, considerando os dados medidos entre 1993 e 2005.......................................................................................................................................................... Tabela 3.12: Coeficientes de correlao de Pearson, para a estao de vero, entre as variveis medidas pela FEPAM de 1993 a 2005 no esturio de Tramanda.......................................................................... Tabela 3.13: Coeficientes de correlao de Pearson, para a estao de inverno, entre as variveis medidas pela FEPAM de 1993 a 2005 no esturio de Tramanda.......................................................................... Tabela 3.14: Coordenadas geogrficas, localizao, tipo de estrutura, municpio e categorias de contaminao para os pontos de drenagem de gua para o interior do esturio, identificados durante levantamento realizado nas margens urbanizadas dos municpios de Imb e Tramanda...................... Tabela 3.15: Valores mdios gerais, para as diferentes formas de nitrognio, medidos entre novembro de 2004 e abril de 2005 nos cinco pontos de amostragem do esturio de Tramanda, comparando essas concentraes com valores encontrados na bibliografia.......................................................................... 31 33 35

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86 87 100 101 102

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Tabela 3.16: Valores mdios gerais, para fsforo total e ortofosfato, medidos entre novembro de 2004 e abril de 2005 nos cinco pontos de amostragem do esturio de Tramanda, comparando essas concentraes com valores encontrados na bibliografia.......................................................................... Tabela 3.17: Vazes mdias dos efluentes calculadas para os seis pontos de amostragem localizados nos municpios de Imb e Tramanda............................................................................................................. Tabela 3.18: Concentraes mdias e quantidade aproximada de cada composto liberada por ano no esturio atravs dos esgotos de Tramanda e Imb................................................................................. Tabela 4.1: Denominao, localizao, tipo de ambiente, distncia da margem e coordenadas geogrficas dos pontos de amostragem de macroinvertebrados bentnicos.............................................................. Tabela 4.2: Classificao do dimetro mdio dos gros, segundo Folk e Ward (1957), para as amostras de sedimento coletadas nos pontos de esgoto e de referncia de Tramanda, Imb e Pontal..................... Tabela 4.3: Classificao do grau de seleo, segundo Folk e Ward (1957), para as amostras de sedimento coletadas nos pontos de esgoto e de referncia de Tramanda, Imb e Pontal....................................... Tabela 4.4: Classificao do grau de assimetria, segundo Folk e Ward (1957), para as amostras de sedimento coletadas nos pontos de esgoto e de referncia de Tramanda, Imb e Pontal..................... Tabela 4.5: Percentuais de matria orgnica presentes nas amostras de sedimento coletadas nos pontos de esgoto e de referncia de Tramanda, Imb e Pontal nas amostragens de novembro de 2004 e janeiro, fevereiro e abril de 2005.............................................................................................................. Tabela 4.6: Valores de pH medidos nos pontos de esgoto e de referncia de Tramanda, Imb e Pontal nas amostragens de novembro de 2004 e janeiro, fevereiro e abril de 2005.................................................. Tabela 4.7: Lista dos taxa de macroinvertebrados bentnicos coletados nas amostragens de bentos efetuadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005....................................... Tabela 4.8: Avaliao qualitativa (presena ou ausncia) dos 16 taxa da macrofauna (desconsiderando as espcies raras), nos 10 pontos de amostragem situados no esturio de Tramanda, ao longo dos quatro meses amostrados (novembro de 2004, janeiro de 2005, fevereiro de 2005 e abril de 2005)..... Tabela 4.9: Densidade mdia de organismos dos 16 taxa da macrofauna (desconsiderando as espcies raras) nos 10 pontos amostrados entre novembro de 2004 e abril de 2005 no esturio de Tramanda.. Tabela 4.10: Resultado da rotina Simper, caracterizando as espcies que mais contriburam para a similaridade das amostras dentro de cada um dos grupos...................................................................... Tabela 4.11: Resultados da anlise de varincia para os valores de riqueza das amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005..................................................................................................................................................... Tabela 4.12: Resultados dos testes de contrastes para os valores de riqueza das amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005..................................................................................................................................................... Tabela 4.13: Resultados da anlise de varincia para o logaritmo da densidade das amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005..................................................................................................................................................... Tabela 4.14: Resultados dos testes de contrastes para o logaritmo da densidade das amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005..................................................................................................................................................... Tabela 4.15: Resultados da anlise de varincia para os ndices de diversidade de Shannon das amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005.....................................................................................................................................................

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LISTA DE FIGURAS Figura 1.1: rea de abrangncia da Bacia Hidrogrfica do Rio Tramanda.......................................................... Figura 1.2: Localizao da rea de estudo, detalhando a Lagoa de Tramanda, a Lagoa Armazm, o Canal Camaro, o Rio Tramanda, a Lagoa das Custdias e os municpios de Tramanda e Imb.................. Figura 2.1: Localizao dos pontos de amostragem no interior do esturio......................................................... Figura 2.2: Desenho esquemtico da montagem do fluxmetro no cabo para efetuar as medies de velocidade da corrente.............................................................................................................................. Figura 2.3: Peridogramas para as sries de temperatura do ar, umidade relativa, presso atmosfrica e nvel da gua, medidos na estao hidro-meteorolgica da SPH em Imb no perodo entre 08/03/2005 e 13/03/2005................................................................................................................................................ Figura 2.4: Srie representativa da ao da mar astronmica reconstituda pela anlise harmnica (em rosa) e srie de oscilaes de perodo menor que 25 horas isolada atravs da aplicao do filtro Butterworth com freqncia de corte de 0,04 ciclos por hora (em azul). Resultados obtidos a partir da srie de nvel da gua medida no esturio de Tramanda entre 08/03/05 e 13/03/05............................. Figura 2.5: Srie original de nvel da gua medida no canal de acesso ao oceano do esturio de Tramanda durante os dias 08/03/05 a 13/03/05 e sries subtidal (submar), diurna e semi-diurna, obtidas atravs da filtragem da srie original com um filtro Butterworth............................................................... Figura 2.6: Srie original de nvel medida no esturio de Tramanda no perodo de 08/03/05 a 13/03/05, sries calculadas para as componentes subtidal (submar), diurna e semi-diurna e velocidades de corrente medidas em superfcie e no fundo no ponto Rio Tramanda.................................................................... Figura 2.7: Srie original de nvel medida no esturio de Tramanda no perodo de 08/03/05 a 13/03/05, sries calculadas para as componentes subtidal (submar), diurna e semi-diurna e velocidades de corrente medidas em superfcie e no fundo no ponto Ceclimar.............................................................................. Figura 2.8: Srie original de nvel medida no esturio de Tramanda no perodo de 08/03/05 a 13/03/05, sries calculadas para as componentes subtidal (submar), diurna e semi-diurna e velocidades de corrente medidas em superfcie e no fundo no ponto Ponte................................................................................... Figura 2.9: Srie original de nvel medida no esturio de Tramanda no perodo de 08/03/05 a 13/03/05, sries calculadas para as componentes subtidal (submar), diurna e semi-diurna e velocidades de corrente medidas em superfcie e no fundo no ponto Rodoviria........................................................................... Figura 2.10: Srie original de nvel medida no esturio de Tramanda no perodo de 08/03/05 a 13/03/05, sries calculadas para as componentes subtidal (submar), diurna e semi-diurna e velocidades de corrente medidas em superfcie e no fundo no ponto Camaro............................................................... Figura 2.11: Valores de salinidade medidos em superfcie e no fundo no perodo de 08/03/05 a 12/03/05 para os cinco pontos de amostragem do esturio de Tramanda..................................................................... Figura 2.12: Imagem em infravermelho do satlite geoestacionrio Goes 12 obtida s 04:00 (horrio local) do dia 09/03/2005, evidenciando que um sistema frontal (linha de nuvens que se estende da Bolvia ao Oceano Atlntico, passando sobre o Rio Grande do Sul) atingiu a rea de estudo na madrugada daquele dia............................................................................................................................................... Figura 2.13: Comportamento da temperatura na superfcie e no fundo entre 08/03/05 e 12/03/05 nos cinco pontos de amostragem do esturio de Tramanda................................................................................... Figura 2.14: Diagrama T-S para as mdias dirias de temperatura e salinidade calculadas a partir dos dados medidos entre 08/03/05 e 12/03/05 nos cinco pontos de amostragem do esturio de Tramanda.......... Figura 3.1: Sistema de esgotos sanitrios de Tramanda: rea abrangida pela rede de coleta (polgono vermelho claro), trajeto do emissrio (linha vermelho escuro) e a localizao da estao de tratamento (polgono laranja hachurado).................................................................................................. Figura 3.2: Posicionamento dos oito pontos de monitoramento da FEPAM em relao ao sistema estuarinolagunar de Tramanda............................................................................................................................... 21 25 33 37

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Figura 3.3: Regresso linear entre as variveis salinidade e condutividade, mostrando a equao da reta e o valor de r. Valores de condutividade em S/cm...................................................................................... Figura 3.4: rea percorrida pelo levantamento de campo para deteco dos pontos potencialmente lanadores de efluentes domsticos no esturio...................................................................................... Figura 3.5: Localizao dos pontos de amostragem de gua para as anlises qumicas. IE = ponto de esgoto em Imb; IR = ponto de referncia em Imb; TR = ponto de referncia em Tramanda; TE = ponto de esgoto em Tramanda; PR = ponto de referncia no pontal..................................................................... Figura 3.6: Exemplos ilustrando os tipos de estruturas por vezes utilizadas nas canaletas a cu aberto das redes de drenagem pluvial dos municpios de Tramanda e Imb para garantir as condies de largura e profundidade constantes e para delimitar a distncia de cronometragem da parcela de gua.......................................................................................................................................................... Figura 3.7: Mdias, desvios padres e valores mximos e mnimos para os valores de temperatura da gua medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 nos pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda................................................................................................................................................. Figura 3.8: Mdias, desvios padres e valores mximos e mnimos para os valores de transparncia da gua medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 nos pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda................................................................................................................................................. Figura 3.9: Mdias, desvios padres e valores mximos e mnimos para os valores de oxignio dissolvido medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 nos pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda................................................................................................................................................. Figura 3.10: Mdias, desvios padres e valores mximos e mnimos para os valores de pH medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 nos pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda................................................................................................................................................. Figura 3.11: Mdias Mdias, desvios padres e valores mximos e mnimos para os valores de salinidade medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 nos pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda................................................................................................................................................. Figura 3.12: Mdias, desvios padres e valores mximos e mnimos para os valores de fsforo total medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 nos pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda................................................................................................................................................. Figura 3.13: Mdias, desvios padres e valores mximos e mnimos para os valores de nitrognio amoniacal medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 nos pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda................................................................................................................................................. Figura 3.14: Mdias, desvios padres e valores mximos e mnimos para os valores de coliformes medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 nos pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda................................................................................................................................................. Figura 3.15: Mdias, desvios padres e valores mximos e mnimos para os valores de demanda bioqumica de oxignio medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 nos pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda............................................................................................................................ Figura 3.16: Agrupamento, de acordo com a salinidade, dos pontos de amostragem da FEPAM situados na regio estuarina de Tramanda, a partir dos dados medidos entre 1993 e 2005, revelando a existncia de trs sub-ambientes............................................................................................................................... Figura 3.17: Agrupamento das variveis, com base nos valores mdios dos dados medidos entre 1993 e 2005 pela FEPAM, considerando todos os pontos de amostragem situados na regio estuarina de Tramanda (GER14 a GER21).................................................................................................................. Figura 3.18: Agrupamento dos pontos de amostragem da FEPAM situados na regio estuarina de Tramanda, a partir dos dados medidos entre 1993 e 2005, incluindo todas as variveis..........................................

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Figura 3.19: Disposio espacial das variveis em relao aos dois primeiros componentes (fatores) obtidos atravs da anlise de componentes principais realizada sobre o conjunto de dados levantados pela FEPAM no esturio de Tramanda entre 1993 e 2005. O primeiro fator representa o efeito da sazonalidade, enquanto que o segundo indica principalmente a influncia marinha............................... Figura 3.20: Disposio espacial dos pontos de amostragem em relao aos dois primeiros componentes (fatores) obtidos atravs da anlise de componentes principais realizada sobre o conjunto de dados levantados pela FEPAM no esturio de Tramanda entre 1993 e 2005................................................... Figura 3.21: Disposio espacial dos pontos de amostragem em relao aos dois primeiros componentes (fatores) obtidos atravs da anlise de componentes principais realizada sobre o conjunto de dados levantados pela FEPAM no esturio de Tramanda entre 1993 e 2005. As letras indicam a estao do ano em que cada amostra foi obtida (V=vero; I=inverno)....................................................................... Figura 3.22: Disposio espacial das variveis em relao ao segundo e terceiro componentes obtidos atravs da anlise de componentes principais realizada sobre o conjunto de dados levantados pela FEPAM no esturio de Tramanda entre 1993 e 2005. O segundo fator descreve a influncia marinha, enquanto que o terceiro representa predominantemente a perturbao por esgotos domsticos........... Figura 3.23: Disposio espacial dos pontos de amostragem em relao ao segundo e terceiro componentes obtidos atravs da anlise de componentes principais realizada sobre o conjunto de dados levantados pela FEPAM no esturio de Tramanda entre 1993 e 2005. As letras indicam a estao do ano em que cada amostra foi obtida (V=vero; I=inverno)....................................................................... Figura 3.24: Disposio espacial dos pontos de amostragem em relao ao segundo e terceiro componentes (fatores) obtidos atravs da anlise de componentes principais realizada sobre o conjunto de dados levantados pela FEPAM no esturio de Tramanda entre 1993 e 2005................................................... Figura 3.25: Mdias, intervalos de confiana de 95% e valores mximos, mnimos e extremos, nos perodos de inverno (I) e vero (V), para cada varivel medida pela FEPAM no esturio de Tramanda entre 1993 e 2005.............................................................................................................................................. Figura 3.26: Localizao dos pontos de drenagem de gua para o interior do esturio identificados durante levantamento realizado nas margens urbanizadas dos municpios de Imb e Tramanda. Xis vermelho: pontos muito contaminados; cruz amarela: pontos pouco contaminados; crculo verde: pontos no contaminados. A rea hachurada em amarelo representa a parcela de Tramanda beneficiada pelo sistema de coleta e tratamento de esgotos, enquanto que as linhas azuis indicam as redes de drenagem pluvial dos municpios............................................................................................... Figura 3.27: Localizao dos pontos de drenagem de gua para o interior do esturio situados no municpio de Imb. Xis vermelho: pontos muito contaminados; cruz amarela: pontos pouco contaminados; crculo verde: pontos no contaminados. As linhas azuis indicam parte da rede de drenagem pluvial do municpio.............................................................................................................................................. Figura 3.28: Localizao dos pontos de drenagem de gua situados no municpio de Tramanda. Xis vermelho: pontos muito contaminados; cruz amarela: pontos pouco contaminados; crculo verde: pontos no contaminados. As linhas azuis indicam o percurso da rede de drenagem pluvial do municpio................................................................................................................................................... Figura 3.29: Ponto #2. Cano de concreto que drena gua pluvial e esgoto domstico provenientes do canal a cu aberto que percorre o canteiro central da Avenida Santa Rosa, no municpio de Imb.................... Figura 3.30: Foto superior: ponto #3, situado no final da Rua Sapiranga, no municpio de Imb e classificado como muito contaminado. Foto inferior: ponto #27, situado no final da Rua Francisco Caetano de Azevedo, no municpio de Tramanda......................................................................................................

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Figura 3.31: Foto superior: ponto #28. Canaleta a cu aberto situada no final da Rua Joo Pessoa, prximo antiga estao rodoviria de Tramanda. Foto inferior: ponto #29. Canaleta a cu aberto localizada na interseco da Rua Ernesto Nunes Bandeira com a Avenida Rubem Berta, em Tramanda. Ambos classificados como muito contaminados................................................................................................... Figura 3.32: Ponto #32, situado no final da Rua Josephino Nunes dos Santos e classificado como muito contaminado. As fotos exibem dois ngulos diferentes do mesmo local e mostram o descaso com a questo ambiental..................................................................................................................................... Figura 3.33: Foto superior: ponto #35, localizado no fim da Rua Apolinrio Alves dos Santos. Foto inferior: ponto #39, situado no final da Rua Frana. Ambos os pontos localizam-se no municpio de Tramanda e foram classificados como muito contaminados...................................................................................... Figura 3.34: Valores mdios de temperatura da gua, pH, salinidade e oxignio dissolvido medidos no esturio de Tramanda, em pontos de esgoto e de referncia, entre novembro de 2004 e abril de 2005, em situaes de alta e a baixa temporada de veraneio................................................................. Figura 3.35: Valores mdios de DBO e DQO medidos no esturio de Tramanda, em pontos de esgoto e de referncia, entre novembro de 2004 e abril de 2005, em situaes de alta e a baixa temporada de veraneio.................................................................................................................................................... Figura 3.36: Concentraes mdias das diferentes formas de nitrognio medidas no esturio de Tramanda, em pontos de esgoto e de referncia, entre novembro de 2004 e abril de 2005, em situaes de alta e a baixa temporada de veraneio................................................................................................................. Figura 3.37: Propores relativas das diferentes formas de nitrognio em relao concentrao total desse elemento. N-amon: nitrognio amoniacal; NTO: nitrognio total oxidado; N-org: nitrognio orgnico..... Figura 3.38: Concentraes mdias de fsforo total e de ortofosfato medidas no esturio de Tramanda, em pontos de esgoto e de referncia, entre novembro de 2004 e abril de 2005, em situaes de alta e a baixa temporada de veraneio................................................................................................................... Figura 3.39: Concentraes mdias de coliformes fecais medidas no esturio de Tramanda, em pontos de esgoto e de referncia, entre novembro de 2004 e abril de 2005, em situaes de alta e a baixa temporada de veraneio............................................................................................................................. Figura 3.40: Concentraes mdias de fsforo total e nitrognio amoniacal medidas na coluna dgua no sistema estuarino de Tramanda ao longo dos ltimos doze anos (com base nos dados levantados pela FEPAM). A linha preta indica a tendncia, calculada atravs de regresso linear........................... Figura 4.1: Localizao das unidades amostrais e dos respectivos pontos de amostragem de invertebrados bentnicos no esturio de Tramanda...................................................................................................... Figura 4.2: Ilustrao do desenho amostral utilizado nas coletas de macroinvertebrados bentnicos, exibindo duas unidades amostrais, uma no ambiente esgoto e outra no referncia. Cada unidade amostral formada por dois pontos amostrais situados a diferentes distncias da margem e cada ponto composto por cinco rplicas biolgicas e uma para anlise sedimentar.................................................. Figura 4.3: Diagrama de Shepard para as amostras de sedimento coletadas nos pontos de esgoto e de referncia de Tramanda, Imb e Pontal nas amostragens de novembro de 2004 e janeiro, fevereiro e abril de 2005............................................................................................................................................. Figura 4.4: Curvas de freqncia para as amostras de sedimento coletadas nos pontos de esgoto e de referncia de Tramanda, Imb e Pontal nas amostragens de novembro de 2004 e janeiro, fevereiro e abril de 2005............................................................................................................................................. Figura 4.5: Diagrama T-S para os dados medidos nos pontos de esgoto e de referncia de Tramanda, Imb e Pontal nas amostragens de novembro de 2004 e janeiro, fevereiro e abril de 2005.............................

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Figura 4.6: Precipitao pluviomtrica para o municpio de Imb, de acordo com os dados da estao meteorolgica da Superintendncia de Portos e Hidrovias. Em azul hachurado os dados de precipitao mdia mensal entre os anos de 1951 e 2000 (normal climatolgica) e em vermelho slido os acumulados mensais para o vero de 2004/2005..................................................................... Figura 4.7: Resultado da anlise de correspondncia para as amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005....................................... Figura 4.8: Contribuio relativa (percentual) de cada espcie por ponto e ms de amostragem, bem como densidades e nmero de espcies verificadas em cada ponto, para as amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005..................................................................................................................................................... Figura 4.9: Variao temporal da riqueza para as amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas em pontos de esgoto e de referncia no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005.. Figura 4.10: Variao temporal da densidade para as amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas em pontos de esgoto e de referncia no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005.......................................................................................................................................................... Figura 4.11: Resultado da anlise de agrupamento para as amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005....................................... Figura 4.12: Resultado da anlise MDS para as amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005............................................................. Figura 4.13: Histogramas para os valores de diversidade de Shannon, riqueza e logaritmo da densidade calculados para as amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005, revelando distribuies prximas normalidade.................... Figura 4.14: Visualizao grfica da anlise de varincia para os valores de riqueza das amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005..................................................................................................................................................... Figura 4.15: Visualizao grfica da anlise de varincia para o logaritmo da densidade das amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005..................................................................................................................................................... Figura 4.16: Visualizao grfica da anlise de varincia para os ndices de diversidade de Shannon das amostras de macroinvertebrados bentnicos coletadas no esturio de Tramanda entre novembro de 2004 e abril de 2005.................................................................................................................................

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RESUMO O esturio de Tramanda, por localizar-se prximo Regio Metropolitana de Porto Alegre, maior aglomerado urbano do Estado do Rio Grande do Sul, recebe forte presso antrpica devido ao turismo e ao crescimento desordenado dos municpios de Imb e Tramanda, situados s suas margens, sendo a contaminao por esgotos domsticos um dos problemas mais evidentes. O presente trabalho visou compreender esse problema em trs etapas: estudo das principais forantes hidrodinmicas no esturio; caracterizao fsico-qumica das guas estuarinas, com levantamento dos pontos potencialmente liberadores de efluente e anlise qumica e de vazo dos esgotos; anlise dos efeitos provocados pelos esgotos sobre a macrofauna bentnica estuarina. As caractersticas hidrodinmicas foram estudadas atravs da aplicao, sobre uma srie temporal de nvel da gua, de tcnicas de anlise espectral, como a Transformada Rpida de Fourier, a anlise harmnica e a decomposio atravs de um filtro Butterworth, e de um monitoramento das correntes, temperatura e salinidade durante cinco dias, trs vezes ao dia, em cinco pontos diferentes. Para a caracterizao fsico-qumica, dados de temperatura da gua, oxignio dissolvido, transparncia, coliformes, salinidade, P-total, N-amoniacal e DBO medidos pela FEPAM entre 1993 e 2005 foram examinados atravs de anlises de agrupamento e componentes principais e de anlise de varincia. Para o levantamento dos esgotos foram percorridas as margens urbanizadas dos municpios de Imb e Tramanda, classificando os pontos qualitativamente como no contaminados, pouco contaminados e muito contaminados. As anlises qumicas foram realizadas em dois pontos de esgoto considerados muito contaminados, um em Imb e um em Tramanda e em trs pontos de referncia, um em Imb, um em Tramanda e um no pontal arenoso que divide as lagunas Tramanda e Armazm. Foram realizadas ainda medidas de vazo em seis pontos de esgoto de ambos os municpios. As amostras de macroinvertebrados bentnicos foram coletadas nos mesmos pontos de esgoto de referncia das coletas de gua para as anlises qumicas. Os dados foram examinados atravs de anlises de correspondncia, agrupamento, escalonamento multidimensional no mtrico e de anlise de varincia. Trs oscilaes atuam como as principais forantes hidrodinmicas no esturio: componente semi-diurna da mar astronmica, componente diurna da mar astronmica e componente submar, que resulta de fenmenos meteorolgicos. O monitoramento das correntes, temperatura e salinidade demonstrou como a interao entre as forantes governa os movimentos de gua no interior do esturio de Tramanda. Os resultados da caracterizao fsico-qumica indicam que no vero as guas estuarinas so mais quentes, apresentam menor concentrao de oxignio dissolvido, maior transparncia, maior nmero de coliformes e maior pH, enquanto que salinidade, Ptotal, N-amoniacal e DBO no apresentam um padro sazonal. Foram identificados no total 45 pontos potencialmente lanadores de efluentes, sendo 19 classificados como muito contaminados, 6 como pouco contaminados e 20 como no contaminados, sendo que Tramanda, apresenta mais pontos sob contaminao, quando comparada a Imb. Entre os dois pontos muito contaminados selecionados para as anlises qumicas, porm, o de Imb mostrou maior grau de contaminao do que o situado em Tramanda. As anlises de vazo revelaram que o volume de esgotos despejado no esturio ao ano de aproximadamente 42258m, inserindo em torno de 9t/ano de nitrognio e 0,87t/ano fsforo. Quanto ao bentos, detectou-se que Laeonereis acuta, Heteromastus similis e Heleobia australis so as espcies mais resistentes aos esgotos, enquanto que os crustceos parecem ser mais sensveis. Os pontos sob influncia de esgotos apresentaram menor densidade de organismos e menor riqueza a partir do incio da temporada de veraneio, sugerindo um maior aporte de esgotos devido ao aumento populacional provocado pelo turismo. Tais impactos foram significativos apenas nos pontos mais prximos liberao dos efluentes.

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ABSTRACT The estuary of Tramanda, located near to Porto Alegre, the largest city in Rio Grande do Sul State, receives intense anthropogenic pressure due to the tourism and the growth of Tramanda and Imb cities along its margins. One of the most evident problems is the contamination by sewage. This study aims to understand that problem in three ways: studying the main hydrodynamic forces in the estuary; undertaking a physiochemical characterization of the estuarine waters, including a survey for sewage outfalls and the measurement of sewage flows; analyzing the sewage effects on the benthic macrofauna. The hydrodynamic characteristics were studied by applying Fast Fourier Transform, harmonic analysis and a Butterworth filter on a water level time series, and by monitoring the currents, water temperature and salinity for five days, three times a day, in five different points inside the estuary. The physiochemical characterization was carried out on water temperature, dissolved oxygen, transparency, coliforms, salinity, total phosphorus, ammonia and BOD data measured by FEPAM between 1993 and 2005, analyzed through cluster and principal components analysis and analysis of variance. The survey for sewage outfalls was accomplished in the urbanized margins of Imb and Tramanda municipalities. The points were classified as no contaminated, little contaminated and very contaminated. Two very contaminated sewage outfalls (the first one in Imb and the other in Tramanda) and in three reference places (Imb, Tramanda and the last one in the sand spit that separates Tramanda lagoon from Armazm lagoon) were chosen for chemical analyses. Measures of sewage flow were also accomplished in six outfalls located in both municipalities. The samples of benthic macrofauna were collected in the same sewage and reference points chosen for the chemical analyses. Benthic data were examined through correspondence analyses, cluster analysis, nonmetric multidimensional scaling and analysis of variance. Three oscillations were the main hydrodynamic forces in the estuary: semidiurnal component of the astronomical tide, diurnal component of the astronomical tide and subtidal component, that results from meteorological phenomena. The monitoring of currents, water temperature and salinity showed how the interaction among the forces governs the movements of water inside the estuary of Tramanda. The results of the physiochemical characterization indicate that in the summer the estuarine waters are hotter, show less concentration of dissolved oxygen, higher transparency, higher number of coliforms and higher pH, while salinity, total phosphorus, ammonia and BOD don't show a seasonal pattern. A total of 45 outfalls were identified; 19 were classified as very contaminated, 6 as little contaminated and 20 as no contaminated. Tramanda presents more points under contamination than Imb. However, among the two very contaminated outfalls selected for the chemical analyses, the one located in Imb showed a larger degree of contamination than the outfalls located in Tramanda. The flow measurements revealed that the volume of sewage spilled in the estuary is approximately 42258m/year, inserting about 9t/year of nitrogen and 0,87t/year of phosphorus. Regarding the benthic macrofauna, it was detected that Laeonereis acuta, Heteromastus similis and Heleobia australis are the most resistant species to the sewage, while peracarid crustaceans seem to be more sensitive. The points under influence of sewage showed smaller densities of organisms and smaller richness than reference points. These impacts started in the beginning of the summer vacation season, suggesting an increase of sewage due to the population raise because of tourism, and were significant only in the points nearest to the sewage outfalls.

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CAPTULO 1: ASPECTOS GERAIS

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1.1 INTRODUO GERAL Hoje, no mundo, encontra-se 3,5 vezes mais pessoas do que havia no incio do sculo XX e o dobro da populao presente em 1960 (U.S Census Bureau, 2004). O forte crescimento populacional observado de 1960 para c traz consigo conseqncias hostis, como um aumento na demanda por recursos (matrias primas, alimentos, manufaturados, ou mesmo financeiros), um acrscimo na produo de rejeitos (resduos slidos e lquidos) e uma maior competio pela ocupao do espao. Mais da metade da populao mundial (estimada em 6 bilhes de pessoas em 1999) e dois teros das principais cidades do mundo esto localizadas na zona costeira. Alm disso, as populaes costeiras tm mostrado crescimento mais acelerado do que as que residem no interior dos continentes (Cicin-Sain e Knecht, 1998). A procura do ser humano pelo litoral resulta de vrias causas, entre as quais, a facilidade de acesso (os oceanos so vias navegveis capazes de unir municpios, pases e continentes, sendo que grande parte das cidades hoje existentes foram colonizadas a partir de travessias ocenicas), a grande disponibilidade de recursos (podem ser explorados tanto recursos marinhos quanto terrestres) e a beleza da paisagem (o litoral o destino de milhes de turistas e apresenta um apelo ao cio). A presso sobre o ambiente costeiro provocada pelo crescimento demogrfico tem sido o alvo de crescentes preocupaes por parte de vrios setores da sociedade. Esturios, particularmente, so regies onde as presses provocadas pela expanso urbana tm se mostrado evidentes, merecendo uma ateno especial (Garrison, 1995). Um esturio pode ser definido como um corpo de gua costeiro semifechado com ligao livre com o oceano aberto, estendendo-se rio acima at o limite da influncia da mar, sendo que em seu interior a gua do mar mensuravelmente diluda pela gua doce oriunda da drenagem continental (Miranda et al., 2002). Esturios costumam ocorrer em vales fluviais ou glaciais (fjrds) inundados pelo oceano, em foz de rios e em lagunas costeiras (Perillo et al., 1999). Um exame da definio citada por Miranda et al. (2002) permite que se conclua que um esturio um corpo hdrico que sofre ao de um ou mais rios, do mar (atravs de uma ou mais ligaes com o oceano) e onde se observa diferentes graus de mistura entre as guas doce e salgada. Pode-se concluir ainda que o esturio apresenta uma rea delimitada, estendendo-se desde a zona costeira adjacente at o limite superior da influncia da mar, podendo englobar um ou mais corpos de gua. De acordo com Kjerfve (1989), o esturio divide-se em trs zonas distintas, denominadas de Zona de Mar do Rio (parte fluvial com salinidade praticamente igual a zero, mas ainda sujeita influncia da mar), Zona de Mistura (regio onde ocorre a mistura da gua doce da drenagem continental com a gua do mar) e Zona Costeira (regio costeira adjacente que se estende at a frente da pluma estuarina que delimita a Camada Limite Costeira). Ainda segundo Miranda et al. (2002), na literatura regional brasileira tambm se encontra os termos sistema (ou complexo) estuarino-lagunar, utilizado para indicar ambientes de plancie costeira que se compe de uma rede de canais interligados entre si e com o oceano, recebendo descarga fluvial de numerosas fontes. O esturio de Tramanda, alvo do presente estudo, se encaixa nessa definio, tendo sido 17

denominado como complexo (ou sistema) estuarino-lagunar Tramanda-Armazm em uma srie de trabalhos (Wrdig, 1987; Medeiros, 1992; Tabajara, 1994; Kapusta, 2001; Lima, 2004). Durante esse estudo os termos sistema estuarino, complexo estuarino ou apenas esturio sero usados concomitantemente, como sinnimos. Lagunas podem ser definidas como corpos de gua lnticos, dos mais variados tamanhos, ligados ao mar por fluxo e refluxo (Esteves, 1998). As lagoas costeiras diferenciam-se das lagunas porque as primeiras no apresentam ligao direta com o oceano. Entretanto, ainda segundo Esteves (1998), no Brasil costuma-se usar o termo lagoa para referir-se a todos os corpos de gua costeiros, independentemente de possurem ou no ligao com o oceano, o que no correto. Assim, so popularmente chamados de lagoas corpos hdricos que, por definio, so na verdade lagunas. Entre os muitos exemplos, podem ser citadas a Lagoa dos Patos, a Lagoa de Tramanda, a Lagoa de Araruama e a Lagoa Rodrigo de Freitas. No presente estudo, Lagoa de Tramanda e Lagoa Armazm sero considerados nomes prprios e tratados em maisculo, mantendo-se assim tais denominaes popularmente consagradas. No se deve esquecer, no entanto, que geomorfologicamente esses corpos hdricos so lagunas. Os esturios esto entre os ecossistemas mais produtivos do mundo (Levinton, 1995), constituindo um grande depsito de nutrientes e detritos. A alta produtividade mantida pelo aporte de nutrientes associado s fontes de gua doce, pelo turbilhonamento da gua provocado por ondas e mars, que mantm altas as concentraes de oxignio dissolvido e continuamente ressuspendem nutrientes e matria orgnica do sedimento de fundo e pela constante reciclagem de nutrientes no substrato (Pinet, 1998). Esturios so importantes habitats para uma grande variedade de fauna e flora, j que, por tratar-se de regies de transio entre as guas continentais e marinhas, abrigam espcies desses dois ambientes, alm de espcies exclusivamente estuarinas. Muitas espcies de peixes e crustceos marinhos eurihalinos utilizam os esturios como local de desova e alimentao. A grande quantidade de comida disponvel nesses ambientes e a relativa segurana das guas mais rasas so condies ideais para o desenvolvimento das larvas e alevinos. Porm, no apenas os organismos marinhos so atrados pelas caractersticas desse ambiente. guas abrigadas e a existncia de canais de comunicao com o oceano fazem de um esturio o local ideal para a instalao de terminais porturios. Alm disso, a alta produtividade desses ambientes (ou ao menos foi, no passado) garantia de fartura de peixes. Devido a esses motivos, quase todos os esturios esto hoje rodeados por centros urbanos. A poluio dos corpos de gua por esgotos domsticos um problema bastante comum em locais populosos (Clark, 2001). Esse tipo de contaminante insere no ambiente grandes quantidades de nutrientes (especialmente nitrognio e fsforo) e de carbono orgnico, provocando o enriquecimento das guas. Tal enriquecimento pode levar a um crescimento excessivo da biomassa vegetal (tanto a fitoplanctnica quanto a de macrfitas aquticas). Ao morrer, toda essa massa vegetal passa a sofrer decomposio bacteriana, o que eleva o consumo de oxignio disponvel no meio, podendo gerar condies de hipoxia. Esse fenmeno de 18

enriquecimento do meio, seguido de aumento na demanda bioqumica de oxignio e de depleo da concentrao desse gs dissolvido na gua, denominado de eutrofizao e constantemente associado ao despejo de esgotos domsticos em ambientes aquticos, podendo ser responsvel por provocar alteraes, s vezes drsticas, na estrutura das comunidades animais e vegetais. Segundo Clark (2001), concentraes de clorofila-a acima de 0,5mg/m em ambiente marinho podem ser indicativas de eutrofizao. Por fim, esgotos domsticos tambm contm quantidades considerveis de metais, leos e graxas, detergentes e patgenos (Clark, 2001). Assim, a liberao desse tipo de efluente tende a modificar as condies fsicas e qumicas do meio, muitas vezes tornando o ambiente estressante ou mesmo inviabilizando a sobrevivncia de certos organismos. Cabe aqui um importante esclarecimento sobre a diferena entre os termos contaminao e poluio. Segundo Clark (2001), contaminao o aumento da concentrao de uma determinada substncia presente na gua, nos sedimentos ou nos organismos para nveis superiores ao nvel natural de base, provocado por atividades humanas. J a poluio a introduo, devido a atividades humanas, de substncias ou de energia no meio marinho, resultando em efeitos deletrios para a biota, causando problemas sade humana, criando obstculos ao desenvolvimento de atividades marinhas, incluindo a pesca, ou comprometendo a qualidade da gua, impedindo seu uso. Nota-se que no caso da poluio no apenas ocorre o aumento da concentrao da substncia para nveis maiores que os naturalmente encontrados no meio, mas esse aumento deve provocar dano para os organismos vivos (causando a morte ou efeitos subletais, como deformaes na morfologia ou alteraes genticas) e para o homem, prejudicando tanto a sade quanto as atividades desenvolvidas no corpo hdrico. Sendo a problemtica da poluio por esgotos domsticos uma questo que envolve processos fsicos, qumicos e geoqumicos, biolgicos, polticos e sociais, e considerando que o esturio um ambiente altamente dinmico, um estudo enfocado na avaliao dessa problemtica deve, essencialmente, passar por uma abordagem interdisciplinar do sistema. Esse mesmo pensamento compartilhado por Medeiros et al. (2002), que enfatizam que existe uma dependncia entre os diferentes processos que afetam a distribuio e a variabilidade de propriedades fsicas, a concentrao de substncias naturais e dos organismos biolgicos, bem como a concentrao de poluentes, devendo ser estudados em pesquisas interdisciplinares, abrangendo o esturio como um todo. O presente estudo se prope a abordar o problema da poluio por esgotos domsticos no sistema estuarino-lagunar de Tramanda de forma interdisciplinar, envolvendo estudos de oceanografia fsica de esturios, de qumica das guas e da comunidade de macroinvertebrados bentnicos.

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1.2 OBJETIVO GERAL O objetivo geral desse estudo contribuir para o conhecimento dos efeitos provocados pela introduo de efluentes de origem cloacal no sistema estuarino-lagunar de Tramanda. Para tal foram estudados aspectos hidrodinmicos (cujo conhecimento fundamental para que se formule suposies sobre a disperso dos contaminantes), qumicos (que permitiram o levantamento da qualidade da gua estuarina) e biolgicos (quando a comunidade de macroinvertebrados bentnicos foi avaliada no intuito de verificar o impacto sobre a biota provocado pela liberao de esgoto domstico).

1.3 REA DE ESTUDO Do ponto de vista geomorfolgico, as lagunas Tramanda e Armazm encontram-se inseridas no que Tomazelli e Villwock (1991) denominaram de Sistema Lagunar Holocnico do Litoral Norte do Rio Grande do Sul. Tal sistema integra a regio nordeste da Provncia Costeira do Rio Grande do Sul, compreendendo a faixa litornea que se estende desde a lagoa do Quinto, ao sul, at a Lagoa Itapeva, ao norte, em terrenos holocnicos pertencentes ao Sistema Laguna-Barreira IV ver Villwock e Tomazeli (1995) para uma detalhada descrio dos sistemas deposicionais do tipo laguna-barreira, os quais foram responsveis por moldar a geomorfologia da Plancie Costeira do Rio Grande do Sul. O Sistema Lagunar Holocnico do Litoral Norte do Rio Grande do Sul constitudo por um conjunto de ambientes e sub-ambientes deposicionais que incluem corpos aquticos costeiros (lagoas e lagunas), sistemas aluviais (rios meandrantes e canais interlagunares), sistemas deltaicos (deltas flvio-lagunares e deltas de mar lagunar) e sistemas paludiais, tendo iniciado seu desenvolvimento cerca de cinco mil anos atrs, quando o mar atingiu seu nvel mximo no final do evento transgressivo que se seguiu ltima glaciao. Do ponto de vista hidrogrfico, tais lagunas inserem-se na Bacia Hidrogrfica do Rio Tramanda (figura 1.1), que abrange dezessete municpios e possui uma rea de 270 mil hectares (Sema, 2004). Essa bacia compreende um conjunto de lagoas interligadas por canais e alimentadas por trs grandes rios (Rio Maquin, Rio Trs Forquilhas e Rio Cardoso) que tm suas nascentes no Embasamento Cristalino da Bacia do Paran (Serra Geral), alm de riachos de menor porte. O limite sul da Bacia Hidrogrfica do Rio Tramanda delimitado pela Lagoa Cerquinha e o limite norte pela Lagoa Itapeva, sendo que na parte central ocorre a comunicao com o oceano, atravs das lagunas Tamanda e Armazm, onde est situada a regio estuarina.

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Figura 1.1: rea de abrangncia da Bacia Hidrogrfica do Rio Tramanda (adaptado de SEMA, 2004).

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As lagoas ao norte do esturio so drenadas pelo Rio Tramanda. Esse rio nasce na Lagoa das Malvas e termina na forma de um delta digitiforme na margem norte da Lagoa de Tramanda, sendo classificado por Tomazelli e Villwock (1991) como o mais importante canal meandrante interlagunar existente na regio. Na regio do delta observa-se uma srie de canais secundrios e abandonados, alm de dois canais principais de escoamento da gua, um desaguando na margem norte da Lagoa de Tramanda e outro na margem leste dessa mesma laguna. O Rio Tramanda passou, h algumas dcadas, por servios de canalizao artificial e retificao de seus meandros com as finalidades de permitir a navegao montante e de facilitar o escoamento para o mar da gua doce proveniente das lagoas ao norte do esturio, sendo que durante esse processo uma srie de ilhotas foi criada. Em decorrncia desta interveno humana, a drenagem do Rio Tramanda se encontra, atualmente, quase toda direcionada para o canal situado na margem leste (Tomazelli e Villwock, 1991). J as guas provenientes das lagoas ao sul escoam para as lagunas estuarinas atravs do Rio Camaro. Este, embora seja popularmente chamado de rio, na verdade um pequeno canal de ligao entre a Lagoa das Custdias e a Lagoa Armazm e ser tratado preferencialmente como canal no decorrer desse estudo. Segundo Tomazelli e Villwock (1991), os canais ao sul de Tramanda possuem uma diferena marcante em relao aos canais situados ao norte. Nesses ltimos, como o caso do Rio Tramanda, o fluxo unidirecional, escoando para o sul, em direo Lagoa de Tramanda, em decorrncia da alimentao de gua por parte dos rios provenientes da Serra Geral. Os canais ao sul, no entanto, podem apresentar reverses de fluxo em funo dos nveis relativos das guas nos corpos lagunares por eles interligados, fato este claramente evidenciado pelo desenvolvimento de pequenos deltas em ambas as desembocaduras dos canais. Schwarzbold (1982), durante um estudo sobre as lagoas costeiras do Rio Grande do Sul, denominou o conjunto de lagoas que se estende da Lagoa da Porteira, ao sul, at a Lagoa Itapeva, ao norte, de Sistema Tramanda. Tal sistema se dividiria em dois subsistemas: um ao norte da desembocadura de Tramanda, formado pelas lagoas Itapeva, dos Quadros e conjunto de lagoas de Osrio; outro ao sul da desembocadura, a partir da Lagoa de Tramanda, passando por uma seqncia de lagoas em colar, at a Lagoa da Porteira. Posteriormente, Wrdig (1984; 1987) chamou de Sistema Lagunar de Tramanda o conjunto de lagoas compreendido entre a Lagoa das Malvas, ao norte, e a Lagoa Cerquinha, ao sul. Esse sistema foi subdividido em quatro subsistemas, em funo do teor de salinidade das guas, do tipo de comunicao com o mar, do afastamento da costa e da idade dos corpos lagunares. As divises propostas foram Subsistema do Esturio de Tramanda (englobando apenas as lagunas Tramanda e Armazm), Subsistema Lagunar Tramanda-Sul (da Lagoa das Custdias em direo ao sul, at a Lagoa Cerquinha), Subsistema Lagunar de Osrio (integrado pelas lagoas Emboaba, Marcelino Ramos, Peixoto, Caconde, Trara, Lessa, Caieira, Horcio, Incio, Veados, Rinco I e Rinco II) e Susbsistema Lagunar Tramanda-Norte (compreendendo as lagoas Pinguela, Palmital, Malvas, do Passo e Pombas). 22

Nenhum desses estudos, entretanto, determinou a real abrangncia do sistema estuarino de Tramanda, tomando por base a definio de um esturio proposta na introduo desse captulo. Para isso seria necessrio determinar o limite superior da influncia da mar (Zona de Mar do Rio) e a regio onde ocorre a mistura entre as guas doce e salgada (Zona de Mistura). A zona de mistura pode ser inferida a partir de revises da bibliografia existente. Chomenko (1981) realizou um extenso levantamento de valores de salinidade na regio e concluiu que em direo ao sul do esturio a influncia da salinidade se estende at a Lagoa do Gentil, fato tambm verificado por Wrdig (1987) e Haase et al. (2003). J em direo ao norte, segundo Wrdig (1987) a influncia do sal menor, tendo sido detectada no Rio Tamanda at aproximadamente 1000 metros montante da sua desembocadura na Lagoa de Tramanda. Entretanto, dados levantados pela Fundao Estadual de Proteo Ambiental Henrique Luis Roessler (FEPAM) e dispostos no presente estudo confirmam a presena espordica de salinidade na Lagoa do Passo, poro norte do Rio Tramanda. Dessa forma, esse estudo considerar como o sistema estuarino-lagunar de Tramanda a regio abrangida entre a Lagoa do Passo, ao norte, e a Lagoa do Gentil, ao sul. Novos estudos devem ser conduzidos visando delimitar oficialmente a rea abrangida pelo sistema estuarino-lagunar de Tramanda, considerando no apenas a Zona de Mistura, mas tambm a Zona de Mar do Rio. O principal foco desse trabalho, no entanto, no o sistema estuarino como um todo, mas sim as lagunas Tramanda e Armazm (figura 1.2). Como j visto, tais lagunas fazem parte do sistema estuarino-lagunar de Tramanda, recebendo gua doce atravs do Rio Tramanda e do Canal Camaro e comunicando-se com o oceano atravs de um canal permanente fixado por molhes. As lagunas possuem juntas 16,6Km de rea e volume de 1,19x107m (Machado, 2000) e esto separadas por um pontal arenoso que cresceu na direo NWSE, situando-se ao norte desse pontal a Lagoa de Tramanda e ao sul a Lagoa Armazm. Do ponto de vista hdrico, porm, as lagunas podem ser consideradas um corpo nico, visto que o pontal no segmenta completamente o corpo lagunar (Tomazelli e Villwock, 1991). O canal de comunicao com o oceano possui cerca de 1,5 Km de extenso, largura mxima de 300 m, mnima de 60 m e profundidade mdia de 3 m (Dillenburg et al., 1992; Tabajara e Dillenburg, 1997). Kjerfve e Knoppers (1999) classificam geomorfologicamente o sistema de lagunas Tramanda-Armazm como pertencendo ao tipo sufocado (choked lagoon). Segundo Miranda et al. (2002), esse tipo de laguna apresenta uma nica conexo estreita com o oceano que atua como um filtro que atenua a onda de mar. A Lagoa de Tramanda revela profundidades mdia e mxima de 1,0 m e 1,4 m, respectivamente. J a Lagoa Armazm apresenta profundidade variando entre 0,5 m e 1,0 m. As taxas de sedimentao situam-se entre 4,2 mm e 4,4 mm ao ano (Dillenburg, 1994). A distribuio textural dos sedimentos do fundo da Lagoa de Tramanda segue o padro clssico de sedimentao lacustre, com sedimentos mais grossos (areia fina e muito fina) dominando as reas rasas marginais (profundidades menores que 1 m) e mais finos (areia lamosa e lama arenosa) prevalecendo nas reas mais profundas ou abrigadas. Por outro lado, a 23

Lagoa Armazm quase que inteiramente dominada por areia fina e areia muito fina. A ausncia quase total de sedimentos finos nessa laguna resultante de sua pequena profundidade (inferior a 1 m) e do aporte pouco significativo de siltes e argilas atravs do Rio Camaro (Tabajara, 1994; Tabajara e Dillenburg, 1997). Estudos realizados por Motta (1965), Lira et al. (1976) e Almeida et al. (1997) indicam que a mar astronmica no apresenta grande efeito na regio, apresentando uma amplitude entre 0,1m e 0,3m. Assim, a entrada de gua salgada no esturio est condicionada principalmente aos efeitos da pluviosidade e do vento. O clima da regio, segundo a classificao de Kppen, do tipo subtropical mido, com temperatura mdia em torno de 20 C (Hasenack e Ferraro, 1989). O padro de ventos determinado pela ao de dois centros de alta presso: o Anticiclone do Atlntico Sul e o Anticiclone Migratrio Polar (Nimer, 1989). O vento predominante durante o ano de direo NE, provocado por influncia do Anticiclone do Atlntico Sul. Entretanto, uma anlise sazonal com dados da estao meteorolgica de Imb revelou uma queda na freqncia dos ventos NE e E durante o inverno, aliada a um claro aumento na freqncia dos ventos de SW e W (Tomazelli, 1993). Esse fato deve-se ao avano mais seguido do Anticiclone Migratrio Polar sobre o Estado, o qual responsvel pelo aumento na freqncia de frentes frias nessa poca do ano. Por esse motivo, a precipitao, embora uniforme ao logo do ano (em torno de 1300 mm anuais), mostra um leve aumento durante o inverno (Hasenack e Ferraro, 1989). Nas margens do esturio esto localizados os municpios de Tramanda e Imb, constituindo um dos maiores aglomerados urbanos do litoral gacho. A populao residente dos dois municpios atinge mais de 43000 pessoas, sendo mais de 31000 em Tramanda e mais de 12000 em Imb (IBGE, 2000). A regio tem padecido com o crescimento desordenado das cidades e o esturio vem sofrendo as conseqncias dessa falta de planejamento, como a poluio e a ocupao irregular das margens. O municpio de Tramanda dista apenas 100 Km de Porto Alegre, capital e cidade mais populosa do Estado do Rio Grande do Sul. Essa proximidade, aliada a uma eficiente auto-estrada, acaba por facilitar muito o acesso dos porto-alegrenses quele municpio, o que faz com que Tramanda seja uma das cidades mais importantes do litoral gacho, autodenominando-se a capital das praias. Um pequeno porto pesqueiro e um terminal petrolfero esto instalados nas margens do esturio. Entretanto, a maior importncia econmica do municpio vem do turismo de veraneio, sendo que sua populao aumenta muito nos meses de vero, quando os problemas de contaminao por esgoto se tornam mais pronunciados (Fabrcio F., 1989). Silva et al. (2001) demonstraram que o esturio vem sofrendo um aumento da concentrao de metais (especialmente Fe e Cu) no sedimento lagunar desde o incio do sculo XX. Eles sugerem que esse incremento possa estar relacionado maior atividade agrcola na bacia hidrogrfica litornea da poro norte do Rio Grande do Sul, com conseqente eroso do solo e transporte de sedimentos proveniente das rochas vulcnicas da Bacia

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do Paran (Serra Geral), que so ricas em Fe e Cu. Outra possibilidade indicada pelos autores seria a adio de metais atravs de efluentes domsticos gerados em Imb e Tramanda. Tramanda possui uma rede de coleta e tratamento de esgotos que abrange 15% do total de domiclios do municpio e 13% da populao residente (IBGE, 2000). Entretanto, segundo Vasconcelos (1993), as casas s margens da laguna lanam os dejetos no corpo hdrico sem qualquer tratamento prvio. Por outro lado, Imb no possui rede de coleta ou tratamento de esgotos em funcionamento e o sistema adotado o de fossas spticas. Fabrcio F. (1989) confirmou a contaminao das guas da laguna por microorganismos de origem fecal. Segundo ele essa contaminao mais acentuada durante o vero e oferece riscos sade humana. Ele explica ainda que as maiores fontes de contaminao so os transbordamentos da rede de coleta de esgotos durante enxurradas e as ligaes clandestinas na rede de escoamento pluvial. Apesar de o trabalho ter sido publicado h mais de quinze anos, observaes atuais em campo sugerem que a situao hoje no muito diferente.

Figura 1.2: Localizao da rea de estudo, detalhando a Lagoa de Tramanda, a Lagoa Armazm, o Canal Camaro, o Rio Tramanda, a Lagoa das Custdias e os municpios de Tramanda e Imb.

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CAPTULO 2: COMPORTAMENTO HIDRODINMICO DO SISTEMA ESTUARINOLAGUNAR TRAMANDA-ARMAZM

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2.1 INTRODUO Estudos de oceanografia fsica de esturios so de extrema importncia para a compreenso dos processos de difuso e transporte de nutrientes e poluentes, gerando resultados que serviro de base para avaliaes de cunho ecolgico, para a tomada de decises e para o gerenciamento desse ecossistema. Tais estudos oferecem suporte para trabalhos direcionados s demais reas do conhecimento, como a qumica, a geologia e a biologia marinha. Processos hidrodinmicos so responsveis por afetar a distribuio e a variabilidade de propriedades fsicas e de organismos biolgicos, alm das concentraes de substncias naturais (salinidade, nutrientes dissolvidos, material em suspenso) e de contaminantes e poluentes (Miranda et al., 2002). Embora existam alguns trabalhos de levantamento de dados fsicos no esturio de Tramanda, muito poucos estudos foram efetuados com o objetivo de contribuir para o conhecimento dos processos fsicos responsveis pela circulao hidrodinmica. Motta (1965) foi um dos pioneiros, realizando estudos em modelo reduzido para a regularizao da embocadura do Rio Tramanda. Dez anos mais tarde, Lira et al. (1976) escreveram uma breve nota sobre o comportamento da cunha salina no esturio de Tramanda. Strohschoen Jr. (1985), amostrou alguns dados fsicos durante seu trabalho sobre o material em suspenso nesse sistema, mas no estudou processos hidrodinmicos propriamente ditos. Da mesma forma Wrdig (1987) levantou dados fsicos e qumicos no sistema lagunar de Tramanda, dividindo-o em subsistemas conforme suas caractersticas fsico-qumicas e geomorfolgicas. Entretanto, como no estudo anterior, processos dinmicos da circulao estuarina no foram considerados. Medeiros (1992), em sua dissertao de mestrado, estudou a fsica e a qumica das guas do sistema estuarino-lagunar de Tramanda. Tal trabalho apresenta interessantes resultados para a parte qumica, porm pouco trata sobre a parte fsica, no envolvendo estudos de circulao estuarina. Tabajara (1994), tambm em dissertao de mestrado, estudou aspectos hidrodinmicos e a sedimentologia do sistema estuarino-lagunar de Tramanda. Esse pode ser considerado o mais completo trabalho j realizado nesse sistema a levar em conta processos hidrodinmicos. Na seqncia, dois outros estudos interessantes so os de Almeida et al. (1997), que trata sobre as mars na barra do Rio Tramanda, e Tabajara e Almeida (1999), que analisa variaes da temperatura, salinidade e material em suspenso durante um ciclo de mar semi-diurna no referido esturio. Tais estudos, embora relevantes, foram publicados na forma de resumos expandidos, sendo extremamente concisos. Sendo o esturio um ambiente de transio entre os sistemas lmnico e marinho, ele se encontra sob a presso de foras provenientes desses dois sistemas. Alm disso, fenmenos atmosfricos tambm exercem influncia nos padres de dinmica estuarina. Miranda et al. (2002) descreve as principais forantes da circulao em um esturio como sendo a descarga fluvial, as variaes no nvel do mar, o gradiente longitudinal de presso provocado pela diferena de densidade (salinidade) da gua entre a cabeceira e a foz do esturio, os padres de 27

circulao na plataforma continental adjacente e o vento agindo por cisalhamento diretamente sobre a superfcie livre da gua do esturio. A descarga fluvial a principal fonte de gua doce de um esturio. Alm disso, o rio responsvel tambm pelo transporte de sedimentos, de substncias orgnicas e inorgnicas, de nutrientes e mesmo de poluentes para o interior desse ambiente. A descarga fluvial (ou vazo de um rio) constitui o volume de gua que transportado pelo mesmo em uma unidade de tempo. A vazo pode sofrer alteraes na escala de dias, meses ou anos e depende diretamente da taxa de pluviosidade que cai sobre a bacia de drenagem. Tais alteraes so responsveis por suprir o esturio com volumes maiores ou menores de gua doce. Como j visto na seo 1.3 dessa dissertao, Tramanda encontra-se em uma regio onde a taxa de precipitao pouco varia ao longo do ano. Essa situao tpica de climas subtropicais e temperados, onde o regime de chuvas principalmente provocado pela ao de sistemas frontais. Como tais sistemas so mais freqentes durante o inverno, verifica-se um aumento no muito pronunciado na taxa de chuvas durante essa estao (Britto e Saraiva, 2001) em climas tropicais, por outro lado, existem estaes seca e chuvosa bem definidas (Climanlise, 1986) e a vazo dos rios apresenta um forte ciclo anual, com um mnimo no inverno e um mximo no vero. Assim, de se esperar que a vazo do Rio Tramanda durante o inverno seja um pouco superior que ocorre no vero. Infelizmente no existem estudos que quantifiquem a vazo desse rio em diferentes estaes do ano para confirmar essa hiptese. O nico estudo que cita um valor de vazo para o Rio Tramanda o de Machado (2000), segundo o qual a vazo mdia desse rio seria de 23,31m/s. O volume de gua doce que introduzido no esturio por via fluvial cria um gradiente longitudinal de salinidade que se estende desde o rio, onde a salinidade mnima, at a desembocadura do esturio no oceano, onde a salinidade muito prxima ou igual da gua do mar. A introduo de gua doce no esturio tende a criar tambm uma estratificao vertical na coluna de gua. Massas de gua de diferentes salinidades apresentam densidades distintas, sendo que quanto maior a concentrao de sais, maior a densidade da gua. Assim, a massa de gua mais salgada e mais densa se posiciona no fundo, sobreposta pela gua superficial, mais doce e menos densa. Entre elas ocorre uma zona de transio que apresenta forte gradiente vertical de salinidade e denominada de haloclina. Quanto maior for a diferena de salinidade entre as massas de gua superficial e de fundo, mais estvel ser a haloclina e mais energia ser necessria para desestabilizar o gradiente e misturar as duas camadas de gua. Segundo Pritchard (1955), e adequadamente traduzido em Miranda et al. (2002), os esturios podem ser classificados em quatro tipos quanto estratificao vertical de salinidade: Esturio de cunha salina (tipo A): ocorrem em regies onde as correntes de mar so fracas e a descarga fluvial alta (esturio dominado pela descarga fluvial). H uma interface distinta entre a gua da descarga fluvial e a gua do mar (haloclina bem definida), com um fluxo contnuo esturio 28

abaixo de gua pouco salina na camada superficial, resultando em forte estratificao vertical. O processo de mistura predominante o entranhamento da gua salgada do fundo na camada superficial de gua mais doce. Esturio moderadamente ou parcialmente misturado (tipo B): apresenta gradiente vertical de salinidade moderado, com a haloclina menos pronunciada que no tipo anterior (diferena de poucas unidades entre a salinidade de fundo e a de superfcie). A energia da mar suficiente para provocar vrtices turbulentos, ocasionando a eroso do gradiente vertical de salinidade por meio da mistura entre a gua doce e a salgada. Assim sendo, a difuso turbulenta um importante processo de mistura nesse tipo de esturio. Esturio verticalmente bem misturado (tipos C e D): a fora da mar predomina sobre a descarga fluvial (esturio dominado pela mar). No h praticamente diferena entre as salinidades do fundo e da superfcie, caracterizando ausncia da haloclina. Esse tipo de esturio dominado por processos turbulentos e ocorre onde a descarga fluvial baixa. Os esturios verticalmente bem misturados se dividem em lateralmente estratificados (tipo C), quando h estratificao horizontal de salinidade (esturios largos e rasos) e bem misturados (tipo D), quando a coluna de gua completamente misturada, tanto verticalmente quanto lateralmente. Como os efeitos relativos da mar e da descarga fluvial sofrem alterao ao longo do tempo, um mesmo esturio pode ser classificado como pertencente a um tipo em um dado momento e a outro tipo em outra ocasio. Para uma adequada classificao do tipo de esturio e dos processos de mistura envolvidos necessrio que se faa o acompanhamento dos valores de salinidade e direo e intensidade da corrente em superfcie e no fundo durante no mnimo um ciclo de mar e que se conhea a descarga fluvial (Miranda et al., 2002). Embora tais procedimentos no tenham sido efetuados no presente estudo, a simples observao da diferena entre os valores de salinidade na superfcie e no fundo suficiente para uma simples deduo sobre a existncia ou no de estratificao vertical de salinidade no momento da medio. Caso a salinidade na superfcie seja igual do fundo, no existe estratificao vertical e a coluna de gua, naquele momento e ponto de medio, encontra-se bem misturada. Se houver diferena de salinidade entre a superfcie e o fundo, existe algum tipo de estratificao. Nesse caso, maiores estudos seriam necessrios para definir que tipo de estratificao estaria ocorrendo e quais os processos de mistura envolvidos. Os processos de mistura, segundo Miranda et al. (2002), podem ser a adveco (movimentos de escala macroscpica gerados pela mar, pela descarga fluvial ou por diferenas de densidade, no qual uma parcela de gua deslocada de uma posio outra) e a difuso turbulenta (movimentos aleatrios em escala microscpica das molculas de gua). O gradiente longitudinal de salinidade (e, conseqentemente, de densidade) verificado entre a cabeceira e a foz de um esturio responsvel por gerar uma fora denominada de componente baroclnico da fora 29

gradiente de presso. Tal forante baroclnica sempre gera movimento da gua esturio acima e sua intensidade aumenta com a profundidade, sendo zero na superfcie e mxima junto ao fundo. Se for imaginado um esturio hipottico, no qual no h a atuao da mar nem de ventos, as duas nicas forantes presentes seriam a descarga de gua doce (gerando movimento de gua esturio abaixo) e o gradiente longitudinal de salinidade (deslocando a gua esturio acima), sendo que o movimento resultante seria bidirecional em duas camadas. Esse movimento denominado de circulao gravitacional, corrente de gravidade, ou ainda, circulao estuarina clssica. um movimento essencialmente em duas dimenses, responsvel pelo efeito advectivo e pelos transportes de volume e de sal esturio abaixo e acima nas camadas superior e inferior da coluna dgua, respectivamente (Miranda et al., 2002). As variaes do nvel do oceano junto costa esto entre as forantes mais importantes da circulao estuarina e so denominadas de componente barotrpico da fora gradiente de presso. Essas variaes podem ser provocadas por diversos fenmenos, mas os principais so a mar astronmica e os fenmenos meteorolgicos. O fenmeno da mar astronmica resulta da interao entre as foras gravitacionais da Terra, da Lua e do Sol agindo diretamente sobre as grandes massas de gua das bacias ocenicas e propagando-se na forma de ondas de Kelvin, de Poincar e de ondas longas de gravidade. Informaes mais detalhadas sobre as causas e a teoria das mars podem ser obtidas em Brown et al. (1989a). As mars astronmicas so classificadas basicamente em trs tipos, de acordo com o perodo por elas apresentado: a mar diurna apresenta um perodo aproximado de 24 horas, ou seja, observado uma altura mxima e uma mnima ao longo de um dia; a mar semi-diurna tem perodo de aproximadamente 12 horas, mostrando duas subidas e duas descidas em um dia; j o terceiro tipo chamado de mar mista, e acontece em locais onde as mars diurna e semi-diurna ocorrem de forma sobreposta. Cada regio geogrfica apresenta um tipo peculiar de mar, sendo que as mars diurnas so caractersticas de altas latitudes, as semi-diurnas de baixas latitudes e as mistas de latitudes mdias (Pinet, 1998). As mars astronmicas so constitudas por uma srie de componentes, cada uma com um perodo prprio e correspondendo a uma das diversas posies que a Terra assume em relao ao Sol e Lua. Algumas das principais componentes da mar astronmica, seus smbolos e seus perodos esto expostos na tabela 2.1. Alm das oscilaes diurnas e se