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PROGRAMAFRANCISCOEDUARDOMOURÃOSABOYADEPÓS‐GRADUAÇÃOEMENGENHARIAMECÂNICAESCOLADEENGENHARIAUNIVERSIDADEFEDERALFLUMINENSE
DissertaçãodeMestrado
ESCOAMENTO UNIDIMENSIONAL EM
BOCAL CONVERGENTE-DIVERGENTE SOB
A AÇÃO DA CAVITAÇÃO GASOSA
RAFAEL DIAS BARRETO
NOVEMBRO DE 2016
2
RAFAEL DIAS BARRETO
ESCOAMENTO UNIDIMENSIONAL EM BOCAL CONVERGENTE-DIVERGENTE SOB A AÇÃO DA
CAVITAÇÃO GASOSA
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa Francisco Eduardo Mourão Saboya de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica da UFF como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Ciências em Engenharia Mecânica
Orientador: Felipe Bastos de Freitas Rachid (PGMEC/UFF )
4
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE NITERÓI, 20 DE AGOSTO DE 2016
ESCOAMENTO UNIDIMENSIONAL EM BOCAL CONVERGENTE-DIVERGENTE SOB A AÇÃO DA
CAVITAÇÃO GASOSA
Esta Dissertação é parte dos pré-requisitos para a obtenção do título de
MESTRE EM ENGENHARIA MECÂNICA
Área de concentração: Termociências
Aprovada em sua forma final pela Banca Examinadora formada pelos professores:
Prof. Felipe Bastos de Freitas Rachid (D.Sc.)
Universidade Federal Fluminense (Orientador)
Profa. Maria Laura Martins Costa (D.Sc.)
Universidade Federal Fluminense
Prof. Rogério Martins Saldanha da Gama (D.Sc.)
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
6
Agradecimentos
A Deus que sempre me guiou e me deu capacidade para alcançar minhas metas e resultados.
Aos professores que me instruíram durante o período que cursei a graduação e pós-graduação
em minha universidade.
Ao meu orientador de projeto final de graduação, iniciação científica e dissertação de
mestrado Felipe Bastos de Freitas Rachid, que me forneceu suficiente conhecimento e direção
para tais atividades, me auxiliando quando tive dificuldades e me fornecendo as melhores
formas para solucionar os problemas com os quais me deparei.
Ao apoio financeiro parcial fornecido pelas agências FAPERJ e CNPq é gentilmente
reconhecido.
Aos meus pais Enio e Maria Alice, que sempre acreditaram, me incentivaram e deram todo o
suporte necessário para o meu desenvolvimento profissional.
7
RESUMO
Líquidos são capazes de, por meio de um processo difusivo, absorver gases em
contato com sua superfície livre. Tais gases permanecem dissolvidos nos líquidos a menos
que a temperatura das misturas liquido-gás sejam elevadas acima da temperatura de
evaporação (cavitação vaporosa) ou a pressão seja reduzida abaixo da pressão de saturação
do gás dissolvido (cavitação gasosa). Este trabalho apresenta um estudo numérico sobre
cavitação gasosa em um bocal convergente-divergente. A motivação deste estudo é que
bocais convergente-divergente são utilizados em diversos dispositivos na engenharia, por
exemplo, em sistemas de combustível de aviação. A ocorrência de cavitação altera
consideravelmente a resposta mecânica do escoamento, tornando assim, viável e aplicável a
análise do comportamento do fluido quando submetido a ação da cavitação. O modelo de
cavitação gasosa utilizado na simulação tem sido recentemente proposto na literatura e é
desenvolvido no contexto da termodinâmica dos processos irreversíveis. Por coerentemente
contemplar a taxa de dissipação de energia associada com a cavitação gasosa, o modelo é
capaz de descrever efeitos irreversíveis importantes observados no escoamento de misturas
líquido-gás através de pequenas passagens. Entre elas estão a redução da velocidade da
frente de onda e a ocorrência do fenômeno da histerese.
Palavras-chave: Cavitação gasosa, termodinâmica dos processos irreversíveis, bocais
convergente-divergente.
8
ABSTRACT
Liquids are able to, through a diffusive process, absorb gases in contact with its free
surface. These gases remain dissolved in the liquid unless the temperature of the liquid-gas
mixtures is elevated above the evaporation temperature (vaporous cavitation) or the
pressure is reduced below the saturation pressure of dissolved gas (gaseous cavitation).
This paper presents a numerical study about gaseous cavitation in a converging-diverging
nozzle. The motivation of this study is that converging-diverging nozzles are used in many
engineering devices, for example in aircraft fuel systems. The occurrence of cavitation
changes significantly the mechanical response of the flow, making viable and applicable
the analysis of the fluid behavior when subjected to the action of cavitation. The gaseous
cavitation model used in the simulation has been recently proposed in the literature and is
developed in the context of the thermodynamics of irreversible processes. By coherently
contemplating the rate of energy dissipation associated with the gaseous cavitation, the
model is capable to describe important irreversible effects observed in the flow of gas-
liquid mixtures through small passages. Among them are the reduction of the wavefront
speed and the occurrence of hysteresis phenomena.
Keywords: Gaseous cavitation, thermodynamics of irreversible processes, converging
diverging nozzles.
9
SUMÁRIO
Capítulo 1. Introdução .......................................................................................................14
1.1. Revisão Bibliográfica e Objetivos ................................................................................14
1.2.1. Organização do Trabalho ..........................................................................................25
Capítulo 2. Equações de Balanço ......................................................................................28
Capítulo 3. Teoria Constitutiva ........................................................................................31
3.1. Energia Livre de Helmholtz e Leis de Estado .............................................................. 32
3.2. Pseudo-potencial de Dissipação e Leis Complementares .............................................35
Capítulo 4. Simulações Numéricas ...................................................................................40
Capítulo 5. Considerações Finais e Sugestões para Futuros Trabalhos........................59
Referências Bibliográficas .................................................................................................62
Apêndice...............................................................................................................................65
10
Lista de Figuras
Figura 4.1 – Perfil do bocal...................................................................................................43
Figura 4.2 – Velocidade da frente de onda em função da fração de volume de gás em
diferentes pressões ...............................................................................................................45
Figura 4.3 – Pressão normalizada x posição normalizada ...................................................47
Figura 4.4 – Velocidade normalizada x posição normalizada .............................................48
Figura 4.5 – Fração de volume de gás normalizado x posição normalizada ........................48
Figura 4.6 – Velocidade da frente de onda normalizada x posição normalizada .................49
Figura 4.7 – Fração de massa de gás dissolvida normalizada x posição normalizada .........49
Figura 4.8 – Pressão normalizada x fração de gás normalizada ...........................................50
Figura 4.9 – Pressão normalizada x posição normalizada ...................................................52
Figura 4.10 – Velocidade normalizada x posição normalizada ...........................................52
Figura 4.11 – Fração do volume de gás normalizado x posição normalizada .....................53
Figura 4.12 – Velocidade da frente de onda normalizada x posição normalizada ...............53
Figura 4.13 – Fração da massa de gás normalizada x posição normalizada ........................54
Figura 4.14 – Pressão normalizada x fração do volume de gás normalizado ......................54
Figura 4.15 – Taxa de dissipação de energia x posição normalizada para = 52KPa .......57
Figura 4.16 – Taxa de dissipação de energia x posição normalizada para = 125 KPa ....57
11
Lista de Tabelas
Tabela 4.1 – Coeficientes polinomiais dados que caracterizam o perfil do bocal ...............43
Tabela 4.2 – Coeficientes materiais que caracterizam o fenômeno de liberação de gás na
cavitação gasosa para duas pressões de saturação distintas..................................................44
12
Lista de Símbolos
A - Área da seção transversal do bocal
L - Comprimento do bocal
x - Coordenada axial
y – Coordenada radial
t - Instante de tempo
u - Campo espacial da velocidade da mistura
p - Pressão termodinâmica
Ɵ - Temperatura absoluta
c - Concentração de gás dissolvido no líquido
- Densidades de massa de líquido
- Densidades de massa de gás
- Densidades de massa de vapor
- Soma da densidade das fases ponderadas
α - Fração de volume de gás
Γ - Taxa de transferência de massa
d - Taxa de dissipação de energia
- Energia por unidade total de volume
Φ - Energia livre por unidade de massa de líquido
Φ - Energia livre por unidade de massa de gás
- Calor específico a volume constante do gás dissolvido no líquido
- Calor específico a volume constante do gás dissolvido no gás livre
- Pressão de saturação
13
-Pressão parcial de líquido
- Pressão parcial de gás
h - Elemento do subconjunto diferencial ∝ (̅α)
- Taxa de fluxo de massa através do bocal
M - Número de Mach
a - Frente de onda na mistura líquido-gás
Re – Número de Reynolds
P - Perímetro molhado
- Diâmetro hidráulico
14
Capítulo 1
Introdução
1.1.Revisão Bibliográfica e Objetivos
Líquidos são conhecidos por serem capazes de absorver certa quantidade de gás em
contato com suas superfícies livres. Através de um processo difusivo, o gás dissolve-se no
líquido e lá permanece, a menos que sua temperatura seja aumentada acima do ponto de
ebulição ou o sua pressão seja reduzida abaixo da pressão de saturação do gás dissolvido.
Neste último processo, usualmente referido como cavitação gasosa, o gás sai da solução
como pequenas bolhas que são transportadas pela corrente de fluxo do fluido como gás
livre, formando um escoamento com bolhas. Escoamentos internos bem como escoamentos
externos podem estar submetidos à cavitação gasosa sob regimes permanente e/ou
transiente. A curvatura do contorno das superfícies sólidas em contato com o líquido,
vórtices, turbulência e a propagação de ondas de baixa pressão são alguns exemplos típicos
de fontes responsáveis por desencadear a ocorrência da liberação de gás (Swaffield de
15
1972; Kranenburg, 1974; Wiggert & Sundquist, 1979; Baasiri e Tullis, 1983; Wylie, 1984;
Chaudry et al., 1990; Hadj-Taieb & Lili, 1998; Kessal & Bennacer, 2005; Cannizzaro &
Pezzinga, 2005).
Escoamentos de misturas líquido-gás existem em vários tipos de instalações de
engenharia, tais como sistemas de transferência de calor de plantas nucleares, sistemas de
combustível de aviação, sistemas de abastecimento de água tratada e de esgotamento
sanitário, oleodutos, reatores em indústrias químicas, etc. Em ocasiões em que a pressão
local, em algum ponto do escoamento, cai abaixo da pressão de saturação do gás
dissolvido, há liberação de gás e o comportamento dinâmico do escoamento é
substancialmente afetado. O gás dissolvido quando liberado se dispersa soba a forma de
gás livre aumentando a fração volumétrica de gás na mistura. Como consequência, a
compressibilidade do meio líquido aumenta, reduzindo, por conseguinte, a velocidade de
propagação da frente de onda no meio.
A determinação acurada da taxa de liberação de gás dissolvido e da velocidade de onda
na mistura é essencial para prever adequadamente a dinâmica do escoamento, não só na
fase do projeto, mas também naquela associada à manutenção. O conhecimento dos campos
de velocidade e pressão por através do sistema permitem aumentar o desempenho das
instalações e equipamentos, sem prejuízo de sua integridade (Swaffield, 1972; Wylie &
Streeter, 1993; Bergant et al., 2006).
A presença de gás livre em suspenção no líquido, mesmo em muito pequenas
quantidades, não só reduz a velocidade de onda no meio como também atenua
substancialmente as pressões. Fazendo de abordagens distintas, vários pesquisadores
(Capriz & Cohen, 1983; Drew & Passman, 1999; Drumheller, Kipp, & Bedford, 1982;
Henry et al., 1971; Marchal, 1962; Semenov & Kosterin, 1964; Temkin, 1992; Wood,
16
1930; Wylie & Streeter, 1993) demonstraram que a velocidade de frente de onda torna-se
altamente dependente da pressão de forma altamente não linear. Dependendo da quantidade
de gás livre e dos níveis de pressão, a velocidade de onda pode assumir valores
comparáveis à velocidade do fluido, dando margem à ocorrência de ondas de choque no
escoamento. Além disso, sempre quando a pressão no fluido cai abaixo da pressão de
saturação há liberação de gás dissolvido aumentando a quantidade de gás livre na mistura e
introduzindo efeitos relevantes de dispersão e atenuação (Baasiri & Tullis, 1983; Chaudhry,
Bhallamudi, Martins, & Naghash, 1990; Wiggert & Sundquist, 1979; Wylie & Streeter,
1993).
Focando-se em aplicações de engenharia de cunho prático, os problemas mais
relevantes nos quais a cavitação gasosa desempenha um importante papel são aqueles
associados aos transientes em fluidos em sistemas de tubulações. Exemplos típicos incluem
sistemas de distribuição de água tratada, sistemas de reatores nucleares e sistemas de
alimentação de combustível de aviação. (Bergant, Simpson, & Tijsseling, 2006; Swaffiled,
1972; Wylie & Streeter, 1993). A relevância dessas aplicações parece ser repsonsável por
concentrar a grande maioria dos trabalhos científicos relacionados a gás livre e cavitação
gasosa neste contexto específico. (Baasiri & Tullis, 1983; Cannizzaro & Pezzinga, 2005;
Chaudhry et al., 1990; Hadj-Taieb & Lili, 1998; Kessal & Bennacer, 2005; Kranenburg,
1974; Swaffiled, 1972; Wiggert & Sundquist, 1979; Wylie, 1984). Uma vez que a cavitação
gasosa em geral precede e influencia a cavitação vaporosa (fenômeno no qual o líquido é
transformado em vapor quando a pressão cai abaixo da pressão de vapor saturado do
líquido) muitos estudos abordam ambos os fenômenos simultaneamente (Baasiri & Tullis,
1983; Kranenburg, 1974; Wiggert & Sundquist, 1979; Wylie, 1984), apesar de terem
escalas de tempo bem distintas. Enquanto que a liberação de gás dissolvido ocorre numa
17
escala de tempo da ordem de segundos, a cavitação vaporosa é um processo muito mais
rápido, levando apenas microssegundos. Como o gás livre na cavitação gasosa, existem
outros fenômenos físicos responsáveis pela atenuação das ondas de pressão em transientes
em fluidos (Bergant et al., 2008a, 2008b).
Em contraste ao problema relacionado à influência do gás livre na propagação de onda
em misturas de líquido e gás para o qual existe uma quantidade significativa de estudos
teóricos e experimentais, (Capriz & Cohen, 1983; Chaudhry et al., 1990; Drumheller et al.,
1982; Marchal, 1962; Freitas Rachid, 2006; Semenov & Kosterin, 1964; Swaffiled, 1972;
Wood, 1930 ; Wylie & Streeter, 1993), somente alguns poucos trabalhos foram devotados
ao fenômeno de cavitação gasosa. Com relação aos trabalhos experimentais envolvendo a
medida de gás liberado, aqueles atribuídos a Schweitzer & Szebehely (1950), Wiggert &
Sundquist (1979), Baasiri and Tullis (1983) e Zielke et al. (1990) são os mais relevantes.
Enquanto que nos três primeiros trabalhos o gás liberado é monitorado fundamentalmente
durante a cavitação vaporosa, no ultimo trabalho os autores analisam somente o processo
de liberação de gás, evitando pressões tão baixas quanto as de vapor saturado do líquido em
seus experimentos.
Estudos teóricos relacionados à liberação de gás no contexto de escoamentos em dutos,
contemplando ou não contrações e expansões, estão também restritos a um pequeno
número de trabalhos (Cannizzaro & Pezzinga, 2005; Kessal & Bennacer, 2005;
Kranenburg, 1974; Wiggert & Sundquist, 1979; Wylie & Streeter, 1993). Para descrever os
efeitos do gás livre na propagação de onda, a grande maioria destes trabalhos considera
como premissa básica a existência de pequenas quantidades de gás livre distribuído por
todo o escoamento, admitindo misturas de líquido e gás homogêneas e isotérmicas. Uma
vez que o liquido e o gás livre compartilham da mesma velocidade e temperatura, somente
18
equações de balanço de momentum e massa para a mistura como um todo são necessárias,
em conjunto com uma equação de balanço de massa para o gás. Complementadas com
equações constitutivas para o líquido e o gás livre (os quais são admitidos ser em fluidos
barotrópicos que compartilham a mesma pressão), estas equações formam um conjunto de
três equações diferenciais parciais não lineares hiperbólicas para os campos de pressão,
velocidade e fração volumétrica de gás.
A cavitação gasosa é comumente levada em consideração como um termo de fonte não
negativo na equação de balanço de massa para o gás livre. Isso é equivalente a assumir um
processo irreversível de liberação de gás, visto que o processo reverso (isto é, de absorção
de gás) ocorre numa escala de tempo maior do que aquela associada com a liberação de gás
(Baasiri & Tullis, 1983; Wylie & Streeter, 1993). Essa hipótese implica em admitir que o
gás liberado permaneça como gás livre ou em cavidades e não se redissolve numa
subsequente elevação da pressão. Uma vez que somente uma pequena parcela do gás
dissolvido efetivamente evolve durante a vida da maioria dos sistemas, é usualmente
admitido que a massa de gás dissolvido permaneça constante e igual ao valor inicial durante
eventos transitórios.
Uma das primeiras proposições de uma expressão para a taxa de liberação de gás é
devida a Van Wijngaarden (1967). Admitindo que a liberação gás seja governada pela
convecção difusiva do gás dissolvido no líquido para dentro da bolha, o autor apelou para a
equação da dinâmica de uma única bolha esférica, juntamente com a hipótese de grandes
números de Péclet, para expressar a taxa de liberação de gás em termos de três parâmetros:
a diferença entre a concentração de gás dissolvido distante da bolha (concentração de
saturação de gás dissolvido no líquido) e aquela na sua superfície, a velocidade relativa
entre a bolha e o líquido e, finalmente, o raio da bolha.
19
Alguns anos mais tarde, estendendo-se implicitamente a Lei de Henry a estados de não
equilíbrio, Kranenburg (1974) reescreveu a expressão para a taxa de liberação de gás
proposta Van Wijngaarden (1967). O autor substitui a diferença de concentração de gás
dissolvido pela diferença entre a pressão de saturação e a pressão local do fluido. Como
consequência, a constante de proporcionalidade da Lei de Henry apareceu na expressão
proposta. Fazendo uso de valores apropriados do número de bolhas por unidade de volume
do fluido e da velocidade relativa entre a bolha e o fluido, Kranenburg (1974) realizou
simulações numéricas envolvendo transientes de pressão na presença das cavitações gasosa
e vaporosa com o intuito de investigar a influência do primeiro fenômeno sobre o segundo.
Reconhecendo as incertezas envolvidas no modelo de Kranenburg e a necessidade de
formulações mais precisas e de maior fundamento físico Wiggert & Sundquist (1979)
simplificaram a formulação proposta por Kranenburg (1974), admitindo que a taxa de
liberação de gás livre dependia exclusivamente na diferença de pressão anteriormente
mencionada, caracterizada como uma medida do grau de supersaturação. Para completar
sua proposta de uma taxa de evolução de gás mais simples, Wiggert & Sundquist (1979)
introduziram um coeficiente de proporcionalidade, o qual foi ajustado mediante o uso de
dados experimentais por eles gerados.
Para investigar pela primeira vez a dissipação não oriunda do atrito em escoamentos
transientes com cavitação, Cannizzaro & Pezzinga (2005) propuseram um modelo
bidimensional levando-se em consideração a troca térmica entre o gás livre e o meio
exterior circundante líquido como também a liberação e absorção de gás. As trocas de calor
e de massa foram consideradas através da equação de balanço de energia para o gás livre e
uma expressão para a taxa de transferência de massa baseada na extensão da Lei de Henry
para estados de não equilíbrio, respectivamente. Após calibrarem os coeficientes do
20
modelo, os autores realizaram simulações numéricas e os resultados foram comparados
com dados experimentais. Eles concluíram que esses dois mecanismos de dissipação não
são sempre capazes de explicar a dissipação total observada.
Visando proporcionar um avanço na esfera do conhecimento teórico sobre a cavitação
gasosa, um novo modelo, que contempla não somente a liberação de gás mas também a
absorção, foi recentemente proposto (Silva & Freitas Rachid, 2013). Ele é formulado no
contexto de uma teoria de variáveis internas e admite como premissa básica misturas de
liquido e gás homogêneas sob transformações isotérmicas, conforme assumido pelos outros
modelos existentes na literatura. Além das massas específicas do líquido e do gás livre, a
fração volumétrica de gás e a concentração de gás dissolvido no líquido são tratadas como
variáveis de estado. Além das equações de balanço de massa e de momentum para a
mistura como um todo e a equação de balanço de massa para o gás livre, outra equação de
balanço de massa para o gás dissolvido é levada em consideração.
Para atribuir uma base termodinâmica consistente ao modelo, as equações constitutivas
são derivadas à luz da termodinâmica dos processos irreversíveis. Além da energia livre de
Helmholtz, admite-se a existência de um pseudo potencial de dissipação a partir do qual
relações constitutivas para os mecanismos dissipativos são obtidas. A restrição associada à
fração volumétrica de gás é tratada como uma propriedade material, fazendo parte efetiva
das leis constitutivas. Os efeitos macroscópicos dissipativos da liberação e da absorção de
gás adequadamente incorporados ao modelo de tal forma que a segunda lei da
termodinâmica é incondicionalmente satisfeita. Fazendo-se uso de uma das mais simples
formas da energia livre de Helmholtz com relação à concentração de gás dissolvido, uma
nova expressão para a taxa de liberação e absorção de gás é proposta, sem apelar-se para a
extensão da Lei de Henry a estado de não equilíbrio. Conforme demonstrado no artigo, a
21
expressão proposta é capaz de descrever adequadamente dados experimentais disponíveis
na literatura com grande acurácia para uma relativamente ampla faixa de pressões de
saturação de misturas de ar e água. Simulações numéricas conduzidas para estas misturas,
submetidas a expansões simples ou carregamentos cíclicos de expansão-contração, ilustram
a influência da liberação de gás na resposta mecânica do fluido, a qual exibe histerese além
dos fenômenos de dispersão e atenuação.
O escoamento através de bocais convergente-divergente também tem sido utilizado para
estudar, experimental e teoricamente, os fenômenos de cavitação gasosa e vaporosa tanto
em regime transiente como permanente. No caso de simulações numéricas, modelos
unidimensionais como também bidimensionais são utilizados em decorrência da
simplicidade advinda quando o regime de escoamento permanente é considerado. Apesar
desta simplificação, outros fatores complicadores podem surgir neste tipo de problema
como a transição de escoamento subsônico para supersônico (na mudança da parte
convergente para a divergente), o surgimento de ondas de choque na parte divergente do
bocal e instabilidades geradas pela dinâmica de contração e expansão das bolhas no
escoamento. Diante desse novo contexto, no qual outros aspectos relevantes surgem no
escoamento com cavitação, os processos de transferência de massa associados aos
fenômenos de cavitação vaporosa e gasosa nem sempre são necessariamente os principais
aspectos das investigações.
Dos trabalhos mais recentes dedicados ao estudo do escoamento em bocais divergente-
convergente destacam-se, em ordem cronológica de publicação, aqueles atribuídos a Ishii et
al. (1993), Preston at al. (2002), Wang & Chen (2002) e Dunn et al. (2010).
Ishii et al. (1993) conduziram um estudo de natureza experimental e teórico para
estudar o escoamento bidimensional com bolhas vertical em bocais. No modelo proposto,
22
embora velocidades distintas sejam atribuídas para as fases líquida e gasosa em conjunto
com a dinâmica da bolha (caracterizada por uma equação da forma de Rayleigh–Plesset que
correlaciona o raio da bolha à pressão local), os efeitos de transferência de massa não são
levados em consideração. No trabalho o estudo é direcionado à investigação do efeito do
raio da bolha na distribuição de velocidade da fase gasosa como também no surgimento das
instabilidades no escoamento associadas ao movimento de contração e expansão das
bolhas, imposto pela geometria do bocal.
Preston at al. (2002) estudaram numericamente os efeitos transientes da dinâmica das
bolhas no escoamento. Para isso, os autores utilizaram um modelo quase unidimensional
contínuo que acopla a equação de Rayleigh-Plesset com as equações da continuidade e
momentum para a mistura como um todo. A estratégia numérica proposta para obtenção de
soluções aproximadas do sistema de equações diferenciais parciais foi baseada no método
dos volumes finitos no âmbito de uma formulação Lagrangeana. Os regimes de escoamento
estudados englobaram aqueles para os quais soluções de regime permanente existem, assim
como aqueles em que a solução diverge devido a instabilidades do movimento das bolhas.
Os resultados obtidos apresentaram relativamente boa concordância quando comparados
com dados experimentais, muito embora os efeitos dissipativos da cavitação decorrentes da
mudança de fase e da liberação de gás dissolvido não tivessem sidos considerados. O único
efeito dissipativo considerado no modelo foi devido amortecimento radial do movimento da
bolha devido à viscosidade do fluido.
Wang & Chen (2002) concentraram a atenção no estudo dos efeitos do movimento
relativo das fases líquida e gasosa no escoamento crítico (afogado) com bolhas, admitindo
como premissa básica que as bolhas eram formadas pelo vapor do líquido em conjunto com
um gás inerte. Para isso, um modelo de dois fluidos unidimensional foi considerado em
23
conjunto com a equação de Rayleigh-Plesset para a dinâmica das bolhas. Os efeitos de
transferência de massa entre as bolhas e o líquido não foram considerados na análise. A
comparação com dados experimentais de outros autores revelaram o modelo proposto
descreve relativamente bem a velocidade relativa entre as fases de acordo com a incerteza
experimental. Excelente concordância entre os resultados teóricos e experimentais foi
também reportada para a vazão mássica crítica e a razão de pressão através das ondas de
choque.
No último trabalho relevante sobre escoamento bifásico com cavitação em bocais
convergente-divergente, Dunn et al. (2010) investigaram experimentalmente a cavitação
gasosa e vaporosa em combustíveis de aviação na presença e na ausência de ondas de
choque na parte divergente do bocal. Os fenômenos de cavitação foram caraterizados
mediante a medição das distribuições da pressão estática ao longo do bocal e de medidas
não intrusivas das velocidades das bolhas e da fração volumétrica da fase gasosa com o
auxílio da técnica de processamento de imagem digital de alta velocidade. Para melhor
caracterizar o padrão de cavitação do combustível de aviação, comparações foram
estabelecidas com o padrão observado na água destilada e no dodecano. Os resultados
obtidos mostraram que a caracterização da cavitação era bem diferente nos três fluidos
analisados. Como as pressões de saturação do ar dissolvido são relativamente próximas das
pressões de vapor para os três fluidos analisados, em praticamente todos os experimentos os
dois fenômenos de cavitação gasosa e vaporosa estiverem presentes, impossibilitando a
identificação isolada dos efeitos desses fenômenos no escoamento.
Visando avançar o conhecimento na área, este trabalho apresenta um estudo numérico
simples sobre a cavitação gasosa em bocais convergente-divergente. A ideia básica por trás
do estudo consiste em testar preliminarmente o modelo de cavitação termodinâmico
24
consistente, desenvolvido recentemente por Freitas Rachid & Silva, 2013 no âmbito da
termodinâmica dos processos irreversíveis. No modelo, o fluido é considerado como uma
pseudo mistura de líquido e gás, ambos considerados substâncias compressíveis. Admite-se
como premissa básica que estes componentes compartilham dos mesmos campos de
velocidade e temperatura e que o escoamento é isotérmico, de modo que apenas uma
equação de balanço de momentum para mistura como um todo é necessária para descrever
o movimento da mistura. A fração volumétrica de gás é tratada como uma variável de
estado, sendo sua restrição devidamente considerada nas relações constitutivas. Em
contraste com outros modelos existentes, o processo de transferência de massa entre as
fases gasosa e líquida é coerentemente descrita como um processo irreversível.
Para reduzir o grau de dificuldade associado à solução numérica do problema, o estudo
foi conduzido considerando-se apenas regime permanente e escoamento subsônico em toda
a extensão do bocal, evitando-se assim a formação de ondas de choque estacionárias na
parte divergente. Por simplicidade, a dinâmica das bolhas regida pela equação de Rayleigh-
Plesset também não foi considerada no modelo.
A capacidade do modelo em descrever adequadamente o comportamento de uma
mistura de líquido e gás escoando num bocal convergente-divergente, na presença de
cavitação gasosa, é analisada por meio de simulações numéricas para a geometria do bocal
utilizado no experimento de Dunn et al. (2010). As aproximações numéricas das soluções
do problema de valor de inicial para as equações diferenciais ordinárias que caracterizam o
modelo foram conduzidas com base no método de Gear, para duas condições iniciais
diferentes associadas à fração inicial de volume de gás e duas pressões de saturação
distintas. Os resultados são comparados com o caso sem cavitação. Além da histerese
observada quando o fenômeno da cavitação ocorre, mostra-se que um pequeno aumento da
25
pressão de saturação pode aumentar drasticamente a taxa de dissipação de energia e, além
disso, o comportamento de outras variáveis importantes, tais como a velocidade da frente
de onda.
1.2.Organização do Trabalho
Para permitir uma leitura mais objetiva e direcionada do trabalho, facilitando ao leitor
melhor selecionar os capítulos que lhe interessam, apresenta-se, a seguir, uma descrição
sumária do conteúdo de cada capítulo.
O segundo capítulo apresenta de forma bem sucinta das equações de balanço
unidimensionais que governam o escoamento invíscido e isotérmico de uma mistura de
líquido e gás sob a forma de gás livre e dissolvido, através de um bocal com área de seção
reta arbitrária e indeformável. Admite-se como hipótese fundamental que o líquido e o gás
compartilham da mesma velocidade e temperatura, de forma que para descrever seu
movimento são necessárias apenas as equações de balanço de momentum na direção da
linha de centro do bocal e uma versão local da segunda lei da termodinâmica, ambas para a
mistura como um todo, além das equações de balanço de massa para o gás dissolvido, o gás
livre e o líquido.
No terceiro capítulo é apresentada a teoria constitutiva, desenvolvida à luz da
termodinâmica dos processos irreversíveis, para retratar consistentemente o fenômeno de
transferência de massa decorrente do processo de liberação e absorção de gás. A teoria
apresentada permite conferir aos fenômenos de liberação e absorção de gás escalas de
tempo diferenciadas, como também magnitudes distintas de taxa de dissipação de energia.
Um conjunto completo de equações constitutivas, formado por leis de estado e leis de
26
complementares, é obtido a partir da proposição de dois potenciais termodinâmicos, a
saber: a energia livre de Helmholtz e um pseudo potencial de dissipação, respectivamente.
A energia livre do fluido é expressa através da ponderação pela fração volumétrica das
energias livres dos constituintes da mistura, como se fossem contínuos independentes. O
pseudo potencial de dissipação é por sua vez escolhido de forma a atender alguns requisitos
matemáticos, os quais asseguram ser a segunda lei da termodinâmica incondicionalmente
satisfeita.
No quarto capítulo são apresentadas as equações de balanço, particularizadas para
regime permanente, em conjunto com as equações constitutivas com o objetivo de
investigar os efeitos do fenômeno de liberação de gás (ar) no escoamento bifásico de uma
mistura de água e líquido num bocal convergente-divergente. As equações resultantes
formam um sistema de quatro equações diferencias ordinárias não lineares, nas quais
figuram explicitamente a velocidade da frente de onda e o número de Mach, além
naturalmente das variáveis dependentes, a saber: a pressão e a velocidade do fluido, a
fração volumétrica de gás e a concentração de gás dissolvido no líquido. O efeito da
presença de gás livre no escoamento é nitidamente notado na expressão da velocidade de
onda, a qual depende fortemente e de forma não linear da fração volumétrica do gás e da
pressão. Evidencia-se nesta expressão, em particular para uma mistura de água e ar à
temperatura ambiente, que baixas pressões e altas frações volumétricas de gás são capazes
de induzir valores de velocidade de onda tão baixos quanto à velocidade da mistura,
permitindo a existência de escoamentos sônicos e supersônicos no bocal.
Restringindo-se, por simplicidade, o estudo a escoamentos subsônicos a partir da
prescrição adequada das condições inicias na entrada do bocal, o problema matemático
resultante é reduzido a um problema de valor inicial cuja solução aproximada é obtida com
27
o emprego do método clássico de Gear, o qual é de até quinta ordem e se destina a sistemas
rígidos, para os quais os métodos clássicos em geral falham. Tomando como referência a
geometria do bocal empregado no estudo de Dunn et al (2010), diferentes simulações
numéricas foram conduzidas, variando-se a pressão de saturação da mistura e a fração
volumétrica de gás na entrada do bocal.
Finalmente no quinto e ultimo capítulo, são apresentadas as principais conclusões do
trabalho como também algumas sugestões para o desenvolvimento de futuros trabalhos.
Uma síntese do trabalho desenvolvido nesta dissertação foi apresentado no artigo intitulado
“ONE-DIMENSIONAL GASEOUS CAVITATING FLOWS IN CONVERGING-
DIVERGING NOZZLES” (Barreto & Freitas Rachid, 2015), o qual foi apresentado no 23o
Congresso Internacional de Engenharia Mecânica, realizado no período de 6 a 11 de
dezembro no Rio de Janeiro, RJ, e disponibilizado na íntegra no Apêndice.
28
Capítulo 2
Equações de Balanço
Considerando um escoamento homogêneo isotérmico unidimensional bifásico de uma
mistura líquido-gás escoando através um bocal convergente-divergente, em que a troca de
massa entre as fases são susceptíveis de ocorrer como resultado da cavitação gasosa. Sob os
pressupostos de equilíbrio térmico, sem deslizamento entre as fases, sem atrito e na
ausência de efeitos gravitacionais, as seguintes equações de balanço são suficientes para
descrever esse problema termomecânico:
) ) ) ) 0,((1 ((1l lA Auu x
(1)
((1 ((1) ) ) )At x
c cAu A
, (2)
( ) ) ,(g gAt x
Au A
(3)
29
2( ( ))( )u Au pAA pAt x x
, (4)
..
: ( ) 0u p A
upx A
dx
, (5)
para (x,t) ϵ (0,L) x (0,+∞), em que L representa o comprimento do bocal. Nestas equações,
u é o campo espacial da velocidade da mistura cuja pressão termodinâmica é denotada por
p. A concentração de gás dissolvido no líquido é representada por c, enquanto que e
representam as densidades de massa de líquido e gás respectivamente. Uma vez que, por
hipótese, as fases líquido e gás são assumidas por coexistir em um mesmo ponto material a
cada instante do tempo, a fração de volume de gás α é submetida a restrição α ϵ (0,1). Está
implícito nas equações acima que não há vapor juntamente com o gás. Como resultado, a
densidade de massa da mistura é a soma da densidade das fases ponderadas de acordo
com as suas frações de volume:
(1 )( )l gc (6)
Como de costume, o ponto sobreposto representa a derivada material em relação ao
tempo e denota a energia livre de Helmholtz por unidade de volume. Com exceção da área
da seção transversal de um bocal, que é suposta ser uma função conhecida da coordenada
axial espacial, todas as outras variáveis dependentes são funções da coordenada axial x e do
instante de tempo t. A taxa de transferência de massa entre as fases gasosa e líquida como
resultado da cavitação gasosa é representada por Γ. Se o gás dissolvido se desprender do
líquido como gás livre, então Γ > 0. Por outro lado, se o gás livre se dissolver na fase
líquida, Γ < 0. Por fim, se não houver transferência de massa, então Γ = 0 e os princípios da
conservação de massa associados com o gás dissolvido e com o gás livre tornam-se
independentes entre si.
30
As equações (1) a (3) expressam o princípio da conservação de massa para a fase
líquida, para o gás dissolvido na fase líquida e para a fase gasosa. A equação (4) expressa
princípio de conservação da quantidade de movimento para a mistura como um todo e a Eq.
(5) é uma versão local da segunda lei da termodinâmica (SLT), que afirma que a taxa de
dissipação de energia d não deve ser negativa. Ele distingue os processos possíveis (d ≥ 0)
dos impossíveis (d < 0). Os processos possíveis são classificados como reversíveis, desde
que d = 0 e irreversível quando d > 0.
Para completar a descrição do problema, devem ser fornecidas as relações
constitutivas. Eles abrangem expressões para p e Γ de tal maneira que a Eq. (5) seja
satisfeita, independente das ações externas e das condições inicial e de contorno.
31
Capítulo 3
Teoria Constitutiva
As relações constitutivas que descrevem o comportamento mecânico macroscópico da
mistura são derivadas no quadro dos processos termodinâmicos irreversíveis.
Para esse problema particular, escolhe-se como variáveis de estado a densidade de
massa local de líquido , de vapor , de gás livre , a concentração do gás dissolvido no
líquido c, a fração de espaço livre α e a temperatura absoluta Ɵ. Como é possível perceber,
a restrição associada com α é tratada nesse trabalho como uma propriedade física das
equações constitutivas. Essa aproximação já foi usada por Freitas Rachid (2003) e Freitas
Rachid (2006) na modelagem da cavitação em escoamentos de fluidos compressíveis e de
efeitos de tensões superficiais em escoamentos líquido-gás homogêneos, respectivamente.
32
3.1. Energia Livre de Helmholtz e Leis de Estado
Seguindo a suposição clássica da termodinâmica dos processos irreversíveis, a energia
por unidade total de volume φ é suposta ser uma função de variáveis de estado , ,c, α e
Ɵ. Uma vez que o fluido é considerado como sendo uma mistura de dois constituintes, o
seu comportamento é suposto por compreender uma combinação das propriedades
termomecânicas de líquidos e gases, tendo α como um fator de ponderação. Assim,
escolhe-se
'( , , , ) : Φ ( , ,, , , , , ) , l v g l v gc c I
(7)
Em que
'Φ ( , , , ) : (1 ) ( ) (1 ) ( ) ( ), , , ,l v g l l l c g g gc c
(8)
(α):=0, αϵ 0, 1 ∞, casocontrário
(9)
Na expressão acima, Φ é uma função suave que descreve as propriedades
termomecânicas do fluido, ao passo que (α) representa a função indicadora do conjunto
convexo (0, 1) (Moreau et ai., 1988). O termo (α) é a parcela não-suave da energia livre e
é incluída para adotar a restrição internaαϵ 0, 1 como hipótese constitutiva. Em outras
palavras, ele impede α de ficar fora de seu intervalo admissível, uma vez que seria
necessária uma quantidade infinita de energia para isso.
Os termos Φ e Φ representam as energias livres por unidade de massa de líquido e
gás, respectivamente. Como sugerido por essa dependência funcional, estas energias livres
33
são supostas a representar o comportamento termomecânico do líquido e do gás, como se
fossem constituintes individuais. Finalmente, o termo c denota a energia livre por unidade
de massa de gás dissolvido que é incorporado na energia livre da mistura para levar em
conta a liberação e absorção do gás. Por uma questão de simplicidade, assume-se como
hipótese constitutiva que c depende unicamente da temperatura. De acordo com a teoria
apresentada em Rachid Freitas & Silva (2013), as seguintes formas para estas energias
livres são assumidas:
02, )( ) : ( l
l l l l l ll
C Log a Log
(10)
2( , )) : ,(g g g g g gC Log a Log
(11) 2 22
( )sc g g g
g
pC Log a Log a
a
(12)
Nas expressões acima, e são considerados constantes. Eles representam os
calores específicos a volume constante do gás dissolvido no líquido e gás livre,
respectivamente. Os parâmetros materiais , , e dependem da temperatura, sendo os
dois últimos o quadrado das velocidades de propagação isotérmica da frente de onda no
líquido puro e gás puro, respectivamente. Na Eq. (12), representa a pressão de saturação,
que depende apenas da temperatura, ou seja, ( )s sp p .
As leis de estado para o fluido, que relacionam as componentes reversíveis das
forças termodinâmicas com as variáveis de estado, são obtidas a partir do potencial de
energia livre e definidas como segue:
34
'
: (1 ) ( ) (1 ) l ll l
ll
pB g
, (13)
'
: ( ) g gg g
g g
pB g
, (14)
'
: (1 )ccB
c
, (15)
'
:B h
, com h ∝ (̅α) , (16)
em que;
'
g g l l cc
(17)
2 2 0: ( )ll l l l l
l
p a
e 2 2: g
g g gg
gp a
(18)
Nas equações acima, e representam as pressões parciais de líquido e gás,
respectivamente. O termo h na Eq. (16) é um elemento do subconjunto diferencial ∝ (̅α)
(também chamado de derivada total) em relação a ∝ da função convexa (̅α). O sub-
diferencial da função indicadora (̅α) em α é dado pelo conjunto (Ekeland & Teman, 1976;
Moreau et al., 1988):
* *_ _ _
) : { ) ) (( ( )(h hI I I ;∀ α∗ (0,1)}, (19)
Um cálculo simples mostra que e _
( )I se α ∉ (0,1). A restriçãoαϵ 0, 1 é
efetivamente levada em conta através da lei constitutiva Eq. (16), uma vez que esta relação
implica que o sub-diferencial _
)(I não é vazio.
35
Tendo em mente que as derivadas temporais devem ser deixadas como derivadas, a
fim de lidar com o princípio do determinismo, isso mostra que a derivada temporal material
que aparece na Eq. (5) pode ser escrita para α (0, 1) como:
. . . .' ' ' .'
ll g
g
cc
(20)
Quando o resultado acima é utilizado na Eq. (5), juntamente com as leis de estado, Eqs.
(13-16), a Eq. (5) pode ser reescrita como:
. . . .
: ( ) 0gll g
cud p B B c BB
x
(21)
Para se obter um conjunto completo de equações constitutivas, é suficiente
especificar um pseudo-potencial de dissipação a partir do qual são derivadas as leis
complementares, de tal maneira que a versão local da SLT dada pela Eq. (5) ou (21) seja
sempre verificado, independentemente das condições iniciais e de contorno.
3.2. Pseudo-potencial de Dissipação e Leis Complementares
Para introduzir o comportamento irreversível da mistura gás-líquido e também para
assegurar que a SLT seja sempre satisfeita, assume-se que existe um potencial de pseudo-
36
dissipaçãoΦ, que é uma função convexa, diferenciável e objetiva de . Assume-se
implicitamente aqui, tal como foi afirmado anteriormente, que o fluido é perfeito, isto é,
não existe qualquer viscosidade. Além disso, o pseudo-potencial Φ=Φ ( ; α ; c ; Ɵ), para
quaisquer valores de , α , c e Ɵ, é assumido como tendo as seguintes propriedades:
Φ ( , α , c , Ɵ) ≥ 0 e Φ (0 , α , c , Ɵ) = 0, (22)
A informação adicional associada com o comportamento dissipativo do fluido é
obtido com Φ através da seguinte lei complementar:
ΓΓ :
B
(23)
Adicionalmente, se a taxa de dissipação de energia d é suposta a ter a forma para αϵ 0, 1 ,
d:= Γ, (24)
logo, obtemos da propriedade da convexidade de Φ que, para qualquer evolução (Berger,
1977):
d:= Γ ≥ Φ ( , α , c , Ɵ) - Φ (0 , α , c , Ɵ). (25)
Em vista da Eq. (22), é fácil ver que d ≥ 0 para qualquer evolução real do fluido e
então a SLT dada pela desigualdade Eq. (5) é sempre satisfeita.
37
Do ponto de vista mecânico, a Eq. (24) estabelece que a taxa de energia dissipada é
devido ao processo de cavitação gasosa apenas. Os pressupostos constitutivos feitos até
agora são suficientes para caracterizar parcialmente o comportamento mecânico do pseudo-
fluido. Uma vez que as equações de balanço de massa dadas pelas Eqs. (1,2,3) definem
subespaços do espaço linear gerado por u, , , e α, em seguida, a fim de que a Eq. (21)
seja igual a Eq. (24), para qualquer evolução real é possível provar que (Freitas Rachid &
Silva, 2013), para αϵ 0, 1 , é preciso ter as seguintes relações entre as forças
termodinâmicas:
= = (26)
= Φ + (27)
As relações acima estabelecem que a pressão da mistura é igual às pressões parciais
do líquido e do gás livre e que a força termodinâmica associada com a taxa de transferência
de massa de gás entre as fases líquida e gasosa é igual à diferença das energias livres destas
duas fases.
Na sequência, assumimos a seguinte escolha simples e adequada paraΦ:
22Γ Γ Γ( , , ) : 2 2
, ar nn ar
r a
B c B Bn n
. (28)
Em que = (c, Ɵ) e = (Ɵ), com k {a, r}, são constantes materiais positivas,
com > 1/2, associadas com os fenômenos de liberação de gás (k = r) e absorção de gás
(k = a). O termo ⟨X⟩ representa o valor máximo entre zero e X, isto é, ⟨X⟩:= max = {0, χ}.
A equação (28) satisfaz as condições estabelecidas anteriormente e por isso o SLT dado
pela Eq. (21) é satisfeito incondicionalmente. Como resultado, com base nas Eqs. (23), (26-
38
27) e (28), as escolhas específicas expressas pelas Eqs. (10-28) dão lugar à seguinte
equação constitutiva:
2 1 2 12 1 2 12 2( ) ( ) a ar r n nn ns sr g a g
p pa Log a Lo
p pg (29)
em que Ɵ), = (c, Ɵ) e = (Ɵ), com k ϵ a, r .
Devido a natureza da relação funcional empregada na Eq. (29), é fácil notar que Γ
pode ser tal que Γ≥ 0 bem como Γ≤ 0. Em outras palavras, o fenômeno de liberação de gás
é considerado bem como o processo reverso de absorção de gás. A transferência de massa
pode ocorrer a partir do gás dissolvido no líquido para gás livre em suspensão no fluido, e
vice-versa. Embora o tempo característico do fenômeno de absorção de gás seja muito mais
longo do que a liberação de gás, ambos os processos podem ser contabilizados na teoria
proposta dentro de um mesmo contexto. A equação (29) indica que o gás vai evoluir do
líquido sempre que a pressão de mistura for reduzida abaixo da pressão de saturação (p
< ). Por outro lado, o gás irá dissolver-se no líquido sempre que a pressão do líquido for
maior que a pressão de saturação (p ). Ambas as situações estão em conformidade com
os resultados experimentais.
A pressão de saturação, que é um parâmetro constitutivo no modelo aqui proposto, é
relacionada com a concentração de saturação de gás dissolvido no líquido pela lei de Henry
(Sander, 1999). Esta lei estabelece que a quantidade de gás dissolvido num líquido é
diretamente proporcional à pressão parcial do mesmo gás na fase gasosa em contato com o
líquido no estado de equilíbrio termomecânico, ou seja, = , em que = (Ɵ) é a
39
constante de proporcionalidade da Lei de Henry, dependente da temperatura, para um par
gás-líquido específico sob consideração (Sander, 1999).
40
Capítulo 4
Simulações Numéricas
Para obter uma melhor compreensão sobre a cavitação gasosa atuante no escoamento de
uma mistura líquido-gás, tomamos como exemplo primário um escoamento de estado
estacionário através de um bocal convergente-divergente. Neste problema, a cavitação
gasosa é induzida pela redução da pressão, que ocorre como resultado da redução de área.
Apesar de ser simples, do ponto de vista mecânico, este problema específico conta com
dados experimentais escassos disponíveis na literatura, pelo menos quando a cavitação
gasosa é a questão central. Com o objetivo de aderir, tanto quanto possível para a situação
física real, apelamos aos dados experimentais existentes de Zielke et al. (1990) sobre
cavitação gasosa, que por sua vez não é dedicada especificamente aos fluxos de estado
estacionário em bocais convergente-divergente. Embora os dados de Zielke terem sido
colocados no contexto de escoamentos instáveis, eles podem ser usados para ajustar os
coeficientes materiais do modelo constitutivo proposto na seção passada, como é mostrado
em Rachid Freitas e Silva (2013).
41
Por outro lado, para reduzir os efeitos tridimensionais do escoamento, recorremos à
geometria do bocal utilizado no trabalho experimental e teórico de Dorofeeva et ai. (2009),
que foi utilizado não para investigar a cavitação gasosa mas investigar a cavitação vaporosa
(as transformações líquido-vapor) de combustíveis de aviação através de passagens
estreitas.
Ao considerar os dados de Zielke, o que exclui a possibilidade do gás livre dissolver-se
novamente no líquido e a geometria do bocal de Dorofeeva, as equações governantes sob
escoamento de estado estacionário são reduzidas a:
22
Γ
1 g
dp m u dA
dx A A dxM
(30)
du A dp
dx m dx
(31)
2
2 2
1 11
g g g
d u dp dA
dx a u dx u A dx
(32)
2
1 (1 )1
dc d dp dAc
dx dx u d
c c
x u A dx
(33)
Para x ϵ 0, L , em que = , o qual é uma constante, representa a taxa de fluxo de
massa através do bocal e M := u/a representa o número de Mach, onde a representa a frente
de onda na mistura líquido-gás:
1/22 2
2 2( 1l l g g
l l g g
a aa
a a
(34)
42
A taxa de transferência de massa Γ e a área do corte transversal do bocal A := y(x)h,
com h = 1,6 milímetros sendo a profundidade do bocal, são dadas por:
2 10.86(Re) rnsr p
pk Log , com
11
2
7.1 1 0
h
xk
D
[Kgm³/s] (35)
A função y(x)[mm] é regida por:
, 0 25.41.59, 25.4 31.8
, 31.8 127
(36)
em que Re( )
l h
l
UD
é o número de Reynolds; com hD := 4A/P sendo o diâmetro
hidráulico, U a velocidade da mistura e P o perímetro molhado, todos avaliados na garganta
do bocal.
O comprimento total do bocal, L, é de 127 mm. A área do bocal é constante para x =
25,4 mm a x = 31,8 mm. As alturas de entrada e saída, y (x=0 milímetros) e y (x=127
milímetros), são ambos de 19 mm e a altura é 1,59 mm garganta. A figura 4.1 representa,
esquematicamente, o perfil do bocal e suas coordenadas.
43
Isto fornece uma proporção da área de entrada do bocal para a garganta de 12:1. Os
coeficientes dos polinômios na Eq. (36), que descrevem a seções convergente e divergente
da altura do bocal em função da coordenada axial, são apresentados na Tabela 1.
i = 5 i = 4 i = 3 i = 2 i = 1 i = 0
-6.4367804E-6 +4.1349816E-4 -6.4900889E-3 -2.2789376E-2 -1.6195205E-2 +1.8999921E+1
+1.0820115E-8 -4.3056382E-6 +5.9625754E-4 -3.3277792E-2 +8.0739920E-1 -5.5563366E+0
Os coeficientes materiais para a Eq. (35) associados ao fenômeno de liberação de
gás na cavitação gasosa para uma mistura de ar e água à temperatura ambiente são
Tabela 4.1. Coeficientes polinomiais dados pela Eq. (36) que caracterizam o perfil do bocal
Figura 4.1. Perfil do bocal
44
Tabela 4.2. Coeficientes materiais para a Eq. (35) que caracteriza o fenômeno de liberação de gás na cavitação gasosa para duas pressões de saturação distintas.
apresentados na Tabela 2 para duas pressões de saturação distintas, que são = 52 kPa e
= 125 kPa. Estes coeficientes foram ajustados em Rachid Freitas e Silva (2013), com
base nos resultados experimentais de Zielke et ai. (1990). As concentrações de gás
dissolvido, que estão associados com essas pressões de saturação através da lei de Henry,
são também apresentados na Tabela 2.
Como pode ser visto na Eq. (34), a velocidade da frente de onda depende não apenas da
fração de volume de gás α e da pressão p através das equações de estado para o líquido e
gás, mas também para a concentração de gás dissolvido c que aparece na densidade de
massa da mistura ρ (ver Eq. (6)). No entanto, uma vez que, na prática, c << ( c/ é da
ordem de 10 ), a dependência de a em c é insignificante e, portanto, pode ser ignorada.
Como resultado, a Eq. (34) se parece exatamente com expressão clássica derivada no
trabalho pioneiro de Wood (1930).
A influência da fração do volume de gás e da pressão sobre a velocidade da frente
de onda pode ser visualizada na Fig. 4.2, a qual foi plotada usando a Eq. (34) para uma
mistura ar-água à temperatura ambiente ( = 1485m/s, = 997,98 kg/m³ e = 290
m/s). Pode ser visto que, mesmo para pequenos valores da fração do volume de gás, a
(Kpa) (Kg/m³) (-) 2 -1 (-)
52 0.021 0.00100 4.445
152 0.050 0.03088 3.420
45
velocidade da frente de onda é drasticamente reduzida quando a pressão na mistura cai
abaixo de 100 kPa até a pressão de vapor 2,334kPa. Como veremos mais adiante, o
processo de liberação de gás atua reduzindo ainda mais a velocidade de frente de onda, o
que justifica a sua inclusão na modelagem de fenômenos de propagação de onda quando se
tornar uma característica relevante.
Para avaliar os efeitos do processo de liberação de gás no escoamento de uma
mistura líquido-gás através do bocal anteriormente mencionado, o sistema de equações
diferenciais ordinárias dado pelas Eqs. (30) a (33) é resolvido numericamente para uma
mistura ar-água à temperatura ambiente. Para assegurar que a fração do volume de gás não
Figura 4.2. Velocidade da frente de onda em função da fração de volume de gás em diferentes pressões p = 2,34, 10, 100, 1000, 10.000, 100.000 kPa para uma mistura ar-
água a temperatura ambiente.
46
irá atingir valores excessivamente elevados no interior do bocal de modo que a dinâmica da
bolha não se torne relevante e para garantir que o escoamento não se torne sônico na
garganta, dando origem à possibilidade da ocorrência de ondas de choque na seção
divergente, apenas baixos valores de frações de volume de gás são considerados,
juntamente de uma combinação de um fluido de baixa velocidade e alta pressão relativa,
como condições iniciais na entrada do bocal. Assim, conforme as condições iniciais,
consideramos todas as combinações possíveis dos seguintes valores:
p(x=0) = = 303.98 Kpa, u(x=0) = = 2.0 m/s, (37)
α(x=0) = α = 1010
, c(c=0) = c = 0,021 / 520,050 / 125
(38)
A solução numérica aproximada para o problema de valor inicial formado pelas
Eqs. (30) a (33), juntamente com as Eqs. (37-38) foi obtida aplicando o método de Gear
clássico, com tamanho de malha inicial de 0,635 mm e uma tolerância da ordem de 10 . O
método de Gear é um método multi-passo até a quinta ordem e é especialmente designado
para lidar com equações diferenciais rígidas.
Na sequência, apresentamos os resultados numéricos obtidos considerando as
condições iniciais dadas pela Eq. (37) com α =10 e α = 10 , para duas pressões de
saturação diferentes e = 52kPa e = 125kPa, que correspondem a = 0,021 kg / m³ e
= 0,050 kg / m³, respectivamente. Para melhor realçar os efeitos da liberação de gás no
escoamento, simulações numéricas foram também realizadas sem considerar o fenômeno
da cavitação, definindo Γ = 0 nas Eqs. (30, 32, 33). As respostas normalizadas de pressão
:= p/p , a velocidade := u/u , a fração volumétrica de gás α := α/α , a velocidade da
47
frente de onda de um ≔ a/a e fração de massa de gás : = f/f (com f:= (α ) / )
como função da posição normalizada ao longo do bocal := x/L são plotados
graficamente nas Figs. 4.3 a 4.8 e 4.9 a 4.14 para α = 10 e α = 10 , respectivamente.
A fim de ajudar na interpretação destas curvas, o perfil da metade superior do bocal
também foi apresentado por uma linha preta nas figuras que seguem.
Figura 4.3. Pressão normalizada x posição normalizada.
48
Figura 4.4. Velocidade normalizada x posição normalizada
Figura 4.5. Fração de volume de gás normalizado x posição normalizada
49
Figura 4.7. Fração de massa de gás dissolvida normalizada x posição normalizada
Figura 4.6. Velocidade da frente de onda normalizada x posição normalizada
50
As figuras (4.3-4.8) correspondem aos resultados gerados para uma mistura ar-água
a temperatura ambiente escoando em um bocal convergente-divergente para três diferentes
situações: i) sem cavitação; ii) com cavitação para uma pressão de saturação = 52 kPa e
iii) com cavitação para uma pressão de saturação = 125 kPa. A fração do volume de gás
admitido é α = 10 . Como pode ser visto nas Figs. 4.3 e 4.4, as respostas da pressão e
velocidade para as pressões de saturação = 52 kPa e = 125 kPa são quase as mesmas
que as observadas para o escoamento sem cavitação, exceto para um pequeno local da saída
do bocal. Como esperado, a velocidade aumenta através da seção convergente, atinge o seu
máximo na garganta do bocal e depois diminui ao longo da seção divergente. Um
comportamento inverso é observado para a resposta da pressão.
Figura 4.8. Pressão normalizada x fração de gás normalizada
51
As diferenças entre as respostas com cavitação e sem cavitação tornam-se evidentes
nas parcelas da fração de volume de gás e da velocidade normalizada da frente de onda
apresentada nas Figs. 4.5 e 4.6. Quando não há cavitação, não há mecanismo de dissipação.
A fração do volume de gás torna-se dez vezes maior na parte estreita do bocal, mas restaura
ao seu valor inicial na saída do bocal (ver Fig. 4.5). Para os fluxos com cavitação, quanto
maior for a pressão de saturação, maior será a fração do volume de gás na garganta do
bocal. Neste local, a fração do volume de gás é mil e um milhões de vezes maior que o
valor inicial α para = 52 kPa e = 125 kPa, respectivamente. Em contraste com a
resposta sem cavitação, a fração do volume de gás não volta ao seu valor inicial na seção
divergente do bocal. Na ausência de cavitação, devido à ligeira variação da fração do
volume de gás e da pressão, a velocidade da frente de onda permanece praticamente
inalterada ao longo do bocal (em torno = 1480 m/s), como pode ser visto na Fig.4.6 .
52
Figura 4.10. Velocidade normalizada x posição normalizada
Figura 4.9. Pressão normalizada x posição normalizada
53
Figura 4.11. Fração do volume de gás normalizado x posição normalizada
Figura 4.12. Velocidade da frente de onda normalizada x posição normalizada
54
Figura 4.14. Pressão normalizada x fração do volume de gás normalizado
Figura 4.13. Fração da massa de gás normalizada x posição normalizada
55
As figuras (4.9 – 4.14) representam a resposta mecânica de uma mistura ar-água a
temperatura ambiente escoando em um bocal convergente-divergente para três diferentes
situações: : i) sem cavitação; ii) com cavitação para uma pressão de saturação = 52 kPa
e iii) com cavitação para uma pressão de saturação = 125 kPa. A fração de volume do
gás admitido é α = 10 .
No entanto, em escoamentos com cavitação, a velocidade da frente de onda é
reduzida de 36% e 96% do seu valor inicial para o = 52kPa e = 125kPa,
respectivamente. Mesmo para = 125kPa, o número de Mach não atinge valores acima
de 0,5. Diferente do caso para = 52kPa, a velocidade da frente de onda não retorna ao
seu valor original da entrada do bocal. Apesar disso, é possível ver na Fig. 4.7 que a
quantidade de gás dissolvido que é liberado na garganta do bocal é muito pequena (cerca de
4% do seu valor inicial) e é quase o mesmo para = 52kPa e = 125kPa. Nota-se que o
gás liberado não se dissolve novamente no líquido na seção divergente. Para deixar em
evidência o fenômeno de histerese induzida pela liberação de gás, foi representada
graficamente na Fig. 4.8 a pressão normalizada como função da fração do volume de gás
normalizado. Uma vez que não há dissipação para o escoamento sem cavitação, o caminho
- α na seção convergente é o mesmo do que na seção divergente, de modo que o par
ordenado ( , α ) no gráfico na entrada do bocal é o mesmo do que na saída do bocal. No
entanto, quando a cavitação gasosa ocorre, estes dois pontos têm coordenadas distintas.
Quanto maior for a pressão de saturação, mais pronunciada se torna a histerese.
56
As respostas dos valores normalizados da pressão, velocidade, fração do volume de
gás, velocidade da frente de onda, fração da massa de gás dissolvido em função da posição
normalizada ao longo do bocal estão representados nas Figs. 4.9, 4.10, 4.11, 4.12, 4.13 para
α = 10 , para ambas as pressões de saturação = 52kPa e = 125kPa. Como pode ser
visto na Fig. 4.9 e na Fig. 4.10, um aumento de α de 10000 não é suficiente para alterar as
respostas da pressão e velocidade, que continuam a ser praticamente iguais ao observado
para o caso sem cavitação. Diferentemente do caso em que α = 10 , nesta nova escala
não há diferença perceptível entre as respostas da fração do volume de gás e da velocidade
da frente de onda entre = 52kPa e o caso sem cavitação, como pode ser visto nas Figs.
4.11 e 4.12. Note que em contraste com o caso em que α = 10 , uma redução
significativa da velocidade da frente de onda é observada agora, mesmo quando não há
cavitação. No entanto, para a pressão de saturação = 125kpa, variações significativas
são observadas tanto na fração de volume de gás quanto na velocidade da frente de onda. O
valor máximo absoluto da fração do volume de gás atinge o valor de 0.01, enquanto que o
valor mínimo da velocidade da frente de onda é de 100 m/s (com um número local de Mach
de 0.63), ambas ocorrendo na garganta do bocal. Como já ocorreu para α = 10 , a
resposta da fração de massa de gás dissolvido é indistinguível para = 52kPa e = 125
kpa, como pode ser visto na Fig. 4.13. Novamente, pode ser visto que apenas uma pequena
quantidade de gás dissolvido se desprende do líquido e permanece como gás livre da
garganta do bocal até a sua saída. A Figura 4.14, que mostra a pressão normalizada em
relação à fração do volume de gás normalizado, mostra que a histerese observada para =
52kPa é quase não perceptível uma vez que a curva para esta pressão de saturação é
57
praticamente sobreposta àquela em que não há cavitação. No entanto, para = 125 kPa é
bastante significativo.
Figura 4.15. Taxa de dissipação de energia x posição normalizada para = 52kPa
Figura 4.16. Taxa de dissipação de energia x posição normalizada para = 125 kPa
58
Finalmente, é apresentada nas Figs. 4.15 e 4.16, a taxa de dissipação de energia em
função da posição normalizada ao longo do bocal para ambos os valores de = 52 kPa e
= 125 kPa, respectivamente. De acordo com o modelo, a dissipação ocorre sempre que a
pressão cai abaixo da pressão de saturação, que ocorre apenas na garganta do bocal, como
pode ser visto nas Figs. 4.15 e 4.16. Enquanto que uma mudança significativa na fração de
volume inicial não implica em um drástico aumento da taxa de dissipação, uma pequena
mudança na pressão de saturação é responsável por aumentar a taxa de dissipação de
energia em um fator de aproximadamente 1000. Embora os resultados obtidos pareçam
estar em conformidade com o que é esperado do ponto de vista físico, resultados
experimentais ainda são necessários para validar de forma definitiva o modelo.
59
Capítulo 5
Considerações Finais e Sugestões para Futuros
Trabalhos
Neste trabalho simulações numéricas foram realizadas para investigar a influência da
cavitação gasosa no escoamento de uma mistura ar-água através de um bocal. Para tal, um
modelo termodinâmico coerente para descrever a liberação de gás recentemente proposto
na literatura foi utilizado. Na ausência de escoamento sônico e supersônico na parte
divergente do bocal, o problema matemático é caracterizado por um problema de valor
inicial formado por um sistema de equações diferenciais ordinárias não lineares, cuja
solução numérica foi aproximada empregando o método clássico de Gear.
Tomando-se como referência a geometria do bocal empregado no estudo de Dunn et al
(2010), diferentes simulações numéricas foram realizadas para uma mistura de água e ar à
temperatura ambiente para duas condições iniciais diferentes associadas com a fração do
60
volume de gás inicial e duas pressões de saturação distintas. Para caracterizar o efeito da
cavitação gasosa decorrente da liberação de gás nos parâmetros básicos do escoamento, os
resultados forma comprados com os que seriam obtidos caso não ocorresse o fenômeno de
cavitação.
Os resultados obtidos mostraram que, por ser um fenômeno de natureza dissipativa,
a cavitação gasosa induz uma dissipação adicional ao escoamento, a qual é capaz de
proporcionar efeitos significativos no padrão de escoamento. Além da histerese observada
quando a cavitação ocorre, é mostrado que um pequeno aumento da pressão de saturação de
gás dissolvido no líquido pode aumentar drasticamente a taxa de dissipação de energia e a
fração volumétrica de gás, induzindo uma substancial redução da velocidade da frente de
onda no meio. Embora uma mudança significativa na fração de volume inicial não implique
num drástico aumento da taxa de dissipação, uma pequena mudança na pressão de
saturação é responsável por aumentar a taxa de dissipação de energia em um fator de
aproximadamente 1000.
Embora os resultados obtidos pareçam estar em conformidade com o que é esperado
do ponto de vista físico, resultados experimentais ainda são necessários para validar de
forma definitiva o modelo. Como na pesquisa bibliográfica realizada, os dados
experimentais para a cavitação gasosa em bocais convergente-divergente ou estavam
atrelados à existência de ondas de choque na parte divergente do bocal ou apareciam
conjuntamente com a presença da cavitação vaporosa ou numa combinação de ambos os
fenômenos, a sugestão mais imediata para a continuidade do presente estudo consiste em
ordem direta de crescente dificuldade:
a Repensaraestratégianuméricadesoluçãodoproblemadeformaapossibilitaro
tratamento da existência de choque na parte divergente. Isto pode ser feito
61
segundo duas abordagens distintas: no âmbito do escoamento permanente ou
transiente. No primeiro caso, deve‐se alterar a estratégia de solução para um
problemadevalordecontornoumavezqueapressãonasaídadobocaldeveráser
prescrita,queseja capazde lidarcomasingularidadedasoluçãodeescoamento
sônico número de Mach igual à unidade na garganta do bocal e incorpore as
relações de salto de Rankine‐Hugoniot. No caso transiente, deve‐se adotar uma
estratégiadesolução,dentreasváriasexistentesnaliteratura,deproblemashiper
bólicos capazes de capturar choques sem introduzir dissipação numérica
excessiva,umavezqueasoluçãoderegimepermanenteserábuscadaevoluindo‐
senotempo.
b Incorporarofenômenodecavitaçãovaporosanomodelodesenvolvidodeformaa
possibilitar o a simulação conjunta de ambos os fenômenos, conforme proposta
apresentadaemBarreto&FreitasRachid 2013 .
c Combinar os itens anteriores de forma a aumentar a possibilidade de efetuar
comparaçõescomdadosexperimentaisdisponíveisnaliteratura.
62
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66
Apêndice
ONE-DIMENSIONAL GASEOUS CAVITATING FLOWS IN CONVERGING-DIVERGING NOZZLES
Artigo apresentado no 23o Congresso Internacional de Engenharia Mecânica, realizado no período de 6 a 11 de dezembro no Rio de Janeiro, RJ.