110
1 MAKI HIRAI O esporte e sua inserção no sistema de espaços livres paulistano Dissertação apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo para a obtenção do título de Mestre em Arquitetura Área de Concentração: Paisagem e Ambiente Orientador: Prof. Dr. Silvio Soares Macedo São Paulo 2009

DISSERTACAO - FINAL 2.indd

Embed Size (px)

Citation preview

  • 1

    MAKI HIRAI

    O esporte e sua insero no sistema de espaos livres paulistano

    Dissertao apresentada Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de So Paulo para a obteno do ttulo de Mestre em Arquitetura

    rea de Concentrao: Paisagem e AmbienteOrientador: Prof. Dr. Silvio Soares Macedo

    So Paulo2009

  • 2

    AUTORIZO A REPRODUO E DIVULGAO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR

    QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA,

    DESDE QUE CITADA A FONTE.

    E-MAIL: [email protected]

    Hirai, Maki

    H668e O esporte e sua insero no sistema de espaos livres

    paulistano / Maki Hirai. --So Paulo, 2009.

    110 p.

    Dissertao (Mestrado - rea de Concentrao: Paisagem

    e Ambiente) - FAUUSP.

    Orientador: Silvio Soares Macedo

    1.Espaos livres So Paulo(SP) 2.Esportes 3.Lazer

    4.Paisagem I.Ttulo

    CDU 712.25(816.11)

  • 3

    Aos alunos da turma do Professor Silvio Macedo, disciplina AUP650, 2. Semestre de 2006, por me darem a certeza de estar no caminho certo.

  • 4

  • 5

    Agradecimentos

    minha famlia, pelo apoio incondicional em todos os momentos de minha vida.

    Aos meus amigos, em especial Thais Aquino Alves da Cunha, Luis Felipe Jorge Bernardini, Marcelo Mesquita Nunes, Fbio Yam Gomes Liu e Murilo Noznica Penessor. Nathalia Diniz e Andr Casado Castao, que alm de amigos, so tambm Mestres, e foram exemplos completamente distintos, mas igualmente importantes durante o desenvolvimento desse trabalho.

    Ao Professor Dr. Silvio Macedo, no apenas pela orientao durante o mestrado, mas por todo o aprendizado ao longo dos dez anos que abrangeram o meu ingresso no curso de graduao da FAU at a concluso desta pesquisa. Agradeo por sua dedicao, confiana e pacincia.

    Professora Dra. Vanderli Custdio e ao Professor Dr. Eugnio Queiroga, membros da banca de qualificao, pelos comentrios e sugestes.

    Isa, da sesso de alunos da ps-graduao, Estelita e Maria Jos, da biblioteca da FAU Maranho, Rejane e Regina, da biblioteca da FAU USP e Ana Maria e Ins, da biblioteca da SEME, por estarem sempre disposio e pelo auxlio prestado.

  • 6

  • 7

    HIRAI, Maki. O esporte e sua insero no sistema de espaos livres paulistano. 2009. 110 p. Dissertao (Mestrado) Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2009.

    Como tema geral do trabalho, tem-se o esporte ao ar livre no meio urbano, sendo o objetivo principal dessa dissertao entender o porte e o funcionamento do sistema de espaos livres pblicos destinados recreao esportiva na cidade de So Paulo. Dessa forma, essa pesquisa apresenta um panorama geral da evoluo das prticas esportivas nos espaos livres paulistanos, verificando-se quais foram os acontecimentos que, ao alterarem a maneira de se ver o esporte, modificaram tambm a paisagem do municpio. Assim, atravs de pesquisas bibliogrficas, pde-se entender como a cidade de So Paulo, de uma sociedade colonial escravista, interiorizada e alheia aos esportes, com ruas precrias e praticamente sem espaos livres pblicos adequados ao lazer esportivo da populao, evoluiu para a situao atual, onde o esporte considerado um direito fundamental do indivduo e os equipamentos esportivos se encontram em quantidade razovel, ainda que sejam insuficientes para atender as necessidades de lazer dos cerca de 11 milhes de habitantes. O levantamento de dados a respeito das instalaes voltadas para o esporte na cidade, tanto pblicas como particulares, somado aos aspectos socioeconmicos, sobretudo a renda materializada sob a possibilidade de se residir em um condomnio equipado com quadras esportivas e piscinas ou de se frequentar clubes e academias particulares - possibilitou a compreenso do porte e do funcionamento do sistema de espaos livres esportivos paulistano. Verificou-se que o sistema diversificado e hierarquizado; porm, a distribuio dos equipamentos pelo municpio irregular, ou seja, a diversidade do sistema inacessvel grande parte da populao.

    Palavras-chave: espaos livres, sistema, esporte, lazer, paisagem, cidade de So Paulo.

    R e s u m o

  • 8

  • 9

    A b s t r a c tHIRAI, Maki. The sport and its insertion in the open spaces system of So Paulo city. 2009. 110 p. Dissertation (Master Degree) Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2009.

    This paper presents a study about the outdoor sports practices in an urban environment, being the main objective of this dissertation to understand the size and operation of the open spaces system for recreational sports in the city of So Paulo. Thus, this research presents an overview of the evolution of sporting activities in the city, verifying which events not only had changed the way to see the sport, but also had modified the landscape of the city. Through bibliographic searches, it could be comprehended as the city of So Paulo, of a colonial slave society, internalized and unrelated to sports, with precarious streets and almost no public open spaces suitable for the population leisure, has evolved to the current situation, where the sport is considered a fundamental right of individuals and sporting equipment, even in reasonable quantity, are insufficient to answer the needs of leisure of about 11 million inhabitants. The survey data about the city sports facilities, both public and private, added to the socioeconomic aspects, especially the income - materialized in the ability to live in a condo equipped with sports courts and swimming pools or to attend private clubs or academies enabled the understanding of the size and operation of the recreational open spaces system of So Paulo. It was found that the system is diversified and hierarchical, however, the equipments distribution by the territory is irregular, that is, the diversity of the system is inaccessible to great part of the population.

    Key words: open spaces, system, sport, leisure, landscape, So Paulo city.

  • 10

  • 11

    1. Introduo

    2. O espao livre e o esporte na cidade de So Paulo2.1 O esporte e os espaos livres: esclarecendo alguns conceitos2.2 A introduo dos esportes na cidade de So Paulo

    3. Os equipamentos esportivos pblicos3.1 Os parques3.2 As praas3.3 As ruas3.4 As represas 3.5 As ciclovias3.6 Os Centros Esportivos3.6.1 As unidades estaduais 3.6.2 As unidades municipais especiais 3.6.3 Os Clubes da Cidade (CCs)3.6.4 Os Clubes da Comunidade (CDCs)3.6.5 Os equipamentos em sistema de rodzio (EESRs)3.7 As unidades educacionais

    4. O sistema de espaos livres esportivos da cidade de So Paulo4.1 A relao pblico-privado4.1.1 Os equipamentos particulares4.1.2 A verticalizao e os condomnios-clube4.2 A diversiade e hierarquia dos equipamentos4.3 A distribuio dos equipamentos pelo territrio4.4 As particularidades de cada regio

    5. Consideraes finais

    6. Referncias bibliogrficas

    S u m r i o13171920

    43434750545758596368707274

    78787983868790

    103

    105

  • 12

  • 13

    1. Introduo

    A Regio Metropolitana de So Paulo , atualmente, a maior aglomerao urbana nacional, com cerca de 19 milhes de habitantes. Desse total, aproximadamente 11 milhes referem-se populao residente no municpio de So Paulo, a qual se apresenta distribuda irregularmente em uma rea de 1.509 km2. A cidade, extremamente heterognea e fragmentada, apresenta grandes contrastes em razo de um modelo econmico e de urbanizao concentrador de riquezas.1 Todavia, no apenas a distribuio de renda que se faz de modo desigual pelo municpio. O acesso educao, ao transporte, s oportunidades de emprego, infraestrutura urbana, cultura e ao lazer resultam de lgicas prprias internas a cada distrito. diante desse panorama que a pesquisa de mestrado foi desenvolvida. Levando-se em conta a importncia do esporte no cotidiano das cidades brasileiras, principalmente a partir da segunda metade do sculo XX, elaboramos, em 2004, o Trabalho Final de Graduao intitulado Plano de Ao Esportivo Municipal de So Paulo, para obteno do ttulo de Arquiteta e Urbanista pela USP. O objetivo de tal trabalho era estudar a situao do lazer esportivo na cidade, atravs da elaborao de um diagnstico sobre a infraestrutura esportiva pblica paulistana. O Plano apresentava aes que deveriam ser seguidas para, supostamente, satisfazer as necessidades de lazer esportivo da populao. Para tanto, foi realizado o levantamento de dados sobre a quantidade, localizao, programas de uso e reas totais dos equipamentos esportivos pblicos, analisando-se os Clubes da Cidade, Clubes Desportivos Municipais (atuais Clubes da Comunidade), quadras esportivas, campos de futebol, canchas de malha e bocha e instalaes diversas, como o Autdromo de Interlagos e o Estdio do Pacaembu, por exemplo. Com as informaes obtidas, efetuou-se o clculo dos ndices de rea de instalao esportiva pblica por habitante, em cada um dos 96 distritos da cidade. Os ndices calculados foram, ento, confrontados com o ndice de 4m2/hab, considerado como o ideal, segundo normas internacionais.2 Concluiu-se que a situao esportiva pblica paulistana era insatisfatria e insuficiente para atender a demanda de esporte e

    1 Os dados sobre a populao da regio metropolitana e da cidade de So Paulo constam da Contagem da Populao 2007 - IBGE.

    2 Sobre os ndices de instalaes esportivas, ver LA CORTE, Carlos de. As instalaes pblicas esportivas municipais

    da cidade de So Paulo: arquitetura, administrao e planejamento, 1999. Dissertao (Mestrado em Arquitetura) FAU USP, So Paulo, 1999.

  • 14

    lazer da populao, estando as instalaes existentes mal distribudas pelo territrio. A ttulo de exemplificao, chegou-se concluso, naquele trabalho, que a populao dos distritos Itaim Paulista e Jardim ngela era melhor servida de instalaes de esporte que os moradores do Morumbi e Jardim Paulista, onde no havia nenhuma unidade esportiva pblica. Contudo, mesmo que os distritos do Morumbi e Jardim Paulista no possuam equipamentos de esporte pblicos, grande parte da populao neles residente utiliza instalaes particulares para a realizao de suas atividades ldico-esportivas, como clubes e academias. Logo, percebeu-se que a adoo de um ndice nico considerado como ideal para todos os distritos no permitiu a verificao da situao esportiva real de cada setor urbano, uma vez que tal procedimento ignorou as tendncias locais e particularidades de cada distrito.3 Embora o plano tenha recomendado a construo de instalaes hierarquizadas segundo a capacidade de atendimento, bem como tenha indicado reas prioritrias para a implantao das unidades, a adoo do ndice como critrio para se determinar a quantidade e o porte dos equipamentos a serem construdos fez com as aes propostas no refletissem, necessariamente, a existncia de uma demanda por tais equipamentos.Tal constatao motivou a elaborao deste novo estudo, o qual procurou aprofundar e complementar a pesquisa base feita para o trabalho de graduao, levando-se em conta os aspectos qualitativos pertinentes ao tema. A cidade de So Paulo extremamente heterognea; trat-la como um todo homogneo regulada por mtodos quantitativos no adequado. Nesse sentido, mais que a simples observao de ndices, para se entender a situao do atendimento das demandas de lazer esportivo ao ar livre da populao fundamental compreender como se organiza todo o sistema de espaos destinados a esta prtica na cidade. Tal sistema possui vrios elementos, a saber: (i) equipamentos esportivos pblicos, tais como clubes desportivos, quadras esportivas, campos de futebol; (ii) espaos livres pblicos equipados para atividades esportivas, como parques e praas; (iii) equipamentos esportivos particulares, como

    3 Constatou-se que ndices resultantes da diviso entre

    determinada rea por um fator qualquer, em geral o

    total de habitantes da regio, representam apenas uma

    informao quantitativa geral, no expressando como essas

    reas se encontram, como so utilizadas e nem a distribuio das mesmas dentro da cidade.

  • 15

    academias e clubes; e (iv) equipamentos esportivos instalados nas residncias, como as quadras e piscinas dos condomnios verticais. O objetivo principal desta pesquisa de mestrado foi, portanto, entender o porte e o funcionamento do sistema de espaos livres pblicos destinados recreao esportiva na cidade de So Paulo. Secundariamente, buscou-se compreender a importncia da utilizao dos espaos livres urbanos, tais como parques, praas e ruas, no que se refere aos seus valores recreativo-esportivos, bem como verificar de que maneira os aspectos socioeconmicos, sobretudo a renda materializada sob a possibilidade de se residir em um condomnio equipado com quadras esportivas e piscinas ou de se frequentar clubes e academias particulares - agem sobre a distribuio dos espaos livres pblicos voltados para o esporte. De acordo com os objetivos do trabalho, vrios procedimentos metodolgicos foram adotados durante o desenvolvimento da pesquisa. Primeiramente, fez-se uma pesquisa bibliogrfica atravs da qual foi possvel entender a interao entre os esportes e os espaos livres, desde o incio da histria da cidade de So Paulo at a primeira dcada do sculo XXI. Buscou-se estudar, sobretudo, a importncia dos espaos livres, principalmente praas, parques e ruas, como locais de lazer esportivo da populao. Concomitantemente s pesquisas bibliogrficas, foram coletados dados a respeito dos principais equipamentos edificados e espaos livres voltados para o lazer esportivo. Foram levantados dados sobre o porte, quantidade e localizao dos equipamentos municipais, estaduais e particulares. A Secretaria Municipal de Esporte, Lazer e Recreao (SEME) e a Secretaria Estadual do Esporte, Lazer e Turismo (SELT) foram as fontes dos dados sobre os equipamentos pblicos edificados (como os centros esportivos) e sobre as ruas utilizadas temporariamente para o lazer (Programa Ruas de Lazer). A Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente (SVMA) e a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (SMA) forneceram as informaes sobre os espaos livres pblicos, como parques e praas. Em relao infraestrutura esportiva particular, especialmente

  • 16

    aos clubes e academias, ressalta-se a dificuldade enfrentada na coleta de dados atualizados, dada inexistncia de uma fonte nica oficial. A pesquisa foi feita via internet e contatos telefnicos, junto s entidades e federaes responsveis, como a Federao Brasileira de Academias (FEBRACAD) e o Conselho Regional de Educao Fsica do Estado de So Paulo (CREF/SP), e mesmo atravs de listas telefnicas. As reas esportivas ao ar livre existentes nos condomnios residenciais foram estudadas atravs de pesquisa bibliogrfica e consultas, via internet e diretamente, a rgos e entidades ligados esfera habitacional, como o Sindicato da Habitao (SECOVI/SP) e a Empresa Brasileira de Estudos de Patrimnio (EMBRAESP). Foram coletados, finalmente, dados sobre os aspectos socioeconmicos da populao, com base nas informaes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) e da Prefeitura Municipal de So Paulo (PMSP). Aps a obteno dessas informaes, elaboraram-se tabelas e mapas com intuito de facilitar a anlise. Diversos materiais foram confeccionados, possibilitando a visualizao ora de um panorama geral, abrangendo toda a cidade, ora de uma situao mais particularizada, dividindo-se o municpio segundo suas zonas, subprefeituras e distritos, e permitindo uma anlise comparativa entre suas diferentes regies. Dessa maneira, foi possvel compreender o funcionamento do sistema de espaos livres esportivos paulistano, o qual se configura de acordo com um modelo concntrico: no ncleo esto concentrados os equipamentos de grande porte; ao redor dele, encontra-se uma rea com unidades de mdio porte; e na periferia, h o predomnio dos equipamentos de menor porte. Por fim, foi realizada uma anlise crtica dos resultados obtidos na pesquisa, segundo a qual o modelo de sistema vigente foi considerado inadequado para uma cidade como So Paulo.

  • 17

    Os espaos livres urbanos destinados recreao so essenciais para a qualidade de vida da populao, sobretudo em uma cidade como So Paulo, onde vivem cerca de 11 milhes de pessoas. Alm de se constiturem como importantes espaos de lazer para grande parte dos paulistanos, quando vegetadas, essas reas exercem influncia sobre o microclima, amenizando a temperatura e aumentando a umidade relativa do ar no local, e proporcionam um conforto psicolgico em meio paisagem dominada por edifcios, automveis e avenidas. Seja pela possibilidade de melhor aerao, insolao e diversidade da paisagem, seja pelo sentido compensatrio da atividade ao ar livre em oposio permanncia em locais fechados durante longos perodos, como na jornada diria de trabalho, ou mesmo pela impossibilidade da prtica de esportes em academias, clubes ou reas pertencentes prpria residncia, grande parte da populao elege os espaos livres urbanos como locais de satisfao de suas necessidades de lazer dirio ou de fim de semana. So neles que se desenvolvem os esportes mais populares do municpio, como o futebol, o skate e as corridas de rua.

    A associao entre atividade fsica, em especial aquela praticada ao ar livre, e sade, remonta Antiguidade, quando surgiu na Grcia a busca pelo homem total, materializado na figura do indivduo sadio de corpo e esprito, de acordo com a ideia mens sana in corpore sano. Desde ento, tal associao percorreu inmeros perodos histricos diferentes, adaptada especificidade de cada poca. Assim, com a Revoluo Industrial e o advento do Capitalismo, as prticas fsico-esportivas foram incentivadas como forma de se manter a sade da populao, principalmente dos trabalhadores. O

    2. O Espao Livre e o Esporte na C i d a d e d e So P a u l o

    O esporte muito mais do que um luxo ou uma

    forma de entretenimento. O acesso ao esporte e a

    prtica do esporte constituem um direito humano

    e essencial para que indivduos de todas as cidades

    conduzam uma vida saudvel e plena [...] O esporte

    fundamental para o desenvolvimento de uma

    criana [...] Traz melhorias para a sade e reduz a

    probabilidade de doenas.4

    4 ONU. Esporte para o desenvolvimento e a paz:

    em direo realizao das

    metas de desenvolvimento do

    milnio. Relatrio da Fora Tarefa entre Agncias nas Naes Unidas sobre o Esporte para o desenvolvimento e a Paz, 2003.

  • 18

    corpo humano era o instrumento atravs do qual se concretizava o trabalho produtivo e, portanto, deveria ser forte e saudvel. J no final do sculo XX, com a crescente urbanizao e com o agravamento dos problemas urbanos, tais como a violncia e o estresse, o lazer esportivo foi elevado condio de direito fundamental dos cidados, com a funo de melhorar a qualidade de vida dos indivduos.

    Em 2009, inmeras modalidades esportivas so praticadas nos parques, praas, ruas e instalaes ao ar livre, como quadras e campos descobertos. Se nos tempos passados essa postura era motivada oficialmente por razes de sade e higiene, hoje, alm da associao entre atividade fsica, sade e bem-estar, o discurso em voga prega o desenvolvimento sustentvel dos centros urbanos, valorizando a presena de espaos naturais nas cidades e o contato do homem com a natureza6. Segundo relatrio elaborado pela Organizao das Naes Unidas (ONU), a prtica de esportes ao ar livre aumenta a conscincia e o respeito com o meio ambiente, ensinando as pessoas sobre a importncia de um

    meio ambiente limpo e saudvel.7

    Em princpio, a grande maioria dos esportes existentes pode ser desenvolvida em espaos livres, principalmente se considerarmos o

    Considera-se que as atividades desportivas e de

    lazer apresentam uma funo que extrapola seus

    objetivos mais imediatos de desenvolvimento e

    manuteno da sade fsica e preparao de atletas.

    Ao lado das atividades culturais, as atividades

    de esporte e lazer tm profunda influncia nas

    condies psquicas dos indivduos, quer pelo bem-

    estar produzido pela realizao do exerccio fsico,

    quer pelo prazer decorrente de aes contemplativas

    como a assistncia a competies [...]. Alm disso,

    as atividades de lazer e desportivas tm um papel

    importante no controle e na reduo da violncia

    urbana que afeta, sobretudo, a populao jovem

    nas grades cidades. Por estas razes, as atividades

    da rea de esportes e lazer so fundamentais na

    melhoria da qualidade de vida da populao.5

    5 SO PAULO. Plano Diretor Estratgico do Municpio de

    So Paulo: minuta do projeto de lei. Maro 2002. p.29-30.

    6 Sem entrar no mrito da discusso do uso

    indiscriminado da expresso desenvolvimento sustentvel

    e a falta de uma definio clara de seus conceitos, vale

    ressaltar que em muitos casos o que se v a imposio de

    uma ideologia difundida pelos bancos internacionais, com outros interesses que no a

    sustentabilidade em si.

    7 ONU, op.cit.

  • 19

    carter ldico dos mesmos. Via de regra, quando praticadas no nvel profissional, as modalidades passam a ser realizadas em ginsios ou complexos esportivos fechados, evitando-se que os fatores climticos interfiram na qualidade dos gestos tcnicos dos atletas. Um bom exemplo o voleibol, que ao ser praticado ao ar livre, pode sofrer interferncia do sol, que ofusca os jogadores, e do vento, o qual altera a trajetria da bola.

    2.1. O esporte e os espaos livres: esclarecendo alguns conceitos

    Para a compreenso do trabalho, faz-se necessria a apresentao de alguns conceitos adotados, tais como lazer, recreao, esporte e sistema de espaos livres. O lazer entendido como o perodo de tempo que cada um dispe aps cumprir suas obrigaes profissionais e sociais, e durante o qual so realizadas atividades de livre escolha do indivduo. Segundo Dumazedier, um dos mais renomados estudiosos do assunto, o lazer definido como o conjunto de ocupaes s quais o indivduo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se

    ou ainda para desenvolver sua formao desinteressada, sua participao social

    voluntria ou sua livre capacidade criadora, aps livrar-se ou desembaraar-se

    das obrigaes profissionais, familiares e sociais.8 Ainda que sejam atividades de livre escolha, importante ter em mente que as formas de lazer so condicionadas pelas caractersticas individuais, tais como idade, gosto pessoal, status familiar e educao, e pelas limitaes de recursos financeiros, de tempo e de espao. A recreao, por sua vez, a ocupao do tempo de lazer de maneira prazerosa, isto , feita pelo prazer que a prpria execuo oferece. Passear, danar, ouvir msica, assistir televiso, ler, desenhar, ir a festas, fazer colees e praticar esportes so exemplos de atividades recreativas. Embora lazer e recreao sejam conceitos distintos conforme apresentados anteriormente, as expresses lazer esportivo e recreao esportiva sero utilizadas no presente trabalho como se fossem

    8 DUMAZEDIER, Joffre. Valores e contedos culturais

    do lazer. So Paulo: SESC, 1980. p.19.

  • 20

    sinnimas, referindo-se ao esporte praticado de maneira no profissional, ou seja, sem a existncia de um contrato ou pagamento de salrio, com o objetivo de ocupar o tempo livre de uma maneira prazerosa. Quanto ao esporte, este tem por caracterstica fundamental o esforo fsico, englobando jogos, competies ou simples caminhadas. Atualmente, podemos considerar o esporte em 3 vertentes principais: educacional, alto nvel e participao. O esporte educacional, dividido em escolar e universitrio, aquele praticado no sistema de ensino com objetivo de promover o desenvolvimento integral do indivduo. J o esporte de alto nvel, tambm chamado de esporte de performance, de rendimento ou de competio, busca a criao de atletas profissionais, os quais faro parte das selees dos pases e sero motivados pela conquista de ttulos mundiais e/ou olmpicos. Por sua vez, o esporte de participao fundamenta-se no direito de o indivduo se educar fisicamente; praticado de modo voluntrio, conhecido ainda como esporte de recreao ou de lazer. O esporte de participao o que mais est presente nos espaos livres urbanos, entendidos como todo espao no ocupado por um volume edificado (espao-solo, espao-gua, espao-luz) ao redor das edificaes a que

    as pessoas tm acesso9 . Nas cidades, podemos citar como exemplos de espaos livres as ruas, praas, parques, quintais, ptios, jardins, terrenos baldios, vielas e reas livres junto s habitaes. Por sua vez, o sistema de espaos livres urbanos o modo pelo qual tais espaos se agrupam, se articulam e estabelecem relaes, ou seja, o sistema de espaos livres de uma cidade o conjunto de todos os espaos livres de edificao existentes na malha urbana, sua distribuio, suas

    interrelaes funcionais e hierrquicas.10

    2.2. A introduo dos esportes na vida urbana de So Paulo

    Para se compreender a situao atual dos espaos livres esportivos paulistanos, necessrio saber quais foram os acontecimentos que

    9 MAGNOLI, Miranda. Espao livre objeto de trabalho.

    Paisagem e Ambiente: ensaios, So Paulo, n. 21, p.175-198,

    2006. Nmero especial. p.179.

    10 HIJIOKA, Akemi et al. Espaos livres e espacialidades

    da vida pblica. Paisagem e Ambiente: ensaios, So Paulo,

    n. 23, p.116-123, 2007. p.121.

  • 21

    alteraram a maneira de se ver as prticas esportivas e como eles se refletiram na paisagem da cidade. Logo, voltando ao perodo colonial, os conceitos de esporte e lazer da maneira como os entendemos hoje ainda no existiam, sobretudo entre a populao indgena nativa. Caa, pesca, canoagem, natao, corrida a p, equitao e arco e flecha eram as principais atividades fsicas das culturas tribais e representavam a alimentao, locomoo e mtodos de ataque e defesa, ou seja, possuam um carter essencialmente utilitrio. Em relao a So Paulo, nos anos que se seguiram a sua fundao como vila, em 1554, e mesmo aps alcanar a categoria de cidade, em 1711, a regio era um mero entreposto comercial pouco populoso, que contava com uma rea central, onde se concentrava a maioria dos habitantes, e uma periferia, formada por chcaras e stios dispersos. A vida urbana era pouco dinmica e havia um forte preconceito em relao s atividades fsicas, na medida em que o esforo muscular era associado ao trabalho escravo e s pessoas no nobres. Nos espaos livres urbanos da poca tambm prevalecia o carter utilitrio. Dessa forma, as poucas ruas existentes eram ocupadas predominantemente pelos escravos que nelas realizavam seus afazeres dirios, relacionados ao abastecimento de gua das casas, despejo de esgotos e compra de alimentos. Estreitas, sujas, desniveladas e sem calamento, para a populao mais abastada as ruas eram apenas ligaes entre os pontos de maior prestgio da cidade, no sendo consideradas locais apropriados para a permanncia por tempo prolongado nem para passeios descompromissados. Assim como as ruas, os quintais das casas e das igrejas no eram vistos como locais de lazer, uma vez que neles eram realizados servios domsticos gerais e cultivos de plantas medicinais, frutas, ervas e flores. Os principais espaos livres utilizados para o lazer eram, portanto, as praas - tambm chamadas de largos ou terreiros, que apesar de no possurem qualquer tipo de equipamento, nem mesmo vegetao, abrigavam os eventos cvicos e religiosos, sem, no entanto, incentivarem qualquer forma de prtica esportiva.

  • 22

    Com a chegada da famlia real portuguesa ao pas em 1808, iniciou-se um processo gradativo de mudanas na cidade. Alm de obras pblicas que visavam melhoria do acesso cidade, tendo sempre em mente motivaes econmicas, a paisagem transformou-se em razo de novas medidas higinicas. Foram abertos novos bairros, alm dos limites tradicionais da cidade, sendo que os terrenos perifricos cidade, mais facilmente acessveis, foram rapidamente apropriados pelas famlias mais

    ricas. Algumas passaram a residir nessas chcaras; outras as utilizavam como

    reas de lazer. [...] Eram os mais ricos saindo da cidade, para morar com mais

    conforto.11 Aps a Independncia do Brasil em 1822, verificou-se a modernizao dos modos de vida urbana de So Paulo, de modo a aproxim-los do estilo de vida europeu. Os Cdigos de Posturas Municipais introduzidos em 1886 estabeleceram, por exemplo, medidas visando melhoria das condies de higiene das ruas, at aquele momento utilizadas como locais de despejo de esgoto e lixo, pois naquela poca as atividades cotidianas, fossem elas de lazer ou de trabalho, se desenvolviam naturalmente no espao pblico, em um perodo no qual a forte segregao das classes sociais em escravos e homens livres no representava uma segregao espacial.

    Paralelamente, nas reas nobres da cidade, as tradicionais edificaes construdas no alinhamento do lote e sem recuos laterais foram substitudas pelos palacetes, cujos recuos e jardins presentes em

    Ao amanhecer, os escravos se juntavam nos

    chafarizes, buscando gua a ser utilizada nas casas.

    Em plena luz do dia, a rua era invadida pelos

    vendedores de frutas, legumes, cestas e objetos de

    folha de flandres negros forros ou escravos, muitos

    deles de ganho. As negras, com seus tabuleiros,

    ocupavam as ruas de maior movimento e os largos

    e praas da cidade, espera dos homens brancos

    e seus encontros de negcio. Nas ruas, juntavam-

    se aos ferreiros, ourives, barbeiros e amoladores de

    facas, que ofereciam seus servios em plena calada

    ou porta dos armazns e lojas dos sobrados.12

    11 REIS FILHO, Nestor Goulart. So Paulo, vila

    cidade, metrpole. So Paulo: Prefeitura do Municpio de So Paulo: BankBoston, 2004. p.89.

    12 ROLNIK, Raquel. A cidade e a lei: legislao, poltica urbana

    e territrios na cidade de So Paulo. 3 edio. So Paulo:

    FAPESP: Studio Nobel, 2003. p.29.

  • 23

    todas as faces do lote proporcionavam melhores condies de insolao e arejamento. Alm dos jardins dos primeiros palacetes, a vegetao foi introduzida na cidade atravs da arborizao de ruas e praas, que passaram a ser utilizadas no apenas durante as festas religiosas e comemoraes diversas, mas tambm no dia a dia da populao, como local de recreao voltada ao passeio e contemplao. O espao urbano mais significativo em relao presena de arborizao e promoo do lazer era, sobretudo, o parque. Se por volta das dcadas de 1850 e 1860, na Europa, este equipamento foi implantado para atender uma nova necessidade da cidade industrial, ou seja, o lazer das grandes massas urbanas como as de Londres e de Paris13, no Brasil, o parque surgiu para atender aos anseios da elite que desejava imitar o modo de vida europeu. Assim, em 1825, o Horto Botnico, atual Jardim da Luz, criado em 1798, foi transformado em Jardim Pblico e aberto populao, de acordo com uma srie de restries que visavam os bons costumes, tornando-se uma nova opo de lazer das elites. Ressalta-se que naquela poca as funes higinicas e estticas se sobrepunham s funes recreativas de tais espaos, sendo que, de acordo com Segawa (1994, p. 56), no final do sculo 19, o conceito da rua e do parque arborizados como pulmes urbanos estava amplamente assimilado14. A maior parte dos paulistanos, porm, no usufruiu desses novos grandes equipamentos, tendo que recorrer a reas bem menos nobres para a satisfao de suas necessidades de lazer, como terreiros e vrzeas. Naquele momento, as atividades esportivas, introduzidas na cidade via colonizadores portugueses, ainda eram pouco diversificadas e no muito populares, sendo algumas delas influenciadas por motivaes militares, como a esgrima e equitao. Havia ainda a prtica de natao e de remo, sobretudo nos rios Tamanduate e Tiet, de peteca, de malha e de ciclismo, esporte da moda praticado por aqueles com condies de importar as bicicletas da Europa. Em meados do sculo XIX, a capoeira, que apesar das proibies era prtica caracterstica dos escravos, ganhou novos praticantes representados pelos estudantes da Faculdade de Direito.

    14 SEGAWA, Hugo. Ao amor do pblico: jardins no Brasil. So Paulo: FAPESP: Studio Nobel, 1996.

    13 Londres e Paris eram as duas cidades europeias mais populosas da poca. Segundo Sennet (SENNET, Richard. O declnio do homem pblico. So Paulo: Cia. das Letras, 1988), Londres possua 1.225.694 habitantes em 1821, e 3.834.354 em 1881. Paris, por sua vez, possua 713.966 habitantes em 1821 e 2.269.023 em 1881. Uma situao bem diferente era encontrada em So Paulo, que em 1890 contava com modestos 64.934 habitantes, de acordo com os dados do IBGE censos demogrficos.

  • 24

    Foi somente em 1850, com a Lei Eusbio de Queirs, que o posicionamento diante das prticas esportivas comeou a mudar mais efetivamente. A lei proibiu o trfico de escravos para o Brasil, indicando que o regime escravocrata no era bem-visto internacionalmente. Mais que isso, tal norma fez com que os imigrantes europeus aos poucos se tornassem a principal mo de obra assalariada no pas. Durante as dcadas de 1850 e 1860, os imigrantes, em especial os ingleses, difundiram novos hbitos culturais, incluindo a prtica de atividades esportivas ao ar livre visando uma vida saudvel e o equilbrio entre mente e corpo. Nesse novo cenrio, a Ginstica, precursora da Educao Fsica atual, foi includa no ensino fundamental das escolas pblicas do Rio de Janeiro em 1854, sendo tal obrigatoriedade estendida aos demais estados brasileiros no incio do sculo XX. O pioneirismo dessa cidade em relao s demais explicado pela presena da Academia Real Militar desde 1810 na sede da Corte, uma vez que a Ginstica era praticada na instituio com fins militares. Ainda que em um primeiro momento a Educao Fsica possusse um intuito higinico, que considerava os exerccios fsicos como receita ou remdio para um corpo saudvel, e um intuitomilitar, que visava o adestramento do corpo, foi inegvel a sua importncia na popularizao das atividades esportivas no perodo. Isto porque, embora o sistema escravocrata apresentasse sinais de colapso, os escravos continuavam a existir em grande nmero na cidade, mantendo vivo o preconceito em relao aos trabalhos manuais e ao esforo fsico. Ressalta-se aqui que o ensino de ginstica nas escolas era uma medida amplamente incorporada na Europa e nos Estados Unidos no momento em questo, destacando-se que na Inglaterra, um dos pases que exerciam grande influncia sobre o Brasil naquela poca, a Educao Fsica estava plenamente inserida nas escolas pblicas desde 1830. Destaca-se que entre 1820 a 1870 os estabelecimentos de ensino ingleses serviram como laboratrios para a inveno dos esportes modernos. A partir de 1880, os novos esportes passaram a ser praticados

  • 25

    alm dos muros das escolas inglesas, nos amplos espaos livres criados na dcada de 1850 e largamente disseminados naquele momento, isto , nos parques urbanos. A realizao dos primeiros Jogos Olmpicos da Era Moderna na cidade de Atenas em 1896, com a participao de 241 atletas - todos homens - de 14 pases, foi consequncia da progressiva internacionalizao dos esportes, sendo que apenas 4 anos depois, nas Olimpadas de Paris, o nmero de atletas e pases aumentou para 997 e 24, respectivamente.15

    O ano de 1888 marcou a introduo, de fato, dos esportes na cidade de So Paulo, quando a abolio da escravido, atravs da Lei urea, somou-se s constantes influncias externas, criando um cenrio propcio a mudanas no modo de vida da populao. Essa situao foi ento reforada pela Proclamao da Repblica, ocorrida no ano seguinte, a qual incentivou a difuso de novos costumes, entre os quais estavam as atividades esportivas, com o objetivo de marcar o rompimento com o perodo colonial.

    Os novos esportes chegaram, enfim, a So Paulo atravs dos clubes e associaes particulares. Em 1888, o primeiro clube esportivo foi fundado por imigrantes ingleses (So Paulo Athletic Club SPAC),

    Figura 1 - Olimpadas de Atenas, 1896. Vista do Estdio Panathinaikos durante a realizao das provas de atletismo. Fonte: Comit Olmpico Internacional.

    15 Participaram da Olimpada de Atenas, em 1896, Alemanha, Austrlia, ustria, Chile, Dinamarca, Egito, EUA, Frana, Gr Bretanha, Grcia, Hungria, Itlia, Sucia e Sua, nas modalidades atletismo, ciclismo, esgrima, ginstica, halterofilismo, luta, natao, tnis e tiro. Nas Olimpadas de Paris, esportes como futebol, golfe, hipismo, plo, remo, rugby e vela foram incorporados.

    Ao findar o regime monrquico, as principais

    cidades brasileiras estavam em condies

    lamentveis, com graves problemas sanitrios. Para

    acentuar o atraso da monarquia, os republicanos

    empenharam-se na valorizao do urbano, em uma

    ampla modernizao tcnica e social. Na poca,

    isso correspondia a copiar as reformas urbansticas

    das cidades europeias, em especial Paris.16 16 REIS FILHO, Nestor Goulart. op. cit. p.139.

  • 26

    e em 1890, foi a vez da primeira academia de ginstica ser inaugurada, dessa vez por imigrantes alemes (Deutsch Turnerschaft). Em 1896, foi realizada a primeira partida de futebol em terras paulistanas, modalidade que chegou ao pas em 1894 pelo ingls Charles Miller. Em 1898, o basquetebol foi trazido pela Associao Atltica Mackenzie College, enquanto o voleibol foi incentivado pela Associao Crist de Moos (ACM), instalada na cidade em 1902. Seguindo o exemplo europeu de prticas de lazer esportivo ao ar livre, vrios parques foram abertos pela cidade, por iniciativa pblica e privada, dentre os quais estavam: Parque Villon, atual Parque Tenente Siqueira Campos, em 1892; Parque da Cantareira, em 1893; Horto Botnico, atual Horto Florestal, em 1896; Parque Antrtica, em 1902; e Parque Bosque da Sade, em 1908. Os dois ltimos foram abertos pela Cia. Antrtica Paulista com objetivo de no apenas proporcionar locais de recreao aos paulistanos, mas tambm de promover seus produtos. Dessas reas, merece destaque o Parque Antrtica, principal local de lazer ativo da populao poca, principalmente nos finais de semana. Com cerca de 300 mil m2, o parque era aberto ao pblico e possua um bosque com trilhas para caminhadas, circos temporrios, parques infantis, pistas de atletismo, quadras de tnis, campo de futebol e quiosques para piquenique. A cidade contava ainda com o veldromo de Dona Veridiana Prado, inaugurado em 1892 e equipado com quadras de tnis e piscinas. Enquanto tais espaos eram frequentados principalmente pela populao mais abastada, dezenas de campos de futebol de vrzea mostraram-se essenciais ao lazer dos habitantes mais humildes. Vale a pena ressaltar que, apesar da boa receptividade da populao implantao dos parques, os mesmos no eram valorizados como nos dias de hoje. Ainda que em 1911 o Relatrio Bouvard tenha ressaltado a necessidade de tais espaos, destacando que mais a populao aumentar, maior ser a densidade da aglomerao, mais crescer o nmero de construes, mais alto subiro os edifcios, maior se

    impor a urgncia de espaos livres, de praas pblicas, de squares de jardins,

    de parques17, a presena de numerosos vazios urbanos, caracterstica

    14 OS MELHORAMENTOS DE SO PAULO. Revista de

    Engenharia, So Paulo, v.1, n. 2, jul. 1911 apud SEGAWA,

    Hugo. Preldio da Metrpole. So Paulo: Ateli Editorial,

    2000. p. 101

  • 27

    da urbanizao no contnua daquela poca, mascarava a importncia dos parques como equipamentos de lazer cotidiano da populao. Foi somente dcadas mais tarde, na segunda metade do sculo XX, atravs da urbanizao intensa e do loteamento das at ento abundantes reas livres, que os parques figuraram como equipamentos essenciais manuteno e melhora da qualidade de vida da populao. A abertura dos bairros-jardins no incio da dcada de 1910 reforou a imagem de So Paulo como cidade repleta de reas verdes, sobretudo para a populao das classes mais abastadas que residiam nesses bairros. O bairro Jardim Amrica foi o primeiro desse tipo e tinha como caractersticas marcantes os altos ndices de espaos livres e de arborizao, garantidos atravs de normas rigorosas pela Cia. City, responsvel por sua implantao: a construo deveria respeitar o limite mximo de 50% da rea do lote, recuos frontais, laterais e de fundo,

    normas rgidas para os fechamentos, por cercas e portes vazados, logrando

    uma transio entre o lote e o passeio de forma sutil18. Alm dos parques, os leitos e margens dos rios exerceram papel importante no desenvolvimento das atividades recreativo-esportivas da populao. Clubes como o Sport Club Germnia, atualmente conhecido como Esporte Clube Pinheiros, e o Espria, fundados em 1899, bem como o Clube de Regatas Tiet, inaugurado em 1907, situados s margens dos rios, impulsionaram a prtica da natao e do remo. Sobre o Rio Tiet, Reis Filho (1994, p. 140) afirma que suas margens eram bem tratadas e arborizadas, com passeios para pedestres junto ao rio, com pavilhes para barcos, casas de madeira e rampas de acesso, como

    certos trechos do Tamisa, acima de Londres19. Outro local de prtica de esportes aquticos era a Represa de Guarapiranga, construda em 1907 e frequentada por praticantes de remo e de esportes vela, como o iatismo.

    18 GUARALDO, Eliane. So Paulo, paisagem e paisagismo

    na primeira repblica. 1995. Dissertao (Mestrado em Arquitetura) - FAU USP, So Paulo, 1995. p.123.

    19 REIS FILHO, Nestor Goulart. op. cit. p.140

    Figuras 2 a 4: Em detalhe, os clubes particulares da rea central da cidade (Associao Atltica Mackenzie College, Veldromo D. Veridiana Prado e So Paulo Athletic Club), o Parque Antrtica e os clubes situados s margens do rio Tiet (Clube de Regatas Tiet, Espria e Clube de Regatas So Paulo).

  • 28

    Figura 5 - Planta da Cidade de So Paulo em 1913 com a localizao dos seguintes

    equipamentos de lazer: clubes s margens do Rio Tiet, ao

    norte; Hipdromo da Mooca, a leste; Jardim da Aclimao,

    ao sul; Parque Antrtica, a noroeste; e Jardim Pblico e

    clubes particulares, ao centro.

    20 GUARALDO, Eliane. op.cit. p.123.

    Um novo impulso foi dado ao esporte nacional em 1920, quando ocorreu a primeira participao do Brasil em uma Olimpada. Um total de 21 atletas foram Anturpia, na Blgica, para participar das provas de natao, plo aqutico, saltos ornamentais, remo e tiro esportivo, sendo que nessa ltima modalidade foram conquistadas uma medalha de ouro, uma de prata e uma de bronze. O pas passou a figurar no cenrio esportivo internacional, abrindo caminho para a participao em torneios sul-americanos de diversas modalidades. As cidades, portanto, deveriam se adequar ao contexto esportivo da poca, melhorando suas estruturas, tanto em equipamentos de esporte quanto em treinamento de atletas. O que poderia ter sido um momento de estmulo implantao de espaos livres pblicos equipados para o esporte, fosse ele amador ou profissional, resultou, na prtica, no fomento de tal atividade dentro dos clubes particulares. Segundo Guaraldo (1995, p. 148), o Poder Pblico municipal transformou sua poltica de espaos pblicos em uma poltica de lazer, estimulando os espaos esportivos e de recreao

    particulares20. A Administrao dos Jardins Pblicos passou, inclusive,

  • 29

    a fazer doaes de plantas e mudas, bem como a executar servios de manuteno em um nmero significativo de clubes particulares, como o Clube Paulistano, Espria, Clube de Regatas Tiet, Clube Palmeiras, entre outros. No mbito nacional, tambm se fez ausente o incentivo abertura de grandes parques urbanos para atender s necessidades recreativas da populao, tendo em vista que a promoo do esporte e do lazer no dirigidos no interessava ao governo. Assim, a atuao do poder pblico junto s prticas esportivas deu-se principalmente atravs dos estabelecimentos de ensino, ou seja, em ambientes devidamente controlados e disciplinados. Dessa forma, o governo elaborou leis e decretos federais a respeito das prticas esportivas nas escolas. Um dos mais importantes foi o Decreto No 19.890/31, uma vez que estabeleceu a obrigatoriedade da Educao Fsica nos estabelecimentos de ensino mdio brasileiros, medida estendida ao ensino fundamental pela Constituio promulgada em 1937, durante o Estado Novo. Essa interferncia na rea esportiva deu-se em razo do carter populista-nacionalista do governo, que tinha como objetivo a mobilizao e o controle das massas. Nesse contexto, a educao fsica praticada nas escolas era vista como vetor dessa mobilizao, na medida em que relacionava o esporte ao esprito patritico, alm de capacitar fisicamente os futuros trabalhadores. Fora das escolas, a iniciativa pblica mais significativa relacionada prtica de atividades esportivas ao ar livre na cidade de So Paulo no momento em questo foi o programa Parques Infantis, institucionalizado em 1935. O programa caracterizava-se pelo oferecimento de atividades ldicas, esportivas e culturais fora do ambiente escolar, em espaos livres de dimenses mais modestas se comparadas aos parques do incio do sculo, e especialmente equipados com brinquedos e instalaes esportivas. Inicialmente, tais parques foram destinados a crianas de 3 a 6 anos, sendo que a partir de 1937 o limite de idade foi estendido at 12 anos. No mesmo ano, as unidades comearam a funcionar tambm durante o perodo noturno, tornando-se sede do chamado Clube de

  • 30

    Menores Operrios, o qual atendia pessoas com at 21 anos. Tanto no perodo diurno quanto no noturno, os frequentadores eram, em sua maioria, provenientes de famlias operrias que encontravam no parque a possibilidade de se desenvolverem fsica, intelectual e socialmente. As 3 finalidades bsicas desses espaos eram: assistir, atravs do fornecimento de assistncia mdica, dentria e alimentar, educar e recrear. O projeto dos Parques Infantis se resumia a um pequeno edifcio, contendo uma cantina e uma ou duas salas para atividades diversas, implantado em meio a uma grande rea livre equipada com campo gramado, aparelhos para ginstica, piscina, tanque de areia, pista de corrida e quadra esportiva. Segundo esse modelo, privilegiavam-se as atividades ao ar livre, consideradas como prticas extremamente saudveis s crianas e populao em geral, j que possibilitavam os benefcios do contato com o ar puro, sol e vegetao. Como exemplo, podemos citar a unidade Santo Amaro que possua uma rea coberta de 278 m2 em um terreno de 4.884 m2. A partir de 1945, o governo municipal priorizou a implantao de equipamentos mais modestos, porm, em maior quantidade. Duas novas tipologias foram, ento, criadas: os Recantos Infantis e os Recreios Infantis. Ambos eram unidades mnimas, geralmente com rea til equivalente a 10% da rea dos Parques Infantis, instaladas em praas pblicas j consolidadas ou em pequenos lotes. A diferena bsica entre os 2 novos tipo de equipamentos relacionava-se distribuio dos mesmos pela cidade, sendo que os Recreios se concentravam na periferia, e os Recantos, na regio central. Em 1975, atravs do Decreto No 12.115/75, que regulamentou o ensino fundamental, os Parques Infantis deixaram de existir oficialmente, passando a ser chamados, juntamente com os Recantos e Recreios Infantis, de Escolas Municipais de Educao Infantil (EMEI). Desde ento, algumas unidades foram completamente alteradas, perdendo grande parte de suas reas livres para a implantao de edificaes como creches e unidades bsicas de sade. A construo das unidades de menor porte a partir da dcada de 1940 refletiu as mudanas que ocorriam na rea urbana de So

  • 31

    Paulo, onde os espaos livres relativamente abundantes at o momento deram vez, aos poucos, s novas necessidades da populao que imigrou para a cidade, atrada pela crescente industrializao. Ironicamente, o aumento populacional gerou um crescimento da demanda por espaos livres para o lazer, ao mesmo tempo em que promoveu a ocupao dos mesmos com equipamentos habitacionais e de infraestrutura, sobretudo de transportes. A mancha urbana da cidade de So Paulo se expandiu em ritmo acelerado, passando de 579.033 habitantes em 1920, para expressivos 1.326.261 em 194021. O desenvolvimento da indstria automobilstica impulsionou a construo de estradas e avenidas por todo o pas, e aumentou a mobilidade da populao, que comeou a exercer parte de seu lazer fora da cidade, atravs de viagens de final de semana para o litoral ou para stios utilizados como segunda residncia. Ainda assim, a procura por espaos de lazer no meio urbano cresceu, uma vez que a implantao da malha rodoviria resultou na perda de significativos espaos livres nas cidades. Para atender a demanda por espaos de lazer esportivo dentro dos limites da cidade, os governos municipal e estadual adotaram uma postura de construo de grandes equipamentos, que seriam capazes de abrigar tanto as atividades esportivas cotidianas quanto eventos maiores, tais como os Jogos Pan-americanos, realizados em So Paulo em 1963. A primeira unidade implantada de acordo com esse princpio foi o Estdio Municipal do Pacaembu, inaugurado em 1940. Ressalta-se que a construo de grandes equipamentos estava associada nova percepo do lazer, que deixou de ser visto apenas como uma forma de manifestao popular e passou a ser encarado tambm como uma mercadoria de consumo disponvel no mercado. Consequentemente, grandes instalaes com capacidade de abrigar um pblico numeroso tornaram-se economicamente interessantes. No ano seguinte, com a aprovao do Decreto-Lei Federal No 3.199/41, o esporte foi institucionalizado, estabelecendo-se normas sobre a organizao de um conselho nacional de esporte, bem como de confederaes, federaes e ligas desportivas, com um carter visivelmente centralizador. O artigo 3 do Decreto-Lei abordava as

    21 Dados do IBGE censos demogrficos.

  • 32

    competncias do recm-criado Conselho Nacional de Desportos, formado por 9 membros nomeados pelo Presidente da Repblica, sendo a principal delas estudar e promover medidas que tenham por objetivo assegurar uma conveniente e constante disciplina organizao e

    administrao das associaes e demais entidades desportivas do pas, bem

    como tornar os desportos, cada vez mais, um eficiente processo de educao

    fsica e espiritual da juventude e uma alta expresso da cultura e da energia

    nacionais22. Sobre os equipamentos esportivos, o artigo 37 do referido Decreto-Lei dispunha:

    Tal determinao, aliada especificao da presena das federaes esportivas junto s capitais dos Estados, fomentou a difuso do esporte na cidade de So Paulo. A publicao no pas, ainda em 1941, do primeiro livro sobre normas e padres construtivos de instalaes esportivas, reforou a criao de condies favorveis construo de grandes equipamentos pblicos nos anos seguintes, a saber: Conjunto Desportivo Estadual Baby Barioni na Barra Funda (1945), Conjunto Desportivo Municipal Constncio Vaz Guimares no Ibirapuera (1957), e Estdio Municipal de Beisebol Mie Nishi no Bom Retiro (1958). No que diz respeito iniciativa particular, observou-se a valorizao dos conjuntos aquticos dos clubes paulistanos, que se tornaram responsveis pela formao de atletas e pela organizao de competies. Paralelamente, a partir dos anos 1940, as piscinas comearam a ser introduzidas nas residncias mais ricas, sendo que durante as duas dcadas posteriores, as mesmas foram difundidas tambm em propriedades de recreio, como stios e chcaras.

    Incumbe Unio, ao Distrito Federal, aos

    Estados e aos Municpios, isoladamente ou

    mediante conjugao de esforos, estimular e

    facilitar a edificao de praas de desportos pela

    iniciativa particular, e bem assim, na falta desta

    iniciativa, constru-las e mont-las a fim de que

    sirvam aos exerccios e competies das entidades

    desportivas.23

    22 BRASIL. Decreto-Lei No 3.199/41.

    23Ibid.

  • 33

    Em relao s atividades de lazer da crescente massa de trabalhadores, o ano de 1946 marcou a criao do Departamento Regional do Servio Social da Indstria (SESI) e do Departamento Regional do Servio Social do Comrcio (SESC) de So Paulo. Tais entidades, atravs da busca pelo bem-estar de seus associados, foram responsveis pela construo de diversas unidades esportivas de qualidade, que at hoje tm fundamental importncia no contexto esportivo paulistano. A partir da dcada de 1950, importantes espaos livres de lazer da cidade foram afetados negativamente pela intensa urbanizao. Os rios e as represas, por se encontrarem extremamente poludos, tornaram-se imprprios para as prticas esportivas neles realizadas regularmente at aquele momento. Desta maneira, foram abandonados gradativamente, ressalvando-se que algumas modalidades, principalmente o iatismo junto s represas, continuaram a ser praticadas, embora em menor intensidade. De acordo com Reis Filho (1994, p.147): com a implantao do sistema de bombeamento das guas poludas do rio Tiet para a Billings,

    as atividades esportivas se tornaram impraticveis. A represa passou a ser

    um campo de decantao de esgoto a cu aberto24. A natao foi, ento, reafirmada como prtica a ser desenvolvida nos clubes e nas residncias, observando-se a valorizao das piscinas particulares. Alm dos rios e represas, as ruas tambm sofreram consequncias diretas da expanso urbana a partir de meados da dcada de 1950 e principalmente na dcada de 1960, momento em que tais espaos livres foram alterados em razo no apenas do contnuo crescimento populacional que ultrapassou a marca dos 3 milhes de habitantes25, mas tambm de um novo elemento: o automvel. Entre os anos de 1950 a 1966, o nmero de veculos automotores no municpio passou de 68 mil para 415 mil26, resultando em profundas alteraes no uso das ruas da cidade, na medida em que os carros, motos e nibus passaram a ser associados poluio e ao perigo de acidentes e mortes. Como consequncia, houve um gradativo esvaziamento das caladas, que deixaram de ser locais de brincadeiras infantis e encontros descompromissados, sobretudo nas reas consolidadas da cidade, onde o fluxo de veculos era mais intenso. Por outro lado, em vrias reas da

    24 REIS FILHO, Nestor Goulart. op. cit. p.147

    25 Segundo dados dos Censos Demogrficos do IBGE, a populao da cidade nos anos 1950 e 1960 era, respectivamente, 2.198.096 e 3.781.446 habitantes. 26 MEYER, Regina Maria Prosperi. O papel da rua na urbanizao paulistana. Cadernos de Histria de So

    Paulo, So Paulo, n.2, jan-dez. 1993. p.23.

  • 34

    periferia, onde a presena de infraestrutura de transportes era escassa, as funes de lazer das ruas foram conservadas. Diante desse panorama, criou-se em 1957 o movimento Ruas de Recreio no Rio de Janeiro. Desde ento, as chamadas ruas de lazer tornaram-se comuns em vrios estados brasileiros, caracterizando-se pelo bloqueio do trfego de veculos em perodos especficos, como em feriados e finais de semana, visando a prtica de atividades fsicas. Nota-se, porm, que essa iniciativa se concentrava em reas onde o fluxo de veculos era menos intenso; nas regies onde o sistema virio est plenamente consolidado, o valor ldico de tais espaos livres no foi, e dificilmente ser, recuperado. No apenas as alteraes do sistema virio, mas tambm o contexto poltico contriburam para a diminuio das atividades de lazer nas vias e caladas urbanas. A Ditadura Militar, vigente no pas entre 1964 e 1985, caracterizou-se pela forte censura e pela represso policial s manifestaes nas ruas, estimulando-se, assim, formas de lazer organizado, controladas pelo governo, dentre as quais merecem destaque a televiso e as idas ao cinema e aos grandes centros comerciais (shopping centers). Contudo, tendo conscincia da popularidade das atividades de lazer esportivas, e usando-as como propaganda poltica, o governo militar incentivou a participao do pas em campeonatos internacionais, como a Copa do Mundo de Futebol e os Jogos Olmpicos, bem como a construo de centros esportivos nas diversas cidades. Foi nesse momento que o nmero de unidades esportivas municipais aumentou consideravelmente: entre 1965 a 1981 foram construdos 29 equipamentos, inclusive o Centro Olmpico de Treinamento de Pesquisa, inaugurado em 1977. Muitas dessas unidades foram utilizadas durante a realizao dos Jogos Pan-americanos sediados na cidade So Paulo no ano de 196327. Ainda na dcada de 1960, transformaes ocorridas no tecido urbano acarretaram a substituio de campos de vrzea e espaos informais de lazer por loteamentos e avenidas. Grandes reas com

    significativo potencial para a implantao de equipamentos pblicos

    27 Participaram dos Jogos Pan-americanos de So Paulo 1.665 atletas de 22 pases. Os

    atletas ficaram alojados na Vila Olmpica, hoje transformada em um conjunto residencial

    para estudantes da USP (CRUSP), e competiram em

    locais diversos, tais como: Ginsio e Parque do Ibirapuera,

    Autdromo de Interlagos, Estdio do Pacaembu, Estdio

    do Bom Retiro, Represa de Guarapiranga, Jockey Club, Hpica Santo Amaro, Clube Atltico Paulistano, Esporte

    Clube Pinheiros, entre outros.

  • 35

    de lazer foram comprometidas, entre elas as vrzeas dos rios Tiet e Pinheiros:

    Diante dos quase 6 milhes de habitantes residentes em So Paulo em 1970, o governo municipal elaborou, em 1972, uma nova legislao de uso e ocupao do solo. Tal legislao estabeleceu taxas de ocupao inversamente proporcionais aos coeficientes de aproveitamento29, consolidando a ocupao vertical segundo o padro de torres isoladas em lotes com grande porcentagem de rea livre. Essas reas passaram, desde ento, a ser utilizadas pelas construtoras como atrativo para a venda das unidades habitacionais, atravs de uma estratgia que promoveu a qualificao desses espaos como locais de lazer, plenamente equipados com playground, jardins, piscinas, quadras poliesportivas, salas de ginstica, salo de festas e outros. O oferecimento dessas tipologias, em um momento de agravamento dos problemas relacionados ao trnsito e escassez de espaos livres pblicos, foi bem-sucedido, gerando uma demanda por condomnios-clube - termo pelo qual ficaram conhecidos - pela populao que podia arcar com os custos de tais facilidades. necessrio ressaltar que, apesar de serem resultado da legislao vlida em todo o municpio, tais tipologias no foram verificadas na chamada cidade informal:

    Essas duas vastas plancies de inundao ainda

    apresentavam grande potencial de utilizao para

    reas verdes na dcada de 60, quando se iniciou

    a sua apropriao pelo sistema de vias marginais.

    Esse sistema, que complementava a retificao e

    canalizao dos rios, s privilegiou as condies

    virias, sem uma postura mais generosa de contribuir

    para dotar a cidade de reas verdes.2828 KLIASS, Rosa Grena. Parques urbanos de So Paulo. So Paulo: Pini, 1993. p.50.

    29 A taxa de ocupao (T.O.) a relao entre a projeo da edificao sobre o terreno e a rea do lote, ou seja, ela representa a porcentagem do terreno sobre o qual h edificao. O coeficiente de aproveitamento (C.A.), por sua vez, o fator que, multiplicado pela rea do lote, indica a quantidade mxima da rea a ser construda no local, somando-se todos os pavimentos. O C.A. determina o potencial construtivo do lote.

    30 MACEDO, Silvio Soares. Espaos livres. Paisagem e Ambiente: ensaios, So Paulo, n. 7, p. 15-56, jun. 1995. p.48.

    Esta generosidade aparente de espaos livres

    dentro de parte dos lotes da cidade formal, no

    acompanhada dentro da cidade informal, ou seja,

    aqueles segmentos urbanos constitudos revelia dos

    poderes legais. Lotes pequenos, construes precrias

    e uma super-ocupao do lote, que condiciona o

    acoplamento das construes, deixa a disposio

    exguos espaos livres, tanto dentro dos lotes [...]

    como nas vias de acesso e circulao.30

  • 36

    Se por um lado a populao com melhores condies financeiras passou a dispor de espaos livres condominiais cada vez maiores e melhor equipados para a realizao de suas atividades de lazer, por outro, as classes mdia e baixa passaram a ser o pblico-alvo dos grandes parques urbanos, implantados a partir de meados dos anos 1970 objetivando-se o atendimento das necessidades da populao em geral. Assim, de acordo com a valorizao naquele momento das prticas esportivas como forma de se melhorar a qualidade de vida dos indivduos em nvel mundial, e na tentativa de interromper a crescente diminuio dos espaos livres em meio malha urbana, nos ltimos anos da dcada de 1970 e ao longo da dcada de 1980, um nmero significativo de parques foi aberto pela cidade. Dessa maneira, se entre os anos de 1825 a 1974 havia apenas 6 parques municipais em So Paulo, entre 1975 a 1989 foram inauguradas mais 18 unidades, sendo que em 1995 o total de equipamentos era de 31. Os parques firmaram-se como importantes locais de lazer ao ar livre dos habitantes da rea urbana consolidada31, concentrando em seu interior atividades at ento dispersas pelo municpio, sobretudo as relacionadas ao esporte, observando-se que quase todos os parques implantados desde ento passaram a conter instalaes destinadas a tal prtica.

    31 Na rea urbana no consolidada, onde a

    implantao de parques no foi significativa, as ruas eram, e at o incio do sculo XXI so,

    as grandes responsveis pelas atividades de lazer esportivo dos

    paulistanos.

    Figura 6 - Quadra esportiva no Parque Ibirapuera.

  • 37

    Embora tivesse sido elaborado o Plano de reas Verdes de Recreao do Municpio de So Paulo, entre 1967 e 1969 pelas arquitetas paisagistas Miranda Magnoli e Rosa Kliass, contratadas pela Prefeitura, tal documento no foi suficiente para garantir o estabelecimento de um sistema integrado de parques, j que as recomendaes presentes no plano no foram seguidas pelo poder pblico. As arquitetas propuseram uma hierarquizao dos parques, que seriam divididos em 4 categorias fundamentadas nos raios de atendimento dos equipamentos: (i) parques de vizinhana, com raio de atendimento igual a 500m; (ii) parques de bairro, com raio de atendimento igual a 1km; (iii) parques setoriais, com 5km de raio de atendimento; e (iv) parques metropolitanos. Nota-se que no foram propostos parques de vizinhana junto s reas de renda alta e mdia-alta, nem parques de bairro nos distritos de renda alta, sugerindo que essa populao no utilizaria tais equipamentos para o seu lazer. De acordo com Jacobs (2003, p.110), o principal problema do planejamento de parques de bairro resume-se ao problema de alimentar uma vizinhana diversificada capaz de utiliz-los e

    mant-los32. A associao entre a localizao dos espaos livres pblicos recreativos e a renda da populao foi um dos pontos mais relevantes do Plano em questo. O Plano de reas Verdes representou um importante avano terico ao abordar o conceito de um sistema de espaos livres hierarquizados voltados para a recreao dos muncipes. Tal conceito figurou, inclusive, em outros planos publicados no mesmo perodo, como o Plano Urbanstico Bsico (PUB) de 1968, e a Lei Municipal No 7.688/71, conhecida como Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (PDDI-SP). Na prtica, porm, o sistema de parques no chegou a ser concretizado. Paralelamente abertura dos parques durante as dcadas de 1970 e 1980, a prefeitura promoveu a construo de unidades esportivas de menor porte, sobretudo junto periferia, sempre em reas adjacentes s escolas municipais. Tais unidades, que na poca se chamavam Minibalnerios e que posteriormente foram renomeadas para Clubes de Cidade, eram utilizadas pelos alunos das escolas aps

    32 JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. So Paulo: Martins Fontes, 2003. p.110.

  • 38

    o turno escolar, e sua localizao buscava conciliar a educao e o esporte. Tambm foram inaugurados naquele momento vrios Clubes Desportivos Municipais, atuais Clubes da Comunidade, caracterizados pelo pequeno porte, pela relativa facilidade de implantao, j que no necessitavam de grandes reas, e por uma maior participao comunitria na sua gesto. No tocante aos Centros Educacionais e Esportivos, criados na dcada de 1960 com o objetivo de estimular o aprendizado e o aperfeioamento de prticas esportivas para a descoberta de talentos, foi elaborada uma nova regulamentao em 1970 estabelecendo que os mesmos passariam a valorizar a educao integral do indivduo e o aproveitamento das horas de lazer de forma salutar. Esses investimentos pblicos no setor de lazer esportivo estavam embasados no movimento mundial Esporte Para Todos, amplamente difundido no Brasil a partir de 1973, que considerava o esporte como instrumento de educao permanente e de desenvolvimento cultural. Em 1978, com a publicao da Carta Internacional da Educao Fsica e Desportos pela Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO), a prtica da educao fsica e do esporte tornou-se direito fundamental de todos os indivduos, configurando-se como uma forma de preservar a sade, enriquecer relaes sociais e enfrentar de forma sadia os inconvenientes da vida moderna. A carta da UNESCO considerava ainda que integrar a educao fsica e o desporto ao meio natural equivale a seu enriquecimento, inspira o

    respeito para os recursos do planeta e desperta o desejo de conserv-los e utiliz-

    los para o maior proveito da humanidade inteira33, mostrando estar em sintonia com os movimentos ambientais difundidos naquela poca. O Fitness foi outro movimento mundial difundido no Brasil a partir dos anos 1980, quando So Paulo possua pouco mais de 8,4 milhes de habitantes. A prtica da ginstica e da musculao ganhou, ento, considervel nmero de adeptos, fazendo com que o nmero de academias de ginstica aumentasse substancialmente em todo o pas, passando de 1 mil unidades em 1971, para 20 mil em 200334. Em relao aos equipamentos pblicos,

    34 DA COSTA, Lamartine (org). Atlas do esporte no Brasil. Rio

    de Janeiro: Shape, 2005. p.63

    33 UNESCO. Carta Internacional da Educao

    Fsica e Desportos. 1978.

  • 39

    observa-se, a partir de 1983, uma sensvel queda na construo de novos clubes, contabilizando-se a inaugurao de apenas 5 unidades de tal data at 1995. A Vila Olmpica Mrio Covas, localizada na zona oeste da cidade e inaugurada parcialmente em 2005, representa o ltimo equipamento pblico de grande porte implantado no meio urbano, caracterizada pela presena de significativa rea livre equipada para a prtica esportiva. Finalmente, a partir dos anos 2000, diante de um panorama no qual o nmero de paulistanos ultrapassou os 10 milhes e a presena de terrenos livres no meio urbano diminuiu de maneira significativa, o poder pblico consolidou-se como promotor do esporte social, priorizado em relao s prticas esportivas de alto nvel. Dentro desse contexto, a misso da SEME era melhorar a qualidade de vida na cidade de So Paulo garantindo o acesso a esporte e lazer com qualidade, como direitos

    sociais fundamentais de todos os cidados35. Notou-se ento o incentivo apropriao dos equipamentos esportivos existentes na cidade, atravs de programas como a Virada Esportiva e o Clube Escola. A Virada Esportiva, que teve sua primeira edio em 2007, caracterizou-se pela realizao de atraes esportivas gratuitas em diversos locais da cidade durante 24 horas ininterruptas, das 14h de um sbado at s 14h do domingo seguinte. Em 2008, foram realizadas cerca de 700 atividades em mais de 380 equipamentos do municpio, destacando-se de forma positiva a utilizao de equipamentos particulares em complementaridade aos pblicos. Foram utilizados:parques, praas, ruas, clubes municipais, ginsios estaduais, Memorial da Amrica Latina, Centros Educacionais Unificados (CEUs), unidades esportivas do SESC e SESI, Sambdromo, represas, campus da Universidade de So Paulo, clubes particulares, entre outros. O Programa Clube Escola institudo pelo Decreto No 48.392/07, por sua vez, props a otimizao do uso dos diversos clubes desportivos municipais, os quais passariam gradativamente a funcionar como extenses das escolas, atravs do oferecimento de atividades esportivas, recreativas e culturais aos estudantes da rede municipal e estadual e s suas famlias. De acordo com o Decreto, eram 4 os objetivos do programa:

    35 SEME. Prioridade social tambm para esporte e lazer. So Paulo: SEME, 2001.

  • 40

    Para viabilizar tal projeto, foi elaborado o Plano de Reformas dos Equipamentos Pblicos Municipais, atravs do qual aproximadamente 90 milhes de reais foram destinados recuperao e melhoria das unidades esportivas do municpio. O plano, implementado em maio de 2007, foi dividido em 3 etapas, das quais duas se encontravam finalizadas em maio de 2008 com a reforma de 303 equipamentos ao custo aproximado de 53 milhes de reais. Durante a terceira fase do plano, iniciada em junho de 2008, cerca de 130 unidades comearam a ser reformadas com a verba restante. Dentre as melhorias realizadas durante as reformas esto a troca de pisos e gramados, reparos em piscinas, instalao de iluminao, pintura e colocao de alambrados. Desde meados dos anos 2000, verificou-se um aumento considervel do nmero de logradouros nos quais o trfego de veculos era bloqueado aos domingos e feriados, com a finalidade de permitir a prtica de atividades recreativas por parte dos moradores, fundamentalmente nas reas perifricas da cidade. Tal medida constituiu-se no programa Ruas de Lazer, criado a exemplo das Ruas de Recreio cariocas do final da dcada de 1950, e regulamentado na cidade de So Paulo em 1996. Assim, se em setembro de 2004 eram contadas 250 Ruas de Lazer na cidade, em dezembro de 2008 esse nmero aumentou para cerca de 850.

    I ampliar as atividades fsicas, esportivas,

    de lazer e de recreao na Cidade de So Paulo,

    especialmente para os alunos da rede pblica e seus

    familiares;

    II proporcionar o aumento qualificado do acesso

    dos alunos aos equipamentos sociais existentes na

    Cidade de So Paulo;

    III contribuir para o enriquecimento scio-cultural

    nas diferentes reas do conhecimento;

    IV utilizar todo o potencial do equipamento

    esportivo.36

    36 SO PAULO (Cidade). Decreto No 48.392/07.

  • 41

    Ao longo da primeira dcada do sculo XXI, a interrupo do trnsito em perodos especficos tambm passou a ser observada com mais frequncia nas ruas das reas urbanas consolidadas, em razo da popularizao das chamadas provas pedestres, comumente conhecidas como corridas de rua. Por aliar os benefcios do exerccio fsico ao ar livre ao baixo custo necessrio para a sua prtica, tal modalidade conquistou um grande nmero de adeptos, sendo que durante 2008 mais de 130 mil pessoas participaram das provas organizadas pela Corpore, uma das principais entidades promotoras de corridas de rua no Municpio. O lazer esportivo tambm foi incentivado junto aos CEUs, grandes centros educacionais equipados com instalaes esportivas e abertos comunidade local, os quais passaram a exercer um importante papel na satisfao das necessidades de recreao da populao por se concentrarem em reas com grande carncia de equipamentos para tal fim, principalmente na periferia da cidade. Idealizados em 2002 no Plano Diretor Estratgico de So Paulo, foram concretizados em 2003, quando a primeira unidade CEU Jambeiro - foi inaugurada na zona leste na cidade. Ainda segundo o Plano Diretor, a recuperao dos espaos pblicos e da qualidade de vida dever prever [...] o resgate e recuperao ambiental,

    esportiva e cultural de todas as praas e parques da cidade37. Observou-se, ento, um novo estmulo criao de parques, oficializado pelo programa municipal Cem Parques para So Paulo. Com o objetivo de atingir o nmero de 100 equipamentos at 2012, 19 parques foram inaugurados pela Prefeitura entre os anos de 2007 e 2008, localizados em sua maioria na zona leste da cidade.38 Ainda que o plano tenha proposto a abertura de parques em todas as regies, buscando-se a melhor distribuio de tais espaos pelo Municpio, no foi sugerida a formao de um sistema que proporcionasse a integrao dos novos espaos entre si, bem como entre os demais equipamentos de lazer j existentes. Alm disso, em um momento no qual grande parte dos espaos livres da cidade foi comprometida, a disponibilidade da rea se impe sua adequabilidade de se converter em um parque. Dessa maneira, muitos parques pblicos

    37 SO PAULO. Plano Diretor Estratgico do Municpio de

    So Paulo: minuta do projeto de lei. Maro 2002. p.60-61.

    38 As zonas leste, oeste, norte e sul receberam, respectivamente, 9, 3, 3 e 4 parques.

  • 42

    implantados em 2007 e 2008 caracterizam-se por possurem pequenas dimenses e raio de atendimento limitado vizinhana imediata. Embora qualquer novo parque seja til populao devido escassez de espaos livres voltados para o lazer, tal medida minimiza, mas no preenche, as lacunas existentes.

  • 43

    3. Osequipamentos esportivos p b l i c o s

    A cidade de So Paulo conta com inmeros equipamentos esportivos pblicos, sendo a maioria administrada pela Prefeitura. Os parques e praas cujos programas prevem instalaes como quadras esportivas, campos de futebol, pistas de corrida, rampas de skate e ciclovias, as ruas que tm o trnsito interrompido em dias especficos para a realizao de atividades fsicas, as represas onde so praticados os esportes nuticos, as ciclovias inseridas na malha urbana, os estabelecimentos educacionais que contam com locais para o ensino da educao fsica e os centros esportivos, tais como clubes desportivos, ginsios e centros olmpicos, so todos exemplos de equipamentos esportivos pblicos, ainda que possuam dimenses, capacidade de atendimento e programas diversos .

    3.1 Os parques

    At dezembro de 2008, 61 parques estavam em funcionamento na capital paulista, sendo 50 municipais e 11 estaduais. Desse total, 22 foram inaugurados a partir do ano 2000, sobretudo nos anos 2007 e 2008, quando foi lanado o projeto Cem Parques para So Paulo. O plano propunha a implantao de parques em todas as regies da cidade, objetivando-se uma melhor distribuio desses espaos pelo territrio. Assim, os novos equipamentos concentraram-se principalmente na regio leste, onde, at o final de 1999, havia apenas 6 parques, e que, ao trmino de 2008, passou a contar com 17 unidades. Novos parques foram inaugurados em 5 subprefeituras que no possuam tal tipo de espao at o fim da dcada de 1990, verificando-se, ento, a presena desses equipamentos em 27 das 31 subprefeituras paulistanas. Destaca-se a adoo de uma nova tipologia chamada parque linear, cuja implantao foi estimulada pelo Plano Diretor Estratgico da Cidade Lei No 13.430/02, que estabeleceu como ao estratgica de gesto ambiental implantar parques lineares dotados de equipamentos comunitrios de lazer, como forma de uso adequado de fundos de vale,

    desestimulando invases e ocupaes indevidas. Dessa forma, os parques lineares teriam funes ecolgicas,

  • 44

    como melhorar a permeabilidade do solo e a drenagem urbana, auxiliar no controle da eroso, e proteger os cursos dgua, e tambm funes sociais, como atender as necessidades de lazer da populao, melhorando a qualidade de vida dos habitantes de seu entorno. Na tabela e no mapa apresentados a segir, nota-se a concentrao de parques junto rea urbana consolidada at 1999. A partir de 2000, os equipamentos passam a ser implantados sobretudo na periferia da cidade.

  • 45

    Fonte: SVMA e SMA, 2008 Como dito anteriormente, significativa parte dos parques novos caracteriza-se por possuir dimenses modestas, verificando-se que 11 desses equipamentos tm rea inferior a 50 mil m2. O Parque Linear Ipiranguinha, implantado na subprefeitura de Aricanduva em 2007 com 10 mil m2, e o Parque Victor Civita, localizado na subprefeitura de Pinheiros e inaugurado em 2008 com 14 mil m2, so os menores parques da cidade. Nesse sentido, a aparente distribuio homognea de tais equipamentos pelo municpio, onde as regies Sul 2, Norte 2, Oeste, Leste 1 e Leste 2 possuem uma quantidade semelhante de parques, mascara as grandes diferenas em relao s reas dessas unidades. No grfico a seguir, observa-se que a soma das reas de todos os parques implantados entre 2000 e 2008 apenas pouco superior rea do Parque Ibirapuera.

    Nmero de parques pblicos, segundo regies e ano de inaugurao.

    Regio At 1999 A partir de 2000 Total Centro 3 0 3 Sul 1 5 0 5 Sul 2 7 4 11

    Norte 1 4 2 6 Norte 2 6 2 8 Oeste 8 3 11

    Leste 1 2 6 8 Leste 2 4 5 9 TOTAL 39 22 61

    Grfico - rea dos

    parques municipais,

    segundo regies e ano

    de implantao.Fonte:

    SVMA e SMA, 2008.

    Considerou-se a rea do

    Parque Anhanguera, na

    zona Norte 2, equivalente

    a 800 mil m2, rea

    efetivamente aberta ao

    pblico dos 9,5 milhes

    totais.

    0

    500000

    1000000

    1500000

    2000000

    2500000

    Cen

    tro

    Sul 1

    Sul 2

    Nor

    te 1

    Nor

    te 2

    Oes

    te

    Lest

    e 1

    Lest

    e 2

    re

    a (e

    m

    m2 ) rea de parques

    implantados a partir de 2000

    rea de parquesimplantados at 1999

    rea do Parque Ibirapuera

  • 46

    Em relao ao programa dos parques, ainda que implantados de acordo com motivaes distintas, ora fruto de loteamentos, ora segundo razes ambientais, nota-se a presena de instalaes esportivas, tais como aparelhos de ginstica, pista de cooper, quadras poliesportivas e pista de skate, na maioria desses espaos.

    Parques pblicos segundo regies. Fonte: SVMA e SMA, 2008. Elaborao da autora.

  • 47

    3.2 As praas

    O levantamento de dados a respeito das praas municipais foi feito enfrentando-se grandes dificuldades. A gesto das praas de responsabilidade das subprefeituras, e no h um cadastro unificado abrangendo a cidade como um todo. Verificou-se que, em vrios casos, as prprias subprefeituras no possuam informaes atualizadas a respeito de tais equipamentos. Inmeros contatos foram feitos, via e-mail e por telefone, aos vrios setores administrativos de cada subprefeitura, entre os quais citamos os departamentos de reas Verdes, Cadastro, Manuteno e Limpeza, Projetos e Obras e Acessoria Tcnica e de Comunicao, sem, no entanto, obter-se informaes sobre o nmero de praas existentes em cada distrito, em especial aquelas equipadas para a prtica esportiva. Foram coletados dados a respeito de 17 subprefeituras, indicando-se a presena de cerca de 2 mil praas em tais reas; porm, no foi possvel precisar quantas dessas possuem equipamentos esportivos em seu interior e mesmo em quais condies as mesmas se encontram, podendo os espaos terem sido ocupados por outros equipamentos pblicos, como unidades de sade, ou por habitaes irregulares. Segundo dado estimado pela Secretaria de Coordenao das Subprefeituras, em 2008, havia cerca de 5,5 mil praas na cidade. Face dificuldade encontrada e superficialidade dos dados obtidos, os quais por vezes resumiram-se a apenas um nmero total, sem o fornecimento do endereo das praas, foi adotado, no presente trabalho, o programa Centralidades Urbanas em Bairros como exemplo da utilizao de tais equipamentos para a satisfao das necessidades

    O programa de atividades da praa moderna

    brasileira evoluiu, a partir do programa

    contemplativo ecltico, para novas formas de uso. A

    apropriao tradicional para o lazer contemplativo,

    passeio, apreciao da natureza e convivncia

    permaneceu como a forma de utilizao intrnseca e

    mais comum da praa; no entanto, novos programas

    voltados ao lazer esportivo e infantil passaram a ser

    propostos e muito bem aceitos.39 39 ROBBA, MACEDO. Praas brasileiras. So Paulo: Edusp, 2005. p.96.

  • 48

    ldico-esportivas da populao. O programa, popularmente conhecido como Centros de Bairro, criado em 2001 pela Prefeitura e efetivado pela Empresa Municipal de Urbanizao (Emurb), foi responsvel pela implantao de vrios equipamentos pblicos de lazer tratados paisagisticamente em So Paulo. Seu objetivo principal era criar reas de vizinhanas principalmente em regies de baixa renda, atravs da instalao de equipamentos de cultura, lazer e esporte em espaos livres prximos s reas com concentrao de moradias e outros equipamentos pblicos, tais como escolas, postos de sade, mercados municipais e terminais de nibus. Na maioria das cerca de 50 praas abertas ou revitalizadas pelo programa, no que se refere ao lazer esportivo, os espaos foram equipados com bancos, mesa de jogos, playground, quadra poliesportiva, quadras de areia e pistas de skate. Em alguns projetos, foram construdos ainda pista de bicicross, equipamentos de ginstica, pista de cooper, parede de escalada e miniquadras para streetball. Alm disso, reas para passeio e descanso em meio a jardins arborizados eram elementos essenciais nos novos espaos. A ltima praa implantada pelo projeto em estudo data do ano de 2004. Desde ento, algumas unidades, apesar de terem exercido um impacto inicial positivo, uma vez que a populao do entorno se apropriou intensamente de tais unidades, tiveram seu uso diminudo devido principalmente dificuldade de manuteno por parte das subprefeituras.

  • 49

    Praas do programa Centros de Bairro

    Fonte: Sakata, 2004.

  • 50

    A localizao das praas dos Centros de Bairro, concentradas junto preferia da cidade, pode ser considerada como uma tendncia na distribuio de tais equipamentos em meio malha urbana de So Paulo. Robba e Macedo (2002, p. 97), referindo-se s praas implantadas a partir da dcada de 1940, constataram que em reas habitacionais, o programa [da praa] englobava, em geral, atividades de lazer

    ativo, principalmente recreao esportiva e infantil, e nas reas centrais ou

    mais adensadas, os usos de circulao, lazer passivo e cultural predominaram. Dessa forma, considera-se que as praas tm sua importncia aumentada quando situadas junto a reas onde predomina a populao de baixa renda, com maiores dificuldades para suprir suas necessidades de lazer na cidade.

    3.3 As ruas

    As ruas so responsveis por grande parte do lazer ativo da populao, especialmente na periferia da cidade, onde se concentram as classes sociais economicamente menos favorecidas e o fluxo de veculos automotores no to intenso como nas reas consolidadas do municpio. Nesse sentido, o programa municipal Ruas de Lazer se destaca como responsvel por assegurar a possibilidade de se interromper o trnsito de automveis em ruas pr-determinadas, durante dias especficos, visando utilizao da rua como rea de lazer. O programa de responsabilidade da SEME, em conjunto com as subprefeituras e com a Companhia de Engenharia de Trfego (CET), e caracteriza-se pela facilidade de implementao e pela participao ativa da populao. As Ruas de Lazer (RLs) so determinadas no pela Prefeitura, mas pelos prprios moradores interessados, mediante um abaixo-assinado representando 70% das residncias, ou seja, a escolha das Ruas de Lazer feita em decorrncia de uma demanda espontnea da populao, fato que aumenta o valor social das mesmas. No local no pode haver igrejas, hospitais, prontos-socorros, estacionamentos, feiras livres e pontos de nibus ou txi. O morador

  • 51

    responsvel pela Rua de Lazer recebe cavaletes e fitas PVC para obstruir o trfego na via aos domingos e feriados, das 8h s 17 h, alm de um kit com materiais esportivos que visam proporcionar o bom andamento das atividades recreativas, contendo bolas de futsal, minitraves de futebol, coletes para a diferenciao das equipes, jogo de damas, pega-varetas e domin, latas de tinta com pincis para pintar a rua, bolas e rede de voleibol, bola de basquete com tabela mirim, apitos de rbitro, bolas de gude, peteca, kit de frescobol, e jogo de taco. Existiam ao final de 2008 cerca de 770 Ruas de Lazer na cidade, concentradas, sobretudo, nas zonas leste e sul do municpio. Quase 37% das RLs do municpio esto na zona leste 2, demostrando a grande carncia de locais para o desenvolvimento de atividades de esporte e lazer na regio. A estimativa que o programa beneficie 50 pessoas por rua, totalizando aproximadamente 38.500 paulistanos.

    Por ser um programa onde a populao tem papel fundamental uma vez que a responsvel por solicitar Prefeitura a implantao da Rua de Lazer, o aumento considervel do nmero de locais atendidos explicita a tambm crescente necessidade de espaos para a prtica esportiva em meio urbano, sobretudo em reas mais carentes da cidade onde os grandes equipamentos para esse fim so escassos.

  • 52

    Ruas de Lazer segundo regies.

    Fonte: SEME, 2008. Elaborao da autora.

  • 53

    O Viaduto Presidente Arthur da Costa e Silva, popularmente conhecido como Minhoco, no centro da cidade, no faz parte do programa Ruas de Lazer mas tambm possui um funcionamento diferenciado, sendo o trfego de veculos permitido apenas de segunda a sexta-feira, das 6h30 s 21h. Aos sbados, domingos e feriados, o viaduto frequentado por paulistanos que nele desenvolvem atividades ldico-esportivas, como andar de bicicleta, caminhar ou passear com animais de estimao. Outro momento em que o trnsito de veculos automotores substitudo por atividades de lazer da populao durante a realizao de provas pedestres, ou corridas de rua, como so mais conhecidas. Segundo a edio de novembro de 2008 da revista internacional especializada em corridas Runners World, 4,5 milhes de brasileiros praticavam tal atividade pelo menos duas vezes por semana, naquele ano. As corridas de rua, cujo exemplo mximo a tradicional Corrida de So Silvestre, que em 2008 teve cerca de 20 mil inscritos em sua 84 edio, popularizaram-se nos ltimos anos por ser uma prtica que dispensa altos investimentos. Atravs dos nmeros da Federao Paulista de Atletismo (FPA), possvel ter uma clara noo do crescimento dessa modalidade nos ltimos 8 anos.

    Apesar de a maior parte desses eventos ser organizada por entidades especializadas, as quais condicionam a participao dos corredores ao pagamento de uma taxa de inscrio, a Prefeitura

  • 54

    organizou, ao longo de 2008, o Circuito Corridas de Rua das Subprefeituras, promovendo provas pedestres gratuitas. O circuito foi realizado atravs de 20 etapas, todas na periferia, com o objetivo de possibilitar o acesso da populao residente em tais reas s corridas, at ento concentradas principalmente nas regies nobres da cidade. Em 2009, a iniciativa da Prefeitura ser mantida, sendo que em janeiro estavam planejadas 19 das 20 etapas, a serem realizadas nas seguintes subprefeituras: Cidade Tiradentes, Ermelino Matarazzo, Guaianases, Itaim Paulista, Mooca, So Mateus, So Miguel e Vila Prudente, na zona leste; Casa Verde, Freguesia do , Jaan, Perus e Vila Maria, na zona norte; e Campo Limpo, Capela do Socorro, Cidade Ademar, Jabaquara, MBoi Mirim e Parelheiros, na zona sul.

    Merecem destaque tambm a Av. Sumar, na zona oeste, e a Av. General Edgar Fac, na zona norte, ambas exemplos de logradouros que apresentam um tratamento diferenciado em relao ao canteiro central da via. Ciclovias e equipamentos de ginstica, como barras para alongamento, so encontrados ao longo da extenso dos canteiros, transformando tais reas em local de lazer ativo da populao residente no entorno das avenidas durante toda a semana.

    3.4 As represas

    So Paulo possui 2 represas localizadas na regio sul da cidade: Represa Guarapiranga, no sudoeste, e Represa Billings, no sudeste.

    XII Trofu Cidade de So Paulo, realizado no dia 25/01/2009, na regio do Parque Ibirapuera, com a participao de

    aproximadamente 8 mil corredores.

  • 55

    Ambas tiveram vocao para serem locais de lazer da populao desde que foram criadas, no incio do sculo XX.; porm, com a poluio que tomou conta das guas a partir da dcada de 1950, as represas foram parcialmente degradadas e as prticas recreativas junto a tais espaos diminuram consideravelmente. Diante dessa situao, em meados da dcada de 2000, a Prefeitura e o Governo do Estado formaram uma parceria e lanaram a Operao Defesa das guas, projeto que objetivava recuperar e preservar as reas de mananciais do municpio. Nesse sentido, os espaos livres marginais das represas passaram a ser disponibilizados para a implantao de equipamentos que, alm de impedirem a ocupao indevida das reas por habitaes irregulares, ofereceriam tambm opes para a realizao das atividades de lazer da populao. Assim, em maio de 2007, a Prefeitura anunciou a implantao de 5 parques lineares na orla da Represa de Guarapiranga, alvo principal da operao em questo. Uma ciclovia de 12 km de extenso ligando os parques tambm foi proposta, e estava em construo ao final de 2008. No incio de 2009 j se encontrava inaugurado o Parque So Jos. A seguir, os parques a serem implantados e seus principais equipamentos esportivos previstos.

    Fonte: PMSP, 2008

  • 56

    Ainda de acordo com os objetivos da Operao Defesa das guas, foi inaugurada a Arena de Esportes Guarapiranga em maro de 2008, localizada na altura do nmero 3.100 da Av.