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Relat. téc. inst. oceanogr., (41):5-14, 1997
Distribuição do plâncton na região costeira de São Sebastião
Sônia Maria Flores Gianesella-Galvão; Elizabeth Aidar; Luz Amelia Vega-Pérez & Flavia Marisa Prado Saldanha-Corrêa
Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (Caixa Postal 66149, 05315-970, São Paulo, SP, Brasil)
Introdução
A região costeira do Estado de São Paulo se encontra sob o domínio de três massas de água: a Água Costeira (AC), a Água Central do Atlântico Sul (ACAS) e a Água Tropical (AT). A AC e a AT são superficiais e apresentam características oligotróficas. Ambas são enriquecidas sazonalmente pela advecção da ACAS a partir do fundo, o que resulta em um incremento de biomassa fitoplanctônica e das taxas de produção primária através de dois processos distintos: a entrada de nutrientes novos para a camada de mistura (Aidar et ai., 1993) e o desenvolvimento da comunidade fitoplanctônica autóctone da ACAS, quando esta atinge a zona eufótica (Saldanha, 1993).
Com o objetivo de conhecer a distribuição da biomassa planctônica na região costeira de São Sebastião em função da estrutura hidrográfica e disponibilidade de nutrientes, foi realizado um cruzeiro oceanográfico durante o verão de 1994. Este estudo deteve-se sobre a área da plataforma interna, a qual de acordo com o observado em trabalhos anteriores em Ubatuba (Aidar et al., op. cit.), é a região biologicamente mais rica e suscetível às interferências antropogênicas.
Material e métodos
As amostragens foram realizadas a bordo do N/Oc. "Prof. W. Besnard" em fevereiro de 1994, cobrindo uma rede de 47 estações oceanográficas, distribuídas ao longo de 7 transectos de 30 milhas de extensão cada um, até a isóbata de 50 m no litoral de São Sebastião, São Paulo (Tabela 1.1 e Fig. 1.1).
Medições de temperatura (termômetros de reversão) e coleta de amostras para determinação de salinidade (salinômetro indutivo), oxigênio (método de Winkler),
Contr. nQ 805 do Inst. oceanogr. da Usp.
nutrientes inorgaD1cos dissolvidos, biomassa fitoplanctônica e material em suspensão foram realizadas nas seguintes profundidades: superfície, 5, 10, 15, 20, 25, 35 m e fundo, de acordo com a profundidade local.
Os nutrientes foram analisados de acordo com métodos espectrofotométricos descritos em Aminot & Chaussepied (1983), para amônia, nitrito e nitrato, e em Grasshoff et ai. (1983), para fosfato e silicato. As amostras para análise de pigmentos fotossintéticos e material em suspensão foram flltradas através de flltros GF/F Whatman®, que foram mantidos em sílica- gel a _20°C até o momento da análise. A biomassa do fitoplâncton foi estimada através de medidas da concentração de cloroflla-a em extrato de acetona a 90% (Jeffrey & Humphrey, 1975). O material em suspensão foi analisado pelo o método gravimétrico (APHA, 1985).
As amostras de zooplâncton foram coletadas em 43 estações oceanográficas, pois não foram efetuadas amostragens nas 4 estações localizadas no interior do Canal de São Sebastião. Foi utilizada uma rede Bongô dupla, de 60 em de diâmetro de boca e malhas de 333 flm e 550 flm, nas profundidades mínimas de 9 m e máximas de 70 m. A densidade e composição do zooplâncton foi estudada .a partir das amostras provenientes da rede fma (333 flm) .
Resultados
A coluna de água apresentou uma forte estratificação termohalina, contudo, sem uma picooclina definida. A AC dominou toda a área costeira, enquanto a ACAS esteve presente apenas nas estações mais externas (área 5, Fig.1.1) e bem próxima ao fundo, abaixo dos 30 m. A temperatura oscilou de 29,39°C na superfície até 16,3TC junto ao fundo. A salinidade apresentou valores entre 30,84 Gunto à costa, na superfície) a 36,14 em alguns pontos nas estações mais ao largo, sugerindo alguma influência da AT, mais salina.
6
As concentrações de oxigênio dissolvido variaram de 2,47 a 5,72 ml rI. Em termos de saturação, a variação foi de 61,30 a 124,80%, com águas subsaturadas sempre junto ao fundo, associadas à ACAS (Figs 1.2 e 1.3).
A amônia apresentou padrões de distribuição horizontal bastante similares nas diferentes profundidades, com a ocorrência de valores altos na radial ao norte, especialmente junto à costa (máximo de 2,7.uM), e baixas concentrações na radial ao sul ( < 0,5 .uM). Ao sul da Ilha de São Sebastião encontrou-se um núcleo de concentração pouco mais elevada à meia água (> 1,5 .uM). Este padrão de distribuição é bem evidente aos 10m de profundidade, por exemplo (Fig. 1.4).
O nitrato (0,0 a 8,1 .uM) e o nitrito (0,0 a 0,9 .uM) apresentaram padrões de distribuição semelhantes, estando os mais altos valores relacionados à ACAS, portanto junto ao fundo (Fig. 1.5). Contudo, núcleos de altas concentrações de nitrato também foram detectados à meia água, especialmente entre os 10 e 15m (Fig. 1.6).
O fosfato apresentou de um modo geral valores abaixo de O,l.uM nas camadas superficiais (Fig. 1.7). Os maiores valores (entre 0,3 e 0,75.u M) estiveram associados à ACAS (Fig.1.8).
Entre a superfície e os 25 m de profundidade, o silicato apresentou um gradiente crescente em direção à costa, atingindo o valor máximo de 9,19 .uM, com pouca variação vertical (Fig.1.9). Já aos 50 m, as concentrações observadas estiveram entre 3,0 e 6,0 .uM (Fig. 1.10), indicando que a proximidade da costa foi o fator mais importante para a distribuição deste nutriente.
A biomassa fitoplanctônica apresentou valores geralmente abaixo de 1,0 mg m -3 nas águas superficiais. Observou-se uma tendência ao aumento das concentrações com a proximidade da costa e com o aumento da profundidade (Figs 1.11 e 1.12). Em termos de c1orofila-a integrada por unidade de área (mg CI-a m-2), observou-se que a região mais externa foi a que apresentou os maiores valores em decorrência da profundidade e que a área ao norte apresentou biomassa fitoplanctônica menor do que a região sul (Fig. 1.13). Tal fato pode ser decorrente de uma menor disponibilidade de nitratos e fosfatos, conforme foi detectado, ou mesmo como conseqüência de uma maior atividade de "grazing" tendo em vista os altos valores de amônia observados também na radial norte.
O material em suspensão apresentou valores entre 12,25 e 200,88 mg rI, com um valor médio de 24,30 mg rI. Embora a maior contribuição tenha sido da fração inorgânica, a fração orgânica foi sempre mais expressiva nos pontos onde foram detectados os máximos de seston. Não se observou um padrão de distribuição definido, podendo-se ressaltar apenas a ocorrência de alguns máximos subsuperficiais e junto ao fundo nas estações mais
Relat. téc. insto oceanogr., (41), 1997
rasas. A distribuição horizontal indica valores mais altos na porção norte do canal (conhecida área de assoreamento ao sul de Caraguatatuba) e na porção mediana e fmal da radial ao norte e face oceânica da Ilha de São Sebastião (Fig. 1.14).
O zooplâncton foi representado por 150 taxa. Os Crustacea predominaram em %% das estações de coleta. Dentre estes, a classe Copepoda foi a mais representativa em 62% das amostras processadas, enquanto que os outros grupos, denominados como Fauna Acompanhante, predominaram nos 38% de amostras restantes.
A Classe Copepoda foi representada por 73 espécies reunidas em 4 subordens: Calanoida (43 espécies), Poecilostomatoida (19 espécies), Cyclopoida (4 espécies) e Harpacticoida (7 espécies).
A Fauna Acompanhante foi constituída por uma ampla variedade de taxa: 77 grupos incluindo famílias, ordens e gêneros.
As espécies de crustáceos dominantes no zooplâncton, foram o Cladocera Penilia avirostris em codominância com os copépodos Temora turbinata, T. sty/ifera, Oncaea venusta e C/ausocalanus furcatus.
Os valores de densidade (ind m -2) foram variáveis (Fig. 1.15a). As estações localizadas entre o litoral e a isóbata de 20 Dl, áreas 1 e 2 (Fig. 1.1), foram as que apresentaram os menores valores: 3.045 ind m -2 (estação 6264) e 36.593 ind m-2 (estação 6277). Os maiores valores foram observados nas áreas 4 e 5, localizadas além da isóbata de 20 m: 694.611 ind m-2 e 938.625 ind m-2 (estações 6268 e 6271, respectivamente). A área 5, mais ao largo, esteve sob a influência da ACAS nas camadas mais profundas. Esta massa de água atua como um evento fertilizador, promovendo o desenvolvimento do fitoplâncton (Figs 1.12 e 1.13).
A alta densidade de zooplâncton na área 4 poderia justificar a menor biomassa fitoplanctônica registrada neste local (Fig. 1.13). Uma alta atividade de "grazing" é sugerida pelos altos valores de amônia aí também encontrados.
Em comparação com as águas costeiras da região de Ubatuba (Aidar et aI., 1993), a biomassa do fitoplâncton apresentou concentrações mais elevadas. Tal fato teria propiciado o crescimento das espécies Temora turbinata, T. sty/ifera e C/ausocalanus furcatus que são preferencialmente herbívoras, embora muitas vezes se comportem como onívoras. Em contrapartida, a presença de material em suspensão rico em matéria orgânica teria favorecido o desenvolvimento da espécie Penilia avirostris, que é basicamente detritívora / onívora.
GIANESELLA-GALV ÃO cf aI.: Plataforma Interna de São Sehastião (OPISS)
Tabela 1.1. Posição das estações oceanográficas do cruzeiro de fevereiro de 1994, na plataforma interna interna de São Sebastião: horário de coleta e profundidade local.
Estação LAT. (8) LONG. (W) Dia HORA PROF. Fev/94 LOCAL LOCAL (m)
6264 23° 35.0 45° 12.1 07 02:00 12
6265 23° 36.8 45° 11.0 07 03 :30 20
6266 23° 41.1 45° 08.9 07 07:40 30
6267 23° 45.5 45° 06.3 07 08:00 37
6268 23° 50.1 45° 04.0 07 10:00 45
6269 23° 54.4 45° 01.5 07 11:50 64
6270 23° 58.8 44° 58.9 07 15:20 74
6271 24° 01.0 45° 03.8 07 18:20 72
6272 23° 56.5 45° 06.5 07 21 :30 48
6273 23° 52.2 45° 08.8 08 23:40 38
6274 23° 47.7 45° 11.3 08 02:00 38
6275 23° 42.9 45° \3.8 08 04:00 20
6276 23° 38.5 45° 16.1 08 05:30 \3
6277 23° 36.5 45° 17.0 08 06:55 12
6278 23° 51.5 45° 14.5 08 09:45 23
6279 23° 54.5 45° \3.0 08 11 :00 39
6280 2]°58.8 45° 11.1 08 12:30 50
6281 24° 03.2 45° 08.8 08 15 :00 72
6282 24° 05.3 45° \3.8 08 17:40 68
6283 24° 00.9 45° 16.0 08 19:15 65
6284 23° 56.8 45° 18.4 08 21:10 33
6285 23° 58.9 45° 23.1 09 23:00 52
6286 24° 03.1 45° 20.9 09 01:15 60
6287 24° 07.6 45° 18.3 09 03:10 66 6288 24° 09.6 45° 23.5 09 04:50 60
6289 24° 05.4 45° 25.4 09 07:00 54
6290 24° 01.0 45° 28.0 09 08:45 51
6291 23° 56.5 45° 30.6 09 1 \:01 43
6292 23° 41.5 45° 20.0 09 13:54 13
6293 23° 44.4 45° 21.3 09 15:05 28
6294 23° 47.2 45° 22.2 09 16:30 29
6295 23° 49.5 45° 24.1 09 17:40 30 6296 23° 51.1 45° 27.3 09 18:25 15 6297 23° 52.2 45° 33.0 09 19:25 25 6298 23° 49.5 45° 34.4 09 2\:20 20 6299 23° 47.6 45° 41.2 10 23:30 12 6300 23° 49.6 45° 40.0 10 00:35 20 6301 23° 54.2 45° 38.0 10 02:23 32 6302 23° 58.7 45° 35.4 10 04:05 36 6303 24° 02.3 45° 32.3 10 05:50 42 6304 24° 07.6 45° 28.4 10 07:30 55 6305 24° 11.8 45° 28.0 lO 09:10 63 6306 24° 14.0 45° 33.2 la 11 :25 62 6307 23° 58.4 45°41.8 lO 15 :30 32 6308 23° 56.0 45° 42.5 lO 16:40 30 6309 23° 51.5 45° 45 .0 \O 18:15 22 6310 23° 47.2 45° 47.4 10 19:30 15
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PROJETO OPISS Cruzeiro de Fevereiro - 1994
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Fig. 1.1. Mapa da área indicando a localização das estações oceanográficas no litoral de São Sebastião (SP) e as áreas definidas para a distribuição do zooplâncton.
GIANESELLA-GALV Áo et ai,: Plataforma Interna de São Schastião (OPISS) 9
Flg, 1,2, Distribuição horizontal das Isollnhas de saturação de oxigênio (%) a 5 m de profundidade,
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Flg, 1 ,3, Distribuição horizontal das Isolinhas de saturação de oxigênio (%) a 50 m de profundidade,
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Flg, 1,4, Distribuição horizontal das isollnhas de concentração de amônia (uM) a 10 m de profundidade,
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PROJETO OPlSS CruZ,I,..O d. r,v,"'lro - 1994
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Fig. 1,5. Distribuição horizontal das isolinhas de concentração de nitrato VI M) a 50 m de profundidade.
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Fig. 1,7, Distribuição horizontal das isolinhas de concentração de fosfato (uM) a 5 m de profundidade.
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Fig. 1.6. Distribuição horizontal das isolinhas de concentração de nitrato ViM) a 10m de profundidade.
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GIANESELLA-GALV ÃO cf ai,: Plataforma Interna de São Sebastião (OPISS) 11
Fig , 1,8, Distribuição horizontal das isolinhas de concentração de fosfato (uM) a 50 m de profundidade,
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Fig, 1,10. Distribuição horizontal das isolinhas de concentração de silicato (uM) a 50 m de profundidade.
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Fig, 1.9. Distribuição horizontal das isolinhas de concentração de silicato (uM) na superffcie.
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Fig. 1.11. Distribuição horizontal da biomassa fitoplanctônica (mgCI-a m-3) a 5 , m de profundidade.
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Clorofila-a (mg,m 3) Prot, 50 m
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Fig. 1.13. Distribuição horizontal dos valores integrados de biomassa fitoplanctônica na coluna de água (mg CI-a m-2).
Relat. téc. inst. oceanogr., (41), 1997
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r? PROJE 10 OPISS CruZ~lro de feverf'lro - 199.
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Fig. 1.12. Distribuição horizontal da biomassa fitoplanctônica (mgCI-a m-3) a 50 m de profundidade .
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PROJETO OPISS CrUZl'Iro dl' reovt»reiro - 199.
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GTANESELLA-GALV ÃO et aI.: Plataforma Interna de São Sebastião (OPISS)
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Fig. 1,14. Distribuição horizontal das isolinhas de material em suspensão total (mg r1) na profundidade de 10 m.
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Fig. 1 .15. Densidade dos organismos do zooplâncton (ind m -2): A- Zooplâncton total ; B- Oasse Copepoda; C- Fauna Acompanhante.
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