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0 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA Dissertação de Mestrado DISTRIBUIÇÃO FUNCIONAL DA RENDA E CRESCIMENTO ECONÔMICO NA DÉCADA DE NOVENTA: UMA APLICAÇÃO DO MODELO DEPARTAMENTAL DE KALECKI ANDRÉ ALBUQUERQUE SANT’ANNA Orientador: Prof o . Carlos Eduardo Frickmann Young Janeiro 2003

DISTRIBUIÇÃO FUNCIONAL DA RENDA E CRESCIMENTO … · pobres da população em virtude da queda da inflação. Esse avanço, porém, não foi suficiente para reverter o quadro de

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE ECONOMIA

Dissertação de Mestrado

DISTRIBUIÇÃO FUNCIONAL DA RENDA E CRESCIMENTO

ECONÔMICO NA DÉCADA DE NOVENTA: UMA APLICAÇÃO DO

MODELO DEPARTAMENTAL DE KALECKI

ANDRÉ ALBUQUERQUE SANT’ANNA

Orientador: Prof o. Carlos Eduardo Frickmann Young

Janeiro 2003

DISTRIBUIÇÃO FUNCIONAL DA RENDA E CRESCIMENTO ECONÔMICO: UMA ANÁLISE PARA A DÉCADA DE NOVENTA

André Albuquerque Sant’Anna

Dissertação submetida ao Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários à obtenção do

Título de Mestre em Economia

Aprovada por: ______________________________________________ Carlos Eduardo Frickmann Young - (UFRJ - orientador) ______________________________________________ José Ricardo Tauile - (UFRJ) ______________________________________________ Antônio José Alves Júnior- (UFRRJ) _______________________________________________ Nelson Henrique Barbosa Filho – (UFRJ) Suplente

Rio de Janeiro, 31 de Janeiro de 2003

Para minha mulher Paula, minha filha, Clarice e meus pais, Ivo e Vera.

AGRADECIMENTOS

Foram muitas as pessoas que contribuíram para que eu conseguisse finalizar esta dissertação. A todas elas gostaria de registrar meus agradecimentos.

Sua imensa alegria, expressa no mais belo sorriso, me deu o ânimo necessário para seguir adiante. Quando já estava cansado de ficar em frente ao computador, minha filha aparecia sempre disposta a brincar. Clarice, obrigado por tudo.

Pela paciência, amor, apoio e por estabelecer o meu prazo final, Paulinha, co-autora em todos os meus projetos, foi fundamental, como sempre.

Cadu, orientador de todas as horas. Sua ajuda e confiança foram essenciais para este trabalho.

Seus bolsistas de IC, Fernanda Cabral e Leonardo Rangel, também me ajudaram muito, principalmente, com relação ao tratamento dos dados, além de terem servido de cobaias com a sua apresentação na Jornada de Iniciação Científica.

Minha mãe, que, com sua experiência em orientações e serenidade, me ajudou sempre nos momentos de dúvida frente aos caminhos a tomar. O pai é normalmente aquele que nos tranqüiliza nas dificuldades. Nesse caso, foi diferente. Meu pai foi mais um a me fazer entender a importância de se terminar logo esta dissertação. Seu amor e torcida foram sempre muito importantes. Filipe Campante, por todo o apoio, pela leitura atenta e pela clareza nos seus comentários.

Anne, Aline, Renata e Marta, por toda a torcida e carinho, sempre. Minha família, pelo suporte em todos os momentos. Gabriela Motta, por todo o apoio e confiança no resultado final. À Petrobras, sobretudo aos funcionários da biblioteca pela eficiência com que

atenderam às minhas demandas mais difíceis. A todos os demais amigos que compartilharam as minhas dúvidas e aflições.

RESUMO

Esta dissertação pretende, utilizando como base teórica o modelo departamental de Kalecki, simular, para a economia brasileira, os efeitos sobre o nível de renda de uma redistribuição em favor dos assalariados. Com o aumento da massa salarial, a demanda por bens de consumo de massa tende a aumentar, o que, na ausência de restrições produtivas, leva a um maior nível de renda, já que os demais componentes da demanda final não são afetados no curto prazo. Ao argumentar que uma melhoria na distribuição da renda pode levar a um aumento no nível de produto em virtude de um aumento na demanda, esta dissertação se insere na discussão sobre a relação entre desigualdade e crescimento econômico como um contra-ponto às abordagens de orientação neoclássica que enfocam os benefícios provenientes de uma redução na desigualdade exclusivamente sobre a capacidade de oferta.

Na década de noventa, a distribuição funcional da renda apresentou uma sens ível piora no Brasil. Aliado a isso, o crescimento econômico nesse mesmo período apresentou um desempenho muito abaixo do desejável. Assim, optou-se por simular qual teria sido o nível de produto em 1996, caso o padrão distributivo fosse o mesmo que o vigente em 1990. Com vistas a estimar esse impacto, utilizou-se uma metodologia para elaborar as equações de determinação da renda no Brasil, tendo como base a matriz de relações intersetoriais do IBGE, de 1996 (último ano disponível). Com base nessa metodologia, foi possível estimar, em um cenário conservador, que o nível de renda, com a distribuição funcional da renda de 1990, teria sido 2,4% maior do que o de fato verificado. Conclui-se, portanto, que uma redistribuição da renda em favor dos assalariados constitui, de fato, uma importante forma de política de promoção do crescimento.

ABSTRACT This dissertation aims to simulate the effects of income redistribution on the level of

GDP, within Brazilian economy, by using Kalecki’s departmental model. With wage increases, the demand for mass consumer goods also tends to increase. Thus, in the absence of productive restrictions, this increase leads, in turn, to higher income level, because, in the short run, other final demand components are not affected. By arguing that an improved income distribution may lead to an improvement in the product as a result of increased demand, this dissertation may be seen within a framework which views the relationship between inequality and growth. This contrasts with neoclassical approaches, which privilege those benefits derived from a reduction in the inequality, solely from the perspective of supply conditions. In the nineties, functional income distribution in Brazil became visibly worse. In addition, in the same period, economic growth was below the desired level. Thus, this dissertation opted to simulate what the level of income in 1996 would have been, if the distributive pattern had been the same as that of 1990. To estimate this impact, a methodology which uses the last available IBGE’s input-output matrix, i.e., 1996, was employed to estimate Brazil’s income determination equations. Based on this methodology, it was possible to estimate, albeit in conservative manner, that the income level, with the same distributive pattern as in 1990, would have been 2.4% larger. It is therefore concluded that an income redistribution which favors workers constitute, indeed, an important way of promoting economic growth.

SUMÁRIO

I – Introdução.....................................................................................................................

II – Distribuição e crescimento na teoria neoclássica.....................................................

II.1. Distribuição e crescimento no modelo de crescimento tradicional......................

II.2. Distribuição e crescimento com mercados de capitais imperfeitos......................

II.3. Escolha política, tributação e seus efeitos sobre distribuição e crescimento........

II.4. Uma visão crítica das abordagens neoclássica sobre distribuição e crescimento

III- A teoria da distribuição da renda de Kalecki...........................................................

IV – Um breve histórico do desempenho econômico brasileiro na década de 90........

IV.1. A distribuição de renda na década de 90.............................................................

IV.2. O crescimento econômico na década..................................................................

V – Metodologia.................................................................................................................

V.1. O modelo de relações intersetoriais......................................................................

V.2. Aplicação da matriz de relações intersetoriais ao modelo departamental de

Kalecki.................................................................................................................................

V.3. Compatibilização das matrizes do IBGE para a aplicação do modelo.................

V.4. Apresentação dos multiplicadores da renda..........................................................

VI – Apresentação das simulações...................................................................................

VI.1. Algumas ressalvas metodológicas antes da apresentação dos resultados...........

VI.2. Resultados da simulação.....................................................................................

VI.2.1 Cenário 1 – Referência.............................................................................

VI.2.2 Cenário 2 – Conservador..........................................................................

VI.3. Uma avaliação sobre os impactos das diferentes formas de estímulo ao

crescimento sobre a balança comercial................................................................................

VI.4. Comentários adicionais.......................................................................................

VII – Comentários Finais..................................................................................................

IX - Referências bibliográficas.........................................................................................

Apêndice do Capítulo III...................................................................................................

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QUADROS 1 – Matriz Departamental................................................................................................

2 – Desigualdade de Renda..............................................................................................

3 – Matriz Departamental Ampliada..............................................................................

4 – Resultado do Modelo..................................................................................................

5 – Ck>15............................................................................................................................

6 – Hipótese 1: Ck>20........................................................................................................

7 – Hipótese 2: Ck>20........................................................................................................

8 – Cenário 1......................................................................................................................

9 – Mudança nos salários.................................................................................................

10 – Taxa de Crescimento Requerida.............................................................................

11 – Cenário 2..................................................................................................................

12 – Taxa de Crescimento Requerida – Cenário 2.......................................................

13 – Necessidade de Importações...................................................................................

14 – Taxa de crescimento das importações decorrentes do acréscimo de produção

em cada departamento....................................................................................................

15 – Elasticidade – produção das importações.............................................................

TABELAS

1 – Mark up por setor......................................................................................................

2 – Taxa de desemprego..................................................................................................

3 – Brasil: indicadores econômicos – 1990 – 1998........................................................

4 – Setores mais afetados pelo aumento da demanda por bens de consumo dos

trabalhadores.....................................................................................................................

5 - Setores mais afetados pelo aumento da demanda por bens de consumo dos

trabalhadores – Cenário 2................................................................................................

GRÁFICOS

1 – Composição do PIB – 1990-2001...............................................................................

2 – Dívida Mobiliária Federal..........................................................................................

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I – INTRODUÇÃO

Um requisito básico para que os cidadãos melhorem o seu nível de vida é o

crescimento econômico. Se uma economia não cresce, os indivíduos que a compõem têm uma

perda de bem-estar. Via de regra, a taxa de crescimento de uma economia é um indicador

essencial para que se conheça o seu dinamismo e as possibilidades de melhoria de vida da

população. Sem embargo, se os benefícios de um possível crescimento são concentrados em

uns poucos indivíduos, não se pode afirmar que o bem-estar social melhora necessariamente

com o desempenho econômico. É preciso levar em conta, nesse caso, que o combate à

desigualdade deve ser prioritário, pois se trata de uma questão ética e está acima de questões

puramente econômicas1. Todavia, cabe ainda uma questão: quais são as conseqüências para o

crescimento econômico de uma melhor distribuição de renda?

No Brasil, a grande desigualdade é uma característica histórica, pois este país tem sido

demasiado rude com as suas populações mais pobres. Como se pode observar todos os dias, a

violência, crescentemente assustadora, é um fruto direto desta tradição de exclusão e

desigualdade que vigora no país desde a sua formação.

Com relação ao crescimento econômico, a história é diferente. Sobretudo da década de

30 à década de 70, o país experimentou altas taxas de crescimento, que o possibilitaram tornar-

se a oitava maior economia do mundo. No entanto, nas últimas duas décadas, o país mergulhou

em diferentes crises que o impossibilitaram de manter o padrão anterior de crescimento. Com

isso, a situação dos mais pobres tornou-se ainda mais dramática2, já que o dinamismo anterior

da economia ainda lhes garantia emprego. Assim, é preciso lançar as bases para um novo

período de crescimento, porém, desta vez, com uma redução dos absurdos níveis de

desigualdade.

Ao longo da década de 90, a distribuição funcional da renda nacional, já tão desigual,

foi se deteriorando continuamente. Neste mesmo período, o crescimento econômico brasileiro

foi um dos mais baixos da sua história. Perante este quadro negativo, indaga-se como poderia

ter sido o desempenho econômico ante uma melhor distribuição da renda. Alguns autores

argumentam em favor de uma possível funcionalidade da desigualdade para o crescimento

1 Nesse sentido, ver Sen (1999) e Kolm (2000). 2 Vale notar que no momento imediatamente posterior ao Plano Real, houve uma melhora para as camadas mais pobres da população em virtude da queda da inflação. Esse avanço, porém, não foi suficiente para reverter o quadro de desigualdade e após os anos iniciais o processo de concentração de renda continuou. Por outro lado, em momento algum houve melhora na distribuição funcional da renda, tema que será aprofundado ao longo desta dissertação.

9

econômico3. Outros, posto que de diferentes correntes teóricas4, defendem a idéia de que um

padrão distributivo mais igualitário gera efeitos positivos sobre o crescimento.

No Brasil, a relação entre distribuição de renda e crescimento econômico já foi tema de

um debate controverso na década de 70. A divulgação do Censo Demográfico de 1970 suscitou

uma série de interpretações acerca da piora distributiva verificada ao longo da década de 60.

De um lado, essa piora foi interpretada por Langoni (1973) a partir de um modelo de capital

humano. Como conclusão de seu argumento, o autor propõe que a desigualdade no período

aumentou em virtude de uma maior demanda por trabalhadores qualificados, não acompanhada

por um crescimento compatível da oferta. Afirma, ainda, que o aumento dessa demanda, por

sua vez, teria sido necessário devido ao grande crescimento econômico na década de 60. Em

resposta à explanação de Langoni, diversos autores buscaram oferecer uma visão alternativa

combinando aspectos da distribuição funcional da renda com elementos de modelos de

segmentação do mercado de trabalho (cf. Tolipan e Tinelli, 1978 e Ramos e Reis, 1991).

Dentre essas interpretações alternativas, há aquelas que buscam inspiração no princípio da

demanda efetiva, conforme assevera Cardoso (1978, p.9):

Os estudos de Belluzzo, Conceição Tavares, Singer e outros mais mostram claramente que não se trata de uma relação entre desigualdade de rendas e crescimento econômico, mas de concentração em proveito de um estrato da população em função de um certo estilo de crescimento econômico, que se baseia prioritariamente no consumo de minorias privilegiadas.

Diante de tal análise, pode-se questionar se um estilo de crescimento baseado em uma

redistribuição em favor dos assalariados, permitindo aumento do consumo das camadas mais

pobres da população, poderia gerar um padrão superior de crescimento. Neste sentido, a idéia

desta dissertação é apresentar uma simulação sobre como teria sido o crescimento na década de

noventa se o padrão distributivo de 1990 não tivesse sido alterado. Com isso, pretende-se

demonstrar que uma melhor distribuição da renda, ao aumentar o poder de compra dos

trabalhadores, teria efeitos benéficos sobre o nível do Produto Interno Bruto.

Ao longo dos últimos anos, a literatura mainstream neoclássica apresentou um

renovado interesse sobre o tema desigualdade e, em especial, como se dá a sua relação com o

desempenho econômico. Dessa forma, o intuito do segundo capítulo é elaborar uma breve

resenha desta nova literatura, apresentando antes, no entanto, o seu ponto de partida teórico: a

3 A respeito, ver Atkinson (1975) e Piketty (2001). 4 Por serem de diferentes correntes, suas explicações para a relação entre crescimento e desigualdade divergem, ainda que concordem nas conclusões.

10

teoria do crescimento neoclássica tradicional. Todavia, esta resenha é acompanhada de uma

visão crítica, que constata os problemas decorrentes da não assunção do princípio da demanda

efetiva como um marco teórico. Dessa forma, uma vez destacado este problema, parte-se, em

seguida para a apresentação de uma visão alternativa sobre a relação entre distribuição de

renda e crescimento econômico. A referência teórica principal nesse caso é o autor polonês

Michal Kalecki, que buscou conciliar teoricamente distribuição, determinada

microeconomicamente, e dinâmica macroeconômica.

A fim de situar o leitor acerca da situação brasileira no período enfocado, foi elaborado,

no capítulo seguinte, um breve histórico da economia brasileira na década de 90, com especial

enfoque para a repartição da renda e o crescimento econômico.

Uma vez determinada a referência teórica desta dissertação, é definida a metodologia a

ser utilizada para as simulações que visam ao objetivo do trabalho. A metodologia empregada

nesta dissertação insere-se numa tradição de trabalhos que, através do uso de matrizes insumo-

produto, procuram inferir relações entre crescimento e redistribuição mediante um aumento do

consumo dos mais pobres (ou trabalhadores) em detrimento de uma redução no consumo dos

mais ricos (e.g. Bonelli e Cunha, 1981, 1982; e Bêrni, 1995). Estes modelos, porém, não

dispõem de uma base teórica mais firme, como as de Tauile e Young (1991) e Cavalcanti

(1997). Destarte, neste trabalho, optou-se por utilizar metodologia semelhante, embora com a

introdução de algumas mudanças, à utilizada por Tauile e Young (1991) por motivos que serão

apresentados com detalhe no quarto capítulo.

Com a metodologia e a parte teórica devidamente definidas e apresentadas, o quinto

capítulo apresenta as simulações realizadas. Conforme será visto adiante, com base nas

simulações realizadas, pode-se concluir que uma melhor distribuição de renda levaria a uma

maior nível de renda5.

Por fim, nas considerações finais, é feito um apanhado geral do que foi realizado nesta

dissertação, com especial ênfase nos resultados obtidos e nas suas implicações para efeito de

política econômica.

5 Em um cenário conservador, essa variação no nível de renda seria de 2,4%. A respeito, ver seção VI.2

11

II – DISTRIBUIÇÃO E CRESCIMENTO NA TEORIA NEOCLÁSSICA

Durante muitos anos, na literatura mainstream, a discussão sobre aspectos distributivos

exerceu um papel apenas periférico. Isto se deve ao fato de a distribuição da renda ser, na

teoria neoclássica tradicional, o resultado de uma determinada configuração de equilíbrio

geral6. Desse modo, uma dada distribuição de riqueza gera um equilíbrio específico e, portanto,

qualquer consideração sobre desigualdade deveria pautar-se sobre a redistribuição daquela7.

Ainda assim, os argumentos para uma redistribuição da riqueza seriam apenas morais, uma vez

que tal atitude levaria a um novo equilíbrio geral, sem impacto sobre a eficiência alocativa da

economia8. Conforme afirma Arrow (1974, p. 255), em sua Nobel Lecture,

...Pareto efficiency in no way implied distributive justice. An allocation of resources could be efficient in a Pareto sense and yet yield enormous riches to some and dire poverty to others.

Nessa concepção, desigualdade, tanto de renda quanto de riqueza, não afeta a eficiência

econômica que, transposta para um contexto dinâmico, seria traduzida numa relação análoga

com o crescimento. Nesse sentido, Stiglitz (1969) mostra, a partir do modelo de crescimento de

Solow9, uma tendência à equalização da riqueza e, por conseqüência, da renda no longo

prazo 10.

Cumpre destacar que a hipótese de mercados de capitais perfeitos e completos é

essencial para a validade daquele resultado, visto que é este suposto que garante a existência de

um preço único, e dado, para cada mercado e que cada indivíduo possa ter acesso ao montante

de capital necessário para que a remuneração desse fator seja igualada para todos os agentes.

De outro passo, violada essa hipótese, surge espaço para uma relação negativa entre

desigualdade e crescimento, pois as possibilidades de produção de um agente passam a ser

influenciadas pela sua riqueza inicial. Logo, quando há algum tipo de imperfeição de mercado,

6 Afinal, em um sistema de equilíbrio geral no qual as preferências, a tecnologia utilizada e as dotações de cada agente são consideradas dadas, o vetor de preços e, por conseqüência, a remuneração dos fatores são determinados pela solução de equilíbrio (cf. Arrow, 1974). 7 De acordo com Arrow (1974, p. 269), “... the final allocation will depend on the distribution of initial supplies and of ownership of firms”. 8 A respeito desse tópico, ver Sen (1999). 9 No modelo tradicional de Solow (1956), são assumidas as hipóteses básicas da teoria do equilíbrio geral e, portanto, seu resultado final configura uma situação de eficiência de Pareto. 10 No seu mo delo, Stiglitz (1969) assume trabalho homogêneo e, portanto, a única fonte de desigualdade na renda provém dos rendimentos do capital. Assim, se não há desigualdade de riqueza, a renda também não se distribui de forma desigual.

12

a distribuição inicial da riqueza passa a ser um fator determinante para o crescimento

econômico. Por exemplo: quanto mais pessoas tiverem acesso a crédito em um mercado

imperfeito, maior tende a ser a eficiência dessa economia.

Há ainda uma outra abordagem que busca explicar teoricamente o porquê de uma

relação negativa entre desigualdade e crescimento na literatura recente11. Trata-se de um

argumento que procura racionalizar a atividade governamental. Uma maior desigualdade

levaria o eleitor mediano a preferir governos voltados para os seus anseios, levando portanto a

altas taxas sobre os mais ricos, o que, por sua vez, geraria grandes distorções produtivas. Tal

política geraria ineficiências, de modo a reduzir os incentivos a poupar, o que levaria a um

menor crescimento econômico (cf. Bénabou, 1996; Bourguignon, 2002).

Ainda que muito diferentes, a corrente de economia política12 e a de imperfeições nos

mercados de capitais possuem um ponto em comum: compartilham a hipótese de que é a renda

que determina os gastos. Desse modo, ainda que com explicações diferentes, o canal pelo qual

uma redistribuição afetaria o crescimento econômico passa necessariamente pelo aumento da

eficiência produtiva da economia. Não há, portanto, nessas abordagens, espaço para uma

análise dos efeitos de uma redistribuição sobre o perfil da demanda.

É nesse ponto que aparece a relevância da contribuição de Kalecki. Não se trata de

negar a importância dos aspectos distributivos para as condições de oferta, mas sim de

reconhecer a importância dos mesmos para a demanda, tendo em vista que, pelo princípio da

demanda efetiva, são os gastos que determinam a renda.

II.1 – DISTRIBUIÇÃO E CRESCIMENTO NO MODELO DE CRESCIMENTO TRADICIONAL

A teoria tradicional do crescimento é, via de regra, associada ao modelo proposto por

Solow (1956). Nesse trabalho, o autor pretendia oferecer uma solução para os problemas de

ausência de pleno emprego e instabilidade decorrentes do modelo de Harrod (1939). Para tal,

Solow toma como hipóteses básicas a existência de mercados perfeitos de fatores e funções de

produção com perfeita mobilidade dos fatores e retornos constantes à escala 13.

11 Ver a respeito em Atkinson & Bourguignon (2000). 12 Entenda-se economia política aqui como esta nova literatura, que, na verdade, aplica o instrumental econômico neoclássico à análise das decisões políticas. 13 Em um contexto de equilíbrio geral, essa hipótese equivale ao pressuposto de um conjunto de produção não-nulo, convexo e compacto. Para que o conjunto tenha essas características, é necessário a presença de retornos constantes (ou decrescentes) de escala e aditividade de distintos processos de produção (Arrow, 1951).

13

Com base nessas duas hipóteses, o problema (da ausência) de pleno emprego é, desde

logo, eliminado. Visto que a premissa de mercados perfeitos de fatores implica que os preços

daqueles são dados, as firmas, ao procurarem maximizar seus lucros, deverão contratar capital e

trabalho até o ponto em que as respectivas produtividades marginais se igualem aos respectivos

preços dos fatores. Não é difícil compreender o porquê de tal comportamento. Caso o produto

marginal fosse maior do que o custo, haveria incentivo a se contratar mais unidades marginais

do fator e ainda obter lucros14. No caso oposto, a redução na quantidade utilizada do fator

também levaria a um incremento nos lucros da empresa. Sendo assim, tem-se que a taxa de

salário -w- deve se igualar à produtividade marginal do trabalho e o retorno do capital - r- deve

ser igual à produtividade marginal do capital15.

Note-se, todavia, que tal resultado é válido apenas com a possibilidade de substituição

entre capital e trabalho, visto que, caso contrário, os produtos marginais não poderiam ser

definidos.

Em virtude da hipótese de a função de produção ser homogênea linear, a renda de cada

indivíduo pode ser traduzida por

yi=w+rk i (1),

onde yi é a renda do indivíduo i e ki é o estoque de riqueza de i. Assumindo-se, em adição às

hipóteses supracitadas, que os indivíduos poupam uma fração constante da sua renda, pode-se

provar que, no longo prazo, a distribuição tende a se tornar igualitária (Stiglitz, 1969).

Optou-se por dar preferência à demonstração de Bertola (2000) à assertiva acima, por

considerá- la mais clara do que a de Stiglitz (1969). Bertola (2000) supõe uma função consumo

do tipo:

iii kcyccc~^_

++= (2),

onde ^c é a propensão marginal a consumir da renda,

~c é a propensão marginal a consumir com

relação à riqueza pessoal e _

c é o consumo autônomo.

Como investimento líquido é, por definição, igual à poupança líquida e igual à variação

de capital, tem-se que a variação de capital de cada indivíduo é dada por:

14 Vale le mbrar a essencialidade da hipótese de rendimentos decrescentes para a obtenção desse resultado.

15 Isto é, wL

LKFr

KLKF

=∂

∂=

∂∂ ),(

;),(

.

14

_~^_~^))(1()1( ckcwrkcckcyck iiiii −−+−=−−−=∆ (3)

Daí, dividindo (3) por ki, tem-se que

ii

i

kcwc

crckk

_^~^ )1(

)1(−−

+−−=∆

(4)

Deve-se notar que a parcela ~^

)1( crc −− de (4) é igual para todos os indivíduos. Ainda, se

_^)1( cwc >− , quanto mais rico o indivíduo (k maior), menor será a parcela de variação da

riqueza decorrente de salário. Logo, a taxa de crescimento do capital dos mais pobres será maior

do que a dos mais ricos, gerando, pois, uma convergência distributiva16.

Há, contudo, que se interpretar esse resultado à luz do modelo de Solow. Definindo k

como a relação capital/trabalho (i.e, k=K/L), tem-se que

LL

KK

LKLK

kk ∆

−∆

=∆

=∆ )(

(5)

Usualmente, assume-se que a força de trabalho cresce a uma taxa exógena n. Aplicando

em (5) tem-se

nKL

LK

kk

−∆

=∆

(6)

Como ∆K/L = i (investimento per capita), ao multiplicar (6) por k, chega-se à “equação

fundamental do crescimento”:

nkckcwrkcnksnkik −−−+−=−=−=∆_~^

))(1( (7)

Se ∆k=0, tem-se um equilíbrio de “steady state”, no qual capital, trabalho e renda

crescem à mesma taxa n. Destaque-se que o problema de instabilidade de Harrod é solucionado

por Solow a partir dos ajustes no estoque de capital ao crescimento da população.

Vale aprofundar-se sobre como se dão esses ajustamentos do estoque de capital, pois são

cruciais para a validade do modelo de Solow. Se a função de produção permite diferentes

combinações de capital e trabalho, os preços dos fatores adquirem um papel decisivo não só na

determinação da distribuição da renda, mas também na alocação dos recursos. Nesse caso, as

16 Como, nesse arcabouço, a única fonte de discrepância na renda dos indivíduos é a quantidade de capital possuída, uma convergência em riqueza implica diretamente em convergência em renda.

15

quantidades de trabalho e capital utilizados, e portanto o nível de emprego e de produção,

dependem das magnitudes dos preços desses fatores. Assim, ressalta Piketty (2001), que a

possibilidade de se substituir capital por trabalho, ou ao contrário, resulta não apenas de uma

questão tecnológica. Trata-se sobretudo de uma avaliação sobre as oportunidades econômicas

de se utilizar mais de um fator ou de outro. Se os preços dos fatores influenciam na sua

alocação, para se compreender como se dá a relação entre variações daqueles preços e a

distribuição da renda, é necessário entender como aquelas atuam sobre a alocação dos fatores.

Em outras palavras, a elasticidade de substituição capital-trabalho possui, para esta teoria, um

importante papel para a determinação da dis tribuição da renda entre lucros e salários. Se a

elasticidade é elevada, há uma forte possibilidade de substituição entre capital e trabalho, uma

vez que os incentivos a trocar um fator pelo outro são, nesse caso, altos. Desse modo, um

aumento de 1% no preço do capital (trabalho), a depender do valor da elasticidade, pode resultar

numa redução, manutenção ou aumento da quantidade empregada de capital (trabalho). Se a

elasticidade de substituição for maior do que um, então um aumento no preço do fator resultará

numa maior redução na quantidade do fator utilizada, o que, pois, acarretará uma queda na

parcela deste fator na renda. No caso de a elasticidade ser menor do que um, um aumento no

preço do fator gera um aumento na sua parcela da renda. Se a elasticidade de substituição

capital-trabalho for unitária, a parcela dos fatores sobre a renda é fixa e independe, portanto, das

variações nos seus preços e quantidades. Destaque-se, contudo, que o valor da elasticidade

depende do formato da função de produção, a qual é determinada pela tecnologia utilizada. Em

outras palavras, cada tipo de função de produção representa diferentes tecnologias e gera

diferentes elasticidades de substituição entre os fatores17.

A resposta dos empresários às mudanças nos preços relativos dos fatores de produção

constitui-se, como proposto acima, num parâmetro crucial para a distribuição da renda. Ainda

assim, esta não leva em consideração os efeitos de uma redistribuição sobre o estoque de capital

futuro da economia. Ou seja, há que se considerar ainda que uma mudança na relação entre

lucros e salários pode alterar os incentivos à inversão por parte dos empresários18. Nesse

sentido, Piketty (2001) recorre à noção de elasticidade de oferta do capital, a qual mede o

percentual de queda da oferta de capital quando a remuneração do capital investido cai 1%.

Vale lembrar que tal argumento é muito importante para a relação entre crescimento e

distribuição: reduzir a parcela do capital na renda implica numa redução da sua rentabilidade, o

17 Uma função tipo CES (caso geral) possui elasticidade de substituição constante (não necessariamente igual a um). Já u ma função Cobb-Douglas (caso particular), por exemplo, possui elasticidade unitária. 18 Este é o argumento que está por trás da idéia de “fazer o bolo crescer para depois distribuí-lo”.

16

que, por seu turno, implica um desincentivo a novos investimentos. A concentração da renda, de

acordo com essa teoria, possuiria, portanto, uma funcionalidade para o crescimento econômico.

Feita esta rápida digressão a respeito dos ajustamentos do estoque de capital e dos seus

efeitos sobre a distribuição da renda, voltemos à apresentação dos resultados demonstrados por

Stiglitz (1969), porém com base na apresentação de Bertola (2000).

É importante ressaltar que a convergência distributiva prevista pela equação (4) decorre

diretamente das hipóteses de mercados de fatores perfeitos e propensão a consumir linear.

Supondo, por exemplo, que a propensão a consumir dos indivíduos mais pobres seja maior do

que a dos mais ricos19, nesse caso, a equação (4) passa a ser para os pobres

p

ppp

p

p

k

cwccrc

k

k_

~ )1()1(

−−+−−=

∆ (4’).

Com relação aos ricos, teremos a seguinte equação:

r

rrr

r

r

kcwc

crckk

_~ )1(

)1(−−

+−−=∆

(4’’).

Nesse contexto, a primeira parcela da equação (4’’) é maior do que de (4’). Com relação

à segunda parcela, o numerador em (4’) é menor do que em (4’’), podendo ser até mesmo

negativo. No que concerne ao denominador, a mesma relação ocorre, pois a riqueza dos pobres

é, por definição, menor do que a dos ricos. Por conseguinte, a extensão da desigualdade de

riqueza será determinante na taxa de crescimento das mesmas. Desse modo, quanto maior a

desigualdade, maior será a diferença inicial entre as taxas de crescimento de pobres e ricos.

Contudo, a taxa de crescimento da riqueza dos pobres é decrescente, não obstante comece muito

alta. Ainda que no princípio seja menor do que a dos pobres, a taxa de crescimento da riqueza

dos ricos tende a se estabilizar num patamar mais alto do que a dos pobres. Conseqüentemente,

a hipótese de propensão a consumir maior para os pobres gera assintoticamente uma maior

desigualdade (Bertola, 2000)20.

Além disso, como os indivíduos mais pobres consomem mais, uma redistribuição levaria

a um aumento na propensão a consumir média da economia. Vale lembrar que este arcabouço

19 Conforme supõe Kaldor (1956) e boa parte dos modelos sobre o tema. Para uma resenha completa, ver Pasinetti (1974). 20 Este resultado, no entanto, é controverso, pois é razoável admitir que, na medida em que aumentam sua renda e riqueza, a propensão a consumir dos pobres se aproxime da dos ricos.

17

baseia-se na “Lei de Say”21, para a qual a renda é dada. Assim, de acordo com essa teoria, o

aumento no consumo levaria a uma redução no nível de investimento e, portanto, a uma menor

acumulação de capital, de modo a prejudicar o crescimento econômico22,23.

A diferença nas propensões a consumir, contudo, não é a única forma de relacionar

desigualdade e crescimento. Se houver uma não-linearidade no retorno do capital, o resultado

do modelo de Solow-Stiglitz não é mais válido (Bourguignon, 2002). Nesse caso, uma melhor

distribuição de riqueza seria mais producente para o crescimento econômico. É disso que trata

a literatura sobre desigualdade e mercados imperfeitos de capital.

II.2 – DISTRIBUIÇÃO E CRESCIMENTO COM MERCADOS DE CAPITAIS IMPERFEITOS

Os modelos da literatura, que relacionam eficiência e distribuição através de

imperfeições nos mercados de capital, buscam formalizar uma idéia antiga e presente no senso

comum: pessoas pobres não conseguem tomar emprestado e, por isso, não conseguem realizar

plenamente seu potencial produtivo 24. Em virtude disso, a desigualdade surge como um fator

de restrição ao crescimento, uma vez que é responsável por oportunidades de investimento não

exploradas (Bourguignon 2002). É importante destacar que o propósito desta seção é

apresentar em linhas gerais as principais idéias presentes nessa literatura.

Conforme foi argüido na seção anterior, na teoria tradicional do crescimento, mercados

perfeitos de fatores constituem uma hipótese importante, que garante a independência do

crescimento com relação a aspectos distributivos, além do pleno emprego e da estabilidade do

resultado. Se, contudo, aquele suposto não for mais válido, as possibilidades de produção

podem variar ao longo da distribuição de riqueza (Piketty, 1997). Tal fato pode decorrer, por

exemplo, de alguns agentes não terem acesso a crédito para investir em uma atividade

produtiva. Num cenário desses, quanto maior a proporção de indivíduos pobres e, portanto,

quanto pior for a distribuição de riqueza, mais potencial produtivo estará sendo desperdiçado,

21 Ao assumir que a renda é determinada por uma função de produção, isto é, pelos fatores de oferta é um reflexo da “Lei de Say”. 22 Note-se que a renda é considerada dada para uma dada configuração dos fatores de produção. O investimento, ao aumentar o estoque de capital, leva a um movimento ao longo da função de produção, gerando um novo nível de renda. 23 Conforme será visto na seção II.4, a visão de demanda efetiva não reflete esse problema, que é inerente a todas as abordagens neoclássicas. 24 Vale ressaltar que imperfeição no mercado de crédito não é a única forma de se tratar o assunto. Alguns trabalhos lidam com imperfeições no mercado de seguros, como Banerjee e Newman (1991).

18

resultando numa perda de eficiência 25. Num contexto dinâmico, uma maior desigualdade

levaria, pois, a um menor crescimento econômico (Ferreira, 1999).

Ainda que cada modelo apresente diferentes estratégias para traçar a relação entre

imperfeição nos mercados de capitais e eficiência, é possível apresentar em linhas gerais

aquelas que podem ser consideradas as principais características dessa literatura. O modelo de

Galor e Zeira (1993) pode ser considerado um dos pioneiros e, ademais, um modelo típico, a

partir do qual podem-se identificar as principais idéias dessa corrente.

Nesse modelo, considera-se uma economia com indivíduos ‘idênticos’, com exceção do

seu estoque inicial de riqueza. Assume-se ainda, o que para esses autores são supostos

fundamentais para os resultados do modelo, uma imperfeição no mercado de crédito, devido à

existência de moral hazard (Risco Moral) 26, e uma não-convexidade na tecnologia de

produção.

Em geral, a suposição de não-convexidade do conjunto de produção é a forma utilizada

para formalizar as diferenças nas oportunidades de produção ao longo da distribuição de renda.

A idéia é que haja um nível mínimo requerido de investimento para se ter acesso à atividade

produtiva.

Com relação ao outro suposto fundamental, pode-se tratar a imperfeição no mercado de

capitais de diversas formas. Galor e Zeira (1993) assumem a existência de moral hazard

quanto ao repagamento de empréstimos, gerando um spread entre a taxa de juros paga pelos

tomadores e a enfrentada pelos emprestadores ao captarem recursos. Uma modelagem

alternativa é proposta por Banerjee e Newman (1993), que focam na exigência de colaterais,

em resposta ao problema de moral hazard. Aghion e Bolton (1997), assim como Piketty

(1997), também centram sua análise sobre a imperfeição no mercado de crédito em decorrência

do problema acima, centrando o foco sobre a taxa de juros. Contudo, diferente de Galor e

Zeira, geram um resultado, no qual a taxa de juros é determinada endogenamente a partir da

oferta e demanda de capital. De fato, conforme arrazoam Piketty (1997) e Bertola (2000), não

importa a microeconomia por trás da falha de mercado, desde que ela exista.

Nesse sentido, qualquer que seja a falha de mercado, dela resulta um equilíbrio no qual

uma parcela da população não investe nos setores mais produtivos da economia, posto que

25 Vale ressaltar, conforme Campante (2002), que, a rigor, o argumento acima condiz melhor com uma relação entre pobreza e eficiência, se bem que a literatura trate o assunto como acima exposto. 26 Moral hazard representa uma situação na qual uma das partes envolvidas em uma transação pode tomar certas atitudes que afetam a avaliação da transação feita pela outra parte envolvida e esta segunda parte não pode monitorar perfeitamente o comportamento da primeira (Kreps, 1990).

19

sejam ‘idênticos’ aos demais, pelo simples fato de não ter riqueza suficiente para transpor os

problemas gerados pela imperfeição de mercado. Assim, indivíduos pobres são

impossibilitados de atuarem em atividades mais produtivas, em virtude da restrição de liquidez

a eles imposta decorrente da imperfeição no mercado de crédito (Ferreira, 1999)27.

Até o momento, o suposto de não-convexidade dos conjuntos de produção parece,

como afirmam Galor e Zeira (1993, p.44), “crucial para os principais resultados da teoria”. No

entanto, Piketty (1997) demonstra que esse suposto não é essencial para as conclusões da

teoria. O autor considera um modelo de Solow, porém com racionamento de crédito ao estilo

de Aghion e Bolton (1997). Dessa configuração, Piketty obtém um resultado de múltiplos

steady states e uma associação negativa entre desigualdade e eficiência. Conforme ressalta

Campante (2002), Piketty estabelece que o suposto essencial dessa teoria é precisamente o de

mercados de capitais imperfeitos.

Em suma, conforme salientam Bertola (2000) e Bourguignon (2002), a configuração

básica desses modelos consiste em uma imperfeição no mercado de crédito, que gera uma não-

lineraridade na acumulação de capital. Desse modo, como assinala Bertola (2000), o retorno do

capital passa a depender da riqueza de cada indivíduo. Visto nos termos da equação (4), tem-se

que:

ii

i

i

kcwc

crckk

_^~^ )1(

)1(−−

+−−=∆

,

onde ri=f(k i). No caso de a relação entre o retorno do capital investido e a riqueza individual

ser positiva, a desigualdade tende a ser crescente. Desse modo, uma redistribuição que

possibilite mais indivíduos a investirem será benéfica para o crescimento econômico.

Da literatura sobre desigualdade e eficiência via imperfeições nos mercados de capitais,

pode-se extrair importantes conclusões. Em primeiro lugar, mostra-se que há uma relação entre

desigualdade e eficiência econômica, sendo este o principal intuito dessa abordagem. Em

segundo lugar, mostra-se que a desigualdade pode persistir, e até crescer, num ambiente com

indivíduos idênticos, com exceção da riqueza inicial. Em alguns casos, há a possibilidade de

ocorrência de “poverty traps”.

27 Bertola (2000, p.32) esclarece que esse argumento é mais realista para o caso de investimentos em educação.

20

Não obstante o suporte empírico que essa literatura encontra (cf. Bénabou, 1996), vale

notar que ela não esgota as possibilidades de explicações para uma possível relação negativa

entre desigualdade e crescimento mesmo dentro da literatura neoclássica. O resultado das

decisões sobre taxações e redistribuição tem efeito sobre a eficiência econômica. Com base

nisso, alguns autores decidiram explorar essa vertente da relação entre desigualdade e

crescimento.

II.3 – ESCOLHA POLÍTICA, TRIBUTAÇÃO E SEUS EFEITOS SOBRE DISTRIBUIÇÃO E CRESCIMENTO

Na última década, houve um ressurgimento das questões sobre desigualdade e, em

especial, das suas relações com o desempenho econômico na literatura mainstream28. A

literatura que procura relacionar o processo político com redistribuição e desempenho

econômico constitui uma das formas de se tratar esse problema. Contudo, por ser bastante

vasta não se pretende elaborar, nesta seção, uma resenha extensiva. O propósito é apenas

apresentar os elementos gerais, sem discutir detidamente cada modelo, ainda que isso

signifique perder pontos interessantes, porém específicos de cada abordagem29.

Normalmente, é comum assumir que um planejador social benevolente, que busca

maximizar o bem-estar social, seria uma opção first best. Contudo, na prática, não é dessa

maneira que as decisões políticas são tomadas. Decisões políticas resultam da interação entre

forças com interesses distintos e, muitas vezes, antagônicos. Esta literatura discorre

explicitamente acerca das decisões sobre taxação e redistribuição. Trata-se de um mecanismo

simplista, no qual as decisões a respeito são decididas apenas através de um processo de

votação. Dessa configuração resulta o ‘teorema do eleitor mediano’, o qual, de forma simples,

postula que se as preferências por uma determinada variável (p.ex., uma taxação sobre a renda)

variam monotonicamente ao longo da distribuição de renda (ou riqueza, ou consumo) e, se

cada pessoa tiver um peso igual na decisão política, então a preferência do eleitor que ocupa a

mediana da distribuição relevante será a que prevalecerá no processo eleitoral (Ferreira, 1999,

p. 9).

28 Nesse aspecto, o artigo de Atkinson (1997), “Bringing income distribution in from the cold”, estabelece um marco. 29 Dentre os modelos mais importantes dessa abordagem, destacam-se os de Alesina e Rodrik (1994), Bertola (1993), Person e Tabellini (1994) e Bénabou (2000).

21

Baseado nesse teorema, pode-se mostrar que se a política fiscal (representada por uma

alíquota t) de um governo é redistributiva, então as preferências com respeito ao valor da

alíquota decrescem monotonicamente com relação à renda. Nesse contexto, ao se medir a

desigualdade como a distância entre a renda do eleitor mediano e a do eleitor médio, então

quanto maior for essa desigualdade, maior será o valor da alíquota t. Se, no entanto, houver

uma perda de eficiência decorrente da taxação, ou mesmo um desincentivo a investir, essa

maior alíquota, decorrente da maior desigualdade, leva a um menor crescimento econômico.

Bourguignon (2002) oferece uma versão estilizada dos modelos dessa literatura: em

primeiro lugar, supõe-se que capital e renda por trabalhador e taxa de salário cresçam à mesma

taxa g. Em seguida, define-se a renda de cada indivíduo como

ii rktTtwy )1()1( −++−= (5),

onde T=ty, t é a alíquota e y representa a renda média. Por simplicidade, assume-se que a

sociedade divide-se entre trabalhadores e capitalistas. Nesse caso, a renda de um trabalhador é

trkwrkwttwtytwyw +=++−=+−= )()1()1( (6)

Para os trabalhadores, uma alíquota alta é benéfica, pois recebem transferências

resultantes da expropriação dos lucros dos capitalistas. Ainda que, dinamicamente, haja alguma

perda, já que a taxa de salário cresce à mesma taxa que o capital médio, existe uma taxação

positiva que é ótima para os trabalhadores (Bourguignon, 2002, p.16). A renda de um

capitalista, por sua vez, é

)()1()1( iiik kktrrkwrkttytwy −++=−++−= (7)

Caso o capitalista i tenha uma riqueza acima da média (i.e., ki>k), ele será contra

qualquer tipo de redistribuição, em favor dos assalariados, sendo apenas a favor de subsídios

para o capital.

Dessa breve estilização, pode-se inferir que a alíquota desejada decresce com o nível de

capital. Ademais, aplicando o teorema do eleitor mediano, a redistribuição e, por conseqüência,

a taxação aumentam na medida em que aumenta a diferença entre a riqueza média e a riqueza

do eleitor mediano (k-kq). Como uma maior taxação representa maiores desincentivos à

inversão, tem-se que uma maior desigualdade leva a um menor crescimento econômico.

Não obstante a atratividade desse argumento decorrente da sua simplicidade, ele parece

não encontrar suporte empírico para as suas conclusões, conforme aponta Perotti (1996). Desse

modo, faz-se necessário buscar explicações alternativas para uma relação negativa entre

22

desigualdade e crescimento decorrentes do processo político. Nesse sentido, Atkinson (1997, p.

316) propõe:

the median voter theorem is far from being ‘standard’. It seems to me important to see how far the findings depend on whether the outcome is governed by the preferences of the median voter, or by the ideology or preferences of political parties, or by political pressure from different interest groups…

Baseado na reflexão acima, Campante (2002) pretende incorporar na discussão dessa

literatura dois aspectos. O primeiro refere-se à decisão sobre a composição dos gastos do

governo como forma de redistribuição. Adverte Campante (2002) que distintas formas de

gastos podem acarretar diferentes impactos e podem ser dependentes da distribuição de renda.

Quanto ao segundo aspecto, não necessariamente a economia política da desigualdade deve

depender apenas de processos de votação. Seguindo Atkinson (1997), pode-se utilizar a idéia

de grupos de interesse que buscam, e possivelmente conseguem, influenciar as decisões

governamentais. Por essa forma, é possível que, em uma sociedade desigual, um governo tenha

políticas regressivas com relação à distribuição, em dissonância com o que prega a abordagem

tradicional. Há que se reconhecer que tal argumento parece mais razoável à luz da observação

da realidade.

Alesina e Perotti (1996) pregam ainda uma outra via de impacto da desigualdade no

crescimento econômico. Segundo esses autores, uma maior desigualdade pode levar a uma

maior instabilidade política, que, por seu turno, levaria a um nível ineficiente de investimentos.

Para Rodrik (1997), o mecanismo que liga eficiência à desigualdade é um pouco distinto. Em

decorrência de uma grande desigualdade, há um grande dispêndio de recursos que são voltados

para rent seeking. Resumindo, para essa abordagem, desigualdade gera algum tipo de distúrbio

social e, por conseqüência, reduz os incentivos à inversão, gerando um menor crescimento

econômico.

II.4 – UMA VISÃO CRÍTICA DAS ABORDAGENS NEOCLÁSSICAS SOBRE DISTRIBUIÇÃO E CRESCIMENTO

Como foi visto ao longo dos itens anteriores deste capítulo, há diferentes estratégias de

abordagem do tema dentro da escola neoclássica, embora não sejam excludentes (cf. Bénabou,

1996). Não obstante busquem explicações bem diferentes para a existência de uma relação

negativa entre desigualdade e crescimento, tanto a corrente que enfatiza o papel das

imperfeições nos mercados de capitais, quanto a que enfatiza os aspectos políticos da

redistribuição possuem ao menos um importante ponto em comum, como se verá a seguir.

23

O suposto de mercados perfeitos e completos já não é mais, na teoria neoclássica, uma

hipótese indispensável para seu raciocínio. Trata-se mais de uma referência, na qual, na sua

existência, pode haver equilíbrio geral e, por conseqüência, eficiência de Pareto. No entanto, a

segunda hipótese básica da teoria neoclássica do crescimento (nível de produto determinado

por uma função de produção) em momento algum é descartada pelas distintas abordagens

analisadas neste capítulo. Com isso, permanece o suposto de que é a renda que determina os

gastos.

Nenhuma dessas correntes, pois, leva em consideração o princípio da demanda

efetiva30, segundo o qual são os gastos, e não a oferta, que determinam a renda nacional. Esse

aspecto fica claro na passagem a seguir:

S’il s’agit simplement de transférer du pouvoir d’achat des enterprises et des capitalistes vers les salariés, (...), pouquoi cela permettrait- il d’augmenter la demande globale, sauf à supposer que les enterprises et les capitalistes ne dépensaient leur pouvoir d’achat ni pour consommer ni pour investir ? Piketty (2001, pp. 114-15)31.

Daí, pode-se concluir a incapacidade de a moderna literatura sobre distribuição e

crescimento considerar os efeitos da desigualdade sobre a demanda. Não se trata com isso de

excluir a importância das contribuições dessas abordagens, mas de ressaltar que suas

conclusões valem mais como condicionantes da capacidade de oferta do que como

determinantes da renda nacional.

Vale destacar os efeitos do PDE sobre cada uma das abordagens em separado. Nessa

direção, primeiro será visto como fica a literatura de economia política da redistribuição nesse

caso. Kalecki (1977, pp.63-70) procura mostrar como diferentes formas de tributação podem

afetar a renda nacional. No caso de um imposto sobre a renda dos capitalistas, o autor admite

que seja gerado um desincentivo ao investimento, como prega a teoria mainstream. Entretanto,

ressalta Kalecki (1977, p. 68, grifo do autor)

Seria prematuro concluir que esse é o resultado final. Deve-se considerar que no primeiro período do novo regime de tributação o lucro bruto aumenta pelo mesmo montante dos 'novos impostos' totais. Assim, se os empresários esperam que os futuros retornos continuem a aumentar no mesmo montante, (...), isso seria suficiente para contrabalançar a influência depressiva do imposto de renda sobre a indução a investir.

30 Doravante, PDE. 31 “Se se trata simplesmente de transferir poder de compra das empresas e dos capitalistas para os assalariados, (...), por que isso permitiria um aumento da demanda global, salvo ao supor-se que as empresas e capitalistas não despendem seu poder de compra nem para consumir nem para investir?”.

24

Essa conclusão resulta do PDE, pois o aumento da tributação leva a um aumento dos

gastos do governo e não encontra redução de gastos em contrapartida, uma vez que o autor

assume uma certa inércia nos gastos capitalistas. O autor segue o raciocínio para os casos de

tributação sobre mercadorias e sobre o capital e mostra que a renda real permanece estável ou

se eleva, respectivamente. Assim, ao menos em uma determinada faixa de tributação, a

validade dos resultados obtidos pela “abordagem do eleitor mediano” não parece válida, em

virtude do PDE.

A conclusão principal da corrente de imperfeições nos mercados de capitais permanece,

considerando-se o PDE, de certo modo válida. Ou seja, a idéia de que uma maior desigualdade

leva a uma restrição de liquidez para alguns indivíduos, reduzindo assim as oportunidades de

investimento não é de modo algum incompatível com o PDE. Inclusive, essa noção já fora

formulada pelo próprio Kalecki (1937): trata-se do "princípio do risco crescente". Como

conclusão desse princípio, Kalecki (1937, p.443) afirma: “The ‘business democracy’ is a

fallacy: the own capital is a ‘factor of investment’.” Note-se, portanto, que é uma conclusão

muito próxima do que afirma a literatura recente.

Ainda com relação aos efeitos de uma redistribuição sobre a demanda, Murphy et al.

(1989) argumentam que, onde haja uma forte desigualdade, a industrialização pode ser

retardada em função de não haver mercados suficientes para a sua viabilização. Dessa forma,

uma redistribuição levaria não só ao crescimento, mas a uma mudança estrutural,

transformando uma economia baseada na agricultura para uma baseada na indústria 32.

Ao considerar que a renda é determinada pela oferta e, como gera, grosso modo,

resultados nos quais uma melhor distribuição levaria a uma economia mais produtiva, esses

modelos recentes são muito mais deterministas do que um modelo que assuma o princípio da

demanda efetiva. Ao considerar que os gastos determinam a renda, uma melhor distribuição,

ceteris paribus, leva a um maior crescimento33. No entanto, é possível que um país com pior

distribuição de renda tenha um crescimento maior do que um outro mais justo. Isso decorre do

fato de os gastos determinarem a renda e, nesse caso, a distribuição é um parâmetro

positivamente correlacionado com a renda.

O próximo capítulo aprofunda este debate, apresentando a teoria da distribuição da

renda de Kalecki e sua relação com o crescimento econômico.

32 Furtado (2000) tamb ém apresenta um argumento parecido a respeito do papel da distribuição da renda para o desenvolvimento econômico. 33 Essa afirmativa será justificada com rigor no próximo capítulo.

25

III – A TEORIA DA DISTRIBUIÇÃO DA RENDA DE KALECKI

Como foi visto no capítulo anterior, há algumas abordagens que partem da teoria

mainstream tradicional e, a partir do questionamento de suas premissas, desenvolvem teorias

distributivas alternativas àquela. Com a análise de Kalecki não é diferente. Há que se ressaltar,

todavia, que ao contrário das abordagens anteriores, Kalecki questiona as duas hipóteses

básicas apresentadas34.

Em primeiro lugar, cabe considerar qual a motivação do autor para estudar a

distribuição da renda. Para Kalecki, o estudo da economia deve centrar-se na sua dinâmica.

Conforme será visto a seguir, a distribuição da renda entre lucros e salários constitui um

importante parâmetro estrutural na determinação da trajetória dinâmica de uma economia

capitalista.

A distribuição da renda é, para Kalecki, um fenômeno essencialmente microeconômico,

que deve ser compreendido a partir do processo de formação de preços. Para tanto, Kalecki

(1977) parte das premissas ortodoxas e as critica para então compor a sua própria teoria da

distribuição da renda.

A primeira das críticas recai sobre as hipóteses de livre concorrência entre as empresas

e de custos marginais crescentes, que equivale à hipótese de rendimentos marginais

decrescentes. Para Kalecki (1977, p.82, 83),

... é perfeitamente justo supor que nas empresas industriais a curva dos custos marginais tem um relativamente longo segmento horizontal e somente começa a subir ao se aproximar da plena utilização dos recursos (...) [Aliado a isso,] As empresas, em geral, não atingem a plena utilização se ocupam no mercado uma posição monopolista (como os cartéis) ou quase monopolista (concorrência imperfeita). Daí porque temos comumente (...) a curva horizontal dos custos marginais, nos quais o preço é consideravelmente superior.

Com base nisso, Kalecki descarta a possibilidade de que a função de produção possa ter

a forma assumida pela teoria neoclássica35. Assim, a curva de custo marginal é, na sua maior

parte, constante e não crescente como assume a teoria ortodoxa. Ademais, baseando-se nas

teorias de concorrência imperfeita, o autor assume que as empresas possuem um certo poder de

34 Ver item II.1. 35 Na verdade, para a teoria kaleckiana, mesmo a existência de uma função de produção não é importante, uma vez que é a demanda que determina o nível de produto.

26

mercado e, portanto, não utilizam toda a capacidade instalada. Nesse sentido, Kalecki (1977, p.

84) afirma que “A razão entre os preços e os custos marginais (...) indica o quanto a situação se

afasta da concorrência perfeita, e por isso pode servir como medida do ‘grau de monopólio’”.

Desta crítica resulta a teoria kaleckiana da distribuição da renda. Para o autor, a

distribuição é determinada a partir do processo de formação de preços, visto que este deve

determinar o excedente unitário sobre os custos.

Na visão de Kalecki (1954), as mercadorias podem, no curto prazo, ter seus preços

formados por dois diferentes mecanismos, de acordo com as respectivas condições de oferta.

Em primeiro lugar, as matérias-primas têm uma curva de oferta inelástica. Pode-se dizer, em

geral, que tais produtos necessitam de um tempo razoável para terem sua oferta aumentada.

Além disso, tais mercadorias possuem um grau de homogeneidade muito maior do que no caso

dos produtos acabados. Um aumento na demanda, pois, não podendo ser acompanhado por um

aumento na produção, levará a uma queda de estoques e, conseqüentemente, a um aumento de

preços.36

Em segundo lugar, Kalecki argumenta que o modelo mais adequado para os demais

produtos dista da concorrência perfeita. Afinal, o que se observa na prática se aproxima mais

da concorrência imperfeita ou oligopólio. Uma vez que as firmas oligopolistas caracterizam-se

pela manutenção de capacidade ociosa, o que significa, oferta elástica, um aumento na

demanda por produtos acabados tende, na maior parte das vezes, a ser acompanhado por um

aumento de produção e não de preços. Kalecki (1954) assume que os custos com materiais e

salários são estáveis para a amplitude relevante da produção. Em outras palavras, trata-se da

mesma hipótese de custos marginais horizontais que Kalecki (1977) assume, em detrimento da

premissa ortodoxa de custos marginais crescentes. Com relação aos custos indiretos, o autor

supõe que sejam relativamente estáveis mesmo com variações de produção. Ademais, devido à

presença de incerteza forte, Kalecki (1954) assume que os empresários não conseguem

maximizar lucros, e desse modo, procuram manter um nível de mark up desejado sobre seus

custos.

Nesse caso, cada firma determina o seu preço por meio de uma adição aos seus custos

unitários de salários e de matéria-prima, de modo a cobrir as despesas gerais e obter lucros37.

Isto é feito mediante a determinação de um mark up, que, entrementes, depende também do

36 Este aumento de preços, como ressalta Kalecki (1954), pode ser intensificado devido a um aumento secundário na demanda, de caráter especulativo. 37Vale ressaltar que os preços das matérias-primas e insumos em geral, a eficiência técnica na sua utilização, os salários nominais e a produtividade média do trabalho são supostos dados (Possas, 1987, p.96).

27

grau de concorrência naquela indústria. Ou seja, ao decidir em que nível fixar seu preço, a

firma deve levar em consideração o preço que deseja cobrar e o preço cobrado em média na

indústria. Quanto maior o seu poder de mercado, mais próximo de preço desejado será o preço

efetivo. Possas (1987) expressa essa idéia da seguinte forma :

_

)1( ppp d θθ −+= (8),

onde p é o preço efetivo determinado pela firma, pd é o preço desejado, _

p é o preço médio da

indústria e θ é o parâmetro que representa o poder de mercado daquela firma 38. Porém, como

foi dito anteriormente, o preço é determinado por um mark up – k - em relação aos custos

diretos unitários - u. Isto é, a firma decide na verdade qual deve ser o seu mark up para então

definir o preço a ser cobrado. Uma vez que up

k = , temos então que:

up

kk d

_

)1( θθ −+= (9)

De fato, esta é a natureza da decisão que a empresa toma ao fixar seu preço: qual o mark up

sobre seus custos de matéria-prima e salários, com base no seu poder de mercado e no preço

médio da concorrência.

Tendo em vista que Kalecki identifica mark up com o grau de monopólio, vale

examinar quais são as principais causas de modificações no grau de monopólio e se elas se

adequam à equação de determinação do mark up proposta. São quatro as principais causas de

modificação no grau de monopólio que Kalecki (1954) identifica: em primeiro lugar, o autor

destaca a influência do processo de concentração da indústria. Neste cenário, as grandes

empresas têm um forte peso sobre a composição do preço médio e, portanto, suas decisões

afetam diretamente o nível do grau de monopólio da indústria. Essas firmas comportam-se

como líderes de preços e, portanto podem definir um θ elevado, pois sabem que serão

seguidas pelas demais. Com isso, o preço médio tende a se elevar e, por conseqüência, também

o grau de monopólio da indústria. Logo, quanto maior a concentração em uma determinada

indústria, maior tende a ser o seu mark up médio.

O aumento da concorrência por vias alternativas ao preço também tende a criar uma

tendência de aumento para o grau de monopólio, uma vez que a possibilidade de manutenção

38 Cabe lembrar que este é o poder de mercado que a firma imagina ter quando determina o seu preço. Nada, porém, assegura que esse seja o seu poder de mercado efetivo.

28

(ou até mesmo aumento) de mark up fica preservada nesse caso. Há dois outros fatores que o

autor considera ainda na mudança do grau de monopólio. Um deles é a influência das

modificações na relação entre custos indiretos e custos diretos. Um aumento nesta relação,

mantido o mark up, leva a uma redução necessária na margem de lucro. Nesse caso, Kalecki

argumenta que pode haver um acordo tácito entre os diversos produtores para assegurar a

manutenção da margem de lucro. Com isso, um aumento na relação custos indiretos/custos

diretos, mantida a margem de lucro, leva a uma inescapável ampliação do grau de monopólio.

Por fim, o poder de barganha dos sindicatos é um outro e importante fator na definição do grau

de monopolização. A idéia é simples, quanto maior for o mark up, mais poder terão os

trabalhadores para negociar aumentos de salários. Como salários participam no custo direto,

fica claro que um aumento daqueles leva a uma redução no mark up, ceteris paribus. É claro

que esse poder depende dos arranjos institucionais a que estão submetidas as relações entre

firmas e sindicatos.

Além dos salários, os custos diretos são compostos também pelos custos com matérias-

primas. Como os preços destas são ‘formados pela demanda’, suas variações tendem a ser

muito maiores do que as variações salariais. Os preços dos produtos finais, portanto, são mais

estáveis que os preços das matérias-primas, já que a estabilidade dos salários se contrapõe à

volatilidade daqueles.

Para que a teoria esteja consistente, falta ainda ligar a razão entre rendimentos e custos

diretos em uma indústria e a parcela relativa dos salários no valor agregado daquela indústria

(Kalecki, 1954, p.21). Conforme Possas (1987, p.97),

a relação entre custos de matérias-primas e de salários -, ao lado do mark up, determinam conjuntamente a participação da massa de salários no valor adicionado, e, portanto, a distribuição da renda, ao nível de cada indústria.

Visto que o valor agregado é o valor dos produtos menos os custos com matérias-primas,

temos, como em Kalecki (1954, p. 21), que:

Custos indiretos + lucros = ))(1( MWk +− (10),

onde k é o mark up, M o gasto total em matérias-primas e W o total de salários. Daí,

depreende-se que a participação relativa dos salários no valor adicionado de uma indústria é

)1)(1(11

))(1( jkMWkWW

w+−+

=+−+

= (11),

29

onde WM

j = é a relação entre custo de matérias-primas e custo salarial. Temos, então, que a

distribuição da renda é determinada pelos valores dos parâmetros k e j. Ambos afetam

negativamente a parcela dos salários no valor adicionado. A equação acima pode ser agregada

para um setor ou conjunto de indústrias verticalmente integrado, o qual é a unidade de análise

de Kalecki (Possas, 1987).

Com relação ao mark up, como já foi visto,

as características do processo competitivo de uma indústria, tanto as relacionadas com a concorrência intercapitalista quanto as relativas à barganha salarial, se refletem num certo nível de mark up sobre os custos diretos unitários (salários e matérias-primas) (Possas, 1987, p.96).

Logo, ao influenciarem na determinação do mark up, a concorrência intercapitalista e a

relação entre trabalhadores e empresários representam pontos cruciais na definição da

distribuição da renda.

No que concerne à relação entre custo de matérias-primas e custo salarial, Kalecki

(1954) argumenta que essa relação tende a variar com o nível de atividade econômica, já que

os preços das matérias-primas tendem a ser mais voláteis do que os salários. Assim, numa

depressão, j tende a cair, de modo a ampliar a parcela dos salários na renda, ao passo que k

tende a reduzir aquela parcela, em virtude da tendência de aumento na concentração industrial

durante um período de queda da atividade econômica.

Cabe notar, em primeiro lugar, que a teoria da distribuição de Kalecki está vinculada ao

processo de formação de preços, conforme ressaltam Atkinson (1975) e Possas (1987). Em

segundo lugar, ao utilizar o mark up na formação de preços, sua teoria fica mais abrangente,

podendo ser utilizada para as mais diversas indústrias, com diferentes estruturas de mercado.

Neste sentido, conclui Possas (1987, p. 98), o mark up “é, por assim dizer, uma ‘variável-

síntese’ das implicações da estrutura competitiva sobre o processo de apropriação de renda em

cada indústria”.

O processo de distribuição da renda, para Kalecki, é um fenômeno de ordem

microeconômica. Ainda assim, constitui-se num importante parâmetro para a determinação do

nível de produto. Para o autor, esse segundo processo tem como elemento essencial o princípio

da demanda efetiva, segundo o qual são os gastos que determinam a renda. Conforme aponta

Kriesler (1996), Kalecki procurava formular seu modelo de sorte que a distribuição da renda

fosse independente do nível de produto e que a determinação dos lucros totais fossem

independentes dos preços e da distribuição. Com base nisso, Kalecki (1977) rejeita a suposição

30

ortodoxa de produto dado, visto que esta se baseia nas premissas de determinação do produto

por uma função de produção baseada em capital e trabalho e de pleno emprego dos fatores de

produção, que, em conjunto, implicam na determinação de um produto de pleno emprego. Em

outras palavras, através do princípio da demanda efetiva, Kalecki rejeita a lei de Say, um

corolário das premissas assumidas pela teoria ortodoxa. Assim, como havia sido dito antes, a

teoria de Kalecki rejeita as hipóteses básicas da abordagem ortodoxa39.

Uma vez estabelecido o princípio da demanda efetiva, faz-se necessário explorá-lo de

modo a estabelecer uma alternativa à teoria mainstream. Kalecki (1977) propõe então um

modelo departamental baseado nas equações marxistas de reprodução para demonstrar que um

aumento global de salários não implica em uma redução dos lucros totais, como fazem crer o

senso comum e a teoria ortodoxa. Para tanto, Kalecki (1977, p.92) adota um modelo de três

setores verticalmente integrados, que produzem respectivamente bens de investimento, DI,

bens de consumo para os capitalistas, DII, e bens de consumo para os trabalhadores, DIII.

Embora não sejam cruciais ao argumento, adotam-se ainda as hipóteses simplificadoras de

abstração da poupança dos trabalhadores, e da ausência de governo e comércio externo40.

Conseqüentemente, a produção de cada setor, bem como a soma dos lucros e salários setoriais

representam o produto e a renda gerados no país41. Definindo P1, P2 e P3 como os lucros brutos

de cada departamento e W1, W2 e W3 como os respectivos salários, temos que P e W são os

respectivos lucros totais e salários totais. O consumo dos capitalistas é representado por Ck, o

consumo dos trabalhadores por Cw, o investimento bruto por I e a renda nacional bruta por Y:

Quadro 1 – Matriz Departamental

DI DII DIII Total

P1 P2 P3 P

W1 W2 W3 W

I Ck Cw Y

39 Vale notar que com base nessa rejeição às premissas ortodoxas, não é apenas a teoria da distribuição da renda de Kalecki que se opõe à sua similar neoclássica, mas sim toda a sua teoria opõe-se ao paradigma neoclássico. 40 No decorrer deste capítulo, o modelo de Kalecki (1954) será apresentado sempre nesta versão simplificada. 41 Note-se que em seu modelo, Kalecki adota uma curva de oferta totalmente elástica, o que garante que toda demanda será atendida e, portanto exclui qualquer possibilidade de dinâmica de curto prazo, tanto de preços quanto de estoques. Simonsen & Cysne (1989), inclusive, sustentam que tal hipótese constitui um “Calcanhar de Aquiles” da teoria kaleckiana.

31

Seguindo Kalecki (1977, pp 2-3), é fácil ver que os lucros do departamento produtor de

bens de consumo para os trabalhadores são iguais ao que os trabalhadores dos demais setores

recebem de salários, dada a hipótese de que os trabalhadores consomem tudo o que ganham:

213 WWP += . Somando P1 e P2 em ambos os lados, ocasiona então que:

2211321 WPWPPPP +++=++ (12),

o que significa que kCIP += . Ademais, dada a distribuição da renda nos três setores,

representadas respectivamente por:

wk CW

wCW

wI

Ww 3

32

21

1 ;; === (13),

o consumo dos trabalhadores pode ser representado por

3

21

1 wCwIw

C kw −

+= (14)

Daí, depreende-se que

3

21

1 wCwIw

CICCIY kkwk −

+++=++= (15)42

Pode-se dizer, portanto, que:

O que foi dito acima esclarece o papel dos ‘fatores de distribuição’, isto é os fatores que determinam a distribuição da renda (...) na teoria dos lucros. (...) Dessa forma, o consumo e o investimento dos capitalistas, em conjunto com os ‘fatores de distribuição’, determinam o consumo dos trabalhadores e, conseqüentemente, a produção e o emprego em escala nacional (Kalecki, 1954, p. 37).

Com base no que foi apresentado, é possível demonstrar que um aumento real

generalizado de salários não implica em uma redução nos lucros globais. Para tal, vale realizar

um pequeno exercício que comprova a proposição acima: seja um aumento real de salários

generalizado ∆W43. Supondo que não decorra tempo suficiente para que os capitalistas mudem

seus investimentos e consumo, como faz Kalecki (1977)44, haverá uma perda de lucros nos

42 Este modelo é generalizado para uma economia com governo, comércio externo e poupança dos trabalhadores no apêndice ao final deste capítulo. 43 Para que o aumento tenha sido real, é preciso que tenha havido perda de poder de barganha por parte dos capitalistas, sendo refletida num mark up menor. 44 Vale destacar a essencialidade dessa hipótese para os resultados do modelo de Kalecki.

32

departamentos I e II equivalente ao aumento dos salários (∆W1=-∆P1; ∆W2=-∆P2). No entanto,

visto que os salários são totalmente gastos em bens de consumo para trabalhadores, os lucros

no departamento III vão aumentar na exata magnitude em que os lucros nos demais setores irão

cair (∆P3 = ∆W1+∆W2). Ou seja, um aumento real de salários não implica numa redução de

lucros totais e, por conseguinte, gera um acréscimo nas despesas com bens de consumo para

trabalhadores, o que leva a um aumento na renda nacional bruta. Em suma, conforme Kalecki

(1942, p. 260):

However great the margin of profit on a unit of output, the capitalists cannot make more in total profits than they can consume and invest.

Este aparente paradoxo apresentado remete à abordagem de Keynes (1936) sobre a

relação entre poupança e investimento: maiores esforços por parte dos indivíduos para poupar

não aumentam a poupança agregada. Ao contrário, dado o investimento, essa maior vontade de

poupança apenas reduz o nível de consumo, levando à queda do produto45. Na verdade, o fato

de as análises de Keynes e Kalecki serem próximas não deve ser uma surpresa. Afinal, ambas

constituem apenas ângulos diferentes que partem de uma mesma premissa: o princípio da

demanda efetiva.

Voltando-se à relação entre distribuição de renda e nível do produto, é imprescindível

que se faça uma análise dinâmica a fim de determinar os efeitos daquela sobre o crescimento

econômico. Pode-se argumentar, por exemplo, que ao se assumir uma função do tipo

acelerador para o investimento, haverá um efeito positivo sobre o investimento, uma vez que as

produções em DI e DII mantiveram-se inalteradas e a produção em DIII cresceu. Daí, pelo

princípio de demanda efetiva, decorrido o prazo suficiente, a variação sobre o lucro será

positiva, estimulando ainda o consumo dos capitalistas, levando a economia a um período de

crescimento.

Para compreender melhor essa dinâmica, é preciso conhecer o que governa o

comportamento dos capitalistas no que concerne aos seus gastos. Em outras palavras, é preciso

saber o que determina as decisões de consumir por parte dos capitalistas e, sobretudo de

investir.

No que se refere ao consumo dos capitalistas em um determinado período, admite-se

que este consiste de uma parcela estável – A – e de uma parte proporcional aos lucros de um

período anterior, Pt-λ. Então,

45 Kalecki (1942, p.260n) já apontava para esta equivalência entre as abordagens.

33

AqPC ttk += −λ (16),

onde q<1 e λ representa uma pequena defasagem temporal. Mas como kCIP ++= , tem-se

que

AqPIP ttt ++= −λ (17)

É importante ressaltar que essa defasagem λ é importante para garantir o resultado

exposto acima, segundo o qual uma melhoria na distribuição de renda, ceteris paribus,

aumenta o nível da renda nacional. Isto ocorre porque “o investimento e o consumo dos

capitalistas, no curto período considerado, resultam de decisões tomadas no passado e devem,

portanto, ser considerados como dados” (Kalecki, 1977, p. 3). No caso do investimento, tal fato

decorre do período necessário para a construção do bem de capital. Já para o consumo dos

capitalistas, Kalecki (1977) argumenta que aqueles acompanham as variações nos lucros,

porém com algum atraso.

Apesar da mencionada importância da defasagem entre lucros e consumo capitalista,

em um modelo dinâmico, no qual o período de tempo relevante é o período de investimento,

tal defasagem pode ser ignorada, visto ser muito menor que a defasagem relativa ao

investimento. Desse modo, Kalecki (1954, p.42) propõe que os lucros sejam uma função do

investimento, com uma certa defasagem temporal:

qAI

P tt −

+= −

1ω (18)

Com base na equação acima, conclui-se que os lucros são determinados pelas decisões

passadas de investir (Kalecki, 1954).

Como a renda é composta de lucros mais salários, então,

3

21

11 wCwIw

qAI

Y ktt −

++

−+

= −ω (19)

Kalecki (1954, p.30) procura simplificar essa fórmula propondo que a parcela relativa a

salários e ordenados na renda bruta seja

YB

YV

+= α (20)

Desse modo, a equação acima passa a ser representada por:

34

)1)(1( αω

−−++

= −

qBAI

Y tt (21)

Como, no curto prazo, A é a parcela estável do consumo dos capitalistas e B é a parte estável

dos salários, as variações na renda bruta são determinadas apenas por variações no

investimento, dadas a propensão a consumir dos capitalistas e a distribuição de renda.

Baseado no que foi apresentado, a definição dos determinantes do investimento é,

portanto, crucial para o estudo da dinâmica capitalista. Kalecki propõe seu modelo de ciclo

econômico, cuja organização baseia-se na interação dos mecanismos de multiplicador e

acelerador, de forma análoga aos modelos "neo keynesianos" (Possas, 1987). Senão vejamos:

dt

Kc

tP

baSF tttt +

∆∆

−∆

∆+=+τ (22)

onde F é o investimento em capital fixo; τ é a defasagem média entre as encomendas e a

efetiva operação do investimento; S é a poupança, que procura refletir os lucros retidos das

empresas; Pt são os lucros no período t; Kt é o estoque de capital ao final do período t; e d

refere-se ao investimento autônomo, que não depende do nível corrente de atividade. Assim, o

investimento em capital fixo é função do nível de atividade (expresso por aSt ); das variações

desse nível (expresso por b∆Pt /∆t-c∆Kt /∆t) e de componentes autônomos relacionados,

sobretudo às inovações e mudanças estruturais. (Kalecki, 1954 e Possas, 1999). Como, por

definição, ∆Kt/∆t=Ft-δ, então46,

''

''

1

11

dt

PbS

ca

F

dt

PbS

ca

ccFF

dccFt

PbaSF

ttt

tt

ttt

ttt

+∆

∆+

+=

⇒+∆

∆+

+=

++

⇒++−∆

∆+=

+

++

θ

ττ δ

(23)

Em seguida, Kalecki (1954, p.101) introduz ao modelo de investimento acima

apresentado, uma relação inversa entre nível de atividade e investimento, do tipo

multiplicador:47

46 Note-se que b’=b/1+c, d’=(cδ+d)/1+c e que t+θ é uma espécie de média ponderada e, portanto, situa-se entre t e t+τ. 47 A defasagem λ entre lucros e consumo dos capitalistas será abstraída por ser pequena se comparada à defasagem θ entre encomenda e construção dos investimentos (Possas, 1987,p.148n).

)24(1

1t

Iqt

P tt

∆∆

−=

∆∆ −ω

35

Conforme visto, este multiplicador resulta da hipótese de consumo dos capitalistas já

apresentada.

O autor acrescenta ainda o investimento em estoques supondo-o proporcional ao nível

de produção, que, por sua vez, é função dos lucros (Possas, 1987, p.147 e 148):

Portanto, somando F e J e subtraindo a depreciação, chegamos à equação dinâmica

expressa em termos do investimento líquido:48

onde µ é função direta do multiplicador e g é função direta de d e inversa da depreciação (δ).

Conforme Possas (1987, p. 149), fazendo ∆t=θ=1 e ∆it = it-it-1, chega-se à seguinte equação a

diferenças finitas:

Por resultar numa equação a diferenças finitas de 2ª ordem, o modelo de Kalecki não

pode gerar endogenamente crescimento e ciclo de forma simultânea, como toda a família de

modelos “neo keynesianos”, conforme demonstrado por Pasinetti (1974). A ocorrência ou não

de flutuações vai depender dos valores dos parâmetros na solução homogênea49, ao passo que a

tendência é dada pela solução particular. Logo, visto que "a solução particular (tendência),

como dissemos antes [é] uma função crescente do componente autônomo d do investimento, e

portanto dos 'fatores de desenvolvimento'." (Possas, 1999, p.37), então fica claro que a

tendência de crescimento depende de fatores autônomos.

48 Vale lembrar que St=It . 49 Não convém aqui deter-se sobre quais valores determinam a forma do componente de "demanda efetiva" (cf. Possas, 1999, p. 39).

)25(1

1' t

PeJ t

t ∆∆

−=+ αθ

)26(1

gti

ic

ai t

tt +∆∆

++

=+ µθ

)27()1

( 12 giic

ai ttt =+

++− ++ µµ

36

Há, contudo, além da separação analítica acima demonstrada entre os componentes de

ciclo e de tendência, uma separação teórica. Esta se baseia em princípios de causalidade de

naturezas diferentes, um relacionado à demanda efetiva e o outro à mudança estrutural:

o componente associado à atuação da 'demanda efetiva', isto é, do comportamento do nível corrente de atividade, [é] capaz de produzir (...) flutuações; e o componente associado à mudança estrutural, derivado da atuação da atuação dos 'fatores de desenvolvimento' (...) produzem trajetória potencialmente instáveis do ponto de vista estrutural... (Possas, 1999, p.39)

Tendo em vista a premissa metodológica central que permeia a teoria da dinâmica

econômica de Kalecki de estrutura econômica estável, fica claro que o modelo do autor não

pode gerar endogenamente ciclo e crescimento, uma vez que este é resultado de mudanças

estruturais, que, por hipótese, não ocorrem no modelo (Possas, 1999).

Nesse sentido, o componente dinâmico de tendência deve mesmo ser explicado por

fatores autônomos, que não são afetados pelo nível corrente de atividade, e portanto, exógenos

ao modelo, posto que esses fatores são responsáveis por mudanças na estrutura econômica.

Note-se, porém, que os "fatores de desenvolvimento" são e devem ser exógenos ao modelo,

embora sejam inerentes à economia capitalista.

De acordo com o modelo de Kalecki, portanto, uma melhor distribuição da renda

acarretaria em um deslocamento da tendência para um patamar mais alto, o que significa um

nível maior de produto. Este mecanismo, contudo, só funciona se houver capacidade ociosa.

Caso a economia já esteja em pleno emprego, ocorrerá aumento de preços, ao invés de

expansão da produção. Nesse caso, a redistribuição perderia seu efeito, visto que a inflação

reduziria o salário real dos trabalhadores.

Caso o modelo permitisse alterações endógenas na distribuição da renda, o componente

de tendência do modelo de Kalecki (1954) sofreria alterações de patamar endógenas. Assim,

uma contínua melhoria da distribuição da renda em prol dos trabalhadores levaria a um período

de crescimento econômico até que se chegasse ao teto do pleno emprego 50.

Do modelo de Kalecki, pode-se concluir que uma melhoria na distribuição da renda

pode gerar um aumento na renda nacional. Mesmo que os trabalhadores não gastem toda a sua

50 Note-se que o raciocínio leva em consideração mudanças endógenas apenas na distribuição da renda, sem considerar progresso técnico, que efetivamente é capaz de gerar uma trajetória de crescimento do próprio componente de tendência.

37

renda, o modelo ainda se aplica, porém com um efeito multiplicador menor, conforme pode ser

verificado no apêndice.

38

APÊNDICE DO CAPÍTULO III:

Modelo com poupança dos trabalhadores, governo e comércio externo:

)1)(1()](1[)](1[)](1[)](1[

)1()1()1()1()1)(1(

)1()1()()1()1()1(

)(

;;;;;;;

;)(

3

35343231

353432313

54321

54321

55

44

33

22

11

wmXwwGwwCwwIww

Y

XwwGwwCwwIwwYwm

XwGwXGCIMYwCwIwYm

XGXwGwCwCwIwCImYYXGWCIMY

XW

wG

Ww

CW

wCW

wI

WwmYMWC

comWPMXGCCIY

k

k

kk

wkkk

wkw

wk

ααααα

ααααααααα

ααααα

αα

α

−+−++−++−++−+

=

⇒−++−++−++−+=−+

⇒++++−−−−+++++=+

⇒++++++++=+⇒++++=+

=======

+=−++++=

39

IV – UM BREVE HISTÓRICO DO DESEMPENHO ECONÔMICO BRASILEIRO NA DÉCADA DE 90

Ao longo da década de 90, o país passou por diversas e importantes mudanças. A

inflação foi reduzida para um dígito, a produtividade do trabalho na indústria cresceu

significativamente, houve um intenso crescimento do agro-negócio e educação e saúde

apresentaram avanços significativos em alguns indicadores. Além disso, houve uma a ampla

abertura econômica e a reforma do Estado, representada sobretudo pelo programa de

privatizações, promovidas no início da década. Foi, em parte, devido a essas reformas

estruturais que foi possível garantir o controle da inflação e o aumento da produtividade (cf.

Pinheiro et al., 1999). Há que se destacar, entretanto, que o crescimento econômico nesse

mesmo período foi pífio, a desigualdade social permaneceu gritante, as dívidas interna e

externa explodiram e a vulnerabilidade externa, decorrente da deterioração das transações

correntes, tornou o país extremamente sensível aos humores dos ‘mercados’.

Tendo em vista que o intuito deste capítulo é fornecer uma justificativa para o objetivo

dessa dissertação, é importante destacar que o histórico aqui desenhado deverá pautar-se

sobretudo nos aspectos distributivos e de crescimento observados ao longo da década. Com

isso, não se pretende negar a importância dos demais aspectos, mas apenas focar naquilo que

mais diz respeito ao conteúdo desta dissertação, já que uma análise do desempenho econômico

em uma década pode abarcar diversos temas diferentes51. De todo modo, crescimento e

distribuição não são fenômenos estanques, sem alguma origem e conseqüências à frente. Sendo

assim, ao buscar compreender o porquê dos resultados insatisfatórios com aqueles fenômenos,

estar-se-á sem dúvida abordando outros temas relevantes para uma análise mais detalhada da

década.

IV.1 – A DISTRIBUIÇÃO DE RENDA NA DÉCADA DE 90

Conforme ressalta Hoffmann (2002), a elevada desigualdade na distribuição de renda

brasileira não é um fenômeno recente. Para compreendê- la é necessário lembrar que desde os

tempos coloniais a posse da terra é extremamente concentrada e que toda a economia do país

foi por muito tempo baseada na agricultura movida pela força de trabalho escrava 52. Ademais,

lembra Furtado (1967, p. 149), ao falar das conseqüências da abolição, que “praticamente em

51 Para uma análise mais completa da economia brasileira na década de 90, ver Giambiagi & Moreira (1999). 52 Ainda hoje, a posse da terra é extremamente concentrada, como mostram Sant’Anna e Young (2000).

40

nenhuma parte houve modificações de real significação na forma de organização da produção e

mesmo na distribuição de renda”.

Pode-se constatar, portanto, que, na sua formação, a ampla desigualdade já constituía

uma característica marcante do país. Essa triste marca, no entanto, não foi ainda apagada da

sociedade brasileira. Ao longo de tantos anos, o Brasil ainda é uma referência negativa em todo

o mundo nos indicadores de concentração de renda. Nesse sentido, a desigualdade apresenta,

nas palavras de Barros, Henriques e Mendonça (2000), uma estabilidade inaceitável, como

pode ser verificada no quadro 1:

Ano Coeficiente de Gini1977 0,621978 0,601979 0,601980 0,591981 0,591982 0,591983 0,601984 0,591985 0,601986 0,591987 0,601988 0,621989 0,641990 0,621991 0,601992 0,581993 0,601994 0,601995 0,601996 0,601997 0,601998 0,601999 0,60

Fonte: http://fgvdados.fgv.br

Quadro 2 - Desigualdade de Renda

Note-se, de acordo com o quadro acima que, ao longo da década de 90, a distribuição

pessoal da renda permaneceu praticamente inalterada e em um patamar altamente concentrado.

Ainda assim, nada assegura que a repartição da renda não tenha piorado durante o período.

Afinal, conforme assevera Castro (1991, p. 9, grifo do autor):

As informações individualmente colhidas mediante esse tipo de levantamento [PNAD] (...) não cobrem determinados tipos de renda, como, por exemplo, os lucros retidos pelas empresas. (...) Donde se infere, de saída, que esse tipo de levantamento não se presta ao estudo da repartição dita funcional da renda (...), [pois] os inquéritos domiciliares não captam um montante de renda que pode situar-se entre 40% e 50% da renda aferida pelas Contas Nacionais.

41

...[Assim, é] bastante plausível que a desigualdade efetivamente existente na economia seria ainda maior do que a registrada.

Em consonância com a suposição acima, embora a distribuição pessoal da renda não

tenha se alterado ao longo da década, a distribuição funcional da renda sofreu uma grande

deterioração no mesmo período. Com isso, é possível que a desigualdade tenha efetivamente

recrudescido no Brasil, durante a década de 90.

Além do problema prático relativo à mensuração da distribuição pessoal, há um outro

problema de ordem teórica:

...nunca será demais repetir que não existe – e é pouco provável que venha a existir – uma teoria da distribuição pessoal da renda (Malan, 1978, p.259-260).

Nesse sentido, Ramos e Reis (1991) argumentam que não se dispõe de um leque de

teorias que possam oferecer um entendimento amplo do processo de distribuição pessoal. O

máximo que se consegue é uma explicação apenas parcial do fenômeno. Decerto, não é de se

estranhar a dificuldade teórica em tratar do assunto. Muitas são as variáveis que influenciam o

comportamento distributivo. Em termos gerais, pode-se dizer que a distribuição pessoal da

renda depende da sua distribuição funcional, da distribuição da riqueza, das decisões de

investimento tomadas ao longo da vida e das políticas de transferências e fiscal adotadas pelo

governo 53 (Atkinson e Bourguignon, 2000; Ramos e Reis, 1991).

Diante das dificuldades mencionadas com relação à distribuição pessoal da renda e, em

consonância com a teoria e a metodologia a serem adotadas, a análise, neste capítulo, será

centrada, sobretudo, na distribuição funcional da renda, grosso modo, entre excedente

operacional bruto e remunerações ao trabalho 54,55.

Desse modo, no que concerne à repartição do valor adicionado entre remuneração dos

empregados, rendimento de autônomos, impostos e excedente operacional bruto, essa década

mostrou-se perversa. A parcela da renda apropriada por remuneração dos empregados e

rendimento de autônomos caiu de 52%, em 1990, para 42% do PIB em 1999. O excedente

operacional bruto, em contrapartida, passou de 33% para 41% do PIB nesse mesmo período,

conforme podemos observar no gráfico de composição do PIB a seguir (IBGE, 2002, p. 19):

53 Para uma abordagem sobre as relações entre distribuição pessoal e funcional da renda, ver Atkinson (1974), Bertola (2000) e Piketty (2001). 54 Ressalte-se que o excedente operacional bruto comporta lucros, dividendos, alugúeis, juros e rendimentos de capital. 55 Daqui avante, ao se falar em distribuição de renda, refere -se à distribuição funcional da renda.

42

GRÁFICO 1

45%

33%

7%

15%

42%

38%

7%

13%

44%

38%

6%

12%

45%

35%

6%

13%

40%38%

6%

16%

38%40%

6%

16%

39%

41%

6%

15%

37%

43%

6%

14%

38%

42%

6%

14%

38%

41%

6%

16%

38%

41%

5%

16%

37%

41%

5%

17%

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

40%

45%

50%

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001

Composição do PIB 1990 - 2001

Remuneração dos empregados Excedente Operacional Bruto

Rendimento de Autônomos Impostos Líquidos de subsídios sobre a produção e importação

Fonte: IBGE

Em razão do aumento da concentração na renda acima verificado, é preciso buscar

compreender as causas desse movimento. Com base no que foi visto no capítulo III, a

estratégia é estudar o processo de formação de preços, uma vez que é através deste que é

determinada a distribuição da renda. Quanto maior for o mark up médio de um setor e,

portanto, maior a concentração industrial, menor será a parcela dos salários no valor

adicionado. Um outro fator que influencia na determinação da distribuição de renda entre

lucros e salários é a relação custos de matérias-primas/salários56.

Kalecki (1954) identifica, a partir da sua teoria de formação de preços, uma relação

entre poder de monopólio, medido pelo mark up, e distribuição de renda. Com base nessa

abordagem teórica, é de se esperar que a concentração industrial tenha aumentado na década de

90, uma vez verificada a elevação da desigualdade de renda. A fim de investigar os efeitos do

mark up sobre a distribuição de renda, calculou-se, a exemplo de Considera (1981), os mark

ups setoriais e as relações custo de matérias-primas/salários também para cada setor. Esses

56 Lembrando que a parcela dos salários na renda é definida por

)1)(1(11

))(1( jkMWkWW

w+−+

=+−+

= , onde k é o mark up e j a relação custos de matérias-

primas/salários.

43

cálculos foram realizados a partir dos dados das matrizes insumo-produto. Contudo, lembra

Considera (1981, p. 640) que,

Uma restrição óbvia ao trabalho será o nível de agregação da análise, por tomar a indústria como um todo. É este, entretanto, um passo necessário, se se deseja ter uma visão macroeconômica do impacto do processo oligopolista de fixação e variação de preços.

Desse modo, embora uma análise ao nível das firmas não seja possível, observar o mark

up médio dos setores e sua variação ao longo do tempo nos fornece uma possibilidade de

compreensão da relação entre concentração industrial e concentração de renda. A metodologia

utilizada segue a proposta por Considera (1981) 57: o mark up é determinado pelo quociente

entre o valor da produção setorial e a soma dos seus respectivos consumo intermediário,

remunerações dos empregados e rendimentos de autônomos58, conforme a seguir:

57 Pereira & Carvalho (1998) e Miranda (2002) também seguem metodologia similar para o cálculo dos mark ups setoriais. 58 A rigor, o mark up apresentado deve ser interpretado como resultado ex post para os mercados flex prices. Em verdade, essa interpretação também deve valer para os demais setores, uma vez que significa o nível de mark up efetivamente adotado e não o desejado, que é o relevante no processo de formação de preços.

44

1990 1 9 9 1 1 9 9 2 1 9 9 3 1994 1995 1996 1997 1998 1 9 9 9 2 0 0 0A G R O P E C U Á R I A 1,85 1,88 1,79 1,77 2,07 2,13 2 , 0 5 2,06 2,09 1,93 1,88E X T R A T I V A M I N E R A L 1,28 1,47 1,51 1,36 1,38 1,36 1 , 3 0 1,31 1,28 1,44 1,31E X T R A Ç Ã O D E P E T R Ó L E O E G Á S 2,47 2,33 2,16 2,02 1,93 1,87 2 , 1 6 2,10 1,40 2,44 3,49M I N E R A I S N Ã O - M E T Á L I C O S 1,35 1,44 1,41 1,43 1,51 1,49 1 , 3 9 1,44 1,46 1,35 1,34S I D E R U R G I A 1,18 1,21 1,25 1,28 1,26 1,27 1 , 2 4 1,26 1,23 1,26 1,30M E T A L U R G I A D O S N Ã O - F E R R O S O S 1,25 1,28 1,26 1,24 1,35 1,35 1 , 2 9 1,29 1,21 1,24 1,25O U T R O S P R O D U T O S M E T A L Ú R G I C O S 1,11 1,15 1,15 1,18 1,24 1,21 1 , 1 7 1,17 1,15 1,12 1,12M Á Q U I N A S E T R A T O R E S 1,35 1,37 1,48 1,71 1,61 1,58 1 , 5 8 1,64 1,59 1,66 1,73M A T E R I A L E L É T R I C O 1,24 1,26 1,33 1,28 1,27 1,28 1 , 2 3 1,22 1,19 1,16 1,16M A T E R I A L E L E T R Ô N I C O 1,39 1,41 1,40 1,44 1,49 1,51 1 , 4 9 1,49 1,61 1,48 1,52A U T O M Ó V E I S , C A M I N H Õ E S E Ô N I B U S 1,17 1,23 1,22 1,25 1,28 1,31 1 , 2 9 1,33 1,28 1,26 1,25O U T R O S V E Í C U L O S , P E Ç A S E A C E S S Ó R I O S 1,19 1,18 1,22 1,25 1,27 1,26 1 , 2 1 1,21 1,17 1,14 1,20M A D E I R A E M O B I L I Á R I O 1,20 1,27 1,23 1,28 1,31 1,29 1 , 2 3 1,25 1,20 1,23 1,19P A P E L E G R Á F I C A 1,14 1,23 1,17 1,11 1,14 1,22 1 , 1 7 1,15 1,11 1,18 1,30I N D Ú S T R I A D A B O R R A C H A 1,27 1,28 1,30 1,32 1,32 1,34 1 , 3 3 1,32 1,29 1,33 1,35E L E M E N T O S Q U Í M I C O S 1,32 1,38 1,42 1,70 1,61 1,56 1 , 4 9 1,58 1,47 1,63 1,70R E F I N O D E P E T R Ó L E O E I N D Ú S T R I A P E T R O Q U Í M I C A 1,34 1,29 1,46 1,81 1,65 1,57 1 , 4 4 1,50 1,69 1,50 1,32Q U Í M I C O S D I V E R S O S 1,28 1,30 1,26 1,28 1,26 1,24 1 , 2 6 1,24 1,23 1,29 1,22F A R M A C Ê U T I C O S E D E P E R F U M A R I A 1,38 1,27 1,44 1,53 1,51 1,46 1 , 4 3 1,53 1,56 1,50 1,42M A T E R I A L P L Á S T I C O 1,39 1,36 1,32 1,40 1,37 1,42 1 , 3 9 1,37 1,33 1,19 1,17I N D Ú S T R I A T Ê X T I L 1,31 1,25 1,25 1,28 1,25 1,27 1 , 2 6 1,24 1,21 1,17 1,14A R T I G O S D O V E S T U Á R I O E A C E S S Ó R I O S 1,11 1,05 1,09 1,06 1,08 1,06 1 , 0 7 1,06 1,08 1,10 1,13C A L Ç A D O S E D E A R T I G O S D E C O U R O E P E L E S 1,10 1,14 1,27 1,26 1,21 1,21 1 , 2 0 1,19 1,17 1,20 1,22I N D Ú S T R I A D O C A F É 1,15 1,18 1,13 1,25 1,25 1,26 1 , 2 1 1,17 1,21 1,28 1,27B E N E F I C I A M E N T O D E P R O D U T O S D E O R I G E M V E G E T A L 1,20 1,27 1,31 1,30 1,26 1,21 1 , 2 0 1,23 1,21 1,24 1,19A B A T E E P R E P A R A Ç Ã O D E C A R N E S 1,11 1,11 1,10 1,15 1,15 1,17 1 , 1 8 1,14 1,12 1,13 1,11I N D Ú S T R I A D E L A T I C Í N I O S 1,15 1,14 1,14 1,15 1,15 1,19 1 , 2 2 1,23 1,27 1,20 1,19I N D Ú S T R I A D O A Ç Ú C A R 1,17 1,16 1,13 1,18 1,17 1,13 1 , 0 9 1,09 1,10 1,11 1,28F A B R I C A Ç Ã O D E Ó L E O S V E G E T A I S 1,14 1,18 1,27 1,18 1,18 1,15 1 , 1 4 1,20 1,27 1,24 1,16O U T R A S I N D Ú S T R I A S A L I M E N T A R E S E D E B E B I D A S 1,15 1,18 1,22 1,23 1,22 1,23 1 , 2 1 1,24 1,23 1,24 1,21I N D Ú S T R I A S D I V E R S A S 1,46 1,45 1,44 1,50 1,55 1,46 1 , 4 0 1,39 1,35 1,35 1,41S E R V I Ç O S I N D U S T R I A I S D E U T I L I D A D E P Ú B L I C A 1,28 1,25 1,25 1,21 1,28 1,37 1 , 4 3 1,40 1,52 1,53 1,60C O N S T R U Ç Ã O C I V I L 1,39 1,42 1,51 1,59 1,75 1,86 1 , 9 4 1,97 1,96 1,90 1,86C O M É R C I O 1,31 1,27 1,23 1,22 1,32 1,30 1 , 2 0 1,18 1,12 1,13 1,15T R A N S P O R T E 1,15 1,16 1,17 1,16 1,19 1,21 1 , 1 2 1,15 1,10 1,10 1,10C O M U N I C A Ç Õ E S 1,65 1,52 1,77 1,85 1,76 2,19 2 , 2 4 2,30 2,13 1,75 1,81I N S T I T U I Ç Õ E S F I N A N C E I R A S 2,30 1,88 2,52 2,74 1,98 1,44 1 , 3 0 1,32 1,36 1,34 1,30S E R V I Ç O S P R E S T A D O S À S F A M Í L I A S 1,09 1,13 1,14 1,19 1,18 1,24 1 , 2 5 1,22 1,13 1,12 1,11S E R V I Ç O S P R E S T A D O S À S E M P R E S A S 1,39 1,57 1,47 1,57 1,42 1,33 1 , 4 1 1,40 1,33 1,28 1,30A L U G U E L D E I M Ó V E I S 6,68 14,67 11,54 8,34 8,32 12,61 16,81 18,67 17,72 16,27 14 ,30A D M I N I S T R A Ç Ã O P Ú B L I C A 1,01 1,01 1,01 1,01 1,01 1,01 1 , 0 1 1,01 1,01 1,01 1,01S E R V I Ç O S P R I V A D O S N Ã O - M E R C A N T I S 1,03 1,02 1,04 1,02 1,05 1,01 1 , 0 2 1,03 1,01 1,01 1,01T O T A L D A A T I V I D A D E 1,21 1,27 1,24 1,23 1,30 1,35 1 , 3 6 1,38 1,36 1,35 1,34Fon te : e laboração p róp r ia , a pa r t i r de dados do IBGE

Tabe la 1 - M a r k u p p o r S e t o r

45

De acordo com a tabela 1, é possível constatar que de fato houve uma elevação do mark

up médio ao longo do período, ainda que com leve reversão nos últimos anos, que se refletiu

em uma piora na distribuição da renda59. Não obstante as diferenças acima pareçam pequenas,

deve-se levar em conta que uma mudança de 1,21 para 1,34 no mark up médio da economia

significa um acréscimo de 11% em dez anos. Para se ter uma dimensão do quanto essa

alteração impacta a distribuição da renda, basta notar que a parcela de valor adicionado

apropriada por remunerações e rendimentos de autônomos passaria de 49,6% em 1996 para

62,8%60 com o mark up de 1990 aplicado àquele ano 61. Assim, parece ter havido, ao longo da

década de 90, um movimento de concentração generalizada da indústria, com especial força

nas atividades aluguéis de imóveis, construção civil, comunicações, fabricação de máquinas e

tratores e elementos químicos.

Siffert Filho e Silva (1999) mostram que houve um grande movimento de fusões e

aquisições ao longo da década, em consonância com a aparente concentração verificada

anteriormente. Desde logo, faz-se necessário entender quais são os principais fatores

responsáveis por esse processo de concentração.

Nesta linha, argumentam Siffert Filho e Silva (1999, p. 406), que “a privatização foi o

ponto de partida de movimentos de reestruturação societária e produtiva em vários setores”.

Após o processo de privatização, em especial na siderurgia e na petroquímica, houve

subseqüentes movimentos de fusões e aquisições. Outro fator que deve ser destacado com

especial relevância para esse processo de concentração foi a abertura econômica iniciada no

princípio da década.

Com a abertura, as empresas brasileiras ficaram expostas à competição de produtos

importados de melhor qualidade e preços competitivos. A estratégia decorrente, pois, era

modernizar ou agonizar. Neste cenário, ganhos de escala tornaram-se necessários para poder

enfrentar a competição, modernizando a produção. Desse modo, as empresas que sobreviveram

apresentaram altos ganhos de produtividade e tornaram-se mais competitivas (Moreira, 1999).

Por essa forma, a abertura econômica propiciou um aumento do ambiente competitivo,

que obteve como resposta das empresas nacionais uma busca por economias de escala com

59 Vale lembrar que a análise do mark up é mais importante no caso da indústria de transformação. 60 Na verdade, esses valores dizem respeito não à distribuição da renda, mas à distribuição do valor adicionado a preços básicos e, por isso, apresentam valores díspares daqueles apresentados no gráfico. 61 Note-se que essa conta considera o valor de j fixo, variando apenas o mark up.

46

vistas a viabilizar novos investimentos e ganhos de produtividade. Uma das estratégias para

esse ganho de escala foram as fusões e aquisições, inclusive nos setores que antes eram

controlados pelo poder estatal. Portanto, as empresas que sobreviveram ao choque de

competitividade imposto pela liberalização comercial foram aquelas que tiveram agilidade e

capital para se adaptar às novas necessidades. Dessa maneira, pode-se dizer que a criação de

um ambiente mais competitivo levou a uma tendência de concentração oligopolista na indústria

brasileira, na medida em que um menor número de empresas sobreviveu e aumentou suas

participações no mercado. Vale notar que tal aparente paradoxo torna-se um fenômeno

compreensível, já que as empresas viram-se sob pressão permanente, interna e externa devido à

abertura (Possas, 1996). Como resposta à essa pressão, as firmas precisaram se reorganizar e

aumentar suas escalas de produção a fim de poder concorrer com os produtos importados, além

da eliminação dos menos aptos a competir, o que afetou a concentração industrial.

Essa pressão competitiva a que foram submetidas as empresas, entretanto, não parece

ter sido capaz de reduzir o poder de formação de preços das empresas nacionais, já que o mark

up continuou a subir62. Desse modo, pode-se concluir que a abertura econômica, embora tenha

trazido benefícios para os consumidores e para a eficiência produtiva da economia, não logrou

êxito no que diz respeito à distribuição de renda. Há que se ressaltar que os próprios ganhos de

produtividade têm responsabilidade direta sobre a deterioração distributiva. Afinal, em uma

economia com pouco crescimento, como foi a brasileira na década passada e com altos ganhos

de produtividade, a tendência é a geração um grande número de desempregados, reduzindo,

pois, a massa de salários paga aos trabalhadores. Ademais, se aqueles ganhos não forem

repassados aos trabalhadores, isto significa um aumento do mark up63, e, portanto, a parcela

dos lucros na renda tende a aumentar ainda mais.

Logo, como foi visto, a distribuição funcional da renda na década de noventa

deteriorou-se de forma acentuada. De acordo com uma análise dos mark ups de cada setor,

pode-se concluir que o poder de formação de preços da maior parte das atividades cresceu ao

longo do período 1990-1996, o que ocasionou uma piora na distribuição de renda, já que a

relação custos de matérias-primas/salários caiu na média durante o mesmo período. Após uma

breve investigação, parece ser possível afirmar que o aumento dos mark ups decorre de um

62 Miranda (2002) procura analisar quais fatores teriam influenciado com mais força esse movimento. Dentre esses fatores, os que parecem, segundo Miranda (2002) terem exercido maior influência sobre a determinação do mark up foram a taxa real de câmbio e o coeficiente de penetração das importações. 63 Para entender melhor essa relação, ver capítulo III e Kalecki (1954).

47

aumento na concentração industrial, que surgiu como uma resposta ao processo de abertura

econômica, cujo efeito foi gerar um ambiente econômico mais competitivo.

Conforme será visto a seguir, não foi só no que concerne aos aspectos distributivos que

o desempenho econômico brasileiro na década de noventa fracassou. O crescimento econômico

daquele período também foi desanimador. Nesse sentido, assim como a piora do padrão

distributivo, em certa medida, o baixo crescimento registrado na década também foi

influenciado pela abertura econômica.

IV.2 – O CRESCIMENTO ECONÔMICO NA DÉCADA

Além da piora na distribuição de renda, o baixo crescimento econômico também

marcou a década de 90. Assim como no período anterior, conhecido como ‘a década perdida’,

o crescimento na década de 90 foi pífio (2,9% a.a em 1980-89 e 1,7% a.a em 1990-99, segundo

Pinheiro et al.,1999)64.

Conquanto não se pretenda realizar uma pesquisa detalhada sobre as causas desse

péssimo desempenho, almeja-se identificar de forma extensiva os seus principais motivos. Por

conseguinte, de acordo com as teorias que partem do princípio da demanda efetiva, a primeira

pista é analisar o comportamento dos componentes da demanda nesse período.

A taxa de investimento média dos anos 90 foi particularmente baixa: 15% do PIB em

média a preços constantes de 1980. Se comparada à taxa média dos anos 80, 18,6% sob o

mesmo critério, percebe-se o baixo padrão de investimento durante a década passada. A preços

correntes, que medem o gasto efetivo, a diferença entre as décadas também é grande: 22,2%

para a década de 80 e 19,6% na década de 90. Também, as exportações apresentaram

crescimento moderado: 4,5% a.a. contra 8,5% a.a. entre 1980 e 1989. Perante este quadro, cabe

buscar compreender os fatores que criaram essas dificuldades para o crescimento da demanda.

Há que se levar em consideração que o grande objetivo macroeconômico da década foi

o controle da inflação. Deve-se ressaltar que, durante a primeira metade da década, o ambiente

de crise interna por que passava o país criou um clima de instabilidade, dentro do qual

investimento e consumo tendem naturalmente a cair. Foi justamente nesse período que as taxas

de crescimento foram as mais baixas65.

64 No que concerne à renda per capita, durante a década de 90, o crescimento foi de 1,3% a.a., ao passo que na década anterior aquela caiu 0,5% a.a., segundo Giambiagi (2002). 65 Ver tabela 3.

48

Após o Plano Real e o sucesso na derrubada da alta inflação, a sua manutenção em

níveis baixos passou a ser o objetivo primeiro da política econômica. Para isso, num primeiro

momento, foi utilizada uma âncora cambial:

... com valorização cambial, abertura comercial e volume significativo de reservas, criou-se uma camisa de força para os preços internos, podendo-se dizer o Brasil adotou neste período uma espécie de superâncora cambial (Gremaud et al., 1999, p. 290).

Logo após a queda da inflação, houve um momento de aquecimento da demanda, em

virtude do aumento de poder de compra das classes de baixa renda. Esse aumento levou a uma

pressão na balança comercial, decorrente do crescimento das importações a fim de cobrir tal

aquecimento da demanda.

Tradicionalmente, o controle da demanda interna é identificado como uma importante

forma de combate ao aumento do nível de preços. Então, após o período de aquecimento da

economia decorrente da queda da inflação, a política econômica, ainda voltada para o controle

inflacionário, passou a adotar uma âncora monetária, com juros reais elevadíssimos. Segundo

Pinheiro et al. (1999),

A mencionada conjugação da apreciação do câmbio no início do plano [Real] com a abertura acarretou, por um lado, drástica redução da inflação mas, por outro, esteve associada à deterioração expressiva das contas internas do país (...) (p. 24). Mas, com o tempo, essa política passou a ser comandada pela necessidade de remunerar adequadamente os capitais a que o país recorreu para financiar o deficit em conta corrente e rolar as amortizações da dívida externa. Com isso, os juros foram mantidos altos para compensar a deterioração do risco-país e, desde 1997, a expectativa de desvalorização gradual da taxa de câmbio (p. 19).

Esta política de juros altos, entretanto, levou a um aumento exponencial da dívida

pública interna, como pode ser comprovado em Gremaud et al. (1999, p. 295):

Fonte: Gremaud et al. (1999)

Gráfico 2 - DÍVIDA MOBILIÁRIA INTERNA FEDERAL

4988

61782

108486

176211

255509 279.002

0

50000

100000

150000

200000

250000

300000

1993 1994 1995 1996 1997 1998

R$

Milh

ões

49

O resultado desse crescimento da dívida gerou ainda mais incerteza a respeito da

capacidade de pagamento do governo o que, por seu turno, voltou a pressionar o câmbio e

requerer a manutenção dos altos juros. Esse ambiente de instabilidade, sobretudo com relação à

fragilidade externa, dificultou em muito o alcance de um novo padrão sustentável de

crescimento econômico.

Aliado à alta da produtividade já referida na década, o baixo dinamismo da economia

brasileira impulsionou um aumento substancial da taxa de desemprego, sobretudo no final da

década, como pode-se observar na tabela a seguir:

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Taxa de Desemprego (%) 4,3 4,8 5,8 5,3 5,1 4,6 5,4 5,7 7,6Fonte: Pinheiro et al. (1999, p. 39)

Tabela 2 - Taxa de Desemprego

De acordo com Young e Pereira (2000), o desempenho macroeconômico brasileiro na

década de 90 seguiu uma padrão histórico, segundo o qual alternam-se problemas relacionados

à estabilidade interna (e.g. a inflação da década de 80 e início de 90), ou à vulnerabilidade

externa, como no início da década de 80 e segunda metade da década de 90.

A tabela 3 sistematiza o conjunto das informações enfocadas nesta seção:

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

Crescimento do PIB (%) -4,3 1,0 -0,5 4,9 5,9 4,2 2,8 3,7 0,2 0,8 4,4

Crescimento do PIB per capita (%) -0,5 -2,1 3,4 4,3 2,8 1,2 1,9 -1,2 -0,5 3,0

Investimento (% do PIB a Preços de 1980) 15,5 14,6 13,7 13,9 15,0 15,5 15,2 16,1 16,1 14,8 14,8

Investimento (% do PIB a Preços correntes) 20,7 18,1 18,4 19,3 20,8 20,5 19,3 19,9 19,7 19,1 19,4

Preços (Deflator do PIB) 2596 417 969 1996 2240 77,6 17,3 8,3 4,9 4,6 8,0

Taxa de Juros Real (%) -4,9 3,6 34,1 7,1 24,4 33,1 16,6 16,4 26,5Setor Externo (US$ Bilhòes)

Exportações 31,4 31,6 35,8 38,6 43,5 46,5 47,7 53,0 51,1 48,0 55,1

Importações 20,7 21,0 20,6 25,5 32,7 49,9 53,3 61,4 57,6 49,2 55,8

Saldo Comercial 10,7 10,6 15,2 13,1 10,8 -3,4 -5,6 -8,4 -6,5 -1,2 -0,7

Transações Correntes -3,8 -1,4 5,9 -0,4 -1,3 -18,0 -23,7 -33,4 -34,9 -24,4 -24,2

Reservas Externas 10,0 9,4 23,8 32,2 38,8 51,8 60,1 52,2 44,6 37,8 32,9

Fonte: Pinheiro et al. (1999), IPEA (2002) e IBGE (2002)

Tabela 3: Brasil: Indicadores Econômicos - 1990-2000

Embora a década de noventa tenha apresentado importantes ganhos para o país,

sobretudo no que diz respeito ao combate à inflação e ao aumento da competitividade, levando

a ganhos de produtividade, a analogia com a década anterior66 não parece ser totalmente

desprovida de sentido, como apontam os dados sobre crescimento econômico, distribuição de

66 A década de 80 ficou conhecida como “a década perdida”, em função do péssimo desempenho da economia brasileira naquele período.

50

renda, setor externo e dívida pública apresentados ao longo do capítulo. Desse modo, fica a

lição de que ainda há muito o que se fazer, sobretudo no que concerne à melhoria na

distribuição de renda, de modo a acabar com a sua inaceitável estabilidade (Barros, Henriques

e Mendonça, 2000) e à redução da vulnerabilidade externa, sem, entretanto, que isso acarrete

em aumento da instabilidade interna, como tem sido o padrão histórico apontado por Young e

Pereira (2000).

51

V – METODOLOGIA

Ao longo dos últimos anos, foi gerada uma vasta literatura sobre crescimento

econômico e distribuição de renda67. Na sua vertente empírica, diversos estudos identificam

uma relação negativa entre desigualdade e crescimento (Bénabou, 1996). No plano teórico, não

obstante a importância das contribuições mais recentes, há que se ressaltar o valor da

contribuição de Kalecki. Como já foi argumentado, ao valer-se do princípio da demanda

efetiva, Kalecki oferece uma explicação mais adequada para o modo como se relacionam

distribuição e crescimento.

Tendo em vista o fraco desempenho econômico brasileiro da última década, aliado a

uma péssima distribuição de renda, cabe se questionar se um padrão distributivo mais

equânime não possibilitaria um maior crescimento da renda. Para realizar tal tarefa, será

utilizado o modelo de relações intersetoriais desenvolvido por Leontief (1983), adaptado para o

modelo departamental de Kalecki (1977), conforme a metodologia empregada por Tauile e

Young (1991) para avaliar o desempenho econômico brasileiro na década de 70. Neste

trabalho, pretende-se, utilizando uma pequena derivação da metodologia, fazer o mesmo

exercício para a década de noventa, marcada pela manutenção da desigualdade de renda e por

um baixo crescimento econômico. Para realizar essa tarefa, serão utilizados os dados das

matrizes insumo-produto do IBGE para o ano de 1996 e da pesquisa de orçamentos familiares

para o mesmo ano, também divulgada pelo IBGE.

Em outras palavras, pode-se dizer que se trata de um exercício de estática comparativa,

no qual a distribuição da renda é o objeto da simulação. Não é questão, pois, apenas de

lamentar o passado, mas também uma forma de apontar para o futuro na esperança de se

alcançar um maior nível de atividade econômica, com uma melhor distribuição.

V.1 – O MODELO DE RELAÇÕES INTERSETORIAIS

O modelo de Insumo-Produto tem por objetivo descrever empiricamente a

interdependência ente os diferentes setores de uma economia, tomando como dados os níveis

de produção e consumo. Adotam-se duas premissas em um modelo de relações intersetoriais.

67 Bénabou (1996) e Bertola (2000) oferecem resenhas bem completas da literatura recente, tanto teórica quanto empírica.

52

Na primeira, assume-se que os diferentes setores mantenham sua participação constante no

mercado de cada produto. Com relação à segunda premissa, assume-se que os processos de

produção dos setores sejam tecnologicamente independentes e caracterizados por uma relação

estável e linear entre os insumos necessários e o produto final de cada setor. A partir daí, é

possível obter um sistema de equações relacionando o produto de cada setor à produção dos

demais setores.

Considera-se também um “setor autônomo” a demanda final, cuja determinação é

exógena ao modelo de insumo-produto. Como as vendas de cada setor devem se igualar ao

consumo autônomo (ligado às categorias de demanda final) mais o montante da produção

requerida pelo consumo intermediário dos demais setores, é possível, através do modelo,

estimar quanto deve ser a variação total da produção em decorrência de uma variação na

demanda final. Em termos formais, isso significa:

∑=

−++++=n

jiiiiiiji MXGICxx

1

, onde i = 1, ....,n (1)

onde xij é a quantidade de produto do setor i fornecido como consumo intermediário ao setor j ,

e Ci, Ii, Gi, Xi, Mi e xi são, respectivamente, o consumo pessoal, o investimento, consumo do

governo, exportação, importação e produto doméstico do setor i (Prado,1981).

Admitindo, de acordo com a segunda hipótese supracitada, que a relação entre os

insumos consumidos em cada atividade e a sua produção total é constante, tem-se que:

∑=

+=n

jijiji dxax

1

(2)

onde aij é o coeficiente técnico que determina a quantidade de produto do setor i necessária à

produção de uma unidade de produto total no setor j, e di é o montante de demanda final pelos

produtos do setor i (di = Ci + li + Gi + Xi - Mi).

Matricialmente, isto pode ser expresso por:

x = Ax + d (3)

onde x é um vetor n x 1 com a produção total de cada setor, d é um vetor n x 1 com a demanda

final setorial, e A é uma matriz n x n com os coeficientes técnicos de produção.

Visto que, no modelo, as categorias de demanda final são determinadas exogenamente,

a produção total correspondente para atender àquela demanda é definida por:

x = (I - A) -1 d (4)

53

onde (I –A)-1 é a matriz de Leontief ou matriz de coeficientes técnicos diretos mais indiretos.

Note-se que é possível calcular o impacto de cada componente do vetor demanda final

em separado. Assim, é possível estimar, por exemplo, os impactos diretos e indiretos de uma

mudança no consumo das famílias sobre a produção. Ademais, como demonstram Feijó et al.

(2000), é possível também decompor os impactos em cada componente do valor produzido,

estimando as variações de salários, tributos, importações e mesmo nível de emprego associados

a uma variação na demanda final68.

Para obter os resultados em termos de salários, tributos ou consumo importado, é

suficiente substituir a relação pessoal ocupado/valor da produção por salário/valor da

produção, tributos/valor da produção ou emissões/valor da produção, respectivamente, de cada

setor (Kupfer et al.., 2001).

Há ainda uma outra forma de se calcular o valor da produção das atividades para um

dado vetor de demanda final (cf. Tauile e Young, 1991; Feijó et al., 2000). Segundo Tauile e

Young (1991, p.23),

Os componentes de renda agregada são obtidos pelo somatório das quantidades de renda geradas na realização da produção de cada setor (ou produto) no período levado em questão. Como são as atividades de produção de bens finais que determinam a produção total de bens, direta ou indiretamente (via insumos), o valor de produção das atividades produtoras de bens finais determina o valor adicionado e a renda equivalente para o conjunto da economia.

Algebricamente:

)(1

jj

n

ijjijijj iymxapxp +++= ∑

=

(5)

onde pj, mj, yj, ij e xj são o preço, as importações, o valor adicionado a preços básicos, o

imposto sobre produtos e a quantidade vendida do produto j.

Dividindo (5) por xj, tem-se então:

∑=

+=n

ijijij vapp

1

(6)

68 Feijó et al. (2000, p. 165) mostram como pode ser calculado, por exemplo, um multiplicador do emprego: E=L(1xn)x, onde E é o número de pessoas ocupadas, o vetor coluna L relaciona o número de pessoas ocupadas e o valor da produção de cada atividade e x é o próprio valor da produção. Mas, de (4), E=L'(I-A)-1d.

54

onde vj é a soma das importações, valor adicionado a preços básicos e imposto sobre produto

unitários. Essa equação representada em termos matriciais fica:

p=Ap+v (7)

Rearranjando os termos, p=(I-A)-1.v (7'). Esta equação permite identificar a

participação de cada uma das variáveis no vetor de preços p.

Para, a partir da equação (7') chegar ao valor da produção, é preciso multiplicá-la pelo

vetor de demanda final d. Dessa maneira, o va lor total da produção de bens finais é

representado em uma matriz, na qual, nas linhas estão os componentes do valor adicionado e

nas colunas os componentes da demanda final. O valor total da produção de bens finais é,

portanto:

dAIvpd 1' )( −−= (8)

V.2 - APLICAÇÃO DA MATRIZ DE RELAÇÕES INTERSETORIAIS AO MODELO DEPARTAMENTAL DE KALECKI

A equação acima, excluindo-se as importações, resulta numa matriz que relaciona os

componentes do valor adicionado nas linhas e os componentes da demanda autônoma nas

colunas. Desse modo, eqüivale ao modelo departamental de Kalecki (1977). Foi a partir dessa

constatação que Tauile e Young (1991) propuseram uma adaptação da matriz de relações

intersetoriais brasileira ao modelo de Kalecki. Seu intuito foi simular, com esse instrumental,

os efeitos de uma melhoria na distribuição da renda entre lucros e salários para o crescimento

econômico alcançado na década de setenta.

Há que se salientar que a metodologia desenvolvida por Tauile e Young (1991) não é a

única que busca uma forma de relacionar a distribuição da renda com a matriz de relações

intersetoriais. Bonelli e Cunha (1981; 1982), Bêrni (1995) e Cavalcanti (1997) também

trabalharam com simulações com matrizes insumo-produto para avaliar os impactos de uma

redistribuição de renda sobre a produção nacional. Não obstante as semelhanças de objetivo e

método, essas abordagens possuem algumas diferenças importantes, que foram decisivas para a

escolha da metodologia. De forma distinta à utilizada nesta dissertação, Boneli e Cunha (1981,

1982) e Bêrni (1995) raciocinam em termos de uma redistribuição que transfira diretamente

consumo dos ricos para consumo dos mais pobres, o que não gera impacto sobre a renda. Com

isso, avaliam sobretudo os impactos sobre a produção e alterações no seu perfil. Nesses casos,

55

contudo, não há impacto sobre a renda agregada, porquanto o princípio da demanda efetiva não

seja considerado. Tauile e Young (1991) e Cavalcanti (1997), por outro lado, atuam com base

naquele princípio, o que lhes confere uma capacidade de avaliar impactos distributivos sobre o

crescimento. Embora com algumas ressalvas, que serão explicitadas mais adiante, esta

dissertação se filia à abordagem proposta por Tauile e Young (1991), pois esta se apresenta

mais próxima à teoria de Kalecki (cf. cap. IV), além de apresentar uma metodologia mais

simples do que a aduzida em Cavalcanti (1997).

O uso da matriz insumo-produto para estimar uma matriz departamental exige que se

adapte o modelo kaleckiano tradicional a um esquema aberto e com governo. Assim sendo,

além dos departamentos responsáveis pela produção de bens de capital (DI), bens de consumo

para capitalistas (DII) e bens de consumo para trabalhadores (DIII), tem-se um departamento

representando a produção de bens destinados ao consumo do governo (DIV) e outro referente

ao comércio exterior (DV). O esquema departamental fica ampliado para a seguinte forma:

Quadro 3 – Matriz Departamental Ampliada

DI DII DIII DIV DV Total

W1 W2 W3 W4 W5 W

P1 P2 P3 P4 P5 P

I CK CW G X Y

Obtém-se, então69, a nova equação de determinação da renda:

É interessante destacar que essa equação representa uma diferença importante entre o

cálculo do multiplicador da renda nesta dissertação e em Tauile e Young (1991). Neste

trabalho, não é adotada a hipótese de que os trabalhadores consomem toda a sua renda. Com

isso, evita-se o problema de incompatibilidade que Tauile e Young (1991) enfrentam: ao se

depararem com uma massa salarial superior ao consumo dos trabalhadores, os autores optaram

por assumir que a ‘poupança’ dos trabalhadores era gasta em bens de consumo dos capitalistas.

69 De acordo com apêndice do capítulo III

)1)(1()](1[)](1[)](1[)](1[

3

35343231

wmXwwGwwCwwIww

Y k

ααααα

−+−++−++−++−+

=

56

Esse tratamento resulta em um multiplicador artificialmente alto, já que uma parcela de

salários não consumida não é considerada como tal. Na abordagem presente, esse problema

simplesmente não surge, uma vez que já foi resolvido ao nível teórico.

Em um modelo verticalmente integrado, como assume Kalecki (1977), a renda só pode

ser gerada através da cadeia de produção ligada às categorias de demanda final. Logo, as

participações do governo e do comércio exterior são obtidas através da renda gerada na

produção (inclusive etapas intermediárias) de bens finais para o consumo do governo e

exportações. Tendo em vista que a tributação e os insumos importados incidem sobre todos os

setores e, portanto, todos os departamentos, reduzindo o excedente de toda a economia, e não

somente do DIV e do DV, as participações do governo e do comércio exterior devem ser

tratadas em termos absolutos e não como saldos. Desse modo, Tauile e Young (1991, p. 25)

enfatizam que

...o modelo é compatível com os conceitos adotados pela matriz de relações intersetoriais, que utiliza a valoração dos preços básicos aproximados (sistema de preços dos produtos nas unidades de produção, antes da incidência dos impostos e subsídios), e que desconsidera a possibilidade de substituição de importação, cuja participação no suprimento de cada setor nacional assume como fixa e não competitiva, merecendo tratamento em separado (tabela de consumo importado).

Então, como resultado, o modelo gera uma matriz cuja soma das linhas gera o valor

adicionado a preços básicos separado entre as formas de apropriação da renda. Já a soma das

colunas também resulta no valor adicionado a preços básicos, porém dividido desta vez entre

as categorias de demanda final.

No modelo kaleckiano, a separação entre consumo dos capitalistas e consumo dos

trabalhadores é crucial, uma vez que esses têm muito menos autonomia sobre suas decisões de

consumo do que aqueles. Entretanto, não há dados do IBGE que separem o consumo dessa

forma na matriz insumo-produto de 1996. Porém, nesse mesmo ano, foi realizada uma pesquisa

de orçamentos familiares, a partir da qual é possível extrair informações desagregadas de

consumo por faixas de renda. É necessário, pois, que se faça alguma hipótese para que se possa

associar os consumos de capitalistas e trabalhadores às categorias de consumo por

rendimentos. Esse problema será tratado com mais detalhes adiante, quando da apresentação

dos resultados.

Uma vez apresentada a forma de aplicação do modelo de insumo-produto ao modelo de

Kalecki, cabe demonstrar como fica a sua solução, a partir da equação (8) (cf. Tauile e Young,

1991, p.25):

57

Valor adicionado a preços básicos2x5 = [W P]’ 2xn (I-A)-1 nxn [I Ck Cw G X] nx5 (9)

V.3 – COMPATIBILIZAÇÃO DAS MATRIZES DO IBGE PARA APLICAÇÃO DO

MODELO

Para que se possa realizar a análise empírica necessária ao alcance do objetivo deste

trabalho, é preciso compatibilizar os dados empíricos, baseados na matriz de relações

intersetoriais de 1996. Contudo, conforme já mencionado, na matriz insumo-produto de 1996,

o consumo das famílias por produto não é desagregado por faixas de rendimento pessoal.

Tendo em vista a necessidade de se tratar o consumo de forma desagregada para a

validade do modelo, optou-se por utilizar os dados de consumo por classes de renda extraídos

da pesquisa de orçamentos familiares (POF) de 1996 e reagrupados por Serôa da Motta (2002).

Como a POF é baseada em uma amostra da população, é preciso fazer algumas considerações

para tornar seus dados compatíveis com a classificação da matriz insumo-produto. Assim, após

classificar os gastos de acordo com os produtos da insumo-produto, foi utilizado o seguinte

expediente: para cada produto, foram calculadas as proporções consumo por faixa de

rendimento/consumo total da POF e, em seguida, essas proporções foram aplicadas aos valores

de consumo das famílias para cada produto (IBGE, 1996, tabela 3). Há que se ressaltar que, em

virtude desse problema com relação ao consumo desagregado, só é possível realizar tal

adaptação para 1996, já que a POF anterior é de 1987 e, para este ano, não há matriz de

relações intersetoriais.

Uma vez estabelecido o procedimento a ser adotado, pode-se calcular a matriz que

relaciona os componentes de demanda final a cada setor da economia e que deve ser

multiplicada pela inversa de Leontief. Vejamos então como fica na prática a equação (9):

MD2x5 = R2xn .(I-D*Bnxn)-1. Dnxm .Ymx5 (10)

onde R é a matriz que relaciona, para cada um dos n setores, o percentual de participação de

cada categoria do valor adicionado no valor da produção; D é a matriz de participação setorial

na produção dos m produtos nacionais (tabela 18 da MIP)70; B é a matriz dos coeficientes

técnicos dos insumos nacionais (tabela 16); (I-D*Bnxn)-1é a matriz de impacto intersetorial e Y

é a matriz que apresenta a composição dos gastos com produtos discriminada pelas categorias

de demanda final (Tauile e Young, 1991).

70 A matriz D tem que ser usada para converter a demanda final de produtos para setores, já que algumas atividades produzem mais de um produto (e.g. agropecuária).

58

Com base no que foi apresentado, convém mostrar como fica a equação (10) quando

aplicada à matriz de relações intersetoriais brasileira de 1996 e, ainda adaptada aos dados de

consumo por faixa de rendimento:

MD6x14 = R6x42 .(I-D*B42x42)-1. D42x80 .Y80x14 (11)

Nas linhas da Matriz MD, encontram-se as seguintes categorias do valor adicionado,

segundo a apuração do IBGE: salários, contribuições sociais, rendimentos de autônomos,

excedente operacional bruto, outros impostos sobre a produção e outros subsídios à produção.

Já as categorias de demanda final são formação bruta de capital fixo, variação de estoques,

gastos do governo, exportações e consumo das famílias. Este, por sua vez, está dividido em

consumo por faixas de rendimentos: zero a dois salários mínimos; dois a três; três a cinco;

cinco a seis; seis a oito; oito a dez; dez a quinze; quinze a vinte; vinte a trinta e superior a trinta

salários mínimos. Assim, é possível fazer diferentes hipóteses a respeito da classificação dos

gastos dos capitalistas.

V.4 – APRESENTAÇÃO DOS MULTIPLICADORES DA RENDA

Após a descrição na seção anterior da metodologia utilizada para determinar o valor

adicionado dividido entre as suas categorias de apropriação e de gastos, cabe mostrar os

resultados obtidos e avaliá- los de acordo com os números de fato da matriz de relações

intersetoriais. Com base nesses resultados é possível calcular os multiplicadores da renda. Daí,

no capítulo seguinte, serão realizadas as simulações com vistas a avaliar o impacto de uma

melhora na distribuição funcional da renda sobre o crescimento econômico. Antes, contudo, é

preciso apresentar o resultado do “modelo base” para 1996:

59

em R$ Mil de 1996

0 --------| 2 2 --------| 3 3 --------| 5 5 --------| 6 6 --------| 8 8 --------| 10 10 --------| 15 15 --------| 20

Salários 2.119.120 2.451.241 5.879.545 3.431.746 6.399.296 5.378.215 12.089.698 9.461.364

Contrib. Sociais 523.504 602.600 1.452.350 838.083 1.577.273 1.322.533 2.937.241 2.291.166

Rend. Autônomos 617.291 717.191 1.787.689 1.057.982 1.988.862 1.679.350 3.854.648 2.992.368

EOB 5.310.565 6.297.708 15.155.575 8.758.002 16.558.953 13.232.497 31.453.204 22.155.242

Outros impostos 459.751 527.550 1.268.476 729.519 1.340.311 1.100.219 2.454.584 1.848.195

Outros subsídios (78.409) (93.564) (215.360) (116.657) (206.590) (159.825) (327.222) (230.486)

Total 8.951.822 10.502.725 25.328.275 14.698.675 27.658.105 22.552.989 52.462.151 38.517.849

20 --------| 30 Mais de 30 FBKF VE G X Total

Salários 12.844.476 35.854.324 21.494.667 2.084.257 76.057.955 12.460.593 208.006.497

Contrib. Sociais 3.091.144 8.649.396 5.375.767 543.738 38.825.252 3.421.260 71.451.307

Rend. Autônomos 3.976.606 11.106.912 6.797.480 362.013 3.197.872 2.354.277 42.490.542

EOB 28.838.239 79.490.821 73.998.282 5.591.042 14.149.614 24.630.401 345.620.145

Outros impostos 2.453.465 6.600.606 6.983.907 520.419 3.176.146 3.325.289 32.788.436

Outros subsídios (296.210) (642.753) (305.950) (102.747) (166.529) (445.915) (3.388.219)

Total 50.907.720 141.059.306 114.344.153 8.998.722 135.240.310 45.745.904 696.968.706

Quadro 4 - Resultado do Modelo

Com relação às linhas, optou-se por agrupar salários, contribuições sociais, e

rendimentos de autônomos sob o nome de “salários”. Dessa forma, buscou-se agregar as

remunerações ao trabalho na categoria salários tal como Tauile e Young (1991). Já o excedente

operacional bruto71, outros impostos e outros subsídios à produção agrupam-se sob a

designação de “lucros”. Com isso, as seis linhas da matriz resultante já podem ser

transformadas em duas. No que se refere às categorias de demanda final, formação bruta de

capital fixo e variação de estoques somam-se e representam a demanda por bens de capital.

A divisão entre consumo dos capitalistas e dos trabalhadores já não é tão simples. É

preciso fazer uma hipótese ad hoc a respeito da divisão a ser realizada entre o consumo por

faixas de rendimentos.

Inicialmente, optou-se por trabalhar com três diferentes hipóteses: na primeira delas,

definiu-se como proxy do consumo da classe capitalista o consumo de quem recebe acima de

quinze salários mínimos. No entanto, conforme pode-se observar a partir do quadro 5, essa

hipótese não se mostra razoável:

71 Vale lembrar uma vez mais que o excedente operacional bruto é composto por lucros, aluguéis, juros e ganhos de capital. Assim, agrupá-lo sob a designação ‘lucros’ visa apenas a manter a nomenclatura utilizada por Kalecki.

60

DI (I) DII (Ck) DIII (Cw) DIV (G) DV (X) Total

Salários 36.657.921 90.267.757 58.705.457 118.081.080 18.236.130 321.948.345

Lucros 86.684.954 140.217.118 103.449.285 17.159.231 27.509.774 375.020.361 Valor Adicionado 123.342.875 230.484.875 162.154.742 135.240.310 45.745.904 696.968.706

Fonte: elaboração própria

Quadro 5 - Ck>15

em R$ Mil de 1996

Esse caso não parece realista, pois a propensão a consumir dos trabalhadores é de

apenas 0,5, ao passo que a dos capitalistas é 0,61, maior do que a dos trabalhadores. Portanto,

essa hipótese deve ser descartada, pois resulta incompatível com o modelo.

Caso o consumo de quem recebe acima de vinte salários mínimos seja considerado

como o consumo dos capitalistas, a solução do modelo fica da seguinte forma:

DI (I) DII (Ck) DIII (Cw) DIV (G) DV (X) Total

Salários 36.657.921 75.522.858 73.450.355 118.081.080 18.236.130 321.948.345

Lucros 86.684.954 116.444.167 127.222.236 17.159.231 27.509.774 375.020.361

Valor Adicionado 123.342.875 191.967.026 200.672.591 135.240.310 45.745.904 696.968.706

Fonte: elaboração própria

Quadro 6 - Hipótese 1: Ck>20

em R$ Mil de 1996

A propensão a consumir dos trabalhadores, de acordo com essa hipótese, é 0,62, e a

dos capitalistas é de 0,51. Esse resultado é, sem dúvida, mais apropriado que o anterior. Logo,

cumpre apresentar o multiplicador que surge como resultado do modelo 72, baseado na hipótese

acima:

Y=1,24I+1,32Ck+1,71G+1,32X (12)73

Não obstante o resultado conseguido com a adoção da hipótese 1, é interessante

verificar os resultados decorrentes da utilização da hipótese seguinte, qual seja, a utilização do

consumo daqueles que recebem acima de trinta salários mínimos como proxy do consumo

capitalista. Sendo assim,

72 Esse multiplicador é definido, de acordo com a equação (9), por: Σi [1+α(w i -w3)] i /(1-αw3) , onde i=I, Ck, G e X. 73 Vale ressaltar que o cálculo deste multiplicador não leva em conta a propensão marginal a importar, como no apêndice do capítulo III, porque, na MIP, as importações são incluídas no consumo intermediário.

61

DI (I) DII (Ck) DIII (Cw) DIV (G) DV (X) Total

Salários 36.657.921 55.610.632 93.362.582 118.081.080 18.236.130 321.948.345

Lucros 86.684.954 85.448.674 158.217.729 17.159.231 27.509.774 375.020.361

Valor Adicionado 123.342.875 141.059.306 251.580.311 135.240.310 45.745.904 696.968.706

Fonte: elaboração própria

Quadro 7 - Hipótese 2: Ck>30

em R$ Mil de 1996

Avaliando essa hipótese como as demais, ela parece ser ainda mais interessante que a

segunda. Isto porque a propensão a consumir dos trabalhadores é de 0,78 e a dos capitalistas é

de 0,38. Esses números estão mais de acordo com os autores que assumem que a propensão a

consumir dos capitalistas é significativamente menor do que a dos trabalhadores74.

Baseado nessa hipótese tem-se o seguinte multiplicador75:

Y=1,33I+1,43Ck+1,96G+1,44X (13)

Apresentados os resultados do modelo e os multiplicadores decorrentes, o intuito agora

é realizar simulações de modo a avaliar o comportamento dos agregados macroeconômico com

um diferente padrão de distribuição de renda. Para essas simulações, serão utilizados dois

cenários. No primeiro, que servirá como referência em virtude do que foi apresentado acima, as

simulações serão realizadas com base na segunda hipótese - o consumo dos capitalistas

equivale ao consumo dos que recebem acima de 30 salários mínimos. O outro cenário, baseado

na primeira hipótese, representa um cenário mais conservador, já que o seu multiplicador é

menor, a fim de qualificar o limite inferior de crescimento decorrente de uma redistribuição em

favor dos assalariados. Contudo, essa tarefa será realizada no capítulo seguinte, já que o

objetivo deste era apresentar a metodologia e os multiplicadores da renda resultantes do

modelo básico.

74 A respeito, ver Simonsen e Cysne (1989). 75 Note-se, como era de se esperar, que quanto maior a propensão a consumir dos trabalhadores, maior é o multiplicador da renda, já que nas três hipóteses apresentadas a distribuição da renda é igual.

62

VI – APRESENTAÇÃO DAS SIMULAÇÕES

Conforme demonstrado no capítulo IV, de acordo com a teoria kaleckiana, uma melhor

distribuição funcional da renda acarreta, ceteris paribus, um maior nível de renda nacional.

Neste capítulo, portanto, pretende-se, a partir dos resultados obtidos no anterior, realizar

algumas simulações a fim de verificar como diferentes distribuições de renda afetariam o nível

do produto brasileiro de 1996.

Uma melhor distribuição da renda entre lucros e salários acarreta não somente um

aumento no valor adicionado da economia, mas também gera conseqüências sobre o nível de

emprego e sobre as importações. Essas conseqüências, por sua vez, também podem ser

estimadas em um modelo de relações intersetoriais, conforme apontam Feijó et al. (2000).

Desse modo, um passo seguinte na análise é verificar a magnitude dos impactos sobre emprego

e necessidade de importações em virtude da adoção de um padrão distributivo superior ao de

1996.

Em seguida, a fim de demonstrar o potencial de crescimento econômico derivado de

uma redistribuição em favor dos assalariados, parte-se para uma avaliação de quanto cada

componente da demanda final, com a distribuição de renda vigente em 1996, deveria crescer

para fazer frente ao crescimento derivado da redistribuição. Diferentes motores do crescimento,

no entanto, produzem diferentes efeitos. Dessa forma, o passo seguinte é avaliar, em especial,

como se dão esses efeitos sobre as importações, visto que a necessidade de divisas para fazer

frente a essas importações pode se constituir em uma restrição à efetivação da ampliação do

produto nacional. Baseado nisso, os impactos sobre a balança comercial de cada tipo de

crescimento são avaliados de sorte a lançar luz sobre possíveis restrições externas à desejada

ampliação da renda.

Embora essa análise forneça subsídios para refletir sobre redistribuição e crescimento, é

preciso ressaltar a importância da existência de capacidade ociosa na economia para a validade

dos resultados a serem apresentados. Caso não haja capacidade ociosa suficiente para atender

ao aumento da demanda, haverá um gargalo produtivo ao crescimento econômico. Nesse caso,

surge a possibilidade de um aumento da inflação, e/ou de um aumento das importações para

atender à demanda excedente. Uma análise da utilização da capacidade nos setores cuja

demanda mais crescer seria, portanto, um passo importante para ratificar a exeqüibilidade da

proposta dessa dissertação. Entretanto, essa análise não será realizada aqui, pois ultrapassaria o

63

escopo desta dissertação. Desse modo, será assumido que há capacidade ociosa suficiente para

fazer frente ao crescimento da demanda76.

VI.1 – ALGUMAS RESSALVAS METODOLÓGICAS ANTES DA APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

Tendo em vista que durante a década de 90 a distribuição funcional da renda foi se

deteriorando continuamente (IBGE, 2002), a idéia aqui é apresentar uma simulação sobre

como teria sido o crescimento econômico se o padrão distributivo de 1990 não tivesse sido

alterado. Nesse sentido, a estratégia é avaliar, à luz do modelo proposto no capítulo anterior,

como uma diferente distribuição impactaria a renda nacional em 1996.

Para fazer essa comparação entre diferentes padrões distributivos e crescimento

econômico para o período 1970-1980, Tauile e Young (1991) aplicam o valor do multiplicador

obtido para o ano de 1970 aos dados de demanda final de 1975, conforme explicitado no item

V.2. Assim, foi possível para os autores avaliar qual teria sido o nível de renda de 1975 se não

tivesse ocorrido deterioração distributiva. Segundo os autores, naquele caso, a renda teria sido

3,2% maior do que a que de fato ocorreu. Note-se com isso que todo o argumento de que a

concentração da renda era um ‘mal’ necessário para garantir o fabuloso crescimento do período

representava uma falácia, já que, com uma melhor distribuição, o “milagre” poderia ter sido

ainda maior.

Esse tipo de análise, no entanto, não pôde ser feita nesta dissertação. A partir de 1980,

as matrizes insumo-produto divulgadas pelo IBGE não apresentam os dados de consumo das

famílias desagregado por faixas de rendimentos. Atualmente, esses dados constam na Pesquisa

de Orçamentos Familiares, também divulgada pelo IBGE. Porém, a periodicidade de sua

divulgação não coincide necessariamente com a da MIP, sendo que apenas em 1996 houve essa

coincidência. Nesse caso, o cálculo do multiplicador da renda, baseado na metodologia

desenvolvida por Tauile e Young (1991), só foi possível para 1996. Essa adversidade, no

entanto, não impediu que se avaliassem os efeitos de uma diferente distribuição de renda sobre

o nível do produto, como pretende esta dissertação.

76 Segundo Giambiagi (2002), a utilização da capacidade instalada não passou de 84% desde 1980. De acordo com simulações do mesmo autor, com um crescimento econômico de 4% a.a., a capacidade seria plenamente utilizada em 5 anos. Desse modo, parece perfeitamente factível supor que a capacidade instalada da indústria não constituiria entrave ao crescimento.

64

Foi possível criar uma alternativa de análise a partir da distribuição de renda por setores

da economia. Desse modo, optou-se por trabalhar a partir dos dados da tabela 2 de Usos de

bens e serviços da matriz insumo-produto, a qual relaciona, por cada setor de atividade, as

informações sobre o valor da produção, consumo intermediário e os componentes do valor

adicionado. Partindo desses dados, é possível realizar as simulações desejadas alterando-se a

distribuição da renda de cada setor da economia. Em termos formais, isso significa alterar, na

equação (8) do capítulo V, a matriz v' de acordo com a distribuição de renda do ano (xx) que se

deseja simular:

')(' 196

'96 dAIvpd xx

−−= (14)

No entanto, esse procedimento não é suficiente, uma vez que, a cada ano, a relação entre valor

adicionado e valor da produção pode ser diferente. Dessa forma, uma simples mudança em v'

estará simulando mais uma alteração na distribuição de renda entre os setores (mediante a

relação entre consumo intermediário e valor adicionado) do que na distribuição de renda entre

lucros e salários. Como esse não era o caminho desejado, optou-se por realizar um ajuste nos

dados de modo que a relação valor adicionado/valor da produção do ano a ser utilizado na

simulação, para cada setor ficasse idêntica à de 1996. Com isso, o valor adicionado simulado

fica, por definição, igual ao valor real de 1996, porém com uma nova distribuição de renda.

Isto ocorre porque a matriz d de demanda final não foi alterada, já que estamos trabalhando

com um modelo aberto de relações intersetoriais. Note-se que, ao buscar transpor um problema

com os dados, nos aproximamos ainda mais da teoria kaleckiana, segundo a qual a distribuição

da renda é determinada microeconomicamente, através do processo de formação de preços.

Desse modo, pode-se dizer que os exercícios realizados nesta dissertação coadunam-se de

modo integral à base teórica utilizada.

Sem embargo, como o consumo dos trabalhadores é endógeno, esse resultado não está

correto: manter o consumo dos trabalhadores inalterado quando o montante total de salários é

ampliado significa uma redução na propensão a consumir da classe trabalhadora. Como essa é

considerada, no modelo kaleckiano, uma variável exógena, definiu-se que a propensão

encontrada no ‘modelo base’ de 1996 é a propensão “correta”. Assim, para o novo patamar de

salários, ajustou-se o consumo dos trabalhadores com base na propensão real de 1996.

Destaque-se que há outros métodos para se tratar o problema acima exposto. Acredita-

se, todavia, que os demais seriam mais arbitrários e carentes de fundamentos teóricos do que o

apresentado. Uma possibilidade, por exemplo, seria supor que o padrão de consumo, definido

pelas parcelas de consumo de cada classe de renda, teria permanecido inalterado desde 1990.

65

Ora, se foi afirmado que houve uma forte piora na distribuição da renda nesse período, aliado

ao fato de se tratar de uma época de abertura econômica, com forte ampliação das importações,

fazer uma hipótese dessas não parece nada razoável. Uma outra possibilidade, totalmente ad

hoc seria simplesmente alterar os valores wi da equação de determinação da renda (cf.

apêndice, cap. III) de sorte a obter um novo valor para o multiplicador. Essa possibilidade, bem

como a anterior, carece de rigor teórico, uma vez que a distribuição da renda é um fenômeno

microeconômico, que resulta das decisões de formação de preços das firmas. Destarte, foi

considerado que a hipótese adotada é a que mais se aproxima desse quadro.

VI.2 – RESULTADOS DA SIMULAÇÃO

Ao longo da década de 90, a distribuição funcional da renda foi se deteriorando

progressivamente77. Assim, para os fins deste trabalho, optou-se por trabalhar com simulações

a partir dos dados relativos à distribuição de 1990, uma vez que esse foi o ano que apresentou

maior participação dos salários na repartição da renda. Dessa maneira, a idéia é apresentar

como o crescimento econômico de 1990 até 1996 teria sido afetado caso a distribuição de

renda de 1990 tivesse permanecido inalterada. Para as simulações, serão adotados dois

cenários: no primeiro, assume-se que os consumo dos capitalistas equivale ao consumo da

faixa de renda superior a trinta salários mínimos. Este será o cenário de referência, para o qual

serão efetuadas as análises. No segundo cenário, mais conservador, o consumo capitalista é

tratado como equivalente ao consumo de quem recebe acima de vinte salários mínimos. Com

esse cenário, pretende-se demonstrar que mesmo sob hipóteses bastante conservadoras o efeito

sobre o nível de produto ainda seria significativo.

VI.2.1 – CENÁRIO 1 - REFERÊNCIA

Vejamos então como fica a renda de 1996 simulada com a distribuição de 1990,

conforme a hipótese 3, apresentada no item V.4:

Hipótese 3: Ck>30

DI (I) DII (Ck) DIII (Cw) DIV (G) DV (X) Total

Salários 50.476.164 59.061.931 109.054.260 119.330.106 19.535.785 357.458.246

Lucros 72.866.711 81.997.375 163.668.224 15.910.204 26.210.119 360.652.633

Valor Adicionado 123.342.875 141.059.306 272.722.484 135.240.310 45.745.904 718.110.879

Fonte: elaboração própria

Quadro 8 - Cenário 1

em R$ Mil de 1996

77 Ver capítulo IV, item IV.1.

66

Antes de se fazer uma análise mais profunda sobre o resultado acima, deve-se observar

que, com relação aos resultados do “modelo base”, expostos no quadro 9, o resultado acima

apresenta, como era de se esperar por ser o próprio objeto da simulação, uma distribuição de

renda entre lucros e salários por departamento diferente da distribuição do modelo base,

conforme pode-se observar a seguir:

DI (I) DII (Ck) DIII (Cw) DIV (G) DV (X) Total

Participação dos Salários na Renda: Modelo Base 30% 39% 37% 87% 40% 46%

Participação dos Salários na Renda: Simulação 41% 42% 40% 88% 43% 50%

Salários na Simulação 50.476.164 59.061.931 109.054.260 119.330.106 19.535.785 357.458.246

Salários no Modelo Base 36.657.921 55.610.632 93.362.582 118.081.080 18.236.130 321.948.345

Taxa de Crescimento dos Salários 38% 6% 17% 1% 7% 11%

Diferença entre Simulação e Base 13.818.242 3.451.299 15.691.678 1.249.026 1.299.655 35.509.901

Participação de cada departamento na diferença 39% 10% 44% 4% 4% 100%

Fonte: elaboração própria

Quadro 9 - Mudança nos salários

A partir da observação dos dados do quadro acima, é possível concluir que a

deterioração na distribuição de renda ao longo do período foi mais forte nos setores que

atendem às demandas por bens de capital. De fato, a participação de salários, contribuições

sociais e rendimentos de autônomos no setor construção civil, responsável por quase metade da

produção que atende à demanda do departamento I, caiu de 38% em 1990 para 18% em 199678.

Pode-se perceber que a piora na distribuição de renda nos setores que atendem ao

consumo dos trabalhadores também foi significativa. Nesse caso, comércio, agropecuária e

aluguéis de imóveis respondem por 35% da produção que atende à demanda por consumo dos

trabalhadores. Naqueles setores, respectivamente, a participação dos salários e demais no valor

adicionado passou de 62% para 71%; 19% para 15% e 6% para 2%. Logo, com exceção do

comércio, a distribuição da renda deteriorou-se também nesses setores. Não obstante o objetivo

deste trabalho não seja procurar uma explicação para a piora na distribuição da renda ao longo

da década, não se pode deixar de ressaltar a importância do processo de concentração nos

diversos setores da economia, conforme aponta uma análise dos mark-ups e relações custos

intermediários/salários de cada setor, em consonância com a teoria da distribuição de Kalecki

abordada no capítulo IV.

Feita a ressalva acerca do comportamento da distribuição da renda ao longo da década,

cabe agora avaliar o comportamento do valor adicionado simulado com o real. O aumento no

78 Ver tabela 4, p.66.

67

consumo dos trabalhadores decorrente do aumento da participação dos salários na renda

geraria um nível de renda 3% maior do que o efetivamente observado:

Y96 = 696.968.706; Y’96 = 718.110.879: (Y’96-Y96)/Y96 = 3,0%

Vale destacar que esse resultado é considerável, sobretudo quando comparado às baixas

taxas de crescimento da década de 90. Se comparada à taxa de crescimento real de 1996, 2,7%,

esse valor é bastante expressivo. Uma redistribuição que levasse novamente ao padrão

distributivo de 1990 seria capaz de gerar um crescimento maior do que o observado. Portanto,

se houvesse um retorno à distribuição de 1990, o crescimento no ano de 1996 teria sido da

ordem de 5,7%, em contraponto aos 2,7% observados.

Além do mais, lembre-se que, em termos de políticas redistributivas, se trata de um

resultado bastante conservador, pois supõe a manutenção da distribuição vigente em 1990. Ou

seja, se o país tivesse mantido o já injusto padrão de distribuição de renda de 1990, o nível de

renda em 1996 seria 3% maior do que o efetivamente observado. Se pensarmos que ainda

haveria muito espaço para uma política redistributiva, pode-se imaginar que esse crescimento

econômico seria ainda maior numa década com uma taxa média de crescimento tão baixa.

Os impactos de uma melhor distribuição da renda, todavia, não ficariam restritos apenas

ao nível do produto interno bruto. É possível também estimar as conseqüências sobre o valor

da produção, pessoal ocupado, por conseguinte, sobre o salário médio e também sobre as

importações.

Já que todo o acréscimo na demanda final conseqüente de uma melhor distribuição da

renda seria refletido, segundo esse modelo, sobre o departamento de bens de consumo para

trabalhadores, os efeitos sobre a produção, pessoal ocupado e importações também só podem

ocorrer por essa mesma via. Assim, para estimar os impactos sobre o valor da produção, basta

multiplicar por 1,084 a produção por setor necessária ao atendimento da demanda dos

trabalhadores79. Com isso, o valor da produção estimada seria de R$ Mil 1.311.432.243, em

contraponto aos R$ Mil 1.272.037.766 do modelo base, o que representa um crescimento de

3,1% no valor da produção.

Para que se possa realizar uma avaliação mais detalhada sobre os impactos de uma

redistribuição sobre a produção, é preciso avaliar os efeitos sobre cada atividade. Na tabela a

seguir, são apresentados os setores que são mais impactados pelo consumo dos trabalhadores.

79 Deve-se multiplicar por 1,08, pois essa é a diferença no consumo dos trabalhadores entre o modelo simulado e o modelo base.

68

Vale lembrar que somente os setores cujo crescimento da produção é estimado como sendo

acima da média (3,1%) estão representados na tabela a seguir:

Total - Base Total - Sim. Variação

RESFRIAMENTO E PREPARAÇÃO DO LEITE E LATICÍNIOS 8.952.669 9.475.836 5,8%

FABRICAÇÃO DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS E DE PERFUMARIA 11.420.610 12.086.319 5,8%

ABATE E PREPARAÇÃO DE CARNES 18.708.349 19.784.130 5,8%

FABRICAÇÃO DE ARTIGOS DO VESTUÁRIO E ACESSÓRIOS 9.957.598 10.510.943 5,6%

OUTRAS INDÚSTRIAS ALIMENTARES E DE BEBIDAS 28.730.630 30.305.235 5,5%

BENEFICIAMENTO DE PRODUTOS DE ORIGEM VEGETAL 21.669.292 22.846.772 5,4%

ALUGUEL DE IMÓVEIS 100.141.706 105.070.976 4,9%

AGROPECUÁRIA 95.973.827 100.673.588 4,9%

INDÚSTRIA TÊXTIL 18.133.010 18.933.369 4,4%

SERVIÇOS INDUSTRIAIS DE UTILIDADE PÚBLICA 33.378.321 34.845.297 4,4%

COMÉRCIO 93.587.836 97.540.688 4,2%

SERVIÇOS PRIVADOS NÃO-MERCANTIS 9.004.388 9.384.425 4,2%

TRANSPORTE 44.309.712 46.166.343 4,2%

SERVIÇOS PRESTADOS ÀS FAMÍLIAS 86.500.532 90.115.408 4,2%

FABRICAÇÃO E REFINO DE ÓLEOS VEGETAIS 13.907.888 14.480.235 4,1%

INDÚSTRIA DO AÇÚCAR 5.997.571 6.231.112 3,9%

FABRICAÇÃO DE ELEMENTOS QUÍMICOS NÃO-PETROQUÍMICOS 13.044.400 13.526.250 3,7%

COMUNICAÇÕES 15.760.645 16.338.189 3,7%

REFINO DE PETRÓLEO E INDÚSTRIA PETROQUÍMICA 44.463.431 46.055.032 3,6%

FABRICAÇÃO DE PRODUTOS QUÍMICOS DIVERSOS 17.851.987 18.482.538 3,5%

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS 6.365.583 6.583.483 3,4%

APARELHOS E EQUIPAMENTOS DE MATERIAL ELETRÔNICO 16.018.302 16.547.037 3,3%

INDÚSTRIA DO CAFÉ 6.583.284 6.799.906 3,3%

FABRICAÇÃO DE CALÇADOS E DE ARTIGOS DE COURO E PELES 6.029.082 6.222.003 3,2%

PRODUÇÃO TOTAL 1.272.037.766 1.311.432.243 3,1%

Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do IBGE

Tabela 4 - Setores mais afetados pelo aumento da demanda por bens de consumo dos trabalhadores

Para estimar os impactos da simulação sobre a distribuição sobre o nível de emprego,

basta aplicar o modelo apresentado no capítulo anterior, seguindo metodologia descrita por

Feijó et al. (2000) e Kupfer et al. (2000): o pessoal ocupado pode ser calculado multiplicando-

se o vetor pessoal ocupado/valor da produção pelo valor da produção: E=L'x80. Em virtude da

nova demanda final d’96 decorrente da nova distribuição, uma nova produção é necessária para

fazer frente ao aumento da demanda81. Um maior valor da produção, por sua vez, gera um

aumento no pessoal ocupado, elevando o nível de emprego. Então, uma vez apresentado o

arcabouço necessário à estimativa do impacto sobre o pessoal ocupado, cabe apresentar os

valores encontrados com a simulação: o pessoal ocupado passaria de 58.784.957 para

60.918.171, ou seja, um acréscimo de 3,6%.

80 Onde x = (I-A)-1d é o valor da produção. 81 Conforme já foi apresentado e será discutido mais adiante, essa nova produção pode não ser factível devido à ausência de capacidade ociosa por parte das empresas. Neste tópico, estaremos admitindo que essa capacidade ociosa de fato existe.

69

Como era de se esperar, já que apenas o consumo dos trabalhadores mudou do ‘modelo

base’ para a simulação, o nível de emprego também só mudaria no departamento III. Note-se

que se trata de um aumento considerável do pessoal ocupado, da ordem de 2 milhões a mais de

empregos. Em uma década marcada pelas altas taxas de desemprego, uma estimativa dessa

ordem é significativa e mais um estímulo a uma política de redistribuição. É interessante

observar também que o crescimento do emprego é de 3,6% - maior do que o da renda -, o que

sugere uma elasticidade-renda do emprego maior do que um.

Com o total de salários pagos e com o total de pessoal ocupado, é possível calcular o

salário médio em cada caso. No caso básico, o total de salários pago aos trabalhadores foi de

R$ Mil 321.948.345 e o pessoal ocupado foi de 58.784.957 trabalhadores. Desse modo, o

salário médio mensal nesse caso foi de R$ 456. Na simulação realizada, por seu turno, o total

de salários seria de R$ Mil 357.458.246 e um total de pessoal ocupado de 60.918.171

empregados. Aqui, o salário mensal médio da economia seria de R$ 489. Em síntese, no que

concerne ao salário médio, o efeito da manutenção do padrão distributivo de 1990 resultaria em

um salário médio 7,2% maior do que o vigente em 1996.

Como se viu até o momento, o potencial de crescimento econômico derivado de uma

redistribuição é significativo. Do que foi apresentado, pode-se inferir que, caso a distribuição

de renda não tivesse se deteriorado de 1990 até 1996, o nível de renda neste ano seria 3,0%

maior do que o efetivamente observado82. Para se ter uma idéia do impacto de uma

redistribuição que levasse a distribuição de 1996 novamente ao patamar de 1990 para o

crescimento, será realizada, conforme propõem Young e Taulle (1991), uma estimativa da

variação necessária no valor total de cada departamento, em separado, para que se alcançasse o

mesmo acréscimo de 3% sobre a renda.

Em primeiro lugar, nesse segundo estágio de simulações, estimou-se a variação

necessária no valor dos investimentos para gerar os resultados anteriormente simulados:

Y’96 = Y96 + 1,33.∆I; Y96 = 696.968.706; Y’96 = 718.110.879

101.931.1533,1

706.968.696879.110.71833,1

' 9696 =−

=−

=∆YY

I ;

82 Na verdade, esse nível seria, no mínimo 3% maior, uma vez que um aumento dos gastos estimula novos investimentos, gerando uma dinâmica favorável a mais crescimento. Ver mais a respeito no capítulo III.

70

13,1875.342.123

101.931.15875.342.123=

+=

∆+I

II

Em suma, para atingir o nível de renda simulado para 1996 com a distribuição de renda

vigente naquele ano, o investimento teria que ser 13% maior do que o realizado.

Vejamos agora como deveria comportar-se, nessas condições, o consumo dos

capitalistas:

586.744.1443,1

173.142.21==∆ kC ;

10,1306.059.141

586.744.14306.059.141=

+=

∆+

k

kk

CCC

Nesse caso, a fim de compensar o efeito da piora na distribuição da renda sobre valor

adicionado, o consumo capitalista deveria ser 10% maior.

Em seguida, analisemos o papel dos gastos do governo nessa simulação:

587.781.1096,1

173.142.21==∆G ;

08,1310.240.135

587.781.10310.240.135=

+=

∆+G

GG

No caso dos gastos do governo, o esforço para gerar o nível de produto desejado

deveria ser 8% maior do que o realizado. Cumpre ressaltar que se trata de um esforço menor do

que o requerido pelos demais. Conforme pode ser visto no quadro 11, tal fato deve-se à maior

participação dos salários sobre o valor adicionado nesse setor. Com isso, o multiplicador dos

gastos do governo é muito superior aos demais multiplicadores e, portanto, seus gastos têm

mais impacto na economia do que os dos outros departamentos.

Finalmente, passemos para o último departamento, as exportações:

915.694.1444,1

173.142.21==∆X ;

32,1904.745.45

915.696.14904.745.45=

+=

∆+X

XX

71

Por possuir um baixo peso sobre o total do valor adicionado, apenas 7%, a despeito de

possuir o segundo maior multiplicador da renda, as exportações deveriam crescer em 32% para

gerar um crescimento de 3% da renda. Vale destacar que o aumento da renda mediante um

incremento das exportações requer um esforço substancial. Não obstante seja muito defendida

como forma principal de geração de crescimento (e.g. Medeiros & Serrano, 2001), a ampliação

das exportações não parece ser tão eficaz, nesse contexto, quanto evitar a deterioração da

distribuição de renda, já que um acréscimo dessa ordem requereria um esforço que não parece

ser factível.

Em suma, a fim de gerar um crescimento econômico relevante puxado pelas

exportações, seria necessário um esforço de políticas de fomento às exportações tão grande ou

maior do que aquele necessário à manutenção de um padrão distributivo mais equânime83.

Há que se advertir, todavia, que uma expansão econômica requer um aumento da

produção e, esta leva, inter alia, a uma maior demanda por produtos estrangeiros necessários

àquela, o que acarreta um aumento das importações. Por conseguinte, em um país em

desenvolvimento, como o Brasil, tradicionalmente com escassez de divisas, o crescimento

puxado pelas exportações oferece, por outro lado, uma interessante oportunidade de

crescimento, ao ampliar o saldo comercial. Conforme aponta Kalecki (1977, pp. 43-53),

qualquer outra forma de estímulo ao crescimento leva a uma maior restrição, ao invés de um

alívio externo. Portanto, no próximo tópico, será analisado o quanto essa necessidade de

importações afetaria a balança comercial, oferecendo, pois, uma restrição ao crescimento

econômico.

Antes, porém, é apresentado um quadro que sintetiza os resultados acima descritos:

I C k G XTx . de Cresc imento Requer ida 12,9% 10,5% 8,0% 32,1%

Fon te : au to r , a pa r t i r de dados do IBGE

Q u a d r o 1 0 - T a x a d e C r e s c i m e n t o R e q u e r i d a

Como pode se ver, uma variação de 7,8% (de 46% para 50%) na participação dos

salários na renda produziria um efeito sobre a renda agregada total, que só seria alcançado por

um maior esforço localizado na produção de qualquer dos departamentos. Desse modo, pode-

se constatar o potencial de crescimento gerado por uma redistribuição da renda em favor dos

salários.

83 Um incremento dessa magnitude nas exportações só seria possível mediante uma grande depreciação da moeda nacional, ou através de um amplo programa de subsídio às exportações. Afinal,um ganho de competitividade dessa magnitude é praticamente inexeqüível em tão curto espaço de tempo.

72

VI.2.2 – CENÁRIO 2 – CONSERVADOR

Neste segundo cenário, os efeitos sobre o nível de produto são mais modestos. Ainda

assim, porém, trata-se de um resultado importante:

Hipótese 3: Ck>30

DI (I) DII (Ck) DIII (Cw) DIV (G) DV (X) Total

Salários 50.476.164 59.061.931 107.263.950 119.330.106 19.535.785 355.667.936

Lucros 72.866.711 81.997.375 161.180.378 15.910.204 26.210.119 358.164.787

Valor Adicionado 123.342.875 141.059.306 268.444.328 135.240.310 45.745.904 713.832.723

Fonte: elaboração própria

Quadro 11 - Cenário 2

em R$ Mil de 1996

Note-se que o resultado acima reflete um crescimento razoável com relação ao valor

adicionado de 1996. A mudança de R$ Mil 696.968.706 para R$ Mil 713.832.723 representa

um crescimento de 2,4%. Em suma, assumindo-se hipóteses bastante conservadoras como a

manutenção do padrão distributivo de 1990 e consumo dos capitalistas acima de vinte salários

mínimos, obtém-se um resultado considerável em termos de crescimento.

No que toca aos impactos sobre a produção, o seu crescimento deveria ser de 2,5% para

atender ao crescimento da demanda. A tabela abaixo mostra quais setores teriam maior

necessidade de crescimento:

Total - Base Total - Sim. Variação

FABRICAÇÃO DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS E DE PERFUMARIA 11.420.610 11.974.030 4,8%

RESFRIAMENTO E PREPARAÇÃO DO LEITE E LATICÍNIOS 8.952.669 9.385.730 4,8%

ABATE E PREPARAÇÃO DE CARNES 18.708.349 19.607.959 4,8%

BENEFICIAMENTO DE PRODUTOS DE ORIGEM VEGETAL 21.669.292 22.688.345 4,7%

FABRICAÇÃO DE ARTIGOS DO VESTUÁRIO E ACESSÓRIOS 9.957.598 10.412.933 4,6%

OUTRAS INDÚSTRIAS ALIMENTARES E DE BEBIDAS 28.730.630 30.038.091 4,6%

AGROPECUÁRIA 95.973.827 99.877.788 4,1%

ALUGUEL DE IMÓVEIS 100.141.706 104.084.706 3,9%

SERVIÇOS INDUSTRIAIS DE UTILIDADE PÚBLICA 33.378.321 34.608.883 3,7%

INDÚSTRIA TÊXTIL 18.133.010 18.775.448 3,5%

TRANSPORTE 44.309.712 45.874.773 3,5%

FABRICAÇÃO E REFINO DE ÓLEOS VEGETAIS 13.907.888 14.389.580 3,5%

COMÉRCIO 93.587.836 96.736.209 3,4%

INDÚSTRIA DO AÇÚCAR 5.997.571 6.195.696 3,3%

SERVIÇOS PRESTADOS ÀS FAMÍLIAS 86.500.532 89.200.623 3,1%

REFINO DE PETRÓLEO E INDÚSTRIA PETROQUÍMICA 44.463.431 45.770.488 2,9%

SERVIÇOS PRIVADOS NÃO-MERCANTIS 9.004.388 9.267.757 2,9%

INDÚSTRIA DO CAFÉ 6.583.284 6.773.228 2,9%

FABRICAÇÃO DE PRODUTOS QUÍMICOS DIVERSOS 17.851.987 18.366.362 2,9%

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 6.365.583 6.544.454 2,8%

COMUNICAÇÕES 15.760.645 16.202.005 2,8%

FABRICAÇÃO DE ELEMENTOS QUÍMICOS NÃO-PETROQUÍMICOS 13.044.400 13.409.241 2,8%

FABRICAÇÃO DE CALÇADOS E DE ARTIGOS DE COURO E PELES 6.029.082 6.190.276 2,7%

APARELHOS E EQUIPAMENTOS DE MATERIAL ELETRÔNICO 16.018.302 16.442.141 2,6%

INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO DE MATERIAL PLÁSTICO 9.599.936 9.837.894 2,5%

PRODUÇÃO TOTAL 1.272.037.766 1.303.666.973 2,5%

Fonte: elaboração própria, a partir de dados do IBGE

Tabela 5 - Setores mais afetados pelo aumento da demanda por bens de consumo dos trabalhadores

73

Na sua maior parte, os setores mais afetados são os mesmos do cenário de referência.

Há apenas alguns proporcionalmente mais impactados, como agropecuária, transporte, material

plástico. Já outros como comércio, indústria têxtil e comunicações, não são tão afetados nesse

cenário.

Com relação ao pessoal ocupado, ao que parece, a elasticidade-renda do emprego é de

fato maior que um, pois, nesse caso, o nível de emprego cresceria em 2,9%, passando para

60.476.142 de trabalhadores empregados. Esse resultado é conseqüência do fato de que os

setores mais afetados pelo aumento de consumo popular são também grandes geradores de

emprego.

Seguindo ainda os passos da seção anterior, foi estimada a variação necessária em cada

componente de demanda final para gerar o nível de produto simulado84. O quadro a seguir

sintetiza os resultados:

I Ck G X

Tx. de Crescimento Requerida 11,0% 6,7% 7,3% 27,9%

Fonte: elaboração própria, a partir de dados do IBGE

Quadro 12 - Tx. De crescimento requerida - Cenário 2

Em suma, mesmo em um cenário conservador, os efeitos de uma redistribuição de

renda em favor dos assalariados são de tal ordem que apenas com ampliações significativas nos

demais componentes da demanda seria possível atingir o mesmo patamar de crescimento.

VI.3 – UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS IMPACTOS DAS DIFERENTES FORMAS DE ESTÍMULO AO CRESCIMENTO SOBRE A BALANÇA COMERCIAL

Em primeiro lugar, vale salientar que, nesta seção, os cálculos baseiam-se

exclusivamente no cenário referencial. Não serão, portanto, realizadas simulações acerca das

necessidades de importações no cenário conservador.

No que se refere às importações, a metodologia utilizada segue o exemplo das

anteriores, diferentemente da proposta de Feijó et. al. (2000). Para esses autores, o

multiplicador de importação deve ser calculado através da utilização da matriz Bm – tabela 17

da MIS – que mostra a necessidade de importação de produtos quando se deseja aumentar uma

unidade monetária na produção das atividades. Por conseguinte, de acordo com esse método,

“uma variação na produção das atividades impactaria as importações de acordo com a seguinte

relação: ∆m = Bm. ∆g” (Feijó et al., 2000, p. 166). Onde ∆m é um vetor de variação da

importação por produto e ∆g é vetor com a variação na produção por atividade. Note-se que a

74

matriz de valor da produção (I-A)-1.d que vem sendo utilizada relaciona a produção por

atividades (ou setores) com as categorias de demanda final. Nesse sentido, é preciso tornar a

matriz Bm compatível para que o cálculo das importações possa ser realizado. A forma de

solucionar esse problema passa pela utilização da matriz de participação setorial na produção

dos produtos nacionais –matriz D. Ao multiplicarmos esta matriz pela Bm, temos uma matriz

que mostra a necessidade de importação por setores quando se deseja aumentar a produção das

atividades em uma unidade monetária. Dessa forma, o vetor ∆m passa a representar a variação

da importação por atividade, de modo que: ∆m = D.Bm. ∆ (I-A)-1.d .

O método descrito acima (método 1), todavia, apresentou um resultado muito diferente

do valor das importações efetivamente observado. Desse modo, optou-se por seguir a

metodologia empregada no cálculo da estimativa do pessoal ocupado (método 2). Em outros

termos, da tabela 1 da MIP, foram obtidos os dados de importações por produto. Multiplicando

a matriz D pela matriz anterior, é possível descrever as importações por setor. Uma vez obtidas

as importações por setor, é possível criar um indicador de importações/valor da produção e,

então seguir a metodologia utilizada para o cálculo do pessoal ocupado. Nesse caso, as

importações podem ser calculadas da seguinte forma: M = m.(I-A)-1.d., onde m é uma matriz

que, para cada setor, apresenta a relação importações/valor da produção.

Antes de apontar os resultados dessa simulação com as necessidades de importação,

convém mostrar os valores gerados por cada método. Dessa forma, fica mais claro

compreender o porquê da opção pelo segundo método:

V a l o r R e a l M é t o d o 1 M é t o d o 2

6 9 . 3 1 0 . 5 8 4 4 2 . 6 9 4 . 3 5 1 6 8 . 4 4 0 . 7 8 6

F o n t e : e l a b o r a ç ã o p r ó p r i a e I B G E ( 1 9 9 6 )

Q u a d r o 1 3 - N e c e s s i d a d e d e I m p o r t a ç õ e s

I m p o r t a ç õ e s e m R $ M i l d e 1 9 9 6

Como pode se observar, o método 2, de fato, apresenta um resultado muito mais

próximo da realidade do que o descrito pelo método 1.

Uma vez demonstradas as razões para a utilização do segundo método, vejamos então

como ficaria o acréscimo nas necessidades de importações em virtude de uma volta ao padrão

de apropriação da renda de 1990: por definição, só o consumo dos trabalhadores cresce com

alteração na distribuição de renda, pois os departamentos são verticalmente integrados. Daí, um

crescimento de 8% no consumo dos trabalhadores levaria a um aumento de 3,3% das

importações, necessárias para a produção do departamento III.

84 Dispensa-se aqui maiores detalhes técnicos, já que a abordagem é semelhante à da seção anterior.

75

Mais uma vez, assim como, o pessoal empregado, em virtude de um aumento de 8% no

consumo dos trabalhadores, as importações necessárias para atender a esse consumo também

devem crescer à mesma taxa. Com isso, o aumento total das importações deve ser da ordem de

3,3%, um pouco acima do crescimento da renda. Vale destacar, contudo, que a relação

importações/PIB permanece a mesma: 9,8%.

Diferentes formas de crescimento levam a diferentes impactos sobre as importações e,

portanto, sobre a balança comercial. Em um país como o Brasil, que enfrenta um déficit

estrutural na balança de serviços, um bom desempenho comercial é essencial para aliviar a

escassez de divisas sem depender de um bom resultado na conta de capital. Assim, o intuito

aqui é avaliar, à luz das estimativas realizadas, os impactos sobre as importações decorrentes

das diferentes formas apontadas no item anterior de se obter um crescimento de 3% da renda.

Como já foi visto, tomando-se 1996 como base, o efeito de uma redistribuição de renda

que a levasse de volta ao patamar de 1990 sobre as importações seria de um aumento de 3,3%.

A mesma conta, aplicando-se a mesma metodologia, foi realizada para avaliar o incremento na

necessidade de importações se o crescimento da renda fosse derivado do aumento na produção

de cada departamento. Esses valores são consolidados no quadro a seguir:

DI (I) DII (Ck) DIV (G) DV (X)

Tx. De Crescimento das Importações 2,8% 2,1% 0,5% 4,3%

Total das Importações 70.332.415 69.863.985 68.788.205 71.364.688

Fonte: elaboração própria, a partir de dados do IBGE (1996)

Quadro 14 - Tx. de Crescimento das Importações decorrentes do acréscimo de produção em cada departamento

É justamente o departamento que produz bens para exportação que demandaria um

maior nível de importações. Apesar disso, não se pode deixar de ter em mente que esse

departamento estaria tendo um brutal aumento de 32% na sua produção. Desse modo, é

interessante avaliar a elasticidade – produção das importações, isto é, avaliar em quantos por

cento aumentariam as importações em decorrência de um acréscimo de 1% na produção de

cada departamento85. Desse modo,

D I ( I ) D I I ( C k ) D I I I ( C w ) D I V ( G ) D V ( X )

E l a s t i c i d a d e 0 , 2 1 0 , 2 1 0 , 3 9 0 , 0 6 0 , 1 3

F o n t e : e l a b o r a ç ã o p r ó p r i a

Q u a d r o 1 5 - E l a s t i c i d a d e - p r o d u ç ã o d a s i m p o r t a ç õ e s

85 Para avaliar a elasticidade no caso da redistribuição, optou-se por comparar o aumento das importações ao aumento na produção de bens de consumo para trabalhadores, que seria de 8,4%.

76

Com isso, é possível avaliar os impactos de cada departamento sobre as importações.

Não cabe nesta dissertação, contudo, se deter sobre uma análise dos motivos que levam a esse

comportamento das importações.

Embora as exportações, conforme o quadro 14, requisitem maiores importações a fim

de fazer frente ao incremento da produção, deve-se destacar que

[apenas o] aumento das ‘exportações externas’ realmente cobre o crescimento das importações por meio do comércio internacional (...). Isso mostra o fato de que as ‘exportações internas’ levam a uma deterioração do balanço de comércio exterior (Kalecki, 1977, p. 49, grifo do autor)86.

Sem dúvida, o crescimento, quando puxado pelas exportações tem o benefício de ainda

melhorar as contas externas. Já quando o crescimento é impulsionado pelos demais fatores, a

tendência é aumentar o desequilíbrio externo. Vale notar, entretanto, que a necessidade de um

aumento de R$ Mil 2.000.000 nas importações, em média, não deveria constituir um fator de

restrição ao crescimento econômico, uma vez que não se trata de uma soma tão significativa

assim (cerca de 10% do total importado, ou 0,3% do PIB). Desse modo, será suposto aqui que

as novas necessidades de importações não seriam um fator impeditivo ao aumento da

produção.

Em síntese, embora as exportações realmente apresentem um efeito benéfico sobre o

balanço de pagamentos, é preciso levar em conta que basear a política de crescimento

econômica exclusivamente na promoção de exportações não é uma boa alternativa. Afinal,

segundo as estimativas realizadas, para se obter um crescimento de 3% da renda, ceteris

paribus, é necessário um crescimento de 32% das exportações.

No que concerne a uma política redistributiva, é interessante notar que uma

redistribuição modesta (que voltasse ao padrão distributivo de 1990) é capaz de gerar a mesma

taxa de crescimento, de 3%, e, não obstante amplie o déficit na balança comercial, produz um

efeito considerável de aumento do bem-estar para a população87.

VI.4 – COMENTÁRIOS ADICIONAIS

Neste capítulo, procurou-se demonstrar que os efeitos de uma redistribuição seriam

positivos para o crescimento econômico. Deve-se ter em conta, no entanto, que para que o

86 Note-se que Kalecki (1977) quando se refere a “exportações internas”, está tratando de investimento e gastos do governo. 87 Vale lembrar que o salário médio cresceria cerca de 7% no cenário 1 das simulações.

77

aumento da demanda de bens de consumo dos trabalhadores leve a um crescimento

sustentável, é preciso que haja capacidade de ampliação da oferta daqueles bens. Em outras

palavras, deve existir capacidade ociosa suficiente para que a oferta não represente um

empecilho ao crescimento econômico derivado de um aumento da participação de salários na

renda. Caso contrário tal ampliação da demanda geraria apenas pressões inflacionárias, sem

impactos sobre o nível de renda real.

Essa preocupação, embora relevante, não será tratada nesta dissertação, pois um estudo

sobre utilização de capacidade nos diversos setores já é por si só tema suficiente para um outro

trabalho. Assim, será feita, como assume Kalecki (1977) no plano teórico, a hipótese de

existência de capacidade ociosa suficiente para cobrir as necessidades adicionais de produção

decorrentes da ampliação da demanda por bens de consumo dos trabalhadores88. Desse modo,

simplifica-se a análise, uma vez que não se precisa decompor os impactos sobre a inflação e

sobre o produto real.

Vale, ainda, um comentário final a respeito dos aspectos positivos de uma

redistribuição sobre o crescimento. Até o momento, toda a análise foi baseada em uma estática

comparativa, na qual os efeitos de uma mudança na distribuição sobre o nível do produto são

avaliados. Entretanto, partindo-se para uma análise dinâmica, pode-se dizer que, na medida em

que melhore o poder aquisitivo de boa parte da população, as expectativas dos empresários

reverteriam, tornando-os mais otimistas com relação às vendas no DII e, por conseguinte,

levando a um aumento nos investimentos (DI). Por conta disso, o efeito total de aumento da

renda poderia ser ainda maior do que o previsto pelas simulações.

88 De fato, a capacidade utilizada tem se mantido por volta de 80% da capacidade instalada. Desse modo, um estrangulamento da capacidade não parece constituir um fator de restrição ao crescimento no curto prazo. A respeito, ver Giambiagi (2002).

78

VII – COMENTÁRIOS FINAIS

Procurou-se neste trabalho mensurar os efeitos de uma possível redistribuição de renda,

que resgatasse o padrão distributivo de 1990 sobre o nível do produto de 1996. Com isso,

procurou-se estimar, ainda que de forma preliminar, a possibilidade de crescimento derivado

de uma melhor distribuição da renda.

Faz-se necessário, contudo, lembrar que esta conclusão só é possível a partir de um

contexto teórico kaleckiano, baseado no princípio da demanda efetiva, em contraposição à

abordagem neoclássica mainstream. Esta preconiza uma relação negativa entre desigualdade e

desempenho econômico em virtude das possíveis ineficências geradas pela desigualdade.

Desse modo, a idéia é que uma eliminação dessas ineficiências possibilita um aumento da

oferta, gerando crescimento econômico. Mostra-se, portanto, que, apesar de chegarem a

conclusões semelhantes, o caminho trilhado por neoclássicos e Kalecki é totalmente diferente.

Vale notar que os efeitos sobre a oferta apontados por esses autores não devem ser descartados,

e sim relativizados: o que define o nível do produto é a demanda. Se, no entanto, a oferta não

for capaz de suprir aquela demanda, então haverá problemas de crescimento.

No que concerne aos aspectos metodológicos, como já foi dito, esta dissertação se

insere em um grupo de trabalhos que estuda distribuição e crescimento através de simulações

com matrizes insumo-produto. Dentre aqueles trabalhos, a filiação mais forte remete a Tauile e

Young (1991), porém com algumas diferenças, as quais foram expostas no capítulo V. Além

disso, há uma outra diferença na realização das simulações, uma vez que não era possível

calcular os multiplicadores da renda para outro ano além de 1996 pelos motivos já

apresentados. Desse modo, optou-se por realizar as simulações com a distribuição de renda ao

nível microeconômico. Destarte, ao buscar transpor um problema com os dados, esta

dissertação aproxima-se ainda mais da teoria kaleckiana, segundo a qual a distribuição da

renda é determinada microeconomicamente, através do processo de formação de preços. Desse

modo, pode-se dizer que os exercícios realizados nesta dissertação coadunam-se de modo

integral à base teórica utilizada.

Finalmente, foram apresentados os resultados dos exercícios que demonstram o

potencial de crescimento que reside em uma redistribuição da renda. Ao aumentar o consumo

dos trabalhadores, sem reduzir os demais componentes da demanda agregada, o valor

adicionado da economia atinge um maior nível. Este nível, em 1996, seria até 3,0% maior do

que de fato observado, em virtude de uma redistribuição em favor dos assalariados. Saliente-se

79

que, além do valor adicionado, o nível da produção, o volume de emprego e as importações

também cresceriam, respectivamente 3,1%, 3,6% e 3,3%. Portanto, a fim de garantir mais

sustentação ao resultado acima referido, foi calculado o impacto que esta redistribuição teria

sobre a balança comercial, uma vez que a década de 90 foi marcada pela vulnerabilidade

externa. Conclui-se que o impacto seria pequeno, já que a relação importações/PIB

permaneceria inalterada, de modo que o crescimento derivado de uma redistribuição em favor

dos assalariados não teria que ser abortado em função de uma possível restrição externa.

Embora consista em uma análise contra-factual, este tipo de estudo possibilita

interessantes insights com relação a que políticas se adotar. Trata-se de um exercício de

estática comparativa, segundo o qual, alterando-se os parâmetros distributivos, avalia-se o

impacto sobre o nível de renda. Vale notar, todavia, que é possível transpor esses resultados

para um contexto dinâmico: o aumento resultante na demanda por bens de consumo para

trabalhadores levaria a maiores lucros das empresas nesse departamento. Com isso, uma

expectativa de maiores lucros futuros poderia levar a um acréscimo no nível de investimentos,

gerando uma trajetória sustentável de crescimento.

Em um país que enfrenta um longo período de baixo crescimento e com extrema

desigualdade, políticas que visem a estimular o crescimento econômico e à redução da

desigualdade fazem-se necessárias. Para isso, é preciso conhecer as relações causais entre

aqueles fenômenos e, ademais, ter-se uma idéia do tamanho dos impactos de uma

redistribuição sobre a economia. Foi neste sentido que esta dissertação buscou contribuir,

teórica e empiricamente, ao trazer à tona uma visão dos impactos sobre a demanda de uma

mudança distributiva e ao oferecer uma estimativa de quanto o nível de renda, na década de

noventa, se ampliaria em decorrência de uma melhor distribuição de renda.

80

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