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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES AVM FACULDADE INTEGRADA PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU FABIANA VILLARDO MOREIRA O TRÁFICO DE DROGAS E A NÃO APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA RIO DE JANEIRO 2016 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL - … · Vivemos o surgimento e o enfrentamento de uma nova espécie de criminalidade que tem caráter transnacional, como o tráfico

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

AVM FACULDADE INTEGRADA

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

FABIANA VILLARDO MOREIRA

O TRÁFICO DE DROGAS E A NÃO APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA

INSIGNIFICÂNCIA

RIO DE JANEIRO

2016

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

1

FABIANA VILLARDO MOREIRA

O TRÁFICO DE DROGAS E A NÃO APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Monografia apresentada à Universidade Candido Mendes/ AVM Faculdade Integrada como requisito para obtenção do grau de especialista em Direito e Processo Penal.

Orientador: JEAN ALVES.

RIO DE JANEIRO

2016

2

PENSAMENTO

“A acusação é sempre um infortúnio enquanto não verificada pela prova”.

Rui Barbosa

3

RESUMO

O Princípio da Insignificância vem atuar como instrumento de interpretação

restritiva do Direito Penal e, consequentemente, de descriminalização Judicial, porém, é

necessária a adequação técnica do Princípio às decisões judiciais.

De acordo com a Ministra do Superior Tribunal de Justiça Maria Thereza Moura,

o delito de tráfico de drogas não pode ser considerado insignificante, visto que se cuida de

delito de perigo abstrato praticado contra a saúde pública.

Cumpre-nos ponderar que, em verdade, no tráfico de drogas o fundamento da

recusa do argumento utilizado é o relevante grau de ofensividade concreta (perigo concreto)

para bens jurídicos de terceiros. O tráfico de drogas (em geral) causa consequências drásticas

para toda a sociedade e diante de um fato significantemente relevante (ou grave) não se aplica

o princípio da insignificância. Não basta, apenas, a insignificância do objeto jurídico tutelado

pela norma, mas o grau de intensidade em que esses bens jurídicos são atingidos pela conduta.

É por isso que ele não vem sendo admitido no delito de tráfico de drogas.

O Princípio da Insignificância, que será analisado posteriormente, é originário da

opção da sociedade brasileira de construir o seu Sistema Penal pautado na ideia do Estado

Democrático de Direito que deve assegurar aos cidadãos a efetividade de seus princípios

elevando ao patamar constitucional os direitos fundamentais destes, assegurando suas

liberdades individuais, de forma a limitar a intervenção estatal em suas vidas, reservando o

poder de punir situações extremamente necessárias.

Vivemos o surgimento e o enfrentamento de uma nova espécie de criminalidade

que tem caráter transnacional, como o tráfico internacional de drogas, de armas e de pessoas,

de órgãos e de corrupção e lavagem de dinheiro. Além daqueles crimes praticados contra

humanidade, seja pelos governos tiranos ou pelas guerras civis ou entre nações.

O enfrentamento dessa nova criminalidade deve ser feito através da criação de

legislações internacionais e da assinatura de tratados nessa magnitude e de outras soluções

que contemplem a participação das administrações nacionais.

O Direito Penal legítimo representa um limite máximo do poder punitivo do

Estado. Este modelo deve estar em harmonia com um Estado e uma sociedade civil que

promovam políticas públicas e particulares, no sentido de propiciar a minimização das

desigualdades sociais e possibilitar o favorecimento da edificação da cidadania, em que sejam

4

garantidos os seus direitos fundamentais à subsistência, à vida, à saúde, à educação. Verifica-

se hoje que o estado nem sempre promove estas políticas.

5

ABSTRACT

The Principle of insignificance is acting as an instrument of restrictive

interpretation of criminal law and, consequently, the Judicial decriminalization, however, is

necessary to the technical adequacy principle to judicial decisions.

According to the Minister of the Superior Court of Justice Maria Thereza Moura,

the offense of drug trafficking can not be considered negligible, since it takes care of the

offense charged abstract danger to public health.

We must consider that, in fact, the drug traffic is the foundation of the refusal of

the argument used is the relevant degree of offensiveness concrete (concrete danger) to legal

interests of third parties. Drug trafficking (in general) cause drastic consequences for the

whole society and before a fact significantly relevant (or severe) does not apply the principle

of insignificance. Not enough merely the insignificance of the object protected by the legal

norm, but the degree of intensity of these legal rights are affected by the conduct. That's why

he has not been admitted to the crime of drug trafficking.

The principle of insignificance, which will be discussed later, comes from the

choice of Brazilian society to build its penal system grounded in the idea that a democratic

state should ensure citizens the effectiveness of its principles by raising the level of these

fundamental constitutional rights, ensuring their freedoms, so as to limit state intervention in

their lives, reserving the power to punish to extremely necessary.

We live in the emergence and facing a new kind of transnational crime that has,

as the international trafficking of drugs, arms and people, and organ of corruption and money

laundering. Besides those crimes against humanity, whether by governments or tyrants or

civil wars between nations.

Facing this new crime should be done through the creation of international laws

and treaties signed by this amount and other solutions that include the participation of national

administrations.

Criminal law is legitimate to a maximum of punitive power of the State. This

model should be in harmony with a state and a civil society that promote public policies and

private, in order to provide minimizing social inequalities and enable favoring the building of

citizenship, as they are guaranteed their fundamental rights to subsistence, life, health,

education. It appears today that the state does not always promote these policies.

6

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 7

1. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA ...................................................................... 10

1.1 Conceito ........................................................................................................... 10

1.2 O Princípio da Insignificância no sistema Penal Vigente ................................ 14

1.3 Tipicidade......................................................................................................... 16

1.4 Exclusão da tipicidade pela utilização do princípio da Insignificância ........... 19

1.5 Críticas ............................................................................................................. 19

2. TRÁFICO DE DROGAS .......................................................................................... 23

2.1 Conceito de Tráfico .......................................................................................... 23

2.2 Conceito de drogas ........................................................................................... 24

2.3 Diferença entre posse e o tráfico de drogas ..................................................... 24

2.4 Lei de Drogas – Lei nº 11.343/2006 de 23 de Agosto de 2006 ....................... 26

2.5 Aspectos Processuais do Crime de Tráfico de drogas ..................................... 28

3. A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E O TRÁFICO DE DROGAS ....................................................................................................................... 29

3.1 Critérios subjetivos na aplicação do Princípio da Insignificância ................... 29

3.2 Entendimentos e Divergências Jurisprudenciais .............................................. 29

CONCLUSÃO ............................................................................................................... 37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 41

7

INTRODUÇÃO

O objeto do presente trabalho é o tráfico de drogas e a não aplicação do princípio

da insignificância, sempre com objetivo de assegurar a máxima tutela dos direitos

fundamentais.

O tema em estudo é frequente em nossa sociedade, tendo sido causa de grande

sofrimento pelas mazelas apresentadas pelo consumo de drogas.

Os índices criminais estão crescentes com relação ao crime de tráfico de drogas, e

o envolvimento de viciados em diversos delitos, principalmente os contra o patrimônio, que é

cada vez mais elevado. A população carcerária cresce na medida em que o combate é

intensificado pelos órgãos que compõe o sistema de defesa social.

A sociedade atual é caracterizada pelo risco e pela globalização, que estão

presentes nos anseios das pessoas e do Estado, quando questões inerentes à justiça e suas

ramificações são postas, suscitando um enfrentamento rápido e eficaz, soberano e forte por

parte do Estado.

O Direito Penal não deve ser encarado como a panaceia de todos os males, pelo

contrário, deve ser visto sempre com a ultima ratio do direito, atuando apenas quando da

efetiva afetação do bem jurídico tutelado, que assim seja feito.

Ultima ratio significa “última razão” ou “último recurso”. Diz-se que o Direito

Penal é a ultima ratio, ou seja, é o último recurso ou último instrumento a ser usado pelo

Estado em situações de punição por condutas castigáveis, recorrendo-se apenas quando não

seja possível a aplicação de outro tipo de direito.

Também chamado de Princípio da Intervenção Mínima, não estando

expressamente inscrito na Constituição Federal, é um princípio limitador do poder punitivo

estatal, impondo-se como o caminho inevitável para conter possíveis arbítrios do Estado.

Mostrar-se o que se entende por ultima ratio, está sendo invertido, pois se o

âmbito administrativo não tenta diminuir a impunidade, está na hora do Direito Penal agir.

Não se deve confundir justiça social com impunidade. Não se trata de fechar os

olhos diante da realidade, mas sim, de aplicar a norma com exatidão dentro dos ditames

constitucionais, aplicando-se o direito de forma igualitária a todos.

O Direito Penal é concebido como uma ferramenta de controle de conflitos

sociais, que se constitui também como instrumento capaz de proteger os direitos fundamentais

8

de todo e qualquer ser humano, tutelando tanto os que não cometeram delitos, como aqueles

que cometeram, ao evitar a aplicação de penas injustas e arbitrárias.

Estamos todos expostos à violência que coloca em risco a nossa segurança, isto é,

a observância dos direitos fundamentais.

Valores como eficiência e funcionalismo são a todo tempo utilizados como forma

de tornar obscuro o discurso de um Direito Penal alicerçado no modelo de democracia

contextual em que as instituições e práticas sociais estão voltadas à efetividade dos direitos

fundamentais.

Há hoje uma imposição de um controle penal social com a aplicação de penas

mais duras e sendo assim, com o aumento do encarceramento, ocorre o aumento da

segregação penal daqueles que são sujeitos excluídos da economia globalizada.

Sabe-se hoje, que a criminalidade acontece tanto nos bairros nobres quanto nas

periferias. Nestas, há uma propensão maior devido especialmente ao tráfico de drogas e suas

conseqüências junto à população local.

Não é tarefa que demanda profunda pesquisa demonstrar que as comunidades

inseridas em zonas de alta vulnerabilidade social são as que mais estão expostas à ação e

cooptação dos traficantes. Nestes locais, o hiato social deixado pelo Estado está propiciando a

ação do tráfico, uma vez que a falta de moradia, educação, saúde, emprego, renda e lazer

fazem com que as pessoas, crianças, jovens e adultas se tornem alvos fáceis do assédio dos

chefes do tráfico local.

A falta de infraestrutura e de políticas públicas voltadas para o atendimento a

comunidades carentes permite aos traficantes, por meio do oferecimento de benefícios como

cestas básicas, medicamentos, roupas, calçados, assistência médica, moradia, lazer (bailes

funks), dinheiro e sem causar nenhum espanto, instrução (pagamento de cursos jurídicos para

formar advogados que irão atuar no tráfico), formar uma rede local de colaboradores fiel e

submissa às regras impostas pelo poder paralelo.

O Direito é uma forma de controle social, que deve garantir a convivência de

todos os cidadãos, e o Direito Penal revela a sua faceta mais drástica quando há violação a

bens jurídicos fundamentais. Assim, assume determinadas proporções e não há outros meios

de controle social que se mostrem eficazes, utilizando-se os instrumentos desse ramo do

Direito para resolver os conflitos.

Todas as razões mencionadas acima me levaram a escolher esse tema de tão

grande importância e que se tornou um problema de toda sociedade, levando ao aumento do

9

índice de criminalidade e, consequentemente, gerando grande preocupação para os indivíduos,

que cada vez mais querem ver o Estado atuando e criando políticas para que o tráfico de

drogas seja controlado e que haja uma punição adequada. E, conforme posicionamento da

doutrina e Jurisprudência não se deve aplicar tal princípio nesse tipo de crime.

10

1. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

1.1 Conceito

Inicialmente, Princípio, na conceituação de Miguel Reale1, são enunciações que

condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico em sua aplicação, integração

e até mesmo para a elaboração de novas normas.

São normas que ordenam que algo seja cumprido, de acordo com as

possibilidades fáticas e jurídicas existentes.

Tem por base a máxima "minimis non curat praetor", isto é, o Magistrado não

deve cuidar de questões insignificantes.

São responsáveis pela busca da constitucionalização do direito, orientando o

ordenamento jurídico na interpretação das normas.

De acordo com Fernando Capez:

Segundo tal preceito, não cabe ao Direito Penal preocupar-se com bagatelas, do mesmo modo que não podem ser admitidos tipos incriminadores que descrevam condutas totalmente inofensivas ou incapazes de lesar o bem jurídico. 2

Ainda segundo o autor, o princípio não pode ser considerado em termos abstratos

e exemplifica: “Desse modo, o referido preceito deverá ser verificado em cada caso concreto,

de acordo com as suas especificidades. O furto, abstratamente, não é uma bagatela, mas a

subtração de um chiclete pode ser.” 3

O princípio da insignificância foi formulado pelo célebre Jurista Alemão CLAUS

ROXIN 4, o qual propôs a interpretação restritiva aos tipos penais, com a exclusão da conduta

do tipo a partir da insignificante importância das lesões ou danos aos interesses sociais.

Relacionado com o axioma mínima non cura praeter, enquanto manifestação contrária ao uso 1 REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 37. 3 Ibidem

4 ROXIN, Claus. Derecho Penal, parte geral. Trad. Diego-Manuel Luzón-Peña. Et al. Madrid: Civitas, 2003, P.73-74.

11

excessivo da sanção criminal, devem ser tidas como atípicas as ações ou omissões que afetem

infimamente a um bem jurídico-penal.

No Brasil, o Princípio da Insignificância é um princípio puramente doutrinário,

não existe definição no ordenamento jurídico, seja em leis, códigos ou até na constituição

Federal. Apenas doutrina e a jurisprudência afirmam e defendem sua existência e

aplicabilidade, procurando conceituá-lo.

O princípio da insignificância quer dizer utilizar-se do Direito Penal, que é a

forma mais violenta de intervenção do Estado na vida e nos direitos fundamentais do cidadão,

apenas nos casos em que exista uma lesão a um bem juridicamente protegido pela norma

penal e quando fracassarem as demais instâncias de controle social (família, religião, escola,

mídia, Estado, Direito, etc.). Porém, não basta apenas a insignificância do objeto jurídico ou

material tutelado pela norma, mas o grau de intensidade em que esses bens são atingidos pela

conduta. Insignificante, quer dizer ninharia, algo irrisório, que não se trata de um ataque

intolerável a determinado bem jurídico, que justifique a intervenção penal. Tal princípio visa

estabelecer limites para a tipificação penal.

O Direito penal, por sua natureza fragmentária, só vai até aonde seja necessário

para a proteção do bem jurídico, não devendo ocupar-se de bagatelas.

Ao tratarmos da relevância e ofensividade ao bem jurídico tutelado pelo Direito

Penal, não poderíamos deixar de mencionar a ideia de nullum crimen sine injuria, ou seja, não

há infração penal sem ofensa ou ataque não só efetivo, mas também relevante. A construção

desta tese tem como supedâneo os postulados garantistas no ordenamento jurídico brasileiro,

por meio de princípios constitucionais implícitos que se relacionam com a concepção

democrática de Estado de Direito.

Como define ROXIN 5, o legislador não possui competência para, em absoluto,

castigar pela sua imoralidade condutas não lesivas a bens jurídicos.

Com efeito, ROXIN 6 reconhecia que a insignificância não era característica do

tipo delitivo, mas sim um auxiliar interpretativo seu, a fim de restringir o teor literal do tipo

formal, conformando-o a condutas socialmente admissíveis, em decorrência de suas ínfimas

lesões aos bens juridicamente tutelados.

O princípio em estudo dispõe que:

5 Ibidem, p. 29.

6 Ibidem, p. 30

12

(...) é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal. Amiúde, condutas que se amoldam a determinado tipo da pena, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material. Nestas circunstâncias, pode-se afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado. 7

Conforme Eugenio Raul Zaffaroni 8, a insignificância só pode surgir à luz da

função geral que dá sentido à ordem normativa e, consequentemente, a norma em particular, e

que nos indica que esses pressupostos estão excluídos de seu âmbito de proibição. O que

resulta impossível de se estabelecer à luz de sua consideração isolada.

Tal princípio também é conceituado por Luis Regis Prado:

(...) devem ser tidas como atípicas as ações ou omissões que afetem infimamente a um bem jurídico penal. A irrelevante lesão a do bem jurídico protegido não justifica a imposição de uma pena, devendo excluir-se a tipicidade da conduta em casos de danos de pouca importância. 9

É imperioso destacar que insignificante não significa inexistente Para que um fato

seja considerado delito é necessário haver tipicidade, antijuricidade e culpabilidade. O

princípio da insignificância atua de modo a impedir a caracterização da tipicidade.

Nas palavras do Ministro Celso de Mello:

Postulado da insignificância e a função do direito penal: de minimi, non curati praetor. O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante,

7 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. Vol. 1. 13ª Ed. São Paulo: Saraiva 2008, p. 21.

8 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Derecho Penal: Parte General. Buenos Aires: Ediar, 2002, p.475.

9 PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 146.

13

seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social. 10

E ainda de acordo com o Ministro do STF Celso de Mello:

O princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentaridade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. (...) Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público. 11

Para Luiz Flávio Gomes, têm-se:

(a) escassa reprovabilidade; (b) ofensa a bem jurídico de menor relevância; (c) habitualidade; (d) maior incidência nos crimes contra o patrimônio e no trânsito, além de uma característica de natureza político-criminal, qual seja, a da dispensabilidade de pena do ponto de vista da prevenção geral, se não mesmo sua inconveniência do ponto de vista da prevenção especial. 12

Para Assis Toledo13, o princípio da insignificância, que se revela por inteiro pela

sua própria denominação, o direito penal, por sua natureza fragmentária, só vai aonde seja

necessário para a proteção do bem jurídico. Não deve ocupar-se com bagatelas.

Há duas modalidades de infração bagatelar própria: a primeira reside na

insignificância da conduta, no desvalor da ação (desaparece nesse caso o juízo de

desaprovação da conduta); a segunda na do resultado (não há que se falar em resultado

jurídico desvalioso). A infração bagatelar própria está regida pelo princípio da insignificância

(fato atípico - não há tipicidade material). 10 Brasil. STF. HC nº 84.687/ MS . Proferido pelo Ministro do STF Celso de Mello. Brasília. 25.10.2004.

11 Ibidem.

12 GOMES, Luiz Flávio. Princípio da insignificância e requisitos subjetivos. Disponível em http://www.lfg.com.br- 27 de abril de 2013. Acesso em 28.03.2013.

13 ASSIS, Jorge Cesar de. Comentários ao Código Penal Militar, 6ª edição. Curitiba: Juruá, 2007, p.159.

14

De acordo com CEZAR ROBERTO BITENCOURT14, para que se tipifique algum

crime, em sentido material, é indispensável que haja, pelo menos, um perigo concreto, real e

efetivo de dano a um bem jurídico penalmente protegido.

Os delitos de perigo concreto ou efetivo têm expressamente estabelecido no tipo,

a necessidade de que haja provocado uma situação de perigo (resultado de perigo). A

consumação de um crime de perigo concreto requer a comprovação por parte do julgador, da

proximidade do perigo ao bem jurídico e a capacidade lesiva do risco.

Adotamos, portanto, a teoria de que por este princípio exclui-se a tipicidade

material do crime por ausência de seu elemento material, como será demonstrado neste

trabalho mais adiante.

1.2 O Princípio da Insignificância no sistema Penal Vigente

Os princípios possuem uma importantíssima função no direito penal, pois devem

dar base, limitar e garantir que tanto no momento de se criar as normas, como no da

aplicação, sejam respeitados os direitos fundamentais do indivíduo, de forma que tanto o

legislador quanto o intérprete da lei utilize os princípios de forma a pautar seus atos com

observância aos preceitos constitucionais inerentes e indissociáveis em um Estado

Democrático de Direito. Norteiam o Direito Penal funcionando como elementos de

direcionamento na aplicação das leis e na proteção dos direitos. Delimitam a atuação do

Estado no sentido de tornar o sistema penal ultima ratio, ou seja, como última possibilidade

de controle a ser utilizada, quando os outros ramos do Direito em si, não tenham como

proteger os direitos e garantias fundamentais em que se estabelece o princípio da humanidade

ou dignidade da pessoa humana.

O Direito Penal não almeja apenas a punição como forma das finalidades de seus

tipos penais, mas juntamente, a proteção dos bens considerados mais significantes para

mantença dos ideais da sociedade, impondo determinadas penas, com o intuito de assegurar o

respeito a tais valores, aplicando efetivamente o princípio da exclusiva proteção de bens

jurídicos.

14 BITENCOURT, 2008, p.125.

15

De acordo com o sistema penal vigente para que seja aplicado o princípio da

insignificância são necessários os seguintes requisitos: consideração do valor do bem e as

condições pessoais do autor, pois uma coisa pode ter ínfimo valor para alguns, mas para

outros, ser de grande relevância.

O princípio da insignificância encontra fundamento jurídico principalmente na

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 no capítulo referente aos Princípios e

Garantias Fundamentais, a saber:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos; XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis; 15

Nesse sentido, é o que aponta Rogério Greco:

É nos meandros da Constituição Federal, documento onde estão plasmados os princípio fundamentais de nosso Estado, que deve transitar o legislador penal para definir legislativamente os delitos, se não quer violar a coerência de todo o sistema político-jurídico, pois é inconcebível compreender-se o direito penal, manifestação estatal mais violenta e repressora do Estado, distanciando dos pressupostos éticos, sociais, econômicos e políticos constituintes de nossa sociedade. 16

15 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988.

16 GRECO, Rogério. Curso de Direito penal: parte especial/ volume II: Introdução à Teoria Geral contra a pessoa. 6ed- Niterói, RJ, Impetus, 2009, p. 7.

16

O autor do fato criminoso não deve ficar impune, não é esse o objetivo da

aplicação do Princípio da insignificância. O magistrado deverá ater-se a potencialidade lesiva

do ato, a forma que favoreceu o autor, e se a conduta não tenha causado prejuízo relevante à

vítima, de modo a poder desconsiderá-la como típica, que de outra forma, no caso de

imputação penal e desconsideração da aplicação do princípio, evidentemente revelado como

medida irrazoável e dispendioso, denotando maior oneração estatal para a solução do conflito.

Pode-se dizer que a Constituição exerce papel fundamental, orientando ao

legislador quais os valores fundamentais precisam ser observados na proteção pelo Direito

Penal, devendo ater-se às limitações do poder de legislar, não utilizando desta prerrogativa,

apenas com o intuito punitivo, mas também, de assegurar os bens primordiais dispostos pela

Carta Magna, aplicando os diversos princípios dispostos no ordenamento jurídico, entre os

quais, o princípio da reserva legal, basilar na tipificação penal.

Em nenhum momento podemos confundir os delitos detentores de insignificância

com os crimes de menor potencial ofensivo, que são tratados no artigo 61 da Lei n° 9.099/95,

onde a competência para julgá-los é dos Juizados Especiais Criminais. Nos crimes de menor

potencial ofensivo não existe a insignificância, pois possui gravidade perceptível, ou seja, fere

mesmo que levemente um bem jurídico de terceiro, assim não podendo ser utilizado o

principio em questão.

1.3 Tipicidade

Tipicidade, conforme ROGERIO GRECO17 é a subsunção perfeita entre a conduta

praticada pelo agente ao modelo abstrato previsto na lei penal, isto é, a um tipo penal

incriminador.

Para Zafaroni 18 o tipo penal é um instrumento legal, logicamente necessário e de

natureza predominantemente descritiva, que tem por função a individualização de condutas

humanas penalmente relevantes, por estarem penalmente proibidas.

Conforme preceitua Munoz Conde:

17 GRECO, Rogério. Curso de Direito penal: parte Geral. 11.ed.Rio de Janeiro, Impetus, 2009, p.158.

18 ZAFFARONI, 2002, p. 443.

17

É a adequação de um fato cometido à descrição que dele se faz na lei penal. Por imperativo do princípio da legalidade, em sua vertente do nullum crimen sine lege, só os fato tipificados na lei penal como delitos podem ser considerados como tal. 19

A adequação da conduta do agente ao tipo penal descrito na lei faz surgir a

tipicidade.

Não se deve confundir o tipo com a tipicidade. O tipo é a fórmula que pertence à

lei, enquanto a tipicidade pertence à conduta. Tipo penal é o próprio artigo da lei. Fato típico é

inerente a norma penal.

Um fato típico é uma conduta humana, por isso prevista na norma penal.

Tipicidade é a qualidade que se dá a esse fato.

Típica é a conduta que apresenta característica específica de tipicidade (atípica a

que não apresenta); tipicidade é a adequação da conduta a um tipo; tipo é a fórmula legal que

permite averiguar a tipicidade da conduta.

Tipicidade formal, segundo o ministro do STJ Og Fernandes20, consiste no

enquadramento da conduta do réu no tipo (o crime) previsto na lei penal. O aspecto subjetivo

consiste no dolo (intenção) e a tipicidade material implica verificar se a conduta possui

relevância penal diante da lesão provocada no bem jurídico tutelado.

A tipicidade material é a conduta que provoca uma lesão ou ameaça de lesão

intolerável ao bem jurídico protegido. Está diretamente ligada à relevância da lesão ou do

perigo de lesão que a conduta do agente causou.

Se a pessoa adquirir ou vender o entorpecente com dolo de tráfico, possivelmente

incidirá na conduta descrita como tráfico de drogas, conforme o caput do artigo 33 da Lei de

Drogas. 21

19 MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducción al derecho penal. Barcelona, 1975, p. 41.

20 Brasil. STJ. HC nº 207.444/MS. Proferido pelo Ministro do STJ Og Fernandes. Brasília. 31.08.2011

21 BRASIL. Lei n° 11.343/2006, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Brasília. DF. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11343.htm. Acesso em: março de 2013.

18

Há tipicidade, quando existe um tipo que seja correlato à ação praticada. Para esta

verificação faz-se um juízo de tipicidade, se o resultado deste juízo for positivo, significa que

a conduta analisada reveste-se de tipicidade.

O juiz comprova a tipicidade comparando a conduta particular e concreta com a

individualização típica, para ver se adéqua ou não a ela. Este processo mental é o juízo de

tipicidade que o juiz deve realizar.

A ausência de apreensão da droga não torna a conduta atípica se existirem outros elementos de prova aptos a comprovarem o crime de tráfico, como, por exemplo, a quebra de sigilo telefônico. 22

A ausência de apreensão da droga não torna a conduta atípica se existirem outros elementos de prova aptos a comprovarem o crime de tráfico. No caso, a denúncia fundamentou-se em provas obtidas pelas investigações policiais, dentre elas a quebra de sigilo telefônico, que são meios hábeis para comprovar a materialidade do delito perante a falta da droga, não caracterizando, assim, a ausência de justa causa para a ação penal. 23

Zaffaroni,24 acerca do princípio da insignificância, ampliou o conceito de

tipicidade, agora não visto apenas pelo prisma formal da subsunção, mas somado a ela o

prisma material, na qual a lesividade ao bem jurídico ganha terreno, também devendo esta ser

levada em conta na caracterização da tipicidade (e consequentemente a ausência da lesividade

irá levar à exclusão do crime, pela inexistência da tipicidade da conduta). Tal princípio nada

mais é do que uma decorrência lógica desse novo conceito de tipicidade, denominado pelo seu

autor de "tipicidade conglobante".

Para que haja a tipicidade conglobante, é necessário que haja conduta contrária ao

ordenamento jurídico em geral, em todos os ramos do direito e não apenas ao ordenamento

penal.

Os principais defensores desta teoria são os penalistas Eugênio Raúl Zaffaroni e

José Henrique Pierangelli.

22 Brasil. STJ. HC nº 131.455/MT. Proferido pela Relatora do STJ Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Brasília. 02.08.2012.

23 Ibidem

24 ZAFFARONI, 2002, p. 477.

19

1.4 Exclusão da tipicidade pela utilização do princípio da Insignificância

Nos casos em que é aplicado o princípio da insignificância há os chamados crimes

de bagatela, que são fatos atípicos. Para que a conduta tenha implicações na seara penal não

basta somente a compatibilidade formal com o tipo, mas também é necessário que a infração

cometida pelo agente venha a atingir bens jurídicos que demandem a tutela penal. É o que se

chama de adequação típica material, ou seja, é necessário que se ofenda efetivamente ao bem

jurídico elevado à tutela penal.

A tipicidade penal deve ser entendida perante a análise não só da tipicidade formal, mas também da tipicidade material, ou seja, deverá levar em consideração a relevância do bem jurídico atingido no caso concreto. Desta forma, o Princípio da Insignificância reduz o âmbito de incidência do Direito Penal ao considerar materialmente atípicas condutas que causam insignificantes ofensas ao bem jurídico tutelado, apesar, de serem formalmente típicas. 25

Apesar de formalmente um fato ser típico, é necessário que o bem jurídico

tutelado seja efetivamente lesado ou fique exposto a perigo relevante, o que preencheria o

juízo da tipicidade material.

1.5 Críticas

Alguns autores criticam o princípio da insignificância por não haver previsão legal. Como visto, tal princípio é uma construção dogmática, podendo trazer grande insegurança Jurídica. No entanto, a norma escrita não esgota todo o direito.

A norma escrita não é capaz de conter integralmente a complexidade do direito, e, em razão disso, no campo penal, a construção teórica de princípios como o da insignificância não fere o princípio da legalidade, até porque são amplamente reconhecidas as causas supralegais de exclusão de ilicitude, como, por exemplo, o consentimento do ofendido.

Outra objeção é a incompatibilidade com o Princípio da obrigatoriedade da ação penal.

25 RIBEIRO, Karla Daniele Moraes, Aplicação do Princípio da insignificância, Disponível em: www. ambitojuridico.com. br ,01.12.2011, acesso em 20 de abril de 2013.

20

Três são os argumentos para defender a aplicação, por via analógica, de causas

excludentes, a seguir expostos.

Conforme disposto na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:

“Art. 5º (...) XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia

cominação legal”.

O primeiro diz respeito ao princípio da legalidade (art. 5º, XXXIX, CF/88)

interpretado juntamente com o art. 5º, XL, da Carta Política “A lei penal não retroagirá, salvo

para beneficiar o réu”.

Somando-se estes dispositivos, fica clara a admissibilidade de exceção que

melhore a situação do acusado; se é possível aplicar lei posterior mais benéfica, não há porque

se negar a aplicação de excludente, fundada em preceitos legais, que implique melhoria no

tratamento penal.

O segundo consiste na ideia do reconhecimento da garantia de ampla defesa,

como bem expõe LOPES:

Por ampla defesa deve-se entender o asseguramento que é feito ao réu de condições que lhe permitam trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade. Uma das condições passíveis de ser exigida pelo acusado é a invocação de razão de direito cuja lei é omissa, e.g, inexigibilidade de conduta diversa como causa excludente da culpabilidade. Não se olvide, outrossim, que a garantia da ampla defesa descende diretamente o due process of law do Direito medieval inglês, berço nobre também do princípio da legalidade. 26

O due processo f law , que significa o devido processo legal, é um princípio

fundamental, que abrange os demais princípios. Permite aos litigantes: oportunidade de

defesa; um Juiz imparcial; oportunidade de produzir novas provas; direito de ter um defensor;

decisão fundamentada no conteúdo dos autos, dentre outros.

Art. 5º - (...) LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.

26 LOPES, Maurício Antônio Ribeiro. Princípio da insignificância no direito penal: análise à luz das Leis 9.099/95, 9.503/97 (código de trânsito brasileiro) e da jurisprudência atual. 2. Ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 174.

21

LV – aos litigantes em processo judicial e administrativo, e aos acusados em geral, serão assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios de recurso a ela inerentes. 27

O terceiro argumento vem fundamentado na cláusula de reserva, presente no art.

5º, § 2º, da Constituição Federal, para firmar a ideia de que o emprego de analogia em

benefício do réu no Direito Penal decorre da adoção de direito não expresso pela carta, mas

reconhecível através de seu sistema e princípios adotados. 28

Pelo demonstrado acima não há que se falar em insegurança jurídica, porque o

princípio da insignificância está baseado em preceitos recepcionados expressamente na

Constituição.

Insta salientar que a doutrina e a jurisprudência têm conseguido elaborar, de

acordo com os limites de interpretação permitidos, critérios razoáveis de delimitação de

condutas que devam ser consideradas insignificantes sob a ótica de um direito penal

fragmentário e subsidiário, fugindo do empirismo e da exacerbação da análise caso por caso.

Ademais, ao parâmetro de nocividade social, para precisar a global insignificância

da conduta, devem ser acrescidos os critérios desvalor da ação, do resultado e do grau de

lesividade ou ofensividade ao bem jurídico protegido pelo tipo penal. Deve-se considerar,

ainda, uma antecipada medição da pena, analisando-se a necessidade de sua imposição, já que

poderá não redundar em qualquer benefício para a sociedade ou para o próprio autor do delito.

O ordenamento jurídico deixa claro que a finalidade primordial da pena é a

reprovação e prevenção do crime, ou seja, a pena visa precipuamente a demonstrar ao

transgressor que não lhe é permitido tal conduta, além de tirá-lo de circulação, para que não

cometa outros delitos.

Ainda, visa incutir nos demais cidadãos, a noção de que transgredir a lei enseja

reprimenda e assim não deve agir.

A ressocialização seria efeito secundário que, se alcançado, será ótimo à

sociedade; por outro lado, não é a finalidade primária, devendo ser postergada caso não

possível em um primeiro momento.

27 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988.

28, ibidem, p. 175.

22

Por isso devem ser afastados esses argumentos simplistas de que não é válido

“mandar” autores de pequenos delitos para o cárcere, já que não há ressocialização na cadeia.

23

2 TRÁFICO DE DROGAS

2.1 Conceito de Tráfico

Tráfico de drogas é o tráfico de substâncias ilícitas, entorpecentes.

(...) São proibidos no território nacional o plantio, a cultura, a colheita e a exploração, por particulares, da Dormideira "Papaver somniferum" e a sua variedade "Aìbum" (Papaveraceae), da coca "Erytroxylum coca" e suas variedades (Erytroxilaceac) do cânhamo "Cannibis sativa" e sua variedade "indica" (Moraceae) (Cânhamo da Índia, Maconha, Meconha, Diamba, Liamba e outras denominações vulgares) e demais plantas de que se possam extrair as substâncias entorpecentes mencionadas no art. 1º desta lei e Seus parágrafos.

§ 1º As plantas dessa natureza, nativas ou cultivadas, existentes no território nacional, serão destruídos pelas autoridades policiais, sob a direção técnica de representantes do Ministério da Agricultura, cumprindo a essas autoridades dar conhecimento imediato do fato à Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes.

§ 2º Em se tornando necessário, para fins terapêuticos, fará a finito a cultura das plantas dessa natureza, explorando-as e extraindo-lhes os princípios ativos, desde que haja parecer favorável da Comissão Nacional de Fiscalização do Entorpecente. 29

Atualmente, o crime de tráfico de drogas é a causa de prisão de mais de um quinto

dos presos, e esse número vem crescendo.

A juíza Maria Cecilia Leone, da 19ª Vara Criminal da Barra Funda, São Paulo,

declarou que o crime de tráfico de drogas é um crime grave e que é necessário que seja

aplicada um regime gravoso para que seja compreendida a gravidade de tal conduta.

A autoria e a materialidade no crime de tráfico, via de regra, é comprovada pela

apreensão da droga na posse do investigado/acusado. Todavia, não é apenas através da

apreensão da droga na posse única e exclusiva do indiciado/acusado que restará materializada

a prática delitiva.

29 Brasil. Decreto-Lei 891 de 25.11.1938. Brasília. Publicado no D.O.U. de 28.11.1938.

24

2.2 Conceito de drogas

A nomenclatura drogas é a utilizada preferencialmente pela Organização Mundial

da Saúde- OMS, que há muito tempo não utiliza mais as expressões: narcóticos, entorpecentes

e tóxicos.

Consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar

dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente

pelo Poder Executivo da União, artigo 1º, parágrafo único da Lei de Drogas. Trata-se,

portanto, de uma norma penal em branco.

De acordo com PERILLO “(...) droga é toda substância que, introduzida no

organismo, provoca alterações de ordem física e/ou mental. Essas alterações podem conduzir

em quem as usam sérios problemas fisiológicos e psicológicos, ou ambos (...)”. 30

É qualquer substância capaz de provocar alterações psicológicas e fisiológicas no

organismo humano.

Ainda Conforme PERILLO, que menciona o seguinte:

Quaisquer substâncias naturais ou sintéticas, que ao entrar em contato com um organismo vivo, pode modificar uma ou várias de suas funções; é uma substância química que tem ação biológica sobre as estruturas celulares do organismo, com fins terapêuticos ou não. 31

Assim, mesmo se uma substância causar dependência, se não tiver sido catalogada

em lei ou em lista elaborada pelo Poder Executivo da União, não haverá tipicidade na conduta

do indivíduo que praticar as ações previstas nos artigos 33 ao 39 da Lei de Drogas.

2.3 Diferença entre posse e o tráfico de drogas

O uso de drogas está disciplinado no artigo 28 da Lei 11.343/2006 que considera

usuário aquele que “(...) adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo,

30 PERILLO, Luís A. Petrópolis, Vozes 1987, 288p

31 Ibidem, p. 59.

25

para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou

regulamentar.” 32

Para o usuário inexiste previsão legal de pena privativa de liberdade, estando o

Juiz restrito as seguintes sanções: admoestação verbal; prestação de serviços à comunidade ou

medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

Conforme o caput e o §º 1 do artigo 33 da Lei de Drogas o tráfico de drogas

caracteriza-se pelas seguintes condutas:

Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

§ 1o Nas mesmas penas incorre quem:

I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas;

II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;

III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas. 33

A lei 11.343/2006 estabeleceu os seguintes critérios para a diferenciação entre

tráfico e uso pessoal de drogas, a saber: natureza e quantidade da substância apreendida, local

e condições em que se desenvolveu a ação, circunstâncias pessoal e social, a conduta e os

antecedentes do agente do fato.

Em outros vocábulos, são relevantes: o objeto material do delito (natureza e

quantidade da droga), o desvalor da ação (local e condições em que ela se desenvolveu) assim

32 Brasil. Lei 11.343. 23.08.2006. Brasília. Publicado no D.O.U. de 24.8.2006.

33 Ibidem

26

como o próprio agente do fato (suas circunstâncias sociais e pessoais, conduta e

antecedentes).

Luiz Flávio Gomes ensina:

(...) A posse de droga para consumo pessoal configura uma das modalidades de delito de posse, que retrata uma categoria penal muito singular no direito penal. Mister se faz, para a consumação da infração, constatar a idoneidade ofensiva (periculosidade) do próprio objeto material da conduta. 34

A conduta de portar pequena quantidade de substância entorpecente, embora se

amolde ao tipo penal, não apresenta nenhuma relevância material.

Para determinar se a droga destina-se a consumo pessoal ou não, o Juiz analisará a

natureza e a quantidade da substância apreendida, o local e as condições em que se

desenvolveu a ação, as circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os

antecedentes do agente.

A quantidade de droga, em regra, não constitui por si só critério determinante, eis

que determinadas quantidades não permitem uma conclusão definitiva. Por isso, a necessidade

de se valorar não somente o critério quantitativo, mas todos fixados na lei.

2.4 Lei de Drogas – Lei nº 11.343/2006 de 23 de Agosto de 2006

A Lei 11.343/2006 dispõe sobre medidas de prevenção, atenção e reinserção

social dos usuários de drogas, bem como à repressão ao tráfico. Por ser uma norma penal em

branco é complementada pela Portaria nº 344/SVS da ANVISA.

As expressões substância entorpecente, ou que determine dependência física ou

psíquica foram substituídas pela expressão droga.

No Brasil, a lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006 instituiu o Sistema Nacional de

Políticas Públicas sobre Tráfico - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido,

atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas, estabelece normas para

repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas, define crimes e dá outras

providências.

34 Brasil. Lei 11.343. 23.08.2006. Brasília. Publicado no D.O.U. de 24.8.2006.

27

De acordo com o parágrafo único do artigo 1º da Lei 11.343/2006 conceitua-se

droga como “Toda substância ou produto capaz de causar dependência, assim especificada em

lei ou em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União”. 35

A lei não foi clara quanto à exigência do laudo de constatação, mas não havendo

comprovação da potencialidade tóxica do objeto nenhuma providência legal pode ser tomada.

No âmbito penal sobressaem tipos penais que penalizam com maior severidade o

crime de tráfico de drogas, punem-se os investidores, por financiar e custear o comércio de

drogas, os asseclas e colaboradores do crime organizado com penas mais elevadas. Ao mesmo

tempo, as penas pecuniárias foram exacerbadas, tornando-se mais proporcionais e razoáveis à

realidade do comércio ilícito. De forma salutar, diferencia os diversos degraus na hierarquia

da criminalidade comum e organizada, cada um respondendo na medida de sua culpabilidade.

Assim, se o gravame mostra-se leve, a pena guarda correspondência com a sanção. Do mesmo

modo, se o traficante for novato no crime, primário e portador de bons antecedentes, gozará

de benesses jamais vistas, contudo harmonizadas com a realidade, porquanto longe está, por

exemplo, o usuário-traficante, do verdadeiro mercador. 36

A pena para o tráfico de drogas pode atingir mais de 20 anos de reclusão (15 é o

máximo para tráfico, mas pode ser aumentado em até 2/3 dependendo da gravidade e extensão

do crime, conforme o art. 18 da lei em objeto).

A realização do laudo toxicológico é necessária quando ocorre a apreensão da substância entorpecente. O fato de não ter sido encontrada droga com o acusado não leva à conclusão de que ele não praticou tráfico. Se assim fosse, o traficante que conseguisse atingir o fim criminoso de transportar e distribuir o entorpecente não poderia ser processado e julgado criminalmente, ao passo que aquele que foi preso pela Polícia e a substância apreendida, enquanto executava o ato delituoso, poderia ser responsabilizado penalmente. Haveria evidente desigualdade, já que os agentes, em ambas as situações, merecem ser punidos da mesma forma. Constata-se, então, que, mesmo sem vestígios, a materialidade delitiva pode ser provada por outros meios, como a prova testemunhal e documental. 37

35 Brasil. Lei 11.343. 23.08.2006. Brasíla. Publicado no D.O.U. de 24.8.2006.

36 FREITAS, Jayme Walmer de. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/9074>. Acesso em: 01 maio 2013.

37 Brasil. STJ. HC nº 91.727/MS. Proferido pelo relator do STJ Ministro Arnaldo Esteves de Lima. Brasília. 2/12/2008.

28

2.5 Aspectos Processuais do Crime de Tráfico de drogas

O tipo penal descrito no artigo 33 da citada lei descreve dezoito verbos, a saber:

importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda,

oferecer, fornecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar e

entregar. Sendo que a prática de mais de um não implica concurso de crimes, mas um único

delito.

Trata-se de norma penal em branco (normas cujo conceito primário é

indeterminado quanto ao seu conteúdo), implicando em aplicação de norma

complementadora, que defina as espécies de drogas relacionadas, conforme listas atualizadas

pelo Poder Executivo da União, cabendo ao Ministério da Saúde publicar periodicamente

listas atualizadas sobre produtos e substâncias considerados drogas.

29

3 A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E O TRÁFICO

DE DROGAS

3.1 Critérios subjetivos na aplicação do Princípio da Insignificância

Para o reconhecimento da infração bagatelar não basta a constatação do desvalor

do resultado ou da ação, mas há, ainda, a verificação de exigências imprescindíveis. Ou seja:

o fato é penalmente irrelevante quando são insignificantes cumulativamente o desvalor do

resultado, o desvalor da ação e o desvalor da culpabilidade do agente. Ou seja, quando todas

as circunstâncias judiciais, antecedentes, conduta social, personalidade, motivos do crime,

consequências, circunstâncias sejam favoráveis.

A insignificância relaciona-se ao injusto penal, nada tendo com os critérios

subjetivos típicos da reprovação da conduta, que se relacionam com a culpabilidade

(necessidade da pena). Dessa forma, acertada e técnica é a decisão que considera a

ofensividade mínima da conduta, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau

de reprovabilidade do comportamento e a inexpressiva relevância do crime para considerar

como insignificante a conduta do paciente.

3.2 Entendimentos e Divergências Jurisprudenciais

Na jurisprudência pátria não se discute mais sua aceitação. Tanto no STF quanto

no STJ e nas instâncias inferiores, o princípio é amplamente aceito no crime de tráfico de

drogas.

É frequente o número de julgados que determinam o trancamento da ação penal

por atipicidade de conduta, baseados no princípio da insignificância. Porém devem ser

observados alguns critérios, tais como: mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma

periculosidade social da ação, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a

inexpressividade da lesão jurídica provocada.

O STF, visando estabelecer um caráter minimamente objetivo à análise de

condutas que se encontram nesta chamada zona cinzenta, estabeleceu determinadas regras de

30

aplicabilidade do Princípio da Insignificância, sendo pertinente a lição do brilhante Ministro

Celso de Mello:

O postulado da insignificância - que se qualifica como expressivo instrumento de política criminal - subordina-se, quanto à sua incidência, à presença, a ser constatada em cada situação ocorrente, de determinados vetores, que assim podem ser identificados: (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada. 38

O Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, por ambas as turmas,

vêm exigindo o preenchimento de requisitos cumulativos para a aplicação do princípio da

insignificância. Desta forma, para que se possa reconhecer a atipicidade material, o que

atestaria uma ofensa pouca relevante ao bem jurídico tutelado, se exige a mínima

ofensividade da conduta, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, ausência de

risco social e inexpressividade da lesão jurídica causada.

Este foi o posicionamento recentemente adotado pelo STJ, ao julgar o HC

155.391 , relatado pela Ministra Maria Thereza:

TRÁFICO. DROGAS. PRINCÍPIO. INSIGNIFICÂNCIA. Segundo precedentes do STF e do STJ, o delito de tráfico de drogas não comporta a incidência do princípio da insignificância, visto que se cuida de delito de perigo abstrato praticado contra a saúde pública. Dessa forma, para esse específico fim, é irrelevante a pequena quantidade da substância apreendida (no caso, 0,2 decigramas de crack). Contudo, essa quantidade, aliada ao fato de que foi aplicada a pena-base em seu mínimo legal, valida a aplicação da causa especial de diminuição em seu grau máximo de 2/3 (art. 33, 4º, da Lei n. 11.343/2006). Então, o quantum da pena e a circunstância de o crime ser praticado na vigência da novel Lei de Drogas possibilitam fixar o regime semiaberto, ou mesmo o aberto, para início do cumprimento da pena, bem com (art. 33 do CP) o falar em substituição da pena de reclusão por restritivas de direitos. (art. 44 do CP) 39

Diferente do raciocínio que se faz ao analisar a possibilidade do Princípio da

Insignificância incidir nos crimes de posse de droga para consumo próprio, no crime de tráfico prevalece à impossibilidade de se reconhecer essa causa excludente da tipicidade material. 38 Brasil. STF. HC nº 97.927/RS. Proferido pelo Ministro do STF Celso de Mello. Brasília. Julgado em 02/06/2009.

39 Brasil. STJ. HC nº 155.391/ES. Proferido pela Relatora do STJ Min. Maria Thereza de Assis Moura. Brasília. Julgado em 2/9/2010.

31

De acordo com a referida Ministra, o delito de tráfico de drogas não pode ser

considerado insignificante, visto que se cuida de delito de perigo abstrato praticado contra a

saúde pública. Tal decisão baseia-se em vários precedentes, dentre os quais destaca-se o

seguinte: “não se aplica o princípio da insignificância ao delito de tráfico de drogas, visto se

tratar de crime de perigo abstrato ou presumido. Destarte, é irrelevante para esse específico

fim a quantidade de droga apreendida”.40

A aplicação do princípio da insignificância de modo a tornar a ação atípica exige a

satisfação, de forma concomitante, de certos requisitos, quais seja conduta minimamente

ofensiva, a ausência de periculosidade social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do

comportamento e lesão jurídica inexpressiva.

O Supremo Tribunal Federal orienta que o Princípio da Insignificância tem como

vetores a mínima ofensividade da conduta, nenhuma periculosidade social da ação, reduzido

grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada. 41

Confirma, ainda, seu entendimento no julgamento do HC nº112.348/DF, que, para

a aplicação do princípio da insignificância, devem estar presentes, de forma cumulada, os

seguintes vetores: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade

social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do agente; e d)

inexpressividade da lesão jurídica provocada. 42

O Supremo Tribunal Federal consagrou o entendimento de que, para a aplicação

do princípio da insignificância, devem estar presentes, cumulativamente, as seguintes

condições objetivas: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma

periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do

agente; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. 43

HC 87.319/PE-PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - TRÁFICO DE DROGAS. O fato de o agente haver sido surpreendido com pequena quantidade de droga - três gramas - não leva à observação do princípio da insignificância,

40 Brasil. STJ. HC nº 122.682/ SP. Proferido pela Ministra Laurita Vaz. Brasília. Julgado em 18.11.2010.

41 Brasil. STJ. HC nº 245.148/MG. Proferido pelo Ministro do STJ Campos Marques. Brasília. Julgado em 20.11.2012.

42 Brasil. STF. HC nº 112.348/DF. Proferido pelo Ministro do STF. Joaquim Barbosa. Brasília. Julgado em 18.9.2012.

43 Brasil. STF. HC nº 107.689/RS. Proferido pelo Ministro do STF Luis Fux. Brasília. Julgado em 07/3/2012.

32

prevalecendo às circunstâncias da atuação delituosa - introdução da droga em penitenciária para venda a detentos... 44

HC 55.816/AM PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 12, CAPUT, DA LEI Nº 6.368/76. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES PARA A CONDENAÇÃO. DILAÇÃO PROBATÓRIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. PROGRESSÃO DE REGIME. POSSIBILIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ART. 2º DA LEI Nº 8.072/90 DECLARADA PELO STF. (...) II - O princípio da insignificância está estritamente relacionado com o bem jurídico tutelado e com o tipo de injusto. Dessa maneira, não pode ser utilizado para neutralizar, praticamente in genere, uma norma incriminadora. Se esta visa as condutas de adquirir, vender, guardar, expor à venda ou oferecer é porque alcança, inclusive, aqueles que traficam pequena quantidade de drogas(...).45

HC Nº 76.167/SP PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. (1) PEQUENA QUANTIDADE DE DROGAS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. MATÉRIA NAO TRATADA PELO TRIBUNAL A QUO. CONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. (2) LIBERDADE PROVISÓRIA. VEDAÇAO ABSOLUTA NOS CRIMES HEDIONDOS E A ELES EQUIPARADOS. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTOS DE CAUTELARIDADE. ILEGALIDADE. RECONHECIMENTO. RHC 18.198 PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ART. 12, DA LEI Nº 6.368/76 E ART. 333, DO CP. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA. ATIPICIDADE. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA. (...) O princípio da insignificância está estritamente relacionado com o bem jurídico tutelado e com o tipo de injusto. Dessa maneira, não pode ser utilizado para neutralizar, praticamente in genere, uma norma incriminadora. Se esta visa as condutas de adquirir, vender, guardar, expor à venda ou oferecer é porque alcança, inclusive, aqueles que traficam pequena quantidade de drogas. Recurso desprovido. 46

RESP 521.137 PENAL. RECURSO ESPECIAL. TÓXICOS (ART. 16 DA LEI Nº 6368/76). PEQUENA QUANTIDADE. PRINCÍPIO DA

44 Brasil. STJ. HC nº 87.319/PE. Proferido pelo Ministro Marco Aurélio. Brasília. Julgado em 06.11.2006.

45 Brasil. STJ. HC nº 55.816/AM. Proferido Felix Fischer. Brasília. Julgado em 03.10.2006.

46 Brasil. STJ. HC nº 18.198/MS. Proferido pelo Desembargador Dorival Moreira dos Santos. Brasília. Julgado em 23.07.2012.

33

INSIGNIFICÂNCIA. PERIGO PRESUMIDO. I O delito previsto no art. 16 da Lei de Drogas é de perigo presumido ou abstrato, possuindo plena aplicabilidade em nosso sistema repressivo. II O princípio da insignificância não pode ser utilizado para neutralizar, praticamente in genere, uma norma incriminadora. Se esta visa as condutas de adquirir , guardar ou trazer consigo tóxico para exclusivo uso próprio é porque alcança, justamente, aqueles que portam (usando ou não) pequena quantidade de drogas (v.g., "um cigarro de maconha") visto que dificilmente alguém adquire, guarda ou traz consigo, para exclusivo uso próprio, grandes quantidades de tóxicos (v.g., arts. 12, 16 e 37 da Lei nº 6368/76). A própria resposta penal guarda proporcionalidade, no art. 16, porquanto apenado com detenção, só excepcionalmente e, em regra, por via da regressão, poderá implicar em segregação total (v.g. art. 33, caput, do Código Penal). Recurso provido. Brasília (DF), 6 de maio de 2004 (data do julgamento). 47

HC 88.820 BA Princípio da insignificância e tráfico de entorpecentes. É da jurisprudência do Supremo Tribunal que não se aplica o princípio da insignificância ao delito de tráfico de entorpecentes: precedentes. De qualquer sorte, as circunstâncias do caso, especialmente se considerada a espécie da substância apreendida e a forma como estava acondicionada, não convencem de que o fato pudesse ser considerado penalmente insignificante. 2. Tráfico de entorpecentes: ausência de dados concretos que justifiquem a afirmação de inexistência de justa causa para a ação penal ou de atipicidade da conduta imputada ao paciente (...). 48

HC 59.190 SP 2006 Relator (a): Ministra LAURITA VAZ HABEAS CORPUS. ART. 12, C.C. 18, INCISO IV, DA LEI 6.368/76. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. 1. Inaplicável o princípio da insignificância ao delito de tráfico de entorpecentes, tendo em vista tratar-se de crime de perigo presumido ou abstrato, sendo totalmente irrelevante a quantidade de droga apreendida em poder do agente. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (...) 49

ACR 1.175 RO 2006. PENAL. PROCESSUAL PENAL. MATERIALIDADE. DEMONSTRAÇÃO. TRANSPORTE. SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. CONCRETIZAÇÃO. CONDUTAS. ART. 12 DA LEI 6.368/76. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. NÃO

47 Brasil. STJ. HC nº 59.190/RS. Proferido pela Ministra Laurita Vaz. Brasília. Julgado em 21.08.2006.

48 Brasil. STF. HC nº 88.820/ BA. Proferido pelo relator Sepúleda Pertence. Brasília. Julgado em 04.12.2006.

49 Brasil. STJ. HC nº 59.190/BA. Proferido pela Ministra Laurita Vaz. Brasília. Julgado em 21.08.2006.

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DESCARACTERIZAÇÃO DO DELITO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. APELO IMPROVIDO. 1. Provada a materialidade e demonstrado, pelo conjunto probatório, que o apelante transportava substância entorpecente sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, havendo, assim, a concretização de condutas descritas no art. 12 da Lei 6.368/76, é imperiosa a manutenção da sentença que condenou aquele como incurso nas penas retro mencionadas. 2. "A pequena quantidade de droga apreendida não descaracteriza o delito de tráfico de entorpecentes, se existentes outros elementos capazes de orientar a convicção do Julgador, no sentido da ocorrência do referido delito". 3. "Inaplicável o Princípio da Insignificância ao delito de tráfico de entorpecentes, tendo em vista tratar-se de crime de perigo presumido ou abstrato, sendo totalmente irrelevante a quantidade de droga apreendida em poder do agente." (STJ, 5ª Turma, RHC 17393, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ 09/05/2005). 4. Apelo improvido 50

HC 141.566 MG HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. REVELIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NEGADO. ORDEM CONCEDIDA EM PARTE. (...)4. O princípio da insignificância não pode ser aplicado aos delitos de tráfico de entorpecentes. 5. Ordem concedida em parte, para revogar a prisão preventiva dos pacientes, sob compromisso de comparecimento a todos os atos do processo. 51

HC 79.661/RS HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PEQUENA QUANTIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PERIGO ABSTRATO. 1. O delito de tráfico de entorpecente é de perigo abstrato para a saúde pública, fazendo-se irrelevante que seja pequena a quantidade de entorpecente (Precedentes). 2. Ordem denegada 52

ACR 6.576/CE PENAL. RECURSO DE APELAÇÃO. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES (ART. 33 C/C 40, INC. I, DA LEI N. 11.343/2006). CRIME PRATICADO POR USUÁRIO. POSSIBILIDADE.

50 Brasil. TRF1. ACR nº 1.175/TO. Proferido pelo Desembargador Federal Olindo Menezes. Brasília. Julgado em 20.03.2006.

51 Brasil. STJ. HC nº 141.566. Proferido pelo Ministro Celso Limongi. Brasília. Julgado em 10.06.2010.

52 Brasil. STJ. HC nº 79.661. Proferido pelo Ministro Hamilton Carvalhido. Brasília. Julgado em 11.09.2007.

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INIMPUTABILIDADE DO AGENTE. INOCORRÊNCIA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DESCABIMENTO. IMPROVIMENTO. A afirmação de que a droga serviria para consumo do próprio acusado não prospera, quando os elementos coligidos evidenciam que o transporte da substância entorpecente destinava-se ao tráfico internacional. A condição de dependente, por si só, não torna o agente automaticamente inimputável, tampouco afasta a possibilidade de condenação por tráfico de entorpecentes, notadamente quando o próprio reconhece que receberia dinheiro pelo transporte da droga para outro país. O princípio da insignificância não se presta a afastar a tipicidade do delito de tráfico de entorpecentes, que é tido pela jurisprudência como crime de perigo abstrato, consumando-se quando se expõe a saúde pública ao potencial risco. 4 - Apelação improvida. 53

HC 156.543/RJ HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DA MINORANTE PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06 NO PATAMAR MÁXIMO. INVIABILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte é firme quanto à inaplicabilidade do princípio da insignificância ao tráfico de drogas. 2. Segundo o § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06, nos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes, as penas poderão ser reduzidas de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas, nem integre organização criminosa. 3. Na hipótese, houve a aplicação da causa de diminuição da pena no patamar inferior ao máximo legal (dois terços), valendo-se a instância ordinária de suficiente fundamentação, o que afasta a alegação de constrangimento ilegal. 4. Para concluir em sentido diverso, infirmando-se os argumentos expendidos na origem, haveria necessidade de revolvimento do acervo fático-probatório, providência descabida na via estreita do habeas corpus. Precedentes do STJ e do STF. 5. Inviável a aplicação do regime aberto ou mesmo do sursis, dada a quantidade de pena imposta ao paciente. 6. Ordem denegada. 54

HC 104.158 PENAL E PROCESSUAL. HABEAS CORPUS. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. VIA IMPRÓPRIA. TRÁFICO DE ENTORPECENTE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO.

53 ACR nº 6.576/CE. Proferido pelo Desembargador Federal Francisco Wildo. Julgado em 27.04.2010.

54 Brasil. STJ. HC nº 156.543/RJ. Proferido pelo Ministro Og Fernandes. Brasília. Julgado em 5.10.2011.

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IMPOSSIBILIDADE. CRIME COMETIDO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 6.368/76. INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ART. 2º DA LEI N.º 8.072/90. SUBSTITUIÇÃO DA PENA RECLUSIVA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. (...) 2. Segundo entendimento desta Corte e do STF, não incide o princípio da insignificância ao delito de tráfico de entorpecentes, pois é de perigo abstrato, contra a saúde pública, sendo, pois, irrelevante, para esse fim, a pequena quantidade de substância apreendida. (...) 55

55 Brasil. STJ. HC nº 104.158/SP. Proferido pela Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Brasília. Julgado em 27.09.2011.

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CONCLUSÃO

Como explicitado no presente trabalho, princípios formam a ordem basilar de

nossos direitos e foram feitos para serem seguidos, tornando assim as relações jurídicas

completas e concretas.

O Princípio da insignificância é um princípio humanista, ou seja, visa o bem estar

social e tem como último recurso a restrição da liberdade do individuo.

O princípio da insignificância pode ser definido como instrumento de

interpretação restritiva do direito penal, baseado na concepção material do tipo penal, por

intermédio do qual é possível alcançar, pela via judicial e sem macular a segurança jurídica do

pensamento sistemático, a descriminalização de condutas que, embora formalmente típicas,

não atingem de forma socialmente relevante os bens jurídicos tutelados pelo direito penal.

Ainda, tal princípio pode ser caracterizado por permitir a desconsideração de condutas

socialmente irrelevantes.

O Direito Penal visa resguardar os interesses da sociedade, sendo norma aplicada

como ultima ratio na segurança dos bens jurídicos mais importantes. O Estado, por meio de

uma intervenção mínima, exercerá seu juízo de valor pela matéria criminal dos fatos mais

relevantes, quando não restarem outras normas capazes de proteger tais bens.

No decorrer do presente trabalho, apresentaram-se as posições da Doutrina e da

Jurisprudência pela não aplicação do princípio da insignificância no crime de tráfico de

drogas, fundamentado que nesses crimes há ofensa a um bem jurídico tutelado que ultrapassa

a esfera do agente.

O Direito Penal é, e sempre será o meio mais eficaz para proteger a população

contra agressões praticadas contra os seus direitos, porém deve sempre valorar os bens

jurídicos mais expressivos em determinados momentos de sua história, pois os bens jurídicos

são relativos e seu valor ligado ao tempo histórico de cada sociedade.

Aos aplicadores do Direito incumbe velar para que os momentos de atuação do

Direito Penal estejam presididos por princípios que legitimem o sistema. Somente intervindo

como última alternativa de composição do conflito, atuando unicamente sobre bens que

realmente demandem proteção penal, e nos limites da ofensa aos bens jurídicos protegidos

pela norma, evitando assim, uma hipertrofia no sistema penal e principalmente para a

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manutenção da dignidade da pessoa humana. O princípio da insignificância se ajusta à

equidade, que abriga um sentimento de justiça, inspirado nos valores vigentes em sociedade,

liberando-se o agente, cuja ação, por sua inexpressividade, não chega a atentar contra os

valores tutelados pelo Direito Penal e a correta interpretação do Direito, que exige uma

hermenêutica mais condizente do Direito impedindo graves injustiças.

Na aplicação da lei penal, as penas devem ser apenas as estrita e evidentemente

necessárias, conforme norma inserta no art. 8º da Declaração dos Direitos do homem e do

Cidadão. Por fim, o princípio da insignificância caracteriza-se como contribuição eficaz para

a descriminalização, e em elemento direcional, que contribui na compreensão e interpretação

do Direito Penal, conduzindo-o pelo caminho da supressão da miséria, da eliminação de

privilégios e da luta contra as discriminações.

Na atualidade, muitas searas da sociedade têm se preocupado e debatido com

bastante ênfase a problemática do trafico de drogas. Nesse sentido, reitera-se que o direito

Penal representa importante setor do Direito, que necessita ser conhecido e utilizado por meio

de princípios, valores e diretrizes de ação, tudo com a finalidade de promover a concretização

de medidas protetivas.

Contudo, tal proteção somente pôde ser efetivada na prática a partir da atuação da

sociedade, Juristas e Poder Público. Enfim, cidadãos em geral, reunidos num todo e com uma

causa em comum garantir o bem jurídico tutelado pelo direito penal: a vida.

Quanto ao Princípio da Insignificância em matéria Penal, estudou-se que a

possível imperfeição da técnica legislativa faz com que condutas sem importância jurídica

alguma para o direito penal sejam consideradas formalmente típicas, quando deveriam ser

excluídas da incidência da lei criminal, pois os fatos sociais visados pelo legislador são

aqueles que possam causar danos significativos aos bens jurídicos penalmente tutelados.

Para resolver este problema do âmbito Penal, a doutrina, destacando-se o autor

Claus Roxin, elaborou a teoria do princípio da insignificância, cuja finalidade precípua é

excluir da esfera penal as condutas que não apresentam um grau de lesividade mínima para a

efetivação do tipo penal, evitando, desta maneira, que a sanção penal seja desproporcional ao

dano causado pela ação formalmente típica.

Conforme verificado ao longo da pesquisa, o princípio da insignificância também

pode ser caracterizado por permitir o afastamento da tipicidade de fatos que, por sua

inexpressividade, são desprovidos de reprovabilidade, de modo a não merecerem valoração da

39

norma penal, em virtude de serem irrelevantes. Tais fatos também são conhecidos como ações

de bagatela.

O Direito Penal não almeja apenas a punição como forma das finalidades de seus

tipos penais, mas também a proteção dos bens mais significantes para a sociedade, impondo

determinadas penas, com o intuito de assegurar o respeito a tais valores, aplicando

efetivamente o princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos.

Visando assegurar os interesses da coletividade, o Direito Penal sendo norma

aplicada como ultima ratio na segurança dos bens jurídicos mais importantes, deverá pautar-

se no princípio da insignificância, eis que seu fundamento é equilibrar a intervenção mínima,

estabelecendo adequação proporcional entre o delito e a pena.

Com a necessidade de distinguir os fatos que importem maior amplitude de

aplicação do Direito Penal, o princípio da insignificância, aplicado aos chamados crimes de

bagatela –tipos penais inferiores que, ensejam desconsideração da punibilidade estatal como

medida de política criminal. Tal princípio demonstrou que nos crimes insignificantes, o

Estado deve buscar medidas de descaracterização dos tipos penais incorridos pelos autores,

uma vez que, o Direito Penal visa resguardar os bens jurídicos que importem maior

reconhecimento na esfera social.

Entretanto, a aplicação deste postulado, não se faz de forma banalizada, uma vez

que, os Tribunais coadunam-se no sentido de que, o pretexto ao princípio necessita de

requisitos específicos tais como: mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma

periculosidade social da ação, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a

inexpressividade da lesão jurídica provocada. Ou seja, não basta apenas que os crimes sejam

cometidos com características ínfimas das lesões provocadas, devendo também, possuírem a

junção de tais requisitos para serem conotados como crimes de bagatela.

Assim, na aplicação do princípio, os operadores do direito deverão ater-se a

potencialidade lesiva dos atos praticados pelo agente, bem como o modo que favoreceu a este,

e se os prejuízos causados a vítima, são realmente consideráveis em sua magnitude a esta em

razão de sua condição social. Desta forma a utilização do Direito Penal deve existir somente

quando necessário ao regramento da conduta social, como forma de política criminal.

Não se busca incentivar a criminalidade, mas sim enaltecer a importância do

princípio nos dias atuais. Evitando-se o processamento de casos que relatam meras

banalidades e que poderiam, caso se pense no pior, aprisionar indivíduos não merecedores de

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enfrentar a barbaridade das masmorras carcerárias brasileiras, verdadeiros centros de

degeneração do ser humano.

Enfim, nas palavras de Monstesquieu, "Toda pena que não derive da necessidade

absoluta, é tirânica".

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