6
TRATADO DOS MODELOS ECONÔMICOS ALTERNATIVOS [10] PREÂMBULO O mundo hoje está marcado por uma crise interrelacionada ambiental e de desenvolvimento. Esta crise está enraizada na dinâmica de um modelo econômico que é centrado na busca de lucros em vez da promoção do bem estar das comunidades. Este sistema assume o consumo infinito de recursos, num planeta finito. Este modelo de desenvolvimento se manifesta particularmente da seguinte forma: 1. O modelo de livre mercado legitimiza uma ordem econômica onde uma riqueza inacreditável é privilégio de uns e a pobreza é condição generalizada da humanidade. Ele conduzir à conseqüências desastrosas como a pobreza, doenças, devastação do meio ambiente e cultura de povos e à miséria espiritual. 2. A injustiça social, cultural, política e econômica no sistema internacional sustenta as elites do norte e do sul e amplia a distância entre classes, raças e sexos. 80% dos recursos mundiais são consumidos por 20% da população e 80% da degradação ambiental é gerada por esses mesmos 20%. A disparidade em riqueza, poder e recursos também está aumentando. A concentração da riqueza entre os 20% mais ricos aumentou de 70,2% para 92,7% em 1989. 3. O Estado neo-liberal usa seu poder e violência para reforçar e expandir esse sistema econômico opressivo sob a coordenação das autoritárias instituições de Bretton Woods, particularmente o Banco Mundial, o FMI e o GATT, em benefício do crescente monopólio das corporações transnacionais e seu controle sobre os recursos mundiais. O modelo Bruntland de desenvolvimento sustentável vai perpetuar esta situação. 4. A expansão presente da ideologia do livre comércio, mina o poder dos estados de formular políticas para a proteção dos recursos naturais e da vida humana. A ideologia neo-liberal transforma as relações sociais e as comunidades eco-culturais e de base em meras variáveis econômicas. 5. A natureza patriarcal do sistema industrial dominante tem o efeito de aumentar a distância no poder e ganhos entre os homens de um lado, e mulheres e crianças do outro. Por exemplo, o trabalho doméstico não é computado no PNB e os dados mostram diferenças marcantes entre os ganhos de mulheres e homens por um mesmo trabalho.

Economia Alternativa

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Economia Alternativa

Citation preview

  • TRATADO DOS MODELOS ECONMICOS ALTERNATIVOS[10]

    PREMBULO

    O mundo hoje est marcado por uma crise interrelacionada ambiental e dedesenvolvimento. Esta crise est enraizada na dinmica de um modelo econmicoque centrado na busca de lucros em vez da promoo do bem estar dascomunidades. Este sistema assume o consumo infinito de recursos, num planetafinito.

    Este modelo de desenvolvimento se manifesta particularmente da seguinteforma:

    1. O modelo de livre mercado legitimiza uma ordem econmica onde uma riquezainacreditvel privilgio de uns e a pobreza condio generalizada dahumanidade. Ele conduzir conseqncias desastrosas como a pobreza, doenas,devastao do meio ambiente e cultura de povos e misria espiritual.

    2. A injustia social, cultural, poltica e econmica no sistema internacionalsustenta as elites do norte e do sul e amplia a distncia entre classes, raas esexos. 80% dos recursos mundiais so consumidos por 20% da populao e 80%da degradao ambiental gerada por esses mesmos 20%. A disparidade emriqueza, poder e recursos tambm est aumentando. A concentrao da riquezaentre os 20% mais ricos aumentou de 70,2% para 92,7% em 1989.

    3. O Estado neo-liberal usa seu poder e violncia para reforar e expandir essesistema econmico opressivo sob a coordenao das autoritrias instituies deBretton Woods, particularmente o Banco Mundial, o FMI e o GATT, em benefciodo crescente monoplio das corporaes transnacionais e seu controle sobre osrecursos mundiais. O modelo Bruntland de desenvolvimento sustentvel vaiperpetuar esta situao.

    4. A expanso presente da ideologia do livre comrcio, mina o poder dos estadosde formular polticas para a proteo dos recursos naturais e da vida humana. Aideologia neo-liberal transforma as relaes sociais e as comunidades eco-culturaise de base em meras variveis econmicas.

    5. A natureza patriarcal do sistema industrial dominante tem o efeito de aumentara distncia no poder e ganhos entre os homens de um lado, e mulheres e crianasdo outro. Por exemplo, o trabalho domstico no computado no PNB e os dadosmostram diferenas marcantes entre os ganhos de mulheres e homens por ummesmo trabalho.

  • Ns as ONGs e movimentos sociais, esboamos este trabalho para definir eestabelecer alternativas ao modelo econmico dominante e por em andamento osseguintes princpios, compromissos polticos, plano de ao e mecanismos deprosseguimento. Assim fazendo, ns declaramos nossa autonomia tanto domercado quanto do estado.

    PRINCPIOS

    A viso fundamental das alternativas ao presente modelo est baseada nosseguintes princpios:

    1. O propsito fundamental da organizao econmica prover as necessidadesbsicas de uma comunidade, em termos de alimentao, abrigo, educao, sade,usufruto da cultura, em oposio concentrao da gerao de riquezas e aocrescimento da produo por si prprio.

    2. A vida econmica tambm deve ser organizada de tal maneira que acrescenteem vez de destruir o meio ambiente e proteja os recursos naturais para o uso defuturas geraes.

    3. Uma alternativa ao sistema corrente deve ser baseada em modelos indgenas,das comunidades de base, modelos que se fortalecem a partir das pessoas, e queso enraizados na experincia, histria e realidade eco-culturais dos povos.

    4. Isto implica em incorporar a diversidade dos sistemas alternativos de produo,dos processos de tomada de decises, de tecnologias especialmente aquelesderivados das comunidades campesinas e dos povos indgenas.

    5. Um modelo econmico alternativo deve reconhecer e institucionalizar o papelcentral da mulheres na construo da vida econmica.

    6. Um modelo alternativo deve ser baseado na relativa auto-suficincia dascomunidades, regies e naes, em vez de no comrcio livre, mercado mundial enas grandes corporaes domsticas e transnacionais como instituies centraisque determinam a produo e distribuio.

    7. A vida econmica deve ser formada por estratgias de baixo para cima, onde aspessoas e as comunidades tem o poder de tomar decises econmicas que afetemsuas vidas, em contraste ao modelo dominante que marginaliza as comunidadesde base e promove relaes econmicas internacionais nas quais o centro subjugaa periferia.

    8. Uma das fundaes ticas centrais de um modelo alternativo ainterdependncia entre todos os povos e a interdependncia de povos e

  • comunidades com o mundo material no humano. Esta interdependncia exige umsistema de partilha de recursos baseado na autonomia, igualdade, democraciaparticipativa e solidariedade. Como membros de uma comunidade, os indivduosdevem assumir a responsabilidade de viver nos limites dos recursos do planeta, emcontraste ao modelo excessivo de consumo do norte e das elites.

    9. Os indicadores de desenvolvimento humano e econmico no devem maisrefletir exclusivamente o crescimento material e o avano tecnolgico, mas devemlevar em considerao o bem estar individual, social e ambiental.

    10. Tais indicadores devem incluir o trabalho familiar no remunerado, igualdadena distribuio da renda, melhor cuidado das crianas, sade, igualdade degneros e a maximizao da felicidade humana com o mnimo uso de recursos edesperdicio.

    11. Num sistema econmico alternativo, o estado ser transformado de principalagente facilitador do sistema econmico que dominado por corporaesdomsticas e transnacionais, num mecanismo que genuinamente represente esirva o desejo das pessoas e promova estratgias de desenvolvimento eautoconfiana centrado na comunidade.

    COMPROMISSOS POLTICOS

    Baseados na viso estratgica acima, ns, os abaixo assinadosrepresentantes de ONGs no Frum das ONGs do Frum Global de junho de 1992nos comprometemos a:

    1. Retornar para e nos identificar com nossas comunidades de base, de maneira acriar autoconfiana coletiva na comunidade e estabelecer modelos econmicosalternativos a partir da prpria comunidade.

    2. Construir mecanismos e instituies de fortalecimento mtuo no sentido deestabelecer uma ordem econmica alternativa.

    3. Participar na construo de movimentos populares pelo meio ambiente e pelodesenvolvimento, comeando por redes aliadas de trabalho biorrregionais at umasolidariedade global.

    PLANO DE AO

    1. Ns nos mobilizaremos para opor-nos e exigir democraticamente, prestao decontas das operaes das instituies de Bretton Woods e do assim chamadomodelo econmico de desenvolvimento dominado pelas corporaestransnacionais. Isto inclui o modelo Bruntland de desenvolvimento sustentvel.

  • 2. Ns trabalharemos para eliminar a dvida internacional existente e desmantelaro sistema injusto que perpetua a criao da dvida internacional.

    3. Ns rechaamos a transferncia de tecnologia e parques industriaisdesatualizados, assim como os projetos agro exportadores que impliquem altocusto ambiental e social.

    4. Exigir o pagamento com tecnologia da dvida ambiental que os pases ricoscontraram historicamente com os pases pobres, de modo que toda a sociedade sebeneficie da utilizao de tecnologias adequadas ambientalmente. Apoiaremospolticas sociais e ecolgicas de transio industrial, tanto para o Sul quanto para oNorte, que redirecionem o atual modelo econmico industrial.

    5. Ns pressionaremos nossos governantes para reestruturar e redirigir o GATT,para trabalhar no sentido de criar um sistema de comrcio global que seja justo esirva aos interesses de todos os povos, assim, como promover autoconfiana locale empreendimentos comunitrios.

    6. Ns nos mobilizaremos para a reduo de oramento militar em todos os pases,pela abolio do comrcio internacional de armas nucleares e para transferir estesrecursos, que devero ser alocados em projetos social e ambientalmentesustentveis no Norte e no Sul.

    7. Ns trabalharemos para estabelecer uma taxao sobre emisses de gscarbnico em todas as naes onde a emisso mdia de 1 tonelada ou mais porpessoa, e aplicar esta renda no Fundo das Pessoas da Terra para odesenvolvimento de tecnologias alternativas a serem partilhadas mundialmente.

    8. Nos mobilizaremos para uma drstica reduo no consumo de energia e estilosde vida excessivamente consumistas, encorajando economias locais-regionais auto-confiana e frugalidade.

    9. Ns vamos trabalhar para desenvolver novas relaes scio-econmicas quesejam no-exploradoras e que recuperem costumes cooperativos que protejam ascomunidades e o meio ambiente. Estes costumes e instituies sero apoiadospela mobilizao de programas voluntrios de intercmbio em todos os nveis.

    10. Ns trabalharemos para desenvolver alianas que construam e estreitem asolidariedade com e entre trabalhadores (ex.: para melhores salrios e condiesde trabalho), pobres urbanos (habitao e saneamento), trabalhadores rurais(reforma agrria), mulheres (igualdade de condies e participao poltica) ecomunidades indgenas que so ameaadas com desalojamento.

  • 11. Ns trabalharemos em nossas respectivas comunidades para defender o fundode desenvolvimento para o Sul, aonde as naes e povos do Sul tenham um papelcentral.

    12. Nos mobilizaremos para tornar transparente toda informao sobre projetos dedesenvolvimento e processos de tomada de deciso que selecionem e avaliemtecnologias.

    MECANISMOS DE ACOMPANHAMENTO

    Ainda que os modelos alternativos sejam autnomos e auto-regulados emtodos os nveis, uma estrutura de rede como sugenda abaixo imperativa paraassegurar o compromisso e o impacto transformador. Os movimentos sociais e asONGs devem organizar-se de maneira descentralizada, democrtica e horizontal,em todos os nveis local, regional, nacional e internacional. O processo decoordenao ocorrer no plano de ao. O tipo de coordenao que se necessitadeve implementar estas aes.

    1. Porque o processo do Tratado sobre Modelo Econmico Alternativo o modelode desenvolvimento alternativo, importante que seja dado ao tratado um lugarcentral dentro do processo alternativo de tratados do Frum Global.

    2. O processo de acompanhamento para modelos econmicos alternativos seruma rede de trabalho aberta e porosa que:

    q identificar experincias inovadoras de desenvolvimento de modeloseconmicos alternativos, redes de trabalho e redes de redes;

    q conveniar, em cooperao com essas redes existentes, grupos de trabalhos quepossuam experincias alternativas e modelos tericos que possam serdifundidos e avaliados pelos grupos de base das comunidades;

    q financie, em cooperao com qualquer grupo interessado, fruns nacionais,regionais e internacionais que promovam, aperfeioem e atualizem o Tratadodos Modelos Alternativos.

    3. De modo a continuamente representar os desdobramentos do processo doTratado de Modelo Econmico Alternativo, no nvel inter-tratados internacionais,ns precisamos desenvolver mecanismos que conservem esse modelo frente detodos os outros tratados.

    Portanto propomos como possvel mecanismo de direo que:

    q cada equipe de tratado designe 6 representantes (um para cada uma dasseguintes regies: Amrica Latina, frica, sia, Amrica do Norte, Europa,

  • Austrlia/Ilhas do Pacfica) para uma nova assemblia de ONGs e MovimentosSociais;

    q esta assemblia eleger entre seus membros um comit internacionalcoordenador com representantes de todas as regies;

    q uma estrutura interconectada paralela em todos os nveis;q qualquer mudana neste tratado s dever ser feita pelo Frum Internacional

    de ONGs e Movimentos Sociais.