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6 DE NOVEmBRO DE 2012 ANO XXII N.º 252 QUINZENAL GRATUITO DIRETORA ANA DUARTE • EDITOR-EXEcUTIVA ANA mORAIs a cabra JORNAL UNIVERsITáRIO DE cOImBRA ana nUnes De aLmeiDa Dois mil alunos correm risco de prescrever no próximo ano O alerta surge no início deste novo ano letivo quando muitos dos alunos nem sabiam que corriam o risco de poder prescrever. Alguns têm o final do curso em dúvida apenas porque lhes falta uma cadeira de licenciatura. A possibilidade de deixarem de ser alunos da Universidade de Coimbra está em cima da mesa se o período de transição não aumentar em mais um ano para o estudante melhor planear a sua formação. O desconhecimento sobre o novo regime aprovado em julho passado passou a preocupação principalmente pelos alunos do Polo II. O número corresponde a mais de metade dos alunos inscritos em mestrados integrados OE2013 As alterações económicas pelas quais o país atravessa estão afetar os mé- dias com proporções nunca antes vis- tas. Os cortes orçamentais previstos no OE2013 afetam a Lusa e a RTP e põem em risco a comunicação. O fu- turo é incerto e os cortes estão na base de vários despedimentos, tanto no serviço público como no privado. A diminuição da capacidade de pro- dução leva ao incumprimento de um bem fundamental em democracia: o direito à informação. meDia Crise dos meios da comunicação noVa PLaTaFoRma DigiTaL Da UC UC DIGITALIS O Festival Caminhos do Cinema Por- tuguês realiza-se já no próximo dia 9 e vai durar até dia 17. Aquilo que co- meçou por ser uma pequena mostra de apoio ao curso de Língua Portu- guesa para estrangeiros acabou por se tornar num festival consagrado, por onde já passaram todos os realizado- res portugueses. Caminhos 2013 Mostra tornou-se em evento nacional O desafio da responsabilidade social dos estudantes Pág. 21 Pág. 6 Págs. 2,3 e 4 Pág. 15 Pág. 16 Págs. 12 e 13 Mais informação em acabra. net 4 DE OUTUBRO DE 2011 ANO XXI N.º 234 QUINZENAL GRATUITO DIRETOR cAmILO sOLDADO • EDITOREs-EXEcUTIVOs INês AmADO DA sILVA E JOãO GAspAR Daniel alves Da silva @ Pág. 9 Partilhar ideias para impulsionar a cultura O objetivo principal do Fórum Teatrão é envolver a comunidade na busca de respostas por mais cultura Um documento repleto de números que descora a preocupação social

Edição nº 252

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Edição nº 252 do Jornal Universitário de Coimbra - A Cabra

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Page 1: Edição nº 252

6 DE NOVEmBRO DE 2012 • ANO XXII • N.º 252 • QUINZENAL GRATUITODIRETORA ANA DUARTE • EDITOR-EXEcUTIVA ANA mORAIs

acabraJORNAL UNIVERsITáRIO DE cOImBRA

ana nUnesDe aLmeiDa

Dois mil alunoscorrem risco deprescrever nopróximo ano

O alerta surge no início deste novo

ano letivo quando muitos dos alunos

nem sabiam que corriam o risco de

poder prescrever. Alguns têm o final

do curso em dúvida apenas porque

lhes falta uma cadeira de licenciatura.

A possibilidade de deixarem de ser

alunos da Universidade de Coimbra

está em cima da mesa se o período de

transição não aumentar em mais um

ano para o estudante melhor planear

a sua formação. O desconhecimento

sobre o novo regime aprovado em

julho passado passou a preocupação

principalmente pelos alunos do Polo

II.

O número corresponde a mais de metade

dos alunos inscritos em mestrados integrados

OE2013

As alterações económicas pelas quais

o país atravessa estão afetar os mé-

dias com proporções nunca antes vis-

tas. Os cortes orçamentais previstos

no OE2013 afetam a Lusa e a RTP e

põem em risco a comunicação. O fu-

turo é incerto e os cortes estão na

base de vários despedimentos, tanto

no serviço público como no privado.

A diminuição da capacidade de pro-

dução leva ao incumprimento de um

bem fundamental em democracia: o

direito à informação.

meDia

Crise dos meios dacomunicação

noVa PLaTaFoRma DigiTaL Da UCUC DIGITALIS

O Festival Caminhos do Cinema Por-

tuguês realiza-se já no próximo dia 9

e vai durar até dia 17. Aquilo que co-

meçou por ser uma pequena mostra

de apoio ao curso de Língua Portu-

guesa para estrangeiros acabou por se

tornar num festival consagrado, por

onde já passaram todos os realizado-

res portugueses.

Caminhos 2013

Mostra tornou-se em evento nacional

O desafio da

responsabilidade social

dos estudantesPág. 21

Pág. 6

Págs. 2,3 e 4

Pág. 15

Pág. 16

Págs. 12 e 13

Mais informação em

acabra.net

4 DE OUTUBRO DE 2011 • ANO XXI • N.º 234 • QUINZENAL GRATUITODIRETOR cAmILO sOLDADO • EDITOREs-EXEcUTIVOs INês AmADO DA sILVA E JOãO GAspAR

Daniel alves Da silva

@Pág. 9

Partilhar ideias para impulsionar a cultura

O objetivo principal do Fórum Teatrãoé envolver a comunidade na busca de

respostas por mais cultura

Um documento repleto de números que descora a preocupação social

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2 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

DEsTAquE

omo já era de esperar,

tendo em conta a maioria

parlamentar de direita, o

OE2013 foi aprovado na sua genera-

lidade a 31 de outubro. Dois dias e

mais de 11 horas depois de debate, os

prós pesaram mais que os contra

para a maioria dos deputados, o que

fez com que este seja já um docu-

mento aprovado. Contudo, a sua vo-

tação final e global será apenas a 29

de novembro.

Mas mais que discuti-lo e aprová-

lo na generalidade ou na globalidade,

é preciso atentar aos efeitos que um

vistoso documento de mais de 300

páginas, adornado de gráficos, tabe-

las, quadros, percentagens, números

e mais números, têm na vida dos que

por cá vivem. Mais do que meros nú-

meros no papel, somos vidas. Vidas

que já se esgotam com os mais recen-

tes jargões dos nossos governantes e

que parecem ter sido incutidas à

força no nosso quotidiano – ‘troika’,

recessão, austeridade, contenção…

Porém, desse esgotamento parece

ver-se um novo paradigma, o da

emergência da contestação. Os bran-

dos costumes de Portugal de outrora

começam a ser substituídos por gen-

tes que mostram a cara e emprestam

a voz para espelhar os quantos mais

casos de dificuldade existem por este

país.

Os obstáculos colocados por o Mi-

nistério das Finanças à sociedade, pa-

tentes no OE2013, apresentam-se a

todos os setores. A transversalidade

e abrangência quer das “medidas do

lado da redução da despesa” quer das

“medidas do lado do aumento da re-

ceita” patenteiam uma exigência de

esforço que se multiplica em toda so-

ciedade portuguesa, com enfoque

para as famílias de mais baixos ren-

dimentos, que parecem ser os casos

mais gravosos.

Para refletir uma comunidade uni-

versitária, que cada vez mais corre o

risco de se perder e de se desfrag-

mentar, mostramos a cara e damos a

voz a dois estudantes da Universi-

dade de Coimbra (UC): Clara de Oli-

veira e Diogo Barbosa. A forma

combativa com que contam a sua his-

tória é sempre acompanhada com um

domínio argumentativo contra o

OE2013 e explicam que o grande ob-

jetivo é denunciar esta situação para

evitar que mais estudantes abando-

nem o Ensino Superior (ES). Porém,

estas duas histórias não se estancam

apenas no impacto que este novo or-

çamento tem no setor do ES. De

forma crua, evidenciam as mais di-

versas repercussões que este docu-

mento traz para os muitos ramos da

sociedade ao contarem as histórias

das suas famílias, abrangidas pelos

tentáculos dos números, dos cortes e

das percentagens.

“São cinco anos que vão ao ar de repente”Diogo Barbosa, estudante de História

na Faculdade de Letras da UC, per-

deu a bolsa de estudos o ano passado

por mudanças de critérios a nível eco-

nómico, aquando do Regulamento de

Atribuição de Bolsas do ministro Ma-

riano Gago. Desde essa perda, tudo

se tem agravado. Não conseguiu

pagar os mil euros de propinas do

ano letivo anterior até 31 de agosto, o

que o impediu de se poder matricu-

lar neste ano letivo. Ainda assim, o

facto de não estar ainda matriculado

na UC devido a constrangimentos

económicos, não o impede da ânsia

do conhecimento. Ao mesmo tempo

que continua a procurar trabalho pela

cidade, o estudante, natural de Cucu-

jães, vai às aulas do último ano, pois

acredita que há sempre mecanismos

que possam “dar a volta à situação”:

falar com os professores e pedir o

congelamento das notas é uma solu-

ção que encontra. No entanto, o sor-

riso com que atira estas alternativas

rapidamente é substituído por preo-

cupação. E desabafa: “a continuar

desta maneira, provavelmente chego

a janeiro e vou-me embora. São cinco

anos que vão ao ar de repente”.

Com algumas semelhanças, Clara

de Oliveira, estudante de Serviço So-

cial da Faculdade de Psicologia e

Ciências da Educação da UC

(FPCEUC), conta que tudo foi difi-

cultado pela falta de atribuição de

bolsa. Depois de ter frequentado uma

licenciatura em Cinema, na Universi-

dade da Beira Interior, não conseguiu

encontrar emprego nessa área, e ape-

sar de ponderar a emigração, ficou

em Portugal. Apostando no seu enri-

quecimento pessoal, enveredou por

uma segunda licenciatura, desta vez

na UC, o que a impediu de ter acesso

a uma bolsa de estudos. Natural de

Portalegre, e com um suporte “muito

reduzido” dos seus pais, a única solu-

ção que encontrou foi pedir um em-

préstimo. Dão-lhe 400 euros por mês

e sabe-se lá quando o acaba de pagar

– “depois de seis, sete anos…”, diz

Clara, a pensar no seu futuro. Tal

como Diogo, também Clara procurou

emprego. Mas em Coimbra, “é muito

difícil, está tudo sobrelotado”, la-

menta.

São estes apenas dois casos. Mas

são estes mesmos dois casos que tra-

duzem a transversalidade de aperto

do nosso povo. Duas famílias que, de-

pois da aprovação do OE2013, veem a

sua situação piorar. Desde avós re-

formados que assistem a um corte

substancial nas pensões e ao au-

mento improporcional dos cuidados

de saúde; a pais com um negócio pró-

prio parado e sujeitos a um aumento

de contribuições fiscais; mães que

estão já privadas de salário e veem

Transversal à sociedade, cortante para o povo e insuficiente para uma melhor situação sócio económica do pa

trouxe duras novidades. Desde reestruturações na administração pública a cortes nas pensões, esta aprovação

e contamos as histórias de dois estudantes e das suas famílias. Testemunhos que espelham os efeitos tentacu

C

Orçamento do Es não somos só meros n

“A universidadenão se pronunciasobre o OE2013 no seu conjunto”, sublinha o reitor,ao mostrar que sóo financiamentoem relação ao ESlhe diz respeito

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6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 3

DEsTAquE

cortados os vários subsídios; uma ad-

ministração pública cada vez mais

reestruturada ou até aos casos do au-

mento da precariedade laboral e im-

pulsionamento do desemprego.

Todos são afetados, ninguém escapa,

mais uma vez, aos números, aos cor-

tes e às percentagens.

Números a menos no Ensino SuperiorDesta forma, o ES não é alheio ao res-

tante panorama. Pelo contrário, no

Ensino Superior “o limite já foi atin-

gido”. Quem o admite é o reitor da

UC, João Gabriel Silva, que acres-

centa ainda que “se todos os setores

da sociedade portuguesa tivessem

cortes desta dimensão já não precisá-

vamos da ‘troika’”. Inicialmente, foi

apresentada uma distribuição orça-

mental oficial pelo Ministério de

Educação e Ciência que residia num

corte 2,5 por cento para as institui-

ções de ES. Contudo, João Gabriel

Silva e o presidente do Instituto Poli-

técnico de Coimbra (IPC), Rui Antu-

nes, concordam ao alertar que com a

aprovação do OE2013 na sua genera-

lidade, este valor é muito próximo

dos 10 por cento.

Rui Antunes tenta explicar que, a

nível absoluto, o IPC tem disponíveis

menos dois milhões de euros e que

“não tem onde cortar esse valor”.

Para João Gabriel Silva, neste mo-

mento, o que ajuda a equilibrar as

contas da UC são os estudantes que

vêm de fora. No entanto, ressalva que

se este corte se der efetivamente é

“dramático e insustentável” para a

UC. Segundo Rui Antunes, no IPC,

sobretudo no último ano, já foram re-

duzias cargas letivas de curso, já

foram dispensados professores com

contrato a termo e já se cortaram des-

pesas em equipamentos, o que ape-

lida como “desinvestimento enorme

na qualidade”.

“A universidade não se pronuncia

sobre o orçamento no seu conjunto”,

sublinha o reitor, ao mostrar que só

o financiamento em relação ao ES lhe

diz respeito. Não conseguindo espe-

cificar o número de cantinas abertas

no Polo I, João Gabriel Silva admite

que “fechar uma das mais pequenas

não tem impacto nenhum”. Os Servi-

ços de Ação Social da UC (SASUC)

são também um espelho da necessi-

dade dos estudantes que recorrem a

serviços a um preço menor. No en-

tanto, João Gabriel Silva considera

que com as reestruturações dos

SASUC, são os estudantes da UC “os

mais beneficiados”, uma vez que a UC

conseguiu “melhorar a qualidade dos

serviços”. Já Clara de Oliveira parece

não ser da mesma opinião que o rei-

tor. A estudante vive numa república

e paga uma renda onde a alimentação

é incluída, o que faz com que não re-

corra com regularidade aos SASUC,

visto que o preço do prato social já

não é “tão social quanto isso”.

“Como podemos acreditar no

nosso ES quando o nosso próprio go-

verno lhe dá o descrédito total?”,

deixa Diogo Barbosa, ao enumerar

com uma segurança de quem co-

nhece a situação ao detalhe as recen-

tes notícias dos cortes no ES: “bolsas

diminuídas e a desaparecerem, mes-

trados e doutoramentos a ficarem

mais caros, encerramento de 100 cur-

sos no próximo ano… Perante este

rol, Diogo reflete: “acho que não há

perspetivas de futuro para os estu-

dantes neste momento”. “Se tiveres

dinheiro tens futuro, se não tiveres

dinheiro não vale a pena tirares um

curso”, concluiu.

Professores e estudantescom o papel de agirAntes da aprovação do OE2013 na

sua totalidade, cabe ao Conselho Eco-

nómico e Social (CES) emitir um pa-

recer sobre o documento. O parecer

que saiu ontem, 5, de uma reunião do

CES é claro ao mostrar uma posição

de discordância face às políticas su-

geridas neste orçamento: “a proposta

de OE2013 não responde à necessi-

dade de crescimento económico, de

melhoria do financiamento da eco-

nomia e de aumento do emprego”.

Para o CES, “o reequilíbrio sustentá-

vel das finanças públicas só será pos-

sível através de uma «profunda

reforma» do Estado e da Administra-

ção Pública”. O Jornal A Cabra con-

tactou o Ministério das Finanças,

porém na pessoa da assessora Paula

Cordeiro, lamentam e dizem “não ser

possível” prestar declarações.

Para o dirigente do Sindicato dos

Trabalhadores da Administração Pú-

blica e de Entidades com Fins Públi-

cos (SINTAP), José Abraão,

atualmente “há milhares de trabalha-

dores dos serviços públicos que

fazem o trabalho deles e o daqueles

que se aposentaram e que não foram

substituídos”. Desta forma, nas me-

didas do lado da redução da despesa

patentes no OE2013, o grande enfo-

que de corte vai para a administração

pública e setor empresarial do Es-

tado. Segundo José Abraão, existem

já cerca de 85 mil trabalhadores em

regime de contrato com termo reso-

lutivo. Contudo, este número vai au-

mentar, pois como alerta o líder da

SINTAP: “o Governo, com este orça-

mento, propõem que estes sejam re-

duzidos em 50 por cento”, o que pode

“comprometer os serviços”, ressalva.

Para além do corte no ES, o abati-

mento total no setor da Educação é

próximo de 700 milhões de euros. Se-

gundo o professor do Agrupamento

de Escolas da Lousã e membro da

Transversal à sociedade, cortante para o povo e insuficiente para uma melhor situação sócio económica do país, o Orçamento do Estado para 2013 (OE2013), já aprovado na sua generalidade,

trouxe duras novidades. Desde reestruturações na administração pública a cortes nas pensões, esta aprovação foi já alvo das inúmeras vozes críticas. Aqui personalizamos essas vozes críticas

e contamos as histórias de dois estudantes e das suas famílias. Testemunhos que espelham os efeitos tentaculados destas medidas de corte. Por Ana Morais

cortar, dar golpe em, encurtar,aparar, abater, amputar. Parecem serestes os objetivos do executivo paracom o povo português. como se nãobastassem as medidas que têm vindoa ser incutidas e que nos dizem serculpa da já gasta austeridade - im-posta por uma abertura de uma in-tervenção externa e tecnocrata -,chega-nos agora um novo orçamentoque surpreende pelo sufoco im-posto.

Se em 2012 já não se soube ondecortar, em 2013 vai ser difícil perce-ber onde não nos exigem que se en-curte. A transversalidade dos suoresextraordinários que são impostos aosvários ramos de atividade com oOE2013 é notória.

cortar no ensino e na educação,quando uma sociedade precisa de seconstruir. cortar nos apoios sociais,quando é necessário inverter o es-tigma de um povo cada vez mais de-sprotegido. cortar as despesas desaúde e aumentar as taxas moder-adoras, quando a nosso país é dosmas envelhecidos. cortar na admin-istração pública de forma aleatória efortuita, quando se ignora a perda dequalidade dos serviços públicos.Enfim, e quando se corta, só secorta?

já cantava josé mário Branco, “ecada um se lamenta/que isto assimnão pode ser/que esta vida não seaguenta/-o que é que se há defazer?”. A inquietação da música “Ascanseiras desta vida” ganha con-tornos de intemporalidade, ao es-pelhar a grande aflição da maioriados portugueses. O que é que se háde fazer quando só se corta?

As histórias apresentadas nestaspáginas são disso exemplo. Estu-dantes, professores, sindicalistas,líderes institucionais – com discursose condicionantes distintos, todosconvergem numa ideia, a daoposição ao OE2013. Se cada vezmais vozes se ouvem e caras semostram contra estas medidas, falta-nos perceber o porquê dos repre-sentantes governamentais persistiremnesta linha da ação. não será esteum indicador de que a democracia ea pluralidade começam a ser com-prometidas?

Porém, é a combatividade dostestemunhos destes dois estudantes(que espelham a vida de outros tan-tos) que devem ser realçados. Apostura critica e de insatisfação coma atual situação do país parece ser aforça que preenche estas histórias eas faz querer ser um exemplo dedenúncia.

mas, a insistência desta linha deação começa a refletir-se num de-scontentamento generalizado da so-ciedade. Quando os sacrifícios nosesgotam e quando estes cortes já far-tam o que fazer para lutar contra “Ascanseiras desta vida”? voltando ajosé mário Branco, parece que temosque voltar ao “corta a carne, corta opeixe/não há pão que o preçodeixe/a poupar/a poupar/ a notinhaque se queixa/tão difícil de ganhar”.

Por Ana Morais

OPINIÃO

QuAndO “AS cAnSEirASdEStA vidA” já fArtAmOrçamento do Estado 2013

não somos só meros números no papel

Page 4: Edição nº 252

desTaque4 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

“A continuar desta ma-neira, provavelmentechego a janeiro e vou-meembora. São cinco anosque vão ao ar de repente”

Diogo BarbosaEstudante

“Estão-nos a tirar tudo, osrecursos todos. E não sei

se isto vai resultar”Clara de OliveiraEstudante

“Este é um corte dramá-tico e insustentável. Setodos os setores da socie-dade portuguesa tivessemcortes desta dimensão jánão precisávamos da‘troika’”

João Gabriel SilvaReitor da UC

“O IPC tem disponíveismenos dois milhões de

euros e não tem ondecortar esse valor”

Rui AntunesDirector do IPC

“Os reflexos irão fazer-sesentir não só ao nível dosprocessos de ensino, mas

muito particularmenteao nível das condições

emocionais”Jorge SantosProfessor

“Aos professores e aos es-tudantes, por serem amassa crítica mais im-portante da intelectuali-dade portuguesa, estáreservado o papel deagir”

Luís Lobo Professor

“Este OE2013 é um forteataque as classes mais

desprotegidas com meno-res rendimentos”

António MoreiraUnião dos Sindicatos de

Coimbra

FENPROF, Luís Lobo, pode ser re-presentativo da “proliferação da pre-cariedade”. E, desta forma, asconsequências extravasam a ativi-dade laboral, estendendo-se ao nívelpessoal quer dos professores quer dosrestantes trabalhadores da adminis-tração pública. “Os reflexos irãofazer-se sentir não só ao nível dosprocessos de ensino, mas muito par-ticularmente ao nível das condiçõesemocionais necessárias para um ade-quado exercício profissional”, refleteo também professor, Jorge Santos.

De novo, este são dois casos espe-cíficos que representam um espectrovariado da sociedade portuguesa. Osdois professores convergem num dis-curso de instabilidade e de incertezaque pode afetar o estado do ensino:“estamos confrontados com uma si-tuação de podermos amanhã ser dis-pensados”, desabafa Jorge Santos.

O caminho destes professorescruza-se assim com as histórias dosdois estudantes, mostrando a abran-gência que estas medidas assumem.Todavia, é nessa convergência que oprofessor Luís Lobo encontra um ca-minho: “aos professores e aos estu-dantes, por serem a massa críticamais importante da intelectualidadeportuguesa, está reservado o papel deagir”.

Uma família que espelha outras tantasÉ com essa vontade de agir e de con-tar a sua história para denunciar mui-tas outras que Diogo apresenta umdiscurso coeso e crítico. Refere a fór-mula de atribuição de bolsas, apre-senta os valores cortados naEducação, enfim, explica tudo queafeta a realidade que conhece. Paratal, fala-nos com um à vontade detodo o seu seio familiar, apesar deconfessar que lhe é difícil. A sua mãetrabalha numa pequena indústriatêxtil privada, em Oliveira de Aze-méis, já não recebe há seis meses e afábrica está a atravessar um processode insolvência. Como se estes fatoresnão fossem suficientes para dificultara gestão do orçamento familiar, oOE2013 trouxe mais surpresas. Nãorecebeu o subsídio de férias e corre orisco de perder o subsídio de Natal.Isto, porque no OE2013 é vincada aideia de que é necessário existir uma“repartição do esforço entre o setorpúblico e o setor privado”. O pai deDiogo, trabalhador por conta própriana construção civil (que se tem apre-sentado em declínio), vai ver a suacontribuição para a segurança socialaumentar com o novo orçamento. Éaqui que se podem ver as medidas dolado do aumento da receita, com umaumento recorde para a carga fiscal,traduzido em mais de 80 por centodo esforço de consolidação, sobre-tudo em impostos.

Também o contexto familiar deClara nos conta como outra alteraçãosignificativa do OE2013 – as novasregras nas pensões. O seu avô vai terum corte substancial na pensão, oque afetará toda a gestão das contasda casa. Com um uso recorrente doscuidados de saúde e com uma cargaelevada de medicamentos para pagar,os avós de Clara veem a sua situaçãoagravada e deixam de a poder ajudarnas suas despesas: “se não fosse esta

carga tão elevada eles poderiam aju-dar-me mais”, lamenta. TambémDiogo faz questão de referir que a suaavó “vai deixar de receber dois mesesde reforma”, evidenciando ainda ocorte na pensão mínima que passa de419 para 377 euros.

Concentrado na preparação dapróxima greve geral para 14 de no-vembro, o representante da Uniãodos Sindicatos de Coimbra (USC),António Moreira, mostra a oposiçãoda USC perante o novo orçamento.“Este OE2013 insere-se num quadrode numa contração económica brutale é um forte ataque as classes maisdesprotegidas com menores rendi-mentos”, reitera. Ao lamentar o nú-mero de desempregados em Coimbra- cerca de 27 mil - António Moreirasublinha a abrangência dos impactosque o novo OE2013 traz para a ci-

dade. Na construção civil, no setormetalúrgico, no pequeno comércio eaté na restauração (com o aumentodo IVA), Coimbra é o reflexo do restodo país, e até de alguns polos euro-peus. “Estamos a atravessar um ca-minho tortuoso e difícil”, expõeAntónio Moreira.

“Estão-nos a tirar tudo”Questionados sobre se os sacrifíciosvalerão a pena, Diogo e Clara, apesardas diferenças no discurso, parecemconcordar na falta de esperança e naincerteza dos próximos tempos. Numtom sereno, Clara é crítica em relaçãoàs medidas já implementadas peloexecutivo e às propostas do OE2013.Para a estudante, a sociedade tende aenfraquecer-se e esgotar-se com estascontenções: “estão-nos a tirar tudo,os recursos todos. E não sei se isto vai

resultar”, afirma com um ar incerto.Já Diogo, num tom mais reivindica-tivo, evidencia a sua combatividade eapela à dos outros. “O ES é cada vezmais para uma elite e se continuar-mos neste caminho, eu infelizmentevou ser dos próximos a abandoná-lo”,assegura ao querer, mais uma vez, es-pelhar outros casos semelhantes.

Para evidenciar os enredos de umasociedade fortemente afetada e des-contente com as medidas expostasnas já referidas mais de 300 páginas,ilustradas de gráficos, tabelas, qua-dros, percentagens, números e maisnúmeros, demos voz a estes testemu-nhos. A reflexão das dificuldades nageneralidade do povo é, cada vezmais, evidente. Mas, fica a pergunta:será que os sacrifícios - nestes mol-des - valerão a pena?

com João Martinsinfografia por camilo Soldado

Em 2013, o ES perdeu 47 milhões de euros divididos entre cortes na área de investigação científica e projetos

Vozes

Críticas

Page 5: Edição nº 252

6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 5

EnSino SUpErior

DG/AAC quer grande adesão estudantil ao protesto de dia 22A academia encontra-se

num mês decisivo para

determinar a sua palavra.

Unem-se esforços para

agitar tudo e todos

contra os ataques ao

Ensino Superior (ES)

Quer-se um novembro de pro-testo e ruído para com as políticascastradoras que vêm a ser seguidaspor toda a extensão do ES no país.Em última Assembleia Magna(AM), dia 30 de outubro, fora apro-vada uma moção que quer concen-trar em duas datas essa intenção:“queremos ser aqueles que estão nadianteira, não podemos deixar defazer porque os outros não que-rem”, expressa o coordenador-geraldo Pelouro da Política Educativa daDireção-geral da Associação Aca-démica de Coimbra (DG/AAC),Tiago Martins. A vontade de, no dia14 de novembro, se encerrar aPorta Férrea em sinal de protestosolidário com a greve ibérica de tra-balhadores levou à consideração deque isso poderia funcionar comouma demarcação dos trabalhado-res. “Não se unirem à greve geralpor causa da luta de sindicatos é es-tranho”, admira-se o representanteda plataforma “Universidade con-tra a austeridade”, Diogo Silva.

O coordenador-geral contrapõeessa ideia e afirma que a vontade daDG/AAC não é praticar “uma lógicaindividualista” já que não havia en-tendimento total entre as centrais

sindicais. Desta forma, não se tomauma posição por nenhuma delas ecria-se uma forma de protestar pró-pria para “ manifestar o desagradocom a situação politica”, asseveraTiago Martins.

Que não se pense que o protestose esgota em dia de greve geral. Aação que se segue ao encerramentoda Porta Férrea pretende de umavez por todas movimentar. Já mui-tas vezes se afirmou que esse é ogrande problema que a AAC en-frenta – agitar os estudantes paraque todos saiam à rua e tenhamuma expressão. “Não queremos, etemos tentado não nos cingir àsmanifestações tradicionais e acres-centar algo diferente que possa tra-zer as pessoas para a nossa causa”,reforça Tiago Martins.

O grupo de trabalho que encetaráesforços para o “forte” protesto dedia 22 conta com um representantepor faculdade. O representante daFaculdade de Letras da Universi-dade de Coimbra, Daniel Nunes,afiança que o dinamismo da cha-mada de estudantes passará por“perceber os problemas concretosque os estudantes sofrem neste mo-mento, tentando assim criar umaonda de solidariedade onde todosestejam presentes nas datas da rei-vindicação”.

A última reunião do grupo tidaontem à noite serviu para mudar ofundo e alinhavar questões como aida às faculdades para explicar e di-vulgar a luta. Já durante esta se-mana se avançou com uma medidaa nível das redes sociais que pre-tendia passar o fundo das imagenspara preto em sinal de reclamação.Gerou curiosidade: “as pessoas per-guntam o que representa essa ima-

gem. Está a haver uma grande ade-são da comunidade estudantil”, as-segura Tiago Martins. A imagemvai mudar. O preto vai dar lugar auma foto de perfil de Facebook que

lembre o pulsar da AAC.

Outras vozesTorna-se incontornável ouvir a vozde outros coletivos que represen-

tam os interesses dos estudantes.Os movimentos associativos estãodo lado da DG/AAC. “Ficamos con-tentes que novembro seja o mês deluta para dar resposta às politicasde destruição do ES”, declara a re-presentante do movimento A Alter-nativa és Tu!, Alma Rivera. Omembro do coletivo AAção, JoãoCosme, recorda que é “importanteter uma série de ações que não sejaisolada mas tem de ser um pro-cesso reivindicativo contínuo”. Es-teve em cima da mesa a propostade uma manifestação nacional nodia 22 por este moviment, o e portodos os outros de Coimbra, quecontinuam a pensar que a respostaé mais forte se se aderir à reivindi-cação nacionalmente. E agorasurge o convite por parte de algu-mas associações em Lisboa. AlmaRivera não se desvincula da ideiado protesto nacional e acha que aposição contra o Orçamento do Es-tado para 2013 da DG/AAC tem deser executada em “conjunto com asoutras, porque é aí que se cons-troem as vitórias”.

Tiago Martins confirma que aAAC já foi contactada, mas lembraque a moção do protesto nacionalem AM “foi chumbada”. Reitera aideia de convergência, mas no sen-tido de olhar pelas “sensibilidadesde cada cidade, se isso acontecer”.

O apoio da instituição também éimportante e o reitor João GabrielSilva já afirmou a intenção de tertodos os estudantes junto de si e doprotesto contra o Orçamento doEstado em particular. Deixou no aro convite para que se juntem a umaação a realizar-se esta sexta -feirana Universidade. Resta saber o queserá.

A massificação e

efemeridade do período

académico que os jovens

vivem leva a que cada

vez mais se afastem

da responsabilidade

de lutar pelo conjunto

“Uma vez falei com o senhor se-cretário de Estado e discutimosporque é que o nível de endivida-mento dos jovens dos Países Afri-canos de Língua Oficial Portuguesatem aumentado. Perguntei quandoé que o Estado nos ajudava e eledisse que não se justificava. Nãoconseguíamos trazer para a ruamais que dois mil estudantes”. Oepisódio passou-se com um ex-di-rigente associativo. Ficou lançado

o repto. Trazer os estudantes doEnsino Superior (ES) para a rua.

O ano trouxe poucas vitóriaspara os estudantes amparadas nosistema político. Não há alunos dosuperior atrás da linha e faltamconsensos para o movimento asso-ciativo nacional. Porém, ainda hápior: nenhum “secretário de Es-tado, nenhum governo tem medode um grupo de estudantes”,queixa-se o presidente da Direção-geral da Associação Académica deCoimbra (DG/AAC), Ricardo Mor-gado.

A crise poderia ser de um Orça-mento do Estado (OE) que eleva ocidadão português ao estatuto deprecário. Ou de uma máquina vi-ciada na falta de empreendedo-rismo. No entanto, ela tambémderiva das escolas de formação su-perior que contêm a vantagem decomplementar a parte profissional.“Três anos em sistema de Bolonhaobrigam a que se tenha de ser bom

aluno e bom dirigente associativo.É impossível”, sublinha o técnicodo Conselho Nacional da Juven-tude.

Em sede de debate promovidopelo núcleo de estudantes da Fa-culdade de Direito da Universidadede Coimbra quis-se discutir,ontem, 5, o paralelo entre o OEpara 2013 e os impactos no asso-ciativismo estudantil. A interpreta-ção do caso envolvido e da suapremissa poderia dar azo a duasformas: ou o OE cortaria na des-pesa para as estruturas de incen-tivo às atividades estudantis ouprovocaria um estímulo na vontadedo jovem querer participar na vidapolítica para reivindicar. Pode pa-recer paradoxal, mas a tentativa élegítima, numa altura em que épreciso abortar a resignação aosproblemas afetos a uma rede de ESque em cinco anos perdeu mais de200 milhões de euros.

“A rede de ES não é uma rede. É

um emaranhado”, sustenta o presi-dente da Juventude Social-Demo-crata, Duarte Marques, presente nodebate. O também deputado na As-sembleia da República apresentouum despudor na certeza de que háinstituições que têm de fechar.Apresentou dúvidas de que estaseja a geração mais qualificada desempre, prefere apelidá-la de “cer-tificada”.

Duarte Marques não se demiteda sua postura de líder de Estado.Traz para a discussão o caso do su-porte do Estado não ser o de apoiarnaquilo que as associações querem.

O significado do OE 2013 para asestruturas juvenis até será positivo:não sofrerá qualquer corte esteano. Mas estará o estudante dentrodo quadro associativo capaz delutar para fora do seu nicho? “Nãochegamos a 20 mil alunos inscritosna Universidade de Coimbra por-que ainda não pagaram”, lembra opresidente da DG/AAC.

Compromisso com o associativismo é inconstante

AnA MorAis

Protesto de dia 22 foi aprovado por larga maioria na última AM

Liliana Cunha

Liliana Cunha

CRUP discutefecho de universidades

O reitor da Universidade de Coim-bra, João Gabriel Silva garante queuma ação conjunta entre universida-des ainda está a ser “desenhada” e pre-tende ter um grande impacto para asociedade civil. O protesto das 14 uni-versidades está marcado para sexta-feira, 9, e pretende ser realizado portodas ao mesmo tempo. A possibili-dade de encerrar as instituições nessemesmo dia não é negada pelo reitor –“não descarto essa possibilidade nemqualquer outra”. A fragilidade da con-tinuação das Instituições do EnsinoSuperior obriga o Conselho de Reito-res das Universidades Portuguesas areunir amanhã, 7 de novembro, paradecidir sobre a ação conjunta das 14universidades para protelar contra oOrçamento do Estado para 2013.

Liliana Cunha

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ensino sUPerior6 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

Estudantes do Polo II pedem recuo no regime de prescriçõesHá na Universidade de Coimbra situações pendentes no plano académico de cerca de dois mil estudantes que

correm o risco de prescrever. A alteração do regime quer que neste ano letivo alunos aparentemente em

situações regulares passem a acarretar mais carga de trabalhos, senão saem da instituição. Por Liliana Cunha

ndei a estudar para nofinal prescrever? Comque cara é que vouchegar aos meus pais

e dizer: olhem, por causa de meiamatrícula, chumbei e prescrevi”,conta o estudante de EngenhariaMecânica da Faculdade de Ciênciase Tecnologias da Universidade deCoimbra (FCTUC), Jorge Qua-resma.

O Polo II da UC está a braços comuma luta contra o regime de pres-crições aprovado em julho passado.Na FCTUC, a maior parte dos cur-sos funciona com mestrado inte-grado, levando o aluno a ter de ocompletar para obter os dois grausacadémicos. Muitos estão em riscoe prevê-se que o número possa che-gar aos milhares. São “mais de doismil de certeza. No Polo II há genteque está no quinto, com a sexta e asétima matrícula”, adianta o ex-pre-sidente do núcleo de EngenhariaMecânica.

Prescrever significa perder o di-reito à inscrição em qualquer umdos ciclos de estudos (licenciatura emestrado integrado) quando o estu-dante não cumpre os requisitos deaproveitamento escolar. O alarmeque surgiu neste início de ano letivona UC deriva do facto de o estudantesó ficar a saber pela plataforma In-

forestudante de que dispõe de umano para reverter a situação senãofica aberta a possibilidade de parardurante um ano o ciclo de estudosem questão.

“Só temos uma pequena amostraestudantil mas, nos nossos resulta-dos, metade dos alunos do mestradointegrado aqui no Polo II, estão emrisco de prescrição, e dessa metade épor causa do novo regime”, afirma ovice-presidente do núcleo de Enge-nharia Civil, Luís Coimbra. Em En-genharia Civil, o núcleo deestudantes propôs-se a realizar uminquérito para apurar a gravidadeda situação. O objetivo é falar com omaior número de pessoas possívelpara “reverter o regime”, afirmaLuís Coimbra. Pela parte da vice-rei-tora para a Pedagogia, MadalenaAlarcão, não adianta um númerocerto porque “não seria realista”.

Todavia, a resposta tarda em che-gar e os alunos precisam de uma já.José Coelho Mendes, estudante deEngenharia Mecânica, foi um dosque já prescreveu. Mas já sabia quecorria esse risco. Agora está inscritoem cadeiras isoladas e pensa arran-jar trabalho para ajudar os pais como pagamento. Todos são próximosde algum colega que já conheceu ouestá agora a conhecer o risco. EmMecânica, o problema remonta ao

ano passado e deriva da mobilidadede uma cadeira de mestrado para ociclo de estudos da licenciatura.

Não cabe ao aluno decidir?A explicação não é simples, mas obenefício de que os alunos de mes-trado integrado deveriam usufruirestá agora bloqueado. É possível atransitoriedade entre anos e fazernum conjunto de cinco créditos decadeiras correspondentes a qual-quer ano, sem seguir à regra o cursodo plano de estudos.

“Se prescreverem por insucesso enão por aplicação do regulamento,aí terá que ser”, garante MadalenaAlarcão. Deixa a porta aberta a casosem que será necessário avaliar maisatentamente a situação. Porém, ogrande problema não se prende como insucesso porque há alunos quetêm apenas duas a quatro cadeirasem atraso num total de cinco matrí-culas.

Está em aberto a possibilidade dealguns alunos pararem o cursomesmo quando estão em vias de oacabar. “Posso fazer cadeiras isola-das mas isso aí são logo 30 créditospara a tese, 60 euros por crédito.Tenho de me aplicar este ano”, ex-plica Jorge Quaresma. Se corrermal, apresentará requerimentos

para resolver a situação caso não al-terem o regulamento.

“A questão não é recuar ou não. Oregulamento existe e tem que seraplicado para se poder fazer esseajustamento”, explica MadalenaAlarcão, ao alertar também para ofacto de este já ter saído em julho. Aproposta de aumento no período detransição para a aplicação do regu-lamento é a única maneira, segundoos estudantes, de conseguir invertera possibilidade de dez por cento dosalunos da universidade prescreve-rem.

“É um contrassenso o aluno estara fazer avaliações a um nível supe-rior de conhecimento quando nãotem os anteriores”, afirma a vice-rei-tora. No entanto, o estudante tem odireito de recorrer à flexibilidade naprioridade do plano de estudos.“Nós não temos regime de prece-dências, cabe à instituição ajudá-losa decidir”, alega Madalena Alarcão.

Movimentar esforços para alterar o documentoOntem, 5, o núcleo de EngenhariaCivil reuniu com o provedor do es-tudante, Rogério Leal e o vice-pre-sidente afirma que o provedor semostrou solidário com o problema.

“O plano agora já se mostrou maisexequível [no que toca ao período de

transição] ”, atesta Luís Coimbra. Osestudantes estão, neste momento, atentar com que a época de finalistade licenciatura se estenda aos quefrequentam mestrados integrados.“Temos os mesmos deveres mas nãotemos os mesmos direitos”, lamentao vice-presidente.

Este regulamento, e a respetivatransição, têm apenas o período deum ano. “No próximo setembro, [osalunos] já prescreveram”, garanteLuís Coimbra. Por enquanto, conti-nuarão a recolher testemunhos paramostrar à reitoria a gravidade da si-tuação e pedem a ajuda da Associa-ção Académica de Coimbra (AAC).“Isto agora está muito a ferver,ainda não falamos com instânciassuperiores, e porque somos um or-ganismo pertencente à AAC, não de-víamos fazer nada sem ela”,assevera a estudante de EngenhariaCivil, Mariana Pereira.

A espera é contínua. O presidenteda Direção-geral da AAC, RicardoMorgado, já reuniu com a reitorianesse sentido e diz que nada do quelá saiu foi concreto. “Acho que a UCestá bem ciente de que terá de fazeralguma coisa porque ainda não sepensou no impacto que isto poderáter nos estudantes sem lhes dar umasegunda oportunidade”, explicaMorgado.

“A

Stephanie Sayuri paixão

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6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 7

ensino sUPerior

IPC pondera adoptar propina máximaA realidade do iPC está,

a par das outras escolas

superiores, prestes a

rebentar a corda. Pede-se

que ainda “se pare mais

qualquer coisa” pelo

título dos cortes

É cada vez mais recorrente oexemplo que as Instituições de En-sino Superior representam, no cená-rio onde tudo está sob penhora.Embora as universidades públicassejam as que sofrem o rombo maior,os Institutos Politécnicos e a sua po-tencialidade prática não deixa tam-bém de ser posta na cauda do apertodos cortes. Trocam-se as voltas desdehá três meses para cá. O início donovo ano letivo foi planeado com um

corte de 3,2 por cento em cima damesa. No entanto, e com o novo Or-çamento do Estado, o corte ascendeaos 25 milhões de euros, represen-tando quase o triplo do inicialmenteanunciado. Por cá, fazem-se as con-tas aonde se pode ceifar mais algumaverba nas seis escolas que compõemo Instituto Politécnico de Coimbra(IPC).

“Temos um agravamento da nossadespesa em mais de seis por centosomado agora ao que já foi descon-tado em julho e agosto”, comenta opresidente do IPC, Rui Antunes. Sóno final no mês de outubro se conhe-ceram os novos contornos no orça-mento das escolas quando já tudoestava planeado: “dá um corte no or-çamento superior a oito por cento”,frisa Rui Antunes. O orçamento parao Politécnico de Coimbra sofreu umrevés porque, em suposição, o go-verno concedera mais algum di-nheiro para pagar o 13º mês aosfuncionários já que retrocedeu para

o corte a apenas um subsídio. Toda-via, nem isso chegou.

A situação do Instituto Superior deContabilidade e Administração deCoimbra (ISCAC) é como a de todo oEnsino Superior (ES) público. Tentasobreviver “a este ataque frontal àdescentralização do ES. A prioridadedo ISCAC é ter como pano de fundoque “não há despedimentos na es-cola, porque as pessoas são necessá-rias e servem a escola. Isto servetanto para professores como parafuncionários”. O presidente doISCAC, Manuel Castelo Branco, tentareverter a situação de outra forma,enceta esforços numa maior divulga-ção da escola e não deixa que os seusalunos abalem para fora do ES por-que têm dificuldades: “contrariamosa lei ao aceitar planos de pagamentoo mais flexíveis possível, para queum único aluno na escola não deixede estudar por falta de meios parapagar as propinas que equivalemquase ao preço do privado”.

Gestão precária de recursosJá se alcançou o abate de verbas naqualidade de quem ensina e é ensi-nado no ES. E o aquecimento no in-verno é caso disso. Têm sidorecorrentes as histórias do corte numbem essencial para o bem-estar –“em relação ao aquecimento, aquiloque estamos a fazer é diminuir otempo de utilização da escola e dimi-nuir o número de salas em funciona-mento”, atesta o presidente da EscolaSuperior de Tecnologia e Saúde deCoimbra (ESTSC), Jorge ManuelConde.

Esta escola antecipou os cortes jáno ano letivo transato e tentou agre-gar turmas maiores, como exemplo,a uma cadeira ambivalente a várioscursos. Contudo, passando para aparte prática, tal não é passível de serfeito: “nas aulas de ambiente hospi-talar, não é possível ter vinte alunosem volta de um doente, não faz sen-tido”, sustenta o presidente da

ESTSC.“Há dois anos desligamos os equi-

pamentos de ar condicionado du-rante o verão e temos implementadomedidas de redução de consumos deágua, eletricidade e combustíveis”,enumera o presidente da Escola Su-perior Agrária de Coimbra, José Gas-par.

A amplitude dos cortes tambémtem reflexo no valor da propina apagar. E mesmo que a realidade dovalor da propina no politécnico sejamais baixa do que na universidade,não tardará a tornar-se ao mesmonível. “Admito que todo o IPC dentrode pouco tempo estará na propinamáxima, se não for no próximo ano éno outro de certeza”, garante o pre-sidente da escola que aplica a pro-pina mais alta de todo o IPC (oISCAC), Jorge Manuel Conde. “Esta-mos a parar tudo, e neste momento,querem que a gente ainda pare maisqualquer coisa”, queixa-se Rui Antu-nes.

Depois da demissão

de José Guilherme da

comissão organizadora,

as atividades de

comemoração dos 125

anos são incertas. Leal

afirma que podem

continuar

A 24 de abril, a comissão organi-zadora para as comemorações dos125 anos da Associação Académicade Coimbra (AAC) é apresentada. Osprojetos e desejos expressados nessedia foram, em parte, gorados, e istodeveu-se a um principal motivo: ademissão do responsável pela co-missão organizadora, José Gui-lherme.

As causas desta demissão aindanão são bem claras. Contudo, o ex-

responsável pela comissão organiza-dora adianta que “por achar que aAAC não desenvolvia um compro-metimento que este evento merecia”, José Guilherme decidiu afastar-se.

A 1 de outubro, o presidente daDireção-geral da AAC (DG/AAC),Ricardo Morgado, em entrevista aoJornal Universitário de Coimbra – ACabra, aborda a questão da demis-são de José Guilherme, manifes-tando “a esperança de que ele [JoséGuilherme] possa voltar [à comis-são] ”. Contudo, o ex-membro da co-missão adianta que nada foi feitonesse sentido: “mesmo após o meuafastamento, tentou-se marcar algu-mas reuniões, mas por motivos deagenda da presidência, nunca foipossível”. Isto também significou al-guns problemas em “passar a pastade forma o mais tranquila possível”,acrescenta.

O vice-presidente da DG/AAC,Francisco Leal, foi quem assumiu aresponsabilidade da comissão.Mesmo não tendo havido um acom-

panhamento para a transmissão dapasta, isso não se revelou muito sig-nificativo, visto que Francisco Leal jáestava ligado à comissão desde iní-cio.

Falta de poder de decisãoe de comunicaçãoNa opinião do ex-membro da comis-são, Francisco Leal foi a escolha in-dicada para assumir a pasta, não sópor ter acompanhado o trabalhodesde início, mas também “pelocargo que ocupa”. “Ele tem capaci-dade para tomar conta deste projetoe também tem o poder de decisãoque eu não tinha por não ser mem-bro efetivo da DG/AAC”, afirma JoséGuilherme, acrescentando que, mui-tas vezes, o seu trabalho via-se difi-cultado por não ter poder de decisão.E exemplifica: “o facto de ter estadodois meses à espera que me abris-sem um conta de e-mail, porque nãotinha o poder de o fazer”. Aindaassim, aponta outra razão para o em-bargo de algumas atividades e diz

que “o maior problema é que conti-nuem a pôr os interesses pessoais àfrente de uma causa que é muitomaior do que todos nós”.

Ainda sobre a demissão, a falta decomunicação entre comissão eDG/AAC é outro motivo apontadocomo causa. José Guilherme atestaque tinha “grandes dificuldades” emcontactar tanto o presidente daDG/AAC, como outros membros.Por seu lado, Francisco Leal afirmaque “ Ricardo Morgado, naquilo quepodia ter feito, sempre ajudou aomáximo e da melhor forma possívela comissão”. Contudo, expressa: “secalhar podia ter havido uma formade comunicar diferente, não só como próprio presidente, mas também anível de trabalho interno, e contramim falo”. Na entrevista dada de dia1, Morgado confirma que “houve al-gumas falhas no trabalho da comis-são com a própria DG/AAC, que oassume”, bem como “falhas de co-municação que atrasaram o pro-cesso”.

Calendário de atividadesdas comemoraçõesAntes da demissão, José Guilhermeafirma que já havia um calendário deatividades “bastante completo e queabrangia todos os setores da AAC,desde os núcleos às secções”. Havia,também, o desejo de “alargar o maispossível essas comemorações emtermos de participação a toda a ci-dade e ao próprio país”. FranciscoLeal, sobre esse calendário, declaraque “algumas dessas atividadespodem continuar”. Apesar disso, ofuturo das comemorações fica umpouco incerto.

Relativamente à gala do aniversá-rio da AAC, realizada no passado sá-bado,3, verificaram-se váriosproblemas técnicos afetos aos vídeosfeitos pela produtora contratada. Ri-cardo Morgado afirma que apesar dea DG/AAC não ter tido qualquer tipode responsabilidade, vão tentar apu-rar o que se passou, dado que se“passou uma imagem menos boa eessa imagem fica colada à AAC”.

Comemorações dos 125 anos da AAC sem futuro certo

Stephanie Sayuri paixão

“admito que todo o ipC dentro de pouco tempo estará na propina máxima, se não for no próximo ano é no outro de certeza”, afirma Jorge Manuel Conde.

Ana Duarte

Liliana Cunha

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Ensino sUpErior8 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

pUBLiCiDADE

Um novo intercâmbio do Brasil aposta na mobilidade estudantil, num momento em queesta está ameaçada pelafalta de verbas no programa Erasmus

“A mobilidade existirá sempre”, ga-rante o vice-reitor para as RelaçõesInternacionais da Universidade deCoimbra, Joaquim Ramos de Carva-lho. Em Coimbra, num universo de22 mil estudantes, mais de 15 porcento são estrangeiros. Este númeroconcretiza-se na distribuição por vá-rios programas de intercâmbio mun-dial. O programa Erasmus,financiado pela Comissão Europeia,é com certeza o mais conhecido, noentanto há uma grande parte denovos alunos que chega do outro ladodo atlântico.

“Somos intercambistas, não entra-mos no programa Erasmus. Em Por-tugal, vieram 1500 brasileiros esteano com este programa”, conta satis-feita Bruna Araújo, do Estado do Pa-raná, no Brasil. Este ano veio estudarem Coimbra. E é uma das que chega-ram ao abrigo do Ciência sem Fron-teiras, um programa em acordo como Governo Federal Brasileiro, nesteano, que pretende nos próximoscinco anos alcançar a meta de enviar100 mil bolsistas para todo o mundo.E o apoio é bem diferente daquilo queoferece a Comissão Europeia. “Estabolsa paga tudo: são 870 euros pormês, os custos da viagem, seguro desaúde e ainda um computador”, sus-tenta Ethiane Mezadri, que chegouhá um mês do Rio Grande do Sul. A

candidatura é sujeita a critérios de se-leção, pedem alunos de excelência, eé “claramente uma bolsa muito supe-rior, por exemplo, ao salário mínimono Brasil, que é de 200 euros”, con-fronta a estudante de EngenhariaQuímica.

Mas há uma contrapartida: Et-hiane e Bruna terão de voltar daqui aum ano e encaminhar todo o suporteque receberam. “Quando voltarmospara lá temos de ficar durante doisanos sem sair do país. É retornar oque pagam por nós”, esclarece BrunaAraújo.

Portugal para quem chegaSão épocas diferentes e prioridadesdiferentes. O Brasil está a apostar emforça na formação dos seus jovenscom modelo no Ciência sem Frontei-

ras. No entanto, em Portugal nãoacontece o mesmo. “Não há mutuali-dade”, lamenta Joaquim Ramos deCarvalho. Os recursos não são equi-valentes e isso reflete-se no facto dea maioria dos estudantes que queremsair de Coimbra escolherem o pro-grama Erasmus que acarreta custossimilares tanto para quem enviacomo para quem recebe.

“No dia-a-dia, aqui não sentimosmuito a crise, mas sabemos que vocêssim. E comparando com o Brasil, acondição de Portugal está muitobem”, lembra Bruna Araújo. Pode pa-recer contraditório, contudo ainda háum retrocesso estrutural na forma devida brasileira.

No contexto de mobilidade in-traeuropeia é inevitável falar do Eras-mus. Mas também este programa

está com problemas de verbas. Ésempre lembrado como um dos casosde sucesso na integração de cidadãoseuropeus nas universidades. O Eras-mus “vai ao encontro de uma neces-sidade, mas pelo facto deeventualmente se pôr a hipótese dedesaparecer, a necessidade não desa-parece e as pessoas vão encontrar for-mas novas de se moverem”, constatao vice-reitor para as Relações Inter-nacionais. O intercâmbio europeutem estado na baila já que a Comis-são Europeia propôs um corte ao or-çamento do programa para opróximo ano de quase dois mil mi-lhões de euros.

“A crise funciona nos dois sentidos.Aliás, do ponto de vista estatístico,não notamos que haja uma diminui-ção tão grande no número de alunos

que chega”, atesta Joaquim Ramos deCarvalho. A saída nestes tempos atépode ser uma mais-valia para a dis-tinção no mercado de trabalho, “emestágios nas empresas do estrangeiro,são oportunidades mais procuradasporque quando há uma crise internaas pessoas viram-se para fora”, pensao vice-reitor.

Só no fim desta semana se decidi-rão as negociações para evitar a limi-tação da qualidade do maiorprograma de mobilidade estudantilmundial. O cenário pode impelir auma maior vontade de saltar os obs-táculos - “uma coisa compensa aoutra, embora ainda seja muito cedopara saber qual dos lados vence – ode retração devido à crise, e outro deexpansão devido à crise também”, he-sita Ramos de Carvalho.

Liliana Cunha

Ian Ezerin

Expansão de estudantes por todo o mundo alimentada pela crise

StEphAniE SAyURi pAixão

A Comissão Europeia propôs um corte ao orçamento do programa ERASMUS de quase dois mil milhões de euros

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6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 9

CUlTUra

Novos trilhos para a Cultura

ubordinado ao tema“TOMAR PARTIDO - Queestratégias de intervenção

local podem ser criadas pelosagentes culturais?”, decorreu nodia 27 de outubro mais um“Fórum Teatrão”. A Tabacaria daOficina Municipal do Teatro(OMT) abriu portas para acolherde novo a opinião da comunidade.

Para um dos membros d’O Tea-trão, Cláudia Pato, este Fórum“vem no seguimento de um traba-lho” que tem vindo a ser realizadopelo grupo. Em edições anterio-res, tentou-se “refletir o projetod’O Teatrão”. Com o intuito de o“abrir às pessoas”, assevera, assimcomo “perceber qual o ‘feedback’que as pessoas podiam dar”, rela-tivamente à relação d’O Teatrãocom a OMT e com a cidade, acres-centou a colaboradora.

O Fórum Teatrão contou com acooperação do “PEOPLES’ OB-SERVATORY”, o Observatório daParticipação, da Inovação e dosPoderes Locais do Centro de Es-tudos Sociais (CES), que sugeriuos instrumentos e os métodos derealização deste Fórum, de formaa reforçar a participação dos in-tervenientes. Esta colaboraçãodeu origem a um ‘workshop’ pré-vio de avaliação interna, do qualsurgiram quatro grandes questõesque foram posteriormente desen-volvidas no “Fórum”.

A saber: “Que papel tem umacompanhia de teatro no destinodas comunidades?”; “Como ima-ginar o «Fórum Teatrão» paracriar espaços onde a comunidadese sinta à vontade para partici-par?”; “A partir das áreas de atua-ção de companhia, que novosprojetos de intervenção se podem

imaginar no território?” e “Comoacha que pode ser avaliado o re-sultado do(s) projeto(s) de inter-venção que se podem imaginar noseu território?”. O objetivo princi-pal a atingir no final deste fórumpassa por criar um plano de tra-balhos, a partir das respostas àsgrandes questões supracitadas.

Cada mesa uma pergunta,múltiplas respostasA diretora artística d’O Teatrão,Isabel Craveiro, depois de fazerum breve resumo sobre as ediçõesanteriores desta iniciativa, expli-cou como se iria desenrolar o“Fórum Teatrão” ao grupo pre-sente, composto por pessoas dasmais diversas áreas (desde mem-

bros do Teatrão, a agentes cultu-rais de diferentes grupos e a insti-tuições da cidade ou atéespetadores). Os presentes foramdivididos em grupos aleatórios,que circulavam entre as mesas etinham de responder às questõesnum intervalo de tempo definido.

Este método de partilha deideias mostrou-se “eficaz”, ga-rante Cláudia Pato. As pessoassentem-se “mais à vontade parapoder colaborar”, refere. A repre-sentar a Casa da Esquina, RicardoCorreia salienta a importânciadestes fóruns, para “criar um sen-tido de comunidade”. O tambémencenador refere ainda a criaçãode “condições de cidadania, per-mitindo cruzar pessoas”, já que

por vezes isso não é possível, por“falta de tempo, de dinheiro, ouporque estamos fechados nonosso casulo”, esclarece RicardoCorreia.

No final, expressou-se a von-tade de concretizar as ideias pro-postas, tendo sido agendada umanova reunião para definir estraté-gias. O objetivo? Pegar nesses re-sultados e “tentar perceber o quepode ser feito”, define CláudiaPato. E conclui, que a médioprazo, “as coisas tenham algumdesenvolvimento prático”. Ficou oconvite da organização dirigidoaos presentes e a todos aqueles aquem nela quiserem ter voz ativapara continuar a discussão dia 24de novembro.

até 27 de Janeiro estão disponíveis no CaV as exposições “o amor de alcibíades” de Eduardo guerra e“obras seleccionadas” de daniel malhão. a entrada é grátis

A assinalar o regresso de DanielMalhão a Coimbra, uma década apósa sua primeira exposição no Centrode Artes Visuais (CAV), foi planeadauma selecção de trabalhos fotográfi-cos realizados nos últimos dez anospelo autor e montada uma exposiçãoexclusiva para este espaço: “Obras

selecionadas”. Durante os próximostrês meses estão patentes no CAVduas novas exibições artísticas, inau-guradas a 27 de outubro e disponí-veis para serem visitadas nas tardesde terça a domingo.

Esta revisitação a trabalhos execu-tados entre 2002 e 2011, que resumea linha seguida pelo artista até aqui eapontando novas direções, versaquestões espaciais, como a arquite-tura contemporânea. Nas 22 obrasescolhidas encontramos maioritaria-mente paisagens e estruturas arqui-tectónicas, não excluindo o próprioprocesso construtivo e de mudançano panorama paisagístico que cria adicotomia construção/destruição.Segundo Daniel Malhão, o desempe-nho enquanto fotógrafo exige “automotivação para satisfazer as enco-mendas fotográficas”, porém é pos-sível também observar um olhar

mais descontraído em algumas dasobras apresentadas.

Subindo ao primeiro andar do edi-fício, encontramos “O amor de Alci-bíades”, um conjunto de trabalhoselaborados por Eduardo Guerra. Or-ganizada em três secções comple-mentares, a primeira dá-nos aconhecer quatro fotografias de pai-sagem registadas em São Tomé ePríncipe. Ao lado, é exibido o filme“O amor de Alcibíades”, filmado porEduardo Guerra, no Rio de Janeiro.Para o artista, a gravação foi “umaexperiência, sem narrativa”. Duranteoito minutos, a câmara foca o per-former brasileiro Gustavo Ciríacanum monólogo que integra, na ver-dade, um discurso partilhado. Asfalas da personagem revelam a des-construção de um diálogo, pois podeescutar-se a interação com o outrointerveniente, mas não se sabe as

respostas, as perguntas e as mani-festações da pessoa com quem estefala.

No entanto, este discurso é sufi-ciente para entendermos as questõescom que o jovem se debate: “deve ounão participar na vida política?”.Para tal, Eduardo Guerra foi buscarinspiração a Platão. Alcibíades, umjovem aristocrata ateniense pronto aentrar na Assembleia, conversa comSócrates sobre como deve governar.Discussão que não perde a atuali-dade, denotando a necessidade deemancipação.

O terceiro elemento é constituídopor pares de objetos, com os quais oartista revela a singularidade daspeças: quer nas fotografias com omesmo enfoque ou em criações ma-nuais, que nunca terão um par igual,pois cada componente conserva assuas particularidades.

A singularidade dos momentos e criações

DAniEL ALvES DA SiLvA

A oMt reuniu cidadãos e diferentes agentes culturais em busca de estratégias de intervenção local

Daniela Proença

a quarta edição do “fórum Teatrão” reuniu na omT alguns dos principaisagentes culturais da cidade, bem como cidadãos que também quiserammarcar presença no debate. por daniel alves da silva e inês pereira

cápor

10NOV

Música

Mscav • 21h30s/inForMação de Preço

cultura

teatro

oMt • vários horários

s/inForMação de Preço

Música

conservatório de Música

21h30 • 12€ c/descontos

Música

conservatório de Música

21h30 • s/inForMação de Preço

cineMa

tagv • 21h30 4€ c/descontos

Por Daniel Alves da Silva

cineMa

casa das caldeiras

18h30 e 21h30entrada livre

9NOV

Música

states cluB

23h00 • 3€

teatro

tcsB • 22h0010€ c/descontos

Projecto FotograFia

casa das caldeiras

21h00 • entrada livre

Música

arte à Parte

22h00 • 5€

19NOV

“porTUgal: EnTrE

o doCUmEnTo E a fiCção”

Chagas CUrado ViEgas wind

Trio fEaT. Carlos “Zíngaro”

samUEl Úria

NOV

7

8 e 9NOV

9NOV

15NOV

NOV

8orQUEsTra Todos

“o profissional”

opEnshow porTUgal

ThE happy moThErs

"o misTério dE BElém"

QUarTETo dE Cordas

dE maTosinhos

“Uma Vida mElhor”

S

9NOV

14 a 5NOV JAN

Page 10: Edição nº 252

CULTURA10 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

ecuemos uns anos. Depoisde um dia de merda, diri-gimo-nos para aquele bar

com as paredes manchadas pelofumo, levados pela vontade de beberalgo e de mandar o nosso patrão parao sítio do costume. Ou imaginemo-nos num ‘road movie’ americano,onde a noite nos conduziu a um bar(sempre a um bar) no meio de ne-nhures. É aí onde a música mais re-cente dos A Jigsaw reside, dentro da‘jukebox’ de um tempo que nuncachegámos a conhecer.

O ar encontrava-se limpo, graças àlei 37/2007, mas isso não impede queviajemos mentalmente até ao recantoonde descansam em terra os “DrukenSailors and Happy Pirates”. E em vezda penumbra enfumada, eram luzescoloridas que iluminavam os artistase a tela branca que se encontravamais atrás. Susana Ribeiro estava au-sente (por motivos de doença), res-tando em palco o baterista MarcoSilva, o compositor e multi-instru-mentista Jorri e o vocalista João Rui,

contador de histórias: primeiro “MyName Is Drake”, e depois “I’ve BeenAway So Long”. Tema que não ficariamal na discografia de Tom Waits, eminício de carreira e com a voz menosencardida.

Uma pausa para as apresentaçõesapós “Even You”, onde o cantor desa-bafa ter esperado ver algum “pirata”na plateia em noite de Halloween.Outro pequeno interregno depois de“Dreams & Feathers” (repescada doanterior álbum “Like the Wolf”),desta vez para trocar a guitarra pelobanjo na música inspirada por Stein-beck, “Red Pony”.

Depois do aviso, “são três palmas,não quatro”, retoma-se o fio de can-ções do último disco, com “LovelyVassel”. Num álbum concetual “sobrea construção da identidade”, sobres-sai a figura do Zé do Telhado, ou“Rooftop Joe”, segundo os A Jigsaw.A música prossegue, com “StrangestFriend” e “Crow Covered Tree”. Estaúltima com uma história curiosa, nagénese da sua composição, foi inspi-

rada pelo levantar de um bando depombos brancos durante uma viagempela Circular Externa e que se trans-formaram em corvos negros, paramelhor condizerem com a sonoridadeda última longa-duração da banda.

Mais uma canção inspirada numescritor, sendo Tolstói o visado em“No more”. Para o final (antes do es-perado encore, claro) estaria reser-vado o tema baseado em Nero, “LastWaltz”, uma espécie de balada a soara Lambchop. O encore trouxe algumaconversa e “Lost Words”, uma versãode um original dos Tiguana Bibles.

Para acabar, desta vez a sério,“uma música animada, que nãoquero que ninguém vá para casatriste”. Declaração de João Rui polvi-lhada com ironia, pouco antes dabanda interpretar “Devil On MyTrain”, que numa cadência marcialencerraria o concerto. Aos 12 anos, asua música torna-se cada vez maisencorpada. A Jigsaw estão a envelhe-cer, e estão a envelhecer muito bem.

Por Daniel Alves da Silva

Em Palco • A JIGSAW

RDAniEL ALVES DA SiLVA

As divisões da Casa

da Esquina servem de

cenário a uma peça

sobre tráfico sexual.

“Senti Um Vazio”,

de Lucy Kirkwood,

mostra-nos como

(sobre)vivem as vítimas

Dijana é uma rapariga de Lestevítima de tráfico humano. Chegaa Portugal com o intuito de teruma vida melhor e acaba por serobrigada a entrar no mundo daprostituição para saldar as suasdívidas e poder ser livre. Este é omote da peça “Senti um Vazio”.

Numa sala pequena, de luzesapagadas, vive-se o primeiro ato.Alguns minutos depois, Dijanaapresenta-se semi-nua, deitadanum colchão, simulando uma re-lação sexual com um cliente. Ape-sar do ambiente intimista que olocal propicia, essa proximidadepotencia um desconforto no pú-blico, ao assistir à cena protago-nizada pela atriz CláudiaCarvalho, que revela: “é muitoconstrangedor, quer para mimquer para as pessoas, é umagrande exposição, uma coisamuito crua.”

A intenção da atriz que prota-goniza a peça é contar a históriade uma rapariga, igual a tantasoutras, vítimas de tráfico sexual.“Dar a entender ao mundo queeste problema existe e que estámais perto de nós do que pensa-mos”, explica a protagonista.

Na preparação de personagens,

as atrizes Cláudia Carvalho eAdiana Silva, realizaram umavasta pesquisa para “percebercomo é que as mulheres se sen-

tem ao estar ali”, como refereAdiana. Para encarnar a persona-gem principal de um modo rea-lista, Cláudia Carvalho observou

o comportamento das prostitutasna Baixa de Coimbra e tentou“perceber mais ou menos como éo corpo delas.”

“Dois iPhones e meio” Esta peça de teatro surgiu atravésde um convite da associação“Saúde em Português” que tinhaem mãos um projeto acerca dotráfico de seres humanos. “O quenós fizemos foi pegar na peça, co-meçar a traduzi-la e contextua-lizá-la”, afirma o encenador,Ricardo Correia.

A mulher, enquanto mercado-ria, é uma das principais questõesdebatidas neste espetáculo, ondea dada altura, a personagem Di-jama confidencia: “eu valho mileuros que foi o que o Vlad pagoupor mim. Mais ou menos dois iP-hones e meio”. Está assim implí-cita a ideia de que o ser humano évisto como um objeto utilizávelpara vários fins, “em que as pes-soas são usadas e depois de seremusadas, são vendidas para seremusadas novamente”, adita o ence-nador.

Lutar pela sobrevivência fazparte do lema deste texto, onde ossonhos ocupam grande parte dopensamento da personagem. Desalientar que o esforço de resistirà crise em que a personagem seencontra é maior do que o sofri-mento em que constantementevive. “Estamos a lutar, estamoscomo ela [personagem] a sobrevi-ver, a cair e a levantar”, diz Ri-cardo Correia, que sublinha asobrevivência como o foco desteprojeto.

Mais do que uma peça, pode serconsiderada uma alegoria à cul-tura vítima de um Estado a quechegamos, tentando assim alertarpara a crise cultural a que o paísassiste.

“Senti Um Vazio” está em cenana Casa da Esquina até ao dia 11de novembro, de quarta a do-mingo, pelas 21h30m.

Ana Namora

Andreia Oliveira

Dijana, de viajante a mercadoria

A mulher explorada sexualmente é a personagem principal desta peça que retrata a realidade contemporânea

filipa alves - foto gentilmente cedida pela casa da esquina

Page 11: Edição nº 252

6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 11

DESPORTO

Integrar e reabilitar através do desporto

tilizar o desporto para ainclusão e reinserção so-cial da pessoa portadora

de deficiência, podia ser o ‘slogan’do Departamento de Desporto daAPCC. Uma associação que todosos dias lida e cuida de pessoas quepossuem não só paralisia cerebralmas também outro tipo de doen-ças, desde doenças genéticas a de-ficiências motoras e déficescognitivos. A responsável pelo des-porto da APCC, Anabela Marto,declara: “o objetivo é a inclusão dapessoa com deficiência”.

A organização está dividida emvários espaços. No Vale das Floresfunciona o Centro de Reabilitaçãode Paralisia Cerebral de Coimbra(CRPCC), na Quinta da Conraria,em Ceira, funciona uma unidaderesidencial, e também na Rua Eçade Queirós existe outra unidadeencarregue de albergar jovens es-tudantes. “O Departamento deDesporto engloba adolescentes detodos os espaços”, afirma AnabelaMarto. A responsável conta que otrabalho é feito também com o jar-dim-de-infância e com a Escola doCRPCC, e ainda com jovens “en-quadrados na escola lá fora”, ex-plica. Esta prática não se esgotanos mais novos, “há adultos queestão enquadrados noutras ativi-dades e que se deslocam ao Centropara fazer desporto”, destaca Ana-bela Marto.

Pioneiros do DesportoAdaptado em PortugalA história do desporto adaptado anível nacional começa em Coim-bra: “a APCC, ainda com outronome, foi quem introduziu o des-porto para deficientes em Portu-gal”, explica a responsável,

sublinhando o papel preponde-rante do fundador e diretor JoséBarros. No início, o boccia e o atle-tismo eram as modalidades prati-cadas. O boccia é “a imagem demarca da APCC”, confere AnabelaMarto.

Contudo, hoje o número de mo-dalidades praticadas é mais ex-tenso. Para os mais novos, existe aexpressão físico-motora, para osadolescentes, a atividade motoraadaptada, semelhante a educaçãofísica, e ainda a natação - desde ainiciação à alta competição -, e o‘slalom’, uma corrida de obstácu-los em cadeira de rodas. De formamais inovadora, também é prati-cada a zarabatana, que utiliza osopro para expulsar setas com in-tuito de acertar num alvo, e o fute-bol em cadeira de rodas elétricas.Mais recentemente, a tricicleta(equipamento de mobilidade parautilização ao ar livre) também éuma das práticas da Associação,bem como a promoção de acam-pamentos e jogos tradicionais.

Um caso de sucesso e afirmaçãoAntónio Oliveira, jogador de boc-cia, é o atleta mais medalhado dainstituição, com várias medalhas eparticipações em Jogos Paralímpi-cos. Desde Seul 1988, o atleta sófalhou Londres 2012. “Tenho acerteza que é um ídolo para osmais novos”, afirma o treinador,Emílio Conceição. “Considero quefoi uma grande injustiça ele nãoter sido convocado este ano”, cri-tica o técnico. A confirmar o su-cesso do atleta estão os diversosprémios de reconhecimento: “oAntónio conseguiu que diversasentidades se juntassem e alca-

troassem a estrada da casa dele”,numa aldeia próxima de Penacova,conta Anabela Marto.

Os apoios para a Associação sãovários: a Câmara Municipal deCoimbra cede gratuitamente a pis-cina municipal para os treinos e aAcadémica/OAF cede o PavilhãoJorge Anjinho uma vez por se-mana. “Nós achamos que é semprepouco porque as necessidades sãomuitas, mas sem esses dois apoiosseria muito difícil”, desabafa Ana-

bela Marto.

“Temos muitos voluntários do meio universitário”Se a competir pela associação nãoexistem estudantes, a ajudar nou-tros âmbitos são alguns que vãoaparecendo. “A nossa ligação como meio universitário é grande”,afirma a coordenadora do gabinetede voluntariado da APCC, CarinaLeal, ao dar enfoque aos estágios,

às visitas à instituição e até ao vo-luntariado. “A verdade é quetemos muitos voluntários do meiouniversitário”, destaca a coorde-nadora.

Para concluir a essência do dés-pota adaptado, Anabela Marto ex-plica: “neste momento, não hámodalidade nenhuma que não sejapraticada por pessoas com defi-ciência. O desporto adaptado é quetem algumas modalidades que osoutros não fazem”.

Em fevereiro, a AAC

obteve medalhas num

torneio universitário de

futevólei. Uma rampa

de lançamento para a

prática da modalidade

na cidade de Coimbra

Não sendo uma modalidade noauge da esfera desportiva atual donosso país, o futevólei é uma articu-lação do voleibol com o futebol, nas-cido no Brasil e que se encontranuma fase de ascensão na Europa.

Na tentativa de dinamizar a moda-lidade, a Federação Portuguesa de

Futevólei organizou, no passado mêsde fevereiro, um torneio nacionaluniversitário que contou com a cola-boração da Federação Académica deDesporto Universitário.

Nesta competição, que teve lugarno Parque das Nações, em Lisboa, aAssociação Académica de Coimbra(AAC) marcou presença ao colocarem prova seis atletas – duas duplasmasculinas e uma dupla feminina. Oresultado veio a revelar-se bastantepositivo com a conquista de um ter-ceiro lugar, de entre nove equipasmasculinas, e um segundo lugar daequipa feminina.

O coordenador-geral do DesportoUniversitário da AAC, Hugo Rodri-gues, revela que, não havendo atletasque se dediquem exclusivamente àmodalidade, o processo de seleçãopassou por observar os jogadores defutebol e futsal e escolher os melho-

res. Consciente de que Coimbra éhoje um dos maiores destinos de es-tudantes estrangeiros, o dirigenteafirma ainda que” são os alunos bra-sileiros que mais participam”.

Apesar do caracter competitivo doevento e da pouca experiência nestetipo de provas, João Pereira, um dosparticipantes, assegura que “nãohouve nenhum tipo de preparaçãoespecial para o campeonato” e que,mesmo assim, as expetativas foramsuperadas. “A nossa intenção eraparticipar, de aperfeiçoar o desportoe a forma de jogar. Acabámos por nosmotivar e saímos medalhados, no 3ºlugar”, afirma o atleta, acrescentandoque, apesar disso, “o saldo foi muitopositivo”.

Também Ana Carolina Santos,uma das jogadoras que alcançou aprata neste torneio, espera voltar avivenciar uma experiência deste tipo,

lamentando contudo a pouca adesãoque a modalidade tem no nosso país.“É uma pena porque temos muitaqualidade”, concluiu.

Em relação a este panorama atual,também João Pereira aponta váriascarências e dificuldades que existemna prática do futevólei na cidade deCoimbra. “É um desporto que é fácilde praticar no verão, basta gostar deir à praia e ter uma rede de vólei. Pelocontrário, no inverno, não é tão fácilnem barato. Neste momento nãotemos nenhum sítio em Coimbraonde o possamos fazer” referiu oatleta, alertando ainda para a neces-sidade de investimentos para pro-mover a modalidade. “Talvez sedevesse investir num pavilhão ouconstruir algo tapado onde pudésse-mos jogar e se calhar fazia com queeu também jogasse futevólei mais re-gularmente”.

Medalhas promovem o futevólei em Coimbra

foto gentilmente cedida por apcc

antónio oliveira é o atleta mais medalhado da instituição

Fábio Aguiar

Inês Rama

A Associação de Paralisia Cerebral de Coimbra (APCC) utiliza o desporto para desenvolver e estimular

capacidades de jovens portadores de deficiência de toda a zona Centro. Por Emanuel Pereira

U

Desporto ADAptADo

D.R.

Page 12: Edição nº 252

12 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

fEsTiVAl CAminhOs DO CinEmA POR

ra uma vez umcurso de LínguaPortuguesa paraestrangeiros naFaculdade deLetras da Uni-versidade deC o i m b r a(FLUC), quetinha sessões decinema comoapoio ao curso”,

começa por narrar o diretor do Fes-tival Caminhos do Cinema Portu-guês, Vítor Ferreira. Em 1988, oCaminhos era assim – uma mostra decinema sem grandes profissionalis-mos, com apenas o objetivo de com-plementar as sessões teóricas doCurso de Verão da FLUC.

De mostra, o Caminhos passoupara festival. Um festival reconhe-cido, onde já rodaram inúmeros fil-mes, desde os realizadores

consagrados aos jovens cineastas eminício de carreira. Realizadores comoJoão Botelho, para quem o Caminhosé “um festival sério”, pois permite“uma maneira diferente de ver ci-nema, sem as pipocas e as coca-colas.É uma maneira de ver cinema comodeve ser visto”.

Mas este festival não teve um per-curso linear. Depois de 1988 – anoem que se exibiram obras de realiza-dores como Paulo Rocha, João CésarMonteiro ou Manoel de Oliveira -, aentão Mostra “Caminhos do CinemaPortuguês” realizou-se nos dois anosseguintes. “Era tipo um ciclo. Nãotinha júri e, na altura, pegavam numtema”, explica Vítor Ferreira. Nessesdois anos, as temáticas prenderam-se com “O Documento”, “O Texto” e“O Imaginário”. Fernando Lopes,Manoel de Oliveira, João Botelho ePaulo Rocha foram alguns dos ci-neastas que rodaram.

O projeto estagnou e, sete anospassados, a mostra evolui para festi-val. Em 1997, Nelson Zagalo, junta-mente com mais alguns membros dadireção do Centro de Estudos Cine-matográficos (CEC), lança-se naaventura. “Foi muito complicado emuito duro, porque tinham passadojá alguns anos desde a última edição”,

relata. Isto significou “fazer tudo dozero, como se a mostra nunca tivesseexistido”. Desde o retomar de con-tactos com instituições como o Insti-tuto do Cinema e do Audiovisual e oTeatro Académico de Gil Vicente aogarantir do financiamento, Zagaloconta que “foi um ano completo a tra-balhar em ‘full-time’, deixando os

Da pelicula

De 9 a 17 de novembro, o Caminhos do Cinema PortuguEs volta A

sala do Teatro Academico de Gil Vicente. A historia deste evento,

incontornavel no panorama do cinema nacional, nem sempre foi

linear. O que comecou por ser uma mostra de cinema para

estrangeiros acabou por se tornar no Unico festival de cinema

portugues do pais. Por Ana Duarte e Daniela Proenca

ao video, o Caminhos percorreu

uma longa viagem. e ver para crer

“uma maneira diferente

de ver cinema, sem as

pipocas e as coca-colas.

como deve ser visto”

“E

´

´

^

´ ´

´

´

´´

´^

joAo Botelho

Realizador

~

´

Page 13: Edição nº 252

6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 13

ORTUGUEs 2012

cursos de lado, deixando tudo de ladopara que o evento se tornasse real”.

O processo de reativação do Cami-nhos significou transformações enor-mes. “A primeira, e mais evidente, foia transformação de um evento, que

era uma mostra, num festival, queimplicou várias dimensões além domero ciclo de filmes”, expõe NelsonZagalo. Mesas redondas, ‘workshops’,prémios, convidados, filmes de aber-tura e encerramento – estas foram asmetamorfoses. “Além disso, criámoso primeiro prémio dedicado a uma fi-gura de relevo nacional, o ‘ArdenterImagine’”, revela Zagalo. Mas havia anecessidade de premiar mais o ci-nema português, até porque não exis-tia outro evento em Portugal quepremiasse a criação nacional, e paratal formaram-se júris, sistema queveio para ficar.

A consagração do festivalDa reativação do Caminhos surgiu oestatuto que o festival tem hoje. Ale-xandre Cebrian Valente, produtor ci-nematográfico e realizador,acompanha o evento desde há algumtempo. “Costumo ter a honra destefestival selecionar alguns dos meusprojetos”, afirma com satisfação,adiantando que este ano, foi convi-dado pela organização para dar for-

mação.Esse estatuto passa, em boa parte,

pelo tipo de programação que é feito.Mas esta depende daquilo que é pro-duzido durante um ano, em Portugal.Margarida Mateus, programadora do

festival, adianta que as coisas já nãosão “como no início”: “não andamos àprocura, porque, felizmente, já ga-nhámos esse estatuto. Agora, aguar-damos que os realizadores,produtores e distribuidores enviemas propostas deles”. Este ano, rece-beram cerca de 200 propostas. Masapenas 67 obras foram escolhidasdesse universo, entre longas e curtas-metragens, animações e documentá-rios. “Se gostaríamos de ter mais?Claro que sim, porque gostaríamosde ter mais tempo, dada a qualidade,neste momento, do cinema nacional”,lamenta Margarida. No entanto, aprogramadora caracteriza esta sele-ção como “representativa de todos osestilos de cinema português”.

Programação e produçãoMas o Caminhos não se trata apenasda apresentação de obras de autoresconsagrados. Há outra componenteneste festival que o torna único nopaís: o destaque para os realizadoresem início de carreira, na categoria“Ensaios Visuais”. Aqui, vários são os

ainda estudantes de Cinema/Artes vi-suais que apresentam os seus proje-tos para “um júri competente, quedepois atribuirá o galardão de melhorensaio visual”, explica Margarida. Os“Ensaios Visuais” é uma das secçõesmais importantes do Caminhos, aomesmo tempo que “é muito acari-nhada dentro da organização”, vistoser “a secção onde os futuros, e espe-remos que sejam futuros realizadoresdo nosso país, têm visibilidade e têma primeira oportunidade de mostrar asua obra para um público”, ressalva aprogramadora.

No que toca à produção do Cami-nhos, esta prende-se bastante com adivulgação. O produtor, Tiago San-tos, explica que “é preciso fazer comque a divulgação dê destaque àquiloque temos, aos nossos pontos fortes”.Contudo, há também a necessidadede que o Caminhos se perpetue aolongo dos tempos: “é necessário que aprodução articule não só a divulga-ção, mas também a calendarizaçãodas atividades paralelas, de forma aque consigamos que a nossa comuni-cação esteja sempre ativa e que se faledos Caminhos ao longo do tempo”. Eporque o festival não se pode esgotar

durante os nove dias de exibição, háainda o curso “Cinemalogia”, onde asformações são diversas, desde o ar-gumento, passando pela realização,imagem e promoção e comercializa-ção. Tiago Santos afirma que esta ati-

vidade tem, também, por objetivo,angariar novos colaboradores – “ofestival ganha muito em fazer açõesde formação mesmo para consumointerno”.

O júriO júri oficial do Caminhos é sempreeclético. Este ano, é composto pornomes como Inês de Medeiros, Isa-bel Medina, Custódia Gallego e até omodelo Ricardo Guedes, entre ou-tros. Sobre o convite, a atriz CustódiaGallego expressa: “fiquei orgulhosapor acharem que eu posso ser idóneapara criticar o trabalho de pessoasque se estão a iniciar, o que é umagrande responsabilidade”. Aindasobre o painel de jurados deste ano, aatriz ressalva que “se as pessoas queestão a avaliar os trabalhos forem deáreas diferentes, que têm a ver comas várias valências da sociedade emque vivemos, isso é positivo e enri-quecedor”.

Para Fernando Mateus, apreciadorde cinema e membro integrante dojúri Federação Internacional de Ci-neclubes nesta edição, a parte difícilnum jurado é “estabelecer uma clas-sificação. Quem é cinéfilo e gosta

realmente de cinema, tem umagrande dificuldade em apreciar fil-mes como um produto”. Sobre o fes-tival em si, considera que é umaoportunidade de muitos filmes quenão teriam outro meio de serem exi-

bidos terem público,

O contributo cultural do Caminhos“À cultura portuguesa, o festival dá-lhe a achega de lhes mostrar os filmestodos que se prestam porque, porvezes, há recusas por parte dos reali-zadores”, atesta Fernando Mateus. Ofacto de um festival desta dimensãose realizar em Coimbra, e não numametrópole como Lisboa ou Porto, nãorepresenta um risco em termos defalta de público. “Há aquele públicofiel desde a primeira hora, entusias-tas do cinema e apreciadores da cul-tura de Coimbra que participam. Masnota-se cada vez mais que o festivalvai buscar outros públicos e conseguetambém trazer todo o cinema portu-guês”, explana Vítor Ferreira.

Para Nelson Zagalo, uma coisa écerta: “[o Festival Caminhos] deveser preservado, apoiado e acarinhadopor todos. É um dos poucos momen-tos em que o amor à cultura cinema-tográfica nacional se abre semrodeios e sem complexos”. Nestalinha de pensamento está tambémCebrian Valente, que sem pudor,afirma que “o facto deste festival se

impor em Coimbra é, por si só, umatentativa corajosa dos seus empreen-dedores, que lutam com dificuldadesimensas e uma falta inqualificável deapoio em termos de estado central...abismal!”.

“nota-se cada vez

mais que o festival

consegue trazer

todo o cinema

portugues”

“fiquei orgulhosa por acharem

que eu posso ser idOnea para

criticar o trabalho de pessoas

que se estAo a iniciar”

^

D.r.

custodia gallego

Atriz

´

~

´

vitor ferreira

diretor do festival

´

^

Page 14: Edição nº 252

CIDADE14 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

A ambição de um modelo territorial,numa ótica de cooperação alargada

relação entre as duas re-

giões remonta ao início

dos anos 90, altura em

que se formalizou o início das rela-

ções institucionais, através da assi-

natura de uma declaração conjunta.

Dessa parceria, chamada de Comu-

nidade de Trabalho Transfrontei-

riça, nasceu “um fórum de

colaboração chamado «CenCyL:

Comunidade de Trabalho Região

Centro – Castilla y León», ao qual

está consubstanciado com o projeto

MIT – Mobilidade de Inovação e

Território”, esclarece um dos res-

ponsáveis envolvidos no projeto,

Jorge Brandão. A rede de cidades

inscritas neste projeto conta com a

presença de cinco cidades portu-

guesas (Coimbra, Aveiro, Figueira

da Foz, Viseu e Guarda) e três cida-

des espanholas (Ciudad Rodrigo,

Salamanca e Valladolid).

Os primeiros laços, a nível regio-

nal, nasceram com a rede de trans-

portes rodoviários e ferroviários

internacionais que atravessam as

duas regiões em direção à Europa –

nomeadamente com a criação do

IP5, que liga Aveiro até à fronteira.

Jorge Brandão relembra que, no

passado, estas cidades “colabora-

ram numa lógica de ‘lobby’ quando

o IP5 foi criado e pensou-se que po-

deriam colaborar também em con-

junto”. O estabelecimento de uma

rede de infraestruturas levou “à re-

flexão sobre um agregado de inicia-

tivas de como valorizar esses

recursos”, acrescenta ainda. Dessa

reflexão nasceram objetivos especí-

ficos para a rede CenCyL, que pas-

sam por promover a troca de

experiências em estratégias de de-

senvolvimento, domínios de mobi-

lidade e regeneração urbanas,

integração social, promoção turís-

tica, desenvolvido territorial, entre

outros. Uma colaboração alicerçada

num modelo territorial, que associe

as infraestruturas com a partilha de

recursos e serviços.

O projeto, que ainda está em de-

senvolvimento, teve a sua apresen-

tação em novembro de 2011, na

cidade da Guarda. O evento contou,

para além da presença dos respon-

sáveis, com a presença dos presi-

dentes de câmara das cidades en-

volvidas. O presidente da Câmara

Municipal de Coimbra, João Paulo

Barbosa de Melo, realçava que “este

jogo de cidades em rede pode ser

um jogo de soma positiva”. No en-

tanto, em declarações à regional

Rádio Altitude, o autarca lamenta a

atitude pouco amigável dos municí-

pios, ao referir que “estão todos

contra todos, por muitos que sejam

os convénios assinados”. Por seu

lado, o presidente da Câmara Mu-

nicipal da Guarda, Joaquim Va-

lente, em declarações à LocalVisão

TV, afirma que “o objetivo é um ter-

ritório, uma identidade e um pro-

jeto de desenvolvimento”. A

atenção dada ao atual clima de ins-

tabilidade que se vive também foi

realçada, o diretor-geral de Urba-

nismo de Salamanca da Junta de

Castilla y León, Angel Peral, alertou

que “em tempo de dificuldade eco-

nómica é mais importante a coope-

ração e o intercâmbio de

experiências”.

Na ótica de cooperação, Coimbra

apresenta-se como uma cidade de

grande potencial, tanto no plano

educativo como no empresarial, já

que o projeto envolve parcerias

entre universidades e em áreas de

inovação e tecnologia. Jorge Bran-

dão ressalva: “Coimbra já tem al-

guma história de colaboração com

Salamanca”, estas cidades “têm in-

teresses em comum” e “já coopera-

vam bilateralmente”. Na área dos

centros de inovação o responsável

destaca a importância do Instituto

Pedro Nunes, associação conimbri-

cense sem fins lucrativos, que tem

promovido a inovação na área cien-

tífica e tecnológica e ainda dos cen-

tros tecnológicos, como o Centro

Tecnológico da Cerâmica e do

Vidro, também sediado em Coim-

bra.

Finalização do projetoO projeto, que tem várias iniciativas

localizadas em cada uma das cida-

des, contou já com a realização de

duas reuniões do Comité de Segui-

mento na cidade do conhecimento.

As sessões servem para debater

temas comuns às cidades envolvi-

das e a promoção do pensamento

num plano estratégico a longo

prazo. “Esse plano estratégico serve

também para refletir um modelo

organizativo para uma lógica de

cooperação mais permanente des-

sas cidades”, comenta Jorge Bran-

dão. Ao Centro de Estudos e

Desenvolvimento Regional e Ur-

bano foi adjudicado o serviço para

a elaboração do plano estratégico

entre as diversas autarquias, cujos

resultados são apresentados nas

reuniões do Comité de Seguimento.

Para já não existem resultados

concretos em nenhuma das cidades

envolvidas na rede CenCyl, pelo que

só após o término do projeto se pro-

cederá à aplicação das suas conclu-

sões. “A rede de cidades é ainda

muito o desejo, existem expectati-

vas de cooperação, de aprofunda-

mento da relação entre essas

cidades. Mas de facto ela formal-

mente ainda não existe”. Equacio-

nar uma forma de cooperação que

permita pensar num futuro a longo

prazo, fundamentada numa estra-

tégia bem pensada, é um aspeto

base do projeto da rede de cidades

CenCyl, para que “este passe a ser

um interlocutor entre a região Cen-

tro e a região de Castela e Leão”,

conclui Jorge Brandão.

A parceria envolve cinco cidades portuguesas (Coimbra, Figueira da Foz, Aveiro, Viseu e Guarda) e três espanholas (Ciudad Rodrigo, Salamanca e Valladolid)

Com laços fortemente vincados e um historial de cooperação de muitos anos, a região do Centro de Portugale de Castela e Leão aproximam-se a passos largos da criação de uma autêntica rede de cidades. Para Coimbra, importante polo universitário e empresarial, a ligação pode ser uma mais-valia. Por João Valadão

A

“O objetivo é este:

um território,

uma identidade e

um projeto de

desenvolvimento”

“A rede de cidades

é ainda muito

o desejo, ela

formalmente

ainda não existe”

D.R.

Rede de Cidades CenCyl

Page 15: Edição nº 252

6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 15

CIênCIA & TECnoLogIA

UC Digitalis: literatura e ciência digitais para toda a UniversidadeMais do que uma biblioteca digital, o novo projeto da Universidade de Coimbra é uma forma de expressão da ciência e literatura feitas em português

O mais recente projeto tecnoló-

gico da Universidade de Coimbra

(UC) foi lançado neste passado

mês de outubro e tem o nome de

UC Digitalis. Esta é uma plata-

forma pioneira de divulgação de

livros e artigos científicos com

forte ligação à lusofonia e que está

acessível, neste momento, para

todo o pessoal docente e não do-

cente da UC.

Nesta primeira fase, a UC Digi-

talis conta com cerca de 1001 li-

vros e 500 revistas, números que

aumentam todos os dias. Este

acervo está disponível no seu for-

mato completo e quem aceder

consegue facilmente descarregar

obras e artigos de cariz científico,

no seu formato digital. O grande

objetivo da plataforma é “agregar

conteúdos ligados à publicação de

livros e artigos e aumentar a visi-

bilidade dos autores da institui-

ção“, afirma o diretor da

Imprensa da UC (IUC), Delfim

Leão.

A nova interface lançada pela

UC está dividida em duas “pontas

de lança”, como classifica Delfim

Leão: a UC Pombalina e a UC Im-

pactvm. A primeira, batizada em

honra do criador da IUC (há cerca

de 240 anos), “especializa-se em

livros marcadamente académicos,

científicos ou ligados à transfe-

rência do saber”, explica o diretor

da IUC. A segunda, Impactvm, “é

dedicada a revistas e artigos, num

processo de requalificação cientí-

fica e terá um acesso completa-

mente livre”, continua Delfim

Leão. Ambas as ferramentas estão

em constante atualização e cons-

tituem, para o docente da Facul-

dade de Letras da UC (FLUC),

Manuel Portela, “uma riqueza

enorme que fica disponível para

consulta aberta”.

Este projeto é considerado

como pioneiro devido à sua forte

ligação com a língua portuguesa e

“é esse o aspeto que o distingue”,

destaca Delfim Leão. Nesse parâ-

metro, a UC Digitalis pretende

“crescer para todo o espaço lusó-

fono” e assim “projetar a ciência

que fazemos em português”, con-

clui o mesmo.

Divulgação vs. PiratariaSegundo Manuel Portela, a pira-

taria é um problema “que se co-

loca em geral quando há

distribuição digital”. Portanto, o

que impede um estudante ou do-

cente da UC, de descarregar um

livro e distribui-lo na internet ile-

galmente? Na verdade, nada. Del-

fim Leão explica que “não é

prevista uma forma de proteção a

um possível desvirtuamento dos

‘eBooks’”.

No entanto, o que a UC Digita-

lis promove é a divulgação. “As

obras disponibilizadas, ou estão

fora de ‘copyright’, ou têm licença

dos seus autores”, comenta o pro-

fessor Manuel Portela. Deste

modo, a divulgação é potenciada

dentro de enquadramentos legais

e é possível “dissuadir a pirata-

ria”, ressalva o diretor da IUC.

O fim do livro em papelDesde o início da era digital que

prevalece a ideia de que o formato

digital irá substituir o impresso

nas obras descontinuadas, como

os dicionários e artigos científi-

cos, reservando o tradicional for-

mato de papel para os livros de

leitura continuada. Contudo, esta

ideia pode ter os dias contados. As

inovações tecnológicas têm feito

com que a “dificuldade que exis-

tia em ler continuamente num

ecrã possa desaparecer”, enfatiza

o professor da FLUC, o que nos

leva a refletir sobre um possível

desaparecimento do formato tra-

dicional.

Para o editor da Lápis de Me-

mórias, Adelino Castro, a digita-

lização do livro é “um processo

inevitável, mas que pensava mais

demorado”. A sua editora ainda

não possui o suporte digital pois,

segundo o mesmo, “estas editoras

tradicionais nasceram e estão vo-

cacionadas para o suporte tradi-

cional e públicos mais reduzidos”.

Embora a ideia que reine hoje

em dia é de que estes dois forma-

tos se complementam e poten-

ciam, “a pressão dos

acontecimentos irá obrigar-nos a

fazer esta reflexão mais cedo do

que se desejaria”, conclui Adelino

Castro.

A construção de um novoconceito de rotunda vaipermitir que a cidade seconstitua como seio deuma solução inovadora eeficiente a nível nacional

Até final deste ano está previsto o

surgimento de uma solução inova-

dora em termos rodoviários, uma

turbo-rotunda. Com a localização

pensada para a rotunda do Bolão,

que coincide com o final da Estrada

Nacional 111 (EN-111), proveniente

da Figueira da Foz, a obra é resul-

tado de uma parceria entre a Câmara

Municipal de Coimbra (CMC) e o

Departamento de Engenharia Civil

(DEC) da Faculdade de Ciências e

Tecnologia da Universidade de

Coimbra (FCTUC).

O conceito de turbo-rotunda sur-

giu em 1996 na Holanda, por inter-

médio do engenheiro Lambertus

Fortuijn. A docente do DEC e uma

das coordenadoras do projeto, Ana

Bastos, frisa que na Holanda existem

“atualmente mais de 180, localizadas

particularmente em meio rural e na

marcação da transição de ambientes

rodoviários”. A nível europeu, já

existem vários países onde são utili-

zadas turbo-rotundas, com Polónia,

Alemanha e Eslovénia a serem os

mais avançados.

“Uma turbo-rotunda é uma tipo-

logia derivada da rotunda normal e

que se apresenta como uma alterna-

tiva direta a rotundas com duas a

três vias de circulação”, explica Ana

Bastos. A seleção do local em Coim-

bra permite acentuar a transição

entre o meio rural e um ambiente ur-

bano e, nas palavras da docente, pro-

curou-se ainda “conjugar à

adequação técnico-científica do pro-

jeto, a oportunidade para se resolver

um problema atual de congestiona-

mento de tráfego” na cidade.

A construção da turbo-rotunda

terá dois momentos. O vereador

para as Obras e Infra-estruturas Mu-

nicipais da CMC, Paulo Leitão, es-

clarece que “numa primeira fase a

rotunda vai ser ligeiramente am-

pliada para ter duas vias, para depois

possibilitar a sua segregação com

lancis [separadores]”. No fundo, o

objetivo desta construção visa a ca-

nalização dos condutores para as

vias mais adequadas ao destino pre-

tendido, através da utilização de se-

parações físicas e sinalização.

Apesar de um dos objetivos da

construção deste tipo de rotunda ser

o aumento da fluidez do trânsito, são

as questões de segurança que preva-

lecem. A inexistência de um enqua-

dramento legal nacional, que defina

a forma como um condutor deve

aceder e circular em rotundas, faz

com que as que têm mais de uma

faixa, ou com um número de faixas

de acesso superior ao de circulação,

sejam candidatas a turbo-rotundas.

Ana Bastos clarifica: “a adoção de

um número de vias de circulação su-

perior ao número de vias disponibi-

lizadas na entrada tende a

traduzir-se num aumento da sinis-

tralidade e dos custos de constru-

ção”.

Em relação ao financiamento da

obra, este é constituído por “fundos

totalmente camarários”, conforme

refere Paulo Leitão, dado que o em-

preendimento não implica montan-

tes significativos nas duas fases de

construção.

Turbo-rotunda surge em Coimbra

StephAnie SAyuRi pAixão

A nova interface da UC está dividida em duas vertentes: a UC Pombalina e a UC Impactvm

Paulo Sérgio Santos

Joel Saraiva

Miguel Patrão Silva

Page 16: Edição nº 252

PAÍS16 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

Os cortes orçamentais estão na base de vários despedimentos no setor da comunicação. A diminuição dacapacidade de produtiva das redaçõesimplica perigos para democracia. Por Ana Namora e Andreia Oliveira

futuro é negro”,afirma o jornalistados quadros do Pú-blico, António Ce-

rejo. Recentemente, o jornalPúblico efetuou 48 despedimentos,“entre os quais 36 eram jornalis-tas”, como explica o jornalista.Com o corte de trabalhadores, asredações veem-se incapacitadas deproduzir conteúdos noticiosos dequalidade. “É difícil com menos 36jornalistas fazer o que já era difícilfazer com cerca de 140/150 jorna-listas que a empresa tem no total”,volta a referir António Cerejo.

No serviço público, a situaçãonão diverge muito do privado.Sofia Branco, jornalista da AgênciaLusa, receia que os cortes provoca-dos pelo Orçamento do Estado(OE) para 2013 sejam “demasiadograndes para garantir que o serviçopublico continue a ser prestadocomo até aqui” e que “a Lusa,muito provavelmente, não conti-nuará a ter gente em todos os sítiosonde tem hoje”.

Relativamente ao caso da RTP, aoferta que é feita pode estar emrisco. O representante da Comis-são de Trabalhadores da RTP, Ca-milo de Azevedo, revela que “hácortes orçamentais que vão ter umreflexo muito grande nas grelhasdos canais todos da RTP” e existeuma preocupação geral “no sen-tido de servir as pessoas em termosde grelhas”.

“Considero ilegítimos todos oscortes que se baseiam apenas nanecessidade de reduzir financia-mentos”, declara a jornalista,Diana Andringa, a propósito dospossíveis cortes orçamentais daRTP e da indeminização compen-satória da agência Lusa. Salientaainda que estas medidas deveriamter uma “análise concreta das si-tuações e objetivos estratégicos de-finidos”

As redações estão a ficar vaziasO contexto de crise dos média emPortugal tem gerado inúmerosprotestos por parte dos trabalha-dores, em forma de luta social. A

jornalista da Lusa clarifica que, nosetor público, os trabalhadoresestão unidos por um objetivocomum: “não permitir que hajaum corte no orçamento na ordemprevista no OE”. Em contraste, nosetor privado, a greve no Públicocentrou-se na questão do despedi-mento coletivo. “Não o fizemos deânimo leve, fizemo-lo também de-pois de termos, enquanto traba-lhadores, contribuído numconjunto de decisões para reduzirem muito os prejuízos da em-presa”, refere António Cerejo.

Quanto à paralisação de quatrodias na agência noticiosa estatal,Sofia Branco explica que “é umprotesto específico” mas que se in-sere num “contexto nacional decrescente tensão social, de cres-centes medidas de austeridade queprejudicam muito os direitos dostrabalhadores”, adita.

“A mudança de paradigma e asalterações estruturais no sectornão são exclusivas de Portugal”,como salienta Alfredo Maia, “masmuitas também aproveitam o pre-texto da crise para fazer limpezasnas empresas” reduzindo o nú-mero de efetivos, acrescenta o tam-bém presidente do Sindicato deJornalistas. Ou como destacaJorge Wemans, ex-diretor daRTP2: “isto é um processo que em

Portugal é mais agravado do queem outros países”.

Os jornalistas de hoje encon-tram-se perante uma grande pres-são em que a garantia de um lugarna redação pode ser posta emcausa. Camilo de Azevedo eviden-cia que “a precariedade nas reda-ções é terrível para as pessoas,para os jovens nessa situação”, quesão em grande número. “O que se

está a assistir é a um esvaziamentodas redações”, sentencia o membroda comissão de trabalhadores daRTP.

Tudo isto são fatores que contri-buem para que, por vezes, existaum mau serviço de comunicaçãosocial em Portugal. Jorge Wemansassevera que a crise atual do jor-nalismo “tem muito a ver com ofacto de os cidadãos acharem que,por estarem ligados a blogues eterem a informação na internet”,julgarem que estão devidamenteinformados: “estão é intoxicadosde informação”, acrescenta.

“A postura do governo tem sido cega”A imprensa dita tradicional temsofrido um recuo e um aumento damesma nos meios de comunicaçãodigitais. Isto deve-se ao facto de“qualquer cidadão ter como reco-lher e divulgar informações. Masisto não é jornalismo”, atesta Al-fredo Maia. “Este fenómeno dosnovos media eletrónicos veio per-

turbar e lançar uma crise terrívelnos meios de comunicação tradi-cionais”, esclarece António Cerejo.

Existe uma perda do poder decompra por parte dos leitores por-tugueses, o que forçosamente se

vai traduzir num “recuo na própriadistribuição, ou seja, na colocaçãode publicações periódicas juntodos potenciais leitores”, adianta odirigente do Sindicato dos Jorna-listas. “Estamos a privar o acesso àinformação aos cidadãos, o queconsiste num direito fundamen-tal”, conclui.

As críticas ao atual ministro titu-lar da pasta da Comunicação So-

cial, Miguel Relvas, são notórias eunânimes por parte de vários jor-nalistas. A jornalista Diana An-dringa diz que a “falta de noção doEstado, de sensibilidade democrá-tica, de espírito de cidadania e derespeito pelos cidadãos, demons-tra desprezo pelas consequênciashumanas da sua política.”

Alfredo Maia chega a referir queo ministro “segue uma políticacompletamente errada” e que “seráresponsável pela destruição dosserviços públicos de rádio e televi-são e agência noticiosa” se não re-cuar “no seu propósito de fazerestes cortes”.

O futuro da comunicação é postoem causa, e se “as empresas come-terem os erros de fazerem cortescegos e diminuírem a capacidadede produção, o futuro será negro”,refere ainda Alfredo Maia. A situa-ção global dos jornalistas e da co-municação em Portugal “é umcampo em grande mudança e quevai mudar ainda mais”, reitera ajornalista da Lusa.

“O

os meios comunicação em portugal atravessam uma crise nunca antes vivenciada

Cortes nosmédia: os riscosna democracia

Crise nos meios de ComuniCaçãoStephanie Sayuri paixão

“Isto é um processo

que em Portugal

é mais agravado

do que em

outros países”

“Qualquer cidadão

tem como recolher e

divulgar informações.

Mas isto não é

jornalismo”

Page 17: Edição nº 252

6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 17

muNdO

Crise fomenta separatismo em Espanha

Os movimentos independentistas estão mais fortes com a crise espanhola. 1,5 milhões de catalãespró-independentistas enquanto o governoapela a união

“Se cada reivindicação da Catalu-nha for acompanhada de 16 reivin-dicações iguais, assistiremos ao fimde Espanha, pois o país não é asoma de 17 nações.”, afirma o pro-fessor de Ciência Política da Uni-versidade Pompeu Fabra(Barcelona), Vicenç Navarro, aoCourrier Internacional. Espanha éum Estado formado por autono-mias que assenta em 17 comunida-des previstas na Constituição de1978, sendo cada uma delas dotada

de parlamento e governo próprio,embora o nível de autonomia dasdiferentes regiões não seja uni-forme.

Os autores da constituição de1978 pretendiam articular a sobe-rania das diferentes nações queconstituem o estado espanhol, mo-derando os sentimentos nacionalis-tas na Galiza, Catalunha e PaísBasco, onde estavam mais arreiga-dos.

1,5 milhões de catalães, de acordocom a Guarda Urbana de Barce-lona, percorreram as ruas da cidademanifestando-se pela independên-cia da região. Embora o movimentoda Catalunha exista há quase doisséculos, a sua presença tornou-semais notória após a manifestaçãodo dia 11 de setembro. Relativa-mente ao impacto deste protesto, opresidente do governo autónomoda Catalunha, Artur Mas, citado noNew York Times, assegura que “aCatalunha nunca esteve tão pertoda plenitude nacional”.

A intensificação da crise econó-mica espanhola e a manifestação dodia 11 de setembro em Barcelona

imprimiram um maior sentimentoindependentista, não só na regiãoda Catalunha, mas igualmente noPaís Basco e na Galiza. O peso dacrise económica ”é evidente mas oobjetivo continua a ser a soberaniacultural e soberania política”, rei-tera o líder do partido nacionalistagalego ANOVA, Xosé Manuel Bei-ras.

Agitação social gera independentismos“Os desejos de independência sãoexacerbados numa situação de con-vulsão social”, assevera o dirigente,refletindo-se nos resultados daseleições regionais de 21 de outubro,no País Basco e na Galiza. Os parti-dos independentistas viram assimaumentado o seu número de votos,enquanto que, “em números abso-lutos, o Partido Popular (PP) e oPartido Socialista (PSOE) têm tidouma descida brutal”, atesta investi-gadora de origem espanhola doCentro de Estudos Sociais da Uni-versidade de Coimbra (CES), SilviaMaeso. No entanto, e apesar disso,nas eleições galegas, o PP conse-

guiu a maioria em termos percen-tuais.

O ímpeto independentista estácada vez mais vincado e “os contor-nos políticos nos quais se tem cons-truído a ideia de um povo comqualidade para se construir comonação, não tem grande diferençaentre as regiões independentistas”,afirma a investigadora CES. Comefeito, o recente reafirmar dasações nacionalistas independentis-tas encontra bases de sustentaçãosimétricas no seu caráter “sobera-nista, no sentido que proclama queo povo, a nação, deve ter soberanianacional”, assevera o líder doANOVA.

A estas várias formas de idealizaras concepções nacionalistas das au-tonomias reivindicadoras de sobe-rania, acrescem-se-lhes também asquestões económicas. A inviabili-dade económica de territórios maispequenos é falaciosa para o econo-mista Manuel Beiras, que asseguraque “a ideia de que os países pe-quenos não conseguem manter-seestá errada”, e ainda acrescenta o“controlo dos próprios recursos” e

a utilização das “vantagens compa-rativas” como mais-valias para eco-nomias de dimensão mais reduzida.

Neste período de contrapontoentre separatismo e centralismo emEspanha, Mariano Rajoy afirmou,citado pela agência espanhola EFE,que no contexto atual não aceitaria“de maneira nenhuma” o separa-tismo espanhol. Com igual sentidoo Rei Juan Carlos publicou no ‘site’da Casa Real que Espanha tem que“superar as dificuldades atuais,agindo juntos e caminhando jun-tos”. Com a conflitualidade inerenteao separatismo, e intensificada peloatual momento de crise económica,o futuro de Espanha, das suas au-tonomias e dos seus respetivos es-tatutos junto da União Europeia(UE) é incerto. “O impasse político”é a expressão usada por SilviaMaeso para fazer o retrato da rela-ção entre o separatismo espanhol ea UE, pois sem o consenso do go-verno Espanhol acerca da indepen-dência, a “UE nunca irá apoiar oseparatismo pois nunca se irá dis-tanciar da posição do estado espa-nhol”.

Os habitantes de Voloscriaram um sistema detroca através da Internet.A ideia, com um milhar deaderentes, surge comouma ferramenta útil à sobrevivência

Envolvidos numa imensa crise fi-nanceira, os gregos vêm-se atadospor políticas de austeridade que lhes

sugam o dinheiro através uma suces-siva aplicação de impostos. A sobre-vivência começa a ser umapreocupação emergente na vida demuitos cidadãos do país. Na cidadede Volos, a cerca de 100 quilómetrosde Atenas, um grupo de cidadãoscriou uma moeda alternativa, o TEM,que equivale a aproximadamente umeuro. O professor da Faculdade deEconomia da Universidade de Coim-bra (FEUC), Elias Soukiazis, escla-rece que esta iniciativa “tem o apoioda câmara e funciona através da in-ternet”. Assim, o objetivo principal é“trocar produto por produto, serviços

por produtos ou serviços por servi-ços”, esclarece o docente.

O sistema funciona através de umabase de dados na internet e, apesar deter começado com um pequeno grupode pessoas, conta já com cerca de milparticipantes. O professor da FEUCacrescenta: “através da internet sãoorganizados mercados de rua e atroca é feita através do TEM”. A cadacidadão é dada uma base de crédito,que pode atingir os 300 créditos.Elias Soukiazis relembra que antiga-mente as trocas eram feitas assim eque as pessoas “querem mostrar quepodem sobreviver sem o Euro, atra-

vés desse sistema”. O co-fundador doTEM, Yiannis Grigoriou, em recentesdeclarações à RTP refere: “para haveruma verdadeira democracia, deve-mos ter a possibilidade de vivermoscom dignidade”.

O professor da FEUC ressalva -“quem é pobre não é quem não temdinheiro. É quem não tem nada paraoferecer”. Assim, segundo Elias Sou-kiazis, uma vantagem que este tipo detroca tem é que “os cidadãos nãopagam impostos e o Estado não re-cebe nada”. Para o professor, o pro-jeto passa também por um processode consciencialização: “as pessoas

têm de pensar que é preciso traba-lhar, que têm de oferecer e é necessá-rio ter dinheiro para sobreviver”. Asurpresa em Volos deveu-se, sobre-tudo, pelo facto de esta ser uma ini-ciativa da própria câmara, quedisponibiliza meios e espaços para arealização de mercados.

Elias Soukiazis relembra que estesistema de troca funciona de formacomplementar: “eles usam os euros”.Contudo, salienta que a ideia “está aexpandir-se e a ser um fenómeno deestudo”. O professor finaliza: “o sis-tema funciona bem. Pelo menos re-solve o problema da pobreza”.

Cidade grega cria moeda alternativa para fugir à crise

fotomontaGem por daniel alveS da Silva

Galiza, país Basco e Catalunha são comunidades autónomas em que crescem os movimentos independentistas.

Luís Azevedo

António Cardoso

Pedro Martins

João Valadão

Page 18: Edição nº 252

arTes18 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

udo começou quando os ir-mãos Paolo e Vittorio Ta-viani (“Padre Padrone”,

1977, “Kaos”, 1984) tomaram conhe-cimento de que na prisão de alta se-gurança de Rebibbia, nos arredoresde Roma, os reclusos tinham por há-bito encenar peças do teatro clássico.Em “César Deve Morrer” (Urso deOuro em Berlim 2012) um grupo deprisioneiros, cujas penas variam entreos 15 anos e a prisão perpétua, ensaiao “Júlio César” de William Shakes-peare. O rótulo de “teatro filmado” émanifestamente redutor para estefilme, apesar de o guião ser pura esimplesmente baseado nos ensaios ena encenação da obra do bardo. Nãose trata tão pouco de um documentá-rio moralista ou até humanitáriocomo pode parecer à primeira vista.Talvez a ideia base seja mais simplesainda: os veteranos realizadores aper-ceberam-se de que não haveria a mí-nima possibilidade de se ficcionar oque quer que seja, pois a realidade

destes reclusos ultrapassa qualquertentativa de imaginação.

A escolha de “Júlio César” é total-mente acertada. Diria até que a inter-pretação pelos reclusos de Rebibbiavem fortalecer um texto que trans-porta, desde logo, uma carga tre-menda. Os temas da honra, da traiçãoe da morte, que dominam a peça deShakespeare, marcaram indelevel-mente a vida desgraçada dos reclusos,muitos deles ligados ao crime organi-zado, onde o golpe palaciano é roti-neiro. A realização não deixou passaressa faceta em branco e evidencia arelação dialética entre as personali-dades fictícias e as personalidadesreais. Por vezes a força do texto é tãovincada que os seus intérpretes sevêem impelidos a “completar” os diá-logos. Outro aspecto que veio, decerta forma, aprimorar a obra é a li-berdade concedida aos actores de uti-lizarem os seus dialectos (que vãodesde o napolitano ao greco-cala-brês).

O preto e branco é, ao longo da pe-lícula, alternado com as cores de umaforma equilibrada, correspondentesaos ensaios pelos espaços da prisão eà actuação final, respectivamente. Osplanos longos e fixos, com um granderecurso ao ‘close-up’, intensificam atensão própria do texto. E se a inter-pretação dramática surpreende pelaenorme capacidade de cada um dosactores sem excepção, o para-dis-curso completa o quadro na perfei-ção. Dificilmente um ‘casting’profissional faria um melhor papel naescolha das personagens. As expres-sões faciais não podem deixar ne-nhum espectador indiferente,especialmente numa época em que amaioria dos actores do ‘showbiz’ pa-rece ter perdido o respeito e a reve-rência pelo texto que interpretam.Sublime, mais uma vez.

E, no final, fecham-se as cortinas,uma vénia para o público e o regressode cada um à sua cela. Sem mais fic-ções.

César deve Morrer

Cin

em

a

Ninguém algema a arteCrítiCa De João ribeiro

De

Paolo TaViaNi, ViTTorio TaViaNi

Com

CosiMo rega

salVaTore sTriaNo

gioVaNNi arCuri

2012

ma relação que se de-senvolve no decorrerdas frequentes cheiasna região de Île-de-

France, a vida do Palhaço Beby,o complexo processo de polime-rização do estireno. Narrativas etemas tão distintos que entre sinada parece haver que os apro-xime.

Mais que um mero exercício derevisitação histórica, o conjuntode curtas que compõe este DVDpermite o acesso do grande pú-blico aos primórdios do trajetode nomes que mais tarde se vi-riam a tornar dos mais proemi-nentes no cinema francês. Entreos dez minutos e a meia hora, osrealizadores propõem-se a traba-lhar os temas rompendo com oscânones então vigentes.

Poucos são os movimentos

que poderão clamar para si a in-fluência na história do cinemaque a ‘Nouvelle Vague’ francesatem.

Antes da sua explosão no finalda década de 1950 - com o seurosto mais familiar em FrançoisTruffaut e Jean-Luc Godard - arevista Cahiers du Cinéma foi aincubadora de uma nova formade pensar e fazer cinema, sobuma ótica que cortava com osvínculos morais da sociedade.Inicialmente críticos e colabora-dores com a publicação, os reali-zadores da ‘Nouvelle Vague’fizeram da palavra a base teóricapara passar à prática: Godard,Truffaut, Jacques Rivette e Jac-ques Doniol-Valcroize têm a pas-sagem pela revista comodenominador comum (assimcomo Eric Rohmer e Claude Cha-

brol, nomes maiores da ‘NouvelleVague’ que não veem nenhumdos seus trabalhos nesta pequenacoleção).

Pequena parte importantepara ajudar à compreensão dotrabalho cinematográfico destesrealizadores, esta coleção de novecurtas oferece um vislumbre pre-liminar do nascimento de lendas.O resto da sua produção artísticaé história.

Apesar de muitas vezes serapelidado como pretensioso, o le-gado do cinema produzido porestes autores pode ser encon-trado nos mais diversos movi-mentos que lhe sucederamcronologicamente, desde o “novocinema português” a célebresrealizadores norte americanoscomo Coppola ou Scorcese.

Nasce uma era

Nouvelle Vague – Primeiros Filmes”

Camilo SolDaDo

“ T

U

ve

r

Artigo disponível na:

filme

De

Vários

eDitora

Midas

2012

Page 19: Edição nº 252

feiTas6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 19

otal Loss” é o se-gundo longa duraçãode Tom Krell sob onome de How To

Dress Well, que sucede a “LoveRemains”, disco pop lo-fi de in-fluências R&B, marcado por umconfessar sofrido de uma fase davida menos feliz.

Se “Love Remains” era umdisco de alguém que finalmentereconhece que está deprimido,“Total Loss” é uma viagem pelasfases inevitáveis até se atingir oestado final de aceitação pelaperda.

Começa com “When I Was InTrouble”, que funciona comoponto distinção entre os dois dis-cos, mais R&B e menos lo-fi. A de-pressão continua, como em “SayMy Name”, em que o sample deum miúdo revela “the only badpart about flying is having to comeback down to the fucking world”.Mas a atitude mudou, e a figuradebruçada continua deprimida.

Contudo, encara a tristeza de frente e em pé, pronta a aceitá-lacomo fase inevitável da vida, “ain't gonna stop until we're throughwith this”, proclama em “Cold Nights”, preparando-se para dei-xar a tristeza sozinha.

Escrito depois da morte de um parente próximo e de um amigo,o disco vive da honestidade de sentimentos e das histórias que ocompõem, para procurar o elo de ligação entre o autor e o ou-vinte. E se a tristeza é o tema central de todo o disco, também aesperança tem um papel relevante como conclusão do mesmo - “&It Was You” e “Set It Right” afirmam a certeza e o consolo de des-cobrir que ninguém está verdadeiramente sozinho.

“Total Loss” aproxima o norte-americano a nomes que têmvindo a revitalizar o R&B e a negar o rótulo de género menor comque há muito vinha a ser injustamente catalogado. E se a músicade Tom Krell não soará tão cedo nas mesmas rádios em que osseus companheiros parecem estar inevitavelmente destinados afigurar, será facilmente lembrada como a mais honesta forma deexpressão artística de todos o seus pares.

ubem Fonseca foi um frutomisto das culturas brasileirae portuguesa, pormenor que

o separa de outros autores brasilei-ros e o aproxima de Portugal, nosecos íntimos que se vão encontrandona sua obra. Descendente de portu-gueses imigrados no Brasil, foi polí-cia e estudioso da psicologia, facetasobviamente espelhadas na sua obra.E pode dizer-se que Rubem Fonsecaé um misto de vários outros aspectos,o que talvez seja o que o torna umautor excepcional.

Em “Axilas & outras histórias in-decorosas”, obra composta por de-zoito short stories, os homicídios, asmulheres, os subornos acompanha-dos de crimes e outras tramas sãoícones noir que constituem o cunhopeculiar do autor, sem que haja o pe-rigo de qualquer uma delas se tornarrepetitiva (atrever-me-ia a dizer queespelham também a sua vivência ur-bana carioca). A reflexão sobre o seupassado português espreita numero-sas vezes, como em “Livre-alvedrio”,onde o protagonista, um polícia, co-gita sobre o suicídio e sobre “a fa-mosa melancolia portuguesa”, ou atéem “Axilas”, onde evoca umas axilasgrossas de uma bisavó.

“Axilas” introduz também uma dasfiguras mais importantes da obra deRubem Fonseca: a mulher e o ob-jecto de desejo que ela constitui paraos homens, bem como os desvarios

sexuais que estes alimentam e quecostumam acabar em mortes maca-bras. Maria Pia, a violinista por quemo protagonista de “Axilas” se apai-xona, é o exemplo da mulher queRubem Fonseca desenha: não podeser burra, nem ter bunda grande, terpeito pequeno, ser interessante semser enfadonha. Maria Pia não é nadadisto, mas acaba por também ser as-sassinada, de qualquer forma. Nãosão raras as considerações sexuaisprofundas e animalescas das perso-nagens, tal como, por outro lado,também o não são as mostras de eru-dição do autor, que junta ambas asfacetas num estilo cru e verdadeiro.

As considerações de Rubem Fon-seca sobre a pessoa chegam recor-rentemente sob esta forma negra damorte – sodomias, assassínios, feti-ches, histórias de uma brutalidadeque só uma certa verosimilhançapode proporcionar, provenientes domeio urbano e escuras como ele. Sãopequenos thrillers - do escritor quese considera um “cineasta falhado” –que roçam uma forma de policial,sem chegar a sê-lo. Tal como os cri-minosos de Rubem Fonseca, que osão sem chegar a sê-lo, porque nas-ceram às mãos de um mestre da ca-racterização psicológica e de umautor que, por piores que pareçam,jamais as julga.

evo confessar, estava seria-mente preocupado comDesmond Miles. Não, não

se trata de uma qualquer emoção des-proporcionada ou drama hiperboli-zado. Estava mesmo preocupado comDesmond. O jovem atlético e vigorosoque havia deixado em ‘Revelations’,capaz de fazer ciúme ao espírito maisfraco de ‘Jersey Shore’, assumia agorauma figura quase disforme, mirradae macilenta, que mais se assemelhavaà profanação canónica dos jogadoresdo ‘FIFA Street 3’.

Mas o pior não passava sequer deperto por isto. Todas as previsões,todos os trailers(bom, quase todos)apontavam numa só direção: umadisrupção completa com a restantesérie, para dar lugar a toda uma novaparafernália de personagens, atribu-tos e armas inoportunas. O rapazteria conhecido novos truques, écerto. Finalmente, teria aprendido atrepar árvores – nada mau para quemfazia vida a escalar prédios e escarpascolossais. Mas e se, como quem tãodepressa muda de aparência, Des-mond mudasse também toda a lógicada sequela? Como aquela paixão quevai de Erasmus para Nice e volta pas-sados uns seis meses com um novo vi-sual e um Pierre debaixo do braço. Ese Desmond roubasse à série a sua es-

sência, para a tornar numa algraviadaprópria de uma série americana queinsiste em perdurar-se?

Nada mais distante. ‘Assassin’sCreed III’ é um retoque empírico, umaperfeiçoamento de tudo o que debom a série já ofereceu, introduzindoos elementos certos. A jogabilidadetornou-se mais fluída (excluindo osinúmeros ‘bugs’, que surgem em ca-tadupa). O modo de luta perdeuaquela cientificidade simplista e irri-tante que caracterizava as ediçõesprévias – felizmente, acabou aquelaideia de enfiar a personagem numabriga contra o resto do mundo e aindaponderar sair vitorioso. E depois há omelhor, a expansão do jogo. Recupe-rando a velha ideia do primeiro epi-sódio, multiplicam-se os cenáriosbaldios (historicamente fundamenta-dos) que servem de fronteira às váriascidades. Entre missões acessórias,caça de animais ou um mero passeiorecreativo, copiam-se os meta-jogos,dentro do jogo, possibilitando umaexperiência que é capaz de durar, li-teralmente, dias e dias.

‘AC3’ é uma conclusão quase per-feita. E é isto que me deixa hoje preo-cupado com Desmond. A ideia de quea nossa amizade de vários anos possaestar perto de um fim.

OUvir

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foi uma boacaminhada,desmond

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Page 20: Edição nº 252

Realizam-se por estesdias, na Universidade deLisboa (UL), mais umas

Jornadas do ciclo “Conhecer para in-tervir”, desta vez dedicadas ao tema“A intervenção social no Ensino Su-perior: que consequências para o cur-rículo?” (www.qualidade.ul.pt).Abertas a toda a comunidade acadé-mica, nelas se pretende discutir a im-portância, as modalidades e o alcancedas várias actividades (culturais, des-portivas, de associativismo, volunta-riado, apoio comunitário edesenvolvimento sustentável) que seassociam, em sentido amplo, à di-mensão de responsabilidade social naUL. Dar-lhes visibilidade significaconsiderar a universidade nãoapenas como um espaço de tra-balho e de prática de ofícios (ensi-nar, aprender e investigar), mas comoum espaço de vida. Onde estudantes,docentes, investigadores e funcioná-rios partilham valores de realizaçãopessoal e colectiva e se constroem, secomprometem como cidadãos solidá-rios e atentos à sociedade e ao planetaque os envolve.

Criadores activos de universi-dade, os estudantes surgem nalinha da frente desta agenda.Pelo protagonismo que adquiremna concepção, promoção, divul-gação e execução de projectostradicionalmente considera-dos “extra-curriculares”,aos quais se continua aatribuir um estatutomenor e periférico noseu perfil de aluno –tipicamente exer-cido e avaliado no

perímetro da sala de aula. Nas áreasdo associativismo, do desporto e dacultura, na solidariedade social e naprotecção do ambiente, por exemplo,o seu contributo é notável. O levanta-mento recentemente feito na UL re-velou uma imensa esurpreendente malha de moda-lidades de intervenção. No quetoca aos estudantes, e para além doseu papel relevante nas associaçõesacadémicas, nas equipas desportivase grupos/movimentos culturais dasvárias faculdades, vale a pena referiralguns exemplos: o apoio social juntode populações/bairros mais desfavo-recidos da cidade de Lisboa; as redesde entre-ajuda em torno dos es-tudantes com necessidades edu-cativas especiais; a organização debancos de roupa e de livros/ma-n u a i s

escolares; a criação de programasde “saúde oral para todos”; a“campanha contra o desperdício decomida”; a divulgação científica juntode alunos do ensino secundário; o le-vantamento e monitorizaçãodos consumos de energia e água,a poupança e reciclagem de papel; o‘car sharig’; “a semana do volun-tariado”; a participação nascampanhas do banco alimentarcontra a fome ou nas de recruta-mento de dadores de medula óssea; o“hospital dos pequeninos”; a festa deNatal com as Pessoas Sem-Abrigo…

É tempo de abrir o curriculume os planos de estudos académi-cos a estas experiências que propor-cionam um notável enriquecimentopessoal e a aquisição de competênciascom impacto no futuro profissional.Este é, aliás, um dos desígnios de Bo-lonha: que a universidade crie osmecanismos necessários paraacreditar, quer por via do suple-mento ao diploma, quer por via deatribuição de créditos (ECTS) estasactividades. Numa época com sinais

tão devastadores de receio e pessi-mismo, a Universidade con-tribuiria assim para inovar e

mostrar, a contrario, que nelapermanece viva uma co-

munidade solidária.

sOltas20 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | terça-feira

uma ideia Para O ensinO suPeriOr

ana nunes de almeida • Pró-reitOra da universidade de lisBOa

O ÍntimO dO PianO

António Pinho Vargas entra e começa a tocar sem dizer uma palavra.À medida que os seus dedos tocam as teclas, somos completamente imer-sos na música que nada mais faz do que nos levar a senti-la fortemente.Num concerto intimista, no passado dia 27, no Teatro Académica de GilVicente (TAGV), Pinho Vargas iniciou o Festival de Música de Coimbra.

Depois de tocar três peças musicais, diz-nos que gosta muito de Coim-bra, que gosta muito do TAGV. Diz-nos, ainda, que por “ligações cósmi-cas”, no passado mês de março recebeu o Prémio José Afonso 2010 e oPrémio Universidade de Coimbra. Dados os vínculos de José Afonso aCoimbra, mostra versões de “Que Amor não me Engane” (do álbum “SoloII”) - “algo que convém que não aconteça”, refere, e ainda “Lindo Ramo,Verde Escuro” (do álbum de 2008, “Solo”).

Todo o concerto incide na sua obra produzida durante 20 anos (de 1976a 1996), presentes em “Solo” e “Solo II” e ainda improvisações, inseridasno álbum com o mesmo nome.

Com as luzes azuis, focos de luz repartidos incidem no teto da sala doTeatro Académico de Gil Vicente, que fazem lembrar um céu estrelado.Enquanto isso, António Pinho Vargas embala-nos, martelando as teclasdo piano, virtuosamente. Há momentos em que a vontade é a de sairmosde nós próprios e flutuarmos naquelas “estrelas” que revestem o teto dasala.

Numa fase final do espetáculo, António Pinho Vargas diz que vai «tocarmais três músicas, uma delas é a Tom Waits. Eu não costumo tocar estamúsica, mas depois penso: “Será que tenho o direito de ser eu a escolhero que vou tocar? Não deveria deixar que quem me ouve escolhesse?”». Opiano faz parte do músico e do compositor, como uma extensão dos seusdedos.

O concerto termina após uma hora de música, e Pinho Vargas aindavolta para tocar mais uma, “apesar de o piano estar desafinado”.

Por Beatriz Barroca

EstudantEs E univErsidadE: O dEsafiO da rEspOnsabilidadE sOcial

critic’arte

D.r.

Breves Manifestação de estudantesEstudantes de Lisboa marcaramuma manifestação nacional parao dia 22 de novembro. A concen-tração está marcada para as14h30, na praça Marquês dePombal, seguindo depois o pro-testo até à Assembleia da Repú-blica. O protesto é organizadopelas associações de estudantes

do ISCTE - Instituto Universitá-rio de Lisboa, da Faculdade deLetras da Universidade de Lisboa,da Faculdade de Ciências Sociaise Humanas da UniversidadeNova de Lisboa e do Instituto deGeografia e Ordenamento do Ter-

ritório. A AAC não se deslocará aLisboa, estando prevista umaação de protesto em Coimbra.

Administração da Lusaprevê cortes nos saláriosDepois da saída voluntária de 18pessoas, 14 jornalistas e quatroadministrativos, a administraçãoda Lusa já anunciou que terá quefazer uma “redução drástica damassa salarial”. A poupança emsalários, graças à saída dos traba-lhadores, é de 700 mil euros. Trêsdos jornalistas eram da delegaçãode Coimbra, que entretanto foiextinta.

Mosteiro de Sta. Clara-A-Velha A diretora regional da Cul-tura do Centro, Celeste Amaro,pensa que a queda de um brasãodo Mosteiro de Santa Clara-a-Velha se deve ao excesso de ruídoproveniente da Praça da Cançãodurante a última Latada. A quedaocorreu três dias depois do finalda Festa das Latas. A diretora fezquestão de solicitar dois estudos,

sendo um deles dirigido à Facul-dade de Ciências e Tecnologia daUniversidade de Coimbra e outroà Universidade do Porto. CelesteAmaro declarou ainda que vailevar o caso “até às últimas con-sequências”.

Morreu Elliot CarterO compositor americano ElliotCarter morreu ontem, quando fal-tava pouco mais de um mês paracompletar 104 anos. O composi-tor ganhou dois prémios Pulitzerem 1960 e 1973, pelas obras“String Quartet No. 2” e “StringQuartet No. 3”, respetivamente.Em 2006 foi nomeado para umGrammy com “Boston Concerto”,na categoria de melhor composi-ção clássica contemporânea. El-liot Carter teve uma atividadebastante profícua nos últimosanos, tendo publicado mais de 40obras entre os 90 e os cem anos.Após ter completado o centená-

rio, em 2008, ainda lançou 14 tra-balhos, sendo a sua derradeiraobra “12 Short Epigrams”, parapiano, completa em 13 de agostodo presente ano.

IKEA em CoimbraA Câmara Municipal de Coimbraaprovou ontem a introdução deuma unidade da marca sueca noPlanalto de Santa Clara, junto aoFórum Coimbra, tal como foraexigido pela IKEA. Contudo, exis-tem algumas condicionantes: oedifício não pode possuir valên-cias próprias ou equiparáveis àsde um centro comercial.

Por Daniel Alves da Silva

Daniel alves Da silva

Page 21: Edição nº 252

ão me recordo exactamentequando foi, mas encontreiem Grafton Street, uma das

artérias principais de Dublin, um dis-creto escultor de cães de areia. Issomesmo, cães de areia. Vi-o chegarcom sacos e caixas recheados deareia húmida e começar a moldarcães de grande porte, deitados e comum aspecto tão real, tão verosímilque só lhes faltava ladrar, latir ouabanar a cauda.

O escultor tinha o ar triste de umdesempregado de longa duração, deum homem da errância das cidades,com a memória de muito álcool emnoites de insónia, na per-dição das peque-nas ruas maliluminadas.

O pouco in-teresse dost r a n s e u n t e spelo labor doescultor não mesurpreendeu,pois percebi quedevia ser presençacostumeira naquela ruada cidade. Mas eu fiquei aliplantado, perto da entrada de umaloja de chocolates, a ver de que modoos cães ganhavam forma e a observarcada gesto do artista, transformadonum verdadeiro afago aos seres quenasciam do seu engenho criador.

Naquele fim de manhã, o escultor,cujo nome nem cheguei a saber, es-culpiu dois cães de grande porte, semraça definida, mas que deviam cor-responder a uma memória visual eafectiva que o acompanhava de lon-guíssima data. Talvez tenham sidoassim, ou continuem a ser, os cães dasua casa, aquela de que se afastaumas horas por dia para ir buscar a

areia bastante para lhes dar umaforma tão realista quanto tristementeefémera.

Tudo isto a troco de quê? De umasmoedas, da curiosidade de visitantesde circunstância como eu ou dascrianças que têm medo de cães e ali,perante a imobilidade dos feitos deareia húmida, prontamente o per-dem, ficando até com vontade de osirem acariciar e desafiar para a brin-cadeira.

O escultor trabalhou com intensi-dade e concentração, não se dei-xando distrair pelo barulho da rua epelo

som forte que saía das lojas de dis-cos e instrumentos musicais. Ele eos seus dois cães pertenciam auma outra dimensão, que é a daarte, da livre ocupação dotempo e também a do es-quecimento das traições davida, dos sonhos por cum-prir e de tanta outra coisaque talvez só aqueles cães ima-ginados tenham podido testemu-nhar.

Quando o trabalho ficou con-cluído, o escultor observou a obrafeita, acendeu um cigarro e começoua conversar com dois outros homens

que, como ele, deviam fazer parte dageografia humana mais constante daanimada Grafton Street.

Depois de ter deixado no boné doescultor o dinheiro que tinha dispo-nível e que ele agradeceu com umavénia e um sorriso, afastei-me na di-recção de uma das boas livrarias dacidade. Nessa alturacomeçou a cho-ver torren-

cialmente e logo a pergunta se meimpôs: “O que vai acontecer aos cãesde areia?”. Quando me aproximei dolocal onde eles haviam ganho forma,descobri que a violência da chuva os

condenara a um quase total desapa-recimento, sem que o escultor ten-tasse protegê-los com um oleado oucom o que quer que fosse. Abrigadodebaixo de um pequeno alpendre, eleassistia impassível ao desapareci-mento físico da sua obra, sem esbo-çar um gesto de contrariedade ou deresistência. Trabalhara, afinal, para

a extinção, para o verdadeiro es-quecimento. Dos cães resta-

ram apenas as fotografiasque eu e mais alguns tu-ristas lhes tirámos.

Ao afastar-me denovo, pareceu-me ouviro latido de dois cães, oseu choro de tristeza esofrimento, mas tudonão devia passar de

pura ilusão minha. Comopodiam dois cães de areia

lamentar esse inexoráveldestino?

Nessa noite tive muita di-ficuldade em entrar nosono. Estava ansioso etenso. Decidi sair doquarto do hotel e vir paraa rua fumar. Foi entãoque vi passar um homem

magro, de óculos de lentesmuito grossas e chapéu na ca-

beça, acompanhado por dois cãesiguais aos saídos das mãos do escul-tor, e um deles, olhando para o dono,perguntou-lhe: “Por que foi quenunca escreveste sobre nós nos teuslivros, James ? Será porque somosfeitos de areia húmida como os so-nhos dos homens quando se desfa-zem?”

O dono levantou a gola da gabar-dina, ajeitou o chapéu e entrou comos dois cães num pequeno ‘pub’ deesquina chamado “Ulysses”.

sOltas6 de novembro de 2012 | terça-feira | a cabra | 21

Os cÃes de areia de GraFtOn streetPor José Jorge letria micrO-cOntO

onge vão os tempos em queStanley Milgram provouque dois em cada três dos

caros leitores electrocutariam umdesconhecido. Ou que SolomonAsch demonstrou que setenta porcento de vocês não saberia dife-renciar duas linhas absolutamentedistintas. Outros tempos, em quesomente a partir de experiênciascontroladas, no âmbito da psicolo-gia social, se avaliava o relaciona-mento do indivíduo com os seuspares e com conceitos como auto-ridade ou conformismo. Hoje emdia, não necessitamos de laborató-rios para investigar tal fenómeno:basta-nos passar numa universi-dade em época de praxe.

Durante a vida estudantil, comono resto dela, diz-se das tradiçõesque são graníticas e pesadas, comorochas milenares e imovíveis. DosHomens vai-se dizendo que têmdireito a viver debaixo delas, àsombra dos penedos. Escondei-vossob a pedra e juntemos fungi à fi-logenia dos sapiens. Mas as tradi-

ções são os Homens que fazem,não só fazem como mantém, quesem alguém que o abrace e acari-nhe, qualquer costume estará des-tinado a definhar solitariamente.Se a praxis vive e sobrevive, cadaano mais pujante e revigorada queo anterior, é porque os estudantesa ela se entregam com renovadosvotos de fidelidade e assolapadapaixão, ano após ano. O que é fas-cinante. Não tanto a praxe, mais adevoção.

Não sou fanático, mero terro-rista do grelo, simples extremistacontra a batina ou básico funda-mentalista anti-nabo. Nada disso.Cada um de nós se veste como bemquer e lhe apetece, sob gélidachuva ou tórrido sol. Podemostambém queimar o que nos dá natelha ou trincar diversos vegetaisnos mais variados e divertidos con-textos. Como a gaivota e a criança,somos livres. De escolher. E énessa escolha que o meu fascínionasce, sendo por isso, confesso,um interesse sobretudo antropoló-

gico.Com efeito, o estudante univer-

sitário escolhe ser praxado. Há atérelatos e boatos, decerto exagera-dos como sempre são os produtosdesse tipo comunicação, de quemchore copiosamente no final dapraxe, lamentando o carácter vec-

torial do tempo, rais o parta quenão volta para trás. E que alguémescolha ser tratado, literalmente,como um animal, não raras vezeshumilhado sob a bandeira da inte-gração e, não suficiente, que no fimainda goste, é algo que me deixa si-multaneamente perplexo e fasci-

nado. Mas é desta massa que sefazem as tradições: de coisas apa-rentemente sem explicação parauns, extremamente gratificantespara outros.

Milgram e Asch quiseram lem-brar-nos que somos antes de maisseres sociais; que a pressão dequem nos rodeia molda o compor-tamento. O que me ajuda a perce-ber a opção generalizada departicipar num ritual que cultiva aarrogância e o abuso. Porém, porvezes, passo por um "doutor" queatira gratuitamente impropérios ameia dúzia de jovens cabisbaixos,ou leio uma notícia sobre maisuma tentativa de integração comresultados lamentáveis, e volto àconfusão e perplexidade. Quemnão gosta, não percebe. Quaisquerque sejam as pressões, somos asdecisões que tomamos. Por isso, háescolhas que nem Milgram e Aschme conseguem explicar.

entre a arreGaça e O calHaBéPor Bacharel Jorge Gabriel

Lrafaela carvalho

Praxis et HOmines (translatiO Per GOOGlum)

Decorria o ano de 1951 quando nas-ceu, em Cascais, José Jorge Letria.

Estudou Direito e História e é pós-graduado em Jornalismo Internacional.Desempenhou funções de redator eeditor, mas foi como escritor que maisse destacou.

Com dezenas de livros publicados,desde poesia, ficção, ensaios, livros in-fanto-juvenis até peças de teatro, foidistinguido com importantes prémiosliterários. Um deles foi o Prix Interna-tional des Arts et des Lettres atribuídoà tradução francesa de “A Tentação daFelicidade”, um livro de poesia

Em 2000 editou o seu primeiro ro-mance “Um amor Português”. É aindaco-autor, com José Fanha, de várias an-tologias de poesia portuguesa.

Também se afirmou como cantor-autor de intervenção. Ao lado denomes como José Afonso, integrou omovimento da canção de resistência,tendo sido agraciado em 1997 com aOrdem da Liberdade.

Ao longo da vida adquiriu uma vastaexperiência na direção de diversas or-ganizações culturais. Em Janeiro de2011 assumiu a presidência da Socie-dade Portuguesa de Autores.

Inês Pereira

JOSÉ JORGE LETRIA61 AnOS

N

Page 22: Edição nº 252

opinião22 | a cabra | 6 de novembro de 2012 | Terça-feira

Saiu o escritor, entrou o gestor. Doprimeiro ficarão os livros, se conse-guirem perdurar, do gestor não fi-cará nada, nem a lembrança donome. Quem aceita gerir os 190 mi-lhões de euros destinados à Culturana Lei do Orçamento do Estado para2013 aceita ser, apenas, coveiro – sergovernante na área da Cultura éoutra coisa. Ser governante na áreada Cultura é saber compreender asqualidades de um espaço civilizacio-nal e comprometer-se a trabalharpara o seu desenvolvimento. Não é ocaso. A cultura deste governo (e, deresto, dos anteriores com mais oumenos variações) é a do lucro fácil àcusta do trabalho de outros, do iatena marina, da aposta no casino.Nada de valorização do património,nem de aposta nos criadores, de in-vestimento nas condições de acessoà Cultura, de atenção para com ostrabalhadores da Cultura (que nãosão apenas músicos, pintores, escri-tores, bailarinos, atores – são car-pinteiros, ‘luthiers’, restauradores,operadores de bilheteira, livreiros,produtores, electricistas, coreógra-fos, maquinistas). O país cujos go-vernos premiaram com 3405milhões de euros as burlas dos ges-tores do BPN, entrega nas mãos deum gestor de turno 190 milhões deeuros, de trocos do Orçamento do

Estado, para que um povo inteiropossa trilhar o seu caminho civiliza-cional e, ainda, o possa estender atoda a Humanidade.

Num tal deserto de pouco vale aindignação. O indignado indigna-secom os tostões que os governanteslhe atiram e faz-lhes chegar a sua in-dignação - o gesto alivia, mas nãotransforma. Por isso é que um con-junto de cidadãos se vem reunido emCoimbra, e noutras cidades, emtorno do Manifesto em Defesa daCultura para reivindicar 1% do Orça-mento do Estado para a Cultura.Trata-se de um propósito com mui-tas tarefas, num ambiente em que aCultura é encarada como um adereçoe como tal “impingida” pelos vende-dores do neo-liberalismo. Trata-se decriar um espaço de afirmação doscriadores e dos públicos conscientesdo valor, também económico, daCultura. Mas, mais do que tudo,trata-se de confrontar os cidadãoscom a necessidade, que é de todos,de reivindicar um espaço de vidapara o exercício da condição humana– a fachada da igreja que se atravessano nosso caminho, a colectividadeonde acontece o ensaio da Filarmó-nica, o livro aonde se vai buscar afrase que queríamos saber escrever, amúsica a mexer nas emoções, a foto-grafia que fixou o exacto momento e

nele nos deixa viver, o enredo teatralem que nos revemos ou não nos re-vemos de todo. Trata-se, afinal, dereivindicar quase nada – 1%! – exi-gindo a parte mínima do OE capaz deconverter a Cultura em assunto deEstado, a diferença entre permitir oacesso à Cultura, exercitada oufruída, ou limitá-lo para milhares deconcidadãos, atirados para a convic-ção salazarista de que a cultura é as-sunto de uns quantos cromos quefalam caro e incompreensível. Não setrata de orientar gostos, mesmosendo verdade que os gostos se dis-cutem – trata-se de pôr à frente dosnossos olhos o que há para ser vistoe deixar que reparemos; de pôr nasnossas mãos o que possa ser mexidoe permitir que o transformemos. OManifesto assumiu-se, natural-mente, como elemento da alternativaa um caminho político de eliminaçãode todos os traços da sociedade so-nhada em 25 de Abril de 1974 e, emmuitos aspectos, caminhada com su-cesso. Uma sociedade em que oacesso à Cultura passou a ser direitoconstitucional, e não apenas umgesto de boa vontade de um qualquermecenas ou benfazejo das delícias da“alma”, os “alegres” de que falava Sa-lazar (em oposição aos tristes, cida-dãos comuns arredados dos efeitosperniciosos da vivência cultural).

Uma sociedade em que as criançassonham ser pianistas e escultores, ar-quitectos e actores, poetas e bailari-nos – profissões que resistiram asê-lo num ambiente hostil à criativi-dade, mas que romperam as barrei-ras da barbárie e se implantaram nonosso chão. Porque já existem, nãoreivindicam espaço para existir – exi-gem que não as assassinem. É nesteespaço que vive o Manifesto, inter-pelando os cidadãos, responsabili-zando os eleitos nos órgãos de poder,constituindo-se notícia de jornalonde se escreve que o “Manifesto emDefesa da Cultura quer autarcas e de-putados de Coimbra a contestaremOrçamento do Estado” (Visão on-line). O Manifesto recusa a trin-cheira, ocupando o espaço públicoonde apresenta as suas propostas;propostas que operacionaliza nas ini-ciativas que os seus activistas cons-troem em conjunto. Basta estaratento a http://www.facebook.com/groups/488625344488243/?fref=tse aparecer numa reunião. Porque aCultura é bem de primeira necessi-dade.

*Membro do Núcleo do Manifesto

em Defesa da Cultura

num tal deserto de pouco vale a indignação. o indignado indigna-secom os tostões que os governantes lheatiram e faz-lheschegar a sua indignação - o gesto alivia, mas não tranforma.

Cultura - um Bem De Primeira neCessiDaDe vale Bem um manifesto

manuel Pires Da roCha*

Famosíssimas as escadas do Bi-gorna. Pena que de formosura nãoestejam repletas tal como a coloridafachada de gentes que por lá abancadurante as vagas noites, numa per-feita vida de convívio e deboche.Longe de tal desonrada escadariapassam os padres e as freiras quedo matutino missal serviço retor-nam e, segundo más-línguas, repu-diam tal local, passando de cabeçasubjugada e evitando contacto vi-sual com a referida cascata depedra.

Da mais divinal musa vestidacom uma curta saia e um decote en-riquecedor para olhares alheios, atéà mais reles rameira que exibe ascarnes indecentemente, mas igual-mente atraente para menos elegan-tes e categóricos olhares; se juntada nata e do mais baixo, de tudo umpouco da pequena cidade que éCoimbra. Mergulha-se num oceanode gente, a maioria caras conheci-das ou personagens caricatas, en-volto num sopro de abundanteálcool, denunciado pelas excessivasgargalhadas que atordoam aquelesque ao sono se querem entregar eque, por puro infortúnio, aturam

este rotineiro hábito. E ouvem-secantares desafinados e um tanto ouquanto caóticos, observam-se osbeijos, que de inocente nada têm,roubados e planejados pela bebida;contemplam-se as mais degradan-tes cenas do ser humano, esban-jando pequenas fortunas paraalcançar a vívida embriaguez, cul-minando, quando em excesso, naviolenta expulsão do líquido queavidamente havia sido ingerido;presenciam-se fascinantes conver-sas, nomeadamente escândalos emexericos de última hora; comen-tam-se episódios supérfluos e aven-turas cativantes, seguindo-se umbem delineado procedimento desaudações, representações de fictí-cias amizades exacerbadas pelo ál-cool; consomem-se cigarrosdesalmadamente, como se o ama-nhã não chegasse e o hoje quisessepartir a todo o vigor; deambulam,num característico jeito, vários in-divíduos, adaptando-se ao balançardo solo, danada ilusão causada pelaexcessiva hidratação alcoólica; des-pedem-se amigos em estados lasti-máveis, abusados por toxinas esugados de toda a essência da viva-

cidade, assemelhando-se a pálidoscadáveres suados por um tórridocalor que lhes consome o âmago dosseus seres, levando-os à exaustãototal, expondo-os directamente aperigos desnecessários.

Mas de grande alarido e confusãose não fazem apenas as tardiashoras passadas na deliciosa escada-ria. Apesar de toda a conotação as-sociada ao lento declínio de netos deegrégios avós e da depravação rela-cionada com o degredo do heroísmoe da nobreza, a verdade é que sevive a vida com intensa emoção eprofunda paixão. Saboreia-se o dul-císsimo e confortante recheio do tãofalado e classicamente tradicionalespírito académico, consumam-segrandes amizades e constroem-senovas, fomenta-se a conversa ho-nesta e a de fachada, sublimam-sepaixões puramente carnais ou, paramais iluminadas almas, amorosas;exalam-se fumos de distantes e exó-ticas paragens, conferindo um pa-norama cosmopolita à provincianaregião; observam-se convívios inte-ressantes, englobando uma vastaamostra de diferentes estilos e char-mes.

Reina o barulho, desenrolam-secaóticas conversas simultanea-mente, ouvem-se diferentes músi-cas dos pequenos estabelecimentoscomerciais, cortadas pelo ocasionalgrito de histeria ou de pura agoniaalcoólica. Seja como for, de diversasbebidas, cigarros, substâncias ilíci-tas e música, se governa a noite nolugar que agora é ponto de encon-tro obrigatório, sinónimo de grandealegria e jubilante felicidade, exta-siante cúmulo de sensações tão hor-rendamente oprimidas ao longo dosdias, causadas pela excessiva dedi-cação ao trabalho e negação de car-nais e mundanos prazeres.

Resta esperar que tal magníficamas suja escadaria se redima dospecados, tentações tão incríveismas, ao mesmo tempo, tão fatais;para que se continue a celebrar aefémera existência, ignorando quedesde o nascimento, da morte jásomos pertença.

*Estudante da Faculdade de Medi-

cina da Universidade de Coimbra

..as mais degradantescenas do ser humano,esbanjando pequenasfortunas para alcançara vívida embriaguez,culminando, quandoem excesso na violenta expulsão do líquido que avidamente havia sido ingerido”

esCaDas Do Bigorna

tiago malhó gomes*

Cartas à Diretora

Page 23: Edição nº 252

OpiniãO6 de novembro de 2012 | Terça-feira | a cabra | 23

Secção de Jornalismo,

Associação Académica de Coimbra,

Rua Padre António Vieira,

3000 - Coimbra

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Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA Depósito Legal nº183245/02 Registo ICS nº116759Diretora Ana Duarte Editora-Executiva Ana Morais Editora-Executiva Andreia Gonçalves Editores Stephanie SayuriPaixão (Fotografia), Liliana Cunha (Ensino Superior), Daniel Alves da Silva (Cultura), João Valadão (Cidade), Paulo SérgioSantos (Ciência & Tecnologia), António Cardoso (País & Mundo) Secretária de Redação Mariana Morais Paginação Cata-rina Gomes, Rafaela Carvalho Redação Beatriz Barroca, Daniela Proença, Emanuel Pereira, Ian Ezerin, João Martins, MiguelPatrão Silva Colaborou nesta edição Ana Namora, Andreia Oliveira, Fábio Aguiar, Inês Pereira, Inês Rama, Pedro Martins,Joel Saraiva, Luís Azevedo Fotografia Ana Morais, Daniel Alves da Silva, Rafaela Carvalho, Stephanie Sayuri Paixão Ilus-

tração Tiago Dinis Colaboradores permanentes Bruno Cabral, Camila Borges, Camilo Soldado, Carlos Braz, Fábio Ro-drigues, Inês Amado da Silva, João Gaspar, João Miranda, João Ribeiro, João Terêncio, José Miguel Pereira, José Miguel Silva,Luís Luzio, Manuel Robim, Rafaela Carvalho, Rui Craveirinha, Tiago Mota Publicidade António Cardoso - 914647047 Im-

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editoRiAl

UmA AtitUde QUe CAReCe de CeRtezA

A aprovação do Orçamento do Estado para 2013 (OE2013) na sua ge-neralidade tem estado, e vai continuar durante algum tempo na ordemdo dia. Todos os setores são afetados, e o Ensino Superior (ES) não é

exceção – aliás, foi um dos que levou mais cortes. Perante esta situação cala-mitosa, é preciso tomar uma atitude.

Na gala do aniversário dos 125 anos da Associação Académica de Coimbra(AAC), realizada no passado sábado, 3, o reitor da Universidade de Coimbra(UC), João Gabriel Silva, não esqueceu os ataques ao ES estipulados noOE2013. Num discurso cru, o reitor afirmou a sua posição contra o corte nofinanciamento para as instituições do ES. Para além disso, apelou ainda à mo-bilização dos estudantes, para que estes não fiquem parados perante o desca-labro em que pode cair o ensino, que cada vez mais se torna um luxo, e não umdireito.

A par das ações de protesto já propostas em Assembleia Magna pela Dire-ção-geral da AAC (DG/AAC), o Conselho de Reitores das Universidades Por-tuguesas (CRUP) vai reunir amanhã, 7, para decidir a ação de reivindicaçãoque 14 universidades vão levar a cabo já sexta-feira dia 9. Por agora, o presi-dente do CRUP, António Rendas, não adianta nada, bem como alguns reito-res das 14 instituições. Quando questionado sobre um possível encerramentoda UC no dia 9, João Gabriel Silva afirma: “não descarto essa possibilidade”.

Apesar de não ser algo concreto, esta afirmação pode trazer um novo alentoaos estudantes. O reitor mostra-se do nosso lado, mostra-se disposto a lutar

contra as ofensivas ao ES – que já não são de agora. Contudo, é de ressalvarque, perante toda a conjuntura que o OE2013 vai instalar, João Gabriel Silvaapenas se referiu aos cortes no ES. Todo o resto que afeta a sociedade e, con-sequentemente os estudantes e a suas famílias, é deixado de parte.

É tempo para olhar a uma outra situação grave com que os alunos daUC se depararam neste novo ano letivo. Mais de dois mil estudantescorrem o risco de prescrever. O assunto simplesmente não é abordado

e a maior parte talvez nem saiba as implicações que a prescrição implica. Osestudantes do Polo II realizaram um inquérito para apurar a gravidade da si-tuação, e face às respostas obtidas, descobriram que mais de metade dos alu-nos com mestrado integrado (Engenharia Civil e Mecânica) está na mó deperder o ano.

Face a esta realidade, os núcleos dos dois cursos já encetaram esforços parachegar à fala com o provedor do estudante, que se mostrou solidário com eles.Em imediato, o objetivo máximo é tentar aumentar em um ano a possibili-dade de o aluno planear o que fazer com as cadeiras que tem em atraso. A vice-reitora, Madalena Alarcão, não admitirá falhas no aproveitamento escolar, eesquece-se claramente de duas premissas: primeira, está prevista a flexibili-dade na escolha de cadeiras para estes alunos; segunda, a perda destes du-rante um ano na UC pode constituir em definitivo a sua saída para sempre dainstituição, já que não há dinheiro para pagar cadeiras em avulso.

Liliana Cunha e Ana Duarte

Por agora, António Rendas, não adianta

nada, bem como alguns reitores das 14

instituições. Quando questionado sobre um pos-

sível encerramento da UC no dia 9, João Gabriel

Silva afirma: “não descarto essa possibilidade”.

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A voltA PArA cAsA por Mariana Morais 200

x 100Uma silhueta delgada, um vestido

vincado, rodavam. Era Ela, a baila-rina. A bailarina que rodava semnunca parar. Um dia, um Velho, queusava um chapéu de palha e fumavaum cigarro adormecido, ordenou-lhe:pára. “Não quero”- foi o que ela, can-sada de rodar, respondeu. Num sor-riso amargo de sarcasmo, o velho riu.E enquanto ria praguejou: não párasporque não consegues. És como ele, oHomem. Sempre a correr de um ladopara outro. Constantemente a correr,a farejar, a procurar. Também estácansado como tu, mas ainda assim,não pára. “Porque não pára?”, per-guntarás tu. Não pára, porque acreditaque, nesse seu corrupio constante,controla. Ilusão Bailarina. Ilusão. Àsua volta, o vento continua a soprar, otempo continua a passar e o seu cor-rupio terá, um dia, de acabar. Afinal,que está ele a controlar? Que estás tua controlar? Nada, bailarina. Nada! Éscomo ele, o Homem…Caos… caos…caos.

O ministério da pasta da Comu-nicação Social, de que é responsá-vel Miguel Relvas, demonstra nãoestar a par da realidade do país noque diz respeito à comunicação. Talcomo noutros assuntos e outros se-tores de vida social e cultural, o Go-verno no seu conjunto, olha para osproblemas de Portugal como ques-tões de negócios. Além da falta denoção de Estado e do espírito de ci-dadania existe um desprezar dasconsequências humanas das políti-cas do Governo. A Cabra tentouchegar ao contacto com o Ministé-rio dos Assuntos Parlamentaresque não se mostrou interessado emprestar declarações. Será sinal dereceio? A.C.

MiguelRelvas

“Fórum Teatrão”

O quarto “Fórum Teatrão”trouxe à Oficina Municipal do Tea-tro vários agentes culturais da ci-dade, reunindo também algunscidadãos interessados no debatesobre estratégias de intervençãolocal. Num momento em que a cul-tura (tal como a saúde e a educa-ção) é fustigada por cortes cegos, éum sinal positivo a realização destegénero de encontros que demons-tram a necessidade de estruturasculturais intervenientes na vida dacidade. A cultura manifesta-seassim como um pilar fundamentalna relação que se cria entre a cidadee os seus habitantes, procurandosempre novas soluções, mesmo emtempos de crise. D.A.S.

puBLiCiDaDe

Reitoria da UC

Novamente a resposta por parte dareitoria tarda. Já todos sabem que umregulamento que gira o regime deprescrições tem de ser aplicado. Noentanto, a pedagogia da Universidadede Coimbra aprovou dois documen-tos importantes no verão e com sériosriscos para o estudante. E ninguémestá ao corrente disso como deveria.Altera-se em setembro a condição demilhares de estudantes que correm orisco de ver os seus cursos inacaba-dos por cadeiras que antes pressupu-nham flexibilidade. É urgenteaumentar o período de transição paramais um ano de modo a que estu-dante não tenha de perder um ano epôr em causa a sua débil situação eco-nómica. L.C.

Stephanie Sayuri paixão

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