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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
MARLA VIEIRA MOREIRA DE OLIVEIRA
EDUCAR PARA A DIVERSIDADE: UM OLHAR SOBRE AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A
EDUCAÇÃO ESPECIAL DESENVOLVIDAS NO MUNICÍPIO DE SOBRAL (1995-2006)
FORTALEZA-CE
2008
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
MARLA VIEIRA MOREIRA DE OLIVEIRA
EDUCAR PARA A DIVERSIDADE: UM OLHAR SOBRE AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A
EDUCAÇÃO ESPECIAL DESENVOLVIDAS NO MUNICÍPIO DE SOBRAL (1995 – 2006)
Dissertação apresentada ao Mestrado Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade (MAPPS) da Universidade Estadual do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre. Orientadora: Profª. Dra. Francisca Rejane Bezerra Andrade
FORTALEZA-CE 2008
1
Ficha Catalográfica
O 48 e Oliveira, Marla Vieira Moreira de
Educar para a diversidade: um olhar sobre as políticas públicas para
a educação especial desenvolvidas no Município de Sobral (1995-2006).
/ Marla Vieira Moreira de Oliveira. – Fortaleza, Universidade Estadual
do Ceará – UECE, 2008.
146 f
(Dissertação de Mestrado para obtenção de título de Mestre em Políticas
Públicas e Sociedade).
1. Educação especial – política governamental – Brasil 2. Educação
especial – Secretaria da Educação especial – Brasil I. Título
CDD: 371.90981
2
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ MESTRADO ACADÊMICO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE
Título: Educar para a Diversidade: Um Olhar sobre as Políticas Públicas para a Educação Especial desenvolvidas no Município de Sobral (1995-2006)
Autor (a): Marla Vieira Moreira de Oliveira Defesa em: ___ /____ / ____. Conceito Obtido:
Banca Examinadora
__________________________________________ Profª.Dra. Francisca Rejane Bezerra Andrade
Orientadora
________________________________________________ Profª. Dra. Vanda Magalhães Leitão (UFC)
________________________________________________ Profª. Dra. Rita de Cássia Barbosa Paiva Magalhães (UECE)
3
Dedico esta conquista ao meu esposo, Alexandre, e ao meu filho Lucas (que ensaia os seus primeiros movimentos de vida). Acreditamos que podemos alcançar todos os nossos sonhos. Com amor e carinho. Aos meus pais, irmãos, sogros, cunhados e sobrinhos com quem compartilho a minha caminhada pessoal e profissional. Dedico, em especial, ao meu irmão (Joice) e cunhada (Andréa). Dois surdos que motivam a minha luta em busca de melhores condições sociais para as pessoas com deficiência.
4
Agradecimentos
Agradeço a DEUS por me conceder força e conhecimentos necessários para
desenvolver todos os projetos em minha vida.
Ao Alexandre, meu marido, companheiro fiel pelo respeito e paciência diante das
horas partilhadas com o computador e os livros, meus instrumentos de trabalho.
Todo o esforço tem nos proporcionado importantes realizações.
Aos meus familiares e amigos, pela certeza do apoio incansável, um abraço especial
aos meus pais que vêem nos meus passos o espelho de seus ensinamentos.
À professora Rejane Bezerra, pela dedicação, compromisso e carinho com que
conduziu as orientações. Além de uma orientadora, fui agraciada com uma valiosa
amizade.
Às professoras Rita Magalhães e Vanda Leitão, pela atenção, disponibilidade e
valiosas contribuições na banca de qualificação e na defesa desta dissertação.
À professora Gláucia Albuquerque, pessoa especial na minha formação acadêmica a
quem dedico um particular agradecimento.
À Secretaria de Educação e escolas municipais de Sobral que aceitaram contribuir
no estudo em Políticas Públicas para a Educação Especial.
Aos meus professores e colegas do mestrado pelo aprendizado do convívio, em
especial dedico um abraço carinhoso a Micheline e Sandra com quem dividi minhas
ansiedades e vitórias.
A Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico –
Funcap pelo apoio financeiro.
A Fátima, secretária do mestrado, que por muitas vezes atendeu meus pedidos.
Ao Mestrado em Políticas Públicas e Sociedade da Universidade Estadual do Ceará, pela oportunidade.
5
De tudo ficaram três coisas: a certeza de que estamos sempre começando...
a certeza de que é preciso continuar... a certeza de que seremos interrompidos antes de terminar...
PORTANTO DEVEMOS
fazer da interrupção um caminho novo... da queda um passo de dança...
do medo, uma escada... do sonho, uma ponte...
da procura... um encontro
DE TUDO, FICARAM TRÊS COISAS por Fernando Sabino
6
RESUMO
Um dos temas em debate no Brasil tem sido a repercussão das políticas internacionais na educação brasileira. Nos anos 1990, a Conferência Mundial de Educação para Todos (Jontiem, na Tailândia) é marco importante para redefinir e elaborar a agenda educacional destinada aos países da América Latina e Caribe. Esse e outros eventos constituíram uma agenda de intenções e trouxeram ajustes redefinidores do papel do Estado em nosso país. Dentre estes ajustes podemos indicar a revisão do papel da escola regular dentro da proposta de Inclusão e suas repercussões (na ampliação do acesso e na qualidade do ensino). Considerando o exposto, nos propomos a analisar o contexto das políticas públicas para a Educação Especial desenvolvidas em Sobral (1995 – 2006) para atender a Política de Inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais - NEE. Buscamos realizar um olhar oportunizado pela visão de gestores e educadores acerca das políticas públicas no município, sobretudo através das ações do Programa Educação Inclusiva: Direito a Diversidade. O Programa tem como objetivo a disseminação da política de inclusão; a formação de gestores e educadores; a sensibilização da sociedade; e a formação de redes apoiadoras do processo de inclusão. O Ceará foi contemplado através de quatro municípios pólos, dentre eles estão: Fortaleza, Sobral, Cascavel e Juazeiro do Norte. Sobral foi selecionado como pólo para realização dessa pesquisa devido aos significativos resultados em âmbito nacional. O nosso estudo é qualitativo descritivo dividido em duas etapas: análise teórico-documental e trabalho de campo. As fontes dos dados foram pessoas e documentações. No que se refere à análise teórico-documental, foi subdividida sistematicamente em dois momentos: o primeiro constituído de documentos oficiais nacionais e estaduais que possibilitaram a construção do que, de fato, caracteriza o processo histórico-político em Educação Especial no Brasil e no Ceará. E o segundo que aliou a aproximação empírica à apropriação de outras fontes orientadoras e organizadoras da Educação Inclusiva no Município de Sobral. Tais fontes (relatórios, projetos e planos) revelam um detalhamento da trajetória e das ações desenvolvidas na esfera municipal e no contexto das escolas. Diante da reflexão e análise dos documentos o próximo passo foi o contato com o espaço empírico. A amostra é composta de três escolas públicas municipais que aceitaram participar do estudo e receberam nomes fictícios – Escola do Arco, Escola da
Sé e Escola do Beco respectivamente os níveis A, B e C. Encontramos nessa leitura de fatos e intenções uma iniciativa que tem a grande responsabilidade de difundir a inclusão educacional no país através de uma relação direta com os municípios, no entanto, identificamos através de nosso estudo que a ação não corresponde à magnitude da proposta. O modelo que vem se constituindo ainda traz em suas ações muitos elementos da integração e não da inclusão. Ademais os resultados nos revelam que a educação inclusiva em Sobral ainda se constitui de forma bem inicial, e baseia o seu trabalho junto aos alunos com necessidades educacionais especiais através de um projeto de atendimento educacional especializado. Palavras-chave: Educação especial. Educação inclusive. Inclusão social.
7
ABSTRACT
One of the themes in debate in Brazil has been the repercussion of the international politics in the Brazilian education. In the years 1990, the World Conference of Education for All (Jontiem, in Thailand) it is important mark for redifine and to elaborate the educational calendar destined to the countries of Latin America and Caribbean. That and other events constituted a calendar of intentions and they brought redefining fittings of the paper of the State in our country. Among these fittings we can indicate the revision of the paper of the regular school inside of the proposal of Inclusion and your repercussions (in the amplification of the access and in the quality of the teaching). Considering the exposed, we intend to analyze the context of the public politics for the Special Education developed in Sobral (1995 - 2006) to assist the Politics of people's Inclusion with special educational needs - NEE. We looked for to accomplish an opportune glance for the managers' vision and educators concerning the public politics in the municipal district, above all through the actions of the Program Inclusive Education: Right the Diversity. The Program has as objective the dissemination of the inclusion politics; the managers' formation and educators; the sensibilization of the society; and the formation of supporting groups of the inclusion process. Ceará was contemplated with four municipal districts poles, among them they are: Fortaleza, Sobral, Cascavel and Juazeiro do Norte. Sobral was selected as pole for accomplishment of that research due to the significant results in national ambit. Our study is qualitative descriptive divided in two stages: theoretical-documental analysis and field work. The sources of the data were people and documentations. In what it refers to the theoretical-documental analysis, it was subdivided systematically in two moments: the first constituted of national and state official documents that made possible the construction of what, in fact, characterizes the historical-political process in Special Education in Brazil and in Ceará. And the second that formed an alliance the empiric approach with the appropriation of other guiding and organizing sources of the Inclusive Education in the Municipal district of Sobral. Such sources (reports, projects and plans)reveal an specification of the path and of the actions developed in the municipal sphere and in the context of the schools. After the reflection and analysis of the documents the next step was the contact with the empiric space. The sample is composed of three municipal public schools that accepted to participate in the study and they received fictitious names – Escola do Arco, Escola da Sé and Escola do Beco respectively the levels A, B and C. Found in that reading of facts and intentions an initiative that has the great responsibility of diffusing the educational inclusion in the country through a direct relationship with the municipal districts, however, we identified through our study that the action doesn't correspond to the magnitude of the proposal. The model wich is under development still brings in your actions many elements of the integration and not of the inclusion. Therefore, the results reveal us that the inclusive education in Sobral is still constituted in a very initial way, and it bases your work close to the students with special educational needs through a project of specialized educational attendance. Word-key: Special education, Inclusive Education, Social Inclusion.
8
Lista de Siglas e Abreviaturas
ABE – Associação Brasileira de Educação ANPED – Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais BPC – Benefício de Prestação Continuada CADEME – Campanha Nacional de Reabilitação de Deficientes Mentais CAPS – Centro de Apoio Psicossocial CAS – Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento às
Pessoas com Surdez CE – Constituição Estadual CEB – Câmara de Educação Básica CENESPE – Centro Nacional de Educação Especial CESB – Campanha para a Educação do Surdo Brasileiro CF – Constituição Federal CNEC – Campanha Nacional de Educação de Cegos CNE – Conselho Nacional de Educação CORDE – Coordenadoria para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente FHC – Fernando Henrique Cardoso FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
Valorização do Magistério GT – Grupo de Trabalho IDT – Instituto de Desenvolvimento do Trabalho ICES – Instituto Cearense de Educação de Surdos INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira INES – Instituto Nacional de Educação de Surdos LBA – Legião Brasileira de Assistência LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais MEC – Ministério da Educação MERCOSUL – Mercado Comum do Sul MPAS – Ministério da Previdências e Ação Social NEE – Necessidades Educacionais Especiais PCA – Professor Coordenador de Área PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais PIE – Plano Individual de Ensino PNE – Plano Nacional de Educação PNLD – Plano Nacional do Livro Didático PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PPD – Pessoas Portadoras de Deficiência PSF – Programa Saúde da Família SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas SEDUC – Secretaria de Educação Básica SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial SESI – Serviço Social da Indústria SESC – Serviço Social do Comércio
9
SESP – Secretaria de Educação Especial (1986) SENEB – Secretaria Nacional de Educação Básica (1990) SEESP – Secretaria de Educação Especial (1992) RES – Resolução TAF – Tempo de Avançar do Ensino Fundamental UECE – Universidade Estadual do Ceará UFC – Universidade Federal do Ceará
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figuras Figura 1 – Abrangência da educação especial nos níveis de ensino 40
Figura 2 – Educação inclusiva: direito à diversidade 73
Figura 3 – Material de formação docente 2006 76
Gráficos Gráfico 1 – Evolução de matrículas na educação especial – 1998 a 2006 43
Gráfico 2 – Evolução de matrículas da educação especial no Estado do
Ceará/CE 55
Gráfico 3 – Municípios-pólo que ampliaram o atendimento dos alunos com
N.E.E na educação infantil e ensino fundamental 78
Gráfico 4 – Municípios-pólo que ofereceram formação para professores
pelo Programa Educação Inclusiva 79
Gráfico 5 – Municípios-pólo que ofereceram formação para professores em
Educação Inclusiva através de outros programas com recursos
do próprio município 79
Gráfico 6 – Demanda de pessoas com necessidades educacionais
especiais atendidas pelo programa Educação Inclusiva: Direito
a Diversidade em Sobral – 2004 88
Gráfico 7 – Evolução de matrículas na educação especial entre 2002 e
2005 – Sobral/CE 92
Gráfico 8 – Faixa etária de gestores e educadores 98
Gráfico 9 – Tempo de serviço 99
Gráfico 10 – Formação de gestores e educadores 99
Gráfico 11 – Curso de especialização – gestores e educadores 100
Gráfico 12 – Evolução da política de inclusão – Sobral 102
Gráfico 13 – Conceituação da educação inclusiva 104
Gráfico 14 – Programa educação inlusiva 106
Gráfico 15 – Conselho escolar e inclusão 112
Gráfico 16 – Estrutura física e organização pedagógica 114
11
Gráfico 17 – Programa de educação inclusiva: direito à diversidade 119
Gráfico 18 – Formação e atuação profissional 120
Gráfico 19 – Formação continuada em educação especial 121
Gráfico 20 – Formação no programa educação inclusiva: direito à
diversidade 122
Gráfico 21 – Avaliação na escola inclusiva 123
Quadros Quadro 1 – Documentos nacionais e internacionais de educação especial 22
Quadro 2 – Documentos da educação do Município de Sobral 23
Quadro 3 – Agenda Pública (Collor e FHC) 35
Quadro 4 – Política e legislação da educação especial 66 Tabelas Tabela 1 – Escolas e atores da pesquisa 24
Tabela 2 – Brasil – Proficiências do SAEB 1995 – 2001 39
Tabela 3 – IDEB 2005 e projeções para a escola municipal – ESCOLA DO
ARCO 108
Tabela 4 – IDEB 2005 e Projeções para a escola municipal – ESCOLA DA
SÉ 108
Tabela 5 – IDEB 2005 e Projeções para a escola municipal – ESCOLA DO
BECO
108
12
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 14
1 Delimitando o Objeto de Estudo – O Problema de Pesquisa 14
2 O Pôrque da Escolha – A Política Pública como Campo de
Pesquisa 17
3 Objetivos da Pesquisa 19
4 Metodologia de Pesquisa – Um Breve Diálogo Sobre os Caminhos
e Opções 20
CAPÍTULO 1 – HISTÓRIA E POLÍTICA DA EDUCAÇÃO
ESPECIAL NO BRASIL E NO CEARÁ: DA
EXCLUSÃO SOCIAL AOS MOVIMENTOS
INCLUSIVOS 27
1.1 Educação Especial no Brasil: Antecedentes Políticos e Evidências
Históricas 27
1.2 Políticas Públicas no Contexto Político Brasileiro (1990 – 2002):
Caminhos e Descaminhos da Educação Especial 35
1.2.1 Governo Lula – uma Escola do tamanho do Brasil? 41
1.3 A Caminhada da Educação Especial no Ceará: Estabelecendo
Conexões entre as Esferas Nacional e Estadual 44
CAPÍTULO 2 – EDUCAÇÃO ESPECIAL EM SOBRAL: PASSOS E
(DES) COMPASSOS NA CONSTRUÇÃO DA
INCLUSÃO EDUCACIONAL 63
2.1 Educação Especial e Educação Inclusiva: Revisitando os
Conceitos no Contexto das Políticas Públicas 63
2.2 O Programa Nacional de Educação Inclusiva: Direito a Diversidade
– Conhecendo a Proposta e o Âmbito das Ações 72
2.3 A Interface Federal-municipal: as Políticas Educacionais de
Inclusão no Município de Sobral pós 1990 81
CAPÍTULO 3 – A POLÍTICA DE INCLUSÃO DO MUNICÍPIO DE
SOBRAL E OS SEUS DIFERENTES PAPÉIS – O
QUE PODEMOS DIZER? 97
3.1 Caracterização das Escolas e dos Atores da Pesquisa 97
13
3.2 Papel e Ações da Política de Inclusão no Município de Sobral –
Entre o Proposto e o Vivido 100
3.3 Escola do Arco, Escola da Sé e Escola do Beco: O Desafio da
Diversidade 108
CONSIDERAÇÕES FINAIS – OLHANDO PRA TRÁS
VISLUMBRANDO NOVOS CAMINHOS 126
REFERÊNCIAS 132
APÊNDICE 139
ANEXOS 144
14
INTRODUÇÃO
Curiosidade é uma coceira nas idéias. (Rubem Alves, 2003)
1 Delimitando o Objeto de Estudo – O Problema de Pesquisa
O paradigma da inclusão remete a pensar sobre questões que
reorganizam os espaços educacionais. O desenvolvimento de uma educação de
qualidade é um discurso que chama atenção para avaliarmos as ações e sua
repercussão no processo educativo dos alunos com necessidades educacionais
especiais, mas também nos remete a refletir as realidades de forma ampliada,
principalmente, além do espaço escolar. De acordo com a pesquisa “Retrato da
Deficiência no Brasil.” (2003), que tem por base os dados do Censo de 2000, têm-
se no país cerca de 24,5 milhões de pessoas com deficiência. São em torno de
14,5% da população brasileira. Um número expressivo que impulsiona a
organização política a lançar seus olhares e ações no intuito de viabilizar o
processo de inclusão social dessa parcela da população brasileira, principalmente
pós anos 1990.
No Brasil, a repercussão das políticas internacionais sobre a educação
reafirma o modelo neoliberal redefinindo o papel do Estado e as responsabilidades
das políticas públicas. Em 1990, a Conferência Mundial de Educação para Todos
(Jontiem, na Tailândia) elabora uma agenda educacional destinada aos países da
América Latina e Caribe. Seguindo a mesma linha, referendada pelo compromisso
de Educação para Todos, a Conferência Mundial de Educação Especial (1994)
elabora a Declaração de Salamanca, documento orientador da política de educação
inclusiva internacional que propõe a equalização de oportunidades para as pessoas
com deficiência. O discurso de inclusão é necessário para que uma política
excludente seja revista. E como incluir? Por se tratar de um demanda específica, a
educação especial (modalidade de ensino) torna-se uma política focalizada, o que a
constitui como prioridade em políticas públicas.
Isso significa rever o papel da escola regular, pois as “políticas inclusivas
supõem uma adequação efetiva ao conceito avançado de cidadania [...]” (Cury,
15
2005, p.12). Em face da legislação vigente, a escola é chamada e precisa estar
preparada para universalizar o seu atendimento. No entanto, esse papel não
corresponde somente a ela, no que diz respeito ao poder público, o item 66 da
Declaração de Salamanca, indica que:
Políticos em todos os níveis, incluindo o nível da escola, deveriam regularmente reafirmar seu compromisso para com a inclusão e promover atitudes positivas entre as crianças, professores e público em geral, no que diz respeito aos que possuem necessidades educacionais especiais. (1994).
A educação, conforme o Art. 6º1 da Constituição Federal de 1988 é um
direito social e o movimento para a inclusão escolar “de todos” é universalista o que
não quer dizer efetivamente “para todos.” Podemos citar como exemplo o caso do
SUS – Sistema Único de Saúde, que mesmo remetendo-se a um dos direitos
sociais, a saúde, não consegue dar conta dessa totalidade e se depara com os
ajustes estruturais do Estado nacional acompanhado pela política de desobrigação
do Poder Público. Na verdade, entendemos que a responsabilidade, não recai
somente nas ações do Estado, mas de uma sociedade que não discute de forma
democrática as questões políticas, sociais e econômicas.
Dentro dessa perspectiva, o estudo constitui seu caminho através do
resgate histórico-político da educação especial no âmbito nacional e local, dando
ênfase às políticas públicas desenvolvidas a partir dos anos 1990. Para tanto, tem-
se como pano de fundo os dois mandatos do Governo Cardoso (1995 – 2002) e o
primeiro mandato do governo Lula (2003 – 2006) no intuito de compreender as
políticas geradas, sua repercussão na legislação, e o papel da política de inclusão.
Destarte, faz-se necessário conhecer também o desenho histórico-político
do Ceará na Era Jereissati (1995 – 2002). Nesse período, a administração estadual
elegeu como uma das prioridades de governo, as ações na área da Educação. O
Plano de Desenvolvimento Sustentável (1995 – 1998) define um projeto educativo
com o slogan: Todos pela Educação de Qualidade para Todos. De fato, ocorre um
olhar diferenciado culminando na formulação da Política Estadual de Educação
Especial: “Integração com Responsabilidade” (1997), que no governo Lúcio
Alcântara (2003 – 2006) permanece como o documento orientador das ações na
1 “São direitos sociais a educação (grifos nossos), a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados.”
16
Educação Especial do Estado. Além desses fatos é necessário destacar outros
pontos importantes para compreender:
• Como a Política de Inclusão vem repercutindo no atendimento às
pessoas com necessidades educacionais especiais;
• As principais mudanças advindas da formulação de políticas
públicas para a Educação Especial;
• As experiências realizadas na intenção de atender as disposições
da legislação sobre educação especial.
No governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC) tem-se a aprovação da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei No 9394/96 que através de
seu texto, dedica à educação especial um capítulo específico estabelecendo a oferta
a partir da educação infantil. Esta modalidade de ensino também é abordada na
elaboração de outros documentos como o PNE (Lei No 10.172/2001) e as Diretrizes
Nacionais para a Educação Especial (Resolução No 02/2001) trazendo outros
olhares e reflexões acerca do processo educacional de pessoas com necessidades
educacionais especiais. A atenção é caracterizada pela preferência do atendimento
em escolas regulares subsidiadas pela política de inclusão.
No âmbito do processo inclusivo, a década de 1990 é condensada de
propostas, principalmente advindas pela formulação de legislação que nos orienta
até os tempos atuais. Encontrar caminhos para atender a diversidade e não a
“igualdade de todos” configura-se como a grande questão em busca de respostas. O
governo Lula (2003 – 2006) dá continuidade à opção pela Educação Inclusiva
criando alguns programas e projetos que visam o atendimento aos alunos com
necessidades educacionais especiais. Um dos programas é o Programa de
Educação Inclusiva: Direito a Diversidade (2003) que vem fazendo o papel de
disseminador da política de inclusão nos municípios com o intuito de transformar os
ambientes escolares em sistemas inclusivos. No Ceará, foram designados quatro
municípios pólos para a implementação do programa, quais sejam: Fortaleza,
Sobral, Cascavel e Juazeiro do Norte. Como se trata de uma ação dentro da política
de inclusão, dentre os pólos vinculados ao programa chamou-nos atenção o
município de Sobral. Isso porque algumas experiências vivenciadas colocaram a
educação sobralense em posição de destaque, uma delas repercutiu nacionalmente
17
e resultou na publicação do livro intitulado Vencendo o Desafio da Aprendizagem
nas Séries Iniciais: A Experiência de Sobral/CE (INEP/MEC, 2005). Trata-se da
experiência que faz parte do projeto “Boas Práticas na Educação.” (INEP/MEC). A
idéia do projeto é selecionar práticas educativas que estão tendo bons resultados.
No caso de Sobral, refere-se ao processo de alfabetização nas séries iniciais que
implicou em mudanças de comportamento, metodologia de ensino, organização da
escola etc. Em um contexto que prioriza a alfabetização de “todos”, é necessário
compreender como seria chegar a bons resultados. Portanto, baseado no contexto
descrito apresentamos o seguinte questionamento:
• Quais as políticas públicas desenvolvidas em Sobral (1995-2006)
para atender a Política de Inclusão de pessoas com necessidades
educacionais especiais?
Acreditamos que para responder tal indagação outras questões se
agreguem ao ponto de partida:
• Qual percurso histórico-político que constitui a Educação Especial
no Brasil, Ceará e Sobral?
• Quais as ações e estratégias desenvolvidas para atender a política
de inclusão?
• Qual o papel do Programa Educação Inclusiva: Direito a
Diversidade na política de Inclusão de Sobral?
• Em que medida os atores sociais do ambiente escolar contribuem
na discussão e nas ações para a inclusão de pessoas com
necessidades educacionais especiais?
2 O Pôrque da Escolha – A Política Pública como Campo de Pesquisa
Num passado recente, encontramos dois elementos definidores e
entrelaçados para a constituição desse estudo. Um deles vem da experiência
familiar, ou seja, ter um irmão e uma cunhada surdos. Tal fato desencadeou na
graduação a busca por maiores esclarecimentos ou caminhos que
18
possibilitassem a verdadeira inclusão educacional. É nesse espaço que reside o
outro elemento que justifica a pesquisa, um trabalho de conclusão de curso que
por meio de estudo de caso analisou alguns aspectos concernentes à presença
do intérprete de LIBRAS,2 no ambiente educacional. A presença desse
profissional na sala de aula não é a única prática desenvolvida no contexto
cearense, mas figura como forma de materializar as intenções presentes nos
documentos que orientam a Educação Especial.
Interessa-nos, portanto, essa materialização de intenções, ou seja, um
estudo com enfoque e compreensão das (re) definições orientadas pela legislação
vigente, tendo em vista que, os documentos oficiais, devem tratar de demandas da
sociedade. Sendo assim, a formulação de políticas públicas é uma questão atual, e
se apresenta como objeto de investigação pertinente para o sistema educacional,
político e social. “Com feito, pode-se afirmar que um setor ou uma política pública
para um setor, constitui-se a partir de uma questão que se torna socialmente
problematizada.” (AZEVEDO, 2004, p.61). Nesse sentido, uma grande questão em
debate é o papel das políticas educacionais que envolvem o processo de Inclusão
Social, partindo-se da premissa de que a educação é um direito social. É papel da
política de inclusão educacional abrir alguns dos caminhos para as possíveis
mudanças na sociedade.
Embasados nessas reflexões, encontramos no Programa de Educação
Inclusiva: Direito à Diversidade a proposta de uma escola diferente, apresentando
no seu escopo o compromisso de fomentar o acesso educacional, bem como,
compartilhar conceitos, ações e experiências que possam facilitar a socialização e a
escolarização das pessoas com NEE. Tal objetivo de ação nos desperta a
“curiosidade” investigativa, pois o programa se propõe a alcançar, através de um
contato com os gestores e educadores, uma parcela significativa ou a totalidade dos
municípios brasileiros.
Essa discussão de responsabilidades e ações não é algo inaugurado pelo
programa. O município que é responsável pela educação infantil e ensino
fundamental recebeu tal tarefa através da Constituição de 1988. No entanto, não
2 Monografia O Intérprete de Libras e a Escola: Um Olhar sobre a Prática Profissional no Instituto de Educação do Ceará (2002) resultou no estudo da evolução histórica da Educação de Surdos buscando elementos que justifiquem a presença do intérprete de LIBRAS, no âmbito educacional. O estudo constatou que a riqueza, na troca de experiências, se contrapõe às dificuldades em lidar com os diferentes. É marcante, nesta pesquisa, a construção das relações entre professores e intérpretes.
19
colocamos como condição sine qua non para a construção de um contexto inclusivo
a operacionalização de um programa, mas atentamos para um trabalho específico
que tem como foco precípuo a formação de gestores e educadores (aqui a
referência maior são os professores), baseando suas discussões em três vertentes –
o município, a escola e a família. Dentre os espaços presentes na discussão do
programa, o ambiente escolar nos despertou como lócus de debate das questões
políticas e educativas, pois é nela que se operacionaliza a maior parte das ações em
educação. Ademais, demarcar um contexto e o espaço a ser pesquisado, possibilita
uma aproximação mais precisa com as questões que circundam a temática.
No entanto, é necessário lembrar que para alcançar os objetivos traçados
nesse estudo, fez-se necessário conhecer a sociedade brasileira (que é permeada
por preconceitos) e compreender os conceitos que circundam a realidade das
pessoas consideradas “diferentes.” Pesquisar políticas públicas para a educação
especial é conhecer o papel do Estado, da sociedade, da legislação vigente e a sua
repercussão na realidade das pessoas com necessidades educacionais especiais. É
o exercício reflexivo entre o pensar e o agir – é acolher as diferenças entre os
indivíduos buscando compreender cada uma.
Reflexão essencial para entender os desafios apresentados à construção
de um contexto inclusivo. Portanto, de acordo com as motivações e as necessidades
pertinentes ao estudo apresentamos os objetivos da pesquisa.
3 Objetivos da Pesquisa
Objetivo Geral
Analisar o contexto das políticas públicas para a Educação Especial
desenvolvidas em Sobral (1995 – 2006) para atender a Política de Inclusão de
pessoas com necessidades educacionais especiais.
Objetivos Específicos
a) Contextualizar historicamente a Educação Especial no Brasil, no Ceará e
no município de Sobral (1995-2006) e as políticas públicas formuladas
para atender às pessoas com necessidades educacionais especiais:
20
b) Explicitar as ações e estratégias desenvolvidas para atender a política de
inclusão;
c) Analisar em que condições ocorrem as ações de inclusão no Município;
d) Identificar a visão dos atores sociais envolvidos sobre as práticas
educativas utilizadas para a inclusão dos alunos com necessidades
educacionais especiais.
4 Metodologia de Pesquisa – Um Breve Diálogo Sobre os Caminhos e
Opções
O desafio da pesquisa social começa pela delimitação do objeto de
estudo, exercício recheado de meandros e de especificidades. Seu desenvolvimento
é repleto de inquietações e questionamentos, os quais alguns são possíveis de
dissecar e refletir.
Na discussão do problema de pesquisa, configuram-se os seguintes
pontos: o Contexto da Educação Especial na esfera nacional e estadual; o contexto
da Educação Especial no Município de Sobral (1995-2006) e as políticas públicas
formuladas para atender às pessoas com necessidades educacionais especiais; a
compreensão de como a política de inclusão através do Programa Educação
Inclusiva: Direito a Diversidade vem repercutindo no atendimento às pessoas com
necessidades educacionais especiais nas escolas de Sobral.
Por se tratar também de uma pesquisa de abordagem qualitativa
descritiva apontamos baseados em Bogdan e Biklen (1994, p.47-51), cinco
características principais para essa investigação: a pesquisa qualitativa tem o
contexto como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal
instrumento; os dados coletados são predominantemente descritivos; a preocupação
com o processo é muito maior do que com os resultados; a análise dos dados tende
a seguir um processo indutivo; o significado que as pessoas apresentam das
situações é vital nesta abordagem. Tais características revelam a importância de um
estudo dessa natureza, por conseguinte, também nos ajuda a compreender e
delinear o locus para o desenvolvimento da pesquisa.
Sobral tem 40 escolas e 3 Centros de Educação Infantil. Escolher as
escolas não foi tarefa fácil, pois se optássemos pela presença do professor de apoio
21
pedagógico específico3, ainda tínhamos um universo de pesquisa numeroso
tornando inviável o acompanhamento das atividades e o desenvolvimento do
trabalho. Portanto, para alcançar os objetivos desse estudo, inicialmente elaboramos
os seguintes critérios para selecionar as instituições:
a) Localização - Escolas situadas na sede do município de Sobral;
b) Escolas com vários tipos de necessidades educacionais especiais
(deficiência mental, deficiência auditiva, deficiência visual etc);
c) Escolas que possuam professor de apoio pedagógico específico.
Partindo desses primeiros critérios detectamos ainda um número
significativo de escolas. Outro fator condicionante da pesquisa foi o processo de
avaliação desenvolvido pela Secretaria de Educação de Sobral intitulado – Avaliação
Externa da Aprendizagem na maioria das unidades escolares do município. Esse
processo envolve a escola de forma bastante significativa por está relacionado às
metas estabelecidas pelo município que visa redução dos níveis de analfabetismo.
Tal fato parece concentrar todas as ações da escola especificamente nesse objetivo,
tendo como conseqüência certa dificuldade de acesso.
Diante desse cenário, ficou um pouco delicado abordar as escolas, então,
elaboramos um outro critério que está relacionado com os níveis das unidades
escolares. Optamos em selecionar 3 (três) escolas, uma para cada nível, ou seja, A
(acima de 800 alunos), B (400 a 799 alunos) e C (até 399 alunos) para termos uma
representação mais expressiva da educação sobralense.
Um outro marco definidor foi a disponibilidade para participar da pesquisa.
Algumas instituições consultadas alegavam não ter condições para a realização de
uma pesquisa (questões institucionais, a própria avaliação externa da aprendizagem
etc) o que acabou contribuindo para que a seleção transitasse da escolha aleatória à
abordagem intencional.
As escolas que aceitaram participar do estudo receberam nomes fictícios
– Escola do Arco, Escola da Sé e Escola do Beco respectivamente os níveis A, B e
C. A idéia foi homenagear pontos históricos e turísticos da cidade de Sobral,
3 Professor que atua no processo de ensino-aprendizagem junto aos alunos com necessidades educacionais especiais em um espaço diferente da sala regular. É nele e através dele que o Programa Educação Inclusiva: Direito a Diversidade operacionaliza suas ações no âmbito escolar.
22
espaços de inclusão, exclusão social e de formação aos freqüentadores desses
locais. O Arco de Nossa Senhora de Fátima ou Arco do Triunfo foi construído em
1953 e é considerado um dos monumentos que mais caracteriza a cidade de Sobral.
A Igreja da Sé, ou Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, começou a ser
construída em 1746 e representa a padroeira da cidade. Já o Beco do Cotovelo
recebeu esse nome porque possui uma pequena curvatura em seu centro. À
localidade várias pessoas se dirigem para saber as últimas notícias da cidade e
conversar em rodas tomando um cafezinho. É também o ponto de encontro de
aposentados. Fazendo uma comparação sobre o que o Beco do Cotovelo
representa para Sobral, encontramos uma similaridade com o que a Praça do
Ferreira é para Fortaleza.
Definida a amostra, operacionalizamos o estudo em duas etapas: análise
teórico-documental e trabalho de campo. As fontes dos dados foram pessoas e
documentações.
No que se refere à análise teórico-documental ela foi subdividida
sistematicamente em dois momentos: o primeiro constituído de documentos oficiais
nacional e estadual que possibilitaram a construção do que, de fato, caracteriza o
processo histórico-político em Educação Especial no Brasil e no Ceará. Constam no
quadro 1 abaixo os documentos constituintes desse primeiro momento:
Quadro 1 – Documentos nacionais e internacionais de educação especial
Tipo Documentação
Leis Constituição Federal (1988)
Leis Lei nº. 8069/90 - Estatuto da Criança e do Adolescente
Leis Lei nº. 10.098/94 – Acessibilidade
Leis Lei nº. 9394/96 – LDB
Leis Lei nº. 9424/96 – FUNDEF
Leis Lei nº. 10.172/2001 – Plano Nacional de Educação
Leis Lei nº. 10.436/02 – Libras
Resolução (Ceará) Resolução nº. 361/2000 – Educação Infantil
Resolução Resolução nº. 02/2001 – Diretrizes Nacionais para a Educação Especial
Documento Estadual Política Estadual de Educação Especial – Integração com Responsabilidade (1997)
Documento Internacional Declaração de Salamanca (1994) Documento Internacional Convenção da Guatemala (1999)
Fonte: Sítio do Ministério da Educação (www.mec.gov.br) e Secretaria de Educação do Estado do Ceará
23
Considerando que os documentos oficiais explicitam as intenções e os
elementos que constituem as políticas públicas, acreditamos que a realização da
pesquisa de campo trouxe subsídios para a identificação das repercussões destes
no contexto educativo. Aliados a aproximação empírica têm-se outras fontes
orientadoras e organizadoras da Educação Inclusiva no Município de Sobral. Tais
fontes (relatórios, projetos e planos) revelam um detalhamento da trajetória e das
ações desenvolvidas na esfera municipal e no contexto das escolas. Esses
documentos contemplam o segundo momento da análise teórico-documental. O
quadro 2, a seguir, lista a documentação pesquisada:
Quadro 2 – Documentos da educação do município de Sobral
Tipo Documentação
Lei Lei Orgânica Municipal (05/04/1990)
Projeto SOBRAL. Secretaria de Educação. Setor de Planos, Projeto e/ou Programas. Projeto de Apoio aos Alunos Portadores de Necessidades Educativas Especiais e Dificuldades de Aprendizagem. Digitado, Sobral. 2003.
Relatório SOBRAL. Secretaria de Educação. Setor de Planos, Projeto e/ou Programas. Avaliação de Desempenho dos Professores de Apoio Pedagógico. Digitado, Sobral. 2003.
Relatório SOBRAL. Secretaria de Educação. Setor de Planos, Projeto e/ou Programas. Relatório da Formação Continuada dos Professores de Apoio Pedagógico Específico. Digitado, Sobral. 2006.
Planilha de coleta de
dados
SOBRAL. Secretaria de Educação. Setor de Planos, Projeto e/ou Programas. Consolidação de Identificação da Demanda de Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais (Planilha). Digitado, Sobral. 2004.
Planilha de coleta de
dados
SOBRAL. Secretaria de Educação. Setor de Planos, Projeto e/ou Programas. Consolidação de Identificação da Demanda de Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais (Planilha). Digitado, Sobral. 2005.
Planilha de coleta de
dados
SOBRAL. Secretaria de Educação. Setor de Planos, Projeto e/ou Programas. Consolidação de Identificação da Demanda de Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais (Planilha). Digitado, Sobral. 2006.
Plano de Metas Projeto Boa Escola – Plano Anual de Trabalho
Plano Projeto Político Pedagógico da Escola do Beco
Plano Plano de Desenvolvimento da Escola do Beco
Plano Proposta Pedagógica da Escola do Beco
Plano Projeto Político Pedagógico da Escola da Sé
Plano Plano de Desenvolvimento da Escola da Sé
Plano Proposta Pedagógica da Escola do Arco
Roteiro Roteiro da Reunião de Planejamento da Escola do Arco
Fonte: Secretaria de Educação do Município de Sobral e Escolas pesquisadas
24
Diante da reflexão e análise dos documentos o próximo passo foi o
contato com o espaço empírico. Nas escolas as primeiras aproximações ocorreram
através de visitas periódicas. Algumas no período da manhã e outras à tarde, pois
nos dois turnos tinham salas de aula regular com alunos com necessidades
educacionais especiais. Elegemos como eixo norteador desse olhar investigativo as
vertentes do programa: o município, a escola e a família. Tendo a escola como foco
da análise.
Como estratégias da coleta de dados, utilizamos a observação e o
questionário. As observações (nas salas de aula regular, na sala de apoio
pedagógico e no planejamento) propiciaram interações que auxiliaram na construção
de respostas aos objetivos da pesquisa. As observações foram registradas em
diários de campo e não seguiram um roteiro prévio, mas em alguns momentos foram
guiadas pela dinâmica das escolas.
No caso dos questionários, interessou-nos particularmente os atores que
trabalham com essa proposta de inclusão nas instituições, no caso, gestores (diretor,
vice-diretor, coordenadores pedagógicos), professores de sala de aula regular e o
professor de apoio pedagógico específico, atualmente chamado de professor do
projeto de atendimento educacional especializado. A aplicação de certo número de
questionários foi personalizada devido a interesse manifestado por alguns dos
profissionais. Para melhor explicitar o número de possíveis participantes da pesquisa
e o público efetivo do estudo, apresentamos uma descrição detalhada das escolas
na tabela a seguir:
Tabela 1 – Escolas e atores da pesquisa
Escola do Arco
Escola da Sé Escola do Beco
Total Total de participantes da pesquisa
Diretor 1 1 1 3 2 Vice-Diretor 1 0 0 1 0
Coordenador Pedagógico
3 2 0 5 2
Professor 26 11 9 46 16 Professor de
apoio pedagógico específico
1 1 1 3 3
Fonte: Escolas participantes da Pesquisa
25
Participaram os diretores da Escola da Sé e da Escola do Beco. No caso
dos coordenadores pedagógicos, contribuíram com a pesquisa apenas os da
Escola da Sé. Vale ressaltar que a Escola do Beco estava sem coordenador
pedagógico, pois o diretor da mesma estava assumindo as duas funções. Tal fato
se deve a saída do diretor anterior para conduzir uma outra escola e a espera pelo
processo de seleção de diretores e coordenadores que estava sendo realizado
pela Secretaria de Educação de Sobral. No que se refere aos professores,
pudemos contar com um número significativo de participantes nas Escolas da Sé e
do Beco, mas a Escola do Arco não nos retornou uma quantidade expressiva de
questionários. É necessário registrar que na Escola do Arco 6 (seis) professores
não aceitaram responder ao instrumental alegando não ter qualquer conhecimento
ou aproximação com a temática. Além disso, registramos que a mesma devolveu
apenas 5 (cinco) questionários. Decidimos mantê-la no estudo dando prioridade as
observações realizadas.
No procedimento de análise, inicialmente realizamos uma leitura flutuante
dos dados para estabelecer o contato inicial com o material coletado. Foram
necessárias muitas idas e vindas para entrecruzar o que estava escrito nos
questionários e os registros dos diários de campo. Diante desse processo,
organizamos o nosso olhar para fatores que circundam a realidade educacional das
pessoas com NEE em suas condições de acesso e a busca de qualidade da vida
escolar. Sendo assim emergiram quatro categorias de análise: a) Educação
Especial; b) Inclusão; c) Políticas Públicas Educacionais; d) Escola.
O construto dessa reflexão emergente do confronto entre ideal e o
real estão dispostos nos seguintes capítulos: O capítulo 1 remete-se a
contextualização da caminhada da Educação Especial no Brasil e no Ceará
procurando compreender em que bases se constituíram na relação com as
pessoas com necessidades educacionais especiais. Entendemos que todo
percurso é fruto de um contexto histórico e uma política pública só é constituída
diante de uma necessidade latente.
No capítulo 2 adentramos nos aspectos específicos referente à
Sobral, inicialmente entendemos um pouco sobre as políticas públicas para
educação especial. No palco de nossa pesquisa conheceremos a trajetória da
educação sobralense para compreender as ações e estratégias implementadas
para atender a política de inclusão. Munidos de uma reflexão teórica acerca da
26
temática elaboramos o capítulo 3, pois se refere ao momento da tessitura teoria
e empiria. É nele que encontramos o confronto entre as questões iniciais e as
respostas encontradas. É a inserção das impressões manifestadas pelos
sujeitos aos dados brutos tendo como eixo orientador os objetivos da pesquisa.
Finalizamos reconstituindo os caminhos trilhados, as dificuldades enfrentadas,
as contribuições conquistadas celebrando assim, a construção de novas pistas
de investigação.
27
CAPÍTULO 1 – HISTÓRIA E POLÍTICA DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NO BRASIL E NO CEARÁ: DA EXCLUSÃO SOCIAL AOS MOVIMENTOS INCLUSIVOS
[...] todo indivíduo é não somente a síntese das relações existentes, mas também da história das relações, isto é, o resumo de todo o passado.
(Gramsci)
Quando se pensa o papel da educação atrelado aos aspectos políticos e
sociológicos é necessário um primeiro diálogo sobre a dinâmica que compõe a
educação como prática social. Portanto, as políticas educativas que estão sendo
postas em ação são resultados de movimentos sociais e políticos que redefinem a
estrutura das relações humanas. As questões sociais devem ser contextualizadas,
pois permitem visualizar como as sociedades se organizam e os reflexos de suas
mudanças ao longo da história.
A investigação sobre as políticas destinadas à educação tem esse viés,
principalmente e especificamente à educação especial. A leitura historiográfica da
educação é fundamental para a percepção de elementos, dados, fatos e mudanças
implementados ao longo da construção da realidade educacional.
Portanto, a análise proposta nesse capítulo envolve dois momentos: o
contexto histórico – político brasileiro e cearense (que descreve os principais
aspectos políticos, sociais e educacionais) e o papel das políticas públicas
educacionais no contexto das pessoas com necessidades educacionais especiais.
1.1 Educação Especial no Brasil: Antecedentes Políticos e Evidências
Históricas
A reflexão acerca dos acontecimentos históricos relacionados à vida de
pessoas especiais é algo complexo e fascinante, pela latente dificuldade de lidar
com o diferente (o desconhecido). As primeiras experiências, no campo da
Educação Especial, mostram que as pessoas com necessidades educativas
especiais viviam à margem dos grupos sociais. Segundo Bueno,
28
A educação especial no Brasil tem como marcos fundamentais à criação do Imperial Instituto de Meninos Cegos (hoje, Benjamim Constant) e do Instituto de Surdos-Mudos (hoje, Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES), na cidade do Rio de Janeiro, por iniciativa do Governo Imperial. (1993, p. 85).
Mazzotta (1996, p. 27), em sua análise sobre esse campo, distingue dois
períodos: de 1854 a 1956 (iniciativas oficiais e particulares) e de 1957 a 1993
(iniciativas oficiais de âmbito nacional). Na análise proposta faz-se necessário
acrescer um terceiro período (1990-2006), concomitantemente ao segundo em que é
constituída a Política de Inclusão.
O início da caminhada, no século XIX, é permeado, mesmo com as
adversidades, pelas primeiras iniciativas voltadas para o atendimento a cegos e
surdos como: a criação do Imperial Instituto de Meninos Cegos pela influência do
cego José Álvares de Azevedo que estudou em Paris (Decreto Imperial n. 1.428,
datado de 12 de setembro de 1854); surgimento do Instituto de Surdos-Mudos, em
26 de setembro de 1857, criado com o auxílio do Professor Eduard Huet
recomendado ao Governo Imperial pelo Ministro da Instrução Pública da França
(LEMOS citado por BUENO, 1993). É necessário acrescentar que
[...] o modelo econômico agrário-exportador que marcava o Brasil no século XIX, não impunha o atendimento escolar como exigência social. Apenas com a maior urbanização e industrialização no século XX é que essa necessidade se fez presente. (LANCILLOTTI, 2003, p. 80).
No século XX, datam da década de 1920 as primeiras medidas
voltadas para os portadores de deficiência física e mental, como, por exemplo, a
Reforma Francisco Campos/Mário Casassanta, instituída pelo Decreto-lei No
7.870 A, de 15 de outubro de 1927 (Ensino Primário), que prescreve a
obrigatoriedade de freqüência à escola para crianças de 7 a 14 anos, podendo
ser ampliada até 16 anos para os que não concluíssem o primário aos 14 anos. O
decreto, porém, isenta as crianças, comprovadamente sem condições de estudo
(FONTES, 2003). Na verdade, não havia ainda preocupação com os deficientes
no âmbito nacional, o que é comprovado quando na IV Conferência da
Associação Brasileira de Educação4, houve a uniformização da terminologia para
os diversos ramos de ensino. A padronização colocou os portadores de
4 A Associação Brasileira de Educação (ABE) foi fundada em 1924.
29
deficiência em “escala de anormalidade”, ou seja, a separação era feita com base
nas “incapacidades” ou limitações. O ensino denominado “emendativo”
organizou-se baseado na divisão do atendimento aos “anormais do físico (débeis,
cegos e surdos-mudos)”; “anormais de conduta”, isto é, menores “delinqüentes,
perversos, viciados” e “anormais de inteligência”, não conceituados. Apenas
aconselhavam escolas separadas para “débeis mentais ligeiros” e outras “para
débeis mentais profundos.” (JANNUZZI citado por FONTES, 2003).
Na educação especial, a concomitância dos setores público e privado
está presente desde o início do século XX, propiciando a presença de uma tênue
linha entre os limites e os papéis desses serviços de atendimento, resultante entre
outros fatores, da dinâmica na luta de interesses dos segmentos sociais.
Com o crescimento das cidades (que ocorre principalmente na década de 30), devido à configuração que vai tomando o País em sua organização urbana (ocasionada pelo movimento de industrialização), vemos também o crescimento da preocupação com a escolaridade da população. (KASSAR, 1999, p. 26).
Os anos 1930 e 1940 são marcados por um momento relevante da
história: o Manifesto dos Pioneiros da Educação (1932), encabeçado por Fernando
de Azevedo, que representou a tomada de consciência de que a educação deve ser
obrigatória, pública e gratuita e dever do Estado (ARANHA, 1996). Outro fato que
registra tal preocupação é o texto da Constituição Brasileira de 1934, o qual repassa
para a União a competência de formular diretrizes para a educação nacional
reiterada no conteúdo da Constituição de 1937.
Em contrapartida, a luta se reflete na caminhada da Educação Especial.
Há um número significativo de instituições de caráter privado. Muitas instituições da
mesma época estavam ligadas à outra forma de organização, a ordens religiosas,
em que predominava o caráter filantrópico-assistencial com foco nos deficientes
mentais e visuais. O modelo de educação era voltado para a caridade pública. A
filantropia teve o papel de trazer à tona reflexões, no sentido de reconhecer a
igualdade dos direitos humanos.
Quanto ao segundo período, Mazzotta (1996) trata inicialmente das
Campanhas para os portadores de deficiência, até aproximadamente a formulação
da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, assim elencadas:
30
a) Campanha para a Educação do Surdo Brasileiro – CESB (Decreto
Federal No 42.728, de 3 de dezembro de 1957);
b) Campanha Nacional de Educação de Cegos – CNEC (Decreto No
48.252, de 31 de maio de 1960);
c) Campanha Nacional de Reabilitação de Deficientes Mentais –
CADEME (Decreto No 48.961, de 22 de setembro de 1960).
Essas iniciativas e movimentações de entidades públicas e filantrópicas,
como APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) e Pestallozi, foram
essenciais para a inclusão de um capítulo sobre educação de excepcionais na Lei No
4024/615 que dispõe:
Título X – Da Educação dos Excepcionais:
Art. 88o - A educação de excepcionais deve, no que for possível, enquadrar-se no sistema geral de educação, a fim de integrá-lo na comunidade. Art. 89o - Toda iniciativa privada considerada eficiente pelos conselhos estaduais de educação e relativa à educação de excepcionais receberá dos poderes públicos tratamento especial mediante bolsas de estudo, empréstimos e subvenções.
Mesmo com a abertura, a obrigatoriedade escolar para as pessoas
especiais não era universal segundo o art. 30 da LDB de 1961, que em seu
parágrafo único indica que: “Constituem casos de isenção, além de outros
previstos por lei: a) comprovado estado de pobreza do pai ou responsável; b)
insuficiência de escolas; c) matrícula encerrada; d) doença ou anomalia grave
da criança.” (grifos nossos).
Na LDB de 1961, o liberalismo pode ser identificado, dentre outros elementos, nos objetivos da educação que se inspira ‘nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana' e na própria caracterização da distribuição dos serviços de educação especial entre os setores público e privado. (KASSAR, 1998).
O acesso da população economicamente menos favorecida às redes
públicas de ensino no Brasil se afirma numa estrutura econômica, social e política,
nas décadas de 1960 e 1970, em que se ressalta o liberalismo e a difusão da ordem
5 A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei 4.024, de 20 de dezembro de 1961, “teve uma gestação lassa e penosa [...], ou seja, entre encaminhamento, as discussões e aprovação do texto passaram-se trezes anos.” (CARNEIRO, 1998: 24-25).
31
capitalista. Diante desse fato, há o explícito conflito da escola pública versus escola
privada. A Educação Especial é marcada nesse período pela retomada e ampliação
da rede privada. A ascensão ocorreu devido a sua organização, em nível nacional e
a relação ambígua estabelecida na organização social brasileira (BUENO, 1993). O
País que se constituía sob reformas da democracia populista passa a se preocupar
com as atitudes políticas do regime militar, como bem destaca Aranha (1996, p.
211): “Durante 20 anos, os brasileiros viveram o medo gerado pelo governo do
arbítrio e pela ausência do estado de direito”.
Além dos acontecimentos retratados, a idéia de descentralização na
educação brasileira acirra os interesses do setor privado. Sob esse mesmo enfoque
ocorrem discussões sobre a nossa “segunda” Lei de Diretrizes e Bases, a Lei No
5.692/71, denominada Lei da Reforma do Ensino de 1o e 2o graus, que traz algumas
disposições sobre as ações para a Educação Especial, segundo Fontes (2003):
Nas diretrizes há um posicionamento que atribui um sentido clínico e/ou terapêutico à educação especial, na medida em que o atendimento educacional assume o caráter preventivo/corretivo. Conforme a Portaria Interministerial No 186/78, não há uma exigência de professor especializado para classes especiais, mas uma recomendação para que, ‘sempre que possível’, se empregassem esses profissionais (grifos nossos).
A lei institucionaliza a educação especial a partir das classes especiais
em escolas regulares realçando, assim, os conceitos do “modelo clínico.” Em 1971,
foi constituído, pelo MEC, um grupo tarefa, através da Portaria No 86, de 17 de junho
de 1971, com a finalidade de realizar uma exaustiva avaliação da Educação
Especial no país. Em 1972, o grupo elaborou o Projeto Prioritário No 35, incluído no
Plano Setorial de Educação e Cultura 1972/1974. No mesmo ano de elaboração do
Plano, o Parecer No 848 do Conselho Federal de Educação aprovado em 10 de
agosto, definiu a natureza do tratamento especial e enfatizou a necessidade de
instalação de serviços especializados junto aos sistemas de ensino.
Em 1973, o então Presidente Médici, criou pelo Decreto No 72.425, o
Centro Nacional de Educação Especial (CENESP) institucionalizando a educação
especial em termos de planejamento de políticas públicas. Diante de tal
realidade, o acesso à escola começava a ser pensado, de forma lenta e com uma
forte tendência a privatização. Tratava-se da coexistência da relação público –
privado, segundo Kassar:
32
[...] transcende a escolaridade propriamente dita quando são estabelecidos critérios para a elaboração do diagnóstico em 1977, por meio da Portaria Interministerial No 477 dos Ministérios da Educação e Cultura e da Previdência Social. Nesse momento abre-se também o espaço para os serviços privados, na ausência de serviços especializados da LBA/MPAS. (1999, p. 31).
No início da década de 1980, o regime militar dava sinais de
enfraquecimento, com lento processo de democratização. [...] Exilados políticos são
anistiados e começam a retornar ao Brasil constituindo assim uma tentativa de
reconstrução do governo democrático. No que se refere ao ensino especial,
conforme Will, citado por Laurent (1997, p. 67-68):
[...] o movimento se intensifica, uma vez que a classe regular é reconhecida como melhor ambiente pedagógico para o aluno com necessidades especiais, considerando-se cada vez mais, que este deva receber ajuda pedagógica e que ele necessita diretamente de sua classe.”
Os debates avivam a necessidade de preparar o ambiente pedagógico
em que os alunos vão ser recebidos para participar do cotidiano escolar. Período em
que ganha força as discussões sobre a filosofia de normalização6 e sob o princípio
da integração que tinha como premissa garantir o acesso das pessoas deficientes a
todos os espaços da sociedade.
Sendo assim, “os alunos passam a receber ajuda pedagógica.” (Idem, p.
35), o que sinaliza avanço nos conceitos de prática educativa. Ademais, no campo
histórico-político, os anos 1980 são marcados pelo processo de redemocratização do
País e pela indefinição das ações do governo federal. De acordo com Vieira (2000):
A política educacional autoritária, concebida em tempos áureos de ditadura, não mais se sustenta. A política educacional que vai responder aos desafios de uma sociedade democrática, contudo, ainda não tomou forma. Vive-se um tempo de busca, de ensaios e de grande efervescência na organização da sociedade. O velho já não atende as demandas que vão surgindo, o novo, entretanto, ainda não nasceu. De outra parte, essa transição, pressionada pela conjuntura internacional e nacional, contraditoriamente, vem marcada pelo questionamento do Estado como grande agente que assegura os direitos sociais, expressos nos serviços públicos, inclusive no oferecimento da educação pública. (grifos nossos) (p. 20-21).
Em 1985, a expressão “Nova República” foi cunhada pelo presidente
Tancredo Neves, com o intuito de caracterizar novo momento político e democrático, 6 “A matriz da normalidade é produto de uma estatística, na qual a maioria dos indivíduos apresenta
comportamentos regulares e semelhantes.” (TOMASINI,1998, p. 113).
33
que o Brasil passa a vivenciar com o fim da ditadura. Tancredo falece antes de
assumir o cargo, o que faz, em seu lugar, José Sarney, com a tarefa de concretizar a
democracia no País. O início da “Nova República” foi caracterizado por períodos de
hiperinflação e sucessivas tentativas de estabilização. O País se vê diante de quatro
planos econômicos que não conseguiram atingir o objetivo de estabilizar a estrutura
macroeconômica, que só viria com o Plano Real, em 1994, no governo Itamar
Franco (ALBUQUERQUE; VIEIRA, 2001).
Mesmo diante dessa realidade econômica, em 1986, pelo Decreto n°.
93.481, de 29 de outubro, o Presidente Sarney instituiu, no Gabinete Civil da
Presidência da República, a Coordenadoria para Integração da Pessoa Portadora
de Deficiência (CORDE), órgão com autonomia administrativa e financeira, com
destinação de recursos orçamentários específicos. Em 21 de dezembro de 1986,
o CENESP foi substituído pela Secretaria de Educação Especial (SESPE) por
meio do Decreto No 93.613, passando a integrar a estrutura básica do Ministério
da Educação e Cultura, como órgão central de direção superior, em Brasília
(FONTES, 2003).
Outro marco significativo do período foram às discussões no decorrer dos
trabalhos da Constituinte 1987/88. A Constituição teve como marca o processo de
descentralização das competências e responsabilidades sociais.
Nesse contexto, segundo o Art. 205, “A educação, direito de todos e
dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” Uma crítica reincidente
aos programas de “treinamento” que visavam o desenvolvimento de indivíduos
com deficiência para o trabalho voltava-se para a visão de que eles estavam
limitados a determinadas atividades laborativas como: artesanato, produção de
doces, entre outras.
Em 1989, realiza-se a Convenção das Nações Unidas sobre os direitos da
Criança que significa um avanço de perspectiva para a educação de crianças e
adolescentes com necessidades educacionais especiais. Seu reflexo no Brasil
ocorreu com a elaboração da Lei No 8069 (ECA), de 13 de julho de 1990, que dispõe
sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, que em seu Capítulo IV descreve:
34
Do Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer: Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando o pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho assegurando-lhes: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.
A década de 1980 é também condensada de um processo de
redemocratização marcado pela grande movimentação popular. Os movimentos na
educação nacional denotam o avanço de um movimento em prol da inserção dos
alunos especiais nas escolas comuns. Portanto, algumas questões de ordem política
e da gestão da educação nacional ficam evidentes.
“Nos anos 80, culminando com o período da constituinte, as políticas
tinham como eixo principal a democratização da escola mediante a universalização
do acesso e a gestão democrática, centrada na formação do cidadão.” [...] “A
educação é considerada, na Constituição Federal (CF), um direito social (Art. 6º).”
(PERONI, 2003, p. 73-76).
É nesse período também que se formalizam questões de
redimensionamento da gestão (democrática) aliado ao processo de municipalização
do ensino. A Constituição de 1988
[...] possibilitou aos Municípios criarem seus próprios sistemas de ensino atribuindo aos mesmos a autonomia relativa na formulação de políticas educacionais, em específico para a Educação Infantil e o Ensino Fundamental. (SOUZA; FARIA, 2004, p. 930).
Portanto, se o município passa a atuar em espaços além da área
administrativa, nos anos 1990, ocorre também uma mudança no eixo de
discussão das ações em educação, as escolas passam a enfatizar a qualidade, o
que até então não nos parece divergente do objetivo de uma instituição de
ensino. O fato é que aliado ao discurso da qualidade encontram-se os conceitos
de eficiência, eficácia, descentralização das responsabilidades e terceirização
dos serviços. Elementos característicos do sistema capitalista e das reformas
políticas que aconteceram na década de 1990, acabando por gerar a
transformação do contexto educacional.
35
1.2 Políticas Públicas no Contexto Político Brasileiro (1990 – 2002):
Caminhos e Descaminhos da Educação Especial
As mudanças e reformas educacionais no Brasil ocorrem principalmente a
partir dos anos 1990, conjugadas à abertura para o capital estrangeiro e privatização
das empresas nacionais e estatais. A conjuntura internacional constituiu marco de
definição e elaboração da agenda educacional dos países da América Latina e
Caribe, a qual esteve atrelada aos ajustes estruturais de redefinição do papel do
Estado, na perspectiva neoliberal. De acordo com Oliveira (citado por LANCILLOTTI,
2003), o movimento neoliberal teve suas raízes no plano internacional, e no Brasil foi
incisivamente implementado no Governo Collor e mantido no Governo Cardoso.
Lancillotti acrescenta:
O neoliberalismo prevê, dentre outras coisas, o enxugamento do Estado, com a restrição de políticas sociais, a privatização de empresas públicas, a desregulamentação de mercado e a abertura para a economia globalizada. No núcleo do pensamento neoliberal está a valorização da ‘qualidade total’, com a importação das idéias de mercado para o campo da educação. Nesses moldes, a qualidade da educação é aferida por resultados quantitativos. Boa escola é a que produz mais resultados. (2003, p. 76).
De acordo com a evolução da agenda pública brasileira definimos o
período de Collor e FHC da seguinte forma (MELO,1999, p. 13):
Quadro 3 – Agenda Pública (Collor e FHC)
Princípio Organizador das Políticas
Públicas
Efeito Esperado das políticas públicas
Collor Cesarismo Reformista; Reformas com o
imperativo da governabilidade.
Reestruturação ad hoc e pouco
consistente das políticas: focalização,
seletividade e redefinição do mix público
- privado das políticas.
FHC Instituir a Boa Governança; ação pública
como fixação de regras do estáveis e
universalistas; primado pela pobreza
absoluta sobre a desigualdade no debate
público.
Focalização, seletividade e redefinição
do mix público - privado das políticas;
políticas compensatórias dos custos
sociais da estabilização.
Fonte: Recorte do Quadro 1. Evolução da Agenda Pública Brasileira (MELO, 1999, p. 13)
36
Em 1990, Fernando Collor de Melo, primeiro presidente eleito pelo voto
popular, assume o compromisso de “abater o tigre da inflação com apenas uma
bala.” A empreitada é constituída de medidas provisórias do Plano Collor. Sobre a
economia tem-se o emblemático episódio do confisco da poupança nacional. Nesse
mesmo período, o País passa por uma série de mudanças políticas, econômicas e
de reestruturações significativas na educação nacional.
Em 15 de março de 1990, com a reestruturação do Ministério da
Educação, a SESPE (Secretaria de Educação Especial) foi extinta e suas atribuições
passaram a ser da Secretaria Nacional de Educação Básica (SENEB). Além dessa
reforma e das ineficazes medidas econômicas, o governo foi marcado por denúncias
de corrupção que desencadearam o processo de afastamento do chefe da nação.
No final de 1992, após o impeachment do Presidente Collor, assume
Itamar Franco. Procedeu-se, a partir de então, à nova reorganização ministerial, com
recriação da Secretaria de Educação Especial (SEESP), como órgão específico do
Ministério da Educação. Na esfera econômica, o Ministro Fernando Henrique
Cardoso elabora o Plano Real, que se propõe a estabilizar a “montanha russa”
instaurada até o momento no País.
Ainda no período de Itamar, em 19947, no contexto internacional,
aconteceu a Conferência Mundial de Educação Especial na Espanha, que ao
demarcar o compromisso de Educação para Todos, elaborou a Declaração de
Salamanca, com ressignificações de atendimento aos alunos com necessidades
educacionais especiais. A Conferência prevê para o Brasil uma ampla discussão e
mudanças no contexto educacional. Uma delas foi à criação do documento Política
Nacional de Educação Especial (1994).
A escola regular, palco de inovações e iniciativas educacionais recebe
importante tarefa diante das pessoas com necessidades educacionais especiais, a
de elaborar caminhos para a concreta inserção desse alunado na vida escolar. Nos
dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso – FHC (1995-2002), mesmo com a
redefinição estatal, alguns passos foram dados nesse sentido:
a) A aprovação da LDB No 9394/96, que redireciona, em diversos
aspectos, a educação nacional;
7 Em 1994, também foi criada a Lei No 10.098/94 – Lei de Acessibilidade.
37
b) A Emenda Constitucional No 14/96, que define as responsabilidades
de Distrito Federal, Estado, Município, assim como dispõe a
constituição de um Fundo para manutenção e desenvolvimento do
ensino fundamental;
c) A Lei No 9424/96, que regulamenta o Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério
(FUNDEF);
d) O Plano Nacional de Educação – PNE (Lei No 10.172/2001);
e) Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica
(Resolução No 02/2001);
f) Lei No 10.098/2000 – dispõe sobre Acessibilidade aos Sistemas de
Comunicação e Sinalização;
g) Lei No 10.436/2002 – regulamenta a Libras como uma língua oficial.
De acordo com o governo federal, a partir de 1995, principalmente com a
elaboração do seu planejamento político estratégico (1995-1998), foi dado um
enfoque expressivo à instituição escolar. Segundo Kassar, (citado por CORREA)
para entendermos a educação especial como uma política pública é de fundamental importância que sejam analisados os aspectos da sua história no contexto do movimento da sociedade, especialmente, as determinações estabelecidas com a Reforma do Estado, implantada no Brasil a partir de 1995... (2004, p. 4)
A Reforma (1995-1998) é embasada no redimensionamento do papel do
Estado tendo como abordagem administrativa a gestão da qualidade total – a
chamada Reforma Gerencial – que propôs a redução do seu tamanho,
principalmente no sentido do orçamento repassando para os segmentos sociais a
responsabilidade de prover as suas necessidades. Consubstanciando essa lógica,
concluímos que há o enxugamento da máquina estatal e a privatização de bens e
serviços – o chamado Estado Mínimo.
Destarte, “a escola sintetiza o nível gerencial-operacional do sistema. [...]
É na escola que estão os problemas e é na escola que está a solução.” (BRASIL,
1995, p. 4), portanto a escola tem o papel de potencializar o conhecimento para
formação de cidadãos e a reversão dos problemas por ela enfrentados – ao que
devemos chamar de autonomia escolar. Há também um espaço conquistado pelas
38
ações do terceiro setor, através da ação das Organizações Não-Governamentais –
ONGs, da terceirização dos serviços ...
Na legislação educacional, a ‘nova LDB’, que teve seus embates iniciados
com base nos princípios estabelecidos na Constituição de 1988, delibera a
organização da educação nacional definindo objetivos, currículos e ‘padrões’ de
ensino esperados. Cabe destacar que a educação, segundo a LDB, é também tarefa
da família (pais ou responsáveis), ficando sob sua responsabilidade matricular seus
filhos e acompanhá-los no processo de educativo. Dentre as ações mais
significativas na universalização do acesso ao ensino, principalmente para o Ensino
Fundamental tem-se a aprovação da Lei No 9424/96 que regulamenta o FUNDEF; a
“injeção financeira” na educação, em específico o Ensino Fundamental com base na
relação custo-aluno; e o fundo com vigência de 10 (dez) anos também atuaria nas
políticas de formação e valorização do magistério.
No entanto, mesmo priorizando o acesso a esse nível de ensino, havia na
Lei No 9424/96 apenas uma referência à modalidade de ensino – Educação Especial
– “estabelecimentos de ensino especial”, que compunha os critérios para o cálculo
custo-aluno. Tal fato evidenciava uma perspectiva de escola especial e não de
escola inclusiva. Mesmo assim,
[...] analisando-se a evolução de matrículas por dependência administrativa nos 1996 a 2003 (em nível nacional) observa-se uma tendência à municipalização, indicada pelo incremento percentual de 389% na rede municipal, contra 185% na rede particular, 44% na rede estadual e de um decréscimo de 13,8% na rede federal. (Mendes, 2006, p. 398).
Em se tratando de sistema de avaliação educacional, nos mandatos de
FHC, um dos pontos de embate entre as ações do governo e a real condição das
escolas diz respeito às avaliações nacionais (SAEB – Sistema de Avaliação da
Educação Básica, Provão etc). Pautadas também pela LDB revelam que no País há
uma educação de duas faces: com amplo acesso, mas sem apresentar grandes
avanços na qualidade de ensino, veja a tabela:
39
Série Disciplinas 1995 1997 1999 2001
Português 188.3 186.5 170.7 165.1
Matemática 190.6 190.8 181.0 176.3
Português 256.1 250.0 232.9 235.2
Matemática 253.2 250.0 246.4 243.4
Português 290.0 283.9 266.6 262.3
Matemática 281.9 288.7 280.3 276.7
(b) Não inclui rurais, inclui federais em 1995.
Tabela 2 - Brasil - Proficiências do SAEB 1995 - 2001
Notas: (a) Inclui escolas federais e rurais. As federais no ano de 1995, As rurais em todos os anos, porém em 1997 não inclui as da Região Norte e em 1999 e 2001 apenas as dos Estados do Nordeste, Minas Gerais e Mato Grosso
4ª Ensino Fundamental
(a) 8ª Ensino
Fundamental (b)
3ª Ensino
Médio (b)
Fonte: Elaboração com base nos dados do Saeb – Inep/MEC (Tabela – adaptada)
A proficiência que é o resultado aferido nos exames do SAEB baseia-se
em médias matemáticas complexas, mas se nos guiarmos nessa tabela apenas
pelos números percebemos um declínio no rendimento das disciplinas de
matemática e língua portuguesa. Tal fato confirma a contradição entre as estatísticas
de acesso à escola e as de qualidade de ensino. Mesmo imersa em contradições, a
luta pela inclusão social na escola procura se constituir através de uma tentativa de
romper com paradigmas baseados na deficiência considerada como ausência total
ou parcial de qualquer habilidade. Segundo o Programa Toda Criança na Escola,
[...] a não-garantia de acesso à escola na idade própria, seja por incúria do Poder Público ou por omissão da família e da sociedade, é a forma mais perversa e irremediável de exclusão social, pois nega o direito elementar de cidadania [...]. (BRASIL, 1997, p. 9).
Em 1998, a ação do governo concentrou-se em pensar alternativas
pedagógicas para trabalhar com a educação especial na perspectiva da
educação inclusiva. O resultado alcançado foi a formulação do documento
“Adaptações Curriculares”, que apresenta estratégias para o processo educativo
de alunos com necessidades especiais e orienta o sistema de ensino para o
processo de construção da “Educação na Diversidade.” Ainda refletindo sobre a
relação da inclusão/exclusão realizou-se em maio de 1999, na Guatemala, a
Convenção Interamericana para Eliminação de Todas as Formas de
40
Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, da qual o Brasil é
signatário. Trata-se de um documento que confere à pessoa com deficiência sua
individualidade, respeitando o “ser deficiente” e criticando os padrões de
normalização existentes nos meios sociais.
Os mandatos de Cardoso finalizam com mais dois documentos que
procuram delinear as diretrizes e metas para Educação Especial: o Plano Nacional
de Educação (Lei No 10.172/2001) e as Diretrizes Nacionais para a Educação
Especial na Educação Básica (Resolução CNE/CEB No 02/2001). A Educação
Especial é reafirmada como modalidade de ensino que perpassa todos os níveis (da
Educação Infantil à Superior):
Figura 1 – Abrangência da educação especial nos níveis de ensino Fonte: Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (2001)
Ambos PNE e Diretrizes reforçam que a educação inclusiva é o caminho
mais adequado para inclusão/integração das pessoas com necessidades
educacionais especiais e para tanto, necessitam de redes apoiadoras vinculadas ao
Poder Público, principalmente as vinculadas à saúde, assistência e promoção social,
inclusive aos programas de renda-mínima e de previdência social. Isto porque
encontramos pessoas com necessidades educativas especiais em todas as faixas
etárias e nas mais diversas situações de trabalho, moradia e saúde.
(2001)
41
1.2.1 Governo Lula – uma Escola do tamanho do Brasil?
Nesse percurso histórico-político adentramos nos tempos mais atuais,
mas especificamente o primeiro mandato do Governo Lula (2003-2006). Luís
Inácio “Lula” da Silva candidata-se pela quarta vez derrotando o então
concorrente ao governo, José Serra. O povo retrata através de seu voto, a
necessidade de um olhar diferente. Como todo plano de governo, uma das áreas
de atuação do Governo Lula é a educação. Uma Escola do tamanho do Brasil8 –
é o programa para a educação que revela um pensamento ousado que tem como
pano de fundo o desenvolvimento social.
São proposições anunciadas, por Lula, em campanha política. De início, o
programa de governo faz o seguinte compromisso no que se refere à educação: “[...]
a expansão do sistema educacional e a elevação de seus níveis de qualidade são as
prioridades no novo modelo de desenvolvimento social a ser implementado pelo
governo PT” (PARTIDO DOS TRABALHADORES, 2003, p. 27).
Em seguida nos pressupostos gerais e diretrizes, afirma: “[...] a
educação básica deve ser gratuita, unitária, laica e efetivar-se na esfera pública
como dever do Estado democrático.” (Idem., p. 29). Sua proposta é romper com o
modelo neoliberal e avançar nas ações em prol da inclusão social do povo
brasileiro. No entanto, a descentralização, como estratégia de afastamento do
Estado, criticada fortemente pelo programa de governo Lula, ainda permanece,
suscitando a constituição de políticas públicas para atender as demandas e as
necessidades da população. Nesse campo também ainda permanecem a atuação
dos organismos internacionais, principalmente o Banco Mundial, BID. No Brasil, o
Banco Mundial, por exemplo, financia projetos na educação e também foi
convidado para fazer parte da Reforma Universitária.
No âmbito da Educação Especial, o programa do governo afirma que
trata essa modalidade como pertencente à educação regular pública propondo um
acompanhamento especializado e ações para prover a acessibilidade desses
alunos. São duas as propostas do programa referente à Educação Especial (Partido
dos Trabalhadores, 2003):
8 Título do Programa para área de Educação do Governo Lula (2003-2006).
42
1. Garantir vagas em estabelecimentos públicos.
2. Garantir a acessibilidade, provendo:
• transporte escolar;
• edificações que permitam o acesso ao cadeirante;
• estímulos e pistas visuais para os deficientes sensoriais, com
comunicação e sinalização adequadas;
• atendimento em sala de aula regular, com acompanhamento de
equipe especializada;
• capacitação continuada dos professores que farão o
acompanhamento desses alunos;
• atendimento em sala de recursos, em horários especiais, quando a
sala regular mostrasse insuficiente;
• equipes técnicas volantes para assessoria aos professores das
salas de recursos;
• atendimento em salas de educação especial, na escola regular,
quando a condição de aprendizado tornar-se inadequada em salas
regulares;
• atendimento em escolas especiais, para os alunos que não se
beneficiem das modalidades anteriores, com equipe de apoio e
professores especializados.
Tais propostas convergem para as ações descritas no Plano Nacional de
Educação – PNE (2001) que com vigência de 10 anos, propõe para a educação
especial 28 metas. De acordo com Pinto (2002, p. 122), algumas são bem
representativas no campo do acesso dos alunos à escola, no setor da infra-estrutura
e no financiamento para a educação especial, quais sejam:
Fonte: Plano Nacional de Educação (Lei No 10.172/2001)
43
Entretanto, mesmo constatando essas aproximações entre o programa de
governo e as diretrizes de PNE, a fonte financiadora não fica explicita. Em 2004,
com o Plano Plurianual – PPA (2004-2007), o planejamento estratégico elaborado
para viabilizar as ações do governo, afirma que vai detalhar estrategicamente os
propósitos descritos no programa Uma Escola do Tamanho do Brasil.
Infelizmente seu texto não apresenta a continuidade esperada. A revisão
modifica 347 programas dos 382 que compõe o PPA, retira 17 e acrescenta 18
novos programas. Dentre as políticas sociais, no caso, a educação, não há
indicativos de apoio financeiro a inclusão educacional. O que há de desdobramento
é a continuação do diálogo com o Banco Mundial para as ações do Fundoescola II e
III. Mesmo com esse detalhe bem peculiar, alguns resultados podem ser aferidos
através do mapeamento das matrículas da Educação Especial, veja no gráfico 1:
Gráfico 1 – Evolução de matrículas na educação especial – 1998 a 2006
Há a ampliação das chamadas ‘matrículas inclusivas’ e um declínio no
atendimento em escolas exclusivamente especializadas e classes especiais.
Temos a impressão de um contexto favorável no sentido da ampliação de
acesso à escolarização dos alunos com necessidades educacionais especiais, mas
é necessário acompanhar, registrar e pesquisar as ações do MEC no intuito de
avaliar as reais possibilidades de inclusão. Sendo assim, apresentamos algumas das
44
iniciativas que podem revelar se há ou não contribuições para esse processo. Eis
algumas delas:
a) Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade (2003) –
responsável de disseminar a política de inclusão junto aos municípios
e seus respectivos segmentos;
b) Projeto Educar na Diversidade (2004) – material de formação docente
pertencente ao Projeto “Educar na Diversidade nos Países do
MERCOSUL”, coordenado pela Secretaria de Educação Especial do
MEC e desenvolvido na Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai;
c) Programa Incluir: igualdade de oportunidade e direito à universidade –
responsável pela promoção da acessibilidade e ações afirmativas para
educação superior (2005).
Dentre as iniciativas citadas escolhemos o Programa Educação Inclusiva:
Direito a Diversidade, considerado ‘multiplicador’ das idéias de inclusão. O intuito é
nos debruçarmos sobre ele para compreender como disseminar a tão propalada
inclusão social. Antes de conversarmos sobre o detalhamento do programa e suas
ações no município-pólo de Sobral faz-se necessário compreender que caminhos
foram trilhados pela educação cearense e assim melhor operacionalizar o
desenvolvimento da pesquisa.
1.3 A Caminhada da Educação Especial no Ceará: Estabelecendo Conexões
entre as Esferas Nacional e Estadual
A história da Educação Especial no Ceará é uma expressão reduzida da
questão em nível nacional. As primeiras experiências no atendimento às pessoas
especiais eram manifestações isoladas e, em geral, de caráter assistencial, o que
caracterizava uma espécie de segregação. Mas o que seria esse caráter
assistencial? Tratamento dado de forma precária que não poderia ser caracterizado
como ação educacional.
A partir dos anos 1930, diante do processo de industrialização e da
reorganização urbana, a sociedade civil começa a organizar-se no intuito de criar
ações para o atendimento das pessoas com deficiência (KASSAR,1999;
45
JANNUZZI, 2004). Tais ações eram materializadas por diferentes tipos de
atendimentos (clínicos, de reabilitação etc) geralmente providos por instituições
particulares (filantrópicas).
No Ceará, essa atuação civil se constituiu a partir de meados da
década de 1940. Segundo Magalhães (2002), a primeira instituição para atender,
combater, tratar e prevenir os problemas oftalmológicos do tracoma (doença
endêmica), no Ceará foi a Sociedade de Assistência aos Cegos – SAC (criada em
1942), instituição privada sem fins lucrativos; no ano seguinte, agregada a essa
iniciativa é criado o Instituto de Educação de Cegos (1943), com o intuito de
educar os deficientes visuais.
Nos anos 1940, a educação cearense abre as portas para o setor privado
em nome da necessidade de prover escola para crianças e jovens. As instituições
particulares passam a receber os alunos que não são absolvidos pelo ensino
gratuito. Na Constituição de 1945, houve mais um incentivo nesse sentido, a isenção
de tributos para os “estabelecimentos particulares de educação gratuita, primária ou
profissional, oficialmente considerados idôneos.” (CE, 1945, Art.128).
Em consonância com a esfera nacional, em 1947, “o texto constitucional
cearense referenda o subsídio estatal ao setor privado.” (VIEIRA, 2002, p. 230). O
que de certa forma vai abrir espaço para um futuro em que instituições privadas
recebem subvenção estatal.9
O conceito de gratuidade permanece, e em março de 1956, funda-se a
Associação Pestalozzi do Ceará para a educação dos portadores de deficiência
mental. Inspirada no trabalho do pedagogo suíço João Henrique Pestalozzi. Uma
experiência, que a exemplo das APAEs (criadas posteriormente) mantém escolas
especiais pelo interior do estado.
Ainda nos anos 1950, a Campanha para a Educação do Surdo Brasileiro
– CESB (Decreto Federal No 42.728, de 3 de dezembro de 1957) influenciou, mesmo
que tardiamente, em 1961 (ano em que a primeira Lei de Diretrizes e Bases
contempla a educação de excepcionais), a fundação, pelo poder público, do
Instituto Cearense de Educação de Surdos (ICES).10
9 É o que acontece atualmente com a atuação das ONGs que fazem o atendimento a pessoas com deficiência. 10 Atualmente é uma escola especial de Fortaleza que abriga o Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas com Surdez (CAS).
46
Seguindo a linha do tempo da educação cearense, após o Golpe Militar
de 1964, fica submetida à égide dos ‘coronéis’, em que a centralização do poder
espelha-se na realidade nacional. Foi também a época em que planejamento
educacional deu o tom na organização do ensino do Estado nacional tendo como
correspondência a mesma prática no âmbito estadual.
Em 1965, mesmo com a ditadura, no governo Virgílio Távora (1963-1967),
foi fundada a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), em Fortaleza,
por iniciativa de um grupo preocupado com o atendimento educacional aos
portadores de deficiência mental. Associação, que ainda hoje, em alguns municípios,
representa o único espaço conquistado pela família para o acompanhamento de
alunos com necessidades educacionais especiais. Vale ressaltar que as associações
descritas até então, são fruto da sensibilização de grupos da sociedade civil frente
aos problemas enfrentados pelas pessoas com deficiência. No entanto, por serem
de caráter privado suscitam uma discussão pautada na relação do “público” e
“privado.” Kassar (1999) salienta que um dos principais pontos de debate acerca da
filantropia reside na gratuidade de seus serviços ou parte deles, o que acaba por
confundir-se com o serviço público. Outrossim, a prática por mais educativa que
pudesse se constituir tinha um viés “clínico” ainda muito demarcado.
Nos anos de 1970, no governo César Cals (1971-1975), apesar da “visão
clínica” ainda marcante na Educação Especial, tem-se um momento relevante na
educação cearense. Em 1972, a Secretaria do Estado do Ceará constituiu um Grupo
Tarefa (orientado pelas ações do CENESP – Centro Nacional de Educação
Especial), com o objetivo de prestar assistência técnico-pedagógica às instituições
de educação especial. Foi o primeiro passo rumo à oficialização da Educação
Especial, no Sistema Educacional do Estado. Processo que foi concretizado
somente em 1976, com a criação da Coordenação de Educação Especial na
Secretaria de Educação do Ceará MAGALHÃES (2002); LEITÃO (1997).
Em meados da referida década, os governos que se sucediam mantinham
como pano de fundo a elaboração de planos para organizar a educação cearense.
Em 1975, com o governo Adauto Bezerra (1975-1979) foi criado I Plano Qüinqüenal
de Desenvolvimento do Ceará que previu para a Educação Especial no Ceará
medidas para qualificação e capacitação de recursos humanos para trabalhar com
as deficiências mental, auditiva e visual.
47
Ainda na década de 1970, houve a criação das classes especiais de
atendimento, nas escolas públicas estaduais. Isso só se tornou possível, devido ao
Centro Nacional de Educação Especial (Cenesp) fomentar as condições financeiras
para a abertura das mesmas através do 1o Curso de Formação de Professores de
Estudos Adicionais na área da deficiência mental. As classes especiais tornam-se
marco da educação pública cearense, por tentar inserir uma parcela significativa de
alunos com necessidades educacionais especiais. Entretanto, mesmo com a
abertura das escolas regulares à integração desses alunos, muitas tentativas foram
frustradas. Magalhães (2002); Leitão (1997).
De fato, as classes especiais partem do princípio de separação entre o
“normal” e o “anormal.” Não causaria estranhamento se a comunidade escolar e
famílias, ainda sem compreender o que estava acontecendo, muitas vezes,
rejeitassem a idéia de ver seus filhos compartilhando espaços com uma pessoa
portadora de deficiência (PPD). O resultado foi que as classes especiais não
conseguiram atingir nem os objetivos estabelecidos à época – iniciar um processo
de convivência no ambiente escolar entre alunos ditos ‘normais’ e alunos
deficientes mentais reproduzindo, assim, o sentimento de segregação e um
impulso ao isolamento.
Ingressamos na década de 1980 ainda utilizando as classes especiais e o
ensino itinerante para atender as demandas específicas. No caso de ensino
itinerante o público era de cegos e surdos, principalmente por usarem um sistema de
comunicação diferenciado.
Não obstante, as contribuições advindas da Constituição de 198911
indicaram, a exemplo da Constituição Federal, o “atendimento educacional
especializado aos portadores de deficiência em qualquer idade, preferencialmente
na rede regular de ensino.” (CE, Art. 218, VI). Se pararmos para refletir sobre a
expressão “atendimento especializado”, de acordo com o dicionarista Aurélio
Buarque de Holanda, a palavra ‘atendimento’ refere-se dar ou prestar atenção. No
caso do vocábulo ‘especializado’ significa que é algo particular, singular. Partindo
desse ponto pensamos que deveria haver uma preocupação com a individualidade
de cada um, ou seja, somos diferentes por essência. Tal reflexão não se refere
apenas à Educação Especial, mas a todos os níveis e modalidades educativas.
11 “As Constituições estaduais, em grande medida, apenas repetem aquela formulação da Constituição Federal”. (Ferreira, 1998: s/p).
48
Impulsionado por esse olhar diferenciado, iniciamos a década de 1990
na educação cearense. No que se refere à Educação Especial apontamos como
ponto de destaque o governo Tasso Jereissati (1995-2002) que apresentou
como prioridade a Educação, através do Plano de Desenvolvimento
Sustentável. Seu projeto educativo apóia-se no slogan: Todos pela Educação de
Qualidade para Todos.
Em linhas gerais, o Plano reconhece a escola como ponto de partida de toda ação pedagógica, propõe sua autonomia, e ao mesmo tempo, identifica na parceria com os municípios o caminho para viabilizar o regime de colaboração entre União, Estado e Municípios. (VIEIRA, 2002, p. 360).
De fato, redimensionar o atendimento para um contexto de qualidade é
um desafio e exige amplas reformas políticas, administrativas e de ensino. Dois
processos foram bastante discutidos e viabilizados no governo Tasso, a eleição de
diretores e o processo de municipalização do ensino. O que nos chama atenção
pelo repasse de responsabilidades é a municipalização. Não se trata de um
fenômeno atual no contexto cearense. Segundo Mendes (citado por HAGUETTE;
VIDAL, 1998, p. 15), “[...] a primeira tentativa remonta o ano de 1975, ‘quando foi
deflagrado pelo Projeto de Assistência Técnica e Financeira aos Municípios (PRÓ-
MUNICÍPIOS) [...].” Em 1990, uma nova tentativa esboçada agora através do
Programa de Municipalização do Ensino Público tem por base a indicação da
Constituição Federal de 1988 em seus artigos 211 e 212. Em 1995, ano em que a
municipalização retorna a pauta de governo, pouco tinha sido feito para o ensino
fundamental (HAGUETTE; VIDAL, 1998). No entanto, a discussão sobre esse tema
tinha um reforço financeiro, ou seja, o contexto de municipalização do ensino torna-
se também resultado das ações do FUNDEF (1996-2006) e do PDDE (Programa
Dinheiro Direto na Escola), programas federais que financiam a educação através
de uma relação direta com os municípios.
Nesse mesmo contexto, coadunando com as discussões em nível
nacional, houve a criação através do Decreto No 24.226, de 23 de setembro de
1996, do Centro Integrado de Educação Especial, situado na estrutura
organizacional do ensino fundamental da Secretaria de Educação Básica, o que
representou a demarcação de um espaço para a educação especial.
49
Ainda nesse sentido, a LDB No 9394/96, que destinou um capítulo
específico para a Educação Especial, suscitou uma reflexão sobre a política
educacional cearense. Esse movimento se constituía visando o acesso
preferencialmente à escola comum na perspectiva de atender ao conclamado pela
Declaração de Salamanca (1994) e reafirmando a política nacional. Destarte, a
Secretaria de Educação do Estado, pela primeira vez, formula uma política
específica para a Educação Especial. A síntese das intenções da política estadual,
nessa modalidade de ensino, é descrita através do documento – Política Estadual de
Educação Especial: “Integração com Responsabilidade.” (1997) que apoiado no
discurso da inclusão apresenta algumas considerações acerca do ensino especial
apontando algumas ações e metas a serem cumpridas.
É necessário ressaltar, que o documento ainda norteia as ações no
contexto educacional cearense, merecendo uma atenção específica e uma análise
mais detalhada. Portanto, acrescentamos ao nosso olhar as pesquisas de
Magalhães (2002) e Figueiredo (2003)12 que se debruçaram sobre essa política
procurando entender seus avanços e suas limitações. É nelas que ancoramos as
nossas discussões.
Convergindo com alguns aspectos apresentados na análise feita por
Magalhães e pelo GT (grupo de trabalho) da ANPED – Associação Nacional Pós-
Graduação e Pesquisa em Educação, ponderamos que no item 2, os princípios da
Política Estadual de Educação Especial do Estado do Ceará, “[...] apontam a
garantia de acesso, permanência e terminalidade educacional da pessoa com
necessidades educativas especiais.” Sendo assim, há um direcionamento para a
universalização da educação inclusiva, todavia não se destacam os princípios que
fundamentam a concepção de inclusão. (FIGUEIREDO, 2003).
Ademais, a orientação, nos princípios norteadores, ressalta o respeito aos
valores democráticos da igualdade, da liberdade e da dignidade humana. A idéia de
normalização assinala a necessidade de oferecer, aos alunos portadores de
necessidades educativas especiais, as mesmas condições e oportunidades sociais,
12 Em 2003, na 25a Reunião Anual da ANPED (Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação), o GT de Educação Especial elegeu, para discussão, a avaliação das políticas públicas desenvolvidas, na área da Educação. O debate envolveu documentos sobre políticas educacionais nacional e local por regiões. O relatório foi elaborado por coordenadores regionais e a região Nordeste foi coordenada pela Profa Rita Vieira (UFC). Trata-se de pesquisa bibliográfica com levantamento documental, em que apenas seis estados contribuíram com documentação para análise. A Educação cearense foi analisada a partir dos seguintes textos: Resolução No 361/2000, no âmbito da Educação Infantil, e a Política Estadual de Educação Especial.
50
educacionais e profissionais ofertadas às outras pessoas (CEARÁ, 1997). O acesso
procura respeitar os direitos, deveres e características individuais de cada um,
inclusive a maneira de viver, no entanto a filosofia de normalização acabar por
padronizar as diferenças.
O documento da Política Estadual de Educação Especial da
Secretaria de Educação Básica do Estado do Ceará não explicita o conceito de
Educação Especial. No entanto, destaca que através da Escola Inclusiva será
propiciado o atendimento aos alunos com necessidades educativas especiais
segundo suas potencialidades e necessidades. Nesse sentido converge com a
Declaração de Salamanca, que em seu item 7, define “princípio fundamental da
escola inclusiva é o de que todas as crianças devem aprender juntas, sempre
que possível, independentemente de quaisquer dificuldades ou diferenças que
elas possam ter.” (grifos nossos). Sendo assim respeita-se o disposto no item
16 da Declaração de Salamanca:
Políticas educacionais em todos os níveis, do nacional ao local, deveriam estipular que a criança portadora de deficiência deveria freqüentar a escola de sua vizinhança: ou seja, a escola que seria freqüentada caso a criança não portasse nenhuma deficiência. Exceções a esta regra deveriam ser consideradas individualmente, caso-por-caso, em casos em que a educação em instituição especial seja requerida.
Uma das metas descritas na política educacional do Estado para dar
suporte à escola inclusiva é a implantação de núcleos de atendimento especializado.
A idéia de descentralizar o atendimento e articular com o trabalho desenvolvido no
ambiente escolar constituem uma perspectiva educativa que está atenta à
diversidade (MAGALHÃES, 2002). De acordo com as diretrizes para implantação do
núcleo, sua estrutura organiza-se da seguinte forma:
a) a equipe de triagem, diagnóstico e acompanhamento (aos alunos e
também às famílias, principalmente através das ações do Serviço
Social);
b) serviços de itinerância e salas de recursos para alunos com deficiência
visual e auditiva (professores especializados tendo como função o
atendimento às necessidades específicas desses alunos. Nesse caso,
o aluno não seria afastado da sala regular, mas teria um
51
acompanhamento que observasse as suas necessidades como, por
exemplo, o uso do Braille ou da LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais);
c) laboratórios de informática (espaço de aprendizagem através de
softwares educativos com o acompanhamento de professores
especializados);
d) apoio administrativo (funcionário já pertencente ao quadro da escola
que se dedica à organização, controle e arquivo das atividades
desenvolvidas no núcleo e das suas relações com as escolas).
Trata-se de uma visão multidisciplinar que suscita de seus profissionais
uma formação que perpasse diversas áreas do conhecimento. No caso da formação
docente, a Política Estadual prevê que os professores devem ter
[...] especialização adequada em nível médio ou superior para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para integração desses educandos nas classes comuns. (Lei No 9394, de 20/12/96, Art. 59).
Magalhães (2002) acrescenta que no documento há referências ao
conhecimento que o professor precisa ter, tais como: desenvolvimento humano, o
respeito à individualidade do aluno, a adoção das metodologias necessárias para o
aprendizado do alunado, mas não visualiza questões próprias de uma cultura
inclusiva. Através de suas metas e ações, a Política Estadual de Educação Especial
do Ceará aponta diretrizes para o contexto escolar, e confere um espaço específico
para a revitalização13 das oficinas pedagógicas, preparando o alunado para o
mercado de trabalho.
No caso do Ceará, o atendimento à demanda desta modalidade de ensino
(tanto no processo educativo e de profissionalização) vem se constituindo através da
ação de instituições públicas e privadas, inclusive através de ONGs (Organizações
não Governamentais). Acrescentamos também os serviços de apoio ao atendimento
dos alunos com deficiência.
13 Vale ressaltar que a revitalização não deveria se deter apenas a modificações do ponto de vista do fazer pedagógico, seria necessário repensar a lógica de mercado de trabalho capitalista e promover uma ruptura de concepções baseadas no senso comum em “que a pessoa com deficiência está incapacitada para as atividades laborativas.” (LANCILLOTTI, 2003, p. 85).
52
A reestruturação e expansão dessa modalidade de ensino demandou ao
governo Jereissati a permanência de alguns recursos educacionais na tentativa de
aliados ao processo de integração/inclusão, constituírem práticas mais contem-
porâneas, dentre eles estão: a) ensino itinerante; b) sala de recursos; c) Classe
Especial; d) Escola Especial; e) Ensino Hospitalar e Domiciliar. No intuito de
entendermos esses conceitos apresentamos a descrição de Mazzotta (1982):
No entanto, o acesso à escola regular ainda é algo não concretizado,
pelo menos não em sua forma plena. Até o final do mandato de Tasso Jereissati
foi possível a implantação de núcleos de atendimento especializado, a presença
de intérprete de Libras em salas de aula regular ampliando, mesmo que de
maneira tímida os espaços de atenção aos alunos com necessidades
educacionais especiais.
Em 2003, o governador Lúcio Alcântara (2003-2006) é eleito com o
slogan “Ceará cada vez melhor.” Por pertencer ao mesmo partido, dá continuidade à
política do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira). Tem como objetivo
principal “reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover a inclusão social.”
(PSDB, 2003, p. 21), mas, a exemplo o governo nacional, não se destitui dos
investimentos internacionais (BIRD, BID etc). O seu plano de governo intitulava-se
a) Ensino Itinerante – É um ensino em que o professor especializado presta serviços aos alunos especiais visitando as escolas e dando apoio pedagógico aos professores de escolas regulares. Geralmente é o profissional que têm conhecimentos para auxiliar no atendimento de alunos deficientes visuais (cegos e de visão subnormal) e/ou deficientes auditivos. Não se restringindo apenas a esses tipos de deficiência. b) Sala de recursos - É considerada como um auxílio especial conduzido por um professor especializado. Como o próprio nome já indica é um ambiente que possui uma variedade de materiais e equipamentos que são apropriados para desenvolver os alunos de acordo com as suas necessidades específicas. c) Classe especial – Instalada em uma escola regular é caracterizada pelo agrupamento de alunos avaliados como da mesma categoria de dificuldades ou deficiências sob a responsabilidade de um professor especializado. d) Escola Especial ou de educação especial – É aquela organizada para atender especificamente alunos especiais. Algumas escolas são planejadas para atender alunos de um determinado tipo de deficiência, ou seja, para somente deficientes mentais ou deficientes visuais etc. e) Ensino Hospitalar e domiciliar – É um serviço desenvolvido para dar apoio a alunos que estão em condições temporárias ou permanente de incapacidade, e, portanto não podem ser privados de um ambiente educacional. Neste caso, quando a quantidade de alunos é expressiva se faz necessário a criação, no caso de um hospital, de classes hospitalares.
53
“Ceará Cidadania: Crescimento com Inclusão Social” acompanhando o que na
campanha foi chamado de “Movimento Ceará Cidadania.” Pauta sua proposta de
trabalho em quatro eixos articulação, quais sejam:
• Eixo 1 – Ceará Empreendedor;
• Eixo 2 – Ceará Vida Melhor (é o que contempla ações referentes
à educação);
• Eixo 3 – Ceará Integração;
• Eixo 4 – Ceará – Estado a serviço do Cidadão.
As ações de Educação situam-se no eixo “Ceará Vida Melhor”. Tendo
como linha ação que contempla as pessoas com necessidades educacionais
especiais – educação de qualidade e inclusão. A referida linha propõe a construção
de uma escola pública que respeite os ritmos e diferenças no processo de ensino-
aprendizagem principalmente daqueles cujo acesso foi negado. A bandeira da
Inclusão Social é também pano de fundo para o governo, a exemplo da política
nacional. Refere-se ao social como espaço que fundamenta a constituição da
cidadania. Nesse sentido, cabe a indagação: Em que consiste essa educação
cidadã no governo Lúcio Alcântara?
Na Educação Básica, o Plano “Escola melhor, Vida melhor (2003/2006)”
reafirma a contribuição dos governos anteriores propondo o seguinte caminho para
execução do plano – o resgate da essência da escola. Apresenta quatro princípios
norteadores: Educação de Qualidade e Inclusão Social; Gestão Democrática e
Controle Social; Ação Profissional Permanente e Valorização dos Servidores da
Educação. No caso específico da Educação Especial, tem-se o Programa de Apoio
ao Desenvolvimento da Educação Infantil e Implementação das Políticas de Inclusão
para Jovens e Adultos, Portadores de Necessidades Especiais (grifos nossos) e
Comunidades Indígenas. De acordo com o programa objetiva-se para a Educação
Especial (CEARÁ, 2004, p. 59-61):
• assegurar a melhoria na qualidade do atendimento dos alunos com
necessidades educacionais especiais, respeitando o direito de ser
54
diferente (grifos nossos); apoiar os municípios na qualificação do
atendimento das crianças e formação de corpo técnico especializado;
• Define como estratégia para alcançar esse objetivo:
• garantir, no orçamento do Estado e dos municípios recursos
financeiros específicos para o desenvolvimento de ações de
Educação Especial; implementação de um programa de formação
permanente e continuada na área de Educação Especial para os
professores do ensino regular e especial, incluindo curso de Libras e
Braille;
• Apresenta como meta:
• fortalecer a política de Educação Especial através da ampliação do
atendimento dos alunos portadores de necessidades educativas
especiais, a uma taxa anual de crescimento de 17,5% em relação a
2002.
Tanto o Plano de Governo (2003) quanto o Plano Plurianual (2004-2007)
não apresentam de forma setorizada a aplicação dos recursos financeiros. O que
ambos descrevem são premissas básicas, o que eles chamam de manutenção do
equilíbrio fiscal, que são (CEARÁ, 2003):
• fontes de financiamento: recursos próprios do tesouro estadual;
recursos captados por meio de convênios com entidades de
desenvolvimento nacionais e internacionais; recursos oriundos de
novos contratos a serem formalizados, mediante operações de
crédito; e recursos oriundos de receitas próprias da administração
indireta e de outras fontes;
• a arrecadação dos impostos estaduais seguirá uma tendência de
crescimento, influenciando no aumento da receita estadual, em
razão do aperfeiçoamento e modernização do processo de
arrecadação, da preservação dos princípios de probidade
administrativa e transparências governamentais, e do estímulo à
atividade produtiva;
• maior efetividade dos gastos públicos;
55
10.999
13.723
17.148
23.911
33.000
7.923
3.076 5.245
7.733
10.306 10.523 9.415
8.478
22.694
13.388
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
30.000
35.000
2002 2003 2004 2005 2006 Total Escolas e Classes Especiais Escolas Regulares/Classes Comuns
• fortalecimento de parcerias com o segundo setor (organizações
empresariais) e terceiro setor (organizações sem fins lucrativos)
para implementação dos programas e projetos para o atual
quadriênio;
• otimização do financiamento das ações governamentais, por meio
da reprogramação orçamentária.
Ressalta ainda as relações de parcerias principalmente com o setor
privado (seja empresarial ou organizações sem fins lucrativos). De fato, houve um
aumento representativo no número de matrículas (que passaram de um total de
10.999 para 33.000 alunos matrículados), tornando-se assim uma forma de aferir os
resultados no tocante ao atendimento de alunos com necessidades educacionais
especiais. É o que podemos constatar no gráfico 2:
Gráfico 2 – Evolução de matrículas da educação especial no Estado do Ceará/CE Fonte: MEC/INEP – Censo Escolar 2006
Podemos perceber ainda, considerando o total geral de matrículas, que
triplicou de 2002 para 2006 o número de alunos atendidos. No entanto, este
resultado apresenta apenas uma das faces do que realmente foi feito no decorrer
desse período. Em 2005, a SEDUC (Secretaria da Educação do Ceará) promoveu
um I Seminário Política Estadual de Educação Especial: Novos Rumos e Desafios
para analisar a política estadual para a Educação Especial. A análise fomentada,
além de avaliar o que foi atingido desde a criação do documento (de 1997 até 2005,
56
o que perfaz um tempo de 12 anos) também enumerou as principais dificuldades e
necessidades presentes até 2005. Um dos exercícios propostos era repensar as
metas e ações descritas no documento e a atualização das terminologias através de
grupos de trabalho (constituídos pelos CREDES – Coordenadoria Regional de
Desenvolvimento da Educação e instituições conveniadas). Foram enumeradas
como espaços conquistados para discussão:14
• Criação da Secretaria de Mobilização e Inclusão Social;
• Secretaria do Trabalho e Empreendedorismo - criação da Célula de
Inclusão de Segmentos Especiais;
• Fóruns promovidos pela Secretaria de Ação Social.
No caso da inclusão escolar, as experiências significativas desde a
criação do documento até a realização do seminário, são (CEARÁ, 2005):
• EEFM. Monsenhor Dourado: Projeto Novo Olhar através da Arte foi
selecionado pelo Instituto Junia Rabello e Financiado pelo Banco
Rural. O projeto consistia na realização de oficinas de teatro,
dança, música, coral, pintura e artesanato. Total de alunos da
escola: 200 / Total de alunos incluídos: 80;
• Alunos com Síndrome de Down e deficiência mental incluídos no
ensino regular e Tempo de Avançar do Ensino Fudanmental (TAF);
• Alunos com Paralisia Cerebral incluídos no ensino regular;
• Alunos com surdez e deficiência visual incluídos no ensino
fundamental e ensino médio, com apoio de professor, intérprete,
instrutor surdo e professor itinerante;
• Participação dos alunos incluídos no Festival de Talentos das
Escolas Públicas – FESTAL.
Após cotejar os resultados alcançados, os mesmos grupos revisaram a
política, pontuando primeiramente as sugestões para o redimensionamento do
14 Os itens que tratam dos resultados aferidos no I Seminário Política Estadual de Educação Especial: Novos Rumos e Desafios, retirados de uma apresentação em power-point, documento apresentado como resultado dos trabalhos desenvolvidos durante o evento.
57
trabalho desenvolvido na educação especial. Um dos pontos de destaque refere-se
à Implantação, Manutenção, Ampliação de Núcleos Pedagógicos, propõe-se:
• Universalização de núcleo de atendimento em âmbito regional;
• Fortalecimento, Ampliação do número de Núcleos e criação de Núcleos
nos bairros;
• Divulgar o trabalho, inclusão do tratamento clínico e maior assistência
às escolas;
• Fazer chegar aos núcleos o material áudio visual (fitas de vídeo, livros,
CDs, cartilhas e outras publicações) referente à Educação Especial,
produzidos e enviados pelo MEC.
Ainda referente ao núcleo solicita-se para a Equipe de Triagem,
Diagnóstico e Acompanhamento:
• Viabilizar a contratação de profissionais específicos como: Psicólogo,
Psicopedagogo, Fonoaudiólogo, Assistente Social e Terapeuta
Ocupacional e garantir a permanência desses profissionais nas
unidades de atendimento às pessoas com NEE;
• Assegurar atendimento psicológico às famílias dos surdos no Instituto
Cearense de Educação de Surdos – ICES.
No tocante aos serviços educacionais de Itinerância e Salas de
Recursos, pede-se:
• Ampliar Espaços Sócio-Educativos Especializados para alunos com
dificuldades de aprendizagem15;
• Garantir a implementação de salas de apoio pedagógico específico e
salas de recursos, em unidades de ensino com matrículas a partir de
100 alunos;
15
Não há uma clareza, segundo a apresentação em power point que serviu de base para essa análise do que sejam os chamados espaço sócio-educativos.
58
• Garantir um professor itinerante com habilidades específicas para
trabalhar com pessoas com deficiência visual e auditiva.
No Apoio Pedagógico no Ensino Regular:
• Revisão do número de alunos por sala de aula, pois a superlotação
prejudica a efetiva implantação de uma prática pedagógica
personalizada (indutiva);
• Suporte pedagógico na escola regular como PCAs (Professores
Coordenadores de Área), Multimeios (regência e apoio), intérprete para
surdos, professor especialista em deficiência visual e mental, para
planejamento, execução e avaliação das atividades;
• Adaptações curriculares nas escolas para atender as Necessidades
Educacionais Especiais (NEE) – visual, auditiva, mental, física,
condutas típicas, altas habilidades e dificuldades de aprendizagem;
• Envolver pessoas com NEE em atividades artísticas (teatro, dança,
música, desenho, pintura, dentre outras);
• Garantia de aquisição de material didático pedagógico específico
(Braille e Libras), bengala, lupas, ábaco, computadores etc., para
atender as NEE;
• Salas adequadas com equipamentos e materiais, livros didáticos e
outros subsídios e com a presença de instrutores surdos nas salas de
aula principalmente na educação infantil para aprendizagem da Língua
de Sinais (Instituto Cearense de Educação de Surdos – ICES);
• Assessoria pedagógica aos conveniados para um melhor
acompanhamento das atividades educativas desde a Educação
precoce até a Educação profissionalizante;
• Disponibilizar as instituições especializadas materiais impressos
(informativos, jornais revistas, livros, boletins de eventos) e
pedagógicos referentes à Educação Especial;
• Estimular a aprendizagem da Língua de Sinais nas escolas inclusivas
visando uma melhor inclusão do aluno surdo (Instituto Cearense de
Educação de Surdos – ICES).
59
Outro ponto de debate no seminário foi o delineamento do Perfil do
professor da Educação Inclusiva segundo os participantes do mesmo:
• Gratificação especial ao professor que ministra aulas para as pessoas
com NEE, incluindo profissionais da rede regular de ensino, e outras
instituições;
• Inclusão no currículo dos Cursos de Licenciatura Plena de Formação
de Professor, das Universidades Estaduais, a disciplina de Educação
Especial, de forma obrigatória;
• Obrigatoriedade para contratação de um professor de Educação Física
e um de Arte-Educação especializado no intuito de desenvolver a
educação física adaptada e para a prática das atividades artísticas.
Cabe observar que essa gratificação presente desde a implantação da
Política Estadual, em 1997, ainda se configura como motivação para o trabalho com
pessoas com necesssidades educacionais especiais. Num contexto inclusivo
entende-se que todos os profissinais tenham acesso às informações pertinentes à
Educação de pessoas com NEE não havendo assim, nenhuma diferenciação. Afinal
a inclusão é pertinente a escola como um todo.
Além dessas sugestões que vislumbravam aspectos relevantes da
educação especial, tem-se a reformulação das metas e ações presentes no
documento da política estadual. Dentre as que foram apresentadas, destacamos:
• Reestruturar as escolas públicas viabilizando adaptações das estruturas
físicas – construção de rampas, pisos antiderrapantes, corrimão,
banheiros adaptados, telefones públicos dentro da escola e espaço
reservado no estacionamento;
• Assegurar o deslocamento das pessoas com NEE às escolas,
considerando a realidade dos municípios;
• Elaborar um programa de implementação das metas da política
Estadual de Educação Especial, de acordo com as prioridades
60
prevendo ações anuais e sua continuidade. Fazer levantamento dos
custos deste programa;
• Estabelecer prazos para implantação dos Programas e garantir recursos
financeiros (verbas) no orçamento estadual para sua execução,
organizando ações de orientação, acompanhamento e avaliação
permanente destes programas;
• Revitalizar as escolas especiais, de modo geral, para atender aos alunos
que não apresentam condições de inserção no ensino regular;
• Formação continuada para os professores da rede regular de ensino;
• Criar programas em veículos de comunicação que proporcionem
orientação em relação às pessoas com Necessidades Educacionais
Especiais, seus direitos através de debates com especialistas;
• Ampliar as ofertas do Benefício da Prestação Continuada (BPC) às
pessoas com deficiência;
• Integração da APAE com os órgãos governamentais e ampliar as
parcerias com as instituições privadas;
• Elaboração de Políticas Municipais que venham garantir a qualidade de
ensino às pessoas com NEE e exigir dos municípios a inclusão da
Educação Especial no Plano de Educação Básica do Município;
• Assegurar os direitos das pessoas com NEE à Assistência social,
educacional, saúde, pela integração das secretarias de educação, saúde e
ação social, através de parcerias com o Terceiro Setor, sem desonerar os
demais órgãos que possam efetivamente contribuir com os objetivos
propostos;
• Firmar um convênio efetivo com o Sistema S (SINE IDT, SENAI, SENAC,
SEBRAE, SESC, SESI) e FIEC para dinamizar o currículo e formação de
professores para atuar na Área do Ensino Técnico Profissionalizante.
Diante do exposto vislumbramos um contexto de significativas
necessidades e uma “sede” por mudanças que de certo modo vem acontecendo
de forma lassa e gradual. Percebemos também que alguns aspectos
característicos da Filosofia da Integração ainda se fazem presentes. Questões
ligadas principalmente a operacionalização das ações que acabam por
61
“normalizar”, ou seja, diluir as diferenças como se fossem tratadas de uma só
forma. A confusa visão de conceitos ainda é parte desse processo (incluir,
integrar e inserir, por exemplo, se apresentam como um mesmo conceito em
diversos momentos nos itens expostos sobre esse seminário).
No entanto, é necessário considerar que o processo avaliativo de uma
política é um procedimento positivo e pode fomentar transformações. Nesse sentido,
pensar e analisar o contexto histórico e as políticas propostas e/ou desenvolvidas
enriquece o nosso diálogo que procurou explicitar o percurso da Educação Especial
no Brasil e no Ceará. É fato que até meados do século passado, os movimentos
educativos para as pessoas com deficiência eram escassos e pontuais.
Tal realidade é reflexo dos movimentos histórico-políticos que priorizaram
outros segmentos da sociedade ou outras ações no Estado, principalmente ligados
ao comércio e à economia. Contudo, também é notório que esses movimentos vêm
bravamente tentando garantir seu espaço, inclusive a partir da Constituinte (1987) e
das mudanças no cenário internacional. Percebemos, então, um novo olhar acerca
da educação brasileira. Tal situação refere-se, não somente, à Educação Especial,
mas a toda educação do País. São várias as inovações educacionais,
principalmente a partir dos anos 1990. A escola eleita como local para
operacionalizar os projetos educativos nacionais é investida também da
responsabilidade de receber pessoas com necessidades educacionais especiais.
Entendemos que a escola ao assumir tal responsabilidade precisa
constituir-se enquanto espaço multicultural respeitando as diferenças, sobretudo,
aquelas que para muitos provoca algo similar ao repúdio ou estranhamento. Os
movimentos inclusivos respaldados na reflexão sensível contida na Declaração de
Salamanca (1994) levantam questões que nos forçam a buscar entender até que
ponto conseguimos por em prática a concepção de educação inclusiva. Segundo
Carvalho (2004, p. 86), a proposta inclusiva tem gerado alguns equívocos que
podemos sintetizar como segue:
• Supor que é assunto específico da educação especial;
• Acreditar que a proposta é dirigida, apenas, a alunos portadores de
deficiência ou das condutas típicas, das síndromes neurológicas,
psiquiátricas ou com quadros psicológicos graves;
62
• Supor que os alunos com altas habilidades/superdotados não são
sujeitos da proposta inclusão educacional escolar;
• Exigir diagnóstico clínico para promover a inclusão de deficientes no
ensino regular;
• Afirme que o paradigma da inclusão “supera” o da integração;
• Desconsiderar as necessidades básicas para a aprendizagem de
qualquer aluno, banalizando essas necessidades e/ou atribuindo-as a
problemas do indivíduo;
• Confundir inclusão com inserção;
• Privilegiar, na inclusão, o relacionamento inter-pessoal (socialização)
em detrimento dos aspectos cognitivos;
• Limitar a “leitura de mundo” à sala de aula, isto é, supor que a inclusão
é um fim em si mesma quando, na verdade, é um processo contínuo e
permanente que envolve a família, a escola, o bairro, a comunidade ...
Alguns equívocos presentes na realidade cearense descritos de uma
forma sintética nesses pontos de reflexão apresentados no seminário. Cabe-nos
lembrar também que educação inclusiva além de não se referir somente a pessoas
com NEE, é um movimento para rever o processo de exclusão social e educacional
de grupos considerados “minorias” no direito à educação e à participação política. O
que nos parece, é que mesmo com a descontinuidade das políticas e a adversidade
do contexto social, a inclusão educacional “teima” em procurar seu lugar e um dos
caminhos é a realidade escolar.
Sendo assim, para dar conta dessa leitura do cenário escolar é
necessário direcionar as nossas lentes e focalizar um contexto específico para
melhor entender esse fenômeno. Portanto, em próximo capítulo, apresentamos a
cidade de Sobral que vem apresentando resultados reconhecidos nacionalmente,
provocando o que chamamos de “curiosidade investigativa”. Para tanto, iniciaremos
o debate conversando sobre os conceitos utilizados no contexto da Educação
Especial e da Educação Inclusiva para então conhecermos o contexto histórico-
político da educação em Sobral.
63
CAPÍTULO 2 – EDUCAÇÃO ESPECIAL EM SOBRAL: PASSOS E (DES) COMPASSOS NA CONSTRUÇÃO DA INCLUSÃO EDUCACIONAL
Quero a harmonia secreta da desarmonia; quero não o que está feito,
mas o que tortuosamente ainda se faz. (Clarisse Lispector)
Dando continuidade às discussões iniciadas no primeiro capítulo, o nosso
debate divide-se em três momentos: uma discussão sobre as políticas públicas e o
processo de constituição do contexto inclusivo; Conhecer a proposta do Programa
Educação Inclusiva: Direito à Diversidade (como uma das iniciativas presentes na
política de inclusão dos municípios brasileiros), para então, em terceiro momento
contextualizar as ações no município de Sobral.
No entanto, é necessário ter presente que tais momentos não podem
ser demarcados e nem separados. Eles se inter-relacionam, pois as idéias e as
concepções que vão surgindo, na realidade, são o(s) retrato(s) do hibridismo das
necessidades, anseios e expectativas das pessoas com necessidades
educacionais especiais.
2.1 Educação Especial e Educação Inclusiva: Revisitando os Conceitos no
Contexto das Políticas Públicas
Antes de começarmos a conversar sobre a experiência sobralense, é
necessário um breve resgate sobre a trajetória das políticas públicas para a
Educação Especial. “Historicamente, as políticas sociais desenvolvem-se e são
implantadas na contradição do movimento da sociedade.” (KASSAR, 2004, p. 61).
No caso da Educação Especial iniciaram com a criação do CENESPE – Centro
Nacional de Educação Especial, na década de 1970, e representou a ampliação do
número de escolas e classes especiais para oferecer atendimento educacional para
as pessoas com deficiência. Não somente na década de 1970, mas também na de
1980, as classes especiais representaram uma tentativa para aqueles que não se
encaixavam no sistema regular de ensino, mesmo assim o ingresso na rede pública
64
de alunos com deficiências ainda era restrito, cuja maioria ainda permanecia em
instituições privadas.
Em meados da década de 1980, esse modelo passou a ser considerado
segregador e excludente devido a fortes questionamentos elaborados,
principalmente, a partir da Constituição de 1988, com a instituição no âmbito das
políticas educacionais da Política de Integração, apoiada nos princípios de
normalização, integração e individualização.
Quando a Nova República (a partir dos anos 1980) se instaurou algumas
demandas se incorporaram ao discurso oficial da democratização. Descentralização,
municipalização, integração de serviços e equipamentos sociais abrindo caminho
para uma maior ênfase nas políticas sociais.
Neste movimento, a luta pela ampliação do acesso e da qualidade da educação das pessoas portadoras de deficiência culminou, no início dos anos 1990, com a proposta de Educação Inclusiva, hoje amparada e fomentada pela legislação em vigor, e determinante das políticas públicas educacionais em nível federal, estadual e municipal. (FERREIRA; citado por GLAT; FERNANDES, 2005, p. 4).
Diante de tal abrangência é preciso esclarecer alguns conceitos que
fazem parte desse contexto político. Para tanto elaboramos algumas questões
básicas para nortear o nosso estudo:
a) Qual o real papel a ser desempenhado pela Educação Especial e
Educação Inclusiva? (Entendendo que a Educação Inclusiva destina-
se a um público que vai além das pessoas com necessidades
educacionais especiais);
b) Qual a relação entre integração e inclusão? (Haja vista que ambos os
conceitos estão presentes na literatura sobre inclusão);
c) Qual o público que faz parte desse processo inclusivo?
Diante de tais questões enumeramos alguns dos principais documentos
orientadores da Educação Especial para nos auxiliar na compreensão da
temática, a saber:
65
a) Constituição Federal de 1988;
b) Declaração de Salamanca (1994);
c) LDB No 9394/96;
d) PNE (Lei No 10.172/2001);
e) Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica
(Resolução CNE/CEB No 02/2001).
A escolha de tais documentos se faz pela abrangência que esses
dispositivos possuem, pois se referem a organização do ensino, metas a serem
alcançadas e diretrizes a serem cumpridas em âmbito federal, estadual e municipal.
Iniciamos a nossa análise através da composição do quadro a seguir, que apresenta
três aspectos relevantes na política e legislação da Educação Especial, quais sejam:
a) O público alvo;
b) A terminologia utilizada para definir esse público e,
c) O Lócus proposto para o atendimento educacional.
Quadro 4 – Política e legislação da educação especial
Qual o público alvo? Terminologia
Utilizada?
Qual o lócus proposto para o atendimento educacional?
Constituição Federal
1988
Art. 208. O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de:
III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
Portadores de deficiência
III – [...] preferencialmente na rede regular de ensino.
Declaração de
Salamanca (1994)
3. [...] escolas deveriam acomodar todas as crianças independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas ou outras. Aquelas deveriam incluir crianças deficientes e superdotadas, crianças de rua e que trabalham, crianças de origem remota ou de população nômade, crianças pertencentes a minorias lingüísticas, étnicas ou culturais, e crianças de outros grupos desvantajados ou marginalizados. No contexto desta estrutura, o termo "necessidades educacionais especiais" refere-se a todas aquelas crianças ou jovens cujas necessidades educacionais especiais se originam em função de deficiências ou dificuldades de aprendizagem.
Necessidades educacionais especiais
3. [...] Existe um consenso emergente de que crianças e jovens com necessidades educacionais especiais devam ser incluídas em arranjos educacionais feitos para a maioria das crianças. Isto levou ao conceito de escola inclusiva.
LDB (Lei No 9394/96) Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de ne66cessidades especiais.
Portadores de necessidades especiais.
Art. 58 [...] preferencialmente na rede regular de ensino.
§1o Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial. §2o O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular.
PNE (Lei No
10.172/2001)
8.2 Diretrizes A educação especial se destina às pessoas com necessidades especiais no campo da aprendizagem, originadas quer de deficiência física, sensorial, mental ou múltipla, quer de características como altas habilidades. (grifos nossos)
Necessidades especiais no campo da aprendizagem
[...] Propõe-se uma escola integradora, inclusiva, aberta à diversidade dos alunos, no que a participação da comunidade é fator essencial. Quanto às escolas especiais, a política de inclusão as reorienta para prestarem apoio aos programas de integração. A educação especial, como modalidade de educação escolar, terá que ser promovida sistematicamente nos diferentes níveis de ensino. A garantia de vagas no ensino regular para os diversos graus e tipos de deficiência é uma medida importante. (grifos nossos)
Diretrizes Nacionais
para a Educação
Especial (Resolução
No 02/2001)
Art. 3o Por educação especial, modalidade da educação escolar, entende-se um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica. (grifos nossos)
Necessidades educacionais especiais
Art. 7o O atendimento aos alunos com necessidades educacionais especiais deve ser realizado em classes comuns do ensino regular, em qualquer etapa ou modalidade da Educação Básica.
66
67
Sabemos que “[...] a educação é uma entre várias práticas sociais
institucionalizas. Ela reflete as contradições presentes na sociedade, o jogo de
forças e o confronto de tendências e interesses.” (LAPLANE, 2004, p. 14). No caso
da Educação Especial, a política e a legislação nacional atribuíram
preferencialmente à escola regular a função de receber os alunos com
necessidades educacionais especiais, mesmo ainda abrindo espaço ao atendimento
dos alunos em classes especiais, escolas especiais, classes hospitalares ou núcleos
especializados (LDB, PNE e as Diretrizes Nacionais Curriculares para Educação
Especial na Educação Básica).
Quanto à caracterização do público da educação especial, tem-se
primeiramente, a nomenclatura “portadores de deficiência.” (CF, 1988).
Posteriormente, com a Declaração de Salamanca (1994), orienta o uso do termo
“necessidades educacionais especiais” aplicando-se às necessidades permanentes,
temporárias, ou as que surgissem em qualquer etapa da escolarização.
Ainda referindo-se a essa terminologia encontramos no texto da
Declaração de Salamanca além das deficiências (cegueira, surdez, surdo-cegueira,
etc) a referência às dificuldades de aprendizagem (o que permitiria considerar uma
diversidade muito maior de pessoas no contexto escolar). Esta última presente de
maneira significativa no contexto escolar no município de Sobral, palco de nossa
pesquisa. Para Kassar, esse conceito referente às dificuldades de aprendizagem,
presente em Salamanca, pode ser observado por dois ângulos:
1. A adoção desse conceito pode solicitar da instituição escolar resposta satisfatória a todas as crianças.
2. Mas há também outro lado, que se revela na forma de serviços oferecidos
às crianças na história de nossa escola. Explicando melhor: desde os fins de 1970, trabalhos como os de Schneider (1977) e Paschoalick (1981) mostram que grande parcela da população que freqüentava classes especiais, portanto crianças que para a época eram reconhecidas como possuidoras de dificuldades de aprendizagem, não tinham realmente dificuldade de aprendizagem ou deficiência. Elas eram encaminhadas aos serviços de educação especial em virtude das contínuas repetências, ou quando a escola as considerava “deficientes” logo nos primeiros contatos. (2004, p. 54-55).
Quando houve a permuta para a nomenclatura “pessoas com
necessidades educacionais especiais”, sinalizada também na Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (Lei No 9.394/96), aponta-se uma ressignificação da
68
Educação Especial, ampliando-se não apenas o seu escopo de atuação, bem como
o público-alvo a que se destina.
Essa perspectiva é bem definida por Carvalho, no sentido de que
[...] especiais devem ser consideradas as alternativas educativas que a escola precisa organizar, para que qualquer aluno tenha sucesso; especiais são as estratégias que a prática pedagógica deve assumir para remover barreiras para a aprendizagem. (2001, p. 17).
Desse modo, permuta-se o enfoque do especial ligado ao aluno
para o enfoque do especial aplicado à Educação. Nesse sentido serão
contemplados os alunos que apresentam características diferenciadas
decorrentes não apenas de quadros orgânicos vinculados a deficiências ou
distúrbios de desenvolvimento, bem como, de condições socioculturais diversas e
econômicas desfavoráveis. Eles terão direito a receber apoios diferenciados que
necessitam ser oferecidos pela educação escolar.
Assim, caracterizam-se as necessidades educacionais especiais que, por
um lado, poderão estar vinculadas às características de aprendizagem diferenciadas
apresentadas por alguns alunos e, por outro, ao conjunto de recursos, apoios e
serviços especializados disponíveis nos sistemas de ensino.
Visto que a terminologia necessidades educacionais especiais pode
ser atribuída a diferentes grupos de alunos, desde aqueles que apresentam
deficiências permanentes até aqueles que, por razões diversas, fracassam em seu
processo de aprendizagem escolar, sua abrangência poderia ampliar de tal forma
que a maioria dos alunos se encontraria dentro dela, haja vista as estatísticas e os
índices de evasão e fracasso escolar encontrados em nossas escolas.
Ademais, instaurou-se uma forte tendência à não utilização da palavra
deficiente e diante de tal fato, é preciso perceber qual o real papel da retirada do
termo “portador de deficiência.” Sobre essa terminologia, Glat; Ferreira nos diz que,
A noção de necessidades educacionais especiais configura um apagamento das referências à deficiência, o que, de um lado, valoriza o campo educacional e incorpora uma visão menos patológica e mais relacional da questão, mas de outro pode dificultar a percepção de demandas específicas postas para a educação das pessoas com deficiência ou voltar a criar uma indesejada associação entre problemas escolares rotineiros e Educação Especial. (2003, p. 6).
69
Mesmo assim, apesar de ser menos usado na legislação, o termo
“pessoas com deficiência” está presente na discussão de políticas para Educação
Especial, principalmente para diferenciar as necessidades educacionais especiais
temporárias das permanentes, ou as orgânicas e de aprendizagem.
Dentro dessa mesma linha de discussão corroborando com Mazzotta,16
(2003) destacamos o debate sobre os termos INTEGRAÇÃO e INCLUSÃO, pois
estes apresentam vários usos, ora aparecem na legislação como etapas de um
mesmo processo, ora exibem escala de superação, e por fim, podem remeter à
oposição de sentidos, por exemplo, na redação do PNE (2001) ao dispor que
“quanto às escolas especiais, a política de inclusão as reorienta para prestarem
apoio aos programas de integração.” (grifos nossos). Nesse sentido, é necessário
verificar em que fundamentos teóricos e ideológicos os documentos se apóiam, para
compreender o enfoque dos textos oficiais.
No que se refere ao sentido disposto no PNE, tem-se o conceito de
integração que “não pode ser visto simplesmente como problema de políticas
educacionais ou de modificações pedagógicas na Educação Especial. Integração é
um processo subjetivo e inter-relacional.” Glat (citado por MAZZOTTA, 1997, p. 199).
Os programas de integração que o texto legal aponta, podem ser interpretados como
todo e qualquer projeto que tenha como objetivo o desenvolvimento psicossocial
dessas pessoas. Partindo desse conceito de integração, a inclusão implicaria “toda
uma reforma na organização e funcionamento dos serviços destinados aos alunos
especiais.” (LAURENT, 1997, p. 70).
De acordo com a Declaração de Salamanca o item 7, diz que “o princípio
fundamental da escola inclusiva é que todas as crianças devem aprender juntas,
sempre que possível, independentemente de quaisquer dificuldades ou diferenças
que elas possam ter.” O item 6 afirma que é “dentro desse contexto que aqueles
com necessidades educacionais especiais podem atingir o máximo progresso
educacional e integração social (grifos nossos)”, partindo da premissa de que
integração e/ou inclusão fariam parte de um mesmo processo.
16 Mazzotta, no artigo Identidade dos Alunos com Necessidades Educacionais Especiais no Contexto da Política Educacional Brasileira (2003) analisa a linguagem política no que se refere aos alunos com necessidades educacionais especiais, à inclusão e à integração escolar destacando o conteúdo do Plano Nacional de Educação e das Diretrizes Nacional para Educação Especial na Educação Básica.
70
Se olhássemos para essa discussão pelas lentes da sociologia, em uma
análise geral, remeteríamos o princípio de integração a uma relação muito próxima
com o conceito de solidariedade descrito por Durkheim (2004), em Da Divisão do
Trabalho Social. Nessa obra o autor faz uma análise de como as pessoas podem se
associar baseadas nas relações de troca sendo resultado de uma diferenciação
entre as partes. É o que ele vai chamar de solidariedade social ou “solidariedade
orgânica”, ou seja, cada um tem sua função. Característica presente na integração
social, principalmente diante das especificidades e peculiaridades no que se refere
às pessoas com necessidades educacionais especiais.
Para não reduzir à escola a função de apenas “socializar” é necessário
compreender qual a abrangência ou papel da EDUCAÇÃO ESPECIAL e
EDUCAÇÃO INCLUSIVA (que também se remete ao debate sobre inclusão), pois
apresentam também várias interpretações: ora em relação de oposição, ora de
superação ou incorporação. Mrech esclarece que “[...] por educação inclusiva se
entende o processo de inclusão dos portadores de necessidades educacionais
especiais ou dos distúrbios de aprendizagem na rede comum de ensino em todos os
seus níveis [...].” (1998, p. 37).
Entendemos inclusão pela máxima “Educação para Todos”, mas devemos
perceber que esse fenômeno não se refere apenas a educação e está
intrinsecamente relacionado com outras políticas sociais, tais como distribuição de
renda, acesso aos bens materiais, culturais e ao trabalho. O acesso a nossa herança
cultural e à vida produtiva através também da educação é parte da construção da
inclusão social e do exercício da cidadania.
Segundo a Lei No 10.172/2001, “a educação especial se destina às
pessoas com necessidades especiais no campo da aprendizagem, originadas quer
de deficiência física, sensorial, mental ou múltipla, quer de características como altas
habilidades”. A Educação Especial não perde significação ao atender de forma
especializada, as crianças e adolescentes especiais. As Diretrizes Nacionais para
Educação Especial na Educação Básica em seu art. 3o diz que:
Por educação especial, modalidade da educação escolar, entende-se um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades
71
educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica (grifos nossos). Parágrafo único. Os sistemas de ensino devem constituir e fazer funcionar um setor responsável pela educação especial, dotado de recursos humanos, materiais e financeiros que viabilizem e dêem sustentação ao processo de construção da educação inclusiva.
Sendo assim, relembrando os conceitos do Mazzotta (1982) trabalhados
no capítulo 1, no caso das alternativas (recursos e serviços educacionais
especiais), “as escolas especiais devem ser enfatizadas quando as necessidades
dos alunos assim o indicarem”; como também “redimensionar as classes especiais
e criar salas de recursos, de forma a favorecer e apoiar a integração em classes
comuns” no sentido de atender “conforme as necessidades da clientela,
incrementando se necessário, as classes especiais, salas de recursos e outras
alternativas pedagógicas recomendadas[...]” Portanto, essas considerações são
um indicativo de que “o caráter de restrição ao uso das escolas e classes especiais
como sinal de preferência pela classe comum foi praticamente anulado.” (GLAT;
FERREIRA, 2003, p. 7).
Há uma abertura expressa para o uso das mais variadas alternativas.
Além das ESCOLAS ESPECIAIS e das CLASSES ESPECIAIS, ainda se tratando
da EDUCAÇÃO ESPECIAL tem-se também a ação pedagógica desenvolvida em
núcleos ou centros de atendimento especializado, onde é necessária a participação
da família, da escola regular ou especial, bem como de profissionais de diversos
serviços (Saúde, Assistência Social, Trabalho, Justiça, Esporte etc). Ações que
podem apoiar o contexto inclusivo, de forma permanente ou temporária
principalmente por também se tratar de outras políticas sociais.
Ainda no estudo em questão, o papel das CLASSES ESPECIAIS
alocadas na escola regular, segundo o PNE – Plano Nacional de Educação (2001)
atende as seguintes situações: “[...] casos muito mais sérios, caracterizados por alto
grau de comprometimento mental ou por deficiências múltiplas, que exigem
atendimento educacional diferenciado em instituições especializadas.”
Salientamos que mesmo compreendendo a necessidade da ESCOLA
ESPECIAL e CLASSES ESPECIAIS, a educação inclusiva, de acordo com as
Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Especial na Educação Básica
(Resolução CNE/CEB No 02/2001), representa a mudança de postura da escola
regular, portanto, alterações no projeto político-pedagógico (PPP), no currículo, na
72
metodologia, na avaliação e nas estratégias de ensino (o que envolve valores e a
própria constituição dos saberes e da cultura escolar), favorecem a inclusão social.
Tais práticas educativas sendo diferenciadas aumentariam as oportunidades para o
atendimento desses alunos, não somente as pessoas com necessidades
educacionais especiais, mas os afro-descentes, as comunidades indígenas etc. Pois,
numa escola inclusiva a diversidade é valorizada em detrimento da uniformidade.
Entretanto existe um caso em particular no contexto das classes especiais
que poderia constituir um contexto inclusivo. Podemos citar como exemplo, a
necessidade das pessoas surdas no uso da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)
regulamentada pela Lei No 10.436/02 de 24 de abril de 2002. Direito resguardado
pelo item 19 da Declaração de Salamanca, que diz: “[...] a importância da linguagem
dos signos como meio de comunicação entre os surdos, por exemplo, deveria ser
reconhecida e provisão deveria ser feita no sentido de garantir que todas as pessoas
surdas tenham acesso à educação em sua língua nacional de signos.”
Portanto, uma sociedade inclusiva é aquela capaz de considerar as
necessidades da condição humana, encontrando meios para que cada cidadão, do
mais privilegiado ao mais comprometido, exerça o direito de contribuir com seu
melhor para o bem comum.
O estudo deste e de outros conceitos referente à Educação Especial e a
Educação Inclusiva auxiliam na compreensão das questões teóricas relativas ao
nosso estudo, assim como, compreender o espaço da nossa pesquisa. Para
conhecer e compreender as nuanças de uma política pública é necessário mergulhar
nas questões pertinentes a temática em questão para então ter mais clareza do
pretendido, do dito e do feito.
2.2 O Programa Nacional de Educação Inclusiva: Direito a Diversidade –
Conhecendo a Proposta e o Âmbito das Ações
A Educação Inclusiva é um movimento, sobretudo, social que
compreende a educação como um direito humano e elemento formador de uma
sociedade cidadã. De acordo com a LDB No 9394/96, os alunos têm direito: à
educação, permanência na escola, respeito à diversidade e a pluralidade de
culturas.
73
Figura 2 – Educação Inclusiva: direito à diversidade
Fonte: MEC/SEESP – 2003 – Figura 02
Para que tais direitos sejam respeitados e praticados, é necessário fomentar
a discussão no âmbito dos processos educativos. Tais debates servirão de base para
reorientar a educação regular contribuindo, assim, para a educação inclusiva. No
entanto, vale ressaltar que ainda encontramos no contexto inclusivo uma forma
fragmentada, visto que, trata-se de um programa de educação inclusiva que faz
referência somente a educação especial. Não negamos a necessidade de uma ação
específica, mas quando nos remetemos a acolher pessoas com necessidades
educacionais especiais ampliamos o nosso universo significativamente.
No caso do Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade (2003-
2006), o objetivo é a formação de gestores e educadores para efetivar a
transformação dos sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos,
tendo como princípio: a garantia do direito dos alunos com necessidades
educacionais especiais de acesso e permanência, com qualidade, nas escolas
regulares (BRASIL, 2005).
Os municípios que aderiram ao Programa estabeleceram uma relação
direta com o governo federal assumindo com a Secretaria de Educação Especial o
compromisso de serem multiplicadores de ações de formação de educadores,
organização do currículo e do espaço escolar para o atendimento educacional
especializado. Além disso, estabeleceriam parcerias e estimulariam a participação
da família com vistas a garantir o acesso e permanência de todos os alunos nas
74
escolas da rede regular de ensino. Para tanto, fundamenta-se nos seguintes
princípios (Brasil, 2005):
a) a identidade pessoal e social e a construção da igualdade na
diversidade;
b) a escola inclusiva é espaço de construção da cidadania;
c) o exercício da cidadania e a promoção da paz;
d) atenção às pessoas com necessidades educacionais especiais.
Divide-se em três campos que se inter-relacionam:
a) O município (que define o Plano Municipal de Educação, a Formação
Continuada de Professores etc);
b) A escola (que necessita se constituir como espaço inclusivo através do
Projeto Político Pedagógico, da Gestão Escolar e da Coordenação
Pedagógica, contando inclusive com a participação efetiva da
comunidade no cotidiano da instituição) e;
c) A família (que no processo cooperativo e coletivo precisa assistir e ser
acompanhada para que receba todo o atendimento especializado.
Nesse sentido, incluímos também as redes de apoio que podem ser
compostas pelas Secretarias de Ação Social e Saúde).
Inicialmente, em 2003, o trabalho envolveu 106 municípios-pólo se
comprometeram em atuar como multiplicadores para municípios da sua área de
abrangência, compreendendo cerca de 1.869 municípios. Nesse mesmo ano, os
dirigentes de educação especial dos municípios-pólo participaram, em Brasília, do I
Seminário Nacional Formação de Gestores e Educadores. O Ceará pertence ao
primeiro grupo que aderiu ao programa tendo como pólos os municípios de
Fortaleza, Cascavel, Juazeiro do Norte e Sobral. As atividades iniciais do programa
visavam o mapeamento das necessidades de cada município, inclusive daqueles
que faziam parte da área de abrangência. E como começar?
De fato as atividades nos municípios pólos só poderiam iniciar em 2004,
com a assinatura do termo de adesão ao Programa para então receber apoio
75
financeiro (viabilizado através do PNUD17) e realizar a multiplicação das idéias de
inclusão na área de abrangência do mesmo. A proposta foi realizar um curso de
formação de gestores e educadores para as suas respectivas redes de ensino e
outro para os municípios de sua área de abrangência.
Como seriam essas formações? Tal formação é oferecida primeiramente
a partir de “pacotes fechados para os gestores multiplicadores, que são capacitados
em Brasília durante uma semana, recebendo um conjunto de apostilas prontas, e
seguindo para servir como pólo de disseminação da política de inclusão nas
regiões.” (MENDES, 2006, p. 399). Depois desse momento os municípios-pólo
encaminhariam a mesma experiência para a sua área de abrangência.
Atrelado a esse processo era indicado dentro das apostilas um
levantamento da demanda, das condições dos municípios (prioritariamente a
formulação ou reformulação de um Plano Municipal de Educação que contemple a
discussão sobre inclusão e diversidade) e das possibilidades de formação de redes
de apoio (no caso, saúde, assistência social etc). Vale ressaltar que todo esse
processo de organização das condições de inclusão era tarefa dos municípios-pólo
sem apoio financeiro do programa reafirmando assim, a política de municipalização
do ensino.
Por se tratar de um programa de formação, em abril de 2005, aconteceu o
II Seminário Nacional de Formação de Gestores e Educadores do Programa
Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, contando com a participação de
representantes de municípios e das secretarias estaduais de educação. A temática
abordada envolveu questões específicas da educação especial. Nesse Seminário
também foi formado mais um grupo de 38 pólos. Desta forma, o Programa contou
com a participação de 2003 a 2005 um total de 54.467 profissionais da educação
(BRASIL, 2006).
O escopo do programa propõe ainda a distribuição de materiais
pedagógicos, mobiliários, entre outros equipamentos, no intuito de implantar salas
de apoio multidisciplinar. Entre 2003 e 2005, se propôs a distribuir através Plano
Nacional do Livro Didático (PNLD) livros impressos em Braille. Além disso,
compunha o pacote, “Kits específicos para alunos cegos” – contendo material
17 O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD vem atuando desde 2000 junto a Secretaria de Educação Especial no Ministério da Educação através do setor de Política Públicas Sociais no Programa de Expansão e Melhoria da Educação Especial.
76
escolar apropriado para esses alunos e no caso da deficiência auditiva, foram
organizados livros digitais em LIBRAS de literatura infanto-juvenil (por exemplo, Alice
no País da Maravilhas, Iracema, Pinóquio, Aladim etc). Material que começou a
chegar a Sobral em meados de 2006.
Além dos recursos pedagógicos, agregou-se ainda o material para a
formação dos docentes – “Educar na Diversidade” – produto de um projeto intitulado
Educar na Diversidade nos Países do Mercosul. Este projeto que visava encontrar
um meio eficaz de combater a exclusão social e promover a inclusão social envolveu
em sua produção, os Ministérios da Educação da Argentina, Chile, Paraguai e
Uruguai e vinte e cinco escolas distribuídas nestes países.
Figura 3 – Material de Formação Docente
Fonte: MEC/SEESP – 2005
Iniciado em 2005 o projeto de formação docente foi inserido no Programa
Nacional de Educação Inclusiva: Direito a Diversidade, tendo por objetivo ajudar na
consolidação da política nacional de educação inclusiva, fomentando a formação de
educadores das escolas dos municípios pólos em todo o País (BRASIL, 2005b).
Em agosto de 2006, já tendo aproximadamente dois anos de existência, o
programa realizou o III Seminário Nacional de Gestores e Educadores com o intuito
de avaliar o andamento das atividades. Essa avaliação baseava-se na análise de
dados resultados de uma pesquisa junto aos municípios-pólo.
Foram enviados instrumentais em abril de 2006 para aferir as seguintes
informações: dados comparativos relacionados ao Censo Demográfico e o Censo
77
Escolar; público atendido e não atendido pelo programa; formação continuada de
professores; formação das redes de apoio (saúde, promoção social, transportes
etc) e as contribuições do programa para constituição do atendimento
educacional especializado. De acordo com os conceitos de educação especial
descritos no Censo 2005, o atendimento educacional especializado pode ser de
quatro tipos, a saber:
1. Apoio pedagógico especializado: Atendimento educacional
especializado, realizado preferencialmente na rede regular de
ensino, ou, extraordinariamente, em centros especializados para
viabilizar o acesso e permanência, com qualidade, dos alunos com
necessidades educacionais especiais na escola. Constitui-se de
atividades e recursos como: Ensino e interpretação de Libras,
sistema Braille, comunicação alternativa, tecnologias assistivas,
educação física adaptada, enriquecimento e aprofundamento
curricular, oficinas pedagógicas, entre outros.
2. Atendimento pedagógico domiciliar: Alternativa de atendimento
educacional especializado, ministrado aos alunos com
necessidades educacionais especiais temporárias ou permanentes,
em razão de tratamento de saúde, que implique permanência
prolongada em domicílio e impossibilite-os de freqüentar a escola.
3. Classe hospitalar: Alternativa de atendimento educacional
especializado, ministrado aos alunos com necessidades
educacionais especiais temporárias ou permanentes, em razão de
tratamento de saúde, que implique prolongada internação
hospitalar e impossibilite-os de freqüentar a escola.
4. Estimulação precoce: Atendimento educacional especializado a
crianças com necessidades educacionais especiais do nascimento
até os três anos de idade, caracterizado pelo emprego de
estratégias de estimulação para o desenvolvimento físico, sensório-
perceptivo, motor, sócio-afetivo, cognitivo e da linguagem.
78
No caso do Pólo de Sobral, objeto de nosso estudo, o trabalho refere-se
mais especificamente a uma tentativa de constituir-se como apoio pedagógico
especializado. Segundo as orientações do Ministério da Educação o apoio
pedagógico especializado (descritas no item 1) remete-se a uma série de ações e
recursos específicos para atender a necessidade de cada aluno. Recursos de ordem
física, pedagógica (o que inclui alterações no currículo) entre outros. O caso é que
Sobral, como veremos mais a frente, ainda está buscando consolidar essa prática.
Entenderemos melhor essa afirmação quando detalharmos as questões específicas
do trabalho desenvolvido na rede municipal de ensino da cidade.
Do ponto de vista estatístico a pesquisa apresentou vários resultados
(matrículas, formação de professores, provimento de recursos etc), dentre eles
apontamos o aumento no acesso à educação escolar principalmente na Educação
Infantil e no Ensino Fundamental. Veja o gráfico a seguir:
Gráfico 3 – Municípios-pólo que ampliaram o atendimento dos alunos com N.E.E na
educação infantil e ensino fundamental
Fonte: MEC/SEESP – Pesquisa nos Municípios Pólos – Agosto 2006
É necessário lembrar que os dados referem-se à matrícula e só estar
formalmente matriculado na escola não indica que essas crianças estejam incluídas.
Ainda sobre essa pesquisa realizada junto aos municípios-pólos, cujo resultado foi
publicado em agosto de 2006, um quadro interessante é revelado no que se refere à
formação dos professores – a redução no percentual de municípios-pólo que
ofereceram formação para os docentes, veja a seguir:
90,3%84,7%
57,3%
38,7%34,7%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
80,0%
90,0%
100,0%
2002 2003 2004 2005 2006
79
66,7%64,2%
41,5%
26,8%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
80,0%
2003 2004 2005 2006
Fonte: MEC/SEESP – Pesquisa nos Municípios Pólos – Agosto 2006
Gráfico 4 – Municípios-pólo que ofereceram formação para professores pelo Programa
Educação Inclusiva
Fonte: MEC/SEESP – Pesquisa nos Municípios Pólos – Agosto 2006
Tal fato se deve ao “estímulo” ou “convite” aos municípios tomarem a
iniciativa de fomentar sistemas educacionais inclusivos. O resultado foi o
crescimento nas iniciativas locais, em que os municípios dispõem de seus
próprios recursos para viabilizar a formação de professores. É necessário lembrar
que os municípios também recebem as verbas do Fundef (1996-2006) que
contempla o ensino fundamental e, desde 1995, o Ceará organiza-se através de
um projeto de municipalização do ensino. Veja o gráfico 5, a seguir, resultado da
pesquisa de 2006:
Gráfico 5 – Municípios-pólo que Municípios-pólo que ofereceram formação para professores
em Educação Inclusiva através de outros programas com recursos do próprio
município
Fonte: MEC/SEESP – Pesquisa nos Municípios Pólos – Agosto 2006
67,5%
94,3%
62,6%
11,4%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
80,0%
90,0%
100,0%
2003 2004 2005 2006
80
Vale ressaltar que os professores em formação, segundo documentos
orientadores do programa devem ser prioritariamente o profissional de escola regular
ressaltando assim o espaço como lócus para a educação inclusiva.
Ao final de 2006, o mapeamento dos multiplicadores do programa chega
a 86% do total dos municípios brasileiros, ou seja, 4646 cidades, através de 144
municípios-pólo. Um número expressivo diante da totalidade de municípios
brasileiros ainda não seriam contemplados (918), apenas 14 %, ainda não estariam
participando desse processo, veja o mapa a seguir:
Mapa 1 – Mapeamento dos 144 municípios-pólo que compõem a base de multiplicação do programa
Fonte: MEC/SEESP – 2006
Podemos refletir que um estudo estatístico revela algumas questões
importantes, mas aponta a necessidade de aproximação. E antes de nos
81
lançarmos no contexto escolar, é preciso tecer os caminhos, as possibilidades e
os entraves presentes no contexto das políticas educacionais do município que é
palco de nosso estudo.
Portanto, agora é momento para cotejar se os resultados alcançados
nesse determinado espaço (no caso Sobral) coadunam os elementos constitutivos
da educação inclusiva.
2.3 A Interface Federal-municipal: as Políticas Educacionais de Inclusão no
Município de Sobral pós 199018
De acordo com informações encontradas no sítio19 da prefeitura de
Sobral, fundada em 05 de julho de 1773, trata-se de um dos 184 municípios do
Estado do Ceará. Localiza-se na região noroeste, no semi-árido, a 230 km de
Fortaleza. Tem como extensão territorial 2.123 Km². Possui aproximadamente
175.000 habitantes.
É nesse cenário da educação municipal em Sobral que constituímos o
nosso campo de investigação. Mas antes é necessário e oportuno conhecer
algumas intervenções já realizadas no intuito de atender as pessoas com
necessidades educacionais especiais.
Antes de iniciar uma conversa sobre as questões atuais na Educação em
Sobral, faremos um breve resgate do movimento para educação especial no
município. A Educação Especial até bem pouco tempo não tinha um espaço
demarcado nas discussões e nas políticas educacionais sobralenses. Contava-se
com a sensibilidade de pessoas na sociedade que tinham alguém na família com
deficiência ou trabalhavam diretamente com as questões sociais.
Em 1990, espelhados na indicação das Constituições Federal e
Estadual, o município aprova a sua Lei Orgânica Municipal que prevê em seu
artigo 174: “A educação é direito de todos e dever do Município e da família, será
18 O contexto descrito nesse item é baseado em entrevista semi-orientada realizada com a técnica responsável pelo setor de Educação Especial da Secretaria Municipal de Educação associado aos dados aferidos em planilhas, projeto, e quadro descritivos de atividades. Destaca-se que não há relatório de gestão que caracterize as ações desenvolvidas no âmbito da Educação Especial. O que se tem são relatórios dos trabalhos desenvolvidos por cada professor de apoio pedagógico. As demais informações foram aferidas no site do município da Secretaria de Educação de Sobral, INEP e MEC e também de relatos informais de alunos (professores de apoio pedagógico específico à época) no período em que a autora ministrou a disciplina Didática, Currículo e Planejamento na Educação Inclusiva em curso de Especialização Lato Sensu em Educação Inclusiva (UVA, 2006). 19 www.sobral.ce.gov.br
82
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania, e sua
qualificação para o trabalho.”
No que se refere especificamente a educação especial em seu Art. 175,
inciso II delibera que o “município manterá o atendimento educacional aos
portadores de deficiências físicas e mentais.” Mesmo com essa indicação da
legislação municipal, a educação não conseguiu dar respostas a essa necessidade.
Foi então que no mesmo ano, por iniciativa de um grupo de comerciantes e
empresários locais e contando também com a colaboração, à época, de pais e
amigos dessas crianças foi criada a APAE – Sobral. A instituição iniciou seus
trabalhos, a exemplo de outras APAE’s, desenvolvendo atividades de reabilitação e
habilitação, além de socializá-los, buscando a integração na sociedade.
Dentro da mesma proposta, mas direcionado a Educação tem-se a APAE
Educadora20 – Escola que desenvolve o trabalho educacional através de atividades
pedagógicas e ensino profissionalizante. É um segmento da instituição com
professores e profissionais da área da saúde como: fisioterapeuta, fonoaudiólogo,
psicólogo, psiquiatra, assistente social e dentista. Desse modo, os alunos não
precisam se deslocar da escola para receberem atendimento médico, o mesmo é
feito na própria unidade. Diante de uma realidade restrita, essa era a instituição mais
indicada para o atendimento de pessoas com necessidades educacionais especiais.
Somente em meados da década de 1990, começaram as mudanças no
contexto educativo em geral e apontamos o governo Cid Gomes (1997-2000), sob o
lema “Sobral no Rumo Certo”, o momento em que algumas discussões para o
atendimento das pessoas com necessidades educacionais especiais foram
fomentadas. Inicialmente no que se refere à educação básica (ensino fundamental).
Entre 1997 e 2000, a rede de ensino de Sobral/CE, assim como em muitos municípios brasileiros, passou por importantes mudanças em função da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e, sobretudo, do impacto causado pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Magistério (Fundef). (BRASIL, 2005, p. 5).
20 Atualmente a APAE – Sobral funciona à Rua Antônio Carlos s/n, bairro do Junco, em dois prédios, que funcionam em dois turnos, oferecendo atendimento na área da saúde e da educação para aproximadamente 250 crianças.
83
Os recursos do Fundef (1996-2006) aliados à política de
municipalização do ensino no Estado, iniciada em 1995, demandaram para o
município a reconstrução de prédios escolares, realização de concursos públicos
e na habilitação de professores. No que se refere à Educação Especial não
representou a abertura imediata de vagas para os alunos com necessidades
educacionais especiais, mas em 1998, um ano após a criação da Política
Estadual de Educação Especial (1997) inicia-se a primeira tentativa para
vivenciar o processo inclusivo. Isto se deve à busca junto à SEDUC de
informações para implantar o núcleo de apoio pedagógico especializado descrito
como proposta de atendimento no documento estatal.
A justificativa dada relacionava-se com fato de que as escolas municipais
à época, estavam em processo de reforma ou construção. Os espaços para a
imediata implantação do núcleo não puderam ser viabilizados. A quantidade de
alunos era imensa e as escolas já estavam sobrecarregadas. A prioridade era alocar
as crianças que já estavam matriculadas. Sobre esse episódio tem-se o relato da
técnica responsável pela Educação Especial em Sobral: “Não tivemos como
conseguir esse espaço dentro de uma escola. Não foi criado o núcleo, mas mesmo
assim, começamos a esboçar um projeto de atuação dos professores de apoio nas
escolas e isso de fato só veio a se concretizar em 2003.” Sendo assim, não se
obteve uma oportunidade de ação concreta, mas a idéia de inclusão já fazia parte
das discussões da Secretaria de Educação de Sobral.
Em 2000, “uma pesquisa sobre os níveis de leitura dos alunos que
estavam em vias de conclusão da 2a série do ensino fundamental verificou que
metade das crianças não sabia ler.” (BRASIL, 2005, p. 15). Após a constatação do
déficit de leitura nas séries iniciais, alfabetizar os alunos tornar-se a maior meta do
município. Para tanto, foi necessário repensar algumas questões circundantes à
prática educativa: metodologia de ensino, avaliação, acompanhamento etc. São
essas ações que se integraram na dinâmica de trabalho para reverter o quadro
situacional do município. Aliado ao redimensionamento pedagógico foi criado um
sistema de premiação que em alguns momentos parece favorecer o processo, mas
também “espera” por resultados. No tocante ao público da Educação Especial, de
acordo com o Censo Demográfico de 2000 tem-se a seguinte configuração:
84
Sobral/CE População
Total
População com Deficiência População de 0 a 19 anos com Deficiência
172.685 24.950 4.038 Fonte: IBGE - Censo Demográfico/2000
A população com deficiência representada através da tabela acima,
perfaz aproximadamente 14% da população sobralense e desses 16% estão em
idade escolar (Educação Básica). Um dado estatístico que apresenta um número
expressivo de alunos que estão ou poderiam estar nas escolas. O quadro
apresentado pelo Censo de Demográfico de 2000 é pano de fundo para as
discussões no segundo governo de Cid Gomes.
Em 2001, Gomes é reeleito em Sobral e a gestão municipal (2001-2004)
tem como propósito dar continuidade às ações para a melhoria na qualidade da
educação do município. A fórmula de organização do ensino que começou a ser
implantada em 2001/2002, tendo o suporte da lei municipal No 342, de 05 de março
de 2002 que institucionalizava a gratificação mensal para os professores
alfabetizadores que atingissem a meta estipulada para o ano letivo. Essa lei foi
regulamentada, em 2003, pelo Decreto No 588 que estabelece que os critérios para
a concessão da gratificação para os professores alfabetizadores. Um e o mais
definidor deles são os resultados obtidos na avaliação externa da aprendizagem.21
Essa priorização da alfabetização dos alunos dá à rede municipal de educação o
reconhecimento do Instituto Nacional de Estudo e Pesquisas Anísio Teixeira através
do Projeto Boas Práticas na Educação.22
Não adormecida, mas amadurecida, a proposta para o atendimento dos
alunos com necessidades educacionais especiais, resultou no Projeto de Apoio aos
Alunos Portadores de Necessidades Educativas Especiais e Dificuldades de
Aprendizagem (2003) inspirado nas idéias descritas na Política do Estado e no
documento para a criação do núcleo de apoio pedagógico especializado e salas de
apoio específico. Tal iniciativa justificou-se pela busca de uma “Escola para Todos”
no intuito de promover a melhoria do processo de ensino-aprendizagem. Mesmo
pensando na universalização do acesso ao ensino regular, vale destacar que até
21
Foi idealizado e implementado pelo professor Edgar Linhares. 22 Em 2005 (ano em que o município ainda esperava melhorias mais expressivas no processo de alfabetização), foi lançado um livro relatando a experiência educativa em Sobral.
85
então o espaço da Educação Especial na Secretaria ainda não era demarcado,
pertencendo ao setor de Planos, Projetos e/ou Programas.
O Projeto teve início com a adesão espontânea de vinte e seis
professores indicados por seus respectivos diretores. Ao mesmo tempo em que o
processo de formação foi iniciado, os professores já vivenciavam as primeiras
experiências no apoio a esses alunos. O trabalho caracterizava-se por atendimentos
individuais ou em grupos num espaço que não era a sala de aula regular.
Os primeiros resultados obtidos nesses primeiros meses do projeto foram
aferidos através de formulários para a Avaliação de Desempenho dos Professores
de Apoio Pedagógico formulados pela equipe de Educação Especial da Secretaria
de Educação e foram distribuídos para 36 escolas com a devolução de 19
preenchidos, e estes embasaram a análise. Os resultados obtidos foram
organizados da seguinte forma (SOBRAL, 2003):
a) Motivos pelos quais as escolas optaram pelo projeto – as respostas
apontam a necessidade de um acompanhamento especializado,
grande quantidade de alunos com dificuldades de aprendizagem,
abertura para inclusão etc;
b) Critérios para a escolha do Professor de Apoio Pedagógico Específico
– foram indicados critérios de ordem profissional (assiduidade,
pontualidade, responsabilidade) e também de ordem afetiva
(afetividade, afinidade com o trabalho, gostar de crianças);
c) Expectativas com relação à atuação do Professor de Apoio
Pedagógico Específico – revelam que há expectativas que circundam
o processo de desenvolvimento do aluno e a sensibilização das
famílias.
d) Resultados da atuação do Professor de Apoio Pedagógico Específico
– 17 diretores apresentaram uma avaliação satisfatória no que se
refere à atuação dos professor de apoio no processo de inclusão dos
alunos com necessidades;
e) Sensibilização da Comunidade Escolar – das 19 escolas, 13 diretores
consideram satisfatório o processo de sensibilização junto à
comunidade escolar, 2 avaliaram como insatisfatório e 4 afirmaram
que o mesmo ainda não começou nas suas respectivas escolas;
86
f) Avaliação do Processo de Formação dos professores – 17 diretores
afirmaram que a formação promovida pela Secretaria proporcionou
uma maior segurança e um trabalho com mais conteúdo e troca de
experiências. Apenas 1 diretor disse desconhecer esse processo, pois
as informações não foram repassadas para a escola;
g) Permanência do Projeto de Apoio aos Alunos com Necessidades
Educacionais Especiais e Dificuldades de Aprendizagem – todos os
diretores consideram importante a continuidade do projeto em suas
escolas; e,
h) Sugestões – no âmbito das sugestões estão: a ampliação da carga
horária de trabalho dos professores (pois eles só trabalham um turno),
outras formações, material didático-pedagógico e um
acompanhamento sistemático e permanente dos técnicos da
Secretaria de Educação juntos aos professores de apoio.
O produto dessa avaliação que contemplou a visão dos gestores
escolares sobre o projeto, afirmou a relevância do trabalho desenvolvido e, de certa
forma, preparou para o começo de uma proposta que tinha como objetivo a
ampliação das atividades, não somente no contexto municipal, mas também em
outras localidades circunvizinhas. No entanto, no que se refere aos critérios de
escolha dos professores de apoio nos chamou atenção o indicativo para o “gostar de
crianças.” Cabe a todo professor que se propõe trabalhar na educação infantil e
ensino fundamental ter afinidade com o público atendido. Vale ressaltar também que
essa questão afetiva não é pertinente apenas aos alunos com necessidades
educacionais especiais, mas a qualquer outro discente que esteja na sala de aula
em processo educativo.
De acordo com o cenário nacional, em 2003, o Programa Educação
Inclusiva: Direito a Diversidade, detalhado no item anterior, passa a fazer parte da
educação cearense. No Ceará, Sobral23 torna-se pólo juntamente com Fortaleza,
Cascavel e Juazeiro do Norte para a construção de sistemas educacionais
inclusivos. Quais os valores que podem efetivar um sistema educacional inclusivo?
De acordo com (CARVALHO, 2004, p. 79) são resumidamente estes:
23 Um dos possíveis motivos para a escolha do município refere-se às mudanças que estavam acontecendo no sistema de ensino relacionadas à melhoria nos indicadores educacionais.
87
• o direito à educação;
• o direito à igualdade de oportunidades, o que não significa um
“modo igual” de educar a todos e sim dar a cada um o que
necessita, em função de suas características e necessidades
individuais;
• escolas responsivas e de boa qualidade;
• o direito a aprendizagem; e
• o direito a participação.
Constituir esses valores não é tarefa fácil. No caso de Sobral,
relembramos que a equipe da Secretaria de Educação iniciou um trabalho com essa
perspectiva através do Projeto de Apoio aos Alunos Portadores de Necessidades
Educativas Especiais e Dificuldades de Aprendizagem (2003) (descrito no item 2.2).
Uma ação desenvolvida pelo município no intuito de melhor atender aos alunos com
necessidades educacionais especiais e também as crianças com dificuldades de
aprendizagem. Objetivos que, de certa forma, coadunam com algumas indicações
do programa de educação inclusiva, indicam a continuidade do projeto. É claro que
o trabalho deve ir além da presença de um professor de apoio pedagógico, mas a
aproximação e a intenção de constituir um sistema inclusivo merecem nossa
atenção. Sendo assim, o projeto já em andamento, torna-se uma forma de
materialização das intenções pertencentes ao programa.
Em Sobral, o programa “chegou” ainda em 2003, mas, devido ao término
de ano letivo, os trabalhos só iniciaram no início de 2004, com o mapeamento da
demanda e das principais prioridades relacionadas às pessoas com necessidades
educacionais especiais. No primeiro ano do projeto (considerado pelo município
como parte das ações programa de educação inclusiva), os professores de apoio
receberam nas escolas um total de 705 alunos com os mais variados tipos de
deficiências e dificuldades de aprendizagem, conforme mostra o gráfico 6:
88
Demanda de Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais atendidas pelo Programa
Educação Inclusiva: Direito a Diversidade em Sobral - 2004
1,5% 11%5%1,5%5%
76%
Física Mental
Auditiva Visual
Multiplas Dificuldades de Aprendizagem
Gráfico 6 – Demanda de pessoas com necessidades educacionais especiais atendidas pelo
Programa Educação Inclusiva: Direito a Diversidade em Sobral – 2004
Fonte: Gráfico baseado em dados da Secretaria de Educação do Município de Sobral/ Equipe de Educação Especial (2004)
Esses foram dados aferidos pela Secretaria de Educação do Município
através de uma ação conjunta com os agentes de saúde no formato de tabela.
Elaboramos essa disposição na forma de gráfico para melhor visualizar e perceber
algumas questões relevantes.
A primeira delas é que o número mais representativo no atendimento
através do programa são as pessoas com dificuldades de aprendizagem. Enquanto
que as demais deficiências atingem até 23% do público atendido. Nesse sentido,
podemos formular algumas hipóteses para tentar compreender o gráfico acima: uma
delas refere-se ao diagnóstico. É possível que os agentes de saúde junto aos
professores (ambos poderiam não ter conhecimento mais aprofundado acerca das
NEE) tenham cometido alguns equívocos.
Outra seria a dificuldade da família em compreender a necessidade desse
trabalho juntos aos alunos. E ainda, o fato do projeto da Secretaria de Educação
também contemplar as pessoas com dificuldades de aprendizagem. Tais afirmações
por serem proposições são passíveis de constatação ou não. A resposta só será
possível no encontro entre teoria e empiria proporcionado pelo trabalho de campo.
O fato é que esse processo tem se repetido anualmente, nos primeiros
dias letivos sendo realizado, a partir de 2005, pelos professores de apoio
pedagógico específico (PAPE) utilizando instrumentais criados pela Secretaria de
Educação do Município. Agregado a esse levantamento anual de demanda e aos
89
trabalhos desenvolvidos pelos professores com alunos, acontecem também as
formações continuadas realizadas com os profissionais do chamado apoio
específico. Em 2005, a formação foi viabilizada através do material Educar na
Diversidade com orientações para o desenvolvimento dos trabalhos pedagógicos e
debates sobre as questões pertinentes a educação inclusiva. Vale ressaltar que
essa formação tem sido o suporte para entender e fomentar o processo de inclusão
nas escolas municipais em Sobral, no entanto, o material ainda não faz parte do
cotidiano do professor da sala de aula regular. O que nos chama atenção, pois o
professor da classe comum, segundo o movimento inclusivo e as diretrizes do
Programa Educar para Diversidade, lida diretamente com esse público.
Nesse biênio (2004/2005) também foram organizados os seminários (a
espelho dos realizados em âmbito nacional) junto aos 44 municípios da área de
abrangência com o intuito de disseminar a política inclusiva e as experiências
vivenciadas nos municípios. Vale ressaltar, que a cada seminário que acontecia em
âmbito nacional era indicado à realização de uma mesma experiência nos
municípios-pólo, vale ressaltar que a verba encaminhada só contemplava esse fim.
Além dos seminários, a representante do programa na Prefeitura de
Sobral, utilizando recurso do município, realizou algumas visitas in loco em cidades
vizinhas para divulgação das linhas de ação do programa e da experiência
desenvolvida nas escolas sobralenses. Em entrevista, ela relata a existência de
municípios muito pequenos que já começaram a implantar o mesmo modelo de
Sobral, e acrescenta que devido ao tamanho desses locais há uma viabilidade maior
para que a Secretaria da própria cidade monitore o caminhar do projeto. Acrescenta
ainda, que esse período foi também o momento de compreender algumas questões
próprias dessa nova realidade educativa.
Uma delas foi perceber como seria o acesso dos alunos com
necessidades educacionais especiais nas escolas regulares, pois a prioridade
estabelecida, através de programas e projetos, era a reversão do quadro de
analfabetismo. É fato que em alguns casos, a criança por ter uma necessidade
educacional especial não necessariamente aprende no mesmo tempo e ritmo das
outras. Nesse sentido, a meta estabelecida para o município poderia “esbarrar” em
resultados aparentemente insatisfatórios. Então, quais os passos trilhados na
tentativa de construir um contexto inclusivo?
90
No caso do contexto educacional sobralense24, o primeiro exercício foi
esboçar um perfil para esse profissional que passaria a fazer parte da escola. Afinal
uma parte expressiva desse processo passaria pela a ação do professor de apoio
pedagógico específico nas escolas.
Em linhas gerais, “o professor de apoio é um educador, um profissional da
área da educação. [...] Seu papel junto às escolas é de ser o multiplicador das idéias
de inclusão” (trecho retirado de entrevista semi-estruturada realizada com a
coordenadora da equipe de Educação Especial em Sobral). Nesse sentido,
percebemos que há uma consonância com a proposta nacional, pelo menos no que
se refere à idéia de multiplicador. Portanto, é através dele que a educação no
município busca concretizar o contexto inclusivo. Eis algumas de suas atribuições
organizadas a partir do que se concebia como responsabilidade para esse
profissional no contexto da escola regular:
• propiciar reflexões junto à comunidade escolar, auxiliando-a a
repensar seus valores e crenças com relação à inclusão
educacional dos alunos com NEE;
• realizar um censo junto aos alunos matriculados na escola para
identificar os tipos de necessidades educacionais especiais
(deficiência física, mental, auditiva, visual, múltipla, surdo cegueira
e dificuldades de aprendizagem associadas às condutas típicas) e
quais turmas e turnos estão alocados;
• participar dos planejamentos pedagógicos da escola, apresentando
sugestões para os professores de sala de aula regular,
favorecendo as adaptações curriculares necessárias;
• acompanhar individualmente ou em pequenos grupos (de até 4
alunos), os alunos com NEE, planejando e executando
atividades, preferencialmente lúdicas, que promovam o
desenvolvimento das potencialidades dos mesmos, não
esquecendo de observar o tipo de dificuldade/deficiência do
aluno e seu nível de desenvolvimento cognitivo, psicomotor e
psicossocial em que os mesmos se encontram;
24 Aqui nos referimos à experiência vivenciada no contexto educativo da cidade de Sobral de forma individual.
91
• elaborar bimestralmente o Plano Individual de Ensino – PIE para
cada aluno ou grupo de alunos (de até 4 alunos) no qual deverá
constar: os objetivos a serem atingidos, conteúdos trabalhados,
tempo previsto para o trabalho com cada conteúdo, metodologia e
material didático utilizados e avaliação descritiva;
• interagir com as famílias dos alunos com necessidades
educacionais especiais e com os profissionais de saúde (PSF,
CAPS, Núcleos de Saúde Integral etc) no sentido de realizar o
acompanhamento na relação família/escola/aluno.
Nota-se além desse leque de atribuições complexas, o fato de
focalizar toda a proposta em uma única pessoa não nos parece o mais
adequado. A constituição de um sistema educacional inclusivo não se restringe
apenas à relação professor – aluno na sala regular, e tampouco somente com o
professor de atendimento especializado, mas à comunidade escolar em sua
dimensão mais abrangente.
Outra questão pertinente refere-se ao Censo, a identificação das crianças
com necessidades educacionais especiais em dados momentos é nítida, mas
existem casos em que a detecção precisa do auxílio de vários especialistas para um
diagnóstico mais preciso.
Já no que concerne ao trabalho desenvolvido pelo professor de apoio,
à utilização de um instrumento de acompanhamento individual (PIE – Plano
Individual de Ensino) auxilia na detecção dos avanços e também das
fragilidades. E é nesse momento que o trabalho junto aos outros profissionais é
sempre uma boa alternativa.
No entanto, é necessário ressaltar que mesmo com algumas observações
a presença de um articulador dessa proposta de inclusão contribui para que algumas
questões sejam repensadas. Uma delas é o acesso, em análise as matrículas na
Educação Especial (2002-2005) observamos uma ampliação nas matrículas à escola
regular enquanto que há um decréscimo nas matrículas em escolas especiais (no
caso das classes especiais apenas uma foi detectada na rede estadual de ensino de
Sobral). É o que contatamos, pelo gráfico 7:
92
Gráfico 7 – Evolução de matrículas na educação especial entre 2002 e 2005 – Sobral/CE Fonte: MEC/INEP - Censo Escolar/2005
Em contrapartida, no levantamento feito pela Secretaria de Educação
Especial (SEESP/MEC), em abril 2006, junto aos municípios-pólo e apresentado no
III Seminário Nacional de Gestores e Educadores foi constatado ainda um número
significativo de alunos não matriculado na rede de ensino regular de Sobral:
Tabela 2 – Identificação de pessoas com deficiência não-matriculadas
2003 2004 2005 2006 - 726 447 559
Fonte: MEC/SEESP – Pesquisa nos Municípios-pólo/2006
Mesmo diante dessa realidade, temos alguns avanços no que se refere
à formação dos professores vinculados ao projeto. Em 2006, foi enviado ao FNDE
um projeto para a formação desse professores, tendo em vista a necessidade de
subsídio financeiro. Conforme já mencionado o programa tem também como meta
impulsionar os município a busca de recursos. A programação do ano foi
organizada a partir desse recurso e contemplou as seguintes temáticas nos
encontros de formação:
a) Noções Básicas sobre Braille no processo de alfabetização de
alunos com deficiência visual;
b) O processo de “Inclusão na Sala de Aula” (Legislação e Adaptações
Curriculares);
87,7% 85,6%
46,4%
28,5%
12,3% 14,4%
53,6%
71,5%
0,0%10,0%20,0%30,0%40,0%50,0%60,0%70,0%80,0%90,0%
100,0%
2002 2003 2004 2005
Matrículas em Escolas Especiais/Classes EspeciaisMatrículas em Escolas Regulares/Classes Comuns
93
c) O processo de “Inclusão dos alunos com necessidades
educacionais na rede regular de ensino”;
d) Noções Básicas de LIBRAS;
e) Método de Alfabetização Dr. Oscar Oñativia – método integral25 /
aquisição da leitura e da escrita em dificuldades específicas de
aprendizagem;
f) III Seminário do Programa Educação Inclusiva: Direito a
Diversidade com os municípios de abrangência.
Diante da organização de uma formação contínua é necessário enfatizar
a intenção de contemplar os conceitos de inclusão sempre aliados a meta maior do
município – a alfabetização, e direciona-se apenas para o professor de apoio
pedagógico. Em dezembro de 2006, concluídas as atividades de formação contínua,
foi realizada uma outra avaliação com os professores de apoio apresentando os
seguintes resultados:
a) Avanços – descreve-se uma melhor aceitação dos professores de
apoio tanto pelo professores da sala de aula regular quanto pelo
núcleo gestor. O processo de formação continuada. Uma maior
aproximação entre Educação e Saúde através do PSF (Programa
Saúde da Família) etc;
b) Dificuldades – Limitações de ordem de estrutura física e pedagógica
(espaço inadequado, falta de material, de jogos pedagógicos,
transporte para os alunos etc);
c) Sugestões – As sugestões apresentadas vislumbravam questões de
ordem profissional vinculadas ao cotidiano de trabalho (reajuste
salarial, formação continuada com troca de experiências, espaço
adequado para acompanhamento de alunos, material didático
pedagógico etc).
25 Criado na Argentina como método de alfabetização, vem sendo utilizado também em outros países, como o Brasil e a Espanha, no âmbito da Educação Especial, com o objetivo de atender as necessidades educacionais de deficientes visuais e auditivos, indivíduos com distúrbios da comunicação, paralisia cerebral, deficiência mental, entre outros. Para obter mais informações sobre a descrição do método consultar o livro: Método integral: aquisição da leitura e da escrita em dificuldades específicas de aprendizagem de Ana Cecília Oñativia da Memnon Edições Científicas publicado em 2000.
94
Dentre os avanços a formação continuada (espaço de aprendizado e
trocas de experiências) e a parceria com Secretaria de Saúde foram apontadas com
bastante relevância. Entendemos que o acesso à atenção básica (no caso, no PSF)
pode proporcionar uma maior qualidade de vida para a criança, principalmente
aquelas que possuem algumas limitações significativas.
Por outro lado, dentre as dificuldades apresentadas, encontramos
deficiências no que se refere à acessibilidade e suporte pedagógico. Além disso,
temos uma em específico, que merece uma atenção especial – “A avaliação externa
não proporciona a inclusão.” (resposta retirada de um dos questionários de
avaliação das atividades do ano 2006). É o conflito entre avaliação convencional
versus avaliação adaptada ou avaliação na perspectiva inclusiva.
A avaliação externa da aprendizagem é, em termos gerais, a aferição da
leitura e da escrita através de instrumentais (oral e escrito) feitos e aplicados por
uma equipe da Secretaria de Educação Municipal para monitorar a aquisição de
leitura e da escrita dos alunos das séries iniciais. Posteriormente são medidos os
níveis de leitura e escrita das turmas avaliadas. É importante destacar que esse
mecanismo foi criado também com o intuito de ajudar as escolas a melhorarem seus
índices nas avaliações nacionais (como, por exemplo, o Prova Brasil).
A questão é que foi criado um mecanismo de incentivo que acabou
contribuindo para um “clima” de diferenças entre as escolas. A unidade escolar que
atingir a meta é “premiada” (gratificação) e é nesse contexto que alunos
considerados “diferentes” não se enquadram. A avaliação de um aluno com
necessidade educacional especial requer uma reconfiguração nos procedimentos e
os resultados aferidos são frutos do avanço que foi possível ser alcançado. É um
processo individual e particular que não o destitui de uma aprendizagem de
conteúdos, mas respeita o ritmo apresentado por cada um. Caso ela não ocorra de
maneira adequada, torna-se “nociva” aos alunos provocando a cristalização do
preconceito e da rejeição social. Sendo assim, a avaliação presente nas escolas
sobralenses, já aponta seus ranços e seus avanços.
Em meio a esse debate, um progresso determinante foi à predisposição
da prefeitura do município para compor um setor específico para as ações da
Educação Inclusiva na Secretaria de Educação de Sobral. Um grupo pequeno,
composto por três profissionais (Psicóloga, Pedagoga – Especialista em
Psicopedagogia, Professora – Mestra em Educação com área de pesquisa em
95
Formação de Professores) que além de atender as necessidades do município,
segundo o programa, ainda precisa acolher a demanda de sua área de abrangência.
Tarefa árdua diante da quantidade de municípios (44) a serem assistidos e da
dimensão de um trabalho para a construção de uma educação realmente inclusiva.
Um trabalho que tenciona a busca pelo respeito à diversidade na
educação precisa observar os pequenos detalhes e os resultados alcançados, e é
nesse sentido, que encaminhamos a nossa pesquisa para o trabalho de campo
tentando perceber nos olhares de gestores e educadores (no caso, professores) o
papel do município, da escola e da família na construção de um sistema
educacional inclusivo.
96
CAPÍTULO 3 – A POLÍTICA DE INCLUSÃO DO MUNICÍPIO DE SOBRAL E OS SEUS DIFERENTES PAPÉIS – O QUE PODEMOS DIZER?
Uma criança com necessidades educa-cionais especiais, antes de ser alguém impedido por uma deficiência, é alguém capaz de aprender.
(Prof. Dr. Hugo Otto Beyer Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
No exercício de construir a trajetória histórica e política de inclusão na
Educação Especial chegamos ao momento de refletir sobre as escolhas que
conduziram o estudo. É momento de começar a tessitura teoria e empiria.
É necessário lembrar que os ajustes e a redefinição do papel do Estado
abriram espaço para um leque de transformações na educação brasileira. Uma delas
é a mudança no âmbito das responsabilidades. A partir dos anos 1990, a escola é
uma instituição autônoma que deve ‘zelar’ pela qualidade de ensino baseado na
eficiência e na eficácia. O foco volta-se para os resultados, principalmente, porque a
instituição escolar deve formar o cidadão apto para o mercado de trabalho. Dentro
dessa mesma realidade é projetada a construção de uma escola inclusiva, ademais,
segundo os documentos norteadores da inclusão, é a escola a mais adequada para
o ingresso e permanência de pessoas com necessidades educacionais especiais
que muitas vezes apresentam um outro ritmo e forma de aprender.
Entendemos que o movimento para a inclusão vem se constituindo e
identificamos no contexto educacional de Sobral quarenta escolas com atendimento
de alunos com necessidades educacionais especiais entre sede e distritos.
O desafio da pesquisa, portanto, está no contexto que de tão peculiar é
recheado de meandros e de especificidades. Ponderamos também que o
desenvolvimento do estudo realiza-se a partir do confronto entre o pensado e o
executado. Escolhemos como opção de pesquisa a abordagem qualitativa para dar
conta de variáveis que vão além de gráficos e estatísticas, muito embora os mesmos
façam parte de nossa análise e dêem suporte para a mesma.
Trata-se de um olhar sobre a conclamada inclusão social, presente
como pano de fundo nas propostas de governo. Partimos da premissa que a
instituição escolar (permeada de conflitos e consensos) também é espaço da
97
sociedade e a educação configura-se como direito social, portanto o
desenvolvimento dos indivíduos nesse ambiente é construto da chamada
educação cidadã.
O que operacionalizamos para alcançar tal objetivo? Primeiro,
conhecemos os espaços em que a política passa de aglomerado de parágrafos e
incisos para as ações práticas. É a aproximação empírica com o objeto de pesquisa.
Partindo desse os cenários de nosso trabalho apontam com quem conversar, os
documentos, os registros etc. É nesses documentos e depoimentos que
conhecemos e reconhecemos, ancorados em pesquisadores, teóricos, e estudiosos
do assunto, se a experiência vivenciada no contexto sobralense trata-se de uma
ação inclusiva ou não. É necessário lembrar que vislumbramos uma sociedade que
acredita e busca o direito à educação e o direito à diferença, ou seja, que a
educação além de ser acessível a todos respeite a individualidade de cada um.
Relembramos também que na aproximação empírica o olhar é delineado
através de dois instrumentos de pesquisa: a observação e o questionário, tendo na
observação o maior eixo de análise. Não obstante, temos também como forma de
compreender a temática as seguintes categorias: a) Educação Especial; b) Inclusão;
c) Políticas Públicas Educacionais; d) Escola.
3.1 Caracterização das Escolas e dos Atores da Pesquisa
Conforme definimos no percurso metodológico, pesquisamos em três
espaços escolares distintos – Escola do Arco, Escola da Sé e a Escola do Beco. A
Escola do Arco (nível A com 1279 alunos) e a Escola da Sé (nível B com 439 alunos)
estão situados em bairros periféricos do município. No caso da Escola do Beco
(nível C com 331 alunos) localiza-se em uma região mais central de Sobral.26 De
acordo com os dados apurados nas próprias escolas temos essas quantidades de
alunos sendo atendidos:
• Escola do Arco: 37 alunos;
• Escola da Sé: 20 alunos;
• Escola do Beco: 11 alunos.
26 O número de alunos refere-se aos dados do Censo Escolar (2006), pois os dados de 2007 ainda estavam em processo de compilação.
98
Faixa Etária de Gestores e Educadores
1
7
10
5
Menos de 20 anos Entre 20 e 30 anos Entre 31 e 40 anos Entre 41 e 50 anos
Para efeito de organização do estudo e para contemplar as diretrizes
descritas pelo Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, decidimos
trabalhar com a nomenclatura gestores e educadores (ou professores). Os gestores
representados pelos diretores e coordenadores pedagógicos e no caso dos
educadores, fazemos a referência aos professores de sala de aula regular e aos de
atendimento educacional especializado.
Retomando o quadro 3 descrito na introdução, tivemos a devolução de 23
questionários. Por se tratar de um mesmo instrumental de pesquisa para diretores,
coordenadores e professores decidimos analisar os 23 questionários juntos
(identificados pela letra Q seguidos de um número na seqüência de 1 a 23). Isso se
deve também por se tratar de um mesmo instrumento para ambos os grupos.
Além disso, entendemos que era necessário um breve perfil dos atores
envolvidos na pesquisa, então optamos por trabalhar com as seguintes informações:
Faixa etária; Carga horária de trabalho semanal; Tempo de serviço, e; Formação
(graduação e pós-graduação).
Iniciando o perfil, identificamos um grupo que tem sua maior
representação entre os 20 e 40 anos, denotando assim a possibilidade de uma
maior experiência no magistério. No que se concebe a faixa etária temos o a seguir:
Gráfico 8 – Faixa etária de gestores e educadores
Fonte: Questão 1 do questionário aplicado com gestores e educadores
Nesse sentido, o que se constata é que 12 dos participantes possui de 5 a
10 anos de tempo de serviço, veja no gráfico a seguir:
99
Formação de Gestores e Educadores
12
5
2 2
1 1 1 1 1
0
2
4
6
8
10
12
14 Pedagogia
Letras
História
Ciências c/ habilitação emmatemática
Estudos Sociais
Geografia
Filosofia
Matemática
Administração Hospitalar
Tempo de Serviço
5
12
2
4
Menos de 5 anos De 5 a 10 anos De 11 a 15 anos Mais de 15 anos
Gráfico 9 – Tempo de serviço
Fonte: Questão 2 do questionário aplicado com gestores e educadores
Em se tratando da constituição de um sistema educacional inclusivo,
percebemos na formação de gestores e educadores uma variedade de cursos na
área de educação (cabendo dizer que existem docentes com mais de um curso de
graduação), e, é no curso de Pedagogia o seu maior destaque, pois possui 12
representantes. Vale ressaltar que as 3 (três) professoras de apoio são pedagogas
(conforme orientação da Secretaria de Educação).
Em segundo, encontramos o curso de Letras (5), o que nos parece
bastante viável para a política de alfabetização do município. Vejamos também os
outros cursos que compõem o universo pesquisado:
Gráfico 10 – Formação de gestores e educadores
Fonte: Questão 4 do questionário aplicado com gestores e educadores
100
Curso de Especialização - Gestores e Educadores
2 2
1 1 1 1
0
0,5
1
1,5
2
2,5
Psicopedagogia
Metodologia do EnsinoFundamental e Médio
Formação de Professores p/ EF
Ensino de Matemática
Educação Especial
Línguas e Códigos
No que se refere à pós-graduação dos atores envolvidos no estudo,
temos como maior nível apontado – a especialização. No caso das professoras
de atendimento especializado, temos o seguinte quadro: Na Escola do Arco, a
professora possui apenas cursos na área de Educação Especial. Na Escola da
Sé e na Escola do Beco, as duas possuem curso de pós-graduação na área de
Psicopedagogia (e uma delas, a do Beco também em Educação Especial).
Apresentamos no gráfico abaixo os cursos realizados por 7 dos 23 atores da
pesquisa:
Gráfico 11 – Curso de especialização – gestores e educadores
Fonte: Questão 4 do questionário aplicado com gestores e educadores
Percebemos, então, que maioria dos professores possui apenas a
graduação e os que cursaram especialização referem-se às outras áreas. Diante
desse breve perfil dos recursos humanos presentes nas escolas municipais
selecionadas, detalharemos a partir de agora as questões concernentes à política de
inclusão municipal e suas formas de materialização.
3.2 Papel e Ações da Política de Inclusão no Município de Sobral – Entre o
Proposto e o Vivido
Iniciamos explicando que a escolha e elaboração do questionário como
instrumento de coleta de dados ocorreu pensando na melhor forma de ter acesso às
informações das escolas, portanto optamos por perguntas que as respostas
101
poderiam ser sim ou não (com justificativa), pois percebemos que respostas que
denotassem conceito (como regular, bom e ótimo), não pareciam ser bem aceitas, já
que se tratava de uma realidade relativamente recente para gestores e professores,
haja vista esta ter iniciado no final de 2003. Consideramos para o estudo que as
necessidades educacionais especiais sejam assim descritas: deficiência visual,
deficiência auditiva, deficiência mental, deficiência física, deficiência múltipla,
condutas típicas e dificuldades de aprendizagem (sendo esta última a de maior
incidência nas escolas. São cerca de 520 alunos). Tal classificação advém dos
documentos (planilhas, projeto etc) referentes à educação especial no município.
Entrecruzamos os assuntos correlatos (baseado na visão de gestores e
educadores) com as informações aferidas nas observações e dividimos, para
efeito de organização das idéias, em três blocos baseados nas categorias de
análise, a saber:
a) Política de Inclusão (baseado também nas informações fornecidas
pela Secretaria de Educação do Município – planilhas, relatórios etc);
b) Papel e Ações do Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade
(uma das formas de materializar a Política Pública);
c) Condições da Escola considerada Inclusiva (Estrutura física, aspectos
da organização pedagógica e da formação dos professores baseado
também nas indicações do programa, sendo que alguns já foram
detalhados no item 3.1).
A Política de Inclusão, de acordo com Ministério da Educação, é medida
de várias formas, uma delas remete-se ao número de matrículas dos alunos na rede
de ensino regular ou classes especiais e escolas especiais. Conforme gráfico 7, no
Capítulo 2, há uma ascendência no acesso a escola regular que passa de 12,3%
para 71,5% de matrículas entre 2002 e 2005.
No caso de Sobral, essa aferição é feita de acordo com instrumento
(anexo III) elaborado pela Prefeitura e é realizado pelos professores de atendimento
educacional que em algumas situações recorre a outros profissionais para tentar um
diagnóstico mais preciso. Trata-se de planilhas que como acompanhamento da
política tem por base a contagem dos alunos atendidos (AAP) e não atendidos
(ANAP) pelo programa. É preciso esclarecer que em meio aos alunos não atendidos
102
Evolução da Política de Inclusão - Sobral
705
559
567
773
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
AAP
ANAP
2006
2004
podem estar alunos matriculados na rede regular de ensino, mas também aqueles
que não estão dentro das escolas. Vejamos a seguir:
Gráfico 12 – Evolução da política de inclusão – Sobral
Fonte: Gráfico elaborado de acordo com planilhas disponíveis na Secretaria de Educação em Sobral
Há uma pequena ampliação no atendimento dentro das escolas, mas
também aumenta o número de pessoas que não participam do programa.
Destacamos, mais uma vez que dentre elas a maioria apresenta dificuldades de
aprendizagem. Tentamos detectar se haviam outras formas para representar esse
resultado, mas durante a pesquisa não foi disponibilizado um documento que
regulamente o processo inclusivo nas escolas da rede regular de ensino. As
referências feitas para sustentar tal política são alusivas aos documentos (leis e
diretrizes) em âmbito nacional e estadual. De acordo com Kassar:
Desde a década de 1990, o Governo Federal tem implantado e/ ou fomentado um conjunto de ações nas várias áreas dos serviços públicos como parte do que se tem denominado de ‘política de inclusão social’. Muitas dessas ações dizem respeito diretamente à crianças e adolescentes, como Bolsa-escola, PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil) e ‘Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade’. Essas ações são implantadas a partir da assunção, por parte do Brasil através de acordos internacionais (Declaração de Jontiem em 1990, Declaração de Salamanca em 1994, Convenção 182 OIT em 1999, entre outros). (2006, p. 119).
É através também da descentralização que se propõe materializar esses
programas. Podemos considerar, então, que a rede de ensino regular em Sobral,
município-pólo do Programa Educação Inclusiva: Direito a Diversidade recebe
matrículas “inclusivas”, ou seja, permite o acesso aos alunos com necessidades
103
educacionais especiais às salas de aula comuns. Baseado nessa afirmação o nosso
debate segue pelo que o Programa concebe como constituição de um sistema
inclusivo. É destacada principalmente a necessidade da formulação de um Plano
Municipal de Educação considerando a autonomia delegada aos municípios com a
Constituição de 1988, e no caso do Ceará a ênfase nas iniciativas locais advindas
da política de municipalização iniciada em 1995, no governo Jereissati. Entretanto, o
município ainda não possui esse documento formalizado e para que possamos
avaliar a constituição de um sistema educacional inclusivo baseamos o nosso olhar
nos indicadores construídos pelo MEC para o Programa. Destacamos alguns para
nortear a nossa pesquisa diante da política educacional desenvolvida:
• Informações sobre as necessidades educacionais especiais das
crianças de 0 a 14 anos;
• Informações sobre as adequações necessárias, em cada escola, para
responder às necessidades educacionais especiais dos alunos;
• Plano Municipal de Educação estipulando metas até o ano de
2010, conforme determinação do Plano Nacional de Educação (Lei
No 10.172/2001) contemplando também as necessidades
educacionais especiais;
• Acessibilidade física e de comunicações (padrões mínimos de
estrutura física e de materiais adequados para o atendimento dos
alunos nas escolas);
• Equipe técnica suficiente para dar suporte a todas as escolas
municipais;
• Programa de Formação Continuada para professores de ensino
regular;
• Critérios para organização de salas inclusivas;
• Programa de formação continuada dos professores e gestores
educacionais;
• Sistemática para o trabalho cooperativo entre o professor da classe
regular e o professor especialista em educação especial;
• A Existência no Município de um Dirigente da Educação Especial;
• Processo de Avaliação.
104
Questão 5 - O que você entende por educação inclusiva ?
6
5
4 4
3
2
1 1 1 1 1
0
1
2
3
4
5
6
7 Valorização das diferenças
Desenvolvimento daAprendizagemTrabalho conjunto
Acesso às pessoas comdeficiênciaSem resposta
Participação
Trabalho c/ pessoas com NEE
Relação Pais e Escola
Respeito à diversidade
Igualdade
Nada
Optamos, como já foi explicitado, trabalhar com os atores convidados em
primeira instância a desenvolver o programa, ou seja, gestores e professores.
Balizado nas visões apresentadas por eles e nas observações realizadas é que
vamos descrever alguns aspectos concernentes às ações do programa,
respondendo a algumas das questões que compõem o nosso estudo. Por se tratar
de educação inclusiva, um aspecto intrínseco era perceber como os atores
entendiam esse fenômeno que estava redimensionando o papel da escola regular.
Essa pergunta foi uma das questões que mais causou inquietações, pois havia uma
nítida busca por elementos que realmente definissem o que é educação inclusiva.
Mesmo com essa dificuldade as respostas tiveram uma referência à “valorização da
diferença” e a “desenvolvimento da aprendizagem”. É o que veremos a seguir
quando perguntamos:
Gráfico 13 – Conceituação da educação inclusiva Fonte: Questionário aplicado com gestores e educadores
A utilização de termos como “diferença”, “diversidade” e “desenvolvimento
da aprendizagem” apontam certa sensibilidade para as questões particulares e
ressalta a importância da diferença. Conforme Beyer:
A educação inclusiva caracteriza-se como um novo princípio educacional, cujo conceito fundamental defende a heterogeneidade na classe escolar, como situação provocadora de interações entre crianças com situações pessoais as mais diversas. (2006, p. 73).
105
No entanto, entendemos que para transpor a intenção e verificarmos se
uma proposta educativa é realmente inclusiva precisamos esclarecer outras
questões, ou seja, é necessário refletir o universo pesquisado sobre outros aspectos.
“Os sociólogos tendem a identificar duas funções sociais opostas na
educação: ser um canal importante de ascensão e mobilidade social, e ser um
mecanismo de reprodução e consolidação das desigualdades sociais.”
(SCHWARTZMAN, 2004, p. 42). A materialização de uma dessas funções depende
de qual conotação é impressa nos contextos principalmente das escolas.
No estudo em questão, temos o atendimento educacional especializado
realizado dentro do ambiente escolar. Este acontece através da ação de um único
profissional na escola – professor de apoio pedagógico específico, atualmente
chamado de professor do Projeto de atendimento educacional especializado. Já
começamos a perceber um significativo hiato entre a proposta desse atendimento e
os recursos humanos e materiais disponíveis. Como sugere o documento do
Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade (MEC/SEESP), no volume 2
destinado ao Município,
O atendimento educacional especializado, realizado pela Educação Especial, visa garantir a todos os alunos o acesso à escolaridade, removendo barreiras que impedem ou dificultam a permanência do aluno nas classes comuns do ensino regular. Este atendimento é constituído por um conjunto de recursos educacionais e estratégias de apoio, colocadas à disposição dos alunos, proporcionando-lhes alternativas de aprendizagem de acordo com as necessidades de cada um. (BRASIL, 2004, p.16).
O atendimento educacional especializado alcança toda a estrutura da
escola em meio às questões de recursos humanos e materiais. Assim sendo, a
acessibilidade física e de comunicação são pontos cruciais para o fomento desse
atendimento.
Portanto, para alunos cegos e surdos, por exemplo, tem a
necessidade de acesso ao Braille e a Libras respectivamente. Em se tratando
de deficientes físicos, a infra-estrutura física é que precisa modificar-se através
da construção de rampas, banheiro adaptados etc. Indicações previstas pelo
Programa (nos volumes 2 e 3, respectivamente dos indicadores do município e
da escola) e que as unidades escolares teriam que se adequar a elas. Mas
antes de conversamos sobre essas questões, primeiramente interessa-nos
106
Questão 16 - Você conhece o Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade?
13
10
Sim Não
saber, visto tratar-se de uma iniciativa nacional, se professores e gestores
conhecem o Programa. Observemos o gráfico a seguir:
Gráfico 14 – Programa Educação Inclusiva
Fonte: Questionário aplicado com gestores e educadores
Há uma diferença mínima entre os que conhecem e os que não
conhecem o Programa. Parece-nos que mesmo aqueles que não conheciam ficaram
em dúvida sobre qual era o assunto referente aquele Programa. Isso se deve a
forma como ele chegou à escola. Conforme as observações e conversas informais,
na verdade, o que eles detêm como informação é que existe na escola um Projeto
da Prefeitura trabalhando as questões relacionadas aos alunos com necessidades
educacionais especiais. Quando perguntamos como ele se desenvolve (Questão 17)
encontramos respostas que confirmam essa visão, quais sejam:
A escola conta com um professor de apoio que trabalha as dificuldades dessas crianças para que possam ter um bom desempenho em sala de aula e que também dá sugestões aos professores de como trabalhar com essas crianças. (Q 23) (grifos nossos) Através de um professor especializado na área desenvolvendo atividades lúdicas em pequenos grupos ou individual e assim apresenta a necessidade educacional especial do aluno. Utilização de tecnologia assistiva. Ex. DVD, CD-Rom, jogos e computador. (Q 4) (grifos nossos) Através de uma professora de apoio que nos dá um suporte para trabalharmos melhor com essas dificuldades. (Q 6) (grifos nossos) Através da inclusão nas salas regulares com acompanhamento pedagógico individual, atividades diferenciadas etc. (Q 10)
107
Programa e Projeto se misturam numa mesma iniciativa sem maiores
diferenciações. Portanto optamos por utilizar as duas nomenclaturas no decorrer de
nossa análise, pois retrata o trabalho desenvolvido no município, principalmente por
ter sua expressão em meio a professores e alunos, principalmente nas salas que
tem alunos com necessidades educacionais especiais – NEE. A figura do “professor
de apoio” é bastante conhecida sendo enfatizada a sua importância no processo
educacional dessas crianças. Mesmo com essa visão confusa e reducionista da
abrangência da educação inclusiva, intentamos perceber o que eles achavam do
programa e perguntamos: O que você pensa sobre o Programa? (Questão 19):
É um programa sério, mas que ainda tem um longo caminho para percorrer até que possamos realmente dizer que a inclusão está acontecendo de fato. (Q 23) Acho de muita importância, desde que dê suporte ao professor, cursos na área e também a escola esteja pronta física e pedagogicamente. (Q12) É um programa para qualificar gestores e educadores. (Q 2)
As respostas destacaram a importância da transformação do ambiente
escolar, mas apontaram a necessidade de instrumentos para que a inclusão
realmente aconteça. De fato, eles percebem a necessidade de uma ampliação de
atitude e que a mesma precisa ir além da ação desenvolvida nesse projeto.
Trata-se de uma discussão sobre a dicotomia inclusão versus não-
inclusão social, já que a educação constitui-se como política social. Examinar essa
relação é perceber que mecanismos estão presentes nas escolas para reforçar a
exclusão e àqueles que dão acesso à educação de qualidade. Entende-se conforme
Beyer que:
A escola que se pretende inclusiva, em cujo espaço não existam campos demarcados, do tipo aqui está os alunos “normais” e ali os “especiais” ou “incluídos”, como se escuta com freqüência, põe em construção uma pedagogia que não é nem diluída, face as necessidades educacionais especiais de alguns alunos, nem extremamente demarcada ou terapêutica, em que se acaba as distinções pessoais. (2006, p. 75-76).
É o respeito à diferença enquanto forma de nos identificarmos em relação
ao outro e em relação a nós mesmo visando à inclusão na tessitura social,
principalmente daqueles que se encontram excluídos.
108
Diante de tal afirmativa, entendemos que a nossa investigação precisa
olhar a escola como parte fundamental nesse processo de inclusão social. Portanto,
conheceremos agora as escolas que contribuíram para esse estudo e suas
características, tendo como parâmetro o Programa Educação Inclusiva: Direito à
diversidade.
3.3 Escola do Arco, Escola da Sé e Escola do Beco: o desafio da diversidade
Em se tratando de escolas consideradas inclusivas, cabe indagar: O que
as constitui? Antes de começarmos a conversar é necessário que relembremos
primeiro, trata-se de uma iniciativa que visa dar respostas à política de inclusão
social brasileira iniciada pelo município e posteriormente reforçada através da
relação direta entre governo federal e municípios. Para tanto, propôs um trabalho de
formação visando à constituição de multiplicadores das idéias de inclusão.
Ressaltamos também que são escolas de destaque, principalmente no IDEB (Índice
de Desenvolvimento da Educação Básica) medido em 2005-2006:
Tabela 3 – IDEB 2005 e projeções para a escola municipal – ESCOLA DO ARCO
Ensino Fundamental 2005 (Observado)
Projeção do IDEB
2007 2009 2011 2013 2015 2017 2019 2021
Anos Iniciais 3.7 3.8 4.1 4.5 4.8 5.1 5.4 5.6 5.9
Anos Finais - - - - - - - - -
Fonte: Prova Brasil 2005 e Censo Escolar 2005 e 2006 sendo modificado apenas o nome da escola.
Tabela 4 – IDEB 2005 e projeções para a escola municipal – ESCOLA DA SÉ
Ensino Fundamental 2005 (Observado)
Projeção do IDEB
2007 2009 2011 2013 2015 2017 2019 2021
Anos Iniciais 3.7 3.8 4.1 4.5 4.8 5.1 5.4 5.7 5.9
Anos Finais - - - - - - - - -
Fonte: Prova Brasil 2005 e Censo Escolar 2005 e 2006 sendo modificado apenas o nome da escola.
Tabela 5 – IDEB 2005 e projeções para a escola municipal – ESCOLA DO BECO
Ensino Fundamental 2005 (Observado)
Projeção do IDEB
2007 2009 2011 2013 2015 2017 2019 2021
Anos Iniciais 4.1 4.1 4.5 4.9 5.2 5.4 5.7 6.0 6.2
Anos Finais - - - - - - - - -
Fonte: Prova Brasil 2005 e Censo Escolar 2005 e 2006 sendo modificado apenas o nome da escola.
109
As escolas fazem parte dos índices satisfatórios de leitura e escrita que o
Município vem apresentando no ensino fundamental em pesquisas de âmbito
nacional (como o IDEB apresentado acima). O que também reforçou, mesmo sem
intencionalidade, os critérios estabelecidos para a escolha do lócus da pesquisa.
São índices que expressam realidades convidativas consideradas de sucesso e
portanto, merecem uma atenção específica, pois também estão se constituindo
enquanto espaço de inclusão versus exclusão educacional.
Uma das primeiras ações diante de uma proposta inclusiva na escola é a
revisão do Projeto Político Pedagógico – PPP e/ou Proposta Pedagógica
considerada a “coluna vertebral” da instituição. De acordo com Veiga, “para a
construção do projeto político pedagógico, devemos ter claro o que se quer fazer e
porque vamos fazê-lo.” (2001, p. 56). Pensando nisso, Beyer (2005, p. 63-64),
apresenta alguns aspectos que devem aparecer no texto como componentes de
reflexão para uma proposta pedagógica diferenciada, a saber:
a) a inserção dos alunos com NEE nas escolas regulares (como e que
elementos são necessários para esse processo);
b) as propostas curriculares que podem melhor contemplar as
necessidades educacionais desses alunos;
c) a organização didática no atendimento escolar dos mesmos (isso
incluindo os critérios para organização de uma sala de aula inclusiva);
d) as epistemologias que podem ser pensadas como base do processo
de ensino-aprendizagem.
A nossa pesquisa deteve-se em averiguar se nos documentos das
escolas havia referências as estes elementos. Não nos propusemos a fazer análise
conceitual do ponto de vista do currículo ou da didática, mas tentamos identificar a
partir deles o espaço já garantido para a discussão dessa realidade tão recente no
contexto das escolas municipais de Sobral.
A Escola do Arco nos disponibilizou a proposta pedagógica que é um
segmento do PPP e a única referência feita à inclusão está descrita no item sobre a
organização curricular, na parte II:
110
Os alunos matriculados nesta instituição são enturmados seguindo os critérios: nível de aprendizagem e idade/série. A escola também trabalha com um projeto de inclusão, que tem por finalidade atender aos alunos com necessidades educacionais especiais – PAPE – Programa de apoio pedagógico especializado. (s/d).
Quando nos deparamos com esse texto, confirmamos que o projeto de
inclusão refere-se apenas a iniciativa aplicada na escola. Outra questão é o período
em que foi feita a última revisão desse projeto deve ter sido provavelmente entre
2003-2004, pois a nomenclatura utilizada para descrevê-lo ainda faz referência ao
primeiro nome dado pela Prefeitura a essa ação.
No caso da Escola da Sé, foi cedido para análise o PPP (do ano de 2000)
e Plano de Desenvolvimento da Escola – PDE (de 2003-2004), ambos sem
referência a uma proposta de educação inclusiva. Já a Escola do Beco nos
concedeu o acesso a toda documentação da instituição. Uma coletânea que consta
os seguintes documentos: Proposta Pedagógica do Ensino Fundamental, Proposta
Pedagógica da Educação Infantil, Planos de Curso, Planos Individuais de Trabalho –
PIT, Plano de Desenvolvimento da Escola, Plano de Gestão (refere-se à diretora da
escola) e o Plano de Trabalho da Coordenadora Pedagógica. O interessante que
essa era a única dentre as três escolas em que a gestora estava acumulando os
dois cargos (de diretora e coordenadora pedagógica).
Entretanto, mesmo com acesso livre a esses documentos só encontramos
como referência ao trabalho de inclusão no Plano Anual de Trabalho da professora
de apoio pedagógico específico (anexo I). É nesse plano que identificamos o papel e
a forma de trabalho desse profissional na Escola do Beco. Suas funções:
• Acompanhamento diário com atividades diversificadas, trabalhando
individual ou em grupo;
• Atendimento ao aluno com dificuldade ou deficiência na sala de aula;
• realização de no mínimo três atendimentos semanais para cada aluno
com duração de 50 minutos cada um;
• Estimular as crianças para melhorar sua auto-estima.
111
Como é desenvolvido esse plano?
• Atividades Lúdicas e Pedagógicas diversificadas;
• Jogos diferentes: bingo de letras e palavras, dominó, quebra-cabeça;
• Contação de histórias, com CD e livros paradidáticos;
• música;
• Jogo de Memória, labirinto.
Diante do exposto compreendemos um pouco das atividades realizadas
nesse projeto não só na Escola do Beco como nas duas outras escolas.
Percebemos que a prática lúdica e a socialização são as ações de maior destaque
no cotidiano desse professor. Entretanto, mesmo que a existência de um projeto
pedagógico próprio possa sugerir a inclusão do aluno com necessidades
educacionais especiais não encontramos maiores indicativos de ações que
respeitem o contexto da diferença.
Antes de conversamos sobre como a escola se organiza para receber
esses alunos, abrimos espaço para um breve diálogo sobre o Conselho Escolar cuja
função também é discutir o PPP da escola. Encontramos nesse debate um dos
indicadores que compõe o volume 3 – A escola do Programa, a existência do
Conselho e o outro se atrela à atuação do mesmo na dinâmica escolar. Sabemos
que o Conselho Escolar é a representação da comunidade para as decisões na
escola, e por se tratar de um fenômeno inclusivo, perceber um pouco de sua
operacionalização torna-se relevante. De acordo com o instrumental de pesquisa
todos os 23 (vinte e três) participantes do estudo afirmaram existir um Conselho
Escolar nas suas escolas (Arco, Sé e Beco). Entretanto, quando perguntamos sobre
a atuação dele no processo de inclusão de crianças com necessidades educacionais
especiais visualizamos o seguinte resultado:
112
Questão 9 - Como o Conselho Escolar atua no processo de inclusão de crianças com NEE?
4
3 3 3 3
2 2
1 1 1
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
Acompanhamento Pedagógico
Através de Reuniões
Garantindo o Acesso
Não sei
Não trabalha
Naturalidade
Sem Resposta
Ajudando a ver quem está fora
Não precisa do Conselho
No ausência da família
Gráfico 15 – Conselho escolar e inclusão
Fonte: Questionário aplicado com gestores e educadores
Há uma diversidade de conceitos relacionados à atuação do Conselho
revelando um distanciamento expressivo de um trabalho mais efetivo junto à
comunidade escolar. Não participamos de reuniões do Conselho nas escolas (até
porque não havia agenda para essa atividade), apenas tivemos a oportunidade de
estar presente em reunião de planejamento da Escola do Arco. Momento em que a
prioridade era planejar como trabalhar os alunos para o processo de avaliação da
Prefeitura de Sobral. Até surgiram assuntos relacionados à condição dos alunos com
necessidades educacionais especiais em alguns episódios na escola, mas a ênfase
estava nas atividades já programadas para aquela reunião.
De posse do que nos revela as propostas pedagógicas das escolas
(Arco, Sé e Beco), iniciamos o detalhamento e compreensão do espaço em que se
operacionaliza o projeto ou programa de inclusão. Organizam-se da seguinte forma:
na Escola do Arco existe uma sala considerada de referência, pois foi equipada pelo
MEC. Nela encontramos dois computadores, uma mesa, 4 (quatro) cadeiras, 1 (um)
armário, alguns jogos e materiais pedagógicos. Trata-se de um espaço climatizado,
mas nos parece que o ar condicionado não estava em condições de uso.
Na Escola da Sé foi organizado um espaço, o antigo almoxarifado para o
atendimento. Nele existe um armário, 3 (três) mesas pequenas e materiais
pedagógicos. Na Escola do Beco não existe um espaço reservado especificamente
para esse trabalho. A sala dos professores é utilizada para esse fim enquanto os
113
professores estão em sala de aula e quando é necessário usar o computador é
solicitado o que fica na secretaria da escola.
Os alunos são matriculados conforme a faixa etária sendo que alguns são
readaptados de acordo com a necessidade. É o caso de uma das crianças da
Escola do Beco que foi adaptada na Educação Infantil. Geralmente essas mudanças
ocorrem com os alunos com dificuldades de aprendizagem mais acentuada. Eles
vão para uma sala chamada Meta 1 ou 2, para onde comumente vão as crianças
com déficits na leitura e na escrita. É como se fosse uma classe de aceleração
modificada. O aluno ingressa no ano esperado para sua idade, mas apresentando
dificuldades expressivas vai para essa sala de meta para ser trabalhado de maneira
diferenciada. No caso das deficiências (como o surdo, o cego, o deficiente mental
etc), estes permanecem na sala em que foram matriculados, exceto alguma criança
que tenha extrema necessidade de ser remanejada para um outro ano.
A estrutura física ou arquitetônica das unidades escolares de Sobral
obedece a um padrão bem semelhante. São em formato quase circular ou em
corredor, e permitem de forma panorâmica visualizar a todos os espaços, pois os
modelos tornam os ambientes bem próximos uns dos outros. Construídas e
reformadas recentemente, ainda apresentam barreiras arquitetônicas, apesar de
possuírem algumas rampas.
Os gestores e educadores, quando indagados sobre alguma adaptação
na estrutura física da escola, descreveram que além das rampas, consideram o
ambiente em que ocorre o atendimento especializado, um espaço de adaptação
já que é nele que acontecem atividades específicas para esses alunos. Apenas 1
(um) professor destacou que havia banheiro adaptado na Escola da Sé, mas
acreditamos que tenha ocorrido um equívoco na referência, pois o que há é uma
rampa de acesso ao banheiro. O que poderia ser considerado uma adaptação na
estrutura física do prédio, e não uma mudança específica no banheiro.
Percebemos então que faltam informações para descrever a acessibilidade na
escola por parte dos atores pesquisados.
Sendo um pouco mais específico (ou seja, no âmbito da sala de aula)
perguntamos aos atores da pesquisa se eles percebiam alguma mudança na
organização física e pedagógica nas salas que recebem alunos com necessidades
educacionais. Vejamos o resultado:
114
Questão 12 - Ocorreu alguma mudança na estrutura física e na organização pedagógica nas sala de aula que recebem
alunos com NEE ?
5
18
Sim Não
Gráfico 16 – Estrutura física e organização pedagógica Fonte: Questionário aplicado com gestores e educadores
Os 5 (cinco) profissionais que responderam haver mudanças no
ambiente da sala de aula fizeram referência a “mudanças de atitude”, “mudança
de localização” da carteira e que receberam algumas sugestões para
“adaptação curricular.” Tais atitudes apontam algumas alternativas para dar
suporte às necessidades pedagógicas dessas crianças, o que apontamos como
elemento positivo.
Uma mudança pedagógica presente nesse contexto e não apontada pelos
professores e gestores é a organização do trabalho através da ação de dois
docentes. O que poderíamos chamar de sistema de bidocência. Mas o que seria
trabalhar com dois docentes? “O professor da turma e um educador especial ou
professor de apoio trabalham conjuntamente, preferencialmente durante as
atividades da sala de aula (o que não significa simultaneidade de atuação).”
(BEYER, 2005, p. 47).
Trata-se a priori de algo inovador para as escolas sobralenses, no
entanto, sua operacionalização necessita de ajustes, ou seja, uma melhor definição
de papéis. Entendemos melhor quando observamos a prática. Esse trabalho
realmente é feito por dois docentes e um mesmo aluno da sala de aula, entretanto, é
um único educador especial para todas as salas. Isso até poderia ser possível se o
docente da classe comum tivesse maiores conhecimentos das especificidades em
Educação Especial. Entretanto, os professores da sala de aula regular não detêm o
conhecimento mínimo necessário para acompanhamento dos alunos com NEE.
115
Há uma dificuldade de conciliar as atividades realizadas em sala de aula e
trabalho desenvolvido no Projeto, pois o atendimento é simultâneo ao horário na
classe, ou seja, enquanto o aluno (sozinho ou em grupo) está em atendimento não
participa das atividades em sala. O mesmo acontece com o professor da sala de
apoio, ao mesmo tempo em que ele está em atendimento em todos os horários, não
pode dedicar-se a muitas observações no âmbito da classe comum.
Cada professor só pode atender no máximo 20 alunos organizados de
acordo as necessidades apresentadas e deve fazer no mínimo três atendimentos
semanais a cada aluno ou grupo de alunos. No caso da Escola do Arco, o número
está próximo de quarenta alunos, pois a professora trabalha os dois turnos (manhã e
tarde). Além desses atendimentos, as conversas durante visitas as famílias das
crianças e o auxílio no acesso ao serviço médico (no caso o Programa Saúde da
Família – PSF) fazem parte de suas atribuições. Contatos que são registrados e
acompanhados pelo professor sem a interferência de outros profissionais da unidade
escolar e que algumas vezes faz com que o “professor de apoio” se ausente da
escola para dar conta dessas ações.
O que notamos é que esse profissional faz seu trabalho separado das
rotinas da escola, ele obedece a etapas que são do conhecimento de todos, pois
algumas foram descritas pelos gestores e educadores, quando perguntamos: Como são
identificadas as crianças com necessidades educacionais especiais? (Questão 11)
Observemos as respostas:
Através de uma anamnese com mãe. Levantamento de dados. Conversa informal com os professores. Através de observações com registros e com diagnóstico de especialistas na área de saúde. (Q 4) (grifos nossos) Pelo professor na sua avaliação diagnóstica o aluno em seguida ele passa para a professora de apoio que passa a acompanhar esse aluno se for constatado que ele tem realmente uma necessidade especial. A direção da escola manda um laudo para a Secretaria de Educação do Município. (Q 6) (grifos nossos) Pela dificuldade que o aluno apresenta para acompanhar o conteúdo das matérias passadas em sala de aula. Depois procuramos os pais ou responsáveis que nos falam dos problemas do aluno e em seguida encaminhamos para a avaliação da pscicopedagoga. (Q 8) Através de observações feitas pelo professor que preenche uma ficha que é repassada para o professor de apoio. O mesmo ele faz com a família dessas crianças e quando necessário encaminha-os para o profissional adequado (médico, fonoaudiólogo, psicólogo). (Q 23) (grifos nossos)
116
Como pudemos observar alguns elementos presentes no trabalho do
professor de atendimento especializado é retratado pelas respostas citadas
(“anamnese”, “observação com registros”, “diagnóstico de especialistas” etc).
Valendo ressaltar que todos esses instrumentos estão sendo aplicados por
professores em formação para a execução desse trabalho, o que suscita um
acompanhamento expressivo da equipe da Secretaria em seu desenvolvimento.
Vamos agora compreender o passo a passo desse trabalho já que ele é o
foco central da ação por uma educação inclusiva: Primeiro é feito o levantamento no
início do ano letivo para sondar se há indícios entre os alunos de diferença de
comportamento e aprendizado. Essa detecção inicial é feita baseada na percepção
do professor da sala de aula regular e posteriormente também observada pelo
professor de apoio. Concomitantemente é feito o preenchimento de uma planilha
(anexo II) para identificar quantos alunos vão ser atendidos pelo programa e quais
suas deficiências, assim como, é disposta a quantidade de crianças que não vão ser
atendidas em primeiro instância. A escolha tem como prioridade as crianças com
deficiências (cegos, surdos, deficiente mental etc) e algumas que possuem
dificuldades acentuadas de aprendizagem.
Em segundo momento, os pais são contatados e convidados a fazer o
preenchimento da ficha de anamnese (anexo III) elaborada pela equipe técnica da
Prefeitura. Caso seja necessário, a criança também é encaminhada para o posto de
saúde mais próximo para atendimento no Programa Saúde da Família (PSF) e
algumas dessas informações são repassadas. Alguns apresentam a necessidade de
um acompanhamento psicológico, fonoaudiológico ou de outros profissionais da
atenção básica com clínico geral, por exemplo, que geralmente já faz o
acompanhamento da comunidade do bairro ou região.
No Programa Educação Inclusiva: Direito a Diversidade a questões
relacionadas à família (contidas no volume 4 do Programa) estão relacionadas ao
acompanhamento dos profissionais de saúde, trata-se da promoção da saúde física
e também mental desses grupos. Devido à família ter uma relação mais acentuada
com os serviços parceiros, optamos apenas por perceber como ocorria o acesso às
escolas e suas implicações.
Trata-se do relacionamento entre aluno, família, escola e serviços
parceiros (assistência social, PSF e outros). A família adentra o ambiente escolar
buscando de forma ansiosa, mas às vezes “desconfiada” a escolarização de suas
117
crianças. Segundo os dados do estudo, os familiares perpassam as seguintes
etapas: “De início é muito complicado, pois a falta de informação dos pais é visível,
principalmente quando o filho é incluído numa sala de aula regular.” (Q 2) “[...] Após
a conversa com a professora do projeto, ela (a família) já sente mais confiança e
segurança passando a participar de reuniões e conversas com a professora de
apoio [...]”. (Q 4)
A família dos alunos em processo de inclusão ainda tem um
comportamento muito tímido no relacionamento com o ambiente escolar. Durante
as observações e algumas conversas informais, percebemos que alguns
“familiares referem-se ao temor de que a inserção de seus filhos nessas classes
regulares não contribua, na intensidade desejada, para sua aprendizagem.”
(CARVALHO, 2004, p. 26). Afinal elas estão chegando de forma ainda muito
recente para trazer seus filhos que até bem pouco tempo não adentravam a
escola regular. Por outro lado, encontramos pais sabendo que seus filhos teriam
acesso as escolas se estimulam e acabam participando, principalmente,
acompanhando o trabalho desenvolvido no projeto.
O único indicador do Programa observável no que concerne a família foi o
acesso a Educação Infantil que pudemos acompanhar um pouco através da
adaptação de uma aluna a esse nível de ensino na Escola do Beco. A família foi
acompanhada nesse processo e depois quando a aluna já poderia ser alocada em
um ano mais avançado.
Retomando os passos para o atendimento, finalizado esse primeiro
contato com grupo familiar (pai, mãe ou responsável), o aluno passa para o
acompanhamento através de Plano Individual de Ensino – PIE (ou intervenção)
(anexo IV), instrumento também criado pela equipe de educação especial do
município para registrar as atividades desenvolvidas e a evolução no
atendimento específico.
A proposta é que se tenha um diálogo aberto e fluente entre os dois
docentes para conversar sobre os avanços e dificuldades dos alunos, mas o que
pudemos observar é que as obrigações para com a sala de aula e principalmente a
meta de alfabetização estabelecida pela política municipal acaba por sobrepor a
esses possíveis momentos de troca. Percebemos que em alguns momentos há um
ensaio e até um efetivo caminhar desse diálogo, fomentado em algumas situações
pela iniciativa do professor que faz o atendimento pedagógico e em outras do
118
docente da sala de aula regular. Todavia, essa relação se perde diante das
urgências e demandas gerais da escola e do Município.
Quando refletimos sobre essa situação percebemos que há um trânsito
confuso por dois paradigmas presentes no sistema escolar: o clínico-médico e o
sistêmico. De acordo com Bleidick citado por Beyer (2005): o paradigma clínico-
médico pauta-se na deficiência como uma situação extremamente individualizada.
Destacam-se os aspectos clínicos da deficiência e o atendimento tende para uma
orientação terapêutica. Seus principais instrumentos são a anamnese e a história
clínica do sujeito. (Elementos presentes conforme respostas da questão 11 do
questionário) Já segundo o modelo sistêmico avalia o aluno conforme uma demanda
esperada pelo sistema escolar. Lida racionalmente com a questão da progressão.
Abordando de forma prática, há uma análise muito mais clínica da vida individual do
aluno do que social. E quando nos referimos as salas de aula regular na amostra
pesquisada encontramos professores que precisam responder a uma política de
alfabetização em que os alunos com NEE são partes desse processo, mesmo
muitas vezes não tendo o êxito desejado para os padrões estabelecidos.
O fato é que em meio a este confuso universo de conceitos e de acordo
com as observações, as crianças apresentam uma desenvoltura satisfatória nas
atividades propostas pelo professor de atendimento educacional especializado,
sendo alguns casos, a relação mais produtiva para elas na escola.
Podemos perceber também através de episódios ocorridos durante as
visitas às escolas que os alunos saíam da sala de aula regular e iam para o espaço
de atendimento procurando atividades que prendessem sua atenção. É fato que
jogos, brincadeiras, ou seja, a prática lúdica é atrativa para qualquer criança, e é
comum que em determinadas ocasiões o momento pedagógico mais privilegiado
seja o acesso a essas atividades, o que também ocorre no recreio. No entanto, é
preciso atentar sobre a excessiva saída da sala de aula para um ambiente
diferenciado. Por que o ambiente de sala de aula não consegue exercer o seu papel
para essas crianças?
Tentamos detectar se os alunos tinham acesso a outras atividades fora da
sala que tivessem características correlatas, então indagamos: Além do Programa
Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, os alunos com NEE participam de outros
projetos desenvolvidos na escola?
119
Questão 21 - Além do Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, os alunos com NEE tem participado de outros projetos
na escola?
16
3
4
Sim Não Sem Resposta
Gráfico 17 – Programa de Educação Inclusiva: direito à diversidade
Fonte: Questionário aplicado com gestores e educadores
Os professores e gestores apontaram como atividades participadas
pelos alunos além do Programa, a “capoeira”, “atividades esportivas”, “arte”,
“dança”, “Escola Viva” e o “Projeto Segundo Tempo.” Atreladas a essa indagação
surgiram outros questionamentos: O que esses profissionais que trabalham com
jogos e brincadeiras despertam nessas crianças? Como aproveitar esses
momentos para também trabalhar materiais ligados a conteúdos? Pois a questão
mais recorrente em Educação Inclusiva é: Como transformar as intenções
contidas nos documentos em práticas com resultados? Indagações intrigantes e
que valeriam aprofundar em um outro estudo tendo como foco as questões
didático-pedagógicas do processo inclusivo operacionalizado nos moldes desse
projeto desenvolvido pela Prefeitura de Sobral. Mesmo sem o aprofundamento
em questões didático-pedagógicas, encaminhamos o estudo objetivando perceber
alguns dos motivos que distanciam esses alunos da classe regular. Resolvemos
perguntar se a formação que professores e gestores tinham até aquele momento,
tornavam-nos aptos para atuar em um contexto com alunos com necessidades
educacionais especiais, vejamos as respostas:
120
Gráfico 18 – Formação e atuação profissional
Fonte: Questionário aplicado com gestores e educadores
Percebe-se pelo gráfico anterior que quase o dobro dos atores do estudo
acredita não ter formação que o torne apto a trabalhar com crianças com
necessidades educacionais especiais. O que denota o expressivo despreparo para
lidar com as questões pertinentes as crianças com NEE. Dentre os que se
colocaram com habilidades para o trabalho estão as 3 (três) professoras inseridas no
projeto da Prefeitura e os demais em número de 5 (cinco) pessoas alegaram o
acesso na graduação a disciplina sobre inclusão, ou participação em alguns cursos
específicos impulsionados pelo interesse na temática. Na identificação para perceber
se o mesmo grupo já havia participado em algum momento de formações no campo
da Educação Especial. Foi praticamente o mesmo resultado com o aumento de 2
(duas) pessoas que declararam já haver participando de algum momento nesse
sentido. Observemos no gráfico a seguir:
Questão 13 - Você considera que sua formação torna-o apto para atuar com alunos com NEE?
8
14
1
Sim Não Sem Resposta
121
Questão 14 - Atualmente você tem participado de cursos de formação contínua na área de
Educação Especial?
6
16
1
Sim Não Sem Resposta
Gráfico 19 – Formação continuada em educação especial
Fonte: Questionário aplicado com gestores e educadores
Mesmo com um número significativo de pessoas que não se considera
apto para um contexto inclusivo, citamos como contribuição prática para uma
mudança de paradigma a inquietação causada por esta questão. Especificamente os
professores de algumas classes regulares participam todos os meses de formação
para trabalhar a leitura e a escrita em suas salas de aula e este seria um bom
momento para abordar algumas questões nesse sentido. E nesse sentido, eles
perceberam que poderiam buscar essas informações também nessas atividades. De
acordo com (FERREIRA; FERREIRA):
Atuar numa unidade escolar, hoje, requer que o educador possua uma significativa capacidade para entender a instituição, sua posição no sistema, sua inserção nas dimensões culturais dos alunos, suas idiossincrasias, suas relações internas e, fundamentalmente, que saibamos olhar para o aluno como se constituindo nestas relações. (2004, p. 43).
Ou seja, são questões que não pertencem somente à existência de uma
iniciativa na escola, mas ao acesso as informações que compõe a dinâmica de uma
unidade escolar: Qual sua função? Como se estrutura? O que a financia? Sabemos
que todo Programa é elaborado com base em propostas e ações tendo como intuito
o alcance de objetivos e/ou metas estabelecidas.
A questão é que o financiamento das ações que compõe o Programa não
está descrita nos documentos orientadores e tampouco no termo de adesão da
proposta, exceto, as verbas destinadas aos Seminários de Formação de Gestores e
Educadores. Eventos pontuais diante de uma necessidade bem mais complexa.
122
Questão 18 - Você participou de alguma formação ofertada pelo Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade?
5
17
1
Sim Não Sem Resposta
Portanto, a formação continuada, tema em debate, tem sua execução
afetada, apesar de ser uma das formas mais recorrentes de fomentar conhecimento
através, como o próprio nome já denota, de um exercício sucessivo de reflexão.
Se no Programa não há pleito de verbas para essas formações, como
ocorre essa formação contínua? Na verdade, a responsabilidade recai para os
cofres do município. É ele que deve contemplar a todos os professores e gestores
como forma de constituir um sistema inclusivo. E nesse sentido, acabamos
confirmando, alicerçados nas respostas dos atores da pesquisa, mais uma
indicação para o processo de municipalização das responsabilidades do ensino.
Vejamos o gráfico a seguir:
Gráfico 20 – Formação no programa educação inclusiva: direito à diversidade
Fonte: Questionário aplicado com gestores e educadores
O que constatamos é que 17 profissionais afirmaram não estar
participando de formação ofertada pelo Programa. O que nos preocupa diante de
uma necessidade latente do contexto escolar. No entanto, se formos pensar na
responsabilidade do município nesse processo precisaríamos atentar para alguns
fatores determinantes. Primeiro, quando começamos a pesquisa eram três, o
número de profissionais que trabalhavam com a Educação Especial no Município.
Uma equipe já reduzida. No decorrer do estudo essa quantidade diminuiu para duas
pessoas, onde temos 40 (quarenta) escolas (na sede e em distritos) e 44 (quarenta e
quatro) municípios na área de abrangência para serem acompanhados.
123
Questão 22 - Sabemos que a escola está sendo submetida a uma avaliação realizada pela Secretaria de Educação do
Município de Sobral. Os alunos com NEE participam dessa avaliação?
20
3
Sim Não
Ademais, os professores de Educação Especial que já deveriam estar
“prontos” para exercer a função de atendimento especializado nas escolas ainda
estão em formação que poderíamos até chamar de inicial. São 40 (quarenta)
professores de Educação Especial que participam mensalmente de um encontro
para formação continuada.
A idéia é que eles além de fazerem o trabalho junto às crianças, possam
difundir o material e os conhecimentos trabalhados nesses encontros com toda a
escola (nas reuniões de planejamento, reuniões com os pais, conselhos de classe
etc), mas, prioritariamente com os docentes de classe regular. Já que são eles
também responsáveis pela formação das crianças. Conforme dito anteriormente, não
tivemos a oportunidade de participar de encontros que envolvessem a comunidade
escolar, exceto a reunião de planejamento da Escola do Arco.
Mesmo assim, as escolas nos proporcionaram estar bem próximo de uma
das questões específicas da sala de aula. A Avaliação Externa da Aprendizagem
nos chamou atenção, pois no período em que realizamos a pesquisa empírica
coincidiu com uma das etapas desse processo de avaliação aplicada com alunos.
Ou seja, encontramos na dinâmica da escola uma das faces mais próximas da sala
de aula. Então, perguntamos se os alunos com NEE participavam do processo:
Gráfico 21 – Avaliação na escola inclusiva
Fonte: Questionário aplicado com gestores e educadores
124
Diante de uma resposta tão expressiva acerca da participação desses
alunos, tentamos compreender de que forma acontece e encontramos as seguintes
afirmações:
Eles apenas apresentam-se. Não há instrumentos nem procedimentos específicos para avaliá-los. (Q 5) (grifos nossos)
Não há diferença. As avaliadoras são desinformadas. Os professores é que sofrem a conseqüência no resultado enfrentado. (Q 11)
São avaliados como os outros e se tiverem comprovação de deficiência não são contados nos dados, nos resultados. (Q 17) (grifos nossos)
Os que têm condição fazem a mesma avaliação dos ditos “normais.” Já os que não tem condições como os deficientes visuais são excluídos. (Q 23)
Percebemos que a participação dos alunos com NEE nesse processo
avaliativo é visto de maneira complexa. A avaliação numa perspectiva inclusiva é
individual e processual. O desafio está exatamente na forma que não nega a
existência de conteúdos, mas respeita o ritmo de cada aluno. Nas situações
descritas acima, “a avaliação é superficial, através de um enfoque unilateral” que
tem como resultado o “rebaixamento das expectativas sociais” desses alunos.
(BEYER, 2005, p. 96). É claro que se fossemos discutir postura avaliativa teríamos
várias correntes a considerar e não é nosso objetivo debater as prerrogativas do
processo de avaliação da Prefeitura, mas destacamos o desconhecimento ou fato de
não haver adaptações para avaliar os alunos com necessidades educacionais
especiais. Fato que acaba por confundir até mesmo os professores que apenas
“contam” ou “não contam” as crianças para o resultado no final do ano letivo. Há
uma modificação na relação professor-aluno que pode causar até a rejeição dessa
criança tendo como justificativa a “não produtividade” da mesma. Isso fora outras
questões que nos levariam a uma grande discussão, no entanto, precisaríamos de
outros elementos (que não nos foram revelados nos dados coletados) para ampliar
nosso debate e entender com mais clareza qual o reflexo dessa prática no cotidiano
escolar desses alunos.
Diante dessas e de outras reflexões apresentadas na análise de
questionários (23) e observações, percebemos o público pesquisado ainda tem
muito a caminhar. A educação como qualquer política social deve ser fruto de uma
125
luta organizada em que as pessoas procuram efetivar os direitos de todos com bens
universais e inalienáveis. Pensando nisso, nos apoiamos em Kassar (2005, p. 65)
para apresentar alguns pressupostos e possibilidades que devem ser considerados,
a saber:
• É impossível pensar na educação das pessoas com quaisquer que sejam as diferenças orgânicas sem abordar a qualidade de ensino para todos os cidadãos;
• Assumimos que educação pública é aquela gratuita à população, mantida e administrada pelo poder público, pelo retorno de nossos impostos;
• O atendimento especializado deve ser oferecido pelo poder público e deve ocorrer na escola pública, o que não precisa, necessariamente, significar na mesma sala de aula. Acreditamos que os serviços especiais podem ser montados nas escolas públicas considerando as necessidades e especificidades das diferenças orgânicas (considerando, especialmente, as condições orgânicas graves);
• Uma escola pública de qualidade pode ter classes especiais, salas de recursos e propiciar formas de atendimento, abrangendo até o residencial, se for o caso, mas deve ser uma instituição escolar, cujo compromisso fundamental é a educação escolarizada. E de qualidade.
Ademais, é necessário rever e reconhecer o que já foi construído.
Reflexões fomentadas por essa e outras pesquisas científicas para que possamos
compreender o que já conquistamos e vislumbrar novos caminhos buscando
alternativas para que o proposto consiga alcançar os objetivos no vivido.
126
CONSIDERAÇÕES FINAIS – OLHANDO PRA TRÁS VISLUMBRANDO NOVOS CAMINHOS
A vida tem sons que pra gente ouvir Precisa aprender a começar de novo É como tocar o mesmo violão E nele compor uma nova canção. (Roupa Nova – Música Começo, meio e fim)
Um dos primeiros pontos a serem destacados no processo de pesquisa
foi à opção pela Educação Especial. Uma temática complexa e repleta de questões
polêmicas. Dividimos as nossas reflexões em duas partes: a primeira referente aos
aspectos mais abrangentes da pesquisa e a segunda ao objeto empírico
especificamente.
Iniciamos contextualizando a realidade das pessoas com necessidades
educacionais especiais e encontramos uma caminhada permeada de percalços,
sobretudo, quando nos reportamos ao tratamento destinado aos mesmos. Tratamos
de historiar as questões relacionadas ao contexto nacional, estadual e municipal (no
caso, o de Sobral) dando ênfase ao período dos anos 1995 a 2006. Encontramos
nesse percurso entraves, mas também alguns avanços aos quais pautamos algumas
considerações que não determinam a completude da realidade, mas apontam
algumas questões para reflexão.
É fato que os anos 1990 marcaram a história brasileira por suscitarem
mudanças de ordem política, econômica e social. A educação, um direito social, não
ficou fora do plano de discussões. É necessário lembrar que nessa década é
formulada a Política de Educação Especial (1994) pautada em diretrizes traçadas
pela Declaração de Salamanca, norteadora de vários documentos em âmbito
nacional, estadual e municipal.
É nessa década também que o Estado brasileiro passa por reformas
significativas principalmente para consolidação da política neoliberal. Em tempos de
Estado Mínimo e conseqüente redução nos recursos investidos nas políticas sociais,
gerar esforços para constituir sistemas de ensino democráticos e que respeitem os
127
alunos com necessidades educacionais especiais é um desafio, sobretudo de ordem
prática. De acordo com Freitas:
Inclusão é um tema recorrente em tempo neoliberais, contrastando com a crescente ampliação da exclusão social decorrente dessas políticas, observáveis a olho nu na sociedade contemporânea. Esta aparente contradição revela a intenção de não se discutir “em que” ou “para que” se inclui. (2002).
É o que constatamos acompanhando a reconstrução da histórica e
política na educação nacional e estadual (Brasil e Ceará). No campo da Educação,
ressaltamos a LDB (Lei No 9394/96), o Plano Nacional de Educação – PNE (Lei No
10.172/2001) e as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação
Básica (Resolução No 02/2001) como algumas das formas de materializar os
acordos internacionais visando uma política de inclusão social. Os movimentos de
educação inclusiva até apresentam indicativos de uma política que respeita a
especificidade de cada um e preza pelo acesso à escola regular, “entretanto só o
acesso não é suficiente e traduzir a filosofia de inclusão das leis, dos planos e das
intenções para a realidade dos sistemas e das escolas requer conhecimento e
prática.” (MENDES, 2006, p. 402). Assim a pesquisa científica é essencial para
desvelar aspectos da realidade e fomentar a reflexão entre o real e o ideal. Nesse
sentido, compreendemos a necessidade de um recorte na realidade para então,
atingir o objetivo da pesquisa que é conhecer as políticas implementadas para
atender o princípio da inclusão.
Diante do objetivo de estudo, imaginamos o mapa do Brasil como um
grande tecido formado por retalhos e cada Estado e Município foram representados
dessa forma. O Ceará composto de 184 retalhos menores, os municípios, ainda se
tratava de um universo muito amplo. Pensamos então, em um pequeno retalho que
tivesse características significativas (destaque nas pesquisas nacionais, por
exemplo) ajudaria a entender como se processa a política de inclusão. Sendo assim,
chegamos a Sobral (1995 – 2006), o retalho escolhido para nosso estudo.
Iniciamos expondo que a Política de Inclusão, em Sobral, teve seus
primeiros ensaios em 1998 com a tentativa de implantação do núcleo de
atendimento especializado. Tentativa que “esbarrou” em algumas prioridades
estabelecidas para o município à época (Reformas nas escolas, o processo de
municipalização do ensino através do Fundef – Lei No 9424/96, entre outras
128
questões). O Município redimensionou sua política educacional buscando
principalmente a reversão do quadro de analfabetismo no ensino fundamental e a
partir de então, essa tem sido a maior meta a ser alcançada.
Somente em 2003, as ações foram retomadas pautando-se nas
indicações estabelecidas pelo Ministério da Educação pós Diretrizes Curriculares
para Educação Especial na Educação Básica, tendo no Projeto de Apoio aos Alunos
Portadores de Necessidades Educativas Especiais e Dificuldades de Aprendizagem
(PAPE) o seu foco de trabalho. O primeiro ano de execução do projeto reforçou a
idéia de que a presença de um profissional para ajudar na construção de uma
proposta inclusiva era essencial. Em meados de 2003 e início de 2004, a iniciativa,
por ser avaliada, principalmente pelos gestores escolares, a atuação de Sobral em
prol da inclusão, passa a fazer parte das ações do município no Programa Educação
Inclusiva: Direito a Diversidade.
Nesse projeto encontramos um profissional que tendo a função de
multiplicar as idéias de inclusão busca junto à escola estabelecer conexões entre
docentes, alunos, pais, gestores e funcionários. Um dos caminhos percorridos é o
sistema da bidocência, algo que merece o seu destaque, mas conforme a
pesquisa, a articulação entre o profissional de sala de aula regular e o do apoio
pedagógico é restrita. Trata-se de um trabalho segmentado e por várias vezes temos
a impressão da coexistência de duas realidades diferenciadas. Uma referindo-se a
sala de aula regular e outra ao espaço em que ocorre o atendimento das crianças.
Diante dessa situação, percebe-se a dificuldade para um docente que não
teve aproximação com os conhecimentos específicos da Educação Especial, ter uma
dinâmica de trabalho fluente junto aos alunos com necessidades educacionais
especiais – NEE. E, além disso, responder as metas traçadas para a educação no
município. É evidente, que, em algumas situações, encontramos trabalhos que
conseguem estabelecer conexões entre as atividades dos dois docentes facilitando
o desenvolvimento da criança, mas são situações que ocorrem com menor
freqüência do que deveria.
Outra questão refere-se ao conceito de atendimento educacional
especializado, o qual não deveria remeter apenas a presença de um profissional na
escola. É válido destacar que este profissional (atualmente chamado de Professor
do Projeto de Atendimento Educacional Especializado - PAEE) tem um
acompanhamento através de formação contínua fomentada pela equipe da
129
Secretaria de Educação do Município. No entanto, o professor da sala de aula
regular, parte e também envolvido no processo, não recebe a mesma formação.
Pensando nisso, relembramos que o Programa Educação Inclusiva:
Direito a Diversidade refere-se a três campos distintos: o município, a escola e a
família. Entendemos que a Secretaria de Educação ainda tem muito a caminhar para
apropriar-se desses três campos, a começar pela formulação de seu Plano Municipal
de Educação que ainda está em discussão. Além disso, a relação e a atuação do
município na tarefa de multiplicador das idéias de inclusão para a região de
abrangência vem se desenvolvendo de forma lenta e gradual. De fato, não podemos
atribuir e nem responsabilizar apenas Sobral por esse caminhar junto aos
municípios, pois o programa federal em termos de verbas enviou apenas os recursos
para organização dos seminários de troca de experiências. As outras articulações
que ocorreram para intercâmbio de ações e a formação continuada dos professores
(para o atendimento especializado) foram fomentadas com recursos próprios.
No que se refere às escolas, estão ainda entendendo como é conviver
com a diversidade. Na amostra pesquisada há uma visão muito confusa sobre os
conceitos ligados a Educação Especial e a realidade da Escola Inclusiva, tendo
em vista, ser uma realidade relativamente recente nas escolas municipais. E Isso
foi um dos fatores que mais dificultou o acesso às informações e a até mesmo o
preenchimento dos questionários. Parece-nos que o principal responsável pelo
processo de inclusão dessas crianças é o PAEE. É esse projeto que abriga a
maior referência para a construção do sistema educacional inclusivo. O que
demonstra uma abrangência reduzida de atuação para uma questão tão latente
na educação brasileira.
Questões como acessibilidade, e até modificações pedagógicas ainda são
objeto de embate no processo de inclusão desses alunos. Citamos como exemplo,
em uma das escolas pesquisadas, duas crianças cegas em salas diferentes e
apenas uma reglete e uma pulsão para ambas utilizarem. No caso, de crianças com
surdez, apenas alguns professores conhecem de maneira muito inicial a Língua
Brasileira de Sinais (LIBRAS), língua oficial da comunidade surda.
No que se refere à estrutura física, encontramos somente as rampas que
possibilitam o acesso de cadeirantes. Os materiais pedagógicos considerados uma
forma adaptação curricular (letras maiores para quem tem baixa visão, material em
alto relevo para os cegos, jogos etc) estão disponíveis, mas, são utilizados com
130
maior freqüência pelas professoras de atendimento especializado. Isso porque
muitos foram construídos pelos próprios profissionais de apoio especializado.
No que consiste a compreensão de uma política ou programa de
educação inclusiva, gestores e educadores afirmam ter conhecimento da existência
dessa ação, mas não detêm maiores detalhes sobre a operacionalização dessa
mudança na escola. Parece-nos que essa transição passa por eles e inclusive
implica na revisão didático-pedagógica, mas a referência sobre o trabalho inclusivo é
feita diretamente ao profissional que faz o atendimento especializado. Fato também
detectado devido ao período da pesquisa ter coincidido com uma das etapas no
processo de Avaliação Externa da Aprendizagem. Nesse caso específico, a escola
tem como prioridade esse momento avaliativo e, o que nos chamou mais atenção é
que não há uma adaptação ou aplicação de uma prova diferenciada aos alunos que
apresentam deficiências. Eles participam do processo sendo “avaliados” da mesma
forma que os demais. O fato de serem submetidos a uma avaliação é válido sob o
ponto de vista da participação, mas a avaliação inclusiva tem por base a evolução
do aluno. Não nega a existência e a necessidade dos conteúdos desde que sejam
coerentes com os níveis de aprendizado previstos pelo planejamento. Isso não os
isenta de até mesmo serem submetidos a uma mesma avaliação desde que estejam
realmente preparados para ela.
Mesmo diante dessas e de outras contradições, destacamos mais uma
vez o trabalho desses professores que “apóiam” essas crianças na escola. Há um
esforço, mesmo com a ausência dos elementos necessários, para que o trabalho
alcance resultados. Eles buscam junto aos professores de sala de aula regular as
mudanças para que o aluno se sinta parte daquele contexto. Ressaltamos também a
abertura das crianças (colegas de sala e de brincadeiras) que os recebem com a
disponibilidade de quem já sabe que, em meio às diferenças, prevalece a
convivência e o aprendizado. Elas não vêem barreiras na convivência com essas
pessoas, compreendem com clareza o conceito de diversidade.
Refletindo sobre como conviver com as diferenças é que percebemos o
quanto ainda é bastante inicial as relações para a construção de uma educação
inclusiva nas escolas municipais sobralenses. O modelo que vem se constituindo
ainda traz em suas ações muitos elementos da integração e não da inclusão.
Lembramos ainda que a dicotomia inclusão/exclusão social, também presente
131
nesse debate, não pertence somente às pessoas com NEE e nem se esgota no
ambiente escolar.
O processo de inclusão educacional exige planejamento e mudanças
sistêmicas político-administrativas na gestão educacional, que envolve desde a
alocação de recursos até a flexibilização curricular que ocorre em sala de aula (algo
ainda embrionário nesse contexto). Nesse sentido, cada sujeito é um elemento
fundamental nesse cenário constituindo assim a rede que sustenta o processo
inclusivo. Sendo necessário que todos se sintam parte nessa construção. A
formação que ainda não contempla os professores de sala de aula regular é
imprescindível.
É notório e não podemos esquecer que o momento é de transição de
paradigmas dado a realidade recente. As conquistas já consolidadas pelas pessoas
com NEE e seus familiares nas escolas municipais de Sobral, não podem ser
descartadas e as estruturas desmanteladas, como se não tivessem um valor
histórico na complexa rede de relações que constituem o corpo social.
Nesse contexto em construção, nos permitimos indagar mais uma vez: O
que é Especial e o que é Inclusivo? Essas perguntas ainda não foram respondidas
na totalidade. Ainda cabem aprofundamentos em questões de ordem pedagógica,
da formação docente dentre outros aspectos. Caminhos que podemos ainda trilhar.
Espaços a conquistar.
132
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139
APÊNDICE
140
Universidade Estadual do Ceará Mestrado em Políticas Públicas e Sociedade
EDUCAR PARA A DIVERSIDADE: UM OLHAR SOBRE AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO ESPECIAL DESENVOLVIDAS NO MUNICÍPIO DE SOBRAL.
Marla Vieira Moreira de Oliveira
QUESTIONÁRIO
Sobral-CE, _____/_____/_____. Dados de Identificação: 1- Quantos anos você tem? ( ) Menos de 20 anos ( ) Entre 20 e 30 anos ( ) Entre 31 e 40 anos ( ) Entre 41 e 50 anos ( ) Mais de 50 anos 2- Há quanto tempo você trabalha? ( ) Menos de 5 ( ) De 5 a 10 anos ( ) De 11 a 15 anos ( ) Acima de 15 anos 3- No decorrer de uma semana, você trabalha: ( ) Menos de 20 horas ( ) Entre 20 e 30 horas ( ) Entre 30 e 40 horas ( ) Mais de 40 horas 4- Qual a sua formação? Graduação ( ) Sim ( )Não Qual curso? _____________________________________________________________________ Quando você concluiu? ____________________________________________________________ Especialização ( ) Sim ( ) Não Qual área? ______________________________________________________________________ Quando você concluiu? ____________________________________________________________ Outros: _________________________________________________________________________ O Município, a Escola e a Família: os Diferentes Papéis no Contexto Educacional Inclusivo. 5- O que você entende por educação inclusiva? _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 6- Na escola onde você trabalha assegura-se na proposta pedagógica o acesso à escola para as
crianças com necessidade educacionais especiais? ( ) Sim ( ) Não
141
7- Se sim, de que forma está previsto este a acesso na proposta pedagógica da escola? Se não por quê?
_____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ 8- Na escola onde você trabalha existe um Conselho Escolar? ( ) Sim ( ) Não 9- Como o Conselho Escolar atua no processo de inclusão de crianças com necessidades
educacionais especiais? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ 10- Existe na estrutura física da escola uma adaptação para receber crianças com necessidades
educacionais especiais? ( ) Não ( ) Sim Se sim, Quais? Se não, por quê? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ 11- De acordo com levantamento feito pela Secretaria do Município, nas salas de aula regular
estudam alunos que apresentam necessidades educacionais especiais. Como são identificadas as crianças que possuem necessidades educacionais especiais?
_________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ 12- Ocorreu alguma mudança na organização física e pedagógica na sala de aula para receber os
alunos com necessidades educacionais especiais? ( ) Sim ( ) Não Se sim, como aconteceu? Se não, por quê? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 13- Você considera que a sua formação torna-o apto para atuar com alunos com necessidades
educacionais especiais? ( ) Sim ( ) Não
142
Por quê? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 14- Atualmente você tem participado de cursos de formação contínua na área da Educação Especial?
Se sim, Qual? Se não, por quê?
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 15- Como ocorre a participação da família no processo de inclusão das crianças com necessidades
educacionais especiais? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 16- Você conhece o Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade? ( ) Sim ( ) Não 17- Como ele é desenvolvido na sua escola? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 18- Você participou de alguma formação ofertada pelo Programa Educação Inclusiva: Direito a
Diversidade? Se sim, Quais? Se não, por quê?
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 19- O que você pensa com relação a esse Programa? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ 20- A Secretaria de Educação do Município dispõe de equipe técnica para dar suporte à escola no
desenvolvimento do Programa? ( ) Sim Como é feito esse acompanhamento? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ ( ) Não Por quê? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________
143
21- Além do Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, os alunos com necessidades educacionais especiais têm participado de outros projetos desenvolvidos na escola? Se sim, Quais? Se não, por quê?
_________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ 22- Sabemos que a escola está sendo submetida a uma avaliação realizada pela Secretaria de
Educação do Município de Sobral. Os alunos com necessidades educacionais especiais participam dessa avaliação?
( ) Sim Como acontece essa participação? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ ( ) Não Por quê? _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ Mais uma vez, muito obrigada pela sua colaboração!
144
ANEXOS