108
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE SUA FINALIDADE RETRIBUTIVA CYNTHIA REGINA DE ABREU BERNARDINO Itajaí (SC), novembro de 2010.

EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

  • Upload
    trantu

  • View
    214

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO

EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE SUA FINALIDADE RETRIBUTIVA

CYNTHIA REGINA DE ABREU BERNARDINO

Itajaí (SC), novembro de 2010.

Page 2: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO

EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE SUA FINALIDADE RETRIBUTIVA

CYNTHIA REGINA DE ABREU BERNARDINO

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito. Orientadora: MSc. Adriana Maria Gomes de Souza Spengler

Itajaí (SC), novembro de 2010.

Page 3: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

AGRADECIMENTO

A meus pais, que me ensinaram o valor do estudo e sempre me motivaram a buscar o saber sem limites.

A minha família, pelo apoio incondicional nestes excelentes cinco anos de graduação.

A professora orientadora deste trabalho, Adriana Maria Gomes de Souza Spengler, pela inigualável

atenção dispensada a cada linha deste estudo.

Aos meus colegas de faculdade, que foram testemunhas do meu empenho e dedicação para me

tornar Bacharel em Direito.

A Deus, por tudo!

Page 4: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

DEDICATÓRIA

A meu pai, Célio José Bernardino, cuja coragem, determinação, dedicação e honestidade construíram

o exemplo de ser humano que procuro seguir em todos os dias de minha vida.

A minha mãe, Luciana Maria de Abreu Bernardino, a quem tudo devo, por sua incansável renúncia, sacrifício e afeto, os quais jamais conseguirei

retribuir na mesma intensidade.

A minha avó materna, Dolores Luiza Bernardi de Abreu (in memorian), que fez parte de muitos momentos inesquecíveis de minha vida, mas

infelizmente não compartilhará comigo este momento tão esplendoroso.

Page 5: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí (SC), novembro de 2010.

Cynthia Regina de Abreu Bernardino Graduanda

Page 6: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Cynthia Regina de Abreu Bernardino,

sob o título “Eficácia da pena privativa de liberdade sob o enfoque de sua finalidade

retributiva”, foi submetida em 22 de novembro de 2010 à banca examinadora

composta pelos seguintes professores:

Itajaí (SC), novembro de 2010

Profª. MSc. Adriana Maria Gomes de Souza Spengler Orientadora e Presidente da Banca

Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

Page 7: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CF Constituição Federal

CP Código Penal

LEP Lei de Execução Penal

RDD Regime Disciplinar Diferenciado

STF Supremo Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal de Justiça

Page 8: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias1 que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais2.

Apenado3

Será sempre aquele em desfavor de quem se proferiu sentença condenatória ou de

absolvição imprópria. Poderá ser tanto o preso definitivo quanto o provisório, em se

tratando de pena privativa de liberdade; o internado ou o submetido a tratamento

ambulatorial, nas hipóteses de medida de segurança.

Criminologia4

Criminologia é a ciência que estuda o crime, como fenômeno social, o criminoso,

como parte integrante do mesmo contexto, bem como as origens de um e de outro,

além dos fatores de controle para superar a delinqüência.

Pena5

A pena é uma sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução

de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na

restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição

punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e prevenir novas

transgressões pela intimidação dirigida à coletividade.

Reincidência6

É a situação de quem pratica um fato criminoso após ter sido condenado por crime

anterior, em sentença transitada em julgado. 1 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 7. ed. Florianópolis: OAB/SC, 2002. p. 40. 2 “Conceito Operacional (=cop) é uma definição para uma palavra e expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os feitos das idéias que expomos”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p. 56. 3 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 5. 4 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 55. 5 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral: (arts. 1º ao 120) – 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v.I. p. 384. 6 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral: (arts. 1º ao 120). p. 499.

Page 9: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

Pena Privativa de Liberdade7

É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal, consistente na

perda de sua liberdade física de locomoção e que se efetiva mediante seu

internamento em estabelecimento prisional.

Penitenciária8

Presídio especial ao qual se recolhem os condenados à pena de reclusão, em

regime fechado e, onde o Estado os submete à sanção das suas leis punitivas, a fim

de que possam regenerar-se ou reabilitar-se para o convívio em sociedade.

7 LEAL, João José. Direito Penal Geral. Florianópolis: OAB Editora, 2004. p. 391. 8 FELLIPE, Donaldo J. Dicionário de expressões latinas: termos e expressões em latim, com a versão para o português. 5. ed. Campinas: Julex, 1991. p. 121.

Page 10: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

ix

SUMÁRIO

RESUMO ........................................................................................... XI INTRODUÇÃO .................................................................................. 12 DA PENA .......................................................................................... 15 1.1 ASPECTOS SOBRE A HISTORICIDADE DA PENA DE PRISÃO ............. 15 1.1.1 Conceito de Pena ..................................................................................... 17 1.2 AS PENAS NA SUA ORIGEM ...................................................................... 18 1.2.1 Fase da Vingança Privada ....................................................................... 18 1.2.2 Fase da Composição ............................................................................... 20 1.2.3 Fase da Vingança Divina ......................................................................... 21 1.2.4 Fase da Vingança Pública ....................................................................... 23 1.3 PERÍODO HUMANITÁRIO ........................................................................... 25 1.3.1 O Direito Penal e os Iluministas .............................................................. 25 1.3.2 Cesare Beccaria - Dei delitti e delle pene .............................................. 26 1.3.3 John Howard - The State of Prisions in England ……………………….. 28 1.3.4 Jeremy Bentham …………………………………………………………....... 29 1.3.4.1 Jeremy Bentham e o Panótico ............................................................. 30 1.4 ESCOLAS PENAIS ....................................................................................... 30 1.4.1 Escola Penal Clássica .............................................................................. 30 1.4.2 Escola Penal Positiva .............................................................................. 32 1.4.3 Terceira Escola ......................................................................................... 34 1.4.4 Escola Moderna Alemã............................................................................. 34 1.5 PANORAMA HISTÓRICO DO DIREITO PENAL NO BRASIL .................... 35 1.5.1 O Código Criminal do Império - 1830 ..................................................... 36 1.5.2 O Código Criminal Republicano - 1890 .................................................. 37 1.5.3 O Código Penal de 1940 .......................................................................... 38 1.5.4 A reforma de 1984 e a Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal) ........... 39 2. A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ..................................................................

41

2.1ESPÉCIES DE PENAS .................................................................................. 41 2.2 PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE ............................................................ 42 2.3 MODALIDADES DE PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE....................... 42 2.3.1 Reclusão e Detenção ............................................................................... 43 2.3.2 Prisão Simples .......................................................................................... 44 2.4 REGIMES PENAIS/PRISIONAIS .................................................................. 45 2.4.1 Regime Fechado ....................................................................................... 46

Page 11: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

2.4.2 Regime Semi-Aberto ................................................................................ 48 2.4.3 Regime Aberto .......................................................................................... 49 2.4.4 Regime Especial ....................................................................................... 52 2.4.5 Regime Disciplinar Diferenciado ............................................................ 53 2.5 EXAME CRIMINOLÓGICO ........................................................................... 53 2.6 PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO ............................................................ 55 2.7 PENA DE MULTA ......................................................................................... 58 2.8 FINALIDADES DA PENA ............................................................................. 59 2.8.1 Teoria Absoluta ou Retributiva da Pena ................................................ 59 2.8.1.1 Kant e Hegel: Defensores da Teoria Retributiva ........................................... 61 2.8.2 Teoria Relativa ou Preventiva da Pena .................................................. 62 2.8.2.1 Prevenção Geral ............................................................................................... 63 2.8.2.2 Prevenção Especial .......................................................................................... 64 2.8.3 Teoria Mista ou Unificadora da Pena .......................................................... 65 3. INEFICÁCIA DA FINALIDADE RETRIBUTIVA DA PENA FACE AO INSTITUTI DA REINCIDÊNCIA ..................................................

67

3.1 POLÍTICA CRIMINAL, CRIMINOLOGIA E AS POLÍTICAS DE SEGURANÇA PÚBLICA .................................................................................... 70 3.2 DADOS ESTATÍSTICOS - SISTEMA PENITENCIÁRIO DO ESTADO DE SANTA CATARINA ............................................................................................ 74 3.2.1 Categoria: Quantidade de Presos/Internados Masculinos ................... 75 3.2.2 Categoria: Quantidade de Presos/Internados Femininos .................... 76 3.2.3 Categoria: Estabelecimentos Penais ..................................................... 76 3.2.4 Categoria: Capacidade ............................................................................ 77 3.2.5 Indicadores Automáticos ........................................................................ 78 3.2.6 Categoria: Perfil do Preso ....................................................................... 78 3.2.7 Categoria: Perfil do Preso ....................................................................... 79 3.2.8 Categoria: Perfil do Preso ....................................................................... 79 3.3 DIREITO PENAL DO INIMIGO (OU INIMIGOS DO DIREITO PENAL) ....... 80 3.3.1 Reações ao Direito Penal do Inimigo ..................................................... 83 3.4 REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO FRENTE ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS E TRATADOS INTERNACIONAIS ...................................

85

3.4.1 Principais julgados sobre o Regime Disciplinar Diferenciado ............ 95 3.5 ABOLICIONISMO PENAL - A ANTÍTESE DO DIREITO PENAL MÁXIMO. 97 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 100 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 102 ANEXOS ........................................................................................... 106

Page 12: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

RESUMO

O presente trabalho constitui-se em um estudo que visa

analisar a eficácia da pena privativa de liberdade, notadamente com ênfase na

finalidade retributiva infligida ao apenado, nos moldes trazidos pelas disposições

esposadas na Lei de Execução Penal. Esta monografia encontra-se dividida em

três capítulos, sendo que o primeiro capítulo versa sobre a historicidade da pena

de prisão, a partir de uma análise de seu conceito e contextualização histórica.

Aborda-se também, sobre as Escolas Penais e traça-se um panorama histórico do

Direito Penal do Brasil junto às legislações criminais já vigentes, desde o Código

Criminal do Império até a edição da Lei de Execução Penal (Lei n. 7.210/84). O

segundo capítulo trata da pena privativa de liberdade, de todas as espécies de

penas previstas no Código Penal, dos regimes carcerários e finalidades da pena,

conforme preceitua a Lei de Execução Penal. Por derradeiro, no terceiro capítulo

trata-se da ineficácia da finalidade retributiva da pena face o instituto da

reincidência, oportunidade na qual são abordados os movimentos de políticas

criminais e até mesmo práticas legais que visam maximizar o castigo do preso,

como é o caso do RDD – Regime Disciplinar Diferenciado, do Direito Penal do

Inimigo (ou inimigos do Direito Penal), também sua antítese – o Abolicionismo

Penal, a fim de elucidar se a adoção desses, por si só, é necessária para se

garantir a plena eficácia da pena privativa de liberdade. No mais, para oportunizar

uma reflexão sobre políticas de segurança pública e até mesmo aspectos da

criminologia, faz-se um levantamento ilustrado por gráficos e tabelas que revelam

dados do sistema penitenciário catarinense.

Page 13: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto proceder a uma

análise da eficácia da pena privativa de liberdade sob o enfoque de sua finalidade

retributiva.

O tema elegido é de tamanha relevância, uma vez que

proporciona uma reflexão acerca das políticas de segurança pública adotadas no

país que, em tese, teriam o dever de oportunizar uma convivência social isenta de

ameaças de violência, permitindo a todos o gozo dos direitos assegurados pela

Constituição Federal/88.

O seu objetivo institucional é o de produzir a presente

Monografia para obtenção do Título de Bacharel em Direito, pela Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI.

O seu objetivo geral é o de investigar acerca da eficácia da

pena privativa de liberdade, mormente no que concerne ao caráter

exclusivamente retributivo desta.

Os seus objetivos específicos calcam-se na abordagem da

finalidade da pena e, não tão somente no tocante à finalidade retributiva, mas sim

tratá-la de um modo completo, ou seja, estudar as hipóteses que contemplam o

castigo infligido ao apenado em dissonância diametral em cotejo à oportunidade

de sua regeneração, trazida pela Lei de Execução Penal.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando da

historicidade da pena de prisão, desde os primórdios da civilização até os dias de

hoje, analisando-se seu conceito.

Outrossim, traz o referido capítulo considerações acerca das

Escolas Penais. E por último, traça-se um panorama do Direito Penal no Brasil, a

partir da contextualização de toda a legislação penal já vigente, passando pelo

Código Criminal do Império, Código Criminal Republicano, Código Penal de 1940,

Page 14: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

13

a posterior reforma da Parte Geral em 1984 até a edição da Lei de Execução

Penal (Lei n. 7.210/84).

No Capítulo 2, tratar-se-á da pena privativa de liberdade e

dos outros tipos de penas previstos no Código Penal, regimes de cumprimento de

pena, discorrendo-se ainda, sobre as finalidade da pena.

No Capítulo 3, abordar-se-á sobre a ineficácia da finalidade

retributiva da pena face o instituto da reincidência, oportunidade na qual são

abordados os movimentos de políticas criminais e até mesmo práticas legais que

visam maximizar o castigo do preso, como é o caso do RDD – Regime Disciplinar

Diferenciado, do Direito Penal do Inimigo (ou inimigos do Direito Penal), também

sua antítese – o Abolicionismo Penal

Outrossim, traz-se considerações referentes à criminologia e

às políticas criminais, a partir de um levantamento estatístico que revela dados do

sistema penitenciário catarinense.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre a eficácia da pena privativa de liberdade sob o enfoque de sua finalidade

retributiva.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

Hipótese 1: A função retributiva da pena privativa de

liberdade é ainda caracterizada como um meio de defesa social.

Hipótese 2: Parte-se da premissa de que a função retributiva

da pena privativa de liberdade deve ser proporcional ao delito cometido,

entretanto, não oportuniza o restabelecimento da ordem social violada pelo crime.

Hipótese 3: A ineficácia e o fracasso da pena privativa de

liberdade não são os únicos fatores a contribuir com a reincidência.

Page 15: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

14

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação9 foi utilizado o Método Indutivo10, na Fase de Tratamento de

Dados o Método Cartesiano11, e, o Relatório dos Resultados expresso na

presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas do Referente12, da Categoria13, do Conceito Operacional14 e da

Pesquisa Bibliográfica15.

9 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente

estabelecido[...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101.

10 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 104.

11 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

12 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 62.

13 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 31.

14 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 45.

15 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 239.

Page 16: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

15

CAPÍTULO 1

DA PENA

1.1 ASPECTOS SOBRE A HISTORICIDADE DA PENA DE PRISÃO

Neste primeiro capítulo, abordar-se-á aspectos relevantes

sobre o surgimento da pena de prisão, que por seu turno, divide-se em algumas

fases, a saber: a vingança privada, a vingança divina, a vingança pública e o período

humanitário.

Lyra16 assinala que as primeiras leis foram leis penais. “Nas

sociedades primitivas, o direito era inteiramente penal. A primeira lei que se impôs

aos legisladores e aos juízes, antes de se fixar os direitos, foi a de aplicar penas”.

A historicidade da pena de prisão revela o surgimento do

Direito Penal nos seus primórdios. Essa idéia de ligação existente entre pena e o

Direito Penal, como ciência propriamente dita, acompanha a história da humanidade.

Nesta senda, no discurso que envolve os termos Ciências

Penais e prisão/pena, destaca-se o entendimento Oliveira17, a qual ensina:

Embora entendendo esses institutos, respectivamente, como gênero e espécie, a literatura específica, seja de generalidade histórica ou casuística, emprega os dois termos de forma tão envolvente que parecem resultar num só conceito.

E continua: [...] a pena é uma instituição muito antiga, cujo surgimento se registra nos primórdios da civilização, já que cada povo e todo período

16 LYRA, Roberto. Comentários ao código penal. Rio de Janeiro: Forense, 1942. p. 10. 17 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. 2. ed. revista e ampliada. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1996. p. 21.

Page 17: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

16

histórico sempre teve seu questionamento penal, inicialmente, como uma manifestação de simples reação natural do homem primitivo para uma conservação de sua espécie, sua moral e sua integridade, após, como um meio de retribuição e de intimidação, através das formas mais cruéis e sofisticadas de punição, até nossos dias, quando pretende-se afirmar como uma função terapêutica e recuperadora.18

Noronha19 sugere que “a história do direito penal é a história da

humanidade. Ele surge com o homem e o acompanha através dos tempos, isso

porque o crime, o qual sombra sinistra, nunca dele se afastou”.

Mirabete20 discorre que “perde-se no tempo a origem das

penas, pois os mais antigos agrupamentos de homens foram levados a adotar certas

normas disciplinadoras de modo a possibilitar a convivência social”.

Outrossim, Mirabete21 aduz que:

Nas antigas civilizações, dada a idéia de castigo que então predominava, a sanção mais freqüentemente aplicada era a morte, e a repressão alcançava não só o patrimônio, como também os descendentes do infrator.

Desta feita, verifica-se que apontar uma data ou período exato

para a origem da pena não constitui uma tarefa fácil, haja vista que a pena exsurge

a partir do momento em que a sociedade assume um caráter de coletividade, ou

seja, passa a viver um grupo, situação que naturalmente exigiu a implantação de

regras próprias.

18 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 21. 19 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. 37. ed. Atualizado Adalberto José Q.T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 20. 20 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 23. ed. revista e atualizada. São Paulo: Atlas, 2005. p. 243. 21 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 244.

Page 18: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

17

1.1.1 Conceito de Pena

Nucci22 conceitua a pena como “a sanção imposta pelo Estado,

através da ação penal, ao criminoso, cuja finalidade é a retribuição ao delito

perpetrado e a prevenção a novos crimes”.

Como bem denota-se do texto ante transcrito, Nucci não deixa

de relacionar as finalidades da pena ao próprio conceito desta. Contudo, convém

salientar que as teorias de finalidades da pena serão cuidadosamente analisadas

em subtítulo específico no próximo capítulo.

De outro norte, Noronha23 posiciona-se distintamente, para

tanto, dissocia o conceito de pena do seu fim:

A pena é retribuição, é privação de bens jurídicos, imposta ao criminoso em face do ato praticado. É expiração. Antes de escrito nos Códigos, está profundamente radicado na consciência de cada um que aquele que praticou um mal deve também um mal sofrer. Não se trata de lex talionis, e para isso a humanidade já viveu e sofreu muito; porém é imanente em todos nós o sentimento de retribuição do mal feito pelo delinqüente. Não como afirmação de vindita, mas como demonstração de que o direito postergado protesta e reage, não apenas em função do indivíduo, mas também da sociedade.

Sob a óptica de Jesus24:

Pena é a sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim é evitar novos delitos.

Para Aníbal25, “pena é a sanção, consistente na privação de

determinados bens jurídicos, que o Estado impõe contra a prática de um fato

definido na lei como crime”.

22 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 171. 23 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 226. 24 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1995. v.I. p. 457. 25 ANÍBAL, Bruno, Apud. SHECAIRA, Sérgio Salomão. In Teoria da Pena. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 182.

Page 19: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

18

Ademais, é oportuno trazer a lume considerações afetas à

etimologia do vocábulo pena, traçadas por Oliveira26:

Etimologicamente, o termo pena procede do Latim (poena), porém, com derivação do grego (poine) significando dor, castigo, punição, expiação, penitência, sofrimento, trabalho, fadiga, submissão, vingança e recompensa.

Destarte, compreende-se que a pena é uma sanção imposta

pelo Estado, com o condão de retribuir ao apenado o mal praticado por este,

impondo-lhe como castigo maior, a privação de sua liberdade, com o intuito de que

não torne a perpetrar novas condutas criminosas.

1.2 AS PENAS NA SUA ORIGEM

1.2.1 Fase da Vingança Privada

Na denominada fase da vingança privada, cometido um crime,

ocorria a reação da vítima, dos parentes e até do grupo social (tribo), que agiam sem

proporção à ofensa, atingindo não só o ofensor, como também todo o seu grupo.

De igual jaez, colhe-se do entendimento de Noronha27, o qual

entende a vingança privada como:

[...] uma reação do indivíduo contra o indivíduo, depois, não só dele como de seu grupo, para, mais tarde, já o conglomerado social colocar-se ao lado destes [...] a reação era puramente pessoal, sem intervenção ao auxílio dos estranhos.

É nesta fase que surge, então, como primeira conquista no

terreno repressivo, o talião, sob o lema “olho por olho, dente por dente”.

26 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 21. 27 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 20.

Page 20: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

19

Oliveira28 acredita que o talião “representava uma grande

conquista, pois estabelecia uma proporcionalidade entre a ação e a reação do delito

cometido e da pena imposta”.

Mirabete29 destaca que o “[...] talião foi adotado no Código de

Hamurabi, (Babilônia), no Êxodo (povo hebraico) e na Lei das XII Tábuas (Roma).

Aduzindo ainda, que o talião “[...] reduziu a abrangência da ação punitiva”.

Leal30 enumera exemplos da aplicação do Talião:

Se um indivíduo destrói o olho de outro indivíduo: destruirão seu olho. Se quebrou o osso do outro: quebrarão seu osso. Se arrancou o dente de outro: arrancarão o seu dente (§ § 196, 197 e 200 do Código de Hamurabi). Os Hebreus também adotaram o talião. Vejamos a Bíblia “Mas se houver dano, urge dar vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe (Êxodo, 21, 23).” Na Lei das XII Tábuas: “Se alguém fere a outrem, que sofra a pena de talião, salvo se houver acordo (Tábua, VII, 11).”

Não obstante, Marques31 pontua: No Brasil, os povos indígenas adotavam valores culturais de punição condizentes à vingança de sangue, regra de Talião, a perda da paz, a pena de morte através de tacape e as penas corporais, sob a concepção de suas crendices, sendo que as práticas punitivas desses povos indígenas em nada influíram na legislação brasileira.

Oliveira32 assim discorre:

A lei de talião era bem mais racional do que as outras formas de vingança punitiva, mas ainda não era reconhecida propriamente como um gênero de pena, porém, sua importância lhe é devida por ser a primeira fórmula de justiça penal.

28 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 23. 29 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 17. 30 LEAL, João José. Direito penal geral. p. 69. 31 MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. Campinas: Bookseller, 1997. v. I. p. 115-116. 32 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 24.

Page 21: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

20

Assim sendo, é possível concluir que no período da vingança

privada, a “pena” não se relacionava a quaisquer ditames de razoabilidade e

piedade, uma vez que era aplicada não tão somente àquele que agrediu outrem,

mas também se estendia à família/grupo do próprio agressor.

1.2.2 Fase da Composição

Posteriormente, surge a composição, sistema pelo qual o

ofensor se livrava do castigo com a compra de sua liberdade (pagamento em

moeda, gado, arma, etc).

Cumpre registrar que a composição foi “adotada, também, pelo

Código de Hamurabi, pelo Pentateuco e pelo Código de Manu (Índia). Também foi a

composição largamente aceita pelo Direito Germânico [...]33”.

Oliveira34 aponta que este “foi o período da vingança privada,

chamado sentimental, porque era o sentimento que provocava e demandava a

justiça”.

E mais:

O delinqüente poderia comprar a impunidade do ofendido, ou de seus parentes, com dinheiro, armas, utensílios e gado, não havendo, então, sofrimento físico pessoal, mas uma reparação material proporcionalmente correspondente. O sentimento e a vingança impulsionavam a justiça e determinavam que a mesma fosse realizada. Como o talião, o sistema de composição não é considerado, ainda, um verdadeiro gênero de pena35.

Acerca do assunto em comento, ensina Aníbal36:

33 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 17. 34 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 24. 35 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 24. 36 ANÍBAL, Bruno. Direito penal: parte geral: introdução, norma penal, fato punível. 3 ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 1978. p .71.

Page 22: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

21

Aqui encontra-se o pacto de paz entre o ofendido e o ofensor, mediante a composição. Achou-se no chamado preço do sangue, a forma de compor o dissídio a princípio irredutível e conducente a verdadeiras hecatombes, entre os dois grupos, o agressor e o agredido.

Vislumbra-se que a composição nada mais era do que um

acordo, oportunidade na qual era conferida ao criminoso a possibilidade de negociar

sua impunidade com o ofendido, mediante o pagamento em pecúnia, ou ainda,

através do escambo de armas, gado ou quaisquer outros utensílios, com o propósito

de evitar a represália, retribuição do mal pelo sofrimento físico.

1.2.3 Fase da Vingança Divina

Nesta fase a punição tinha por finalidade aplacar a ira da

divindade atingida pelo crime, numa sociedade regida pelo mais ferrenho

teocentrismo, onde qualquer acontecimento, independentemente de sua natureza,

era atribuído à vontade divina.

No que tange à vingança divina, Noronha37 explica:

Já existe um poder social capaz de impor aos homens normas de conduta e castigo. O princípio que domina a repressão é a satisfação da divindade, ofendida pelo crime. Pune-se com rigor, antes com notória crueldade, pois o castigo deve estar em relação com a grandeza do deus ofendido.

A fase da vingança divina apresenta uma característica

peculiar, pois neste período a religião confundia-se com o Direito e, por conseguinte,

as poucas leis existentes na Idade Medieval sujeitavam-se aos dogmas do

Cristianismo.

Acrescentam-se as observações de Kaufmann citado por

Bitencourt38:

37 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal introdução e parte geral. p. 21. 38 KAUFMANN, Hilde. Princípios para la reforma de la ejecución penal, 1977. In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 11.

Page 23: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

22

[...] a pena privativa de liberdade foi produto do desenvolvimento de uma sociedade orientada para a consecução da felicidade surgida do pensamento calvinista cristão. O pensamento cristão, com algumas diferenças entre o protestantismo e o catolicismo, proporcionou, tanto no aspecto material como no ideológico, bom fundamento à pena privativa de liberdade.

O Direito primitivo romano, bem como o Direito dos outros

povos foram influenciados pela vingança divina. Oliveira39 aponta as penas

comumente empregadas para castigar os infratores na Antiga Roma:

Aos patrícios era a dada a morte por decapitação simplesmente, aos plebeus eram empregados meios degradantes e cruéis e aos escravos a crucificação. Eram usadas a mutilação, a flagelação, a precipitação do alto da rocha Tarpéia e a execução “ad bestian” às feras. Ainda hoje, há em Roma os lugares conhecidos por arenas, onde o Imperador Nero mandava soltar as feras para devorar os cristãos.

Nesse sentido, traz-se a lume as considerações de García

Valdés citado por Bitencourt40:

A privação da liberdade continua a ter uma finalidade custodial, aplicável àqueles que seriam submetidos aos mais terríveis tormentos exigidos por um povo ávido de distrações bárbaras e sangrentas. A amputação de braços, pernas, olhos, língua, mutilações diversas, queima de carne a fogo, e a morte, em suas mais variadas formas, constituem o espetáculo favorito das multidões desse período histórico.

Fernandes41 ainda complementa:

A vingança divina era exercida com redobrada crueldade, eis que o castigo tinha a altura da grandeza do deus ofendido e seu propósito era purificar a alma do ofensor, preparando-o para a bem aventurança eterna. Na realidade, a vingança divina não passava de imposição penal e sacerdotal.

39 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 21. 40 GARCÍA VALDÉS, Carlos. Introduccíon a la penalogía, 1981. In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 9. 41 FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia integrada. 2. ed. rev., atua. e. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 651.

Page 24: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

23

Destarte, perfaz-se que no período da vingança divina, Estado

e Igreja se confundiam no exercício do poder. Outrossim, o castigo já era visto como

pena, eis que seu propósito, além de infligir rigorosos castigos corporais ao recluso,

era fazer com que este refletisse sobre infração que cometera.

1.2.4 Fase da Vingança Pública

No período em questão restou enaltecida a idéia de dar maior

estabilidade ao Estado, razão pela qual tirou-se da mão da vítima, ou de sua família,

a titularidade da punição, que deixara de ser impregnada tão somente pelo caráter

religioso.

Sobre a vingança pública, descreve Oliveira42:

A composição, que na vingança individual era uma faculdade de compensação e reparação, tornou-se um dever jurídico, e a pena, nesta passagem do privado ao público, perde seu fundamento religioso para assumir uma finalidade eminentemente política.

Segundo Mirabete43:

[...] visou-se a segurança do príncipe ou soberano pela aplicação da pena, ainda severa e cruel. Também em obediência ao sentido religioso, o Estado justificava a proteção do soberano que, na Grécia, por exemplo, governava em nome de Zeus, e era seu intérprete e mandatário. O mesmo ocorreu em Roma, com a aplicação da Lei das XIII Tábuas. Em fase posterior, porém, libertou-se a pena de seu caráter religioso, transformando-se a responsabilidade do grupo em individual (do autor do fato), em positiva contribuição ao aperfeiçoamento de humanização dos costumes penais.

Oliveira44 acrescenta que “foi da internação em mosteiros e

reclusão em celas, que se originou a pena privativa de liberdade e o uso da

expressão celular”.

Coaduna-se com essas reflexões o esposado por Noronha45: 42 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 33. 43 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 17. 44 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 35.

Page 25: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

24

A preocupação era de defesa do soberano e dos favorecidos. Predominavam o arbítrio judicial, a desigualdade de classes perante a punição, a desumanidade das penas (a de morte profusamente distribuída, como entre nós vemos nas Ordenações do Livro V, e dada por meios cruéis, tais quais a fogueira, a roda, o arrastamento, o esquartejamento, a estrangulação, o sepultamento em vida etc.)

No tocante às penas desumanas, descrevidas por Foucault46

como suplícios, transcreve-se um trecho de sua notória obra, por bem representar o

escárnio para com o corpo:

Quase sem tocar o corpo, a guilhotina suprime a vida, tal como a prisão suprime a liberdade, ou uma multa tira os bens. Ela aplica a lei não tanto a um corpo real e susceptível de dor quanto a sujeito jurídico, detentor, entre outros direitos, do de existir. Ela devia ter a abstração da própria lei.

Como anteriormente enfatizado, o período da vingança pública

ainda fora marcado pela penas cruéis, sobretudo, a de morte, todavia, o período em

análise deixara um importante legado.

Nesta senda, colhe-se das pertinentes observações de

Bitencourt47:

De toda a Idade Média, caracterizada por um sistema punitivo desumano e ineficaz, só poderia destacar-se a influência penitencial canônica, que deixou como seqüela positiva o isolamento celular, o arrependimento e a correção do delinqüente, assim como outras idéias voltadas à procura da reabilitação do recluso. Ainda que essas noções não tenham sido incorporadas ao direito secular, constituem um antecedente indiscutível da prisão moderna.

Assim sendo, depreende-se que no período conhecido por

vingança pública, a tortura ainda era bastante empregada, entretanto, as penas não

atingiam somente o corpo do condenado, uma vez que eram acompanhadas de

castigos acessórios, os quais também tinham o condão de induzir o infrator à

reflexão.

45 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 24. 46 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Traduzido por: Raquel Ramalhete. 31. ed. Petrópolis: Vozes, 2006. p. 16 47 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 12.

Page 26: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

25

1.3 PERÍODO HUMANITÁRIO

1.3.1 O Direito Penal e os Iluministas

Na Idade Média, Deus era considerado o centro do universo,

daí o termo teocentrismo, período este em que a pena assumiu seu caráter mais

cruel e repugnante. Por essa razão, a reforma era algo que não podia tardar.

É neste período de expectativa de mudança, que surge o

Iluminismo, oportunidade na qual segundo Garrido Guzman citado por Bitencourt48,

“filósofos, moralistas e juristas dedicam suas obras a censurar abertamente a

legislação penal vigente, defendendo as liberdades do indivíduo e dignidade do

homem”.

Ainda acerca do Iluminismo, destaca Bitencourt49:

As correntes iluministas e humanitárias, das quais Voltaire, Montesquieu e Russeau seriam fiéis representantes, fazem severa crítica aos excessos imperantes na legislação penal, propondo que o fim do estabelecimento das penas não deve constituir em atormentar um ser sensível.

E continua:

A pena deve ser proporcional ao crime, devendo-se levar em consideração, quando imposta, as circunstâncias pessoais do delinqüente, seu grau de malícia e, sobretudo, produzir a impressão de ser eficaz sobre o espírito dos homens, sendo, ao mesmo tempo, a menos cruel para o corpo do delinqüente50.

Oliveira51 sintetiza os objetivos dos pensadores da época, que

despertavam a consciência pública contra as vergonhosas atrocidades geradas

pelas práticas dos suplícios já descritos por Foucault :

48 GARRIDO GUZMAN, Luis. Manual de Ciencia Penitenciaria, 1983. In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 32. 49 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 32. 50 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 32. 51 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 40.

Page 27: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

26

Os reformadores não pretendiam somente abrandar as penas com o desaparecimento dos castigos aflitivos e infamantes, mas atacavam a corrupção que dominava a justiça, a qual, ainda se apresentava lacunosa, irregular e contraditória, onde instâncias múltiplas a denegriam e a centralizava ao superpoder monárquico.

Assim sendo, verifica-se que a intenção comum dos

pensadores neste período calcava-se na necessidade da reforma do sistema

punitivo. Verificar-se-á nos itens a seguir alguns importantes defensores dos ideais

iluministas.

1.3.2 Cesare Beccaria – Dei Delitti e delle Pene

Intérprete desse anseio de mudança trazido pelo Iluminismo foi

Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, que nascera em Milão no ano de 1738. Ao

invés de se entregar à vida despreocupada e cômoda, que sua posição lhe

proporcionava, preferiu volver suas vistas para os infelizes e desgraçados que

sofriam os rigores e as arbitrariedades da justiça daquele tempo.

Em 1764, Beccaria escreveu seu famoso livro Dei Delitti e delle

Pene, no português, Dos Delitos e das Penas, que causou tamanha repercussão,

pois, segundo Bitencourt52, “[...] Beccaria constrói um sistema criminal que

substituirá o desumano, impreciso, confuso e abusivo sistema criminal anterior”.

Em sua obra, Noronha53 tece alguns comentários acerca de

Beccaria:

Não era um jurista, mas filósofo, discípulo de Rousseau e Monstesquieu. Sua obra assenta-se no contrato social e logo de início, chama a atenção para as vantagens sociais que devem ser igualmente distribuídas, ao contrário do que sucedia. No § II, afirma que as penas não podem passar dos imperativos da salvação pública.

52 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 33. 53 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 24.

Page 28: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

27

Mirabete54, por seu turno, afirma que o livro de Beccaria se

tornou “o símbolo da reação liberal ao desumano panorama penal então vigente,

demonstrando a necessidade de reforma das leis penais”.

“Beccaria, inspirado na concepção do Contrato Social de

Rousseau, propõe novo fundamento à justiça penal: um fim utilitário e político que

deve, porém, ser sempre limitado pela lei moral”55.

De outro norte, registra-se que se tem increpado à obra de

Beccaria falta de originalidade, como aponta Noronha56:

Não há mesmo profundidade no livro, que também não é original, pois suas idéias, inspiradas no Iluminismo, movem-se na corrente dos tempos. Seu sucesso, sua grande repercussão (penetrando na Declaração dos Direitos do Homem, traduzido em vários idiomas e aceito por códigos, como o francês de 1791), deve-se ao momento em que veio à luz; era o livro que a sociedade esperava.

Transcreve-se um trecho do § VI do livro de Beccaria57, que

abarca os ideais da causa pela qual tanto militou:

À proporção que as penas forem mais suaves, quando as prisões deixarem de ser a horrível mansão do desespero e da fome, quando a piedade e a humanidade adentrarem as celas, quando, finalmente, os executores implacáveis dos rigores da justiça abrirem o coração à compaixão, as leis poderão satisfazer-se com provas mais fracas para pedir a prisão.

Beccaria58 ainda afirmou em sua obra que ”os castigos tem por

finalidade única obstar o culpado de tornar-se futuramente prejudicial à sociedade e

afastar seus concidadãos do caminho do crime”.

54 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 19. 55 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 19. 56 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 26. 57 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Traduzido por: Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2006. p. 26. 58 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. p. 49.

Page 29: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

28

“A finalidade das penalidades não é torturar e afligir um ser

sensível, nem desfazer um crime que já está praticado”59.

Desta guisa, perfaz-se que foi a partir da obra de Beccaria –

“Dos Delitos e das Penas” que se deu início ao período de humanização da pena,

onde a finalidade do encarceramento passa ser a de isolar e recuperar o infrator.

1.3.3 John Howard – The State of Prisons in England

John Howard, considerado o pai da Ciência Penitenciária,

encabeçou na Inglaterra o movimento humanitário da reforma das prisões e, a partir

dos horrores que presenciou, escreveu em 1770 seu livro The State of Prisons in

England, no português, O Estado das Prisões na Inglaterra.

Bitencourt60 aponta as características de John Howard:

Howard nunca aceitou as condições deploráveis em que se encontravam as prisões inglesas. Não admitia que o sofrimento humano fosse conseqüência implícita e iniludível da pena privativa de liberdade, embora nessa época, como agora, a reforma da prisão não fosse um tema que interessasse ou preocupasse muito ao público ou aos governantes.

Como discorre Oliveira61, o esforço de Howard não foi inútil: Com a ajuda do Duque de Richmond foram construídos dois estabelecimentos penitenciários, nos moldes que ele preconizava, em 1775 e 1781, chamados “Penitenicary-House”. Posteriormente, o governo inglês construiu mais outro, “Mondham Norfolk”.

Em suma, destaca-se que John Howard pregava um melhor

tratamento aos condenados, a partir da regeneração do delinqüente e da

humanização das penas, partindo da premissa de que a reabilitação não é

oportunizada em cárcere com condições deploráveis.

59 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. p. 49. 60 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 40. 61 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 47.

Page 30: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

29

1.3.4 Jeremy Bentham

Jeremy Bentham nasceu em 1748 e morreu em 1832. De

personalidade excêntrica, foi um escritor muito prolífico, que se interessou vivamente

pelas condições das prisões e o problema penitenciário.

O pensador considerava que o fim principal da pena era

prevenir delitos semelhantes. Segundo Bentham citado por Bitencourt62:

O negócio passado não é mais problema, mas o futuro é infinito, o delito passado não afeta mais que a um indivíduo, mas os delitos futuros podem afetar a todos. Em muitos casos é impossível remediar o mal cometido, mas sempre se pode tirar a vontade de fazer mal, porque por maior que seja o proveito de um delito, sempre pode ser maior o mal da pena.

Ademais, Bitencourt63 também discorre que “Bentham não via

na crueldade da pena um fim em si mesmo, iniciando um progressivo abandono do

conceito tradicional, que considerava que a pena devia causar profunda dor e

sofrimento”.

Na expressão de Bentham64, numa crítica às condições

inadequadas das prisões, considerava que estas, salvo raras exceções,

apresentavam as “melhores condições para infestar o corpo e a alma”.

Sendo assim, a partir das considerações ante traçadas,

verifica-se que Jeremy Bentham conduziu suas ações para o bem da sociedade

como um todo e, notadamente, agregou um novo sentido à finalidade da pena, qual

seja, o de prevenir a prática de futuras condutas criminosas.

62 BENTHAM, Jeremy. Principios de legislacíon y jurisprudencia, 1934. In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 46. 63 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 47. 64 BENTHAM, Jeremy. Principios de legislacíon y jurisprudencia, 1934. In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 43.

Page 31: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

30

1.3.4.1 Jeremy Bentham e o Panótico

O panótico foi uma das contribuições mais importantes de

Bentham. No panótico, restou enfatizado especialmente os problemas de segurança

e controle do estabelecimento penal, o que também não deixou de ser alvo dos

estudos de Foucault, diga-se.

Na expressão de Foucault citado por Bitencourt65: “O panótico

é um autêntico zoológico: o animal está substituído pelo homem – agrupado ou

individualmente – e o rei pela maquinaria de um poder furtivo”.

No entanto, o panótico não se ocupava apenas com a

dominação propriamente dita dos infratores, haja vista que também preocupava-se

com a finalidade reabilitadora da pena, razão pela qual Bentham não admitia o

isolamento celular permanente66.

Contudo, apesar do esforço que Bentham empregara para

tornar realidade seu projeto, não logrou êxito, entretanto, salienta-se que suas

críticas e estudos foram substanciais para reduzir os castigos bárbaros e excessivos

que se impunham nas prisões inglesas.

1.4 ESCOLAS PENAIS

1.4.1 Escola Penal Clássica

Com o Iluminismo e a humanização da pena, nasce a Escola

Penal Clássica, dividida em dois períodos distintos: o político, representado por

Beccaria; e o prático, com a figura de Carrara.

65 FOUCAULT, Michel. Vigilar y castigar, 1976. In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 50. 66 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 52.

Page 32: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

31

Para os seguidores desta Escola, o “crime não é um ente de

fato, mas entidade jurídica; não é uma ação, mas infração. É a violação de um

direito”67. Este é um princípio basilar e característico desta Escola.

Outra peculiaridade da Escola Clássica, e também

fundamental, diz respeito à pena, como discorre Noronha68:

O crime é a violação de um direito e, portanto, a defesa contra ele deve encontrar-se no próprio direito, sem o que ele não seria tal. Conseqüentemente, ela não pode ser arbitrária, mas há de regular-se pelo dano sofrido pelo direito. É retributiva. Deve importar também em coação moral que detenha os possíveis violadores do direito.

É nesse sentido que se encontram as assertivas de Mirabete69:

Para a Escola Clássica, o método que deve ser utilizado no Penal é o dedutivo ou lógico-abstrato (já que se trata de uma ciência jurídica), e não experimental, próprio das ciências naturais. Quanto à pena, é tida como tutela jurídica, ou seja, como proteção aos bens jurídicos tutelados penalmente. A sanção não pode ser arbitrária; regula-se pelo dano sofrido, inclusive, e, embora retributiva, tem também finalidade de defesa social.

Oliveira70 assinala que “a Escola Clássica surgiu

simultaneamente na Itália, Alemanha e França. Na Itália, além de Francesco

Carrara, teve como representantes Carmignani e Filangieri”.

Não há como descurar o valor da Escola Clássica, uma vez

que teve notória influência na elaboração do direito penal e, não obstante, grande

parte dos Códigos e das leis penais, elaborados no século passado, toma como

norte suas diretrizes.

67 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 32. 68 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 32. 69 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 21 70 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 61.

Page 33: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

32

1.4.2 Escola Penal Positiva

De um lado, a Escola Clássica, que se inspirava no Iluminismo,

defendera o princípio individualista, entretanto, esqueceu-se da sociedade. Daí

então, surgiria a Escola Positiva, que se dizia socialista.

Oliveira71 reporta as origens da Escola Positiva:

Com César Lombroso, criador da criminologia, e sua obra, “O Homem Delinqüente”, inicia-se um novo período, já dentro de um campo científico, que veio a originar o surgimento da Escola Penal Positiva, assim chamada, não devido ao positivismo de Augusto Comte, mas devido ao método utilizado.

César Lombroso “criou com seus estudos a Antropologia

Criminal e, nela, a figura do criminoso nato”72. Malgrado o exagero apresentado na

teoria lombrosiana, seus estudos foram relevantes para o combate à criminalidade73.

É oportuno transcrever os princípios básicos da Escola Penal

Positiva, trazidos concisamente por Oliveira74:

São os seguintes caracteres da Escola Positiva: a) método experimental, positivo indutivo; b) responsabilidade social derivada do determinismo; c) periculosidade do delinqüente; d) crime como fenômeno natural e social trazido pelo homem; e a pena não como castigo, mas como meio de defesa social; f) negação do livre arbítrio ou liberdade social.

Contudo, o grande expoente da Escola Positiva foi Enrico Ferri,

o qual criou a Sociologia Criminal ao publicar o livro que leva esse nome. Ferri era

discípulo de Lombroso e ressaltou a importância de um trinômio causal do delito:

fatores antropológicos, sociais e físicos75.

71 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 61. 72 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 21 73 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 21. 74 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. p. 62. 75 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 23.

Page 34: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

33

Ademais, Ferri pregava que a “a pena deve ser indeterminada,

adequada ao delinqüente, e visar o reajustamento para o convívio social”76.

Convém assinalar que Ferri dividiu os criminosos em cinco

categorias, como descreve Mirabate77:

[...] o nato, conforme propusera Lombroso; o louco, portador de doença mental; o habitual, produto do meio social; o ocasional, indivíduo sem firmeza de caráter e versátil na prática do crime; e o passional, homem honesto, mas de temperamento nervoso e sensibilidade exagerada.

E, finalmente, com Rafael Garofalo, que iniciara a chamada

fase jurídica do positivismo italiano, é que a Escola Positiva recebeu conteúdo

jurídico. Garofalo “[...] sustentava que existem no homem dois sentimentos básicos,

a piedade e a probidade (ou justiça), e que o delito é sempre uma lesão desses

sentimentos”78.

Nucci79 também destaca acerca da escola em comento:

A escola positiva deslocou o estudo do Direito Penal para o campo da investigação científica, proporcionando o surgimento da antropologia criminal, da psicologia criminal e da sociologia criminal. Ferri e Garofalo foram discípulos de Lombroso e grandes expoentes da escola positiva, sobretudo o primeiro.

E continua:

Não há dúvida de que a escola positiva exerceu forte influência sobre o campo da individualização da pena, princípio que rege o Direito Penal até hoje, levando em consideração, por exemplo, a personalidade e a conduta social do delinqüente para o estabelecimento da justa sanção80.

76 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 36. 77 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 23. 78 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. p. 23. 79 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 63. 80 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 63.

Page 35: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

34

Como visto, a Escola Positiva teve seu início a partir do

desenvolvimento de algumas ciências sociais, sendo que tinha como princípio

basilar diminuir a crueldade das penas que eram impostas aos apenados e, não

menos importante, priorizar os interesses sociais em relação aos individuais.

1.4.3 Terceira Escola

A Terceira Escola foi uma corrente eclética, visto que abarcava

as posições extremadas da Escola Clássica e do Positivismo Naturalista. Situando-

se entre aquelas duas, aceita os dados da antropologia e da sociologia criminal,

ocupando-se do delinqüente; mas, dando a mão ao Classicismo, distingue entre o

imputável e o inimputável.

Consoante Lyra citado por Noronha81, os pontos básicos dessa

corrente podem sintetizar-se:

1) respeito à personalidade do direito penal, que não pode ser absorvido pela sociologia criminal; 2) inadmissibilidade do tipo criminal antropológico, fundando-se na causalidade e não-fatalidade do delito; 3) reforma social como imperativo do Estado, na luta contra a criminalidade.

Como visto, a Terceira Escola teve como propósito conciliar

preceitos das Escolas Clássica e Positiva, de modo a apontar as características que

distinguiriam os seres imputáveis dos inimputáveis.

1.4.4 Escola Moderna Alemã

A finalidade principal dessa escola foi a adoção de medidas e

providências de ordem prática no interesse da repressão e prevenção do delito, o

que conseguiu, introduzindo nas legislações diversos institutos.

Noronha82 aponta os caracteres dessa escola:

81 LYRA, Roberto. Direito Penal: parte geral, 1936. In: NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. 37. ed. Atualizado Adalberto José Q.T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 20.

Page 36: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

35

a) método lógico-jurídico para o direito penal e experimental para as ciências penais; b) distingue o imputável do inimputável, sem se fundar, porém no livre arbítrio, e sim na determinação normal do indivíduo; c) aceita a existência do estado perigoso; d) tem o crime como fato jurídico, mas também como fenômeno natural; e) a luta contra o crime far-se-á não só pela pena, mas também com as medidas de segurança.

Noronha83 assinala que a essa escola “foi fecundada no terreno

das realizações práticas, pregando a necessidade de adotarem, as legislações,

institutos como o das medidas de segurança, livramento condicional, sursis etc”.

Assim sendo, denota-se que a Escola Moderna Alemã já

plantava a essência da função preventiva da pena, bem como introduzira nas

legislações importantes institutos que no presente ainda são adotados, a saber,

livramento condicional e sursis.

1.5 PANORAMA HISTÓRICO DO DIREITO PENAL NO BRASIL

Quando os portugueses chegaram no Brasil, depararam-se

com uma terra que era habitada por índios, os quais não viviam sob a influência de

quaisquer regras ou ditames legais, restando, aos olhos dos europeus, a completa

falta de civilização.

Sucintamente, NUCCI84 discorre como instalou-se a legislação

portuguesa no Brasil:

Inicialmente, vigoraram as Ordenações Afonsinas (1446), da época de D. Afonso V. Posteriormente, passaram a viger as Ordenações Manuelinas (1521), da época de D. Manuel I. Antes das Ordenações Filipinas (1603), do reinado de D. Filipe II, houve a aplicação da compilação organizada por D. Duarte Nunes de Leão, por volta de 1569.

82 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 41. 83 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 41. 84 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 65.

Page 37: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

36

As ordenações Filipinas foram a mais longa de todas as

ordenações – 1603 a 1830. Previa penas cruéis e desproporcionais. Somente foi

dado espaço para uma legislação mais elaborada com a edição do Código Criminal

do Império (1830), como verificar-se-á no subtítulo a seguir.

1.5.1 O Código Criminal do Império – 1830

A Constituição brasileira de 1824 determinou a urgente e

imperiosa necessidade de elaboração de um Código Criminal, fundado nas sólidas

bases da justiça e da equidade, consoante o disposto no art. 179, parágrafo 18.

Bitencourt85 assinala, com efeito, que o Código Criminal do

Império foi um dois mais bem elaborados, tendo grande influencia do Código Penal

espanhol de 1848 e do Código Penal português de 1852.

Ademais, Bitencourt86 refere-se ao Código Criminal do Império

como uma legislação que apresentava “[...] clareza, precisão, concisão e apuro

técnico”.

Segundo Bruno87, “foi esse código obra legislativa realmente

honrosa para a cultura jurídica nacional, como a expressão avançada do

pensamento penalista no seu tempo”.

Noronha88 destaca que “foi aprovado o Projeto em sessão de

20 de outubro de 1830 na Câmara, sendo remetido ao Senado. Em 16 de dezembro,

D. Pedro I sancionava-o”.

Lyra citado por Noronha89 enumera as originalidades do Código

Criminal do Império:

85 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 46. 86 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 46. 87 BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral, tomo 1º: introdução, norma penal, fato punível. p. 178. 88 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 57.

Page 38: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

37

1.º) no esboço de indeterminação relativa e de individualização da pena, contemplando já os motivos do crime, só meio século depois tentado na Holanda e, depois, na Itália e na Noruega; 2.º) na fórmula da cumplicidade (co-delinqüência como agravante) com traços do que viria a ser a teoria positiva a respeito; 3.º) na previsão da circunstância atenuante da menoridade, desconhecida, até então, das legislações francesas e napolitana, e adotada muito tempo após; 4.º) no arbítrio judicial, no julgamento de menores de 14 anos; 5.º) na responsabilidade sucessiva, nos crimes por meio de imprensa, antes da lei belga e, portanto, é esse sistema brasileiro e não belga, como é conhecido; 6.º) a indenização do dano ex delicto como instituto de direito público; 7.º) na imprescritibilidade da condenação.

Registra-se que o Código de Processo Criminal surgiu em

1832.

Nota-se que o Código Criminal contemplava o novo momento

histórico vivido pelo Brasil com a proclamação da Independência, razão pela qual

apresentava idéias avançadas, destinadas a impressionar a sociedade.

1.5.2 Código Criminal Republicano – 1890

Como não poderia deixar de ser, a Proclamação da República

exigiu um novo sistema jurídico e, em 1890, aprovou-se o Código Penal da Era

Republicana.

Nucci90 comenta sobre o aludido código: “[...] sob muitas

críticas, acusado de não ter mantido o mesmo nível de organização e originalidade

de seu antecessor, foi mantido até que se editou o atual Código Penal”.

Leal91 esclarece:

O novo código, seguindo a tendência da época, aboliu a pena de morte e adotou as seguintes sanções: prisão celular, reclusão, prisão com trabalho obrigatório, prisão disciplinar, para menores de 21

89 LYRA, Roberto. Introdução ao estudo do direito criminal, 1936. In: NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. 37. ed. Atualizado Adalberto José Q.T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 57. 90 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 65. 91 LEAL, João José. Direito penal geral. p. 83.

Page 39: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

38

anos, banimento, interdição, suspensão, perda da função pública e a multa.

Noronha92 também manifesta-se sobre a política criminal

adotada pelo Código Republicano:

Era ele de fundo clássico. Procurou suprir lacunas da legislação passada. Definiu novas espécies delituosas. Aboliu a pena de morte e outras, substituindo-as por sanções mais brandas, e criou o regime penitenciário de caráter correcional.

O Código Penal da Era Republicana foi mantido até que se

editou o atual Código Penal (Decreto-lei 2.848/40), da época de Getúlio Vargas,

advindo de projeto elaborado por Alcântara Machado.

1.5.3 Código Penal de 1940

Em maio de 1938, o Professor Alcântara Machado entregava

ao Governo o anteprojeto da Parte Geral do Código Criminal Brasileiro e, em agosto

de 1938, o projeto completo seria o ponto de partida para o atual Código Penal.

Noronha93 enaltece que o Código de 1940 é uma “obra

harmônica: soube valer-se das mais modernas idéias doutrinárias e aproveitar o que

de aconselhável indicavam as legislações dos últimos anos”.

Nélson Hungria citado Noronha94 declarou que “respingamos,

para o efeito de algumas ratificações, nos Códigos Penais suíço, dinamarquês e

polonês”.

Inobstante, acrescenta Noronha95 que no Código de 1940 “é

marcante, entretanto, a influência do Código da Helvétia, e do italiano”.

92 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 59. 93 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 62-63. 94 HUNGRIA, Nélson. Novas questões jurídico-penais, 1949. In: NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. 37. ed. Atualizado Adalberto José Q.T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 62. 95 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 62.

Page 40: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

39

Dotti96 explica as espécies da pena privativa de liberdade

trazidas pelo Código de 1940:

Reclusão (cominada a no máximo trinta anos) e a de detenção (cominada em no máximo três anos), reservada a prisão simples para a Lei das Contravenções Penais. A multa completava o elenco das sanções principais (art. 28 e 6º). As penas acessórias previstas no Código Penal eram: a) perda da função pública; b) interdições de direitos; c) publicação da sentença (art. 67)

Destarte, observa-se que o Código Penal de 1940 representou

um progresso jurídico, porque traz em sua essência uma orientação liberal.

1.5.4 A reforma de 1984 e a Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal)

Posteriormente, editou-se a Lei n. 7.209/84, promovendo

extensa reforma na Parte Geral do código atual, embora sem modificá-la por

completo.

Noronha97 traça um breve histórico da reforma de 1984:

A origem está situada num Anteprojeto, datado de 1981, elaborado pelos ilustres juristas Francisco Assis Toledo, Ricardo Antunes Andreucci, Miguel Reale Junuior, Serrano Neves, Helio Fonseca, Rogério Lauria Tucci e René Ariel Dotti. Uma Comissão Revisionadora formada por Dinio Garcia, Miguel Reale Junior, Francisco Assis Toledo e Jair. L Lopes deu forma final ao Projeto, datado de 1983, surgindo a citada Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984, que diz respeito à nova Parte Geral do Código Penal.

Ademais, Nucci98 assim manifesta-se:

O Código original de 1940, nascido da concepção causalista, sofreu algumas modificações de natureza finalista por ocasião da mencionada reforma do ano de 1984, permanecendo, pois, híbrido, não se podendo afirmar ser de conotação causalista pura, nem tampouco finalista de essência.

96 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 201. 97 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 64. 98 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 65.

Page 41: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

40

Noronha99 elenca as inovações trazidas pela aludida reforma:

[...] disciplina normativa de omissão, surgimento do arrependimento posterior, nova estrutura sobre o erro, ao excesso punível alargado para todos os casos de exclusão de antijuricidade, ao concurso de pessoas, às novas formas de penas e à extinção das penas acessórias, à abolição de grande parte das medidas de segurança com o fim da periculosidade presumida.

“Com a nova Parte Geral surgiu a primeira Lei de Execução

Penal (Lei n. 7.210/84), ambas em perfeita sintonia, como não poderia deixar de

acontecer”100.

É sobre as espécies de penas, regimes prisionais, finalidades

da pena e outros aspectos acerca da Lei de Execução Penal que abordar-se-á no

capítulo seguinte.

99 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 64. 100 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. p. 64.

Page 42: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

41

CAPÍTULO 2

A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

2.1 ESPÉCIES DE PENAS

A Constituição Federa/88 prevê, em seu art. 5.º, XLVI, as

seguintes penas: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d)

prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição dos direitos.

Outrossim, no que tange às penas proscritas pela Constituição

Federal/88, importa ressaltar que a refalada legislação veda a aplicação de pena de

morte (salvo em caso de guerra declarada), prisão perpétua, trabalhos forçados,

banimento e quaisquer penas cruéis (art. 5.º, XVLII).

Ressalta-se que a reforma da Parte Geral do Código Penal de

1984 eliminou a classificação que existia no Código Penal de 1940 entre penas

principais e penas acessórias101.

Já de acordo com o art. 32, Do Código Penal, as penas

classificam-se em: a) privativa de liberdade, b) restritiva de direitos; c) pecuniárias.

Destarte, tendo em vista o esposado na legislação pátria, faz-

se necessário e pertinente aclarar sobre cada espécie de pena declinada, como bem

verificar-se-á nos subtítulos seguintes.

101 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 111.

Page 43: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

42

2.2 PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

Em respeito à ordem já preconizada pelo Código Penal,

discorre-se primeiro sobre a pena privativa de liberdade.

Como restou abordado no primeiro capítulo, com o Iluminismo

e a grande repercussão das idéias dos reformadores (Beccaria, Howard e Bentham),

a crise da sanção penal começou a ganhar destaque, haja vista que a pena

chamada a intimidar não intimidava. Já naquela época, averiguou-se que a

tradicional função de corrigir o criminoso retribuindo sua falta não se cumpria, ao

contrário, incitava a reincidência102.

A pena privativa liberdade é “[...] aplicável ao autor de uma

infração penal, consistente na perda de sua liberdade física de locomoção e que se

efetiva mediante seu internamento em estabelecimento prisional [...]”103.

Segue ainda, no entendimento de Mirabete104:

Apesar de ter contribuído decisivamente para eliminar as penas aflitivas, os castigos corporais, as mutilações, não tem a pena de prisão correspondido às esperanças de cumprimento com as finalidades de recuperação do delinqüente.

Em face do exposto, denota-se que a pena privativa de

liberdade pode ser considerada a mais grave de todas as sanções apontadas pelo

ordenamento jurídico pátrio.

2.3 MODALIDADES DE PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

Existem três modalidades de penas privativas de liberdade –

reclusão, detenção e prisão simples – as quais, segundo o entendimento de Nucci,

“[...] poderiam ser unificadas sob a denominação de pena de prisão”105. 102 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 11. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. I. p. 442. 103 LEAL, João José. Direito penal geral. p. 391. 104 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 288.

Page 44: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

43

2.3.1 Reclusão e Detenção

Esses dois tipos de pena são decorrência da prática de crimes.

A respeito do assunto em comento, Bitencourt106 tece uma

importante explanação:

A reforma penal de 1984 adotou penas privativas de liberdade, como gênero, e manteve a reclusão e a detenção como espécies, sucumbindo à divisão histórica do direito pátrio. A reclusão destina-se aos crimes mais graves [...] A detenção está reservada para os crimes de menor gravidade e jamais poderá iniciar o seu cumprimento no regime fechado (art. 33, caput, do CP).

Com o propósito de corroborar o trecho acima transcrito, traz-

se a lume as assertivas de Nucci107, o qual preleciona:

A reclusão é prevista para os crimes mais graves; a detenção é reservada para os mais leves, motivo pelo qual, no instante de criação do tipo penal incriminador, o legislador sinaliza a sociedade a gravidade do delito.

Bitencourt108 também assinala algumas das distinções mais

importantes entre as penas de reclusão e detenção:

a) limitação na concessão de fiança – a autoridade policial somente poderá conceder fiança nas infrações punidas com detenção ou prisão simples (art. 322 do CPP), nunca nos crimes punidos com reclusão; b) espécies de medida de segurança – para infração penal punida com reclusão, a medida de segurança será sempre detentiva; já para o autor punido com detenção, a medida de segurança poderá ser convertida em tratamento ambulatorial (art. 97 do CP).

E mais:

[...] prioridade na ordem de execução (arts. 69, caput, e 76, ambos Código Penal) – executa-se primeiro a reclusão e depois a detenção

105 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 381. 106 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 113. 107 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 381. 108 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 113.

Page 45: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

44

ou prisão simples; e) influência decisiva nos pressupostos da prisão preventiva (art. 313, I, do CPP)109.

Contudo, é de bom alvitre salientar que há ainda quem aponte

entendimento um pouco diversificado em relação às penas de reclusão e detenção,

como é caso, por exemplo, de Costa Júnior citado por Nucci110:

Inexistindo entre reclusão e detenção qualquer diferença ontológica, mesmo porque a lei não ofereceu nenhum critério diferenciador, parece não restar outra solução ao intérprete que assentar na insuficiência do critério quantitativo as bases da diversificação.

Desta feita, pode-se concluir que a pena de reclusão destina-se

aos crimes mais graves, sendo de no máximo 30 (trinta) anos. De outro norte, tem-

se que a detenção foi concebida para os crimes de menor impacto.

2.3.2 Prisão Simples

A prisão simples é aplicada aos casos de prática de

contravenções penais, que por seu turno, encontram-se previstas no Decreto-Lei n.

3.688/41 (Lei das Contravenções Penais).

Estabelece o art. 6.º da norma ante citada:

Art. 6º A pena de prisão simples deve ser cumprida, sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em regime semi-aberto ou aberto. § 1º O condenado a pena de prisão simples fica sempre separado dos condenados a pena de reclusão ou de detenção. § 2º O trabalho é facultativo, se a pena aplicada, não excede a quinze dias.

Desta feita, da leitura do dispositivo transcrito, denota-se que a

prisão simples comporta apenas os regimes semi-aberto e aberto. Ademais, não se

109 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 113. 110 COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Comentário ao código penal, 2002. In: NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 382.

Page 46: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

45

pode inserir o contraventor condenado no mesmo lugar onde se encontram os

condenados a cumprir pena de reclusão e detenção.

2.4 REGIMES PENAIS/ PRISIONAIS

Em conformidade com a legislação brasileira, existem três

espécies de regimes de cumprimento de pena privativa de liberdade, quais sejam,

regime fechado, semi-aberto e aberto.

Dispõe o Código Penal que o regime inicial da execução da

pena privativa de liberdade é estabelecido na sentença de condenação, com

observância no art. 33 e seus parágrafos do Código Penal111.

Nesta senda, segue o art. 110, da LEP (Lei de Execução

Penal): “O juiz, na sentença, estabelecerá o regime no qual o condenado iniciará o

cumprimento da pena privativa de liberdade, observado o disposto no art. 33 e seus

parágrafos do Código Penal”.

Outrossim, traz-se a lume o disposto no art. 111, da LEP:

Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição. Parágrafo único. Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á a pena ao restante da que está sendo cumprida, para determinação do regime.

Verificar-se-á a seguir a exposição das espécies propriamente

ditas dos regimes carcerários adotados pelo Código Penal.

111 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984. 11. ed. revista e atualizada. São Paulo: Atlas, 2008. p. 325.

Page 47: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

46

2.4.1 Regime Fechado

Quando inserido no regime fechado, o condenado será

submetido, no início do cumprimento da pena, a exame criminológico de

classificação para a individualização da execução (art. 34, CP).

Nucci112 preleciona:

O regime inicial fechado (exceto quando imposto por lei, como, por exemplo, para condenados a penas superiores a oito anos e por crimes hediondos e equiparados – exceto a tortura, que tem regra especial) deve ser fundamentado pelo juiz.

Não obstante, em que pese o esposado supra, é de bom alvitre

salientar que a gravidade do crime não constitui pressuposto para eleição do regime

fechado. Isto porque a escolha do regime fechado segue os mesmos critérios do art.

59, do Código Penal, nos termos da determinação expressa do § 3º do art. 33.

Tem-se ainda, o ensinamento de Capez113:

A gravidade do delito, por si só, não basta para determinar a imposição do regime inicial fechado, sendo imprescindível verificar o conjunto das circunstâncias de natureza objetiva e subjetiva previstas no art. 59, do CP, tais como grau de culpabilidade, personalidade, conduta social, antecedentes, etc., salvo se devido à quantidade de pena for obrigatório aquele regime.

No mesmo sentido é a edição da Súmula 718 do Supremo

Tribunal Federal, que preconiza: “A opinião do julgador sobre a gravidade em

abstrato do crime não constitui motivação indônea para a imposição do regime mais

severo do que o permitido segundo a pena aplicada”.

O local destinado para o cumprimento da pena de reclusão no

regime fechado é a penitenciária, onde o apenado é alojado em cela individual,

112 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 392. 113 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (art. 1º a 120). 9. ed. rev. e. atual. São Paulo: Saraiva, 2005. v. I. p. 361.

Page 48: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

47

contendo dormitório, aparelho sanitário e lavatório, com salubridade e área mínima

de seis metros quadrados114.

É o que se extrai do art. 87, caput, da Lei de Execução Penal,

in verbis: “A Penitenciária destina-se ao condenado à pena de reclusão, em regime

fechado”.

Outrossim, infere-se do art. 88, da norma supramencionada:

Art. 88. O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório. Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular: a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana; b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).

Barros115 descreve o trabalho do preso no regime fechado:

O condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e isolamento durante o repouso noturno (art. 34 § 1º do CP). O trabalho será em comum dentro do estabelecimento, na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado, desde que compatíveis com a execução da pena (art. 34 § 2º do CP). O trabalho que alude o texto legal é o interno, pois o trabalho externo, no regime fechado, só é admissível em serviços ou obras públicas realizadas por órgãos da administração direta ou indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas às cautelas contra a fuga em favor da disciplina (art. 36 da LEP). O limite máximo de número de presos será de 10% do total de empregados da obra. Caberá ao órgão da administração, a entidade ou a empreiteira a remuneração desse trabalho. A prestação de trabalho à entidade privada depende do consentimento expresso do preso (art. 36, parágrafos 1º, 2º e 3º da LEP). Urge ainda, para que se admita o trabalho externo, o cumprimento de no mínimo 1/6 da pena. A autorização para este tipo de trabalho só será dada pela direção do estabelecimento penitenciário (art. 37 da LEP).

Outrossim, é oportuno frisar que o apenado poderá progredir

de regime quando do cumprimento de 1/6 da pena. Porém, quando tratar-se da

prática de crimes hediondos, sob a égide da Lei n. 8.072/90, a progressão de regime

114 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 394. 115 BARROS, Flavio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral. 4. ed. rev. e. atual. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 244.

Page 49: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

48

dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se primário, e de 3/5

(três quintos), se reincidente (art. 2º, § 2º), com a reforma operada pela Lei n.

11.464/07.

2.4.2 Regime Semi-Aberto

A pena de detenção deve ser cumprida em regime semi-aberto

ou aberto, consoante dispõe o art. 33, caput, do Código Penal. Também quando o

condenado não reincidente receber uma pena superior a 4 (quatro anos), desde que

não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto

(art. 33, § 2º, alínea ‘b’, do Código Penal).

Nucci116 tece considerações sobre o regime em comento:

Deve ser cumprido em colônia penal agrícola ou industrial, ou estabelecimento similar (art. 35, CP). O condenado fica sujeito ao trabalho durante o dia, podendo freqüentar cursos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior. Admite-se o trabalho externo, desde que haja merecimento do condenado. Não há mais isolamento noturno.

Tendo em vista as considerações transcritas, é oportuno

pontuar que no regime semi-aberto, o trabalho externo é admissível, inclusive na

iniciativa privada, ao contrário do que ocorre no regime fechado, diga-se117.

É nesse sentido o entendimento jurisprudencial:

O juiz da condenação, na própria sentença, já poderá conceder o serviço externo. Ou então, posteriormente, o juiz da execução poderá concedê-lo, desde o início do cumprimento da pena. A exigência do cumprimento de um sexto da pena se verifica apenas quando tal benefício for concedido pela direção do estabelecimento penitenciário, que dependerá também da aptidão, disciplina e responsabilidade do apenado (art. 37 da LEP) (STF, RTJ, 120:1122).

116 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 397. 117 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 120.

Page 50: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

49

Ademais, tem-se que outro benefício deste regime contempla a

possibilidade de saídas temporárias, como depreende-se dos dizeres de Teles118:

O condenado poderá obter autorização para sair do estabelecimento temporariamente, sem qualquer vigilância direta, para visitar a família e também para participar de atividades que proporcionem condições para seu retorno ao convívio social.

O art. 122 da Lei de Execução Penal, estabelece que os

condenados que cumprem pena em regime semi-aberto poderão obter autorização

para a saída temporária do estabelecimento, sem vigilância direta, ou seja, sem

escolta, no seguintes casos: I – visita a família; II – freqüência a curso supletivo

profissionalizante, bem como de instrução do segundo grau ou superior, na comarca

do juízo da execução; III – participação em atividades que concorram para o retorno

ao convívio social.

Vide, ainda, a Súmula 40 do Superior Tribunal de Justiça, que

assim estabelece: “para obtenção dos benefícios de saída temporária e trabalho

externo, considera-se o tempo de cumprimento da pena no regime fechado”.

Desta feita, conclui-se que no regime semi-aberto o condenado

cumpre a reprimenda sem o mesmo rigor aplicado no regime carcerário estudado no

subtítulo anterior.

2.4.3 Regime Aberto

O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de

responsabilidade do condenado, é o que se extrai do art. 36, caput, do Código

Penal.

Referido regime destina-se àquele que não for reincidente, cuja

pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos (art. 33, §2º, alínea ‘c’, do Código

Penal). Outrossim, sujeita-se ao regime aberto o condenado que for transferido pela

progressão de regime semi-aberto para o aberto.

118 TELES, Ney Moura. Direito Penal: parte geral: arts. 1º a 120. São Paulo: Atlas, 2004. p. 344.

Page 51: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

50

Ensina Bitencourt119:

O condenado só permanecerá recolhido (em casa de albergado ou estabelecimento adequado) durante o repouso noturno e nos dias de folga. Deverá trabalhar, freqüentar cursos ou exercer outra atividade autorizada fora do estabelecimento e sem vigilância. Com responsabilidade e disciplinadamente, o detento deverá demonstrar que merece a adoção desse regime e que para ele está preparado, sem frustrar os fins da execução penal, sob pena de ser transferido para outro regime mais rigoroso.

O ingresso do condenado em regime aberto supõe a aceitação

do seu programa e das condições impostas pelo juiz (art. 113 da LEP). Aceitação

esta, que não está prevista em relação às penas restritivas de direitos120.

Mas para que o apenado possa cumprir a pena em casa de

albergado, deverá ele adequar-se aos requisitos indicados no art. 114, da Lei de

Execução Penal, a saber:

Art. 114. Somente poderá ingressar no regime aberto o condenado que: I - estiver trabalhando ou comprovar a possibilidade de fazê-lo imediatamente; II - apresentar, pelos seus antecedentes ou pelo resultado dos exames a que foi submetido, fundados indícios de que irá ajustar-se, com autodisciplina e senso de responsabilidade, ao novo regime. Parágrafo único. Poderão ser dispensadas do trabalho as pessoas referidas no artigo 117 desta Lei.

A casa de albergado deve ser um prédio situado em centro

urbano, sem obstáculos físicos para evitar fuga, com aposentos para os presos e

local adequado para cursos e palestras (art. 93 a 95, LEP)121.

Contudo, inexistem Casas de Albergado em muitas Comarcas,

razão pela qual sobreveio a utilização do PAD – regime de prisão albergue

domiciliar, o qual é originalmente destinado a condenados maiores de 70 anos,

119 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 121. 120 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 121. 121 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 398.

Page 52: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

51

condenados acometidos de doença grave, sentenciadas com filho menor ou

deficiente físico ou mental e condenada gestante (art. 117, LEP)122.

Traz-se a lume os dizeres de Bitencourt123 sobre a falta da

casa de albergado: A Lei n. 7.210 afastou peremptoriamente a possibilidade de concessão de prisão domiciliar fora das hipóteses previstas no art. 117. A falta ou deficiência de casa de albergado não justifica a concessão indiscriminada de prisão domiciliar. A previsão do art. 3º da Lei n. 7.209, permitindo a concessão de sursis em substituição às penas restritivas de direito, pela falta de casa de albergado, limitou-se a um ano de vigência da referida lei.

Destarte, a partir do entendimento acima colacionado, verifica-

se que Bitencourt considera que o art. 117 da Lei de Execução Penal apresenta um

rol exaustivo, porquanto não comporta a prisão domiciliar em face da inexistência de

vaga ou do estabelecimento propriamente dito.

A teor do disposto no art. 118 da Lei de Execução Penal, a

execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a

transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado: I –

praticar fato definido como crime doloso ou falta grave; II – sofrer condenação, por

crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível

o regime (art. 111).

Nas palavras de Capez124:

As hipóteses de o condenado ser transferido para o regime mais grave são: a) se durante o cumprimento da pena, praticar crime doloso; b) se frustrar os fins da execução; c) a prática de falta grave; d) sofrer condenação por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime.

122 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 398. 123 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 122. 124 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (art. 1º a 120). p. 380.

Page 53: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

52

Ademais, cumpre registrar, ainda, que regredirá para o regime

mais gravoso, o condenado que puder, mas ainda assim não pagar a multa aplicada

cumulativamente (art. 36, § 2º, do CP).

2.4.4 Regime Especial

Nos termos do art. 37, do Código Penal, “as mulheres

cumprem pena em estabelecimento próprio, observando-se os deveres e direitos

inerentes à sua condição pessoal [...]”.

Para Bitencourt125:

A lei determina tratamento especial às mulheres, com: a) estabelecimento próprio: as mulheres não podem cumprir pena junto com os presos do sexo masculino; b) condição pessoal: devem ser respeitados os direitos e deveres inerentes à condição de mulher. Tem o direito de manter o filho consigo durante a fase de amamentação (art. 5.º, XLVIII e L, da CF).

E sustenta Mirabete126:

[...] a mulher tem os mesmos princípios morais, igual Inteligência, sente, compreende e quer como o homem e por isso pode-se aplicar às mulheres presas todas as regras que são adequadas para corrigir os condenados. Entretanto, comum é a afirmação de que a fraqueza física e a superior afetividade da mulher explicam as atenuações que lhes são concedidas no regime das penas. A Ciência Penitenciária tem sustentado sempre que as prisões de mulheres devem ser separadas daquelas destinadas aos homens, pois a presença daquela exacerba o sentimento genésico dos sentenciados, aumentando-lhes o martírio da forçada abstinência.

Desta feita, verifica-se que a lei determina que devem ser

levados em consideração o sexo, as condições fisiológicas e psicológicas da mulher.

De outro norte, para fins de execução penal, tem as mulheres deveres e direitos

idênticos aos dos homens.

125 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 127. 126 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984. p. 251.

Page 54: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

53

2.4.5 Regime Disciplinar Diferenciado

O regime disciplinar diferenciado é uma modalidade de sanção

disciplinar (e não é regime de cumprimento de pena) a que está sujeito o preso

provisório ou condenado definitivo que praticar fato previsto como crime doloso e,

quando ocasionar subversão da ordem ou disciplina internas, a teor do disposto no

art. 52 seus incisos e parágrafos, da Lei de Execução Penal.

Contudo, registra-se que o RDD – Regime Disciplinar

Diferenciado será abordado em subtítulo próprio no capítulo seguinte, por relacionar-

se à eficácia do castigo atribuído ao apenado.

2.5 EXAME CRIMINOLÓGICO

No subtítulo 2.4.1 deste capítulo, que por seu turno, trata do

regime fechado, discorreu-se que quando inserido no regime fechado, o condenado

será submetido, no início do cumprimento da pena, a exame criminológico de

classificação para a individualização da execução (art. 34, CP).

Acerca do exame criminológico, pontua Bitencourt127:

A realização do exame criminológico tem a finalidade exatamente de fornecer elementos, dados, condições, subsídios, sobre a personalidade do condenado, examinando-o sob os aspectos mental, biológico, e social, para concretizar a individualização da pena por meio dessa classificação dos apenados.

Malgrado o Código Penal ainda traga em sua redação o exame

criminológico, é de bom alvitre salientar que o advento da Lei n. 10.792/03

dispensou a necessidade de realização do exame criminológico.

Ao cuidar da classificação do condenado, refere-se a Lei de

Execução Penal, em seu art. 8º, caput, que o exame criminológico será

127 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 129.

Page 55: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

54

obrigatoriamente feito nos condenados à pena privativa de liberdade em regime

fechado, sendo facultado em relação àqueles no cárcere em regime semi-aberto128.

Elucida Pitombo citado por Mirabete129:

No exame criminológico, a personalidade do criminoso é examinada em relação ao crime concreto, ao fato por ele praticado, pretendendo-se com isso explicar a “dinâmica criminal (diagnóstico criminológico), propondo medidas recuperadoras (assistência criminiátrica)” e a avaliação da possibilidade de delinqüir (prognóstico criminológico).

A anterior redação do art. 112, da Lei de Execução Penal,

assim previa:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva, com a transferência para regime menos gravoso, a ser determinado pelo Juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos 1/6 (um sexto) da pena no regime anterior e seu mérito indicar a progressão. Parágrafo único. A decisão será motivada e precedida de parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico, quando necessário.

De outro norte, após o advento da Lei n. 10.792/03, o aludido

dispositivo legal passou a preconizar:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão. § 1o A decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor. § 2o Idêntico procedimento será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes.

128 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984. p. 52. 129 PITOMBO, Sérgio Marcos de Moraes. Os regimes de cumprimento de pena e o exame criminológico. In: MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984. 11. ed. revista e atualizada. São Paulo: Atlas, 2008. p 52.

Page 56: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

55

Assim sendo, verifica-se que o exame criminológico não é mais

indispensável para a concessão do benefício da progressão de regime, bastando

apenas que o diretor do estabelecimento penal ateste o bom comportamento

carcerário do apenado.

Contudo, referido exame ainda pode ser confeccionado, haja

vista que a Lei n. 10.792/03 não alterou o disposto no art. 8º, da Lei de Execução

Penal, o qual ainda prevê a realização do mesmo.

Ademais, traz-se a lume a Súmula 439, recentemente editada

pelo Superior Tribunal de Justiça, que tem a seguinte redação: “Admite-se o exame

criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada”

Destarte, convém pontuar que a Súmula supra transcrita

pacificou o entendimento sobre a realização do exame criminológico quando as

peculiaridades da causa assim o recomendarem.

2.6 PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO

Com a decadência da pena privativa de liberdade, uma vez que

esta raramente consegue atingir um de seus escopos, que é o de reinserir o

apenado no seio da sociedade, passou a se buscar alternativas à pena de prisão.

O condão das penas restritivas de direitos, complementando as

alternativas concretizadas por meio da multa, da suspensão condicional da pena e

até mesmo do livramento condicional, é proporcionar uma solução mais realista e

humana ao grave problema da prisão130.

É indispensável que se encontrem novas penas compatíveis

com os novos tempos, “[...] mas tão aptas a exercer suas funções quanto às antigas,

130 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 294.

Page 57: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

56

que, se na época não foram injustas, hoje o são. Nada mais permite que se aceite

um arsenal punitivo do museu do século XVIII”131.

Assim são descritas as penas restritivas de direito por Dotti132:

As penas restritivas de direitos são reações aplicadas contra o autor da infração, limitando o exercício de determinados direitos, liberdades ou garantias. Tais penas, como a designação bem o diz, se destinam a restringir ou recortar determinados direitos do condenado.

Sob a óptica de Jesus, essas penas “[...] são meios de que se

vale o legislador visando impedir que ao autor de uma infração penal venha a ser

aplicada medida ou pena privativa de liberdade”133.

As penas restritivas de direito, de acordo com o disposto no art.

43, do Código Penal, são:

a) prestação pecuniária;

b) perda de bens e valores;

c) prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;

d) interdição temporária de direitos; e

e) limitação de fim de semana.

Cumpre registrar que as penas alternativas são substitutivas. O

magistrado, em primeiro lugar, fixa a pena privativa de liberdade. Em seguida, a

substitui por uma ou mais alternativas, se for o caso. Não podem ser aplicadas

diretamente, nem cumuladas com as privativas de liberdade134.

131 ADREUCCI, Ricardo Antunes. O direito penal como justo. Revista dos Tribunais, n. 551, 1981, p. 296. 132 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. p. 21. 133 JESUS, Damásio E. de, Direito Penal, volume 1: parte geral. 28. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 529. 134 JESUS, Damásio E. de, Direito Penal, volume 1: parte geral. p. 532.

Page 58: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

57

Ademais, nos termos do art. 44, do Código Penal, as penas

são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando:

I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a 4 (quatro) anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, ou qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II – o réu não for reincidente em crime doloso; III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.

Não obstante, convém pontuar que se o condenado for

reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face da condenação

anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha

operado em virtude da prática do mesmo crime, por inteligência do disposto no § 3º,

do art. 44, do Código Penal.

Ainda no que tange às penas restritivas de direito, tem-se que

“em determinadas circunstâncias, as penas restritivas de direito podem ser

‘convertidas’ em pena privativa de liberdade, observada a detração (art. 44, §§ 4º e

5º, do CP e art. 181 e parágrafos da LEP)”135.

Contudo, afrima Bitencourt136:

A despeito da grande expectativa pelas necessárias e esperadas ‘penas alternativas’, vemos com grande ceticismo o futuro de tais sanções, pela falta de vontade política em dotar de infra-estrutura necessária para permitir a sua adequada operacionalização.

Destarte, verifica-se que a pena restritiva de direito é mais

benéfica ao réu, uma vez que tem o condão de evitar a aplicação de pena privativa

de liberdade, todavia, está adstrita a determinados pressupostos – um objetivo e

dois subjetivos, que devem estar presentes simultaneamente.

135 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 142. 136 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 146.

Page 59: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

58

2.7 PENA DE MULTA

A pena de multa consubstancia-se na obrigação de pagar

quantia certa ao fundo penitenciário, consoante o disposto no art. 49, do Código

Penal, o qual preconiza:

Art. 49. A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo de 10 (dez) e, no máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.

O legislador que elaborou a reforma da Parte Geral do Código

Penal em 1984, adotou o sistema dias-multa e inaugurou uma nova sistemática de

cominação de penas137.

Reale Junior citado por Bitencourt138, assim descreve o referido

sistema:

Observa-se que a multa, revalorizada, com o critério adotado, pode surgir como pena comum (principal), isolada, cumulada ou alternadamente, e com pena substitutiva da privativa de liberdade, quer sozinha, quer em conjunto com a pena restritiva de direitos, independentemente de cominação na Parte Especial.

Bitencourt139 também conceitua a pena em comento:

A pena de multa consiste na imposição ao condenado da obrigação de pagar ao Fundo Penitenciário determinada quantia em dinheiro, considerando a gravidade do delito, a culpabilidade do agente e, particularmente, sua condição econômica.

E mais: “Nessa aferição, levar-se-á em consideração não só o

seu salário, mas toda e qualquer renda, inclusive de bens e capitais, apurada na

data do fato”140.

137 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 277. 138 REALE JUNIOR, Miguel. Penas e medidas de segurança, 1985. In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 277. 139 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 162. 140 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 277.

Page 60: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

59

O art. 51, do Código Penal, dispõe sobre a impossibilidade da

conversão da multa:

Art. 51. Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição.

Quanto à expressão “dívida de valor”, que exsurge do

dispositivo supra, esta tem o propósito de transformar a sanção penal em débito

monetário. Porém, tal característica não altera a natureza penal dessa sanção, mas

apenas abarca outros objetivos, quais sejam, proibir a conversão da multa não paga

em prisão e satisfazer os civilistas, pois dívida de valor pode ser atualizada

monetariamente141.

É imperativo destacar que a Lei n. 9.268/96 alterou a redação

do artigo anteriormente transcrito, oportunidade na qual passou a impedir a

conversão da multa não paga em pena privativa de liberdade.

2.8 FINALIDADES DA PENA

As finalidades da pena consubstanciam-se em três teorias,

quais sejam, teoria absoluta ou retributiva, teoria preventiva e teoria mista, que por

seu turno, serão melhores esmiuçadas nos subtítulos subseqüentes.

2.8.1 Teoria Absoluta ou Retributiva da Pena

Esta teoria, como seu próprio nome esboça, remete à exclusiva

retribuição do mal ao acusado, com o propósito claro de realizar justiça, ou seja, a

pena caracteriza-se pela conseqüência jurídico-penal do crime perpetrado.

Acerca do assunto em comento, Bitencourt142 coloca:

141 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. p. 167. 142 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 107.

Page 61: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

60

Segundo esse esquema retribucionista, é atribuída à pena, exclusivamente, a difícil incumbência de realizar justiça. A pena tem como fim fazer justiça, nada mais. A culpa do autor deve ser compensada com a imposição de um mal, que é a pena, e o fundamento da sanção estatal está no questionável livre-arbítrio, entendido como a capacidade de decisão do homem para distinguir entre o justo e o injusto [...] dando margem à implantação do positivismo legal.

Capez143 preleciona que “[...] a pena é a retribuição do mal

injusto, praticado pelo criminoso, pelo mal justo previsto no ordenamento jurídico

(punitur quia peccatur est).

Para Teles144:

Na verdade, as teorias absolutas, chamadas retributivas, traduzem-se na necessidade de retribuir o mal causado – o crime – por outro mal, a pena, e sustentam-se, por isso, ainda, no velho espírito de vingança, que se situa na origem da pena, o que já não é acreditável nos dias modernos.

Nas palavras de Mirabete145:

Para as teorias chamadas absolutas (retribucionistas ou de retribuição), o fim da pena é o castigo, ou seja, o pagamento pelo mal praticado. O castigo compensa o mal e dá reparação à moral, sendo a pena imposta uma exigência ética em que não se vislumbra qualquer conotação ideológica. Para a Escola Clássica, que considerava o crime um ente jurídico, a pena era nitidamente retributiva, não havendo qualquer preocupação com a pessoa do delinqüente, já que a sanção se destinava a restabelecer a ordem pública alterada pelo delito.

Desta feita, depreende-se das considerações anteriormente

esposadas, que a teoria retributiva da pena diz respeito tão somente à retribuição do

mal praticado pelo acusado, isto é, do delito que perpetrara.

143 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. 357. 144 TELES, Ney Moura. Direito penal: parte geral: arts. 1º a 120. p. 321. 145 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984. p. 24.

Page 62: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

61

2.8.1.1 Kant e Hegel: Defensores da Teoria Retributiva

Entre os defensores das teses absolutistas ou retribucionistas

da pena destacam-se dois dos maiores expressivos pensadores do idealismo

Alemão: Kant, cujas idéias sobre o tema foram expostas em sua obra denominada

“A metafísica dos Costumes”, e Hegel, cujo idealismo jurídico-penal se extrai de sua

obra “Princípios da Filosofia do Direito”.

Kant e Hegel são tradicionalmente destacados na qualidade de

principais representantes das teorias absolutas da pena, todavia, estabelecem

razões distintas para fundamentarem suas convicções, enquanto para Kant a teoria

retributiva é de ordem ética, Hegel a considera de ordem jurídica.

Bitencourt146 sintetiza o entendimento de Kant:

De acordo com as reflexões kantianas, quem não cumpre as disposições legais não é digno de direito de cidadania. Nesses termos, é obrigação do soberano castigar “impiedosamente” aquele que transgrediu a lei. Kant entendia esta como imperativo categórico, isto é, como aquele mandamento que representasse uma ação em si mesma, sem referência a nenhum outro fim, como objetivamente necessária.

Ademais, Kant “[...] elabora sua concepção retributiva da pena

sobre a idéia de que a lei penal é um imperativo categórico”147.

Hegel também é partidário da teoria retributiva da pena e, para

tanto, eternizou a seguinte frase: “a pena é a negação da negação do Direito”. E

mais, acreditava Hegel que a pena vinha a restabelecer a ordem jurídica violada

pelo delinqüente, bem como que a pena não é somente um mal que se deve aplicar

simplesmente porque antes houve outro mal, porque seria irracional querer um

prejuízo porque já existia um prejuízo anterior148.

146 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 108. 147 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 108. 148 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 113.

Page 63: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

62

Contudo, é oportuno registrar que Kant e Hegel, em que pese

terem sido os mais expressivos, não foram os únicos defensores das teorias

absolutas da pena. Dentro da doutrina internacional podem-se constatar alguns

exemplos de opiniões semelhantes, como se verá em caráter meramente

enunciativo.

Carrara149, em seu famigerado “Programa de Direito Criminal”,

escreveu que “o fim primário da pena é o restabelecimento da ordem externa da

sociedade”. Essa concepção de Carrara, no entender de Bitencourt, aproxima-se

muito da defendida por Hegel.

O delito, na visão de Carrara150, “agrava a sociedade ao violar

suas leis e ofende a todos os cidadãos ao diminuir neles o sentimento de segurança

[...]”, de forma que, para evitar novas ofensas por parte do delinqüente, a pena deve

ser aplicada para poder “reparar este dano com o restabelecimento da ordem, que

se vê alterada pela desordem do delito”.

E finalmente, para Welzel151, “a pena aparece presidida pelo

postulado da retribuição justa, isto é, que cada um sofra o que os seus atos valem”.

2.8.2 Teoria Relativa ou Preventiva da Pena

A teoria relativa, também denominada utilitária ou utilitarista, dá

à pena um fim exclusivamente prático, mormente o da prevenção geral (com relação

a todos) ou especial (com relação ao condenado). E, na Escola Positiva, onde o

homem passou a centrar o Direito Penal com objeto principal de suas concepções, a

pena já não era mais um castigo, mas sim uma oportunidade clara para ressocializar

o criminoso.

149 CARRARA, Francesco. Programa de derecho criminal. Tradução: Ortega Torres. Bogotá: Temis, 1971, v.1. p. 615. 150 Ibidem. p. 616-618. 151 WELZEL, Han. Derecho penal alemã. Tradução: Juan Bustos Ramirez e Sergio Yáñez Pérez. Santiago: Ed. Jurídica de Chile, 1970. p. 326.

Page 64: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

63

Assim, calca-se a finalidade preventiva no propósito de evitar a

prática de novas infrações.

Como visto anteriormente, a prevenção dar-se-á de forma geral

ou especial, que serão explanadas a seguir.

2.8.2.1 Prevenção Geral

Dentre os defensores de uma teoria preventivo-geral da pena

destacam-se Bentham, Beccaria, Filangieri, Schopenhauer e Feuerbach.

“Na prevenção geral o fim intimidativo da pena dirige-se a

todos os destinatários da norma penal, visando a impedir que os membros da

sociedade pratiquem crimes”152.

Assinala Bitencourt153:

A prevenção geral fundamenta-se em duas idéias básicas: a idéia da intimidação ou da utilização do medo, e a ponderação da racionalidade do homem. Essa teoria valeu-se das idéias fundamentais para não cair no terror e no totalitarismo absoluto. Teve, necessariamente, de reconhecer, por um lado, a capacidade racional absolutamente livre do homem – que é uma ficção do livre-arbítrio, e por outro lado, um Estado absolutamente racional em seus objetivos, que também é uma ficção.

De outro norte, Nucci154 apresenta outro enfoque para a teoria

da prevenção geral:

a) geral negativo, significando o poder intimidativo que ela representa a toda a sociedade, destinatária da norma penal; b) geral positivo, demonstrando e reafirmando a existência e eficiência do Direito Penal.

152 JESUS, Damásio E. de, Direito Penal, volume 1: parte geral. p. 519. 153 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. I. p. 77. 154 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 371.

Page 65: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

64

Em suma, tem-se que na teoria da prevenção geral a ameaça

da pena produz no indivíduo uma espécie de motivação para não cometer delitos.

2.8.2.2 Prevenção Especial

Na prevenção especial a pena visa o autor do delito, retirando-

o do meio social, impedindo-o de delinqüir e procurando corrigi-lo.

“A teoria da prevenção especial procura evitar a prática do

delito, mas, ao contrário da prevenção geral, dirige-se exclusivamente ao

delinqüente em particular, objetivando que não volte a delinqüir”155.

Preleciona Leal156:

É possível que a ameaça de uma pena possa evitar que muitos indivíduos venham a praticar crimes. Essa eficácia preventiva, no entanto, somente funciona em relação aos indivíduos que se encontrem integrados na sociedade, para os quais a prática de um crime representaria apenas um episódio ocasional. Para os marginalizados, injustiçados e infratores habituais, é lógico que a função preventiva de sanção criminal torna-se bastante inócua.

Assim como na prevenção geral, Nucci157 também apresenta

outro enfoque na prevenção especial:

c) especial negativo, significando a intimidação ao autor do delito para que não torne a agir do mesmo modo, recolhendo-o ao cárcere, quando necessário e evitando a prática de outras infrações penais; d) especial positivo, que consiste na proposta de ressocialização do condenado, para que volte ao convívio social, quando finalizada a pena ou quando, por benefícios, a liberdade seja antecipada.

Destarte, perfaz-se que a teoria da prevenção especial não

abarca apenas a idéia de algo repressivo, ou então, do castigo propriamente dito,

mas também contempla uma função pedagógica ou educativa da pena.

155 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 129. 156 LEAL, João José. Direito penal geral. p. 317. 157 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 371.

Page 66: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

65

2.8.3 Teoria Mista ou Unificadora da Pena

A pena, na reforma de 1984, passou a apresentar a natureza

mista: é retributiva e preventiva, conforme dispõe o art. 59, caput, do Código Penal:

Art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: [...] Consoante o artigo supra transcrito, vê-se que no atual sistema

normativo brasileiro, a pena não deixa de possuir todas as características aqui já

expostas, ou seja, é castigo + intimidação ou reafirmação do Direito Penal +

recolhimento do agente infrator e ressocialização158.

“Para as teorias mistas (ecléticas ou intermediárias), a pena,

por sua natureza, é retributiva, tem seu aspecto moral, mas sua finalidade não é

simplesmente prevenção, mas um misto de correção e educação”159.

Ressalta Bitencourt160:

Inicialmente essas teorias unificadoras limitaram-se a justapor os fins preventivos, especiais e gerais, reproduzindo assim as insuficiências das concepções monistas da pena. Posteriormente, em uma segunda etapa, a atenção da doutrina jurídico-penal fixa-se na procura de outras construções que permitam unificar os fins preventivos gerais e especiais a partir de diversos estágios da da norma (cominação, aplicação e execução).

Outrossim, não há como descurar o disposto no art. 22, da Lei

de Execução Penal, o qual preconiza: “A assistência social tem por finalidade

amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à liberdade”.

158 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 371. 159 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984. p. 25. 160 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. p. 143.

Page 67: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

66

Nos dizeres de Leal161:

As teorias mistas ou ecléticas procuram justificar a aplicação da pena com fundamento de ordem moral (retribuição pelo mal praticado) e de ordem utilitária (ressocialização do condenado e prevenção de novos crimes). A pena guarda, inegavelmente, seu caráter retributivo: por mais branda que seja, continua sendo um castigo, uma reprimenda aplicável ao infrator da lei positiva. Ao mesmo tempo, busca-se com ela alcançar metas utilitaristas, como a de evitar novos crimes e a de recuperação social do condenado.

Com isso, pode-se concluir que a finalidade da pena adotada

pelo Brasil, a saber, mista/utilitária, tem o fito de implicar repressão ao crime

perpetrado e prevenir novos delitos, objetivando a reeducação do delinqüente,

retirando-o do convívio social quando necessário.

No capítulo seguinte serão abordados aspectos que se

relacionam diretamente com a eficácia da função retributiva da pena, como é o caso

do Regime Disciplinar Diferenciado, Direito Penal do Inimigo (ou inimigos do Direito

Penal) também sua antítese – o abolicionismo penal. No mais, para oportunizar uma

reflexão sobre políticas de segurança pública e até mesmo aspectos da criminologia,

faz-se um levantamento ilustrado por gráficos e tabelas que revelam dados do

sistema penitenciário catarinense.

161 LEAL, João José. Direito penal geral. p. 318.

Page 68: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

67

CAPÍTULO 3

INEFICÁCIA DA FINALIDADE RETRIBUTIVA DA PENA FACE AO INSTITUTO DA REINCIDÊNCIA

A reincidência162 pode ser considerada como um indicativo de

falência do sistema penal, entretanto, não deve ser apontada como fator

predominante para tanto.

A década de 90, no Brasil, ficou marcada pelo aumento da

repressão penal. A edição de um amontoado de leis com conotação expressamente

conservadora durante aquela década reforçou o total declínio do sistema carcerário.

Nos últimos anos, o cenário político-criminal mostra-se peculiar

e contraditório. Andrade163 lembra que:

No sistema penal a reivindicação de sua redução e abandono convive com a de sua expansão [...] Enquanto que está demonstrada a debilidade dos potenciais garantidores do Direito Penal, continua-se apostando neles.

E complementa: No Brasil, dos anos 80 em diante verifica-se claramente este quadro político-criminal ambíguo representado, por um lado, pelos movimentos de Lei e Ordem (de cuja hegemonia são expressões mais visíveis as Leis de Prisão Temporária, Crimes Hediondos, Crime Organizado, movimentos pela pena de morte ou prisão perpétua) e, por outro, por uma tendência despenalizadora/descriminalizadora representada pela reforma penal de 84, a recente Lei dos Juizados Especiais criminais (constitucionalmente programada) e a reforma penal da parte especial do Código Penal164.

162 Art. 63. Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior. CP. 163 ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A ilusão de segurança jurídica: do controle da violência à violência do controle penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado,1997. p. 296. 164 ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A ilusão de segurança jurídica: do controle da violência à violência do controle penal. p. 296.

Page 69: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

68

A crescente violência somente fortaleceu a crença popular de

que a solução do crime estaria na prisão, o que protegeria os homens bons dos

homens maus. E, malgrado a aplicação da pena privativa de liberdade, os altos

índices de reincidência têm sido, historicamente, invocados como um dos fatores

principais da comprovação do efetivo fracasso da pena privativa de liberdade [...]165.

Bitencourt166 bem assinala:

A prisão, em vez de conter a delinqüência, tem lhe servido de estímulo, convertendo-se em um instrumento que oportuniza toda a espécie de humanidades. Não traz nenhum benefício ao apenado; ao contrário, possibilita toda a sorte de vícios e degradações [...] Enfim, a maioria dos fatores que dominam a vida carcerária imprimem a esta um caráter criminógeno, de sorte que, em qualquer prisão clássica, as condições materiais e humanas podem exercer efeitos nefastos na personalidade dos reclusos.

Não são realizados estudos que possibilitem deslindar os

aspectos que podem ter influência sobre a reincidência, ou seja, não há pesquisas

científicas que permitam estabelecer se a reincidência pode não ser considerada

como um ou o mais importante indicador da falência da prisão, ou se esta pode ser

um resultado atribuível aos acontecimentos posteriores à libertação do interno, como

por exemplo, o fato de não encontrar trabalho ou então, não ser aceito pelos demais

membros da sociedade167.

“As elevadas taxas de reincidência podem não só indicar a

influência da prisão, como ainda refletir as transformações dos valores que se

produzem na sociedade e na estrutura socioeconômica”168.

A explicar o fenômeno da reincidência, seguem os argumentos

de Pinatel citado por Bitencourt169:

165 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 106. 166 Ibidem. p. 107. 167 SPARKS, Richard; HOOD, Roger. Problemas clave en criminología. Espanha: Ed. Guadarama, 1970. p. 232-233. 168 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 108. 169 PINATEL, Jean. La sociedad criminógena, 1979. In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 11. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. I. p. 108.

Page 70: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

69

[...] é um critério grosseiro a avaliação da eficácia dos métodos penitenciários feita pelos índices da reincidência. O simples percentual de reincidência não leva em consideração a situação dos internos no tocante às condições, população e peculiaridade gerais de cada estabelecimento penal. Pode ocorrer, por exemplo, que em determinado estabelecimento haja superpopulação e que se congreguem reclusos de alta periculosidade. Inegavelmente, superpopulação e periculosidade são dois fatores importantíssimo nos no aumento da taxa de reincidência. Nessa hipótese, a reincidência não poderia ser atribuída de forma exclusiva ao fracasso dos métodos penitenciários. E mais, as reincidências não são todas comparáveis, pois em alguns casos não passam de fracassos aparentes, constituindo, na verdade, êxitos parciais.

No que tange ao castigo máximo, Bitencourt170 aponta-o como

uma espécie de objetivo ressocializador “mínimo”, que não é por ele considerado de

forma negativa:

Modernamente, só se concebe o esforço ressocializador como uma faculdade que se oferece ao delinqüente para que, de forma espontânea, ajude a si próprio a, no futuro, levar uma vida sem praticar crimes. Esse entendimento configura aquilo que se convencionou chamar de “tratamento ressocializador mínimo”. Afasta-se definitivamente o denominado objetivo ressocializador máximo, que constitui uma invasão indevida na liberdade do indivíduo, o qual tem o direito de escolher seus próprios conceitos, sua ideologias, suas escalas de valores.

“Acabar com a delinqüência completamente e para sempre é

uma pretensão utópica, uma vez que marginalização e a dissidência são inerentes

ao homem e o acompanharão até o fim da aventura humana na Terra”171.

Não bastasse isso, uma teoria da pena que não queira ficar na

abstração ou em propostas isoladas, mas que pretenda atender à realidade, tem, no

dizer de Roxin172:

[...] que reconhecer as antíteses inerentes a toda a existência social para, de acordo com o princípio dialético, poder superá-las numa fase posterior; ou seja, tem de criar uma ordem que demonstre que,

170 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 124. 171 ROXIN, Claus. Problemas fundamentais de direito penal. Coimbra: Ed. Veja Universidade, 1986. p. 42-43. 172 ROXIN, Claus. Problemas fundamentais de direito penal. Coimbra: Ed. Veja Universidade, 1986. p. 45.

Page 71: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

70

na realidade, um Direito Penal só pode fortalecer a consciência jurídica da generalidade, no sentido de prevenção geral, se, ao mesmo tempo, preservar a individualidade de quem a ele está sujeito; que o que a sociedade faz pelo delinqüente também é, afinal, o mais proveitoso para ela; e que só se pode ajudar o criminoso a superar a sua inidoneidade social de uma forma igualmente frutífera para ele e para a comunidade se, a par da consideração da sua debilidade e da sua necessidade de tratamento, não se perder de vista a imagem da personalidade responsável para a qual ele aponta.

Ferrajoli173, nas entrelinhas, faz menção à super valorização do

castigo como uma conseqüência do Direito Penal Máximo, por assim dizer:

[...] o modelo de direito penal máximo, quer dizer, incondicionado e ilimitado, é o que se caracteriza, ale de sua excessiva severidade, pela incerteza e imprevisibilidade das condenações e das penas e que, conseqüentemente, configura-se como um sistema de poder não controlável racionalmente em face da ausência de parâmetros certos e racionais de convalidação e anulação. Devido a estes reflexos, o substancialismo penal e a inquisição processual são as vias mais idôneas para permitir a máxima expansão e a incontrolabilidade da intervenção punitiva e, por sua vez, sua máxima incerteza e irracionalidade.

Destarte, é forçoso concluir que a reincidência muitas vezes

não se opera tão somente pela total ineficácia do sistema carcerário, mas também

por estar relacionada a uma série de outros fatores, que evolvem, por exemplo, a

perspectiva de vida do apenado quando este retorna ao seio da sociedade após o

cumprimento da reprimenda.

3.1 POLÍTICA CRIMINAL, CRIMINOLOGIA E AS POLÍTICAS DE SEGURANÇA

PÚBLICA

Para uns, a política criminal se apresenta como uma técnica ou

um método de observação e análise crítica do Direito Penal, já para outros, parece

que política criminal é uma maneira de raciocinar e estudar o Direito Penal, fazendo-

o do modo crítico, expondo seus defeitos práticos, sugerindo reformas e

aperfeiçoamentos.

173 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 84.

Page 72: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

71

A política criminal se dá tanto antes da criação da norma penal

como também por ocasião de sua aplicação. Ensina Fragoso174 que o nome de

política criminal foi dado a importante movimento doutrinário, devido a Franz Liszt,

que teve influência como:

[...] tendência técnica, em face da luta de escolas penais, que havia no princípio deste século (referindo-se ao século XX) na Itália e na Alemanha. Essa corrente doutrinária apresentava soluções legislativas que acolhiam as exigências de mais eficiente repressão à criminalidade, mantendo as linhas básicas do Direito Penal clássico.

E continua Fragoso175, referindo-se ao termo que foi usado

pela ONU – Organização das Nações Unidas para denominar “o critério orientador

da legislação, bem como os projetos e programas tendentes a mais ampla

prevenção do crime e controle da criminalidade”.

De outro norte, segundo Nucci176, a criminologia, que envolve a

antropologia criminal (estudo da constituição física e psíquica do delinqüente), bem

como a psicologia criminal (estudo do psiquismo do agente da infração penal) e a

sociologia criminal (estudo das causas sociais da criminalidade), tem uma visão

mais ampla e aberta, visto que não se restringe à análise da norma penal e seus

efeitos, mas sobretudo às causas que levam à delinqüência.

A criminologia, nas palavras de Shecaira177:

[...] é um nome genérico designado a um grupo de temas estreitamente ligados: o estudo e a explicação da infração penal; os meios formais e informais de que a sociedade se utiliza para lidar com o crime e com atos desviantes; a natureza das posturas com que as vítimas desses crimes serão atendidas pela sociedade; e, por derradeiro, o enfoque sobre o autor desses fatos desviantes.

174 FRAGOSO, Heleno. Lições de direito penal: parte geral. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 18. 175 FRAGOSO, Heleno. Lições de direito penal: parte geral. p. 18. 176 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 54. 177 SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. São Paulo: RT, 2004. p. 31.

Page 73: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

72

Ademais, estabelecendo a diferença entre política criminal e

criminologia Shecaira178 diz que:

Aquela implica as estratégias a adotarem-se dentro do Estado no que concerne à criminalidade e a seu controle; já a criminologia converte-se, em face da política criminal, em uma ciência de referências, na base material, no substrato teórico dessa estratégia. A política criminal, pois, não pode ser considerada uma ciência igual à criminologia e ao direito penal. É uma disciplina que não tem um método próprio e que está disseminada pelos diversos poderes da União, bem como pelas diferentes esferas de atuação do próprio Estado.

Em suma, a política criminal implica na postura do Estado no

combate à criminalidade.

Ademais, não há como descurar que a política criminal e a

criminologia tem importante contribuição na implementação de políticas de

segurança públicas.

Numa ótica tradicionalista, a função maior do Estado é prestar

segurança (do latim secure, significa "sem medo") aos seus cidadãos, garantindo-

lhes a sua incolumidade física e moral, reflexo de uma convivência pacífica e

harmoniosa entre os indivíduos. Sob esse prima, o conceito de segurança pública

está ligado ao de poder de polícia, estando a ordem pública assimilada à ordem

interna do grupo.

O poder de polícia, que incorporou valores sociais, assim

passou a ser definido, nos dizeres de Neto179:

[...] atividade administrativa do Estado que tem por fim limitar e condicionar o exercício das liberdades e direitos individuais visando a assegurar, em nível capaz de preservar a ordem pública, o atendimento de valores mínimos da convivência social, notadamente a segurança, a salubridade, o decoro e a estética.

178 SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. São Paulo: RT, 2004. p. 41. 179 NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. Direito Administrativo da Ordem Pública. 3. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1998. p. 71.

Page 74: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

73

Assim, moldou-se um novo conceito de segurança pública, que

então foi conceituada como a garantia da ordem pública interna, sendo esta:

[...] o estado de paz social que experimenta a população, decorrente do grau de garantia individual ou coletiva propiciado pelo poder público, que envolve, além das garantias de segurança, tranqüilidade e salubridade, as noções de ordem moral, estética, política e econômica independentemente de manifestações visíveis de desordem180.

Em outras palavras, segurança pública seria a garantia dada

pelo Estado de uma convivência social isenta de ameaça de violência, permitindo a

todos o gozo dos seus direitos assegurados pela Constituição, por meio do exercício

do poder de polícia.

A política criminal e criminologia são elementos a auxiliar o

Estado no combate à criminalidade, entretanto, para Souza181, a maioria das

instituições policiais do país adota uma política ultrapassada de capturar criminosos.

E mais, as instituições policiais demonstram a incapacidade de prever os problemas

da comunidade e de planejar técnicas preventivas, da mesma forma que falham por

não trabalharem em conjunto com essa mesma comunidade.

Em artigo publicado, Souza182 afirma enfaticamente:

O clamor público por uma política de segurança que, ao mesmo tempo, controle a criminalidade, aumente o sentimento de segurança do cidadão e dê respostas adequadas às demandas de prestação de serviço não parece ter sido suficiente para que houvesse uma mudança de qualidade na implementação de mudanças permanentes. A polícia, em nossa democracia, ainda concebe o público como uma ameaça ou um obstáculo

Contudo, é oportuno registrar que a Constituição Federal/88

trouxe uma inovação tecnológica no que tange à responsabilidade pela segurança

180 NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. Direito Administrativo da Ordem Pública. 3. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1998. p. 81. 181 SOUZA, Luís Antônio Francisco de. Polícia e Policiamento no Brasil: Mudanças Recentes e Tendências Futuras. Boletim IBCCRIM - nº 113, 2002. 182 SOUZA, Luís Antônio Francisco de. Polícia e Policiamento no Brasil: Mudanças Recentes e Tendências Futuras. Boletim IBCCRIM - nº 113, 2002.

Page 75: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

74

pública. Consoante o caput do art. 144, é dever e responsabilidade de todos. Veja-

se:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida pela preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos [....]

Isto significa que todos os cidadãos brasileiros são

responsáveis pela segurança de toda a sociedade. Portanto, mais do que uma

atitude cidadã, zelar pela integridade física e moral dos indivíduos, bem como pela

manutenção da ordem pública, é um dever constitucional.

A constitucionalização dessa responsabilidade, no entanto,

apenas normatiza uma regra lógica. Ora, atribuir aos integrantes de uma

comunidade a obrigação de velar por sua própria segurança é uma questão de bom

senso. Porque a sociedade tem o dever de se interessar e lutar por todas as causas

que lhe dizem respeito, estando ultrapassado o entendimento no qual o Estado, e

apenas ele, é o responsável pelos problemas sociais.

Destarte, perfaz-se que a política criminal e a criminologia

podem fortalecer as bases das políticas de segurança públicas, todavia, hoje a

problemática da segurança pública deixou de ser uma questão de ordem absoluta

da Polícia, sem participação alguma de qualquer segmento da sociedade, tendo em

vista o preceito constitucional de que a segurança pública é responsabilidade de

todos.

3.2 DADOS ESTATÍSTICOS – SISTEMA PENITENCIÁRIO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

A partir do século XIX, as chamadas ciências penais se

consolidaram em importância. Isso porque elas se preocupam em estudar o

fenômeno da criminalidade, ou seja, levam em conta as causas para que se possa

compreender e explicar o fenômeno criminal.

Page 76: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

75

*** TOTAL DE 13.388

Através das estatísticas se pode conhecer o nexo de

causalidade entre determinados fatores e os crimes perpetrados. As estatísticas

criminais servem, ainda, para traçar políticas criminais e estratégias de ações

preventivas e repressivas.

As tabelas e gráficos a seguir foram confeccionados com os

dados fornecidos pelo DPN – Departamento Penitenciário Nacional, através da

conexão com a base de dados do InfoPen – Sistema Nacional de Informação

Penitenciária.

As estatísticas abaixo representadas dividem-se em categorias,

indicadores e itens, que objetivam traçar um panorama do Sistema Penitenciário de

Santa Catarina e, por conseguinte, tem a finalidade de auxiliar no desenvolvimento

das derradeiras considerações deste trabalho acadêmico.

3.2.1 Categoria: Quantidade de Presos/Internados Masculinos Indicador: Quantidade de Presos Custodiados no Sistema Penitenciário

O gráfico abaixo representa os números de presos/internados

masculinos no Estado de Santa Catarina. A identificação é feita através do

demonstrativo dos presos provisórios, aqueles que cumprem pena em regime

fechado, semi-aberto e aberto, internação e tratamento ambulatorial.

*Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. InfoPen. Referência: 06/2010

PRESOS/INTERNADOS DO SEXO MASCULINO

3.712; 28%

5.290; 40%

1.635; 12%

2.609; 19%

142; 1%Presos Provisórios

Regime Fechado

Regime Semi Aberto

Regime Aberto

Internação

TratamentoAmbulatorial

Page 77: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

76

***TOTAL DE 1.903

3.2.2. Categoria: Quantidade de Presos Internados/Femininos

Indicador: Quantidade de Presos Custodiados no Sistema Penitenciário

O gráfico abaixo representa os números de presos/internados

femininos no Estado de Santa Catarina. A identificação é feita através do

demonstrativo das presas provisórias, aquelas que cumprem pena em regime

fechado, semi-aberto e aberto, internação e tratamento ambulatorial.

*Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. InfoPen. Referência: 06/2010

3.2.3 Categoria: Estabelecimentos Penais Indicador: Quantidade de Estabelecimentos Penais (Secretaria de Justiça e Segurança Pública)

A tabela abaixo demonstra a quantidade de estabelecimentos

penais que o sistema carcerário do Estado de Santa Catarina abarca. Contempla o

número de penitenciárias (cumprimento de pena de reclusão em regime fechado),

colônias agrícolas e industriais (cumprimento de pena em regime semi-aberto),

casas de albergados (cumprimento de pena privativa de liberdade em regime aberto,

e pena de limitação de fim de semana), cadeias públicas (recolhimento de presos

provisórios) e hospitais de custódia e tratamentos psiquiátricos (cumprimento de

PRESOS/INTERNADOS DO SEXO FEMININO87; 8%

443; 41%

368; 34%

191; 17%PresosProvisórios

Regime Fechado

Regime SemiAberto

Regime Aberto

Internação

TratamentoAmbulatorial

Page 78: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

77

medida de segurança de internação ou tratamento ambulatorial). Os indicadores

apontam os estabelecimentos destinados tantos aos homens quanto às mulheres.

Categoria: Estabelecimentos Penais Masculino Feminino Total

Indicador: Quantidade de Estabelecimentos Penais 41 1 42

Item: Penitenciárias 6 0 6

Item: Colônias Agrícolas, Industriais 1 0 1

Item: Casas de Albergados 2 0 2

Item: Cadeias Públicas 31 1 32

Item: Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico 1 0 1

*Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. InfoPen.Referência: 06/2010.

3.2.4 Categoria: Capacidade Indicador: Número de Vagas (Secretaria de Justiça e Segurança Pública)

A tabela abaixo representa o número total de vagas disponíveis

no sistema carcerário do Estado de Santa Catarina. A amostragem contempla o

número de vagas para o sexo masculino e feminino. Também revela o número de

vagas para presos provisórios, cumprimento de pena em regime fechado, semi-

aberto, aberto e até mesmo no RDD – Regime Disciplinar Diferenciado. Salienta-se

que não foram fornecidos dados relativos ao Sistema Penitenciário Federal.

Categoria: Capacidade Masculino Feminino Total

Indicador: Número de Vagas 6.800 437 7.237

Item: Sistema Penitenciário Estadual - Provisórios 2.691 368 3.069

Item: Sistema Penitenciário Estadual - Regime Fechado 2.992 61 3.053

Item: Sistema Penitenciário Estadual - Regime Semi-

Aberto

1.035 8 1.043

Item: Sistema Penitenciário Estadual - Regime Aberto 10 0 10

Item: Sistema Penitenciário Estadual - RDD 72 0 72

Item: Sistema Penitenciário Federal - Regime Fechado 0 0 0

Item: Sistema Penitenciário Federal - RDD 0 0 0 *Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. InfoPen. Referência: 06/2010.

Page 79: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

78

3.2.5 Indicadores Automáticos

A tabela infra representa o número total da população

carcerária do Estado de Santa Catarina. Expressa uma relação entre a população

carcerária, o número de habitantes do Estado e uma soma de 236,67 presos para

cada 100.000 (cem mil) habitantes.

Indicadores Automáticos

População Carcerária: 14.481

Número de Habitantes: 6.118.743

População Carcerária por 100.000 mil habitantes: 236,67 *Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. InfoPen. Referência: 06/2010.

3.2.6 Categoria: Perfil do Preso Indicador: Quantidade de Presos por Grau de Instrução

A tabela representa o grau de instrução dos presos do Estado,

o que auxilia no desenvolver de um perfil dos apenados. O número de presos que

tem baixo nível de escolaridade, ou seja, ensino fundamental incompleto, é gritante.

Veja-se:

Categoria: Perfil do Preso Masculino Feminino Total

Indicador: Quantidade de Presos por Grau de Instrução

13.388 1.903 14.481

Item: Analfabeto 633 37 670

Item: Alfabetizado 1.536 85 1.621

Item: Ensino Fundamental Incompleto 6.002 499 6.501

Item: Ensino Fundamental Completo 2.363 159 2.522

Item: Ensino Médio Incompleto 1.446 123 1.569

Item: Ensino Médio Completo 1.125 106 1.231

Item: Ensino Superior Incompleto 141 29 170

Item: Ensino Superior Completo 75 6 81

Item: Ensino acima de Superior Completo 2 0 2 *Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. InfoPen. Referência: 06/2010.

Page 80: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

79

3.2.7 Categoria: Perfil do Preso

Indicador: Quantidade de Presos por Tempo Total das Penas

A tabela abaixo traz um indicativo de presos por tempo total

das penas. A maioria dos presos já condenados por uma sentença transitada em

julgado, cumpre uma reprimenda de 4 (quatro) até 8 (oito) anos.

Categoria: Perfil do Preso Masculino Feminino Total

Indicador: Quantidade de Presos por Tempo Total das Penas

9.239 616 9.855

Item: Até 4 anos 2.537 200 2.737

Item: Mais de 4 até 8 anos 2.773 226 2.999

Item: Mais de 8 até 15 anos 2.119 149 2.268

Item: Mais de 15 até 20 anos 832 28 860

Item: Mais de 20 até 30 anos 656 11 657

Item: Mais de 30 até 50 anos 212 0 212

Item: Mais de 50 anos até 100 anos 76 2 78

Item: Mais de 100 anos 34 0 34 *Fonte: Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. InfoPen. Referência: 06/2010.

3.2.8 Categoria: Perfil do Preso Indicador: Quantidade de Presos por Faixa Etária

A tabela abaixo traz um indicativo de presos masculinos e

femininos por faixa etária. O número de jovens encarcerados, aqueles entre 18 a 24

anos de idade, representa a maior porção.

Categoria: Perfil do Preso Masculino Feminino Total

Indicador: Quantidade de Presos por Faixa Etária 13.388 1.093 14.481

Item: 18 a 24 anos 4.046 364 4.410

Item: 25 a 29 anos 3.343 219 3.562

Item: 30 a 34 anos 2.558 176 2.734

Item: 35 a 45 anos 2.132 198 2.330

Item: 46 a 60 anos 1.079 100 1.179

Item: Mais de 60 anos 168 7 165

Page 81: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

80

3.3 DIREITO PENAL DO INIMIGO (OU INIMIGOS DO DIREITO PENAL)

O Direito Penal do Inimigo é atualmente considerado como

uma das vertentes mais rígidas do Direito Penal Máximo.

Vale registrar que no Direito Penal Máximo qualquer tipo de

infração deve ser punido severamente, a fito de servir de exemplo à sociedade e

buscando evitar que o agente possa cometer atos mais graves. Dessa forma, uma

mendicância, por exemplo, deve ser punida penalmente, para que futuramente não

se transforme em furto ou até mesmo num roubo, latrocínio183.

Nas palavras de Ferrajoli citado por Nucci184, o Direito Penal

Máximo: É um modelo de direito penal caracterizado pela excessiva severidade, pela incerteza e pela imprevisibilidade de suas condenações e penas, voltado à garantia de que nenhum culpado fique impune, ainda que à custa do sacrifício de algum inocente [...] Esse sistema vem sendo adotado, primordialmente, pelos Estados Unidos, implicando no método vulgarmente denominado de “tolerância zero”.

Foi o professor Alemão Günter Jakobs, que na segunda

metade da década de 90, desenvolveu a denominação Direito Penal do Inimigo. O

autor procura distinguir o Direito Penal do Cidadão do Direito Penal do Inimigo.

Inicialmente, convém aclarar que Jakobs explica o que

denomina “Direito Penal do Cidadão”, cujo ponto de partida se deu através da Teoria

Sistêmica de Niklas Luhmann, tendo em vista a constatação da complexidade e a

contingência da sociedade moderna, formulando uma espécie de Direito penal da

normalidade, ou, nas próprias palavras do autor, o “Direito Penal do Cidadão”185.

183 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. p. 372 184 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão, 2002. In: NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 374. 185 É o chamado Funcionalismo Sistêmico, sustentado por Jakobs. Tese rigorosamente criticada por Roxin (Funcionalismo Teleológico – segundo o qual o Direito Penal tem por finalidade tutelar o bem jurídico relevante), por Frisch, por Zaffaroni (Funcionalismo Reducionista). Cf.: ROXIN, Claus,

Page 82: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

81

E, segundo Jakobs186:

O Direito Penal conhece dois pólos ou tendências em suas regulações. Por um lado, o tratamento com o cidadão, esperando-se até que se exteriorize sua conduta para reagir, com o fim de confirmar a estrutura normativa da sociedade, e por outro, o tratamento com o inimigo, que é interceptá-lo já no estado prévio, a quem se combate por sua periculosidade.

Para o referido autor, existem pessoas que não admitem ser

obrigadas a entrar em um estado de cidadania, logo, não podem participar do

conceito de pessoa187.

Sánchez188, referindo-se ao conceito de inimigo e às

características do Direito Penal do Inimigo fornecidos por Jakobs, diz que:

Se nos restringirmos à definição desse autor, o inimigo é um indivíduo que, mediante seu comportamento, sua ocupação profissional ou, principalmente, mediante sua vinculação a uma organização, abandonou o Direito de modo supostamente duradouro e não somente de maneira incidental [...] As características do Direito Penal de inimigos seriam então a ampla antecipação da proteção penal, isto é, a mudança de perspectiva do fato passado a um porvir; a ausência de uma redução de pena correspondente a tal antecipação; a transposição da legislação jurídico-penal à legislação de combate; e o solapamento de garantias processuais.

Ainda segundo as lições de Sánchez189, o Direito Penal do

Inimigo pode ser entendido com a terceira velocidade do Direito Penal, na qual “[...]

o Direito Penal da pena de prisão concorre com uma ampla relativização de

garantias político-criminais, regras de imputação e critérios processuais”.

GRECO, Luís. Funcionalismo e Imputação Objetiva no Direito Penal. 3ª ed., Trad. Luís Greco. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 119. E também: GOMES, Luiz Flávio, MOLINA, Antonio Garcia-Pablos de. Direito Penal – Parte Geral – Vol. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 173 - 205. 186 JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. Direito Penal do Inimigo: noções e críticas.Tradução de André Luis Callegari e Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 37. 187 Ibidem. p. 36. 188 SÁNCHEZ, Jesus Maria Silva. A expansão do direito penal: aspectos da política criminal nas sociedades pós industriais. p. 148. 189 SÁNCHEZ, Jesus Maria Silva. A expansão do direito penal: aspectos da política criminal nas sociedades pós industriais. p. 148-149.

Page 83: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

82

Resumidamente, para Jakobs190 os inimigos são os criminosos

econômicos, terroristas, delinqüentes organizados, autores de delitos sexuais e

outras infrações penais perigosas. Em poucas palavras, é inimigo quem se afasta de

modo permanente do Direito e não oferece garantias cognitivas de que vai continuar

fiel à norma.

No mais, parte-se da premissa de que Jakobs191 considera que

o inimigo não admite ingressar no estado de cidadania, bem como não deve

participar dos benefícios do conceito de pessoa. Por conseguinte, o inimigo não é

um sujeito processual, logo, não pode contar com direitos processuais, como por

exemplo, o de comunicar-se com seu advogado constituído.

Tem-se ainda:

Contra o inimigo [...] não se justifica um procedimento penal (legal), sim, um procedimento de guerra. Quem não oferece segurança cognitiva suficiente de um comportamento pessoal, não só não deve esperar ser tratado como pessoa, senão que o Estado não deve tratá-lo como pessoa (pois do contrário vulneraria o direito à segurança das demais pessoas) 192.

O Direito Penal do Inimigo, como se vê, necessita da eleição

de um inimigo e caracteriza-se ademais pela oposição que faz ao Direito penal do

cidadão (onde vigoram todos os princípios limitadores do poder punitivo estatal).

Elencar-se-á a seguir as principais características do Direito

Penal do Inimigo, a saber: a) o inimigo não pode ser punido com pena, sim, com

medida de segurança; b) não deve ser punido de acordo com sua culpabilidade,

senão consoante sua periculosidade; c) as medidas contra o inimigo não olham

prioritariamente o passado (o que ele fez), sim, o futuro (o que ele representa de

perigo futuro); d) não é um Direito Penal retrospectivo, sim, prospectivo; e) o inimigo

não é um sujeito de direito, sim, objeto de coação; f) o cidadão, mesmo depois de

190 JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. Direito Penal do Inimigo: noções e críticas. p. 39. 191 Ibidem, p. 45. 192 Ibidem, p. 45.

Page 84: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

83

delinqüir, continua com o status de pessoa; já o inimigo perde esse status

(importante só sua periculosidade).

E outras, g) o Direito Penal do cidadão mantém a vigência da

norma; o Direito Penal do inimigo combate preponderantemente perigos; h) o Direito

Penal do inimigo deve adiantar o âmbito de proteção da norma (antecipação da

tutela penal), para alcançar os atos preparatórios; i) mesmo que a pena seja intensa

(e desproporcional), ainda assim, justifica-se a antecipação da proteção penal; j)

quanto ao cidadão (autor de um homicídio ocasional), espera-se que ele exteriorize

um fato para que incida a reação (que vem confirmar a vigência da norma); em

relação ao inimigo (terrorista, por exemplo), deve ser interceptado prontamente, no

estágio prévio, em razão de sua periculosidade.

3.3.1 Reações ao Direito Penal do Inimigo

A Teoria extremista lançada por Jakobs, aos olhos de seus

críticos, nada mais é do que um exemplo do Direito Penal de autor, que pune o

sujeito pelo o que ele é em total contrapartida ao Direito Penal do fato, que pune o

agente pelo o que ele fez.

É oportuno assinalar que a máxima expressão do Direito Penal

de autor deu-se durante o Nazismo, na Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Desse modo, o Direito Penal do Inimigo reporta-se a esse nefasto período da

História, através de uma nova perseguição a determinados grupos de delinqüentes.

Muitas foram as críticas proferidas em detrimento do Direito

Penal do Inimigo e, dentre todos os críticos, talvez poucos destacam-se tanto quanto

Zaffaroni, o qual enfatiza que se não fosse o termo utilizado, ou seja, inimigo, a

teoria não teria despertado tanta polêmica.

Zaffaroni193 complementa que “Jakobs deve ser criticado pela

introdução de elementos próprios do estado absoluto no interior do Estado de direito,

193 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo no direito penal. Tradução de Sérgio Lamarão. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p. 167.

Page 85: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

84

sem se dar conta de que isso o implode”. A razão é que “todo espaço que se

concede ao Estado de polícia é usado por este para estender-se até chegar ao

Estado absoluto”, enterrando, definitivamente, o seu inimigo.

O refelado autor pontifica os Estados de direito “não são nada

além da contenção dos Estados de polícia, penosamente conseguida como

resultado da experiência acumulada ao longo das lutas contra o poder absoluto”194.

Apesar da luta, é bom deixar claro que o Estado de polícia não veio a óbito, apenas

encontra-se encapsulado.

Nesse sentido, a função do direito penal de todo Estado de

direito é a “redução e a contenção do poder punitivo dentro dos limites menos

irracionais possíveis”195. Logo, o termo direito penal garantista em um Estado de

direito é uma redundância grosseira.

Destaca ainda, que nenhum cidadão pode resistir ao título de

inimigo. Exemplo fático deste fenômeno pode ser observado em uma “lei que

permite a detenção indeterminada sem processo, violação de correspondência e de

privacidade sem ordem judicial, tribunais militares secretos e a expulsão do

território”.196

Por fim, Zaffaroni chama a atenção para o fato de que o direito

internacional penal é direito penal do inimigo e não do cidadão. Para tanto, cita

exemplos da atualidade, tais como, o caso do ex-presidente sérvio Slobodan

Milosevic. Outrossim, atenta para o que ele chama de lógica do quitandeiro no

combate ao terrorismo e propõe como sendo o papel do direito penal nada mais que

o ordinário, ou seja, “se delitos são cometidos, seus responsáveis devem ser

individualizados, detidos, processados, julgados, condenados e levados a cumprir a

pena”197.

194 Ibidem, p. 169. 195 Ibidem, p. 172. 196 Ibidem, p. 150. 197 Ibidem, p. 185.

Page 86: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

85

Destarte, conclui-se que o Direito Penal do Inimigo, já

unicamente em sua concepção teórica, atinge o Estado de direito concreto, real ou

histórico, portanto, perde o rumo das conquistas já obtidas por meio das diversas

lutas sociais travadas pela humanidade.

Os direitos dos cidadãos, independentemente da geração a

que ele pertença, são frutos que não podem desaparecer, tampouco serem

mitigados, pois caso isso venha a ocorrer, o próprio Estado de direito terá sido

abolido.

3.4 O REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO FRENTE ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS E TRATADOS INTERNACIONAIS

Importante ressaltar que a origem do RDD encontra-se na

Grécia antiga, porém, com outra terminologia, diga-se. No Brasil Império, havia

também o chamado “cárcere duro”, para os criminosos que desobedecessem o

Imperador198.

Após diversas rebeliões no Estado de São Paulo, dentre elas a

maior rebelião já registrada, ocorrida no Município de Taubaté, ocasião na qual

envolveram-se quatro cadeias públicas sob a responsabilidade da Secretaria de

Segurança do Estado e vinte e cinco unidades prisionais, diversas medidas

administrativas foram adotadas199.

Dentre as medidas adotadas, estava a edição de Resoluções,

que visavam assegurar a disciplina e a ordem no sistema carcerário. Assim surgiu a

Resolução SAP-26, de 04/05/2001, a qual instituiu o Regime Disciplinar Diferenciado

no Estado de São Paulo.

198 GOMES, Luiz Flávio; CUNHA, Rogério Sanches; CERQUEIRA, Thales Tácito Pontes Luz de Pádua. O regime disciplinar diferenciado é constitucional? O legislador, o judiciário e a caixa de pandora. Disponível em: <http://www.bu.ufsc.br/ConstitRegimeDisciplinarDifer.pdf>. Acesso em 18 out. 2010 199 SILVA, Fernanda Cintra Lauriano. Análise da In (Constitucionalidade) do Regime Disciplinar Diferenciado. Disponível em: <http://www.lfg.com.br. 21 de junho de 2009>. Acesso em: 18 out. 2010.

Page 87: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

86

Várias foram as resoluções que se calcaram no intuito de

adotar o Regime Disciplinar Diferenciado nos complexos penitenciários no Estado de

São Paulo.

Em março de 2003, o Governo Federal, ao procurar uma

medida para “endurecer” o sistema já criado e amparar legalmente o RDD, editou a

Lei n. 10.792, que entrou em vigor em 1º de dezembro de 2003, e alterou e Lei de

Execução Penal (Lei n. 7210/84) para a inclusão do Regime Disciplinar Diferenciado.

Atinente à concepção do instituto do RDD, vale expor um

conceito de Mirabete200:

O regime disciplinar diferenciado [...] não constitui um regime de cumprimento de pena em acréscimo aos regimes fechado, semi-aberto e aberto, nem uma nova modalidade de prisão provisória, mas sim um regime de disciplina carcerária especial, caracterizado por maior grau de isolamento do preso e de restrições ao contato com o mundo exterior, a ser aplicado como sanção disciplinar ou como medida de caráter cautelar, tanto ao condenado como ao preso provisório, nas hipóteses previstas em lei.

Bitencourt201 assim descreve o regime em comento: As restrições consagradas pelo novo diploma legal (Lei n. 10.792/03 não se destinam a fatos, mas a determinadas espécies de autores, impondo isolamento celular de até um ano, não em decorrência da prática de determinado crime, mas porque, na avaliação subjetiva de determinada instância de controle social formal, representam “alto risco” social ou carcerário, ou então porque há “suspeitas” de participação em quadrilha ou bando.

E mais, Bitencourt202 considera que a prescrição do RDD “[...] é

capaz de fazer inveja ao condenado neo-socialismo alemão das décadas de 30 e 40

do século passado.

200 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984. 11. ed. revista e atualizada. São Paulo: Atlas, 2004. p. 116. 201 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 468. 202 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 468.

Page 88: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

87

O novo texto legal, alterado pelo advento da Lei n.

10.792/2003, enfim, ficou com a seguinte redação:

Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório, ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características: I - duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada; II - recolhimento em cela individual; III - visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas; IV - o preso terá direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol. § 1o O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade. § 2o Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando.

Portanto, da leitura do texto legal, denota-se que o RDD -

Regime Disciplinar Diferenciado abarca as seguintes características: duração

máxima de 360 dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de

mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada; recolhimento em cela

individual; visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração

de duas horas; direito à saída da cela por duas horas diárias para banho de sol.

Ressalta-se que o RDD está totalmente vinculado aos ditames

da execução penal e, desde sua implantação, teve sua eficácia discutida por muitos

estudiosos das ciências criminais.

O exemplo mais célebre a retratar a eficácia do regime criado e

legalmente amparado sob a égide da Lei n. 10.792/03, foi o traficante Fernandinho

Beira-Mar, que em maio de 2003 foi transferido para o presídio de segurança

máxima de Presidente Bernardes, a 600 KM da cidade de São Paulo203.

203 GOMES, Luiz Flávio; CUNHA, Rogério Sanches; CERQUEIRA, Thales Tácito Pontes Luz de Pádua. O regime disciplinar diferenciado é constitucional? O legislador, o judiciário e a caixa de

Page 89: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

88

Na época em que foi transferido, Beira-Mar transparecia certa

confiança, todavia, no interior do presídio de Presidente Bernardes, ele comandava

os morros do Rio e uma rede de tráfico de drogas com ramificação até no exterior,

motivo pelo qual foi encaminhando ao cumprimento de sua reprimenda no RDD204.

Autoridades judiciárias costumavam fazer entrevistas

periódicas gravadas com os presos de Presidente Bernardes, para assegurar que a

integridade física deles fosse preservada enquanto do cumprimento da pena.

Numa dessas entrevistas, Fernandinho Beira-Mar205 admitiu:

Já estou chamando formiga de meu louro. Olha o ponto que eu cheguei. Sinceramente, são sete meses numa situação completamente [...] Eu não desejo para o meu pior inimigo passar pelo o que estou passando.

E, a partir da adoção do RDD, muitos foram os argumentos

lançados a defender sua inconstitucionalidade, mormente por causa de sua duração,

como verificar-se-á a seguir.

Como já se viu, a duração máxima do RDD pode atingir o

patamar máximo de trezentos e sessenta dias, os quais podem ser repetidos por

igual período. De outro norte, a Lei de Execução Penal, em seu artigo 58, antes da

alteração trazida pelo advento da Lei n. 10.792/2003, estipulava que “O isolamento,

a suspensão e a restrição de direitos não poderão exceder a 30 (trinta) dias”.

Logo, cotejando o dispositivo supramencionado, o que se pode

concluir é que o isolamento do regime disciplinar diferenciado poderia ter sido mais

razoável ao ser previsto pelo legislador, se o prazo tivesse guardado compatibilidade

com aquele já estabelecido na Lei de Execução Penal, qual seja, o de trinta dias, pandora. Disponível em: <http://www.bu.ufsc.br/ConstitRegimeDisciplinarDifer.pdf>. Acesso em 18 out. 2010. 204 Ibidem. 205 GOMES, Luiz Flávio; CUNHA, Rogério Sanches; CERQUEIRA, Thales Tácito Pontes Luz de Pádua. O regime disciplinar diferenciado é constitucional? O legislador, o judiciário e a caixa de pandora. Disponível em: <http://www.bu.ufsc.br/ConstitRegimeDisciplinarDifer.pdf>. Acesso em 18 out. 2010.

Page 90: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

89

consoante o disposto no art. 58, que somente teve sua redação alterada com a

promulgação da lei supramencionada.

O posicionamento do Conselho Nacional de Política Criminal e

Penitenciária206 questiona especificamente sobre a duração do regime. O Conselho

manifestou-se no seguinte sentido:

[...] O projeto, ao prever 360 dias de isolamento, certamente causará nas pessoas a ele submetidas a deterioração de suas faculdades mentais, podendo-se dizer que o RDD não contribui para o objetivo da recuperação social do condenado e, na prática, importa a produção deliberada de alienados mentais. (grifou-se)

Ademais, em que pese o regime disciplinar diferenciado

abarcar uma hipótese de maximização do castigo atribuído ao apenado, urge

salientar que vai de encontro ao famigerado princípio da humanidade da pena,

estatuído na Constituição Federal/88.

A Constituição Federal/88 assegura aos presos “o respeito à

integridade física e moral” (art. 5.º, inciso XLIX), vedando a aplicação de pena de

natureza cruel e degradante (art. 5.º, inciso XLVII, e).

Nesse sentido, destaca, com prioridade, o magistrado

argentino Guillermo Yacobucci citado por Bitencourt207 que “a própria dignidade do

homem determina a existência do ‘princípio pelo qual ninguém pode legalmente

consentir que se lhe aflija um sério dano corporal’“.

Acerca do regime disciplinar diferenciado e sua dissonância em

cotejo ao princípio da humanidade, assinala Bitencourt208:

Na realidade, esse tipo de regime, que constitui verdadeira sanção criminal, promove a destruição moral, física, e psicológica do preso, que, submetido a isolamento prolongado, pode apresentar

206 Ibidem. 207 YACOBUCCI, Guillermo. El sentido de los principios penales, 2002. In: BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 17. 208 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 18.

Page 91: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

90

depressão, desespero, ansiedade, raiva, alucinações, claustrofobia e, a médio prazo, psicoses e distúrbios afetivos profundos irreversíveis.

E mais:

Com efeito, o regime disciplinar diferenciado – instituído pela Lei n. 10.792/2003 – viola o objetivo ressocializador do sentenciado, vigente na sociedade contemporânea desde o Iluminismo. A Lei de Execução Penal (LEP), já em seu primeiro artigo, destaca como objetivo do cumprimento de pena a reintegração social do condenado, que é indissociável da execução da sanção penal. Portanto, qualquer modalidade de cumprimento de pena em que não haja a concomitância dos dois objetivos legais, quais sejam o castigo e a reintegração social, com observância apenas do primeiro, mostra-se ilegal e contrária à Constituição Federal209. (grifos não originais)

Desta feita, Bitencourt210 considera que o regime disciplinar

diferenciado constitui o exemplo mais marcante e mais recente na legislação

brasileira de violação do princípio da humanidade da pena, haja vista que:

[...] representa, na verdade, autêntica vingança social, e tem o castigo como único objetivo, desprezando por completo a recuperação social, primado declarado da pena privativa de liberdade. (grifou-se)

Nada obstante, o regime disciplinar diferenciado fere o

princípio da proporcionalidade. Ora, ainda que o referido regime reja aplicado com o

intuito de manter a ordem e a disciplina no interior dos estabelecimentos penais,

registra-se que o RDD não se resguarda de proporcionalidade.

Neste ínterim, vale trazer a lume uma ponderação feita por

Queiroz e Melhor211 acerca do princípio da proporcionalidade:

Convém notar, todavia, que o princípio da proporcionalidade compreende, além da proibição de excesso, a proibição da intervenção jurídico-penal. Significa dizer que, se por um lado, deve

209 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 18. 210 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 18. 211 QUEIROZ, Paulo; MELHOR, Adeleine. Princípios constitucionais da execução penal. Salvador: Editura Juspodivm, 2006. p. 09.

Page 92: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

91

ser combatida a sanção penal desproporcional porque excessiva, por outro lado, cumpre também evitar a resposta penal que fique muito aquém do seu efetivo merecimento, dado o seu grau de ofensividade e significação político-criminal, afinal a desproporção tanto pode dar-se mais quanto para menos [...]

E nos dizeres de Bitencourt212:

O princípio da proporcionalidade é uma consagração do constitucionalismo moderno (embora já fosse reclamado por Beccaria), sendo recepcionado, como acabamos de referir, pela Constituição Federal brasileira, em vários dispositivos, tais como: exigência da individualização da pena (art. 5.º, XLVI), proibição de determinadas modalidades de sanções penais (art. 5.º, XLII, XLIII e XLIV).

No mesmo sentido, segue o entendimento de Rodrigues citada

por Castilho213 atinente aos preceitos fundamentais:

Anabela M. Rodrigues refere que há direitos fundamentais em que as exigências de regulação da execução não justificam restrições, sob pena de afetar o conteúdo essencial do preceito constitucional que o prevê. Arrola o direito à vida, à integridade física, ao respeito pelos seus bens. Quanto ao segundo, porém, coloca a questão de saber se aplicação de certas medidas gerais ou especiais de segurança ou de certas medidas disciplinares constituem, por si só, uma forma de tratamento desumano e informa que o problema já foi suscitado várias vezes perante a Comissão Européia dos Direitos do Homem, havendo decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem em sentido negativo, embora ressalvando que um prolongado isolamento social pode levar à destruição da personalidade, constituindo, nessa hipótese, tratamento desumano.

Outrossim, é oportuno aclarar que a Declaração dos Direitos do

Homem e do Cidadão, de 1789, já exigia expressamente que se observasse a

proporcionalidade entre a gravidade do crime praticado e a sanção a ser aplicada, in

verbis: “a lei só deve cominar penas estritamente necessárias e proporcionais ao

delito” (art. 15).

212 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 24. 213 RODRIGUES, Anabela Miranda. A posição do recluso na execução da pena privativa de liberdade. Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, 1982. In: CASTILHO, Ela Wiecko V. de. Controle da legalidade na execução penal (reflexões em torno da jurisdicionalização). Porto Alegre: Fabris, 1988. p. 27.

Page 93: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

92

O Estado não deve se converter em autoritário e, para que isto

não ocorra, é salutar o respeito aos limites que garantam uma prevenção exercida

em benefício de todos os cidadãos e sob o controle de todos.

Por conseguinte, o Estado deve proporcionar condições,

mostrar alternativas, não impor nenhuma delas. Escreveu a propósito Bettiol214:

O Estado não pode impor a virtude. Ele apenas pode, ou melhor, deve, criar as condições para o homem poder levar uma vida virtuosa, de modo que o indivíduo – se quiser – possa aproveitar-se dela.

E finalmente, sobre o ponto da proporcionalidade, vale invocar

os dizeres do Ministro Gilmar Mendes215, ex Presidente do Supremo Tribunal

Federal, o qual consigna que a doutrina mais moderna defende que:

[...] em se tratando de imposição de restrições a determinados direitos, deve-se indagar não somente sobre a admissibilidade constitucional da restrição eventualmente fixada, mas também sobre a compatibilidade das restrições estabelecida pelo princípio da proporcionalidade.

Destarte, não há como descurar que o regime disciplinar

diferenciado fere algumas das garantias estatuídas pela Constituição Federal/88 e,

não bastasse isso, as normas do regime tem uma natureza mista, ou seja, possuem

uma fachada de processo penal (execução penal), porém, com um acentuado

caráter de Direito Penal, já que torna mais rigoroso o regime de cumprimento de

pena e, portanto, interfere na liberdade do cidadão216.

E finalmente, para concluir este tópico, é pertinente proceder a

uma análise do regime disciplinar diferenciado e suas hipóteses de cabimento à luz

214 BETTIOL, Giuseppe. O problema penal, 1967. In: CASTILHO, Ela Wiecko V. de. Controle da legalidade na execução penal (reflexões em torno da jurisdicionalização). p. 33. 215 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 127. 216 GOMES, Luiz Flávio; CUNHA, Rogério Sanches; CERQUEIRA, Thales Tácito Pontes Luz de Pádua. O regime disciplinar diferenciado é constitucional? O legislador, o judiciário e a caixa de pandora. Disponível em: <http://www.bu.ufsc.br/ConstitRegimeDisciplinarDifer.pdf>. Acesso em 18 out. 2010.

Page 94: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

93

dos principais Tratados Internacionais ratificados pelo Brasil e que possuam

relevância com o tema.

A Convenção Americana de Direitos Humanos foi adotada e

aberta à assinatura na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos

Humanos, em San José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1969 e ratificada

pelo Brasil em 25 de setembro de 1992.

O art. 5º, itens 1, 2 e 6, assim versam:

Artigo 5º - Direito à integridade pessoal 1. Toda pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral. 2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. [...] 6. As penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados.

Outrossim, cita-se o artigo 11, item 1: “Toda pessoa tem direito

ao respeito da sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade”.

Nesta senda, segue o entendimento esposado nos dispositivos

da Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos

ou Degradantes, que foi adotada pela Resolução 39/46, da Assembléia Geral das

Nações Unidas em 10 de dezembro de 1984 e adotada pelo Brasil em 28 de

setembro de 1989217.

Essa convenção estabelece, em sua maior parte, o

procedimento para combater a tortura. Contudo, o art. 1.º especifica o termo tortura,

in verbis:

Artigo 1º - Para fins da presente Convenção, o termo "tortura" designa qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de

217 SILVA, Fernanda Cintra Lauriano. Análise da In (Constitucionalidade) do Regime Disciplinar Diferenciado. Disponível em: <http://www.lfg.com.br. 21 de junho de 2009>. Acesso em: 18 out. 2010.

Page 95: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

94

obter, dela ou de terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou terceira pessoa tenha cometido ou suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam conseqüência unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas decorram

Enaltece-se, ainda, neste estudo, a Declaração Americana de

Deveres e Direitos do Homem, proclamada pelas Nações Unidas em 10 de

dezembro de 1948. Os artigos que merecem destaque e, por conseguinte, se

coadunam como o tema, são os artigos 1.º, XVIII e XXVI, os quais preconizam218:

Artigo I. Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança de sua pessoa. [...] Artigo XVIII. Toda pessoa pode recorrer aos tribunais para fazer respeitar os seus direitos. Deve poder contar, outrossim, com processo simples e breve, mediante o qual a justiça a proteja contra atos de autoridade que violem, em seu prejuízo, qualquer dos direitos fundamentais consagrados constitucionalmente. [...] Artigo XXVI. Parte-se do princípio de que todo acusado é inocente, até provar-se-lhe a culpabilidade. Toda pessoa acusada de um delito tem direito de ser ouvida em uma forma imparcial e pública, de ser julgada por tribunais já estabelecidos de acordo com leis preexistentes, e de que se lhe não inflijam penas cruéis, infamantes ou inusitadas.

Cumpre registrar, também, que nos termos do art. 5.º, § 3º, da

Constituição Federal/88:

Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

Desta feita, a partir da observância dos dispositivos legais

supramencionados, perfaz-se que o regime disciplinar diferenciado não vai de

218 SILVA, Fernanda Cintra Lauriano. Análise da In (Constitucionalidade) do Regime Disciplinar Diferenciado. Disponível em: <http://www.lfg.com.br. 21 de junho de 2009>. Acesso em: 18 out. 2010.

Page 96: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

95

encontro apenas às garantias fundamentais sedimentadas na Constituição

Federal/88, mas também em relação aos tratados internacionais aqui referidos.

3.4.1 Principais julgados sobre o Regime Disciplinar Diferenciado

Ante a enorme polêmica ocasionada pela adoção do regime

disciplinar diferenciado na Lei de Execução Penal – LEP, alguns dos tribunais

brasileiros firmaram entendimentos no teor de seus acórdãos.

O Superior Tribunal de Justiça219, ainda que em poucas

oportunidades, diga-se, já se manifestou sobre o tema, onde decidiu pela

constitucionalidade do regime. Eis um dos julgados:

EMENTA - HABEAS CORPUS. REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO. ART. 52 DA LEP. CONSTITUCIONALIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. NULIDADE DO PROCEDIMENTO ESPECIAL. REEXAME DE PROVAS. IMPROPRIEDADE DO WRIT. NULIDADE DA SENTENÇA CONDENATÓRIA NÃO RECONHECIDA. 1. Considerando-se que os princípios fundamentais consagrados na Carta Magna não são ilimitados (princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas), vislumbra-se que o legislador, ao instituir o Regime Disciplinar Diferenciado, atendeu ao princípio da proporcionalidade. 2. Legitima a atuação estatal, tendo em vista que a Lei n. 10.792 /2003, que alterou a redação do art. 52 da LEP, busca dar efetividade à crescente necessidade de segurança nos estabelecimentos penais, bem como resguardar a ordem pública, que vem sendo ameaçada por criminosos que, mesmo encarcerados, continuam comandando ou integrando facções criminosas que atuam no interior do sistema prisional - liderando rebeliões que não raro culminam com fugas e mortes de reféns, agentes penitenciários e/ou outros detentos - e, também, no meio social [...] Ordem denegada. (grifou-se)

Portanto, como bem denota-se, o Egrégio Superior Tribunal de

Justiça encara o RDD como uma medida necessária dentro dos estabelecimentos

penais. Entende a referida Corte que o Regime Disciplinar Diferenciado obedece ao

princípio da proporcionalidade.

219 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. “Habeas Corpus” n. 40300 – RJ, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DF, 7 de junho de 2005. Fonte: DJ 22/08/2005 p. 312. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=regime+disciplinar+diferenciado&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=14>. Acesso em: 21 out. 2010.

Page 97: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

96

De outra banda, é oportuno colacionar um julgado proferido

pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo220, que chegou a discordar do

entendimento emanado do STJ, considerando que o regime disciplinar diferenciado

abandonava o intuito de ressocialização/correção do detendo, caracterizando-o

inconstitucional. Veja-se:

O chamado RDD (regime disciplinar diferenciado), é uma aberração jurídica que demonstra à sociedade como o legislador ordinário, no afã de tentar equacionar o problema do crime organizado, deixou de contemplar os mais simples princípios constitucionais em vigor [...] Independentemente de se tratar de uma política criminológica voltada apenas para o castigo, e que abandona os conceitos de ressocialização ou correção do detento, para adotar medidas estigmatizantes e inocuizadoras próprias do Direito Penal do Inimigo, o referido regime disciplinar diferenciado ofende inúmeros preceitos constitucionais. E continua o insigne Magistrado, "trata-se de uma determinação desumana e degradante (art. 5º , III , da CF), cruel (art. 5º , XLVII , da CF), o que faz ofender a dignidade humana (art. 1º , III , da CF). [...] O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, ao entender como inconstitucional o citado regime disciplinar, ainda deixou evidente que a medida é desnecessária para a garantia da segurança dos estabelecimentos penitenciários nacionais e dos que ali trabalham, circulam e estão custodiados, a teor do que já prevê a Lei 7.210 /84”. (grifou-se)

Contudo, em que pese o julgado supra transcrito, num de seus

acórdãos mais recentes, proferido nos autos de um Agravo em Execução, o Tribunal

de Justiça do Estado de São Paulo221 entendeu pela constitucionalidade do RDD.

Veja-se:

Esse regime constitui modalidade de sanção disciplinar, bastando, nos termos do artigo 52, caput, da LEP, a prática de crime doloso que "ocasione subversão da ordem ou disciplina internas". Isola-se o sentenciado, mantendo-o incomunicável com os demais prisioneiros, impedindo, desse modo, o nascimento de novas rebeliões. Caracteriza-se por seu rigor, eis que submete o detento a recolhimento em cela individual pelo prazo máximo de 360 dias, sem prejuízo de nova imposição por nova falta grave da mesma espécie,

220 BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. “Habeas Corpus” n. 978.305.3/0-00, Rel. Desembargador Borges Pereira, SP, 29 de agosto de 2006. Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=2313022&vlCaptcha=pTktA>. Acesso em: 21 out. 2010. 221 BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Execução Penal n. 990.08.077146-9, Rel. Desembargador Almeida Toledo, SP, 31 de março de 2009. Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=3628525>. Acesso em 21 out. 2010.

Page 98: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

97

até o limite de um sexto da pena aplicada. São permitidas visitas semanais de duas pessoas adultas, não computadas nesse limite as crianças, com duração de duas horas, assim como duas horas diárias de banho de sol (art. 52, incisos I a IV, da LEP). Essa rigidez ou maior severidade passa longe de medida cruel, degradante ou desumana. Constitui, na verdade, providência que se justifica para impedir novos ataques à ordem e à disciplina internas, tutelando, inclusive, a integridade física dos agentes penitenciários. Consoante bem anotou o ilustre Procurador de Justiça oficiante, "o regime disciplinar diferenciado obedece a todos os requisitos legais, inclusive aos de gênero internacional, não havendo que se falar em violação do direito fundamental de cumprimento de pena com dignidade. Todos os direitos constitucionais são assegurados aos presos que estão em RDD, a única diferença com os demais é a ausência de contato com os demais detentos, sem óbice algum ao recebimento de visita, banho de sol, recebimento de correspondência, entre outros direitos”. (grifou-se)

Finalmente, atinente ao Supremo Tribunal Federal, convém

registrar que este ainda não se posicionou sobre a (in) constitucionalidade do

Regime Disciplinar Diferenciado, nem mesmo de forma indireta, diga-se.

Desta feita, considerando todo o esposado acerca do RDD, é

possível concluir que, a priori, o legislador e os operadores do Direito estão se

socorrendo a um meio ineficaz de combate à criminalidade, que traduz, tão somente,

um desejo atávido da sociedade pela vingança social.

Considera-se ainda, que o regime disciplinar diferenciado

representa, atualmente, a mais drástica sanção disciplinar, haja vista que contempla

características que visam tão somente maximizar a pena como forma de castigo.

3.5 ABOLICIONISMO PENAL – A ANTÍTESE DO DIREITO PENAL MÁXIMO

Esse movimento prega o desaparecimento do sistema penal e

visa sua substituição por modelos alternativos de solução de conflitos. O

abolicionismo penal tem como expoentes Thomas Mathiesen, Louk Hulsman e Nils

Christie.

Page 99: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

98

Hulsman, um dos maiores destaques do movimento, citado por

Zaffaroni222, para explicar a o abolicionismo:

Parte de uma série de fatos inquestionáveis, tais como a de ser a resposta punitiva somente uma forma de resolver conflitos sociais, que o sistema penal opera criminalizando ao acaso, que trabalha compartimentalizadamente etc, para chegar a conclusão de que a justiça penal, em sua forma atual, poderia ser suprimida com grande vantagem, sendo substituída pelas restantes alternativas que permitem a solução de conflitos: a reparação, a conciliação etc.

De maneira simplificada, outros motivos pelos quais se justifica,

para os abolicionistas, a eliminação do sistema penal: a) a pena de prisão não

cumpre com suas finalidades (reprovação e prevenção); b) grande parte das

condutas tidas como criminosas podem ser solucionadas por outros ramos do

direito; c) a “cifra negra” que corresponde às infrações penais que não foram objeto

de persecução penal pelo Estado; d) a natureza seletiva do Direito Penal, etc223.

Ao proceder uma análise do pensamento de Hulsman,

Zaffaroni224 concorda que existe possibilidade de reduzir a repressividade do

sistema penal, e, “[...] quanto ao mais, cremos que carece fundamento imaginar a

viabilidade abstrata de resolução dos conflitos sociais por uma via não punitiva”.

Outrossim, Zaffaroni225 critica o movimento abolicionista por

não situar a problemática na história e, nada obstante, é incisivo ao afirmar que o

direito penal “[...] é só uma forma de controle social institucionalizado e, como é

lógico, o controle social não desaparecerá, porque não desaparecerá a estrutura de

poder dentro da sociedade.

222 ZAFFARONI. Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 339-340. 223 GRECO, Rogério. Direito penal do equilíbrio: uma visão minimalista do direito penal. Niterói: Impetus, 2005, p.11. 224 ZAFFARONI. Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. p. 340. 225 ZAFFARONI. Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. p. 340.

Page 100: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

99

A tese abolicionista radical, de acordo com Gomes226, o qual

sustenta que “a pena e o próprio Direito Penal possuem efeitos mais negativos que

positivos”. Advoga, por isso, pela sua eliminação.

Marchi Junior citado por Prado227, afirma que:

O abolicionismo surgiu a partir da percepção de que o sistema penal, que havia significado um enorme avanço da humanidade contra a ignomínia das torturas e contra a pena de morte, cujos rituais macabros encontram-se retratados na insuperável obra de Michel Foucault, perdeu sua legitimidade como instrumento de controle social.

De outro norte, em que pese a brilhante teoria defendida pelo

movimento abolicionista, este, ao denunciar essa perda de legitimidade, não

conseguiu propor um método seguro para possibilitar a abolição imediata do sistema

penal.

Crêem os abolicionistas somente ser possível a abolição do

sistema penal em uma sociedade diferente, mais igualitária, o que está longe de se

concretizar na atualidade, entretanto, para se chegar a este estágio, elege-se o

Minimalismo com um dos caminhos228.

Não há como descurar que o abolicionismo apresenta um

grande valor de cunho humanitário, todavia, diante de determinados acontecimentos

que assolam a vida cotidiana é impossível não se socorrer ao Direito Penal. Ora, a

violência urbana que se instalou nas sociedades contemporâneas, gerando altos

índices de criminalidade, não pode ser solucionada, nesses casos, por outros ramos

do Direito.

226 GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Os novos juizados especiais criminais. São Paulo: WWC Editora, 1996. p. 481. 227 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral. 3 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. vol. 1, 2002. p. 15. 228 ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal. Trad. de Vania Romano Pedrosa e Amir Lopes da Conceição. Rio de Janeiro: Revan, 1991. p. 106.

Page 101: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

100

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa teve como objeto o estudo da eficácia da

pena privativa de liberdade sob o enfoque de sua finalidade retributiva, isto é, o

trabalho buscava entender se o castigo imposto ao apenado pela prática de uma

infração penal pode ser considerado eficaz.

Não se pode deixar de considerar o grave momento vivido

pelas instituições públicas, fruto de dezenas de anos de descaso para com as

causas sociais, ocasionando o surgimento de um Estado paralelo, onde as

instituições públicas estão em total falência, e dentre elas, por óbvio, o sistema

prisional.

A busca pela confirmação ou não das hipóteses mencionadas

na introdução da presente monografia, serviu de base para direcionar o estudo e,

por conseguinte, viabilizar a divisão em segmentos, que são representados por três

capítulos.

No primeiro capítulo, trouxe-se um apanhado histórico da pena,

com ênfase no estudo de sua mais remota origem, bem como o seu

desenvolvimento desde a antiguidade até os dias atuais. Além disso, discorreu-se

sobre o conceito de pena. Outrossim, discorreu-se sobre as Escolas Penais que

marcaram época e também teceu-se um breve panorama histórico do Direito Penal

no Brasil, que fez menção do Código Criminal do Império de 1830 até a edição da

famigerada Lei de Execução Penal em 1984.

No segundo capítulo, a pesquisa fora direcionada aos aspectos

da pena privativa de liberdade no ordenamento jurídico brasileiro, oportunidade na

qual também abordou-se acerca das duas outras modalidades de penas existentes

no Código Penal, quais sejam, restritiva de direitos e multa. Ainda no referido

capítulo, tratou-se dos aspectos norteadores de cada regime prisional, bem como

explanou-se sobre as teorias que apontam as finalidades da pena.

No terceiro capítulo, por fim, trata-se da ineficácia da finalidade

retributiva da pena face o instituto da reincidência, oportunidade na qual são

Page 102: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

101

abordados os movimentos de políticas criminais e até mesmo práticas legais que

visam maximizar o castigo do preso, como é o caso do RDD – Regime Disciplinar

Diferenciado, do Direito Penal do Inimigo (ou inimigos do Direito Penal), também sua

antítese – o Abolicionismo Penal, a fim de elucidar se a adoção desses, por si só, é

necessária para se garantir a plena eficácia da pena privativa de liberdade.

Outrossim fez um apanhado dos principais dados estatísticos que são extraídos do

sistema carcerário do Estado de Santa Catarina , tendo como referência o mês de

junho de 2010, a partir das noções da criminologia e da política criminal.

No tocante às hipóteses levantadas no início da pesquisa e que

serviram de base para o desenvolvimento do trabalho, restaram devidamente

comprovadas, como verificar-se-á a seguir:

Hipótese 1: Comprovou-se que a função retributiva da pena

privativa de liberdade é ainda caracterizada como um meio de defesa social. É

cediço que o século XIX foi marcado pela existência de um controle social e moral

sobre os indivíduos. Um grande número de instituições nasceu sob o modelo deste

paradigma, do qual a prisão é o melhor exemplo. A prisão exsurge como eixo

principal do esquema de punições dos sistemas penais, pois visa retirar o criminoso

do meio social para manter um convívio harmônico na sociedade.

Hipótese 2: Umas das finalidades da pena, de cunho

eminentemente retributivo, deve proporcionar o restabelecimento da ordem violada

pelo delito, por isso deve adequar a justa punição ao mal praticado pelo delinqüente.

Contudo, não é suficiente para restabelecer a ordem social, visto que alguns

criminosos figuram como reincidentes, circunstância esta que não implica no

restabelecimento da ordem social.

Hipótese 3: Comprovou-se que a ineficácia e o fracasso da

pena privativa de liberdade não são os únicos fatores a resultar na reincidência.

Uma série de outros fatores pode contribuir para que o apenado volte a cometer

novos crimes depois de cumprir uma reprimenda. A reincidência pode surgir a partir

de um resultado atribuível aos acontecimentos posteriores à libertação do interno.

Ademais, nada obstante, não há como descurar que a marginalização é inerente ao

homem.

Page 103: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

102

Page 104: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

103

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A ilusão de segurança jurídica: do controle da violência à violência do controle penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado,1997.

ADREUCCI, Ricardo Antunes. O direito penal como justo. Revista dos Tribunais, n. 551, 1981, p. 296.

ANÍBAL, Bruno. Direito penal: parte geral: introdução, norma penal, fato punível. 3 ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 1978.

BARROS, Flavio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral. 4. ed. rev. e. atual. São Paulo: Saraiva, 2004.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Traduzido por: Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2006.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 11. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007. v. I.

BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Execução Penal n. 990.08.077146-9, Rel. Desembargador Almeida Toledo, SP, 31 de março de 2009. Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=3628525>. Acesso em 21 out. 2010.

BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. “Habeas Corpus” n. 978.305.3/0-00, Rel. Desembargador Borges Pereira, SP, 29 de agosto de 2006. Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=2313022&vlCaptcha=pTktA>. Acesso em: 21 out. 2010.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. “Habeas Corpus” n. 40300 – RJ, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DF, 7 de junho de 2005. Fonte: DJ 22/08/2005 p. 312. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=regime+disciplinar+diferenciado&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=14>. Acesso em: 21 out. 2010.

CAFFARENA, Borja Mapelli. Sistema progressivo y tratamiento. Lecciones de derecho penitenciario. Madrid, 1989.

Page 105: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

104

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. I.

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral: (arts. 1º a 120). 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v. I.

CARRARA, Francesco. Programa de derecho criminal. Tradução: Ortega Torres. Bogotá: Temis, 1971. v. I.

CASTILHO, Ela Wiecko V. de. Controle da legalidade na execução penal (reflexões em torno da jurisdicionalização). Porto Alegre: Fabris, 1988.

DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

FELLIPE, Donaldo J. Dicionário de expressões latinas: termos e expressões em latim, com a versão para o português. 5. ed. Campinas: Julex, 1991.

FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia integrada. 2. ed. rev., atual. e. ampl. São Paulo: Saraiva, Revista dos Tribunais, 2002

FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: Teoria do Garantismo Penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Tradução: Raquel Ramalhete. 31. ed. Petrópolis: Vozes, 2006.

FRAGOSO, Heleno. Lições de direito penal: parte geral. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994.

GOMES, Luiz Flávio; CUNHA, Rogério Sanches; CERQUEIRA, Thales Tácito Pontes Luz de Pádua. O regime disciplinar diferenciado é constitucional? O legislador, o judiciário e a caixa de pandora. Disponível em: <http://www.bu.ufsc.br/ConstitRegimeDisciplinarDifer.pdf>. Acesso em 18 out. 2010.

GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Os novos juizados especiais criminais. São Paulo: WWC Editora, 1996.

GRECO, Rogério. Direito penal do equilíbrio: uma visão minimalista do direito penal. Niterói: Impetus, 2005.

JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. Direito Penal do Inimigo: noções e críticas.Tradução de André Luis Callegari e Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.

JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1995. v. I.

Page 106: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

105

LEAL, João José. Direito Penal Geral. Florianópolis: OAB Editora, 2004.

LYRA, Roberto. Comentários ao código penal. Rio de Janeiro: Forense, 1942.

MARCÃO, Renato. Curso de execução penal. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. Campinas: Bookseller, 1997. v. I.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 23. ed. revista e atualizada. São Paulo: Atlas, 2005.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984. 11. ed. revista e atualizada. São Paulo: Atlas, 2008.

NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. Direito Administrativo da Ordem Pública. 3. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1998.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. 3. ed. rev. atual. e. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

NORONHA, E. Magalhães. Direito penal: introdução e parte geral. 37. ed. Atualizado Adalberto José Q.T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2003.

OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. 2. ed. revista e ampliada. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1996.

PASSOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 7. ed. Florianópolis: OAB/SC, 2002.

PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica e metodologia da pesquisa jurídica. 10. ed. Florianópolis: OAB/SC editora, 2007.

PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral. 3 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. v.I.

QUEIROZ, Paulo Queiroz; MELHOR, Adeleine. Princípios constitucionais da execução penal. Salvador: Editora Juspodivm, 2006.

ROXIN, Claus. Problemas fundamentais de direito penal. Coimbra: Ed. Veja Universidade, 1986.

Page 107: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

106

SÁNCHEZ, Jesus Maria Silva. A expansão do direito penal: aspectos da política criminal nas sociedades pós industriais. Tradução de Luiz Otavio de Oliveira Rocha. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

SHECAIRA, Sérgio Salomão. Teoria da Pena. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

SILVA, Fernanda Cintra Lauriano. Análise da In (Constitucionalidade) do Regime Disciplinar Diferenciado. Disponível em: <http://www.lfg.com.br. 21 de junho de 2009>. Acesso em: 18 out. 2010.

SOUZA, Luís Antônio Francisco de. Polícia e Policiamento no Brasil: Mudanças Recentes e Tendências Futuras. Boletim IBCCRIM - nº 113, 2002.

SPARKS, Richard; HOOD, Roger. Problemas clave en criminología. Espanha: Ed. Guadarama, 1970.

TELES, Ney Moura. Direito Penal: parte geral: arts. 1º a 120. São Paulo: Atlas, 2004.

WELZEL, Han. Derecho penal alemã. Tradução: Juan Bustos Ramirez e Sergio Yáñez Pérez. Santiago: Ed. Jurídica de Chile, 1970.

ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal. Trad. de Vania Romano Pedrosa e Amir Lopes da Conceição. Rio de Janeiro: Revan, 1991.

ZAFFARONI. Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo no direito penal. Tradução de Sérgio Lamarão. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007.

Page 108: EFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SOB O ENFOQUE DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Cynthia Bernardino.pdf · É a medida de ordem legal, aplicável ao autor de uma infração penal,

107

ANEXOS