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DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado . São Paulo: Saraiva, 1995. RESENHA Autor: Túlio Silva Sene CAPÍTULO I DA SOCIEDADE O antecedente mais remoto da afirmação de que o homem é um ser social por natureza vem de Aristóteles, no séc. IV a.C., que dizia que “o homem é naturalmente um animal político” 1 . Na mesma ordem de idéia, e por influência de Aristóteles, Cícero, em Roma, no séc. I a.C, disse que “a primeira causa de agregação de uns homens a outros é menos a sua debilidade do que um certo instinto de sociabilidade em todos inato; a espécie humana não nasceu para o isolamento e para a vida errante, mas com uma disposição que, mesmo na abundância de todos os bens, a leva a procurar o apoio comum” 2 . Entre os autores medievais, Santo Tomás de Aquino, o mais expressivo seguidor dessa corrente, afirma que o “o homem é, por natureza, animal social e político, vivendo em multidão, ainda mais que todos os animais, o que se evidencia pela natural necessidade” 3 . Para ele, a vida solitária é uma exceção e, neste caso, é resultado ou de excellentia naturae (indivíduo virtuoso em comunhão com Deus), ou de corruptio naturae (anomalia mental) ou mala fortuna (por acidente). Modernamente muitos autores se filiam a essa corrente de pensamento, estando entre eles o notável Ranelletti, que acredita que o homem é induzido fundamentalmente por uma necessidade natural, porque a associação com outros homens é condição essencial de vida. Opondo-se aos adeptos do fundamento natural da sociedade, encontram-se muitos autores, geralmente classificados como contratualistas. Muitos deles tendem a 1 ARISTÓTELES, A Política. 2 CÍCERO, Da República. 3 SANTO TOMÁS DE AQUINO, Summa Theologica.

Elementos de Teoria Geral Do Estado - Fichamento

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DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 1995.

RESENHAAutor: Túlio Silva Sene

CAPÍTULO IDA SOCIEDADE

O antecedente mais remoto da afirmação de que o homem é um ser social por natureza vem de Aristóteles, no séc. IV a.C., que dizia que “o homem é naturalmente um animal político”1. Na mesma ordem de idéia, e por influência de Aristóteles, Cícero, em Roma, no séc. I a.C, disse que “a primeira causa de agregação de uns homens a outros é menos a sua debilidade do que um certo instinto de sociabilidade em todos inato; a espécie humana não nasceu para o isolamento e para a vida errante, mas com uma disposição que, mesmo na abundância de todos os bens, a leva a procurar o apoio comum”2. Entre os autores medievais, Santo Tomás de Aquino, o mais expressivo seguidor dessa corrente, afirma que o “o homem é, por natureza, animal social e político, vivendo em multidão, ainda mais que todos os animais, o que se evidencia pela natural necessidade”3. Para ele, a vida solitária é uma exceção e, neste caso, é resultado ou de excellentia naturae (indivíduo virtuoso em comunhão com Deus), ou de corruptio naturae (anomalia mental) ou mala fortuna (por acidente). Modernamente muitos autores se filiam a essa corrente de pensamento, estando entre eles o notável Ranelletti, que acredita que o homem é induzido fundamentalmente por uma necessidade natural, porque a associação com outros homens é condição essencial de vida.

Opondo-se aos adeptos do fundamento natural da sociedade, encontram-se muitos autores, geralmente classificados como contratualistas. Muitos deles tendem a ver seu mais remoto influenciador como Platão, em “A República”. Lá Platão faz menção a uma organização social racionalmente construída sem uma necessidade natural. No séc. XVI se baseariam nisso alguns utopistas como Thomas More, em “Utopia” e Tommaso Campanella, em “A Cidade do Sol”. Essa idéia aparecerá mais claramente com Thomas Hobbes, no “Leviatã”, de 1651. Em oposição a Hobbes, Montesquieu, em sua obra “Do Espírito das Leis”, afirma existir leis naturais que levam o homem a escolher a vida em sociedade. No entanto, Montesquieu não chega a mencionar expressamente o contrato social, passando à apreciação das leis do governo, sem fazê-las derivar de um pacto inicial. Quem retoma a apreciação de Hobbes, explicando a existência e a organização da sociedade a partir de um contrato social foi Rousseau, em “O Contrato Social”. Nesta obra ele afirma o povo como soberano no reconhecimento da igualdade como um dos objetivos fundamentais da sociedade, bem como na consciência de que 1 ARISTÓTELES, A Política.2 CÍCERO, Da República.3 SANTO TOMÁS DE AQUINO, Summa Theologica.

existem interesses coletivos distintos dos interesses de cada membro da coletividade. Neste instante o ato de associação produz um corpo moral e coletivo que é o Estado, que tem por finalidade propiciar a liberdade e igualdade através das leis.

Conclui-se, de toda maneira, que o homem não pode ser concebido como um ser isolado, devendo ser sempre considerado como homem social. Desta forma, para que um agrupamento social possa ser considerado como uma sociedade, ele deve apresentar as seguintes características:

a) uma finalidade ou valor social;b) manifestações de conjunto ordenadas;c) o poder social.A finalidade deve ser algo considerado por todos, daí temos que a

finalidade deve ser um bem comum. Esse bem comum não se refere a uma espécie particular de bens e sim a um conjunto de condições que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana. Isso quer dizer que uma sociedade deve ter por finalidade a criação de condições que permitam a cada homem a consecução de seus respectivos fins particulares.

Entretanto, não basta que um agrupamento humano tenha uma finalidade comum, seus componentes devem se manifestar em conjunto, visando aquele fim. Essas manifestações em conjunto devem, no entanto, atender a três requisitos: reiteração, ordem e adequação. Primeiro, os membros da sociedade devem se manifestar em conjunto de forma reiterada, pois só assim o todo social terá condições de atingir seus objetivos. Os atos praticados isoladamente devem ser conjugados e integrados num todo harmônico, se fazendo assim necessária uma ordem. O que se verifica, em resumo, é que manifestações de conjunto se produzem numa ordem, para que a sociedade possa atuar em função do bem comum. Essa ordem, regida por leis sujeitas ao princípio da imputação (se “A” é – “B” deve ser), não exclui a vontade e a liberdade dos indivíduos. Cada grupo humano deve sempre ter em conta a adequação às exigências e possibilidades da realidade social para que suas ações se conduzam no sentido efetivo do bem comum.

Para se falar em poder, deve-se ter em mente, a princípio, que ele é um fenômeno social e bilateral, sendo sempre uma correlação de duas ou mais vontades. Há, no entanto, aqueles que não acreditam na necessidade do poder social. São conhecidos sob a designação genérica de anarquistas. Verificando-se as configurações atuais do poder e seus métodos de atuação, chega-se à seguinte síntese:

a) o poder, reconhecido como necessário, necessita de legitimidade, que se obtém através do consentimento dos que a ele se submetem;

b) embora o poder não chegue a ser puramente jurídico, ele age concomitante com o direito;

c) há um processo de objetivação, que dá preferência à vontade objetiva dos governados ou da lei, desaparecendo a característica de poder pessoal;

d) desenvolveu-se uma técnica do poder que o torna despersonalizado.Considerando a finalidade, podemos separar dois tipos de sociedade:

uma de fins particulares e outra de fins gerais. Essa última visa a criar as condições necessárias para que os indivíduos e as demais sociedades que nela se integram consigam atingir seus fins particulares. A participação nestas sociedades quase sempre independe de um ato de vontade. As sociedades de fins gerais são comumente denominadas de sociedades políticas. Existem

muitas espécies de sociedades políticas, como a família, clãs e tribos. A sociedade política de maior importância, por sua capacidade de influir e condicionar, bem como por sua amplitude, é o Estado. Chegamos, portanto, à primeira noção de Estado: é uma sociedade política.

CAPÍTULO IIDO ESTADO

Sob o ponto de vista da época do aparecimento do Estado, as inúmeras teorias existentes podem ser reduzidas a três posições fundamentais:

a) os que acreditam que o Estado, assim como a própria sociedade, sempre existiu, porque desde que o homem vive sobre a Terra acha-se integrado numa organização social, dotada de poder e com autoridade para determinar o comportamento de todo o grupo;

b) os que acreditam que a sociedade existiu por um determinado período sem Estado e, depois, por diversos motivos, ele foi constituído para atender as necessidades dos grupos sociais. Para estes autores, o surgimento dos diferentes Estados não foi concomitante, aparecendo de acordo com as condições concretas de cada lugar;

c) os que acreditam que o conceito de Estado não tem uma aplicação geral, sendo este possuidor de características muito bem definidas. Para estes autores, o Estado surge apenas com o nascimento da idéia e da prática da soberania. Balladore Pallieri indica, com absoluta precisão, o ano de nascimento do Estado, 1648, o ano em que foi assinada a paz de Westfália.

Examinando as teorias que pretendem explicar a formação originária do Estado, podemos dividir dois grupos:

a) teorias que acreditam numa formação natural ou espontânea, que poderia ser:

→ Origem familial ou patriarcal (Robert Filmer);→ Origem em atos de força, de violência ou de conquista

(Oppenheimer);→ Origem em causas patrimoniais ou econômicas (Marx e Engels);→ Origem no desenvolvimento interno da sociedade (Robert Lowie).

b) teorias que sustentam a formação contratual do Estado, apresentando em comum, apesar de também divergirem entre si quanto às causas, a crença em que foi a vontade de alguns homens, ou de todos, que levou à sua criação.

Há dois processos típicos opostos, ambos utilizados na atualidade, que dão origem a novos Estados: o fracionamento e a união de Estados. Tem-se o fracionamento, quando uma parte do território de um Estado se desmembra e passa a constituir um novo Estado. E tem-se a união, quando dois ou mais Estados resolvem unir-se. Por último, há também o surgimento de Estados por processos atípicos e imprevisíveis, como, por exemplo, o surgimento do Estado do Vaticano e o Estado de Israel.

Quanto à evolução do Estado, temos as seguintes classificações:ESTADO ANTIGO – Caracterizado por uma natureza unitária e religiosa,

também chamado de Estado teocrático;ESTADO GREGO – Caracterizado fundamentalmente pela cidade-

Estado, a polis. Há uma elite que compõe a classe política com poder de decisão acerca dos assuntos de caráter público. Mesmo quando o governo era tido como democrático, ele era movido por uma faixa restrita da população, apenas os considerados cidadãos;

ESTADO ROMANO – Caracterizado por uma base familiar da organização. Assim como o Estado grego, ele também tinha as cidades-Estado como base. O domínio de uma grande extensão territorial e, sobretudo, o cristianismo iriam determinar a superação da cidade-Estado, promovendo o advento de novas formas de sociedade política, englobadas no conceito de Estado Medieval;

ESTADO MEDIEVAL – Caracterizado pelos três principais elementos que se fizeram presentes na sociedade política medieval, o cristianismo, as invasões bárbaras e o feudalismo. Conjugados estes três elementos, percebe-se que o Estado era mais uma aspiração do que uma realidade: um poder superior exercido pelo imperador, com uma infinita pluralidade de poderes menores, sem hierarquia definida; uma incontável multiplicidade de ordens jurídicas, como a ordem imperial, a ordem eclesiástica, o direito das monarquias inferiores, um direito comunal, as ordenações dos feudos e as regras estabelecidas no fim da Idade Média pelas corporações de ofício.

ESTADO MODERNO – A aspiração à antiga unidade do Estado Romano, jamais conseguida pelo Estado Medieval, iria crescer de intensidade em conseqüência da nova distribuição das terras. Os tratados de paz de Westfália tiveram o caráter de documentação da existência de um novo tipo de Estado, com característica básica de unidade territorial dotada de um poder soberano. Era já o Estado Moderno.

Partimos agora para a busca da noção de soberania, não existente no mundo antigo pela falta de oposição entre o poder do Estado e outros poderes. Até o século XII, a situação continua mal definida, aparecendo referências a duas soberanias concomitantes: uma senhorial e outra real. Já no século XIII, o monarca vai ampliando a esfera de sua competência exclusiva, afirmando-se soberano de todo reino, acima de todos os barões, adquirindo o poder supremo de justiça e de polícia, acabando por conquistar o poder legislativo. Assim é que o conceito de soberano, inicialmente relativo, pois se afirmava que os barões eram soberanos em seu senhorio e o rei era soberano em todo o reino, vai adquirindo o caráter absoluto como poder supremo.

A primeira obra teórica a desenvolver o conceito de soberania foi “Les Six Livres de la République”, de Jean Bodin, de 1576. Para ele a soberania é o poder absoluto e perpétuo de uma república, palavra que se usa tanto em relação aos particulares quanto em relação aos que manipulam todos os negócios de estado de uma república. Como se vê, a expressão república equivale ao moderno significado de Estado. Quase dois séculos depois, no ano de 1762, Rousseau publicaria “O Contrato Social”, dando grande ênfase ao conceito de soberania e já transferindo sua titularidade da pessoa do governante para o povo. Para ele, a soberania é inalienável e indivisível.

Quanto às características da soberania, praticamente a totalidade dos estudiosos a considera:

→ una: não é concebível mais de um poder superior no mesmo âmbito;

→ indivisível: se aplica à universalidade dos fatos, sendo inadmissível a existência de várias partes separadas da mesma soberania;

→ inalienável: aquele que a detém desaparece, se ficar sem ela;→ imprescritível: jamais seria verdadeiramente superior, se tivesse

prazo de duração.

A essas características Zanzucchi ainda acrescenta que ela é:

→ originária: porque nasce junto com o Estado;→ exclusiva: porque só o Estado a possui;→ incondicional: só encontra limites postos pelo próprio Estado;→ coativa: porque o Estado não só ordena, mas também dispõe de

meios para fazer cumprir suas ordens coativamente.

A isso tudo Duguit acrescenta que a soberania é um poder de vontade comandante e de vontade independente. Sua preocupação com isso se dirige ao âmbito externo do Estado, pois, segundo ele, o poder soberano não admite que qualquer convenção internacional seja obrigatória para o Estado, o que torna inviável e existência de um direito internacional.

Outro aspecto importante a ser considerado é o que se relaciona com a justificação e a titularidade da soberania. Neste caso, podem-se distinguir dois grupos:

a) Teorias teocráticas: a soberania se justifica por Deus e o titular do poder é o monarca.

b) Teorias democráticas: a soberania se justifica por ser originada do povo e o titular é o Estado.

Finalmente, quanto ao objeto e à significação da soberania, verifica-se que o poder soberano se exerce sobre o povo e significa que, dentro dos limites territoriais, tal poder é superior a todos os demais. E com relação aos outros Estados, a afirmação de soberania tem significação de independência.

Em relação ao Território, podemos estabelecer as seguintes conclusões de caráter geral:

a) não existe Estado sem território;b) o território estabelece o limite da ação soberana do Estado;c) além de ser elemento constitutivo necessário, o território, sendo

âmbito de ação soberana do Estado, é objeto de direitos deste.

É importante se fazer um estudo sobre os limites dos territórios sobre o mar e sobre o espaço aéreo. Como não há um órgão internacional competente para decidir sobre os limites do mar territorial, ou sua extensão, isso tem sido feito por meio de tratados ou atos unilaterais dos Estados. O Brasil faz parte de um acordo de fixação de limites que engloba até 200 milhas da costa. Situação análoga se dá com relação ao espaço aéreo, pois, com o desenvolvimento da aeronáutica e das conquistas espaciais, a ONU tenta promover entendimentos sobre a matéria. Em 1966 foi aprovado um Tratado do Espaço Exterior pelo qual, entre outras coisas, se nega a qualquer Estado a possibilidade de ele se

apossar, no todo ou em parte, do espaço ultra-terrestre, inclusive da Lua ou de qualquer outro satélite ou planeta.

Em relação ao povo, deve-se compreendê-lo como o conjunto dos indivíduos que, através de um momento jurídico, se unem para constituir o Estado, estabelecendo com este um vínculo jurídico de caráter permanente, com participação na formação da vontade do Estado e no exercício do poder soberano. Todos estes adquirem a condição de cidadãos, podendo-se, assim, conceituar o povo como conjunto dos cidadãos do Estado.

A finalidade do Estado é buscar o bem comum de um certo povo, situado em determinado território. Assim, pois, o desenvolvimento integral da personalidade dos integrantes desse povo é que deve ser o objetivo do Estado, o que determina uma concepção particular de bem comum para cada Estado, em função das peculiaridades de cada povo. O verdadeiro sentido de poder ou dominação estatal não é o de que uns homens estão submetidos a outros, mas sim o de que todos os homens estão submetidos às normas. O minucioso exame das características do poder do Estado, de sua origem, de seu modo de funcionamento e de suas fontes leva à conclusão de que não se pode admiti-lo como estritamente político, nem como exclusivamente jurídico. Organizar-se é constituir-se com um poder, assinalando que, assim como não há organização sem presença do direito, não há poder que não seja jurídico (REALE).

Encontrar um conceito de Estado que satisfaça a todas as correntes doutrinárias é absolutamente impossível devido à sua complexidade. A par disso, toda conceituação pode dar a impressão de redução formalista. Em todo caso parece-nos que se poderá conceituar o Estado como a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território.

CAPÍTULO IIIESTADO E DIREITO

A concepção do Estado como pessoa jurídica representa um extraordinário avanço no sentido da disciplina jurídica do interesse coletivo. Esta noção promove a conciliação entre o político e o jurídico. Com efeito, só pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas, podem ser titulares de direitos e deveres jurídicos e, assim, para que o Estado tenha direitos e obrigações, deve ser reconhecido como pessoa jurídica.

Segundo Miguel Reale, o Estado apresenta uma face social, relativa à sua formação e ao seu desenvolvimento, em razão de fatores sócio-econômicos; uma face jurídica, que se relaciona com o Estado enquanto ordem jurídica; e uma face política, na qual aparece o problema das finalidades do governo em razão dos diversos sistemas de cultura. Enquanto sociedade política, voltada para fins políticos, o Estado participa da natureza política, que convive com a jurídica, influenciando-a e sendo por ela influenciada, devendo, portanto, exercer um poder político. Para Weber, a política é o conjunto de esforços feitos com vista a participar do poder ou a influenciar a sua divisão, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado.

O caráter político do Estado, portanto, dá-lhe a função de coordenar os grupos e os indivíduos em vista de fins a serem atingidos, impondo a escolha

dos meios adequados. Para a consecução desse objetivo, devem ser levados em conta, sobretudo, três dualismos fundamentais:

→ Necessidade e possibilidade→ Indivíduos e coletividade (conciliação das necessidades de

ambos)→ Liberdade e autoridade (em busca de maior eficácia dos meios

disponíveis).Como se verifica, o Estado e o povo estão permanentemente implicados

num processo de decisões políticas.Quando os povos europeus buscaram a constituição de unidades

políticas sólidas e estáveis, tornou-se indispensável o aparecimento de um símbolo da unidade popular, tanto para obter do povo, por via emocional, sua adesão à luta contra o absolutismo, quanto para a institucionalização de lideranças. Surge, então, como pura criação artificial, o conceito de Nação, que seria largamente explorado no século XVIII, para levar a burguesia, economicamente poderosa à conquista do poder político. As características das nações são as mesmas das comunidades, e podem ser resumidas da seguinte forma:

a) Diferentemente da sociedade, a comunidade não se forma em torno de um objetivo, sua única aspiração é a preservação da própria comunidade;

b) Diferentemente da sociedade, na comunidade inexiste qualquer vínculo jurídico entre seus membros, unidos apenas pelos sentimentos comuns;

c) Na comunidade não há nenhum poder instituído, há, quando muito, centros de influência, a quem os membros conferem prestígio.

Em conclusão, o Estado é uma sociedade e a Nação uma comunidade, havendo, portanto, uma diferença essencial entre ambos, não se podendo dizer, com propriedade, que o Estado é uma Nação ou que é produto da evolução desta. Para obter maior integração de seu povo, e assim reduzir as causas de conflitos, os Estados procuram criar uma imagem nacional, simbólica e de efeitos emocionais.

O Estado é um todo dinâmico, submetido a um constante sistema de tensões. As transformações ocorridas no Estado podem ser efetivadas gradativamente por evolução ou bruscamente por revolução. A primeira é preferível no sentido de que é realizada através do desenvolvimento natural e progressivo das idéias e dos costumes, e da constante adaptação do Estado às novas condições de vida social. Assim, caminha-se com mais segurança, sendo mais fácil avaliar a verdadeira profundidade e o sentido real das mudanças verificadas nas condições de vida e nas aspirações dos indivíduos. Para Cattaneo, do ponto de vista jurídico, a revolução é o abatimento de uma ordenação jurídica e a instauração de outra nova, através de meio ilegal, isto é, por procedimento não previsto na ordenação anterior.

CAPÍTULO IVESTADO E GOVERNO

A base do conceito de Estado Democrático é, sem dúvida, a noção de governo do povo, revelada pela própria etimologia do termo democracia. O que se pode concluir é que houve influência das idéias gregas, no sentido da afirmação do governo democrático, equivalendo ao governo de todo o povo, neste se incluindo, porém, uma parcela muito mais ampla de habitantes do Estado, embora ainda se manifestem algumas restrições.

O Estado Democrático moderno nasceu das lutas contra o absolutismo, sobretudo através da afirmação dos direitos naturais da pessoa humana. Daí a grande influência dos jusnaturalistas, como Locke e Rousseau. Podemos dizer que três grandes movimentos político-sociais transpuseram do plano teórico para o prático os princípios que conduziram ao Estado Democrático. São eles: a Revolução Inglesa, a Revolução Americana e a Revolução Francesa. Uma síntese dos princípios que passaram a nortear as exigências da democracia tocam sempre em três pontos:

→ a supremacia da vontade popular;→ a preservação da liberdade;→ a igualdade de direitos.

Sendo a democracia o governo do povo, coloca-se um entrave sobre a forma pela qual esse povo poderá externar sua vontade. Neste sentido, temos três alternativas: a democracia direta, a semidireta e a representativa. A primeira é aquela em que o povo se pronuncia de maneira direta, através de assembléias populares, sem intermediação alguma. Neste caso, é possível a realização de uma ampla discussão antes de se deliberar em relação a determinado tema, todavia é algo que se torna inviável com o crescimento populacional. A segunda, a semidireta, caracteriza-se por alguns institutos que elaboram deliberações que são aprovadas pelo povo por meio do voto. Alguns exemplos são:

→ referendum: consulta à opinião pública para introdução de uma emenda constitucional ou lei;

→ plebiscito: consulta prévia à opinião popular; dependendo do resultado tomam-se as providências legislativas;

→ iniciativa: confere a um certo número de eleitores a possibilidade de se criar uma emenda constitucional ou lei;

→ veto popular: após a aprovação de projeto de lei, dá-se um tempo para aprovação popular;

→ recall: instituição que tem poder de revogar eleição ou decisão judicial.

A impossibilidade prática de utilização dos processos da democracia direta, bem como as limitações inerentes aos institutos de democracia semidireta, tornaram inevitável o recurso à democracia representativa. Na democracia representativa, o povo concede um mandato a alguns cidadãos, para, na condição de representantes, externarem a vontade popular e tomarem decisões em seu nome.

A representação política, neste caso, é realizada através de partidos, que, para Ferreira Filho, são instituições dotadas de personalidade jurídica e situadas no âmbito do direito público interno. É possível se fazer uma classificação dos sistemas partidários em relação à organização interna, externa e ao âmbito de atuação:

Quanto à organização interna→ Partidos de quadros: formados por membros influentes para prestígio;→ Partidos de massas: caracterizados pela quantidade de filiados;

Quanto à organização externa→ Sistemas de partido único: um só partido que comporta todos os

debates políticos;→ Sistemas bipartidários: dois partidos que se alternam no poder;→ Sistemas pluripartidários: vários partidos, igualmente dotados da

possibilidade de dominar.

Quanto ao âmbito de atuação→ Partidos de vocação universal;→ Partidos nacionais;→ Partidos regionais;→ Partidos locais.

Vários foram os critérios utilizados através dos tempos para a escolha de governantes, desde o critério da força física até outros critérios como o de sorteio, o de sucessão hereditária e, finalmente, o de eleição, característico do Estado Democrático. Como o direito de sufrágio se exerce na esfera pública para consecução de fins públicos, ele configura um direito público subjetivo. Mas como é necessária a escolha de governantes para que se complete a formação da vontade do Estado, o sufrágio, além de direito, também é um dever, ou função social. No que se refere à extensão do direito de sufrágio, tem-se duas posições, uma que defende o sufrágio universal e outra que defende o sufrágio restrito. Dois princípios orientam as considerações acerca do sufrágio restrito, um que defende a possibilidade de agir livremente no momento de votar e outro que defende que o eleitor deve ter consciência da significação do seu ato. O sufrágio pode ser definido com base nas seguintes restrições:

→ Idade;→ ordem econômica;→ sexo;→ deficiência de instrução;→ deficiência física ou mental;→ condenação criminal;→ engajamento no serviço militar.

Os sistemas eleitorais podem ser, basicamente, de três tipos:

a) Sistema de representação majoritária;b) Sistema de representação proporcional;c) Sistema de distritos eleitorais.

ESTADO CONSTITUCIONALEm sentido geral, pode-se dizer que o constitucionalismo começou a

nascer em 1215, quando os barões da Inglaterra obrigaram o Rei João Sem Terra a assinar a Magna Carta, jurando obedecê-la e aceitando a limitação de seus poderes. O constitucionalismo é visto como resultado da conjugação de três objetivos, a afirmação da supremacia do indivíduo, a necessidade de limitação do poder dos governantes e a busca da racionalização do poder. O titular do poder constituinte é sempre o povo e é nele que se encontram os valores fundamentais, que informam os comportamentos sociais, sendo ilegítima a Constituição que não se vincula às aspirações e valores de seu povo. A supremacia da Constituição é preservada por um padrão jurídico fundamental, que não pode ser contrariado por qualquer norma integrante do mesmo sistema jurídico. As normas constitucionais, em qualquer sistema regular, são as que têm o máximo de eficácia, não sendo admissível a existência, no mesmo Estado, de normas que com ela concorram em eficácia ou que lhes sejam superiores.

A Magna Carta, citada no parágrafo anterior, é considerada o antecedente mais remoto das Declarações de Direitos, justamente por consagrar os direitos dos barões e prelados ingleses, restringindo o poder absoluto do monarca. Todavia, o século das Declarações foi o XVIII, influenciado pelas proposições sustentadas pelos juristas do século XVII, dentre elas:

1- Há direitos naturais eternos e absolutos, válidos para todos os homens em todos os tempos e lugares;

2- O Direito Natural é um grupo de regras suscetíveis de verificação por meio da razão;

3- O Estado existe tão-só para assegurar aos homens esses direitos naturais;

4- O Direito Positivo, aplicado e executado pelos tribunais, é o meio pelo qual o Estado realiza essa função.

Em 1789, a Assembléia Nacional francesa aprovou sua Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que, inegavelmente, teve maior repercussão do que as precedentes. Em seu artigo II, ela dizia que “O fim de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão.” Outras declarações se seguiram a essa em novas proclamações, como em 1793, 1795, 1814 e 1848, pois cada maré revolucionária queria trazer sua própria Declaração de Direitos.

Proclamada na Alemanha em 1919, frente a uma situação desesperadora de desemprego e miséria que assolava os operários, a Constituição de Weimar exerceu grande influência no constitucionalismo moderno, sobretudo pela ênfase dada aos direitos fundamentais. Todavia, com a eclosão da II Guerra Mundial, não houve uma efetiva aplicação das normas de promoção dos direitos sociais. Finalmente, após essa guerra, o problema dos direitos fundamentais da pessoa humana foi posto novamente em debate, com a aprovação da Carta das Nações Unidas, de 26 de Junho de 1945.

SEPARAÇÃO DE PODERES E FORMAS DE GOVERNOA teoria da separação de poderes, incorporada ao constitucionalismo

através da obra de Montesquieu, foi concebida para assegurar a liberdade dos indivíduos. Para o autor de “O Espírito das Leis” (1748), quando os poderes legislativo e executivo estão unidos, não há liberdade, pois que pode-se esperar que o governante faça leis tirânicas. Quanto maior a concentração do poder, maior será o risco de um governo ditatorial. Embora seja clássica a expressão separação de poderes, ela é inadequada, uma vez que o poder soberano do Estado é uno e indivisível. Neste caso, é mais apropriado falar-se em distribuição de funções.

O antecedente mais remoto a falar em separação de poderes é Aristóteles, que considerava injusto e perigoso atribuir-se a um só indivíduo o exercício do poder. No entanto, as idéias mais recentes acerca deste tema nos levam ao século XIV, quando aparece a obra “Defensor Pacis”, de Marsílio de Pádua, estabelecendo uma distinção entre o poder legislativo e executivo. A base de seu pensamento é a afirmação de uma oposição entre o povo, que ele chama de primeiro legislador, e o príncipe. No século XVI, Maquiavel informa que, na França, encontravam-se três poderes distintos: o legislativo (Parlamento), executivo (Rei) e um judiciário independente. É curioso notar que Maquiavel louva essa organização, porque dava mais liberdade e segurança ao rei, uma vez que o mantinha fora das disputas entre seus súditos, o que evitaria desagrados para com ele.

No século XVII, é que vai surgir a primeira sistematização doutrinária da separação dos poderes, com a obra de Locke. Baseado no Estado inglês de seu tempo, ele aponta a existência de quatro funções fundamentais exercidas por dois órgãos do poder. A função legislativa cabia ao Parlamento, enquanto as funções executiva, federativa e prerrogativa cabiam ao rei. As funções federativas se destinavam a eventuais relacionamentos com outros Estados, e as funções prerrogativas consistiam no poder de se fazer o bem público sem uma subordinação a regras.

Finalmente, com Montesquieu, a separação dos poderes já é concebida como um sistema em que se conjugam um legislativo, um executivo e um judiciário, harmônicos e independentes entre si. Essa é a configuração que irá aparecer na maioria das Constituições subseqüentes. Assim é que, já na Declaração dos Direitos da Virgínia, de 1776, consta do parágrafo 5 “que os poderes executivo e legislativo do Estado deverão ser separados e distintos do judiciário.” No artigo XVI da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada na França em 1789, consta que “toda sociedade na qual a garantia dos direitos não está assegurada, nem a separação dos poderes determinada, não há Constituição.”

Sobre as formas de governo, a classificação mais antiga nos remete também a Aristóteles, que se baseia no número de governantes. Para ele, tínhamos três formas de governo: a realeza (governo de um homem só); a aristocracia (governo de uma elite reduzida); e a democracia (ou república para alguns tradutores, que consiste no governo da multidão). Cada um destes poderia sofrer uma degeneração, deixando de se orientar pelo interesse coletivo, e se tornar respectivamente em tirania, oligarquia e demagogia.

Maquiavel, em 1531, publica “Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio”, no qual desenvolve uma teoria procurando sustentar a existência de ciclos de governo. Para ele o ponto de partida seria um Estado Anárquico, que se desenvolveria com a busca de uma liderança, resultando em uma Monarquia Eletiva. Esta se converteria depois em Monarquia Hereditária, que depois se degeneraria em uma Tirania. Para coibir seus males, um grupo mais poderoso a substituiria por uma Aristocracia que seria depois transformada em Oligarquia. O povo insatisfeito com os descalabros da Oligarquia resolveria governar por si mesmo e então instauraria um governo Democrático. No entanto, essa democracia se degeneraria passando os indivíduos a governar em proveito próprio, o que os levaria de volta à Anarquia, dando início novamente ao ciclo.

Mais tarde Montesquieu apontaria para três espécies de governo: um republicano; um monárquico; e outro despótico. Na realidade, a monarquia e a república são ainda hoje as formas fundamentais de governo, cabendo aqui caracterizá-las em separado.

MONARQUIA:→ Vitaliciedade→ Hereditariedade→ Irresponsabilidade

REPÚBLICA:→ Temporariedade→ Eletividade→ Responsabilidade

Além da distinção entre monarquia e república, outras classificações podem ainda ser feitas com base nas relações entre o executivo e o legislativo. Temos, a partir daí, a configuração de dois sistemas, o parlamentarismo e o presidencialismo.

A Inglaterra pode ser considerada o berço do parlamentarismo. Já no século XIII, o mesmo que assistiu à elaboração da Magna Carta, numa rebelião dos barões e do clero contra o monarca, iria ganhar forma o Parlamento. Neste período foram acontecendo reuniões, para se conversar sobre os assuntos do reino, que acabaram por ganhar o caráter de uma assembléia política. A consolidação dessas reuniões resultou no surgimento do Parlamento. Um dos pontos básicos do parlamentarismo é a distinção entre o Chefe do Governo, que passou a ser o primeiro ministro, e o Chefe do Estado, que continuou a ser o monarca. As principais características dessa forma de governo são:

→ Distinção em Chefe de Governo e Chefe de Estado;→ Chefia do governo com responsabilidade política;→ Possibilidade de dissolução do Parlamento;

O presidencialismo, assim como ocorreu com o parlamentarismo, não foi resultado de uma criação teórica. No entanto, por sua vez, ele não passou por um longo e gradual processo de elaboração. Pode-se afirmar que o presidencialismo foi uma criação americana do século XVIII. A péssima lembrança que tinham da atuação do monarca, enquanto estiveram submetidos à coroa inglesa, mais a influência dos autores que se opunham ao absolutismo, especialmente Montesquieu, determinou a criação de um sistema que, consagrando a soberania da vontade popular, adotava ao mesmo tempo um mecanismo de governo que impedia a concentração do poder. Como

características básicas do sistema presidencial, podem ser indicadas as seguintes:

→ O Presidente da República é o Chefe do Governo e o Chefe do Estado;

→ A chefia do executivo é unipessoal;→ O Presidente da República é escolhido pelo povo;→ O Presidente da República é escolhido por um prazo

determinado;→ O Presidente da República tem poder de veto.

Nas classificações tradicionais, os Estados são considerados unitários, quando têm um poder central, núcleo do poder político; e são considerados federais, quando conjugam vários centros de poder político autônomo. O Estado Federal indica, antes de tudo, uma forma de Estado, não de governo. Etimologicamente, federação (do latim foedus) quer dizer pacto, aliança. O Estado Federal é, portanto, uma união de Estados. Ele nasce, realmente, com a constituição dos Estados Unidos da América, em 1787. Com a independência de 1776, as treze colônias passam a constituir, cada uma delas, um novo Estado. Poucos anos depois, celebram entre si um tratado, conhecido como Artigos de Confederação, aliando-se para uma ação conjunta. Em seguida, aprovam uma constituição comum que propunham que a confederação se convertesse em federação. As características fundamentais dos Estados Federais são as seguintes:

→ A união faz nascer um novo Estado e aqueles que aderiram perdem sua antiga condição;

→ A base jurídica de um Estado federal é uma Constituição, não um tratado;

→ Na federação não existe direito de secessão;→ Só o Estado Federal tem soberania;→ No Estado Federal as atribuições da União e as das

unidades federadas são fixadas na Constituição, por meio de uma distribuição de competências;

→ A cada esfera de competências se atribui uma renda própria;

→ O poder político é compartilhado pela União e pelas unidades federadas;

→ Os cidadãos do Estado que adere à federação adquirem a cidadania do Estado federal e perdem a anterior;

CAPÍTULO VPROBLEMAS DO ESTADO CONTEMPORÂNEO

O mundo é uma sociedade de Estados, na qual a integração jurídica dos fatores políticos ainda se faz imperfeitamente. Tecnicamente os Estados vivem em uma situação de anarquia, pois embora exista uma ordem jurídica em que todos se integram, não existe um órgão superior de poder, a que todos se

submetam. O exame das organizações de Estados existentes, no mundo do pós-guerra, permite a identificação de três espécies, que são:

→ Organizações para fins específicos (ex.: OPEP); → Organizações regionais para fins amplos (ex.: OEA);→ Organizações de vocação universal (ex.: ONU).

Na realidade as organizações de vocação universal são um fenômeno deste século, só havendo dois exemplos até hoje: a Sociedade das Nações e a Organização das Nações Unidas. A Sociedade das Nações, também designada como Liga das Nações, surgiu logo após o término da I Guerra Mundial. Entre suas principais deficiências, estava o desinteresse das grandes potências. Além disso, inúmeros desentendimentos surgidos entre os membros acabaram provocando a retirada de alguns, inclusive do Brasil. Já em 1927 era evidente o desprestígio da Sociedade que não conseguiu qualquer êxito na sua tarefa de assegurar a paz. Com o início da II Guerra, ela desmoronou de vez, sendo oficialmente extinta em 1946.

Em fevereiro de 1945, encontraram-se em Yalta, ao sul da URSS, Roosevelt, Churchill e Stalin, celebrando vários acordos referentes à situação mundial de pós-guerra. O primeiro ponto do protocolo então firmado refere-se precisamente à “organização mundial”, estabelecendo-se que as Nações Unidas (termo tecnicamente errado, pois seriam na verdade Estados Unidos), encontrar-se-iam nos EUA para criação da futura organização. A ONU é uma pessoa jurídica de direito internacional público, tendo sua existência, sua organização, objeto e condições de funcionamento, previstos no instrumento de constituição, que é a carta das Nações Unidas. Os seus objetivos podem ser assim resumidos:

1. manter a paz e segurança internacionais;2. desenvolver relações amistosas entre os Estados;3. conseguir a cooperação internacional;4. ser um centro de harmonização dos Estados para consecução de objetivos comuns.

A estrutura da ONU pode ser claramente percebida pela indicação de seus órgãos fundamentais, que são:

a) Assembléia Geralb) Conselho de Segurançac) Conselho Econômico e Sociald) Conselho de Tutelae) Corte Internacional de Justiçaf) Secretariado

É indiscutível que ela tem prestado bastante auxílio ao desenvolvimento dos povos e à causa da liberdade, mas também não há dúvidas de que ela apresenta falhas de estrutura e funcionamento, que reduzem sua eficácia de atuação. Dentre os principais defeitos geralmente apontados estão:

1. o respeito à soberania dos Estados anula suas ações;2. o direito de veto dos membros permanentes do Conselho de Segurança;

3. a falta de eficácia das decisões, que por ser apenas uma confederação, se limita a fazer recomendações;

4. a falta de recursos próprios.

O Estado Liberal, com um mínimo de interferência na vida social, trouxe, de início, alguns inegáveis benefícios: houve um progresso econômico acentuado, o indivíduo foi valorizado e desenvolveram-se as técnicas de poder. Todavia, pode-se dizer que ele também criou as condições para sua própria superação, uma vez que isso se degenerou mais à frente em ultra-individualismo, com a formação de grandes mazelas urbanas, decorrentes da super-exploração do proletariado, e também em desequilíbrios econômicos em larga escala.

Em 1932, ao ser eleito presidente dos EUA, Franklin Roosevelt se depara com uma situação desesperadora: milhões de desempregados, famílias inteiras sem alimentos e sem abrigo, e até altos círculos financeiros inseguros e desorientados. Frente a essa realidade, ele lançou seu programa de governo conhecido como New Deal, que era uma política intervencionista. Desde então o Estado passa a ter uma atuação mais intensa na sociedade, empregando seu poder supremo e coercitivo para suavizar algumas conseqüências mais penosas da desigualdade econômica. O advento da II Guerra Mundial viria para estimular ainda mais a atitude intervencionista do Estado. Terminada a guerra, ocorre ainda um avanço maior do intervencionismo, pois inúmeras necessidades novas impõem a iniciativa do Estado em vários setores: na restauração dos meios de produção, na reconstrução das cidades, na readaptação das pessoas à vida social, bem como no financiamento de estudos e projetos.