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EM DEFESA DA VIDA - Parte (3) (Alguns argumentos contra o uso das DROGAS) Rubens Santini – Junho/1995 – Distribuição gratuita

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EM DEFESA DA VIDA - Parte (3)

(Alguns argumentos contra o uso das DROGAS)

Rubens Santini – Junho/1995 – Distribuição gratuita

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Índice

Prefácio ................................................. 3 Introdução ............................................... 4 Uma carta de adeus ....................................... 5 Como evitar que um traficante adote seu filho ............ 6

O vício por dentro ....................................... 9 A devastação que as drogas causam no cérebro ............ 10 Drogas psicotrópicas: o que são e como atuam ............ 11 Cresce o número de jovens dependentes de crack .......... 12 Crack: o vício é imediato ............................... 13 As perversas pedras do pó ............................... 14 Governo pode autorizar uso médico da maconha ............ 15

Dependentes de drogas têm tratamento comunitário ........ 16 A procura dos vilões .................................... 19 AIDS: pacto com a morte.................................. 20 Alcoolismo na adolescência .............................. 21 Escapando do vício ...................................... 23 A estratégia contra a droga ............................. 25 A droga nos rituais religiosos........................... 26

Desencarne por overdose ................................. 28 Tratamento do drogado ................................... 32

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Prefácio

Esta é a terceira e última parte de “EM DEFESA DA VIDA”. Tivemos o primeiro tema tratando do Aborto, seguido do

Suicídio e, este, abordando as Drogas. A nossa intenção, ao organizar textos de autores encar-

nados e desencarnados, é levar informações sob os mais diver-sos ângulos, numa forma de ampliar a visão sobre estes temas tão polêmicos.

Todos estes três assuntos devem passar a ser discutido dentro da própria família, num diálogo franco e aberto, com a maior naturalidade.

Como veremos nos textos apresentados, é preferível fa-lar um ano antes, do que cinco minutos depois do fato ter

ocorrido. E é na adolescência o melhor período para que estes te-

mas sejam discutidos.

Rubens Santini

São Paulo, 25 de junho de 1995

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Introdução

“Proibir ou não proibir, eis a questão!”. A discussão está lançada. Existem argumentações a favor

da liberação das drogas, e existem as que são contra. A favor, alegam que ficaria mais fácil para localizar os

viciados e, por ventura, procurar tratá-los. Assim como, fi-caria mais fácil para identificar os traficantes e fixar re-gras para limitar o uso das drogas.

Contra, alegam que aumentaria o seu consumo, principal-

mente entre os adolescentes, onde ainda eles não têm uma vi-são crítica de mundo muito bem definida e esclarecida, sendo uma presa fácil para esse vício.

Também não adianta proibir, pura e simplesmente, e não se fazer mais nada. Temos o exemplo da famosa “Lei Seca” que vigorou nos Estados Unidos, entre 1919 e 1933, onde o álcool foi “eliminado”, proibidos sua fabricação, uso e venda. Ocor-reu o que se conhece e o que seria previsto. Quem realmente queria beber tinha inúmeros meios de obtê-lo. Vigorou o impé-rio do contrabando, da fabricação ilegal, da venda dissimula-da. É como nos conta o famoso cineasta espanhol Luiz Buñel, em seu livro “Meu último suspiro”:

“... passei cinco anos nos Estados Unidos, em 1930, na

época da proibição, e acho que nunca bebi tanto. (...) Podia-se conseguir uísque em farmácias, e em determinados restau-rantes, servia-se vinho em xícaras de café.”

Até agora, as campanhas contra as drogas tem resultado

em um grande fracasso. Não resolvem jogar uma série de informações científicas, com a intenção de amendrontar as pessoas. Muito menos fazer cartazes, colocando um desenho de uma caveira dizendo que a droga mata. Seria a mesma coisa se espalhássemos cartazes pelo mundo inteiro, dizendo que a fome e a desnutrição também fazem milhares de vítimas. É preciso atacar o problema pela sua raiz. Geralmente, o viciado tem instinto autodestrutivo, muitas movidas pela falta de diálogo dentro do lar, das dificuldades nos relacionamentos fami-

liares e afetivos. A prevenção começa dentro de casa. É preciso abrir canais de discussão nas escolas, na

sociedade como um todo. Enfim, o problema precisa realmente ser discutido na sua profundidade.

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Uma Carta de Adeus (1)

“Acho que neste mundo ninguém procurou descrever o seu próprio cemitério. Não sei como meu pai vai recebê-lo; mas preciso de todas as forças enquanto é tempo.

Sinto muito, meu pai, acho que este diálogo é o último que tenho com o senhor. Sinto muito mesmo... Sabe, pai, está em tempo do senhor saber a verdade que nunca desconfiou. Vou ser breve e claro. Bastante objetivo. O TÓXICO ME MATOU!

Travei conhecimento com meu assassino, o tóxico, aos 15 anos ou 16 anos de idade. É horrível, não pai? Através de um cidadão elegantemente vestido, bem elegante mesmo, e bem fa-lante, que me apresentou o meu futuro assassino: o tóxico.

Eu tentei recusar, tentei mesmo, mas o cidadão mexeu com

o meu brio, dizendo que eu não era homem. Não é preciso dizer mais nada, não é pai? Ingressei no mundo do tóxico. No começo foram as tonturas, depois o desvaneio e a seguir a escuridão. Depois veio a falta de ar, o medo, as alucinações e logo a seguir veio a euforia do pico novamente. Eu me sentia mais gente do que as outras pessoas: e o tóxico, meu amigo insepa-rável, sorria...

Sabe pai, a gente quando começa, acha tudo ridículo e muito engraçado. Até Deus eu achava ridículo e hoje no leito do hospital, eu reconheço que Deus é o mais importante de tudo no mundo, e que sem a ajuda Dele eu não estaria escre-vendo esta carta. Pai, eu só tenho 19 anos e sei que não te-nho a menor chance de viver. É muito tarde para mim. Mas para o senhor, meu pai, tenho um último pedido a fazer: diga a

todos os jovens que o senhor conhece e mostre a eles esta carta. Diga a eles que em cada porta de escola, em cada cur-sinho de faculdade, em qualquer lugar há sempre um homem elegantemente vestido e bem falante, que irá mostrar-lhes o seu futuro assassino e destruidor de suas vidas, e que os levará à loucura ou à morte, como aconteceu comigo.

Por favor, faça isso meu pai, antes que seja tarde de-mais para eles.

Perdoa-me, pai. Já sofri demais. Perdoa-me também por fazê-lo sofrer pelas minhas loucuras.

Adeus meu pai... ”

Observação: Caso verídico! Depois desta carta, o jovem morreu em um hospital em São Paulo, onde estava internado.

(1) "Extraído da revista espírita Allan Kardec - julho/93.

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Como evitar que um traficante adote o seu filho(2)

(1) Os pais atuam como modelo, exemplo para os filhos. Assim sendo, respeito mútuo e diálogo asseguram uma relação harmônica e, como decorrência desta relação, podemos ter o crescimento promovendo sempre o redimensionamento entre os membros integrantes não da nossa casa, mas do lar.

(2) A automedicação deve ser evitada, se não estamos

incentivando indevidamente o uso inapropriado às drogas. (3) Quando medicar o seu filho, nunca associe este fato

como algo prazeroso, tal como comer uma barra de chocolate.

Procure associar o remédio à necessidade de combater a doen-ça.

(4) O consumo de bebidas alcoólicas e de cigarros é in-

centivado pela sociedade a ponto de induzir ao “sucesso” os seus usuários. Os adolescentes em busca de auto-afirmação se identificam com o adulto (o pai, a mãe e outros), procurando fumar e beber, mesmo sem gostar.

(5) Apoio, atenção e amor a cada filho, respeitando a

sua individualidade de expressar, implicando a aceitação da maneira como ele é e não como gostaríamos que ele fosse.

(6) Mobilizar o crescimento, despertando o senso crítico

do filho, tendo ele a oportunidade de expressar seu ponto de vista, discutir, avaliar situações e andar sobre suas pernas.

(7) Não corromper o filho às suas idéias. Diante da te-

levisão, leituras e as demais situações sociais; deixe que seu filho num processo lento e gradativo obtenha sua cons-ciência crítica estruturada, dentro da dinâmica familiar. A proposta é discutir e não proibir.

(8) É saudável não invadir os espaços, portanto, deixe

que seu filho traga amigos para dentro de casa. (9) Considerando a adolescência um período de transição,

de fronteira, canalize o diálogo como forma de redimensionar

as relações com vias ao crescimento dos jovens como dos pais. (10) Adolescer é ainda um sonho por fazer, um esboço a

concretizar, um intuito de viver e inventar. Assim, sendo, o adolescente sente-se em cima do muro por não ser criança e também não ser adulto. Diversões, lazer e em grupo ‚ necessá-rio.

(2) Texto de Miltes Aparecida Bonna - extraído do livro "Família e Espiritismo" - Edições U.S.E.

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(11) A vigilância dos pais é importante, com a dosagem

não policial; porém amorosa, companheira, de quem zela pelo bem do filho e nele confia.

(12) Observar o grupo com quem o filho anda, uma vez que

a influência do meio social é forte na adolescência. (13) A família que cedo começou o diálogo com o filho,

encontrará, na sua adolescência, aceitação, facilidade de reciclar compreensão e confiança em mão dupla.

(14) Vale mais falar um ano antes do que o cinco minutos

depois. Assim sendo os pais devem se atualizar e reciclarem-se para acompanhar a evolução do tempo: é fundamental acompa-nhar o momento de seu filho.

(15) Abordar sobre as consequências do uso indevido de

drogas, com naturalidade e dentro da verdade científica. Nun-ca mentir ou fazer especulações em cima de assuntos, porque o efeito poderá ser contraditório.

(16) Não acomodar diante do cansaço e desânimo das tare-

fas diárias. Também dê um tempo para o seu filho, compartilhe com ele alegrias, preocupações, seja amigo da criança e do jovem, eles precisam muito desta troca.

Ao detectar um filho com problemas, por onde caminhar?

Medidas educativas são necessárias, quando detectamos um filho experimentando ou até mesmo usando drogas:

(1) Não deixe o desespero tomar conta de você, pois

desta forma os pais não usam a razão. (2) Não se culpe, responsabilize-se. (3) Não dramatize nem use atitudes primitivas e drásti-

cas, como surrar, expulsar, xingar, porque tudo isso só agra-va mais o problema.

(4) Tenha como meta a busca de segurança e saúde para o

seu filho. (5) Sensibilize-se mostrando o envolvimento e as conse-

quências, use de firmeza, mostrando-lhe que ele está doente e que pode contar com o apoio familiar para se recuperar.

(6) Institua um processo disciplinar no sistema de vida,

mesmo ele sabendo que vocês estão atuando de forma mais inci-siva. É necessário paciência, compreensão, firmeza e acima de tudo muita garra.

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(7) Procurar um profissional ou outra pessoa de confian-

ça para ajudar você e seu filho; e se necessário encaminhe-o para tratamento.

(8) Algumas vezes se faz necessário cortar o assédio de

determinados companheiros que podem emperrar o tratamento. Bom senso, afeto e tato nestes momentos.

(9) Os pais devem se comprometer a acompanhar o processo

de recuperação do filho e não delegar este papel ou até mesmo esperar que os Professores responsáveis o façam.

(10) Desmitifique idéias primárias como sentir medo ou

vergonha por ter um drogado na família. O único mal que pode haver é não estar ao lado do doente, desconsiderá-lo como um

marginal que está desonrando a família. O que interessa, realmente, é o seu bem estar e a sua vida.

(11) Reintegrá-lo na sociedade através de seus ideais,

lazer, estudo, compromissos e vínculos sadios com todos os que o rodeiam.

(12) Procure inteirar-se dos grupos, como o DESAAT -

Departamento de Socorro Anti-Álcool e Tóxico, do Centro Espí-rita “Obreiros do Senhor”, Rua Francisco Alves, 275, Pauli-céia, São Bernardo do Campo-SP e outros de tratamentos espe-cializados para dependentes químicos. Nunca interne em hospi-tal psiquiátrico sem a devida recomendação de um especialis-ta. Lembre-se que cada caso é único e particular, o que re-

quer uma atenção clínica e para instituir o tratamento em busca de recuperação. A busca de Deus, a valorização da vida e a assistência espiritual (com a fluidoterapia) são roteiros que também trazem novas esperanças.

“As crianças aprendem desde pequenas que a dor física pode

ser sedada com remédios que seus pais compram na farmácia.

Assimilam, pelo exemplo dos adultos, que existem antídotos

para combater a insônia, o nervosismo, a tosse, a dor. De

maneira geral, o homem moderno tem grande dificuldade de su-

portar a dor. Vários autores questionam até que ponto a pri-

vação da dor por meio da farmacologia não deveria ser consi-

derada na explicação do adolescente às drogas. Ao experimen-

tar a dor psíquica, inerente ao processo de crescer, o jovem

buscaria nelas uma espécie de pílula anti-dor.”(*)

(*) "Prevenção de Drogas" - Dr. Roberto Wusthof - Ed. Brasiliense

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O vício por dentro(3)

“Israel Levin, um dos proprietários da indústria de cuecas Zorba, sonhava ver seu filho Abrão nos altares das sinagogas de São Paulo, como rabino. De Abrão, hoje com 31 anos, pode-se dizer tudo. Menos que ele leve uma vida de rabino. Viciado em cocaína desde os 15 anos, ele já roubou o próprio pai, apanhou de traficantes, surrou a ex-mulher. Anda armado. Entre uma injeção e outra de cocaína - foram quatro ao total, num espaço de cinco horas -, Abrão recebeu VEJA em sua casa para uma entrevista. Ele é contra a legalização das drogas. Os viciados consumiriam mais, argumenta. A seguir, os principais trechos de seu depoimento:

“Estou para lá de Bagdá. Sob o efeito das drogas não sou uma pessoa feliz. Me sinto culpado de usá-las. Minha vida es-tá muito ruim. As drogas me afastaram do trabalho e da fami-lia. Virei uma pessoa sem escrúpulos. Por exemplo: digamos que tenho só 10 reais no bolso e minha ex-mulher, a atriz Grace Gianoukas, telefona dizendo que precisa de dinheiro para comprar leite para o nosso filho de 4 anos, o Nicolas. Bem, se eu precisar comprar uma dose para mim, eu não dou a grana para o Nicolas, com certeza. E é certeza. É certeza. Não é uma dúvida.

Aos 15 anos, eu já fumava maconha e cheirava cocaína. Nessa época, numa certa noite, quando cheguei em casa, fui intimado por meu pai. “Você fuma maconha?”, ele me perguntou. Não tive como negar. Começamos a discutir. Na manhã seguinte,

fui mandado embora de casa. “Quando uma das laranjas do saco é podre, a gente tira, para não estragar as outras”, foi o que ouvi. As outras laranjas eram meus dois irmãos. Reconci-liamo-nos muitos anos depois, quando comecei a trabalhar na Zorba como assistente de marketing. Trabalhava muito. Porque o viciado é um sujeito compulsivo. Tudo vira vício na vida dele. Todas as mulheres de minha vida, por exemplo, foram obsessão. Nessa época, criei o famoso passarinho da Zorba, aquele que fez sucesso nas campanhas publicitárias.

Mas aos 26 anos, decidi parar de trabalhar. Virei ro-queiro. Montei um grupo, o Abrão e os Lincolns. Mas, apesar de o som ser do barulho, não emplacamos. Sem dinheiro, preci-sava roubar para conseguir comprar a droga. Comecei a vender tudo o que tinha na casa de meu pai, à revelia dele. Televi-

são, esse tipo de coisa. Até o dia que os tiras da Policia Civil me pegaram. Tinha comprado 5 gramas de cocaina e estava louquinho para aplicar. De cara, assumi que era viciado. Le-varam-me à delegacia. Foi traumatizante. Queriam saber de on-de vinha aquela mercadoria. Começaram a me ameaçar. Deram uns socos na minha cara. Me deixaram pelado. Fui parar no xadrez. Foi nojento. Um lugar que fedia a xixi, com ratos embaixo do cano. Achei um absurdo. Rasparam meu cabelo dizendo que eu parecia mulher. Rasparam até minhas sobrancelhas. Péssimos

(3) Extraído da Revista VEJA de 01/fev/1995

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dias. O sol mal penetrava na cela. Ficava fazendo exercícios.

Também meditava, fazia ioga, o que motivo de piada entre os carcereiros. Ioga naquele chão nojento, nem Buda seria capaz! Saí de lá no terceiro dia, cheio de piolho e com umas perebas no corpo. Tive de me depilar todo. Saí aliviadíssimo, porque reconquistara a liberdade. A prisão me fez perceber que estou mesmo fora da realidade. O futuro do viciado é a morte ou a loucura total. ”

A devastação que as drogas causam no cérebro(3)

“As drogas agem na parte mais delicada do cérebro huma-no, o mecanismo de transmissão dos impulsos nervosos. O cé-

rebro tem por bilhões de células, os neurônios, que comuni-cando-se entre si geram as sensações, o pensamento ou a ação. Essa comunicação só acontece graças a substâncias químicas conhecidas por neuro-transmissores. É aí que as drogas chegam para atrapalhar. Interagindo como os neuro-transmissores, tornam imprecisas as mensagens entre os neurônios. É o fim de uma harmoniosa ciranda de impulsos nervosos. Elas podem esti-mular o sistema nervoso central, como a cocaína, a cafeína ou a nicotina. Deprimi-lo, como o álcool ou a heroína. Perturbá-lo, como a maconha ou o ácido lisérgico. Fica-se eufórico, inapetente ou insone. Vêem-se coisas. Ouvem-se sons. Depen-dendo do tipo de droga, da quantidade usada e do tempo de uso, variam os malefícios. A cocaína é a que mais rapidamente devasta o usuário. Bastam alguns meses ou mesmo semanas para

que ela cause um emagrecimento profundo, insônia, lesão da mucosa nasal e maior suscetibilidade a convulsões. Ao longo dos anos, porém, os efeitos destrutivos do álcool são mais graves e numerosos. Entre eles estão gastrite, hipertensão, pancreatite, miocardite, hepatite e cirrose. Retrato dessa tragédia são as clínicas brasileiras. A média de idade das pessoas que procuram ajuda contra bebida é de 35 anos. Contra a cocaína, 20 anos. Curiosamente, a heroína, que está entran-do agora no mercado brasileiro, é o entorpecente que apresen-ta o menor risco de doenças decorrentes do uso crônico. No máximo, contam-se a constipação intestinal e algums espasmos das vias biliares. A heroína vicia muito rapidamente, gera uma grave síndrome de abstinência, e é a que relativamente mais mata por overdose, seguida de perto pela cocaína. A dose

letal da maconha, em contrapartida, é absurda. Para morrer, o sujeito teria de fumar 50 quilos de maconha por minuto duran-te quinze minutos. O principal problema da maconha é que cau-sa câncer, como o tabaco, e afeta a memória.

(3) Revista VEJA - 01/fev/95

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Drogas psicotrópicas: O que são e como atuam(9)

“Impropriamente chamadas de tóxicos - já que qualquer substância pode vir a ser tóxica - as drogas psicoativas ou psicotrópicas atuam principalmente no cérebro (sistema ner-voso central). Deriva daí a denominação psicotrópico: tro-pismo ou atração pela mente. Produzem alterações psicológicas cuja qualidade e intensidade vão variar principalmente com o tipo e quantidade de droga.

Vamos tomar, por exemplo, os efeitos que a maconha e a cocaína causam no organismo humano:

(a) A ingestão aguda de maconha leva um aumento de fre-

quência dos batimentos do coração, que só vai representar

problema para quem eventualmente já tenha problemas cardía-cos. Ingerida constantemente, a maconha pode levar à altera-ção do nível de testosterona circulante, com consequente di-minuição no número de espermatozóides no líquido seminal. É, no entanto, importante ressaltar que esse efeito é reversí-vel, voltando os valores ao normal após a interrupção do seu uso. Usada cronicamente, a maconha parece também interferir na memória e, consequentemente, com a capacidade de aprendi-zagem. Apatia é outra condição geralmente associada ao uso crônico da maconha. Uma afirmativa muito frequente nas dis-cussões que se travam sobre o uso de drogas psicotrópicas é que o álcool e o fumo são mais maléficos do que a maconha. O que se sabe é que o tabaco prejudica o aparelho circulatório e aumenta a probabilidade de câncer. Mas isto não significa

que a maconha não possa também ter esse efeito. Ainda não existem estudos suficientes sobre o uso regular da maconha que permitam descartar essa possibilidade. Sendo a maconha uma droga de uso ilegal, muito dificilmente se conseguirão dados confiáveis onde as pessoas irão dizer por quanto tempo fumam e quanto fumam (é necessário um número muito grande de pessoas estudadas para se chegar a conclusões válidas). (...) Em relação ao álcool, a comparação com a maconha só seria justa se ela fosse consumida na mesma quantidade e intensi-dade com que o são as bebidas alcóolicas. É até possível que a maconha seja menos prejudicial, mas no momento tal afirma-tiva é no mínimo prematura.

(b) Os efeitos mais comuns após o uso de cocaína são a perda da fome e do sono, acompanhada de euforia, sensação de bem-estar e de aumento de energia. Doses maiores podem levar à excitação sexual. Também a uma irritabilidade intensa, o que possivelmente explica a associação entre o uso de cocaína e violência. Os sintomas físicos que aparecem concomitante-mente são aumento dos batimentos cardíacos, dilatação da pu-pila, aumento da temperatura corporal, suor e palidez. A sen-sação de intenso bem-estar é fugaz. Desaparece rapidamente e

(9) "O que é Toxicomania" - Dra Jandira Masur - Ed. Brasiliense

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sobrevêm a apatia, tristeza e ansiedade, o que por sua vez é

revertida por uma nova dose de cocaína. É fácil entender por-que ela é considerada como uma das drogas com maior potencial para produzir dependência psicológica. O uso contínuo de cocaína leva a problemas psicológicos bastante sérios, como idéias de perseguição, irritabilidade intensa e alucinações. Obviamente, essas alterações podem comprometer toda a vida de relação da pessoa. ”

Cresce o número de jovens dependentes de crack(5)

O consumo de crack - mistura de pasta de cocaína com bicarbonato de sódio - antigamente restrito a menores de rua de São Mateus, no extremo leste de São Paulo, se alastrou. Hoje o crack já invadiu as classes alta e média de São Paulo e é a droga que apresenta maior número de casos de dependên-cia da cidade.

Segundo o Departamento Estadual de Narcóticos (Denarc), o número de encaminhamentos para tratamento por uso de crack aumentou cerca de 20% no ano de 1993 (com relação a 1992). No total foram 223 casos, dos quais 81 envolvendo jovens entre 16 e 18 anos. Só nos dois primeiros meses deste ano o Denarc apreendeu uma quantidade de cocaína equivalente ao total do primeiro quadrimestre de l993.

O crack também é a maior preocupação da Delegacia de In-

vestigação sobre Crimes contra a Criança e o Adolescente. Se-gundo a delegada titular, Elisabete Ferreira Sato, em 50% dos casos investigados - as vítimas estavam envolvidas com a dro-ga.

“A droga está hoje em ‘ascensão social’, já é parte dos costumes da classe alta paulista”, afirma Alberto Corazza, delegado titular da Divisão de Prevenção e Educação (Dipe) do Denarc.

Uma amostra disto é o aumento de dependentes de crack em clínicas particulares, com alto custo de internação - o plano mais barato na Comunidade Terapêutica Maxwell, em Atibaia-SP, sai por US$ 2.800 por mês.

Segundo Corazza, o perfil do consumidor de crack é divi-dido. Ele é um adolescente ou um profissional “bem estabele-

cido”, com mais de 30 anos. “A droga hoje é consumida nos ex-tremos da sociedade, tanto na classe mais baixa como nas es-feras da classe A”, diz.

A zona leste de São Paulo continua sendo o maior foco de origem dos usuários de drogas que procuram o Denarc (um total de 537 casos no ano passado), além de ter a maior incidência de crimes, segundo Elisabete Sato.

Outra característica do crack é que normalmente ele é feito do que profissionais da área chamam de “escalada”.

(5) "Folha de São Paulo - 07/março/1994

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“Nunca vi chegar aqui nenhum paciente que tivesse começado no

crack”, diz Flávia Garcia de Macedo, psicóloga e coordenadora da equipe técnica da Maxwell.

Experimentar crack já é um risco grande demais. Além da droga ser ilegal, oito em cada dez “experimentadores” se tor-nam dependentes. Marcelo (nome fictício), 23 anos, dependente em tratamento há 14 meses na Maxwell e já pronto para sair pela segunda vez - na primeira teve uma recaída -, concor-da: ”Ninguém tem controle com crack. A fissura é muito violenta”.

Crack: o vício é imediato (5)

O crack é resultado da mistura do bicarbonato de sódio

com pasta de cocaína. O produto final é uma pedra insolúvel em água que por isso é fumada em cachimbos ou até em copos plásticos utilizados como tal. Outra forma de consumo que vem crescendo entre os jovens é colocar a pedra de crack no ci-garro de maconha.

O crack atualmente é a droga que mais preocupa os espe-cialistas. Flávia Macedo, psicóloga do Instituto Maxwell, admite que ele cause dependência de forma mais imediata, mas avisa que o processo é inevitável com qualquer droga. “Todas são perigosas. Só que o crack é mais barato, além de ser con-sumido por uma população mais jovem em quantidades muito maiores”.

A delegada Elisabete Sato diz ter “preocupação social” com a questão do crack. Segundo suas pesquisas, na maioria

dos casos as vítimas vêm de famílias desetruturadas e elegem a droga como sua válvula de escape. Alberto Corazza completa: “O crack dá um ‘prazer de Cinderela’ - depois o mundo vira uma abóbora.”

Terapia exige esforço: Abandonar o crack não é fácil.

Como em qualquer outro caso de dependência, o tratamento significa abstinência total, de forma definitiva. “Saí daqui achando que estava bom. Cheguei lá fora e não aguentei. Agora eu sei que essa briga é para a vida toda”, diz Marcelo (todos os nomes de dependentes são fictícios). “O crack é o demô-nio”, diz Felipe, um paciente da Maxwell de 18 anos. “Fumo maconha desde os dez anos, mas o crack acabou comigo”. Para aguentar a ‘fissura’ (vontade de usar a droga) ele toca vio-

lão, escreve muito e faz exercícios. Ex-nadador, Alexandre, 16 anos, está na fase final de tratamento na Maxwell e pre-tende voltar a competir, trabalhar e estudar. “O crack foi minha gota d’água, fui para o fundo do poço”. Antes de acei-tar de vez o tratamento, ele fugiu várias vezes, chegando a fazer a pé metade do caminho de Atibaia ao Centro de São Pau-lo. “Meu pai morreu e ninguém me convence que a culpa não foi minha”, conta, explicando por que finalmente mudou de idéia.

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As perversas pedras de pó(6)

Em São Paulo o crack alucina quem o fuma, quem o vê e quem o combate pensando em guerra às drogas.

O negro Baralhão está com 55 quilos, mas já teve 62. Tem 39 anos, mas parece ter 50. Sentado num canto de calçada do centro de São Paulo, pega no bolso da calça o cachimbo e uma pedrinha parecida com lasca de queijo parmesão. (...) Bara-lhão pega um isqueiro, aquece a pedra e aspira fundo. Em me-nos de quinze segundos a cocaína chega ao seu cérebro e pro-voca uma forte constrição dos vasos. Tuiiiiinnnn. É a Luz, o Relâmpago, o Estalo. Seus olhos vidram, desliga-se. Coisa de um segundo. Baralhão move-se nervoso. Como se um comando ex-

terno ligasse ao mesmo tempo todas as conexões elétricas de um arranha-céu, da torradeira dos elevadores, a droga ordena a liberação de dopamina, o mais poderoso excitante do orga-nismo. Num edifício, tamanha sobrecarga queima os fusíveis e desliga o sistema. No cérebro as células protegem-se captu-rando de volta o excesso de dopamina, mas no de Baralhão a cocaína desligou essa válvula. Cada tragada é um novo estí-mulo, mas Tuin só na primeira. São dez minutos de êxtase. Absorvida a dose, falta dopamina nos circuitos e onde houve luz e movimento, há silêncio e escuridão. É a nóia. (...) Nóia vem de paranóia. Nela sucedem-se alguns minutos de alu-cinações (calçadas cravejadas de pedras, policiais entrando pelas janelas do décimo andar, baratas andando debaixo da pe-le) e a depressão provocada pela falta de dopamina nos cir-

cuitos químicos do cérebro. Ou a pessoa espera algumas horas e o sistema nervoso se reequilibra, ou queima outra pedra, estimula uma nova descarga e ascende de novo o edificio. Minutos depois ele se apaga. Nova nóia. Isso dura dias, até que, por mais pedras que restem, o cérebro já não tem mais dopamina. (...)

Ou o viciado larga a pedra ou troca de classe, para pior. Três versões do colapso do craqueiro:

(1) A do policial Alberto Corazza, dirigente do Denarc: “O sujeito começa a fumar mantendo os valores e os

hábitos da classe média, mas a droga toma conta da vida dele. Em pouco tempo, ele vira marginal. Rouba em casa para comprar

a droga.” (2) A do traficante Wesley, 17 anos: “Tem sujeito que tem emprego e trabalha certo. Começa a

fumar no fim de semana, depois de cuidar de todas as ‘responsas’. Depois começa a fumar de noite. Em quatro ou cinco meses ‘descabela’ e larga a ‘responsa’. Vi pouca gente largar a pedra.”

(6) "Revista VEJA - 04/maio/1994

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(3) A do ex-usuário Rogério, 40 anos, dez de profissão liberal, sentado num bar da classe média bonita de São Paulo:

“Eu fumava maconha desde os 18 anos. Fiquei desempregado

em maio do ano passado e em agosto um amigo mostrou uma pedra. Fumei e disse: “É isso que eu quero”. Dias depois fui buscar maconha e comprei três. Com três eu passava o dia sem pensar em emprego. Em setembro estava 4 quilos mais magro. Em outubro eu vendi o relógio e pipei três dias seguidos. Dias depois tive uma crise respiratória. Em novembro vendi a tele-visão, o rádio e algumas roupas. Passava o dia trancado e só comia frutas, leite, mel e aveia. Eu era respeitado na boca. Tinha crédito. Na nóia, achei que morreria na rua e a família descobriria tudo. Guardava as pedras atrás de uma tomada. Um

dia tinha gente em casa, saí com tudo em cima, subi numa árvore e fumei das 3 às 9 horas da noite. No fim do mês tinha perdido 12 quilos, dormia de olhos abertos e sentia dificul-dades em mexer os pés. Em dezembro fiquei sem dinheiro, as pernas perderam a sensibilidade abaixo da canela. Era parar ou morrer. Fumei mais duas vezes, joguei tudo fora e fui ao Hospital das Clínicas. Estava com o sistema nervoso devasta-do. Consegui emprego há um mês, vou para a cama às 10 horas, levanto às 6 e faço quatro horas de ginástica. Se o sujeito não tem formação, não sai. E, se tem e não o ajudam, também fica.”

Governo pode autorizar o uso médico da maconha(7)

Quem só esperava ouvir elogios à maconha a partir de órfãos da cultura hippie se surpreendeu. A maior autoridade sanitária do Brasil, o pesquisador paulista Elisaldo Carlini, professor do departamento de psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo, enalteceu os efeitos curativos da droga em plena Câmara dos Deputados.

O Secretário nacional de Vigilância Sanitária revelou que o Ministério da Saúde analisa a possibilidade de liberar para fins terapêuticos o principio ativo da maconha - o tetraidrocanabinol, ou THC.

A defesa oficial do alucinógeno aconteceu durante o seminário “Discriminalização das drogas: sim ou não?”.

Carlini mostrou que, em determinados tratamentos médicos, o THC pode ajudar os pacientes. “O THC se revelou uma das substâncias mais potentes para prevenir a náusea e o vômito causados pelo tratamento quimioterápico em pacientes com câncer”, diz Carlini. Há apenas outro uso médico recomendado para o THC hoje em dia. Essa substância é capaz de diminuir a pressão do líquido do globo ocular, o que ajuda no tratamento de glaucoma.

(7) "Revista VEJA - 7/junho/1995

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Dependentes de droga têm tratamento comunitário(8)

O tratamento em saúde mental e dependência química sofrem um grande preconceito em razão de um conjunto de estereótipos negativos criados ao seu redor. Identificar no alcoolismo e na dependência química, deformações de caráter e não doenças tratáveis, como realmente o são, é algo comum, assim como confundir o atendimento psiquiátrico com a aura repressiva dos velhos manicômios.

Para demonstrar que é possível enterrar essas imagens do passado, a Comunidade Terapêutica Doutor Bezerra de Menezes, localizada no Jardim Assunção, em São Bernardo do Campo (SP), propõe uma alternativa capaz de valorizar a capacidade

criativa, produtiva e de relacionamento das pessoas com problemas psiquiátricos e de dependência química. Do questionamento bem sucedido da metodologia ortodoxa da psiquiatria tradicional, surgiu o que hoje é o principal diferencial do Bezerra em relação às outras clínicas de recuperação: o conceito de comunidade terapêutica.

Comunidade terapêutica nada mais é que um método marcado pela ausência de hierarquia rígida e a intensa participação do paciente no destino de seu tratamento. O histórico de bons resultados atesta o êxito do conceito: pacientes vivendo em regime de comunidade, assumindo posição ativa diante do tratamento e compartilhando com a família o processo de recuperação apresentam, com toda certeza, maiores chances de reabilitação.

A dependência química é reconhecidamente um problema social com graves conseqüências para o individuo, sua família e empresas.

Conceitualmente, nada mais é que uma predisposição mórbida a desenvolver dependência a substâncias químicas: drogas, álcool e narcóticos, é entre outras alteradoras do estado de humor. Por isso, devem ser tratados como doença primária, crônica, progressiva e fatal.

Buscando recuperar o indivíduo físico, moral e espiritualmente, o Bezerra utiliza técnicas atuantes nos mecanismos de defesa e no sistema de auto-ilusão do dependente químico, levando-o a reconhecer as conseqüências nocivas do uso descontrolado de químicos. “O paciente tem que ser honesto com ele mesmo, ser responsável por seu tratamento

e, acima de tudo, ter consciência de que depende dele a sua recuperação”, avalia João Lourenço, médico psiquiatra do Bezerra.

Quando chega à Comunidade, o dependente passa pela avaliação de um consultor, que é um paciente químico em recuperação e que, portanto, sabe como ninguém avaliar se o individuo está pronto para o tratamento. Os 30 primeiros dias, chamado por João Lourenço de UTI do dependente químico, são extremamente importantes. Esta etapa de visa à

(8) "Folha Espirita" - março/1995

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desintoxição e recomposição das condições orgânicas do

indivíduo. Caso tenha algum problema orgânico, o paciente é enviado a um hospital para uma avaliação e tratamento e depois retorna ao Bezerra.

Em seguida são trabalhadas as esferas cognitivas, através de palestras sobre a natureza da doença; afetiva, onde são formados grupos que discutem sentimentos, realizam confrontos e se auto-ajudam a romper o bloqueio emocional; e espiritual, quando são reformulados valores ético-morais e aplicado o programa de 12 passos dos Alcoólatras Anônimos. “O que propomos é a revisão dos valores, independente da religião. Às vezes acontece de a pessoa ser espírita e ela percebe que se voltando ao Espiritismo, consegue rever mais esses itens”, conta Lourenço.

Ao ser internado, muitas vezes o paciente passa por

surtos psicóticos constantes e, nesse caso, é encaminhado ao Departamento de Psiquiatria até melhorar. “Isso deve ser feito porque cada dia do programa é importantíssimo. Melhorando, ele retorna ao Departamento de Dependência Química para seguir esse programa”, explica.

A segunda fase do tratamento é ambulatorial, que complementa a internação. Essa etapa dura três meses, com duas sessões semanais de quatro horas, onde o paciente acompanha palestras, participa de grupos de tarefa e de apoio terapêutico. Após a melhora nos aspectos clínicos e a conscientização sobre a doença, são feitos os grupos de apoio terapêutico, durante um ano. Também é possível participar da etapa ambulatorial dos pacientes que se encontram em grau de comprometimento que não justifique a internação.

O psiquiatra afirma que entre as drogas mais usadas hoje pelos dependentes químicos estão a cocaína, maconha, crack, álcool, calmantes, anfetaminas e moderadores de apetites. A grande maioria dos internos é masculina. Os jovens são dependentes em menor escala do álcool e muito mais das drogas.

Obsessão - Quanto a problemas de obsessão, Lourenço

explica que, nesses casos, nem sempre há obsessores assolando a vida do dependente químico. Segundo ele, na maioria das vezes o indivíduo acaba tendo o que se chama de obsessão oportunista, por ele estar entrando em uma série de desregramentos morais éticos, em função da doença. Muitas vezes, conforme disse, a pessoa já tem tendência para a

dependência química e o processo obsessivo vai desencadeando a doença. “O dependente químico sempre gosta de arrumar um culpado para os seus problemas. Por isso, mesmo que seja um caso de obsessão, nada dizemos. Se ele conseguir vivenciar os 12 passos dos Alcoólatras Anônimos estará fazendo a reforma íntima, que é a proposta do Espiritismo. Se melhorar nesse sentido, o obsessor vai acabar abandonando-o, se for o caso”, avaliou.

Descriminalização - A descriminalização das drogas tem

gerado opiniões diversas e correntes de opinião pró e contra

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a idéia. Para João Lourenço, existem duas coisas em relação à

dependência química: o tratamento da doença e a repressão ao tráfico, que considera itens completamente diferentes. Segundo ele, quem usa drogas às vezes faz o tráfico para conseguir a droga e é um doente também. Isso não significa que não possa responder por seus atos. “Tratamos de doentes que querem se tratar. O problema do tráfico e liberação das drogas me parece politico-administrativo. Acho que se houver a liberação as pessoas começarão a usá-la mais, novos casos aparecerão, pois a doença só se manifesta quando você tem a predisposição”, argumentou.

A procura dos vilões(10)

“A família é o culpado número 1. Não é à toa que praticamente todos os droga-dependentes relatam problemas em casa.

A criança mantém uma relação de dependência natural com os pais. A partir do momento em que, já na adolescência, essa relação se torna inadequada por esgotamento de carga afetiva, o jovem pode preferir trocá-la pela droga.

Enquanto a interdependência humana se transforma em autonomia pelo processo natural da adolescência, a droga-dependência compromete seriamente o desenvolvimento dessa autonomia.

Em termos de prevenção, a família tem um papel de grande responsabilidade, pois auxilia o jovem na elaboração de seus valores e conceitos, processo que prevê choques de opinião e conflitos.

O caráter de intimidade do relacionamento familiar faz da família palco ideal para a prática da argumentação, tornando o jovem mais firme em suas posturas e convicções. Sendo a droga um problema com que se convive atualmente, surgirá de forma espontânea e natural neste “tribunal familiar”, ensejando a melhor prevenção que existe: simplesmente falar sobre o assunto, sem sensacionalismo, pavor e preconceitos.

Os jovens que não tem a chance de dialogar em casa percorrem um caminho árduo e solitário na maturação de seus

conceitos. Sem a segurança de uma posição defendida pelos pais, estão muito mais vulneráveis às influências de outros jovens ou de ídolos, com quem se identificam na procura por segurança.

Traficantes: bode expiatório predileto - Finalmente as pessoas estão se convencendo de que a história do pipoqueiro que vende drogas na esquina do colégio não passa de folclore.

(10) "Prevenção de Drogas" - Dr. Roberto Wusthof - Ed. Brasiliense

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Ou, então, que o garotão ficou viciado porque pessoas mal

intencionadas misturaram drogas no refrigerante na festinha de 15 anos de sua namorada. No entanto, por mais que os fatos concretos demonstrem que o acesso dos jovens às drogas ocorre por meio de seus próprios colegas, existe ainda hoje uma super valorização do papel do traficante. Até certo ponto isso expressa um grande comodismo: transferir as responsabi-lidades de problema complexo e multifatorial para um único bode expiatório. É mais fácil para os pais condenar a organi-zação mafiosa do tráfico, que questionar a educação dada aos filhos. Além disso, ao se escandalizarem com a situação, desviam a atenção de seu próprio comportamento. Muitos colégios acreditam ser mais eficientes enfrentar as drogas com uma equipe de segurança vigiando ostensivamente os banheiros, pátios, lanchonetes e redondezas, que promover o

debate sobre o assunto. Limitar a disponibilidade da droga não deixa de ser um esforço válido dentro de um programa preventivo global. Deve ficar claro, no entanto, que toda ação policial não passa de medida paliativa, já que o objetivo principal ‚ a diminuição da demanda. Reduzir a procura da droga pelas pessoas é, sem dúvida, solução mais efetiva, tornando supérfluo o traficante.

O prazer é cego - É ponto pacífico que as drogas dão prazer aos seus consumidores, principalmente na fase inicial da aventura; mais tarde, quando acaba essa ‘lua de mel’, o de-pendente não consegue alcançar a mesma intensidade de prazer, intensificando e ampliando o uso da droga na esperança de reencontrar o efeito inicial. (...) A prevenção do uso de

drogas deve enfatizar aos jovens a grande contradição ideo-lógica implícita na droga-dependência. A maior parte dos droga-dependentes está na adolescência, em que ser criança é babaquice e ser adulto é ‘caretice’; o mundo é visto de maneira crítica, o que é ponto de partida de propostas novas e construtivas para a evolução dos sistema vigente. A cabeça dos jovens nessa fase é verdadeira fábrica de idéias, com preferência por tudo que vem colorido no tom da rebeldia. Superficialmente, a droga expressa rebeldia por excelência, mas ao mesmo tempo, desvitaliza a contestação na indiferença. O uso de drogas é um tremendo comodismo. Fracassando na tentativa de nadar contra a correnteza de um rio cujo sentido gostaria de alterar, os jovens adotam por lema a alienação. E empunham uma bandeira falsa e vazia: “nós nos drogamos porque

é bom”. É como se a droga sussurrasse aos seus ouvidos: “eu resolvo todos os seus problemas; eu crio para você um mundo fora da realidade, sem atritos, onde você será o rei; basta me consumir; experimente”. O tributo exigido por este mundo de sonho e fantasia é renúncia à liberdade. Mais cedo ou mais tarde, o drogado descobrirá que o sonho se transformou num pesadelo. ”

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AIDS: pacto com a morte(10)

“São os usuários de drogas endovenosas que estão engros-sando em proporções assustadoras as estatísticas da AIDS, a fatal síndrome da imunodeficiência adquirida.

Nenhum outro grupo de risco registrou um aumento tão explosivo. Todas as tentativas de prevenção entre os droga-dependentes tem se revelado um fracasso total. Por quê?

O grupo de risco constituído pelos homossexuais cons-cientizou-se com relação aos perigos da transmissão, adotando medidas profiláticas.

Enquanto isso, boa parte dos droga-dependentes que se picaram mostra indiferença, parecendo ignorar o problema, o

que provoca uma visível irritação por parte de autoridades da saúde pública. As campanhas elaboradas apelando para a razão dos envolvidos equivalem à tentativa de passar um filme para um grupo de cegos. Trata-se de esforço em vão.

O ponto intrigante é uma grave carência da vontade de viver. Quem não ama a vida apresenta um comprometimento do impulso da auto-preservação. Talvez seja por isso que os drogados estejam ignorando o risco de se contaminar com o vírus da AIDS. A doença encaixa-se perfeitamente no projeto de morte que comanda o droga-dependente.

Prevenir a AIDS entre os drogados, no fundo, é a própria prevenção às drogas e consiste na tentativa de transformar esse projeto de morte em projeto de vida.

As pseudo-soluções, como a distribuição de seringas e

agulhas descartáveis, não deixam de ter a sua validade, porém, não atacam o problema em sua essência. ” Como se transmite a AIDS através das drogas endovenosas:(11)

(1) A cocaína (ou heroína) injetada costuma ser usada em grupo. Os usuários formam uma roda para a “sessão de pico”.

(2) A droga é diluída em água e colocada na seringa. Uma

pessoa usa a seringa para “puxar” o sangue. (3) O sangue se mistura à droga. Se a pessoa estiver

contaminada, o HIV (vírus da AIDS) está no sangue que foi para dentro da seringa e no sangue que ficou na agulha.

(4) A seringa é passada para outras pessoas, que vão

injetar o sangue misturado com a droga em suas veias. O sangue contendo o HIV penetra nas veias das pessoas, que vai se contaminar.

(10) "Prevenção de Drogas" - Dr. Roberto Wusthof - Ed. Brasiliense (11) "Folha de São Paulo - 24/abril/1995

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Alcoolismo na adolescência(12)

“Abuso de álcool pode ser identificado pelas perdas. O adolescente começa a perder a memória, a capacidade de concentração, os raciocínios abstratos, fica com mania de perseguição e agressivo.

Se não for tratado, só vai ganhar uma coisa na idade adulta: cirrose, uma das 350 doenças causadas ou agravadas pelo consumo abusivo de álcool.

É por causa dessas perdas que a escola vai se tornando insuportável. A grande maioria adolescente, viciada em álcool, já repetiu de ano pelo menos uma vez e acabaram abandonando a escola. Repete-se de ano porque o adolescente perde a capacidade de associar.

Não há uma medida padrão para se aferir quando um jovem começa a ter problemas com bebidas. Cada organismo absorve álcool de uma maneira e os problemas podem aflorar com um copo de cerveja ou dez de vodka.

O melhor método para se detectar um alcoólatra em potencial, segundo os psiquiatras, é observar seu comportamento, principalmente a agressividade e a perda de memória.

O principal problema não é a dependência, quando o corpo exige álcool todos os dias. É o descontrole. O adolescente já tem uma tendência a ser impulsivo e com o álcool acha que é onipotente, que nada acontecerá com ele. ”

Vejamos o depoimento da adolescente Cynthia Lorena Han-

sen, 20 anos, mora em Heliodoro, sul de Minas. Seu pai é fazendeiro e alcoólatra. Ela seguiu o pai. Só parou o vício, após cortar os dois pulsos:(12)

“Dei meu primeiro gole aos 14 anos. Não foi bem um gole.

Foi um porre. Tomei cinco copos de cuba. Foi muito rápido para mim: me acabei em seis anos.

Eu era super-insegura, me achava péssima, feia. Com álcool estava tudo resolvido. Virava super-mulher, vinha uma sensação de grandeza, ficava linda, inteligente.

No inicio, bebia no fim-de-semana. Tomava cerveja, cuba, uísque. Comecei a faltar nas aulas. Na sexta-feira não ia porque saía para beber. Na segunda-feira faltava porque tinha ressaca.

Para complicar, fui morar sozinha em Pouso Alegre (MG) com 14 anos. Só queria fazer festa. O álcool foi o pó de pirlimpimpim.

Tomei bomba na escola, voltei a morar com os pais, mas continuava bebendo. Enchia a cara a noite inteira e ia à escola sem dormir. Com 16 anos eu tomava um litro de rum e muita cerveja.

(12) "Folha de São Paulo - 19/março/95

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Aos 17 anos, começou a dependência. Quando o bar

fechava, eu ficava desesperada, ia para a zona de prostituição. Lá os bares fechavam às 6h, 7h da manhã.

Fazia tudo por álcool. Roubava dinheiro em casa, na pensão, vendia minhas roupas. Roubei dois litros de uísque num hotel.

Aos 18, fui morar com um alcoólatra e comecei a beber de manhã. No fim do ano passado bebia dois litros de uísque por dia e muita cerveja. Quando não tinha dinheiro para uísque, tomava cachaça. Morava com um amigo que acordava à noite para beber.

Tinha muito apagamento, não lembrava de nada. Batia o carro, passava mal, vomitava, dizia que ia parar, mas depois sentia falta. Nunca tive tremedeira porque bebia sempre. Tinha só dores de estômago e de garganta.

Bêbado não tem vida afetiva. Eu usava as pessoas para beber. Pensava: “Aquele gato tem grana. Vou fazer ele pagar um uísque para mim”. Tenho medo de ter AIDS. Fiz o teste e vou ver o resultado no próximo mês. Eu quase nunca transava com camisinha.

Em agosto do ano passado cheguei ao fundo do poço. Tinha me separado de um cara de 35 anos, alcoólatra. Em julho, meu pai tinha me expulsado de casa.

Morava com uma galera e todo mundo bebia muito. Eu que-ria morrer e reencarnar melhor.

Tentei o suicídio tomando Lexotan e cuba. Tomei um Lexo-tan e bebi uma 15 cubas. Fiquei tão bêbada que peguei a caixa de Lexotan e tomei mais nove comprimidos. Quebrei um Presto-barba e cortei os dois pulsos. Doía muito, mas achava que

qualquer coisa era melhor do que a vida. Espirrou sangue no espelho do banheiro, no chão, na

minha roupa. Desmaiei no quarto e meus amigos chamaram um médico.

Voltei para a casa da minha família e foi a primeira vez que eu e meu pai conversamos. Ele falava antes, mas não adiantava: eu achava que não era alcoólatra.

Fui internada numa clínica no dia 12 de agosto de l994. Acho que isso é hereditário. Meu pai, minha mãe e meus tios eram alcoólatras. Meu avô morreu bêbado.

Passei muita vontade de beber na clínica. A irmandade segue os 12 passos dos Alcoólatras Anônimos e me salvou. Descobri que sou mais bacana sem álcool.

Não adianta só tapar a garrafa. Estou aprendendo a

viver. Troquei o álcool por espiritualidade. Você só pára depois de muitas perdas. Perdi tudo, perdi quase a vida. ”

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Escapando do vício(10)

“Julgo oportuno abordar, em pinceladas, a questão do tratamento dos drogados.

É o momento em que se pode ressaltar a importância do apoio da família, dos amigos e dos colegas. Afinal, aquelas que consomem drogas são gente como a gente.

Preconceitos e rejeição só agravam uma situação proble-mática e delicada. Se quisermos resgatar os amigos que se perderam no mundo das drogas e do álcool, precisamos ofere-cer-lhes nossa presença e nosso apoio, de modo que eles en-contrem alguém com quem possa conversar, que os compreenda e que lhes mostre que o caminho da felicidade não passa pelas drogas.

O primeiro passo para iniciar um tratamento é que o

individuo admita que o problema da dependência existe. A maior parte dos droga-dependentes, por um distúrbio na capacidade de julgamento, acredita ser capaz de largar as drogas no momento em que tiver vontade. Na realidade, em muitos casos, isto não passa de uma ilusão.

Questão extremamente polêmica é se o inicio do trata-mento deve ou não estar condicionado à vontade pessoal do dependente. O professor Claude Olievenstein, do Centre Medi-cal Marmottan (Paris), coloca como condições básicas para o tratamento, em sua Instituição, a voluntariedade, o anonimato e a gratuidade.

Sem dúvida, quando o dependente procura ajuda terapêu-tica por decisão própria, temos um ponto de partida mais po-sitivo, com prognóstico provavelmente mais promissor. Vários

outros autores observam também que o próprio indivíduo, cujo tratamento fora iniciado contra a sua vontade, mudou de opi-nião após alguns dias, manifestando-se favorável ao fato de terceiros terem tomado a decisão por ele. Isto demonstra que em geral o droga-dependente perde o senso crítico para ava-liar a própria situação.

O tratamento é feito preferencialmente em regime ambula-torial, pois permite que durante a terapia o dependente con-viva com o seu meio e, portanto com os seus problemas. A in-ternação é sinônimo de afastamento do contexto psico-social, forçando o dependente a passar um período crítico de reinte-gração após a sua volta, o que explica, em parte, a elevada reincidência no uso de drogas. A família, quase sempre, depo-sita toda a esperança na internação, numa clara fuga do pro-

blema e da responsabilidade. Justamente a participação ativa da família é um dos fatores principais para o sucesso da recuperação.

Recomenda-se que o paciente seja abordado por uma equipe multidisciplinar: médico psiquiatra, psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, nutricionista e enfermeira. As indicações para internação hospitalar são principalmente: grave síndrome de abstinência a exigir tratamento clínico, risco iminente de suicídio e o aparecimento de quadros psicó-

(10) "Prevenção de Drogas" - Dr. Roberto Wusthof - Ed. Brasiliense

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ticos. A desintoxicação é a parte mais simples desta caminha-

da longa e árdua que é o regresso das drogas. Há muitos obstáculos e abismos no caminho e as taxas de recuperação não são propriamente animadoras.

Por essa razão, boa parte dos terapeutas que lidam com droga-dependentes vivem em constante questionamento sobre a validade de seu trabalho e experimenta nítida sensação de impotência. Para que sua equipe não desanimasse, o psiquiatra paulista Wilson Roberto Gonzaga da Costa, que admiro, sempre dizia: “um é infinita vezes maior que zero”.

“Dados da Organização Mundial da Saúde alertam que 3 milhões de pessoas morrem por ano em conseqüência do fumo. Basta fi-car perto para estar ameaçado. Nos Estados Unidos, morrem to-do o ano mais de 53 mil não fumantes afetados pelos efeitos

nocivos do cigarro. São chamados ‘fumantes passivos’. O fumo provoca nessas pessoas doenças cardíacas, câncer no pulmão e outros tipos de câncer. O fumo mata precocemente 50% dos fu-mantes. E o mais impressionante é que mata também quem jamais colocou um cigarro na boca”.(*)

A estratégia contra a droga(4)

A adolescência, quando não bem amparada pelos pais, é acompanhada de sofrimento, contradições e muita confusão.

O impacto que o jovem sofre quando tenta entrar no am-biente do adulto é muito grande. Sobrevêm empecilhos, atrapa-

lhando a sua entrada na sociedade adulta e implicando em si-tuações desastrosas, que devem ser percebidos precocemente e corrigidos com amor.

Frente a uma sociedade difícil, incompreensiva, às vezes hostil, o adolescente reage, e tenta modificá-la levando em conta as suas próprias transformações. Surge daí conflitos cujas raízes estão nas dificuldades que encontra em ingressar nesse mundo, somadas às dificuldades do adulto em dar passa-gem a essa nova geração que lhe faz críticas e tenta mudar os seus valores.

Existe um impulso de busca e ao mesmo tempo um temor do desconhecido. Nessas condições, o jovem percebe que não é mais criança e sente que o solicitam como adulto. Não conse-gue, de forma clara e tranqüila, enfrentar a sua insegurança

nos momentos que é colocado em evidência. Transparece, então, a timidez, a agressividade, o desleixo, a gozação ... chega a ser inoportuno.

Sob essas condições de fragilidade, pode o jovem ser abordado por algo que lhe deixa mais extrovertido, mais fa-lante e que lhe promete a euforia - a droga.

Os jornais e revistas comentam freqüentes histórias de jovens que tropeçaram nas drogas e se deram mal. A promessa

(*) Texto extraído da Campanha anti-fumo da Prefeitura de São Paulo (4) Extraído da "Folha Espírita" - Março/1995

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de bem-estar ‚ fugaz e enganosa. Em pouco tempo, o viciado

conhece o inferno interior, cuja porta de saída vai se tor-nando cada vez mais distante.

Os governantes e a sociedade refletem: o que fazer para combater uso de tóxicos que incapacita o jovem para a vida escolar, para a vida familiar e em sociedade?

Muitos sugerem a legalização como solução para o drama dos usuários. Mas legalizar o consumo de drogas corresponde a deixar à mostra medicamentos para uma criança de 2 ou 3 anos de idade. Por um descuido dos familiares, ingere o vidro todo de remédio e acaba num pronto socorro apresentando um quadro de intoxicação grave. Por isso, a não proibição ao consumo de droga, propiciaria a incapacitação física e mental de uma presa fácil - o adolescente.

A prevenção ainda é o melhor caminho. A juventude de

hoje está melhor do que em anos anteriores. É o que revelou a pesquisa publicada pelo Cebrid - Centro Brasileiro de Infor-mações sobre Drogas Psicotrópicas - informando que estudantes do primeiro e segundo graus entrevistados no final de 1993, quanto à experimentação de drogas, apresentavam, em torno de 5 pontos percentuais a menos em relação aos entrevistados de l989. A pesquisa também revelou que a introdução de drogas começa, atualmente, na faixa dos 10 a 12 anos. Isto sugere que a prevenção deve começar numa idade mais precoce, in-cluindo aulas de esclarecimentos aos pais.

Portanto, temos que dizer não a legalização das drogas, porque nos basta o exemplo do consumo da bebida alcoólica e do cigarro. O Cebrid confirma, por pesquisa, que a droga mais consumida pelos jovens na atualidade é o álcool.

Entendendo o filho nas suas necessidades íntimas e in-troduzindo diálogos freqüentes e princípios religiosos, en-contrar-se-á na prevenção contra as drogas o fortalecimento do jovem, mostrando ser este o meio mais digno de se educar.

A droga nos rituais religiosos

“Os efeitos psicotrópicos das drogas, rompendo as fron-teiras do limitado mundo concreto, têm fascinado os homens há séculos. O acesso a esferas transcendentais sempre esteve ga-rantido pelos poderes da farmacologia; as ‘viagens químicas’ encontraram amplo respaldo nos valores religiosos e culturais

das antigas civilizações. Muitos tentam justificar a atual onda de drogas como uma continuação de seu uso no passado. Que as drogas não são nenhuma novidade é certo, porém, seu consumo, hoje, tem conotação completamente diferente.

Em primeiro lugar, perdeu-se o uso ritual de drogas, cujas regras limitavam o consumo às pessoas preparadas para as experiências supra-sensoriais (sacerdotes, por ex.)”(10)

“Cogumelos alucinógenos foram usados pelos sacerdotes do povo asteca e ainda são usados pelos índios mexicanos em ce-

(10) "Prevenção de Drogas" - Dr. Roberto Wusthof - Ed. Brasiliense

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rimônias religiosas; são chamados de teonanacati, que signi-

fica ‘carne de deus’.Os efeitos alucinógenos são interpreta-dos como mensagens dos deuses. O ritual religioso como que ‘contém’ os efeitos da droga sobre a mente; assim contidos, os efeitos vão ter a função social que lhes é atribuída. O individuo toma a droga não para ele, mas para cumprir o papel para o qual foi designado pelo seu grupo. Este tem função de-terminadora de onde, quanto, quando e porque a droga vai ser usada. O significado do uso das drogas dentro dos ‘ritos de passagem’, como é a iniciação para a vida adulta, está colo-cada de uma forma muito clara e bonita num diálogo que se deu entre um etnólogo, Georg J. Sietz, e um jovem índio da tribo dos Karauetari, aparentado culturalmente dos yanomani, que vivem na região amazônica, em área fronteiriça entre Brasil e a Venezuela:

- Você também aspira epena? (obs: epena é um alucinógeno) - Não! Não posso aspirar ainda. Sou muito jovem. - Quando você terá idade para isso? - Não sei. Mas acho que logo. - Quem decide a esse respeito? - Meu pai. Ele me ensina tudo relacionado com o pó epe-

na, e eu também já sei o que acontecerá quando aspirar o pó. - E o que acontece? - Pode-se ver os hukala, os homens grandes que moram em

grandes cabanas, lá em cima (e ele aponta em direção ao céu) O pó me torna tão alto que posso alcançá-los e falar com eles.

- E o que você quer conversar com eles? - Posso pedir-lhes para que me ajudem nas caçadas, para

que eu encontre animais grandes. E quando aspiro epena, sin-to-me forte, muito mais forte dos que aqueles que não têm o

pó “(9)

“O pediatra Luiz Alberto Chaves de Oliveira dá alguns sinais de alerta aos pais, para saber se seu filho está usando dro-

(9) "O que é Toxicomania" - Dra Jandira Masur - Ed. Brasiliense.

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gas. Desconfie se o adolescente mudar de atitude de repente.

O isolamento (longos períodos trancados no quarto), queda do rendimento escolar, mudança de sono e no apetite podem ser sintomas. O uso de crack e cocaína levam a um emagrecimento. Já a maconha aumenta a fome, principalmente por doces. A principal indicação, de que seu filho pode ser um viciado em drogas, é a brusca variação no humor, afetada por crises de irritação, intolerância e agressividade. Mesmo com esses indícios, não se precipite em tirar conclusões apressadas: consulte antes um especialista. ”(*)

(*) "Folha de São Paulo" - 18/junho/95

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Desencarne por overdose(13)

CASO (1):

“Ao nos aproximarmos de uma casa, ouvimos terrível ba-rulho, as luzes acendiam e apagavam, parecia o primeiro um-bral. Na porta, uma guarda de espíritos mal encarados. Os Lanceiros se acercaram deles para que nós entrássemos. Jovens de boa família eram os freqüentadores daquele local. Deitados no chão, muitos deles usavam o corpo das garotas para aspirar

o pó, uma verdadeira orgia. Todos nós prestávamos auxílio, dispersando os fluidos pesados daquele grupo, quando perce-bemos uma garota de seus 18 anos debatendo-se em convulsões; os médicos dela se acercavam mas, ao tentarem socorrê-la, ela foi presa pela organização das trevas que, como loucos, se apossaram do corpo da jovem. Na nossa frente, espíritos trevosos apossavam-se dos seus fluidos vitais e arrebentavam as ligações dos seus corpos. Seu espírito, dementado, jogava para lá e para cá o corpo que se debatia entre a vida e a morte.

Quis correr para junto de Suzane, mas fui contido por Rayto que alertou:

- Lembre-se de que estamos aqui para ver como ocorrem os

desencarnes forçados. Já estivemos no Vale, onde uma organi-zação vive como se encarnada fosse.

- Mas vamos deixar esta menina ser vampirizada? - Sim, respondeu-me. - Não compreendo... - Compreende sim, estamos aqui estudando um meio de des-

truir esta organização.

Calei-me apavorado. Ninguém pode imaginar o que seja um

desencarne por overdose. A língua estava para fora e daquela boca adolescente, vários vampiros se aproveitavam das emana-ções dos tóxicos. A agonia da jovem durou cerca de quatro ho-ras. Alguns espíritos trevosos que não aspiravam o corpo fa-ziam o serviço de desencarne de maneira bastante precária.

Enquanto os encarnados lentamente tentavam tirá-la dali, a equipe trevosa apoderou-se dos corpos físicos, duplo eté-rico e perispiritual. E a jovem, que deixara de viver na matéria encontrava-se em estado desesperador na

(13) "Driblando a dor" - de Luiz Sérgio através de Irene Pacheco Machado

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espiritualidade, porque mesmo “pirada”, tinha relances da

realidade que estava vivendo. Aquela equipe tentava usar as energias dos chacras; primeiro a ser visitado pelas mãos ávidas dos trevosos foi o coronário. No cérebro, eles buscavam a substância cinzenta e ali encontraram grandes concentrações de corpos, os neurônios. Notamos que eles usaram a substância branca, esta eles separaram. Na cinzenta está a sede das atividades intelectuais e sensoriais da pessoa. Utilizando-se de aparelhos, eles trabalhavam nos corpos da menina. Nós apenas observávamos. Confesso que já me encontrava nervoso.

Enquanto isso, o corpo físico da garota esperava que seus colegas lhe dessem um fim. Na parte espiritual, uma equipe trevosa lhe sugava as energias chegando até a medula espinhal. Vimos a sede dos reflexos mais simples, e órgão de

passagem das impressões, que estão indo da periferia aos centros nervosos, e das ordens motoras que partem dos centros cerebrais e que estão indo aos músculos. E ali, na primeira e na segunda vértebra lombar, eles buscavam um líquido que guardavam com cuidado.

Os corpos da jovem eram analisados pela equipe trevosa e a garota, em pânico gritava muito.

Quando percebemos, eles já estavam trabalhando no chacra básico. Esse chacra apresentava a cor rosa - alaranjada e ali eles buscavam algo, que não encontraram, isso se denotava por suas fisionomias fechadas. Quando iam buscar outras energias, Sara, com o seu aparelho, interferiu no deles, o que fez com que desconfiassem. Olharam ao redor, mas mesmo assim levaram o espírito de Suzane, enquanto os jovens se livraram do corpo

físico, jogando-o num lugar sombrio. Nós seguimos a equipe protegida pela Espiritualidade superior, que nos tornou invi-síveis aos olhos deles.

E assim voltamos ao Vale, onde testemunhamos o que espe-ra um viciado em tóxicos. Entramos, não pelo portão princi-pal, mas sim por outro local somente do conhecimento da equi-pe da Espiritualidade superior. Estávamos agora em um quarto, que mais parecia uma sala cirúrgica, com vários aparelhos; a garota foi colocada na mesa. Na hora em que isto ocorreu, buscamos o corpo físico e estava sendo devorado por outros espíritos, que nele bebiam o tóxico, o coquetel de drogas. Mesmo no Vale, ela sentia a profanação do seu corpo e gritava desesperadamente.

De repente, vimos entrar o chefe; devia ser um técnico,

pois era conhecedor do assunto. Foi direto na corrente san-guínea e retirou tudo o que desejava.

- O que faremos com ela? perguntaram. - Deixe-a aí, talvez eu precise dela. Risadas soaram. Só o nosso grupo desejava chorar. Não é

fácil presenciar o que presenciamos.

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- Como é possível isto acontecer, Enoque? Por que não

fazemos alguma coisa? - Simplesmente porque, para salvar muitos, temos que

conhecer melhor este lugar. - Mas, coitada, nas mãos desses loucos ela vai sofrer

demais. Nada podemos fazer, então? - Nada, por agora. Olhe a ficha dessa garota: Suzane aos

12 anos: a primeira experiência sexual; aos 14 anos: o pri-meiro aborto; aos 15 anos: o segundo aborto; conhecedora de maconha desde os 10 anos, consumidora de coca, pico e compri-midos desde os 13 anos. Iniciadora de várias colegas. Agrediu a mãe com 17 anos, quebrando-lhe o braço. O pai sofreu enfar-

te, porque Suzane foi presa por furto. Tentou viciar o irmão de 9 anos. Tentou estrangular a avó, porque não lhe deu di-nheiro...

- Chega! falei. Mas mesmo assim gostaria de ajudá-la. - Vamos sim, Sérgio, mas não agora. - O que quis dizer o chefe, que pode precisar da menina? - Para satisfazer os seus instintos sexuais. - O que? Isso não, então não podemos deixá-la aqui!

- Sossegue. Por enquanto estamos só acompanhando o caso, logo estaremos prestando ajuda. ”

CASO (2):

“ (...) Nisso, Marquinho caiu em convulsão. (...)E foi nesse momento que entrou a equipe trevosa. Ouvi um deles dizer:

- Estênio, o cara está mais que doidão, está completa-

mente louco! O chefe daquele grupo colocou as mãos sobre a fronte do

moribundo, revigorando os lobos frontais e acelerando o cha-cra coronário, buscando o comando das forças do duplo etéri-co, que interliga o perispírito com o corpo físico. Em segui-da, regulou cada centro de força Eu me desesperei, porque o nosso grupo não entrava em ação. Notei que Sara filmava a cena e tentei concentrar-me para melhor compreender aquela

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situação. A operação foi feita no perispirito, mas mesmo as-

sim os chacras do duplo e do físico também foram tocados pe-los irmãos da equipe trevosa. Em desencarnes normais, é nesse instante que o Espírito se eleva até a massa fluídica e é desprendida da matéria. Com esse irmão o fato se deu ao con-trário: presenciamos uma nuvem escura e lodosa envolver o espírito, que desencarnava completamente atordoado. Notamos que a equipe não lhe dava passes, talvez por não conhecer profundamente a ação magnética. Esse grupo me pareceu desejar ativar o sistema nervoso, enquanto uma equipe socorrista do Departamento de Desencarne normalmente isola todo o sistema nervoso, oferecendo magnetismo espiritual, que dispersa o magnetismo dos centros de força, separando as partes elétri-cas. Nesse caso, deu-se o inverso: os trevosos ativaram os chacras e atuaram à altura de cada um deles, como se desejan-

do reviver os movimentos físicos, por parte do moribundo, an-siosos por tê-lo desperto.

- Carlos, esclarece-me uma coisa: sabemos que nas mortes

violentas e nos suicídios, os técnicos da espiritualidade so-correm depois da morte física, e aqui o físico ainda vive, mas essa equipe já está desligando os centros de força. Por que?

- Preste bastante atenção, Luiz Sérgio, e saberá porque

eles procuram esses corpos. Vi, então, os espíritos trevosos buscarem no abdômen um

líquido leitoso que saía do umbigo do corpo físico e corria

para o períspirito, mas ao invés do perispirito, um dos es-píritos da equipe se colava na frente e era ele quem absorvia a substância. O perispirito do moribundo juntou-se ao físico em vez de deixá-lo. Sentimos que aquele jovem iria presenciar até mesmo a decomposição do seu corpo físico. Enquanto isso, os trevosos tiravam todas as energias dos corpos e o jovem gritava, asfixiado. ”

“Recordei-me de uma aula sobre a destruição do corpo etéreo. A grandeza divina concede ao Espírito uma veste semi-material, feita do fluido universal, e esta veste, se bem tratada, permite que voltemos bem vestidos para o mundo

espiritual, mas se a destruímos, voltaremos com ela em farrapos. Quantos Espíritos destroem o seu laço fluídico, que nada mais é do que uma expansão do seu perispírito, através do suicídio consciente ou inconsciente! O perispírito também se renova, se aprimora, atendendo à evolução, mas igualmente é destruído, quando não temos uma vida digna. Ele vai ficando remendado, isto é, enfraquecido, e até se deforma.”(13)

(13) "Driblando a dor" - Luiz Sérgio - através de Irene Pacheco Machado

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Tratamento do drogado(13)

“O tratamento do drogado não é um tratamento médico no sentido estrito do termo, tão pouco a dependência de drogas uma doença.

Temos de buscar as causas, os motivos que levaram o jo-vem a consumir tóxico.

O tratamento deve ser feito por bons profissionais e os pais de um dependente devem ir, a seu turno, ao fundo do poço para salvar seu filho.

Desejar que o tempo resolva ‚ descaso e talvez o tempo seja curto para a salvação.

Um grama de tóxico no organismo é morte certa das célu-

las nervosas. A família deve viver alerta, pois seu filho pode estar

sendo usuário do tóxico e nesse estágio é bom você lhe esten-der as mãos.

Por isso, devemos tratar um toxicômano, ou simples usuá-rio, com a ajuda da Psicanálise.

Muitas vezes a família deseja que o psicólogo opere mi-lagres, mas não contribui para a cura do viciado. Uma família sã é mais fácil de cooperar com o profissional, mas muitas vezes o psicólogo tem de curar antes a família para depois chegar ao individuo drogado.

Muitos pais demoram a aceitar a dependência, o vício, e para salvar o filho iniciam com as agressões. Em protesto, o filho agride e é cada vez mais agredido.

A família, quando se deparar com filhos problemáticos, deverá não só buscar apoio profissional, mas também se auto-analisar, porque na maioria das vezes o erro vem da educação do individuo. O psicanalista tem de buscar a causa nas raízes profundas da alma. Se um dependente de droga desejar agredir a sociedade, esta agressão não é gratuita.

Quem descobrir que seu filho é viciado, tudo deve fazer para mudar o ambiente familiar. O pai tem de voltar a ser o herói da época infantil, a mãe o ninho de amor que o aconche-ga nas horas de tormenta. Se não for assim, o filho viverá distante da sociedade e a família sentirá ainda mais a sua ausência.

(13) "Driblando a dor" - de Luiz Sérgio através de Irene Pacheco Machado

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Fontes bibliográficas utilizadas como pesquisa

1. Revista espírita Allan Kardec - julho/93.

2. "Família e Espiritismo" - Miltes Aparecida Bonna - Edições U.S.E.

3. "Prevenção de Drogas" - Dr. Roberto Wusthof - Ed. Brasiliense

4. Revista VEJA de 01/fev/1995

5. "O que é Toxicomania" - Dra Jandira Masur - Ed. Brasiliense

6. "Folha de São Paulo - 07/março/1994

7. "Driblando a dor" - de Luiz Sérgio através de Irene Pacheco Machado

8. "Folha Espírita" - Março/1995

Rubens Santini ([email protected])

Distribuição gratuita. Não é permitida a sua venda. A cópia é permitida para distribuição gratuita. São Paulo, junho 1995

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