12
1 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI A obra completa de Jacques Tati pela primeira vez em Portugal em VERSÕES DIGITAIS RESTAURADAS

EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

  • Upload
    doquynh

  • View
    216

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

1VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

VERÃO EM FESTA COMJACQUES TATI

A obra completa de Jacques Tatipela primeira vez em Portugal em

VERSÕES DIGITAIS RESTAURADAS

Page 2: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

ELOGIO DE TATIpor Serge Daney

Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo: 1) um momento na obra de Jacques Tati; 2) um momento na história do cinema francês; 3) um momento na história do cinema. Desde 1948, os seus seis filmes são talvez os que pontuam mais profundamente a nossa história. Tati não é só um cineasta raro, autor de poucos filmes, aliás todos bons; é, vivo, um ponto de referência. Todos nós pertencemos a um período do cinema de Tati: assim, eu pertenço àquele que vai de Mon Oncle (1958: um ano antes da Nouvelle Vague) a Playtime (1967: um ano antes dos acontecimentos de Maio 68). Apenas Chaplin, a partir do sonoro, teve esse privilégio: estar presente mesmo quando não filmava e, quando filmava, estar à hora exacta, quer dizer um pouco adiantado. Tati: antes de mais uma testemunha.

[…] Se olharmos em perspectiva para os seis filmes realizados por Tati desde 1948 (Jour de Fête), percebemos que eles traçam uma linha de fuga que é, mais coisa menos coisa, a do cinema francês do pós-guerra. […] Quem é que ainda hoje é capaz de isolar, de mimar, os gestos mais quotidianos (o de um criado de café a servir à mesa), e, ao mesmo tempo, de falar da concepção de Playtime como se se tratasse de uma tela de Mondrian? Tati, evidentemente. Além disso, cada um dos seus filmes é um marco-testemunho de “como vão as coisas” no cinema francês de há trinta anos para cá. Se Jour de Fête testemunha da euforia do pós-guerra, se Les Vacances e Mon Oncle da aparente perenidade de um género muito francês (a sátira social) no quadro do “cinema de qualidade”, Playtime, grande filme antecipador, constrói a Défense antes da existência da Défense, mas diz também que o cinema francês já não pode tratar o gigantismo da realidade francesa, que perde terreno nela e que, como ela, vai degradar--se ao abrir à internacionalização, ou seja à americanização, a que já ameaçava o carteiro de Jour de Fête. Efectivamente, os dois filmes seguintes já não são nem inteiramente franceses (Trafic é uma co-produção, um filme muito “europeu”), nem inteiramente cinema (Paradeé uma encomenda da televisão sueca).

Evidentemente, Tati não é apenas a testemunha exemplar e desolada do recuo do cinema francês e da degradação do ofício (ainda que cada um dos seus filmes seja como um documentário, uma perspectiva abissal das suas condições de possibilidade). Ele toma o cinema nas condições em que o encontra (tecnologicamente também) e curiosamente, ele que tantas vezes foi acusado de passadismo, não pensa senão em inovar. Começamos a saber que Tati não esperou por ninguém para repensar ex nihilo, a partir de Jour de Fête, a banda sonora do cinema, mas sabemos que no outro extremo da cadeia, quase trinta anos mais tarde, Parade (escandalosamente ignorado quando da estreia, pelos “Cahiers” também) é uma extraordinária exploração no domínio do vídeo. Na verdade, o grande tema dos filmes de Tati, através dos avatares da produção (ou graças a eles), é aquilo a que chamamos hoje com uma certa facilidade os media. Não no sentido restrito dos “grandes meios de informação”, mas no sentido, mais próximo de McLuhan, das “extensões especializadas das faculdades mentais ou psíquicas do homem”, dos prolongamentos do seu corpo no todo ou em parte. Os media, são já, por excelência a história de Jour de Fête, em que um carteiro, à força de refinar na transmissão da mensagem, a perde (é uma criança que a herda, mas desviada pelo caminho por um circo, não a irá transmitir: bela metáfora da intransitividade da arte moderna), no momento em que o espectador tiver compreendido que a mensagem é ele, o carteiro, Tati. Mas os media são também o fogo-de--artifício lançado cedo de mais e por engano no fim de Vacances e que transformava Hulot em espantalho luminoso, prefigurando o fim genial de Parade em que cada um – seja quem for – se torna rasto luminoso de uma cor numa paisagem electrónica (numa entrevista, Tati explica que tinha substituído os pinos dos malabaristas por pincéis). E os media eram também, em Mon Oncle, esse parti-pris muito surpreendente para a época de não fazer rir à custa dos programas de televisão comprada pelo casal, mas de reduzir essa televisão ao espectáculo das variações de luz fria e baça iluminando o jardim ridículo.A lista não tem fim e poderiam citar-se cem outros exemplos.

Page 3: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

3VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

O essencial é que haja a todo o momento e para qualquer um (numa espécie de democratização do cómico que é a grande aposta dos últimos três filmes de Tati e sem dúvida o reconhecimento de que todos nos tornámos, pouco a pouco, cómicos) uma possibilidade de tornar-se medium. Do porteiro de Playtime que, com o vidro partido, se transforma na porta toda, à criada aterrorizada com a ideia de passar sob o raio electrónico que abre a porta da garagem onde os portões se fecharam estupidamente (Mon Oncle), há para os corpos (numa indiferenciação crescente) a possibilidade (a ameaça?) de se tornarem por sua vez um limite, um limiar. in Cahiers du Cinéma, nº303, Setembro de 1979,incluído no catálogo Jacques Tati,editado pela Cinemateca Portuguesa, 1987Tradução de Vera Futscher Pereira

Sobre o cinema e os “gags” tinha Jacques Tati ideias bastante precisas. “A possibilidade de abrir uma varanda sobre a vida e de fazer conhecer todas as riquezas da existência dos homens é uma das finalidades do cinema”, disse, um dia, o cineasta de origem russa nascido Jacques Tatischeff em 1908. E o “gag”? “O ‘gag’ é democrático, atinge sem preconceitos ricos e pobres, pequenos e grandes, malandros e bem comportados.”

O primeiro “gag” de Tati é a sua desmesurada altura. Ao contrário de Charles Chaplin ou de Buster Keaton – que criaram, no cinema, personagens cómicos do tipo “pequeno homem sozinho contra a multidão” – o senhor Hulot de Tati é o homem enorme, esguio, também ele “sozinho contra a multidão” mas com o privilégio de olhar de cima – de muito de cima – o mundo que o rodeia. “Não se pode evitar o confronto entre Tati e Chaplin, mas que isso sirva para tornar evidentes as diferenças”, escreveu Henri Agel e com toda a razão. Hulot não é um vagabundo sentimental com pretensões a melhorar o mundo. O desejo de interferir, de ajudar, é tudo em Chaplin-Charlot, que ajuda cegas, paralíticas, órfãs e crianças a encontrar um equilíbrio ou uma porta para a felicidade. Leonor Pinhão, Público Magazine, 31 de Março de 1996

DIÁLOGO COM JACQUES TATIEntrevista por Jorge Silva Melo

Tati, num quarto do Hotel Ritz, renitente a entrevistas, mas disposto a dialogar. E a entrevista fez-se.

P.: Parece-nos que os seus filmes estabelecem francamente duas espécies de mundos opostos: o mundo estabelecido dos “outros”, o mundo de um outsider, Hulot…

Jacques Tati: Sim, é isso…

P.: As relações entre eles são uma confrontação puramente binária: Hulot e os outros. E o gag é o arquétipo dessa relação?

JT: Sim, sim…

P.: O gag provém sobretudo da observação que Hulot realiza sobre o mundo dos “outros”?

JT.: Sim. Mas também da observação dos outros sobre Hulot. Por exemplo, um presidente de uma grande empresa pode muito bem interromper o seu discurso se, por acaso, depara com uma personagem que nada tem a ver com ele, como é o caso de Hulot. Neste caso, é o presidente que é o observador.

P.: Mas nesse mundo dos outros há sempre personagens que se aproximam de Hulot (a velha inglesa e as crianças de As Férias, o sobrinho do Tio. Em Play Time, o nome dessa personagem é Barbara…

JT.: Nunca tinha pensado nisso… não, não, de modo nenhum… estas coisas acontecem… os que estão perto dele são, de certo modo, os inocentes. Tenho a impressão que a rapariga que chega a Paris, que tem aquela personalidade, que leu, que quer descobrir coisas, sente-se muito mais só do que a turista riquíssima que tem tudo organizado.

P.: E Hulot também está só?

JT.: Sim, está só. […]

Page 4: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

4 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

P.: Mesmo no seu cinema, há uma certa tendência por parte da crítica em aproximá-lo mais da tradição francesa de um Max Linder do que da slapstick comedy americana…

JT.: Acho que está certo… mas acho que poderia perfeitamente ter escrito um conto russo… não sei se serei tipicamente francês… sou francês porque faço filmes em França. Se os fizesse em Itália…

P.: No cinema francês de agora há uma grande influência do cinema americano… Truffaut, por exemplo. Ou Jean-Pierre Melville, que é uma pura cópia…

JT.: Ah, Melville é isso mesmo. Truffaut é diferente.

(A conversa é interrompida por um telefonema. Começamos por outra via.)

P.: O gag é, na maior parte dos filmes cómicos, uma interrupção da linha geral. Você consegue uma unidade do filme apesar da multiplicidade dos gags…

JT: Em Play Time, foi necessário um certo rigor. Na maior parte dos filmes cómicos há uma ideia, um gag que nos diverte e que nós queremos à viva força meter dentro do filme. Aqui precisei de um maior rigor e, por exemplo, quando eu tinha um gag melhor do que o que lá está mas que comprometeria a unidade da construção, não hesitei em tirá-lo. O que eu tentei foi valorizar o gag em relação à sua situação. Ele aparece naturalmente na construção e o que tentei foi que todos os gags fossem verosímeis. Que não fossem gags para um cómico do cinema, mas situações divertidas que possam acontecer a mim, àquela senhora… é nesse aspecto que Play Time me parece significar uma evolução dentro do cinema cómico. […] é um

filme que respeita a presença das coisas e que não interfere. […]

P.: Assinava a frase de Rossellini “as coisas estão ali, para quê manipulá-las?”

JT.: Assinava de certeza. […]

P.: Gostaria de fazer um filme dramático?

JT.: … Não, quer dizer… acho que já há demais…

P.: Como é que elabora os seus argumentos?

JT.: Trabalho com um amigo que é pintor, Jacques Lagrange. Fechamo-nos durante dois meses, começamos a trabalhar de manhã, não muito cedo, as ideias não vêm assim muito cedo… Eu escolho sempre a linha geral. Creio que não poderia filmar um argumento feito por outro. Acho que podia, mas fá-lo-ia mal. E então procuramos os dois… ele traz um ideia, a coisa passa-se como um jogo de pingue-pongue. Como não se pode jogar sozinho pingue-pongue, eu atiro uma bola, ele responde “sim, mas…” e atira outra bola, eu digo “não, isso não tem muita piada” ou “sim, acho bem” e por aí fora…

P.: Não trabalha sobre um inventário de gags?

JT.: Não, não de modo nenhum. O que acontece é que uma pessoa está, por exemplo, num aeroporto e vê uma senhora com uma mala. Tenho boa memória visual. Registo as coisas. Se no tal jogo de pingue-pongue é preciso um efeito com uma senhora como aquela, lembro--me de a ter visto no aeroporto nessa situação. Tenho gavetas por todo o lado e sirvo-me delas.

Excerto de uma entrevista de Jorge Silva Meloa Jacques Tati, conduzida com a colaboraçãode Fernando Guerreiro e Eduardo Paiva Raposo,publicada em A Capital, 20 de Marçode 1968, reproduzida no livro Século Passado,de Jorge Silva Melo, Livros Cotovia, 2007

Page 5: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

5VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

HÁ FESTA NA ALDEIA Jour de Fête (1949)Elenco: Jacques Tati, Guy Decomble, Paul Frankeur

Legendas: Português | Duração: 79’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

Mas a visão de Jour de Fête tal como foi feito em 1947 (quando as filmagens tiveram lugar) mostra como Tati era um humorista atento à realidade não apenas “técnica” (todos os seus filmes acompanham as transformações técnicas que transformam a vida quotidiana) mas também “social”. Jour de Fête é (agora)o filme mais “transparente” de Tati, através do qual se vê uma época. Neste caso o pós-guerra em França. A ocupação da Europa pelo exército americano é mostrada num breve plano com um jeep da polícia militar, que François (Tati) “desorienta” fazendo-o entrar pelo campo adentro. O papel que a “invasão” americana teve na cultura e mudança de hábitos, e a influência do seu cinema, é a base das mais divertidas cenas do filme, com o carteiro tentando imitar os carteiros americanos que vê na barraca de cinema. Mas também a própria situação francesa de então não escapa ao olhar atento e irónico de Tati, sendo a sequência da instalação do mastro paradigmática, tanto pelo que mostra (o pau com a bandeira francesa que se procura manter direito), como o que se insinua através da figura do carteiro, com Tati surgindo quase como um “clone” de De Gaulle, reforçado por algumas tiradas do diálogo (as referências ao “líder” e à necessidade de “autoridade” que é preciso para dirigir a operação, etc.)Manuel Cintra Ferreira, folhas da Cinemateca Portuguesa,Julho de 1999

Nota: A versão original de Há Festa na Aldeia, a preto-e-branco, perdeu-se. Desde que uma versão a cores do filme foi lançada em 1995, duas outras versões a preto-e-branco, inicialmente concebidas por Tati, não tinham voltado a ser trabalhadas.Em 2012, foi digitalizada uma dessas versões a preto-e-branco, para uma resolução de 4k. O restauro de Há Festa na Aldeia que apresentamos neste programa realizou-se a partir de uma dessas cópias a preto-e-branco.

Festival de Veneza ‘49 – Selecção Oficial, Em CompetiçãoFestival de Veneza ‘49 – Prémio Melhor Argumento

PRÉMIOS:

Sara-a-dias, 2015

Page 6: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

6 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

AS FÉRIAS DO SR. HULOT Les Vacances de Monsieur Hulot (1953)Elenco: Jacques Tati, Louis Pérault, André Dubois

Legendas: Português | Duração: 88’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

Gostaria de dizer quanto é magnífico este filme. Mas não sei dizer bem como… Creio que faz parte daquelas obras, que surgem em quadrantes vários, vivendo sobretudo da não-necessidade de comentários, de grandes “exegeses” (embora, é claro, estas se possam fazer). […]

Festival de Cannes ‘53 – Prémio da Crítica Internacional Oscars ‘56 - Nomeação Melhor Argumento

PRÉMIOS: Os planos iniciais de Les Vacances de Monsieur Hulot, com aquele mar batendo a areia, a “praia” solitária, é bem o mostrar das direcções opostas, mas ‘convergentes’ que marcarão o filme e esta figura de Tati. De vários lugares convergem para ali (e é o que de seguida vemos) os veraneantes, os citadinos que vão a banhos. De comboio, em camionetas, de bicicleta, de automóvel. O mundo dos campos surge neste começo do filme como aquilo que se vai atravessar (v. Jour de Fête), aquilo por onde se passa para chegar ao local de férias, à praia, ao mar. Para neste reproduzir, ao ralenti, em descanso, os mesmos movimentos, o viver igual que se trouxe. Claro que Hulot chega depois (sozinho no seu descapotável – tínhamo-lo ‘visto’ nos campos) e aquela corrente de ar que põe a sala em burburinho é já o seu elemento natural.Gil Abrunhosa, folhas da CinematecaPortuguesa, Janeiro de 1987

Tati retira dos planos dos seus filmes tudo o que é supérfluo. A sua câmara abre-se, com uma janela sobre uma paisagem determinada, povoada pelos mais variados tipos que têm em comum um ar mais ou menos vulgar. O humor nasce de algo que se desloca nessa harmonia, por vezes de forma imperceptível, aqueles gestos quotidianos que à força de os repetirmos perderam o sentido e não damos por eles. Gestos e sons. Se a modernidade do cinema de Tati passa pelo seu aspecto “primitivo”, outro sinal dessa modernidade é a forma como o som é trabalhado, perturba o conjunto ou nele se integra. Quer os ruídos, quer os diálogos se destacam da mesma forma que os referidos gestos: banais os primeiros, mas adquirindo um sentido novo (o barulho do vento que abala os rituais dos veraneantes quando a porta da sala de espera se abre), e os segundos limitados ao essencial, e, como em qualquer conversa, feitos de comentários perdidos, apanhando-se um ou outro fragmento. Se o cinema moderno nasceu de muitas experiências e filmes, Les Vacances de Monsieur Hulot, de Tati e Viaggio in Italia, de Rossellini, são as obras que definitivamente lançam os seus alicerces. Manuel Cintra Ferreira, folhas da Cinemateca Portuguesa,Abril de 1994

Marta Monteiro, 2015

Page 7: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

7VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

O MEU TIO Mon Oncle (1958)Elenco: Jacques Tati, Jean Pierre Zola, Adrienne Servantie

Legendas: Português | Duração: 111’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

Que no fim, este seja um filme de rir (e como a cor, o uso esplêndido que Tati faz dela – aquece e esfria esse riso!) – e sorrir – nem o disse, perante a beleza pungente e humilde que é a sua e a daqueles cães correndo à solta, no início e no fim, deste filme em que só nós é que rimos à gargalhada!Gil Abrunhosa, folhas da Cinemateca Portuguesa, Janeiro de 1987

Tentemos então ver Mon Oncle, a partir de alguns traços e pormenores que assinalem quer a relevância da experiência, quer o grau de inovação que o filme introduzia na obra de Tati, quer ainda a manifestação do génio humorístico do realizador (e “gags” geniais, como é óbvio, não faltam aqui).Em primeiro lugar, parece importante assinalar a mudança de cenário, em relação aos filmes precedentes. Quer Jour de Fête, quer as Vacances eram filmes “rurais”, é em Mon Oncle que a cidade e o espaço urbano são introduzidos. E são-no, numa espécie de assunção dessa mudança, de maneira extraordinariamente fluida, como se Tati quisesse registar a transição: através do senhor Hulot, a única personagem capaz de circular com o mesmo à vontade (ou falta dele) por todos os sítios, passamos do bairro popular e antigo (filmado como uma persistência, ou um vestígio, do campo na cidade) ao bairro elitista e moderno, ao espaço definitivamente urbano que aqui é o verdadeiro objecto do trabalho de Tati. Depois, é o puro prazer que o visionamento de um filme de Tati sempre oferece. Observar a meticulosa e imaginativa construção dos “gags”, sentir em Tati o mais legítimo herdeiro moderno dos grandes burlescos clássicos (Buster Keaton, sobretudo) – e ver na sua arte a continuação de uma tradição que está hoje, e até prova em contrário, definitivamente perdida. Arte e tradição de que Mon Oncle preserva até a tendência para uma certa melancolia: que dizer daqueles planos que pontuam o filme, com os cães e os miúdos – a não ser que são eles, juntamente com o “indomável” Hulot,

Festival de Cannes ‘58 - Prémio Especial do JúriOscars ‘59 – Melhor Filme Estrangeiro

PRÉMIOS:

as criaturas mais livres e mais “móveis” que Tati mostra em Mon Oncle?Luís Miguel Oliveira, folhas da Cinemateca Portuguesa, Out. de 2007

O reencontro com O Meu Tio pode ser tanto mais estimulante quanto, há quase meio século, Tati foi um dos primeiros a ter a percepção do modo como os valores ligados ao moderno design estavam a mudar, de facto, todos os aspectos da vida humana, dos espaços públicos às zonas de intimidade familiar.João Lopes, Diário de Notícias

É um filme perfeito, […] projectando-se,ao mesmo tempo, numa radical modernidade (de que são exemplos o trabalho sobre a banda de som, em particular o uso dos ruídos,e o estilizado artificialismo de todo o filme).[…] Enorme sucesso de público e de crítica, multiplamente laureado – do Prémio Especial do Júri de Cannes ao Óscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira – O Meu Tio foi o zénite da carreira de Tati.Jorge Leitão Ramos, Expresso

Catarina Sobral, 2015

Page 8: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

8 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

PLAYTIME – VIDA MODERNA Playtime (1967)Elenco: Jacques Tati, Barbara Dennek, Rita Maïden

Legendas: Português | Duração: 124’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

Com a sua visão crítica sobre o mundo moderno, a sua melancolia face a Paris e a uma França que desaparecem, Playtime poderia passar por um filme reaccionário. Mas não o é de todo. Porque se Tati transmite uma visão irónica sobre a evolução da sociedade, ele fá-lo sempre com graça e ligeireza, sem qualquer ponta de amargura ou insistência. Para além disso, a forma como ele filma os arranha-céus, os halls do aeroporto, os corredores das multinacionais prova que ele sabe também captar a sua beleza. […] Em Playtime, Tati não rejeita o mundo moderno, filma-o com brilho. Mas fustiga poeticamente os seus excessos e absurdos, oferecendo um olhar melancólico sobre o que vai desaparecer e que valeria o esforço de ser conservado.

Grande Prémio da Academia do Cinema ‘68PRÉMIOS:

Playtime é - tal como Os Tempos Modernos de Chaplin - uma pura obra-prima, que concilia as virtudes do génio criador e do divertimento popular, inteligência crítica e fantasia inspirada, observação realista e deriva burlesca. [...]Sem dúvida que a sátira da globalização, infinitamente subtil, mostra, meio século mais tarde, uma presença surpreendente. O desenvolvimento do consumismo e dos tempos livres das massas, a reprodução dos objectos e dos comportamentos, a perda de referências culturais e das relações afectivas em prol do funcionamento e do rendimento, o conformismo generalizado, o recuo político face à economia, fazem de Playtime o filme que mostrou, mais cedo e com mais força, a missa burlesca de um século XX desfigurado pela tecnologia, que Fritz Lang já tinha anunciado, em 1926, com Metropolis. [...]Autor desta obra-mundo que é Playtime, Tati é em todo o caso um Deus vingador, e o Sr. Hulot - justamente designado por André Bazin como “l’Ange Hurluberlu” - o seu mandatário. Descido à Terra para revelar a incomensurável vaidade e a escandalosa pretensão da perfeição dos homens.Jacques Mandelbaum, Le Monde

João Fazenda, 2015

A força com que Tati elabora a representação de Paris é reveladora da sua lucidez sobre a evolução das coisas e da sua inteligência do cinema: os edifícios, os escritórios, os locais de trabalho e o trânsito densos. Quanto à Paris emblemática dos grandes monumentos históricos, não aparece senão através de reflexos nos vidros: a Torre Eiffel ou o Arco do Triunfo não são mais do que espectros, de imagens imateriais, um museu virtual que se perfila furtivamente na cidade moderna. […]Jacques Tati filmava a sua época, previa o futuro e inventava as ferramentas estéticas convenientes ao seu objecto. Playtime é a prova deslumbrante disso: trinta e cinco anos após o seu lançamento, este filme cintilante, desconcertante e inesgotável permanece também um objecto crítico de primeira ordem para pensar a nossa época – e o seu cinema.Serge Kaganski, “Le fabuleux destin de Monsieur Hulot”,em Les Inrockuptiles, nº354, Julho de 2002

Page 9: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

9VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

TRAFIC - SIM, SR. HULOT Trafic (1971)Elenco: Jacques Tati, Marcel Fraval, Honoré Bostel

Legendas: Português | Duração: 96’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

Trafic é uma espécie de balanço e um ponto final na obra de Tati – Parade será um regresso, e uma reivindicação, mais do que uma interrogação, à fonte do palhaço-inspirador – filme sobre o atraso, que se organiza em paralelo com a transmissão televisiva, em directo, da chegada à lua (símbolo duma nova era, dum novo espaço e dos novos media), Trafic inclui, à medida que os vai encenando, a crítica dos gags e das referências cinematográficas que constituem a própria matéria do cinema. Nesse sentido, Trafic é porventura o último filme verdadeiramente “moderno” – isto é, antesda era “do vazio”, a era pós-moderna.Saguenail, O Olhar de Ulisses, edições Porto 2011,Capital Europeia da Cultura / Cinemateca PortuguesaMuseu do Cinema

National Board of Review ‘73 – Melhor Filme EstrangeiroPRÉMIOS:

Este observador incessante e divertido, que é Tati nos seus filmes, curiosamente, não cede à narrativa; antes, a sua visão “abstracta” do real – num sentido que diríamos próximo da pintura ou da música – é que está muito perto dos meios da pintura contemporânea (e é o que torna tão certeira a sua análise – ou visão?). E talvez esteja também perto de uma tradição literária – e Tati é não-literário por excelência! – de que Gogol é expoente.

Isto para dizer que Trafic é o filme mais “narrativo” de Tati. Esta odisseia do automóvel e dos protagonistas que é a viagem até ao salão automobilístico de Amsterdam (viagem que aponta outras; v. os lançamentos espaciais que o mecânico vê pela T.V.), não é só a revelação “épica” do automóvel, as peripécias cómicas da sua e da nossa existência; mas é igualmente a descoberta que a public-relations girl faz de si, isto de passagem, como sempre sucede em Tati, entre a sinfonia rodoviária e as paragens campestres… Em certo sentido, é um filme de um romance de aprendizagem por automóvel: da sua entrada em cena, na fábrica, em que ela crepita, eficiente, “portátil” – com a indumentária “ultra-moderna”, passando pelo seu MG desportivo, onde se veste, tirando o chapéu da roda sobresselente até à fralda de fora e jeans com que termina; e quando esta rapariga “sem nome”, mudada pelo trânsito, pela viagem, e por aqueles desvios – paragens – chora o cãozinho (o gag é estupendo!) que julga morto – é que a descoberta de si se inicia, deixando de estar convertida ao ritmo daquele tráfico, e encontrando um caminho no meio do tráfego…

Diga-se, com isto, que nos seus planos amplos, onde tudo se integra, Tati nos dá uma aceitação do moderno e contemporâneo, que é uma das suas grandes criações.Gil Abrunhosa, folhas da Cinemateca Portuguesa, Janeiro de 1987André Letria, 2015

Page 10: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

10 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

PARADE Parade (1974)Elenco: Jacques Tati, Karl Kossmayer, Pierre Bramma

Legendas: Português | Duração: 89’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

Rodado em vídeo, com uma estrutura que segue de perto a de um hipotético programa televisivo de variedades, Parade é uma obra singularíssima na filmografia de Tati. Em primeiro lugar, claro, pelas peculiares condições e circunstâncias em que o rodou. Mas também, e sobretudo, por aquilo que fez com elas. Não será um “filme-testamento”, por maior que seja a tentação de olharmos assim para o derradeiro filme de um gigante como Tati (que de resto não pensou Parade como seu último trabalho), mas lá que passa por aqui uma ideia de “súmula” dos principais fundamentos da sua obra, eis algo que parece difícil de desmentir. Depois da acumulação e da sofisticação de Playtime (via ainda seguida no magistral Trafic), Parade é quase um desnudar, um regresso ao básico, uma espécie de raio X aplicado ao cinema de Tati. Num certo sentido, há aqui uma dimensão quase pedagógica (Tati, no papel de director do circo, a funcionar como um “demonstrador”, como um professor de mecânica cómica) que se liga às fabulosas curtas-metragens onde o cineasta “explicava” como devem andar os carteiros ou como se deve jogar ténis, por exemplo. Paradeé Tati sem Hulot, deixando perceber que Tati sem Hulot é Hulot sem gabardine – fica a mecânica, a estrutura, o esqueleto, mas sem qualquer capa. Tudo o resto é a mesma coisa. […]

Parade é, finalmente, o mais genuíno “documentário” daquele que, para alguns (e de maneira não tão provocatória quanto pode parecer), é o maior documentarista da história do cinema. Não sabemos, em Parade, o que foi encenado (os momentos, no “prólogo”, nos bastidores ou no bengaleiro; a participação, espontânea ou preparada, do público); mas o certo é que tudo – aquilo que se suspeita ter sido encenado e o que não se suspeita – é visto e mostrado da mesma maneira. Tati perante uma audiência “ao vivo”, Tati perante uma orquestra de figurantes – vai dar ao mesmo, e Parade é, no fundo, o documento dessa relação. Luís Miguel Oliveira, folhas da Cinemateca Portuguesa, Out. de 2003

Festival de Cannes ‘74 – Selecção Oficial,Fora de CompetiçãoLondon Film Festival ‘75 – Grande Prémio

PRÉMIOS:

Madalena Matoso / Planeta Tangerina, 2015

Page 11: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

11VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

DIÁLOGO COM JACQUES TATIEntrevista por Jorge Silva Melo

P.: Começou com curtas-metragens…

JT.: Ah, é a única escola verdadeira! Não há mais nenhuma. Porque nas curtas-metragens vocês podem exprimir-se, fazer os vossos esboços.E na longa-metragem há uma responsabilidade financeira; e não se pode defender o filme contra o produtor… Tem que se lhe dar garantias de que ele vai ganhar dinheiro, sem o queele não fará a produção. Nas curtas, não;há a possibilidade de, antes do filme longo,se experimentar. E são essas experiênciasque permitem uma evolução e uma técnica.Há todas as possibilidades de expressão sem o perigo de estarmos a estragar a noite aos espectadores – a curta pode, quando muito, melhorá-la. E, aliás, há muito poucos autores que começaram directamente pelalonga-metragem. Penso em Renoir, em Clair,em Clément. Todos aprendemos imensocom essas experiências.

Excerto de uma entrevista de Jorge Silva Meloa Jacques Tati, conduzida com a colaboraçãode Fernando Guerreiro e Eduardo Paiva Raposo,publicada em A Capital, 20 de Marçode 1968, reproduzida no livro Século Passado,de Jorge Silva Melo, Livros Cotovia, 2007

CURTAS METRAGENSDE JACQUES TATI

PROCURA-SE BRUTAMONTES On Demande une brute (1934)Realização: Charles BarroisElenco: Jacques Tati, Hélène Pépée, palhaço Rhum

Legendas: Português | Duração: 23’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

CUIDA DO TEU GANCHOESQUERDO Soigne ton gauche (1936)Realização: René ClementElenco: Jacques Tati, Louis Robur, Max Martell

Legendas: Português | Duração: 13’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

DOMINGO ANIMADO Gai Dimanche (1935)Realização: Jacques BerrElenco: Jacques Tati, palhaço Rhum

Legendas: Português | Duração: 22’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

A ESCOLA DOS CARTEIROSL’Ecole des facteurs (1946)Realização: Jacques TatiElenco: Jacques Tati, Paul Demange

Legendas: Português | Duração: 16’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

AS AULAS NOCTURNASCours du soir (1967)Realização: Nicolas RibowskiElenco: Jacques Tati, Marc Monjou

Legendas: Português | Duração: 30’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

FORÇA, BASTIA Forza Bastia (1978)

Realização: Jacques Tati e Sophie TatischeffLegendas: Português | Duração: 26’

VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

ESPECIALIDADE DA CASADégustation maison (1976)Realização: Sophie TatischeffElenco: Dominique Lavanant, Gilberte Genia

Legendas: Português | Duração: 12’VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

As curtas-metragens de Jacques Tati foram restauradas na sua totalidade por iniciativa de Les Films de Mon Oncle, por dois laboratórios: L’Immmagine Ritrovata (Itália) foi responsável pelo restauro da imagem e L.E Diapason (França) pelo restauro do som. O primeiro passo foi encontrar o material original existente nos arquivos pessoais de Jacques Tati, nos Archives Françaises du Film, através de uma rede de cinematecas e em vários laboratórios. Deste modo, foi possível obter estas curtas-metragens raras, “resgatadas” à invisibilidade.

O cinema de Jacques Tati teve desde sempre uma estreita relação com a ilustração. A Leopardo Filmes lançou um desafio a seis ilustradores portugueses para criarem novos cartazes para as seis longas metragens do realizador. São esses cartazes que reproduzimos neste programa e estão expostos no Espaço Nimase no Teatro Municipal Campo Alegre.

Page 12: EM FESTA COM JACQUES TATI - porto.pt folder 5/Catálogo das Obras de... · 2 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI ELOGIO DE TATI por Serge Daney Cada filme de Tati marca ao mesmo tempo:

12 VERÃO EM FESTA COM JACQUES TATI

Ao mesmo tempo que a filmografia de Jacques Tati se mantém única na História do Cinema,as especificidades técnicas da sua rodageme pós-produção eram igualmente invulgares e avançadas para a sua época. Apesar de estas técnicas estarem hoje ultrapassadas, elas testemunham, no entanto, a extrema modernidade de Tati; ele usava os melhores meios tecnológicos à sua disposição para criar um universo fílmico distintamente Tatinesco. […]Hoje, são necessárias técnicas especiais para respeitar os métodos de filmar de Tati no restauro dos seus filmes. Para além disso, Tati revia e remontava constantemente os seus filmes. Anos após o seu lançamento, ele ia a uma projecção, reparava quando é que os espectadores se riam e remontava todas as cópias em função disso. Este rigor perfeccionista levava a muitas alterações e modificações, não só na imagem mas também nos negativos físicos e nas cópias, acelerando inevitavelmente a sua deterioração. Tati preocupava-se muito com a preservação de todos os materiais originais dos seus filmes na sua produtora, mas não podia prevenir o seu natural e inevitável desgaste.

Tornou-se então essencial levar a cabo um restauro de todos os seus filmes, com dois objectivos em mente: manter o seu trabalho disponível para o público através de novos formatos digitais, e conservá-lo de forma a que pudesse voltar a ser usado por gerações futuras.

[…] Foi necessária uma enorme sensibilidade para investigar minuciosamente a vida e o trabalho de Tati, de modo a perceber as suas intenções, as suas dúvidas e medos, o que lhe agradava e o que lhe desagradava. Os materiais para este trabalho foram os seus diários de rodagem, notas, documentos de produção, correspondência e fotografias. Compreender os filmes de Tati, antes e durante o restauro, foi uma viagem meticulosa até à identificação última de uma montagem original, a recuperação da qualidade da luz ou do grão da imagem na época, redescobrir como Tati criava as suas bandas sonoras ou identificar uma mancha estranha. Era essencial restaurar tanto a imagem como o som com respeito absoluto pela obra, não acrescentar nem retirar o que quer que fosse, removendo apenas os defeitos causados pelo material envelhecido e pela degradação. Cada filme foi meticulosamente examinado de forma a localizar, identificar e analisar os melhores materiais que restavam. Cada tipo de restauro usou a tecnologia que melhor se adaptava, de acordo com a necessidade de não adulterar os trabalhos originais: o objectivo primordial era assegurar que os filmes de Jacques Tati possam durar para sempre. Studiocanal

O RESTAURO DOS FILMESDE JACQUES TATI

Programação completa em:www.medeiafilmes.com

facebook.com/medeiafilmes