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XXVI ENEGEP - Fortaleza, CE, Brasil, 9 a 11 de Outubro de 2006 1 ENEGEP 2006 ABEPRO Práticas ergonômicas na gestão de segurança do trabalho: o caso das atividades de mineração subterrânea Agnaldo Fernando Vieira de Arruda (UFSC) [email protected] Eugenio Andrés Díaz Merino (UFSC) [email protected] Leila Amaral Gontijo (UFSC) [email protected] Resumo Este artigo apresenta um diagnóstico atual do conhecimento e das práticas ergonômicas na gestão de segurança do trabalho nas atividades de mineração subterrânea, abordando para isto o universo da mina subterrânea, através da caracterização dos ambientes e dos trabalhos em subsolo. Em seguida são feitas considerações conceituais sobre a ergonomia, apontando o relacionamento das suas atividades com a segurança e saúde do trabalho, além também de fazer referência aos preceitos dos sistemas de gestão de segurança do trabalho aplicados na mineração subterrânea. Apresenta o resultado da pesquisa sobre a aplicação da ergonomia nas atividades de mina subterrânea, e questiona sobre a participação da ergonomia nestes trabalhos, especificamente em relação aos sistemas de gestão de segurança do trabalho. Concluí que a contribuição da ergonomia nas minas subterrâneas pode melhorar os ambientes e os trabalhos subterrâneos, através da participação do nível gerencial. Sugere ainda uma maior participação da ergonomia no âmbito dos sistemas de gestão de segurança do trabalho para as minas subterrâneas. Palavras-chave: Ergonomia; Mineração Subterrânea; Gestão de Segurança do Trabalho. 1. Introdução O objetivo deste artigo é questionar sobre a participação da ergonomia nos sistemas de gestão de segurança do trabalho das atividades desenvolvidas em mina subterrânea, como ferramenta de melhoria, na forma conceitual e estratégica da organização. Este artigo tem, portanto como finalidade, diagnosticar o estagio atual do conhecimento, compreensão e aplicação das práticas ergonômicas na gestão de segurança do trabalho nas atividades de mineração subterrânea, além de trazer para o âmbito do campo gerencial estratégico e campo da segurança e saúde do trabalhador as questões e desafios da ergonomia, as quais se relacionam e ultrapassam o universo dos ambientes de trabalho. Este trabalho surgiu da necessidade de agregar os conhecimentos e benefícios da ergonomia aos sistemas de gestão de segurança do trabalho voltado para mineração subterrânea, uma vez que nas pesquisas realizadas, descritas a seguir, sobre a aplicação da ergonomia na mineração subterrânea, não aparecem trabalhos que envolvam a ergonomia com a questão gerencial e estratégica da organização. Os trabalhos encontrados são de cunho pontual, tratando cada problema de forma individualizada. Estes trabalhos permitem melhorias nos aspectos abordados, mas de forma isolada, não criando uma cultura sobre ergonomia nas organizações, principalmente no nível estratégico, que trabalham com mineração subterrânea. Para alcançar os objetivos propostos, a estratégia usada neste estudo foi salientar e contextualizar a necessidade da participação dos princípios da ergonomia nos sistemas de gestão de segurança do trabalho para as atividades de mina subterrânea, através de pesquisas e análises de trabalhos publicados e de informações divulgadas pelas próprias empresas de mineração.

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Práticas ergonômicas na gestão de segurança do trabalho: o caso das atividades de mineração subterrânea

Agnaldo Fernando Vieira de Arruda (UFSC) [email protected] Eugenio Andrés Díaz Mer ino (UFSC) mer [email protected]

Leila Amaral Gontijo (UFSC) [email protected]

Resumo

Este artigo apresenta um diagnóstico atual do conhecimento e das práticas ergonômicas na gestão de segurança do trabalho nas atividades de mineração subterrânea, abordando para isto o universo da mina subterrânea, através da caracterização dos ambientes e dos trabalhos em subsolo. Em seguida são feitas considerações conceituais sobre a ergonomia, apontando o relacionamento das suas atividades com a segurança e saúde do trabalho, além também de fazer referência aos preceitos dos sistemas de gestão de segurança do trabalho aplicados na mineração subterrânea. Apresenta o resultado da pesquisa sobre a aplicação da ergonomia nas atividades de mina subterrânea, e questiona sobre a participação da ergonomia nestes trabalhos, especificamente em relação aos sistemas de gestão de segurança do trabalho. Concluí que a contribuição da ergonomia nas minas subterrâneas pode melhorar os ambientes e os trabalhos subterrâneos, através da participação do nível gerencial. Sugere ainda uma maior participação da ergonomia no âmbito dos sistemas de gestão de segurança do trabalho para as minas subterrâneas. Palavras-chave: Ergonomia; Mineração Subterrânea; Gestão de Segurança do Trabalho.

1. Introdução

O objetivo deste artigo é questionar sobre a participação da ergonomia nos sistemas de gestão de segurança do trabalho das atividades desenvolvidas em mina subterrânea, como ferramenta de melhoria, na forma conceitual e estratégica da organização. Este artigo tem, portanto como finalidade, diagnosticar o estagio atual do conhecimento, compreensão e aplicação das práticas ergonômicas na gestão de segurança do trabalho nas atividades de mineração subterrânea, além de trazer para o âmbito do campo gerencial estratégico e campo da segurança e saúde do trabalhador as questões e desafios da ergonomia, as quais se relacionam e ultrapassam o universo dos ambientes de trabalho.

Este trabalho surgiu da necessidade de agregar os conhecimentos e benefícios da ergonomia aos sistemas de gestão de segurança do trabalho voltado para mineração subterrânea, uma vez que nas pesquisas realizadas, descritas a seguir, sobre a aplicação da ergonomia na mineração subterrânea, não aparecem trabalhos que envolvam a ergonomia com a questão gerencial e estratégica da organização. Os trabalhos encontrados são de cunho pontual, tratando cada problema de forma individualizada. Estes trabalhos permitem melhorias nos aspectos abordados, mas de forma isolada, não criando uma cultura sobre ergonomia nas organizações, principalmente no nível estratégico, que trabalham com mineração subterrânea.

Para alcançar os objetivos propostos, a estratégia usada neste estudo foi salientar e contextualizar a necessidade da participação dos princípios da ergonomia nos sistemas de gestão de segurança do trabalho para as atividades de mina subterrânea, através de pesquisas e análises de trabalhos publicados e de informações divulgadas pelas próprias empresas de mineração.

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2. O trabalho em mina subterrânea

Segundo as Normas Reguladoras de Mineração (2002), a indústria da mineração é aquela que abrange os trabalhos de pesquisa mineral, extração de minério a céu aberto e no subsolo, beneficiamento de minérios, distribuição e comercialização de bens minerais.

Para efeito das Normas Reguladoras de Mineração (2002), entende-se por jazida toda massa individualizada de substância mineral ou fóssil, aflorante ou existente no interior da terra, e que tenha valor econômico, e por mina a jazida em lavra, ainda que temporariamente suspensa.

Dentro deste contexto, a mina subterrânea abrange as áreas subterrâneas nas quais se desenvolvem as operações de lavra, que segundo as Normas Reguladoras de Mineração (2002) são o conjunto de operações coordenadas objetivando o aproveitamento industrial da jazida até o beneficiamento das mesmas, inclusive, incluindo também nesta referência as máquinas, equipamentos, acessórios, instalações, e obras civis utilizados nas atividades.

2.1 Caracter ização do trabalho em mina subterrânea

O trabalho em minerações subterrâneas estruturadas, caracterizado por desenvolver as atividades da mina de forma técnica e legal, procurando minimizar os riscos de acidentes e manter um ambiente de trabalho dentro dos limites legais, possui um ciclo de operações básicas, que envolve de forma geral: a perfuração da rocha, o desmonte da rocha com explosivos, o abatimento de choco, que são blocos semi-soltos no teto e paredes da mina e o reforço do teto da mina, a equipagem da frente desmontada (ventilação, água, ar comprimido e energia), e por fim o carregamento e transporte do material desmontado, sendo o ciclo finalizado nesta operação. Nos intermédios das operações básicas, existem ainda os trabalhos de engenharia e geologia, incluindo segurança do trabalho e meio ambiente, nas modalidades operacionais e táticas, visando o controle da produção em termos qualitativo e quantitativo, o ambiente do trabalho, a segurança dos trabalhadores e as relações das atividades com o meio ambiente, para cumprir as determinações estratégicas da organização. Ainda existem neste contexto os trabalhos auxiliares (manutenção, drenagem e abastecimento) que acompanham o desenvolvimento, o planejamento e a operação da mina subterrânea.

Os trabalhos subterrâneos informais, caracterizados por não cumprir as determinações técnicas e principalmente legais em relação à segurança do trabalho, diferem dos trabalhos desenvolvidos em minerações estruturadas. Estas últimas possuem uma consciência mineral e conseqüentemente minas organizadas, desenvolvendo uma lavra social. Já as primeiras não têm preocupações com a segurança do trabalhador, o meio ambiente e o aproveitamento do recurso mineral. Esta visão ambiciosa de maior lucro e menor custo é uma das razões que fazem com que alguns trabalhos subterrâneos sejam descontextualizados dos aspectos básicos de segurança do trabalho, sendo executados de forma rudimentar e às vezes desumana, com mínimas condições ambientais de trabalho.

2.2 Ambientes e locais de trabalho em mineração subterrânea

O ambiente de uma mina subterrânea é o meio com componentes ambientais não biológicos (ar, água e as rochas), e biológicos (vírus, bactérias e o homem). A atmosfera subterrânea está composta pelo ar proveniente do ar do ambiente global, encaminhado para a mina subterrânea de forma natural ou forçada. A hidrosfera subterrânea está representada pelas águas subterrâneas e a litosfera pelas rochas e no caso de aberturas subterrâneas próximas as superfícies por solos (TORRES, 2005). Portanto, o ambiente subterrâneo constitui parte do ambiente global ou exterior, não sendo isolado ou independente do ecossistema. No contexto da mineração subterrânea, o homem é a componente biológica mais importante.

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A ação humana no subsolo provoca alterações dos componentes do meio ambiente natural criando riscos que afetam principalmente a vida humana, refletida em acidentes fatais que ocorrem nas minas subterrâneas no mundo todo, como por exemplo nas minas de Kentucky, nos Estados Unidos, Sullivan no Canadá, Muchongguo na China, entre muitas outras. Além das mortes, a contaminação da atmosfera subterrânea causa doenças ocupacionais (doenças respiratórias, silicose, surdez, desconforto, stress, etc), as águas subterrâneas provocam inundações, afetando de forma doentia a biodiversidade e o ecossistema e a instabilidade do maciço rochoso ocasiona acidentes com inabilitação física, psíquica e corporal (TORRES, 2005).

Dentro do contexto de ambiente de mina subterrânea, os trabalhos das operações básicas descritos anteriormente são desenvolvidos em ambientes particulares, confinados, escuros, úmidos na maioria dos locais, com ventilação e iluminação forçada (artificial) e riscos de desplacamento de rochas, caracterizando um ambiente insalubre e com alto grau de risco ambiental e operacional. Nos trabalhos informais estes ambientes são mais afetados do ponto de vista das condições de trabalho pela falta de respeito às normas básicas de higiene e segurança do trabalho, pelo desconhecimento técnico associado à ambição de um lucro maior.

Segundo Joy (2004) nos últimos 15 anos houve uma melhoria na segurança nas minas subterrâneas e nos ambientes de trabalho. Estes ambientes vêm sofrendo mudanças e melhorias na sua concepção, principalmente devido à evolução de consciência de legisladores, empregadores e empregados, existindo preocupações verdadeiras e investimentos reais em segurança do trabalho, procurando adequar o ambiente e o trabalho subterrâneo as normas estabelecidas de segurança e saúde do trabalho. Os ambientes e trabalhos subterrâneos ainda devem ser melhorados, mesmo nas minas estruturadas, e para isto, sugere-se concentrar esforços no relacionamento da ergonomia com sistemas de gestão de segurança do trabalho.

3. A ergonomia e a gestão de segurança do trabalho

3.1 Definições de ergonomia

Para Rebelo (2006) a Ergonomia é uma ciência multidisciplinar, pois se fundamenta em diferentes domínios do saber, constituindo uma unidade estrutural que permite estabelecer uma coerência alicerçada nos seus métodos de ação. Esta visão panorâmica possibilita contextualizar o trabalho humano, de modo a encontrar as condições de trabalho que permitam a melhor integração do trabalhador do ponto de vista do conforto e segurança, assim como da confiabilidade e eficiência do sistema produtivo.

Já a International Ergogomics Association – IEA considera a Ergonomia uma disciplina e uma profissão, que trata da compreensão das interações entre os seres humanos e outros elementos de um sistema, aplicando teorias e princípios, dados e métodos, a projetos que visam otimizar o bem estar humano e performance global dos sistemas.

Ergonomia é definida por Iida (2003) como o estudo da adaptação do trabalho ao homem, sendo o trabalho neste caso considerado de forma ampla, abrangendo não apenas as máquinas e equipamentos usados na transformação de materiais, mas também toda a situação em que ocorre o relacionamento entre o homem e seu trabalho.

Nas descrições baseadas em Rebelo (2006), IEA e Iida (2003), a abordagem da ergonomia é feita de uma forma ampla dentro da organização, procurando relacionar as questões da ergonomia com o trabalhador de maneira sistêmica, deixando clara a relação com a segurança do trabalho e as possibilidades de melhoria dos ambientes e processos de trabalho.

Dentro do contexto das definições abordadas, observa-se um estreito relacionamento

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conceitual da ergonomia com a gestão de segurança do trabalho e os seus preceitos, tipificada, no próprio conceito de ergonomia, que em resumo é fundamentado na relação entre homem, ambiente e trabalho. O que este artigo questiona, portanto é a não observação na prática deste relacionamento estreito nos sistemas gerenciais de segurança do trabalho, principalmente nas minas subterrâneas.

3.2 A ergonomia e a segurança do trabalho

O desenvolvimento de novas tecnologias procura proporcionar conforto e qualidade de vida ao ser humano, através de melhorias no ambiente de trabalho, nos transportes, no lazer, na moradia, entre muitos outros. Porém, uma conseqüência desta procura, é o aparecimento de novas condições de trabalho, muitas vezes responsáveis por condições adversas para os trabalhadores.

Neste contexto, as perspectivas de intervenção em segurança e saúde no trabalho, focam normalmente na definição de procedimentos de ação centrados na tipificação dos perigos ou dos fatores de risco e convergem em soluções pré-definidas para os problemas diagnosticados. Apesar de estes procedimentos serem eficazes, apresenta problemas decorrentes do fato de muitas vezes não considerarem o Homem como o “ator” principal de uma situação de trabalho. É precisamente neste aspecto que a ergonomia pode focar a sua atenção, em particular, na compreensão da interação do trabalhador com os elementos de uma situação de trabalho, tendo em vista a sua otimização de acordo com critérios de segurança e saúde, ao mesmo tempo em que promove a eficiência do sistema produtivo (REBELO, 2006).

A ergonomia pode contribuir para solucionar um grande numero de problemas sociais, principalmente os relacionados com a segurança e saúde do trabalho, além de poder contribuir para a prevenção de erros e melhoria do desempenho. Analisando os acidentes pode-se concluir que as causas vão desde erros humanos até o inadequado relacionamento entre o trabalhador e suas tarefas, podendo esta probabilidade de acontecer ser reduzida se forem consideradas as capacidades e limitações humanas durante o projeto de trabalho e seu ambiente (MERINO, 2006).

Um dos principais campos da ação ergonômica é a concepção de meios de trabalho adaptado às características fisiológicas e psicológicas do ser humano e de suas atividades (FRANCO, 2001).

Em relação a objetivos e concepções da ergonomia, destaca-se a melhoria do ambiente de trabalho e a busca da segurança do trabalhador. Estes fatores podem ser aproveitados como forma e justificativa fortes para auxiliar no desenvolvimento de sistema de gestão de segurança do trabalho, com participação ativa da ergonomia, na forma gerencial.

3.3 Preceitos dos sistemas de gestão de segurança do trabalho

Lapa (2001) considera a gestão de segurança e saúde ocupacional, através da garantia da integridade física e da saúde dos funcionários, como fator de desempenho que deve ser incorporado á gestão do negocio empresarial.

Fatureto (2000) destaca os benefícios esperados com a implantação de um sistema de gestão de segurança e saúde, citando como principais:

− Redução nas perdas, custos de produção e nos custos de acidentes, sem afetar lucros; − Aperfeiçoamento da gerência de riscos e Maior rigor no cumprimento da legislação; − Introdução de sistemática de técnicas de análise de acidentes, incidentes, danos nas

propriedades e perdas no processo industrial;

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− Valorização da implantação do sistema de gestão e saúde e de procedimentos padrão; − Melhoria da qualidade, produtividade, motivação, imagem da empresa e condições de

segurança.

As descrições anteriores apresentam fortes justificativas para que as empresas de modo geral e no caso em estudo, as de mineração subterrânea, implementem e mantenham um sistema de gestão de segurança do trabalho, visando vários aspectos de melhorias no ambiente de trabalho, a segurança do trabalhador e também a sobrevivência da empresa no mundo globalizado.

Os sistemas de gestão de segurança e saúde do trabalho mais difundidos atualmente são a BS 8800 (1998) e OHSAS 18001 (1999), que são abordados neste artigo, principalmente nos seus preceitos.

A BS 8800 (1998), norma britânica que fornece orientação sobre Sistemas de Gestão da Segurança e Saúde do Trabalhador (SST), para encorajar a conformidade com as políticas e objetivos declarados de SST, e sobre como a SST deve ser integrada ao sistema global de gestão da organização. Ela não é uma norma de especificações, e sim um guia de implantação e uso, que fornece um sistema de gestão pró-ativo e elementos que podem ser integrados com outros sistemas gerenciais para auxiliá-los a melhorar o desempenho na área de Segurança e Saúde Ocupacional.

As organizações estão tentando gerenciar suas atividades de modo a antecipar e prevenir circunstâncias que possam resultar em lesão ou doença ocupacional. Neste contexto, o modelo da BS 8800 estabelece, portanto uma estrutura a respeito da Segurança e Saúde no Trabalho (SST), orientando as empresas e a forma de gerenciamento de suas atividades, de modo a antecipar e prevenir situações que possam causar acidentes ou doenças ocupacionais (FERNANDES, 2000) e (SOUZA, 2002). É neste contexto que a ergonomia poderia atuar junto aos sistemas de gestão de segurança do trabalho.

A OHSAS 18001 (1999) é uma especificação que tem por objetivo fornecer às organizações os elementos de um Sistema de Gestão da Segurança e Saúde no Trabalho (SST) eficaz, passível de integração com outros sistemas de gestão (qualidade e meio ambiente, principalmente), de forma a auxiliá-las a alcançarem seus objetivos de segurança e saúde ocupacional. Ela define os requisitos de um Sistema de Gestão da SST, tendo sido redigida de forma a aplicar-se a todos os tipos e portes de empresas, e para adequar-se a diferentes condições geográficas, culturais e sociais.

Em relação aos preceitos de um sistema de gestão de segurança do trabalho, tanto a BS 8800 (1998) como a OHSAS 18001 (1999), destacam a necessidade da existência de uma política de segurança e saúde ocupacional, definida e autorizada pela direção da organização, que estabeleça claramente os objetivos globais de segurança e saúde e o comprometimento para melhorar o desempenho da segurança e saúde do trabalho.

Analisando a relação da ergonomia com os sistemas de gestão de segurança do trabalho, e comparando com os trabalhos encontrados sobre a atuação da ergonomia nas minas subterrâneas, fica evidente a necessidade da participação dos fundamentos da ergonomia nestes sistemas, como facilitador, para atingir os objetivos da organização e melhorias necessárias no ambiente de trabalho.

4. A ergonomia na mineração subterrânea

Para descrever sobre a contribuição da ergonomia nos trabalhos de mina subterrânea, foi feita uma pesquisa nos portais da Capes e NIOSH - National Institute for Occupational Safety and

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Health, como ferramenta de busca, utilizando-se como base de pesquisa o Scopus, Medline e Elsevier, para pesquisar nos periódicos Applied Ergonomics, Ergonomics, Human Factors, International Journal of Industrial Ergonomics e Oxford Journal. Esta pesquisa constatou a presença de estudos em áreas e postos específicos de trabalho no subsolo, não aparecendo, portanto nesta pesquisa nenhuma participação ergonômica com foco nos sistemas de gestão de segurança do trabalho. Pode-se observar nestes estudos um direcionamento dos trabalhos para áreas de vibração e assentos de equipamentos e manuseio de materiais e cargas, havendo na maioria deles um envolvimento restrito da ergonomia com a segurança do trabalho, mas sem pretensões gerenciais ou estratégicas.

Neste contexto, Mcphee (2004) descreve que ainda é pobre a compreensão da contribuição da ergonomia na mineração, incluindo aí a mineração subterrânea, e que há uma escala de itens emergentes entre ergonomia e a mineração, considerando-se desde a as mudanças nas práticas trabalho até uma melhoria na produtividade.

Portanto, nos trabalhos em atividades de mina subterrânea, segundo a pesquisa realizada, a ergonomia participa mais ativamente desenvolvendo estudos localizados sobre vibração no corpo do trabalhador, assentos e analise de postura em equipamentos, manipulação manual de materiais e cargas, relacionamento da idade dos trabalhadores, probabilidade de exposição aos perigos, entre outros aspectos. É esta visão restrita que este artigo questiona, especificamente porque a ergonomia não aparece como ferramenta nos preceitos da gestão de segurança do trabalho, mas apenas em trabalhos localizados.

Em relação a projetos de assentos e análises de vibração para equipamento de mineração subterrânea Mayton et al (2003) e Kittusamy (2005) descrevem que os equipamentos de carga e transporte em minas subterrâneas expõem os indivíduos à vibração no corpo inteiro. Além de choques mecânicos e que por muitos anos os projetos de assentos não eram prioridade nos projetos dos veículos, e mais, que a exposição afeta a saúde, segurança e conforto do trabalhador, bem como sua eficiência e desempenho. Nesta ótica, os pesquisadores conduziram um estudo para comparar projetos de assentos convencionais com projetos de assentos ergonômicos da NIOSH - National Institute for Occupational Safety and Health (que contém espuma visco elástico, sustentação lombar ajustável, ajuste de posição e inclinação, entre outros), em equipamentos de mineração subterrânea. Comprovando a melhoria em termos de redução de vibração e choque no corpo, além de um maior conforto e ajuste do corpo ao assento.

Outra abordagem da ergonomia na mineração subterrânea refere-se às questões da idade dos trabalhadores. Neste aspecto Trakofler et al (2005) apresentam descrições do envelhecimento físico e cognitivo dos trabalhadores da indústria de mineração, relacionados com a segurança do trabalho, sugerindo a integração destes conhecimentos nos projetos apropriados de segurança do trabalho, propondo também recomendações preliminares dirigidas às considerações de segurança para a força de trabalho de idade mais elevada da indústria da mineração. Descrevem também vantagens e desvantagens sobre a idade dos trabalhadores nas minerações, alertando para a as questões de treinamento e conhecimentos de novas gerações para substituir as que irão aposentar-se.

Um outro aspecto abordado nos trabalhos da ergonomia para a mineração subterrânea são as propostas e procedimentos para manuseio manual de cargas e materiais nas minas. Nesta abordagem, Stewart et al (2005) comentam que a manipulação de materiais em mina subterrânea continua a ser a categoria com maior potencial de acidentes e ferimentos, e que a mecanização e o treinamento da atividade do trabalhador são dois métodos que podem ajudar a impedir estes acontecimentos. Os autores descrevem também diversos procedimentos e

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soluções de segurança para minas subterrânea com vistas a mostrar maneiras seguras e inseguras de executar tarefas de manuseio manual de materiais.

As práticas do trabalho na mineração subterrânea estão mudando e conseqüentemente às exposições a riscos para os trabalhadores também estão mudando. Deslocamentos mais longos, fadiga e sobrecarga, cansaço mental, trabalho físico pesado intermitente, pouca variação da tarefa, trabalho sedentários em posturas fixas e a vibração no corpo, além de envelhecimento, todos trazem riscos para a saúde e segurança do trabalhador do subsolo. Entretanto, estes aspectos ainda não são reconhecidos, como deveriam pelas empresas de mineração, como causas potenciais de problemas de saúde e segurança na indústria da mineração (McPHE, 2004).

Juntamente com as mudanças nas minas subterrâneas, nos últimos 15 anos, começaram a surgir, ainda que de forma lenta, conscientização, decisões técnicas e políticas para desenvolvimento de melhorias dos problemas relacionados aos trabalhos subterrâneos. É neste contexto que a ergonomia poderia participar, de forma estratégica na organização, auxiliando os sistemas de gestão de segurança do trabalho a atingirem seus objetivos.

5. Conclusões

As minas subterrâneas e as práticas de trabalho ali desenvolvidas merecem mais atenção da segurança do trabalho e em especial de estudos ergonômicos. Devido às particularidades e riscos inerentes ao ambiente subterrâneo, considerado insalubre pela legislação, por ser um ambiente confinado, úmido, escuro, com riscos de desmoronamento e com atmosfera deficiente, acarretando em um ambiente prejudicial à segurança e a saúde do trabalhador.

O relacionamento da ergonomia com a mineração subterrânea e a gestão de segurança do trabalho, apesar de existir na forma conceitual e na forma de trabalhos práticos, conforme demonstrado na pesquisa realizada, se apresenta incipiente podendo ser mais ativo e aplicado, principalmente na forma gerencial, auxiliando no desenvolvimento de sistemas de gestão de segurança do trabalho.

Os principais sistemas de gestão em segurança do trabalho não abordam, e se o fazem é de forma discreta, os fundamentos da ergonomia em seus preceitos, mas os descrevem constantemente nas suas considerações sobre melhoria no ambiente de trabalho.

As praticas de ergonomia e de segurança do trabalho no âmbito operacional são importantes, porém limitadas em relação ao seu alcance e cumprimento de seus objetivos. Para que se tenha uma melhor eficiência, eficácia e efetividade de um plano de segurança e ergonômico são necessários que o mesmo faça parte do conceito da organização e das ações estratégicas da empresa. As decisões gerenciais de segurança do trabalho para reduzir as situações de risco, baseadas em fundamentos ergonômicos podem tornar-se mais eficientes, trazendo contribuições efetivas na redução dos níveis de acidentes nas minas.

Portanto, o questionamento deste artigo, em relação à participação da ergonomia nos sistemas de gestão de segurança do trabalho, de forma estratégica, mostrou-se pertinente, pelas considerações apresentadas, permitindo sugerir que os sistemas de gestão de segurança do trabalho desenvolvidos para as minas subterrâneas procurem adotar de forma ampla e participativa os fundamentos da ergonomia e seu relacionamento com a segurança do trabalho, nas suas propostas, de forma que seja implementada no conceito da organização, no nível estratégico da empresa.

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