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Ensaios Históricos Leopold Rodés Benefíciamento primário maceração o papel é feito com fibras vege tais dos talos de plantas como o linho e o cânhamo ou da parte fibro sa da entrecasca de gramíneas como esparto bambu ou ainda dos elemen tos estruturais de folhas como o sisal e o henequên Antes de iniciar a ma nufatura do papel porém estas fi bras devem ser desagregadas medi ante maceração corte e insistente batimento para serem transformadas numa polpa passível de ser transfor mada em folhas de papel Maceração etapa importante na polpação A desagregação destas massas ou conjuntos fibrosos eo seu desdobra mento nos seus elementos cons titutivos isto é nos diversos níveis de agregação das suas partículas fi brosas constitui a atividade denomi nada polpação nome dado ao pro cesso tecnológico que a partir das fibras vegetais consegue produzir uma polpa celulósica com a qual podem ser obtidos novos agregados 0 presente ensaio focaliza os pro cedimentos usados no beneficiamento primário das fibras vegetais princi palmente a operação que consiste em macerar os tecidos fibrosos antes durante tilou após o socamento dos mesmos A maceração é conseguida mediante a imersão dos feixes elou tecidos fibrosos em água em condi ções adequadas Normalmente a maceração antecede ou acompanha a operação de batimento das partes das plantas que contêm as fibras Inturriescimento pela água abre os fibras Os miicrIai fibrosos celulósicos quando expostos à ação da água ou a um ambiente com umi dade relativa muito elevada uma in chação denominada inturnescímento A intensidade do intumeNcímento está relacionada com a morfologia crista lina da fibra e com a polaridade dos agentes intumescedores usados Ws como água ou entre outros metanol etanol e benzaldeído 0 poder intumes cedor da água aumenta com a adição de ácidos de bases ou de sais inorgâ nicos Quando a celulose é intumescida ela abre ficando mais reativa por quanto o agente inturnescedor ao cindir as pontes de hidrogénio que interligam as diferentes cadeias poli méricas de celulose e pelo efeito da solvatação subseqüente enfraquece forças intermoleculares em jogo assim facilitando a desagregação des tas cadeias Simultaneamente esta abertura crescente permite a for mação de compostos de adição como resultado de tratamentos com ácidos ou bases Cabe lembrar que a maioria destas reações de adição com a celu lose ocorrem nos seus abundantes grupos hidroxilas e também que a distribuição espacial dos substituintes depende da acessibilidade dos res pectivos grupos funcionais Moceror e bater operações mutuamente complementares No processo de desagregação ini cial denominado polpação entram principalmente em jogo duas ações por um lado uma ação preparatória de maceração que consiste em man ter submersas em água as partes fi brosas do vegetal para as amolecer de forma diferenciada das partes não fibrosas e assim facilitar a separação das fibras intumescidas por outro lado uma importante ação comple mentar que consiste num ínsPiente batimento socamento ou pisoajiiento das partes do vegetal que contêm as Fibras visando pela força dos repeti dos impactos mecânicos quebrar as i uras que mesmo amolecidas pela iiizicei ktç to ainda mantêm unidas as partes fibrosas às não fibrosas As operações de macerar e bater devem ser visualizadas no seu con junto e nas suas funções mutuamente complementares porquanto as partes fibrosas do vegetal amolecem princi palmente em decorrência da absor ção de água pelas novas superfícies formadas nas fragmentações e racha duras causadas no martelamento pro longado do vegetal Estas rachaduras podem ser de dimensões variadas desde fissuras na escala molecular até fendas macroscópicas que indu zem a separação das camadas lami nares que constituem as paredes ce lulares onde as microfibrilas desem penham uma função de reforço As microfibrilas estão orientadas em di reções determinadas e dispostas em camadas lâminas sucessivas dentro das paredes celulares nas quais po dem ser detectados pequenos orifíci os poros ou pontuações que ínterco municam espaços vizinhos facilitan do eventuais transferências de subs tâncias líquidas e de sólidos em solu ções diluídas A maceração pode ser ainda au xiliada pela ação bioquímica de urna fermentação ou apodrecimento me diante a qual elementos microbianos digerem alguns dos componentes res ponsáveis pela agregação das fibras em feixes fibrosos assim facilitando a desagregação dos mesmos Fibras virgens versus fibras reciclados A Iffiras virgens se comportam cila L n emen e com relação 6 fibras que foram secas no passado o bati mento de fibras virgens apresenta um índice de iniumescírnento muito ele vado sendo que o valor deste índice fica reduzido à sua metade após se cagem redução decorrente do colap so de paredes celulares que ocorre durante a primeira secagem das fi bras É evidente que oentumescímen to da fibra desaparece com a primei ra secagem e este desaparecimento implica em modificações geométri cas ou topográficas das superfíci es nas quais a água estava adsorvida e das quais foi expulsa pela secagem Algumas destas modificações pare 0 Papel Setembro 1994 13

Ensaios Históricos...ais da fermentação e cuja presença no produto final não é desejada Neste ensaio é transcrita uma ver são do procedimento de polpação de fibras vegetais

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Page 1: Ensaios Históricos...ais da fermentação e cuja presença no produto final não é desejada Neste ensaio é transcrita uma ver são do procedimento de polpação de fibras vegetais

Ensaios HistóricosLeopold Rodés

Benefíciamento primário maceração

o papel é feito com fibras vegetais dos talos de plantas como o

linho e o cânhamo ou da parte fibrosa da entrecasca de gramíneas comoesparto bambu ou ainda dos elementos estruturais de folhas como o sisal

e o henequên Antes de iniciar a manufatura do papel porém estas fibras devem ser desagregadas mediante maceração corte e insistentebatimento para serem transformadasnuma polpa passível de ser transformada em folhas de papel

Maceração etapa importante napolpação

A desagregação destas massas ouconjuntos fibrosos e o seu desdobramento nos seus elementos cons

titutivos isto é nos diversos níveis

de agregação das suas partículas fibrosas constitui a atividade denomi

nada polpação nome dado ao processo tecnológico que a partir dasfibras vegetais consegue produziruma polpa celulósica com a qualpodem ser obtidos novos agregados

0 presente ensaio focaliza os procedimentos usados no beneficiamento

primário das fibras vegetais principalmente a operação que consiste emmacerar os tecidos fibrosos antes

durante tilou após o socamento dosmesmos A maceração é conseguidamediante a imersão dos feixes elou

tecidos fibrosos em água em condições adequadas Normalmente amaceração antecede ou acompanha aoperação de batimento das partes dasplantas que contêm as fibras

Inturriescimento pela água abreos fibras

Os miicrIai fibrosos celulósicos

quando expostos à açãoda água ou a um ambiente com umidade relativa muito elevada uma in

chação denominada inturnescímento

A intensidade do intumeNcímento está

relacionada com a morfologia cristalina da fibra e com a polaridade dosagentes intumescedores usados Wscomo água ou entre outros metanoletanol e benzaldeído 0 poder intumescedor da água aumenta com a adiçãode ácidos de bases ou de sais inorgânicos

Quando a celulose é intumescidaela abre ficando mais reativa porquanto o agente inturnescedor aocindir as pontes de hidrogénio queinterligam as diferentes cadeias poliméricas de celulose e pelo efeito dasolvatação subseqüente enfraquece

forças intermoleculares em jogoassim facilitando a desagregação destas cadeias Simultaneamente esta

abertura crescente permite a formação de compostos de adição comoresultado de tratamentos com ácidos

ou bases Cabe lembrar que a maioriadestas reações de adição com a celulose ocorrem nos seus abundantes

grupos hidroxilas e também que adistribuição espacial dos substituintesdepende da acessibilidade dos respectivos grupos funcionais

Moceror e bater operaçõesmutuamente complementares

No processo de desagregação inicial denominado polpação entramprincipalmente em jogo duas açõespor um lado uma ação preparatóriade maceração que consiste em manter submersas em água as partes fibrosas do vegetal para as amolecerde forma diferenciada das partes nãofibrosas e assim facilitar a separaçãodas fibras intumescidas por outrolado uma importante ação complementar que consiste num ínsPientebatimento socamento ou pisoajiientodas partes do vegetal que contêm asFibras visando pela força dos repetidos impactos mecânicos quebrar as

i uras que mesmo amolecidas pelaiiiziceiktçto ainda mantêm unidas aspartes fibrosas às não fibrosas

As operações de macerar e baterdevem ser visualizadas no seu con

junto e nas suas funções mutuamentecomplementares porquanto as partesfibrosas do vegetal amolecem principalmente em decorrência da absorção de água pelas novas superfíciesformadas nas fragmentações e rachaduras causadas no martelamento prolongado do vegetal Estas rachaduraspodem ser de dimensões variadasdesde fissuras na escala molecular

até fendas macroscópicas que induzem a separação das camadas laminares que constituem as paredes celulares onde as microfibrilas desem

penham uma função de reforço Asmicrofibrilas estão orientadas em di

reções determinadas e dispostas emcamadas lâminas sucessivas dentrodas paredes celulares nas quais podem ser detectados pequenos orifícios poros ou pontuações que íntercomunicam espaços vizinhos facilitando eventuais transferências de subs

tâncias líquidas e de sólidos em soluções diluídas

A maceração pode ser ainda auxiliada pela ação bioquímica de urnafermentação ou apodrecimento mediante a qual elementos microbianosdigerem alguns dos componentes responsáveis pela agregação das fibrasem feixes fibrosos assim facilitando

a desagregação dos mesmos

Fibras virgens versus fibrasreciclados

A Iffiras virgens se comportamcilaLnemenecom relação 6 fibrasque já foram secas no passado o batimento de fibras virgens apresenta umíndice de iniumescírnento muito ele

vado sendo que o valor deste índicefica reduzido à sua metade após secagem redução decorrente do colapso de paredes celulares que ocorredurante a primeira secagem das fibras É evidente que oentumescímento da fibra desaparece com a primeira secagem e este desaparecimentoimplica em modificações geométricas ou topográficas das superfícies nas quais a água estava adsorvidae das quais foi expulsa pela secagemAlgumas destas modificações pare

0 PapelSetembro 1994 13

Page 2: Ensaios Históricos...ais da fermentação e cuja presença no produto final não é desejada Neste ensaio é transcrita uma ver são do procedimento de polpação de fibras vegetais

cem ser irreversíveis sendo necessá

rios uns impactos mecânicos relatívamente intensos para poder novamente intumescer as fibras na sua

reciclagemOs impactos mecânicos adicionais

resultam num aumento do número de

partículas micelares o que eleva ovalor da resistência à drenagem dassuspensões resultantes Estas micelasse apresentam com um papel importante tanto no intumescimento como

na secagem do papel isto devido àgrande superfície específica que elasapresentam

Influência dos impactos mecânicosdurante a maceração

0 processo de secagem ao retirarmoléculas de água aderidas às superfícies celulares deve deixar livres as

forças de adesão que mantinham retidas as moléculas de água Estas forças causam mudanças na geometria ena topografia superficial externa dasparedes celulares assim como nosinterstícios capilares ou rachadurasde profundidades diversas Estas mudanças podem ser interpretadas comocoalescência entre partículas e rearranjo irreversíveis de aglomeradosrecém formados ou representandopartes destacadas das paredes celulares ao longo dos batimentos sucessivos

Tudo parece indicar que a coesividade nas estruturas das paredescelulares diminui o que pode ser causado por uma menor freqüência dasinterconexões entre as regiões cristalinas das cadeias celulósicas o queaumenta a propensão à desagregaçãoem decorrência de impactos mecânicos É difícil verificar se a desagregação decorre de uma degradaçãohidrolítica das macromoléculas ou

resulta dos impactos mecânicos sobre as fibras e no caso de uma açãoconjunta qual é o peso de cada umadestas atividades sobre o resultado

final da polpação0 batimento mecânico visa frag

mentar as substâncias sólidas de ori

gem orgânica que devido a seu elevado peso molecular e sua pouca solubilidade em água somente podemser eliminadas das fibras pelo arrastedos seus fragmentos em suspensãonas águas das sucessivas lavagens das

fibras Assim sendo a maceração dessas fibras e a sua lavagem com águasão duas operações que encontramosrepetidas vezes ao longo da evoluçãohistórica do beneficiamento primáriodas fibras acompanhando sempreporém o batimento mecânico dasmesmas As duas operações secomplementam mutuamente no seuobjetivo de limpar as fibras celulósicas de algumas impurezas sólidas insolúveis mediante uma suspensãodestas impurezas nas águas de lavagem ou lixiviação que simultaneamente eliminam os ingredientes solúveis nestas águas A renovação periódica das águas usadas na maceraçãoconfigura uma lixiviação que facilita

a eliminação de componentes residuais da fermentação e cuja presençano produto final não é desejada

Neste ensaio é transcrita uma ver

são do procedimento de polpação defibras vegetais usada no século X1pelos árabes de acordo com uma descrição do Emir Muizz ibn Badís10071061 época da primeira men

ção de atividade papeleira na cidademoura de Shatwi Sactabi ou Xátiva

perto de Valência 1056 0 procedimento descrito pode ser consideradocomo ponto relevante na trajetóriaevolutiva que por tentativa e errofoi delineando o perfil presente dostratamento modernos visando a

polpação de plantas fibrosas

RELATO SOBRE A POLPA ÇAO NO S1 X1

Emir MUi7ibn Balis 1007 1061

Após desfazer o tranzado de uma corda branca de cânhamo da excelente qualidade das cordas fabricadas na Síriapentear repetidamente seus fios com um pente até deixar asfibras suaves e macias como o cabelo bem penteado de umabela mulher Seguidanienle preparar leite de ctil que deveráser elaborado com a melhor e mais bratica cal viaa disponívelnele deivando macerar as fibras de cânhamo durante a uítetoda até a manhã segitínte Após esta inceração com asduas mãos amassar as fibras antes de tis pendurar e deixarexpostas ao sol durante uni dia inteiro até ficar secas Aseguir colocar novamente as fíbras em leite de cal mas nãonaquele que já foi usado anteriormente e sim num outrorecém preparado para esta finalidade e no qual as fibrasdeverão permanecer a noite toda até a manhã do dia seguinte

Arnassar coni as mãos Ia inesina maneira co ricafuraria amassadas asflíiis peta primeiro tez e colocálas ao sol parasecar repelindo estes paksosIor ou mais lias Colocando

ti massa para onacerar cucu liei inim leiie de cal novo e recémpreparado i po4m fica iiiutío 1neIIir

Quando a operação de branqueamento estiver ternínadacortar as fibras em retalhos de igual tamanho com uniastesouras e colocar as fibras cortadas em água pura quedeverá ser renovada diarkonente durante sete dias Quandototia a cal tiver sído eliminada asfibrus deveis ser batidasnum almofariz certificandosede que as libras perinaneammolhadas efrescas durante o baffinenio

Quando finalmente asfibras estiverem limpas e isentas dequalquer partícula ou aglomerado estranho colocar raiais ualimpa e num reripiente garanticiamente limpo ir desnianchando as fibras atéficar com unta aparência sedosa

14 0 PapelSetembro 1994