Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

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  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

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    E D I T O R A A U T O R E S A S S O C I A D O S L T D A .

    Uma editora educativa a serviço da cultura brasileira

    Av. Albino J. B. de Oliveira, 901

    BarSo Geraldo | CEP 13084-008

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    Conselho Editorial "Prof. Casemiro dos Reis Filho"

    Bernardete A. Gatti

    Carlos Roberto Jamil Cury

    Dermeval Saviani

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    Maria Aparecida Motta

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    Diretor Executivo

    Flávio Baldy dos Reis

    C oordenadora E d i to r ial

    Érica Bombardi

    Assistente Editorial

    Aline Marques

    Revisão

    Ana Carla de Almeida  - I

    a

      edição

    Carolina Dutra Carrijo  - I" edição

    Fernando Ramos de Carvalho

    Rodrigo Nascimento

    Diagramação e C ompos ição

    DPGLtda.

    C apa

    Baseada em  Schema delle proporzioni dei corpo umano (1490) e Studio delia fisionomia

    umana e Cavalieri,  de Leonardo da Vinci, e em  O pensador (1880-1881), de Augu ste Rodin.

    Fotos: "Criança no pneu": www.appa i .o rg .b r ;  " C amba lho ta" : www.academicadaamadora .p t ;  

    " B ambo lê" : www.s iemens .com.b rc idadan iaempresa r ia l .a sp?cana l=374&paren t=367&grupo=2 ;

    " C orr ida" : www.esec -mto rga -massama .rc ts .p t / Jo rna l /ed29 / j2909 .h tm 

    C r iação

    Bruno de Castro

    Leiaute e Arte-ftnal

    Bruno de Castro

    www.abdr.org.br

    abd r§abdr .o rg .b r

    Denuncie a cópia ilegal

    A I

    a

      e d . f o i i m p r e s s a p e l o C e n t r o d e

    E d u c a ç ã o F í s i c a e D e s p o r t o s d a U n i v e r s i d a d e

    | F e d e r a d o E s p í r i t o S a n t o ( C e f d / U f e s e m 1 9 9 7 ) .

    Impressão e Acabamen to

    Gráfica Paym

    ENTRE A

    E D U C A Ç Ã O F Í S I C A

    N ES COL A E A

    E D U C A Ç Ã O F Í S I C A

    E S C O L A

    A educação fí s i ca com o com pon ente curr icular

    Francisco Eduardo Caparroz

    3

    a

      Edição

    C O L E Ç Ã O E D U C A Ç Ã O F Í SI C A E E S P O R T E S

    AUTORES

    ASSOCIADOS V J I

    mailto:[email protected]://www.autoresassociados.com.br/http://www.appai.org.br/http://www.academicadaamadora.pt/http://www.esec-mtorga-massama.rcts.pt/Jornal/ed29/j2909.htmhttp://www.abdr.org.br/http://www.abdr.org.br/http://www.esec-mtorga-massama.rcts.pt/Jornal/ed29/j2909.htmhttp://www.academicadaamadora.pt/http://www.appai.org.br/http://www.autoresassociados.com.br/mailto:[email protected]

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    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

    (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Caparroz, Francisco Eduardo

    Entre a educação física na escola e a educação física da escola: a

    educação física como componente curricular / Francisco Eduardo

    Caparroz. - 3. ed. - C ampinas, SP: Autores Associados, 2007. - (Coleção

    educação física e esportes)

    Bibliografia.

    ISBN 978-85-7496-157-6

    1. Educação física - Brasil 2. Educação física - Brasil - Histór ia

    I. Título. II. Série.

    05-6719 CDD - 613 .70942

    índice para catálogo sistemático:

    1. Brasil: Educação física na escola 613.709 42

    I

    a

     ediç ão (Cefd/Ufes) - 1997

    2

    a

      edição (Autores Associados) - dezembro de 2005

    Impresso no Brasi l - dezembro de 2007

    Copyright © 2007 by Editora Autores Associados LTDA.

    Depósito legal na Biblioteca Nacional conforme Lei n. 10.994, de 14 de

    dezembro de 2004, q ue revogou o Decreto-lei n. 1.825, de 20 de dezembro

    de 1907.

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    Dos crimes contra a propriedade intelectual

    Violação de direito autoral

    Art. 184. Violar direito autoral

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    represente :

    Pena - reclusão de um a quatro anos e multa .

    U N I V E R S I D A D E F E D E R A L O © P A Ä

    BIBLIOTECA CENTRAI

    Ã memória da Angelica/

    amiga, madrinha e irmã pelo seu sorriso,

    carinho, coragem e dignidade (fue sempre

    marcaram sua trajetória de educadora, mãe e

    mulher e (jue a jizeram uma pessoa especial,

    infinitamente úuerida e (fue estará sempre

    presente em nossos corações.

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    I t B L i O T p r * f > ç w < » '

    S U M Á R I O

    A G R A D E C I M E N T O S

      ix 

    P R E F Á C I O À 2

    a

      E D I Ç Ã O

      xi 

    P R E F Á C I O  xv

    I N T R O D U Ç Ã O L 

    C A P Í T U L O U M

    I N T R O D U Ç Ã O A O S A N O S D E 1 9 8 0 D A E D U C A Ç Ã O F Í S IC A B R A S I LE I R A 7 

    C A P Í T U L O D O I S

    E M B U S C A D O E S T A T U T O C I E N T Í F I C O D A E D U C A Ç Ã O F Í S IC A 1 7  

    1 . A c a r a c t e r i z a ç ã o d a e d u c a ç ã o f ís i c a: e n t r e c a m p o d e c o n h e c i m e n t o e

    p r á t i c a s o c i a l 1 9

    2 . O c o n c e i t o d e e d u c a ç ã o f í s i c a e s c o l a r 5 2

    C A P Í T U L O T R Ê S

    E N T R E A E D U C A Ç Ã O F Í S IC A N A E S C O L A E A E D U C A Ç Ã O F Í S IC A D A E S C O L A 7 5  

    1 . A i n c o r p o r a ç ã o d a e d u c a ç ã o f í s i c a p e l a i n s t i t u i ç ã o e s c o l a r e o s e u

    d e s e n v o l v i m e n t o c o m o c o m p o n e n t e c u r r i c u l a r 8 3

    C O N S I D E R A Ç Õ E S F I N A I S

    O " S A L T O " P A R A F O R A N A B U S C A D A I D E N T I D A D E P E R D I D A 1 4 1  

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    ANEXO l

    6 3

    Lista de docu men tos analisados 163 

    Lista das obras estudadas 169 

    BIBLIOGRAFIA 173 

    P O S F Á C I O

      1 8 5

    ~ » t . r > w u w r n i i r

    I O - 1 - E C A C E N T H A X

    A G R A D E C I M E N T O S

    s te t r aba lho é produto de uma longa t r a je tór ia na qua l es t ive-

    ram presentes pessoas e ins t i tuições com as qua is pude man-

    te r uma r ica r e lação, quer no âmbi to acadêmico-prof iss iona l , quer no

    âmbi to pessoa l . Re lação es ta permeada de ações e sent imentos diver -

    sos e adversos , que com cer teza concor re ram tanto para meu amadu-

    rec imento prof iss iona l quanto pessoa l .

    Ao Programa de História e Filosofia da Educação e a seus pro-

    fessores, espec ia lmente à professora Nere ide Saviani pe los a pontam en-

    tos c r í t icos que foram essenc ia is para a consecução deste t r aba lho.

    Ao Lino e ao Medina , por te rem most rad o a impor tânc ia e a ne-

    cess idade de aprofundamento dos es tudos acadêmicos e pe lo incent i -

    vo incondic iona l nes ta t r a je tór ia .

    Aqueles com quem pude deba te r minhas idé ias e que sempre

    est iveram disponíve is a i sso, espec ia lmente a Cel i , Joc imar , Carmen

    Lúcia, Helder, Renato, Walter e André.

    Ao José Gera ldo, p r imeiro pe la sua comp etente , r igorosa e fu n-

    d a m e n t a l o r i e n t a ç ã o q u e p e r m i t i u d e t e c t a r a s l i m i t a ç õ e s e

    potenc ia l idades des te es tudo, - segundo pe lo incent ivo e pe la dedica-

    ção que desprendeu para comigo, compreendendo meus l imi tes e mi-

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    x   ENTRE A EDUCA ÇÃO FÍ S ICA NA ESCOLA E A EDUC AÇÃO FÍ S ICA DA ESCOLAPREFÁCIO À2

    a

     EDIÇÃO

     x

    /lt

    nhãs possibilidades,- terceiro pela convivência que, de início caracte-

    r izada por cer tas " tensões" , foi ao longo sendo ( re )const ruída por um

    r ico diá logo e por uma re lação de respe i to, que propic iou que eu re -

    conhe cesse ne le mais que um or ientador , um verdade i ro m est re e tam-

    bém um amigo.

    A g r a d e ç o e s p e c i f i c a m e n t e a o s n o v o s ' e v e l h o s a m i g o s q u e

    (re)encontrei no Espír ito Santo e que cada vez mais, com suas críti-

    cas , sugestões , e pr inc ipa lmente pe la sua dignidade e disposição em

    construir um projeto para a educação f ísica escolar brasileira, tornam

    possível meus anseios políticos e profissionais para esta. Um forte e

    f ra te rno abraço aos professo res José Luiz , Nelson, Zen ól ia , Sandra ,

    Robson, Frade, Graça, Amarílio, Silvana,Valter e Fernanda.

    E à Delma, porque com ela é mais fácil e prazeroso viver a carí-

    c ia do tempo e const rui r cot idianamente o tempo da de l icadeza .

    P R E F Á C I O À 2

    A

      E D I Ç Ã O

    I 1 ique i hon rado com o convi te para pre fac ia r es ta r e impressão

    JL

      do l ivro de Franc isco Eduardo Capar roz , r ea l izada pe la Edi to-

    ra Autores Assoc iado s . Ace i te i imedia tamente por amizade e r econh e-

    c imento ao potenc ia l inte lec tua l do autor , mas também com o desaf io

    de con fer i r " força" ao deba te indic iado p or es te l ivro que é já um su-

    cesso edi tor ia l .

    I sso exige le r , r e le r , aprofundar o deba te proposto, const rui r

    novas interpretações, buscar outras fontes. Enfim, por intermédio deste

    l ivro, procurar entender a tua l izadamente o obje to const ruído e sua

    abordagem, o contexto de produção da obra , os vínculos prof iss iona is

    e de formação do própr io autor , bem como as inic ia t ivas que se suce-

    deram tempora lmente no pa ís , após sua publ icação pe lo Centro de

    Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espír ito Santo

    ( C E F D - U F E S ) , e m 1 9 9 7 .

    Quero anui r a propr iedade do prefác io à pr imeira impressão,

    escr i to pe lo professor doutor José Gera ldo Si lve i ra Bueno. Resta -me,

    então, para não se r r epe t i t ivo, polemizar com Capar roz . Em que me-

    dida o autor , que é ele próprio marcado em sua formação inicial e con-

    t inuada pe las fontes e ambiênc ia soc ia l que reuniu e inte rpre tou , c r iou

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    xii   ENTRE A EDUC AÇÃ O F ÍS ICA NA ESCOLA E A EDUCA ÇÃO F ÍS ICA DA ESCOLA

    a l te rna t ivas de pesquisa e inte rvenção àque las presentes no per íodo

    1 9 8 0 - 1 9 9 4 ,  de verniz azevediano, do t ipo, o que a educaçã o f í s ica tem

    sido, o que é e o que deveria ser?

    Os achados do l ivro cont inuam a repercut i r na produção mais

    r e c e n t e do a u t o r ( c omo e m   C A P A R R O Z , 2 0 0 1 A  e b

    ;

      C A P A R R O Z  et al.,

    2 0 0 4 ) ,  que re toma questõe s e o supor te da his tór ia do cur r ículo e das

    disciplinas escolares para reivindicar , agora, mais proximidade em pes-

    quisa e intervenção do universo do professor e da aula na escola. Es-

    ses textos já revisam e ampliam o impacto social do livro e a meu ver

    compõem um conjunto tempora l do pensamento do autor no inte r s t íc io

    ent re mest rado no Brasi l e doutorado na Espanha .

    E claro que a maturidade da obra e do autor envolve e está en-

    volvida pe la produção de conhec imento na educação e na educação

    física, em particular . No ano de lançamento do livro

      ( 1 9 9 7 ) ,

      foi cr ia-

    do o Grupo de Traba lho Temát ico: Educação Fís ica , Espor te e Escola

    do Co l é g i o Br a s i l e i r o de C i ê nc i a s do E spor t e , que s e r e úne

    b i a nua l me n t e no c ongr e s so da e n t i da de . N a U ni ve r s i da de F e de r a l

    Fluminense (UFF) , é r ea l izado o Encontro Fluminense de Educação

    Física Escolar , a cada ano. Na Universidade Federal de Minas Gerais

    (UFMG) , ocor re o seminár io sobre educação f í s ica escola r . Os gru-

    pos de pesquisa consol idam-se pe lo pa ís , sendo re fe rênc ias produções

    oriundas de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espír ito Santo,

    Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Goiás, Pernambuco e Bahia.

    A produção edi tor ia l ampl ia - se na forma de ana is e per iódicos

    em di fe rentes supor tes . Todavia , como sustenta o professor Capar roz ,

    se o foco hoje caminha necessar iamente na di reção de compreender

    os saberes , as prá t icas dos professores , a inte rvenção nos modos de

    fazer / teor izar com/na aula , f az- se mis te r que se r ecuperem os ve ícu-

    los es t r a tégicos de disseminação do conhec imento da ambiênc ia es-

    cola r : os per iódicos de ensino e técnicos , uma vez que o t ípico do

    per iodismo c ient í f ico é discursar sobre obje tos que , se supõe , exis t i -

    r am ou que dever iam exis t i r como prá t ica da educação f í s ica na esco-

    PREFÁCIO À 2

    a

      ED IÇÃO x/ l t

    la . A edição de l ivros qüe repercutem no deba te sobre educação f í sica

    escola r c resce , inc lus ive na var iedade de ins t i tuições chance ladoras .

    Merecem destaqu e as publ icações por grupos de pesquisa , mas, sobre-

    tudo, a consol idação das co leções ve iculadas para a á rea das edi toras :

    Autores Assoc iados , Papi rus e Uni juí .

    A obr a de F r a nc i s c o E dua r do Ca pa r r oz , a o s e r r e e d i t a da e

    lançada quase uma década depo is , confere novas poss ibi l idades d e le i-

    tura ao texto. Pode mesmo ser base para autores que foram fonte de

    aná l ise quan do da sua fe i tura . Autores que foram cr i t icados e es tavam

    dis tantes das p osições s ina l izadas no l ivro na ocasião do lançamento

    agora podem esta r mais próximos ou caminhar na di reção apontada .

    Em a lgumas s ituações , se rá observado também um ac i r ramento das po-

    s ições , o que impossibi l i ta qua lquer t ipo de diá logo c ien t í f ico a par t ir

    das inte rpre tações gra fadas e que se conf i rmaram nos anos que se se -

    guiram.

    Este livro, como o bje to e fonte viva de conhec imento , movimen-

    ta-se. O autor e parte daqueles que lhe serviram de fontes também es-

    tão vivos e em f ranca movim entação no camp o acadêmico da educação

    f ísica . E desse r ico e poderoso processo que um maior públ ico da edu-

    cação f ísica brasileira terá oportunidade de participar . Para alguns, con-

    vido à leitura, para outros existe sem pre esp aço para releituras. Ler e reler

    pode gerar também o desejo de escrever e reescrever. E todos nós, que

    fomos constituídos e constituidores pela e da área de educação f ísica,

    queremos, podemos e devemos ass im proceder .

    Amarílio Ferreira Neto

    Professor da Universidade Federal do

    Espírito Santo  ( U F E S )  e coordenador do  P R O T E O R I A

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    P R E F Á C I O

    er convidado a prefaciar o livro de Francisco Eduardo Caparroz

    foi para mim motivo de satisfação e de orgulho, na medida em

    que e le é f ruto de sua disser tação de mest rado, produz ida sob minha

    or ientação e defendida no Programa de Estudos Pós-Graduados em

    Educação: História e Filosofia da Educação, da Pontif ícia Universida-

    de Católica de São Paulo.

    Mot ivo de sa t i s fação e de orgulho por consta ta r que o t r aba lho

    que vimos rea l izando no Programa es tá gerando bons f rutos , r econhe-

    c idos pe la comunidade acadêmica e divulgados para públ icos diver s i -

    f icados, cujo acesso à dissertação seria muito mais dif ícil .

    Mas, mais do que isso, por verif icar a aceitação, por uma edito-

    ra universitár ia, de estudo ousado e original que procurou verif icar até

    que ponto a educação f í s ica pra t icada nas escolas tem s ido es tudada

    como componente cur r icula r , na medida em que grande par te da pro-

    dução teór ica que sobre e la se debruça tem buscado seus fundamen-

    tos e e fe tuad o suas c r í t icas a par t i r dos de te rmina ntes e xte rnos que a

    conformaram e não na sua const i tuição his tór ica dent ro da escola .

    O primeiro m érito deste trabalh o foi o de procurar analisar a pro-

    dução teórica sobre educação f ísica escolar produzida a partir dos anos

    « y W IV E R S ID Â O E F E D E R A L D O P A «

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    xvi   ENTRE A EDU CAÇ ÃO F ÍS ICA NA ESCOLA E A EDU CAÇ ÃO F ÍS ICA DA ESCO LA

    de 1980, com base em cr i té r ios def inidos para levantamento bibl iográ-

    f ico espec í f ico, prá t ica não mui to ut i l izada em nosso m eio. O autor , a

    par t i r de c r i té r ios obje t ivos e expl ic i tamente apresentados , e fe tuou le -

    vantamento exaust ivo da l i te ra tura produz ida no Bras i l , incorporando

    l ivros e a r t igos publ icados nos pr inc ipa is per iódicos espec ia l izados .

    A discussão e fe tuada no segundo capí tulo é , a meu ver , exem-

    plar, na medida em que pro cura verif icar como a li teratura especializada

    tem t ra tado a educação f í sica como cam po de conhec im ento, e fe tuando

    crítica acerba, mas justa e metódica , de aspectos qu e mostram a incon -

    s is tênc ia teór ica desses es tudos que , via de regra , têm confundido

    campo de conhec imento com prá t ica soc ia l . Por out ro lado, expõe as

    f raquezas da á rea que parece te r incorporado acr i t icamente as discus-

    sões or iginár ias do campo pedagógico que também procuraram, por

    decre to, ins t i tui r a "c iênc ia pedagógica" . Em s íntese , ass im como a

    pedagogia , a educação f í s ica não se const i tui em campo de conhec i -

    mento, porque esse se produz a par t i r da de l imi tação de obje to/mé-

    todo, não porque o anunciemos  a priori,  ma s c omo p r odu t o de um c on-

    j un t o o r gâ n i c o de i nve s t i ga ç õe s que , e m da do mome nt o h i s t ó r i c o ,

    consegue tornar i r r edut íve l seu obje to de es tudo.

    A cr í t ica e fe tuada à visão de educação f í s ica escola r como con-

    formada por ins t i tuições exte rnas à escola (mi l i ta r , médica e espor t i -

    va) aponta para novos caminhos, na medida em que , em s íntese , e fe -

    tua análise crítica da delimitação de seu o bjeto a partir dessas influências,

    e mais , por considerar que essas não são exte rnas mas se const i tuem

    no pró pr io cam po em que a educação f í sica escola r se for jou.

    Mas, mais do que todas essas c r í t icas , a presente obra aponta

    para novas poss ibi l idades de es tudos sobre a educação f í s ica que se

    pra t ica nas escolas . Se quisermos e fe t ivamente procurar r esponder o

    que e la tem s ido, é prec iso que nos dispamos de nossos "pré-conce i -

    tos" e adentremos à instituição escolar para verif icarmos, de fato, como

    ela tem se const ruído na prá t ica pedagógica e fe t iva .

    PREFÁCIO À 2

    a

     EDIÇÃO  lt

    Nesse sent ido, o t r aba lho em questão nos aponta que a educação

    física escolar da qual se tanto falou e se escreveu nessas duas ú ltimas dé-

    cadas não era a que efetivamente se dava dentro da instituição escolar ,

    mas aquela que os teóricos apontavam como expressão de influências

    negativas do militar ismo, da medicina e do esporte, para produzirem um

    discurso prescritivo e exortativo sobre o que ela deveria ser .

    Assim, perdeu-se o que a educação f ísica foi construindo, de fato,

    como componente curricular , posição da qual o autor resolveu não só

    divergir , como efetuar cr ítica f irme, dura, mas, antes de m ais nada, séria

    e consistente, calcada no princípio da pluralidade acadêmica que deve

    nortear estudos dessa natureza e que aponta para as possibilidades ex-

    tremamente interessantes de estudo sobre a educação f ísica escolar .

    J o s é

      Geraldo Silveira Bueno

    Professor titular do Programa de Estudos Pós-

    Graduados em Educação: História, Política, Sociedade

    da PUC-SP.

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    9/102

    I N T R O D U Ç Ã O

    s t e es tudo fo i desenvo lv ido o r ig ina lmen te como d i s ser t ação '

    do cu rso de mes t rado do Programa de Es tudos Pós -Gradua-

    dos em Educação- . H i s tó r i a e Fi loso f ia da Educação , da Pon t i f í c i a Un i -

    v e r s i d a d e C a t ó l i c a d e S ã o P a u l o ( P U C - S P ) . C a r a c t e r i z a - s e o m e s m o

    c o m o u m e s t u d o t e ó r i c o e r e f e r e - s e f u n d a m e n t a l m e n t e à p r o b l e m á t i -

    ca da educação f í s i ca esco lar . Versa sobre a fo rma como a p rodução

    teó r i ca dos anos de 1980 e in í c io dos anos de 1990 t ra tou a ques t ão

    da educação f í s i ca como componen te cu r r i cu lar . Dessa fo rma, a aná-

    l i s e da p rodução especia l i zada sobre educação f í s i ca p roduzida no pe-

    r íodo compreend ido en t re 1980 e 1994 , no Bras i l , p rocurou respon-

    d e r à s e g u i n t e q u e s t ã o : d e q u e m o d o a p r o d u ç ã o t e ó r i c a s o b r e a

    educação f í s i ca dos anos de 1980 concebe a educação f í s i ca como um

    c o m p o n e n t e c u r r i c u l a r ?

    Três h ipó teses nor t earam o es tudo- .

    1 . D e f e n d i d a e m a g o s t o d e 1 9 9 6 e i n t i t u l a d a   A educação ísica

      como

     componente curricular:

    entre a educação Jísica tia escola e a

      educação

     Jísica da escola.  S e n d o a b a n c a e x a m i n a d o r a

    c o m p o s t a p e l o s p r o f e s s o r e s d o u t o r e s : J o s é G e r a l d o S i l v ei r a B u e n o - P U C - S P

    ( o r i e n t a d o r ) , - N e r e i d e S a v i a n i - P U C - S P e V a l t e r B r a c h t - C e n t r o d e E d u c a ç ã o

    F í s i ca e D e s p o r t o s d a U n i v e r s i d a d e F e d e r a l d o E s p í r i t o S a n t o ( C E F D / U F E S ) .

    t ^ i V E R S I D A D E F E D E R A L D O

      PAHM

    BIBLIOTECA CENTRAL

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    10/102

    2 ENTRE A EDUCAÇ ÃO FÍSICA NA ESCOLA E A EDUCAÇ ÃO FlSICA DA ESCOLA

    a) Embora os e laboradores da produção teór ica sobre educação

    f ís ica escola r es tivessem cen t rando suas preocup ações em uma

    educação f í s ica a se r desenvolvida dent ro da escola , não con-

    segui ram es tabe lecer uma inte r locução com a educação n o sen-

    t ido da carac te r ização da educação f í s ica como componente

    curricular,-

    b) Ao e laborarem a produção teór ica sobre educação f í s ica esco-

    lar , justif icam, explicam sua incorporação e seu desenvolvimen-

    to como componente cur r icula r , buscando uma fundamentação

    basicamen te no seu cará te r ins t rumenta l , u t i l i tá r io, na sua de-

    te rminação pe la es t rutura econômica , pol í t ica e soc ia l em fa -

    vor do poder hegemônico, dominante e

    c) A educação f í s ica manteve uma intensa inte r locução com a

    educação, apenas no âmb i to das teor ias educac iona is , in corpo-

    rando os aspec tos f i losóf icos , soc iológicos e ps icológicos da

    educação, de modo mecânico.

    Obje t ivando invest igar a bibl iograf ia que tenha exerc ido e fe t i -

    vamente alguma influência na área, util izei como critér io o levantamen-

    to da l i te ra tura espec ia l izada constante dos concursos públ icos para

    professores de I

    o

      e 2

    o

      graus

    2

      das redes municipal e estadual de São

    Paulo (ocor r idos ent re   1 9 8 0  e  1 9 9 4 ) ,  das propostas curriculares para

    a área de educação f ísica de I

    o

      e 2

    o

      graus das redes municipal e esta-

    dual de São Paulo (entre 1980 e 1994) e dos subsídios pedagógicos/

    cur r icula res de educação f í sica também das redes munic ipa l e es tadua l

    de São Paulo (entre   1 9 8 0  e  1 9 9 4 ) .

    Com base no levantamento da bibl iograf ia c i tada nos documen-

    tos , encont re i se tenta  ( C A P A RR O Z , 1 9 9 6 )  obras de referência sobre edu-

    cação f ísica: considerei todas as obras em que o termo educação f ísica

    estivesse presente e, ainda, aquelas editadas após 1980, visto que é este

    2 . A t u a i s e n s i n o f u n d a m e n t a l e e n s i n o m é d i o ( r e s p e c t i v a m e n t e ) .

    INTRODUÇÃO 3

    o per íodo que inte ressa aos obje t ivos des te t r aba lho. O levantamen-

    to, obedecendo aos re fe r idos c r i té r ios de se leção, r eve lou a exis tên-

    cia de 16 livros e 11 artigos em periódicos

    3

    .

    Fe i tos os levantamentos , e fe tue i a se leção e c lass i f icação das

    obras ( limitando-me à análise sobre os livros e artigos) de autores na-

    c iona is e que ver sassem sobre e ducação f í sica escola r ou t r a tassem da

    área da educação f í s ica em te rmos abrangentes . I sso s igni f ica que os

    temas espec í f icos , como ana tomia , f i s iologia , bioenergé t ica e tc . , não

    foram considerados para e fe i to de aná l i se des ta pesquisa .

    A escolha do re fe renc ia l teór ico que fundamentou es te t r aba lho

    está r e lac ionada à compreensão do obje to em suas de te rminações his-

    tór icas espec í f icas . Para compreender como a produção teór ica dos

    anos de 1980 carac te r iza a educação f í s ica como componente cur r icu-

    la r , foi prec iso empreender es tudos sobre a forma como essa produ-

    ção analisa o passado da área e quais conseqüências ela traz à tona para

    expl icar por que a educação f í s ica es tá presente no cur r ículo. Assim,

    procure i descrever e expl icar o mot ivo que levou os autores aqui es-

    tudados a percor re rem a his tór ia da educação f í s ica escola r , o modo

    com o operaram as aná l ises a esse r espe i to e a que conc lusão chegaram.

    Foi operada inicialmente uma breve discussão sobre as relações

    que se travaram no âmbito acadêmico da educação f ísica brasileira des-

    de 1980, obje t ivando compreender o contexto em que a produção teó-

    rica fora elaborada, bem como explicitar a importância que tal produ-

    ção teve na per spec t iva de avançar em di reção ao redimensionamento

    das concepções pedagógicas , das abordagens metodológicas , dos para-

    digmas que balizavam a produção científ ica, enfim da ruptura e supera-

    ção que e la procurou es tabe lecer com uma produção que a té então se

    pautava quase única e exc lus ivamente na per spec t iva biologic is ta da

    aptidão f ísica. E isso pode ser observado no Capítulo 1.

    3 . A r e l a ç ã o d a s o b r a s a n a l i s a d a s e n c o n t r a - s e n o A n e x o 2 .

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    11/102

    1 kN IK h A EDUCAÇ AQ F ÍS ICA NA ESCOLA E A EDUCA ÇÃO F ÍS ICA DA ESCOLA

    O desenvo lvimento das aná l i ses r eve lou que , além da questão d o

    t ra tamento dado à educação f í s ica como componente cur r icula r , ha-

    via uma out ra , no meu entender ante r ior a essa , e que se r e fe r ia à

    indef inição conce i tua i da educação f í s ica , pois a l i te ra tura em questão

    parecia não distingui- la entre uma prática social, que ocorre em dife-

    rentes âmbi tos de um campo de es tudo, de uma área de conhec imen-

    to, de um campo de inte resse c ient í f ico.

    Nesse sent ido, procure i compreender como essa l i te ra tura bus-

    cou def ini r conce i tua lmente a educação f í s ica . Assim, foi necessár io

    percor re r a forma com o essa produ ção carac te r izou a á rea nos anos de

    1980. Essa característica deu-se com base em um discurso ambíguo re-

    sul tado de uma indef inição do t r a tamento dispensado à educação f í s i -

    ca , t r a tando-a ora como uma prá t ica soc ia l produz ida his tor icamente

    pe lo hom em e que diz r espe i to às diversas formas que a a tividade f í s i-

    ca assumiu na soc iedade moderna , ora como campo de es tudo, como

    área de conhec imento, como campo de inte resse c ient í f ico.

    Decor rente disso, uma carac te r í s t ica marcante dessa l i te ra tura

    parec ia se r a do entendimento de que o apr imoramento das prá t icas

    soc ia is se dar ia exc lus ivamente em vi r tude do desenvolvimento c ien-

    t í f ico, consid erando ta is prá t icas apenas como cam po de apl icação das

    descober tas c ient í f icas , o que me levou a ana l i sa r como se processou

    essa discussão conceituai mais ampla. Também procurei verif icar , den-

    tro dessa discussão, de que forma foi caracterizada a educação f ísica

    escola r , obje to do Capí tulo 2.

    Toman do po r base as observações decor rentes dessa veri f icação,

    e entendendo que a produção teór ica sobre educação f í s ica escola r ,

    obje to de es tudo deste t r aba lho, é uma const rução que não pode se r

    compreendida de forma isolada e desprendida do seu cará te r his tór i -

    co, foi necessár io r ea l izar uma aná l i se que compreendesse o par t icu-

    la r como resul tado de múl t iplas de te rminações . Assim, procure i ver i -

    f i c a r o que ve m se ndo p r oduz i do a c e r c a da c a r a c t e r i z a ç ã o dos

    componentes cur r icula res , na l i te ra tura mais ampla da educação. Re-

    I N T R O D U Ç Ã O 5

    cor r i aos es tudos sobre a his tór ia das disc ipl inas /matér ias escola res ,

    sobre a espec i f ic idade do saber escola r , sobre a conversão do conhe-

    c imento em conteúdo cur r icula r , enf im, a aná l i ses que obje t ivaram

    compreender a const i tuição, o desenvolvimento, as pecul ia r idades e

    o s igni f icado daqui lo que se denominou componente cur r icula r . Nes-

    se sentido, lancei mão das produções de Saviani (1994, 1995a), San-

    tos (1990) , Goodson (1990) e Forquin (1992, 1993) .

    Desta manei ra , no Capí tulo 3, empreendi aná l i se de forma a

    de ta lhar co mo a educação f í sica, como co mp onen te cur r icula r , foi es-

    tudada pe la produção dos anos de 1980. Consta te i que , de uma forma

    gera l , essa produção entende a incorporação da educação f í s ica pe la

    ins t i tuição escola r e o seu desenvolvimento como componente cur r i -

    cula r , sempre em vi r tude do seu cará te r ins t rumenta l , de sua confor -

    mação irremediável pela estrutura econômica, política e social, de sua

    de te rminação como con t role soc ia l . Nesse sent ido, enten de que a edu-

    cação f ísica sofre ao longo de sua trajetória histórica influências exter-

    nas das instituições militar , médica e desportiva, levando a área a f icar

    aprisionada a um caráter util i tár io, ou seja, a educação f ísica serviu

    sempre aos intentos do poder hegemônico, sendo conformada de acor -

    do com as de te rminações/mudanças que o contexto lhe impr imia , mas

    sempre se rvindo ao ideár io dominante .

    O estudo sobre as análises produzidas pela li teratura dos anos

    de 1980 acerca dessas influências possibilitou o entendimento das con-

    seqüênc ias que os autores r e t i r am de seus es tudos e o que levantam a

    respeito, ou seja, foi possível entender como eles descrevem, explicam

    o passado e o presente dessa á rea no cur r ículo e o que apontam em

    relação ao futuro dessa disciplina.

    Assim, nas Considerações Finais, aponto as saídas propostas pe-

    los di fe rentes autores , que se carac te r izaram fundamenta lmente pe lo

    que deno mine i "sa l to para fora" , por entend er que , na medida em que

    pra t icamente toda essa produção pouco se debruçou no sent ido de

    procurar descrever e explicar a trajetória histórica da educação f ísica

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

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    168E N T R E A E D U C A Ç Ã O F l S I CA N A E S C O L A í  A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A D A E S C O L AANEXO169

    como par te da cul tura incorporada pe la ins t i tuição escola r , mas a en-

    tende co mo re f lexo de de te rminações econômico-soc ia is e , conseqüen-

    t e me n t e , i n f l ue nc i a da po r i n s t i t u i ç õe s que nã o e r a m c ons i de r a da s

    const i tuidoras de seu campo, não poder ia haver out ra sa ída para sua

    t ransformação que a da busca de bases exte rnas a e la .

    Enf im, mais que uma nova resposta a questões tão complexas ,

    entendo que o mér i to des te t r aba lho - tendo c la ro que a l i te ra tura

    sobre a qua l me debruce i se mater ia l izou num de te rminado contex-

    t o , num da do mome nt o h i s t ó r i c o e , po r i s so me smo, r e c onhe c e ndo

    sua impor tânc ia his tór ica - é o de procurar es tabe lecer r e f lexão c r í -

    t ica que aponte para novas poss ibi l idades de es tudos sobre educação

    física escolar .

    C A P Í T U L O • U M

    I N T R O D U Ç Ã O A O S A N O S D E 1 9 8 0

    D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A B R A S I L E I R A

    endo o obje t ivo pr inc ipa l des te t r aba lho de pesquisa r ea l izar um

    estudo so bre a produ ção teór ica dos anos de 1980 e de 1990 qu e

    versa sobre educação f ísica escolar , procurando analisar como essa pro-

    dução carac te r iza a educação f í s ica como componente cur r icula r , foi

    necessár io dar um pr imeiro passo em di reção à compreensão do mo-

    vimento dos anos de 1980 e de 1990 dent ro da educação f í s ica esco-

    la r no Bras i l . Procure i , ass im, aprofundar o entendimento do contex-

    to em que a produç ão teór ica fora e laborada , bem co mo a imp or tânc ia

    que e la teve na per spec t iva de avançar em di reção ao redimensiona-

    mento das concepções pedagógicas , das abordagens metodológicas ,

    dos paradigmas que ba l izavam a produ ção c ient í f ica , enfim da ruptura

    e superação que e la procurou es tabe lecer em re lação a uma produção

    que a té então se pautava quase que única é exc lus ivamente na p er spec-

    tiva biologicista, da aptidão f ísica.

    Des de o f ina l dos anos de 1970, e durante os anos de 1980, ob-

    serva- se um efervescente per íodo de denúncias , r eve lações e desco-

    ber tas do pape l qu e a educação f í s ica vinha e vem de sem penh ando em

    favor de um poder hegemônico, dominante , de te rminante e opressor

    ( M E D I N A , 1 9 9 0 ) . A

      pro du ção na área passa a ser intensa e versa, prin-

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

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    1 4 ENTRE A EDU CAÇ ÃO F fS ICA NA ESCOLA E A EDUC AÇÃ O FtS ICA DA ESCOLA

    c i p a l m e n t e , s o b r e a s c o n c e p ç õ e s q u e h i s t o r i c a m e n t e v i n h a m

    formatando e o r i en tando as suas p rá t i cas . E nesse sen t ido que Medina

    (1983) no in í c io dos anos de 1980 exp l i c i t a a ex i s t ência de t rês con -

    cepç ões de educação f í s ica : convencional , m odern iz adora e revo luc io -

    nár i a ; Gh i ra lde l l i Jún io r (1991) , po r ou t ro l ado , c l as s i f i ca-as em c inco

    t ipos : h ig i en i s t a , mi l i t a r i s t a , pedagog ic i s t a , compet i t i v i s t a e popu lar ,

    enqu an to Cas t e l l an i F i lho (1988) re fere- se a t rês concepç ões : b io lo -

    g ização , ps i copedagog ização e t rans fo rmadora . Embora d i ferenciados ,

    os au to res ap rox imam-se na concepção da educação f í s i ca , t omando-

    se por base um refe rencia l fo ra da p rópr i a á rea , ou se j a , das d i scussõe s

    que ocorr i am no campo da pedagog ia , bas i camen te das t eo r i as educa-

    c ionai s pau tadas nas p ropos tas de Pau lo Fre i re , da pedagog ia l i ber t a -

    dora , e de Derme val Sav ian i e José C ar los L ibâneo , da pe dagog ia h i s -

    tó r i co -cr í t i ca (c r í t i co -socia l dos con teúdos ) nos anos de 1980 .

    E p rec i so t e r c l a ro que es se não fo i um movimen to i so l ado da e

    na educaç ão f ís ica ,- ao con t rár io , e l e i n ser iu -se num m ovim en to mui to

    mai s amplo , que é o da redemocra t i zação da soc iedade b ras i l e i ra . No

    f ina l dos anos de 1970 , os mov imen tos soc ia i s o rgan izad os pas saram

    a c l amar pe l a "aber tu ra po l í t i ca" . Fo i o t empo das re iv ind icações por

    uma "anist ia ampla, geral e i rrestri ta", pela organização l ivre dos s in-

    d i ca tos e demai s as sociações , pe l as "Di re t as J á" . Fo i o t empo em que

    se exp l i c i tou o descon ten tamen to cada vez maio r de parce l a s ign i f i -

    cat iva da sociedade brasi leira com o autori tarismo presente ao longo dos

    governos mi l i t a res . Fo i o t empo , en f im, da " t rans i ção democrá t i ca" .

    No cenár io da educação f í s i ca nac ional , s ão t ravados impor t an -

    t es debates e o rgan izados movimen tos que , en t re ou t ras carac t er í s t i -

    cas , t i veram o mér i to de t ens ionar as re l ações v igen tes na área , com

    u m m o v i m e n t o i n t e n s o d e q u e s t i o n a m e n t o e c o n t e s t a ç ã o d a s p r á t i c a s

    e das po l í t i cas púb l i cas da época . Pau tados p r inc ipa lmen te na b io log i -

    z a ç ã o d o m o v i m e n t o h u m a n o , m a t e r i a l i z a v a m - s e p o r i n t e r m é d i o d e

    prá t i cas despor t iv i zada s , v i sando bas i cam en te à fo rm ação de a t l e t as e

    ao desenvo lv imen to da ap t idão f í s i ca , desenvo lv ida por meio de uma

    I N T R O D U Ç Ã O A O S A N O S D E 1 9 8 0 D A E D U C A Ç Ã O F f SI C A B R A S IL E I R A85

    pedagog ia t ecn ic i s t a . Nesse sen t ido , a p rodução t eó r i ca que se inser i a

    numa v i são h i s tó r i ca ou soc io lóg ica p rocurou operar a c r í t i ca mos t ran -

    do que , h i s to r i camen te , a educação f í s i ca b ras i l e i ra es t eve a t re l ada ao

    parad igma b io lóg ico e que , nes sa perspect iva , as p rá t i cas desenvo lv i -

    das sus t en taram-se pe lo seu cará t er i n s t rumen ta l em favor do  status

     quo,

    a serviço da classe dominante, ou seja, a educação fís ica vol tava-se para

    a cons t rução de um corpo o rde i ro , d i sc ip l inado , fo r t e e a l i enado , ga-

    ran t indo saúde e ap t idã o f í s ica ao trabalhador , p rep arando-o para as ex i-

    gências das t écn icas do t rabalho . Essa p rodução revela t ambém que

    esse cará t er i n s t rumen ta l es t ava impregnado de au to r i t a r i smo , heran -

    ça da influência mil i tar que se sobrepôs à área desde o início do sécu-

    lo pas sado .

    Essa crí t ica estabelecida nos anos de 1980 se, por um lado, t rouxe

    uma impor t an te con t r ibu ição , ao cr i t i car um modelo quase ún ico que

    confo rma va a educação f í s i ca e ab r i r a poss ib i l i dade de debate sobre ou-

    t ras fo rmas de compreender a educação f í s i ca que não apenas pe los as -

    pec tos b io lóg icos , acabou t ambém por operar um cer to reducion i smo,

    ao anal i s ar de fo rma mecân ica a re l ação en t re a esco la e a soc i edade ,

    en t re a educaçã o f í s i ca e as ex igências do t rabalho , com a função ún ica

    de p repa rar o a luno para a a t iv idade soc ia l o rdenada , au to r i t á r i a .

    Ne sse sen t ido , o s anos de 1980 aparece m como o nasc ime n to

    d e c o n c e p ç õ e s e p r á t i c a s p e d a g ó g i c a s li b e r t a d o ra s , t r a n s f o r m a d o r a s ,

    na perspect iva de desenvo lver uma educação f í s i ca vo l t ada para o ser

    humano e não mai s para as necess idades do cap i t a l . As e l aborações

    t raz i am em seu bo jo uma nova p ropos ta de educação f í s i ca , t o t a lmen-

    t e d i feren te de tudo o que hav ia s ido pensado ou exper imen tado , v i s -

    to que a educação f í s i ca que se t i nha a t é en tão só serv i a para a manu-

    t e n ç ã o d o

      status cfuo.

    Nesse p r im ei ro mom ento , a c r í ti ca dos au to res nos anos de 1980

    resumiu-se na denúncia do es t abelec ido , s em que houvesse um mer-

    gu lho mai s i n t enso na anál i s e das p rá t i cas pedagóg icas e fe t ivas e que

    r e d u n d a r a m , p o s t e r i o r m e n t e , n o s u r g i m e n t o d e u m a d i v e r s i d a d e d e

    W W I V E R S i D A p c F E D E R A L D Q P A

    BIBLIOTECA CENTRA .

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

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    10 ENTRE A EDUCAÇÃ O F ÍS ICA NA ESCOLA E A EDUCAÇ ÃO F ÍS ICA DA ESCOLA

    ver tentes que c lamam por uma educação f í s ica e laboradora de uma

    praxis para a const rução de um "corpo democrá t ico" , do "movimento

    l i v r e " , do " c o r po c omo i ns t r ume n t o de l i be r t a ç ã o do home m" , da

    "consciência corporal", da "cultura corporal", da "expressão corporal",

    da "percepção dos s ignos soc ia is do corpo" , da "percepção dos con-

    dic ionantes soc iois tór icos que de te rminam os di fe rentes t ipos de con-

    cepção de corpo na soc iedade" .

    Nesse processo de con tes tação, des tacam-se a r ea l ização de im-

    por tan tes eventos , com o o Congresso Brasi lei ro de Ciênc ias do Espor -

    t e - R e g i ã o N o r t e / N o r d e s t e

      ( 1 9 8 0 ) ,

      que discut iu temas re lac ionados

    aos aspec tos soc iológ icos da educação f í s ica e do espor te . N esse mes-

    mo ano, houve a par t ic ipação de um grupo de es tudantes da Faculda-

    de de Educação Física de Santo André, na 32

    A

      Reunião Anual da SBPC,

    apresentando t r aba lho int i tulado "Af ina l , o que é Educação Fís ica no

    Brasil?". Ainda em 1980, ocorreu a realização do I Encontro Nacional

    de Estudantes de Educação Fís ica

      ( E N E E F ) ,

      realizado na Bahia, e que,

    ent re vár ios temas abordados , teve t r aba lhos que procuravam ana l i sa r

    a conjuntura da pol í t ica nac iona l , "a par t ic ipação do professor e do

    estudante de educação f í s ica nas ent idades" .

    Em 1983, houve a r ea l ização do I I I Congresso Bras i le i ro de

    Ci ê nc i a s do E spor t e , e m G ua r u l hos ( S P ) , p r omovi do pe l o Co l é g i o

    Brasi le i ro de Ciênc ias do Espor te (CBCE) , em que se discut iu, numa

    das mesas , o tema "Despor to e desenvolvimento humano", que pare-

    ce ter sido uma das principais alavancas impulsionadoras de uma dis-

    puta ac i r rada pe la hegemonia dent ro do CBCE, ent re o grupo da á rea

    médica e aque les que se inser iam ou se aproximavam d e per spec t ivas

    consideradas progress is tas . Outro s f a tos r e levantes foram, a inda , a pu-

    bl icação do per iódico  Corpo e Movimento,  da Assoc iação dos Professo-

    res de Educação Física de São Paulo, a partir de 1984, e o debate tra-

    vado em 1985, por ocasião da e le ição para a escolha da di reção da

    Assoc iação dos Professores de Educação Fís ica   ( A P E F - S P )  para a ges-

    t ã o 1 9 8 6 - 1 9 8 8 ( C AS T E LL A N I F I L H O , 1 9 8 8 ) .

    I NT R O D U Ç Ã O A O S A NO S P E  1 98 0 DA EDU CAÇÃO F ÍS ICA BRASILE IRA 11

    Pode-se observar que , ent re o f ina l dos anos de 1970 a té mea-

    dos dos anos de 1980, parece haver uma união de forças , um esforço

    concent rado por par te de todos aque les que se s i tuavam no campo dos

    "progress is tas" ' , para a const rução de um movimento renovador na

    área , capaz de se cont rapor ao paradigma biológico hegemônico. Po-

    rém, a par t i r da " t r ansição democrá t ica" , observa- se que o movimen-

    to passa a priorizar no debate as questões mais específ icas da área, ainda

    que a presença das questões pol í t icas amplas cont inuem presentes . A

    maior ia dos formuladores /e laboradores das concepções de educação

    f ís ica escola r nos anos de 1980 es tão desenvolvendo seu t r aba lho nas

    instituições de ensino superior (IES) já desde o f inal dos anos de 1970.

    Nesse per íodo inic iam-se os cur sos de pós-graduação em educação f í -

    sica no Brasil e estão voltando vários professores que realizaram seus

    estudos pós-graduados no exte r ior . Já no iníc io dos anos de 1980, a

    área passa a sof re r uma cobrança in te rna e exte rna q uanto à sua legi t i -

    mação enquanto á rea acadêmica , e nesse sent ido há necess idade de se

    p r oduz i r t e o r i c a me n t e . O bse r va m- se , po r e xe mpl o , o s r e c l a mos de

    pesquisadores e de agênc ias f inanc iadoras de pesquisas sobre a c ien-

    tif icidade da área

      (B R A C H T , 1 9 9 3 ;

      p .

      1 1 1 ) .

      H á um i n t e nso mov i me n t o

    dos inte lec tua is da á rea , ingressando e r ea lizando seus cursos de m es-

    t rado e doutorado ( tanto em programas espec í f icos de educação f í s i -

    ca , como em programas de educação) e depois vol tando para as IES.

    Nesse sent ido, parece que , em meados dos anos de 1980, a á rea passa

    a demonst ra r uma cer ta "matur idade" acadêmica , poss ibi l i tando aná-

    lises críticas voltadas para o seu interior . Esse movimento fez com que

    os intelectuais passassem a explicitar suas diferenças teóricas. Começam

    a surgir teorias explicativas da área à luz de diferentes referenciais teó-

    r icos , com ac i r ramento d o deba te em re lação à produção do per íodo.

    1 . E n t e n d e n d o p r o g r e s s i s t a c o m o o s q u e l u t a r a m p e l o p r o c e s s o d e r e d e m o c r a t i z a ç ã o

    d a s o c i e d a d e b r a s i l e i r a n o f i n a l d o s a n o s d e   1 9 7 0  e d u r a n t e o s a n o s d e  1 9 8 0 .

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    15/102

    1 4 ENTRE A EDUCAÇÃO FfSICA NA ESCOLA E A EDUCAÇÃO FtSICA DA ESCOLA

    Após as cons iderações an ter io res , va l e re tomar a lgumas ques tõe s

    j á apon tadas para poder perceber es se movimen to não só pe l a ó t i ca que

    seus su j e i tos nos o ferecem, mas , p r inc ipa lmen te , com o lhar que per -

    mi t a uma anál i s e d i ferenciada , no sen t ido de poss ib i l i t a r a v i sua l i zação

    das p r inc ipa i s carac t er í s t i cas ap resen tadas pe l a p rodução t eó r i ca e l a-

    borada nos anos de 1980 .

    A anál i s e operada pe los in t e l ec tua i s des se per íodo apon ta para

    u m m o v i m e n t o a u t o - i n t i t u l a d o " r e n o v a d o r "

    2

      da educação f í s i ca b ras i -

    l e i ra . Nes t e sen t ido , vão cons t ru i r concepções , f i rmar pos i ções que de-

    ver i am romper , superar o pas sado . En t re t an to , parecem negar es se pas -

    sado ou mesmo obscurecê- lo , va l en do-se de anál i ses que f i caram presas

    meramente aos cond ic ionan tes econômicos , po l í t i cos e soc i a i s , mes -

    mo quando t en tavam se vo l t a r para a aná l i s e do campo pedagóg ico .

    Não é p re t ensão negar ou menosprezar a cons ideração desses

    cond ic ionan tes . O que se co loca em ques t ão é se a p rodução dos anos

    de 1980 fo i cons t ru ída , p roduzida apenas pe lo embalo , pe l a a l avanca

    2 . P o d e - s e o b s e r v a r a i d é i a d e c o n s t i t u i ç ã o d e u m m o v i m e n t o " r e n o v a d o r " e m a l g u n s

    t r a b a l h o s e l a b o r a d o s n o f i n a l d o s a n o s d e 1 9 8 0 e i n í c i o d o s d e 1 9 9 0 . O l i v e i r a a f i r -

    m a : " P e r c e b e - s e q u e a e d u c a ç ã o f í s i c a n o s a n o s d e 1 9 8 0 d e u u m s a l t o q u a l i t a t i v o

    n ã o s o m e n t e e m r e l a ç ã o s ó a s u a p r á t ic a , m a s t a m b é m q u a n t o a o s s e u s p r e s s u p o s -

    t o s t e ó r i c o s , d i a l e t i c a m e n t e p r o d u z i d o s e r e s p o n s á v e i s p e l a s u p e r a ç ã o d e s s a p r á -

    t i c a " ( 1 9 9 4 , p . 1 7 ) . O m e s m o a u t o r , e m o u t r o m o m e n t o , c o m e n t a : " E s t a é p o c a

    i n d i c a a i n c o r p o r a ç ã o d e v a l o r e s q u e s u p e r a r i a m a h e g e m o n i a d o s v a l o r e s m é d i -

    c o - h i g i ê n i c o s q u e , h i s t o r i c a m e n t e , v i n h a m i n f o r m a n d o a p r á t i c a d as a t i v i d a d e s f í-

    s i c a s " ( 1 9 9 3 , p . 1 3 0 ) . M e d i n a , a o f a z e r u m b a l a n ç o d a á r e a n o s a n o s d e 1 9 8 0 , a f i r m a :

    " E s t o u c o n s c i e n t e d e q u e a v a n g u a r d a d a e d u c a ç ã o f í s i c a n o B r a s il e s t á a i n d a p a s -

    s a n d o p o r u m p e r í o d o p o r a l g u n s c h a m a d o s d e   ideológico,  o u s e j a , u m p e r í o d o d e

    d e n ú n c i a s , r e v e l a ç õ e s e d e s c o b e r t a s d o p a p e l q u e e s t a á r e a d o c o n h e c i m e n t o v i -

    n h a e v e m d e s e m p e n h a n d o e m f a v o r d e u m p o d e r h e g e m ô n i c o , d o m i n a n t e , d e -

    t e r m i n a n t e e o p r e s s o r " ( 1 9 9 0 , p . 1 0 7 ) . J á o C o l e t i v o d e A u t o r e s n o s r e v e l a : " N a s

    d é c a d a s d e 1 9 7 0 e 1 9 8 0 s u r g e m m o v i m e n t o s ' r e n o v a d o r e s ' n a e d u c a ç ã o f í s i c a { . . . ]

    O s m o v i m e n t o s ' r e n o v a d o r e s ' n a e d u c a ç ã o f í s i c a d o q u a f a z p a r t e o m o v i m e n t o

    d i t o ' h u m a n i s t a ' n a p e d a g o g i a , s e c a r a c t e r i z a p e l a p r e s e n ç a d e p r i n c í p i o s f i l o s ó f i -

    c o s e m t o r n o d o s e r h u m a n o , s u a i d e n t i d a d e , v a l o r , t e n d o c o m o f u n d a m e n t o o s

    l i m i t e s e i n t e r e s s e s d o h o m e m e s u r g e c o m o c r í t i c a a c o r r e n t e s o r i u n d a s d a p s i c o -

    l o g i a c o n h e c i d a s c o m o c o m p o r t a m e n t a l i s t a s " ( 1 9 9 2 , p . 5 5 ) .

    INTRODUÇÃO AOS ANOS DE 1980 DA EDUCAÇÃO FfSICA BRASILEIRA 125

    propu l so ra das mudanças po l í t i cas ocor r idas no in í c io des se per íodo ,

    ou se a par t i r d i s so consegue operar em pro fund idade a anál i s e t eó r i -

    ca com re l ação à educação f í s i ca como componen te cu r r i cu lar .

    C e n t r a n d o - m e n a a n á l i s e d o e n t e n d i m e n t o d a e d u c a ç ã o f í s i c a

    com o com pon en te cu r r i cu lar , po r par t e dos que a anal i s aram t eo r i ca -

    men te nos anos de 1980 , p rocure i es tudar t a l p rodução observando

    qual o t ra t amen to que es ses d i spensaram à educação f í s i ca como com-

    ponen te cu r r i cu lar . Segundo seus fo rmuladores , é nes se per íodo que

    se esboçam os p r imei ros e l emen tos no sen t ido de operar -se uma cr í -

    t i ca à sua função soc iopo l í t i ca conservadora no in t er io r da esco la (CO-

    L E T I V O D E A U T O R E S ,  1 9 9 2) , e n f a t i z a n d o p r e o c u p a ç õ e s c o m a e d u c a ç ã o

    f í s i ca esco lar na perspect iva de t en tar romper t eo r i camen te com o es -

    t a b e l e c i d o  ( O L I V E I R A ,  1993).

    Dessa fo rma, co locam-se em cena d i feren tes concepções : desen-

    volvimentis ta, humanista, construt ivis ta, fenomenológica, antropológico-

    cul tural , his tórico-crí t ica, his tórico-social , s is têmica e crí t ico-superadora.

    A p rodução a respei to des sas concepções t em se dado por meio de d i s -

    ser t ações , t eses , a r t i gos acadêm ico-c i en t í f i cos , l i v ros e p ropos t as cu r r i -

    culares para o ensino de educação fís ica nos estados e municípios. Po-

    dem-se observar algumas dessas concepções em produções como:  Educação

    física escolar: uma abordagem desenvolvimentista  ( T A N I  et al., 1988);  Educação de

    corpo inteiro: teoria e prática da educação física  (F R E IR E ,  1989a)

    ;

      Educação física

    humanista  ( O L I V E I R A ,  1985);  Educação física escolar: uma abordagem fenomenoló-

    gica  ( M O R E I R A , 1 9 9 1 ) ;  Diretrizes gerais para o ensino de 2

    o

      grau-, núcleo comum -

    educação física  CAS T E L L AN1 F L L HO,  1988a),  Educação física e sociedade  (B E T T I ,

    1991),-

      Metodologia do ensino de educação física  ( C O L E T I V O D E A U T O R E S ,

      1992).

    Essas concepções su rgem no sen t ido de es t abelecer a lgo novo

    n a á r e a, p e r t e n c e n d o , p o r t a n t o , a o m o v i m e n t o a u t o - i n t i t u l a d o " r e n o -

    vador" . Esse movimen to ganha impor t ância , p r imei ro , po rque va i g ra-

    d a t i v a m e n t e o c u p a n d o e s p a ç o a c a d ê m i c o n a s u n i v e rs i d a d e s , n o s p r o -

    g ramas de pós -g raduação da área med ian te a p rodução de d i s ser t ações

    e t eses , nos per iód icos especí f i cos (p r inc ipa lmen te a

      Revista Brasileira

    Y M I V Ê K S Í Í M P E F - E D £ R A L D O

      f»AJt

    BIBLIOTECA CENTRAI,

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    16/102

    1  4 ENTRE A EDUCA ÇÃO FfSICA NA ESCOLA E A EDUCAÇ ÃO FtSICA DA ESCOLA

    de Ciências do Esporte)

    3

    ,

      nos congressos , encon t ros , s impósios . Segundo ,

    porque grande par te dessa produção acadêmica foi conver t ida em l i -

    vros que passaram a ser adotados nos cursos de educação f ísica das 1ES.

    Terce i ro, porque , desde o f ina l dos anos de 1980, par te dessa produ-

    ção passa a estar presente nas bibliografias dos concursos públicos, nos

    programas cur r icula res e de reor ientação cur r icula r e nos subsídios

    pedagógicos e laborados por órgãos governamenta is de vár ios es tados

    e munic ípios .

    Observa- se que a preocupação cent ra l dos formuladores dessas

    concepções é com a educação f í s ica escola r . Ent re tanto, não parecem

    esta r preocupado s em carac te r izá-la com o com pone nte cur r icula r e sim

    versar sobre uma área que , na escola , se deve pauta r nos pr inc ípios

    nor teadores de uma cer ta concepção. Ou se ja , não conseguem promo-

    ver uma discussão em torn o dos aspec tos pedagó gicos necessár ios que

    devem ser observados para carac te r izá- la como componente cur r icu-

    la r . Parece que esses formuladores , apesar de es ta rem cent rados na

    educação f í s ica escola r , buscam pr ior i ta r iamente inte r locução com a

    própr ia educação f í s ica , e quando buscam inte r locução com a educa-

    ção, o f azem pr ivi legiando as teor ias educac iona is abrangentes , que

    3 . O N ú c l e o d e E s t u d o s e P e s q u i s a s P e n s a m e n t o E d u c a c i o n a l B r a s i l e i r o , d o P r o g r a -

    m a d e E s t u d o s P ó s - G r a d u a d o s e m H i s t ó r i a e F i l o so f i a d a E d u c a ç ã o , d a P U C - S R

    r e a l i z o u p e s q u i s a c o l e t i v a c o m o b j e t i v o d e r a s t r e a r , c o m p i l a r , r e s e n h a r e a n a l i s a r

    a p r o d u ç ã o c i e n t í f i c a s o b r e o p e n s a m e n t o p e d a g ó g i c o b r a s i l e i r o , d i v u l g a d o n a s d é -

    c a d a s d e 1 9 7 0 e 1 9 8 0 , p o r m e i o d e p e r i ó d i c o s e s p e c i a l i z a d o s ( P U C - S P / N E P P E B ,

    1 9 9 5 a ) . D e n t r o d e s s e g r a n d e t e m a , p e n s a m e n t o p e d a g ó g i c o b r a s i l e i r o , a p e s q u i -

    s a e l e g e u c i n c o a s s u n t o s , s o b r e o s q u a i s a s a n á l i s e s d e v e r i a m s e r d i r i g i d a s , a s a b e r ,

    c u r r í c u l o , d i s c i p l in a / m a t é r i a , d i d á t i c a , f o r m a ç ã o / a p e r f e i ç o a m e n t o d o c e n t e e l i v r o

    d i d á t i c o . F o r a m a n a l i s a d o s o s s e g u i n t e s p e r i ó d i c o s :  Revista Brasileira de Estudas Peda-

    gógicos, Cadernos de Pesquisa, Educação e Realidade, Educação t Sociedade, Cadernos do

      CÍDBS,

    Revista da  ANDE,  Em Aberto, Teoria e Educação.  D i s t o r e s u l t o u o l e v a n t a m e n t o d e 9 6 5

    a r t i g o s . I n t e r e s s a n t e o b s e r v a r q u e , d e s s e s , a p e n a s u m p o u c o m a i s d e 1 % ( 1 0 a r t i -

    g o s ) s e r e f e r i a m à e d u c a ç ã o f í s i c a . O q u e p a r e c e m o s t r a r q u e a e d u c a ç ã o f í s i c a

    e s c o l a r p o u c o f o i d i s c u t i d a n e s s e s p e r i ó d i c o s , m a n t e n d o s u a s d i s c u s s õ e s r e s t r i t a s

    a p e r i ó d i c o s e s p e c í f i c o s d a á r e a .

    INTRODUÇÃO AOS ANOS DE 1980 DA EDUCAÇÃO FfSICA BRASILEIRA   1 5

    conformar iam a a tuação concre ta da educação f í s ica escola r , ou, a in-

    da , das questões de fundo soc iológico e f i losóf ico da educação. I sso

    faz com qu e não se apro fund e a comp reensão d a educação f í s ica como

    componente cur r icula r , pois , ao manter inte r locução fundamenta lmen-

    te com a própria educação f ísica, está se fortalecendo a idéia que a edu-

    cação f í s ica enquanto prá t ica soc ia l é única , não impor tando onde se

    desenvolve (se no clube, na academia, no exército, na escola ou em

    qualquer out ro lugar ) . Fa to que nos remete à idé ia de que exis te uma

    educação f í s ica  na  escola e não uma educação f í s ica d a  escola . O que

    está se levantando aqui é que parece não haver , na produção teór ica

    dos anos de 1980 sobre educação f í s ica escola r , um pr ivi legiamento,

    uma a tenção maior em torno dos aspec tos , das pecul ia r idades de uma

    educação f í s ica da escola . Observa- se que há uma inte r locução ent re

    educação f í s ica e educação, mas não no sent ido de pene t ra r nas pecu-

    liar idades da própria área, de estabelecer os traços principais do cur-

    r ículo, com obje t ivo de levanta r - se o t r a tamento que deve se r dado e

    qua is aspec tos devem esta r presentes para que se possa carac te r izar a

    educação f í s ica como componente cur r icula r . Essa inte r locução ent re

    a educação e a educaçã o f í s ica ocor re no âm bi to das teor ias gera is da

    educação, no sent ido de buscar concepções que conformar iam as prá -

    t icas pedagógicas . Tem-se a impressão de que a educação f í s ica não

    consegue olhar para o seu inte r ior e visua l izar as questões da prá t ica

    pedagógica , do componente cur r icula r , da didá t ica .

    Diante das questões apresentadas a té aqui , parece haver uma

    cer ta carênc ia presente na produção teór ica dos anos de 1980 quanto

    a o a p r o f unda me n t o  der. aspec to s necessár ios para a com preen são da

    educação f í s ica com o com pon ente cur r icula r. Assim, entendi com o ne-

    cessár io debruçar -me sobre ta l produção, com o obje t ivo de ver i f ica r

    como entendem a t r a je tór ia his tór ica des ta á rea no cur r ículo e qua is

    e lemen tos re t i r am dessa t r a je tór ia com o essenc ia is para explicar e jus-

    t i f ica r a educação f í s ica como componente cur r icula r .

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    17/102

    N

    C A P Í T U L O • D O I S

    E M B U S C A D O E S T A T U T O C I E N T Í F I C O

    D A E D U C A Ç Ã O F Í SI C A

    o me de bruçar , sobre a l i te ra tura espec ia l izada em educação

    física escolar , com o objetivo de verif icar como ela tem sido

    t ra tada , depare i -me com uma questão que , no meu entender , inte r fe -

    r ia em toda a trajetória dessa produção, qual seja, a de uma indefinição

    conce i tua i mais ampla , a do própr io obje to.

    Em outras palavras, a parcela da li teratura especializada produ-

    zida a partir dos anos de 1980 e, dentro dela, a que busca uma concei-

    tuação mais precisa, tem tratado a educação f ísica de forma ambígua,

    uma vez que boa parte dessa li teratura, ao se voltar para o trato de di-

    fe rentes questões sobre a á rea e , pr inc ipa lmente , para a busca dessa

    definição conceituai, não explicita a que educação f ísica se refere:

    • se es tá t r a tando da educação f í sica como prá t ica soc ia l produ-

    z ida his tor icamente nas r e lações ent re os homens e que se

    consubstanc ia por inte rmédio do despor to, do*lazer , da ginás-

    t ica como forma de apr imorar /manter a condição f í s ica do in-

    divíduo, do componente que faz par te do cur r ículo das esco-

    las etc. , isto é, das mais variadas formas que a atividade f ísica

    V fU V ur ol DA ^c r t U t f t ^

      rMU>

    BIBLIOTECA CENTRAJL

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    18/102

    1 8 E N T R E A E D U C A Ç Ã O F L S IC A N A E S C O L A T A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A D A E S C O L A

    foi assumind o na soc iedade m oderna e que foram se const i tuin-

    do n o cam po d e a tuação da ed ucação f í sica ,- ou

    • se com o um camp o de es tudo, com o área de con hec im ento,

    i s to é , como obje to de inte resse de es tudos s i s temát icos e or -

    ganizados , enf im, como campo de inte resse c ient í f ico.

    Decor rente dessa indef inição inic ia l , surge uma out ra , que se

    re fe re ao fa to de o apr imoramento das prá t icas soc ia is se r considera-

    do apenas como decor rênc ia di re ta do desenvolvimento do conhec i -

    mento c ient í f ico, como se essas prá t icas se const i tuíssem meramente

    em campo de apl icação das descober tas c ient í f icas .

    Disso resul tou, em bo a par te da l ite ra tura , um discurso am bíguo

    ent re o que se const i tui obje to de invest igação c ient í f ica (de descr i -

    ção, expl icação e genera l ização de achados sobre fenômenos ou sobre

    re lações ent re f enômenos) e o que se const i tui obje tò de normat iza-

    ções , or ientações , prescr ições , qu e qua lquer prá t ica socia l que se pre -

    tenda organizar com o intui to de se a t ingi r de te rminados obje t ivos ,

    demanda necessar iamente . Boa par te da l i te ra tura que se pre tendeu

    c ient í f ica , i s to é , que pre tendeu buscar expl icações sobre "o que é a

    educação f í s ica" , acabou se conf inan do (quase que exc lus ivamente) na-

    quilo "que ela deveria ser".

    A par t i r da í , vol te i -me mais espec i f icamente para a educação

    física escolar , no intuito de procurar analisar como a li teratura espe-

    c ia l izada a tem t ra tado conce i tua lmente . Pude observar que , enquan-

    to para a lguns es tudiosos a agregação do te rmo

      escolar

      é  r e dunda n t e

    (uma vez que para esses a educação f í sica é entendida c om o uma dis-

    c ipl ina pedagógica , própr ia à ins t i tuição escola ) , para out ros , a edu-

    cação f í s ica escola r const i tui - se em uma das expressões da educação

    f ís ica mais abrangente (dent re out ras r amif icações como despor t ivas ,

    de lazer , corretivas, terapêuticas etc.) .

    O que pu de ver i f ica r é que , no entendim ento do qu e se ja a edu-

    cação f ís ica , com o cam po de con hec im ento ou co mo prá t ica socia l , há

    E M B U S C A D O E S T A T U T O C I E N T Í F I C O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A 1 9

    uma cer ta indef inição. Essa indef inição per s is te quando se t r a ta da

    educação f í s ica em te rmos abrangentes e quando se t r a ta da educação

    física escolar , ora sendo confundidas, ora a educação f ísica escolar sen-

    do t r a tada como uma das expressões da educação f í s ica , ora a pr imei-

    ra sendo entendida como única expressão da segunda .

    Essa ambigüidade no t r a to dos problemas re la t ivos à educação

    f ís ica não pode se r considerada negação do conce i to de educação f í -

    sica escolar , mas, antes, como resultado de uma questão central na área- ,

    há uma def inição do obje to da educação f í s ica escola r? Nesse sent i -

    do, a ambigüidade conce i tua i não é um dado a se r desprezado, - pe lo

    cont rá r io, auxi l ia -nos a pensar o modo pe lo qua l a própr ia á rea cami-

    nhou para a indef inição ou para def inições que acabavam por negar a

    sua própr ia espec i f ic idade .

    1 . A C A R A C T E R I Z A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A :

    E N T R E C A M P O D E C O N H E C I M E N T O E P R Á T I C A S O C I A L

    A forma pe la qua l os autores ana l i sados se r e fe rem à educação

    f ís ica , t r a tando-a como área de conhec imento ou como prá t ica soc ia l ,

    revela a dif iculdade em delimitar cada uma dessas instâncias, bem como

    as consid erações que são espec í f icas e per t in entes a cada campo. Essa

    literatura via de regra discute a área não a partir de uma unidade em

    torno do que ela seja, mas sim do que ela deveria ser .

    Desde o iníc io dos anos de 1980, a produção teór ica parece

    colocar a educação f í s ica em xeque , apontando para a necess idade de

    uma re f lexão sobre a ident idade da á rea . I sso decor re bas icamente de

    dois f a tores marcantes : um é o momento his tór ico soc iopol í t ico, que

    marca a sociedad e brasileira no f inal dos an os de 1970 e início dos anos

    de 1980, com o processo d e redemocra t izaçãò, - o out ro é a necess ida-

    de exposta , tanto por pol í t icas governamenta is em meados dos anos

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    19/102

    21 ENTRE A EDUCAÇÃO FlSICA NA ESCOLA T A EDUCAÇÃO FÍSICA DA ESCOLA

    de 1970 (pr inc ipa lmente em re lação à pós-graduação) , como pe la co-

    mun idade acadêm ica da á rea , de confer i r um níve l de qua l idade já a l -

    cançado em outras áreas, a f im de suprir as necessidades colocadas pelo

    mercado de t r aba lho em IES e prover a formação de quadros para o

    desenvolvimento da pesquisa em educação f í s ica   ( C A R V A L H O , 1 9 9 3 ) .

    A década de 1970, pr inc ipa lmente em sua segunda metade , m ar -

    ca de forma contundente a á rea , vis to que ocor re uma sér ie de fa tos

    impor tantes para um redimensionamento da educação f í s ica nos anos

    de 1980: um número marcante de professores que , com apoio gover -

    namenta l , va i r ea l izar es tudos d e pós-graduação no exte r ior ; o es tabe-

    lecimento de convênios e intercâmbios com centros de pesquisas estran-

    ge i ros , - a organização de labora tór ios de pesquisa ( f i s iologia ,

    c ineant ropometr ia ) em de te rminadas univer s idades , - a fundação do

    Centro de Estudos do Labora tór io de Apt idão Fís ica de São Cae tano

    do Sul  ( C E L A F I S C S ) ;  a fundação do Colégio Bras i le i ro de Ciênc ias do

    Esporte (CBCE),- e o início da pós-graduação em educação f ísica no

    Brasil , com o curso de mestrado da Escola de Educação Física da Uni-

    versidade de São Paulo, em   1 9 7 7 ( B RA C H T , 1 9 9 3  e  C A S TE L L A N I F I L H O ,

    1 9 8 8 ) .

    O movimento de redemocra t ização, a "aber tura pol í t ica" que

    marca o iníc io dos anos de 1980, inf lui di re tamente na produção teó-

    r ica da educação f í s ica do per íodo. O intenso deba te pol í t ico que se

    t rava por toda a soc iedade se ins taura também dent ro da á rea , f azen-

    do emergi r um t ipo de produção teór ica que va i se "cont rapor" ao que

    vinha sendo p roduzido h egemo nicamente na área . Até o iníc io dos anos

    de 1980, há predominânc ia dos aspec tos biológicos , pr inc ipa lmente em

    relação à f isiologia e à cineantropometria, nas pesquisas realizadas, o

    que indica a forte influência das ciências naturais. Entretanto, a partir

    desse per íodo, observa- se um inte resse acentuado pe las questões de

    ordem pedagógica e soc iocul tura l , denotando ass im a inf luênc ia das

    c iênc ias soc ia is e human as  ( B R A CH T , 1 9 9 3  e  O L I V E I RA , 1 9 9 4 ) .

    Parece haver necess idade de pol i t iza r o deba te acadêmico, CO-

    EM BUSCA DO ESTATUTO CIENTÍFICO DA EDUCAÇÃO FÍSICA 19

    locando ass im a educação f í sica em "harmonia com o mom ento a tua l" .

    Assim, emerge uma for te c r í t ica ao "descompromisso pol í t ico" de que

    se impregnara a á rea ao longo de décadas , procurando dar - lhe um ca-

    rá te r pol í t ico que cont r ibuísse com o a lavancamento das t r ansforma-

    ções sociais, tão almejadas à época.

    A E d u c a ç ã o F í s i c a b r a s i l e i r a n ã o t i n h a , a t é o i n í c i o d o s a n o s 1 9 8 0 , u m a

    o p o s i ç ã o s i s t e m á t i c a a o c o n s e r v a d o r i s m o . E s t e f i c av a m a s c a r a d o , p o i s n ã o

    h a v i a o q u e l h e c o n t r a s t a s s e . N e s s a é p o c a d e s p o n t a u m a g e r a ç ã o q u e c o -

    m e ç a d e n u n c i a r o e s t a b e l e c i d o , a s s u m i n d o p o s i ç õ e s n u m a p e r s p e c t i v a d e

    c r í t i c a s o c i a l . O s g r u p o s r e p r e s e n t a n t e s d o p e n s a m e n t o c o n s e r v a d o r , c o n -

    t u d o , c o n t i n u a m a t u a n t e s . I n c o n f o r m a d o s e d e s a c o s t u m a d o s c o m o d iá -

    l o g o , a s u a p r i n c i p a l e s t r a t é g i a é u m a t e n t a t i v a d e d e s i d e o l o g i z a ç ã o d o d e -

    b a t e e m t o r n o d a E d u c a ç ã o F í s i c a. A o f a z ê - l o, i d e o l o g i z a m - n o m a i s a i n d a .

    E s s a p o s t u r a c o n s e r v a d o r a , n o r t e a d a p e l a i d e o l o g i a l i be r a l , o u n e o l i b e r a l ,

    v e i c u l a u m a v i s ã o d e m u n d o a p o i a d a n u m a ó t i c a d e c o n s e n s o . É a t e n t a t i v a

    de ha rmon iza r o ina rmon izáve l , masca rando a lu ta de c la sses [OL IVE IR A, 1994 ,

    p . 2 5 ] ,

    Neste contexto, a educação f í s ica que , nos anos de 1970, pe la

    inf luênc ia da concepção tecnic is ta , incorporara e lementos da pedago-

    gia, por intermédio da didática, passa, nos anos de 1980, a apropriar-

    se dos e lem entos das teor ias da educação produzid as no f ina l dos anos

    de 1970 e começo dos de 1980, que procuravam quest ionar a neut ra -

    l idade da educação no processo, his tór ico soc ia l pol í t ico e econômi-

    co, concebendo a escola como ve iculadora da ideologia burguesa . Es-

    sas teor ias procuravam operar aná l i ses c rí t icas de cunho progress is ta ,

    para expl ic i ta r as f ina l idades soc iopol í t icas da educação   ( M E L L O 8C

    B R A C H T , 1 9 9 2 ) ,  apontando, assim, para concepções que traziam em seu

    bojo uma visão t r ansformadora de mundo, de homem, de escola .

    Assim é que as produções de Paulo Fre ire , Moaci r Cado t t i , José

    Car los L ibâneo e Dermeval Saviani passam a se r incorporadas por di -

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    20/102

    2 2 E N T R E A E D U C A Ç Ã O F l S I C A N A E S C O L A T A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A D A E S C O L A

    versos autores da educação f ísica, tais como Medina (1983), Castellani

    F i l ho ( 1983) , F e r r e i r a ( 1984) , Ca va l c a n t i ( 1984) , Ca r mo ( 1987) ,

    Ghira lde l l i Júnior (1991) , Bracht (1989) , Soares (1990) , Cole t ivo de

    Autores (1992) ' , ent re out ros .

    Nesse contexto, a preocupação em re lação à ident idade da edu-

    cação f í sica ganha destaq ue . As produç ões de cu nho f i losóf ico, soc io-

    lógico, his tór ico, ant ropológico e pedagógico, impl íc i ta ou expl ic i ta -

    mente , t r azem em seu bojo a pergunta : o que é educação f í s ica? Essa

    preocupação percor re toda a década de 1980 e cont inua for te na de

    1990, de manei ra ní t ida nos t r aba lhos de Ol ive i ra (1984) , Medina

    (1983) , Caste l lani F i lho (1983 e 1988) , Tani e t a l . (1988) , Fre i re

    (1989a) , Bracht (1989 e 1995) , Cole t ivo de Autores (1992) , Gaya

    (1994) , Taf fa re l e Escobar (1995) , Sant in (1995) , Ghira lde l l i Júnior

    (1995) , Lovisolo (1995) .

    A produção dos anos de 1980 t rouxe à tona questões impor -

    tantes no campo f i losóf ico, soc iológico, pedagógico, provave lmen-

    te obscurec idas nas décadas ante r iores em função da hegemonia da

    inf luênc ia médica e biológica sobre a á rea , e t rouxe também sér ios

    p r ob l e ma s .

    A cont r ibuição dos inte lec tua is da educação f í s ica que se s i -

    tuavam nesse "movimento renovador" , emergente nos anos de 1980,

    tem uma impor tânc ia indiscut íve l , pr inc ipa lmente no que diz r espe i to

    ao tensionamento da á rea e à polemização dos deba tes ne la t r avados ,

    o que poss ibi l i tou o a lavancamento de re f lexões que antes não es ta -

    vam postas . Ent re tanto, esse r edimensionamento da educação f í s ica

    parece te r - se dado a par t i r de discussões que f icaram c i rcunscr i tas a

    um c e r t o ma n i que í smo e m f unç ã o do a c i r r a me n t o do de ba t e po l í t i -

    c o que a que l e mome n t o h i s t ó r i c o p r opor c i ona va

      ( M E L O ,

      1995). Essa

    questão é mencionada em Bracht (1993, p. 111) , que ao comentar o

    1 . E ssa ob ra é u sua lm en te c i t ada des sa fo rma , r azão pe la qua l op te i po r e s t a fo rma

    de c i t ação .

    E M B U S C A D O E S T A T U T O C I E N T Í F IC O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I CA19

    pe r c u r so da c omuni da de a c a dê mi c a da á r e a , r e un i da e m t o r no do

    C B C E

    2

    ,

      enfa t iza :

    e n t e n d e m o s q u e d e p o i s d e u m a c e r t a e u f o r i a e " i n g e n u i d a d e " c i e n t i f i c i s t a

    d o s s e u s p r i m e i r o s a n o s d e e x i s t ê n c i a , c o m a c o n s e q ü e n t e a v e r s ã o à r e f l e -

    x ã o f i l o s ó f i c a , a q u e s e s e g u i u u m p r e d o m í n i o i d e o l ó g i c o c o m a s o b r e p o s i -

    ç ã o d o p o l í t i c o a o a c a d ê m i c o , o C B C E c h e g a a o s s e u s 1 5 a n o s c o m o q u e

    p o s s u í d o p e l o d e s e j o d e c o m p l e m e n t a r o c o n h e c i m e n t o d a s c o i s a s c o m o

    c o n h e c i m e n t o d e s i m e s m o - d o s p r e s s u p o s t o s e p i s t e m o l ó g i c o s c o m q u e

    o p e r a .

    Isso não signif ica que se está aqui fazendo apologia à neutrali-

    dade , mas um esc la rec imento quanto ao fa to de que a pola r ização ex-

    t remada , que se deu nos anos de 1980, parece te r gerado dois f enô-

    me nos . O p r i me i r o é que de n t r e os i n t e l e c t ua i s do mov i me n t o

    r e nova dor , p r ogr e s s i s t a , c ons t i t u i u - s e uma v i s ã o p r e domi na n t e e m

    re lação ao mod o de re f le t i r sobre a área , pr inc ipa lmente em re lação à

    sua his tór ia . O segundo re fe re - se à ausênc ia de posições diver sas ,

    man tendo inte r locução ent re s i . Não que e las não exis t issem, - não ha-

    via predisposição para o deba te acadêmico, apenas para o pol í t ico e ,

    quando o deba te acontec ia , nem sempre ocor r ia de forma sensa ta e

    c oe r e n t e

    3

    . O que ocor re nesse per íodo então é quase "um diá logo de

    surdos" . Melo (1995, pp. 136-137) , ao observar o movimento ocor r i -

    do na á rea nos anos de 1980, expõe :

    2 . E n t e n d o q u e e s s a e n t i d a d e é a m a i s r e p r e s e n t a t i v a d o s p r o f e s s o r e s d e e d u c a ç ã o

    f í s i c a , q u e a t u a m n o m e t o a c a d ê m i c o , b e m c o m o é a q u e t e m p r o m o v i d o e v e n t o s

    e p u b l i c a ç õ e s ( s i s t e m á t i c a e p e r i o d i c a m e n t e ) n o s q u a i s o s d e b a t e s a c e r c a d a s q u e s -

    t õ e s q u e f o r a m c o l o c a d a s a c i m a s e f a z e m p r e s e n t e s d e s d e 1 9 7 8 ,

    3 . N ã o a d v o g o a q u i d e f o r m a a l g u m a e m f a v o r d e m e d i a ç õ e s c o n s e n s u a i s , a o c o n t r á -

    r i o , e n t e n d o q u e m e s m o a s p o s i ç õ e s c o n f l i t a n t e s p o d e m e d e v e m s e f a z e r p r e s e n -

    t e s n o d e b a t e , p r i n c i p a l m e n t e p o r q u e i s s o n o s p o s s i b i l i t a u m a i d e n t i d a d e , n a

    med ida em que a exp l i c i t ação das nos sa s d i f e r enças nos iden t i f i ca .

  • 8/19/2019 Entre a Educação Na Escola e a Educação Física Da Escola

    21/102

    2 5 E N T R E A E D U C A Ç Ã O F l S I C A N A E S C O L A T A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A D A E S C O L A

    Parece que em con t r apos ição , ou opos ição , " . . . à h i s tó r i a o f i c i a l f ac tua l -

    r e p r o d u t o r a - a c r í t i c a s u r g e u m a u n â n i m e h i s t ó r i a c r í t i c a . P a r e c e a i n d a f a l -

    t a r m u l t i p l i c i d a d e d e o p i n i õ e s e p o s t u r a s q u e t r a n s i t e m e n t r e e s s e s e x t r e -

    m o s , a l é m d e r i q u e z a d e d e t a l h e s " .

    C o r r o o r i s c o d e a f i r m a r q u e a p o l a r i z a ç ã o d o s d i s c u r s o s , o c a s i o n o u a

    c r i a ç ã o d e m i t o s e h e r ó i s e d e g r u p o s q u e s e a n t a g o n i z a v a m m u i t a s v e z e s

    m a i s p o r m o t i v o s p e s s o a i s d o q u e i d e o l ó g i c o s , i m p o s s i b i l i t a n d o u m a c o m -

    p r e e n s ã o m a i s d i v e r s a e m ú l t i p l a d e h i s t ó r i a . G r u p o s , d e n o m i n a d o s p o r

    u m r ó t u l o , p a r e c i a m , i n c o e r e n t e m e n t e , s e a c h a r d e t e n t o r e s d a v e r d a d e .

    Al i á s ró tu lo s fo ram o que não f a l t a r am na década de 80 [ME L O, 1995 ,

    p p . 1 3 6 - 1 3 7 ] ,

    É prec iso te r c la ro que , ao f ina l dos anos de 1980, quando as

    questões a fe tas ao processo de redemocra t ização já não es tavam co-

    locadas tão for temente (como quando do seu iníc io) , e quando o " ini -

    migo comum", ou seja, a ditadura militar , já havia sido deposta, os in-

    te lec tua is do movimento renovador não se agrupavam mais em torno

    de um único bloco progress is ta . Expl ic i tam-se di fe renças , bas icamen-

    te no que tange às concepções por e les adotadas . Assim, não se tem

    mais (ou nunca se teve) dois blocos apenas (conservador

      versus

      progres-

    s is tas , ou reac ion ár ios

      versus

      revolucionários) , mas f ica patente a exis-

    tênc ia de vár ios grupos . Ent re tanto, o ac i r ramento do deba te pol í t i -

    co- ideológico per s is te , o que leva cada vez mais ao a fas tamento do

    diá logo ent re os que têm pontos de vis ta di fe rentes . Impor tante dizer

    que esse diá logo se torna di f íc i l , também, porque os inte lec tua is que

    têm sua produção com base nos conhec imentos de ordem biológica e

    médica em par te se des ligam do CBC E, no m omen to em que es te passa

    a se r hegem onicam ente c onduz ido por inte lec tua is , que se vol tam para

    a produção de ordem soc iológica , his tór ica , ant ropológica , pedagógi-

    ca . Além disso, esses inte lec tua is que de ixaram o CBCE não procu ram

    manter interlocução com aqueles que estão a produzir teoricamente fora

    dos seus interesses de estudo. Organizam-se, então, entidades que se

    E M B U S C A