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ENUNCIADO Nº 01 AS MEDIDAS PROTETIVAS DA LEI Nº 11.340/06 NÃO SÃO APLICÁVEIS EM DESFAVOR DE ADOLESCENTES INFRATORES SUJEITOS AO PODER FAMILIAR EXERCIDO PELA VÍTIMA Justificativa: A Lei nº 11.340/06 não cria direito novo; introduz mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher estabelecendo medidas de assistência e proteção, tratando-se de um comando direcionado a adultos. Por tal razão o art. 13 da Lei nº 11.340/06 admite a aplicabilidade da legislação referente à criança e ao adolescente (Lei nº 8.069/90), não a afastando como acontece no art. 41 que veda a aplicação a Lei nº 9.099/95. O art. 20 da Lei nº 11.340/06 apresenta a possibilidade de aplicação de prisão preventiva ao sujeito ativo, que denomina “agressor”, o que não se admite para adolescentes. A mesma lógica deve persistir para tal sujeito ativo quando prevê a Lei Maria da Penha a aplicação das medidas protetivas de urgência em seu art. 22. Saliente-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente prescreve as medidas socioeducativas abordadas em seus artigos 112 a 128 como única solução educativo/pedagógica/repressiva para os atos infracionais praticados por adolescentes. São princípios que amparam a Lei nº 11.340/06 os da “dignidade da pessoa humana”; da “liberdade”; da “igualdade”; da “proporcionalidade” e da “razoabilidade”. São tais princípios igualmente aplicáveis aos adolescentes pela Lei nº 8.069/90, sendo- lhes também aplicável, à luz dos artigos 3º a 5º do ECA, os princípios da “prioridade absoluta” e da “proteção integral”. Saliente-se, portanto, que o adolescente infrator é tão hipossuficiente quanto a mulher agredida, sendo certo que em seu benefício ainda oferece a lei o princípio da proteção integral, que seria ignorado caso lhe fossem aplicadas medidas protetivas como a de afastamento do lar. O artigo 22 da Lei nº 11.340/06, ao prever em seus incisos II e III as medidas protetivas de afastamento do lar e proibição de aproximação da mulher agredida, caso aplicável fosse a adolescentes, vulneraria não só o disposto nos artigos 3º, 4º, 5º, 15 e

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ENUNCIADO Nº 01AS MEDIDAS PROTETIVAS DA LEI Nº 11.340/06 NÃO SÃO APLICÁVEIS EM DESFAVOR DE ADOLESCENTES INFRATORES SUJEITOS AO PODER FAMILIAR EXERCIDO PELA VÍTIMA

Justificativa: A Lei  nº  11.340/06 não cria  direito  novo;   introduz mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher estabelecendo medidas de assistência e proteção, tratando-se de um comando direcionado a adultos. Por tal razão   o   art.   13   da   Lei   nº   11.340/06   admite   a   aplicabilidade   da   legislação referente   à   criança   e   ao   adolescente   (Lei   nº   8.069/90),   não   a   afastando   como acontece  no  art.   41  que   veda  a  aplicação  a   Lei   nº   9.099/95.  O  art.   20  da   Lei  nº 11.340/06 apresenta a possibilidade de aplicação de prisão preventiva ao sujeito ativo,   que   denomina   “agressor”,   o   que   não   se   admite   para   adolescentes.   A mesma   lógica   deve   persistir   para   tal   sujeito   ativo   quando   prevê   a   Lei  Maria   da Penha a aplicação das medidas protetivas de urgência em seu art.  22.  Saliente-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente prescreve as medidas socioeducativas abordadas   em   seus   artigos   112   a   128   como   única   solução educativo/pedagógica/repressiva   para   os   atos   infracionais   praticados   por adolescentes. São princípios que amparam a Lei nº 11.340/06 os da “dignidade da pessoa   humana”;   da   “liberdade”;   da   “igualdade”;   da   “proporcionalidade”   e   da “razoabilidade”.   São   tais   princípios   igualmente   aplicáveis   aos   adolescentes   pela Lei nº 8.069/90, sendo-lhes também aplicável, à luz dos artigos 3º a 5º do ECA, os princípios   da   “prioridade   absoluta”   e   da   “proteção   integral”.   Saliente-se, portanto,   que   o   adolescente   infrator   é   tão   hipossuficiente   quanto   a   mulher agredida,   sendo   certo   que   em   seu   benefício   ainda   oferece   a   lei   o   princípio   da proteção   integral,   que   seria   ignorado   caso   lhe   fossem   aplicadas   medidas protetivas   como   a   de   afastamento   do   lar.   O   artigo   22   da   Lei   nº   11.340/06,   ao prever   em   seus   incisos   II   e   III   as   medidas   protetivas   de   afastamento   do   lar   e proibição   de   aproximação   da   mulher   agredida,   caso   aplicável   fosse   a adolescentes,   vulneraria  não  só  o  disposto  nos  artigos  3º,  4º,  5º,  15  e  19  da  Lei nº   8.069/90,   que   amparam   a   necessidade   de   convivência   familiar   para   o adolescente,   como   afrontaria   o   caput   do   artigo   227   da   CRFB,   que   assegura   ao adolescente   absoluta   prioridade,   bem   como   o   direito   à   convivência   familiar. Dessa   forma,   resta   como   única   alternativa   para   a   harmonização   dos   diplomas legais   estudados   a   interpretação   conforme   a   Constituição   de   que   as   medidas protetivas  de urgência  elencadas  na Lei  Maria  da Penha não sejam aplicáveis  em desfavor de adolescentes infratores por atos praticados no seio familiar. Também o   art.   79,   inciso   II   do  CPP,   ao   abordar   a   conexão   e   a   continência,   excepciona   a possibilidade   de   unidade   de   julgamento   quando   houver   concurso   entre   a jurisdição comum e o juízo de menores.  A CRFB assegura ao adolescente pelo art. 227   §   3º   a   garantia   de   pleno   e   formal   conhecimento   da   atribuição   de   ato infracional   que   tenha   praticado,   sendo   certo   que   tais   atos   serão   apreciados sempre   pela   Vara   da   Infância   e   Juventude,   jamais   por   Juizados   da   Violência Doméstica  e Familiar  contra  a  Mulher,  caminhando tais  procedimentos  conforme o   rito   apresentado   pelo   Estatuto   da   Criança   e   do   Adolescente.   O   art.   1.630   do Código Civil  ao abordar o poder familiar  entrega deveres àqueles que o exercem, 

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tampouco poderiam tais deveres serem negligenciados por via reflexa mediante a aplicação equivocada de medidas protetivas  de urgência.  Observe-se por fim que o   princípio   da   vedação   à   proteção   deficiente   alcança   a   todos   os   envolvidos   em uma   situação   que   apresente   um   adolescente   infrator   como   autor   de   agressão contra   sua   genitora   ou   familiar,   sendo   os   artigos   174   e   175   do   Estatuto   da Criança   e   do  Adolescente   instrumentos   válidos   para   fazer   cessar   tal   estado.   De fato   conferem   tais   artigos   proteção   a   todos   os   envolvidos   ao   autorizar   o Delegado de Polícia  a,  conforme sua avaliação discricionária  acerca da gravidade do  ato   infracional   praticado  e   sua   repercussão   social,   proceder   à   internação  do adolescente   para   garantia   de   sua   segurança   pessoal   ou  manutenção   da   ordem pública,  encaminhando-o  ao representante  do Ministério  Público   junto à  Vara  da Infância   e   Juventude. Referências: -   CRFB/88,   art.   227;   -   Código   de   Processo Penal,  art.  79; - Código Civil,  Art. 1.630; - Lei nº 11.340/06, art.  13, art.  20 e 22; - Lei   nº   9.099/95,   Art.   41;   -   Lei   nº   8.069/90,   arts.   3º,   4º,   5º,   15,   19,   art. 112 usque 128, 174 e 175.

ENUNCIADO Nº 02O REGISTRO DE FATO ATÍPICO CONDICIONA-SE À NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE DILIGÊNCIA PARA DEFINIÇÃO FUTURA DE ENQUADRAMENTO LEGAL, RELATIVO A FATOS COM REPERCUSSÃO NA ESFERA DE INCIDÊNCIA PENAL OU ADMINISTRATIVA INTERNA DA PCERJ

Justificativa: Os registros  de ocorrência  de Polícia  Judiciária  têm como objetivo a notificação   formal  e  padrão de  uma notitia  criminis  ou de fato  administrativo  de repercussão   jurídica   interna  na  Polícia  Civil   ao  Delegado de  Polícia,   com vistas  a controle   estatístico-cadastral   e   também   a   subsidiar   o   início   de   uma   apuração, ainda que posterior. Daí, registro de fatos que não serão objetos de investigação, seja   por   serem   atípicos,   seja   por   estarem   prescritos   ou   terem   sido   objetos   de alguma   outra   causa   extintiva   de   punibilidade,   seja   por   falta   de   condição   de procedibilidade,   ferem a  própria ratio  essendi  do   registro  de  ocorrência  policial, além de constituir  usurpação das funções  das serventias  extrajudiciais,   tabelares e   registrais.   Desta   forma,   deve   o   Delegado   de   Polícia   orientar   a   equipe   de plantão,  a uma vez constatada de forma óbvia e  inequívoca a atipicidade do fato (devendo  o  plantonista   formular   consulta  ao  delegado  no  caso  do  menor   indício de dúvida) encaminhar o comunicante a um ofício de notas para que seja  lavrada a   sua   declaração   do   fato   ou   que   descreva   o   fato   desejado   em   um   documento particular por ele assinado, o qual poderá ser levado a uma serventia de Títulos e Documentos para o devido registro.  Naturalmente,  fatos violentos como suicídio, acidentes   de   trânsito   com   autolesões   fatais   e   outros   fatos,   aparentemente atípicos,  mas   que  merecem  devida   apuração   para   que   seja   descartada   qualquer possibilidade   de   existência   de   infração   penal   em   seu   entorno,   deverão   ser objetos   de   registro   para   apuração   e   confirmação   de   sua atipicidade. Referências: -   CRFB/88,   art.   129,   VII   e   art.   144,   §§   1   e   4;   -   Lei    nº 8.935/94  art. 6 usque art. 11. - Lei nº 6.015/76, art. 127 usque art. 131;

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ENUNCIADO Nº 03O DESCUMPRIMENTO DE ACORDO JUDICIAL DE VISITAÇÃO DE FILHOS NÃO CONFIGURA CRIME DE DESOBEDIÊNCIA, TENDO EM VISTA O CABIMENTO DAS MEDIDAS ADMINISTRATIVAS PREVISTAS NO ART. 249 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Justificativa: O   presente   enunciado   se   justifica   tendo   em   vista   que   inúmeras pessoas   comparecem   em   Delegacias   Policiais   buscando   realizarem   registros   de fatos que se circunscrevem em descumprimento de acordos  judiciais  de visitação de  filhos.  Não raro,  a  parte  que se  sente  prejudicada,  busca  com a confecção  do Registro   de   Ocorrência   constranger   a   pessoa   a   quem   imputa   o   suposto descumprimento   a   cumprir   a   ordem   judicial,   sob   a   pecha   de   ser   supostamente processada   criminalmente.   É   cediço   que,   com   o   advento   da   Constituição Democrática   de   1988,   fundamento   de   validade   de   todo   ordenamento   jurídico, inúmeras   instituições   e   institutos   jurídicos   passaram   por   um   novo   filtro constitucional,   ganhando   nova   roupagem   democrático-republicana.   Nessa   linha, as atribuições do Delegado de Polícia no processo penal ganham novos contornos constitucionais.   Visto   como   o   primeiro   garantidor   dos   direitos   fundamentais,   o Delegado   de   Polícia   deve,   antes   de   tudo,   atuar   como  um   filtro,   impedindo   que condutas  que  não   se   revistam  do  menor   vestígio  de   tipicidade  penal  motivem  a instauração   de   Investigações   Criminais,   que   por   si   só   já   constituem   em   pena processual   ao   investigado.   Desta   forma,   deve   o   Delegado   de   Polícia   obstar   ou impedir   persecuções   que   se   constituam   mera   lide   cível,   sem   qualquer repercussão   penal.   O   presente   caso,   se   adequa   a   tal   hipótese.   O   crime   de Desobediência é descrito no art. 330 do Código Penal, a saber:

Desobediência

Art. 330, CP. Desobedecer a ordem legal de funcionário público:

Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e multa.

Doutrina   e   jurisprudência,   de   forma   tranquila,   entendem   que   o   delito   de desobediência   não   se   caracteriza   quando   a   lei   comina   sanções   civis   e/ou administrativas   para   o   descumprimento   de   uma   determinação   legal.   Somente incidiria   o   crime   de   desobediência,   subsidiariamente,   quando   a   própria   lei, expressamente,   ressalve   a   cumulação   da  medida   administrativa   ou   cível   com   a aplicação  do  art.   330  do  CP.  Nesse   sentido  HUNGRIA já   lecionava  que[...]  se, pela desobediência de tal ou qual ordem oficial, alguma lei comina determinada penalidade administrativa ou civil, não deverá reconhecer o crime em exame, salvo se a dita lei ressalvar expressamente a cumulativa aplicação do art. 330  (ex.: a testemunha faltosa, segundo o art. 219 do Cód. de Proc. Penal, está sujeita não só a prisão administrativa e pagamento das custas da diligência da intimação, como o processo penal por crime de desobediência)No   que   se   refere   ao   descumprimento   de   decisões   judiciais,   o   tema   ganha contornos   mais   sensíveis.   Isto   porque   as   partes   processuais   possuem,   a   seu dispor,  inúmeros instrumentos processuais para fazer valer seus direitos,  sendo o processo   de   execução   (cível,   trabalhista   ou   mesmo   penal)   um   desses instrumentos.   Desta   forma,   eventual   descumprimento   de   determinada   decisão judicial,  como regra, não importa na prática do crime de desobediência,  sob pena da própria desnecessidade do processo de execução. Excepcionalmente,  contudo, 

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em   decisões   com   cunho   claramente  mandamentais,   em   que   o   juízo   não   possua outro  meio   de   fazer   valer   a   execução   da   decisão,   poderá   haver   a   incidência   do delito   de   desobediência,   caso   haja   ressalva   expressa   na   decisão   sobre   a incidência   de   tal   tipo   penal.   Nesse   sentido,   inclusive,   é   a   jurisprudência   do STJ: PENAL.   CRIME   DE   DESOBEDIÊNCIA.   DETERMINAÇÃO   JUDICIAL   ASSEGURADA POR   MULTGA   DIÁRIA   DE   NATUREZA   CIVIL   (ASTREINTES).   ATIPICIDADE   DA CONDUTA.

Para  a   configuração  do  delito  de  desobediência,   salvo   se  a   lei   ressalvar  expressamente  a 

possibilidade de cumulação da sanção de natureza civil ou administrativa com a de natureza 

penal, não basta apenas o não cumprimento de ordem legal, sendo indispensável que, além de 

legal a ordem, não haja sanção determinada em lei específica no caso de descumprimento. 

(Precedentes).   Habeas   corpus   concedido,   ratificando   os   termos   da   liminar   anteriormente 

concedida. (STJ, HC nº 22721/SP, Rel. Min. Félix Fischer, 5ª Turma, 27.05.03)

Conclui-se,   portanto,   que   o   descumprimento   de   acordo   judicial   de   visitação   de filhos   não   constitui   crime   de   desobediência,   tendo   em   vista   que   o   ECA,   no   art. 249, prevê imposição de penalidade administrativa para o caso.

Art. 249, Lei 8.069/90. Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao poder 

familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária 

ou Conselho Tutelar: (Redação alterada pela Lei nº 12.010, de 2009)

Pena   -  multa   de   três   a   vinte   salários   de   referência,   aplicando-se   o   dobro   em   caso   de 

reincidência.

Referências: -   CRFB,   88;   -   Código   Penal,   art.   330;   -   Lei   nº   8.069/90,   art. 249. Nota 1 HUNGRIA, Nélson. Comentários ao Código Penal, Vol. IX, p. 420.

ENUNCIADO Nº 04O CARGO DE DELEGADO DE POLÍCIA, POR SUA NATUREZA TÉCNICO-JURÍDICA, GOZA DOS ATRIBUTOS DA AUTONOMIA E INVIOLABILIDADE DE SUAS DECISÕES DEVIDAMENTE FUNDAMENTADAS, EMANADAS NO CURSO DA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL

Justificativa: O   exercício   da   atividade   de   polícia   judiciária   pelo   Delegado   de Polícia   possui   natureza   técnico-jurídica,   advindo   esta   atividade   do   texto constitucional   e   de   outras   inúmeras   leis   infraconstitucionais.   É   incabível, portanto,   qualquer   ingerência   interna   ou   externa   sobre   os   seus   atos   de investigação,   ressalvada   a   hipótese   de   requisição   ministerial   no   feixe   de atribuições   do   controle   externo   da   atividade   fim   da   investigação   criminal, incluindo-se as requisições fundamentadas, respectivamente os art. 129, VII e VIII da  CRFB,   a   requisição  pelo  Poder   Judiciário  e   a  determinação  de   instauração  de inquérito   pelo   Chefe   de   Polícia   em   provimento   a   recurso   a   indeferimento   de requerimento   de   instauração   de   inquérito   policial.   Ressalte-se   que   nem  mesmo essas   permissões   legais   implicam   em   afastamento   da   avaliação   de   ilegalidade manifesta   dentro   do   bom   senso   jurídico   ou   cumprimento   de   requisições   de natureza   teratológica.   Também  não   têm  o   condão   de   influenciar   a  metodologia 

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técnica   de   cumprimento   das   diligências   requisitadas   e   tampouco   obstam   o Delegado   de   Polícia   de,   na   presidência   do   feito,   determinar   quantas   outras diligências  forem necessárias  para complementar  as  requisitadas  e realize  tantas outras   quanto   entenda   serem   necessárias   ao   esclarecimento   da   verdade   dos fatos.  Não sendo as  hipóteses  acima enumeradas,  ou seja,  as  demais   requisições ministeriais   e   de  magistrados   não   estão   amparadas   pela   Constituição   e   normas infraconstitucionais,   devendo   ser   recebidas,   caso   sejam   realizadas   por   esses órgãos,   como   direito   de   petição   ou notitia   criminis,   tal   qual   o   tratamento dispensado a qualquer pessoa física,   jurídica ou agente político.  A inviolabilidade implica   na   impossibilidade   de   responsabilização   penal,   civil   ou   administrativa acarretadas  por  decisões do Delegado de Polícia  na sua atividade-fim,  ressalvada comprovada existência de dolo ou culpa gravíssima.  Admitir  o contrário seria por amarras   para   que   o   presidente   da   investigação   atue   com   afinco   em   busca   da verdade   real   e   deixe   de   praticar   atos   necessários,   com   receio   de   vir   a   sofrer sanções   por   atos   que   venham   a   ferir   interesses   particulares.   Não   há   assim, incidência hierárquica sobre a atividade-fim do Delegado de Polícia, na forma que nos socorremos da lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

“Há de se observar que a relação hierárquica é acessória da organização administrativa. Pode 

haver   distribuição   de   competências   dentro   da   organização   administrativa,   excluindo-se   a 

relação  hierárquica  com relação  a  determinadas  atividades.   (…)  Trata-se  de  determinadas 

atividades   que,   por   sua   própria   natureza,   são   incompatíveis   com   uma   determinação   de 

comportamento por parte do superior hierárquico. Outras vezes, acontece o mesmo porque a 

própria   lei   atribui   uma   competência,   com   exclusividade,   a   determinados   órgãos 

administrativos,   em  especial   os   colegiados,   excluindo,   também,   a   interferência  de  órgãos 

superiores” (in Direito Administrativo, 13ª edição, p. 92, Atlas).

Some-se a isto a tendência moderna e democrática a uma polícia de Estado e não de   governo,   sujeita   às   intempéries   políticas   de   ocasião. Referências: -   CRFB/88, art.  144,  §  4º;   -  Código  de  Processo  Penal,  art.  4º  e  5º  §  2º;   -   Lei  nº  12.830/13, art. 2º e §§ 1º, 2º e 6º e art. 3º.

ENUNCIADO Nº 05NOS CASOS DE IMPOSSIBILIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA VÍTIMA NO CRIME DE LESÃO CORPORAL CULPOSA PELO CONDUTOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR DE VIA TERRESTRE SERÁ REALIZADO O REGISTRO DE OCORRÊNCIA, MAS A LAVRATURA DO TERMO CIRCUNSTANCIADO OU INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL FICARÁ CONDICIONADA A REPRESENTAÇÃO DAQUELA

Justificativa: É cediço que em muitos casos de acidentes de trânsito que resultam lesão   corporal,   a   vítima   esteja   hospitalizada,   impossibilitando   a   representação dela   para   que   se   prossiga   com   os   atos   de   polícia   judiciária   e,   como   é   de conhecimento   teórico,   de   que   a   prisão   ou   qualquer   ato   de   investigação   com vistas   ao   descobrimento   da   verdade   dos   fatos,   depende   da   manifestação   da vítima,  como conciliar  este requisito  de procedibilidade da  investigação criminal, que não é outra consequência senão a de disponibilidade da vítima a despeito do 

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fato que encontra-se na esfera exclusiva de sua decisão, agir contrário a ausência da   representação   e   realizar,   por   exemplo,   conduções   coercitivas   e   oitiva   de testemunhas?  O papel  do Delegado como agente  político  garantidor  dos  direitos humanos   fundamentais   é   garantir   à   vítima   a   possibilidade   de   ir   em   busca   do responsável  pelo fato que a vitimou, sendo a melhor medida a prática de atos de conservação   das   provas   denominadas   irrepetíveis,   ainda   que   futuramente   o ofendido   não   queira   representar   e   tenha   sido   um   trabalho   em   vão.   A   função garantidora   implica   em   conservar   o   bônus   para   a   vítima,   representado   pela conservação da prova, do que o ônus de inviabilizar a descoberta da verdade pela não realização das provas técnicas, ao argumento positivista de não ter existido a representação  dela.  Ademais,   em   razão   do   disposto   no   art.   291  da   lei   9.503/97 verificam-se hipóteses em que a ação penal  nos crimes de  lesão corporal  culposa será   de   natureza   pública   incondicionada   e,   em   muitos   casos,   em   razão   da dinâmica   do   evento,   não   é   possível   saber   de   antemão   se   a   ação   penal   pública será   incondicionada  ou   condicionada   à   representação  da   vítima.  Desta   forma,   a melhor medida é realizar  o registro de ocorrência e se praticar  os atos de polícia judiciária   que   impliquem  em  realização  de  provas   técnicas   irrepetíveis   e   após   a representação   da   vítima,   lavra-se   o   termo   circunstanciado   ou   instaura-se   o inquérito policial, conforme o caso. Referências: - Lei nº 9.503/1997, art. 291.

ENUNCIADO Nº 06O DELEGADO DE POLÍCIA PODERÁ, MEDIANTE DECISÃO FUNDAMENTADA, DISPENSAR A FIANÇA DO PRESO, PARA NÃO RECOLHIMENTO AO CÁRCERE DO INDICIADO POBRE

Justificativa: O   presente   enunciado   tem   por   escopo   consagrar   a   viabilidade jurídica  do Delegado de Polícia  dispensar  a   fiança do conduzido pobre,  por   força do   princípio   constitucional   da   isonomia   e   do   princípio pro   homine.   A   situação econômica   do   conduzido   pobre   não   pode   funcionar   como   óbice   para   fins   de concessão de  liberdade provisória,  sob pena de criminalização do vulnerável  pela sua   hipossuficiência   socioeconômica.   Essa   grave   circunstância   consagra   a desigualdade   de   tratamento   entre   o   pobre   e   o   não   pobre.   Aquele,   ao   revés   da liberdade   paga,   deverá   aguardar   encarcerado   o   provimento   judicial, exclusivamente,   pelo   o   fator   da   sua   condição   vulnerante,   de   acordo   com   a interpretação puramente  literal  do art.  325,  §1º,   inc.   I  do CPP. Como é cediço no mundo   jurídico,   a   interpretação   gramatical   é   a   mais   pedestre   para   extrair   o conteúdo, significado e o alcance da norma. Simplesmente é um ponto de partida para   descobrir   a   vontade   da   norma.   Dessa   forma,   muito   embora,   o   artigo expressamente não franqueie  ao Delegado de Polícia  a prerrogativa  de dispensar a   fiança   do   conduzido  miserável,   essa   posição   não   se   sustenta   consoante   uma interpretação   sistemática   e   prospectiva   do  diploma  processual.  Nesse  horizonte há força normativa  suficiente  para viabilizar  a  dispensa da fiança concedida pelo Delegado de Polícia. Primeiramente, o dispositivo remete o intérprete ao art. 350 do  diploma  processual,   o  qual   estabelece   a  previsão  de  dispensa  da   fiança  pelo 

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Magistrado.   Dessa   forma   é   perfeitamente   viável   a   utilização   de   analogia   para estender   a   possibilidade   de   concessão   de   posição   jurídica   da   vantagem   ao indiciado   pobre   pelo   Delegado.   O   art.   3°   do   CPP   é   clareza   hialina,   quando assevera  que  a   lei   processual   penal   admitirá   a   aplicação  da  analogia.  Ainda  que não   fosse   a   analogia   a  melhor   técnica,   com   a   reforma   pela   lei   nº   12.403/11   a atribuição para se arbitrar fiança está disposta no art. 322 do CPP, que faz alusão ao Delegado de Polícia  e  ao  Magistrado,  e  não o  art.  350,  do CPP.  Esta  aparente antinomia   é   resolvida   com   a   leitura   do   art.   350   do   CPP   como   a   sede   legal   da forma ou   instrumento  vinculante  da   liberdade  provisória,  quando   faz  alusão  aos arts.   327   e   328,   ambos   do   CPP,   qual   seja   a   assunção   do   compromisso   de comparecer aos atos do  inquérito ou processo.  A referência no art.  327 do CPP a "inquérito"   e   "instrução   criminal",   denuncia   serem   seus   presidentes   os responsáveis   pela   decisão   da   liberdade   provisória   por   dispensa   e   vinculada, respectivamente   ao   compromisso   assumido   perante   o   Delegado   de   Polícia   e   o Juiz.  De mais a mais,  respeitável  doutrina processual   já se manifestou no sentido de   declarar   a   inconstitucionalidade   por   omissão   do   art.   350   do   CPP.   Nesse sentido  as   lições  do  professor  Gustavo  Grandinetti:   “a  conclusão,  portanto,  é  de que   a   restrição   do   art.   350   do   Código,   que   exclui   o   Delegado   de   Polícia   como autoridade competente para isentar a prestação de fiança (...)  é  inconstitucional. Não é o que está na norma que viola a constituição, mas o seu silêncio: a omissão quanto  à  possibilidade  de  o  Delegado   conceder   a   isenção  da   fiança.   Portanto,   a hipótese   aponta   para   a   adição   do   que   foi   omitido,   para   que   a   norma   se   torne conforme  a  Constituição.”   (Processo  Penal  e  Constituição).  Diante  do  exposto,  o Delegado  de  Polícia  poderá   isentar   a   fiança  do  preso  pobre  para  não   recolhê-lo ao cárcere. Referências: -  Código de Processo Penal,  art.  3°;  322,  325,  327,  328 e 350;

ENUNCIADO Nº 07É ATRIBUIÇÃO PRIVATIVA DO DELEGADO DE POLÍCIA A DECISÃO ACERCA DA LAVRATURA DO AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE CONFORME SEU LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO, NÃO ESTANDO SUJEITO À REQUISIÇÃO OU ORDEM EMANADA DOS PODERES JUDICIÁRIO, EXECUTIVO OU MINISTÉRIO PÚBLICO

Justificativa: O   que   difere   o   inquérito   policial   instaurado   por   portaria   daquele instaurado por auto de prisão em flagrante é o caráter coercitivo deste, que além da finalidade de qualquer   inquérito  policial,  a  saber,  descobrir  a  verdade real  do fato   em   apuração   e   fornecer   às   partes   e   ao   juízo   elementos   que   possam   ser utilizados   em   uma   eventual   ação   penal,   traz   outra   função:   funcionar   como   um verdadeiro  processo de  instrução para  que o  Delegado de Polícia  possa  avaliar  e decidir  quanto  à  existência   indícios  de autoria  de  infração penal;  à  existência  de situação   flagrancial;   e   à   tipificação   da   eventual   infração,   as   quais   interferirão diretamente: 1) na ocorrência da prisão recolhimento ou não; 2) no cabimento de fiança;   3)   no   seu   valor   (da   fiança);   4)   na   coleta   de   compromisso   de comparecimento   ao   JECRIM,   caso   conclua  haver   situação   flagrancial   de   infração de menor potencial  ofensivo. Trata-se tal conclusão da única leitura que pode ser 

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extraída   do   art.   304,   §   1º,   do   Código   de   Processo   Penal.   Desta   forma,   todo procedimento diferenciado das demais  inquisas policiais  se dá devido ao juízo de valor   decisório   que   deverá   o   Delegado   de   Polícia   tecer   sobre   o status libertatis do   indivíduo,  o  qual   será  objeto  de  uma  avaliação   judicial   postergada. Assim,   cabe  ao  Delegado  que   formou  a   fundada   suspeita   da  prática  de   infração penal   e   seu   estado   flagrancial,   e   somente   a   este,   a   inteira   responsabilidade   de sua decisão.  Falamos aqui  sobre avaliação da  liberdade do  indivíduo capturado e levado   à   sua   presença   por   agentes   policiais   ou   por   qualquer   um   do   povo, constituindo   tal   ato   a   primeira   análise   jurídica   imparcial   da   prisão   captura, direito   indeclinável   de   qualquer   pessoa   presa.   Disto   depreende-se   ser incompatível   com  o   acima   exposto,   qualquer   comando  hierárquico,   de   qualquer superior  hierárquico,  ao Delegado de Polícia  a  aplicação  da prisão  recolhimento, visto   ser   ato   cognitivo   e   decisório   exclusivo   daquele   a   quem   foi   apresentado   o conduzido,   ou   seja,   o   Delegado   de   Polícia   que   tomou   conhecimento   da   prisão captura.   É   de   bom   alvitre   frisar   que   tal   incompatibilidade   ocorre,   ainda   que   o superior   hierárquico   seja   Delegado   de   Polícia.   Em   relação   às   requisições emanadas   do   Poder   Judiciário   serão   recebidas   como notitia   criminis,   tendo   em vista   que   a   análise   das   fundadas   suspeitas   que   se   extrai   do   disposto   do   artigo 304,   §1º   do   CPP   denota   uma   relação   de   imediação   entre   as   provas   e   seu destinatário   no   auto   de   prisão   em   flagrante,   qual   seja   o   Delegado   de   Polícia, sendo   incompatível   a   ingerência   externa   de   qualquer   outro   órgão,   inclusive   da própria   Polícia   Judiciária.   O   resultado   da   fundada   suspeita   e   a   decisão   de lavratura do auto de prisão em flagrante pelo Delegado de Polícia dá início a uma modalidade   de   inquérito   policial   por   cognição   coercitiva,   sendo   a   inferência   do fato   e   sua   subsunção   a   uma   norma   penal   incriminadora   e   processual   penal   do estado   de   flagrância   uma   análise   que   é   resultado   do   sistema   do   livre convencimento motivado, de cujo efeito colateral  é o indiciamento,  ato exclusivo do Delegado de Polícia conforme art. 2º,§ 6º da lei 12.830/13. Ressalta-se ainda a possibilidade de a voz de prisão ser emanada pelo próprio Juiz nos casos de crime praticado na sua presença, nos moldes do art. 307 do CPP, podendo o Magistrado lavrar  o auto de prisão em flagrante ou optar  pela condução até a delegacia  com atribuição e apresentar o fato ao Delegado de Polícia. A requisição para lavratura do   auto   de   prisão   em   flagrante,   que   resultará   em   um   indiciamento   é,   por   via indireta,   uma   requisição   de   indiciamento,   sendo   dogmaticamente   inconcebível, conforme doutrina (NUCCI: 2011, p. 96) mais balizada, ipsis literis:

“Requisição de indiciamento: cuida-se de procedimento equivocado, pois indiciamento é ato 

exclusivo da autoridade policial, que forma o seu convencimento sobre a autoria do crime, 

elegendo, formalmente, o suspeito de sua prática. Assim, não cabe ao promotor ou ao juiz 

exigir, através de requisição, que alguém seja indiciado pela autoridade policial, porque seria o 

mesmo que demandar à força que o presidente do inquérito conclua ser aquele o autor do 

delito.   Ora,   querendo,   pode   o   promotor   denunciar   qualquer   suspeito   envolvido   na 

investigação criminal,  cabendo-lhe, apenas, requisitar do delegado a  ‘qualificação formal,  a 

identificação criminal e o relatório sobre vida pregressa’” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código 

de Processo Penal Comentado. 10ª ed. Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 96).

Pelas   mesmas   razões   acima   aludidas   também   é   o   tratamento   que   se   dá   a requisições   de   lavratura   ou   de   indiciamento   pelo  Ministério   Público,   posto   que não estão abrangidas pelos ditames do Art. 129, VII da CRFB e das demais normas orgânicas   que   regulamentam   o   controle   externo   da   atividade   fim   policial,   pelo 

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Ministério   Público.   Ainda   que   houvesse   tal   previsão,   esta   seria   ilógica   e incoerente,  visto  que nenhum diploma conferiu  ao Ministério  Público,  órgão que será  parte  e,  portanto,   legalmente  interessado e suspeito,  o  poder  de suprimir  a liberdade  de  qualquer  pessoa  possível   sujeito  de   sua  ação,  podendo  o  MP atuar como condutor  na prisão captura,  tal  qual  ocorre com o magistrado,  sendo a ele, em especial,  sequer destinatário da norma esculpida o art. 307 do CPP, falecendo atribuição  para  presidir   lavratura  do   auto  de  prisão   em  flagrante.  Referências: - CRFB/88, art. 129, VII, e art. 144, §§ 1º e 4º; - Código de Processo Penal, art. 304, § 1º e 307; - Lei 12.830/13, art. 2º e §§ 1º, 2º e 6º e art. 3º.

ENUNCIADO Nº 08PARA EFEITOS DE CONCESSÃO DE FIANÇA PELO DELEGADO DE POLÍCIA, PREVISTA NO ART. 322, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E CARACTERIZAÇÃO DA COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS, É IRRELEVANTE A EXISTÊNCIA DE CONCURSO DE CRIMES

Justificativa: Até   o   advento   da   Lei   nº   12.403/2011,   a   concessão   de   fiança   pelo Delegado de Polícia era exclusiva para os crimes apenados com pena de detenção ou   prisão   simples.   Com   a   nova   redação   dada   ao   art.   322   do   CPP,   houve significativa   ampliação   de   suas   atribuições   já   que   passa   a   poder   arbitrar   fiança para   todos  os  delitos   apenados   com pena  privativa   de   liberdade  não   superior   a quatro   anos.   O   propósito   ampliativo   é   nítido,   pois   apenas   três   tipos   penais previstos   no   Código   Penal   possuem   pena   de   reclusão   superior   a   três   anos,   são eles:   Divulgação   de   informações   sigilosas   ou   reservadas;   Duplicata   Simulada   e Abandono  Material.   A   ampliação   das   hipóteses   de   arbitramento   da   fiança   pelo Delegado   de   Polícia   acompanha,   no   mais,   o   propósito   mais   geral   da   lei   nº 12.403/2011   de   reduzir   os   índices   brasileiros   de   encarceramento   provisório. Porém,   um   problema   circunstancial   surge   após   o   advento   desta   lei.   A   atual redação   do   art.   322   do   CPP   estabelece   como   requisito   objetivo   para   o arbitramento   da   fiança   pelo   Delegado   o   prazo   máximo   da   pena   privativa   de liberdade   abstratamente   cominada,   devendo   então   perquirir   se   o   dito   requisito legal objetivo considera ou não a existência de concurso de crimes que possa, em tese,   exasperar   a   pena   máxima   futuramente   aplicada   para   além   dos   4   anos estabelecidos   no   artigo   em   alusão.   A   revisão   de   literatura   revela   que,   embora haja profusão de artigos disponíveis,  poucos são os  livros-curso que enfrentam a questão   com clareza.  Para  Edílson  Mougenot  Bonfim   (BONFIM,  2012,  p.  540   ),   a Autoridade Policial não poderá conceder fiança, o que alega com fundamento nas súmulas   723   do   Supremo   Tribunal   Federal,   81   e   243   do   Superior   Tribunal   de Justiça.   Embora   o   autor   não   transcreva,   temos   que   os   verbetes   sumulares indicados tem o seguinte teor:

STF, Súmula nº 723 - Suspensão Condicional do Processo - Crime Continuado – Admissibilidade 

- Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena 

mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano.

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STJ Súmula nº 81   -  Fiança -  Concurso Material  -  Soma das Penas - Não se concede fiança 

quando, em concurso material, a soma das penas mínimas cominadas for superior a dois anos 

de reclusão.

STJ Súmula nº 243 - Suspensão do Processo - Concurso Material ou Formal ou Continuidade 

Delitiva - Somatório ou Incidência de Majorante - Limite Aplicável - O benefício da suspensão 

do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, 

concurso   formal   ou   continuidade   delitiva,   quando   a   pena   mínima   cominada,   seja   pelo 

somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.

Em   sentido   diverso,   entendendo   por   aplicação   analógica   do   art.   119   do   Código Penal,   André  Nicolitt   (NICOLITT,   2014,   p.   797)   sustenta   que  mesmo  em   caso  de concurso  de   crimes  que   implique  em  possibilidade  de   superação   do  prazo  de   4 anos,   é   possível   ao   Delegado   de   Polícia   arbitrar   fiança.   Concordamos   com   tal posicionamento.   Primeiramente,   é   necessário   esclarecer   que   há   indiscutível lacuna   legislativa   que   implica   em  necessidade   de   integração  hermenêutica   e,   já de   saída,   diga-se   que   não   se   pode   supor   qualquer   aplicação   da   Súmula   723   do Supremo   Tribunal   Federal,   bem   como   da   Súmula   243   do   Superior   Tribunal   de Justiça,   já   que   tratam   de   questões   atinentes   a  medidas   despenalizadoras,   com inequívoco   conteúdo   de   direito  material   penal,   enquanto   o   instituto   da   fiança constitui-se  de questão   tipicamente  processual.  O mesmo não se  diga  da súmula 81 do Superior  Tribunal  de Justiça,  que entendo,   todavia  incorreta.  Como sabido havendo   lacuna   legislativa,   a   solução   hermenêutica   da   Teoria   Jurídica   clássica aponta   como   mecanismo   integrativo   a   analogia.   Como   aponta   Giusepe   Lumia (LUMIA,   2003,   p.   92),   há   de   se   distinguir   a analogia   legis e   a analogia   iuris, a primeira   ocorre   quando   a   lacuna   pode   ser   resolvida   com   recurso   a   disposições legislativas   que   regulam   situações   similares,   a   segunda   ocorre   quando,   na ausência de previsão normativa para caso similar,  o  intérprete se vale de recurso aos princípios gerais de direito.  Penso que,  uma vez que a norma versada no art. 322   trata   do   instituto   da   concessão   de   liberdade   provisória   mediante   fiança, questão   atrelada   a   prisão   em   flagrante,   modalidade   de   prisão   cautelar, justificada   exclusivamente   na   necessidade   se   fazer   cessar   conduta aparentemente delituosa,  a analogia  legis  exigiria que houvesse norma relativa a prisões   cautelares   ou  medidas   cautelares   penais   não   prisionais   que   de   alguma maneira   versassem   sobre   tal   questão.   Entretanto,   não   se   verifica   nas   normas processuais   penais   brasileiras   qualquer   hipótese   em   que   o   legislador   tenha relacionado  prazo  e   concurso  material   de   crimes,  de   forma  que   improcede   falar aqui   em analogia   legis. Devemos   cogitar,   portanto,   de   integração   por   meio de analogia   iuris,   buscando   solução   integrativa   que   permita   dar   a   questão   uma solução   consentânea   com a   as  demais  normas   gerais   que   regem o  ordenamento jurídico.  Neste  sentido,  verifica-se  que  a  prisão  em flagrante,  está   justificada  no estado  de   flagrância,   quando  presentes   as   hipóteses   do   art.   302  do   CPP,   o   que autoriza   excepcionalmente   a  prisão   cautelar   com dispensa  de  mandado   judicial, por ser necessária a intervenção para evitar que a consumação delitiva. Constata-se  que   a   existência   de   eventual   concurso   de   crimes   não   interfere   no   estado  de 

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flagrância, de forma que se, por exemplo, o suposto autor do fato é surpreendido em flagrante por crime de furto,  é  irrelevante que tenha ele praticado 1 furto ou 10 furtos,  do que se evidencia que a razão da prisão em flagrante é  indiferente à quantidade  de   condutas  do  agente,   bastando  que  haja   aparente   tipicidade.  Pois bem,   se   a   quantidade   de   crimes   não   é   relevante   para   a   caracterização   do flagrante,   não   se   pode   cogitar   que   influencie,   de   outra   sorte,   a   atribuição  para arbitrar fiança nos casos de flagrante delito. Há de se compreender, ademais, que a mens   legis da  modificação   legislativa   foi   ampliar   as  hipóteses  de  arbitramento da fiança pelo Delegado de Polícia,  de forma a reduzir o número de encarcerados cautelares,   o   que   recomenda   que   o   intérprete   dê   ao   dispositivo   interpretação ampliativa.   No  mais,   o   art.   322   do   CPP   não   impõe   ao   Delegado   de   Polícia   um dever  de  arbitrar   fiança  quando   satisfeito  o   requisito  objetivo,   podendo,  diante das circunstâncias não arbitrar fiança quando houver motivo que faça presumir o pronto   retorno   do   custodiado   à   prática   da   infração.   Neste   caso   a   eventual existência   de   concurso   de   crimes,   demonstrando   que   se   trata   de   conduta reiterada, poderia,  casuisticamente,  não recomendar a fiança, o que não significa que   haja   qualquer   óbice   à   concessão   da   fiança.   Da   mesma   forma,   quando   o legislador   fixou  o   conceito  de   crime  de  menor  potencial  ofensivo  no  art.    61  da Lei   9.099/95,   o   fez   sem   determinar   se   a   existência   de   concurso   capaz   de exasperar  a  pena  para  patamar   superior  a  dois  anos   interferiria  na   competência do   juizado  especial   criminal.  Novamente  é   caso  de   se   recorrer  à analogia   iuris e não à analogia  legis,  pois não há qualquer previsão legal a qual possa se socorrer o   intérprete.  Da  mesma   forma  que  o   art.   322  do  CPP,  o   art.   61  da   Lei   9.099/95 merece   interpretação   ampliativa,   já   que   foi   elaborado   com   nítido   propósito   de propiciar   a   despenalização.   Nesta   toada,   é   interpretação   mais   adequada ao telos da   norma   a   de   que   existência   eventual   de   concurso   não   interfere   na competência   dos   Juizados   Especiais   Criminais.  Referências: -Código   de   Processo Penal,  arts.  302  e  322;   -   Lei  nº  12.403/2011;   -   Lei  nº  9.099/95,  art.  61. BONFIM, Edilson  Mougenot.   Curso   de   processo   penal.   São   Paulo:   Saraiva.   2012.  LUMIA, Giuseppe.  Elementos  de teoria  e   ideologia  do direito.  São Paulo:  Martins  Fontes. 2003. NICOLITT,   André.   Manual   de   processo   penal.   São   Paulo:   Revista   dos Tribunais. 2014

ENUNCIADO Nº 09A EMBRIAGUEZ AO VOLANTE, EM QUE PESE A SUA CLASSIFICAÇÃO COMO CRIME DE PERIGO ABSTRATO, EXIGE PROVA DE EFETIVA ALTERAÇÃO DA CAPACIDADE PSICOMOTORA PARA SUA CONFIGURAÇÃO, NÃO SENDO SUFICIENTE, PORTANTO, A AFERIÇÃO ATRAVÉS DE ETILÔMETRO, EMBORA DISPENSÁVEL O EXAME PERICIAL

Justificativa: O  crime de  embriaguez  ao  volante  é  um crime de  perigo  abstrato  e não se vê aqui qualquer inconstitucionalidade, ao contrário do que é preconizado por   certa   vertente   doutrinária:   a   presunção   do   risco,   por   óbvio,   não   abraça   o risco   irrealizável.   Trata-se   de   opção   legislativa   legítima,   apta   a   proteger   o   bem 

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jurídico   tutelado   –   no   caso,   a   vida   e   a   integridade   corporal   de   pessoas indeterminadas – em diferentes estágios de ataque, pois o risco potencial  é risco possível,   vulnerando   o   objeto   de   proteção   penal,   ainda   que   remotamente. Todavia,   a   excepcional   técnica   legislativa  não  pode  e   não  deve   ser   interpretada de   forma   a   alcançar   situações   de   risco   é   inexistente.   Assim,   dirigir   um   veículo com  a   capacidade  psicomotora   comprometida  pelos   efeitos   do   álcool   ou  drogas afins   em   via   pública,   sendo   certo   que   no   local   há   razoável   movimentação   de pessoas   e   de   outros   veículos,   ainda   que   daí   não   se   infira   a   iminência   de   uma ofensa,   é   inegavelmente   uma   situação   perigosa.   Diferentemente,   conduzir   o mesmo   veículo   em   via   onde   não   há   a  menor   possibilidade   de   atingimento   dos bens jurídicos é conduta que sequer resvala na previsão legal.  Entende-se,  assim, que o princípio da ofensividade ou lesividade aceita ambas as hipóteses de perigo –   concreto   ou   abstrato   –,   refutando   tão-somente   os   casos   de   ausência   de qualquer  risco.  Nesse diapasão,   insta  salientar  que a nova redação do artigo 306 do   CTB,   ao   exigir   a   alteração   da   capacidade   psicomotora,   erigiu   essa peculiaridade   à   qualidade   de   elementar,   ainda   que   essa   constatação   não desautorize  a  classificação  do  delito  como de perigo  abstrato.  Explica-se:   se  não há   alteração   da   capacidade   psicomotora,   não   há   risco   a   ser   aferido,   isto   é,   o motorista   não   age   ofensivamente.   Ao   passo   em   que,   existindo   a   alteração, percebe-se   o   perigo   que   pode   ser   presente   (concreto)   ou  meramente   potencial (abstrato),  dependendo  da   iminência  ou  não  de  um dano.  De   toda  sorte,   impõe-se   o   reconhecimento   da   mencionada   alteração   para   que   reste   aperfeiçoada   a adequação   típica.   Reforçamos:   sem   alteração   da   capacidade   psicomotora comprovada,   não   há   crime.   O   raciocínio   até   aqui   desenvolvido   conduz   a   outra indagação:   como   deve   ser   comprovada   a   necessária   alteração   da   capacidade psicomotora?   No   que   concerne   ao   uso   de   álcool,   a   redação   anterior   do   artigo 306  do  CTB  estabelecia   a   existência  do   crime  quando   constatada   a   presença  no sangue de  concentração  alcoólica   igual  ou superior  a  6  dg/l  de sangue.  Observe-se   que   a   norma   não   fazia  menção   à   capacidade   psicomotora   do   agente.   Assim, determinada   a   concentração,   integralizavam-se   as   elementares,   ou   seja,   a conduta  era   típica.  Essa  concentração,  no  entanto,  quedava-se   limitada  a   certos procedimentos   probatórios,   como,   por   exemplo,   o   exame   de   sangue,   realizado nos   institutos   médico-legais,   ou   a   análise   do   ar   alveolar   pelo   instrumento denominado etilômetro,  ocasião em que uma tabela de conversão determinava a presença   de   álcool   no   sangue   e   sua   quantidade.   Com   a   Lei   nº   12.760/2012,   a concentração alcoólica caiu por terra como exigência de tipicidade formal. Afinal, é   plenamente   possível   –   e   isso   depende   do   caso   concreto   e   da   pessoa   que realizou   a   ingestão   de   álcool   –   que   aquele   que   apresente   tal   concentração   não tenha a  capacidade  psicomotora  comprometida.  Assim,  é  enganosa  a   redação do §   1º,   I,   do   artigo   306,   que   dá   a   entender   existir   absoluta   paridade   no   binômio concentração/alteração.  O exame de sangue ou o exame através do etilômetro de nada valem se não cotejados com outros  elementos  de prova.  Se, v.  g.,  o   teste  é positivo   para   concentração   alcoólica   e   o   condutor   apresenta   perceptível desequilíbrio,   mostrando   dificuldades   em   andar   em   linha   reta,   temos   o   crime, indubitavelmente.   Entretanto,   se  o   único   sinal   de   embriaguez  é   o  hálito   etílico, 

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não há crime. Não se quer dizer com isso,  contudo,  que a submissão do condutor a   exame   pericial   –   ainda   que   para   mera   constatação   de   sinais   externos   de embriaguez   –   seja   exigência   inafastável.   Mesmo   que   a   providência   seja recomendável,   o   próprio   legislador   tratou  de   tornar   a  perícia   facultativa,   desde que a afetação psicomotora seja evidente.  Não é outra a conclusão que se extrai do §  2º  do artigo  306.  Essa   facultatividade  deriva  de uma série  de  fundamentos, mas   tem   relação   íntima   com   o   fator   temporal,   uma   vez   que   o   álcool   e   outras substâncias   psicoativas   são   processadas   pelo   organismo,   logo   desaparecendo seus   sinais  exteriores.  O   tempo entre  a  abordagem e  a  condução  do  motorista  a um   instituto   de   perícias,   portanto,   pode   tornar   o   exame   técnico   inútil   dada   a volatilidade   das   evidências.   Por   conseguinte,   tem-se   que   a   embriaguez   ao volante,  crime de perigo abstrato,  somente resta  caracterizada pela alteração da capacidade  psicomotora,   que  não  é  provada  de   forma  absoluta  pelo  etilômetro, tampouco  exige  apreciação  pericial. Referências:   -  Código  de  Trânsito  Brasileiro, art. 306; - Lei nº 12.760/2012.

ENUNCIADO Nº 10O DELEGADO DE POLÍCIA PODE, MEDIANTE DECISÃO FUNDAMENTADA, DEIXAR DE LAVRAR O AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE, JUSTIFICANDO O AFASTAMENTO DA TIPICIDADE MATERIAL COM BASE NO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, SEM PREJUÍZO DE EVENTUAL CONTROLE EXTERNO

Justificativa:  A palavra “crime” comporta algumas espécies de conceitos:  são eles o   conceito   formal,  material  e   analítico.  Em se   tratando  do  estudo  da   tipicidade, há que se falar em tipicidade formal e material.  Na tipicidade formal é necessário que   o   comportamento   realizado   seja   completamente   adequado   àquele   que   o legislador   previu.   Seria   a   adequação   típica   de   subordinação   imediata   (quando está   perfeitamente   ajustado).   A   tipicidade  material,   por   sua   vez,   está   ligada   à ideia   de   efetiva   lesão   ao   bem   jurídico.   Para   que   se   adentre   à   noção   de insignificância,   deve-se   ter   em   mente   a   ligação   do   tema   com   a   intervenção mínima do direito penal, na qual há quatro subprincípios: o da fragmentariedade, no qual o Direito Penal tem um caráter fragmentário, pois não cria bens jurídicos, mas   seleciona  bens   jurídicos  preexistentes;   subsidiariedade,   o  da   insignificância (propriamente   dito)   e   adequação   social.   Da  mesma   forma,   trabalha-se   com   as funções  do  princípio  da   lesividade  e  uma  delas  é   a  de  proibir   a   incriminação  de condutas   desviadas   que   não   afetem   qualquer   bem   jurídico.   Nesse   sentido,   a palavra  “desviada”  é empregada como conduta orientada em direção fortemente desaprovada   pela   coletividade.   Desta   forma,   propõe-se   uma   leitura   clara   do contexto   em   que   será   aplicado   (o   que   propriamente   poderíamos   chamar   de “releitura  do princípio  da   insignificância”),   sob  todos  os  aspectos,  para  que  haja proporcionalidade,  equidade,  principalmente,   respeito ao princípio da  igualdade, tratando   os   iguais   de   forma   equivalente   e   os   desiguais   de   forma   desigual,   na medida   de   sua   desigualdade.   Com   relação   à   operacionalização   do   princípio   da insignificância,  há  possibilidade  de que o  Delegado de Polícia,  através  da análise 

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de sistemas de inteligência,  verifique se é a primeira vez que determinada pessoa é   conduzida   à   Delegacia,   tendo   como   motivo   um   suposto   crime   no   qual   haja possibilidade de aplicação do mencionado postulado.  Portanto,  se diante de toda análise   a   Autoridade   Policial   verificar   que   é   a   primeira   vez   que   um   fato, reconhecidamente   insignificante   está   sendo   registrado,   prestigiando-se   os requisitos  das  Cortes  Superiores,  o  Delegado está  autorizado,  mediante  a  devida fundamentação,   a   afastar   a   lavratura   da   prisão   em   flagrante.   No   entanto,   sua atitude   deve   ser   a   de   permitir   que   o  Ministério   Público   e   o   Judiciário   tenham acesso   à   decisão   o   mais   rápido   possível,   evitando   transtornos   indeléveis   à dignidade   da   pessoa   humana.   Para   que   isso   seja   efetivado,   há   algumas alternativas.   Uma   delas   é   a   imediata   remessa   das   peças   até   então confeccionadas,  juntamente com a decisão da Autoridade Policial,  decidindo pelo afastamento   da   prisão   em   flagrante   por   força   da   aplicação   do   princípio   da insignificância,  o  que,   inclusive,  poderia   ser   feito  através  de  ofício  ao  Ministério Público,  informando sobre as atitudes tomadas, de modo a possibilitar o controle externo da atividade policial.  Caso o Promotor de Justiça entenda que não é caso no   qual   incida   o   princípio   da   insignificância,   poderá   receber   como   peças   de informação   e   proceder   à   imediata   denúncia.   Além   disso,   outro   meio   bastante interessante,   é   a   imediata   instauração   de   inquérito   policial   (ou   mesmo   termo circunstanciado   de   ocorrência,   caso   a   suposta   situação,   em   sendo   considerada crime,   seja   da   competência   dos   Juizados   Especiais   Criminais),   com   consequente instrução   de   tudo   que   houver   sido   colhido   e   documentado,   bem   como   com   a decisão   de   não   indiciamento,   por   força   da   ausência   de   tipicidade   material, estampando   a   desnecessidade   de   manutenção   em   cárcere,   ou   mesmo   de enfrentamento   de   uma   eventual   ação   penal,   concluído   através   de   minucioso relatório   (ou  decisão)  de   forma a  demonstrar  as   razões  de   fato  e  de  direito  que possibilitaram   a   autoridade   policial   manifestar   aquele   posicionamento.   Resta claro que a  intenção do Delegado de Polícia não é a de, simplesmente, não lavrar o   auto  de  prisão  em  flagrante,   liberando   todos  os  envolvidos  após   a   apreciação sumária   dos   fatos   e   alijando   a   situação   numa   espécie   de   “limbo   jurídico”.   Vai muito  além.  O  que  não  deve  ocorrer  é  acreditar  que  o  Delegado  pode  deixar  de registrar   situações  envolvendo  a  aplicação  do  princípio  da   insignificância   e  que, através   do   controle   externo   da   atividade   policial,   o   Ministério   Público   terá condições   de   saber,   em   tempo   hábil,   de   todos   esses   casos,   para   que   tome providências no sentido de denunciar  ou arquivar.  Partindo-se para uma situação um pouco diferente desta primeira hipótese narrada,  ainda há possibilidade para uma   segunda   alternativa,   que   é   a   formalização   da   prisão   com   a   aplicação   da fiança,   caso   seja   possível   diante   dos   requisitos   legais.   Desta  maneira,   caso   não seja   vislumbrada,   à   primeira   vista,   a   possibilidade   de   aplicação   imediata   do princípio   da   insignificância,   por   não   estarem  presentes   seus   requisitos,   ou   seja, caso   a   primeira   situação   narrada   não   possibilite   o   afastamento   da   prisão   em flagrante,  com todos desdobramentos processuais  cabíveis,  passa-se,  então,  para a   formalização  do   flagrante,  mas  ainda   sem encarceramento   inicial.   Em situação hipotética,  havendo   concurso  de  crimes,  ou  eventualmente  diante  da  prática  de várias   condutas   criminosas,   mas   que   isoladamente   poderiam   ser   consideradas 

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insignificantes   ou   outra   situação   na   qual   esteja   caracterizada   a   necessidade   de segregação   cautelar,   não   restam   dúvidas   que   o   preceito   princípiológico   da bagatela não pode ser banalizado e,  portanto,  resta  justa a aplicação de medidas cautelares   ou   mesmo   a   prisão,   em   última   hipótese.   Daí   a   proposição   de   uma releitura   do   princípio   da   insignificância,   de   modo   a   possibilitar   sua   efetiva operacionalização no direito brasileiro.  Se determinada pessoa pratica reiteradas condutas   insignificantes,   sem   que,   por   exemplo   seja   a   hipótese   de   crime continuado,   com solução  positivada  no  artigo  71  do  Código  Penal,  não  pode   ser beneficiada,  de forma deliberada, com a aplicação do princípio da insignificância, pois   nesta   hipótese   o  Direito   Penal   como   sistema   subsidiário   falhou   e   o   Estado deve   dar   uma   resposta   para   a   sociedade,   pacificando   o   conflito   eventualmente existente,   principalmente   diante   daqueles   que   discordam   veementemente   do instituto   da   bagatela   e   ignoram,   inclusive,   sua   aplicabilidade.   Por   fim,   não   se pode   confundir,   da   mesma   maneira,   uma   situação   como   insignificante   de situações  em  que  podem  ser   enquadradas   como  de  pequeno   valor,   conforme   já positivado na legislação pátria, mormente em se tratando de crimes patrimoniais. Além  disso,   busca-se  privilegiar   a   dupla   face  do  princípio  da  proporcionalidade, sob o aspecto da proibição do excesso e da vedação à proteção insuficiente.

ENUNCIADO Nº 11O DELEGADO DE POLÍCIA, NO EXAME FÁTICO-JURÍDICO DO ESTADO FLAGRANCIAL, PODE, MEDIANTE DECISÃO FUNDAMENTADA, AFASTAR A LAVRATURA DO AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE, DIANTE DO RECONHECIMENTO DE CAUSA EXCLUDENTE DE ILICITUDE, SEM PREJUÍZO DE EVENTUAL CONTROLE EXTERNO

Justificativa:  Em   um   primeiro   plano   cumpre   esclarecer   que   a   controvérsia   ora instada   ao   presente   debate   cinge-se   à   possibilidade   de   o   Delegado   de   Polícia, durante   a   análise   de   situação   flagrancial,   reconhecer   a   incidência   de   causa   de justificação,   com o   subsequente  afastamento  da   lavratura  do  auto  de  prisão  em flagrante   e   imediata   instauração   de   inquérito   policial.   Por   essa   via,   há   de   se reconhecer  que doutrina  conservadora,  embasada em uma  interpretação  vetusta e   meramente   gramatical   do   artigo   310,   parágrafo   único   do   pátrio   Diploma Processual   Penal,   assevera   que   cabe   ao   Magistrado   o   exame   das   causas excludentes   da   ilicitude,   após   a   lavratura   do   auto   prisional.   Trata-se,   por evidente,   de   uma   interpretação   odiosa   e   avessa   aos   ditames   constitucionais   da dignidade   da   pessoa   humana   e   da   liberdade,   como   expressões   máximas   dos direitos  e  garantias   fundamentais  de  nossa  ordem  jurídica.  No  campo  do  direito material, independente de uma análise profunda das teorias do delito, resta claro que qualquer  delas  adotam uma concepção estratificada  do conceito  de crime,  o qual,   por   sua   vez,   não   se   resume   a   uma  mera   subsunção  descritiva   do   fato   sob exame   à   norma   penal   paradigmática.   Em   sua   concepção   clássica,   amplamente adotada   na   doutrina   nacional,   a   infração   penal   compõe-se,   de   forma estratificada,  num  fato   típico,   ilícito  e  culpável.  Nessa   linha,  a  análise  do  delito, 

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que   justifica   o   próprio   exame  da   situação   flagrancial   e,   por   sua   vez,   autoriza   a imposição  de  medida   restritiva  de   liberdade,   reclama  uma acurada  valoração  de todos os seus elementos integrativos.  Nesse diapasão, faz-se imperioso frisar que a   interpretação   sistemática  dos  artigos  5º,   inciso   LXI  da  CRFB/88,  4º,  301  e  302 do   Código   de   Processo   Penal   alinha-se   nesse   sentido,   sempre   fazendo   alusão   à verificação de existência da infração penal, cuja concepção engloba todos os seus componentes.   De   tal   conjugação,   depreende-se   claramente   que   a   Carta Republicana,   em   situação   excepcional,   autoriza   a   restrição   da   liberdade individual   em   situação   de   flagrante   delito,   bem   como   o   legislador   ordinário assevera   que   tal   situação   flagrancial   vincula-se   ao   reconhecimento   do cometimento  de  uma   infração  penal,  nas  hipóteses   legalmente  estipuladas.  Ora, se   a   situação   fática   trazida   à   apreciação   do   Delegado   de   Polícia   traduz-se   em plena   verificação   de   incidência   de   preceito   de   justificação,   consoante   as hipóteses   legalmente  estampadas  no artigo 23 do Código Penal,  conclui-se  que a infração   penal   não   restou   perfectibilizada   e,   portanto,   inexiste   o   delito   que justifica a medida de restrição de  liberdade,  a ser  instrumentalizada pelo próprio auto   prisional.   Certo   é   que   a   análise   da   tese   flagrancial   comporta   um   juízo   de cognição   sumária,   onde   cabe   ao   Delegado   formar   sua   convicção,   devidamente fundamentada,   a   partir   dos   elementos   vestigiais   de   autoria   e   materialidade delitiva   ora   colhidos.   Assim,   entendendo   presente   um   juízo   de   probabilidade quanto à verossimilhança do preceito permissivo, a solução que mais se adequa à ordem   jurídica   consiste   no   afastamento   da   lavratura   do   auto   de   prisão   em flagrante e na imediata instauração do competente inquérito policial.  Ocorre que a   reforma  processual   realizada  pelo  advento  da   Lei  nº  12.403/11  não  promoveu efetividade à norma  insculpida no parágrafo único do Artigo 310,  o qual,  por  sua vez, reclama interpretação conforme à Constituição, sob pena do reconhecimento de  sua  não recepção,  vez  que  patente  seu   retrocesso  e   franca  oposição  à  ordem constitucional.   A   seu   turno,   o   Delegado   de   Polícia,   na   qualidade   de   primeiro garantidor   dos   direitos   fundamentais   na   persecução   criminal,   guarda   como precípuo  mister,   essencial   e  exclusivo  na  ordem constitucional,   ora   referendado pelo   advento   da   Lei   nº   12.830/13,   a   apuração   da   autoria,   materialidade   e circunstâncias   das   infrações   penais.   No   fiel   exercício   de   sua   atividade   técnico-jurídica,   compete  ao  Delegado  de  Polícia  a   imperativa  necessidade  de   resguardo da dignidade da pessoa humana, erigida sob a forma de princípio fundamental  da ordem   republicana,   na   esteira   do   artigo   1º,   inciso   III   da   Constituição   Federal, bem   como   a   tutela   da   liberdade,   expressão   maior   dos   direitos   e   garantias fundamentais,   cuja   eventual   restrição   condiciona-se   exclusivamente   a   situações excepcionais   e   reguladas   no   arcabouço   normativo,   nos   termos   do   artigo   5º   da Carta   Federativa.   Desta   forma,   sobeja   cristalino   o   reconhecimento   de   que,   na análise da tese flagrancial,  o Delegado de Polícia  tem o poder-dever  de examinar a   incidência   de   eventual   preceito   de   justificação,   na   esteira   do   artigo   23   do Código Penal,  decidindo,  de forma fundamentada,  pelo afastamento da  lavratura do   auto   de   prisão   em   flagrante,   com   imediata   instauração   do   inquérito policial.  Referências:  -   CRFB/88,   art.   1º,   III,   e   art.   5º,   inc.   LXI;   -   Código   de 

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Processo   Penal,   arts.   4º,   301,   302   e   310;   -   Código   Penal,   art.   23;   -   Lei    nº 12.403/2011.

ENUNCIADO Nº 12O DELEGADO DE POLÍCIA PODERÁ DEIXAR DE LAVRAR O AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE, ATRAVÉS DE DECISÃO FUNDAMENTADA, SE RECONHECER A EXISTÊNCIA MANIFESTA DE UMA CAUSA DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE, SEM PREJUÍZO DE EVENTUAL CONTROLE EXTERNO

Justificativa:  O   conceito   operacional   de   crime,   por   imperiosa   exigência   da dogmática   penal,   é   sequencial.   Nesse   sentido,   cada   etapa   metodológica   de valoração  do   fato  punível  apresenta  nexo  de  dependência  com a  etapa  anterior, funcionando como pressuposto  lógico de análise  da fase subsequente.   Isso não é novidade.   Nesse   sentido,   é   de   clareza   hialina   que   a   análise   da   situação   de “flagrante   delito”   positivada   no   art.   302   do   CPP   pressupõe   a   valoração   da culpabilidade do agente conduzido à presença do Delegado de Polícia.  Não existe qualquer   vedação   expressa   nesse   sentido.   A   Lei   12.830/13   reforçou normativamente   essa   previsão   ao   estabelecer   que   o   Delegado   de   Polícia   tem liberdade   jurídica   para   a   apreciação   dos   fatos.  Nesse   escopo,   se   o  Delegado  de Polícia   pode   formar   o   seu   convencimento   positivo   acerca   da   totalidade   dos requisitos  do  conceito  de   crime  para  documentar  a  prisão,  por  que  não  poderia fazê-lo   negativamente,   para   reconhecer   a   ausência   de   contrariedade   à   norma, para   fins   de   reprovação   penal?   Deve   o  Delegado   de   Polícia   empurrar   com   seus pés   à   escuridão  do   cárcere  um  sujeito  que  aparentemente   agiu   sob  o  manto  de uma causa de exclusão de culpabilidade? Obviamente que esse entendimento não se   coaduna   com   a   função   de   primeiro   garantidor   dos   direitos   fundamentais.   O prof. Hélio Tornaghi no infinito de sua sabedoria já asseverava:

“Com sacrifício de algumas horas de  lazer,   fossem olhar as prisões onde milhares 

de pessoas  definhavam,  vítimas  de  leis  viciadas  e  de magistrados   indolentes;  em 

que  os   cárceres   fétidos  e  escuros  eram  tristes  monumentos  da  miséria  humana, 

contornados  por  muros apavorantes  onde a  liberdade estava  cercada de ferros  e 

a  inocência se misturava ao crime; subterrâneos em que a  luz do dia não entrava 

e   nos   quais   jaziam   sepultados   os   pobres   infelizes,   que   haviam   cometido   o 

desaforo   de   dizer-se   inocentes   diante   de   um   juiz   obtuso   ou   perverso   (...) 

Desventuradamente   –   oh   triste   e   desditosa   humanidade-   os   ventos   da 

prepotência  continuam a soprar,   frios,  gelados,  siberianos,  e  o urso polar  sufoca 

com pés de ferro multidões de desgraçados aos quais promete tesouros,  mas que 

não   são   livres   nem   para   morrer.   Infortunadamente,   nos   países   amantes   da 

liberdade,   gemem   ainda   os   infelizes   em   prisões   abjetas,   indignas   de   vermes, 

quanto  mais   de   pessoas   criadas   à   imagem   e   semelhança   do   Senhor.”   (Curso   de 

Processo Penal, Vol.2, pág. 2 Hélio Tornagui).”

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De   mais   a   mais,   mesmo   que   suficiente   a   leitura   napoleônica   do   art.   302   do CPP, ad   argumentandum,   há   que   se   considerar   que   o   art.310,   p.u,   do   CPP   não cristalizou   uma   exclusividade   para   apreciação   das   causas   de   justificação   e exculpação.  Esse dispositivo está inexoravelmente ligado à existência material  de um   auto   de   prisão   em   flagrante.   Logo,   esse   artigo   somente   tem   aplicação   para aquelas   situações  nas  quais  o  Delegado  de  Polícia   imputa  a  prática  do  delito  ao preso.   Dessa   forma,   esse   artigo   confere   ao  Magistrado   como   segunda   instância das decisões do Delegado, quando esse entender presente os requisitos do crime. Trata-se  de   interpretação  prospectiva  do  CPP,  atenta  ao  princípio   constitucional do   favor   rei. Referências:  -   Código   de   Processo   Penal,   art.   302   e   310;   -   Lei   nº 12.830/2013.

ENUNCIADO Nº 13O CONTROLE EXTERNO A QUE SE REFERE O ART. 129, VII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DEVE SER REALIZADO SOBRE OS RESULTADOS E OS MEIOS EMPREGADOS PARA EXECUÇÃO DA ATIVIDADE-FIM DA POLÍCIA JUDICIÁRIA - A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL -, NÃO PODENDO ABARCAR O CONTROLE SOBRE AS ATIVIDADES ADMINISTRATIVAS DESEMPENHADAS

Justificativa:  A   Constituição   da   República   Federativa   do   Brasil   de   1988,   em   seu art.  129,   inc.  VII,  preceitua que o Ministério  Público  detém o poder  de exercer  o controle  externo da atividade policial,  a  ser  disciplinada em  lei  complementar.  A lei   complementar   nº   75/1993,   relativa   à   organização   do  Ministério   Público   da União,   prevê   em   seu   artigo   3º   a   atribuição   para   exercer   o   controle   externo   da atividade policial,  com o objetivo de assegurar:

“a) o respeito aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, aos objetivos fundamentais 

da República  Federativa do Brasil,  aos princípios   informadores  das  relações  internacionais, 

bem como aos direitos assegurados na Constituição Federal e na lei;

b) a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio público;

c) a prevenção e a correção de ilegalidade ou de abuso de poder;

d) a indisponibilidade da persecução penal;

e) a competência dos órgãos incumbidos da segurança pública.”

Merece análise  também a Lei  Orgânica do Ministério  Público – Lei  nº 8.625/1993 que   dispõe   sobre   normas   gerais   para   a   organização   dos   Ministérios   Públicos Estaduais.  Neste  diploma,   assim  como  na  aludida   Lei   Complementar,  observa-se que   o   controle   externo   da   atividade   policial   tem   incidência   na   investigação criminal,   permitindo   aos  membros   do Parquet acompanhar   inquérito   policial   ou diligências   investigatórias,   bem   como   requisitar   diligências   investigatórias   e   a instauração   de   inquérito   policial,    conforme,   respectivamente,   previsto   no   art. 10,   inc.   IX,   “e”,   e   art.   26,   inc.   IV   da   LOMP.   Registra-se   ainda   que   o   controle 

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exercido   pelo  Ministério   Público   se   encontra   inserido   no   chamado   sistema   de freios   e   contrapesos   que   foi   estabelecido   em   nosso   texto   constitucional   para garantir   a   separação  dos  poderes   e   evitar  que  algum atue  de   forma  desmedida. Com   fulcro  nesta   ótica,   percebe-se   claramente   que  o   controle   externo   exercido pelo Ministério Público deva se restringir à fiscalização do exercício da atividade-fim   desempenhada   pela   Polícia   Judiciária,   qual   seja,   a   investigação   criminal,   de modo   a   velar   que   tal   órgão,   sob   o   pretexto   de   exercer   sua   função constitucionalmente  assegurada,  não viole  direitos  estabelecidos  em nossa Carta Magna. No tocante à fiscalização das atividades inerentes à função administrativa da Polícia Civil,  podendo citar o controle de bens públicos destinados pelo Estado para   execução   da   atividade-fim,   a   organização   de   quadro   de   pessoal,   o cumprimento   das   atribuições   de   cada   unidade   policial,   dentre   outras,   como ocorre   em   qualquer   outro   Poder,   deve   permanecer   a   cargo   dos   órgãos responsáveis  pela realização do controle   interno.  De acordo com o magistério  de José dos Santos Carvalho Filho “controle  interno é aquele exercido por órgãos de um   Poder   sobre   condutas   administrativas   produzidas   dentro   de   sua   esfera” (Manual   de   Direito   Administrativo,   Atlas:   São   Paulo,   25   ed.,   2012).   Observa-se que, na própria estrutura da Polícia Judiciária do Estado do Rio de Janeiro, há um órgão   com   atribuição   para   realizar   o   controle   interno   das   atividades administrativas:   a   Corregedoria   Interna   (COINPOL).   Ademais   no   âmbito   da Secretaria   de   Segurança   Pública   existe   a   CGU,   Corregedoria   Geral   Unificada, também   incumbida   de   tal   atribuição,   atuando   externamente.   Deve-se   observar que   a   Polícia   Civil   integra  o   Poder   Executivo,   não   restando  qualquer   razão  para que um órgão diverso, Ministério Público, assuma a realização de sua fiscalização meramente   administrativa.   Corrobora   também   tal   entendimento   o   princípio   da eficiência,   inserido   em   nossa   Carta   Magna   pela   EC   nº   19/1998.   Para   este princípio,   urge   um   aumento   da   produtividade   com   redução   de   desperdícios   de dinheiro   público,   devendo   os   serviços   públicos   ser   realizados   com   presteza, perfeição   e   rendimento   funcional.   Por   sua   vez   o   princípio   da   economicidade, expressamente  previsto  no  art.   70  da  CRFB,  propõe,  em síntese,   a  promoção  de resultados   esperados   com   o   menor   custo   possível.   É   a   união   da   qualidade, celeridade   e   menor   custo   na   prestação   do   serviço   ou   no   trato   com   os   bens públicos.  Atribuir  a fiscalização dos atos administrativos praticados pelas Polícias Judiciárias  a órgão diverso,  além de promover desgastes na separação harmônica dos   poderes,   implicaria   em   menor   produtividade   por   tratar-se   o   pretenso fiscalizador   de   órgão   não   afeto   às   rotinas   e   padrões   do   órgão   fiscalizado. Ademais   ampliar   as   atribuições   de   um   órgão   já   assoberbado   de   atribuições   e afazeres,  cujo custeio e mão de obra requerem vultosos  investimentos do erário, para,   com   prejuízo   de   suas   funções   precípuas,   incumbir-se   de   fiscalização administrativa   das   Polícias   Judiciárias,   concorrente   às   Corregedorias   Internas   e também às Corregedorias Gerais Unificadas (no caso das Polícias Civis),  tratar-se-ia de verdadeira afronta aos princípios da eficiência e economicidade, vulnerando também   o   princípio   da   razoabilidade.   Pelo   exposto,   o   controle   externo   da atividade   policial   pelo   Ministério   Público   deve   restringir-se   aos   atos desempenhados   durante   a   investigação   criminal   em   sua   atividade   fim,   jamais 

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àqueles   praticados   em   sua   atividade  meio,   sob   pena   de   violação   da   separação harmônica   de   poderes   e   dos   princípios   da   eficiência,   economicidade   e razoabilidade.Referências:  -  CRFB,  art.  37,  70 e 129,  VII;   -  LC nº 75/1993, art.  3º; - Lei nº 8.625/1993 (LOMP), art. 10, IX e art. 26, IV.

ENUNCIADO Nº 14O MERO EXTRAVIO DE CHEQUE BANCÁRIO NÃO CONSTITUI INFRAÇÃO PENAL, ESTANDO EIVADO DE ILEGALIDADE O DISPOSTO NO ART. 5º, § 1º DA RESOLUÇÃO Nº 3.972/11 DO BACEN

Justificativa:  O extravio de cheque bancário,  per si  só,  é fato atípico e,  portanto, não   passível   de   apuração   por   parte   da   polícia   judiciária.   Desta   forma,   não   é cabível   registro   de   ocorrência   policial   de   extravio   de   cheque,   devendo   as comunicações   pertinentes   serem   feitas   à   instituição   bancária   e/ou   órgãos   de defesa   ao   crédito,   públicos   ou   privados,   constituídos   para   este   fim.   Padece, portanto,   do   vício   da   ilegalidade   a   exigência   de   apresentação   de   registro   de ocorrência   policial   por   parte   do   correntista   à   instituição   financeira   para   que possa   ser   solicitada   a   sustação  ou   revogação   de   cheque,   ferindo  o   comando  do art.  5º,  §  1º  da  Resolução  nº  3.972/11  do Banco  Central  do Brasil  o  princípio  da legalidade   estrita,   por   pretender   um   ato   normativo   administrativo   inovar   na ordem  jurídica.  Não  o  bastante,   tal   dispositivo   fere  o  pacto   federativo,   além de pretender   usurpar,   por   via   transversa,   o   comando   das   atividades   de   polícia judiciária dos Delegados das Polícias Federal e Civis ao propor a autarquia federal uma   regra   de   conduta,   não   prevista   em   lei,   sobre   uma   atividade   inerente   a órgãos de entes políticos autônomos.  Cabe, desta forma,  o correntista  que tenha negado   a   sua   solicitação   de   sustação   ou   revogação   cheque   extraviado   buscar junto   à   Justiça   Federal   o   seu   direito   líquido   e   certo   que   não   ter   sua   pretensão legítima obstaculizada por uma normativa  desprovida de amparo  jurídico através da   exigência   de   um  documento   ao   qual   não   pode   obter,   sem  prejuízo   da   busca judicial   de   indenização   e   compensação   por   eventuais   danos  materiais   e  morais pela   autarquia   e   pela   instituição   financeira   solidariamente. Referências:  - CRFB/1988,  art.  5º,   II;  art.  25 caput;  art.  32,  §  4º;  art.  144,  §§  1º  e  4º;   -      Lei  nº 12.830/13,  art.  2º,  §  1º;   -  Resolução 3.972 de 28 abril  de  2011 do Banco Central do Brasil.

ENUNCIADO Nº 15APÓS O DESCUMPRIMENTO INJUSTIFICADO A DOIS MANDADOS DE INTIMAÇÃO, PODERÁ O DELEGADO DE POLÍCIA DETERMINAR A CONDUÇÃO COERCITIVA DE PARTES À UNIDADE POLICIAL

Justificativa:  A   condução   coercitiva   é   regulamentada   no   Código   de   Processo Penal nos arts. 201, §1º; 218 e 260, a saber:

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Art. 201, CPP. [...]

§1º   Se,   intimado   para   esse   fim,   deixar   de   comparecer   sem   motivo   justo,   o 

ofendido   poderá   ser   conduzido   à   presença   da   autoridade.  (Incluído   pela   Lei   nº 

11.690, de 2008).

Art. 218,   CPP. Se,   regularmente   intimada, a   testemunha deixar   de   comparecer 

sem   motivo   justificado, o   juiz poderá   requisitar   à   autoridade   policial   a   sua 

apresentação   ou   determinar   seja   conduzida   por   oficial   de   justiça,   que   poderá 

solicitar o auxílio da força pública.

Art. 260,   CPP. Se o   acusado não   atender   à   intimação   para   o   interrogatório, 

reconhecimento  ou  qualquer  outro   ato  que,   sem ele,   não  possa   ser   realizado,  a 

autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença. 

Tendo  em vista  a   condução   coercitiva  não   constituir  modalidade  de  prisão,   esta foi   perfeitamente   recepcionada   pela   Constituição   da   República,   em   seu   art.   5º, LXI.  Outrossim,  mostra-se perfeitamente possível  a condução coercitiva realizada durante  o   Inquérito  Policial,   tendo em vista  que a  palavra  “autoridade”  utilizada pelo   Código   de   Processo   Penal   não   se   restringe   à   autoridade   judiciária.  Muito pelo   contrário,   quando   o   legislador   assim   desejou,   restringiu   expressamente. Neste  mesmo   sentido,   a   Resolução   SEPC   nº   605,   de   27   de   julho   de   1993,   que aprovou   o   Manual   de   Procedimentos   de   Polícia   Judiciária,   expressamente autoriza   ao   Delegado   de   Polícia   a   utilização   do   instrumento   da   condução coercitiva.   Cria,   contudo,   a   necessidade   de   que   a   parte   seja   regularmente intimada por duas vezes, não apresentando justificativa para sua ausência.

Art.  36 -  Se regularmente intimada por duas vezes a testemunha não comparecer 

nem   apresentar   justificativa,   a   autoridade  mandará   conduzi-la   a   sua   presença, 

mediante mandado de condução coercitiva.

Cite-se, nesta linha, jurisprudência do STF:

Ementa:   HABEAS   CORPUS.   CONSTITUCIONAL   E   PROCESSUAL   PENAL.   CONDUÇÃO 

DO   INVESTIGADO   À   AUTORIDADE   POLICIAL   PARA   ESCLARECIMENTOS. 

POSSIBILIDADE.   INTELIGÊNCIA  DO  ART.   144,   §   4º,   DA   CONSTITUIÇÃO   FEDERAL   E 

DO ART. 6º DO CPP. DESNECESSIDADE DE MANDADO DE PRISÃO OU DE ESTADO DE 

FLAGRÂNCIA.   DESNECESSIDADE   DE   INVOCAÇÃO   DA   TEORIA   OU   DOUTRINA   DOS 

PODERES   IMPLÍCITOS.   PRISÃO   CAUTELAR   DECRETADA   POR   DECISÃO   JUDICIAL, 

APÓS   A   CONFISSÃO   INFORMAL   E   O   INTERROGATÓRIO   DO   INDICIADO. 

LEGITIMIDADE.   OBSERVÂNCIA   DA   CLÁUSULA   CONSTITUCIONAL   DA   RESERVA   DE 

JURISDIÇÃO.   USO   DE   ALGEMAS   DEVIDAMENTE   JUSTIFICADO.   CONDENAÇÃO 

BASEADA   EM   PROVAS   IDÔNEAS   E   SUFICIENTES.   NULIDADE   PROCESSUAIS   NÃO 

VERIFICADAS.   LEGITIMIDADE   DOS   FUNDAMENTOS   DA   PRISÃO   PREVENTIVA. 

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GARANTIA   DA   ORDEM   PÚBLICA   E   CONVENIÊNCIA   DA   INSTRUÇÃO   CRIMINAL. 

ORDEM DENEGADA. I  –  A própria  Constituição Federal  assegura,  em seu art.  144, 

§  4º,   às  polícias   civis,   dirigidas  por  delegados  de  polícia  de   carreira,   as   funções 

de polícia   judiciária  e a apuração de  infrações  penais.   II  –  O art.  6º do Código de 

Processo  Penal,  por   sua  vez,  estabelece  as  providências  que  devem ser   tomadas 

pela  autoridade  policial   quando   tiver   conhecimento  da  ocorrência  de  um delito, 

todas  dispostas  nos   incisos   II  a  VI.   III  –  Legitimidade  dos  agentes  policiais,   sob o 

comando da autoridade policial  competente (art. 4º do CPP), para tomar todas as 

providências necessárias à elucidação de um delito, incluindo-se aí a condução de 

pessoas   para   prestar   esclarecimentos,   resguardadas   as   garantias   legais   e 

constitucionais   dos   conduzidos.   IV   –   Desnecessidade   de   invocação   da   chamada 

teoria  ou  doutrina  dos  poderes   implícitos,   construída  pela  Suprema Corte  norte-

americana   e   incorporada   ao   nosso   ordenamento   jurídico,   uma   vez   que   há 

previsão   expressa,   na   Constituição   e   no   Código   de   Processo   Penal,   que   dá 

poderes   à   polícia   civil   para   investigar   a   prática   de   eventuais   infrações   penais, 

bem   como   para   exercer   as   funções   de   polícia   judiciária.  V   –   A   custódia   do 

paciente   ocorreu   por   decisão   judicial   fundamentada,   depois   de   ele   confessar   o 

crime e de ser interrogado pela autoridade policial,  não havendo, assim, qualquer 

ofensa à clausula constitucional  da reserva de jurisdição que deve estar presente 

nas hipóteses dos  incisos LXI  e LXII  do art.  5º da Constituição Federal.  VI  – O uso 

de   algemas   foi   devidamente   justificado   pelas   circunstâncias   que   envolveram   o 

caso,  diante  da  possibilidade  de  o  paciente  atentar   contra  a  própria   integridade 

física  ou de terceiros.  VII  –  Não restou constatada  a  confissão  mediante   tortura, 

nem   a   violação   do   art.   5º,   LXII   e   LXIII,   da   Carta   Magna,   nem   tampouco   as 

formalidade   previstas   no   art.   6º,   V,   do   Código   de   Processo   Penal.   VIII   – 

Inexistência de cerceamento de defesa decorrente do indeferimento da oitiva das 

testemunhas  arroladas  pelo  paciente e  do pedido de diligências,  aliás  requeridas 

a destempo, haja vista a inércia da defesa e a consequente preclusão dos pleitos. 

IX  –  A   jurisprudência  desta  Corte,   ademais,   firmou-se  no   sentido  de  que  não  há 

falar   em   cerceamento   ao   direito   de   defesa   quando   o   magistrado,   de   forma 

fundamentada,   lastreado   nos   elementos   de   convicção   existentes   nos   autos, 

indefere  pedido de diligência  probatória  que repute   impertinente,  desnecessária 

ou   protelatória,   sendo   certo   que   a   defesa   do   paciente   não   se   desincumbiu   de 

indicar,   oportunamente,   quais   os   elementos   de   provas   pretendia   produzir   para 

levar   à   absolvição   do   paciente.   X   –   É   desprovido   de   fundamento   jurídico   o 

argumento de que houve inversão na ordem de apresentação das alegação finais, 

haja   vista   que,   diante   da   juntada   de   outros   documentos   pela   defesa   nas 

alegações,   a   magistrada   processante   determinou   nova   vista   dos   autos   ao 

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Ministério Público e ao assistente de acusação, não havendo, nesse ato, qualquer 

irregularidade   processual.   Pelo   contrário,   o   que   se   deu   na   espécie   foi   a   estrita 

observância   aos   princípios   do   devido   processo   legal   e   do   contraditório.   XI   –   A 

prisão cautelar  se  mostra  suficientemente  motivada para a garantia  da  instrução 

criminal   e   preservação   da   ordem   pública,   ante   a   periculosidade   do   paciente, 

verificada  pela  gravidade   in   concreto  do   crime,  bem como pelo  modus  operandi 

mediante o qual   foi  praticado o delito.  Ademais,  o paciente evadiu-se  do distrito 

da   culpa   após   a   condenação.   XII   –   Ordem   denegada.”   (HC   107644,   Relator(a):  

  Min.   RICARDO   LEWANDOWSKI,   Primeira   Turma,   julgado   em   06/09/2011, 

PROCESSO ELETRÔNICO DJe-200 DIVULG 17-10-2011 PUBLIC 18-10-2011).

Referências:  -                             CRFB/1988,   art.   5º,   LXI;   -                             Código   de   Processo Penal,   artigos   201,   §1º;   218   e   260;   -                             Resolução   SEPC  nº   605,   de   27   de julho de 1993, art. 36; -                           STF, HC 107644.

ENUNCIADO Nº 16O DELEGADO DE POLÍCIA, EM SUA MOTIVADA AVALIAÇÃO JURÍDICA QUANTO À TIPIFICAÇÃO E AO ESTADO FLAGRANCIAL, CONHECERÁ DE CAUSAS DE AUMENTO OU DIMINUIÇÃO DE PENA EM ABSTRATO, BEM COMO DE PLURALIDADE DELITIVA

Justificativa:  A   figura   do   Delegado   de   Polícia,   com   o   advento   da   Constituição Republicana de 1988, ganha novos contornos,  na medida em que deverá atuar na persecução   penal   como   primeiro   garantidor   dos   direitos   fundamentais.   Nesta linha,   o   Delegado   de   Polícia   deve   realizar   juízo   de   valor   jurídico   sobre   o   fato criminoso,   realizando   sua   tipificação   penal.   Para   tal   desiderato,   o   Delegado possui   plena   autonomia   regrada   para   conhecer   de   causas   de   aumento   ou diminuição   de   pena,   tanto   previstas   na   parte   geral,   quanto   especial   do   Código Penal.   O   mesmo   se   diga   quanto   à   análise   de   eventuais   aumentos   de   penas decorrentes   do   concurso  material   de   crimes,   do   concurso   formal   ou  mesmo   da continuidade   delitiva.   Tal   juízo   de   valor   encontra-se   ínsito   na   própria   natureza das   atribuições   do   cargo   de   Delegado   de   Polícia,   inerente   à   Presidência   da Investigação Policial.

ENUNCIADO Nº 17NÃO SERÁ LAVRADO REGISTRO DE OCORRÊNCIA QUANDO TRATAR-SE DE CRIME DE AÇÃO PENAL PRIVADA OU PÚBLICA CONDICIONADA E A VÍTIMA OU QUEM TENHA QUALIDADE PARA REPRESENTÁ-LA MANIFESTAR A FALTA DE INTERESSE NO PROSSEGUIMENTO DO FEITO, EM FACE DA AUSÊNCIA DE CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE

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Os   registros   de  ocorrência  de  polícia   judiciária   têm  como  objetivo   a   notificação formal e padrão de uma notitia criminis ou de fato administrativo de repercussão jurídica   interna   na   Polícia   Civil   ao   Delegado   de   Polícia,   com   vistas   a   controle estatístico-cadastral   e   também a   subsidiar   o   início   de   uma   apuração,   ainda   que posterior.  Daí,   registro  de   fatos  que  não   serão  objetos  de   investigação  por   falta de   condição   de   procedibilidade   ferem   a   própria ratio   essendi do   registro   de ocorrência   policial,   além   de   constituir   usurpação   das   funções   das   serventias extrajudiciais,   tabelares  e registrais.  Crimes de ação penal  privada ou ação penal pública   condicionada   à   representação   têm   como   condição   de   procedibilidade para   o   início   da   investigação   a   manifestação   da   vítima   ou   seu   representante legal,   conforme   art.   5º,   §   4º,   do   CPP.  Desta   forma,   registros   de   ocorrências   de crimes de ação privada ou pública condicionada somente serão objeto de registro sem a representação da vítima ou seu representante legal, caso estes não tenham como manifestar   sua  vontade  naquele  exato  momento  da  notícia.  Tais   registros, entretanto,   serão   feitos   e   sobrestadas   as   atividades   investigativas   até   que   haja manifestação   do   legitimado   para   requerer   o   seu   prosseguimento,   observado   o prazo   decadencial   de   6   (seis)   meses.   Havendo  manifestação   expressa   negativa quanto   ao   oferecimento   da   representação,   todavia,   nem  mesmo   o   registro   de ocorrência   será   lavrado,   recomendando-se   a   coleta   por   escrito   de   termo   de desinteresse   o   qual   terá   breve   descrição   dos   fatos,   para   seu   arquivamento   em livro   próprio   na   unidade   policial.   Para   as   delegacias   inseridas   no   programa Delegacia   Legal,   recomenda-se   a   criação   de   peça   própria   de   termo   de desinteresse   no   SCO,   dentro   dos   procedimentos   administrativos.Referências:  - Código de Processo Penal, art. 5º, § 4º; art. 38.

ENUNCIADO Nº 18A REQUISIÇÃO DE EXAME PERICIAL EM DISPOSITIVOS DE ARMAZENAMENTO DE MÍDIA DIGITAL PELO DELEGADO DE POLÍCIA PRESCINDE DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL, CONTANTO QUE A SUA APREENSÃO TENHA SIDO FEITA DENTRO DOS DITAMES LEGAIS

Justificativa:  O   exame   pericial   em   dados   constantes   em   dispositivos   de armazenamento digital  em nada se confunde com o  instituto da interceptação de dados, esta sim, sujeita a sigilo constitucional que somente pode ser afastado por ordem   judicial,   e   conforme   a   regulamentação   prevista   na   lei.   Ao   passo  que   nos dispositivos   de   mídias   digitais,   os   dados   encontram-se   estáticos,   alocados   de maneira   perene   em   determinado   ambiente,   a   interceptação   pressupõe   uma comunicação  de  dados  e  um acesso   indevido  a  estes  por   terceiros  enquanto  em trânsito,   violando   sua   confidencialidade,   integridade   ou   disponibilidade.   Assim sendo,   a   comunicação   de   dados   tem   a   sua   proteção   constitucional   prevista   no art.  5º,  inc.  XII  da CRFB, o qual condiciona seu afastamento à autorização judicial na   forma  da   lei.   Os   dados,   uma   vez   armazenados,   estão   sujeitos   a   proteção   do inciso   X   do   mesmo   artigo,   podendo   ter   seu   sigilo   afastado   pelo   Delegado   de Polícia  conforme disposto em legislação ordinária.  Neste sentido  já decidiu o STF 

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reiteradamente,   sendo  uma  das  mais   recentes   no   julgamento  do  HC   91.867/PA, cujo trecho do voto do Ministro-Relator Gilmar Mendes passamos a transcrever:

“2.   Ilicitude   da   prova   produzida   durante   o   inquérito   policial   -   violação   de 

registros   telefônicos   de   corréu,   executor   do   crime,   semautorização   judicial.   2.1 

Suposta ilegalidade decorrente do fato de os policiais,  após a prisão em flagrante 

do   corréu,   terem   realizado   a   análise   dos   últimos   registros   telefônicos   dos   dois 

aparelhos   celulares   apreendidos.   Não   ocorrência.   2.2não   se   confundem 

comunicação telefônica  e   registros   telefônicos,  que recebem,   inclusive,  proteção 

jurídica distinta.

Não   se   pode   interpretar   a   cláusula   do   artigo   5º,   XII,   da   CF,   no   sentido   de 

proteção   aos   dados   enquanto   registro,   depósito   registral.   A   proteção 

constitucional   é   da   comunicação   de   dados   e   não   dos   dados.2.3   Art.   6º   do 

CPP:dever da autoridade policial  de proceder à coleta do material  comprobatório 

da   prática   da   infração   penal.   Ao   proceder   à   pesquisa   na   agenda   eletrônica   dos 

aparelhos   devidamente   apreendidos,   meio   material   indireto   de   prova,   a 

autoridade   policial,   cumprindo   o   seu   mister,   buscou,   unicamente,   colher 

elementos   de   informação   hábeis   a   esclarecer   a   autoria   e   a   materialidade   do 

delito (dessa análise  logrou encontrar   ligações entre o executor do homicídio e o 

ora paciente). Verificação que permitiu a orientação inicial da linha investigatória 

a ser adotada, bem como possibilitou concluir que os aparelhos seriam relevantes 

para a investigação.”

Decisão:  A   Turma,   por   votação   unânime,   indeferiu   o   pedido   de   habeas   corpus   , 

nos   termos   do   voto   do   Relator.   Ausente,   justificadamente,   o   Senhor   Ministro 

Joaquim Barbosa. 2ª Turma, 24.04.2012.

Sob a perspectiva dos peritos criminais que forem destinatários de   requisição de perícias   de   dispositivos   de   mídias   pelo   delegado   de   polícia,   não   cabe   a   estes tecer   qualquer   análise   sobre   a   licitude   da   prova   colhida   e   da   requisição.   Em primeiro   lugar,   por   não   exercerem   cargo   de   formação   jurídica,   lhes   faltando aptidão técnica para avaliações jurídicas das ordens que lhe forem emanadas;  em segundo   lugar,   por   desconhecerem   o   todo   das   investigações,   sempre compartimentadas,  somente sabendo do contexto em que se deu a apreensão na medida  em que  este   for  necessário  para   a   execução  de   seu  munus;   em  terceiro lugar,  por  se tratarem de requisições,  e não mera solicitações,    tendo portanto a natureza   de   comando   imperativo   do   qual   não   pode   o   perito   se   escusar   de cumprir,   sob   pena   de   estar   cometendo   infração   disciplinar   ou   até   mesmo, eventual   crime  de  prevaricação.Referências:  –  CRFB,  art.  5º,   incisos  X  e  XII,   art. 144,   inc   IV,   §  4;  –  ei  9.296/96;  –  lei  12.830/13,  Art.  2º,   inc   II;  –  CPP,  art.  6º,   inc VII;

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ENUNCIADO Nº 19OS DADOS CADASTRAIS DE CLIENTES DE INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, OPERADORAS DE TELEFONIA FIXA E MÓVEL, DENTRE OUTRAS, NÃO TÊM SEU SIGILO CONDICIONADO À RESERVA DE JURISDIÇÃO, PODENDO SER REQUISITADOS DIRETAMENTE PELO DELEGADO DE POLÍCIA, QUE DEVERÁ ESTABELECER PRAZO RAZOÁVEL PARA A SUA RESPOSTA, CUJO DESCUMPRIMENTO ENSEJARÁ A OCORRÊNCIA DO CRIME PREVISTO NO ART. 21 DA LEI Nº 12.850/13, OU SUBSIDIARIAMENTE, O DO ART. 330 DO CÓDIGO PENAL

Justificativa:O   referido   enunciado   tem   por   escopo   disciplinar   o   poder   geral   de requisição   do   Delegado   de   Polícia,   já   consolidado   expressamente   nas   Leis 12.830/13 e 12.850/13,  para a  instrução da  investigação criminal.  Nesse sentido, para   fins   de   resolução   de   conflitos   entre   a   privacidade   e   o   dever   do   Estado   de aplicar  as  leis  penais,  os dados cadastrais  das pessoas não estão albergados pelo o  manto   constitucional.   A   Carta   da   República   salvaguardou   a   inviolabilidade   da intimidade nesses termos:

Art.5o,   XII “é   inviolável   o   sigilo   da   correspondência   e   das   comunicações 

telegráficas,  de dados e das comunicações  telefônicas,  salvo,  no último caso,  por 

ordem   judicial,   nas   hipóteses   e   na   forma   que   a   lei   estabelecer   para   fins   de 

investigação criminal ou instrução processual penal”.

Nesse   prisma,   conforme   se   denota   no   comando   constitucional,   a   extensão   da proteção   ao   direito   da   intimidade   diz   respeito   somente   e   tão   somente   ao processo   de   comunicação   entre   os   indivíduos,   que,   nesse   caso   admite   ser excepcionado por  ordem  judicial,  como  já  se  posicionou a   jurisprudência  do STF: “Da minha leitura,  no inciso XII  da Lei  Fundamental,  o que se protege,  e de modo absoluto,  até  em relação  ao Poder   Judiciário,  é  a  comunicação   ‘de  dados’,  e  não os   ‘dados’,  o  que tornaria   impossível  qualquer   investigação administrativa,   fosse qual fosse.” (MS 21.729 ,  voto do Rel.  Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 5-10-1995,   Plenário, DJ de   19-10-   2001).   Assim,   no   que   diz   respeito   aos   dados cadastrais,   responsáveis  pela  a   simples   identificação  do   sujeito,  para  o quantum statis da   persecução   penal,   não   se   é   exigível   ordem   judicial.    Nessa   toada,   vale destacar,  que  uma das  características  mais  marcantes  dos  direitos   fundamentais repousa   justamente   na   sua   relatividade,   isto   é,   no   fato   deles   não   serem absolutos.   Já   se   tornou   pacífico   que   os   direitos   fundamentais   podem   sofrer limitações,  quando  enfrentem outros  valores  de  ordem constitucional,  in   casu, a segurança   pública.   A   própria   Constituição   assegurou,   em   seu   art.   144,   §   4º,   às polícias  civis,  dirigidas  por  delegados  de carreira,  as   funções  de polícia   judiciária e a apuração de infrações penais.  O art.  6º,  II  a VI,  do CPP, c/c   o art.2o,  § 2o, da Lei 12.830/13 c/c os arts. 15 e 21 da Lei 12.850/13, estabeleceu as providências a serem   tomadas   pelos   Delegados   de   Polícia   quando   tiverem   o   conhecimento   da ocorrência   de   um   delito.   Assim,   é   de   clareza   hialina   que   a  mens   legis do ordenamento   jurídico   foi   no   sentido   de   consagrar   autonomia   às   Polícias   Civis   e Federal,   através  dos  meios  normativo-jurídicos   indispensáveis   para   a   elucidação 

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das   práticas   criminosas   no   corpo   social.   Concluindo,   o   poder   de   requisição   do Delegado   de   Polícia   deve   ser   recebido   como   uma   ordem   direta   dirigida   às instituições   financeiras,   operadoras   de   telefonia   fixa   e   móvel,   impondo   um verdadeiro status de subordinação desses  frente  ao poder  público,  no seu mister de  buscar  a   verdade  dos   fatos  no   inquérito  policial.  Referências:  -  CRFB/88,  Art. 144, §4º; - CPP, Art. 6º, II a VI; - Lei nº 12.830/13, art. 2º, §2º; - Lei nº 12.850/13, art. 15 e 21.