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Alma Lusa Círculo do Graal ERAM VERDES OS cAMpOS… Deus não é fruto da filosofia do homem, mas o homem é fruto da Vontade de Deus! Eram verdes os campos… luminoso o ambiente! Círculo do Graal [email protected] Portugal

Eram verdes os campos (rev III)

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O caminho do homem nas planícies da materialidade para desenvolvimento da sua espiritualidade e regresso à Pátria.

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Deus não é fruto da filosofia do homem, mas o

homem é fruto da Vontade de Deus!

Eram verdes os campos… luminoso o ambiente!

Círculo do Graal [email protected]

Portugal

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Eram verdes os campos…

Alma Lusa

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INDICE

Introdução …………………………………………………. Pág. 05

01 - A Palavra …………………………………………… Pág. 08

02 - A Ilha ………………………………………………… Pág. 12

03 - Dualidade da Vida ………………………………. Pág. 16

04 - Justiça e Sofrimento ……………………………. Pág. 21

05 - Misericórdia ……………………………………….. Pág. 29

06 - O Ribeiro ……………………………………………. Pág. 33

Epílogo ……………………………………………………….. Pág. 36

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A PALAVRA!

No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus, e o

Verbo era Deus.

Ele estava no princípio com Deus.

Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele, nada do

que foi feito se fez.

Nele estava a Vida, e a Vida era a Luz dos homens;

E a Luz resplandeceu nas trevas, e as trevas não a

compreenderam.

João, 1-1;5

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Eram Verdes os campos

INTRODUÇÃO

Perfeito é Deus, o Senhor! Perfeita a Sua Vontade, que está n’Ele e d’Ele emana para gerar e conservar a obra da Criação. Perfeitas são portanto também as Leis que em Sua Vontade perpassam a Criação. Abdruschin “Na Luz da Verdade – Mensagem do Graal “

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No místico mar da sabedoria ergue-se a terra prometida em

fragrâncias de luz e rios cristalinos de água viva.

Longos são os ramos de frondosas árvores anciãs que através dos

tempos muito viram e muito sabem.

Longos são os raios de luz que iluminam almas peregrinas de branco

vestidas, olhos incandescentes de sabedoria vetusta, transbordando

de harmonia e equilíbrio.

Altas montanhas ao longe deixam passar os sussurros do vento que

ondulando em espirais lançam a brancura da neve eterna para o

infinito azul num quadro de magia e pureza.

O verde dos campos orla rios de água viva correndo para o

manancial da vida, alimentando esses seres que de olhar alegre e

agradecido contemplam, lá no alto, essa cruz de vida em raios de luz

branca derramando bênçãos, alimentando e renovando a vida.

Sons alegres e musicais em harmonia elevam-se para o alto em

agradecimento.

Louvado seja o Senhor, Criador de todas as coisas...

Eram verdes os campos que ladeavam o caminho empoeirado à hora

do meio-dia.

Dois homens caminhavam em passo certo, rosto sereno e olhar sagaz

de tempos imemoriais.

- Este caminho de terra dura e poeira macia é como o

ensinamento do Alto, por baixo uma capa dura e simples

para que quem procura, adquira a experiência do

ensinamento e a viva, por cima a maciez da capa

protectora de quem ensina para que ninguém, que se

esforce, se desvie para caminhos cómodos que levam à

estagnação.

O silêncio do campo só era cortado pelo movimento dos ventos que

em dança simples se esgueiravam por entre as folhas das árvores e

pelo trinar das aves que com movimentos rápidos tentavam

acompanhar os entes do vento com cantos redobrados.

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Os olhos claros dos viajantes fulguravam de alegria ao contemplar o

espetáculo que a natureza lhes ofertava.

- Como é possível que diante de tal obra, plena de beleza e

equilíbrio, a humanidade escolha o caminho cómodo da

estagnação e não aceite o que lhe é ofertado com tanta

singeleza.

De semblante baixo, a tristeza por um momento dominou o segundo

viajante que retorquiu:

- Infelizmente, o homem prefere aceitar sem analisar o que

lhe é ofertado e colocar-se numa situação de dependência

espiritual e comodidade, atirando para terceiros a

responsabilidade do que aceita.

Engano fatal para tal homem, ele é responsável por tudo o

que aceita, certo ou errado; as leis que regem os universos

aplicam-se, inexoravelmente, e em tempo certo colhem o

seu tributo.

Só por um momento a tristeza dominou os viajantes, logo a alegria e

a luz que os rodeava prevaleceu sobre tais almas plenas de amor e

felicidade pela obra do Altíssimo.

Eram verdes os campos que ladeavam o caminho empoeirado à hora

do meio-dia.

Os entes dos ventos deslizavam velozes no arvoredo rodeando as

fadinhas que assomavam por entre o colorido de flores silvestres

esvoaçando com suas asas cristalinas e semblante singelo, tranquilos

e de olhar vivo, gnomos e elfos, contemplavam com carinho os

viajantes que placidamente se tinham recostado debaixo dos ramos

frondosos de uma árvore anciã.

Em frente, não muito longe, também um grupo de animais ditos

ferozes, descansavam do calor do meio-dia, contemplando os

homens que perto deles os miravam também. Harmonia e confiança

deslocavam-se no etéreo!

E a natureza seguia o seu curso indiferente às filosofias dos homens,

mas atenta às suas ações.

Eram verdes os campos… luminoso o ambiente!

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I

A Palavra

Rogo-vos, porém, irmãos, pelo nome de nosso Senhor

Jesus Cristo, que digais todos uma mesma coisa, e que

não haja entre vós dissensões; antes, sejais unidos, num

mesmo sentido, e num mesmo parecer.

S. Paulo

“Primeira epístola aos Coríntios – 1;10”

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Caía mansamente a neblina sob o sol da manhã, refrescando cada

folha, cada flor; gotas de orvalho contendo o mundo, humedeciam o

solo pleno de vida e vigor latente.

Aos poucos os ruídos noturnos emudeciam e os seus habitantes

retiravam-se para o calor e segurança de suas tocas.

As aves chilreavam numa algazarra sinfónica conduzidas pela batuta

de maestro anónimo.

No chão o restolho era revolvido e o vento espalhava-o num manto

de cor e forma.

Ao longe, na planície, os animais movimentavam-se em manadas

seguras, procurando a melhor erva verde e tenra que pela manhã

estava fresca.

Por entre colinas e montes vestidas de verde, os filhos de Zéfiro

brincavam numa correria ondulante, fazendo estremecer as fadinhas

das flores que olhavam para eles com ar reprovador. Sorriam os elfos

que a tudo observavam com olhar brilhante. Cintilava de vida e

movimento a natureza.

Ao redor de uma fogueira, um grupo de homens, arrumava os seus

pertences para se porem ao caminho em mais um dia de jornada.

Lentamente reuniram-se para a oração de graças da manhã. O seu

olhar era límpido e os seus pensamentos em reverência adoraram o

Senhor dos Mundos.

Senhor, a Ti pertenço,

Que a minha vida seja uma prece de gratidão constante a

Ti,

Aceita pela Tua bondade o meu agradecimento

E dá-me por este dia o auxílio de Tua força.

Ámen

Serenidade envolvia o grupo. Dirigiam-se para a costa e até já

podiam ouvir o bramir do oceano à distância. O seu destino era a

ilha Branca e esperavam receber de Neptuno o seu favor e escolta de

ondinas para a travessia.

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Um grupo de centauros acompanhava-os a distância curta, como que

a montar guarda, precioso era o grupo de homens vestidos de branco

e de olhar secular. Iam prestar auxílio a uma comunidade que se

encontrava em dissensão por causa do modo como a Palavra

Sagrada haveria de ser transmitida, e esta postura estava a dividi-los

e a criar sombras escuras que os atormentava e alimentava ainda

mais a divisão. O querer saber melhor e a falta de clareza espiritual

estava a ofuscá-los. Após, tomariam a jornada marítima para o seu

destino, a ilha Branca. A chegada ao pequeno burgo foi saudada

efusivamente; depois de um curto descanso dirigiram-se para a sala

das devoções.

Reunida a assembleia e após curta oração de pedido de auxílio, o

ancião do grupo falou:

- Caríssimos, a Palavra do Senhor segue por muitos

caminhos, porque muitos são os caminhos do homem. É

dever que adoremos o Altíssimo sem quaisquer dogmas ou

pretensas sabedorias e interpretações, se o fizerdes de

espírito aberto, certamente a Sua força vos trará auxílio, a

Sua luz iluminará o caminho e o Seu Amor será bálsamo

espiritual. Nem todos os homens estão preparados, pela

sua formação, a receber a Palavra da mesma forma, então

divulguem-na conforme o grau de evolução do ouvinte.

Façam-no como servos do Senhor, simples e devotos e não

como aqueles que repetem o que aprenderam com o

cérebro e não ouvem a voz interior, a voz do espírito.

Sede tolerantes, mas firmes na defesa da Palavra, lembrai-

vos que a Verdade só a Deus pertence.

Tudo o que o ser humano conhece e divulga está sujeito ao

espaço e ao tempo, à mutação dos conceitos, e à evolução

do conhecimento que ele domina no momento e que

moldam esses mesmos conceitos. O nosso saber é

imperfeito e só nas nossas peregrinações através da Vida

ele se aperfeiçoará, por isso, tolerância e humildade são

aliados da firmeza.

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Venerai o Altíssimo, porque a Palavra é una com Ele; no

princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o

Verbo era Deus. Procurem a Verdade em espírito e o vosso

intelecto compreenderá.

Dividir a Palavra é enfraquece-la, não o façam… não o

façam!

Em silêncio o ancião dirigiu-se para o seu assento e, visivelmente

abatido, recostou-se. Na sala nem um movimento se fazia sentir, os

semblantes denotavam o efeito das palavras. No ar as formas de

pensamento eram confusas, crispadas, mas também de aceitação… e

tudo isto o ancião sentia. A assembleia foi fechada pelo sacerdote da

comunidade que com voz pesarosa disse:

- Cometemos o pecado da estultícia, não estivemos alerta e

pretendemos saber melhor que o nosso próximo, com isso,

olhamos para nós e esquecemo-nos de pedir auxílio aos

guias, fomos vaidosos ao querer dominar o saber que o

nosso intelecto nos proporcionava e surdos aos avisos da

nossa voz interior, com boa intenção é verdade, mas com

orgulho e intolerância atuamos, agora vede o resultado,

divisão, antagonismos …

Após a oração de agradecimento, o grupo dirigiu-se para o porto

onde um barco de velas vermelhas os esperava, o vento soprava de

feição prometendo uma viagem calma.

Lentamente se afastou do porto seguro a embarcação, desfraldando

as velas ao sopro de Éolo; o ancião na ponte olhava para as pessoas

que no cais acenavam em despedida e a tristeza tomou conta do seu

espírito. Quantos daqueles se iriam perder na voragem da

intolerância e mesmo na melhor boa vontade para difundir a

Palavra, fá-lo-iam deteriorando o Amor e alimentando a arrogância.

O seu olhar ergueu-se aos céus sem nuvens e um rosto feminino

sorriu animando-lhe o espírito, Gaia, a Senhora da Terra, assim o

alentava.

Pouco a pouco a nave se fundiu no horizonte…

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II

A Ilha

Tão brandamente os ventos os levavam

Como quem o Céu tinha por amigo;

Sereno o ar e os tempos se mostravam,

Sem nuvens, sem receio de perigo.

Camões

“Os Lusíadas – Canto 1 - 43”

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No horizonte o céu fundia-se com o mar numa simbiose de

plenitude, só separados pelos tons de azul. Navegavam há três dias e

as horas, Éolo e a sua comitiva tinham-se retirado, passavam

devagar numa calmaria constrangedora.

Um vulto branco, à proa do navio, mirava o horizonte, olhar fixo, o

seu pensamento vogava para a ilha que já não distava muita

distância. As casas brancas sobressaíam do verde da vegetação

luxuriante, o ancoradouro estava protegido por uma muralha de

pedras, que só Titãs poderiam ter construído, tal o tamanho e peso.

Na costa oriental as escarpas eram altas e a pique, um Templo

erguia-se nesta continuidade inserido numa gruta, uma alta torre

branca completava um conjunto de casas amplas formando um

complexo habitacional e de devoção, perfeitamente inserido na

arquitetura da paisagem.

Virou-se devagar para os nautas e disse-lhes:

- Zéfiro regressa, aprontai os vossos afazeres que uma

brisa vai soprar daqui a pouco.

A calma foi substituída por uma azáfama de cabos e velas, ordens e

gritos de instruções, semblantes animados e prontos para a

continuidade da viagem, que até ali tinha recebido o favor dos

deuses. As velas enfunaram e o ranger do cordame e da madeira deu

início ao balançar característico do movimento do navio a avançar,

cortando a água que se tornava ondulante.

Entardecia quando o navio aportou no ancoradouro, cuja baía estava

plena de vida.

A comitiva que esperava o grupo era constituída por vários homens e

mulheres, todos vestidos de branco, embora em silêncio, os seus

rostos mostravam a alegria do momento e a espontaneidade do bem-

estar; eram os sacerdotes do Templo, que no alto da Ilha marcava a

diferença na paisagem. A luz difusa do entardecer era cortada por

archotes cujas chamas trémulas lambiam o ar morno, transmitindo

um aspeto etéreo ao ambiente. Do grupo adiantou-se um homem

jovem, cujos olhos cintilavam com a luz de tempos idos:

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- Bem-vindo a casa, é com alegria que te recebemos de

volta, nobre sacerdote. Sentimos a tua falta e de teus

preciosos ensinamentos, estamos ansiosos para ouvir de

tuas viagens.

O ancião, visivelmente feliz, adiantou-se e de mãos estendidas

segurou as mãos do seu interlocutor, pupilo desde a infância:

- Estou grato por tuas palavras, certamente contarei de

minhas viagens, agora é hora de recolher. Estou muito

feliz por estar de volta ao vosso meio que para mim é fonte

de alegria e de bem-estar.

Com visível satisfação e como se de crianças se tratassem, o grupo

seguiu o ancião no caminho de volta, que por entre veredas e árvores

anciãs emolduravam a escada de pedra com degraus lisos e rebordo

arredondado, fruto do uso milenar. Os barulhos noturnos

começavam a substituir o canto alegre das aves que em profusão

esvoaçavam no céu azul, num bailado coreografado pelos filhos de

Zéfiro. Nas tocas aninhavam-se os animais diurnos para descanso e

segurança, porque a noite perigos inesperados escondia. A natureza

seguia o seu curso que desde milénios fora estabelecido, no princípio

dos tempos.

Seguia o caminho para o alto da Ilha, em direcção ao Templo, onde a

luz dos archotes o iluminava, circundando o complexo num halo de

luz visível muito longe no mar e conduzindo almas em perigo para

um porto de abrigo seguro.

A noite cobriu a Ilha Branca de manto escuro. O silêncio, aqui e

acolá, era cortado pelo pio noturno da coruja, sempre atenta ao mais

pequeno movimento no solo, quando os pequenos roedores corriam

em procura de alimento no restolho. No seu quarto, virado ao mar, o

sumo-sacerdote usufruía da paisagem noturna e ouvia o barulho

cadenciado das ondas a desfazerem-se em novelos de espuma branca

contra as rochas da falésia, ao longe, pequenas luzes, denunciavam a

presença de veleiros em suas viagens de comércio.

O sumo-sacerdote pensava nos acontecimentos dos últimos dias em

relação à Palavra Sagrada e o desvio sub-reptício que os

ensinamentos estavam a tomar. Sombras de preocupação toldavam-

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lhe o espírito. As várias interpretações obsessivas de alguns crentes

estavam a tomar caminhos sinuosos de onde seria difícil voltar sem

sofrimento. Estas atitudes levaram muitos a afastarem-se da

Palavra, confusos e amedrontados, e a procurarem apoio onde

fossem bem recebidos e satisfeitas as suas necessidades. A

intolerância e o oportunismo lentamente encharcavam as almas dos

devotos.

As mãos postas em devoção, olhar cerrado, espírito aberto, o sumo-

sacerdote louvou o Altíssimo:

- Senhor, Teu servo eu sou, conduz o meu espírito em Tua

Luz, no cumprimento de Tua Vontade, para que o caminho

que eu trilhe me conduza à Pátria, aos Jardins Eternos!

Em repouso adormeceu o corpo, mas o espírito procurou os Centros

de iluminação e Conhecimento.

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III

Dualidade da vida!

Existe apenas um Criador, um Deus, e portanto também

apenas uma única força que perflui tudo que existe e o faz

viver e progredir!

Essa força Divina, pura e criadora, flui constantemente

através de toda a Criação, reside nela e é inseparável da

mesma.

Abdruschin

“Na Luz da Verdade – Mensagem do Graal”

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Amanhecia, o sol espreitava no horizonte e devagar subia no etéreo,

resplandecendo sobre o manto de água que circundava a Ilha, qual

pedra preciosa engastada em jóia dourada.

Cedo levantava-se o sumo-sacerdote e, ritmicamente, fazia o seu

passeio matinal. Descia até ao povoado, casas brancas engastadas na

natureza, misto de cor e harmonia arquitetural. O respeito pela

natureza era bem visível. O abate de árvores para a construção da

área residencial era mínimo, e só as zonas onde as habitações e os

caminhos eram necessários, seriam limpas. Entre as habitações,

espaçadas umas das outras, sempre se mantinha o arvoredo, fazendo

sobressair a sua brancura; daí o nome de Ilha Branca.

Em todo o lado reinava o equilíbrio, o povoado era limpo, as pessoas

alegres, a azáfama começava cedo e o burburinho dos afazeres e das

conversas elevava-se como o sol no horizonte.

O sumo-sacerdote estava acompanhado de Sikar, seu pupilo e

sacerdote, ambos caminhavam lentamente em amena conversa.

-Tanta é a beleza que nos rodeia que nos esquecemos de a

apreciar pelo hábito, disse Sikar, olhando em redor com

desvelo.

Alphek passou o olhar pela paisagem exuberante e multi-colorida,

como a certificar-se do que o seu pupilo dissera.

- É verdade. Por isso a natureza das coisas é dual, a vida é

comparativa, só assim podemos ter a noção e a perspetiva.

Fomos providos sabiamente pelo Criador com o livre

arbítrio para a nossa evolução e formação, no entanto, esta

característica que é espiritual está ligada a outra que é a

responsabilidade.

Para fazermos escolhas e tomar decisões temos que ter

opções, só assim a livre decisão pode funcionar e a

responsabilidade inerente a essa decisão. A decisão é

nossa por direito e a responsabilidade também.

- Compara a vida a uma moeda. A moeda tem duas faces,

impossível ter uma ou separá-las. A espiritualidade e a

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intuição, a materialidade e o intelecto. A beleza é

apreciada e valorizada porque existe o feio como

comparativo. Todos os sentimentos existentes neste plano

da Criação têm uma função de utilidade e estes

sentimentos são ligados pelo equilíbrio. O equilíbrio é

fundamental na atuação. Repara na natureza, é equilíbrio

puro, por isso as nossas leis e comportamento se regem

pelas leis da Criação que expressam a Vontade criadora do

Altíssimo.

No mar pequenas estrelas acendiam-se e apagavam-se, reflexos do

sol no balanço da ondulação que se envolvia na areia dourada da

praia.

- A falta de equilíbrio está a fazer com que o egoísmo

predomine entre os homens da grande cidade.

Sikar olhava para o horizonte como que a querer visualizar a grande

cidade, que no outro lado do mar, prosperava desordenadamente.

- Tudo o que está debaixo dos céus é bom, desde que em

equilíbrio! Retrucou Alphek:

Egoísmo, estado humano indispensável para a evolução na

sociedade e no seu caminhar individual no sentido

espiritual.

Ferramenta indispensável na tecedura complexa que é o

estado comportamental do individuo; como tudo o que se

rege pelas leis naturais também o egoísmo tem que estar

em equilíbrio sob pena de adulterar e desviar o espírito

humano de sua peregrinação.

Infelizmente, como tudo no comportamento humano, o

egoísmo foi exacerbado e adulterado, deixando de cumprir

o que lhe estava reservado, auxiliar o individuo na sua

evolução espiritual!

Património da alma acumulado por experiência, o egoísmo

não dá, só acumula e, como a moeda, tem a outra face que

é o altruísmo, a partilha do saber acumulado pelo egoísmo.

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Entre o egoísmo e o altruísmo, ambos necessários à

evolução espiritual, está o equilíbrio; é impossível dar o

saber, o conhecimento, os valores adquiridos, acumulado

por alguém, estes valores fazem parte do património

espiritual e cultural, é-lhe intrínseco, fruto da sua

experiência vivencial, é a sua riqueza, diferente,

evidentemente, de pessoa para pessoa.

Como seres espirituais que somos, a individualidade é a

nossa referência.

Para equilibrar o egoísmo existe o altruísmo que partilha o

saber acumulado pelo egoísmo, num misto de amor e

doação ao próximo. O saber acumulado se não for

partilhado de nada serve, nem para o seu proprietário.

É como o planeta, se este, através da sua actividade

vulcânica não aliviasse a tensão no seu interior, explodiria:

equilíbrio.

Neste plano material em que vivemos, necessitamos do

intelecto e da carga sentimental a ele ligada para a nossa

evolução espiritual, por isso, o controlo das emoções e dos

sentimentos ligados à matéria ser necessário, se esta nos

dominar, tornar-nos-emos mais pesados e maior

dificuldade teremos no regresso à Pátria, aos jardins

eternos, de onde provimos.

O caminho é só um, podemos segui-lo para cima no sentido

da Luz ou para baixo no sentido das trevas, a decisão é

nossa.

Há três pilares básicos no nosso comportamento que não

devemos descurar:

- Olhar dentro da nossa alma e rever o resultado das

nossas ações!

- Confidenciar o que nos vai na alma ao nosso melhor

amigo, o nosso guia e protector espiritual!

- Não mentir a nós próprios, este é o primeiro passo para a

verdade!

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Se não descurarmos estes procedimentos, então o

equilíbrio manter-se-á e seremos felizes, só então

estaremos capacitados para ajudar o nosso semelhante,

em verdade.

Por momentos silenciaram a olhar a imensidão azul à sua frente,

perscrutavam sinais dos elementos da comitiva de Neptuno, a eles

tão queridos.

- Mestre, quando me relatarás os acontecimentos de tua

viagem?

Alpkek, o sumo-sacerdote, sorriu com tristeza.

- Mais tarde, Sikar, mais tarde…

Alegres e confiantes regressaram para se dedicarem aos seus

afazeres no Templo, pela velha escadaria, antiga como o tempo,

incrustada na rocha e que entrava na montanha em direção ao alto.

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IV

Justiça e Sofrimento

E o que fora curado não sabia quem era; porque Jesus se havia retirado, em razão de, naquele lugar, haver grande multidão. Depois, Jesus encontrou-o no templo, e disse-lhe: Eis que já estás são; não peques mais, para que te não suceda alguma coisa pior. E aquele homem foi e anunciou aos judeus que Jesus era o que o curara. S. João “Bíblia - Novo Testamento 5-13:15”

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O alvorecer trouxe o canto das aves depois de uma noite silenciosa

entre o piar do mocho e o cantar das cigarras, sussurros de sons

notívagos; o canto e o voo alegre e ladino, emprestando aos

humanos a alegria e a singeleza da obra já feita por tantos e

prestimosos seres que, diligentemente, mantinham a harmonia e a

beleza.

Alphek mirava a distância, que se unia entre o mar e o céu no

horizonte, no balcão da sala de visitações, amplamente aberto em

arcos sobre os penhascos. A paisagem era magnífica, o espelho de

água transluzia os reflexos do sol matutino, o ar estava fresco e

límpido, as ondas envolviam-se nas arribas num som mágico de

cadência ritmada e formas brancas de espuma volátil.

Um toque na porta maciça de madeira, incrustada com detalhes de

ferro, e um pedido de licença para entrar fez-se ouvir, Sikar parou

frente à porta entreaberta e aguardou a ordem de seu mestre.

- Entra Sikar, aguardava a tua visita.

-Bom dia Mestre, a manhã está radiosa e convida ao

passeio e meditação.

- Hoje vou dar-te conhecimento de uma das situações com

que se deparam os seres humanos no outro lado do mar.

Aproveitaremos para desfrutar com os nossos queridos

enteais o passeio.

Mais uma vez as escadas milenares, desgastadas que eram nos seus

degraus pelo passar do tempo, foram usadas. Como sempre o

povoado fervilhava de vida e movimento nos seus afazeres

domésticos, que também se faziam necessários para o contributo

quotidiano do bem-estar e provimento do corpo e da alma.

Os dois sacerdotes enveredaram pelo caminho que conduzia aos

campos verdes e floridos que se estendiam à sua frente, beirando as

escarpas que dividiam a terra do mar

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- Uma das questões com que deparei nas minhas viagens

foi o muito sofrimento dos seres humanos e a pergunta,

umas vezes sincera e ansiando por resposta, outras com

mal escondido despeito e vontade dolosa: Porque tanto

sofrimento se Deus é perfeito e justo?

Sikar baixou o olhar e os pensamentos afluíram num misto de

ansiedade e expetativa do que seu Mestre diria.

- Não é fácil para uma pessoa em sofrimento e sem

entender as correlações da vida compreender que o seu

estado se deve só a ela própria, principalmente, quando

esse sofrimento é causado por terceiros sem sua

intervenção direta.

Só a boa vontade, fé na justiça e perfeição do Criador e o

conhecimento das Suas leis pode amenizar tal sofrimento

e resgatá-lo.

Alphek pausou e o seu olhar percorreu o horizonte buscando o

auxílio dos guias para que a sua explanação fosse correta e absorvida

integralmente.

- O Criador muniu o ser humano com uma ferramenta

indispensável à sua evolução nas planícies da matéria

onde peregrina para seu benefício.

- O livre arbítrio!

A capacidade de tomar decisões e escolher o caminho que

mais se coaduna com ele, tomar a iniciativa da ação e

construir uma sociedade para seu benefício e de seu

próximo.

O ser humano é livre e tem o intelecto para gerir essa

liberdade, o poder criativo para se rodear de beleza e

bem-estar, o poder organizativo para que a sociedade

possa, dinamicamente, criar as condições úteis ao

progresso material e espiritual.

De muito somos capazes e nessa capacidade devemos

equilibrar o nosso comportamento sentimental, nas

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emoções e afetos que, obrigatoriamente, nos conduzirão

na nossa relação interpessoal.

A nossa liberdade termina onde começa a liberdade do

próximo e é nesta junção de atitudes e respeito que a

construção do tecido vivo, que é a sociedade, se deve

pautar.

Somos seres sociais de origem, embora independentes e

autónomos pela própria natureza da nossa

espiritualidade.

Justiça e Amor equilibram a nossa atuação e vivência!

O olhar límpido e penetrante do Sumo-sacerdote poisou no seu

pupilo a avaliar o efeito de suas palavras.

Sikar estava compenetrado a ouvir as palavras do mestre e ao olhar

deste deu um sorriso de cumplicidade e aquiescência pelo que o

mestre continuou.

- E, como tal, a dualidade mantém a sua atuação, mesmo

nos critérios de escolha material para opção de vida…

retorquiu Sikar, fazendo um gesto abrangente com as suas mãos.

- Verdade, retorquiu Alphek, assim também nos efeitos do

livre arbítrio! A livre decisão está intimamente ligada à

responsabilidade!

- Lei da Reciprocidade!

O homem tem a opção de escolha e decisão, no entanto, a

responsabilidade dessa decisão também lhe pertence, é

inerente ao livre arbítrio. Só não é responsável quem não

tem o livre preceito de decisão, não é o caso dos humanos

que o têm por origem, no seu gene, mesmo escravo o

homem é livre espiritualmente.

As ações obrigam a resgate, assim é inserido na ação da

Vontade Divina através de Suas Leis que governam as

Criações de modo equilibrado e justo e o ser humano não

está isento dessa Lei!

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Livre só é o ser humano que vive e atua na Vontade de

Deus, no cumprimento da Lei: se o ser humano cumpre a

lei dos homens, porque não cumpre a Lei de Deus?

A Justiça Divina e o cumprimento da Lei é inexorável,

cumpre-se, no entanto, o Amor de Deus permite ao ser

humano resgatar as suas ações através da sua boa

vontade, assim ele o queira, assim está à sua disposição.

O ser humano carrega o fruto das suas ações, ninguém o

pode aliviar ou remir, só ele e a quem ele ofendeu.

- É interessante como os acontecimento se engrenam

numa mescla de ação – reação, capacidade de resgate e

novos acontecimentos que conduzem a novo ciclo para

nova atuação…

Disse Sikar olhando o seu mestre…

- A formação do ser humano passa exatamente por esses

ciclos que o conduzem à experiência da vida, assim ele

saiba aproveitar essa experiência no sentido do seu

próximo, justiça e amor, o ciclo fecha-se depois de estar

concluído e manter-se-á aberto até tudo estar resgatado;

repito, as leis divinas que regem os universos,

concomitantemente a nós espíritos humanos, cumprir-se-

ão independentemente das filosofias e modo de estar das

sociedades humanas e o desejo individual!

A lei não muda pelo desejo ou anseio humano, mas

cumpre o que lhe está destinado. O ser humano, pela sua

ação, conduz o seu destino!

Alphek abria os horizontes de seu conhecimento para o discípulo

que o ouvia atentamente.

- No entanto, cada vida terrena, não é suficiente para

enquadrar toda esta sinfonia de acontecimentos, que pela

sua característica é complexa.

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- Tens razão Sikar, os acontecimentos de uma vida

terrena não são suficientes para abarcar os milénios de

legado cultural e experiencial da história humana, muito

há ainda a experienciar.

Não há lacunas no desenrolar das leis da Criação. A tudo

o Onipotente precaveu, Justiça e Amor em Equilíbrio!

Alphek caminhava em passo cadenciado mas firme e Sikar

acompanhava-o alegremente por veredas e caminhos rodeados de

uma natureza exuberante e viva de movimento. Os seres enteais, que

eles tanto se alegravam, andavam num corrupio de lá para cá,

esvoaçavam, espreitavam, ou corriam pelos campos verdes…

animais silvestre acompanhavam essa correria sem que os humanos

compreendessem o porquê daqueles movimentos, aparentemente,

desordenados, as aves esvoaçavam febrilmente dobrando os seus

cantos numa sinfonia de vida e alegria.

Em tudo o equilíbrio fazia jus à Vontade do Criador!

Depois de um trecho do caminho em silêncio a absorver a alegria

envolvente Sikar disse:

- É necessário muita presença e um ser evoluído

espiritualmente para abarcar os conhecimentos que a

Criação guarda.

- Sikar, guarda os conhecimentos com amor e devoção e

passa-os ao teu semelhante, o que eles fizerem desse

legado a eles diz respeito, é imperdoável quem guarda o

conhecimento para si sem o partilhar.

- O libre arbítrio e a Reciprocidade por si só não

conduzem, ainda, ao cabal conhecimento e elucidação da

pergunta formulada pelos seres humanos: Porque tanto

sofrimento se Deus é perfeito e justo?

Para isso temos que introduzir o último elemento da

tríade:

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- A Reencarnação!

O Onipotente é Justo e Bondoso e permite que o ser

humano possa resgatar o fruto das suas ações, que

também servem para a sua formação, através do tempo.

Podemos, consecutivamente, criar ciclos de experiência

nas ações e resgatar o que de mal foi feito ou cimentar o

que de bom também foi feito, a dualidade da vida em

plena florescência na Lei. É natural que o ciclo de uma

vida terrena nada é para o efeito temporal da Criação.

Fala-se em infinito para o espaço físico e para o tempo e é

nesses conceitos que o ser humano se desenvolve.

Somos parte integrante e, de certo modo, privilegiado,

neste imenso tear da Criação, ainda não tomámos

consciência do nosso lugar nesta maravilhosa obra de

nosso Criador, é tempo de despertar e evoluir

espiritualmente para ocuparmos o lugar que a nós

pertence, para alegria de todos os seres que connosco

partilham o mesmo lar!

A Criação não se resume ao nosso espaço temporal, para

lá outro espaço existe e é nessa multiplicidade de espaços

que nós vivemos num ciclo de encarnação e

reencarnação. Não existe a morte, como fator decisivo

neste ciclo, mas sim um fenecer num plano e o renascer

noutro.

Morte é um termo definitivo e não se enquadra no Amor

Divino, a não ser que o ser humano tome por opção de

ação esse caminho, mesmo assim, o ser humano tem

imensos avisos e exemplos para desvio nas suas múltiplas

peregrinações de vida pelas planícies da matéria.

- O ser humano está no caminho e tem a decisão de opção,

ou segue para cima, em direção à Luz, ou para baixo, em

direção às trevas, o caminho é o mesmo. Assim como ele

decidir, assim sobre ele virá o fruto da decisão. Alegria ou

sofrimento!

O livre arbítrio permite-nos tomar o nosso destino em

nossas mãos pela livre decisão, a Reciprocidade permite-

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nos receber o fruto dessa decisão pela responsabilidade e

a Reencarnação permite-nos resgatar ou usufruir os

efeitos da responsabilidade pela experiência e vivência da

ação através do tempo.

O Criador não castiga, cumpre-se a Lei!

Novamente o silêncio foi cúmplice do estar daqueles seres que

irmanados no mesmo sentido vibravam com o meio envolvente. A

natureza cobria-se de manto escuro num ciclo de renascer a noite e

cumprir-se o dia, tal qual o diálogo sobre a reencarnação, após o dia

a noite, após a noite o dia, para gáudio e vida dos seres que vibram

no ciclo natural da natureza. Assim o Criador o predispôs, assim será

cumprido!

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V

Misericórdia

Bem-aventurados os misericordiosos, pois eles

alcançarão misericórdia! Não vos enganeis, entretanto,

praticando falsa misericórdia, mas considerai se a vossa

boa vontade é verdadeiramente proveitosa aos homens!

Jesus

“Sermão da Montanha”

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O amplo salão das audiências abria-se ao mar através de largas

aberturas na rocha em jeito de janelas trabalhadas com esmero e

arte. A altura do salão em relação ao mar permitia ouvir,

ritmicamente, o bater das ondas nas falésias, num repetitivo som

cavo e calmo vindo de distâncias, trazia ao espírito a universalidade

da união entre a matéria e a espiritualidade.

Alphek, de pé, com o olhar preso no horizonte, distendia o seu

pensamento na amplitude da ação humana, nos conceitos e

entendimento da intelectualidade, necessária à atuação nas

matérias, e na intuição e ação do espírito que brandamente moldava

o efeito da intelectualidade.

Tudo estava conforme a lei e em equilíbrio! Vibrava a Criação em

uníssono na Vontade e na Lei do Criador!

A beleza da paisagem envolvente, o silêncio cortado pelos sons da

natureza, o pensamento a divagar por planícies imensas de

sabedoria vetusta, a tranquilidade do espírito e do corpo,

preenchiam a evolução do pensamento do sumo-sacerdote sobre a

atuação do homem na correlação, Justiça e Amor.

Fazia-se sentir nos homens mais piedosos, cumpridores da Lei, uma

atitude de distância espiritual dos que, no efeito da reciprocidade

das ações, labutavam nos seus afazeres diários com dificuldades e

mal disfarçada angústia, sofrimentos motivados pela tirania dos que

em poder dominavam e dos efeitos da reciprocidade que em retorno

faziam cumprimento da Lei; mesclavam-se a injustiça e a justiça

numa simbiose de ação difícil de entender, até para os mais

esclarecidos, originando ações de entendimento individual que

levavam a extremos de individualidade e a divisões no cumprimento.

Tirania e injustiça originam gritos de revolta dos que, em

sofrimento, lutam pelo equilíbrio; no tempo a história regista os

acontecimentos do passado, que no futuro devem ser remidos, num

ciclo de eterna atividade e contínua mudança!

Subiam lampejos de luz para o alto na procura de auxílio e

misericórdia e outros tantos pensamentos revoltados pela

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insatisfação dos desejos pessoais e anseios de poder egoístico que em

desequilíbrio mais fomentavam a injustiça e alimentavam o

desequilíbrio.

Marasmo e a confusão dos tempos!

A tudo, o sumo-sacerdote, assistia na sua espiritualidade plena de

misericórdia para com os que sofriam e, pela Vontade do Altíssimo,

o Misericordioso, tinham direito ao perdão, que só é devido a quem

prevarica e reconhece; as suas peregrinações tinham-no provido de

vivências experienciais que lhe permitiam sentir a tristeza e angústia

dos seres humanos e em misericórdia compartilhava o seu

sofrimento, independentemente da culpa, já que a justiça é Divina e

pela Lei será cumprida, não da sociedade humana que se rege por

leis, permeáveis aos conceitos e desejos de quem detém o poder, ou

do individuo, que em verdade ou não, toma uma atitude de

sobranceria sem olhar para si, arguto ao erro do seu semelhante.

Só no perdão reside a misericórdia, equilíbrio universal, só na vivência se pode sentir o sofrimento do próximo, que nos não é alheio, e assim remir os muitos fios do destino que indubitavelmente nos ligam ao ciclo da reciprocidade, com ou sem nosso conhecimento. O Altíssimo, o Misericordioso, é Deus de Justiça e Amor, a Sua Perfeição atua no equilíbrio da Justiça e do Amor, inseparáveis desde sempre porque desde sempre estão ligadas pela atuação unigénita! O cumprimento incondicional da Lei da Reciprocidade pressupõe, indubitavelmente, a Misericórdia, para salvação de todos os que, perdidos, anseiam pelo caminho e pela verdade, e fortalecimento dos que já se encontram no caminho da Pátria! Atentos devem estar os justos, para que no caminho, em misericórdia, possam ajudar o seu semelhante a ultrapassar as muitas vicissitudes que se lhes deparam na vivência. Alphek aproximou-se das janelas e olhou para baixo onde as águas do oceano se desfaziam em novelos brancos de pura espuma contra as rochas trabalhadas pelo tempo, por um momento os seus

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pensamentos foram desviados para o deleite de tão bela paisagem, que na sua pujança irradiavam força e equilíbrio. No céu, num bailado coreografado por mão invisível, as aves rodopiavam e o seu canto fazia-se ouvir em sintonia com o bramir do mar. Vibrava a natureza e os servos do Altíssimo, em trabalho e amor.

Em silêncio, as palavras do Livro ecoaram na alma do sumo-

sacerdote:

“Sem um verdadeiro vivenciar não há amadurecimento espiritual!

Obrigai-vos, por isso, com toda a força para o vivenciar!

Familiarizai-vos com a penúria e os sofrimentos alheios, e

despertai dessa forma em vós a misericórdia.”

Só ao Altíssimo é devido a Justiça e a Clemência!

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VI

O Ribeiro!

Segundo for esse sentimento intuitivo e os consequentes

pensamentos, a força Divina de atuação autónoma será

dirigida por ele para bons ou maus efeitos!

Eis a responsabilidade com que o ser humano tem que

arcar! Nisso encontra-se também seu livre arbítrio!

Abdruschin

“Na Luz da Verdade – Mensagem do Graal”

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Corria devagar o ribeiro que a pressa de chegar ao mar era pouca.

Deambulava por prados verdes e de vez em vez caía de alturas para

mergulhar na cálida água de bacias formadas pela arte do tempo.

Esgueirava-se por entre a vegetação cerrada das margens,

usufruindo da sombra amiga que lhe ofertavam. Cálidas e cristalinas

eram as suas águas quando o sol as beijava, fresca quando a sombra

da vegetação as cobria.

A tudo isto, Alphek, observava com olhar tranquilo, perscrutando o

movimento alegre e ladino de seres elementares, que só o seu olhar

espiritual podia ver. Há muito que o ser humano tinha perdido esta

dádiva, por sua própria vontade, ao alimentar a arrogância “do

querer saber melhor” e afastar-se do auxílio, rejeitando-o, dos seus

guias.

Na paisagem só o barulho da brisa e o marulhar do ribeiro,

misturado aqui e acolá pelo trinar de aves canoras, se faziam ouvir.

Tranquilidade, convidando a introspeção.

E assim, Alphek, pensava:

“Para onde caminhas Humanidade? Porque escolheste o

caminho para baixo, o caminho que conduz à perdição,

alimentas vaidades e arrogância, fechaste o teu espírito à

condução de guias espirituais, que pelo amor do Altíssimo

te foram disponibilizados. Escolheste a face negra da

dualidade da vida e nas suas profundezas alimentas a

miséria. Corres de olhar cerrado para o precipício, surda

aos avisos, desprovida de Amor!

Ninguém se furta à Lei da gravidade e quando chegar a

hora, que virá, o peso das tuas ações envolver-te-ão num

abraço fatal. Toda a materialidade, a seu tempo, será

destruída e renovada para um novo ciclo de vida, não

queiras estar cá quando esse tempo chegar, porque a

destruição também te atingirá.

Tiveras escolhido o caminho para o Alto e a paz e alegria

perenes seriam o teu galardão. Vida eterna, porque a lei da

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gravidade, inflexível e no cumprimento da Vontade do

Altíssimo, teria elevado o teu espírito para os Jardins

Eternos, onde pertences, em vez de para baixo para as

profundidades escuras da matéria mais densa, onde o

fenecer é lei.

Lá, no Paraíso, só o sentido da vida é real, e o equilíbrio é

lei que alimenta e progride. Felizes os que chegarem perto

dos degraus do trono do Altíssimo, a esses é permitido

usufruir das alegrias dos justos e do Seu Amor.”

O toque de um sino repicou à distância, era hora do meio-dia e o seu

passeio estava terminado.

Devagar levantou-se e com olhar embevecido olhou em redor a

despedir-se das pequenas criaturas que alegremente acenavam. A

face do ancião expressava bem o equilíbrio entre o seu corpo e o

espírito. Naquele recanto do mundo, a sua ilha, as sombras escuras

ainda não tinham chegado, mas o tempo se encarregaria de as

conduzir pela mão do homem. O semblante de Alphek sombreou por

momentos e por momentos anteviu as imagens desagradáveis desse

futuro, que de longínquo estava perto.

A extensão do prado verde terminava no penhasco, fundindo-se no

horizonte numa mescla de cores, verde e azul, matizes alimentadas

pela luz do astro rei que no etéreo irradiava a sua benfazeja luz para

sustento e alegria de suas criaturas. No momento, a Ilha era a

fortaleza da Palavra e Alphek o seu guardião; longos eram os

tentáculos que se agitavam no outro lado do mar, cinzentos e

obscuros, no meio da neblina opressiva e cerrada,

desordenadamente traduziam o caminho que os seus mentores

seguiam.

E o caminho era longo…

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EPÍLOGO

Tempos passaram, novas civilizações nasceram sobre os

escombros das caídas.

Terras foram sugadas pelo mar e outras nascidas para um

novo ciclo.

Novas filosofias, novas crenças, novas religiões, outros

saberes, outros conhecimentos e a Humanidade regista na

memória do tempo a sua História, o seu património

cultural e espiritual para as gerações futuras, a sua

Civilização, o seu Legado.

Memórias de tempos ancestrais que do passado clamam

por verdade, agigantam-se no presente para a remissão

das ações.

Deus não é fruto da filosofia do homem, mas o homem é

fruto da Vontade de Deus!

Alma Lusa

Ω