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Especial [email protected] 3090-1010 MANAUS, DOMINGO, 29 DE MAIO DE 2016 F1 CACAU É OURO No Madeira, O chamado cacau nativo é colhido pelos ribeirinhos na floresta da Calha do Madeira, onde é chamado de fruto da cor de ouro CACAU MADEIRA N ovo Aripuanã (AM) – O sabor do chocolate estimula sensores desde as papilas gustativas da língua até o nosso cérebro, dando um prazer muito grande, garantem os endocrinologistas. É nutritivo e pode ser considerado um alimento de qualidade, reforçam os nutricionistas. O que eles talvez não saibam é que a fonte dessa energia, o fruto do cacau, vem sendo colhida em lugares remotos da Amazônia, como na Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do rio Madeira, no coração da maior floresta tropical do mundo. O que os ribeirinhos do Amazonas não sabem é que o cacau nativo que eles colhem no meio da mata e vendem aos atravessadores está virando chocolate fino na Europa. Isso depois que os comerciantes revendem o cacau para as cooperativas de Belém (PA) e Itacoatiara (AM). São eles que beneficiam as amêndoas dos frutos para enviá-las à Alemanha, onde são ingrediente de chocolates que custam cerca de 3 euros por unidade (mais de R$ 8). Até chegar nas prateleiras e na boca dos chocólatras do mundo inteiro, o cacau nativo da Amazônia percorre um longo caminho de esperança e sofrimento, marcado pelo trabalho árduo e sofrimento de uma gente humilde e trabalhadora, explorada pela ganância e astúcia comercial de atravessadores, que compram o cacau a R$ 7,50 o quilo e revendem às cooperativas por R$ 170. Agora, quando esse cacau chega à Europa, onde é vendido em euros, continua sendo um mistério no Madeira. MÁRIO ADOLFO RICARDO OLIVEIRA

Especial - 29 de maio de 2016

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Especial - Caderno especial do jornal Amazonas EM TEMPO

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[email protected], DOMINGO, 29 DE MAIO DE 2016

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CACAU É OURONo Madeira,

O chamado cacau nativo é colhido pelos ribeirinhos na fl oresta da

Calha do Madeira, onde é chamado de fruto da cor de ouro

CACAUMADEIRA

Novo Aripuanã (AM) – O sabor do chocolate estimula sensores desde as papilas gustativas da língua até o nosso cérebro, dando um prazer muito grande, garantem os endocrinologistas. É nutritivo e pode ser considerado um alimento de qualidade, reforçam os nutricionistas. O que eles talvez não saibam é que a fonte dessa

energia, o fruto do cacau, vem sendo colhida em lugares remotos da Amazônia, como na Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do rio Madeira, no coração da maior fl oresta tropical do mundo.O que os ribeirinhos do Amazonas não sabem é que o cacau nativo que eles colhem

no meio da mata e vendem aos atravessadores está virando chocolate fi no na Europa. Isso depois que os comerciantes revendem o cacau para as cooperativas de Belém (PA) e Itacoatiara (AM). São eles que benefi ciam as amêndoas dos frutos para enviá-las à Alemanha, onde são ingrediente de chocolates que custam cerca de 3 euros por unidade (mais de R$ 8).Até chegar nas prateleiras e na boca dos chocólatras do mundo inteiro,

o cacau nativo da Amazônia percorre um longo caminho de esperança e sofrimento, marcado pelo trabalho árduo e sofrimento de uma gente humilde e trabalhadora, explorada pela ganância e astúcia comercial de atravessadores, que compram o cacau a R$ 7,50 o quilo e revendem às cooperativas por R$ 170. Agora, quando esse cacau chega à Europa, onde é vendido em euros, continua sendo um mistério no Madeira.

MÁRIO ADOLFO

RICARDO OLIVEIRA

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Mas por que o cacau da Amazônia é o pre-ferido das indústrias de chocolate da Europa? Por que o aroma, o sabor e a cor diferem do cacau produzido em outras regiões, como na Bahia, por exemplo? Descoberto pelos Maias e Astecas, o cacaueiro é originário de regiões de fl oresta pluviais da América Tropical, onde até hoje é encontrado em estado silvestre. Tentando ser mais preciso, botânicos apostam que o cacau é originário das cabeceiras do rio Amazonas. E quem já provou sua amêndoa pura, sem nenhum benefi ciamento, vai perce-ber claramente a diferença no amargor e no intenso sabor de chocolate.

Diretores da Hachez, centenária fábrica alemã de chocolate, por exemplo, provaram o cacau nativo da Floresta Amazônica e fi caram impres-sionados. “É o genuíno, pelo seu sabor primitivo e selvagem!”, deduziram. Isso revolucionou os conceitos da empresa, que passou a comprar a produção do rio Purus desde 2005, considerada genuína pelo seu sabor primitivo, ou, como eles dizem, selvagem. Além de que passou a investir para que os ribeirinhos aumentassem a sua pro-dução. Hoje, as barras feitas com cacau nativo (Wild Cocoa) são vendidas só na Alemanha.

À exceção da comercialização, já que não é este seu objetivo, é mais ou menos isso, em termos de apoio técnico e logístico, o que a Fundação Amazonas Sustentável (FAS) vem fazendo nas RDSs do rio Madeira, onde, aproximadamente,

40 famílias vêm produzindo – dependendo do clima – até 100 toneladas de cacau.

Para acompanhar o processo de colheita, secagem e comercialização – e até a ousadia de uma pequena fábrica que começou a fabricar chocolate e produtos derivados do seu próprio cacau –, repórteres do EM TEMPO percorreram seis Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDSs) do Madeira, guiados por Maurício Felipe, assistente de mobilização da FAS, que conhece os mistérios do rio e pilota a voadeira com maestria. Durante cinco dias, os jornalistas entraram na fl oresta para colher, junto com os ribeirinhos, o fruto do cacau nativo, dormiram nas reservas, se alimentaram de peixes pes-cados do Madeira, acompanharam o processo de quebra da casca, secagem e até da fabri-cação de produtos do cacau, acompanharam passo a passo essa sofrida e ao mesmo tempo “fascinante” aventura. Descobrindo que, no rio Madeira, Cacau é ouro!

Do plantio até a colheita, leva-se, em média, de 3 a 4 anos. É nesse período que muita coisa pode acontecer. Enchentes, chuvas em excesso, sol causticante, a praga da vassoura de bruxa e até mesmo ataques de papagaios, que, aos milhares, invadem as reservas de cacaueiros e devoram os frutos. O sucesso do cultivo depende da proteção contra os ventos e de um bom sombreamento, fornecido ora por bananeiras, ora por árvores de porte superior ao do cacaueiro.

O ribeirinho Waldenor Queiroz Pinto sabe disso e apressa a colheita. O período ideal para que o trabalho seja feito é de janeiro a abril, quando ele trabalha de 6h às 17h, com um intervalo de alguns minutos para o almoço.

— Depois do fabrico, começa a poda, que deve ser concluída até o final de junho. Quem não souber desses pequenos detalhes, para sobreviver do cacau, vai acabar apanhando –, diz Waldenor.

Depois da secagem, o cacau é ensacado e leva-do para a beira do rio, para esperar o barco dos compradores, que vão parando de comunidade em comunidade, recolhendo toda a produção das RDSs do rio Madeira.

“Eu tinha 7 mil pés de cacau em 10 hectares. Isso me renderia uma safra de 12 toneladas. Mas a água levou tudo”

WALDENOR PINTO

Quem não sabe lidar com o cacau acaba apanhando

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Morador da RDS do Madeira, Wal-denor Queiroz Pinto trabalha na secagem do cacau, sobre a barca-ça. Ele possui 10 hectares de cacau plan-tados

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NEM SEMPRE A VIDA TEM SABOR DE CHOCOLATE

Rio Madeira (AM) – O extrativismo de ca-cau é uma maneira de os ribeirinhos

conseguirem dinheiro, já que a maioria deles se de-dica apenas à pesca e à agricultura de subsistência. Mas a colheita do cacau não

é tarefa fácil. Ela começa por vota das 5h, quando o acauã começa a cantar e seo Waldenor Queroz Pinto, 57, mete a cabeça para fora da janela para conferir como vai ser o tempo. Sorve mais um gole de café na caneca de esmalte e se anima com o prenúncio de dia ensolarado, para compensar a chuva que caiu na véspera. Estamos na Comunidade de “Zé João” – a 45 metros de Novo Aripuanã, de voadeira –, que virou Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e onde seis famílias sobrevivem do extrativismo do cacau, preservando a atividade em áreas de várzea no Baixo Amazonas.

Waldenor veste sua camisa azul de mangas compri-das para se proteger dos mosquitos e caminha para a barcaça onde estão sendo secadas as amêndoas de cacau colhido na semana passada. Barcaça é uma espécie de tabuleiro de quatro metros ou mais, com um telhado móvel, de zinco, que é movimentado pelos ribeirinhos de acordo com o clima. Se ameaça chuva, eles fecham o tabuleiro empurrando o telha-

do. Se vem o sol, empurram a cobertura para trás, descobrindo as amêndoas de cacau. Esse processo de secagem leva de quatro a cinco dias no sol. Com chuva, se estende entre oito e dez dias.

Waldenor nasceu, se criou e pretende viver o resto de seus dias nesse pedaço de chão, entre o rio Ma-deira e a fl oresta. O pai, Edmundo Pinto de França, e a mãe, Marina Queiroz Pinto, também nasceram ali.

— Não tem porque eu sair daqui. Não me acostu-maria ao barulho da cidade, ao furdunço. Aqui é meu paraíso, tenho paz, trabalho, planto e não tenho patrão. O que ganho depende do meu braço –, diz o homem, que ri pouco, fala pausadamente e tem o hábito de refl etir demoradamente antes de dar respostas aos questionamentos do jornalista.

Waldenor tem seis fi lhos, e com o fruto do cacau está educando todos eles, que estudam em Manicoré (a 330.47 quilômetros de Manaus em linha reta). O mais velho, Alciraine França, 23, já está na faculdade.

— Eles passam as férias comigo, mas não é mo-leza. Passam o mês inteiro ajudando na colheita, na quebra e na secagem do cacau –, avisa o ribeirinho.

Enquanto seca na barcaça, o cacau tem que ser revolvido de três a quatro vezes por dia, para não secar apenas de um lado. Essa tarefa é feita com o auxílio do rodo. Depois de pegar a ferramenta, ele tira as botas e enrola a barra da calça para subir sobre o tabuleiro, onde estão secando 200 quilos de amêndoas de cacau. Cotado a R$ 7,50 o quilo, isto signifi ca dizer que Waldenor está pisando sobre R$ 1.800.

Enquanto revolve as amêndoas com o rodo, o

agricultor vai contando que, se não fosse a cheia violenta de 2014 – a maior da história do rio Ma-deira –, ele hoje estaria produzindo em torno de 12 toneladas. Antes, a sua colheita recorde tinha sido de 8 toneladas, em 2013.

— Tinha 7 mil pés de cacau em 10 hectares. Isso me daria uma safra de 12 toneladas. Mas a água levou tudo. Hoje está reduzido a 4 mil pés, se tiver isso aí. O rio me levou 8 toneladas e tive um prejuízo de R$ 8 mil.

Depois de revolver as sementes, seo Waldernor salta da barcaça, pega o paneiro e o “podão” – uma foice presa na ponta de uma vara de 8 metros ou mais – e se embrenha na fl oresta. Está na hora de colher mais cacau. O “podão”é usado nas plantações de cacau da Amazônia porque os cacaueiros nativos da região não são tão baixos quanto os pés plantados pelo homem.

Olhando por entre as folhas longas dos cacaueiros, Waldenor vai descobrindo frutos amarelos “como ouro” no meio do verde escuro. Basta um corte no caule – movimentando a lâmina da foice para baixo –, e o cacau cai sobre o chão úmido de folhas secas, fazendo um barulho abafado. Horas depois, o ribeirinho faz o caminho contrário, reunindo os frutos em um só lote, para depois encher o paneiro.

Como já foi citado, sobreviver do extrativismo do cacau não é parada fácil. Depois de carregar o pesado paneiro, sustentado pela cabeça através de uma tira larga de pano, os frutos são descascados e colocados para fermentação, só depois é que são espalhados sobre a barcaça para a secagem.

CACAUMADEIRA

Sobreviver do cacau não é tarefa fácil. Os ribeirinhos da comunidade de “Zé João” sabem disso

MÁRIO ADOLFO

O trabalho de Waldenor começa ao ama-nhecer, quan-do, armado de paneiro e podão, ele se embrenha na mata para ir colher o cacau

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No meio da fl oresta,UMA FÁBRICA DE CHOCOLATERibeirinhos da calha do Madeira começam a produzir chocolate com a ajuda da Fundação Amazonas Sustentável (FAS), que bancou a instalação de estufas de secagem, desenvolveu o design dos produtos e até instalou uma usina para gerar energia

No terceiro dia, zar-pamos às 7h. O destino é a RDS de Verdum, que já

fi ca nos limites de Mani-coré – duas horas de vo-adeira de Novo Aripuanã. É um sábado, por isso é possível avistar, ainda do

rio, grupos de crianças correndo sobre a grama verde da comunidade, pontilhada de casinhas de madeira, pintadas com cores alegres e fortes. Em uma delas, sustentada por longos esteios para fi car imune à subida traiçoeira das águas do rio, se destaca um letreiro, onde se lê Fábrica Agro–Verdum.

Subimos a escada de 12 degraus e nos deparamos com um grupo de oito pessoas trabalhando. Naquele momento, eles arrumam sobre a mesa os produtos fabricados com a semente do cacau – chocolate em pó (doce e amargo), barra de chocolate, geleia e licor de cacau. Todos eles estão em embalagens próprias, com rótulos, orientação sobre o produto e selo de certifi cação.

Quem nos recebe é dona Maria Lucia Araújo França, a coordenadora da RDS Verdum, que administra a fábrica. De acordo com ela, a produção ainda não é sufi ciente para alçar sonhos mais altos, como chegar de forma direta às fábricas da Europa.

— Por enquanto, nossos produtos são consumidos somente em Manicoré ou em Manaus, quando tem algum evento. Fabricamos cem unidades de cada produtos que desenvolvemos.

Explica Maria Lúcia que a fábrica artesanal de Verdum só existe devido à parceria com a Fundação Amazonas Sustentável (FAS).

A FAS é uma instituição não governamental, fun-dada em 20 de dezembro de 2007, que tem como um de seus principais programas o Bolsa Floresta, que é o primeiro projeto brasileiro com certifi cação internacional para compensar as populações tradi-cionais e manter os serviços ambientais fornecidos por meio das fl orestas.

Maria Lúcia reconhece que a FAS fez “quase tudo”. Levou o produto para São Paulo, onde foram feitos os ajustes exigidos pela Vigilância Sanitária, desen-volveu as macas, rótulos e vasilhames e desenvolveu o design gráfi co de cada produto.

A assessoria foi tão “sofi sticada”, que a FAS con-seguiu, por meio de uma parceria com uma empresa alemã, instalar uma turbina hidrocinética que, presa por meio de cabos, é instalada no rio para gerar energia por correntes. É o primeiro projeto do gênero na Amazônia brasileira.

— Dessa forma, fomos a primeira fábrica artesanal de chocolate, localizada na comunidade do Verdum, na RDS do rio Madeira, que teve energia fornecida por uma turbina – conta, orgulhoso, Luciano Furtado, 38, fi lho de Maria Lúcia que também trabalha na fábrica com a mulher, Valéria de Vasconcelos Paixão.

Hoje, a vila é iluminada pelo projeto Luz para Todos, que, na Calha do Madeira, foi implantado no governo Dilma Rousseff . Mas o que foi feito da turbina?

— Ah, numa certa madrugada ouvimos um es-trondo. Corremos para ver o que era e vimos que uma balsa da Hermasa havia atropelado, destruído a turbina e arrebentado os cabos.

— Você foram indenizados? –, pergunta o repórter.— Nunca. Nem satisfação eles deram.

CACAUMADEIRA

MÁRIO ADOLFO

A fábrica de chocolate Agro–Verdum consome 60 quilos de amêndoas de cacau por mês para fabricar seus produtos. Hoje, na fl oresta que avança sobre as mar-gens do rio Madeira – e tem árvores devoradas pela forte correnteza –, existem bem menos de 10 mil pés de cacau, depois que a co-munidade fi cou submersa na cheia de 2014.

Para fabricar os derivados do cacau, a comunidade se une. Cerca de 40 famílias moram na RDS Verdum, mas apenas seis pessoas traba-

lham na fábrica. No entanto, na hora da colheita e da quebra do cacau, todos se unem. Menos as crianças, que estão na escola São Pedro, estudando. Assim mesmo, respeitamos as leis do trabalho infantil”, observa a coordenadora da fábrica, Maria Lúcia.

De acordo com a líder da RDS Verdum, para fabricar chocolate em barra em pó, licor e geleia, os ribeirinhos – agora “operários” da fábrica – entram na mata cedo para colher o fruto. Depois de que-brar a casca, as amêndoas

são espremidas no tipiti para extrair o licor. Em seguida, as sementes vão para a fer-mentação e, por último, para a barcaça secar.

Para demonstrar a quali-dade superior do chocolate feito com o cacau do Ama-zonas , fabricantes de choco-lates da Alemanha garantem que, atualmente, o “cacau selvagem” da Amazônia vira o “chocolate mais puro e natural na Europa”.

Luciano pega um pedaço da barra de chocolate e leva ao fogo para ser derretido. Em poucos minutos, o aroma

inconfundível e inebriante de chocolate toma conta do es-paço. Servido em um copo, ele entrega aos repórteres.

— Provem. Este é o choco-late puro. Não tem nem leite!

Provamos e demos razão ao alemão Wolf Kropp–Butt-nerr, diretor da fábrica de chocolate alemã Hachez, que levou um susto ao mastigar uma barra de chocolate sel-vagem da Amazônia. “Nunca tinha experimentado um ca-cau com gosto tão intenso de chocolate!”. A experiência foi retratada pelo jornal “Estado de São Paulo”.

O ALEMÃO ESTAVA CERTO

“Nunca tinha experimenta-do um cacau com gosto tão intenso de chocolate!”

Wolf Kropp–ButtnerrDIRETOR DA FÁBRICA DE CHOCOLATE ALEMÃ HACHEZ

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Maria Lúcia, coordenadora da RDS de Verdum, colhe o cacau que será levado para a fábrica de chocolate, também dirigida por ela

Crianças brincam com o fruto do cacau colhido na RDS de Verdum. Eles estudam na escola São Pedro, mas é sábado, dia de algazarra

Cacau em pó, em barra, em licor e geleia: os produtos da fábrica Agro-Verdum, prontos para serem comer-cializados

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No meio da fl oresta,UMA FÁBRICA DE CHOCOLATERibeirinhos da calha do Madeira começam a produzir chocolate com a ajuda da Fundação Amazonas Sustentável (FAS), que bancou a instalação de estufas de secagem, desenvolveu o design dos produtos e até instalou uma usina para gerar energia

No terceiro dia, zar-pamos às 7h. O destino é a RDS de Verdum, que já

fi ca nos limites de Mani-coré – duas horas de vo-adeira de Novo Aripuanã. É um sábado, por isso é possível avistar, ainda do

rio, grupos de crianças correndo sobre a grama verde da comunidade, pontilhada de casinhas de madeira, pintadas com cores alegres e fortes. Em uma delas, sustentada por longos esteios para fi car imune à subida traiçoeira das águas do rio, se destaca um letreiro, onde se lê Fábrica Agro–Verdum.

Subimos a escada de 12 degraus e nos deparamos com um grupo de oito pessoas trabalhando. Naquele momento, eles arrumam sobre a mesa os produtos fabricados com a semente do cacau – chocolate em pó (doce e amargo), barra de chocolate, geleia e licor de cacau. Todos eles estão em embalagens próprias, com rótulos, orientação sobre o produto e selo de certifi cação.

Quem nos recebe é dona Maria Lucia Araújo França, a coordenadora da RDS Verdum, que administra a fábrica. De acordo com ela, a produção ainda não é sufi ciente para alçar sonhos mais altos, como chegar de forma direta às fábricas da Europa.

— Por enquanto, nossos produtos são consumidos somente em Manicoré ou em Manaus, quando tem algum evento. Fabricamos cem unidades de cada produtos que desenvolvemos.

Explica Maria Lúcia que a fábrica artesanal de Verdum só existe devido à parceria com a Fundação Amazonas Sustentável (FAS).

A FAS é uma instituição não governamental, fun-dada em 20 de dezembro de 2007, que tem como um de seus principais programas o Bolsa Floresta, que é o primeiro projeto brasileiro com certifi cação internacional para compensar as populações tradi-cionais e manter os serviços ambientais fornecidos por meio das fl orestas.

Maria Lúcia reconhece que a FAS fez “quase tudo”. Levou o produto para São Paulo, onde foram feitos os ajustes exigidos pela Vigilância Sanitária, desen-volveu as macas, rótulos e vasilhames e desenvolveu o design gráfi co de cada produto.

A assessoria foi tão “sofi sticada”, que a FAS con-seguiu, por meio de uma parceria com uma empresa alemã, instalar uma turbina hidrocinética que, presa por meio de cabos, é instalada no rio para gerar energia por correntes. É o primeiro projeto do gênero na Amazônia brasileira.

— Dessa forma, fomos a primeira fábrica artesanal de chocolate, localizada na comunidade do Verdum, na RDS do rio Madeira, que teve energia fornecida por uma turbina – conta, orgulhoso, Luciano Furtado, 38, fi lho de Maria Lúcia que também trabalha na fábrica com a mulher, Valéria de Vasconcelos Paixão.

Hoje, a vila é iluminada pelo projeto Luz para Todos, que, na Calha do Madeira, foi implantado no governo Dilma Rousseff . Mas o que foi feito da turbina?

— Ah, numa certa madrugada ouvimos um es-trondo. Corremos para ver o que era e vimos que uma balsa da Hermasa havia atropelado, destruído a turbina e arrebentado os cabos.

— Você foram indenizados? –, pergunta o repórter.— Nunca. Nem satisfação eles deram.

CACAUMADEIRA

MÁRIO ADOLFO

A fábrica de chocolate Agro–Verdum consome 60 quilos de amêndoas de cacau por mês para fabricar seus produtos. Hoje, na fl oresta que avança sobre as mar-gens do rio Madeira – e tem árvores devoradas pela forte correnteza –, existem bem menos de 10 mil pés de cacau, depois que a co-munidade fi cou submersa na cheia de 2014.

Para fabricar os derivados do cacau, a comunidade se une. Cerca de 40 famílias moram na RDS Verdum, mas apenas seis pessoas traba-

lham na fábrica. No entanto, na hora da colheita e da quebra do cacau, todos se unem. Menos as crianças, que estão na escola São Pedro, estudando. Assim mesmo, respeitamos as leis do trabalho infantil”, observa a coordenadora da fábrica, Maria Lúcia.

De acordo com a líder da RDS Verdum, para fabricar chocolate em barra em pó, licor e geleia, os ribeirinhos – agora “operários” da fábrica – entram na mata cedo para colher o fruto. Depois de que-brar a casca, as amêndoas

são espremidas no tipiti para extrair o licor. Em seguida, as sementes vão para a fer-mentação e, por último, para a barcaça secar.

Para demonstrar a quali-dade superior do chocolate feito com o cacau do Ama-zonas , fabricantes de choco-lates da Alemanha garantem que, atualmente, o “cacau selvagem” da Amazônia vira o “chocolate mais puro e natural na Europa”.

Luciano pega um pedaço da barra de chocolate e leva ao fogo para ser derretido. Em poucos minutos, o aroma

inconfundível e inebriante de chocolate toma conta do es-paço. Servido em um copo, ele entrega aos repórteres.

— Provem. Este é o choco-late puro. Não tem nem leite!

Provamos e demos razão ao alemão Wolf Kropp–Butt-nerr, diretor da fábrica de chocolate alemã Hachez, que levou um susto ao mastigar uma barra de chocolate sel-vagem da Amazônia. “Nunca tinha experimentado um ca-cau com gosto tão intenso de chocolate!”. A experiência foi retratada pelo jornal “Estado de São Paulo”.

O ALEMÃO ESTAVA CERTO

“Nunca tinha experimenta-do um cacau com gosto tão intenso de chocolate!”

Wolf Kropp–ButtnerrDIRETOR DA FÁBRICA DE CHOCOLATE ALEMÃ HACHEZ

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Maria Lúcia, coordenadora da RDS de Verdum, colhe o cacau que será levado para a fábrica de chocolate, também dirigida por ela

Crianças brincam com o fruto do cacau colhido na RDS de Verdum. Eles estudam na escola São Pedro, mas é sábado, dia de algazarra

Cacau em pó, em barra, em licor e geleia: os produtos da fábrica Agro-Verdum, prontos para serem comer-cializados

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Em Santa Rosa, tem mulher na COLHEITA DO CACAU

Após o recolhimento, os frutos são descascados pelas mulheres da reserva e colocados em caixas de fermentação por alguns dias. Em seguida, são secos em carretas

CACAUMADEIRA

Lidar com as tarefas do extrativismo do cacau na RDS Santa Rosa é uma festa. Tanto na colheita quanto na quebra e na secagem das amêndo-

as há a presença das mulheres, que dão um ar de alegria e beleza à comunidade. Por isso, o trabalho é feito entre risos, conversas animadas e rapidez. Enquanto duas delas dão o corte na casca do fruto, outras retiram as amêndoas e atiram dentro da bacia. Com a rapidez de uma linha de montagem.

Habitada por cinco famílias, que somam 40 pessoas no total, Santa Rosa produziu este anos 6 toneladas de cacau, na várzea.

Os cacaueiros estão espalhados no meio da fl oresta. Foi lá que encontramos o maior deles, com quase 10 metros, com frutos brotando nos caules e tronco da árvore. Enquanto os homens se embrenham sob as copas dos cacaueiros para colher o fruto, as garotas se arrumam para iniciar o ritual da quebra. Vestem shorts e cami-setas, arrumam o cabelo e até passam o

batom. E garantem que isso não é somente porque o fotógrafo Ricardo Oliveira, do EM TEMPO, está por perto.

Quando os homens enchem os paneiros e completam a colheita, eles levam o cacau até o terreiro da comunidade e atiram sobre a relva onde as meninas Andreia, Natália, Sabrina, Rebeca e Fátima já estão acomo-dadas, em círculo, para descascar o fruto.

Depois de descascadas, as amêndoas são colocados em caixas de fermentação por alguns dias. Em seguida, são secas em estufas. Mas, aí, o tralho volta para os homens, com mais disposição para fi car sob o sol e movimentar o rodo.

Todas as garotas que trabalham no ex-trativismo do cacau, em Santa Rosa, estão concluindo o ensino básico e sonham com a faculdade. Andreia Mar está se preparando para liderar a sua comunidade e conquistar novos mercados para a venda do cacau. Para isso, ela está fazendo o curso Lide-rança do Instituto de Educação do Brasil (IEB), viajando a Brasília uma vez por mês.

— Aqui em Santa Rosa, vendemos o cacau a R$ 7,00 e o atravessador revende para

a cooperativa por R$ 37. É uma exploração e um dia vamos acabar com isso. Temos que negociar dire-to com a indústria do cacau –, diz Andreia, citando como exemplo os ribeirinhos de Boca do Acre, na confl uência do rio Acre com o Purus, no sul do Amazonas, que colhem o cacau e o vendem a uma cooperativa que benefi cia os frutos para enviá-los à Alemanha, onde viram chocolates em barra.

Ela reclama do valor do Bolsa Floresta, de apenas R$ 50. “O que signifi ca isso para uma família de cinco pessoas, por exem-plo?”. Mas é justa ao reconhecer o papel da Fundação Amazonas Sustentável (FAS), que deu tudo o que os ribeirinhos precisam para explorar o cacau nativo do Madeira.

— Não é exagero dizer que, aqui, a FAS é a nossa prefeitura! –, diz a futura líder Andreia.

MÁRIO ADOLFO

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É domingo de céu azul na RDS de Santa Rosa, mas as meninas trabalham na quebra do cacau. E fazem isso na maior alegria

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MANAUS, DOMINGO, 29 DE MAIO DE 2016F7EspecialEspecial

A natureza dá,

A NATUREZA TIRA

CACAUMADEIRA

Depois da cheia histórica do Madeira, em 2015, ribeirinho desistiu do cacau e foi ser garimpeiro

MÁRIO ADOLFO

Waldenor Queiroz Pinto mos-tra, na parede de madeira de sua casa, a marca da água, “cicatriz” da enchen-

te de 2014 que fez tantos estragos. Desde seu avô, Loreano Rodrigues Queiroz – um dos primeiros a desbra-var as matas do Madeira e construir o pequeno sítio –, o rio não subia tanto.

— Em mais de 120 anos, minha família vive aqui, desde meus avós, e nunca tinha visto nada igual. Per-demos quase tudo. Isso fez muitas famílias que viviam do cacau desis-tirem –, diz o ribeirinho.

Foi a natureza que deu as matas infestadas de pés de cacau. O que os botânicos tratam como “cacau nativo” ou “selvagem”. Mas, assim como a natureza dá, a natureza tira. Nos primeiros meses de 2014, vários municípios da Amazônia brasileira e boliviana foram afetados com a cheia histórica do rio Madeira, afetando os Estados brasileiros de Rondônia, Acre e Amazonas. Pelo lado boliviano, a região foi a do rio formador do Madeira, o Beni (juntamente com o Madre de Dios, do Peru).

Na região do Madeira, o rio engoliu

a fl oresta. E foi uma de-vastação nas plantações e no bolso dos p e q u e n o s agricultores ribeirinhos. De acordo com os bo-letins climá-ticos da época, o que aconteceu foi um episódio meteorológico típico do verão, chamado “Alta da Bolívia”, mas o fato é que, em 100 anos de medição, nunca se havia chegado a esta cheia inédita, próxima de 20 metros.

Na mesma RDS “Zé João”, o ribeiri-nho Fracinal Rodrigues Coelho perdeu 3 toneladas de cacau na cheia do rio. Hoje, o que colheu é pouco mais de 200 quilos. “Até a barcaça fi cou so-terrada pela lama que cobriu o sítio na vazante. Nunca vi o Madeira ser tão agressivo”, cometa Waldenor, que está tentando se reerguer depois da tragédia climática de 2014.

Para sobreviver, ele alugou uma balsa de garimpo e está varrendo o leito do rio com dragas, na esperança de que a qualquer hora possa chegar até a um fi lão do metal precioso e “bamburrar”.

Quando não é água, é o solNa RDS Bom Jesus, onde se produz

em terra fi rma, o problema não foi a água de 2014. Foi o verão de 2015. De acordo com João da Silva Corrêa, 34, foram seis meses sem chuva. O que torrou os cacaueiros.

— Tínhamos 800 mudas prontas pra produzir e perdemos tudo. Dava vontade de chorar, o “caboco” tra-balhar o ano inteiro e perder tudo de uma hora para outra.

João Corrêa acredita que tanto na várzea quanto em terra fi rme, os desas-tres ecológicos (cheia de 2014 e verão de 2015) servem para ensinar liçõe. De

acordo com o agricultor, no extrativismo todo mundo trabalha de forma errada e desordenada. São produtores que trabalham com o Sistema Agrofl orestal (SAF) e que recorrem a vários tipos de culturas para ter produção o ano todo.

— Aqui no Madeira, por exemplo, juntamos o plantio de cacau com os de banana, goiaba, macaxeira e açaí. Isso tudo ao Deus dará, sem saber ao certo o tempo de plantar, de trabalhar a muda, de podar, fazer o sombreamento. No caso do verão, faltou o sombrea-mento. Não estávamos preparados –, admite Corrêa.

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Ribeirinho retorna para casa, depois da colheita do cacau

Depois da enchente de 2014, é hora de começar mais um ciclo esperando que 2017 seja mais generoso que 2015, quando a enchente arrastou os cacaueiros

Além de gerar renda na comunidade, o cacau também serve de alimento

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Page 8: Especial - 29 de maio de 2016

MANAUS, DOMINGO, 29 DE MAIO DE 2016F8 EspecialEspecial

EXPEDIENTE

EDIÇÃO/REPORTAGEMMário Adolfo

FOTOGRAFIASRicardo Oliveira

DIAGRAMAÇÃOAdyel Vieira

TRATAMENTO DE IMAGENSKleuton Silva

RevisãoJoão Alves

em 2013, porém houve signifi -cativa queda na produção em 2014, e consequentemente na receita, devido à cheia recorde que ocorreu na Calha do Ma-deira em 2014. Cerca de 90% das famílias da RDS do Rio Ma-deira foram impactadas por esta cheia. Visando a antecipar possíveis impactos decorren-tes de novas cheias, a FAS promoveu em 2015 ações de conscientização e treinamento das famílias sobre temas tais como habitabilidade e adap-tação de cadeias produtivas.

EM TEMPO – Qual a es-tratégia de investimento da FAS para ampliar ainda mais esta produção?

Virgílio Viana – Em 2015, a FAS investiu em capacitação para os comunitários, promo-vendo um intercâmbio entre produtores da região da RDS do rio Madeira e de outros Estados, no Pará. O objetivo foi capacitar os ribeirinhos nas práticas de benefi ciamento do cacau, por meio do processo de fermentação, além de agregar valor às amêndoas de cacau, abrindo novos mercados e pos-sibilitando a comercialização do produto local para o mer-cado nacional.

Também empreendemos grande esforço com o objeti-vo de recuperar as condições produtivas após a enchente de 2014. Foram reconstruí-dos secadores e realizadas capacitações para a venda de subprodutos, como licores, doces e geleias, por meio do

Projeto Empreendedorismo Ribeirinho, uma parceria da FAS com o Sebrae que visa a fortalecer a geração de renda e a produção sustentável por meio do apoio à gestão de negócios de base comunitária.

EM TEMPO – É verdade que o cacau do Madeira abastece a indústria de chocolate da Alemanha, por exemplo?

Virgílio Viana – Não co-nheço produtores que já abas-teçam o mercado exterior. Estamos buscando melhorar os processos produtivos para agregar valor ao produto e en-tão investir na exportação do cacau da RDS do rio Madeira.

EM TEMPO – Existe nesse

caminho a fi gura do atra-vessador, é lógico que ele fatura três vezes mais em cima da força de trabalho dos caboclos que exploram o cacau nativo... Isto não é desigual?

Virgílio Viana – Sim, a fi -gura do atravessador e do regatão historicamente foram fatores de empobrecimento das comunidades ribeirinhas em razão do baixo preço pago aos seus produtos. Um dos investimentos que a FAS tem feito na região do Madeira é em barcos para auxiliar o trans-porte dos produtos diretamen-te aos mercados locais. Um exemplo é o barco Zagallo, que faz o transporte de mercadoria das próprias comunidades até a cidade de Manicoré.

Virgílio Viana

‘A FAS aposta no cacau do Madeira’

Desde 2013, as atividades de apoio à cadeia produtiva do

cacau desenvolvidas pela Fundação Ama-zonas Sustentável (FAS) contam com re-cursos do Bradesco e

do Fundo Amazônia, cooperação internacional que tem como principais doadores os governos da Noruega e Alemanha. Essa parceria tem como objetivo apoiar os investimentos de promoção da conservação e do uso sustentável das fl orestas no Bioma Amazônia.

A FAS é uma organizaç ã o brasileira nã o go-vernamental, sem fi ns lucrativos, de utilidade pú blica estadual e federal. Foi criada em 20 de dezembro de 2007, pelo Banco Bradesco,

em parceria com o governo do Estado do Amazonas. Posteriormente, passou a contar com o apoio da Coca-Cola Brasil (2009), do Fundo Amazô nia/BNDES (2010) e da Samsung (2010), alé m de outras parcerias em progra-mas e projetos desenvolvidos.

De acordo com o superintendente geral da Fundação, Virgílio Viana, no fi nal do ano passado, a ministra de Clima e Ambiente da Noruega, Tine Sundto� , veio até o Amazonas conhecer pessoalmente os projetos e, em seguida, durante a Conferência do Clima em Paris, anunciou uma nova doação da Noruega ao Fundo.

— Renovamos a nossa parceria com o Fundo Amazônia, com a aprovação de um novo pro-jeto com foco em cadeias produtivas, e agora pretendemos consolidar os projetos de desen-volvimento sustentável na Amazônia –, disse Sundto� . Nesta entrevista, o superintendente da FAS, Virgílio Viana, fala sobre as ação da FAS na Calha do Madeira. A entrevista:

MÁRIO ADOLFO

CACAUMADEIRA

EM TEMPO – O que era, em termos de organização e pro-dução, a RDS do rio Madeira antes da FAS?

Virgílio Viana – Antes da FAS, havia um investimento muito in-cipiente na produção e na orga-nização dos produtores de cacau. O que nós fi zemos foi investir em diferentes etapas da cadeia produtiva do cacau, desde a parte fi totécnica - ou seja, o manejo das plantações - até as estruturas de secagem, de benefi ciamento, até chegar a uma pequena unidade de produção de chocolate, que foi idealizada pela FAS e depois disso teve apoio de outros parceiros. Temos um olhar voltado para toda a cadeia produtiva do cacau, desde a produção até a secagem, o benefi ciamento, a produção do chocolate e a inserção desse cho-colate na merenda escolar.

EM TEMPO – Qual é a sua po-tencialidade e, hoje, até onde pode chegar a produção do

cacau dessa RDS?Virgílio Viana – Existe um

potencial enorme de expansão da produção do cacau em fun-ção da qualidade do solo e do clima, que são muito propícios ao cacau. Da nossa visão do ponto de vista estratégico, esta é uma área que deve ter não só uma expansão no ponto de vista da produção, mas também um investimento na certifi cação orgânica e de origem do cacau.

Em 2015, foram produzidas cer-ca de 11,6 toneladas de cacau, gerando uma receita bruta de R$ 672,64 para cada uma das 80 famílias produtoras.

EM TEMPO – São quantos os produtores de cacau na RDS do Madeira?

Virgílio Viana – Atualmente, apoiamos cerca de 80 famílias produtoras, do total de 1.027 residentes na RDS do rio Ma-deira, benefi ciando diretamente uma média de 320 pessoas na

RDS do rio Madeira. Apoiamos ainda outras atividades produti-vas importantes, como o açaí, a borracha e a castanha, na RDS do rio Madeira, uma vez que do total de 1.027 famílias muitas se dedicam a outras atividades.

EM TEMPO – Há quanto tempo a FAS vem investindo no cacau da região do rio Madeira?

Virgílio Viana – Com recursos do Fundo Amazônia e Bradesco, a FAS investiu, de 2010 a 2015, em nove cadeias produtivas prio-ritárias. Ao todo, foram benefi cia-das por estes investimentos 574 comunidades em 16 Unidades de Conservação estaduais no Estado do Amazonas – cobrindo uma área de abrangência de 10,8 milhões de hectares. Foram mais de 2,4 mil projetos distribuídos entre as nove cadeias.

A FAS vem investindo na RDS do rio Madeira desde 2008. O apoio à cadeia do cacau se intensifi cou

RICARDO OLIVEIRA

Virgílio Viana (no destaque) é o gerente da FAS que está apoiando os ribeirinhos da RDS do rio Madeira, no benefi ciamento de cacau

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