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Reqte. : MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Reqda. : JACINTA MERIGUETE COSTA S E N T E N Ç A Vistos etc. Cuidam os presentes autos de Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa , intentada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, em face de JACINTA MERIGUETE COSTA (então Secretária Municipal de Educação), partes devidamente qualificadas. Aduz-se na inicial, em síntese, que: 1. em 15/03/2010, o Sr. Marcelo Gentil de Farias, servidor público municipal, protocolizou na Promotoria de Justiça de Guarapari correspondência registrada sob o 4483 relatando que “foi protocolado junto a Prefeitura Municipal de Guarapari uma solicitação de informações funcionais em 02/02/2010 sob o nº 2010/02/2263 com cópia em anexo”, e que o Processo Administrativo encontra-se dentro da Secretaria Municipal de Educação de Guarapari no Setor de Recursos Humanos desde 08/02/2010 sem que até esta data tenha uma finalização, resposta ou pedido de esclarecimentos”; 2. foi enviado o ofício OF/PCGU/5ªPJC/118/10 à Secretaria Municipal de Educação requisitando informações acerca do fornecimento de resposta ao requerimento e, em caso negativo, o envio da exposição dos motivos da omissão; 3. a requerida encaminhou memorando da Gerência Setorial de Pessoal com a declaração de que foram prestadas todas as informações” nos autos do processo judicial nº 1502/10”; ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Vara dos Feitos da Fazenda Pública Estadual e Municipal, de Registros Públicos e do Meio Ambiente da Comarca de Guarapari/ES PROCESSO nº 021.10.005116-4

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Públicos … Pro - Guarapari164 SENTENCA acao civil... · notificação recomendatória, depois de transcorridos 99 dias do primeiro requerimento

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Reqte. : MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUALReqda. : JACINTA MERIGUETE COSTA

S E N T E N Ç A

Vistos etc.

Cuidam os presentes autos de Ação Civil Pública porAto de Improbidade Administrativa, intentada pelo MINISTÉRIOPÚBLICO ESTADUAL, em face de JACINTA MERIGUETE COSTA (entãoSecretária Municipal de Educação), partes devidamente qualificadas.

Aduz-se na inicial, em síntese, que:

1. em 15/03/2010, o Sr. Marcelo Gentil de Farias,servidor público municipal, protocolizou naPromotoria de Justiça de Guaraparicorrespondência registrada sob o nº 4483relatando que “foi protocolado junto a PrefeituraMunicipal de Guarapari uma solicitação deinformações funcionais em 02/02/2010 sob o nº2010/02/2263 com cópia em anexo”, e que o“Processo Administrativo encontra-se dentro daSecretaria Municipal de Educação de Guarapari noSetor de Recursos Humanos desde 08/02/2010 semque até esta data tenha uma finalização, resposta oupedido de esclarecimentos”;

2. foi enviado o ofício OF/PCGU/5ªPJC/118/10 àSecretaria Municipal de Educação requisitandoinformações acerca do fornecimento de respostaao requerimento e, em caso negativo, o envio daexposição dos motivos da omissão;

3. a requerida encaminhou memorando da GerênciaSetorial de Pessoal com a declaração de que“foram prestadas todas as informações” nos autos do“processo judicial nº 1502/10”;

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4. informado acerca da manifestação da requerida,o noticiante esclareceu que “existe um processojudicial protocolizado sob o nº 021.09.008820-0 quetramita na Vara dos Feitos da Fazenda Pública competição inicial nº 20090195438 que requer danosmateriais e morais pelo não recebimento de salárioreferente ao mês de setembro de 2009”, e que oprocesso administrativo nº 2263 de 02/02/2010versa sobre assunto diverso;

5. segundo o noticiante trata-se de solicitação deinformações sobre: 1 - não pagamento de 13ºsalário sobre uma carga horária de 18 horassemanais; 2 - não pagamento de rescisãocontratual ao término do ano letivo; 3 - nãoforneimento de vale transporte; 4 - nãopagamento de parte de salário do mês dedezembro/2009 e o motivo deste pagamentosomente poder ser feito em nome de terceiros, e 5- auxílio-alimentação;

6. o ofício OF/PCGU/5ªPJC/Nº168, com requisiçãoda cópia integral do processo administrativo nº2263/2010 e prazo de 10 (dez) dias para o seucumprimento, foi recebido na SEMED em26/04/2010 e a cópia não foi encaminhada até apresente data;

7. por meio de correspondência protocolizada naPromotoria de Justiça sob o nº 4579, o noticianteencaminhou cópia da petição inicial atinente aoprocesso nº 021.09.008820-0, evidenciando que aação trata de matéria diferente da veiculada noprocesso administrativo;

8. a requerida foi notificada de formarecomendatória (NOTIFICAÇÃORECOMENDATÓRIA Nº 006/2010) em

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03/05/2010 para: 1 - adotar as medidas necessáriaspara o cumprimento dos prazos estabelecidos naLei Orgânica Municipal de Guarapari no tocanteà prestação de informações e fornecimento decertidões; 2 - efetivamente prestar as informaçõesrequeridas no bojo do processo administrativo nº2263, e, por fim, 3 - informar ao Parquet asprovidências tomadas, no prazo de 05 (cinco)dias;

9. em 14/05/2010 a requerida remeteu resposta ànotificação e ao ofício OF/PCGU/5ªPJC/Nº168,com o seguinte teor: “a Gerência Setorial de Pessoaldesta Secretaria Municipal prestou as informaçõessolicitadas referentes ao Senhor Marcelo Gentil deFarias nos autos do processo judicial nº 1505/10 eequivocadamente, por se tratar das mesmasinformações, presumiu já ter fornecido os dadossolicitados. Ao tomar conhecimento que se tratava deassuntos diferenciados, a Secretaria retomou com oandamento do Processo Administrativo de nº 5264 de15/03/2010 e, conforme cópia em anexo, onde foramprestadas as informações solicitadas e dada ciência aoservidor em 13 de maio de 2010”;

10. consta do processo administrativo nº 5224,despacho datado de 12/05/2010 - e com ciência doservidor no dia posterior - que informa: “Quantoaos vales transportes, foram entregues as cartelasmensais com 50 vales transportes conforme recibosassinados pelo mesmo”, sem, contudo, apresentarresposta quanto aos demais questionamentos dorequerimento, já que o servidor solicitouinformações também sobre gratificação natalina,auxílio alimentação e outras verbas não pagaspela municipalidade;

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11. a requerida, responsável pela prestação dasinformações, enviou respostas de carátermeramente protelatório sem atender de formasatisfatória às requisições do Parquet;

12. A requerida, ignorando o que estatui a LOM, nãoprestou informações requeridas pelo servidormunicipal em 02/02/2010 (processoadministrativo nº 2010/2/2263), assim como nãorespondeu a novo requerimento do mesmoservidor (processo administrativo nº2010/3/5224), datado de 15/03/2010, onde pugnoupelo cumprimento dos prazos estabelecidos naLOM;

13. apenas com o envio de ofícios requisitórios enotificação recomendatória, depois detranscorridos 99 dias do primeiro requerimento e58 dias do requerimento que o reiterou, foiexarado despacho com resposta a um dos váriosquestionamentos apresentados pelo servidor;

14. a requerida também desprezou completamenteas atribuições do MP previstas em lei, tendo emvista que ofereceu respostas insuficientes, decaráter meramente protelatório, e que poderiamlevar à conclusão inverídica de que não houveomissão por parte da agente pública;

15. os ofícios remetidos pela requerida se limitaram aafirmar, enganosamente, que as informações játeriam sido prestadas em processo judicial, o queconstitui verdadeira afronta à instituição doMinistério Público, traduzindo-se numa má-féescancarada;

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16. verifica-se o intuito da requerida em delongar asapurações ministeriais, o que fere princípiosconstitucionais que regem a AdministraçãoPública;

17. o Ministério Pùblico ao requisitar informações ofez estipulando o prazo de 10 dias, previsto noart. 8º, § 1º, da Lei nº 7.347/85, quando pela LOMdeveriam as informações ser apresentadas noprazo de 8 (oito) dias;

18. a requerida, ao se negar a prestar as informaçõesrequeridas pelo servidor e ao tentar protrair asaveriguações do Parquet, feriu os princípiosconstitucionais que devem embasar a conduta doagente público, e incorreu em ato de improbidadetipificado no art. 11, caput e incs. I e II, da LIA.

Com base neste fático contexto, pede-se aindisponibilidade de bens da requerida, bem como, ao final, a condenaçãoda mesma nas sanções previstas no art. 12, inc. III, da LIA, além dopagamento de indenização por dano extrapatrimonial coletivo ocasionadoao ente público, no importe de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais).

A inicial foi instruída com documentos (fls. 25/69).

Regularmente notificada, a requerida ofertou defesaprévia às fls. 77/89, onde arguiu preliminar de carência de ação, aduzindo,no mérito, a inexistência de prática de ato de improbidade administrativa ea inocorrência de dano extrapatrimonial coletivo.

A decisão de fls. 91/92, recepcionou a inicial eindeferiu o pedido liminar de indisponibilidade de bens.

A requerida foi citada e apresentou contestação (fls.98/116, onde reproduziu os termos da defesa prévia.

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Réplica às fls. 118/124.

Audiência preliminar às fls. 139/140.

AIJ às fls. 148/152

As partes apresentaram alegações finais na forma dememoriais (fls. 155/164 e 167/187).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório, em síntese. Decido.

A preliminar de carência de ação, arguida na defesaprévia, e não enfrentada na decisão que recebeu a inicial, não mereceacolhida, porquanto confunde-se com o mérito, já que intenta demonstrara inocorrência de recusa, na espécie, às requisições encaminhadas peloParquet.

Rejeito, assim, a preliminar.

No mérito, cumpre enfatizar, preliminarmente, que,segundo reza o inciso VI do artigo 129 da Constituição Federal, o membrodo Ministério Público pode "expedir notificações nos procedimentosadministrativos de sua competência, requisitando informações e documentos parainstruí-los, na forma da lei complementar respectiva". Uma leitura apressada eequivocada do citado dispositivo normativo autoriza conclusões nosentido de que o Promotor de Justiça apenas pode expedir requisições nocurso de procedimentos de investigação formalmente instaurados, sendovedada a expedição de requisições "avulsas", preparatórias, semprocedimento ou inquérito civil público.

Contudo, uma análise conglobante da ordemnormativa revela que o Promotor de Justiça está plenamente autorizado aexpedir notificações e requisições sem a necessidade do prévio

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procedimento administrativo ou ICP, sendo importante assinalar que talexpediente visa facilitar o desempenho ágil das excelsas missõesinstitucionais do Ministério Público, na medida em que permite a rápidacompreensão da verdadeira dimensão dos fatos, evitando o agravamentodo problema ou a instauração inútil de um procedimento.

Nessa esteira, apesar de o artigo 129, inciso VI, daConstituição Federal apontar que o Ministério Público apenas estáautorizado a expedir requisições para instruir procedimentos, tal preceitoconstitucional não veda, de forma alguma, que outros comandos legaisoutorguem o poder de requisição genérico, ou seja, não há limitaçãoconstitucional. O artigo 129, inciso VI, da CF apenas determinou que podeo órgão do Ministério Público expedir requisições para instruir osprocedimentos administrativos, não tendo o preceito constitucionalrestringido a expedição de requisições à instrução de procedimentosadministrativos.

Nessa quadra, a própria Constituição autoriza que leisinfraconstitucionais estabeleçam outras funções ao Ministério Público,desde que respeitada sua finalidade institucional. Em consonância com oditame constitucional, o artigo 8°, § 1°, da Lei n.° 7.347/85, estabelece que"o Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, OUrequisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações,exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10(dez) dias úteis".

Observa-se, portanto, que diante da conjunçãoalternativa "ou" do artigo 8°, § 2°, da Lei da Ação Civil Pública, é indene dedúvidas que o órgão de execução do Ministério Público ou instaurainquérito civil e expede as requisições para instruí-lo, ou requisitadiretamente as informações, certidões, exames e perícias, sem anecessidade do procedimento administrativo, orientação harmônica com oartigo 129, IX, da CF, o que, na prática, facilita a atuação do Promotor deJustiça, que pode agir de forma mais célere e eficiente, eis que desoneradodas formas estéreis, inúteis e burocráticas de um formal procedimento, queapenas contribui para o agravamento da lesão difusa investigada peloMinistério Público, frustrando a força normativa da Constituição.

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A conjunção alternativa "ou" do artigo 8°, § 2°, da Leida ACP espanca, pois, todas as dúvidas. É inegável, também, que taldisposição legal encontra abrigo no artigo 129, IX, da CF, tendo sidorecepcionada pela ordem constitucional.

Nesta esteira, segundo o artigo 26, inciso V, da Lei n.°8.625/92, compete ao Ministério Público "praticar atos administrativosexecutórios, de caráter preparatório", dentro os quais destaca-se a expediçãode requisições, ainda que sem o prévio procedimento administrativo, paraavaliações preliminares sobre fatos nebulosos - como de restoexpressamente previsto no inc. I, alínea “b”, do mesmo preceptivo legal -,que, de imediato, não reclamam a burocrática instauração de ICP.

Este entendimento é sufragado pelo egrégioSUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

“MANDADO DE SEGURANÇA. PREFEITOMUNICIPAL. REQUISIÇÃO DE INFORMAÇÕESPELO MINISTÉRIO PÚBLICO. PESSOASCONTRATADAS PELA PREFEITURA. EMBARGOSDE DECLARAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535, DOCPC. SÚMULA 284/STF. DIREITO DE CERTIDÃO.DECISÃO NOS LIMITES CONSTITUCIONAIS.INDEPENDÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO.DIRETRIZES TRAÇADAS PELA ADMINISTRAÇÃOSUPERIOR DO PARQUET ESTADUAL.OBRIGATORIEDADE. AUSÊNCIA DEPREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF.DESNECESSIDADE DE PRÉVIA INSTAURAÇÃO DEINQUÉRITO CIVIL OU PROCEDIMENTOADMINISTRATIVO. ARTIGO 26, I, "B", DA LEI Nº8.625/93. I - Trata-se de mandado de segurança impetradopelo ora recorrente, prefeito municipal de Minas Gerais,contra o ato do Ministério Público consubstanciado narequisição de informações sobre as pessoas nomeadas,

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contratadas e terceirizadas por aquela Prefeitura a partir de05.10.98. V - Não se faz necessária a prévia instauração deinquérito civil ou procedimento administrativo para que oMinistério Público requisite informações a órgãos públicos -interpretação do artigo 26, I, "b", da Lei nº 8.625/93. VI -Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.”(STJ-1ª Turma, REsp. 873.565/MG, Relator MinistroFRANCISCO FALCÃO, j. 05.06.2007, DJ 28.06.2007, p.880).

Conclui-se, portanto, que a Constituição Federal, a Leida Ação Civil Pública e a Lei Orgânica do Ministério Público autorizam aexpedição de requisições e notificações sem a necessidade de inquérito civilpúblico ou procedimento administrativo.

Superada a digressão, vê-se que, no caso presente, ainstauração, pelo Ministério Público Estadual, através da 5ª Promotoria deJustiça Cível de Guarapari, da Averiguação Preliminar nº 016/10, teve porescopo a apuração de eventual omissão perpetrada pela requerida, nacondição de Secretária Municipal de Educação, quanto ao fornecimento deinformações solicitadas pelo servidor municipal Marcelo Gentil de Farias,o que culminou com o encaminhamento de ofícios requisitórios enotificação recomendatória pelo Parquet tidos como não suficientementerespondidos.

Nessa esteira, imputa-se à requerida conduta ofensivaaos princípios reitores da administração pública (CF/88, art. 37),consubstanciada na omissão de resposta a requerimento administrativoformulado por servidor público municipal, dentro do prazo estabelecidona LOM, bem como na insuficiência de informações requisitadas pelo MPno bojo do reportado procedimento de averiguação preliminar (AP nº016/10).

Como cediço, as sanções cominadas na Lei 8.429/92têm como destinatário o agente público que, por ação ou omissão, viole osdeveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, lealdade às

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instituições e que notadamente importem em enriquecimento ilícito (art.9º), causem prejuízo ao erário público (art. 10) ou atentem contra osprincípios da Administração Pública (art. 11), compreendida nesse últimoitem a lesão à moralidade administrativa.

Outrossim, tem-se que "a probidade administrativa é umaforma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial daConstituição, que pune o ímprobo com a suspensão de direitos políticos (art. 37,§4º). A probidade administrativa consiste no dever de o funcionário servir aAdministração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, semaproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou deoutrem a quem queira favorecer. O desrespeito a esse dever é que caracteriza aimprobidade administrativa. Cuida-se de uma imoralidade administrativaqualificada. A improbidade administrativa é uma imoralidade qualificada pelodano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem (...)." (SILVA,José Afonso, in Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª ed., São Paulo,Malheiros Editores, 2005, p-669).

Ademais, considerando a gravidade das sanções erestrições impostas ao agente público pela legislação pertinente, bem comoas conseqüências que podem advir para a sociedade, toda e qualquerdenúncia/notícia de improbidade administrativa deve ser analisada com amaior acuidade possível, isto porque uma interpretação ampliativa poderáacoimar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis decorreção administrativa, desde que ausente a má-fé do agente, indo alémdo que pretendeu o legislador, o que não se admite.

A má-fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal eímprobo e a ilegalidade só adquire o “status” de improbidade quando aconduta antijurídica fere os princípios constitucionais da AdministraçãoPública coadjuvados pela má-intenção do agente. Em outros termos, paraque reste configurado o ato de improbidade administrativa por infraçãoaos princípios da Administração Pública, impõe-se que fique demonstradoo dolo do agente na prática do ato, sob pena de adoção de modalidade de

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responsabilidade objetiva em situação não aventada pela legislaçãonacional.

Da obra de Hely Lopes Meirelles, atualizada porArnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes, colhe-se o seguinte trecho:

“(...) haja quem defenda a responsabilidade civil objetivados agentes públicos em matéria de ação de improbidadeadministrativa, parece-nos que o mais acertado é reconhecera responsabilidade apenas na modalidade subjetiva. Nemsempre um ato ilegal será um ato ímprobo. Um agentepúblico eventualmente incompetente, atabalhoado ounegligente não é necessariamente um corrupto ou desonesto.O ato ilegal, para ser caracterizado como ato deimprobidade, há de ser doloso, ou, pelo menos, de culpagravíssima” (Mandado de segurança, 27ª ed., São Paulo:Malheiros, 2004, p. 217).

Na mesma toada, Marcelo Figueiredo também fazimportante consideração sobre o tema:

“(...) cumpre observar que a presente lei pretende colher emsuas malhas os atos de improbidade, que comportam, comoveremos ao longo dos comentários, diversos 'graus', comdiferentes conseqüências jurídicas. Nessa direção, não nosparece crível punir o agente público, ou equiparado, quandoo ato acoimado de improbidade é, na verdade, fruto deinabilidade, de gestão imperfeita, ausente o elemento de'desonestidade', ou de improbidade propriamente dita. Énecessário ampla investigação na conduta do agente paraverificar se a ilegalidade praticada pode ou não sercatalogada como ato de improbidade” (ProbidadeAdministrativa, Comentários à Lei n° 8.429/92 eLegislação Complementar, 6ª ed., Malheiros, p. 49).

Ocorre que, do acervo probatório subexamine, nãoemerge a evidenciação de dolo ou má-fé da requerida, seja quanto ao

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atendimento do requerimento administrativo formulado pelo servidormunicipal Marcelo Gentil de Farias, seja no tocante ao atendimento dasrequisições enviadas pelo MP.

No que se refere às solicitações administrativas doservidor, não há nos autos qualquer elemento de prova que descortine aciência ou interferência da requerida quanto à sua inaugural e indevidaparalisação no setor de RH responsável pelas informações, não exsurgindoda cópia do processo administrativo nº 2010/3/5224 (fls. 53/57), através doqual pugnou o servidor pelo cumprimento dos prazos estabelecidos naLOM, qualquer indevido retardamento passível de ser atribuído à esfera deatuação da requerida.

Neste ponto, as questões relativas à suficiência dasinformações, e/ou à satisfação ou inconformismo do servidor com aresposta fornecida no reportado procedimento pelo setor competente nãoatrai, de per si, qualquer pecha de improbidade à esfera jurídica darequerida, refletindo, antes, questão que se liga à esfera individual dodestinatário das informações, ante a existências de vias adequadas para adedução de eventual pretensão voltada ao recebimento dos benefíciosquestionados, a que julgava fazer jus.

De observar-se, ainda, que, ao que se denota dosdocumentos carreados com a exordial, houve, sim, da parte da requerida,respostas às requisições enviadas pelo MP, como se nota do MEMOSEMED Nº 060/2010 (fls. 34/35), que objetivou responder o ofícioOF/PCGU/5ªPJC/Nº118/10, e do OFÍCIO SEMED Nº 116/2010 (fls. 52/57),que intentou atender aos ofícios OF/PCGU/5ªPJC/Nº168/2010 eOF/PCGU/5ªPJC/Nº181/10 (este último relativo à notificaçãorecomendatória), inclusive com envio de cópias do procedimentoadministrativo nº 5224, onde foram prestadas as informações dirigidas aopleito administrativo do servidor municipal Marcelo Gentil de Farias.

É bem verdade que houve alguns equívocos e atrasosnas informações enviadas ao Parquet, mas referidos dados foram apenasrepassados pela requerida, já que lastreados em elementos de informação

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fornecidos pelo setor competente que detinha seu conhecimento. Ademais,o motivo das apuradas divergências e/ou apontadas insuficiências nasinformações repassadas ao Parquet restou razoavelmente esclarecido pelogerente do setor de RH responsável pelas informações, de cujodepoimento é possível ainda extrair a ausência de qualquer tergiversaçãoou omissão na postura da requerida quanto ao atendimento às requisiçõesoriundas do MP.

Segue trecho do depoimento:

“que o depoente é gerente do setor de recursos humanos daPMG; que se recorda de um requerimento administrativoformulado pelo servidor Marcelo; que a resposta dada a talrequerimento, é a que consta às fls. 57; que com certeza oatraso na resposta administrativa foi devido ao volume detrabalho; que a requerida enviou um memorando aodepoente para que o mesmo desse a informação requisitadapelo MP; que a requisição passava pela Procuradoria doMunicípio antes de serem prestadas as informações; que osfuncionários da educação abrem muitos processos com omesmo teor; que acredita o depoente que a resposta buscadapelo servidor fora prestada a contento no bojo do processojudicial mencionado no memorando interno de fls. 35; que arequerida procurou o depoente em mais de umaoportunidade para atendimento das requisições do MP; queem relação ao servidor Marcelo, ao que se recorda, não hánenhuma pendência (...); que a primeira providênciaadotada pela requerida quando do recebimento de requisiçãodo MP era o despacho encaminhando o expediente para osetor do depoente; que segundo orientação da ProcuradoriaGeral à época, todo requerimento ou requisição deveria serprimeiramente submetido ao crivo da Procuradoria; que nãotem conhecimento preciso da razão da orientação dada pelaProcuradoria Geral à época; que as requisições do MP foramapenas através de ofício, sem encaminhamento de portaria

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ou outro documento; que o depoente tinha a conduta dedespachar no mesmo dia ou no dia seguinte as requisiçõesquando as mesmas chegavam ao seu setor; que não sabedizer se no caso presente houve algum retardamento noatendimento das requisições do MP; que em geral os atrasoseram ocasionados ante a necessidade de prévia submissão darequisição ao setor jurídico; que não sabe dizer se no casopresente a requerida adotou a conduta de enviarpreviamente as requisições do MP à Procuradoria; quehouve mudança do Procurador Geral do Município; queatualmente não tem mais ocorrido retardamento noatendimento das requisições do MP (...); que não se lembrao Procurador na época dos fatos; que não se lembra se aorientação do Procurador Geral para submissão dasrequisições à procuradoria era escrita; que não sabe onde eralançada a manifestação da Procuradoria, quando a mesmase manifestava previamente; que as informações dadas pelodepoente eram através de memorando interno, para que arequerida por ofício encaminhasse ao MP; que verificando aresposta de fls. 57, é possível constatar que, de fato, nãoforam respondidos, de forma analítica, todos os pontosquestionados no requerimento de fls. 55/56, mas entendeque não houve omissão; que é possível até que muitos dosrequerimento tenham obtido resposta em outroprocedimento administrativo” (ROMILSONPRAVEZANI, fls. 151/152).

O reportado testemunho confere credibilidade aodepoimento prestado em juízo pela requerida, nos moldes que seguem:

“que até o envio do primeiro ofício pelo MP, o processoadministrativo do servidor Marcelo estava parado no setorde recursos humanos; que não sabe o motivo pelo qual oprocesso administrativo ficou parado no setor de recursoshumanos sem a devida resposta; que acredita que o processoficou no setor mencionado sem resposta porque o Chefe do

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Setor acreditava que as informação perseguida pelo servidorjá havia sido prestada no bojo de um processo judicial; queao receber o primeiro ofício do MP encaminhou a requisiçãopara o setor de recursos humanos; que na sequência, enviouao MP a resposta do setor competente, como consta às fls.34/35; que a depoente não confirmou a fidedignidade dainformação constante do memorando de fls. 35, pois confiouna mesma; que em relação à segunda requisição do MP, adepoente atendeu, enviando cópia integral do processoadministrativo do servidor, explicando a divergência deinformações (fls. 52/57); que em relação à notificaçãorecomendatória de fls. 48/49, entende que todas asinformações que haviam para serem prestadas relativamenteà pasta funcional do servidor, foram prestadas; que noentanto o servidor na verdade não concordava com asinformações, porque se sentia não atendido, achando termais direitos; que o servidor em questão buscava receberdireitos por uma substituição informal levada a efeito, semautorização da Secretaria de Educação, o que é irregular;que o servidor em questão esteve diversas vezes no setor derecursos humanos, e recebeu verbalmente a explicaçãoquanto a não ter direito aos benefícios que procuravareceber, objeto de seu requerimento administrativo; (...) quehavia uma orientação do Procurador Geral do Município,para que todas as requisições dirigidas aos secretários fossemprimeiramente enviadas para a Procuradoria, o que, àsvezes, retardava a resposta ao MP; que na maioria das vezesera a própria Procuradoria que preparava as informaçõescom base nos dados fornecidos pelos secretários; que no casodos autos, a depoente, com medo de perder o prazo, seantecipou e enviou a requisição para o setor competente,repassando a informação posteriormente para o MP; que nopróprio documento que o MP encaminhava a depoente davaorientação no próprio documento, para que fossem prestadasas informações requisitadas; que a depoente também

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chamava o gerente do setor alertando o mesmo para que asinformações foram prestadas; que a resposta à notificaçãorecomendatória é a de fls. 52 e ss.” (JACINTAMERIGUETE COSTA, fls. 150).

Não identifico nos autos, portanto, elemento deconvicção que aponte na direção de uma indevida e/ou maliciosa ocultaçãode informações pela requerida, ou mesmo deliberada tentativa deinterferência na apuração levada a efeito pelo Parquet por meio de condutadolosa de fornecimento de dados incorretos ou insuficientes.

Ao revés, é possível extrair do acervo probatório ocorreto encaminhamento interno, pela requerida, das requisições enviadaspelo MP, e a ocorrência de equívocos no trâmite dos procedimentosadministrativos deflagrados pelo servidor municipal Marcelo Gentil deFarias, bem como na tempestividade e completude das informaçõessolicitadas, perpetrados, todavia, de forma involuntária, não pelarequerida, mas pelo setor tecnicamente responsável pelo atendimento àsinformações perseguidas.

Daí não vislumbrar a ocorrência, in casu, de atos deimprobidade administativa passíveis de enquadramento no art. 11, caput, eincs. I e II, da LIA, o que, a seu turno, possui o condão de afastar, também,o pleito de condenação em danos extrapatrimoniais coletivos, de resto nãoevidenciados (STJ-1ª Turma, REsp. nº 821891/RS, Relator Ministro LUIZFUX, j. 08/04/2008, Dje 12/05/2008).

À luz do exposto, JULGO IMPROCEDENTES ospedidos, e, em conseqüência, com fulcro no art. 269, I, do CPC, JULGOEXTINTO o processo, com resolução de mérito.

Sem condenação em custas e honorários advocatíciospor se tratar de demanda proposta pelo MP (CF/88, art. 128, § 5º, inc. II, al."a").

Após o trânsito em julgado, arquivem-se.

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P.R.I.

Guarapari/ES, 17 de maio de 2012.

GUSTAVO MARÇAL DA SILVA E SILVA

Juiz de Direito

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