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 PONTA GROSSA - PARANÁ 2009 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Dierone César Foltran Júnior Elenice Parise Foltran Licenciaturas ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA 1

Estrutura-e-Funcionamento-da-Educação-Básica1 (1)

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EDUCAO A DISTNCIA

LicenciaturasESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DA EDUCAO BSICA 1Dierone Csar Foltran Jnior Elenice Parise Foltran

pONTA gROSSA - pARAN 2009

CRDITOSJoo Carlos Gomes Reitor Carlos Luciano Santana Vargas Vice-Reitor Pr-Reitoria de Assuntos Administrativos Ariangelo Hauer Dias - Pr-Reitor Pr-Reitoria de Graduao Graciete Tozetto Ges - Pr-Reitor Diviso de Educao a Distncia e de Programas Especiais Maria Etelvina Madalozzo Ramos - Chefe Ncleo de Tecnologia e Educao Aberta e a Distncia Leide Mara Schmidt - Coordenadora Geral Cleide Aparecida Faria Rodrigues - Coordenadora Pedaggica Sistema Universidade Aberta do Brasil Hermnia Regina Bugeste Marinho - Coordenadora Geral Cleide Aparecida Faria Rodrigues - Coordenadora Adjunta Edu Silvestre de Albuquerque - Coordenador de Curso Colaborador Financeiro Luiz Antonio Martins Wosiak Colaboradora de Planejamento Silviane Buss Tupich Colaboradores em EAD Dnia Falco de Bittencourt Jucimara Roesler Colaboradores de Informtica Carlos Alberto Volpi Carmen Silvia Simo Carneiro Adilson de Oliveira Pimenta Jnior Juscelino Izidoro de Oliveira Jnior Osvaldo Reis Jnior Kin Henrique Kurek Thiago Luiz Dimbarre Thiago Nobuaki Sugahara Colaboradores de Publicao Eloise Guenther - Diagramao Ceslau Tomaczyk Neto - Ilustrao Colaboradores Operacionais Edson Luis Marchinski Joanice Kuster de Azevedo Joo Mrcio Duran Inglz Maria Clareth Siqueira Marin Holzmann Ribas

Todos os direitos reservados ao Ministrio da Educao Sistema Universidade Aberta do BrasilFicha catalogrfica elaborada pelo Setor de Processos Tcnicos BICEN/UEPG.

F671e

Foltran, Elenice Parise Estrutura e funcionamento da educao bsica./ Elenice Parise Foltran e Dierone Csar Foltran Jnior. Ponta Grossa : Ed. UEPG, 2009. 153p. il. Licenciaturas - Educao a Distncia. 1. Estado, Educao e Sociedade. 2. Polticas educacionais. 3. Escola Pblica - construo. 4. Educao bsica. 5. Educao - modalidades. 6. Professor - formao e profissionalizao. I. T. CDD : 370.19

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA Ncleo de Tecnologia e Educao Aberta e a Distncia - NUTEAD Av. Gal. Carlos Cavalcanti, 4748 - CEP 84030-900 - Ponta Grossa - PR Tel.: (42) 3220-3163 www.nutead.uepg.br 2009

ApRESENTAO INSTITUCIONALPrezado estudante Inicialmente queremos dar-lhe as boas-vindas nossa instituio e ao curso que escolheu. Agora, voc um acadmico da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), uma renomada instituio de ensino superior que tem mais de cinqenta anos de histria no Estado do Paran, e participa de um amplo sistema de formao superior criado pelo Ministrio da Educao (MEC) em 2005, denominado Universidade Aberta do Brasil (UAB). O Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) no prope a criao de uma nova instituio de ensino superior, mas sim, a articulao das instituies pblicas j existentes, possibilitando levar ensino superior pblico de qualidade aos municpios brasileiros que no possuem cursos de formao superior ou cujos cursos ofertados no so suficientes para atender a todos os cidados. Sensvel necessidade de democratizar, com qualidade, os cursos superiores em nosso pas, a Universidade Estadual de Ponta Grossa participou do Edital de Seleo UAB n 01/2006-SEED/MEC/2006/2007 e foi contempladas para desenvolver seis cursos de graduao e quatro cursos de ps-graduao na modalidade a distncia. Isso se tornou possvel graas parceria estabelecida entre o MEC, a CAPES e as universidades brasileiras, bem como porque a UEPG, ao longo de sua trajetria, vem acumulando uma rica tradio de ensino, pesquisa e extenso e se destacando tambm na educao a distncia, A UEPG credenciada pelo MEC, conforme Portaria n 652, de 16 de maro de 2004, para ministrar cursos superiores (de graduao, seqenciais, extenso e psgraduao lato sensu) na modalidade a distncia. Os nossos programas e cursos de EaD, apresentam elevado padro de qualidade e tm contribudo, efetivamente, para a democratizao do saber universitrio, destacandose o trabalho que desenvolvemos na formao inicial e continuada de professores. Este curso no ser diferente dos demais, pois a qualidade um compromisso da Instituio em todas as suas iniciativas. Os cursos que ofertamos, no Sistema UAB, utilizam metodologias, materiais e mdias prprios da educao a distncia que, alm de facilitarem o aprendizado, permitiro constante interao entre alunos, tutores, professores e coordenao. Este curso foi elaborado pensando na formao de um professor competente, no seu saber, no seu saber fazer e no seu fazer saber. Tambm foram contemplados aspectos ticos e polticos essenciais formao dos profissionais da educao. Esperamos que voc aproveite todos os recursos que oferecemos para facilitar o seu processo de aprendizagem e que tenha muito sucesso na trajetria que ora inicia. Mas, lembre-se: voc no est sozinho nessa jornada, pois far parte de uma ampla rede colaborativa e poder interagir conosco sempre que desejar, acessando nossa Plataforma Virtual de Aprendizagem (MOODLE) ou utilizando as demais mdias disponveis para nossos alunos e professores. Nossa equipe ter o maior prazer em atend-lo, pois a sua aprendizagem o nosso principal objetivo. EQUIPE DA UAB/ UEPG

SUMRIO PALAVRAS DOS PROFESSORES OBJETIVOS E EMENTA 7 9

A RELAO ENTRE ESTADO, EDUCAOE SOCIEDADEDE EDUCAO

SEO 1- AS TRANSFORMAES DA SOCIEDADE CONTEMPORNEA SEO 2- AS INFLUNCIAS INTERNACIONAIS NA ATUAL PROPOSTA

1113 19

A pOLTICAS EDUCACIONAIS, DAS REFORMAS CONSTRUO DA ESCOLA pBLICA A pARTIR DASE A LDB N0 9394/96

DE ENSINO, DOS pLANOS NACIONAIS DE EDUCAO E DO FINANCIAMENTO DA EDUCAO

SEO 1- ANTECEDENTES HISTRICOS, SOCIAIS E POLTICOS DASREFORMAS EDUCACIONAIS SEO 2- AS ATUAIS LEIS DA EDUCAO: CONSTITUIO FEDERAL DE 1988

2930 55

A EDUCAO BSICA

SEO 1- ASPECTOS GERAIS DA ESTRUTURA PEDAGGICADA EDUCAO BSICA SEO 2- A EDUCAO INFANTIL SEO 3- O ENSINO FUNDAMENTAL 81

7173 76

SEO 4- O ENSINO MDIO

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MODALIDADES DA EDUCAO120 123

SEO 1- EDUCAO PROFISSIONAL SEO 2- EDUCAO ESPECIAL SEO 3- EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS SEO 4- EDUCAO A DISTNCIA

105107 113

FORMAO E pROFISSIONALIZAODO pROFESSOREDUCAO

SEO 1- FORMAO E ATUAO DOS PROFESSORES SEO 2- PROFISSIONALIZAO E VALORIZAO DOS PROFISSIONAIS PALAVRAS FINAIS141

131132 DE

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pALAVRAS DOS pROFESSORESAcadmico! Voc est iniciando uma nova disciplina, dedicada compreenso da organizao da educao nacional, nos seus aspectos histricos, polticos e, principalmente na sua base legal. Voc encontrar o texto-base, atalhos para a internet, bibliografia, informaes complementares e atividades para a sua reflexo. Ao final de cada unidade, voc encontrar tambm uma bibliografia com autores que podem ser consultados para complementar os seus estudos. No decorrer destes encontros textuais, voc ir revisar e analisar a Estrutura e Funcionamento da Educao Bsica, destacando-se os seguintes aspectos: Aconstruodaescolapblicaapartirdaspolticaseducacionais,das reformas de ensino, dos planos nacionais de educao e do financiamento da educao AsrelaesentreEstado,educaoesociedade; AEducaoBsica; Modalidadesdaeducao; Formaoeprofissionalizaodoprofessor. No desenvolvimento de cada uma destas unidades, voc encontrar um encaminhamento terico e atividades para fixao e aplicao do contedo trabalhado. A dimenso dada aos temas de ordem legal, e cabe a voc, a aplicao dos princpios da escola brasileira, compreendendo, discutindo, questionando e aperfeioando-os a partir da reflexo sobre a sua prpria prtica no mbito da escola em que atua ou atuar. Esta disciplina pretende oferecer subsdios para que voc possa conhecer, compreender e discutir a organizao da educao brasileira e suas bases legais, pois o fazer profissional dentro da escola est intimamente relacionado forma como a educao estruturada e organizada. A legislao educacional deve servir como suporte inspirador do processo educativo e no como cerceador da criao e da liberdade dos educadores! Tenha um bom proveito nesta disciplina!

OBJETIVOS E EMENTAObjetivOsEspera-se possibilitar a voc, contextualizar a organizao da educao brasileira nos seus aspectos histricos, polticos, sociais, econmicos e educacionais. Espera-se tambm que voc compreenda as relaes entre educao, Estado e sociedade. E, alm disso, espera-se ainda que voc possa conhecer e entender as questes educacionais presentes na Constituio Federal de 1988 e os ordenamentos presentes na Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional n 9394/96 definidos para a educao bsica.

ementaEstrutura e Funcionamento da Educao Bsica. Anlise das relaes entre educao, Estado e sociedade. Estudo da organizao da educao brasileira: dimenses histricas, polticas, econmicas e educacionais. Anlise da educao na Constituio Federal de 1988 e Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (Lei 9.394/96).

CrOnOgramaA seguir voc encontrar uma sugesto para a sua dedicao ao estudo nesta disciplina: UNIDADE1 - As relaes entre Estado, educao e sociedade 2 - A construo da escola pblica a partir das polticas educacionais, das reformas de ensino, dos planos nacionais de educao e do financiamento da educao 3 - A educao bsica 4 - Modalidades da educao 5 - Formao e profissionalizao do professor

CARGA HORRIA12 horas 16 horas

16 horas 12 horas 12 horas

A

relao entre Estado, educao e sociedade

ObjetivOs De aPrenDiZagemAo final desta unidade voc ter subsdios para: Entender as mudanas que esto ocorrendo na sociedade, no mbito poltico, econmico e social, e a relao dessas mudanas com a educao. Compreender o papel do Estado na atual sociedade e a sua relao com a educao.

rOteirO De estUDOsSEO 1 As transformaes da sociedade contempornea SEO 2 As influncias internacionais na atual proposta de educao

UNIDADE I

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pARA INCIO DE CONVERSA

Voc j deve ter ouvido falar sobre a revoluo tecnolgica, globalizao da economia, era digital, mudanas no mundo do trabalho. E o que isso tem a ver com a educao? Tudo! Essas mudanas esto favorecendo o surgimento de uma nova sociedade. Tanto no Brasil como no mundo est ocorrendo uma abertura poltica e principalmente econmica. Ou seja, crescem as corporaes, as megafuses entre as indstrias nos mais variados setores em busca de sobrevivncia. Voc, j deve ter notado que isso um processo paradoxal, porque ao mesmo tempo em que algumas fronteiras caem diante de um mercado mundial que se expande, outras se reforam. Progressivamente, os pases esto perdendo a sua autonomia econmica e, junto com ela, sua autonomia poltica. Essas transformaes incidem tanto sobre a cultura como sobre a educao, medida que impem novas polticas para a educao e assim novos desafios escola. (Santos e Andrioli, 2005) Diante desse quadro, no h como pensar a educao isolada do prprio contexto sociopoltico e econmico. Esta situao j levanta algumas reflexes, por exemplo: como a educao deve ser direcionada, de forma autnoma ou submissa em relao a esse contexto? Em outras palavras, em que medida a educao afetada por esse contexto e em que medida ela possui autonomia perante as transformaes e oscilaes polticas e sociais? Como educar se, de acordo com a lgica do mercado, a prpria educao passa a ser uma simples mercadoria oferecida de modo semelhante a qualquer objeto de consumo, no mercado global? Identificar os desafios que esta realidade coloca para o trabalho educativo uma tarefa que continua em aberto. Como voc pode perceber, so questes bastante complexas que se apresentam neste cenrio. Por isso, por estas questes que voc, iniciar o seu estudo, as suas reflexes. A seguir, voc encontrar alguns subsdios que o ajudaro a entender as relaes entre sociedade, Estado e educao.

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AS TRANSFORMAES DA SOCIEDADE CONTEMpORNEA

Para comear, preciso entender que transformaes so essas e como elas se articulam. Por isso, num primeiro momento, voc estudar a globalizao, suas caractersticas e princpios fundamentais; e, na seqncia, o texto apresenta algumas reflexes sobre a poltica neoliberal e suas conseqncias para o trabalho educativo. No final do sculo XX, o capitalismo entra em um processo de reestruturao e integrao econmica, que envolve o progresso cientfico em reas como as telecomunicaes e informtica, a privatizao de amplos setores de bens e servios pertencentes ao Estado, a busca pela eficincia e competitividade e a desregulamentao do comrcio entre os pases, com o enfraquecimento das fronteiras econmicas e procura de liberdade de trnsito tanto para pessoas como para mercadorias, uma espcie de comrcio universal. Isso tudo vem sendo chamado de globalizao. Segundo Santos e Andrioli (2005) a globalizao uma tendncia internacional do capitalismo que, juntamente com o projeto neoliberal, impe aos pases perifricos a economia de mercado global sem restries, a competio ilimitada e a minimizao do Estado na rea econmica e social. Vrios estudiosos discutem esse tema. Leia, a seguir, o que os autores LIBNEO, OLIVEIRA e TOSCHI (2005, p.81) tm a dizer: As transformaes gerais da sociedade atual apontam a inevitabilidade de compreender o pas no contexto da globalizao, da revoluo tecnolgica e da ideologia do livre mercado (neoliberalismo). A globalizao uma tendncia internacional do capitalismo que, juntamente com o projeto neoliberal, impe aos pases perifricos a economia de mercado global sem restries, a competio ilimitada e a minimizao do Estado na rea econmica e social. Concretamente, isso leva ao domnio mundial do sistema financeiro, reduo do espao de ao para os governos. Com isso, os pases so obrigados a aderir ao neoliberalismo, ao aprofundamento da diviso internacional do trabalhoGlobalizao tem sido usada para expressar uma gama de fatores econmicos, sociais, polticos e culturais que expressam o esprito de desenvolvimento do capitalismo. Neoliberalismo pressupe o mercado como princpio fundador, unificador e auto-regulador da sociedade.

UNIDADE 1

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e da concorrncia e, no por ltimo, crise de endividamento dos Estados nacionais. Quais as decorrncias dessa poltica? Voc j deve ter notado que aumentou a excluso social, o desemprego e a misria no pas. Todos os dias se ouve nos noticirios sobre a criminalidade e a violncia que assolam o pas decorrentes, em muitos casos,da m administrao pblica. Em sntese, quais foram as condies que a globalizao obteve para se desenvolver? a interconexo mundial dos meios de comunicao, a equiparao da oferta de mercadorias, a equiparao das moedas nacionais e das lnguas.

A globalizao percebida em manifestaes como: Produtos,capitaisetecnologiassemidentidadenacional; Automao,informatizaoeterceirizaodaproduo; Implementao de programas de qualidade total e de produtividade; Demisses,desemprego,subemprego; Recesso,desempregoestrutural,exclusoecrisesocial; Diminuio dos salrios, diminuio do poder sindical, eliminao dos direitos trabalhistas e flexibilizao dos contratos detrabalho; Desqualificao do Estado e minimizao das polticas pblicas. LIBNEO, OLIVEIRA e TOSCHI (2005, p.75-76).

A contradio, neste contexto, que o avano cientfico e tecnolgico proporcionou uma oportunidade de romper as fronteiras entre os pases e os continentes. Porm, nunca se produziu tanto e, ao mesmo tempo, nunca houve tanta gente faminta, desempregada, sem um lugar para morar (Santos e Andrioli, 2005). E o neoliberalismo como surgiu?

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Historicamente, o neoliberalismo filho do liberalismo. Segundo Santos e Andrioli (2005), o liberalismo surgiu e se desenvolveu nos sculos XVII e XVIII em oposio monarquia absoluta, esta fundada na idia de hierarquia divina, social e natural, baseada na estrutura feudal de produo, bem como numa concepo teocrtica do poder. Baseado na idia de que os seres humanos so, por natureza, livres e iguais, o direito liberal rompe com a idia de direito divino do monarca e, portanto, com a hierarquia estabelecida. Em lugar de uma submisso cega ao poder e vontade do rei, criou-se a noo de direito civil, onde h regras que valem para todos, privilegiando o indivduo, sua liberdade e seu direito natural propriedade. Nasce o Estado liberal, com a funo de legislar e garantir a ordem pblica. No entanto, o liberalismo, como modelo de Estado, no teve eficcia, devido a vrios fatores, dentre os quais destaca-se o fracasso das suas polticas de desenvolvimento para os pases do Terceiro Mundo, fazendo com que a falncia desse modelo fosse inevitvel. Os tericos do liberalismo afirmam que esta falncia ocorreu porque a liberdade, enquanto valor central, ainda estaria sofrendo restries. Sendo ento necessrio redimensionar este Estado e rever quais eram realmente suas atribuies, sempre visando expanso da liberdade individual. neste contexto histrico que surge o neoliberalismo. Como o neoliberalismo se caracteriza? Segundo BIANCHETTI (2005, p.11) O neoliberalismo, como arcabouo terico e ideolgico no algo novo. Nasce como combate, no incio da dcada de 1940, s teses de Keynes e ao iderio do Estado de Bem-estar , sobretudo aos direitos sociais e aos ganhos de renda da classe trabalhadora, ou seja, o neoliberalismo vem sendo concretizado em orientaes de governo e na disseminao de valores em torno do mito do Estado-mnimo. Por que o neoliberalismo implantado? Porque a partir da dcada de 1970, o capitalismo sofreu um enorme desgaste ,principalmente com a incorporao da tecnologia aumentando a crise de superproduo, houve ento uma gradativa reduo na taxa de lucros e no crescimento econmico. Como soluo ao problema, foram

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trazidas idias de economistas como Friedrich Hayek e Milton Friedman, reforando o ideal da competitividade no livre mercado e a retirada da influncia do Estado sobre a economia. Em termos de estrutura social, no neoliberalismo vigora a manuteno da sociedade burguesa, com suas caractersticas bsicas, conformesalientamSantoseAndrioli(2005):a)trabalhocomomercadoria; b)propriedadeprivada;c)controledoexcedenteeconmico;d)mercado comocentrodasociedade;e)apartheid,exclusodamaioria;f)educao regulada pela diviso social de classes. Qual o papel do Estado neste modelo? Na sociedade contempornea, cabe ao Estado garantir a harmonia entre a liberdade mxima de escolha dos indivduos e o compromisso com a eficincia e a qualidade. Porm, o que se v no cotidiano no bem isso: apenas tem liberdade de escolha quem tem poder aquisitivo e este, por sua vez, s alcanado por meio de uma economia estvel, em que possvel manter-se num emprego com uma relativa estabilidade salarial. A interveno do Estado, na atividade econmica, marcada por perodos perfeitamente delineados, conforme apresenta MAURANO (2004, p.2) a seguir: O Estado Liberal foi marcado pelo no-intervencionismo. O objeto central do Estado era o indivduo e o seu papel era garantir a liberdade das pessoas. Ocorre que essa interveno mnima do Estado gerou conseqncias desastrosas, tais como a criao de monoplios que praticamente dizimaram as pequenas empresas, bem como desigualdades sociais acentuadas, marcadas por um proletariado vtima da misria e ignorncia. J em contraposio ao Estado Liberal, surgiu, aps a segunda grande guerra, o denominado Estado Social, em que a preocupao com o princpio da liberdade foi superada pela necessidade de se assegurar o cumprimento de outro princpio, o da igualdade. Ento, no Estado do Bem-Estar, o ideal de igualdade, que fora tomado como pressuposto pelo pensamento liberal, reconhecido como algo a ser implementado, adquirindo maior importncia do que a liberdade individual e econmica. Assim, para alcanar essa igualdade, entendia-se que o Estado deveria intervir na ordem econmica e social, passando a atuar diretamente na

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rea social e a intervir no domnio econmico. Na medida em que o Estado foi se afastando dos princpios do liberalismo, comeou a ampliar as suas atividades, que passam a ser definidas como servios pblicos, passando assim a absorver determinadas atividades comerciais e industriais que antes eram reservadas iniciativa privada. Porm, a constatao da ineficincia da mquina administrativa para prestar diretamente os servios de interesse social, isso aliado aos custos excessivos para a sua manuteno, desencadeou, no mundo contemporneo, uma srie de transformaes, com a finalidade de reduzir a atuao direta do Estado, repassando-se iniciativa privada atividades que, por sua natureza, podem ser executadas por particulares. Desta forma, surge a idia de Estado como regulador e no executor, e as atividades que permanecerem sob a sua responsabilidade devero ser, preferencialmente, executadas de forma descentralizada com a contratao de empresas privadas (Maurano, 2004). A onda de reformismo do mundo contemporneo, gerada a partir da constatao de que o modelo intervencionista do Estado de Bem-Estar Social no poderia subsistir, tambm atingiu o Estado Brasileiro. No Brasil, foi durante o governo de Fernando Collor que o intervencionismo estatal comeou a ruir e surgem os primeiros sinais de desestatizao. Essa desestatizao percebida atravs das leis que comeam a ser flexibilizadas e a interveno estatal comea a desaparecer. Em 1994 a desestatizao comea a tomar contornos mais definidos com as polticas desenvolvidas pela equipe do Presidente Fernando Henrique Cardoso. A reforma implantada teve por objetivo realizar o ajuste fiscal nos termos acordados com o Fundo Monetrio Internacional. Essa reforma envolveu medidas destinadas a atender a quatro finalidades segundo Maurano (2004): (a) reduzir o tamanho do Estado; (b) redefinir seu papel regulador; (c) recuperar a governana, ou capacidade financeira e administrativa de implementar ; (d) aumentar a governabilidade, ou capacidade poltica do governo de intermediar interesses, garantir legitimidade e governar. Para tanto, lanou-se mo de emendas constitucionais, alteraes da legislao administrativa, privatizaes, abertura comercial, poltica monetria voltada estabilidade da moeda e atrao de investimentos estrangeiros.

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Segundo NASCIMENTO (1997, p.63), o Estado neoliberal, ao contrrio do Estado social-liberal, , ao mesmo tempo, centralizado e descentralizado, sua funo limitada interveno, tem por papel induzir mudanas, estabelecer parcerias e coordenar iniciativas. centralizado no que se refere definio de um currculo mnimo e de umsistemaunificadodeavaliao;descentralizadonoquedizrespeito s diferenas sociais, s desigualdades e s necessidades especficas de cada regio. Em suma, o Estado neoliberal coloca o indivduo no centro da filosofia social e defende a propriedade privada como sendo direito fundamental do homem. Ao Estado cabe a funo regulatria, no sentido de reduzir incertezas e assimetrias de informaes e de garantir a produo eficiente e de qualidade. Pela descrio acima e pela poltica social e educacional posta em prtica no Brasil, voc pode perceber que o que se est buscando exatamente isto: menos Estado e mais mercado. O progressivo aumento das privatizaes a prova mais evidente disso e, como se no bastasse, a educao, que j em parte controlada pela iniciativa privada, est sendo entregue de uma vez por todas ao domnio do capital. Quais as exigncias do mercado? O mercado exige pessoas polivalentes, flexveis, geis, com viso do todo, conhecimentos tcnicos e um relativo domnio na rea de informtica, que falem, leiam e escrevam em vrios idiomas, que possuam habilidades mltiplas, e assim por diante. Segundo essa regra, quem no estiver capacitado de acordo com as exigncias do mercado excludo do processo produtivo.

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A cincia e a tecnologia adquiriram nesta nova realidade uma grande importncia, tanto que tm levado os estudiosos a chamarem a sociedade atual de Sociedade do Conhecimento, Sociedade Tcnico-Informacional ou Sociedade Tecnolgica. Isso significa que o conhecimento, o saber e a cincia adquirem um papel muito mais destacado que anteriormente. Hoje as pessoas aprendem na fbrica, na televiso, na rua, nos centros de informao, nos vdeos, no computador e, cada vez mais, vo se ampliando os espaos de aprendizagem. Nesta sociedade marcada pela revoluo tecnolgico-cientfica, curiosamente, a centralidade do processo produtivo est no conhecimento e, portanto, tambm na educao. Como fica a educao neste contexto? At agora voc leu sobre as caractersticas da globalizao, seus traos predominantes e as relaes entre globalizao e educao. A seguir, voc encontrar mais subsdios para entender as polticas neoliberais, bem como as devidas implicaes para a educao no contexto brasileiro.

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AS INFLUNCIAS INTERNACIONAIS NA ATUAL pROpOSTA DE EDUCAO

Dando continuidade ao seu estudo, agora voc vai ler sobre as polticas internacionais e as suas implicaes na poltica econmica e conseqentemente na poltica educacional brasileira. O neoliberalismo defende para a educao uma proposta de escola bsica, universal, laica, gratuita e obrigatria a todos. Essa mesma proposta apresentada para os pases da Amrica Latina e para o Brasil, ou seja, uma educao de formao geral e polivalente visando a qualificao de mo-de-obra para o mercado. Essa idia de preparao de mo-de-obra est voltado para o atendimento ao mercado e no com fins humanitrios.

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Segundo Santos e Andrioli (2005), evidente que a preocupao do capital com a educao no gratuita. Existe uma coerncia do discurso neoliberal sobre a educao no sentido de entend-la como definidora da competitividade entre as naes e por se constituir numa condio de empregabilidade em perodos de crise econmica. Santos e Andrioli (2005), ainda completam que para a filosofia neoliberal nem todos conseguiro vencer, ou seja, vence o mais forte, assim, necessrio trabalhar com a idia de competio e valorizar os poucos que conseguem se adaptar lgica do mercado, ou seja, trata-se de convencer a grande maioria dos jovens de que eles so incapazes, de que devem se conformar sendo trabalhadores com pouca ou quase nenhuma qualificao. Seu fracasso passa a ser assimilado no como o resultado de um sistema de ensino, mas de sua prpria incapacidade pessoal e social. Por outro lado, deve-se tambm convencer os vencedores de que eles constituem uma elite, que alcanaram o sucesso por seu esforo, dedicao e vontade de vencer. Assim, essa elite passa a se definir como camada privilegiada e superior classe trabalhadora. E a escola o que faz nesta realidade? As escolas so obrigadas a produzir um percentual de fracassados, para fornecer trabalhadores desqualificados de que a economia necessita. Nesse quadro, as polticas educacionais so projetadas e implantadas segundo as exigncias da produo e do mercado, com o predomnio dos interesses dos pases ricos, isto , daqueles que dominam a economia. O exemplo mais ntido disso na educao so as polticas dos rgos internacionais, como o Fundo Monetrio Internacional e o Banco Mundial. Esses dois organismos foram idealizados a partir da conferncia realizada em 1944, na localidade de Bretton Woods, nos Estados Unidos, quando os governos comearam a discutir sobre o ps-guerra e a criao de um sistema econmico dinmico, que derrubasse as barreiras para o livre comrcio.

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Dessa forma, o FMI (Fundo Monetrio Internacional) comeou a funcionar em 1947, com a funo bsica de fornecer recursos financeiros para os pases que apresentassem dficits nas contas externas, decorrentes de adversas conjunturas internacionais. O objetivo de suas aes era a de assegurar o bom funcionamento do sistema financeiro mundial, pelo monitoramento das taxas de cmbio e da balana de pagamentos, e de assistncia tcnica e financeira. Sua sede est em Washington, EUA, e conta com 184 pases membros, ou seja, quase todos os membros da ONU, com poucas excees (Almeida, 2002). J o Banco Internacional para a Reconstruo e o Desenvolvimento (BIRD), mais conhecido como Banco Mundial, segundo Arruda (2003), foi concebido para a reconstruo dos pases que foram destrudos pela Segunda Guerra Mundial (1939-1945), principalmente os que estavam situados na Europa. O papel do Banco Mundial primeiramente definido como apoio a reconstruo dos pases envolvidos na segunda guerra foi se alterando com o passar dos anos. O marco principal da nova configurao do papel do Banco Mundial acontece quando McNamara foi o seu presidente. Segundo Fonseca (1998), o aumento da pobreza da populao atingindo nveis intensos e perigosos para o prprio equilbrio econmico, a desigualdade que se alastrou ampliando a polarizao entre pases ricos e pobres, fez com que o ento Presidente McNamara recomendasse que a assistncia financeira concedida pelo Banco Mundial abrangesse tambm a dimenso social. No final da dcada de 1960 o Banco Mundial havia includo o setor social em seus crditos, mas de forma alguma tendo como motivao a justia social. Ao contrrio, foi uma estratgia poltica. (Fonseca, 1998). No Brasil, desde o governo Collor (1990-1992), o Brasil vem adotando uma srie de reformas acordadas ao modelo neoliberal, como programas de estabilizao, corte de gastos pblicos, negociao da dvida externa, abertura comercial, flexibilizao e estmulo entrada de investimentos estrangeiros, privatizao, eliminao de programas de controle de preos

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e desmantelamento de servios pblicos. Essas reformas trouxeram aproximao entre o Banco Mundial e o governo brasileiro, a partir da dcada de 1990, especificamente durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2003). A partir dessas reformas o Banco Mundial vem ampliando suas funes tcnicas e financeiras, assumindo um papel cada vez mais poltico, mediante a formulao de polticas nacionais. Quais as diretrizes do Banco Mundial para a educao? A partir da dcada de 1990 a educao vem sendo considerada pelo Banco Mundial como um instrumento fundamental para promover o crescimento econmico e reduzir a pobreza, ou seja, o seu interesse em promover aes e definir polticas educativas para os pases em desenvolvimento, incluindo o Brasil evidente. O ponto central da poltica do Banco Mundial para o Brasil e especificamente para a educao a reduo do papel do Estado no financiamento da educao, e a diminuio dos gastos do ensino. Baseandose em estudos internos, o Banco Mundial direciona investimentos para bibliotecas, material didtico e livros, em prejuzo do fator humano. Para melhorar as condies de vida dos pobres as aes giram em torno da ampliao e aperfeioamento da educao primria (anos iniciais apenas da Educao Bsica) e o atendimento mdico bsico (ambulatorial). O nmero de alunos por professor ou tempo dedicado ao ensino desconsiderado para o desenvolvimento da educao, mas til para reduo de custos, colocando em prtica a orientao de reduzir custos ampliando ao mximo os resultados (Fonseca, 1998). Segundo (Fonseca,1998) O Banco Mundial denomina como cooperao ou assistncia tcnica os crditos concedidos ao setor educacional dos pases em desenvolvimento, entretanto, esses financiamentos consistem em emprstimos do tipo convencional, com encargos pesados, regras rgidas e condicionalidades econmicas e polticas a serem seguidas para que o crdito seja concedido. A educao submetida a uma perspectiva economicista, e a lgica de mercado passa a ser encarada como fator de eficincia dos servios de ensino.

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Silva (2002), destaca que no apenas os emprstimos que Banco Mundial concede influenciam as polticas educacionais brasileiras, mas principalmente, a sua influncia atravs de suas orientaes, Tanto Silva (2002), como Rosemberg (2000), alertam sobre o engano de pensar que as orientaes polticas das organizaes multilaterais so impostas aos governos sem a anuncia dos mesmos, mas existe um certo consentimento para as mesmas, seja pela morosidade, tanto do governo quanto da comunidade acadmica, em oferecer resistncia tcnica aos pacotes educacionais apresentados ou ainda por manter uma certa ordem no sistema. O discurso destas instituies remete para a qualidade total na educao, onde os investimentos e benefcios so projetados e calculados da mesma forma como se procede em uma empresa. Por que isso ocorre? Do ponto de vista do capitalismo, a educao e o conhecimento passam a ser o centro da transformao produtiva e do desenvolvimento econmico. So, portanto, bens econmicos necessrios transformao da produo, ao aumento do potencial cientfico e tecnolgico e ao aumento do lucro e do poder de competio num mercado marcado pela concorrncia. (Santos e Andrioli 2005). Neste sentido, possvel verificar a educao/conhecimento e conexo estabelecida entre econmico. desenvolvimento/desempenho

Na perspectiva neoliberal a educao vista como um problema econmico, j que tida como o elemento central desse novo padro de desenvolvimento. No Brasil, as polticas sociais, econmicas e educacionais continuam se delineando de acordo com as propostas do mercado mundial. Segundo os discursos oficiais, preciso fazer os ajustes necessrios para que o pas se desenvolva em sintonia com as outras naes. Ou seja, modernizao da educao, diversificao, produtividade, eficcia e competncia so as palavras de ordem. A educao oferecida, atualmente, como uma mercadoria, e a escola tornou-se, na verdade, mais uma empresa qual se paga pela obteno de um servio.

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Os autores LIBNEO E OLIVEIRA (1998, p. 604) destacam alguns aspectos que demonstram a transformao da escola em mais um negcio que se rege pela ordem do mercado: adoo de mecanismos de flexibilizao e diversificao dos sistemasdeensinonasescolas; ateno eficincia, qualidade, ao desempenho e s necessidades bsicasdeaprendizagem; avaliao constante dos resultados/desempenho obtidos pelos alunos que comprovam a atuao eficaz e de qualidade do trabalho desenvolvidonaescola; estabelecimento de rankings dos sistemas de ensino e das escolas pblicasouprivadasquesoclassificadasoudesclassificadas; criao de condies para que se possa aumentar a competio entre as escolas e encorajar os pais a participarem da vida escolar e fazer escolhaentreescolas; nfase na gesto e na organizao escolar mediante a adoo de programasgerenciaisdequalidadetotal; valorizao de algumas disciplinas: matemtica e cincias naturais, devido competitividade tecnolgica mundial que tende a privilegiar tais disciplinas; estabelecimento de formas inovadoras de treinamento de professorescomo,porexemplo,educaoadistncia; descentralizao administrativa e do financiamento, bem como do repassederecursosemconformidadecomaavaliaododesempenho; valorizao da iniciativa privada e do estabelecimento de parcerias comoempresariado; o repasse de funes do Estado para a comunidade (pais) e para as empresas.

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A interveno dos organismos internacionais como o FMI e o Banco Mundial, e a submisso do governo brasileiro s exigncias postuladas por esses organismos, repercute de maneira decisiva sobre a educao. Em funo dessa realidade poltica, possvel afirmar que as maiores alteraes que ultimamente tm sido previstas esto chegando s escolas e, muitas vezes, so aceitas sem discusses. Veja a seguir as principais conseqncias do pacote neoliberal para a educao apontadas por Santos e Andrioli (2005): Menos recursos, por dois motivos principais: a) diminuio da arrecadao (atravs de isenes, incentivos, sonegao...); b) no aplicaodosrecursosedescumprimentodeleis; Prioridade no Ensino Fundamental, como responsabilidade dos EstadoseMunicpios(aEducaoInfantildelegadaaosmunicpios); Formaomenosabrangenteemaisprofissionalizante; A maior marca da subordinao profissionalizante a reforma do ensinomdioeprofissionalizante; Privatizaodoensino; Municipalizao e escolarizao do ensino, com o Estado repassandoadiantesuaresponsabilidade; Acelerao da aprovao para desocupar vagas, tendo o agravante damenorqualidade; A sociedade civil deve adotar os rfos do Estado. Se as pessoas

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no tiverem acesso escola, a culpa colocada na sociedade que no se organizou, isentando, assim, o governo de sua responsabilidade com aeducao; A autonomia apenas administrativa, sendo que as avaliaes, os livros didticos, os currculos, os programas, os contedos, os cursos de formao, os critrios de controle e fiscalizao continuam dirigidos e centralizados, mas, no que se refere parte financeira (como infraestrutura,merenda,transporte),passaaserdescentralizada; Produtividade e eficincia empresarial (mximo resultado com o menorcusto):nointeressaoconhecimentocrtico; Modismo da qualidade total (no estilo das empresas privadas) na escolapblica,apartirde1980; Tentativa de privatizao do ensino superior, atravs do desmonte dasuniversidadespblicas; Nova LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional) determinando as competncias da Federao, transferindo responsabilidadesaosEstadoseMunicpios; Parcerias com a sociedade civil (empresas privadas e organizaes sociais). Diante de tudo o que j foi exposto, a atuao coerente e socialmente comprometida na educao parece cada vez mais difcil, tendo em vista que a causa dos problemas est longe e, ao mesmo tempo, dispersa em aes locais. A tarefa de educar, atualmente, implica conseguir pensar e agir localmente e globalmente, o que carece da interao coletiva dos educadores.

Nesta unidade voc estudou as transformaes que a sociedade atual vem enfrentando, a sua forma de organizao da economia, da poltica e da educao. Voc leu sobre a globalizao e as polticas neoliberais, destacando suas caractersticas e suas aes no contexto brasileiro. O ponto mais importante da unidade foi o estabelecimento das relaes entre essas polticas e a educao nacional. Em sntese, possvel fazer as seguintes consideraes acerca dos impactos da

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globalizao e do neoliberalismo sobre a educao e dos desafios que esto colocados para a poltica educacional: a) a racionalidade subjacente s polticas educacionais difundidas pelo neoliberalismo e decorrentes da globalizao a racionalidade empresarial. b) sendo a educao um bem de consumo e fonte de lucro, ela torna-se acessvel somente a uma pequena parcela da sociedade. c) a educao no deve ficar de fora do contexto sociopoltico, mas tambm no pode ser determinada por ele, pois deve, antes de tudo, interagir com a realidade, transformando-a; d) o papel da escola no deve ser o de reproduo da sociedade classista, mas antes o lugar da produo, apropriao e socializao do saber. Esta a tarefa por excelncia da escola. Alm dos aspectos mencionados, possvel perceber que os reflexos diretos esperados pelo grande capital a partir de sua interveno nas polticas educacionais dos pases pobres, em linhas gerais, so os seguintes: a) garantir governabilidade e segurana nos pases subdesenvolvidos; b) quebrar a inrcia que mantm o atraso nos pases do chamado Terceiro Mundo; c) construir um carter internacionalista das polticas pblicas com a ao direta e o controle atravs dos mecanismos internacionais; d) estabelecer um corte significativo na produo do conhecimento nesses pases; e) incentivar a excluso de disciplinas cientficas, priorizando o ensino elementar e profissionalizante. A educao uma responsabilidade do governo, mas tambm dos seus protagonistas imediatos: professores, pais e alunos. Por isso, possibilidades de crtica e oposio ainda podem ser visualizadas. Um exemplo disso constatado na decidida e corajosa resistncia de estudantes, professores e diversos outros segmentos da sociedade ao processo em curso, pois, mesmo sendo um projeto perverso, ele no consegue a dominao total. Essa luta no nova, voc ver na prxima unidade como a escola est sendo construda a partir de cada reforma educacional, de cada plano nacional de educao e como ela est constituda hoje pelas leis que a regulam. Conto com voc na prxima unidade!

Para verificar os contedos trabalhados, faa a atividade a seguir: A unidade faz referncia acerca do papel e atuao dos organismos internacionais na educao brasileira. Procure ampliar seus conhecimentos sobre essa questo fazendo uma pesquisa nos sites de busca da internet. Para dar incio a sua pesquisa, faa uma visita pgina do Banco Mundial (http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/HOMEPORTUGUESE/ EXTPAISES/EXTLACINPOR/BRAZILINPOREXTN/0,,contentMDK:21352466~menuPK:381 7183~pagePK:1497618~piPK:217854~theSitePK:3817167,00.html).

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A construo da escola

pblica a partir das polticas educacionais, das reformas de ensino, dos planos nacionais de educao e do financiamento da educao

ObjetivOs De aPrenDiZagemAo final desta unidade voc ter subsdios para: Contextualizar historicamente o desenvolvimento e a organizao da educao no Brasil. Identificar as leis que propuseram reformas para a educao brasileira. Identificar as regras sobre o financiamento da educao brasileira.

rOteirO De estUDOsSEO 1 Antecedentes histricos, sociais e polticos das reformas educacionais SEO 2 As atuais Leis da Educao: Constituio Federal de 1988 e a LDB n 9394/96

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pARA INCIO DE CONVERSANesta unidade voc ir estudar o desenvolvimento da educao brasileira. Para compreender melhor esse desenvolvimento, a unidade inicia com uma retomada histrica da educao, destacando principalmente as reformas e leis institudas para a educao nacional. Na seqncia, o destaque ser para a educao proposta na atual Constituio Federal, a elaborao da atual LDB, as prioridades do Plano Nacional de Educao e o financiamento da educao. As mudanas no campo educacional so originadas primeiramente pelas mudanas no campo econmico, sociocultural, tico-poltico, ideolgico e terico do pas. Essas mudanas so protagonizadas pelos organismos internacionais e regionais vinculados aos mecanismos de mercado e representantes encarregados de garantir a rentabilidade do sistema capital, conforme voc ver com maior clareza no prximo captulo. Veja agora como isso foi se configurando historicamente na educao brasileira. Bons estudos!

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ANTECEDENTES HISTRICOS, SOCIAIS E pOLTICOS DAS REFORMAS EDUCACIONAIS

importante fazer uma rpida retomada histrica da educao brasileira para que voc possa contextualizar o processo educacional que veio se desenvolvendo no Brasil. Como um processo sistematizado de transmisso de conhecimentos, evolui em rupturas marcantes e fceis de serem observadas.

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A histria da educao no Brasil inicia-se no perodo colonial, quando comeam as primeiras relaes entre Estado e educao, por meio dos jesutas que chegaram em 1549, chefiados pelo Padre Manuel da Nbrega. Em 1759, com as reformas pombalinas, houve a expulso dos jesutas, passando a ser institudo o ensino laico e pblico, e os contedos basearam-se nas Cartas Rgias. Muitas mudanas ocorreram at os dias de hoje. As principais reformas foram: Benjamim Constant (1890), Epitcio Pessoa (1901), Rivadvia Correia (1911), Carlos Maximiliano (1915), Joo Alves da Rocha Vaz (1925), Francisco Campos (1932), Gustavo Capanema (1946) e as Leis de Diretrizes e Bases de 1961, 1968, 1971 e 1996. At os dias de hoje muito tem se alterado no planejamento educacional, mas a educao continua a ter as mesmas caractersticas impostas em todos os pases do mundo, que a de manter o status quo para aqueles que freqentam os bancos escolares. Veja a seguir as mudanas que ocorreram em cada perodo da educao no Brasil.

Brasil Colnia e ImprioA primeira grande ruptura travou-se com a chegada mesmo dos portugueses ao territrio do Novo Mundo. No h como no reconhecer que os portugueses levaram ao Brasil um padro de educao prprio da Europa, o que no quer dizer que as populaes que viviam no Brasil j no possussem caractersticas prprias de se fazer educao. A educao que se praticava entre as populaes indgenas no tinha as marcas repressivas do modelo educacional europeu. Porm, a educao no Brasil no teve o mesmo incentivo que nas demais colnias europias na Amrica. Quando e como comeou a educao no Brasil? Passados exatamente quarenta e nove anos da chegada dos portugueses ao Brasil, a Coroa Portuguesa enviou para c, juntamente com o primeiro Governador-Geral, Tom de Sousa, aqueles que so considerados os primeiros educadores do Brasil, os padres jesutas. Chefiados pelo padre Manuel da Nbrega, os jesutas puseram-se a educar dentro dos propsitos da Igreja Catlica os gentios que aqui encontraram.

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Perceberam que no seria possvel converter os ndios f catlica sem que soubessem ler e escrever. Assim, a leitura, a escrita e o clculo eram, de fato, os contedos prprios da instruo. Desta forma, os jesutas cumpriram o papel de inculcar a cultura dominante. Quando os jesutas chegaram somente a ao territos rio, eles no trouxeram moral, costumes e a religiosidade europia; trouxeram tambm os mtodos pedaggicos. O trabalho desenvolvido pelos jesutas teve duas fases distintas. A primeira delas orientava-se pelo plano de estudos concebido por Manuel da Nbrega, voltado para o ensino das primeiras letras, a catequese, a msica e alguma iniciao profissional. A segunda fase foi inspirada nos princpios do Ratio Studiorum (Ordem dos Estudos), concentrando-se no ensino de humanidades, filosofia e teologia, escrito por Incio de Loyola. Isso quer dizer que os colgios jesuticos representavam a principal instituio de formao da elite colonial. A formao intelectual neles ministrada foi marcada pela rigidez nas formas de pensar e de interpretar a realidade e por forte censura sobre os livros. Segundo VIEIRA E FREITAS (2003, p.36), tanto Espanha quanto Portugal mantiveram o mtodo escolstico como instrumento de formao de seus intelectuais, porque foram partidrios da contra-reforma e acabaram por manter-se margem da grande revoluo cientfica e cultural que ocorreu a partir do renascimento at o sc. XVII. Por outro lado, deve-se levar em considerao que o trabalho dos jesutas no foi fcil, os obstculos enfrentados por eles foram diversos, desde questes de sobrevivncia em local diferente de Portugal, at disputas com os prprios colonizadores pela conquista do gentio e defesa contra ataques violentos.

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Para dar sustentao a esse modelo, e para manterem toda a sua mquina educacional, os jesutas dependiam inicialmente de esmolas e foram aos poucos compreendendo que deveriam buscar a sua autosuficincia. A explorao do trabalho escravo nos engenhos e fazendas por eles administradas permitiu-lhes subsidiar suas obras educacionais. Recebiam tambm suprimentos pblicos, que eram um imposto adicional: a redzima. Este mtodo funcionou durante 210 anos, de 1549 a 1759, quando uma nova ruptura marca a histria da educao no Brasil: a expulso dos jesutas pelo Marqus de Pombal. Voc deve estar se perguntando: se a educao no Brasil estava funcionando, se no havia nus para o governo, por que os jesutas foram expulsos, por quais motivos? GHIRALDELLI JR. (2006, p. 26) explicita que a Companhia de Jesus foi expulsa de Portugal e do Brasil quando o Marqus de Pombal, ento ministro de Estado em Portugal, empreendeu uma srie de reformas no sentido de adaptar aquele pas e suas colnias s transformaes econmicas, polticas e culturais que ocorriam na Europa. No campo cultural, o que se queria era a implementao em Portugal de idias mais ou menos prximas do Iluminismo. Os jesutas foram expulsos perodo de pensamento europeu das colnias em funo de radicais caracterizado pela nfase na experincia e diferenas de objetivos com os dos religio e s autoridades tradicionais, interesses da Corte. Enquanto os e pela emergncia gradual do ideal jesutas o democrticas. (Ghiraldelli Jr., 2006, p.26) proselitismo, Pombal pensava em preocupavam-se comna razo, pela desconfiana em relao Iluminismo corresponde ao Redzima- uma taxa especial para a Companhia de Jesus, que era descontada sobre todos os direitos e dzimos da prpria Coroa. Isso correspondia a 10% dos impostos cobrados na colnia.

das sociedades liberais, seculares e

reerguer Portugal da decadncia em que se encontrava diante de outras potncias europias da poca. A educao jesutica no convinha aos interesses comerciais emanados por Pombal. Se as escolas da Companhia de Jesus tinham por objetivo servir aos interesses da f, Pombal pensou em organizar a escola para servir aos interesses do Estado.O proselitismo (do latim eclesistico proslytus, que por sua vez provm do grego ) o intento, zelo, diligncia, empenho ativista de converter uma ou vrias pessoas a uma determinada causa, idia ou religio (proselitismo religioso). Origem: Wikipdia, a enciclopdia livre.

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Que mudanas, ento, ocorreram na educao brasileira aps a expulso dos jesutas? A educao brasileira, com isso, vivenciou uma grande ruptura histrica num processo j implantado e consolidado como modelo educacional. Aps a expulso dos jesutas, o ensino que persistiu no Brasil Colnia teve um cunho paliativo, baseado nas chamadas aulas rgias ou aulas avulsas de Latim, Grego e Retrica. Cada aula rgia era autnomaO subsdio literrio foi criado em 1772 e era um imposto que incidia sobre o vinho, o vinagre e a aguardente e a chamada carne verde. O subsdio literrio tem sido apresentado como o primeiro salrioeducao.

e isolada, com professor nico, e uma no se articulava com as outras. Portugal logo percebeu que a educao no Brasil estava estagnada e era preciso oferecer uma soluo. Para isso, instituiu-se o subsdio literrio para manuteno dos ensinos primrio e mdio. O resultado da deciso de Pombal foi que a educao brasileira estava reduzida a praticamente nada. O sistema jesutico foi desmantelado e nada que pudesse chegar prximo dele foi organizado para dar continuidade a um trabalho de educao. O cenrio cultural brasileiro ganharia novamente impulso a partir da chegada da famlia real portuguesa (1808), que traz consigo hbitos da metrpole;tantoque,nosdoisanossubseqentesasuachegada,D.Joo VI cria a Academia Real da Marinha (1808) e a Academia Real Militar (1810);pormessainiciativanoforasuficienteobastanteparafortalecer a idia da construo de um sistema nacional de instruo pblica. A educao continuou a ter uma importncia secundria. Como voc leu anteriormente, a educao sofreu com o descaso, deixada no ostracismo. Somente com o advento da independncia (1822) e o incio do perodo imperial que a educao comea a passar por algumas mudanas, pode-se dizer que esse perodo tornou-se um marco para a histria da educao brasileira, pois nessa fase que se do os primeiros ensaios, visando formao de um sistema de ensino. Voc deve estar se perguntando: Quais as diferenas na oferta da educao em relao ao perodo anterior? Qual foi a educao destinada populao brasileira?

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Um dos primeiros passos foi em 1823, a criao do Mtodo Lancaster, ou ensino mtuo. Esse mtodo consistia no ensino pelo aluno j treinado que ensinava a um grupo de dez alunos. Ele foi institudo na tentativa de suprir a falta de professores. Outro marco foi com o retorno de D. Joo a Portugal, quando D. Pedro I proclama a Independncia do Brasil e outorga a primeira Constituio Brasileira em 1824. A elaborao dessa constituio foi bastante tumultuada ocorrendo conflitos entre os radicais e os conservadores. Em termos educacionais o Art. 179 desta Lei dizia que a instruo primria gratuita para todos os cidados. Entretanto, sabe-se que a realidade era outra. Cidados, naquela poca, eram aqueles que possuam propriedades, terras, bens e participavam do governo local. Em 1826, um decreto institui quatro graus de instruo: pedagogias (escolas primrias), liceus, ginsios e academias. Em 1827, um projeto de lei prope a criao de pedagogias em todas as cidades e vilas, alm de prever o exame na seleo de professores, para nomeao. Propunha ainda a abertura de escolas para meninas. Essa lei de ensino, de 15 de outubro de 1827, ainda expressa que: art. 1 Em todos os lugares mais populosos, vilas e cidades sero criadas classes de primeiras letras, que forem necessrias. art. 4 As escolas sero de ensino mtuo nas capitais das provncias; e tambm nas cidades, vilas e lugares populosos, em que for possvel estabelecerem-se. art. 5 Para as escolas de ensino mtuo sero utilizados os edifcios, arranjando-se com os utenslios necessrios custa da Fazenda pblica,e os professores que no tiverem a necessria instruo deste ensino iro instruir-se em curto prazo custa dos seus ordenados nas escolas das capitais.Mtodo de ensino mtuo ou Lancaster foi elaborado por Joseph Lancaster, educador ingls no final do sculo XVII. Era adequado aos interesses dos governos locais, pois proporcionava a economia de recursos com a contratao de professores e reduzia as despesas com a educao. http://www8.pr.gov.br/portals/ portal/semana/02_educadores_ educando.pdf

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Em 1834, o Ato Adicional Constituio dispe que as provncias passariam a ser responsveis pela administrao do ensino primrio e secundrio. Foi por isso que, em 1835, surge a primeira Escola Normal no pas. Em 1837, foi criado o Colgio D. Pedro II, com o objetivo de se tornar modelo pedaggico para o curso secundrio. Sendo assim, foi no Imprio que ocorreu o aprofundamento da dualidade educacional que vinha se instalando no pas. O que isso quer dizer? Que tivemos, por um lado, um ensino elitista, cujo modelo oficial era representado pelo Colgio Pedro II e, por outro, as escolas de primeiras letras para a maioria da populao. Mas a situao piorou ainda mais com o incremento populacional urbano, fato que preocupava a elite nacional. E como resultado dessas preocupaes logo se iniciou as discusses sobre a criao do ensino tcnico-profissional que seria destinado a essa parte da sociedade. Como voc percebeu nas leituras sobre esses perodos iniciais da educao no Brasil, as tentativas de reforma do ensino que ocorreram no sinalizaram para diminuir as diferenas educacionais do pas. Desta maneira, o Brasil entra no perodo republicano com uma elevada taxa de analfabetismo, sem contar com a grande parcela da populao que ficou excluda da escola.

A educao no Brasil a partir da RepblicaAo entrar no perodo da Repblica, voc poder perceber que houve diversas legislaes destinadas constituio do sistema educacional. Assim, a partir de agora, o seu estudo ter como fio condutor uma linha temporal, tendo por foco as diversas legislaes educacionais.

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Que reformas ento ocorreram no perodo da Repblica Velha? Foi no perodo da Repblica Velha (1889-1930) que mais se procedeu s reformas ducacionais; ntretanto, sso o ode er ntendido omo xpanso e e i n p s e c e democrtica do ensino. Inspirada nos ideais liberais norte-americanos, a Constituio Republicana de 1891 introduziu o princpio federalista, ou seja, os Estados passaram a organizar-se por leis prprias, desde que respeitando a carta magna (Constituio Federal), e para a organizao da educao percebe-se influncia positivista. Essas mudanas incidiram diretamente sobre a configurao do sistema de ensino do pas, e foi a partir desse perodo que o movimento pela educao popular despontou. Inmeros projetos de reforma foram concebidos no perodo. Essas propostas nem sempre correspondem a um conjunto orgnico de medidas, mas a decretos com o intuito de reformar aspectos relativos organizao do ensino. A primeira reforma que ocorreu foi no ensino secundrio. Essa reforma foi organizada por Benjamin Constant (Primeiro-Ministro da Pasta da Instruo, Correios e Telgrafos - 1890/1892) e atingiu diretamente o Colgio Pedro II, que era considerado o modelo oficial de educao no pas. Benjamin Constant foi um dos maiores propagadores do iderio positivista no Brasil, logo, a reforma por ele pensada revestia-se daqueles princpios. Segundo VIEIRA E FREITAS (2003, p.77), a organizao escolar instaurada pela reforma Benjamin Constant apresentou duas orientaes principais. De um lado, tornar os diversos nveis de ensino formadores e no apenas preparadores dos alunos, com vistas ao ensino superior. De outro, romper com o academicismo reinante no ensino brasileiro mediante a formao fundamentada na cincia. Para assegurar a primeira inteno, instituiu-se o exame de madureza, cujo objetivo era identificar a capacidade intelectual do aluno ao concluir o ensino secundrio. Quanto ao segundo objetivo, a grade curricular, o ensino secundrio passou aO positivismo teve em Augusto Comte (1798-1857) seu principal formulador, a partir de sua trilogia Curso de filosofia positiva, Discurso preliminar sobre o conjunto do positivismo e Catecismo Positivista, em que apresenta seus pressupostos tericos, exercendo forte repercusso no pensamento educacional, colocando-se como a filosofia da indstria e formulando uma teoria poltica de organizao da sociedade assim expressa em sua mxima: O amor por princpio, a ordem por base, o progresso por fim. Silva, Joo Carlos da. Utopia Positivista e Instruo Pblica no Brasil. Revista HISTEDBR online. http://www.histedbr.fae.unicamp.br/ art2_16.pdf

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compreender o estudo das cincias, incluindo noes de sociologia, moral, direito e economia poltica, ao lado das disciplinas tradicionalmente ensinadas, tornando o ensino enciclopdico. Essa reforma foi bastante criticada tanto pelos positivistas, por que no respeitava os princpios pedaggicos de Augusto Comte, quanto pelos que defendiam a predominncia literria, j que o que ocorreu foi um ensino enciclopdico. A mudana mais significativa decorrente da reforma Benjamin Constant foi a laicizao do ensino pblico por meio da institucionalizao da liberdade de culto, expandiram-se os colgios privados, ou seja, iniciavase, ainda que timidamente, a desoficializao do ensino. Neste contexto, logo surgiram modificaes buscando ajustar a formao oferecida tanto nos seus contedos quanto nos mtodos. A reforma proposta por Epitcio Pessoa, que conhecida como Cdigo de Institutos Oficiais de Ensino Superior e Secundrio, e ainda o regulamento para o ginsio nacional, consistiu na excluso de disciplinas como biologia, sociologia e moral tendo em vista a incluso da lgica. Outra reforma implantada foi de autoria de Rivadvia Corra em 1911, na qual se pretendia que o curso secundrio se tornasse formador do cidado e no um simples promotor a um nvel seguinte. Retomou a orientao positivista, pregando a liberdade de ensino, entendendo a possibilidade de oferta de ensino que no fosse por escolas oficiais, e de freqncia. Alm disso, pregou ainda a abolio do diploma em troca de um certificado de assistncia e aproveitamento e transferiu os exames de admisso ao ensino superior para as faculdades. A poltica educacional adotada no pas foi resultado dos embates de foras antagnicas que havia no cenrio social e educacional. Essas foras foramrepresentadasportrsgruposqueprocuraramdemarcarseusespaos; o primeiro deles era constitudo pela alta hierarquia do clero catlico, o segundo, pelos seguidores positivistas e, por ltimo, as lideranas civis liberais. no embate realizado por essas trs instncias representativas que se configuraram as propostas liberais e conservadoras. possvel verificar isso na alternncia do carter imprimido nas reformas educacionais. Enquanto a Lei Orgnica Rivadvia Corra (1911) procurou alinhar-se ao pensamento liberal republicano, dando continuidade tendncia proposta pela reforma Benjamin Constant, ou

LAICIZAO Significa tornar laico, leigo. Subtrair a educao da influncia religiosa.

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seja, desoficializando de vez o ensino, atravs de sua autonomia didtica e administrativa, por outro lado, a reforma de Carlos Maximiliano demonstrou seu carter conservador, buscando reorganizar o sistema escolar brasileiro, reoficializando o ensino, reformou o ensino secundrio e regulamentou o superior. A dcada de vinte foi marcada por diversos fatos relevantes no processo de mudana das caractersticas polticas brasileiras. Foi nessa dcada que ocorreu o Movimento dos 18 do Forte (1922), a Semana de Arte Moderna (1922), a Rebelio Tenentista (1924), entre outras. Como a educao escolar foi tratada pelos governos na dcada de 20? A partir de 1920, a educao no Brasil passa a viver sob um movimento eufrico que fora denominado Otimismo Pedaggico. Esse movimento desencadeou por todo o pas uma srie de reformas de ensino em nvel estadual, restritas, portanto, aos ensinos primrio e normal, visto que o ensino superior estava a cargo do governo federal e o secundrio no passava de uma rede de cursos preparatrios. No mbito federal, ocorreu a ltima reforma da chamada Repblica Velha, a Reforma Rocha Vaz (1925), implementada num perodo de transio do modelo social urbanoindustrial que estava sendo introduzido no Brasil. As medidas adotadas por essa reforma serviram para acentuar a crise poltica, pela qual o pas estava passando, culminando na Revoluo de 1930. Em termos educacionais, o Estado passou a controlar o sistema de ensino implantando a instruo moral e cvica nos currculos primrios e secundrios. Alm disso, a Reforma Rocha Vaz no impediu a aproximao das doutrinas escolanovistas que vinham sendo desenvolvidas h sculos na Europa, mas que, somente no fim da primeira repblica, entraria como um movimento de fora a influenciar a educao brasileira. O final da primeira repblica revelou um cenrio de efervescncia poltico-social que repercutiu diretamente sobre o modelo educacional adotado no pas. Foram realizadas diversas reformas de abrangncia estadual e ainda os esforos introduzidos com o iderio da Escola Renovada proposta pelos profissionais da educao, que criaram espaos para um debate pedaggico com a criao da ABE Associao Brasileira de Educao, em 1924. Voc pde perceber pela leitura deste perodo histrico que houve diversas reformas educacionais, porm quase todas foram destinadas ao

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ensino secundrio ou superior, e para a educao popular quase nada foi feito. A esperana que a repblica trouxesse possibilidades de direitos sociais no foi sentida pela maioria da populao, principalmente as mulheres. Ou seja, manteve-se a mesma estrutura dualista de classe.

Acesse sites de Histria da Educao para conhecer um pouco mais sobre o otimismo pedaggico e as propostas do escolanovismo no Brasil

A Educao no Estado GetulistaA seguir voc estudar o perodo da histria que corresponde aos anos 1930-1946 e que marcado por diversas mudanas no cenrio internacional e nacional. Um desses primeiros marcos foi a Revoluo de 1930. e a Constituio Federal de 1934. Veja, quais as mudanas nesse perodo? E a educao como foi entendida e organizada? Comeando pelo cenrio internacional, possvel verificar que o mundo, na fase do entre guerras, experimentou uma grande crise econmica que chegou em 1929 nas bolsas de valores de Nova Iorque, chamada de crack., que foi a grande depresso econmica. Ou seja, bancos faliam, empresas fechavam, o desemprego foi geral por toda Europa. Resumindo, todos foram afetados inclusive o Brasil. No Brasil, durante este perodo o caf representava 70% das exportaes, e os Estados Unidos eram os maiores compradores. Segundo Souza (1999), a reduo quase total das importaes norteamericanas trouxe uma sria crise para a balana comercial brasileira, do que resultaram: a) a poltica do governo brasileiro de financiar os estoques para manter o preo do caf no mercado internacional foi afetadanegativamentepelacrise;b)opreodeoutrosprodutosprimrios tambmca am,aprofundandoacrise;c)aindstriafoidecertaforma r beneficiada, pois capitais anteriormente investidos no caf passaram a seraplicadosnaindstria;d)comadesvalorizaodamoedabrasileira

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e a conseqente elevao dos preos dos produtos estrangeiros, houve um estmulo para a fabricao de produtos similares no Brasil. Os fazendeiros, que sofreram grandes perdas, tiraram seu apoio ao governo que no solucionava seus problemas e essa atitude criou condies para uma ao radical e violenta contra o governo. Washington Luiz, que era o presidente da Repblica em 1930, foi derrubado, e em seu lugar subiu Getlio Vargas, apoiado pelos militares. No perodo compreendido entre 1930 e 1937, acirrou-se o confronto poltico-ideolgico nacional. E a Revoluo de 30 foi o marco referencial para a entrada do Brasil no modelo capitalista de produo. A acumulao de capital, no perodo anterior, permitiu que o Brasil pudesse investir no mercado interno e na produo industrial. A nova realidade brasileira passou a exigir uma mo-de-obra especializada e para tal era preciso investir na educao. Sendo assim, em 1930, foi criado o Ministrio da Educao e Sade Pblica e, em 1931, o governo provisrio sancionou decretos organizando o ensino secundrio e as universidades brasileiras ainda inexistentes. Os decretos n 19.890/31 e 21.241/1932, ficaram conhecidos como Reforma Francisco Campos, que ocupou-se no s do ensino mdio, mas tambm do ensino superior. Segundo Zotti (2006), a reforma Francisco Campos deveria reconstruir o ensino em novas bases, com o objetivo de superar o carter exclusivamente propedutico e contemplar uma funo educativa, moral e intelectual do aluno. O objetivo do ensino secundrio era preparar os jovens para sua integrao na sociedade, que comeava a mudar, tornando-se mais complexa e dinmica. Ou seja, era necessrio, atualizar o ensino de acordo com as exigncias do desenvolvimento industrial. Neste sentido, a reforma instituiu dois cursos seriados: o curso fundamental e o curso complementar. O curso Fundamental tinha por objetivo uma formao geral, com nfase na cultura humanstica, com o intuito de preparar o homem para a vida em sociedade e para os grandes setores da atividade nacional, independente do ingresso no ensino superior, possua uma durao de 5 anos e uniforme a todo o pas. J o curso complementar, com durao de dois anos, mantinha o objetivo de formao propedutica. Na realidade essa organizao estava calcada numa viso elitista, evidenciada no carter enciclopdico e que continuou sendo espao de uma minoria, que podia passar cinco anos adquirindo uma slida cultura

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geral. O que no representava a realidade da maioria da populao. Em suma, foi um ensino secundrio para a formao da elite. O que se percebe na dcada de 30 que estavam presentes algumas idias elaboradas nas dcadas anteriores, mas acompanhadas de uma maior discusso frente s questes educacionais, no sentido de criar um ensino mais adequado modernizao do pas, ou seja, a nfase foi na capacitao para o trabalho e um formao ampla para a elites. Nesse perodo havia a crena de que a reforma da sociedade se daria pela reforma da educao e do ensino, a importncia da criao de cidados e de reproduo/modernizao das elites, e ainda a idia da funo da educao no trato da questo social. (Zotti, 2006). Para o desenvolvimento e implantao da reforma de Francisco Campos instituiu-se em 1932 a taxa de Educao e Sade, para financiar a educao.A taxa Educao e Sade foi instituda pelo decreto n 21.335/32 com o objetivo de constituir um fundo especial para a sade educao. As taxas incidiam sobre quaisquer documentos que fossem sujeitos a selo federal, estadual ou municipal. Era uma taxa fixa de 200 ris, do qual a educao ficava com um tero do montante, que s desapareceu na reforma tributria de 1965. MORGADO, Patrcia Cristina Chaves Rodrigues. O processo de financiamento do ensino mdio pblico no Distrito Federal. Dissertao de Mestrado. Site: http:// www.bdtd.ucb.br/tede/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=641

Contudo, os debates ideolgicos ocorridos no perodo de 19301937, entre catlicos, liberais e governistas, evidenciam que no havia consenso quanto a qual proposta adotar. Em comum, defendiam que a educao era fator fundamental para a construo de um novo Brasil, mas numa lgica de preservao das relaes sociais vigentes e de sua dinmica e organizao. Concomitante a reforma Francisco Campos a dcada de 30 tambm foi marcado pela divulgao do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, inspirada nos debates vivenciados. O que foi esse manifesto? Quem liderou? Quais eram as causas defendidas?

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O Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova (1932) foi um documento redigido por Fernando de Azevedo. E representou a tomada de posio dos intelectuais liberais num movimento em que propuseram a reconstruo educacional no Brasil, estabelecendo alguns princpios como: universalizao da educao, laicidade, gratuidade, obrigatoriedade, co-educao, descentralizao, formao universitria para professores, educao pragmtica e utilitria e esprito cientfico nas investigaes. No Manifesto defendia-se ainda que a educao fosse pblica como funo do Estado, ou seja, o Estado deveria organizar, sistematizar e legislar sobre a educao, tanto que na Constituio seguinte, em 34, foi estipulado que o Estado deveria elaborar a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional. Os pioneiros da Escola Nova afirmavam que o caminho para a modernizao passava pela reconstruo da educao pblica. Trecho do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova Na hierarquia dos problemas nacionais, nenhum sobreleva em importncia e gravidade ao da educao. Nem mesmo os de carter econmico lhe podem disputar a primazia nos planos de reconstruo nacional. Pois, se a evoluo orgnica do sistema cultural de um pas depende de suas condies econmicas, impossvel desenvolver as foras econmicas ou de produo, sem o preparo intensivo e a iniciativa que so os fatores fundamentais do acrscimo de riqueza de uma sociedade. Quais os resultados desse movimento? Segundo Azanha (2004), a importncia do Manifesto tem sido, algumas vezes, minimizada pela arrogncia dos patrulheiros ideolgicos, mas fora de dvida que se trata de um documento que constitui marco histrico na educao brasileira, por vrias razes. Dentre elas, sobreleva o fato de que se trata da mais ntida e expressiva tomada de conscincia da educao como um problema nacional. Alm disso, o Manifesto continha um diagnstico e era um indicador de rumos. claro que, pelos seus prprios propsitos, o diagnstico e o traado de rumos foram expressos em uma linguagem genrica. Mas no caberia outra forma num documento poltico cujo objetivo era provocar sentimentos e atitudes e

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mobilizar para a ao. O Manifesto era ao mesmo tempo uma denncia, a formulao de uma poltica educacional e a exigncia de um plano cientfico para execut-la, livrando a ao educativa do empirismo e da descontinuidade. O documento teve grande repercusso e motivou uma campanha que repercutiu na Assemblia Constituinte de 1934. Neste sentido, em 1934, a nova Constituio (a segunda da Repblica) dispe, pela primeira vez, que a educao direito de todos, devendo ser ministrada pela famlia e pelos Poderes Pblicos, acolheu a idia de um plano nacional de educao, a ser fixado pela Unio, atribuiu aos Estados e ao Distrito Federal a competncia para organizar e manter sistemas educativos nos territrios respectivos, respeitadas as diretrizes estabelecidas pela Unio, estabeleceu os montantes mnimos de recursos a serem aplicados pelo governo federal, pelos Estados e pelos municpios na manuteno e no desenvolvimento dos sistemas educativos, fixando 10% da arrecadao da Unio, 20% da arrecadao dos Estados e Distrito Federal e 10% da arrecadao dos municpios e atribuiu ao Conselho Nacional de Educao a tarefa de elaborar o plano nacional de educao e ordenou aos Estados e ao Distrito Federal que estabelecessem conselhos de educao.

Voc sabia que a Constituio de 1934 previa alguns privilgios tributrios aos professores? Pois sim, no Captulo dos Direitos e Garantias Individuais (art. 113), a Constituio prescrevia ( 36) que nenhum imposto gravar diretamente a profisso de escritor, jornalista ou professor. (Souza, 1999).

No perodo que se segue, durante o estado ditatorial de Vargas os debates educacionais so enfraquecidos, dando-lhes um novo encaminhamento, ou seja, saindo do seio da sociedade civil e passando ao controle da sociedade poltica. Tal conjuntura evidenciou-se nos termos da Constituio de 1937, imposta ao povo brasileiro por Getlio Vargas. Sem dvida, a Constituio de 37 optou pelo discurso conservador catlico, atingindo frontalmente os setores liberais. No contexto poltico o estabelecimento do Estado Novo, segundo Romanelli (2002), faz com que as discusses sobre as questes da educao, profundamente ricas no perodo anterior, entrem numa espcie de hibernao. Ou seja, algumas conquistas do movimento de

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1932 que influenciou a Constituio de 1934, acabaram enfraquecidas nessa nova Constituio de 1937. A principal caracterstica desta constituio foi a enorme concentrao de poderes nas mos dos chefes executivos. O seu contedo era fortemente centralizador, ficando a cargo do presidente da repblica a nomeao das autoridades estaduais, os interventores, a esses por sua vez, cabiam nomear as autoridades municipais. O ensino neste contexto adquiriu um carter cvico, rigorosamente centralizado quanto a sua administrao. A constituio de 1937 concedeu privilgios ao ensino particular, ficando o estado com a funo de suplementar deficincias regionais e locais e no determinou verbas especficas para educao e o ensino. Outro ponto em destaque foi a criao do ensino profissional para atender as classes menos privilegiadas, isto , criou-se a escola para os pobres, institucionalizando a dicotomia que na prtica sempre existiu, de escolas para os pobre e escolas para os ricos. Ou seja, marcando uma distino entre o trabalho intelectual, para as classes mais favorecidas, e o trabalho manual, enfatizando o ensino profissional, para as classes mais desfavorecidas. Essa distino entre trabalho intelectual e manual percebida pelas reformas que se seguiram. Veja a seguir, a nfase que foi dada ao ensino tcnico. A solidificao dos ideais nacionalistas apareceu com muita evidncia na Reforma Capanema, em 1942, ao atribuir ao ensino secundrio um carter patritico. Com esse propsito, o currculo oficial buscava atrelar todos os contedos ao nacionalismo. O curso secundrio foi organizado em dois nveis: ginasial de quatro anos, e colegial, de trs. O colegial era dividido em duas modalidades: o clssico, procurado pela elite, possibilitava o ingresso na universidade, e o tcnico, que tinha como finalidade a formao profissional dos alunos, no dando acesso ao ensino superior. (Paran, 2008) A partir de 1942 o Ministro da Educao e Sade Pblica, Gustavo Capanema, iniciou as reformas conhecidas como: Leis Orgnicas do Ensino, compostas por oito decretos-lei. As Leis Orgnicas mantiveram alto grau de seletividade, permanecendo o mesmo sistema de provas e exames e o aprofundamento da elitizao do ensino.

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Principais Decretos-Lei Decreto que criou o Servio Nacional de Aprendizagem Industrial SENAI (Decreto-lei 4028, de 22 de janeiro de 1942). Lei Orgnica do Ensino Industrial (Decreto-lei 4073, de 30 de janeiro de 1942). Lei Orgnica do Ensino Secundrio (Decreto-lei 4244, de 9 de abril de 1942). Lei Orgnica do Ensino Comercial (Decreto-lei 6141 de 28 de dezembro de 1946). Lei Orgnica do Ensino Primrio (Decreto-lei 8529, de 2 de janeiro de 1946). Lei Orgnica do Ensino Normal (Decreto-lei 8530, de 2 de janeiro de 1946). Decretos que criaram o Servio Nacional de Aprendizagem Comercial SENAC. (Decretos-lei 8.621 e 8.622 de 10 de janeiro de 1946).

As Leis Orgnicas do Ensino flexibilizaram e ampliaram as reformas de Francisco Campos. Interessa assinalar que tais leis completaram o processo poltico aberto com a criao do Ministrio do Negcio da Educao e Sade Pblica. Segundo Piletti (2006), apesar dessa diviso do ensino secundrio, entre clssico e cientfico, a predominncia recaiu sobre o cientfico, reunindo cerca de 90% dos alunos do colegial. Quais as principais mundaas ocorridas a partir de 1945 no cenrio internacional? O que ocorre no pas com o fim da ditadura de Vargas? Como fica o cenrio nacional em termos educacionais? De acordo com Cruz (2006), o Brasil Nacional-Desenvolvimentista se constituiu em um perodo marcado por efervescentes processos sciohistricos, entre eles o termino da 2 Guerra (1945), o que representou para a humanidade uma nova fase nas relaes internacionais e nas diversas esferas da vida societal. Em termos nacionais, os anos 40 foram

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marcados pelo fim da ditadura Vargas, o que levou a redemocratizao institucional do Pas, sobretudo, com a realizao das eleies em que o General Eurico Gaspar Dutra, foi eleito Presidente da Repblica. Foi a partir das prioridades estabelecidas pelo seu governo, que a poltica econmica brasileira foi se moldando associao com o capital financeiro internacional, consoante com o plano do ps-guerra de imposio de uma nova ordem mundial. Nesse contexto, os resultados apresentados pela misso ABBINK (Comisso Tcnica Mista Brasil/Estados Unidos) indicam que para o Brasil aquecer a sua economia e elevar o nvel de produo seria necessrio formular uma poltica que objetivasse a conteno do nvel de inflao e primasse pelo desenvolvimento da indstria petrolfera. Tais medidas passariam pela compresso salarial e o recurso ao capital estrangeiro para suprir a falta de recursos nacionais. Cruz (2006), ainda salienta que o processo de industrializao pautado sob o capital estrangeiro intensificou-se na dcada de 50 com o Presidente Juscelino Kubitschek. Ou seja, os recursos internacionais apresentavam-se como soluo alternativa de desenvolvimento econmico, inaugurando dessa forma um novo modelo de industrializao. Para tanto, foi necessrio reformular o papel do Estado para dar curso as idias desenvolvimentistas do governo respaldadas em seu Plano de Metas. E na dcada de 60, com a posse de Jnio Quadro (1961), enfatizou-se uma ambgua poltica externa independente utilizada pelo governo como instrumento de presso para vantagens e concesses, numa tentativa de buscar apoio internacional para um plano nacional de desenvolvimento. Com a renncia de Jnio Quadros, assumiu o governo Joo Goulart, posteriormente, deposto pelo golpe de Estado de 1964. Em termos educacionais neste perodo, o marco foi uma nova Constituio em 1946 que alm de inaugurar um regime liberaldemocrtico, baseado no direito de todos, concede ao Estado o papel de propiciar esse direito. No aspecto educacional, aparece pela primeira do perodo de 50 a realizao da operao Panamericana que tinha como apelo vencer o subdesenvolvimento. Seus principais resultados foram o BID (Banco Internacional de Desenvolvimento) e a Aliana Para o Progresso. E da dcada de 1960 a criao da Comisso Econmica para a Amrica Latina (CEPAL) e o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB). CRUZ, Marta Vieira. Brasil NacionalDesenvolvimentista. Site: http://www.histedbr. fae.unicamp.br/navegando/artigos_frames/ artigo_083.html

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vez em uma Constituio brasileira a expresso diretrizes e bases, referindo-se educao em mbito nacional. Ainda possvel assinalar como conquistas desta Constituio: Os professores ganham o direito de acumularem cargos pblicos pela emergencial falta de professores habilitados para atender a demanda; Afirma a obrigao do Estado, na manuteno e na Expanso do EnsinoPblico; Afirmaagratuidadedoensinoprimrio,oqualeraobrigatrio; Afirmaanecessidadedeconcursospblicosparaomagistrio; Atribui a Unio competncia para legislar sobre as diretrizes da EducaoNacional; Coloca a responsabilidade das empresas quanto a educao de seus empregadosedosfilhosdosempregados; Determina percentuais mnimos dos impostos a serem aplicados em educao, nunca menos de 10% pelo governo federal , 20% pelo governo estadual, e 20% pelo governo municipal. Resumidamente, a partir da Constituio de 1946 que se estabelece que Unio caiba legislar sobre as diretrizes e bases da Educao Nacional, cabendo ento ao ministro Clemente Mariani (1948) dar projeto de reforma geral da Educao, tendo como eixo central traar as novas bases da Educao Nacional (Fazenda, 1985). nesse quadro que tramitou a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (n 4.024), aprovada e sancionada no ano de 1961. So por demais conhecidas as polmicas suscitadas decorrentes desse projeto centradas nos embates escola particular x escola pblica e centralizao x descentralizao (Saviani, 1973). Por tratar-se de um fecundo momento histrico, ligado ao processo de construo da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, agora voc acompanhar agora um pouco dos embates que ocorreram durante os treze anos que o projeto levou para entrar em vigor. O propsito desse recorte mostrar as relaes de fora que se deram no perodo e sua influncia na promulgao que ocorreu em 1961.

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A primeira LDBNo texto que segue voc vai encontrar subsdios para entender por que o processo de elaborao da primeira LDB foi to demorado. Quais os entraves que existiram? Como ela foi concebida e organizada? Embora tenha sido apresentado ao Congresso Nacional em 1948, o projeto de LDBEN s comeou a ser discutido em 1957. Os debates ocorridos giravam em torno da questo centralizao versus descentralizao do ensino. A discusso sobre a centralizao ou descentralizao colocava em pauta a questo sobre qual o modelo mais eficiente para ampliar as oportunidades educacionais, estando os educadores progressistas contrrios tendncia centralizadora do Estado. (Ribeiro, 2003, p. 146). Por sua vez, a poltica que tomou conta de todo o processo de discusso do projeto teve, como principais atores, a ala representada pela UDN Unio Democrtica Nacional e, em contraposio, a ala do PSD. O pano de fundo dessa acirrada disputa era a defesa da escola privada de um lado e, do outro, da escola pblica. Em 1959, veio a pblico o Manifesto dos Educadores mais uma vezconvocados;essemanifestocongregouopensamentodosdiversos representantes da esfera poltico-educacional do pas. Nele, expressaramse educadores e intelectuais liberais, liberais progressistas, socialistas, comunistas e nacionalistas. Segundo SANFELICE (2006, p.1662) na voz dos Pioneiros da Educao Nova havia surgido o Manifesto de 1932, gritando pela renovao educacional. Muitos daqueles pioneiros continuaram em cena por vrias dcadas seguintes e perseguidos as vezes, outras cooptados, ou simplesmente se mantendo coerentes s suas convices, levaram adiante a concepo que representavam no que diz respeito s questes educacionais da sociedade em transformao daquele contexto. Culminando no envolvimento com o processo de elaborao da primeira LDB, na elaborao doManifesto de 1959 e na Campanha em Defesa da Escola Pblica (estatal) que antecedeu a aprovao da Lei 4024/61. O Manifesto de 1959 d seqncia ao Manifesto de 1932, o complementa e atualiza, com uma viso histrica mais de vinte anos depois. De acordo com ROMANELLI (1987, p.179 citada por SANFELICE 2006, p.1662) o manifesto era um progressismo conservador que deixava um

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pouco de lado a preocupao de afirmar os princpios da Escola Nova, para, acima de tudo, tratar do aspecto social da educao, dos deveres do Estado Democrtico e da imperiosa necessidade de no s cuidar o Estado da sobrevivncia da escola pblica, como tambm de efetivamente assegur-la a todos. Concomitantemente ao desenrolar dessa manifestao apresentado um substitutivo ao projeto de LDBEN, cujo autor foi o deputado Carlos Lacerda. O que propunha o Substitutivo Lacerda? Quem eram os favorecidos por esse substitutivo? Por defender os interesses da escola particular, o Substitutivo ganhou defensores e opositores. A Igreja Catlica, atravs dos representantes das escolas privadas, parte para uma disputa hegemnica, visando os seus interesses. Por outro lado, os defensores da escola pblica rebatiam os argumentos catlicos, acusando a Igreja de ter representado historicamente os interesses da classe privilegiada, contribuindo para manter tais privilgios. O que se conclui da anlise do texto final da LDBEN de 1961 que o resultado de toda essa disputa foi traduzido pelo vis da conciliao, ou seja, uma conjuno de foras, numa soluo de compromisso. Resumindo, a Lei n 4.024/61 trata-se de um texto que nasce velho, na medida em que muitas de suas concepes j haviam sido superadas pelas idias emergentes no panorama educacional do perodo. Dessa tentativa de conciliao surgiu uma lei que favorece a ideologia da escola privada, mais do que o aprimoramento da escola pblica. Como ficou estruturado o ensino com a Lei n 4.024/61? Em relao estrutura do ensino, manteve-se o primrio de quatro anos. O ensino ginasial de quatro anos, subdividido em: secundrio, comercial, industrial, agrcola e normal. O ensino colegial era de trs anos, subdividido em: comercial, agrcola e normal. E o ensino superior. Em termos de financiamento a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, de 1961, elevou de 10% para 12%, da receita dos impostos, o mnimo a ser aplicado pela Unio na manuteno e desenvolvimento do ensino, e os Estados, o Distrito Federal e os municpios 20% no

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mnimo. Os recursos seriam divididos em quatro parcelas. Trs delas, correspondendo cada uma delas a trs dcimos do total, iriam constituir os fundos nacionais do ensino: - fundo nacional do ensino primrio - fundo nacional do ensino mdio - fundo nacional do ensino superior A ltima parcela, correspondente dcima parte do total, destinarse-ia s despesas administrativas do MEC. Segundo Vieira e Freitas (2003), essa lei mal foi promulgada e comearam a emergir discusses sobre a possibilidade de outras reformas do ensino. Essas reformas iro aparecer no perodo da ditadura militar. Segundo Saviani (2005), no que se refere educao, o governo militar no tinha a inteno de criar uma nova LDB, mas apenas ajustar a que estava em vigor, Lei n 4.024/61. Por que o governo militar precisava reformar a educao? Quais os motivos? Neste item voc ir conhecer mais algumas reformas educacionais, as quais muitas deixaram vrios resqucios na foram como a educao organizada atualmente.

Para saber mais sobre os embates em torno da 1 LDB leia: Vieira, Sofia Lerche e Freitas, Isabel Maria Sabino de. Poltica educacional no Brasil: introduo histrica

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As reformas do perodo militarCom a deposio de Joo Goulart em 1964, findou-se democracia populista que perdurava na nao brasileira desde 1946. Surge ento uma articulao entre a burguesia industrial e financeira, tanto em nvel nacional como internacional, fortalecida pelos latifundirios, militares, alguns intelectuais tecnocratas e pelo capital mercantil, organizando uma nova classe para formar um novo bloco de poder e assumir o controle do pas, instaurando o perodo em que os militares o governaram. A educao, ou melhor, a poltica educacional faz parte deste contexto em que o Estado assume cunho ditatorial voltado para os interesses do capital. Tanto as reformas do ensino superior (1968) quanto as do ensino primrio e mdio (1971) so realizadas sem a participao da sociedade civil, com a inteno de desmobilizar os eventuais movimentos sociais. Dessa maneira, a poltica educacional se transforma em estratgia de hegemonia, ou seja, um recurso necessrio para a obteno do consenso. Como neste perodo todo oramento nacional estava programado para o crescimento econmico do pas, a Constituio outorgada em 1967, revogou o percentual de 12% sobre a receita de impostos para fins educacionais, atravs da supresso da poltica de vinculao de recursos. A educao coube apenas recursos de alguns impostos, a sustentao financeira do ensino recebia verbas no oramentrias com o salrioeducao, incentivos fiscais, fundo especial da loteria federal, loteria esportiva federal e fundo de investimento social (FINSOCIAL). A Constituio de 1967 durou apenas dois anos, pois em 1969 foi colocado em vigor o Decreto Lei 477 e o Ato Institucional de n 5, o AI-5, que foi o instrumento jurdico que suspendeu todas as liberdades democrticas e direitos constitucionais, permitindo que a polcia efetuasse investigaes, perseguies e prises de cidados sem necessidade de mandato judicial. O que mudou na educao? E por qu? Primeiro foi elaborada a reforma do ensino superior com a Lei 5.540/68. Segundo VIEIRA E FREITAS (2003, p.132), a reforma do ensino superior deve ser compreendida sob diversos elementos. Do ponto de vista poltico, constitui resposta a uma presso por acesso ao ensino superior, demanda claramente colocada no seio da sociedade civil, de modo especfico entre suas camadas mdias. Do ponto de vista tcnico, procura atender a

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uma exigncia de racionalizao, tanto no sentido de conter a expanso desordenada desse nvel de ensino, quanto de prover os meios para que as instituies pudessem vir a oferecer mais e melhor ensino, num ambiente onde a participao estudantil fosse posta sob controle. Foi nessa poca que se criou o vestibular classificatrio. Outra ao do governo em termos educacionais foi a criao do Mobral, utilizando o Mtodo de Paulo Freire. O Mobral se propunha a erradicar