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Estudar láfora obriga a trabalhar mas consegue-se uma vida melhor Estudar no estrangeiro não é fácil, mas entre os part-times e os apoios estatais, portugueses garantem que têm uma vida mais desafogada. 4 João Pedro Santos, 32 anos, acabou a licenciatura em Engenharia Civil na Dinamarca. Está a fazer o mestrado e trabalha em part-t/me numa empresa farmacêutica.

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Estudar láforaobriga a trabalharmas consegue-seuma vida melhor

Estudar no estrangeiro não é fácil, mas entre ospart-times e os apoios estatais, portuguesesgarantem que têm uma vida mais desafogada.

4 João Pedro Santos, 32anos, acabou a licenciaturaem Engenharia Civil naDinamarca. Está a fazer omestrado e trabalha empart-t/me numa empresafarmacêutica.

? Gonçaloßeistem 25 anos,está desde setembroem Copenhagaa estudar GestãoHoteleira e Turismo.Trabalha num scottishbar, 12 horas porsemana, e está aganhar 938 euros.

ANA BELA FERREIRA

Adecisão de ir estudar para fora é to-mada tendo em conta muitos fato-res: o curso não existir cá, não se ternotas para entrar em Portugal ouporque se procura uma experiênciano estrangeiro. Depois começa a es-colha do país. E é aí que se descobrequais os sítios onde não se paga pro-

pinas ou se há um empréstimo estatal paraestudar. Além de ser mais fácil encontrar umtrabalho em part-ãmepara conciliar com osestudos.

É isso que garantem os jovens portuguesesque escolheram estudar fora. Gonçalo Reisestá em Copenhaga a estudar Gestão Hote-leira e Turismo, numa turma internacional.Está desde setembro de 20 18 na capital dina-marquesa, depois de sete anos de interregnoentre o secundário e o início da licenciatura."Tinha o curso de Técnico de Turismo e de-pois do secundário quis começar a trabalhar,

fui nadador salvador e segurança privado. Ti-nha feito estágio num parque de aventura eo meu patrão começou a dizer que para fazercoisas mais radicais precisava de uma licen-ciatura." Esperoupelos 23 anos para se po-der candidatar a esse contingente, mas nãopassou no teste de candidatura à Escola Su-

perior de Hotelaria e Turismo do Estoril - "j á

não estudava há cinco anos" -, e aí começoua pensar nos custos do ensino superior emPortugal.

"As propinas eram caríssimas e aqui na Di-namarca não pago; lá tinha de ir de carroporque teria de fazer em pós-laboral e a essahora os transportes não são eficazes, e aquiando de bicicleta."

Na Dinamarca, os estudantes recebem umapoio para fazer o ensino superior. "São 5500coroas, cerca de 750 euros por mês." Umapoio automático para todos os dinamar-queses e para todos os estudantes da UniãoEuropeia que encontrem trabalho. Não po-dem fazer mais de 12 horas semanais, masesse trabalho acaba por ser mais bem pagodo que em Portugal.

Dois fatores que para Gonçalo e João PedroSantos (outro português na Dinamarca) com-pensam os custos mais elevados, por exem-plo da renda de casa. "O que acaba por servantajoso é o rácio do que se ganha e do quese gasta." Ou seja, aos dois alunos aindalhessobra dinheiro no fim do mês, graças ao apoioestatal -cuja única regra é não chumbar maisdo que três vezes à mesma disciplina- e aotrabalho, que gerem facilmente com as aulas.

João Pedro Santos está a começar a tese emEngenharia Civil numa vertente energéticana Universidade Técnica da Dinamarca.

Já foi nesse país que completou a licenciatu-ra em Engenharia Civil, depois de cinco anosem que apenas completou dois curricularesdo curso no Politécnico de Leiria. "Tive váriasdificuldades com o tipo de ensino e avalia-ções muito pouco flexíveis. Em Portugal nãoé avaliado se a pessoa pensou bem no exer-cício, só se chegou ao resultado. Por motivosfinanceiros e por estar farto desse modelo deensino, quando tive a oportunidade de virpara a Dinamarca, vim."

Em Portugal, João játrabalhava em part-ti-me-"emcaixasdesupermercados,embares,em lojas de desporto" -, o que lhe dava250/270 euros por mês, e tinha de pagar pro-pinas, mais a casa (é natural de Torres Vedras) .

"Tinha de haver ajuda dos pais", confessa.Desde que chegou à Dinamarca, para onde semudou com a namorada, já acabou a licen-ciatura (converteu alguns dos créditos feitosem Leiria), está a fazer o mestrado e sempretrabalhou ao mesmo tempo. Recebe 700 eu-ros pelo part-timede 12 horas semanais e o

apoio do Estado para estudar. "Paga-se maisna renda de casa e nas coisas, mas é mais fácilsobrar algum dinheiro ao fim do mês." Comexperiências tão diferentes, João admite:"Adoro Portugal, a única coisa de que não gos-to é do mercado de trabalho."

Em Inglaterra, Margarida Vieira e Teimo

Sousa também elogiam a facilidade em con-quistarem autonomia financeira, muito maisdo que teriam em Portugal. A algarvia estudaBiologia Marinha em Portsmouth, trabalha 15horas por semana num supermercado, ga-nhando 500 libras por mês (cerca de 568 eu-ros) . Paga de renda 425 a 455 euros (despesasincluídas) , dando folga para pagar os outrosgastos. "Quando sinto que estou mais aperta-da de dinheiro peço para trabalhar mais ho-ras. Aqui há essa flexibilidade." Conta tambémcom a ajuda estatal. "Candidatamo-nos aostudentfínancee é-nos emprestado o valor dapropina, só começamos apagar dois anos de-

pois de acabar o curso, e se ganharmos maisde 25 mil libras por ano, eles descontam 30%do ordenado", explica. No seu caso, o emprés-timo é de 10 500 euros, um valor que, admite,não teria condições de pagar. Sente que emPortugal seria mais difícil conseguir conciliaros estudos com o trabalho: "A carga horáriaem Portugal é muito superior."

O madeirense Teimo fez a licenciatura naterra natal, mas tinha o desejo de emigrar. Pri-meiro pensou aindafazer o mestrado em Lis-boa, mas acabou por não entrar e decidiuemigrar logo nessa altura. "Vim por causa domestrado em Produção Cinematográfica, quejá acabei e agora comecei umapós-graduaçãoem Efeitos Visuais." Na primeira formação

Lá fora, alunosdizem que a vidaé mais cara, masque ganhammais e conseguemque sobre dinheiroao fim do mês.

também teve o empréstimo, agora foram os

pais que financiaram os 4258 euros da espe-cialização. Teimo trabalha mas, como vive emLondres, são os pais que lhe pagam a renda de739 euros. Os cerca de 140 euros que ganha nopart- timeseivem para as outras despesas.Mas esta ajuda está a terminar: Teimo já arran-jou trabalho numa empresa da sua área e vaideixar de precisar da ajuda dos pais. "O quevou ganhar vai dar sem problemas para a casae para as despesas."

Tomé João está na Alemanha, em Dussel-dorf, a aprender a língua para em setembro co-

meçar a estudar Cinema. Não foi para estudar

que emigrou, mas acabou por decidir fazer alicenciatura que há muito sonhava. As propi-nas são 250 euros por semestre, mas esse valorinclui um passe para os transportes em todo oEstado e descontos noutras formações (comocursos de línguas ou cursos onliné) . O valor darenda de casa é semelhante a Lisboa, onde To-mé, natural do Algarve, vivia antes de emigrar.Com trabalho bem pago como intérprete, To-mé, quejáfoi gerente de vendas em Lisboa, diz

que para ganhar o mesmo e estudar em Portu-

gal "teria de trabalhar como um escravo".

Pouca flexibilidade e falta de residênciasOs estudos feitos em Portugal, como o de Su-sana da Cruz Martins, mostram a maior difi-culdade cá em conciliar o trabalho com osestudos. 'Ainda temos das cargas horárias le-tivas mais pesadas da Europa, o que pode serum obstáculo a essa conciliação", admite ainvestigadora do ISCTE que integrou o estu-do "Condições de vida dos estudantes do en-sino superior". Também por cá, as ajudas doEstado pesam apenas 6% no rendimento dosestudantes, quando na Dinamarca, porexemplo, são 52% dos rendimentos.

Mas o principal problema, sublinha o rei-tor da Universidade de Lisboa, António CruzSerra, é o alojamento: "Não há alojamento.São precisas mais residências e já estamos atratar disso."

Segundo o estudo do ISCTE, as despesascom alojamento são 11% do orçamento dosestudantes portugueses, o quarto país euro-peu onde este valor é mais elevado.

? João Tomé, 33anos, estuda alemãoem Dusseldorf paraentrar em Cinema emsetembro. Trabalhacomo intérprete. Paraganhar o mesmo eestudar em Portugaltinha de trabalhar"como um escravo".

< Teimo Santos, 23 anos,está em Londres, onde já fezo mestrado e está a terminaruma especialização. Já

arranjou emprego na área.

T Margarida Vieira,20 anos, estudaBiologia Marinhaem Portsmouth.Paga as despesascom o trabalhonum supermercadoe conta com oempréstimo estatalpara as propinas.

Portugal tem das

cargas letivas maispesadas da Europa,daí que só 22,3%dos estudantestrabalhem aomesmo tempo.